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CARL ROGERS

ensaios

Cadernos Inúteis da Casa de Gestalt


A vivência do sentido ontológico da
inutilidade amalgama-se com a vivência da
drmática da ação, do desdobramento do
possível, da possibilidade, da criação.
Como condito sine qua non da ação
compreensiva e musculativa. Da
criatividade, da poiese.
Da existência.

O presente caderno é um núcleo temático


de nossa produção. Contém erros formais
na sequência dos ensaios, duplicatas, que
serão corrigidos nas próximas versões.
Igualmente orientará a produção de
ensaios sobre o tema.
1. INTRODUÇÃO À ABORDAGEM ROGERIANA.......................................4

2. PERSONA... PERSONALIDADE, & PERSONAGEM (Personagente,


personator, personação).......................................................................14

3. A PESSOA DE CARL ROGERS É EMPÍRICA. FENOMENOLÓGICO


EXISTENCIAL EMPÍRICA....................................................................... 17

4. ABORDAGEM ROGERIANA. DE ONTOLOGIA, ÉTICA,


EPISTEMOLOGIA, E MÉTODO...............................................................19

5. PSICOLOGIA AMBIENTAL. FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAL.


ABORDAGEM ROGERIANA. ABORDAGEM GESTÁLTICA......................21

6. ABORDAGEM ROGERIANA. DE ONTOLOGIA, ÉTICA,


EPISTEMOLOGIA, E MÉTODO...............................................................42

7. Abordagem Rogeriana. Algumas questões......................................44

8. AVALIAÇÃO ORGANÍSMICA DA EXPERIÊNCIA: CONSICIÊNCIA,


LIBERDADE EXPERIENCIAL E AFIRMAÇÃO NO TRABALHO
PSICOLÓGICO E PSICOTERÁPICO........................................................47

9. AVALIAÇÃO ORGANÍSMICA DA EXPERIÊNCIA: CONSCIÊNCIA,


LIBERDADE EXPERIENCIAL E AFIRMAÇÃO, NO TRABALHO
PSICOLÓGICO E PSICOTERÁPICO........................................................49

10. A COMPREENSÃO É EMPÁTICA. A EMPATIA É COMPREENSIVA.


(Aliás, Compreensão Empática é uma redundância...)........................55

11. Dialógica......................................................................................... 61

12. DIALÓGICA, HERMENÊUTICA E ESTÉTICA DO CONFLITO Conflito,


Mediação, e Facilitação da resolução de conflitos em Psicologia e
Psicoterapia Fenomenológico Existencial...........................................65

13. Genuinidade na Abordagem Rogeriana. A autenticidade


fenomenativa, empática, dialógica, de ser outro, em sendo ator.......94

14. DA INCONDICIONALIDADE DA PESSOA NA ABORAGEM


ROGERIANA........................................................................................ 103

15. JOHN............................................................................................. 108

16. Nem Teorético, nem Prático. Muito menos Pragmático O


Paradigma Rogeriano. Fenomenológico Existencial: Poiético..........120

17. Carl Rogers, o patético. Empatético, peripatético......................133

18. O RISCO E O ÔNUS DO ROGERISMO VULGAR.............................139


19. Carl Rogers. Sobre o sentido da concepção e do logos metódico
de seu paradigma em psicologia e psicoterapia I.............................142

Carl Rogers. Sobre o sentido da concepção e do logos metódico de


seu paradigma em psicologia e psicoterapia II.................................149

20. TENDÊNCIA ATUALIZANTE E EMPATIA.......................................154

21. TENDÊNCIA FORMATIVA..............................................................157

22. TENDÊNCIA ATUALIZANTE..........................................................161

23. A AÇÃO NÃO É SÓ AÇÃO MUSCULAR..........................................166

24. COMPREENSÃO E PERCEPÇÃO....................................................169

25. SINERGIA SINESTÉSIOLÓGICA DA COMPREENSÃO, E


SINESTESIOLOGIA DA SINERGIA DA MUSCULAÇÃO COMPREENSIVA.
SINERGIA SINESTESIOLÓGICA DA COMPREENSÃO-MUSCULAÇÃO:
SINERGIA DA AÇÃO. Sinetésica estética da sinergia implicativa da
ação, da compreensão, e da musculação compreensiva..................177

25. ESTÉTICA, ESTESIA E SINESTESIA, SINESTESIOLOGIA.


DIALÓGICA, EXPERIMENTAÇÃO E HERMENÊUTICA DRAMÁTICA DA
CINEMÁTICA DA AÇÃO....................................................................... 182

26. CONCEITUAÇÃO. O TEMPO, O CONCEITO, E O PRECONCEITO. O


conceito e o Tempo............................................................................ 199
1. INTRODUÇÃO À ABORDAGEM ROGERIANA
Afonso H L Fonseca, psicólogo.

Ao prof. Joel Martins,


Um lúcido, pioneiro, sábio, e risonho
mestre de Fenomenologia.
Aos meus alunos da Turma de
Parnahyba e da Turma São Luís, da
Formação.

O trabalho de Carl Rogers tem uma especial importância -- não


só no desenvolvimento, na história, da Psicologia, como na história
da própria Ontologia e da Epistemologia da Ciência, e de sua
metodologia.
Como aquele que -- já seguindo uma consistente tradição --,
desenvolveu a Ontologia, a Epistemologia, e a metodologia de uma
Psicologia, e de uma Ciência, ontológicas, fenomenológico existenciais
e dialógicas -- compreensivas, implicativas; e, portanto,
gestaltificativas. Hermenêuticas e experimentais, neste sentido
fenomenológico existencial, compreensivo.
A Ciência do conhecer pré-reflexivo, e pré-conceitual. A ciência
da ação. Do acontecer.
E não, meramente, a ciência das coisas.
Não por acaso, não estaria longe da gaya scienza nietzsceana.

Especial, e qualitativo, momento, no curso deste processo, é o


do desenvolvimento de um paradigma da concepção e da facilitação
dos grupos vivenciais. Radicalmente fenomenológico existencial e
dialógico. Que influencia todo o desenvolvimento de sua abordagem.
E, por consequência, o desenvolvimento da psicologia, da
psicoterapia, e da Ciência. Na medida em que, significativamente,
contribui assim para o desenvolvimento da ontologia e da
epistemologia de um paradigma fenomenológico existencial de
ciência.

Participei, como um dos vinte facilitadores, da equipe de


facilitação um grupo de duas mil pessoas, na Universidade de
Princeton, em 1980. Menos por mérito meu, mas mais porque se
pretendia uma equipe internacional de facilitadores. E eu era o único
brasileiro presente.
Era a abertura da reunião anual da Associação Americana de
Psicologia Humanista. Que se daria na forma de um grande grupo
vivencial, com todos os participantes, no final de semana anterior ao
encontro; que se desenvolveria durante a semana, na Universidade.
Na quinzena anterior ocorria na Universidade um grupo vivencial
internacional. E os facilitadores do grupão da AAHP viriam deste
grupo vivencial.
Naquele momento já se lidava, na equipe do Rogers, com o
receio de se fazer os grandes grupos vivenciais residenciais, com
duração de sete ou quinze dias.
Poderia acontecer algo de problemático?
E a proximidade da equipe, o clima de amizade e aventura,
fortalecia a ousadia e a experimentação.
E assim, na experimentação, foi desenvolvido o paradigma dos
grupos vivenciais. Que superava, então, o paradigma dos chamados
grupos de encontros. Paradigma dos grupos vivenciais que hoje
vigora, como o paradigma rogeriano, fenomenológico, existencial, de
concepção e da facilitação de grupos.
Mas, um grupo com duas mil pessoas? Valeriam os mesmos
achados? Não poderia acontecer algo de problemático com um grupo
tão grande? Perguntava-se nas reuniões de preparação da equipe.
O grupo aconteceu... Com duas mil pessoas... Vinte
facilitadores, doze microfones; exatamente com os mesmos princípios
e concepções de um grupo vivencial com vinte, cinquenta, cem, cento
e vinte, ou duzentas pessoas...
Não aconteceu nenhum incidente grave. E foi um grupo rico,
alegre, e produtivo.
No final, o alívio alegre e jocoso, de que não houvesse
acontecido nada de ruim...
Foi desses riscos e ousadias, riscos e ousadias da
experimentação fenomenológica existencial, experimentação
compreensiva -- afinal Rogers e sua equipe de PhDs tinham uma
reputação a preservar -- que caracterizam a uma disposição e
ousadia para a experimentação implicativa... Foi desses riscos e
ousadias que Rogers criou e consolidou, não só um paradigma de
concepção e de trabalho com grupos, mas nada menos que uma
abordagem ontológica, fenomenológico existencial e dialógica,
hermenêutica e experimental – compreensiva, implicativa,
gestaltificativa --, em Psicologia, E em ontologia, epistemologia, e
metodologia da Ciência.
Não foi pouco.
Nem é.
Nem é, ainda, devidamente reconhecido.
Ou mesmo devidamente compreendido, ou explicitado.
Mesmo, em particular, e especialmente, entre os chamados
Rogerianos.
Naquele momento, Carl Rogers e colaboradores entendiam
profunda e jovialmente, ainda que não o fizessem conceitualmente --
tão metidos que andavam no pré-reflexivo e pré-conceitual --, o
sentido da experimentação ontológica. Da experimentação
compreensiva, da experimentação gestaltificativa, da experimentação
fenomenológico existencial, e dialógica.

Freud não explica?


Ele que fique para ele com todas as explicações...
E o caráter doentio das overdoses de explicação...
A implicação, a compreensão.
A experimentação, compreensiva, interpretação compreensiva.
Compreensiva, e implicativa...

E, entendem o caráter de dejeto da explicação.


Não se desentende a importância da explicação. No seu
momento, lugar, e oportunidade próprios.
Mas, sabidas são as consequências de se remexer, mormente
obsessivamente, em dejetos...
A experimentação da interpretação compreensiva, a
compreensão, não é conhecimento.
A experimentação da interpretação compreensiva, em
específico, é conhecer.
Como dizia Pessoa, é sempre melhor conhecer pela primeira
vez que saber...
O saber da compreensão, da interpretação compreensiva, da
experimentação ontológica, sempre, é conhecer pela primeira vez...
E, como tal, é implícito, e tem como pré-requisito, a ação.
A ação é sempre a vivência da atualização de possibilidades.
O devir. Devir de algo que não existe. E que passa a existir,
compreensiva e muscularmente; cognitiva e materialmente -- por
intermédio da ação, da atualização.
Na exata medida, a experimentação da interpretação
fenomenológica, compreensiva, sua implicação, e compreensão, são o
inexato conhecer intrínseco à ação. A vivência do desdobramento de
possibilidades, enquanto a vivência episoidial da tensão, intensão, do
modo pré-reflexivo e pré-conceitual de sermos. Existência.
Carl Rogers obstinadamente buscava a compreensão, e buscava
constituir a compreensão como método. Porque buscava, em
específico, a ação, a sua tendência atualizante. Já que a compreensão
é o conhecer intrínseco à ação. À atualização. À tendência
atualizante, que nos constitui como existência, da qual somos
constituídos.
E não existe explicação que leve à compreensão (Takuan
Soho).
A ação, e a intrínseca compreensão, são empíricas.
Fenomenológico existenciais empíricas. Porque não são reflexivas,
não são teoréticas...
A ação é a experimentação, no sentido especificamente
ontológico. Fenomenológico existencial, e dialógico.
E, não é por acaso que experimentação, empírico, perigo,
respiração, pirata, piração... Etimologicamente vêm de perire.
O importante verbo grego, que tem como sentido o de arriscar,
o tentar.
O arriscar o tentar o potente vivencial, o possível vivenciado
fenomenológica e existencialmente.
Isto é a ação, a atualização... Arriscar, tentar, o possível
vivencial, o potente... A afirmação do que é, apenas, possibilidade
vivida em desdobramento...
E arriscar, tentar, experimentar o desdobramento do potente
vivencial, o possível -- no episódio de sua momentaneidade
instantânea -- é o que entendemos como ação. Atualização.
A ação, a atualização, é o que entendemos como existência. Em
seu caráter de movimento existencial – de moção --, de emoção, de
cognição pré-reflexiva e pré-conceitual, de compreensão; em seu
caráter de criação, de superação, de regeneração.

Com Kurt Goldstein, Carl Rogers entendeu o caráter dramático


(ação), ativo, da existência. Em suas características próprias de
moção, de emoção, de cognição compreensiva, de criação, de
superação, de regeneração.
E fez da ação, da tendência atualizante, que constitui a
existência, o elemento central de sua concepção e metodologia de
trabalho com as pessoas e com os grupos.
Um método que possa favorecer a ação -- a tendência
atualizante, no trato com as pessoas --, eminentemente exige o
favorecimento do modo pré-reflexivo, e pré-conceitual, de sermos, o
favorecimento do modo ontológico de sermos.
Que é, própria e especificamente, o modo de sermos do pathos
– no sentido Grego do termo. O modo de sermos da sensibilidade
emocionada, modo de sermos da emoção – este o sentido grego de
pathos. O modo de sermos da empatia.
Modo páthico, de sermos. Patéthico, peripathético.
Empathético, emperipathético, empáthico.
Que não restem dúvidas, o paradigma rogeriano é, antes que
mais nada, uma ética...
PERIpathético, na exata medida em que é, radicalmente,
empáthico e exPERImental.

De modo que não se entende a abordagem rogeriana se não se


entende o seu caráter eminentemente experimental.
Experimental, não no sentido científico explicativo comum.
Mas no específico sentido científico compreensivo e implicativo,
pré-reflexivo, e pré-conceitual, ontológico, fenomenológico
existencial. Enquanto pathética, peripathética, empathica...
Neste sentido --já sob a influência da filosofia do diálogo, de
Buber; e da tradição fenomenológica intensional, e gestaltificativa, de
Brentano --, Rogers decididamente entende que, de modo radical, a
sua concepção e metodologia não se filiavam à comum concepção e
metodologia que radica no modo não ontológico de sermos, no modo
reflexivo e conceitual de sermos.
Em sendo assim, sua metodologia era radicalmente uma
metodologia da ação, da atualização, da tendência atualizante. Uma
metodologia implicativa, compreensiva e empática; pré-reflexiva e
pré-conceitual, de caráter eminentemente dialógico, portanto.
Não fazem sentido, no âmbito desta concepção e metodologia,
desta epistemologia e ontologia, os elementos característicos do
modo reflexivo e conceitual de sermos.
Não faz sentido a explicação.
Conceitual e metodologicamente isto não significa pouco.
E a questão não é de nem de muito nem de pouco. Porque é
uma radical questão qualitativa.
Não fará sentido, portanto, a reflexão. A objetividade, e a
subjetividade; a teoria, o teórico. Na ontológica da dialógica,
compreensiva, empática, um tu, o outro jamais será um objeto.
Jamais seremos sujeitos.
Ontologia ontológica, a fenomenologia experimental da ação, a
concepção e metodologia rogerianas são eminente empíricas.
Empírica na medida em que são experimentais. Experimentais na
medida em que empíricas.
Mas, em específico, no sentido ontológico, fenomenológico
existencial e dialógico.
Da vivência pré-reflexiva, e pré-conceitual. Fenomenológico
existencial.

Na exata medida em que a moral e o moralismo são ônticos, e


não ontológicos -- ou seja, na exata medida em que são
eminentemente reflexivos, conceituais e teóricos -- eles, igualmente,
não fazem o mínimo sentido metodologicamente, no paradigma
rogeriano.
Em seu caráter ôntico, coisificado, a técnica igualmente não faz
o mínimo sentido no cerne de uma metodologia ontológica,
fenomenológico existencial e dialógica. Empática, patética.
Hermenêutica e experimental, neste sentido.
Dialógica, uma metodologia fenomenológica eminentemente
prescindirá da arbitrariedade, sendo especificamente improvisativa.
Na medida em que dialógica.
Em sua condição ontológica, uma metodologia fenomenológica
estará assim isenta das dicotomizações sujeito-objeto, e de suas
consequências.
Em seu caráter poiético estará isenta da causalidade. Da
utilidade e do pragmatismo.
Da realidade – enquanto modo acontecido, realizado, de
sermos.

Carl Rogers desenvolve, pois, o paradigma de uma concepção e


metodologia da dialógica empírica do encontro com a pessoa
empírica.
Mas, muito importante é que se entenda o caráter ontológico,
fenomenológico existencial próprio deste empirismo.
A operacionalização de todas estas características, próprias ao
modo ontológico de sermos, Carl Rogers foi desvelando ao longo
desenvolvimento de sua metodologia implicativa, compreensiva, e
empática. Em particular à medida que se desenvolveram os trabalhos
com os grupos vivenciais, a partir de 1974. Especificamente
caracterizados por uma radicalização fenomenológico existencial e
dialógica; patética, PERIpathética, empathica, exPERImental...
Privilegiar, assim, o modo ontológico de sermos da ação
significa momentaneamente, na duração do episódio da ação,
escapulir do âmbito da reflexão. Em específico, do âmbito da
dicotomia sujeito-objeto, dejetos. Para incorporar atualizativamente o
âmbito do jeto propriamente dito. O âmbito do projeto (que não é
nem sub nem ob jeto, dejetos, mas jeto, propriamente dito. Ação).
Na dialógica da interação, um tu, o outro jamais é objeto,
dejeto.
Nem nós somos sujeitos, dejetos.
A ação, a inter-ação, é relação com uma alteridade. Um tu.
Enquanto modo ontológico de sermos, jetos, projetos, o eu e o
tu, o eu tu, não são os dejetos, subjeto, e objeto. Na medida em que
são o próprio jeto. O desdobramento da vivência do possível
propulsivo. Do potente. A vivência do desdobramento da
possibilidade. A ação, atualização.
Na momentaneidade instantânea do modo ontológico de sermos
da dialógica eu-tu, o eu não é um sujeito, o tu não é um objeto.
Eu-tu é ação.
Interação, o eu é emergência e desdobramento de
possibilidades, o tu é emergência e desdobramento de possibilidades,
o eu-tu, interação, é emergência e desdobramento de possibilidades,
ação.
De modo que são alteridades absolutas em inter-ação.
Para si próprios, e para o outro.
Ação, interação, a dialógica, e a absorção na dialógica da
relação eu-tu, nutre-se da alteridade e da diferença.
E Rogers cedo entendeu que, no âmbito de uma metodologia
ontológica, fenomenológico existencial e dialógica; compreensiva,
implicativa, gestaltificativa, seria pretensioso e prepotente se
pretender determinar a condição do outro. O outro é um foco
autônomo de produção de sentido, já diria Husserl.
Efetivamente, esta pretensão e prepotência determinam a
aniquilação da dialógica, e a destruição do outro – mesmo que seja a
nível meramente conceitual --, a aniquilação da oportunidade do
encontro, do conhecer, e da criação do outro com o outro.
A dialógica, a ação, a interação, em específico, são a criação do
possível, e a criação como atualização do possível, na
momentaneidade instantânea da ação.
E a aniquilação, ou a tentativa covarde de condicionar a
outridade do outro é a aniquilação da dialógica, a aniquilação da
ontológica. A aniquilação da empatia.
Por isso que Rogers compreendeu que uma consideração
positiva incondicional pelo outro, e por sua experiência alteritária, era
para ele, e para a sua abordagem, uma condição de método
fundamental.
O que, igualmente, significa que uma consideração positiva
incondicional por si próprio é, também, uma condição de método.
Na medida em que, mesmo na dialógica da relação conosco
próprios, relacionamo-nos com a outridade, e somos,
eminentemente, outros.
A relação com a outridade de um desconhecido. Que nos faz
outros.

Porque querer condicionar espuriamente a outridade do outro,


quando, como eu, o meu desafio já é lhe propor a outridade de um
outro?
Outro que, para ele, só é outro na medida em que sou outro de
mim mesmo.
Não é à toa que ator é a origem da palavra e do conceito de
outro. Só sou outro na ação. Em sendo outro, sou ator. Em sendo
ator, sou outro...
Consideração positiva incondicional por si mesmo, constituinte
da empatia, da dialógica, a que ele veio chamar de genuinidade. A
genuinidade de ser outro...
Clarice Lispector captaria maravilhosamente o sentido:
Eu antes tinha querido ser os outros. Para saber o que
não era eu. Mas entendi que eu já tinha sido os outros.
E isso era fácil. Meu desafio maior seria ser o outro dos
outros. E o outro dos outros era eu...
Carl Rogers dizia que em sua abordagem um grande desafio era
que o nosso poder não aniquilasse o poder do outro de ser e de
recriar-se como outro.

Por último não podemos nos negar a uma palavra final sobre os
grupos.
Na concepção e na metodologia do trabalho com grupos Rogers
realizou consideráveis progressos qualitativos.
Na simplicidade (que não é o modo simplório com que alguns
destroem a sua abordagem, às vezes de modo pretensamente
responsável), na simplicidade de seu empirismo fenomenológico,
Rogers chega ao grupo.
No curso do desenvolvimento de sua metodologia empática,
fenomenológico existencial e dialógica, compreensiva, implicativa,
gestaltificativa, de lidar com o grupo, Rogers naturalmente entende
que não pode lidar com o grupo como um objeto. No sentido
ontológico e epistemológico do termo.
Na ontológica fenomenológica do grupo, o grupo não é, nem
pode ser um objeto. Este é um achado fundamental. Condição da
vivência e do desdobramento da vivência do pensamento grupal pré-
reflexivos e pré-conceituais.
Sim, o grupo existe e fenomenologiza-se como existência. Pré-
reflexiva, e pré-conceitualmente. Ao modo de sermos da vivência da
ação. A ação, atualização grupal.
Não é metáfora ou figura de linguagem falar de ação grupal.
Na intrincadas tessituras da dialógica de sua fenomenação pré-
reflexiva e pré-conceitual, os grupos não só se comportam, não só
explicam. Os grupos compreendem e implicam. Os grupos agem pré-
reflexiva, e pré conceitualmente.
E, naturalmente, é necessário participar da momentaneidade
instantânea dos episódios da ação, da existência, grupal.
Rogers intuitivamente direciona-se à fenomenológica existencial
da ação grupal.
Desprovido da reflexão, desprovido do grupo como objeto. E de
si próprio como sujeito.
Desprovido da teoria, e do moralismo.
Desprovido da explicação, e da ciência explicativa.
Desprovido da causalidade.
Desprovido da utilidade, do pragmatismo.
Desprovido do realismo.
(Todas estas características, própria e especificamente, do
modo reflexivo e conceitual de sermos.).
Para constituir-se como ator -- individual e coletivo, pessoal e
interpessoal -- no âmbito da dramática da momentaneidade
instantânea dos episódios da ação, da existência grupal, e de seus
participantes.
Não mais como espectador, expectador. Mas como ator,
inspectador, própria e especificamente. Na dramática da dialógica da
ação coletiva e interpessoal.
Rogers chega, assim, ao conhecimento de que existe uma
fenomenológica existencial grupal. E refina qualitativamente a sua
concepção e método, para participar desta fenomenológica
existencial.
Para participar da preservação de suas condições de
possibilidade.
As condições de possibilidade de sua incrível potência de moção
e emoção existenciais. Da incrível produtividade de seu conhecer
implicativo e compreensivo. De seus próprios poderes de criação, de
superação, e de regeneração. Tanto pessoal quanto coletiva.
Rogers descobre e cria, assim, o paradigma fenomenológico
existencial e dialógico de concepção e de facilitação de grupos.
2. PERSONA...
PERSONALIDADE, & PERSONAGEM
(Personagente, personator, personação).
Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

Acerca das qualidades da persona, a personalidade, seguindo a


metáfora original (Etrusca), cremos que podemos dizer que existe uma
condição efetivamente sonante da pessoa, personante; e uma condição não
sonante, dessonante, despersonante, da pessoa.
Através do que sona, persona (Etrusco).
Ou não.
Nietzsche observava, em torno de todo espírito profundo brota sem
cessar uma máscara. Só podemos progredir mascarados...
Maffesoli esclarecerá a ambígua concepção de máscara. Existem
máscaras que escondem e máscaras que revelam. Duas concepções de
máscaras, uma Grega e outra Etrusca.
Não seria uma concepção da ambígua, ôntica, e ontológica, condição
humana?

De qualquer forma, não existe uma condição unívoca da pessoa. De sua


ôntica e ontológica personalidade. Mas uma condição ambígua. De resto, a
ambiguidade ontológica e ôntica da existencia. Da existensia, e da insistênsia.
A condição ontológica, sonante; e a condição ôntica, não sonante,
efetivamente, dessonante.
Aí vemos a bela metáfora da insistensia e da existensia como som e
silêncio. E muito não precisamos para entendê-las como música.
Mais intensivamente, a insistênsia é som, música, ritmo.
Sonante, sonativa, personativa.
Mas, sonativa de per si a insistênsia -- até poderíamos dizê-la
insonativa, impersonativa, personativa --, o mesmo não poderíamos dizer com
relação à existensia.
Que poderíamos dizer exsonativa, expersonativa, expersonante.
A insistênsia é sonativa. Na medida em que, implicação intensiativa,
intensional, é sonorizante, em sua temporalidade própria, do ritmo do sentido e
ação, no desdobramento da possível, atualização. Sonoriza, na ritmicidade do
fluxo da fenomenológica do sentido e da ação, a vivência do desdobramento
das possibilidades.
A existensia apenas ressoa, ressona. E não sona, não persona.
A insistênsia, sonativa, personativa, é pré-reflexiva, pré-teórica,
dialógica, ao modo de sermos da ação fenomenológica. A existensia é
reflexiva, teorética. Ao modo de sermos do sujeito, e dos objetos.
A insistênsia, sonativa, personativa -- dialógica e ontológica,
fenomenativa, fenomenológica -- é intuitiva, e improvisativa. Estética e poiética.
Experimental, e hermenêutica.
A existensia, despersonativa, não é estética nem poiética, nem é
dialógica, nem experimental, nem hermenêutica. Não é intuitiva, nem
improvisativa.

De modo que, quando nos referimos a uma teoria da personalidade, e a


uma abordagem teórica da pessoa – baseada esta, ou não, numa teoria da
personalidade --, não podemos estar nos referindo à condição ontológica da
pessoa como insistênsia. Mas apenas a sua condição despersonativa como
existensia. Já que a insistênsia da pessoa – própria e especificamente
sonativa, personativa, personante --, é, em específico, ontológica e dialógica,
fenomenológica e fenomenativa e insistensial; e, portanto, intuitiva e
improvisativa, dialógica, estética, poiética, experimental, e hermenêutica...

Numa ética e metodologia inter humanas, pré-reflexivas, pré-teóricas,


fenomenológica existenciais, e dialógicas, não é o foco a personalidade no seu
modo e condição existensial. Sua natureza, genética, constituição, estrutura...

Em específico, em tal ética e metodologia, o interesse é a


fenomenológica ontológica da ação, da atualização. Que é própria, não da
condição e do modo de sermos da persona, enquanto existensia; mas da
persona enquanto insistênsia, enquanto ação, enquanto atora. O personagem,
especificamente; personagens -- personagente, personator,
personainspectator, personainspectação, personação...

Como com relação a tudo, passada a instantaneidade ontológica da


duração do instante de sua momentação, a personação se ontifica, se coisifica,
em persona, personalidade exsistensial, no ôntico sentido psicológico. A
pessoa, a personalidade ôntica, na sua criatividade, se cria na ontológica
fenomenológica do personagem, na ontológica fenomenológica da ação. Da
insistênsia.
Mas, enquanto tal, acontecida, ôntica, existensia, em espeecífico a
personalidade não mais sona, não é mais fenômeno, não é mais
fenomenológica, não é mais ontológica, não é mais dialógica, não é mais
possível, não é mais ação...
Coisa entre coisas, como diria Buber. Feita, fato.
Que estaria condenada à coisidade, à fatalidade...
Não fossem encantadas as coisas. Enquanto instalações da
possibilidade, enquanto instalações do possível.
Encantadas que são, assim, as coisas são desencantáveis.
Mas sob a específica condição do modo de sermos da abertura para o
possível, e para mais um ciclo da ação, do modo de sermos ontológico, que,
própria e especificamente, é a poiética e a estética. Sonativa, Personativa.
Sob o influxo da permeabilidade estética, a persona, enquanto
exsistênsia, abre-se, em seu possível instalado, para a condição ontológica de
insistênsia. Estala a possibilidade instalada, dramatiza-se a provocatividade do
tu possível, para mais um ciclo fenomenológico da ação. Mais que a ôntica
persona não personante, personativa-se; personagente, personator,
personagem, personação.

Distinguem-se, assim, as qualidades e características da experiência da


persona ôntica, como existensia; e as características e qualidades da persona
como agente, personagem, ontológico, ator, efetivamente ação.

De modo que cumpre distinguir entre a qualidade, as qualidades, da


personalidade como persona, e as qualidades da personalidade como agens,
como personagem. Já que o personagem, ator, ação, é pré-reflexivo, pré-
teórico, dramático, estético e poiético. E, enquanto tal, ontológico,
fenomenológico insistensial, dialógico. O que quer dizer, própria e
especificamente, intuitivo e improvisativo, em sua atualidade e presença.
Presença e atualidade especificamente estéticas e poiéticas, pré-
reflexivas. Às quais não rege, nem se aplica, nenhuma teorética.

A atualidade e a presença só são acessíveis à ação dialógica, inter


ação. À intuição, e à improvisação. Estéticas e poiéticas, fenomenológicas, e
ontológicas.

Pré-reflexivas, e pré-teoréticas. Só são acessíveis à implicação.

Bibliografia
BUBER, M Eu e Tu.
HEIDEGGER, M Ser e Tempo.
MAFFESOLI, M A Conquista do Presente.
NIETZSCHE, F Assim Falava Zaratustra.
O Nascimento da Tragédia.
3. A PESSOA DE CARL ROGERS É EMPÍRICA.
FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAL EMPÍRICA.
Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

A pessoa de Carl Rogers, de sua Abordagem Centrada na Pessoa, não tem, em


momento algum, a pretensão a um caráter ontológico, ou metafísico.
Carl Rogers buscava apenas, em primeiro lugar, sair decididamente do
referencial de uma relação não implicativa com a pessoa do cliente. Sair da perspectiva
do referencial de uma relação explicativa, objetivista, teorética, conceitual, técnica, ou
meramente comportamental, ou simplesmente alienada, com a pessoa do cliente .
E ele sabia que a relação efetiva com a pessoa situava-se, naturalmente, no
plano imediato de uma relação empírica. Empírico aqui quer dizer não teórico. E,
também no caso do Rogers, e da Fenomenologia, não objetivista.
Talvez precocemente advertido por Buber, não obstante, Rogers sabia que, em
se tratando da pessoa, este empirismo por certo não seria o empirismo objetivista...
No seu tempo, e no meio da cultura acadêmica Norte Americana -- ele não formulava
assim --, a sua empatia era exatamente o empirismo dialógico, fenomenológico
existencial, compreensivo e implicativo. O empirismo fenomenológico da dialógica.
Este empirismo fenomenológico da consciência já estava em germe
proposto pela metodologia do Aristóteles do De Anima, quando este propõe a
metodologia das Ciências Naturais para o estudo da consciência. Um empirismo
especificamente da consciência. Que Brentano vai desvendar, como o empirismo
fenomenológico intensional da consciência. A dimensão fenomenológico existencial, e
dialógica, da consciência; e da relação dialógica, como diria Buber, da natureza não
humana, do inter humano, e da relação com o sagrado.
Carl Rogers vai entender este empirismo como empatia. Como páthico.
Empático.
Não, certamente, o conceito do pathos no sentido Latino, o pathos como
sofrimento, como doença. Mas o pathos entendido, no seu sentido Grego original,
como sensibilidade emocionada. Como a sensibilidade estética, e poiética,
fenomenológico existencial.
Juntando Aristóteles, e a patéthica Grega; juntando Brentano, Buber, e
Heidegger, mesmo que assim não o soubesse, em sua noção implicativa de empatia, aí
está a genialidade de Carl Rogers. Porque suas concepções e metodológica,
eminentemente, própria e especificamente, implicativas, fenomenológico existenciais e
dialógicas, compreensivas, emergiam no mundo da ciência e da cultura Norte
Americanos, fortemente marcados por uma ontofobia, e fortemente marcados pelo
objetivismo, explicativo, e por seu empirismo objetivista, por sua tecno lógica, e por
seu comportamentalismo.
Em particular no objetivismo do modelo bio-médico, no objetivismo bio-médico
da epistemologia psicanalítica, e no objetivismo explicativo Comportamental...
Carl Rogers pelejou com estas tendências objetivistas explicativas, ontofóbicas,
técnicas, utilitaristas, pragmáticas, predominantes na cultura da ciência, da Psicologia,
e da Medicina Norte Americanas; e, por que não dizê-lo, mundiais.
Pelejou, igualmente, com as tendências idealistas. Para depurar e decantar um
modelo fenomenológico existencial empático, para preconizar uma relação com o
cliente, com o educando, com o participante de grupo, que valorizasse, não uma
perspectiva, explicativa, teorética, objetivista; moralista, causativa, técnica,
pragmática; mas que fosse experimental e hermenêutica, no sentido ontológico e
fenomenológico existencial. Que fosse implicativa, fenomenológico existencialmente
empírica, dialógica; empática, numa palavra...
Carl Rogers queria dizer, apenas, com o seu conceito de pessoa, que na sua
abordagem privilegiava a relação com a pessoa considerada na perpspectiva do
empirismo de uma relação com ela, a relação com a pessoa fenomenológico existencial
empírica, dialógica, compreensiva e implicativa, a pessoa na empatia da relação
ontológica, dialógica, e fenomenológico existencial, compreensiva e implicativa.
Apenas isso.
Em nenhum momento Carl Rogers se propôs a fazer uma ontologia da pessoa.
Mas busca em essência definir e cultivar uma relação ontológica com a pessoa
empírica. Fenomenológico existencial empírica. Dialógica, compreensiva e implicativa.
E isso era monumental, no âmbito dos conflitos culturais, éticos, ontológicos e
epistemológicos daquele momento e lugar precisos. Carl Rogers só precisava disso, o
conceito da relação com a pessoa em sua empiria compreensiva e implicativa,
dialógica, empática.
Críticas às formulações de Carl Rogers? Claro que sim. Sempre, como a todos.
Desenvolvimentos de sua concepção da pessoa e da metodologia de sua relação com
ela... Claro que sim!
Mas criticá-lo sob o ponto de vista de uma ontologia da pessoa não faz sentido.
Carl Rogers não se preocupou em elaborar uma ontologia da pessoa. Sua concepção
de pessoa é metodológica. E sua consideração pela pessoa é consideração pela pessoa
ontologicamente empírica, e evidentemente empírica.
Criticá-lo por algo que ele não fez não faz sentido.
Sua preocupação era preconizar uma relação implicativa e compreensiva com a
pessoa, como a sua presença e alteridade, em sua empiria fenomenológico existencial,
e dialógica, compreensiva e implicativa. Para tanto, ele não precisava de uma teorética
ontológica da pessoa. Seu interesse era o de privilegiar a dialógica ontológica,
empática, da relação com a pessoa fenomenológico existencialmente empírica.
O plano da relação ontológica com o outro, anterior aos princípios de uma
Ontologia...
Neste plano da vivência, ele certamente diria, com Pessoa: o ter consciência
não me obriga a ter teorias... Só me obriga a ser consciente...
As conquistas ontológicas, epistemológicas, conceituais e metodológicas de Carl
Rogers, neste sentido, são clássicas. Na história da Psicologia, e na história da cultura
da civilização ocidental. O que quer dizer, foram, em sua essência, importantes quando
foram concebidas, e vão ser sempre. Não considerar isso adequadamente é não
contextualizá-lo, e não compreendê-lo.
Carl Rogers é, naturalmente, criticável. Como todo mundo. Claro. E ele próprio
tinha aguda consciência disso. Mas ele tem outras dimensões para serem criticadas.
Sua concepção operacional e metodológica da pessoa, e da relação com a pessoa, é
genial. Revolucionou a Psicologia e a Psicoterapia. Revolucionou as Ciências Humanas.
Revolucionou a Ciência, no sentido de uma Ontologia, de uma Epistemologia, e de
uma metodológica fenomenológico existenciais e dialógicas, compreensivas e
implicativas.
4. ABORDAGEM ROGERIANA.
DE ONTOLOGIA, ÉTICA, EPISTEMOLOGIA, E MÉTODO

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

As questões correlatas de ontologia, de ética, de epistemologia e de método são a


questão central de concepção e método da abordagem rogeriana.
Isto porque, seguindo uma ontologia, uma ética, uma epistemologia e uma
metodologia fenomenológico existenciais, a abordagem rogeriana assume uma aguda ruptura
paradigmática. Com relação, em particular, à Ciência Explicativa hegemônica, com relação ao
Pragmatismo, com relação ao Objetivismo, com relação ao Realismo, com relação ao princípio
de realidade, e ao positivismo do real; e com relação ao Idealismo. Em decidido privilégio ético
e metodológico de uma Ontologia, de uma Epistemologia e Ciência compreensivas, dialógicas,
e implicativas. De uma ética do inutilmente poiético e estético. De uma metodologia,
empática, radicalmente empiristas, não no sentido objetivista do empirismo objetivista, mas
no sentido da radicalidade do empirismo fenomenológico existencial e dialógico,
compreensivo, implicativo, gestaltificativo. O modo de sermos da ação, da atualização, como o
cognitivo devir do desdobramento de possibilidades.
Rogers entendeu de um modo particular, e foi parte do movimento que entendeu que
a ação, a atualização, é a característica central da existência. Que a cria e recria, que a solve e
resolve, em seu acontecer. E que a metodologia, a ontologia, a ética e a epistemologia da
atualização são, própria e especificamente, fenomenológicas e existenciais. Dialógicas.
Compreensivas, implicativas, gestaltificativas.
O que significa que uma ontologia é fenomenológico existencial?
Significa a compreensão de que, ontologicamente, no que essencialmente nos
constitui como seres humanos, somos ora acontecer, ora acontecido. E que, no modo de
sermos do acontecer, somos, basicamente, ação, atualização. Uma tendência atualizante, se
quisermos. Mas o devir fenomenológico existencial do desdobramento cognitivo de forças, as
possibilidades, que se dão compreensiva e implicativamente, gestaltificativamente, no modo
de sermos da consciência pré-reflexiva, pré-teorética, e pré-comportamental.
A ação, a atualização, a tendência atualizante são eminentemente fenomenológicas.
Meio perplexo e atabalhoado, mas de modo extremamente importante, e significativo,
Rogers já chamava a atenção para isso. Ou seja, a ação, a atualização, a tendência atualizante,
se dão como vivência. Fenomenológico existencial.
A ação, a atualização, a tendência atualizante, não se dão representativamente, como
consciência representativa. Não se dão explicativamente, como consciência explicativa,
teorética. Não são conceituais, mas consciência pré-conceitual. E pré-comportamental -- não
se dão comportamentalmente.
Dão-se, antes, como consciência pré-reflexiva, fenomenológico existencial e dialógica;
compreensiva e implicativa, gestaltificativa.
A ação, a atualização, a tendência atualizante, dão-se como vivência imediata de
forças, possibilidades, em desdobramento. Que surgem, vivencialmente, do íntimo do que
entendemos como ser, de um modo múltiplo e multiplamente contínuo, e se desdobram,
cognitiva e muscularmente, como devir, como o vir a ser da ação.
Em seu desdobramento, as possibilidades, necessariamente, e de um modo intrínseco,
se constituem, assim, como consciência pré-reflexiva, como consciência fenomenológico
existencial. De modo que, fenomenológico existencial e dialógica, compreensiva e implicativa,
gestaltificativa, a ação é eminentemente cognitiva, eminentemente epistemológica,
especificamente. Ainda que da ordem da epistemologia dialógica, fenomenológico existencial
empírica.
Uma epistemologia de raiz fenomenológico existencial e dialógica. O que quer dizer,
compreensiva e implicativa, gestaltificativa. E não explicativa. Quer seja o explicativamente
teorético, ou o explicativamente comportamental.
O percurso vivencial, vivenciativo, do desdobramento de possibilidades transita como
devir compreensivo, compreensivamente cognitivo, como ação, atualização, formação da
vivência, e formativo de coisas, desde níveis pré-compreensivos, até se exaurir como coisa. E
assim, múltipla e continuamente.
A ação é compreensiva e implicativa, gestaltificativa, portanto; o que quer dizer,
fenomenológico existencial e dialógica. Não é explicativa, não é teorética, nem
comportamental.
O ethos, a ética da ação, da atualização, da operação da tendência atualizante, é,
assim, na momentaneidade instantânea de seu acontecer, vivência fenomenológico
existencial, compreensiva e implicativa, gestaltificativa.
De modo que, ao privilegiar o modo de sermos da ação, da atualização, da operação da
tendência atualizante, a abordagem rogeriana faz uma decidida escolha pelo ethos, pela ética
fenomenomenológico existencial e dialógica, compreensiva e implicativa, gestaltificativa. Ética
do pathos, da sensibilidade emocionada, empathos, empatia, pathética.
O pathos, a empatia, a vivência fenomenológico existencial, compreensiva e
implicativa, gestaltificativa, é própria e especificamente, dialógica. Ou seja, da ordem do
acontecer – e não do acontecido –, a vivência empática, fenomenológica, é o modo de sermos
do ator, modo de sermos da ação, do acontecer. E não o acontecido modo de sermos do
sujeito e do objeto.
Eminentemente distinta, anterior, à condição acontecida do sujeito e do objeto -- e de
sua explicativa dicotomização --, a vivência fenomenológica, a vivência empática, é vivência de
sentido – logos, onto logos, fenomeno logos, dia logos.
Especificamente dialógica, a vivência fenomenológico existencial, a vivência empática,
compreensiva, implicativa, gestaltificativa, é uma vivência de compartilhamento (dia) do
sentido (logos). É uma vivência dialógica.
Compartilhamento do sentido, dia logos, vivência empática, que pode se dar, segundo
a antropologia buberiana, na esfera da relação com a natureza não humana, na esfera do
humano, do inter humano; e na esfera da relação com o sagrado.
O caráter empático da abordagem rogeriana significa que ela adota a ética e a
metodologia do pathos, da vivência fenomenativa. Adotando como metodologia, como
epistemologia, como ontologia, a fenomenológica da ação, da atualização, da tendência
atualizante. Ontologia, ética, epistemologia e metodologia, fenomenológico existenciais e
dialógicas, compreensivas e implicativas, gestaltificativas. Que permitem, e potencializam a
ação, a atualização, a operação da tendência atualizante.
Rogers se caracterizou por uma clara e decidida compreensão da importância do poder
existencial da ação, do poder fenomenológico existencial da atualização, da tendência
atualizante. Compreendeu que a ação é a própria existência, o próprio acontecer da existência.
Que, múltipla e continuamente, supera o acontecido da existência, criando-o e recriando-o
continuamente, em sua poiese. Criando-nos é recriando a nós próprios, e ao mundo que
solidariamente nos diz respeito.
5. PSICOLOGIA AMBIENTAL. FENOMENOLÓGICO
EXISTENCIAL. ABORDAGEM ROGERIANA.
ABORDAGEM GESTÁLTICA.

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

A Abordagem Rogeriana e a Psicologia da Gestalt que deriva da Gestal’terapia de

Perls são duas das mais conhecidas e efetivas abordagens contemporâneas de psicologia

fenomenológico existencial. De ampla aplicação, no âmbito da chamada clínica

psicológica, dos trabalhos com grupos, dos trabalhos na escola, na empresa, no âmbito

dos trabalhos de ação social, e na chamada psicologia jurídica, dentre outras áreas,

essas abordagens não foram pensadas, entretanto, conceituadas e exercidas, ainda, com

relação a sua pertinência e produtividade no âmbito da Psicologia Ambiental

especificamente fenomenológica e existencial.

A lacuna é muito significativa enquanto tal. Em particular porque é a ruptura

paradigmática que estas abordagens constituem, com relação a paradigmas objetivistas, e

a paradigmas idealistas -- em direção a uma ontologia fenomenológica e existencial -- ,

que permite, não só uma interpretação do ambiente em sua ontologia, no âmbito de seu

sentido ontológico, mas a perspectiva de uma avaliação ontológica, e especificamente

estética do ambiente. Ou seja, é esta ruptura paradigmática que permite e potencializa

uma apreensão, uma apreensão compreensiva, a compreensão, e uma interpretação e

avaliação, especificamente compreensivas, estéticas e ontológicas do ambiente.


A psicologia fenomenológico existencial, portanto, a Abordagem Gestáltica, e a

Abordagem Rogeriana, permitem e potencializam assim importantes abordagens de

psicologia ambiental, assim como importantes subsídios para a militância ambientalista,

para a educação e produção cultural ambientalistas, e para ciência ambiental; na medida,

em particular, que contribuem diferenciadamente na constituição de uma ética ambiental

especificamente fenomenológica, e existencial, estética, e em consonância com uma

ontologia fenomenológica e existencial e estética do ambiente. Para além dos paradigmas

idealista, e dos paradigmas objetivistas e coisificantes do ambiente, e da psicologia

ambiental.

PSICOLOGIA AMBIENTAL FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAL

O AMBI-ENTE.

Em outro local (v. FONSECA, Afonso H L O Ambiente somos nós.) tratamos da

integridade, da integração, que somos nós, enquanto Ambiente, ao modo de sermos de

nossa dialógica fenomenológico existencial, e ontológica. No âmbito de nossa

hermenêutica existencial.

No âmbito de nossa vivência ontológica, fenomenológico existencial, e estética, o

ambiente é sempre a radicalidade alteritária de um tu.

E, igualmente, em nossa condição e modo ontológicos de sermos -- ou seja, ao

modo ontológico, compreensivo, fenomenológico e existencial, dialógico, e ativo, de

sermos --, estamos, necessariamente, implicados com o ambiente. Na intensionalidade

própria e específica deste modo de sermos. Estamos, necessária e inextrincavelmente,

implicados com esta radicalidade alteritária de um ambiente como tu, em sua ontologia

(no seu sentido de devir), na dinâmica de seu devir outro, anteriormente à experiência

da dicotomização sujeito-objeto.
Ou seja, ao modo fenomenológico e existencial de sermos, ao modo dialógico de

sermos, modo hermenêutico de sermos, ativo, atualização, ao modo empático de sermos,

somos, necessariamente, com o ambiente; integridade e integração, na dialógica inter

ativa da momentaneidade da relação eu-tu. Na verdade, somos, nesses momentos

dialógicos, um ser devir outro, que articula e integra o que entendemos como nós

mesmos e o que entendemos como ambiente num campo dialógico de ação, de

atualização.

De modo que, desta perspectiva, podemos compreender, e dizer, que o ambiente

somos nós.

E é, apenas, na vivência deste modo ontológico de sermos que o ambiente pode

se dar -- que nos podemos dar --, em nossa ontológica, dialógica.

É apenas na vivência desse modo ontológico de sermos, e conhecer, que

podemos nos dar em nossa dialógica ontológica: inextrincavelmente implicados com o

ambiente, enquanto radicalidade alteritária e ativa de um tu. Num modo de sermos que

não é da ordem da objetividade, que não é da ordem da realidade – porque, própria e

especificamente, é da ordem da possibilidade, e do seu desdobramento em ação,

atualização --, modo de sermos que não é da ordem da dicotomização sujeito-objeto,

que não é da ordem das relações de causa e efeito, que não é da ordem do útil e da

utilidade, que não é da ordem do prático, que não é pragmático. Que é antes da ordem

ontológica de sermos, devirmos, à ventura da inutilidade desproposital produtiva –

estética, e poiética.

Ou seja: em seu modo e condição ontológicos de ser, em nosso modo e

condição ontológicos de sermos, e conhecer, somos uma integridade e uma integração

dialógica, uma implicação dialógica, interativa: somos o ambiente intensional, o ambiente

enquanto compreensão, e enquanto ação, em seu acontecer. Somos integridade e

integração, que se rompe e se dicotomiza no que, como sujeitos, entendemos como o

ambiente enquanto objetividade, nos modos não ontológicos de sermos. O ecossistema,

como tal entendido. Ou seja: o ambiente como objeto, o ambiente como coisa, e como

acontecido, o ambiente como casa.


Aos modos de sermos, e conhecermos, da consciência que não é vivência

ontológica: ou seja: ao modo reflexivo de sermos, ao modo conceitual e teorético de

sermos; ou ao modo de sermos de nossa desconcienciação comportamental, -- modos

eu-isso de sermos --, o ambiente é um isso. É um objeto, circunscrito em seu caráter de

objeto. Circunswcrito em seu caráter de conhecimento representacional, reflexivo,

conceitual. Na manipulatividade e utilidade inscritos na condição de sua instalação como

realidade, como acontecido, como realidade já atualizada, e como coisa.

O AMBIENTE COMO PRESENÇA E ATUALIDADE

No modo de sermos da vivência ontológica, fenomenológica e existencial -- que

é, portanto, da ordem da compreensão, que é da ordem implicação (e não da ordem da

explicação), que é da ordem da dialógica, e da empatia, eu-tu --, o ambiente é,

eminente e especificamente, presença.

Enquanto presença é, como tal, ação; é atualização: atualidade.

A pres-ença é este modo ontológico pré-ente, pré-coisa, pré-real de sermos:

este modo de sermos ontológico, fenomenológico e existencial, dialógico, compreensivo,

ativo, de sermos de que falamos. No que nos é mais originário, somos presentes,

implicativos; não somos da ordem da realidade, da ordem da coisidade, do acontecido,

da ordem da explicação. Somos da ordem da presença, do modo de sermos que é da

ordem da possibilidade e do seu desdobramento em ação, atualização; somos da ordem

da implicação, e do acontecer. O modo ontológico de sermos é o modo de sermos da

pres-ença. O modo pré-coisa de sermos, presente, é, assim, o modo de sermos no qual,

onto-lógicamente, vivemos possibilidades, e atualização; possibilidades e o seu

desdobramento, no que entendemos como ação, atualização. Não é da ordem da

realidade, não é da ordem do acontecido, do factual, não é da ordem da coisidade.

Presença é atualidade, é atualização, é ação.


Ainda que, passada a pontualidade de seu momento próprio, a vivência, a

presença, se constitua inexoravelmente em coisidade, em realidade, em fato, em

acontecido, eu-isso, ente, ent-idade.

Só como presença se dá o ambiente em sua/nossa ontológica .

O ambiente em sua efetividade e atualidade ontológicas só se dá como pres-ente,

como pres-ença; e, naturalmente, como atualidade: como a atualidade que é intrínseca à

presença, como atualização, como vivência de ação.

Assim, nesse modo ontológico de sermos, e de devir; neste modo de ser devir o

ambiente, o ambiente não é objeto, não é um isso. Não é acontecido, mas é a própria

vivência dialógica do acontecer. É presente, e atual. É a vivência paulatina da

performação, performance, da ação, atualização, inter ação (ainda que não

exclusivamente inter humana). É a dialógica da relação de um eu implicativo com a

radicalidade alteritária de um tu. Na dialógica de momentaneidade da relação eu-tu.

A AMBIGUIDADE DIALÓGICA E FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAL DO AMBIENTE.

O termo Ambi-ente remete a ele como um ente própria e eminentemente ambí-

guo.

É ambíguo, o ambi-ente, tanto do ponto de vista dialógico; como do ponto de

vista fenomenológico e existencial.

Do ponto de vista dialógico, o ambi-ente é ambíguo porque o ambiente pode,

alternativamente, ser:

(1) O Ambiente como eu-tu. Ontológico, compreensivo, presença, e


atualidade. Acontecer. Neste caso, própria e especificamente dialógico.
E,

(2) O Ambiente como eu-isso. O ambiente como objeto, como coisa,


como realidade, como acontecido.
Por outro lado, no modo especificamente ontológico, dialógico, de sermos ( eu-tu),

o ambi-ente oscila alternantemente na vivência da ambiguidade da movimentação

interativa entre o eu, e a radicalidade alteritária de um tu.

No modo ontológico, eu-tu, de sermos, portanto, o ambi-ente oscila ambi-

guamente, na vivência da ambígua movimentação de uma lógica dial, dialógica: ambígua

dinâmica de movimentação da momentânea implicação interativa, recíprocamente

remetente, entre um eu, e a alteridade radical de um tu. Logos.

De modo que, em termos de dialógica, o ambiente é de ambi-ente chamado

porque é, caracteristica, própria e especificamente, ambí-guo. Ambíguo entre um poder

ser dialógico, e um poder ser não dialógico. Em seu modo dialógico, ontológico, de ser,

o ambiente é, ainda, ambíguo ao ser, em sua vivência, alternância dialógica da

implicação interativa entre um eu e um tu. A movimentação vivencial implicativa

intensional entre eu-tu. No âmbito do campo dialógico inter ativo que o modo eu-tu de

sermos constitui.

Já em termos de uma perspectiva fenomenológica e existencial, mais

especificamente, a ambiguidade do ambi-ente se constitui na alternância dele enquanto

ambiente no modo ôntico de sermos do ser ambiental; e o ambiente em seu modo

ontológico de sermos.

De um lado, ao modo ôntico de sermos: o ambiente vivido no seu modo de

possibilidade exaurida, de objeto, de realidade, coisa. E, do outro, o ambiente ao modo

ontológico de sermos, o ambiente como vivência ontológica de possibilidade e de

possibilitação, como presença, e ação, atualidade, sentido, e desdobramento de sentido.

Assim, o ambiente pode se dar ônticamente, como coisa; e pode,

alternativamente, se dar, ontologicamente, fenomenológico e existencialmente, como

vivência de possibilidade, e do desdobramento desta: como ação, como interpretação


compreensiva fenomenológico existencial, como hermenêutica, como presença e

atualidade.

Neste modo ontológico, o ambiente se constitui, estesicamente, como vivência

sensível, e não abstrativa, de corpo e sentidos. No âmbito de uma estética ambiental; e

como hermenêutica ambiental fenomenológico existencial.

Da mesma forma que alternamos, então -- entre um modo ôntico, e um modo

ontológico de sermos --, assim alterna, também, o ambiente em seus modos de ser. Daí

algo de sua ambigüidade, de sua ambientidade.

Ao modo ontológico, eu-tu, de sermos, duramos na intensionalidade da vivência

ambiental de possibilidade que se desdobra em atualização, ação. E o ambiente se dá

numa dualidade eu-tu, que é anterior à dicotomização entre nós mesmos como sujeitos,

e o ambiente como objeto.

Como vimos, na momentaneidade da vivência, em nosso modo ontológico de

sermos, o ambiente possui a potência da radicalidade alteritária de um tu, no

desdobramento da dialógica eu-tu. Mas, neste caso, e justamente por isto, o ambiente,

própria e especificamente, não é um objeto. Mas o devir de uma totalidade inter ativa

que nos envolve e implica na dinâmica dialógica de sua integridade, na dinâmica

implicativa de sua integração. De modo que, sem desconhecer a radicalidade de sua

alteridade como tu, podemos dizer que o ambiente somos nós.

ESTÉTICA AMBIENTAL.

A CIÊNCIA E A ÉTICA AMBIENTAIS SÃO ESTÉTICAS.

Ao modo ontológico de sermos, ao modo ontológico de ser o ambiente --

fenomenológico e existencial, hermenêutico, dialógico, compreensivo, empático --, o

ambiente é, somos, vivenciado(s) como estesia. É este o modo eminentemente estésico,

estético, e poiético de sermos. Em seu modo ontológico de devir, o ambiente se dá

como, e no âmbito, de uma estética – de uma ciência estética?


Já que na ontologia de sua vivência é estésico, estético, a avaliação do ambiente

só se pode dar estéticamente, estésicamente. A avaliação do ambiente é intrínseca à

vivência de sua estesia. A vivência ambiental é, em si, avaliativa.

A ciência e a consciência ambientais são eminentemente estéticas.

Da mesma forma que é estética a sua ética, a sua lógica, ação, e metodológica

de sua interpretação.

A vivência estética do ambiente deriva naturalmente da insistência na, e da

atualização da estesia, da sensibilidade não abstrativa. Deriva da qualidade de que é o

modo não abstrato, não abstraído, não abstrativo, de sermos: o modo de sermos em que

somos vivência imediata de corpo, e de sentidos; sem o distanciamento abstrativo

teorético, ou comportamental. O corpo e os sentidos, enquanto vivência atualizativa, não

estão abstraídos. O modo estético de sermos/ de ser o ambiente é/devém como

sensibilidade atuante de vivência, de corpo, de sentidos.

O que define o estético, além de seu caráter pré-reflexivo, pré-conceitual, pré-

real, é o seu caráter de atualidade e de pres-ença. O estésico, o est-ético, são

atualidade – ação, atualização de possibilidade--, e presença.

O estético, o modo estético de sermos, é, assim, atualidade e presença. É o

modo de sermos da ação, da atualização. Porque é, todo ele, impregnado de

possibilidade e de ação; é animado pela força da possibilidade e de seu desdobramento,

no que entendemos como ação, atualização, inter-pret-ação (especificamente

compreensiva).

Ainda que não seja da ordem da realidade, da ordem da coisidade – já que é da

ordem da possibilidade, e de seu desdobramento --, o estético, como vivência, é o modo

de sermos que, em seu caráter de atualização, produz a realidade atualizada, constitui a

atualidade realizada, à medida que a possibilidade se desdobra, se atualiza, e se esvai

enquanto tal, na constituição da realidade: do acontecido.

Esta vivência do desdobramento estético de possibilidade, no que entendemos

como ação, em sua pulsatividade própria, no modo ontológico, estético, de sermos --


desdobramento que coisifica, que constitui os úteis e seus usos, que constitui a

realidade, em sua ação, atualização --, este desdobramento e atualização, é o que

entendemos como poiese.

A insistência neste modo de sermos da poiese, o privilégio deste modo de

sermos, é própria e especificamente uma ética: a poiética: a ética de anuência e do

consentimento na potência, na possibilidade, e no seu desdobramento, na atualização,

que são próprios ao modo ontológico de sermos, ao modo fenomenológico existencial de

sermos, modo, portanto, ontológico, dialógico, estético, poiético.

Pois bem, é nesse modo estético e poiético de sermos, assim, que o ambiente

própria e especificamente se dá, em seu caráter ontológico originário. Como atualidade, e

como presença; como ação, como atualização, como compreensão, como interpretação

compreensiva, como intrínseca avaliação.

O MODO ONTOLÓGICO E FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAL DE SERMOS É

PRÓPRIA E ESPECIFICAMENTE EMPÍRICO E EXPERIMENTAL.

A ESTÉTICA, A METODOLÓGICA E A HERMENEUTICA AMBIENTAIS

FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAIS SÃO FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAIS,

EXPERIMENTAIS E EMPÍRICAS.

O EMPÍRICO E O EXPERIMENTAL EM PSICOLOGIA AMBIENTAL

FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAL.

É importante a compreensão ampla da essência, e das implicações de que o

modo de sermos fenomenológico existencial, e dialógico, é um modo de sermos eminente

e especificamente empírico e experimental.


É fenomenológico existencial, e dialógicamente, empírico na medida em que é

implicação no modo de sermos da intensionalidade da vivência de possibilidades

própria e inerente ao modo ontológico, fenomenológico existencial, de sermos .

Ou seja, o modo de sermos ontológico é fenomenológico existencial, e

dialógicamente, empírico na medida em que se constitui como vivencia de implicação no

modo tensional de sermos; modo intensional de vivência da tensão do possível, da

possibilidade, e do seu desdobramento em ação, na perforrmática da ação.

O modo vivencial, fenomenológico e existencial de sermos, em sua empiria, é

vivência não abstrativa de implicação com a possibilidade, e com os seus

desdobramentos. É, imediatamente, vivência implicativa e intensional de corpo e de

sentidos na vivência de ser no mundo.

Distinto, portanto, do modo de sermos da realidade. Modo de sermos este em

que a força da possibilidade se realizou, já, e se constitui em coisa, se coisificou, se

constituiu em fato. Criou, inclusive, a possibilidade da fatalidade.

O teorético se constitui como uma saída da condição empírica e implicativa deste

modo fenomenológico existencial dialógico, e empírico, de ser no mundo.

Empírico, portanto, quer dizer a vivência não teorizante.

Da mesma forma que empírico quer dizer não comportamental.

Na medida em que o comportamental (com porto) é o modo de sermos da

atividade padronizada e repetitiva. No qual se reduzem a vivência, e a própria

consciência.

Neste sentido, o processo da ação, como nos mostrou Hannah Arendt, é diferente

do comportamento. Sendo a ação característica do modo fenomenológico existencial,

dialógico, e empírico, de sermos, per-form-ático. Enquanto que o comportamento, em seu

modo próprio de ser, é assim distinto do modo de sermos da ação.

Posterior, e secundariamente, à efemeridade momentânea deste modo intensional

de sermos, o momentum da força de sua pulsatividade se esvai.


E, da vivência e desdobramento da possibilidade, na ação, passamos aos, e nos

constituímos nos modos não tensionais de sermos: os modos de sermos teorético, e do

comportamento: modos pragmáticos, e não empíricos (no sentido fenomenológico), de

sermos. Caracteristicamente diferentes do modo tensional, intensional -- modos

pragmáticos que não se caracterizam pela tensão da pressão (ex-pressão) da força

pulsativa de possibilitação que constitui o modo vivencial de sermos; modos de sermos,

teorético, e comportamental, que não se caracterizam pelo caráter desproposital, e pelo

caráter de inutilidade produtiva, e disfuncional, do modo ontológico fenomenológico

existencial, dialógico, e empírico de sermos.

Empírico, portanto, quer dizer dentro do perigo. Dentro do perigo e da fruição, do

desfrute da ação, da atualização.

O modo vivencial, fenomenológico existencial, intensional, de sermos é

fundamentalmente este modo de sermos de atualização do possível na vivência e

produção de efeitos da ação. Neste modo de sermos lidamos com a potência

característica do possível como uma alteridade radical, que atualizamos.

Buber diria, não sou eu que faço acontecer, mas não aconteceria sem mim...

Este modo de sermos demanda a atualização de uma disposição para corrermos

o risco da tentativa de, e tentarmos, atualizar a potência da possibilidade de uma

alteridade radical, na qual estamos implicados. Ariscarmos a incerteza de seus processos

de acontecer, e de seus efeitos. Que, em particular, incomodam ao cristalizado do

acontecido, à realidade realizada, acontecida, coisificada, e impotente.

A disposição tentativa, e o risco da vivência da intensionalidade da potência do

possível em sua constituição como ação é o sentido do verbo Grego perire. Que dá

origem ao termo empírico (emperire); da mesma forma que dá origem ao termo perigo, e

ainda, reveladoramente, ao termo e sentido de perito. Nunca é muito lembrar que a raiz

perire dá origem aos termo pirata, pirar, respirar, transpirar. Termos do mesmo gênero.

No mesmo sentido, o termo ex-peri-mental tem origem no verbo perire. Neste

sentido de desdobramento da ação, ou seja, de desdobramento do possível, como


potência de uma alteridade radical com a qual estamos inextrincavelmente implicados

vivencialmente enquanto ser no mundo.

O modo fenomenológico existencial e dialógico, estético, de sermos é, assim,

empírico e experimental.

Na medida em que configura o modo único no qual podemos vivenciar o

ambiente em sua ontologia, na medida em que se constitui como a ética e a

metodológica na qual o ambiente é possível, o modo fenomenológico existencial e

dialógico de sermos em sua empiria e experimentalidade é o modo no qual podemos

vivenciar o ambiente como ação, como presença, como atualidade, como vivência

fenomenal. O ambiente só se dá, e só é avaliável em nosso modo estético de sermos,

fenomenológico existencial e dialógico, própria e especificamente, estético, e

experimental.

O caráter fenomenológico existencial empírico e experimental da ética, estética, e

da metodológica da psicologia fenomenológico existencial é o modo próprio para a

vivência do ambiente em sua ontologia, para a sua avaliação, atualização, e elaboração.

PSICOLOGIA AMBIENTAL ROGERIANA.

Empatia e ética, estética, ambientativa.

Normalmente não se pensa a Abordagem Rogeriana de Psicologia e de

Psicoterapia como uma abordagem possível de Psicologia Ambiental. O que é de todo

um equívoco, e que produz prejuízos para a possibilidade da própria abordagem, e da

Psicologia Ambiental. Uma vez que, enquanto abordagem fenomenológico existencial e

dialógica, fenomenológico existencial hermenêutica, a Abordagem Rogeriana é, própria e

especificamente, igualmente, uma substancial Psicologia Ambiental.

O elemento essencial, e central, da ética e da Abordagem Rogeriana é o modo

de sermos da ação: da atualização --, própria e inerente à presença dialógica, à


empatia. O próprio modo ontológico de sermos, portanto, da presença dialógica e da

empatia, que se dá eminentemente estésico, e estético.

Este modo de sermos -- que é da ordem da compreensão, e da implicação, o

modo ontológico, eu-tu, compreensivo de sermos --, foi privilegiado por Rogers no

paradigma ético e metodológico da vivência de sua abordagem.

Na verdade, a própria potência, vontade de possibilidade, e ação, atualização --

que a vivência do modo ontológico de sermos faculta, ontologicamente próprias ao

humano --, foram privilegiadas por Rogers, como referencial intrínseco de avaliação, de

auto regulação, e de superação.

Carl Rogers compreendeu que uma tendência para a ação, uma tendência para a

atualização, tendência atualizante, nos anima, impulsiona, e orienta, básica e

ontologicamente, constituindo-se como o nosso referencial intrínseco de avaliação.

Este modo ontológico de sermos -- modo de sermos da ação, da atualização,

modo eu-tu de sermos, modo de sermos da compreensão, e da ação, da atualidade, e

da presença, modo de sermos que constitui a emoção -- é, própria e especificamente, o

modo empático de sermos, o modo de sermos da empatia, da compreensão empática,

ou da empática compreensiva.

A empatia é este modo ontológico, fenomenológico e existencial, dialógico, e

ativo, atualizante, de sermos. O modo de sermos que é continente para a emoção.

Podemos entender que empatia significa ‘dentro’ do pathos.

O pathos, neste sentido, é o pathos entendido em seu sentido Grego original, de

sensibilidade estética, e poiética. Sentido ainda continente para o caráter afetivo,

emocional, que acompanha este modo pathico de sermos. A ética do pathos, pathética,

é esta ética de anuência e da condescendência na momentaneidade estética, e poiética

deste modo pathico de sermos.

Por outro lado, na acepção Latina de pathos, acepção que prevalece entre nós, o

pathos denota predominantemente sofrimento e doença, e termina por se constituir nas


nossas concepções de patologia. Mas no sentido Grego originário pathos remete à

vivência sensível, ativa e emocionada.

É este o pathos, no sentido Grego, que está presente no sentido de em-patia:

dentro da vivência páthica.

O pathos, a empatia, é eminentemente dialógica.

Como dialógica, como ontológica, a empatia não se restringe ao âmbito das

relações interpessoais. O pathos, a empatia, igualmente, se dá no âmbito da relação

com a natureza não humana, no âmbito das relações ambientais, portanto; e no âmbito

da relação com o sagrado.

Desta forma, o modo de sermos da empatia se dá não apenas no âmbito --

dialógico, ontológico, fenomenológico, e existencial, ativo, atualizativo --, da relação inter

humana.

O que chamamos de empatia se refere substancialmente ao modo

fenomenológico existencial de sermos, ao modo ontológico de sermos, ao modo dialógico,

compreensivo, estético, e poiético, modo ativo, e atualizativo, de sermos; o modo de

sermos da presença, e da atualidade, e da atualização.

Que é, como vimos acima, o modo próprio no qual pode se dar a integridade, e

integração, da vivência ambiental; da vivência de nós próprios como ambientes. Como

vimos, o ambiente não se dá, em sua integridade e integr-ação, como coisa, como

objeto, como realidade, como acontecido, como um isso. Em sua integridade e

integração, o ambiente se dá como presença e atualidade, o ambiente se dá

empaticamente, como empatia. O ambiente carece de nossa própria interpretação, de

nossa própria ação, atualização... O ambiente só se dá como ação, como interpretação

compreensiva, como compreensão, estéticamente, poieticamente, dialogicamente,

empaticamente.

Na Abordagem Rogeriana, não obstante, este modo de sermos -- que é o modo

ontológico e ativo de sermos, o modo estético de sermos, o modo de sermos da ação


(da atualização), a presença dialógica, a compreensão, a empatia – é, indevidamente,

pensado normalmente como circunscrito à pessoa, e à relação interpessoal. Isto decorre,

evidentemente, do empirismo objetivista que ainda impregna certas mentes centradas, da

falta de informação, e da carência de uma cultura fenomenológica e existencial.

Própria e eminentemente fenomenológico existencial e dialógico esse modo de

sermos, a limitação restritiva da empatia à relação interpessoal, é de todo indevida. E se

dá, em particular, porque a empatia é pensada, ou não, a partir da perspectiva de um

empirismo objetivista; e não fenomenológico. O que induz a uma distorção, e a uma

perda deste seu caráter fundamental, a uma perda do caráter dialógico de que se

reveste o fenomenológico, e a empatia. Ou seja, a uma perda do caráter fenomenológico

e existencial, e dialógico, próprio e específico à ação -- à atualização --, à presença, e à

empatia. Caráter fenomenológico próprio ao modo ontológico e fenomenológico de

sermos.

Quando compreendemos o caráter específica e eminentemente fenomenológico e

existencial, dialógico -- intrínseco, e inalienável --, da presença, e da empatia, da ação,

da atualização, da atualidade, entendemos o quanto é imprópria e indevida, não só a

concepção delas como restritas à relação interpessoal imediata, como o concebê-las da

perspectiva de um empirismo objetivista. E não da perspectiva vivencial de um empirismo

fenomenológico, existencial, e dialógico.

O dialógico, como característica particular e definidora da empatia, o modo de

sermos eu-tu, na terminologia substancial de Martin Buber --, modo de sermos da ação

e da atualização, não se limita ao âmbito da relação interpessoal, no crucial – mas não

exclusivo -- âmbito da relação inter humana.

Própria e especificamente, o Dialógico (cf. Buber, M. Eu e Tu), o fenomenológico

e existencial, o modo empático de sermos, se dá, como vivência, como relação eu-tu,

como ação, atualização:

(1) no âmbito da relação com a natureza não humana;

(2) no âmbito da relação com o sagrado, e...


(3) no âmbito da relação inter humana.

No âmbito destas três esferas do modo de sermos da relação eu-tu o dialógico

se dá, fenomenológica e existencialmente, como presença, como atualização – como

ação, como empatia...

De forma que não é, de modo algum, simplesmente no âmbito da relação

interpessoal que se dá o dialógico, a presença, a atualização: a empatia.

A condição de que o dialógico, o fenomenológico e existencial, própria e

especificamente: a empatia, não se dá, apenas, no âmbito do interpessoal; a condição de

que o dialógico, a ação – atualização --, a presença, e a empatia, enquanto modo de

sermos, não se dá apenas no âmbito da dialógica do inter humano; mas similarmente se

dá, nos âmbitos da dialógica da relação com a natureza não humana, e da relação com

o sagrado, abre e constitui, não só, a possibilidade da ética e da metodológica de uma

psicologia ambiental fenomenológico existencial, como a possibilidade da ética e da

metodológica da psicologia ambiental gestáltica; assim como a possibilidade da ética e

da metodológica de uma psicologia ambiental rogeriana, compreensiva, e empática –

dialógica, e fenomenológico existencial. Constituindo assim a possibilidade da contribuição

diferenciada do paradigma da psicologia fenomenológico existencial, do paradigma da

Abordagem Gestaltáltica, e do paradigma da Abordagem Rogeriana para a Psicologia

Ambiental.

Isto porque a questão fundamental da ética e da metodológica da Psicologia

Ambiental, a questão fundamental da Psicologia ambiental fenomenológico existencial,

dialógica, é a questão da vivência ontológica, fenomenológico existencial, dialógica,

empática, ativa, ato-ativa, atualizante, do ambiente vivência ontológica. A vivência

dialógica do ambiente como presença. Ou seja, a vivência do ambiente ao modo de

sermos que é próprio à ética, à estética, e à metodológica da psicologia e da

psicoterapia fenomenológico existencial, rogeriana, gestáltica. A ética, estética, e

metodológica empáticas.
PSICOLOGIA AMBIENTAL GESTÁLTICA,

NA TRADIÇÃO DA GESTAL’TERAPIA.

Como sempre, ainda que tenha a sua particularidade, naturalmente, em termos

essenciais, a perspectiva ética, conceitual e metodológica da Psicologia Ambiental

Gestáltica não é muito diferente da perspectiva da Psicologia Ambiental Rogeriana.

Variando, naturalmente, em estilos, e panelas, e em aspectos menores, tais como o das

respectivas teorias clássicas. As teorias clássicas dessas abordagens configuram, na

verdade, os seus aspectos mais frágeis e transitórios, na medida em que, meramente

experimentais, num momento de precária de sedimentação e apreensão teórica de seus

fundamentos, tendem a ser intensamente criadas, e recriadas, hermeneuticamente, pela

vivencia mais consensual de sua metodológica, de sua ética, estética.

Como a Abordagem Rogeriana, a Abordagem Gestáltica (na tradição da

Gestal’terapia de Perls) é uma estética: uma ética da vivência da estesia; uma ética do

vivivencial, uma ética, uma estética, portanto, da ação, do devir... De modo que o seu

interesse ético, estético e metodológico, fundamental se liga ao privilegiamento do modo

fenomenológico existencial estético de sermos, op modo de sermos do devir e da ação

(Que, tradicionalmente, em Gestalt Terapia, se chamou de Contato).

A partir daí temos toda a consideração fenomenológica e existencial por este

modo ontológico de sermos, e do qual tratamos acima.

De fato, se podemos singularizar uma ênfase de estilo mais peculiar à Abordagem

Gestáltica é a sua característica ênfase em uma disposição experimental fenomenológico

existencial, e expressionista. É de Perls a frase luminosa de que qualquer problema

humano só se resolve experimentalmente. De modo que uma explícita e enfática

disposição fenomenológico existencial empírica e experimental sempre foi característica da

metodológica de Perls.
Perls tinha um contato mais íntimo, no seu nascedouro, com esta disposição

experimental fenomenológico existencial e empírica. Não é teoricamente que Perls

aprende esta arte empírica e experimental – a arte da experimentação fenomenológico

existencial empírica. É, sobretudo, no teatro expressionista experimental, é com o

Expressionismo, e com o desdobramento em sua própria existência da compreensão do

íntimo vínculo entre humanidade, a qualidade de ser/devir humano, e esta disposição

experimental fenomenológico existencial, dialógica.

A disposição experimental do Expressionismo fortemente derivava da valorização

da vivência compreensiva-expressão, de Dilthey, e do perspectivismo experimental de

Nietzsche. As considerações pelos processos de constituição da forma, da formação, da

performance, que a Psicologia da Gestalt dava forma, em sua versão psicológica, foram

profundamente apreendidas por Perls.

Mais que isto, o caráter propulsivo da existência [ex-(in)is(sis)tência], a partir de

sua condição específica de possibilidade, de potência, de possível, de poiese e de

poiética -- ou seja, o seu caráter de projeto de projetação; o seu caráter de perspectiva,

perspectivação, perplexidade; o seu caráter de disegno (na formulação do

Renascimento); o seu caráter de Gestalt (na acepção de devir já de Goethe); o seu

caráter de performance, e de expressão, do Expressionismo; o seu caráter de Outlook

(outsight?); foram perfeitamente entendidos por Perls. Não de um modo teórico, mas a

partir de sua vivência do Expressionismo, da Teatralização Expressionista.

E, neste sentido, a disposição experimental aparece de um modo muito mais

forte, e mais nítido, na atitude experimental da metodológica estética de Perls. Pelo

menos com relação aos momentos iniciais da abordagem de Carl Rogers.

Centrada na ação, na atualização, e em suas condições, naturalmente que a

ética, e a metodológica, de Carl Rogers eram, evidentemente, empíricas, e experimentais,

no sentido fenomenológico existencial; o que foi ficando mais evidente nos momentos

mais avançados de sua obra, em particular no concernente aos trabalhos com grupos, e

no modo como os trabalhos com grupo, em sua radical experimentalidade fenomenológico

existencial, recriam toda a abordagem, inclusive a chamada terapia individual.


Mas Perls é muito mais ostensivo, essencial, dramático, e explícito, com relação

ao privilegiamento deste aspecto fenomenológico existencial experimental da existência, e

de sua metodológica, e estética. O que, efetivamente, caracteriza um momento muito

particular, e importante, desta metodológica, e desta estética. Podemos dizewr que o

Perls da Gestal’terapia já nasce estético, e fenomenológico existencial empírico e

experimental.

Assim, a estética, e a metodológica da ação, de Perls -- fenomenológico

existenciais empíricas -- têm, uma importância particular para a psicologia ambiental,

para a psicologia ambiental fenomenológico existencial.

Esta particularidade, e esta importância, derivam eminente e especificamente do

dado de que, como vimos, em sua ontológica, o ambiente é, e só se dá, de forma

fenomenológico existencial e dialogicamente empírica e experimental. O ambiente é

especificamente fenomenológico, e existencial: o ambiente só se dá ao modo de sermos

da presença, como atualidade, como ação e atualização. O ambiente só se dá de um

modo fenomenológico existencial hermenêutico: O ambiente só se dá como interpretação

fenomenológico existencial. O ambiente só se dá de um modo fenomenológico existencial

experimental e empírico. O ambiente só se dá como criação, e intrínseca estética, já

como avaliação.

E são justamente essas características da existência-e-do-ambiente que Perls

enfatiza na estética de sua metodológica. Perls dedicou-se meticulosamente ao

desenvolvimento de uma metodologia estética e experimental, per-form-ativa. De modo

que, ainda que interessado na chamada psicoterapia, Perls desenvolveu de um modo

ousado a metodológica de uma estética, que é única em termos de experimentação

fenomenológico existencial.

E que é efetivamente única em nossas relações ambientais, e nas relações,

avaliações e metodológicas de uma psicologia ambiental fenomenológico existencial

dialógica, expressiva.
Perls ajudou-nos a aprender que, literalmente, só existimos quando criamos. E

que o fundamento desta criação é o modo de sermos – vivencial, fenomenológico

existencial e dialógico – do possível, da potência, da possibilidade, do poiético, que se

bosqueja e esboça em pro-jeto, projetação, em disegno (existencial), em perspectiva, em

Gestalt, em ação – ou seja, empírico, e experimental.

O ambiente, em seu caráter ontológico -- enquanto presença, e enquanto

atualidade, só existe na medida em que, pela vivência, e pelo desdobramento da vivência

do possível, ousamos criá-lo e avaliá-lo no seu (nosso) modo fenomenológico existencial,

empírica e experimentalmente. Na medida em que ousamos interpretá-lo fenomenológico

existencialmente. Da mesma forma que esta interpretação e criação experimentais já são

em si avaliativas. Nos outros modos de sermos -- em nossos modos teorético e

comportamental --, o ambiente se dá como possibilidade exaurida, possibilidade

realizada, como coisa, como acontecido.

A ética da Gestal’terapia, e a sua metodológica da atualização, definem o cerne

da ética, estética, e de uma metodológica da Psicologia Ambiental Fenomenológico

Existencial.

Assim, do momento em que entendemos o ambiente em sua ontológica de

presença, e de atualidade, compreendemos a importância e o interesse da ética e da

metodológica das psicologias e psicoterapias fenomenológico existenciais – tratamos aqui

da Gestal’terapia e da Abordagem Rogeriana na constituição, no exercício e

desenvolvimento de uma Psicologia Ambiental Fenomenológico Existencial.

Bibliografia

Buber, Martin Eu e Tu.

Heidegger, Martin Ser y Tiempo.


Perls, Fritz. Gestalt Therapy. Excitt and Growth in Human Personality.
6. ABORDAGEM ROGERIANA.
DE ONTOLOGIA, ÉTICA, EPISTEMOLOGIA, E MÉTODO

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

As questões correlatas de ontologia, de ética, de epistemologia e de método são a


questão central de concepção e método da abordagem rogeriana.
Isto porque, seguindo uma ontologia, uma ética, uma epistemologia e uma
metodologia fenomenológico existenciais, a abordagem rogeriana assume uma aguda ruptura
paradigmática. Com relação, em particular, à Ciência Explicativa hegemônica, com relação ao
Pragmatismo, com relação ao Objetivismo, com relação ao Realismo, com relação ao princípio
de realidade, e ao positivismo do real; e com relação ao Idealismo. Em decidido privilégio ético
e metodológico de uma Ontologia, de uma Epistemologia e Ciência compreensivas, dialógicas,
e implicativas. De uma ética do inutilmente poiético e estético. De uma metodologia,
empática, radicalmente empiristas, não no sentido objetivista do empirismo objetivista, mas
no sentido da radicalidade do empirismo fenomenológico existencial e dialógico,
compreensivo, implicativo, gestaltificativo. O modo de sermos da ação, da atualização, como o
cognitivo devir do desdobramento de possibilidades.
Rogers entendeu de um modo particular, e foi parte do movimento que entendeu que
a ação, a atualização, é a característica central da existência. Que a cria e recria, que a solve e
resolve, em seu acontecer. E que a metodologia, a ontologia, a ética e a epistemologia da
atualização são, própria e especificamente, fenomenológicas e existenciais. Dialógicas.
Compreensivas, implicativas, gestaltificativas.
O que significa que uma ontologia é fenomenológico existencial?
Significa a compreensão de que, ontologicamente, no que essencialmente nos
constitui como seres humanos, somos ora acontecer, ora acontecido. E que, no modo de
sermos do acontecer, somos, basicamente, ação, atualização. Uma tendência atualizante, se
quisermos. Mas o devir fenomenológico existencial do desdobramento cognitivo de forças, as
possibilidades, que se dão compreensiva e implicativamente, gestaltificativamente, no modo
de sermos da consciência pré-reflexiva, pré-teorética, e pré-comportamental.
A ação, a atualização, a tendência atualizante são eminentemente fenomenológicas.
Meio perplexo e atabalhoado, mas de modo extremamente importante, e significativo,
Rogers já chamava a atenção para isso. Ou seja, a ação, a atualização, a tendência atualizante,
se dão como vivência. Fenomenológico existencial.
A ação, a atualização, a tendência atualizante, não se dão representativamente, como
consciência representativa. Não se dão explicativamente, como consciência explicativa,
teorética. Não são conceituais, mas consciência pré-conceitual. E pré-comportamental -- não
se dão comportamentalmente.
Dão-se, antes, como consciência pré-reflexiva, fenomenológico existencial e dialógica;
compreensiva e implicativa, gestaltificativa.
A ação, a atualização, a tendência atualizante, dão-se como vivência imediata de
forças, possibilidades, em desdobramento. Que surgem, vivencialmente, do íntimo do que
entendemos como ser, de um modo múltiplo e multiplamente contínuo, e se desdobram,
cognitiva e muscularmente, como devir, como o vir a ser da ação.
Em seu desdobramento, as possibilidades, necessariamente, e de um modo intrínseco,
se constituem, assim, como consciência pré-reflexiva, como consciência fenomenológico
existencial. De modo que, fenomenológico existencial e dialógica, compreensiva e implicativa,
gestaltificativa, a ação é eminentemente cognitiva, eminentemente epistemológica,
especificamente. Ainda que da ordem da epistemologia dialógica, fenomenológico existencial
empírica.
Uma epistemologia de raiz fenomenológico existencial e dialógica. O que quer dizer,
compreensiva e implicativa, gestaltificativa. E não explicativa. Quer seja o explicativamente
teorético, ou o explicativamente comportamental.
O percurso vivencial, vivenciativo, do desdobramento de possibilidades transita como
devir compreensivo, compreensivamente cognitivo, como ação, atualização, formação da
vivência, e formativo de coisas, desde níveis pré-compreensivos, até se exaurir como coisa. E
assim, múltipla e continuamente.
A ação é compreensiva e implicativa, gestaltificativa, portanto; o que quer dizer,
fenomenológico existencial e dialógica. Não é explicativa, não é teorética, nem
comportamental.
O ethos, a ética da ação, da atualização, da operação da tendência atualizante, é,
assim, na momentaneidade instantânea de seu acontecer, vivência fenomenológico
existencial, compreensiva e implicativa, gestaltificativa.
De modo que, ao privilegiar o modo de sermos da ação, da atualização, da operação da
tendência atualizante, a abordagem rogeriana faz uma decidida escolha pelo ethos, pela ética
fenomenomenológico existencial e dialógica, compreensiva e implicativa, gestaltificativa. Ética
do pathos, da sensibilidade emocionada, empathos, empatia, pathética.
O pathos, a empatia, a vivência fenomenológico existencial, compreensiva e
implicativa, gestaltificativa, é própria e especificamente, dialógica. Ou seja, da ordem do
acontecer – e não do acontecido –, a vivência empática, fenomenológica, é o modo de sermos
do ator, modo de sermos da ação, do acontecer. E não o acontecido modo de sermos do
sujeito e do objeto.
Eminentemente distinta, anterior, à condição acontecida do sujeito e do objeto -- e de
sua explicativa dicotomização --, a vivência fenomenológica, a vivência empática, é vivência de
sentido – logos, onto logos, fenomeno logos, dia logos.
Especificamente dialógica, a vivência fenomenológico existencial, a vivência empática,
compreensiva, implicativa, gestaltificativa, é uma vivência de compartilhamento (dia) do
sentido (logos). É uma vivência dialógica.
Compartilhamento do sentido, dia logos, vivência empática, que pode se dar, segundo
a antropologia buberiana, na esfera da relação com a natureza não humana, na esfera do
humano, do inter humano; e na esfera da relação com o sagrado.
O caráter empático da abordagem rogeriana significa que ela adota a ética e a
metodologia do pathos, da vivência fenomenativa. Adotando como metodologia, como
epistemologia, como ontologia, a fenomenológica da ação, da atualização, da tendência
atualizante. Ontologia, ética, epistemologia e metodologia, fenomenológico existenciais e
dialógicas, compreensivas e implicativas, gestaltificativas. Que permitem, e potencializam a
ação, a atualização, a operação da tendência atualizante.
Rogers se caracterizou por uma clara e decidida compreensão da importância do poder
existencial da ação, do poder fenomenológico existencial da atualização, da tendência
atualizante. Compreendeu que a ação é a própria existência, o próprio acontecer da existência.
Que, múltipla e continuamente, supera o acontecido da existência, criando-o e recriando-o
continuamente, em sua poiese. Criando-nos é recriando a nós próprios, e ao mundo que
solidariamente nos diz respeito.
7. Abordagem Rogeriana. Algumas questões

Afonso H Lisboa da Fonseca.

affons@uol.com.br

http://www.geocities.com.br/eksistencia/

Carl Rogers entendia a sua abordagem como sendo uma abordagem


fenomenológico existencial1. Entendia que a tendência atualizante, que ele
preconizava como fonte básica da motivação humana, só operava
fenomenologicamente. As condições que ele constituiu como condições de criação
de um clima terapêutico – quase tão faladas quanto mal entendidas – são condições
fenomenológicas. As características do funcionamento ótimo da personalidade são
características eminentemente fenomenológico existenciais.

Rogers sofreu uma influência importante das psicologias fenomenológico


existenciais de Abraham Maslow e de Rollo May, introdutores da psicologia
fenomenológico existencial nos EUA, influenciados pelos psicoterapeutas
fenomenológico existenciais europeus, em particular Medrard Boss e Ludwig
Binswanger, que buscavam constituir uma psicoterapia fenomenológicas a partir
da fenomenologia de Heidegger. O livro Existence2, de Boss e Binwanger, dentre
outros, publicado originalmente na Europa, teve sua publicação nos EUA
patrocinada por Maslow e por May. Rogers fez a revisão da obra.

No entanto, Rogers, de um modo geral, não tematizava de um modo mais


sistemático e explícito os fundamentos fenomenológico existenciais de sua
abordagem, ainda que teorizasse de um modo bastante significativo.
Progressivamente, os escritos de Rogers foram se tornando cada vez menos
teorizantes, cada vez mais ensaísticos. Registros dos processos de sua
experimentação em psicologia e psicoterapia, em particular no desenvolvimento e
vivência de seu modelo de trabalho com grupos.

Certamente que a indisposição de Rogers para um maior aprofundamento


teórico advinha de suas influências empiristas.

Mas o propugnador incansável da concepção de empatia no âmbito da


psicologia e da psicoterapia não podia ser simplesmente um empirista objetivista.
O Carl Rogers que acolheu as concepções fenomenológicas da psicologia
organísmica de Kurt Goldstein, como tendência atualizante, auto-atualização
organísmica, avaliação organísmica da consciência, não podia ser simplesmente um
empirista objetivista Rogers não se filiava ao empirismo do Pragmatismo, nem ao

1
ROGERS, Carl, KINGET, M. PSICOTERAPIA E RELAÇÕES HUMANAS. Belo Horizonte,
Interlivros, 1977.
2
MAY, Rollo (org.) EXISTENCE.
empirismo anglo saxão, de um modo geral. Não se filiava ao comportamentalismo.
Ainda que não estivesse bem desenvolvida a explicitação e o esclarecimento da
vinculação de suas concepções à Fenomenologia e ao Existencialismo.

No seu modelo de trabalho com grupos, a partir de 1974, há uma depuração


e radicalização das características fenomenológico existenciais de seu modelo. Há
uma relativização das idéias de tendência atualizante, e mesmo de condições
terapêuticas no contexto do grupo, para centrar-se no provimento de condições
hermenêuticas para o desdobramento da dialógica do encontro grupal.

O fato, entretanto, é que Rogers pouco tematizou os fundamentos


fenomenológicos de suas concepções, ainda que estas se caracterizem de um modo
muito específico pela perspectiva fenomenológico existencial.

O fato, entretanto, também, é que a frágil explicitação e desdobramento dos


fundamentos fenomenológico existenciais da abordagem rogeriana faz com que
suas concepções, e o arcabouço teórico geral de sua abordagem se fragilizem.
Gerando dificuldades para a reprodução de seu conhecimento, e formação de
novos profissionais a ela aderentes.

Alguns conceitos estão, em função disto, pobremente elaborados. Alguns


flagrantemente inconsistentes e superados.

O conceito de tendência atualizante, por exemplo. Sua concepção vincula-se a


uma perspectiva biológica. Quando as questões pertinentes à terapia, ao trabalho
psicológico, à facilitação de grupos, dizem respeito não a uma dimensão biológica,
mas à dimensão fenomenológico existencial. A explicitação desta concepção
segundo a perspectiva fenomenológico existencial permite a assimilação da
tendência atualizante à dimensão do possível, da possibilidade compreensivamente
vivida. E a concepção de seu desdobramento à noção de interpretação
fenomenológico existencial. E à compreensão do modelo rogeriano como uma
hermenêutica fenomenológico existencial.

Por outro lado, a noção de compreensão, na concepção de compreensão


empática – tão importante na concepção da abordagem rogeriana -- filia-se à
concepção de compreensão da filosofia da vida de W. Dilthey – a reprodução em
mim, um ser vivencial, da vivência de outro ser vivencial. Martin Heidegger foi
influenciado por Dilthey, e desdobrou as suas concepções, concebendo a
compreensão como a própria constituição do sentido, ao nível do ser-no-mundo.
Diferentemente da perspectiva de Dilthey, a compreensão desta forma concebida
deixa de ter uma concepção objetivista, ou subjetivista, já que a vivência de ser no
mundo se dá fora da dicotomização sujeito-objeto. A compreensão empática pode
assim ser compreendida de um modo mais próprio, em particular no sentido de
seu caráter dialógico.

Assim, desvendar as raízes fenomenológico existencial das concepções de


Rogers, da abordagem rogeriana, permite uma apuração de seu sentido, uma
apuração do sentido das concepções de Rogers. A superação de processos
degenerativos da abordagem, e uma continuação da sua produção e reprodução.
8. AVALIAÇÃO ORGANÍSMICA DA EXPERIÊNCIA:
CONSICIÊNCIA, LIBERDADE EXPERIENCIAL E
AFIRMAÇÃO NO TRABALHO PSICOLÓGICO E
PSICOTERÁPICO.

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo


CENTRO DE ESTUDOS DE PSICOLOGIA E PSICOTERAPIA FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAL

Rua Alfredo Oiticica, 106 Farol. 57032-010 Maceió AL  Fax 082-2218175. 2318191.

e-mail: affons@nornet.com.br. Página: http://www.angelfire.com/hi/afonsoaf/index.html


9. AVALIAÇÃO ORGANÍSMICA DA EXPERIÊNCIA:
CONSCIÊNCIA, LIBERDADE EXPERIENCIAL E
AFIRMAÇÃO, NO TRABALHO PSICOLÓGICO E
PSICOTERÁPICO

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

“Centro de avaliação. Esta noção refere-se à fonte dos critérios aplicados pelo
indivíduo na avaliação de suas experiências. Quando esta fonte é (...) inerente
à própria experiência, dizemos que o centro de avaliação está no indivíduo.”

Carl R. Rogers.

“A consciência é a última fase da evolução do sistema orgânico, por


consequência também aquilo que há de menos acabado e de menos forte neste
sistema. É do consciente que provém uma multidão de enganos. (...). Se o laço
dos instintos, este laço conservador, não fosse de tal modo mais poderosos do
que a consciência, se não desempenhasse, no conjunto, um papel de regulador,
a humanidade sucumbiria fatalmente sob o peso de seus juízos absurdos, das
suas divagações, da sua frivolidade, da sua credulidade, numa palavra, do seu
consciente. (...).Enquanto uma função não está madura, enquanto não atingiu o
seu desenvolvimento perfeito, é perigosa para o organismo (...). Considera-se
que o consciente é uma constante! Nega-se o seu crescimento, as suas
intermitências! É considerado como ‘a unidade do organismo’! Sobrestima-se,
desconhece-se ridiculamente, aquilo que teve a consequência eminentemente
útil de impedir o homem de realizar o seu desenvolvimento com demasiada
rapidez. Julgando possuir a consciência, os homens pouco se esforçaram por a
adquirir; e hoje ainda estão nisso! Trata-se ainda de uma tarefa eminentemente
actual, que o olho humano começa apenas a entrever, a de se incorporar o
saber, de o tornar instintivo no homem (...).”

F. Nietzsche.

“... a existência é culpada ou inocente? Então Dionísio encontrou sua verdade


múltipla, a inocência, a inocência da pluralidade, a inocência do devir e de
tudo que é.
(...) A inocência é o jogo da existência, da força e da vontade. A existência
afirmada e apreciada, a força não separada, a vontade não desdobrada, esta é
a primeira aproximação da existência.”

G. Deleuze.

“Toma cuidado! ... Ele está a reflectir: vai defender a sua mentira ...

F. Nietzsche

As concepções de experiência organísmica, e de avaliação organísmica da


experiência, têm um lugar fundamental no sistema conceitual desenvolvido por Carl
Rogers. A experiência organísmica é, na concepção de Rogers, a fonte última de um
conhecer saudável e criativo, que pode saudavelmente orientar a comunicação, o
comportamento, a ação, da pessoa no seu mundo, e permitir-lhe uma avaliação e re-
orientação destes. Num sentido psicodinâmico, a experiência organísmica é, por
excelência, a fonte saudável de avaliação e seleção da experiência, e de constituição
saudável da consciência, e da imagem de si da pessoa. Dimensões conscientes que
constituem-se, e subordinam-se, no funcionamento saudável da pessoa, à dinâmica,
potência, ritmos e intensidades próprios da experiência organísmica.

Rogers é claro ao indicar que, de um ponto de vista psicológico, a tendência


atualizante desdobra-se na pessoa apenas de uma perspectiva eminentemente
fenomenal. Ou seja, apenas através do vivido próprio e pontual da pessoa é que
manifestam-se, a nível psicológico e comportamental, os influxos da tendência
atualizante. De modo que a atuação da tendência atualizante na pessoa constitui-se
basicamente como a sua própria experiência organísmica de si-e-do-mundo que lhe diz
respeito, na necessária correlação fenomenal da pessoa com este mundo. Daí que seja a
experiência organísmica, o vivido da pessoa, o fundamento intrínseco e o motor do
funcionamento saudável e potente de sua personalidade.
A concepção do funcionamento ótimo e saudável da personalidade não estaria
distante da provocação de Nietzsche ao fazer uma apologia do ceticismo, em A Gaia
Ciência3:
“... Pois muito bem! Vamos lá, experimenta-te. Mas não
quero voltar a ouvir falar de nenhuma questão que não autorize a
experiência. Tais são os limites da minha ‘veracidade’”.

3
NIETZSCHE, F. A GAIA CIENCIA, Lisboa, Guimarães e C.ª, 1984.
Assim, a avaliação saudável e potente do mundo que lhe diz respeito, e, em
particular a avaliação de sua própria experiência, de seu próprio vivido, por parte da
pessoa, tem um critério “interno”, inerente, intrínseco assim à própria experiência. A
avaliação saudável e potente da experiência é, portanto, fundamentalmente experiencial,
é avaliação experiencial organísmica da experiência.
É, mais especificamente, assim, afirmação, afirmação da afirmação: afirmação
da potência do devir da experiência organísmica, do vivido, da existência, em seus
critérios e intensidades próprios.
Com a concepção de avaliação organísmica da experiência, Rogers chega assim
à afirmação da propria experiência organísmica da pessoa como fonte do critério de
avaliação do mundo e da experiência, da pessoa.

A avaliação experiencial organísmica da experiência, como afirmação da


experiência organísmica, é, assim, o critério e o princípio explicativo do funcionamento
ótimo e saudável da personalidade.
Na sua concepção do funcionamento ótimo da personalidade, Rogers
preocupou-se, em última instância, com o critério de avaliação de sua experiência por
parte do indivíduo, em especial de sua experiência de si.
Num primeiro momento, sua preocupação centrava-se em descrever um critério
que garantia a autonomia, e a criatividade, do indivíduo com relação ao controle
heteronômico. Um critério que garantia a autonomia da pessoa com relação a critérios
de avaliação oriundos na perspectiva de outros pessoas, ou de outras instâncias sociais.
Num segundo momento, sua concepção entende um primado, uma ascendência
da experiência organísmica, do vivido, do existencial com relação à consciência e à
imagem de si da pessoa. Ou seja, no funcionamento saudável, a consciência e a imagem
de si da pessoa são variáveis dependentes -- se é que podemos falar assim --, em relação
ao primado da experiência organísmica, do vivido, do existencial.
Há, na concepção e na teorização de Rogers, uma certa confusão epistemológica
em torno do termo experiência. Confusão que revela a ambiguidade entre um uso
empirista, e um uso mais propriamente fenomenológico do termo.
Mas o critério que Rogers constata e elege no funcionamento ótimo da
personalidade é inconfundível: no funcionamento ótimo da personalidade, a experiência
é avaliada organismicamente, ou seja experiencialmente, fenomenológico-
existencialmente.
A saúde não está no bloqueio ou distorção da experiência organísmica, para
fazê-la adequar-se às necessidades de uma imagem de eu funcional, ou às demandas da
consciência ou do meio.
Por outro lado, a qualquer forma de avaliação heteronômica, Rogers ressalta a
própria avaliação factual que configura e impôe a experiência organísmica, como
critério e processo de avaliação. Ou seja, Rogers ressalta assim a própria afirmação da
experiência organísmica como critério e processo de avaliação.
Este critério contrapôe-se a critérios de avaliação da experiência que se
fundamentam em fontes externas à própria vivência fenomenológico existencial do
indivíduo. Critérios externos estes que têm, segundo a formulação teórica de Rogers,
uma função de modelagem de uma imagem de eu compatível com as demandas
condicionais impostas pelas pessoas socialmente significativas, que satisfazem as
necessidades de consideração positiva da pessoa, constituindo-se, desta forma, como
centros externos, heteronômicos, de avaliação do mundo e da experiência da pessoa.

Para Rogers a simbolização consciente desta vivência organísmica pode estar


distorcida por bloqueios e interceptações da experiência. Defesas psicológicas, que
visam impedir que cheguem à consciência elementos dissonantes com uma imagem de
eu que é desejável pelas pessoas socialmente significativas, e, no limite, desejável pela
própria pessoa, carente da consideração positiva dessas pessoas socialmente
significativas.
No funcionamento ótimo da personalidade, estas defesas psicológicas estão
reduzidas a um mínimo. E o indivíduo goza de liberdade experiencial, que permite-lhe
que a potência de sua experiência organísmica possa constituir, de um modo
significativo e substancial, a sua consciência e a sua imagem de eu, permitindo-lhe
usufruir do melhor de suas capacidades e criatividade, em sua relação com o seu meio,
em particular com as dificuldades desta relação.

Estas concepções estão fundamentalmente influenciadas pelas perspectivas da


psicologia organísmica, do existencialismo, e da filosofia da vida. Perspectivas, em
particular que reconhecem, num primeiro plano, a inocência e a benignidade do vivido,
a inocência da existência tal como ela se manifesta como vivido, a inocência e a
benignidade do corpo, do organismo, e o interêsse e valor na sua afirmação plena,
segundo os ritmos, critérios e intensidades que lhe são intrínsecos, segundo os padrões
de sua auto-regulação organísmica.
É importante obseravar que, neste momento, Rogers já está inteiramente no
avesso do avesso do avesso da inversão socrática, como Nietzsche a designou.
Para Nietzsche, Sócrates marcou o momento de uma inversão no
desenvolvimento da cultura da Civilização Ocidental. A cultura pré-socrática grega
valorizava fundamentalmente a benignidade e a afirmação do corpo, dos instintos, dos
sentidos, do vivido. A emergência da perspectiva socrática definiu uma nova
perspectiva, que depreciava, desabonava, estas dimensões do humano e relegava-as a
um plano inferior e pejorativo. Instalando dimensões abstratas, tais como a consciência,
o espíritual, o teórico, no topo da pirâmide de valores. A esta inversão Nietzsche
chamou de inversão socrática.
Nietzsche definia como o seu intento o de fazer uma inversão da inversão
socrática, e reinstalar o corpo, os instintos, os sentidos, o vivido, a experiência -- num
sentido fenomenológico e existencial do termo --, no topo da pirâmide de valores. Na
verdade fazer do vivido a própria fonte dos valores, fonte da avaliação, e do
conhecimento, fonte do ético e do verdadeiro.

Toda uma nova perspectiva desenvolve-se, em psicologia e psicoterapia, direta


ou indiretamente, a partir desta perspectiva de Nietzsche, conjugada com a perspectiva
da fenomenologia e do existencialismo de Kierkegaard. Uma perspectiva que busca
resgatar a concepção de uma inocência e benignidade do corpo, dos instintos, dos
sentidos, do vivido -- da experiência. O valor de sua afirmação, e o desenvolvimento de
valores e modos de ser que potencializem a sua afirmação.
Ou seja, toda uma perspectiva que descobre o valor da afirmação do vivido e da
experiência, e que busca fazer, em psicologia e psicoterapia, a inversão da inversão
socrática, que Nietzsche propunha. Este me parece ser um sentido fundador e
fundamental da psicologia e psicoterapia fenomenológico-existencial organísmica, dita
humanista.
Para tal, existe a premissa do valor próprio da afirmação do corpo, dos instintos,
da existência, do vivido, da experiência, em contraposição às perspectivas vigentes em
nossa cultura, sejam elas de cunho religioso, científico ou filosófico, que preconizam o
ideal ascético (a vida tal como ela existe está essencialmente errada, é necessário algo
além dela para justificá-la e fundamentar a sua negação) -- e a inversão socrática. Que
preconizam um primado da consciência sobre a experiência organísmica, e um controle
heteronômico da pessoa, a partir de referenciais de avaliação extrínsecos a sua
experiência.
Deleuze comenta e expôe um fundamento da apreci-ação da vida, da apreci-ação
da existência, de uma afinidade pelo vivido, pela experiência organísmica, de uma
biofilia, como dizia Fromm:
“... a existência é culpada ou inocente? Então Dionísio
encontrou sua verdade múltipla, a inocência, a inocência da
pluralidade, a inocência do devir e de tudo que é.

(...) A inocência é o jogo da existência, da força e da


vontade. A existência afirmada e apreciada, a força não separada, a
vontade não desdobrada, esta é a primeira aproximação da
existência.”4

Descrevendo o funcionamento ótimo da personalidade, em sua liguagem


fenomenológico existencial organísmica, Rogers5 define três características básicas de

4
DELEUZE, Gilles NIETZSCHE E A FILOSOFIA, Rio, Editora Rio, 1976.
tal funcionamento da personalidade: (a) a atitude aberta ante a experiência; (b) o
funcionamento existencial; e (c) a confiança no organismo.
A abertura à experiência, a liberdade experiencial, oposta a uma atitude de
defesa com relação à experiência, característica da necessidade de preservação de uma
imagem de eu rígida, dissonante com relação a esta experiência organísmica e
compatível com demandas heteronômicas.
Uma sintonia, afirmação e identificação com a pontualidade da experiência, da
existência, do vivido. Uma identificação com esta pontualidade da existência, e com o
fluxo vívido e vivido de seu devir. E a liberdade para constatar e afirmar o organismo,
mais especificamente a experiência organísmica, como “um guia competente e seguro”.
Desta forma, Rogers descreve um critério do funcionamento pleno e saudável
que radica-se, no limite, na afirmação do organismo, tal como ele se manifesta como
vivido, como experiência organísmica. Que radica-se, assim, na eleição do vivido, da
experiência organísmica, como critério de avaliação.
Liminarmente, ele descarta como critério qualquer centro de orientação e
avaliação do comportamento que esteja “fora” da própria vivência fenomenológico-
existencial da pessoa. Esteja este centro em outras pessoa, nos grupos de referência da
pessoa, na religião, na moral, nos costumes, na política ou outros. O que interessa
fundamentalmente é a valorização de um modo de funcionamento que centre-se
habitualmente no frescor fugaz e nas intensidades do vivido, da experiência
organísmica, e que possa afirmá-los em sua potência, ritmos e intensidades próprios.
Por outro lado, é primordial discriminar esta experiência organísmica e sua
afirmação do funcionamento da consciência, em suas modalidade não fenomenais e
reflexivas.
O frescor emergente da experiência organísmica dá-se justamente nas
modalidades pré-reflexivas originárias, vivenciais, da consciência. A um nível
existencial é esta modalidade pré-reflexiva da consciência que constitui e configura o
que chamamos de experiência organísmica.
De modo que a consciência intelectual, reflexiva, ainda que tenha o valor de seu
lugar próprio não se caracteriza como um critério e guia competente para o que Rogers
chamaria de funcionamento ótimo da personalidade.
Neste funcionamento, a experiência organísmica, o vivido, configura-se como
força que constiui a consciência e a imagem de eu da pessoa. Configura-se, desta forma,
como força, como multiplicidade de forças que constituem a sua comunicação, o seu
comportamento, a sua ação, o seu ajustamento criativo, no mundo que lhe diz respeito.
A pessoa não tem um organismo, uma experiência organísmica, não tem um
vivido; ela é, como devir, a sua experiência organísmica, ela é o seu vivido. Vivido que
a inspira e a constitui, que constitui a imagem do seu eu, e que, desejavelmente,
constitui a sua ação, e a cri-ação e devir de seu ser-no-mundo.
5
ROGERS, Carl, KINGET, G. Marian PSICOTERAPIA E RELAÇÕES HUMANAS, Belo horizonte,
Interlivros, s/d.
Esta perspectiva de concepção do corpo, do organismo, da experiência
organísmica, do vivido, assume-os como eminentemente ativos, como afirmativos,
benignos e desejáveis. Atividade e afirmatividade estas com relação às quais interessa
portanto desenvolver valores e atitudes afirmativos. Interessa afirmar a afirmação que
eles já configuram.
De modo que a avaliação organísmica da experiência é, fundamentalmente, a
afirmação e a atualização da experiência organísmica, e a constituição de sua afirmação
e atualização como fonte de avaliação e dos valores, como critério da avaliação, dos
valores e do verdadeiro.
10. A COMPREENSÃO É EMPÁTICA.
A EMPATIA É COMPREENSIVA.
(Aliás, Compreensão Empática é uma redundância...)
Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

O que caracteriza as abordagens fenomenológico existenciais de


psicologia e psicoterapia, notadamente a Gestalt, e a Abordagem
Rogeriana, é que -- privilegiando o modo fenomenológico existencial
dialógico, hermenêutico, poiético, estético, e experimental, de sermos
-- elas, em específico, própria e especificamente, privilegiam o modo
compreensivo de sermos, em sua concepção, metodologia, e
vivência.
Isto representa, do ponto de vista epistemológico, e ontológico,
um agudo corte, radical (de raiz), definitivo, e definidor.
Ao privilegiarem, em sua concepção, metodologia, e vivência, o
modo compreensivo de sermos, ao privilegiarem uma concepção e
uma metodologia compreensivas, as abordagens fenomenológico
existenciais não privilegiam o modo explicativo de sermos. Quer ele
se dê sob a forma teórica, ou comportamental.

A concepção, a metodologia, a vivência, das abordagens


fenomenológico existenciais privilegiam a implicação, e a
intensionalidade, que são próprias e específicas do modo
compreensivo de sermos.
Isto, em específico, quer dizer que, por privilegiarem a
implicação, e não a explicação, elas não são teorizantes em sua
concepção e vivência metodológica.
O que quer dizer que -- não explicativas, não teorizantes,
implicativas -- elas não são científicas. A não ser que falemos do
âmago de uma ciência compreensiva. Que falemos do âmago de uma
ciência própria e especificamente estética.
Aí chegados, ainda teríamos que considerar qual o interesse de
reduzir uma arte ao estatuto científico...
Dito isto, dizemos que as abordagens fenomenológico
existenciais, igualmente, não são moralistas.
Da mesma forma, fundadas numa concepção e metodologia
compreensivas, as abordagens fenomenológico existenciais não são,
por isso, técnicas. Mas hermenêuticas e experimentais, no sentido
fenomenológico existencial.
Da mesma forma que não são práticas.
Nem teoréticas, nem moralistas, nem técnicas, nem práticas, as
abordagens fenomenológico existenciais são, própria e
especificamente, poiéticas. Pelo seu caráter de privilegiamento do
modo criativo de sermos, que é o modo de sermos da ação: da
vivência e vivência da atualização de possibilidades – o modo
compreensivo de sermos. Fenomenológico existencial, dialógico,
estético, poiético, hermenêutico, e, assim, experimental.

Pela sua própria característica de ser, todo ele, ação, de ser


todo ele atualização de possibilidades, este modo compreensivo de
sermos, que é o modo sensível de sermos, é todo ele, também,
movimento, movimentação. Moção, e-moção, emoção.
Ou seja, ao mesmo tempo em que é o modo sensível de
sermos, o modo compreensivo de sermos é o modo de sermos
impregnado pela emoção. É o modo de sermos que contém a
emoção. De tal forma, que é o modo de sermos de nossa
sensibilidade emocionada.

A esta característica de sensibilidade emocionada do modo


compreensivo de sermos é que alude o sentido do termo e da
concepção de Empatia.

Compreensão e Empatia são, assim, dois aspectos intrínsecos e


necessários do mesmo processo da vivência fenomenológico
existencial e dialógica – vivência esta experimental, implicativa,
intensional, hermenêutica, e poiética.
De um modo tal, que toda Empatia é, própria e
especificamente, Compreensiva. Da mesma forma que toda
Compreensão é, própria e especificamente, Empática. Referindo-se os
termos respectivamente a aspectos diferentes de um mesmo
processo fenomenológico existencial, dialógico, hermenêutico,
poiético, e experimental – neste sentido fenomenológico existencial.

O termo Compreensão se refere à constituição, como sentido


-- como consciência, pré-reflexiva -- da vivência fenomenológico
existencial. Da vivência que é, intrinsecamente, e
caracteristicamente, vivência de possibilidade; e vivência do
processamento do desdobramento de possibilidade. Como dissemos:
a ação.
A possibilidade se constitui e, em sua constituição, é apreendida
como sentido (logos, fenômeno-logos, dia-logos), como consciência,
pré-reflexiva. Isto é a apreensão da cum-(a)preensão, cum-a-
apreensão da possibilidade. Cum-preensão, Cumpreensão,
Compreensão. Que se dá e desdobra no dito modo de sermos da
consciência pré-reflexiva, fenomenológico existencial, dialógico,
hermenêutico, poiético; experimental, intensional e implicativo.
O termo Compreensão refere-se, assim, à constituição como
consciência -- consciência pré-reflexiva, fenomenológico existencial,
dialógica, hermenêutica, e experimental -- da vivência de
possibilidades, e da ação, atualização -- que é, especificamente, o
desdobramento -- compreensivo, intensional, e implicativo --, de
possibilidades em sua vivência.
Processo que é, assim, implicativo, e não explicativo: própria e
especificamente é não teorético. E não comportamental.
Na verdade, pré-teorético, e pré-comportamental.
No modo fenomenológico existencial de sermos, própria e
especificamente, vivenciamos possibilidades.
O próprio às possibilidades em sua vivência, em seu acontecer,
é que elas se desdobrem. Já que, em sua vivência intensional, as
possibilidades são forças plásticas, potências. Que, na vivência de seu
acontecer, performaticamente se configuram em formas. Formas da
vivência. Formas, sempre, compreensivas – na vivência de seu
acontecer. Mas, estritamente compreensivas, ou compreensivas e
musculares, no seu desdobramento. Ou como as formas objetivadas
do mundo e da vida acontecidos.
E este desdobramento configura-se e se constitui em si como a
Ação, ataualização.
Sua vivência e o seu resultado é o que entendemos como
poiese.

Todo este processamento se constitui como vivência de sentido,


como logos, dia-logos, fenomeno-logos. Constui-se, assim, como
consciência fenomenológica e existencial, pré-reflexiva, pré-
conceitual, pré-ente, presente.
Própria, e especificamente, assim, é esta constituição da
possibilidade, e da ação, como logos, como consciência
fenomenológica, e existencial, que constitui o que chamamos de
cum-preensão – Compreensão. O modo compreensivo de sermos.
Que é o modo fenomenológico existencial, dialógico, hermenêutico,
poiético e experimental de sermos.

Este modo de sermos fenomenológico existencial dialógico,


hermenêutico e experimental, é o modo de sermos estésico, o modo
Estético de sermos. O termo estésico igualmente menciona a
característica impregnação de possibilidades, e de ação, que é própria
a este modo de sermos.
E propriamente foi entendido pelos estéticos Gregos como o
modo de sermos da sensibilidade.

Pela própria movimentação característica da vivência, e da


vivência do desdobramento da possibilidade, e da ação, este modo de
sermos da sensibilidade, o modo Compreensivo de sermos, —
fenomenológico existencial, dialógico, hermenêutico e experimental
--, é, própria e especificamente, vivência de movimento.
É movente. É moção, é Emoção. Emocionado.
Ou, seja, pela própria vivência de possibilidade, e da ação, que
se constitui como compreensão, o modo compreensivo de sermos é,
igualmente, intrinsecamente marcado pela emoção.
Assim, o modo de sermos de nossa sensibilidade, o modo de
sermos compreensivo, fenomenológico existencial, dialógico,
hermenêutico e experimental, é o modo movente de sermos, o
modo co-movente de sermos. O compreensivo modo de sermos é,
igualmente, portanto, o modo de sermos da emoção, o modo de
sermos de nossa sensibilidade emocionada.

Os Gregos designaram como Pathos, como Páthico, este modo


compreensivo de sermos – o poiético modo compreensivo de
sermos da vivência de possibilidade, e da vivência ativa, modo de
sermos da emoção, modo de sermos da sensibilidade emocionada (no
sentido de que contém a emoção).
O modo compreensivo de sermos que contém a emoção, e que,
fenomenológico existencial, dialógico, hermenêutico e experimental,
constitui, e configura a poiesis emocionada de nossa existência, e da
existência do mundo que nos diz respeito. O Pathos, o modo páthico
de sermos.
O modo Empáthico (de dentro do pathos) de sermos.
Vale particularmente observar que este sentido de Pathos é o
sentido Grego original. Do qual diverge o sentido Latino do termo.
Sentido Latino no qual o conceito de Pathos ficou marcado pela
acepção de excesso, ou descontrole, de emoção; de sofrimento, de
doença.
Assim, o sentido Grego original do termo é o de modo
compreensivo e poiético de sermos da sensibilidade emocionada.
Modo de sermos da sensibilidade.
De modo que o termo Patológico, por exemplo, tem um sentido
completamente diferente na sua acepção Grega original, e na sua
acepção Latina subsequente. Um, no limite, ligado a sensibilidade
compreensiva, poiética, e emocionada; o outro, ligado no limite a
exagero de emoção, ou a doença. Este sentido Latino derivado do
sentido Grego original é o que prevalece na cultura da civilização
ocidental.
O termo e a concepção de Empatia (dentro do pathos) –
derivam deste sentido Grego original do termo pathos. É desse
sentido Grego original de pathos que surge a concepção, e o termo,
Empathia, como designativo da vivência do modo compreensivo e
poiético de sermos de nossa sensibilidade emocionada. Ou seja, como
designativo da vivência do modo de sermos de nossa sensibilidade
estética, poiética, fenomenológico existencial, e dialógica,
hermenêutica e experimental, neste sentido. O modo de sermos que
é própria, e especificamente, compreensivo; que é, própria e
especificamente, compreensão. A vivência fenomenológico
existencial sensível, estética, e poiética, que é a vivência de
possibilidades, e da ação -- como desdobramento de possibilidades
--, e que se constitui como consciência, fenomenológico existencial.

A vivência páthica, empáthica, de nossa sensibilidade


emocionada, é, assim, própria e eminentemente,
especificamente, compreensiva. O termo Empatia enfatiza este
aspecto de sensibilidade emocionada -- movida, e-movida, e-
mocionada, em sua form-ação, per-form-ação, pela potência plástica
da vivência do possível, da vivência da emoção -- na vivência que é,
própria e eminentemente, compreensiva.
De modo que toda compreensão é empática; e toda
empatia é compreensiva.
Na medida, em particular, que a vivência eminentemente
compreensiva de possibilidade, e do seu desdobramento, na
ação, fenomenológico existencial, dialógica, hermenêutica e
experimental, é, própria e especificamente, intrinsecamente,
movente – moção, co-moção, emoção. Empática.
Empatética, pathética, peripathética.

Assim, a vivência páthica se constitui e se configura como


sentido. Como consciência pré-reflexiva, fenomenal – como
compreensão --, especificamente, pela força plástica, potência,
característica da possibilidade, e de sua atualização: do seu
desdobramento.
A compreensão, como movimento da atualização de
possibilidade, é, própria e especificamente, movente, (e)mov-ente, e-
moção, portanto.
A compreensão, o modo de sermos da compreensão, assim,
é, própria e especificamente, páthico, empático.

De modo que não é pertinente afirmar que Compreensão e


Empatia são essencialmente diferentes... Compreensão e empatia são
aspectos descritivos do mesmo processo da vivência em nossa
sensibilidade emocionada, fenomenológico existencial e dialógica –
experimental, hermenêutica, e poiética. Compreensiva, e empática.

Toda empatia é compreensiva, toda compreensão é empática.

Fundamental, também, entender que, e como, a vivência


fenomenológico existencial, compreensiva e empática é,
própria e eminentemente, dialógica.
Ao modo dialógico de sermos -- próprio à vivência
fenomenológico existencial, compreensiva, e empática -- não
nos damos, e desdobramos, numa relação sujeito objeto. Mas
sim vivencialmente – na vivência que é vivência da dinâmica
inter-ativa de uma relção eu-tu. E não a dicotomização
sujeito-objeto que é própria aos modos não vivenciais, e não
dialógicos, de sermos. A explicação, e o comportamento.
A dialógica interhumana, que é eminentemente vivencial – da
mesma forma que a dialógica com a natureza não humana, e a
dialógica com o sagrado --, a vivência se caracteriza como o
compartilhamento eu-tu da performática compreensiva de
produção de sentido, a partir da vivência e atualização
compartilhada de possibilidades. Há um compartilhamento
compreensivo, e empático, que não é objetivo – nem subjetivo – mas
dia-lógico.
Assim, no modo de sermos da compreensão, e da empatia, não
somos sujeitos, nem o outro é objeto. O outro é pontualmente um tu,
e, pontualmente, somos o polo eu da dialógica pontualmente
interativa de uma inter-ação eu-tu.
Inter-ação e desdobramento vivenciais de possibilidades, que
se constituem especifica e eminentemente como cognição,
pontualmente compartilhada. Como desdobramento de sentido,
de logos, compreensivos e empáticos, enquanto tais. Em sua
dialógica, fenomenológico existencial, pré-reflexiva.

BIBLIOGRAFIA.
BUBER, Martin. Eu e Tu.
HEIDEGGER, Martin. EL SER Y EL TIEMPO.
11. Dialógica

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

Ontológico, fenomenológico, lógico, o modo pré-reflexivo de sermos, compreensivo e


implicativo, gestaltificativo, é, própria e especificamente, dialógico. Modo eu-tu de sermos,
segundo a designação de Buber. O modo dialógico de sermos é, assim, ontológico,
fenomenológico, e existencial; compreensivo e implicativo, gestaltificativo. Presente, presença;
ação, atualidade.

Lógico, quer particularmente dizer que o modo dialógico de sermos, ontológico,


fenomenológico, é cognição. É o modo pré-reflexivo de sermos, na vivência do qual
experienciamos logos, sentido. O logos, o sentido que nos distingue como humanos. O sentido
que é ontológico, uma vez que caracteriza este ser que vivencia logos, sentido -- e que, por
isto, é um ser lógico: ontológico...

Logo, o ser que vivencia o sentido é ontológico.

E é ontológico o sentido que vivencia o ser que vivencia o sentido.

O termo ontológico conceitua e define, assim, tanto o ser que é ontológico; como o sentido,
que é ontológico. Definindo, também, o modo ontológico de sermos de vivência do sentido,
que é o modo ontológico de sermos, o modo de sermos em que vivenciamos o logos, o sentido.
O modo de sermos da implicação.

Já que, alternativamente, podemos, também, ser o modo de sermos da explicação (teorética,


e comportamental). Que não é lógico. Não é fenomenológico, não é ontológico, não é
dialógico. Sobretudo porque não é -- o modo explicativo, modo eu-isso de sermos --, o modo
de sermos da vivência do sentido. Ontológico, fenomenológico, dialógico...

Fenomenológico em momento algum quer dizer o estudo do fenômeno.

Fenomenológico quer dizer o sentido do fenômeno. O logos do fenômeno, fenômeno logos,


fenomenológico.

Os fenômenos se constituem como forças que vivenciamos no modo pré-rflexivo de sermos. As


possibilidades.

Vivenciamos as possibilidades porque, nos seus desdobramentos, como forças que são, as
possibilidades se constituem intrinsecamente como logos, como sentido, como cognição,
como consciência.

Mas cognição, consciência, pré-reflexivas, compreensivas, implicativas. Ontológicas,


fenomenológico existenciais. O logos é, assim, fenomenológico; e o fenômeno é lógico. Como a
vivência do desdobramento cognitivo de possibilidades. Sendo o fenomenológico o sentido do
fenômeno.
O mesmo fenômeno que é ontológico, e é fenomenológico, é, igualmente, dialógico.

Uma de suas maravilhas...

O modo ontológico de sermos, fenomenológico existencial, compreensivo e implicativo,


gestaltificativo, é, própria e especificamente, dialógico.

O modo ontológico de sermos, fenomenológico existencial, compreensivo e implicativo,


gestaltificativo, é um modo de sermos que, ainda que comum e corriqueiro para qualquer ser
humano, tem características muito peculiares. Principalmente quando tomamos a realidade do
modo explicativo, acontecido, de sermos como referência. Características corriqueiras que têm
substanciais e radicais qualidades.

No modo ontológico de sermos não vigora a dicotomia sujeito e objeto. Modo vivencial,
implicativo, de sermos, modo de sermos do acontecer, o modo ontológico de sermos não é o
modo de sermos, portanto, da teorética. Na qual um sujeito, acontecido, atualizado,
desatualizado (Buber, toda a atualização implica uma desatualização), contempla um objeto,
igualmente acontecido, atualizado, desatualizado...

No modo ontológico de sermos não vigora a causalidade, não vigoram as relações de causa e
efeito. São forças, possibilidades, que se desdobram. Magistralmente, Buber diria: não sou eu
que crio as possibilidades, mas elas não acontecem sem mim...

Além do mais, o modo ontológico de sermos, não é o modo de sermos da utilidade. Já que
não há sujeito, sujeitado, para o uso de objetos, objetados; não há objetos como úteis, e
sujeito para utilizar úteis objetos...

O modo ontológico de sermos não é o modo de sermos da realidade. Porque é ação,


atualização, realização, acontecer do desdobramento de possibilidades; e não o modo
acontecido de sermos da realidade. Alternativamente, o modo ontológico de sermos é o modo
de sermos da possibilidade, e do desdobramento de possibilidades como ação. E não o
acontecido modo de sermos da realidade.

Não obstante, vivenciamos a momentaneidade da vivência do modo ontológico de sermos, em


cada um de seus momentos, como uma dualidade. Não é a dicotomia sujeito – Objeto, de
sujeitos e obje(i)tos acontecidos; mas o projeito, a projetação, o acontecer, da dialógica da
relação eu-tu. Que, em sendo o próprio projeto, projetação do desdobramento de
possibilidades, não é sub-jeto, nem ob-jeto. A momentaneidade da vivência do modo
ontológico de sermos, fenomenológico existencial e dialógico, compreensivo e implicativo,
atualidade e presença, é a projetação de um eu e de um tu, de uma inter ação eu-tu, que,
própria e especificamente se dão como possibilidades, possibilitações...

A dualidade da presença, e da atualização, de um eu que se remete a um tu como


possibilidade; e de um tu que se remete a um eu como possibilidade. Criando, neste
remetimento recíproco, uma esfera inter mediária. A esfera do entre, do inter, da inter ação.
Que eminentemente cognitiva, se constitui como o âmbito inter ativo, e ativo, da dialógica eu-
tu.
No modo ontológico de sermos, relacionamo-nos com a natureza não humana, com os outros
seres humanos -- individualmente e em grupos --, e com o sagrado. Neste modo ontológico de
sermos, natureza não humana, os outros seres humanos, e o sagrado, e o próprio eu do eu-tu,
não são acontecidos. Mas acontecer, possibilidades em desdobramento. Projetos, projetação
do desdobramento de possibilidades. Que se dão na dialógica de uma interação eu-tu. E não
objetos.

Da mesma forma que o eu não é o eu de um sub-jeto. Mas, igualmente, projeto, já que


projetação do desdobramento de possibilidades.

Como vivência da interação de um eu e um tu possíveis, presentes e atuais, atualizativos, a


relação eu-tu se dá como ação, atualização, como inter ação do desdobramento de
possibilidades, que cognitivamente se constitui como consciência pré-reflexiva, como onto
logos, como fenômeno logos, como dia logos. O dia logos se caracteriza o âmbito de uma
vivência de sentido, desdobramento de possibilidades, ação, atualização, presença e
atualidade, em que um eu e um tu se projetam recíproca e mutualmente como possibilidades,
e constituem o eu-tu, o dia logos, como o âmbito de uma esfera intermediária de vivência de
sentido, de ação, de atualização.

As eventualidades da experiência dialógica do modo eu-tu de sermos são a duração de


momentaneidades instantâneas da temporalidade própria dos desdobramentos de
possibilidades.

Presença, atualidade, ação.

São eminentemente gestaltificativas, no sentido de que são formativas – atividades, ação,


atualização, de criação de formas --, ciação originária e original, como vivência dos
desdobramentos das multiplicidades de forças das possibilidades. Formação, formas, onto-
lógicas, fenômeno-lógicas, dia-lógicas, da cognição da consciência da pontualidade da
momentaneidade instantânea de seu acontecer, como a ação, a atualização dos processos de
formação de figura e fundo.

E formativas, gestaltificativas, no sentido de que as vivências dos processos de formação de


figura e fundo, escoam, instalando-se como coisas. Formando, além de processos intensionais
de formação de figura e fundo, as coisas do mundo, originais, e originárias. As coisas, as
instalações do mundo.

Cada coisa, feita, fato, não é morta. Vivíssimas são as coisas. Os Xamãs que o digam... Porque,
enquanto coisas, as coisas são só instalações do possível, instalações de possibilidades.

Instalação quer dizer, ação lentificada. Ação devagar quase parando.

Mas não quer, de modo algum, dizer falta de ação, falta de possível, falta de possibilidade,
falta de força. Sobretudo, não quer dizer fatalidade. (Buber diria, magistralmente, a única
coisa que pode vir a ser fatal ao homem, é crer na fatalidade... Dos fatos, feitos, coisificados).

O núcleo das coisas é, também, o Ser. O núcleo das coisas é também o possível, a
possibilidade, a ação. Que lá dormita, como a brasa coberta de cinzas, até que possamos para
ela nos abrirmos num modo própria e especificamente estético de sermos, o modo eu-tu,
dialógico, ontológico, fenomenológico existencial, compreensivo e implicativo,
gestaltificativo... Aí, a coisa se dilui como objeto, o eu se dilui como sujeito, e emerge o eu-tu,
na relação com o que antes era o eu-isso da fatalidade factual da coisa acontecida, em sua
mera instalação.

De modo que a vivência do momento ontológico, fenomenológico e existencial, dialógico – eu-


tu, compreensivo e implicativo, gestaltificativo, atualidade e presença, ação, sempre escoa,
sempre se converte no modo eu-isso de sermos. No fato, na coisa, feita, no isso. Mas, na
instalação de cada coisa reside a possibilidade da eventualidade dialógica, eu-tu, do acontecer.

BUBER, Martin Eu e Tu.

FONSECA, Afonso Fatal mesmo é crer na fatalidade.


12. DIALÓGICA, HERMENÊUTICA E ESTÉTICA DO
CONFLITO
Conflito, Mediação, e Facilitação da resolução de
conflitos
em Psicologia e Psicoterapia Fenomenológico
Existencial.

Gestalt.
Abordagem Rogeriana.

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

Introdução;

1.
Aporia, Instalação, Fatalidade e Fatalismo do Conflito;

1.1. Realidade do conflito e de sua instalação ôntica;


1.2. O conflito e sua aporia;
1.3. Facticidade e fatalismo do conflito;

2.
A mediação e a facilitação da superação, e da resolução, como experiência estética do
conflito -- à ventura dos devires de suas possibilidades. O Grupo Vivenciativo.

2.1. A Experiência estética, experiência ontológica, fenomenológico existencial,


dialógica, do conflito;
2.2. Dialógica do conflito;
2.3. Compreensão. O modo de sermos da experiência estética, da dialógica, da
aporética, e da da interpretação, hermenêutica fenomenológico existencial;
2.4. Sobre o caráter implicativo da experiência estética, da dialógica, da aporética, da
compreensão e da hermenêutica do conflito.
2.5. Aporética. Aporia e aporética do conflito;
2.6. Hermenêutica do conflito;
2.7. O Grupo Vivencial como recurso experimental ontológico, fenomenológico
existencial dialógico e hermenêutico para a mediação e facilitação da resolução de
conflitos;
2.8. O Grupo e o tempo;
3.

O conflito, suas formas improdutivas, e as formas improdutivas da mediação;

3.1. Moralismo e conflito. Teorética e cientificidade;


3.1.1. O olhar de espectador do teorético e a ação do ator do conflito;
3.1.2. Conflito e explicação;
3.1.3. Cientificidade e conflito;
3.2. O caráter comportamentativo do conflito;
3.3. E o caráter desportativo da superação do conflito;
3.4. Pragmática, resolução e superação do conflito. O processo de vivência da superação
do conflito não é prática, não é pragmática;
3.5. Realismo, ontológica, conflito, e superação;
3.6. Das formas improdutivas da mediação.

Conclusão
Introdução;
A metodologia da mediação e da facilitação da resolução de conflitos da psicologia e
psicoterapia fenomenológico existencial -- Gestal’terapia, Abordagem Rogeriana – se
fundamenta, em seus princípios de concepção e método, na própria facilitação da dinâmica
existencial do conflito, privilegiando o modo ontológico de sua vivência fenomenológico
existencial, dialógico, e estética.
Esta metodologia busca propiciar condições relacionais de espaço, e de tempo,
condições empáticas, condições de experimentação e interpretação, fenomenológico
existenciais, para uma relativização da facticidade e fatalismo do conflito, para uma
relativização da realidade ôntica da instalação das aporias do conflito -- instalação do conflito
no não dialógico, no não ontológico, no não hermenêutico.
A metodologia propõe às partes conflitantes a experiência da vivência integrada da
presença (modo fenomenológico existencial dialógico de sermos) e da atualidade (atualização)
fenomenológico existenciais dialógicas do conflito. De modo que a vivência desta presença e
atualidade, em sua inerente potência criativa – a partir da vivência do modo de semos de sua
potência atual, da potência de suas possibilidades --, possa atuar na natural facilitação da
atualização, da superação, e resolução do conflito. Diluindo a instalação de sua realidade ôntica
no fluxo de suas possibilidades. Possibilidades estas que intrinsecamente impregnam o modo
vivencial de sermos, ontológico, fenomenológico existencial, e dialógico.
O grupo vivencial, constiuído pelos facilitadores e pelas partes conflitantes -- e que
pode ser apoiado pela forma da entrevista diádica --, é, assim, o instrumento, por excelência,
para a mediação, e para a facilitação da resolução de conflitos da psicologia e psicoterapia
fenomenológico existencial – Gestal’terapia, Abordagem Rogeriana.
1.
Aporia, Instalação, Factidade e Fatalismo do Conflito;

1.1. O conflito e suas aporias;


A afligência do conflito decorre, naturalmente, de sua estase, da paralisia de sua
instalação na realidade de sua formação ôntica. A afligência do conflito decorre da parada que
ele configura nos fluxos existenciais pessoais, interpessoais, grupais ou inter grupais.
O dinamismo destes fluxos existenciais como tais caracterizam a existência. São
potencializados pela vivência de possibilidades, e pelo desdobramento destas, no modo
fenomenológico existencial e dialógico de sermos.
A existência pessoal, a existência grupal, e inter grupal, fluem, assim, constantemente, a
partir da vivência das potências de possibilidades; transitando pelo desdobramento e atualização
dessas possibilidades. Em direção, sempre, à realização e à coisificação. O momento de sua
vivência, e da vivência de seu desdobramento, atualização, não obstante, não são da ordem da
realidade e da coisidade. O seu momento próprio e específico configura o presente -- o modo de
sermos de pré-coisa, o modo de sermos da presença, e da atualidade, modo de sermos estético,
fenomenológico existencial e dialógico.
O conflito não foge a esta dinâmica. E flui, enquanto as possibilidades potencializam e
alimentam os dinamismos de seu devir. Paralisando-se progressivamente, à medida que vão se
exaurindo as suas possibilidades, e ele vai se instituindo, e se instaurando, no âmbito do modo
ôntico de sermos.
A progressiva experienciação da realização do conflito, a suaprogressiva instalação
ôntica, a sua progressiva coisificação, tem sempre um caráter cada vez mais conflitual,
progressivamente conflitual, não produtivo, não criativo, e estéril.
A progressiva estase da coisificação, como Heidegger e Buber indicaram, é
progressivamente angustiante. Esta angústia da estase e da paralização remete, mais uma vez,
para ao modo fenomenológico existencial de sermos, para o modo de sermos do possível, da
possibilidade, e de sua atualização.
Nas suas formas produtivas, o conflito é sempre, também, o conflito de diferentes
possibilidades, na concorrência que as leva a afirmarem-se em suas forças. Em sua vivência, o
conflito também move as relações, e tem, assim, o caráter produtivo de promover a novidade, de
promover o possível, e a atualização de sua potência.

Um nível de conflito, e da sua angústia de sua aflição, na coisificação, é sempre


inevitável, assim. E diretamente proporcional a sua vivência ativa e presente, nos fluxos e contra
fluxos de suas inércias e da atualização de suas possibilidades.
Não obstante, o conflito pode, também, se tornar progressivamente improdutivo.
Angustiante, e improdutivo. Na medida em que estaciona em certos limites, e paralisa a
dinâmica de possibilitação, e de atualização de possibilidades da pessoa, da relação --
interpessoal, grupal, ou intergrupal.
Esta estagnação, esta paralisia, que constitui o conflito em sua improdutividade --
intrapessoal, interpessoal, grupal, intergrupal – potencializa-se naturalmente na medida em que
a realização, e coisificação progressivas -- consolidando a sua inércia, a sua coisificação, a sua
estase, a sua paralisia -- constituem o direcionamento natural e inevitável do desdobramento das
possibilidades. Com a concomitante aflição, afligência, da angútia que as acompanha.
Nesta forma, o conflito chega a suas aporias.
Em termos existenciais, a aporia é o sem passagem, é a estagnação, o sem devir, sem
potência, sem possibilidade, dos fluxos, ou ausência de fluxos, existenciais.
O termo aporia—usado originalmente em Literatura -- vem de poro. Que tem o sentido
de passagem, de passagem de fluxo. Poro, poria.
A a-poria é o sem passagem. O limite, a finitude. O sem passagem, a aporia, da
realização da possibilidade, e da paralisia nesta realização, da paralisia na coisificação e na
coisidade. Com a exclusão momentânea da concorrência de novos possíveis. Mas a aporia é,
também, o ponto onde as potências, os possíveis se detonam, mais uma vez. O método
aporético, a-por-ético, a a-por-ética, se pauta pela vivência afirmativa da aporia, pela
vivência afirmativa da sua estagnação; e pela vivência afirmativa da emergência da potência de
novos possíveis, de novas possibilidades. A potência desta emergência é diretamente
proporcional ao modo como podemos vivenciar afirmativamente a impotência conflituosa,
aflitiva, afligente e angustiante, da aporia

Assim, a afligência da aporia se configura, no plano existencial – pessoal, interpessoal,


intergrupal --, e se cronifica, como conflito.
O conflito se instala, se estabelece e se fortalece, enquanto tal, à medida em que se
paralisam os fluxos de atualização de suas possibilidades, no modo ôntico da existência pessoal,
grupal, ou intergrupal; o conflito se fortalece e se instala na medida em que se paralisa, ao nível
do modo ôntico de estagnação, e instalação, de suas aporias.
É, assim, na angústia de suas afligências, que se dá o reforçamento deste modo ôntico
da experiência do conflito -- a prevalência da experienciação de sua téorética explicativa, a
prevalência de sua comportamentalidade, a prevalência de suas pragmáticas, em suas aflições,
nas estases de suas aporias: potencializados pela excludência de sua vivência no modo de
sermos de sua poiese; potencializados pela exclusão de sua vivência estética, que é a vivência
no modo dialógico, ontológico, hermenêutico, ativo, atualizativo, de possibilidades, e de
possibilitações.
A progressão da realização, da coisificação, do conflito -- e do relacionamento
intrapessoal, interpessoal, ou inter grupal, só conduz, naturalmente, à acentuação do conflito. Na
medida em que estas se dão na ausência da vivência do possível, na ausência da vivência de
possibilidade; na ausência da ação, e da atualização, pessoal e coletiva, que é a vivência da
possibilidade e do seu desdobramento, própria ao modo ontológico, fenomenológico existencial,
de sermos.
O conflito é, desta forma, um momento adensado da multiplicidade de fluxos e
perspectivas existenciais.
Momento que naturalmente se resolve na vivência fenomenológico existencial e
dialógica da aporia, e de sua superação pontual, na abertura do concurso e da concorrência das
possibilidades, que são próprias ao modo ontológico, fenomenológico existencial de sermos.
De modo que, para além da vivência angustiante da estagnação e da aporia do conflito,
está sempre a poiese, a vivência poiética. Está sempre a vivência do concurso e da concorrência
de novas potências, de novas possibilidades. Cujos desdobramentos reencetam o fluxo
existencial, a atualização, a ação, a criação. A desinstalação, e a superação do conflito.

1.2. Realização e realidade do conflito e de sua instalação ôntica;


Podemos dizer que o conflito aparece fenomenológicamente em sua potência, ou seja,
vivencialmente, na vivência de suas possibilidades. A vivência do conflito neste seu momento é
a vivência da interação de forças, da limitação de forças; e a vivência das aporias são momentos
dos fluxo de atualização de possibilidades.
Esta vivência da potência do conflito faz com que o seu fluxo seja o próprio fluxo da
atualização. E, no que pese a momentaneidade de suas aporias, o conflito assim vivenciado é a
vivência dos fluxos de suas interações, de suas possibilidades, e atualizações. Que,
naturalmente, podem levar à superação de suas aporias, à superação do conflito, à sua resolução,
na criação da atualização de novas possibilidades.
Alternativamente, o vivencial, o fenomenológico existencial dialógico pode se
direcionar no sentido da sua coisificação, da sua realização, da sua instalação ôntica.
Nesta alternativa -- quando o conflito não se resolve no âmbito da experiência do modo
ontológico, fenomenológico existencial dialógico, de sua emergência -- ele perde,
progressivamente, a sua dinâmica experiencial e experimental, a suas forças de possibilidade, a
sua fluidez. E avança no sentido da coisificação, da realização, e da instalação de sua
experiência ôntica.
Desenvolve-se, então, a instalação do conflito, a realização do conflito, no âmbito de
sua experiência ôntica. O que significa a realização, a coisificação, a instalação de suas aporias.
A realização, a coisificação, a instalação do conflito. Desprovido, então, do influxo de
possibilidades e de possibilitação, próprias à vivência do modo ontológico de sermos, o conflito
tende a se instalar, a se coisificar, a se realizar, numa paralisia progressiva.
Tanto ao nível pessoal, quanto ao nível grupal, e inter grupal, quanto mais perdura a
interdição à vivência dialógica ontológica, fenomenológico existencial, mais tende a se
radicalizar, a se sectarizar, o conflito entre as partes. O conflito, privado da incisão da
emergência, e da prevalência, da vivência do possível, da vivência da possibilidade e do seu
desdobramento, da vivência da ação, da atualização, da criação, realiza-se. O que quer dizer:
coisifica-se, instala-se, e se cronifica.
Até que novos acontecimentos, ou a angústia de sua aflição gerem e regenerem um
retorno ao modo ontológico de vivência de suas possibilidades.
De modo que é só a incidência da momentaneidade do modo de sermos da vivência
dialógica, ontológica, fenomenológico existencial, estética, que permite o deslocamento, a
cisão, a infusão da potência de possibilidades, a infusão de devir, na instalação conflituosa.
Criando novas condições, e novas condições de possibilidade, permeabilizando as suas aporias,
e permitindo a passagem de seus fluxos existenciais e o fluxo de suas atualizações – quer seja ao
nível do pessoal, do inter pessoal, do grupal, ou do intergrupal.

1.3. Facticidade, e fatalismo, do conflito;


Na exacerbação da experiência de instalação real de seu modo ôntico, o conflito se
instala em sua condição de fato; e não mais como acontecer; o conflito se instala em sua
condição de acontecido, em sua facticidade.
O efetivamente existencial, o efetivamente ontológico, fenomenológico existencial e
dialógico, estético, é, inteiramente, acontecer.
Porque é inteiramente ação, atualização, como desdobramento das possibilidades, de
que é propriamente impregnado.
Ou seja, é o antípoda do fato, do factual, do acontecido.
O não existencial, o modo ôntico de sermos é -- enquanto fato, enquanto realidade,
enquanto coisidade -- possibilidade atualizada, exaurida, realizada, coisificada, acontecida, feita,
fato.
De forma que, o modo existencial, ontológico, de sermos é acontecer; enquanto que o
modo ôntico de sermos é acontecido, é fato.
A realidade do conflito, a sua instalação -- em sua aporia – o seu enrijecimento, é
instalação e realidade ônticas. À medida que se desenvolve, e se fataliza, o conflito é cada vez
mais da ordem da realidade, da ordem do fato, do factual. De modo que este seu fortalecimento
é cada vez mais factual, cada vez mais fatal.
E, cada vez mais, a exclusão da oportunidade da experiência e experimentação, pelas
partes, do conflito em sua modalidade alternativa -- ou seja, a experiência e experimentação do
conflito no seu modo ontológico, fenomenológico existencial e dialógico, no seu modo estético
– a exclusão desta oportunidade, potencializa a paralisia do conflito em sua realidade, instalação
e aporia.
De um modo tal que permite a constituição, e potencializa a constituição, de uma
dogmática -- segundo Buber, a dogmática do decurso das coisas –, segundo a qual só esta
modalidade da realidade, da instalação, da fatalidade e do fatalismo do conflito é factível.
O conflito, que é factual, neste seu momento, é constituído, e passa a sê-lo cada vez
mais, como fatalidade, como fatalismo.
Buber6 esclarece a ontologia da fatalidade, e do dogma da fatalidade, o dogma do
decurso das coisas, como predomínio da realidade, como predomínio excludente do modo eu-
isso de sermos, não dialógico, como predomínio do decurso das coisas.
Muito própriamente, Buber adverte, que, a única coisa que pode vir a ser fatal ao
homem é crer na fatalidade...
6
BUBER, M. EU E TU
Porque -- esclarece ele --, basta a momentaneidade da vivência da imersão, sempre
disponível, no modo alternativo de sermos, em nosso modo ontológico de sermos -- dialógico,
fenomenológico existencial, estético, eu-tu --, para que a rigidez do factual, a rigidez do fatal;
para que a rigidez da fatalidade, para que o dogma do decurso -- que a fatalidade potencializa, e
que à fatalidade potencializa -- possam dissolver-se no movimento da ação, no movimento
atualizativo da potência de suas possibilidades.
A elaboração da vivência do modo ontológico de sermos, como modo de sermos da
vivência do desdobramento de possibilidades, dissolve, assim, a realidade, a instalação ôntica, o
caráter factual, a fatalidade, o fatalismo do conflito.
Diante do conflito instalado, em sua realidade ôntica, factual, resta-nos, assim, a
alternativa: sucumbir progressivamente à afligência da factualidade, da fatalidade do conflito;
ou permitir e promover a experiência e a experimentação de sua vivência dialógica; a
experiência e experimentação de sua ontológica, a experiência e a experimentação da
interpretação de sua hermenêutica, a vivência da conflituação no modo fenomenológico
existencial, estético e dialógico de sua vivência.
É no privilegiamento desta experiência e experimentação que se centra a concepção e a
metodológica do Grupo Vivencial. A concepção e a metodológica da Abordagem
Fenomenológico Existencial de psicologia e psicoterapia; da Gestal’terapia, e da Abordagem
Rogeriana.

2.
A mediação e a facilitação da superação, e da resolução, como
experiência estética do conflito -- à ventura dos devires de suas
possibilidades. O Grupo Vivenciativo.

O Grupo Vivencial constituído com a equipe de facilitação, ou com o facilitador, e as


partes conflitantes é a oportunidade psicossocial de tempo e espaço, vivenciais, que a concepção
e a metodologia das psicologias e psicoterapias fenomenológico existenciais – Gestal’terapia,
Abordagem Rogeriana – oferecem como metodológica para a mediação e para a facilitação da
resolução de conflitos.
Trata-se de promover, de propor e de propiciar às partes em conflito o tempo e o
espaço, a disposição e a disponibilidade, para o natural processamento imediato da experiência e
da experimentação na vivência conflitiva. Ou seja, a experiência do conflito em sua forma
vivencial, estética, fenomenológico existencial dialógica.
O Grupo Vivencial naturalmente demanda as suas condições, ou seja, tempo e espaço,
disposição e disponibilidade para a sua experiência e experimentação.

2.1 A Experiência estética, experiência ontológica, fenomenológico existencial,


dialógica, do conflito;
Como vimos, a experiência do conflito, como todo o existencial, oscila entre as as
formas ônticas e ontológicas de sua experienciação. Ou seja, a experiência do conflito oscila
entre o modo de ser eu-isso, e o modo eu-tu de sua experienciação; entre o modo de sermos em
que ele, o conflito, é acontecido, e o modo de sermos, estésico, estético, em que ele é ação,
atualização, acontecer: o modo fenomenológico existencial de sermos: experiência e
experimentação imediatas da estesia, da sensibilidade, da vivência, do corpo e dos sentidos.
Em sua forma ôntica, eu isso -- a dimensão do acontecido --, a experiência do conflito,
privada do influxo de possibilidades e de possibilitações, privada de ação, de atualização – o
que quer dizer, privada de superação e de resolução --, se instala; interrompendo os seus fluxos,
realizando-se; coisificando-se, cada vez mais, e constituindo-se, como tal, enquanto acontecido;
enquanto factualidade.
Nessa dimensão, meramente, cada vez mais cristalizada, cada vez mais aflitiva,
conflitativa, as potências do conflito se investem meramente na sua aflição.
É interessante e importante observar que, para os sectários das partes em conflito, para
os que própria e especificamente ganham com o próprio conflito, esta é a alternativa de
predileção. Ou seja, manter a experiência do conflito paralisada na forma ôntica de sua
experienciação, na experiência da forma de sua instalação, de sua realidade realizada, de sua
factualidade, de sua fatalidade.
Os que se dispõem a elaborar a superação e a resolução do conflito carecem sempre de
lidar com os sectários, que investem na cronificação e na perpetuação do conflito.
A qualquer momento, não obstante, pode-se criar a oportunidade para que o conflito
seja vivenciado alternativamente pelas partes conflitantes ao modo ontológico de sermos, no
modo eu-tu de sua experiência e experimentação, ao modo dialógico de sermos.
E -- a partir da interpretação (fenomenológico existencial, compreensiva, dialógica), a
partir da dramática ampla e livre, da realidade, da factualidade, e da instalação, do conflito,
pelas próprias partes conflitantes em interação, a partir da interpretação de sua experiência do
conflito como acontecido -- o conflito pode, então, ser vivenciado e interpretado --
fenomenológico existencialmente, esteticamente, hermeneuticamente, experimentalmente,
dialogicamente, dramaticamente--, na imediaticidade de sua forma própria e específica de
acontecer.
Como vivência, pessoal/coletiva, que disponibiliza, enquanto experiência, e
experimentação, fenomenológico existenciais, o campo vivencial das possibilidades, e das
possibilitações. Campo estético, portanto, dramático, fenomenológico existencial, e dialógico --
vivência, e vivência do desdobramento de suas possibilidades. Vivência que, própria e
eminentemente, se dá como ação, como atualização. De Possibilidades que, simultaneamente,
são possibilidades próprias e específicas do grupo, no processamento conjunto de sua
experiência coletiva, da experiência coletiva de seus subgrupos, e de seus participantes
individuais.
Numa experiência e experimentação, assim, que são, em importantes de suas dimensões
-- na integridade e integração do grupo, na integridade participativa do processamento vivencial
--, experiência e experimentação, não simplesmente das partes segregadas, mas experiência e
exprimentação, interpretação: dramática, do grupo e da vivência de seu processamento
experimental, em seu con-junto.
Esta experiência e experimentação fenomenológico existenciais e dialógicas do conflito
são, assim, a experiência e a experimentação do conflito no privilegiamento do modo de sermos
de sua vivência estética.
Ou seja, no modo de sermos da vivência de sua estesia. Como abertura à experiência
pré-reflexiva, pré-comportamental, pré-pragmática, fenomenológico existencial dialógica, na
qual prevalece a experiência vivencial, a experiência de corpo, de sentidos; a experiência
estésica, estética.
Própria e especificamente, a Estética é uma Ética (O termo, aliás, já o diz).
A ética que subjaz à concepção e à metodológica da psicologia e psicoterapia
fenomenológico existencial; a ética que subjaz à concepção e metodológica da Gestal’terapia e
da Abordagem Rogeriana enquanto tais.
De modo que, quando propomos o grupo vivencial como metodológica de mediação e
de facilitação da resolução de conflitos, propomos, às partes conflitantes, um deslocamento do
modo da experiência do conflito meramente na forma ôntica de sua realidade e instalação, um
deslocamento da experiência do conflito meramente na forma ôntica de sua facticidade.
Propomos a afirmação do conflito, e a vivência do conflito em sua forma estética, vivencial, e
dialógica, que permite a diluição de sua realidade em suas possibilidades, a sua superação,
assim, e a movimentação de suas resoluções.
O que caracteriza a experiência estética, fenomenológico existencial, compreensiva,
dramática, dialógica, é que, como diz Buber, toda ela é ação, é atualização; ou seja, toda ela é
impregnada de possibilidades, e do desdobramento de possibilidades.
De modo que a vivência estética do conflito permite relativizar e sair da paralisia
afligente da instalação ôntica do conflito, do conflito como realidade, como isso, como
acontecido. Propiciando e potencializando o modo de sermos no qual vivenciamos a infusão de
possibilidades e de possibilitação, e dos seus desdobramentos, em ação, atualização,
interpretação. Infundindo, assim, a vivência do conflito de potência, de possibilidades, de
atualização, de movimento.

2.2 Dialógica, e a dialógica do conflito;


Na alternação da experienciação e experimentação do conflito nos momentos da
vivência de seu modo ontológico -- fenomenológico existencial, estético --, a vivência do
conflito pontualmente se desdobra no âmbito do modo dialógico de sermos, no âmbito da
vivência, da experiência e da experimentação, dialógicas.
Porque, própria e especificamente, o vivencial -- o fenomenológico existencial, o
estético, o hermenêutico, o ontológico --, é o dialógico.
O vivencial é dialógico, o dialógico é vivencial.
Individual, e coletivamente, o dialógico é o modo eu-tu de sermos, o modo de sermos
compreensivo, no qual vivenciamos a ação, o desdobramento compreensivo de possibilidades.
O que caracteriza a dialogicidade, o que caracteriza a qualidade dialógica deste modo
de sermos, é que, de várias formas, e em níveis variados, este é um modo de sermos de vivência
imediata e intuitiva. Vivência imediata e intuitiva da movimentação de implicação inter-ativa
entre um eu e a alteridade radical de um tu. Vivência esta que, como tal, é pré-reflexiva, pré-
comportamental, pré-pragmática.
É o modo de sermos no qual o processo compreensivo de produção de sentido – logos
–, que já se dá como ação, atualização, é – como diz o prefixo dia -- um processo
compartilhado. Processo compartilhado, como vivenciação, como movimentação inter-ativa –
de produção de sentido, e de atualização de possibilidades, de ação -- entre eu e tu.
É, portanto, dia-logos, enquanto vivência de movimentação inter ativa entre eu- tu.
Eu-e-tu que eminentemente se dão como alteridades radicais; e, enquanto alteridades radicais,
de modo intrínsecamente implicativo; como possibilidades em desdobramento.
Processamento momentâneo, então, no qual o compartilhar interativo da produção de
sentido, de ação, se constitui como campo compreensivo e compartilhado de desdobramento
de possibilidades, e de ação.
Assim, no modo dialógico de sermos -- fenomenológico existencial, vivencial,
ontológico, e estético --, o movimento eu-tu/tu-eu, é, própria e especificamente, um movimento
de imediata implicação inter-ativa, e poiética.
Movimentação na qual há um compartilhamento do processo, in-tensional,
eminentemente compreensivo, de produção de sentido, e de ação. Um processo inter-ativo,
eminentemente implicativo, que se dá como vivência de um campo compreensivo
compartilhado do desdobramento de possíveis, do desdobramento de potências, do
desdobramento de possibilidades, de vontades de possibilidades; no que entendemos como
ação -- um campo fenomenológico e existencial, dialógico, estético, e de vivência ontológica.
O objetivo da concepção e da metodologia da psicologia e psicoterapia fenomenológico
existencial – Gestal’terapia, Abordagem Rogeriana – o seu objetivo na vivência da mediação e
da facilitação da resolução de conflitos, seja na experiência grupal, ou na experiência da relação
diádica, é o de criar a oportunidade, o tempo e o espaço, que se abrem e privilegiam a
temporalidade própria da vivência dialógica.
Quando propomos o grupo vivencial como recurso para a mediação e para a facilitação
da resolução de conflitos, propomos exatamente porque no grupo vivencial nos abrimos e
privilegiamos a vivência do modo dialógico de sermos, a vivência da experiência e da
experimentação dialógicas.
No âmbito da experiência dialógica, os participantes, e os seus sub-grupos, podem
efetivamente inter-agir.
Não, simplesmente, na experienciação sectária, e impotente, da teorética do conflito:
com a mera definição e experiência conceitual, abstrata e estática de suas instâncias, por cada
uma das partes. Na impotência aflitiva e angustiante da ausência da vivência de possibilidades e
de possibilitações.
Nem, simplesmente, no mecanicismo, igualmente impotente, de nosso modo
comportamental. Nem na mera esterilidade das pragmáticas.
Os participantes e os seus subgrupos podem inter-agir, efetivamente, no processo
poiético de produção de possibilidades e de sentidos, a partir da dialógica, (eu-tu) da inter-ação
de suas alteridades. E podem interagir como sistema integrado, o processo grupal, de produção
de possibilidades e de atualização.
De modo que o conflito, vivenciado pelas partes conflitantes na momentaneidade da
experiência do modo dialógico de sermos, tende a ter a sua realidade, a estagnação de sua
instalação, a sua factualidade, a sua fatalidade e fatalismo, transformados, diluídos -- na
vivência da emergência compartilhada, dialógica, de suas possibilidades e possibilitações.
O campo dialógico constitui-se como, propicia e promove, o compartilhamento entre as
partes deste campo da emergência do desdobramento de possibilidades.
A vivência do conflito pode ser, então, atualizada.
O staus quo do conflito pode ser diluído em possibilidades, pode ser superado, e o
conflito deslocado, movimentado, eventualmente resolvido – como elaboração da dialógica da
integração tensional das partes conflitantes, no âmbito integrativo do processamento da
experiência e da experimentação da vivência grupal. A vivência do processo poiético de
emergência de suas possibilidades e possibilitações, a vivência, pelas partes conflitantes, da
experiência da diluição da realidade da instalação factual do conflito -- em suas possibilidades --
a vivência de suas superações, e resoluções, pode ser atualizadas.
Na mediação, e na facilitação da resolução de conflitos, a vivência dialógica pelas
partes conflitantes -- no âmbito da experiência de processamento do grupo vivencial --, permite
que as partes conflitantes momentaneamente constituam -- alternativamente à normalidade de
sua experiência conflitiva -- uma dimensão de vivência compartilhada de experiência e de
experimentação. Uma experiência e experimentação de vivência do processo grupal como uma
totalidade integrativa, compartilhada e solidária, ainda que tensional. Uma totalidade e
totalização dialógicas, inter-ativas, atualizativas.
Neste sentido, o que caracteriza a concepção e a metodológica das psicologias e
psicotrerapias fenomenológico existenciais dialógicas -- Gestal’terapia, Abordagem Rogeriana –
é, exatamente, o propiciamento metodológico desta experiência do campo dialógico, como
vivência grupal. Pelo privilegiamento em sua prática da experiência ontológica, da experiência
estética -- fenomenológico existencial dialógica. Seja no âmbito do grupo vivencial, seja no
âmbito da forma de relação diádica em que este pode se configurar.

2.3. Compreensão.
O modo de sermos da experiência estética, da dialógica, da aporética, da
interpretação, hermenêutica, fenomenológico existencial;

A compreensão é característica, e, própria e eminentemente, intríseca, ao modo


ontológico de sermos.
A compreensão é experiência estética, a experiência estética é compreensiva. A
experiência estética é vivência imediata de corpo e de sentidos, e esta vivência é, própria e
eminentemente, compreensiva.
A compreensão é intrínseca, portanto, ao modo fenomenológico existencial e dialógico
– eu-tu -- de sermos; é intrínseca à experiência e à experimentação fenomenológico existenciais,
é intrínseca ao empirismo fenomenológico existencial, é intrínseca à interpretação
fenomenológico existencial; e, portanto, é intrínseca à hermenêutica fenomenológico
existencial: hermenêutica própria e especificamente compreensiva. A compreensão é intrínseca
ao modo ontológico de sermos, à vivência ontológica.
O que caracteriza o aspecto compreensivo do modo ontológico, fenomenológico
existencial e dialógico de sermos é que ele é, especificamente, vivência empírica. Vivência, que
-- como todo vivencial, fenomenológico existencial, e dialógico -- é vivência imediata, pré-
reflexiva, pré-conceitual, pré-teórica, pré-comportamental, pré-pragmática, pré-realista, pré-
realidade.
Vivência que é anterior à representação; uma vez que, na verdade, a representação é
re(a)presentação. E, intrinsecamente, a compreensão é, própria e especificamente, a-present-
ação. Dá-se no modo pres-ente de sermos – o modo pré-coisa de sermos.
E o que é que se dá, o que é que, na vivência compreensiva, acontece como
apresentação ?
Pela abertura para o Ser, que é própria ao modo ontológico de sermos, inexoravelmente
abrimos o campo do possível, o campo da potência, o campo das possibilidades, o campo da
ação, da atualização – que são, segundo Heidegger, o campo do desdobramento compreensivo
das possibilidades, da poiese. São, assim, as possibilidades em seu desdobramento que se
apresentam, que se presntificam, como compreensão.
O desdobramento das possibilidades as constitui como conhecer – as possibilidades se
apresentam com conhecer, como sentido.
De modo que, segundo a sua potência, é a vivência das possibilidade e do seu
desdobramento -- na ação, na atualização, na interpretação compreensiva fenomenológico
existencial – que se constitui como conhecer.
O conhecer dá-se, assim, como apreensão – apreensão que é a constituição do sentido
do ato de conhecer. Conhecer compreensivo, uma vez que o sentido das possibilidades em seus
desdobramentos se constitui como apreensão, se constitui com(a)preensão – se constitui como
cum-preensão... compreensão.
A vivência de possibilidade e do seu desdobramento, a ação, é, assim, intrínseca ao, e
constituinte do modo compreensivo de sermos; como, de resto, é intrínseca, e constituinte de
toda a experiência e experimentação do modo fenomenológico existencial, dialógico; modo
ontológico, e estético, de sermos.
A vivência, o conhecer, compreensivos, é eminentemente conhecimento implicativo, é
implicação.
Ou seja, ele se dá como logos, dia-logos, como dialógica. Como vivência eu-tu. Como
vivência, portanto, que não é da ordem do relacionamento sujeito-objeto.
Afirmar isso é uma redundância, uma vez que tudo que a relação eu-tu não é é relação
sujeito-objeto.
De forma que o conhecer que a possibilidade constitui em sua vivência, e na vivência
de seu desdobramento, é conhecimento, é cognição; mas, em particular, é o conhecimento e a
cognição como apreensão – conhecimento cum(a)preensão – o conhecimento compreensivo
momentâneo próprio à vivência da dialógica da da relação eu-tu.
Na qual se dá, de modo inextrincável, a movimentação da implicação com a
alteridadade radical de um tu -- que se dá, na vivência dialógica, como possibilidade, e
possibilidade em desdobramento, na ação, no acontecer, da inter ação.
Não é conhecimento teórico, ex-plicativo, mas conhecimento vivencial, conhecimento
artístico, conhecimento dionisíaco, implicativo, compreensivo. O conhecer de uma consciência
embriagada, dissoluta em sua embriaguês, e que evolui em sua potência criativa, não para a
abstração, e para a clareza abstrativa do conceitual, mas para perder-se na embriaguês do
confusional de sua auto superação.
E ste e-vento, esta e-ventualidade inter ativa, à-ventura -- que é, assim, da ordem do
presente e da presença, da atuação e da atualidade -- escoa-se para a coisificação, para a
entificação, para a ontificação, e para a inação. Perdendo, inevitavelmente, neste seu
escoamento -- decaimento, para Heidegger --, o caráter de sua dialógica, o seu caráter imediato
de implicação inter ativa com a alteridade radical de um tu. Deixa, progressivamente, de ser da
ordem da implicação para, progressivamente, se constituir na ordem da ex-plicação.
Nesta forma ex-plicativa, a experiência pode se constituir com teorética, como
comportamento, no âmbito da causalidade e da dicotomia sujeito-objeto; no âmbito da
subjetividade, no âmbito da objetividade, no âmbito de inter subjetividade; no âmbito da
utilidade, no âmbito da prática, da pragmática, do fato – feito --, e da realidade.
Todo este modo ôntico de sermos -- eu-isso, factual, real -- não é caracterizado pela
compreensão, não é da ordem da compreensão, nem é da ordem da implicação -- implicação
que intrinsecamente se constitui no âmbito da compreensão.
O modo ôntico de sermos é, própria e especificamente, da ordem da ex-plicação... O
modo de sermos no qual estamos ‘fora’ do desdobramento inter ativo da implicação com a
alteridade radical de um tu. O modo de sermos no qual estamos fora da implicação com o
possível e com a possibilidade, em seus desdobramentos e constituição compreensivos.

2.4. Sobre o caráter implicativo da experiência estética, da dialógica, da aporética,


da compreensão, e da interpretação fenomenológico existencial, da
hermenêutica compreensiva.

No modo ontológico de sermos, fenomenológico existencial e dialógico, não vigora


assim a dicotomia sujeito-objeto. Não vigora a objetividade, nem a subjetividade; muito menos,
evidentemente, a intersubjetividade.
No modo ontológico de sermos, todas elas se resolvem na vivência da dialogicidade, eu-
tu, da experiência da ação, da experiência do ator. Que é intencional, e intensional.
O modo ontológico de sermos não comporta nem a objetividade, nem a subjetividade.
Mas é, própria e eminentemente, da ordem da relação eu-tu, da ordem da relação dialógica. É o
modo de sermos da vivência fenomenológico existencial, dialógica. Que se constitui como
movimentação da implicação necessária, dos sentidos da relação de um eu com a alteridade
radical de um tu.
Assim, na vivência ontológica, fenomenológico existencial dialógica – ao invés da
relação sujeito-objeto --, temos que, momentânea e pontualmente, o eu está implicado na
vinculação com um tu, que se dá como possibilidade em afirmação e desdobramento.
Toda a vinculação se desdobra, assim, como inter ação. Como inter ação entre
alteridades que se dão como possibilidades, como potências, como possíveis, que se desdobram,
como ação, na inter ação, eminentemente implicativa.
A inter ação, dialógica, eu-tu, é, eminentemente, assim, da ordem da implicação,
A experiência estética, a dialógica, a hermenêutica compreensiva – a interpretação,
compreensiva – são aspectos da experiência ontológica, fenomenológico existencial, dialógica.
De modo que são, todas elas, da ordem da inter ação, da ordem da compreensão, e da ordem da
implicação.
A implicação que é característica, portanto, da vivência, significa a implicação, o
movimento da vinculação necessária, pontual e momentânea, inter ação, entre a alteridade de
um eu, e a alteridade de um tu. Que se dão como possibilidades em processo de atualização,
processo este que se desdobra como inter ação.
De modo que a vivência do conflito na forma ôntica de sua instalação, na forma ôntica
de sua realização, na forma ôntica da coisificação de suas aporias, no seu caráter de ex-plicação,
é característicamente improdutiva. Porque nesta forma de sermos da explicação, não
vivenciamos o campo de possibilidades que é característico do modo ontológico, e
compreensivo, de sermos. Não vivenciamos a implicação de momentos de vivência eu-tu
possíveis e potentes. Não vivenciamos a inter ação, a ação, a atualização, que são característicos
do modo estético de sermos, modo ontológico, compreensivo, fenomenológico existencial e
dialógico.

2.5 Aporética. Aporia e Aporética do Conflito;


Um dos elementos característicos mais marcados da existência – e, por implicação, da
concepção e da metodológica das psicologias e psicoterapias fenomenológico existenciais –
Gestal’terapia, Abordagem Rogeriana – é a sua qualidade aporética.
Na verdade, esta ética, enquanto metodológica, vem já de Aristóteles, e é mediada pela
leitura e resgate que dele faz na Modernidade a psicoloogia do ato, de Brentano.

Pode-se evitar a aflição da estagnação do momento da aporia, evitando-se a sua


vivência, a vivência da aporia. O que significa a perda do caráter produtivo da aporia, e a
cronificação da aporia, do conflito, e de sua aflição. Além da fragilização da vida.
Para além, no limite, da aporia está a poiese, a potência, o concurso e a concorrência do
possível, das possibilidades; a ação, a atualização.
Tudo depende da insistência, e da persistência, na vivência da aporia, de seu
inconveniente e aflição, nas suas intensidades próprias, e nas formas próprias de seu modo
fenomenológico existencial dialógico.
A vivência afirmativa da aporia permite a abertura da experiência e experimentação da
vivência do possível, das possibilidades, e de sua atualização.
De modo que a apor-ética, o método aporético, é a disposição para privilegiar primaria
e afirmativamente a vivência fenomenológico existencial dialógica da aporia, na intensidade e
na intensificação próprias de seu momento, momentum.
A vivência da concentração da intensidade da aporia tipicamente conduz à superação de
sua estagnação, ao restabelecimento do fluxo do possível, à abertura do campo de novas
possibilidades.
A aporética se dispõe à afirmação da ação, à afirmação da potência do possível, e de
seus desdobramentos, na ação. Até que esta ação encontre a sua limitação, a sua finitude, a sua
aporia. Seja pelas finitudes de suas potências. Seja pelo concurso e concorrência de novas
possibilidades. A insistência e a persistência na vivência da finitude da aporia, com suas
implicações próprias, permite a abertura e emergência de novos campos de possibilidades,
dando origem a novos possíveis, e a novas aporias, a serem experienciadas e experimentadas.
A instalação do conflito é a instalação, e a estagnação, de sua aporia: a instalação
ôntica, factual, da aporia. Ou seja, a instalação da aporia no modo em que ela não pode
efetivamente ser vivenciada, e resolvida, superada.
De modo que, quanto mais as partes conflitantes se recusem à experiência da vivência
ontológica, fenomenológico existencial dialógica, da aporia de seu conflito, e dos fluxos de sua
superação, mais o conflito, em sua coisificação, tende a se acentuar enquanto tal, a se cronificar,
e a se instalar.
A apor-ética e o método aporético da concepção e da metodológica das psicologias e
psicoterapias fenomenológico existenciais – Gestal’terapia, Abordagem Rogeriana -- se
propõem, então, a reunir as partes conflitantes em um experiência vivencial – grupal, ou inter
individual -- que permite a vivência afirmativa compartilhada da aporia conflitual, em suas
intensidades fenomenológico existenciais e dialógicas próprias. Possibilitando, assim a
restauração do fluxo da vivência em direção aos limites da aporia, aos limites de sua superação,
na produção criativa, pelo sistema e pelo processo grupal, das possibilidades alternativas de sua
superação, pelo conjunto do grupo como um todo, conjunto que engloba as partes conflitantes,
na encarnação estética de sua elaboração fenomenológico existencial dialógica.

2.6 Hermenêutica do conflito.


Para além de suas aporias, o conflito é prenhe de possibilidades.
Antes da abertura dos campos de possibilidades e de interpretação de suas
possibilidades, as próprias aporias são potências, são possibilidades, a serem fenomenológico
existencialmente interpretadas. E só nesta forma fenomenológico existencial de sua
interpretação elas podem ser afirmadas, e esvaídas, superadas. O que envolve o deslocamento
da mera experienciação de sua instalação ôntica, para a sua vivência estética, fenomenológico
existencial dialógica. Vivenciadas as aporias, novas possibilidades podem emergir, e se oferecer
ao processamento da interpretação, da heremêutica fenomenológico existencial.
Estas possibilidades são, assim, detonadas nos limites de suas aporias. São
possibilidades a serem fenomenológico existencialmente, estéticamente, interpretadas, na
medida de sua urgência e emergência, na medida de sua potência, presença e atualidade.
Dada a adequada ambiência, essas possibilidades podem ser interpretadas pelos
próprios agentes do conflito. Na medida em que estes efetivamente puderem se constituir como
tais – ou seja, como agentes. Ou seja, na medida em que puderem dispor do espaço e do tempo
da experiência hermenêutica experimental em que se constitui a vivência.
É esta interpretação, fenomenológico existencial dialógica, das aporias do conflito, e
das dinâmicas e fluxos de suas possibilidades, por parte de seus próprios agentes, que pode se
constituir como um fluxo de atualização criativa do conflito, e que pode romper ou diluir, em
suas possibilidades, as barreiras da instalação de suas aporias, da instalação de sua realidade; e
conduzir o conflito para além de seu status-quo, na sua superação pela vivência da emergência e
atualização.
A Hermenêutica é a arte da interpretação7.
No caso, interpretação compreensiva, fenomenológico existencial, dialógica. Que é
como se constitui o tempo característico da vivência. A experiência da vivência fenomenológico
existencial dialógica é a experiência da vivência de possibilidades e do desdobramento destas.
Esta vivência de possibilidades e do seu desdobramento – processamento que é própria
e eminentemente estético, compreensivo, pré-reflexivo, fenomenológico existencial dialógico –
é o que entendemos como interpretação, e como hermenêutica, compreensivas.
Assim, quando propomos a experiência do grupo vivencial para as partes conflitantes,
estamos oferecendo a oportunidade de uma experiência de saída da realidade e da instalação,
da factualidade e da fatalidade, da aporia, do conflito, para uma experiência de diluição na
hermenêutica de suas possibilidades ativadas, e em desdobramento.
De modo que, em termos essenciais, a experiência grupal fenomenológico existencial e
dialógica é, própria e eminentemente, a experiência da vivência, individual e coletiva, do
desdobramento de possibilidades -- no que entendemos como ação, como interpretação
fenomenológico existencial.
O que define e caracteriza o espaço e o tempo, o processo, do grupo vivencial
fenomenológico existencial dialógico como espaço, tempo e processo eminente e
especificamente hermenêuticos. O espaço e o tempo, própria e especificamente, de uma
hermenêutica fenomenológico existencial dialógica. Compreensiva. Não explicativa.
Implicativa.
Aplicado assim à mediação e à facilitação da resolução de conflitos, o grupo vivencial
fenomenológico existencial dialógico permite que as partes em conflito interpretem
fenomenológico existencial e dialogicamente o conflito. O que efetivamente os constitui como
agentes do conflito.
Que podem, numa vivência compreensiva eminentemente hermenêutica, interpretar as
suas aporias; ao tempo em que podem interpretar, compreensivamente, as suas possibilidades
emergentes.

2.7. O Grupo Vivencial como recurso experimental ontológico, estético,


fenomenológico existencial dialógico, e hermenêutico, para a facilitação da
resolução de conflitos.
A insistência e a persistência na vivência, no modo vivencial de sermos -- que é
intrínseca vivência compreensivativa de possibilidades, e do desdobramento dessas
possibilidades-- é a vivência estésica. É estética, fenomenológico existencial dialógica. É
sensibilidade -- de corpo, de vivido e de sentidos -- e afetividade imediatas.
7
Palmer,
O termo estésico deriva do nome de um vento que sopra em determinada fase do ano, na
Grécia. E que impulsiona as velas dos navios, que deixam assim os portos.
Os Gregos identificaram a força propulsiva do estésico à força propulsiva inerente e
intrínseca ao modo fenomenológico existencial de sermos, modo, ontológico, modo vivencial de
sermos, dialógico. Que é todo ele impulsão: a impulsão que é a da ação --, pela força
propulsiva da vivência do possível, da vivência da possibilidade, da potência; que se desdobra, e
se desdobra como ação, atualização.
De forma que este modo fenomenológico existencial e dialógico de sermos – que é
estésico, que constitui a vivência estética, que é estético -- é todo ele ação, atualização, na
temporalização e espaciação de sua duração.
Estésico, e estético é, pois, o modo sensível e afetivo de sermos, o modo
fenomenológico existencial dialógico, modo vivencial de sermos: e, integralmente, é
intrinsecamente o modo de sermos da ação, da atualização.
Em sua potência propulsiva, de vivência momentânea e de desdobramento de
possibilidades, este modo ontológico de sermos potencializa-se como devir, como vir a ser,
como ação, atualização -- individual e coletivamente. E como superação da aporia, a porização,
o acesso, mais uma vez, à potência, à possibilidade, vontade de possibilidade.
O Grupo Vivencial, assim como a sessão inter individual, vivencial, fenomenológico
existenciais dialógicos, primam, conceitual, e metodologicamente, pela constituição, e
priorização, da experiência e experimentalidade da vivência estética – fenomenológico
existencial dialógica como vivência grupal. Pela aporética estética, pela vivência estética de
suas aporias, e do vir a ser das potências de suas superações.
Conceitual, e metodologicamente, o Grupo Vivencial, e a sessão diádica – uma
modalidade de grupo vivencial --, abrem mão de posturas científicas, de posturas teoréticas, de
posturas explicativas, de posturas moralistas, de posturas técnicas, de posturas pragmáticas, de
posturas comportamentais, de posturas realistas... Em privilégio de uma estética. Em privilégio
da experiência e experimentação vivenciais, fenomenológico existenciais, dialógicas como
experiência grupal.
Simplesmente porque os modos de sermos daquelas posturas não são da ordem do modo
de sermos próprio e específico da compreensão e da ação (Modo de sermos cum(a)preensão:
modo de sermos com apreensão da possibilidade e do seu desdobramento). Modo de sermos da
vivência da experiência da possibilidade, da potência, do possível, da vontade de possibilidade,
e do seu desdobramento, na experimentação e experiência da ação, atualização. Modo de
sermos da superação, da criação, da alegria.
Conceitual e metodologicamente, assim, o Grupo Vivencial, alternativamente,
privilegia, abre-se, e cria condições, para a vivência estética fenomenológico existencial,
dialógica -- o modo próprio de sermos no qual vivenciamos possibilidade, potência, devir, e o
seu natural desdobramento em ação.
De modo que são um espaço e tempo privilegiados para a vivência do destravamento do
conflito, enclausurado em sua comportamentalidade e em sua teorética explicativa; para o
destravamento de sua aporia, de sua instalação real.
Pela imersão em conjunto das partes conflitantes numa experiência coletiva grupal.
Que, pelo seu caráter fenomenológico existencial estético, aporético, se constitui, própria e
especificamente, como uma vivência compartilhada de secretação compartilhada de
possibilidades compartilhadas; e de secretação da ação, da atualização, que se constitui como
devir da propulsão do possível, e da atualização, da ação; para além da instalação das aporias do
conflito; para além de sua estagnação, e estanquização, dissolvendo a instalação realizada destas
aporias nas possibilidades que podem emergir da vivência compartilhada da estética do conflito.
Assim, a vivência grupal fenomenológico existencial dialógica, gestáltica, rogeriana, é
uma ambiência original e privilegiada para a mediação e para a facilitação da resolução de
conflitos.
Os grupos assim constituídos podem variar. Desde pequenos grupos diádicos – um
facilitador, e um cliente --, passando por grupos com três ou mais participantes, com um
facilitador; e grupos maiores, chegando mesmo aos grandes grupos. Para cada um deles se
providenciam as condições adequadas para a instauração pontual e momentânea da
temporalidade e da espacialização de sua vivência estética, fenomenológico existencial,
dialógica.
Desta forma, a concepção e a metodológica da psicologia e da psicoterapia
fenomenológico existencial dialógica – Gestal’terapia, Abordagem Rogeriana – privilegiam o
modo de sermos que potencializa naturalmente o modo ontológico de sermos de superação da
aporia do conflito, e de sua instalação realizada. Privilegiam a elaboração, a prevalência, e o
desdobramento, da vivência fenomenológico existencial, dialógica –, seja pessoalmente, inter
individualmente, grupal, ou inter grupalmente.
Recusando-se, assim, ao privilegiamento -- na abordagem da pessoa, ou na abordagem
do grupo, ou das relações inter grupais -- de uma abordagem teorética, ou científica, explicativa
e moralista; recusando-se a uma abordagem técnica, recusando-se a uma abordagem
comportamental, ou a uma abordagem pragmática; recusando-se a uma abordagem realista; a
concepção e método da psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial – Gestal’terapia,
Abordagem Rogeriana – privilegiam, na vivência pessoal, na vivência inter pessoal, na vivência
grupal, o modo ontotológico, o modo dialógico, o modo fenomenológico existencial de sermos.
O modo ontológico, modo dialógico, de sermos, é, própria e especificamente, como
vimos, o modo estético de sermos. O modo de sermos da experiência estética. Que é o modo de
sermos da experiência fenomenológico existencial, poiética: a experiência de vivência imediata
de corpo e de sentidos, modo de sermos da sensibilidade e da afetividade, que é da ordem da
experiência pré-reflexiva, e pré-conceitual, de vivência de possibilidades, e de vivência do
desdobramento de possibilidades. No que entendemos como ação, atualização: poiese, poiética,
estética.
De modo que, quando propomos a abordagem fenomenológico existencial dialógica da
Gestal’terapia e da Abordagem Rogeriana, para a mediação, e para a facilitação da resolução de
conflitos, propomos – à pessoa, ao grupo, aos inter grupos, -- um relativização da experiência da
instalação ôntica -- não estética, não poiética, e não dialógica -- do conflito – ,uma relativização
da experiência explicativa, do conflito, da experiência teorética, moralista ou comportamental
do conflito. Propomos uma relativização da factualidade, e da fatalidade, do fatalismo, do
conflito. E a imersão das partes conflitantes na experiência e experimentação dialógicas.
Trata-se de uma permissão, enquanto oportunidade de vivência, à momentaneidade da
experiência e da experimentação de uma estética do conflito.
Ou seja: propomos a permissão, como processo pessoal e grupal, à temporalidade da
elaboração, pessoal, grupal, de uma situação e do processamento de uma vivência coletiva e
individual, que privilegia, e se pauta, pela vivência do modo ontológico de sermos. Modo de
sermos fenomenológico existencial, dialógico, poiético. Que, em sua vivência, é, eminente e
ontologicamente, modo de sermos de vivência de possibilidade, e de vivência do
desdobramento de possibilidades.
Propomos o processo hermenêutico de inter-pret-ação fenomenológico existencial,
dialógica, de inter-ação interpretativa, pessoal e/ou grupal: ação, atualizção. Que -- à força da
potência de sua ventura estésica, do seu devir, da vida à ventura, do possível, -- é sempre
superação.
Superação que pode, efetivamente, ser gestada, e efetivamente criada e vivenciada,
pela(s) pessoas e pelo(s) grupo(s), pelas partes conflitantes. E que é superação -- movimentação
pela potência da possibilitação, da atualização -- das aporias do conflito. Superação
compartilhada do próprio conflito, em suas possibilidades, possibilitações, e devires.
Deslocamento e diluição, em suas possibilidadese possibilitações, da realidade da instalação do
conflito nas sua formas ônticas e factuais.

2.8. O Grupo e o tempo;


No essencial, a vivência grupal é a momentaneidade de um tempo. Da temporalidade
ontológica, compartilhada, em sua inter atividade implicativa, como experiência grupal.
À medida que, como experiência e experimentação grupais, sobre o funcionamento
ôntico explicativo – teorético, ou comportamental, pragmático – diferencia-se e prevalece o
modo compreensivo implicativo de vivência, fenomenológico existencial, dialógica, estética, e
hermenêutica, instala-se como vivência a duração da temporalidade ontológica.
Que se configura como temporalidade das possibilidades, em seus intrínsecos
desdobramentos: em suas intrínsecas atualizações. O tempo faz-se ao largo de sua condição
cronométrica, e passa a ter a própria ação, a própria atualização, a própria temporalidade da
vivência do desdobramento das possibilidades, como indício, como referência, e como critério.
O tempo ontológico é um tempo das intensidades, um tempo pautado pelas
intensidades. Diferente do tempo cronométrico, que que é monótono e se pauta pelos limites e
intervalos calculativamente definidos. O tempo ontológico fenomenológico existencial,
dialógico, hermenêutico -- temporalidade estética -- violenta, diminui, sobrepassa, e dilui, os
intervalos e os limites calculativos do tempo cronométrico.
A temporalidade ontológica é pulsativa, animado pela atualização das possibilidades. É
o presente, a atualidade e a presença. E se esgota em sua atualização criativa, cedendo, mais um
vez, lugar ao eterno retorno do tempo cronométrico.
Assim, o tempo ontológico inexoravelmente destina-se no tempo cronométrico. Sua
duração, não obstante, é antinômica e incompatível com os padrões calculativos e ônticos deste.
De modo que, constituir e elaborar a experiência e a experimentação do Grupo
Vivencial é constituir e elaborar, atualizar, a vivência da momentaneidade de sua temporalidade
própria. Que tem, dentro de limites razoáveis, critérios próprios de explicitação e de conclusão.
Ou seja, é preciso ter tempo, ôntico, disponível. A temporalidade ontológica,
fenomenológico existencial e dialógica, estética, e hermenêutica, ainda que possa se enquadrar
em limites razoáveis, e careça desses limites, tem um tempo próprio de explicitação e de
conclusão. Não pode, assim, ser simplesmente constrangida, inviabilizada, ou impregnada pelas
demandas do tempo ôntico.
O grupo vivencial requer, assim, tempo disponível para a constituição e experimentação
de sua temporalidade própria.

3.
O conflito, suas formas improdutivas, e as formas improdutivas da
mediação;

Como tudo que é vivencia humana, o conflito tem o seu momento agudo, em que as
possibilidades concorrem e competem como perspectivas originais, em atualização, na interação
entre as partes conflitantes. Neste momento, o conflito é vivido ontológicamente, e pode
afirmar-se enquanto tal, e vivencialmente escoar para sua natural superação e resolução.
Numa outra alternativa o conflito pode não se resolver em sua agudeza, e escoar para
uma forma ôntica de sua experiência, na qual as instâncias e aporias do conflito se instalam
factualmente, realizam-se, e cronificam-se.
Nesta forma, o conflito é experienciado em sua inércia, na paralisia inerte de suas
instâncias e aporias, na paralisia de suas angústias, e afligências.
Fora da poiese, e da ação, da atualização, fora da vivência do concurso e da
concorrência de novas possibilidades, a experienciação do conflito sai da perspectiva
compreensiva, e de sua intrínseca implicatividade, podendo se instalar em suas modalidades ex-
plicativas, moralistas, teoréticas, científicas, técnicas, comportamentais, pragmáticas ou
realistas.
Estas perspectivas explicativas apartam-se das perspectivas éticas fenomenológico
existenciais empíricas e experimentais – poi-éticas, est-éticas –, na proporção direta em que se
instalam. Buscam abranger o conflito reflexiva e conceitualmente, na ótica da busca, ou da
pressuposição, de verdades não compreensivas e não implicativas. Alheadas da vivência da
efetiva condição dos agentes do conflito – os quais, apenas, podem engendrar, pela sua ação,
pelo engendramento e atualização das possibilidades do conflito, as verdades a ele pertinentes.
Assim, o predomínio -- que exclui as possibilidades da vivência ontológica, estética,
compreensiva, e dialógica –, o predomínio da experienciação moralista -- que se esmera na
pressuposição do verdadeiro, ao invés do empenho hermenêutico em sua criação --, nas suas
formas teoréticas, explicativa e científica, constitui uma experiência improdutiva do conflito,
que, cada vez mais, se atola na experiência ôntica de sua instalação.
Da mesma forma ocorre com a limitação do conflito a sua dimensão comportamental.
Dimensão esta desprovida das possibilidades da poiética de sua ação, no âmbito de sua vivência
ontológica.
O modo comportamental em nossas vidas comporta a atividade padronizada e
repetitiva, alheando-se do modo ontológico, fenomenológico existencial, dialógico. Modo no
qual podemos vivenciar e atualizar possibilidades, no qual efetivamente agimos. Tratar o
conflito ao nível meramente de sua comportamentalidade é garantir a sua repetição, e reforçar
os elementos de sua facticidade, de sua instalação ôntica. O que, no limite, neste modo, pode ser
resolvido, apenas, pela violência. Mais ou menos explícita.
Um engano, ainda, é uma abordagem pragmática do conflito. Enganadoramente, uma
pragmática do conflito só pode ser estéril, e levar a um reforçamento de sua instalação, da
instalação de sua inércia e paralisia. Uma vez que o que desloca o conflito de sua instalação --
pela diluição de sua realidade em suas possibilidades -- é a sua vivência ontológica,
fenomenológico existencial, dialógica e estética.
Vivência que disponibiliza a experiência e a experimentação do campo ontológico,
dialógico, e estético das possibilidades.
A vivência ontológica é implicativa, eu-tu, como observamos: está fora da
dicotomização sujeito-objeto. Está também fora da ordem da causalidade. E, especialmente, até
por isso, fora da dimensão dos úteis e da utilidade.
A vivência ontológica, em suas efetividades de produção e atualização de
possibilidades, é da ordem do modo de sermos da inutilidade produtiva e desproposital...
Só assim se dá a vivência do campo das possibilidades, e o seu desdobramento, em
ação; só assim se dá a dialógica, a estética, a interpretação compreensiva, a hermenêutica
fenomenológico existencial, a criação, a superação...
A pragmática se pauta pela prática, pelo valor da prática, e da ação funcional,
adaptativa. A prática se pauta pela utilidade, e pelo princípio de sobrevivência.
E tudo que não encontramos na vivência ontológica, fenomenológico existencial, e
estética, é a utilidade. Ainda que a vivência ontológica, estética, fenomenológico existencial e
dialógica seja eminentemente produtiva, e criativa. Isso é o que significa dizer que ela é inerente
e intrinsecamente poiética -- pela ação em que se configura a atualização, o desdobramento, de
possibilidades. Poiese e criatividade estas que, produzem, inclusive, todos os úteis, e todas as
utilidades. Que não se geram e regeneram na esfera da experiência ôntica de sua existência. Mas
se geram e se regeneram, própria e especificamente na vivência do modo ontológico de sermos.
De modo que a insistência no pressuposto pragmático da utilidade, e da funcionalidade,
na metodologia para a resolução do conflito é insistir no encerramento dele nas formas ônticas
de sua instalação, pela interdição da possibilidade de sua vivência produtiva e criativa.
Quanto à funcionalidade, é evidente que o que almejamos não é a funcionalidade do
conflito, mas, mais propriamente, o que almejamos é a sua disfunção, superação e resolução.
Pela força de seus possíveis.
Esta disfunção do conflito decorre da diluição da instalação de sua realidade, da
realidade de sua instalação ôntica, na elaboração e atualização de suas possibilidades, das
possibilidades que se geram e regeneram na vivência de seu modo dialógico, estético,
fenomenológico existencial e dialógico.
Um outro aspecto extremamente importante quando consideramos a vivência ontológica
fenomenológico existencial, é que estamos tratando sempre, na momentaneidade do modo de
sermos desta vivência, de vivência de possibilidade, e vivência do desdobramento de
possibilidades. O possível é antinômico com a vivência do real, que a ele se contrapõe. Na
verdade, o possível atualizado se constitui em realidade, realiza-se. De modo que o acesso ao
campo das possibilidades, como vivência ontológica, exige que nos descolemos da vivência do
real, para desfrutarmos, especificamente, da vivência da possibilidade e de sua atualização, que
constitui a ação.
Ontológicamente, não somos seres do real, mas seres da possibilidade. A realidade é
progressivamente inóspita para o humano, como observou Heidegger, até que ele possa
experimentar e inspirar na fonte do possível.
De modo, que, ao contrário do que possa parecer, uma postura realista não condiz com a
postura da vivência grupal, da mesma forma que não convém com a postura da mediação e
facilitação fenomenológico existencial dialógica da resolução de conflitos.
Poder-se-ia dizer antão: e é uma postura irrealista, então, que é pertinente? Não
exatamente isto. À medida em que se começa a insistir, e começa a persistir, enquanto
experiência grupal, a vivência fenomenológico existencial, esta começa progressivamente a
caracterizar-se como a vivência ativa, produtiva; como a vivência da ação, como vivência de
possibilidades e da atualização de possibilidades. Que desloca-se do que podemos entender
como experiência da realidade, para caracterizar-se, cada vez mais, como vivência poiética,
vivência estética, fenomenológico existencial dialógica, que se constitui muito mais como
vivência de possibilidade, e de sua atualização; do que como vivência da realidade.

O conflito é sempre um momento particular da vida pessoal, da vida inter pessoal,


grupal e inter grupal. Sua evidência, sua explicitação, sua superação, e resolução são evidências
de saúde psicológica e social. Mas o conflito é um momento, um momentum, dos fluxos da
existência pessoal, um momento dos fluxos das relações interpessoais, grupais, e inter grupais.
Sua progressiva realização, e instalação, trazem consigo o sofrimento, e a redução desta
vitalidade. Esta instalação se dá na medida em que a experiência das partes conflitantes, em sua
individualidade e em seu conjunto, se detém e se demora na experiência de seu modo ôntico, de
seu modo factualizado, fatal, acontecido; eximindo-se, ou se privando, das formas, formações,
performações, figurações, atualizações, criatividade, do modo de sua vivência ontológica, de
sua vivência estética, fenomenológico existencial, dialógica.
A concepção e a metodologia de mediação, e da facilitação da resolução de conflitos
das psicologias e psicoterapias fenomenológico existenciais empenham-se no sentido da criação
de condições pessoais, interpessoais, grupais, inter grupais, para a respectiva vivência atual da
experiência do conflito em sua forma ontológica, em sua forma fenomenológico existencial,
dialógica.
Esta vivência permite a vivência do conflito ao modo de sua experiência estética,
vivencial – corpo, vivido, sentidos --, criativa. O que permite a vivência pelos participantes, e
conjuntos destes, das elaborações e desdobramentos fenomenológico existenciais dialógicos das
possibilidades da tensão e da situação conflituosa. E, com isso, a dissolução em suas
possibilidades da fatalidade e da instalação do conflito. E a sua superação.

BIBLIOGRAFIA DE REFERÊNCIA
BUBER, Martin EU E TU.
HEIDEGGER, Martin SER E TEMPO.
PALMER, R. HERMENÊUTICA.
13. Genuinidade na Abordagem Rogeriana.
A autenticidade fenomenativa, empática, dialógica, de
ser outro, em sendo ator.

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

A genuinidade do psicólogo, do psicoterapeuta, do pedagogo, do facilitador de grupos,


é uma das condições metodológicas da abordagem rogeriana. A genuinidade, não tem
aqui um sentido moralista, ou metafísico. Igualmente, não tem o sentido de uma
consonância com uma suposta vida interior.

Ao nos relacionarmos inter humanamente, dialógicamente, com o outro, somos


constantemente outros. O modo dialógico de sermos, fenomenológico existencial, é o
modo de sermos em que, na relação com o outro, somos constantemente outros.
Outros com relação ao(s) parceiro(s) da relação. E outros com relação a nós próprios,
com relação ao passado de nós próprios, já que o modo fenomenológico existencial, e
dialógico, de sermos é o nosso presente, a nossa presentidade. Modo de sermos do
presente, caracterizado pela vivência do desdobramento de possibilidades. que em
específico é a ação.

Cuja atualização implica na constante emergência e atualização da outridade de nós


próprios.

A originalidade, a genuinidade, a autenticidade de nós próprios, nós outros, portanto,


não está na mesmidade de uma identidade. Não está na mesmidade de uma
identidade com o passado de nós próprios.

Na condição do passado de nós próprios -- a condição específica de ente, de coisa,


impotente, sem forças/possibilidades --, cada vez mais nos angustiamos, como
observava Heidegger.

E a própria angustiação nos conduz, da condição de ente -- de coisa, impot-ente --¸ à


condição originária e ontológica de pré-ente. Da condição de ente, ao pré-ente, à pré-
ença. À presença. Ao não só fenomenológico, mas ontológico modo dialógico de
sermos, do presente: o modo fenomenológico existencial e dialógico de sermos,
compreensivo e implicativo; gestaltificativo.

Que é -- todo ele, na constatação de Buber --, atualidade. Atualização. Ação. Todo
ele ação, na momentaneidade instantânea da eventualidade de sua duração, como
duração da vivência fenomenológico existencial do desdobramento de possibilidades.

Isto quer dizer que é todo ele, este modo ontológico de sermos, vivência de forças,
vivência de possibilidades, que se desdobram em ação. É todo ele -- o modo
fenomenológico existencial e dialógico de sermos, compreensivo e implicativo,
gestaltificativo -- desdobramento cognitivo, consiência pré-reflexiva, fenomenal, de
forças, da vivência do desdobramento de possibilidades, ou seja, ação. Atualização.
As possibilidades, as forças que se dão em nossa vivência ontológica,
fenomenológica, dialógica, de ser no mundo, continuamente emergem, e se
desdobram, fenomenológico existencialmente; e são sempre radicalmente outras e
inéditas, infinitamente outras e inéditas, as forças que constituem a nosas vivência
ontológica.

A figurarem gestaltificativamente, e, na ação, a configurarem o nosso devir, a nossa


superação, e o sujeito no qual continuamente nos constituímos, junto com o mundo
que nos diz respeito.

Diferentes, diferenças, inéditas as possibilidades, somos sempre outros, ao atualizá-


las, ao desdobrá-las vivencialmente, fenomenológico existencialmente, ao agirmos.
Inéditos.

De modo que a originalidade ontológica de nós próprios, nossa genuinidade, nossa


autenticidade, é, sempre, fenomenológico existencialmente, a orginalidade e a
autenticidade de, como atores, sermos recorrentemente e constantemente outros.

Ser ator, agente, é ser outro (Mafffesoli), ser outro é ser ator. É ser ação, como
vivência fenomenológica do desdobramento de possibilidades.

É esta a nossa cíclica, renovativa e regenerativa, originalidade. A nossa cíclica e


renovativa genuinidade e autenticidade. A autenticidade de sermos constante, cíclica,
renovativa, e regenerativamente, outros.

É a presença da genuinidade desta outridade, característica da vivência do modo


fenomenológico existencial e dialógico de sermos -- compreensivo e implicativo,
gestaltificativo -- que se constitui como uma das condições da metodológica
fenomenológico existencial da abordagem rogeriana.

Desnecessário dizer que, como no caso das demais condições da metodológica da


abordagem rogeriana, existe uma fundamental meta condição das condições
metodológicas. Que é a da aquiescência com a momentaneidade instantânea da
vivência do modo fenomenológico existencial e dialógico de sermos, compreensivo e
implicativo, gestaltificativo. Uma aquiescência com o modo cognitivamente ativo,
especificamente atualizativo, de sermos.

Na vivência deste modo ontológico de sermos é que podem, sine qua non, deitar
raízes, na momentaneidade instantânea da relação, e frutificar, não só a empatia e a
consideração positiva incondicional -- que, junto com a genuinidade, formam o
conjunto de condições metodológicas formuladas por Carl Rogers --, mas a própria
ação, a própria, atualização, a própria tendência atualizante. E mesmo, naturalmente,
a própria tendência formativa, como característica especificamente gestaltificativa da
ação, como característica especificamente gestaltificativa da tendência atualizante.
Enquanto processo formativo de coisas, na duração da vivência fenomenológico
existencial de formação de figuras e fundos da ação, da atualização, da tendência
atualizante.

Naturalmente que medra todo tipo de distorções improdutivas com relação à noção de
genuinidade da abordagem rogeriana – assim como com relação às outras de suas
noções.
Com relação a uma noção de genuinidade, naturalmente, as fáceis e explicativas
interpretações moralistas e metafísicas ganhariam uma predominância. Estas
interpretações contradizem uma noção fenomenológica de genuinidade. Na medida
em que se afastam da premissa básica da genuinidade fenomenológica e existencial,
que é a vivência, que é o modo fenomenológico de sermos, a afirmação do modo
fenomenológico e existencial de sermos. Físico, e nunca metafísico. Ético, estético,
poiético, e nunca moralista...

Para privilegiarem o modo conceitual, o modo reflexivo, metafísico, explicativo, não


implicativo, nem compreensivo, de sermos.

Reduzindo a genuinidade a uma identidade com um modelo ideal, teórico, conceitual.


Explicativo. Acontecido. Não fenomenológico, nem existencial... Desconsiderando a
genuinidade como a presença da vivência do desdobramento cognitivo do possível.
Que chamamos de ação, de atualização.

Ou, de modo inconsistentemente objetivista, tratando de reduzir a genuinidade às


expressões de uma ‘vida interior’.

Vida interior inexistente, em termos existenciais. Na medida em que, como nos adverte
Nietzsche, a existência não tem dentro. E toda vida interior é doença...

A existência é a projetação, o pro-jeto (jato), projatação, da insistência (eksistencia


ontológica). Ou seja, a vivência, pré-reflexiva, pré-conceitual, fenomenológico
existencial, e dialógica, compreensiva, e implicativa; o movimento, a moção, e-moção,
e motiv-ação, como pressão, ex-pressão, do desdobramento pré-reflexivamente
cognitivo das forças que são as possibilidades.

As possibilidades emanam projetativamente, ex-pressivamente, do Ser. E se


constituem em nossa vivência de ser no mundo. Na qual não se distinguem ainda
sujeito e objeto, interior e exterior. Tal é a inconsistência da ideia de uma vida interior
como fonte de nossa verdade, de nossa originalidade, de nossa genuinidade, de
nossa autenticidade... Ontológicamente, não somos uma vida interior. Nossa
originalidade e nossa autenticidade não está numa suposta vida interior. Numa
suposta interioridade.

Referindo-se à interiorização, bem humorado, Nietzsche diria antológicamente, sobre


o caráter reflexivo da vida interior -- na miríade de suas frases antológicas:

Cuidado! Ele está a refletir. Vai defender a sua mentira... kkkkk (sorry)

Em momentos diversos também Rogers e Perls dizem frases antológicas. Em que, por
pouco, mas com graves implicações ontológicas e epistemológicas, erram na forma.
Nas palavras:

Rogers diria:

Os fatos são amigos.

Como era bôbo, meus deuses... Apesar de genial, e tão importante...


Não, não, Rogers!!!

Os fatos não são amigos!!!

Os fatos são fatos. E são especificamente feitos, viu?

E são amigos se, na performance do seu perfazimento, competentemente, damos


tempo à ação do possível para fazê-los assim.

Mas, de qualquer forma, é inexorável: os fatos não são amigos, além da possibilidade
de celebrá-los como bem feitos, bem fatos.

Além disso, os fatos são fatais. Fatídicos. Fatalidades. Fatalidade...

Além disso, a própria fatalidade (Buber).

Da qual temos que nos livrar, nas asas da alegria, da tristeza, ou da angústia, do
desespero... Para retornarmos ao modo de sermos do eterno retorno do possível, ao
modo de sermos do eterno retorno da vontade de possibilidade, da vontade de tudo –
tão diferente da vontade de nada que é o niilismo, que impera na fatalidade e no
fatalismo dos fatos.

Não, os fatos não são amigos.

Retornados ao modo de sermos do eterno retorno do possível, já não estamos mais


no domínio dos fatos, do feito, da fatalidade. Mas, mais uma vez, viajamos na potência
das velas do possível. Do desdobramento de possibilidades...

Já não estamos mais no domínio dos fatos, mas no âmbito dos atos. No âmbito
próprio da ação, da atualização. Que continuamente nos gera e regenera, como
constantemente possíveis, como constantemente outros, como constantemente
atores. A fonte da possibilidade, da genuinidade da outridade, da outridade da
genuinidade, a fonte de nossa originalidade, de nossa genuinidade, de nossa
autenticidade.

Outro que pensaria que perdeu um bom momento para ficar calado foi Fritz Perls.
Quando pronunciou uma de suas frases mais geniais – se entendermos, como a
Rogers, para além das palavras...

Perls disse:

O núcleo do real é a ação.

Que nada, Perls...

O núcleo do real é apenas a realidade. A real ordem do rei.

Senhor rei mandou dizer... (Nem mais temos rei...).

O acontecido, o passado, a coisidade, o impossível, o impotente, o fato, a fatalidade, a


explicação...
Mas, entendemos que não foi isso que você quis dizer, apesar de se embananar nas
palavras... Entendemos que, na verdade, você quis dizer:

O núcleo do verdadeiro é a ação.

Aí está o caráter genial de sua frase. Que o coloca no nível dos grandes e patéticos
ontologistas e epistemólogos do século XX... E você entendia muito bem o que era
isso, e o que isto queria dizer...

Há uma distância de mundos entre a realidade e a verdade...

Na verdade, apenas, uma distância entre modos de sermos. O modo de sermos da


realidade não é o modo de sermos da verdade. O modo de sermos da verdade é o
modo ontológico de sermos, fenomenológico existencial e dialógico, compreensivo e
implicativo, gestaltificativo. Especificamente o modo de sermos do acontecer.

O modo de sermos da realidade, como o nome indica, é o modo de sermos do


acontecido, da coisa, do fato; e, no seu abuso, droga pesada, na hiper realidade, o
modo de sermos da angústia, do fatalismo e da fatalidade, da impotência progressiva,
da morte – a possibilidade da impossibilidade de toda possibilidade... Como dizia
Heidegger. Que nos previne contra o acontecer. Contra a vida...

De modo que Perls queria, evidentemente, dizer:

O núcleo do verdadeiro é a ação.

Assim como Rogers queria dizer:

Os atos são amigos.

Amicíssimos, generosos, misteriosos, dádivas. Misteriosamente generosos, e


generosamente dadivosos.

Nietzsche já diria: a ação é um mistério... A virtude que dá...

O próprio possível, a força da possibilidade Não é à toa que se chama de presente.

E, uma das dádivas generosas do modo de sermos dos atos, da ação, da atualização,
fenomenológico existencial, compreensiva e implicativa, é que, própria e
especificamente, ele é dialógico. Ou seja, ele é, também, o modo de sermos do
compartilhamento (dia) do sentido (logos). O modo de sermos no qual não só
compartilhamos sentido (logos), mas compartilhamos a produção de sentido. Com o
sagrado, com a natureza não humana, e com os outros seres humanos, no inter
humano.

Uma das dádivas generosas do modo de sermos dos atos, do modo de sermos de
nossa genuinidade, é que ele é o modo dialógico de sermos, no qual compartilhamos
o processo poiético de produção de sentido, com os outros seres humanos, com a
natureza não humana, e com o sagrado.
A última fase da vida do Rogers, a dos grandes grupos vivenciais, a partir de 1974, é
fase de uma interessante e impressionante radicalização fenomenológico existencial.
Digo do ponto de vista vivencial, ontológico, epistemológico, e metodológico. Toda a
demanda existencial dos anos cinquenta e sessenta parece ter explodido dentro dos
laboratórios do Dr. Carl Rogers. Principalmente na vivência, concepção e método dos
grupos vivenciais. Os paz e amor da era hippie eram agora Phds. E, frequentemente,
muito pouco convencionais... Dr. Rogers, inclusive, frequentemente assumia ares de
um avôzinho degenerado...

Foi uma fase intensamente vivencial, e não teorética. E não resultou num movimento
coletivo de teorização das importantes aprendizagens que se deram naquele período
experimental. Foram formulações experimentais, e aprendizagens, muito importantes.
Para todo o paradigma da abordagem rogeriana, para a concepção e método do
trabalho com grupos, para a concepção e método da psicoterapia fenomenológico
existencial, para a psicoterapia em geral, e para a ontológica, epistemológica e
metodológica de uma ciência ontológica, epistemológica e metodológicamente
compreensiva, e implicativa. Superando ousadamente, na ação, os estreitos limites do
paradigma da ciência explicativa, no que concerne ao trato com as pessoas e com os
grupos.

Isso não é pouco. As histórias futuras da Fenomenologia existencial, da psicologia e


psicoterapia fenomenológico existencial, as histórias futuras da Ontologia e da
Epistemologia da ciência compreensiva, terão, sem dúvidas, que mencionar as
experiências e experimentações rogerianas, principalmente no que concernem aos
trabalhos com grupos.

Pela experimentação e aprendizagens desta época, fica claro que as condições


terapêuticas formuladas originalmente são, na verdade, características, ou dimensões
de uma metacondição específica. Que é a subsunção epistemológica e metodólogica
delas a uma fenomenológica, a uma dialógica, a uma ontológica.

Ou seja, as condições terapêuticas, pedagógicas, e facilitadoras preconizadas


originalmente subsumem-se em uma epistemológica fenomenológico existencial, e
são, na verdade, aspectos e dimensões da vivência fenomenológico existencial e
dialógica, compreensiva e implicativa, gestaltificativa. Assim o são, própria e
especificamente, a empatia – a compreensão empática, que é uma designação
redundante, uma vez que toda compreensão é empática, e toda empatia é
compreensiva... --, a consideração positiva incondicional pela experiência do cliente, e
a genuinidade do terapeuta.

Assim, quando se trata de genuinidade, não se trata da fidelidade a uma vida interior,
introspectiva, subjetiva ou objetiva, explicativa e teorética. Mas a abertura, como dizia
Heidegger, da liberdade para verdade do vivencial, no âmbito da dialógica de uma
relação fenomenológico existencial, compreensiva, implicativa, gestaltificativa.

Num primeiro momento, desenvolvendo uma Psicologia e uma Psicoterapia da


relação. Carl Rogers tentava superar a neutralidade, objetividade e frieza de uma
postura técnica, de uma postura cientificamente explicativa. Desde o início, Carl
Rogers entendeu perfeitamente, que, em se tratando de gente, uma ontologia, uma
epistemologia, uma metodologia, uma ética, explicativas não atenderiam às demandas
da condição humana. Por isso que tratava-se de abrir mão, enquanto postura
metodológica, da fatalidade e do fatalismo, da artificialidade, da explicação; e abrir
caminho para uma ontológica, para uma epistemológica, para uma metodológica, para
a ética de uma ciência própria e especificamente compreensiva, e implicativa.

Esta, própria e especificamente, fenomenológico existencial e dialógica, compreensiva


e implicativa, gestaltificativa, só faz sentido no âmbito de uma genuinidade. Que
termina ficando clara, posteriormente, como a genuinidade da verdade da abertura
vivencial, que é toda ela a cognitiva fenomenológico existencial da ação, do
desdobramento de possibilidades.

Carl Rogers quer abrir mão do engessamento explicativo do institucional. E entende


que, para além do institucional, para aquém da explicação, existe a possibilidade de
relações inter humanas, implicativas, dialógicas, compreensivas, fenomenológico
existenciais. Que reconhecem, e afirmam o institucional. Mas que o têm como chão, e
não como teto, como limite. De modo que não vê mais como necessário a crônica
definição, e a crônica limitação da relação ao explicativo e ao institucional. Na
verdade, passa a ver a necessidade de superação dessa limitação ao engessamento
institucional e explicativo da relação entre psicólogo e cliente, entre terapeuta e cliente,
ente facilitador e grupo, entre professor e aluno... A definição da genuinidade, e de sua
importância como elemento ético e metodológico, surge neste contexto.

Para além da superação da relação institucional, há a necessidade de franqueza por


parte do psicólogo, do pedagogo. E não só a franqueza, num sentido moral, mas as
próprias condições de ser franco, e engajar-se no que Buber define, no Do diálogo e
do dialógico, como conversação genuína. Ou (op.cit) como a abertura, em detrimento
da imposição, enquanto modo de relação.

Rogers teorizará sobre a genuinidade do terapeuta a partir de sua teoria do fluxo da


experiência8. A genuinidade é então o estado de acordo do terapeuta... Uma teoria útil
e interessante durante um certo momento. Mas bastante precária do ponto de vista
teórico e epistemológico.

Depois das avassaladoras experiências, experimentações, e aprendizagens com os


grupos vivenciais, que já não são mais os Grupos de Encontro, é que podemos
entender que a genuinidade, como as outras condições da metodológica da
abordagem rogeriana, na verdade são elementos de uma condição maior, à qual se
subsumem: a ética ontológica fenomenológico existencial, a metodológica
epistemológica da vivência da ação, da atualização, fenomenológico existencial e
dialógica, compreensiva, implicativa, gestaltificativa.

De modo que a genuinidade é a genuinidade da ação. A genuinidade do modo ativo


de sermos, do modo afirmativo de sermos. A genuinidade de sermos outros. Em
particular porque é só a duração na insistência, no modo de nos atualizarmos como
outros, que nos permite a vivência da duração na dialógica inter humana, na qual é
possível inter agir com a outridade do outro. E com a outridade de nós próprios.

Nesse sentido, é interessante observar que a ação, a genuinidade da ação, é pré-


reflexiva; dá-se no modo pré-reflexivo de sermos.
8
ROGERS, Carl Psicoterapia e Relações Humanas.
De modo que é a projetação inspectativa da ação. Na qual vivemos a condição
inspectativa de atores.

E não de espectadores. Nunca, efetivamente, espectadores de uma interioridade de


nós próprios.

O modo acontecido de sermos é o modo reflexivo de sermos, no qual nos cindimos


num sujeito que se dobra, que se flete, flexivamente, reflexivamente, sobre objetos.
Um sujeito, portanto, que é espectador -- ex-pectador --, de objetos.

Mesmo quando estes objetos são um suposto si mesmo. O si mesmo como objeto:
objetivismo...

Na ação, o modo de sermos do acontecer, da atualização, o ator, evidentemente, não


é espectador – a não ser de modos bastante corrompidos, e doentios... Na ação, o
ator é efetivamente ator, inspectador, inspectativo, inspectação. Na ação o ator é
unificado na vivência da projetação inspectativa do desdobramento expressivo de
possibilidades. Na genuinidade da ação somos projetação inspectativa.

Vale a observação de Nietzsche, não temos dentro. E toda vida interior é doença...
Buber diria, na sua duração, o modo ontológico de sermos é todo ele ação.

Genuínos sejamos, é a consigna do método.

Mas não reflexivamente, não conceitualmente, não teóricamente, não


explicativamente, não moralisticamente, não fatalísticamente, não realísticamente, não
na identidade do mesmo.

Mas genuínos na momentaneidade instantânea fenomenológico existencial da


vivência da ação, da vivência fugaz e duradoura da condição do ator, que se confunde
com a condição de ser outro.

BUBER, Martin Eu e Tu.

- Do Diálogo e do Dialógico.

HEIDEGGER, Ser y Tiempo.
MAFFESOLI, A Conquista do Presente.

NIETZSCHE, Assim Falava Zaratustra.

PERLS, Fritz Gestalt Terapia.

ROGERS, Carl Tornar-se Pessoa.

- Psicoterapia e Relações Humanas.


14. DA INCONDICIONALIDADE DA PESSOA
NA ABORAGEM ROGERIANA
Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

Talvez não passe adequadamente percebido que Carl Rogers elevou a


importante instância ética, e princípio político, e metodológico, a consideração
pela pessoa, qua pessoa, política, e pela pessoa em sua ontológica
fenomenodialógica. Não é pouco.
Ao lado de sua insistência na ação -- no poder naturalmente criativo,
superativo, e regenerativo, da ação, à qual designa como tendência atualizante
--, um dos aspectos mais básicos, e brilhantes, da concepção e da
metodológica relação da abordagem rogeriana é a radicalidade de seu respeito
incondicional pela pessoa. E pela ontológica compreensiva, e implicativa, da
relação com a pessoa. Respeito este como constituinte de uma relação que
metodologicamente potencializa a persistência na vivência fenomenodialógica
da ação, a atualização, no modo de sermos de sua dialógica.
A concepção da consideração positiva incondicional pela experiência da
pessoa é uma instância ética crucial, importantemente política, e metodológica.
Ela implica, necessariamente, o respeito incondicional pela pessoa política, o
respeito pela fenomenológica da relação inter humana, que implica o respeito à
pessoa como outra, o respeito à pessoa como tu.
Respeito que só se dá, evidentemente, num reconhecer, e conhecer, a
pessoa particular e fenomenológico existencialmente empírica, e dialógica, em
sua alteridade. O modo próprio e específico do conhecer como acontecer;
empático. O conhecer fenomenodialógico, e existencial, compreensivo, e
implicativo. Numa palavra, o conhecer no âmbito compreensivo da
momentaneidade instantânea da relação empática.
O que quer especificamente dizer: fenomenodialógica.
Empático quer dizer: no modo páthico de sermos. No modo de sermos
do ‘pathos’. E o modo de sermos do pathos, além de fenomenológico, e
ontológico, é própria e especificamente dialógico.
Muito equívoco em torno do conceito do termo pathos. Equívoco que se
repete quase que maquinalmente. Ou até com pretensões a novidade.
Primeiro, é preciso considerar que o sentido do termo pathos que
prevalece entre nós é o sentido Latino, Romano, da palavra. Que tem a ver
com paixão, na verdade o excesso de paixão, como doentio, como sofrimento,
como doença.
Originariamente, não obstante, no seu sentido Grego, anterior ao Latino,
Romano, a palavra pathos não tem este sentido.
Mas refere-se à estética da sensibilidade emocionada. À estética da
vivência fenomenológica, que é, propriamente, fenomenodialógica.
Naturalmente motiva, emotiva, emocionada, e motivativa. O termo Grego
refere-se, assim, à estética natural e intrinsecamente motiva, e emotiva, da
vivência da ação, da atualização.
Empatia é, assim, a estética do pathos, a estética fenomenodialógica da
vivência do modo ontológico de sermos da ação. Eminentemente compreensivo,
e implicativo; naturalmente motivo, e motivacional; e originária e naturalmente
tingido pela emoção ontológica.
A empatia -- como ontológica do modo fenomenológico e existencial de
sermos, compreensivo e implicativo -- é eminentemente dialógica. De modo
que é, em essência, na duração de sua momentaneidade instantânea, a relação
com uma alteridade. Com a alteridade do tu.
Seja na esfera da relação com a natureza não humana, na esfera do
inter humano, seja na esfera da relação com o sagrado.

Eminentemente empática, a condição da consideração positiva


incondicional pela experiência do outro tem, assim, um profundo arraigamento
dialógico, fenomenodialógico. Inter humano. Ontológico. E implica a
compreensão profunda e radical de que, ao nível da vivência ontológica, pré-
reflexiva, fenomenológico existencial, e dialógica, compreensiva e implicativa, a
sua experiência e experimentação se dão como a dialógica da relação com a
alteridade radical de um tu.

Enquanto alteridade (o caráter daquilo que é outro), na momentaneidade


instantânea da duração da dialógica da relação eu-tu, o tu se dá em sua
autonomia radical, como possibilidade, como desdobramento autônomo de
possibilidades. Que é sempre cognitivo, e implicação da dialógica da relação, na
pontualidade de sua momentaneidade instantânea.
Na dialógica da relação, não podemos, e não pode o eu, determinar o tu.
O tu se dá, sempre como devir da atualização de possibilidades
alteritárias, que, continuamente, se produzem, no âmbito dialógico, cognitivo,
da momentaneidade instantânea do modo de sermos de uma relação muito
peculiar – a relação eu-tu (Buber).
Que, em termos de vivência fenomenológico existencial e dialógica,
compreensiva e implicativa, gestaltificativa, dá-se como projetação cognoscente
do desdobramento de possibilidades, como desdobramentos de forças plásticas,
plastificativas.
E que não é, como modo de sermos, como vivência, da ordem do modo
de sermos da dicotomia sujeito-objeto. Modo de sermos da ação, modo de
sermos do ator, do acontecer; diferente do modo de sermos, acontecido, do
espectador – no qual se constituem sujeito e objeto, e a sua teorética
dicotomização.
O acontecer da dialógica da relação eu-tu não é, portanto, e por isso, da
ordem da teorética; nem da ordem do moralismo. Igualmente, não é da ordem
das relações de causa e efeito; nem da ordem da utilidade; não é da ordem da
técnica. Nem mesmo, como vivência, da ordem da experiência da realidade --
uma vez que a experiência da realidade é da ordem do acontecido, e a vivência
do acontecer fenomenológico existencial e dialógico, compreensivo e
implicativo, gestaltificativo, é em específico o acontecer. Da ordem da verdade,
como nos mostra Heidegger, que é o acontecer; mas não da ordem da
realidade, que é o acontecido.

A consideração positiva incondicional pela experiência do outro é


condição, assim, da relação fenomenodialógica com o outro na
momentaneidade instantânea de seu acontecer ontológico.
De modo que, no âmbito da momentaneidade instantânea da relação eu-
tu, não posso determinar o tu. Que é um foco autônomo de produção de
sentido (Husserl). Sentido dele próprio, e o próprio processo de geração e de
constituição de sentido que se desdobra como a dialógica da relação.
Além do que, sobretudo, como enfatiza Buber, o tu não é objeto. Em
nenhuma circunstância o tu é objeto. Nem sujeito (da mesma forma que o eu
não é sujeito, mas, como o tu, projeto, projetação do desdobramento de
possibilidades, projeito). Projeto, projetação que se desdobra enquanto vivência
como impulsão do desdobramento de possibilidades, no âmbito da
momentaneidade instantânea da dialógica da relação. O tu não é objeto de um
sujeito, eminente e especificamente espectador; mas parceiro intrínseco da
momentaneidade instantânea da dialógica da ação, inter ação, do ator.
Em não sendo objeto – nem o eu sujeito --, o tu, como o âmbito da
própria relação eu-tu, não teorético, não é conceitual, mas intensional, pré-
conceitual, compreensivo, e implicativo. Além de dialógico, naturalmente.
Estão, o tu, e a própria relação eu-tu, fora do modo teorético de sermos
da moral e do moralismo. Estão fora do modo de sermos da causalidade, das
relações de causa e efeito; fora do modo de sermos da técnica, da utilidade, da
realidade – como características próprias do modo acontecido de sermos.
Já que o modo dialógico de sermos é da esfera do modo de sermos do
acontecer. Cuja vivência caracteristicamente se dá fora do modo teorético de
sermos, do modo de sermos do sujeito e do objeto, e do modo de sermos da
própria dicotomia sujeito-objeto; fora da causalidade, fora do explicativo modo
de sermos da ciência explicativa. Fora da utilidade; e, como acontecer, fora da
experiência acontecida da realidade.

Mas, dentre as peculiaridades do âmbito do modo de sermos do


acontecer da dialógica do eu-tu, está a de que esta esfera, ainda que autônoma
e afirmativa, carece da afirmação, afirmação da afirmação, por seus partícipes.
O eu-tu, o eu, e o próprio tu, carecem e demandam afirmação recíproca,
para se desdobrarem.
De modo que só existe relação na afirmação da dialógica. Só existe
dialógica na afirmação do tu – do eu e do tu, da dialógica do eu-tu.
Quando há uma recusa à afirmação do tu, à afirmação da relação eu-tu,
a própria relação eu-tu se desvanece, e escoa momentânea e instantaneamente
no sentido do modo eu-isso sermos, objetivo, e coisificado.
De modo que podemos explicarmo-nos – des-implicarmo-nos --, com
relação ao tu. Podemos extinguir a momentaneidade instantânea da perduração
do evento da relação eu-tu... Mas não podemos determinar a alteridade e a
geração alteritária do tu, e dos seus sentidos. Da mesma forma que não
podemos fazê-lo com relação ao próprio eu, que se confronta com o tu de si
mesmo... Assim como não podemos determinar a alteridade e a geração
alteritária das possibilitações e dos sentidos da própria relação eu-tu.

Daí a ontológica instância ética, o princípio político, e o princípio


metodológico fenomenodialógico da consideração positiva incondicional pela
experiência do outro na relação inter humana. Como uma conditio sine qua non
da dialógica.
Como afirmação da presença alteritária da pessoa do outro, e do tu, E da
própria relação eu-tu, na fenomenodialógica do encontro.

A instância ética e o princípio, político, e igualmente metodológico, da


consideração positiva incondicional têm a sua importante e fundamental
implicação política.
A consideração e a aceitação, a celebração mesmo, da pessoa política,
qua pessoa – que era muito comum à abordagem rogeriana -- em sua
alteridade. Como pessoa, a pessoa é digna de um respeito e de uma
consideração positiva e calorosa. Isto é um princípio ético e político de respeito
pela pessoa como pessoa. Não envolve nenhum tipo de aceitação ou
aprovação. Mas é um princípio de consideração positiva pela pessoa genérica
que se particulariza e encarna na pessoa empírica.
Há confusão quando se mal entende a instância ética e o princípio
político e metodológico da consideração positiva incondicional como um
princípio moral. Não o é. É uma instância ética e um princípio de respeito e
consideração, e mesmo de celebração, pela pessoa genérica que se
particulariza na pessoa empírica.Só isso. E não é pouco. E não um pricípio
moral, um tipo de aceitação moral do que quer que seja da pessoa particular.
Princípio ético, político e metodológico a consideração positiva
incondicional pela experiência do outro estabelece que inclusive, e em
particular, o excluído e oprimido, é sempre outro, ontologicamente outro,
inteiramente outro, e inteiramente hábil, eticamente hábil, para o encontro
dialógico. E que, mesmo enquanto outro com o qual não interagimos, sua
pessoa enquanto pessoa genérica e particular merece um respeito, e uma
celebração, incondicionais. E merece ser respeitada enquanto outro em sua
alteridade, que só pode ser devidamente tratada, apreciada, descoberta, e
criada, no âmbito dialógico da relação inter humana propriamente dita.
Numa república incompleta (Raimundo Faoro) como a nossa, derivada de
intensos processos coloniais da história da humanidade, que resultaram e
resultam na escravização e na submissão de povos, cujos descendentes se
constituem como as maiorias oprimidas e excluídas de nossos cidadãos,
alteritários sempre; numa república incompleta, na qual medrou e medra como
erva daninha, ou como um processo degenerativo, a gênese deficitária ou a
deterioração social de uma instância ética e política radical de respeito para
com a pessoa, e para com a própria vida – ética e princípio político que na
prática, de modo tácito, não valeriam para a maior parte da população, as
classes despossuídas; em verdade não valem para ninguém; – numa república
incompleta na qual, inclusive, a Psicologia e os psicólogos frequentemente
assumem uma cínica e tácita negação do respeito e da própria condição
humana da alteridade do oprimido e excluído, e negam ideologicamente a
própria realidade social e histórica do oprimido e excluído; o princípio ético,
político e metodológico da consideração positiva incondicional, e sua reiteração
e afirmação, ganham uma importância ética, política, metodológica e humana
fundamentais.
É com relação à pessoa genérica, com relação à pessoa política em sua
alteridade; é na ontológica da relação dialógica com a pessoa ontológica,
empírica, fenomenodialogicamente empírica, não teorética, nem explicativa, é
na implicação que se impõe os princípios éticos, políticos e metodológicos, da
consideração positiva incondicional pela experiência do outro.
Devemos a Carl Rogers a afirmação e a reiteração desta instância ética,
deste princípio político, e deste princípio de método fenomenodialógico e
implicativo, no âmbito tão alienado e ideologicamente comprometido e ruinado
da Psicologia e da Psicoterapia.
15. JOHN

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

Chego de madrugada a Maceió, vindo do trabalho em Salvador...


Um grupo ótimo em Salvador... Com pessoas especiais e queridas, com
momentos muito ricos, emocionantes, e felizes...
Nesses momentos, à tarde, eu lembrara com amizade e gratidão do John...
Com quem eu tanto aprendera sobre grupos vivenciais, com quem eu, de um modo
importante, aprendera a facilitar grupos, e com quem eu vivera tantos grupos, e tantos
momentos especiais de grupo...
Pego o carro, no estacionamento do aeroporto. E, meio “sonado” e
vagarosamente, dirijo-me para casa. Tentando sintonizar o rádio, que estava com a
sintonização difícil, para ajudar a me mater acordado.
Trabalho cumprido, repouso merecido em breve...
Mais uma vez o John, da mesma forma, me vem à memória... Quase que
simultaneamente, à sintonia...
No rádio, é Djavan cantando...
Um pouco confuso, e com interferências...
Demoro um pouco a perceber que ele canta, exatamente, a mesma música de
onde tirei um verso para fazer uma citação na 'apresentação' que o John me pedira,
anos atrás, para um livro dele...
‘Por ser exato, o amor não cabe em si...
Por ser encantado, o amor revela-se’...

Assim era com o espanto, eu dizia...

O livro do John chamava-se-ia Vestígios de Espanto...

Menciono a 'sincronicidade' por que o John tinha muito a ver com esse tipo de
experiência... Tinha uma abertura muito natural e particular para o insólito, para o
improvável... Era um tipo de liberdade que o dispunha de um modo especial para a
vivência do “'todo’ diferente das partes”. E “diferente”, em particular, “da soma das
partes”, da multiplicidade dos grupos, de suas multiplicações...
Duas carcterísticas me pareceram muito peculiares ao John. Esta abertura
natural para o insólito e improvável, bem assimilada à normalidade cotidiana, e sempre
enquadrada por um bom humor suave e fino; e uma tolerância virtualmente
inesgotável... Pedra fundamental, com ele aprendí, da compreensão e da facilitação
de grupos...

Conhecemos o John quando da segunda vinda ao Brasil do Rogers e


colaboradores, no Grupo Vivencial de Arcozelo. Trazidos ao Brasil pela ousadia de
Eduardo Bandeira.
O staff de Norte Americanos era composto pelo Rogers, o John Wood, a
Maureen Miller, Maria Bowen, e o Jack Bowen.
]
O John tinha meio que uma aura mitológica, de sábio. Na verdade maior,
depois aprendi, do que a pretensão de sabedoria dele próprio. Ainda que ele fosse
bastante sábio.
Devida, a aura, talvez, a uma aparência singular. Quem sabe herdada da
ascendência indígena Norte Americana. Alegava-se isso... Mas, a bem da verdade,
nada na aparência do John lembrava uma fisionomia de ameríndio. A não ser, talvez,
uma pele vermelha, que não era de um "vermelho" de pele de índio...
No grupo, o John, assim como a Maureen, estava em seu ambiente natural.
Aparentemente, mais do que o Rogers, por exemplo. Eles eram responsáveis
importantes pela proposta, e experimentação, com aquele novo modelo de grupos
vivenciais. Modelo que em muito, qualitativa e quantitativamente, transcendia ao
paradigma dos "Grupos de Encontro". Movimentavam-se neste novo paradigma de
trabalhos com grupo – finamente fenomenológico existencial -- como se estivessem
em casa. Na medida em que esta metodologia de trabalho com grupos atualizava, de
um modo importante, o que eles pensavam, em termos de filosofia de vida e de
trabalho.
Tinham vivido de um modo intenso as revoluções culturais dos anos 60, e o
que se decantava daqueles tempos, em termos de valores e de disposições,
convergia, para eles, naquele tipo de trabalho com grupos. Em especial uma
disposição franca e intensamente experimental, em termos fenomenológicos.
Faziam, na verdade, uma dupla muito boa. Complementavam-se de um modo
muito bom. O John mais tranqüilo, a Maureen mais esperta, mais ativa e incisiva. Na
verdade, eram muito amigos, se davam muito bem, e se gostavam. Tive neles uma
matriz de minha formação em Psicologia, na Abordagem Rogeriana, em
fenomenologia (ainda que eles não pretendessem ser tecnicamente
fenomenológicos...) e nos trabalhos com grupos.

O Grupo de Arcozelo tinha uma ambiência particularíssima...


Além das possibilidades e características de vivência de um grupo
fenomenológico existencial de quase duzentas pessoas, durante quinze dias, num
recanto maravilhoso -- uma antiga fazenda de café, transformada por Paschoal Carlos
Magno num centro desenvolvimento em Arte Teatral --, o grupo trazia algo dos
grandes festivais, recentemente acontecidos... E o John havia vivido com intensidade
aquela época. Por esse motivo, dentre outros, ele permanecia como um fundo
essencial do Grupo. Assim como a Maureen.
O Rogers era a grande estrela, mas, quase oitentão, não guardava essas
características, era até meio caretão. Com todas as características aparenciais de um
turista idoso Norte Americano. Incluídos aí o chapeuzinho e a bermuda brancos, a
camisa de estampado colorido, e a máquina fotográfica, claro, pendurada no
pescoço... Na aparência um bom cidadão americano dos anos 50. Não era o mesmo
no plano das idéias e da vivacidade pessoal. Profundamente inteligente, vanguardista,
ousado e efetivamente dotado de uma generosidade, uma atenção, e um sorriso
enormes. Transformava-se quando falava nas reuniões dos grupos, imbuído sempre
de uma presença muito marcante e precisa, mas que sempre conservava a escala
pessoal da comunicação.
Arcozelo foi aquela experiência fantástica e inenarrável, naquela comunidade,
por quinze dias, numa proximidade e compartilhamento muito grandes, com vivências
muito particulares e muito intensas, tanto pessoais quanto coletivas.
Naquele momento o John era meio distante. Só nos aproximamos mais no ano
seguinte, em um grupo também organizado pelo Eduardo Bandeira, em Itapoan, em
Salvador, do qual o John era também facilitador, junto com a Maureen. O Rogers não
viera.
Neste grupo, o John me falou e convidou para participar do programa de verão
deles no CSP (Center for the Studies of the Person), na Itália e nos Estados Unidos.
Com atividades naquele verão em Roma, em La Jolla, e em Princeton, em New
Jersey.
E eu fui...

Nas cecanias de Roma, em Rocca di Papa, o Workshop on Personal and


Social Power, com doze dias de duração, era organizado por Alberto Zucconi e por
seu instituto de Roma.
Depois de passar por Lisboa, via Roma, eu chegara ao Centro per uno Mondo
Migliore, em Rocca di Papa, nas cercanias montanhosas da cidade.
Eu era, então, estudante concluinte de psicologia, em Maceió. E me esforçava
no grupo por pertencer àquela comunidade internacional. A conexão que o John me
permitia com tudo aquilo era fundamental. O John era muito dedicado a conectar, e
fazer com que as pessoas interagissem bem, se sentissem bem recebidas, e
conectadas.
Era fantástico participar de um modo tão próximo e intenso, de um grupo
multinacional daqueles, tão particular.
Lembro o Giggia, um senhor magrinho e “sem vergonha”, que se dizia o dono
do Cabaret, onde o grupo se reunia e se divertia alegre e ruidosamente, até a alta
madrugada. Pauline Aarts, uma linda e finíssima cantora holandesa. Lembro-me dela
se acompanhando ao violão... Uma música melancólica que falava de uma menina
que morria num rio, e aos poucos ia se diluindo, e se fundindo à água, aos peixes, às
folhas. Nunca esqueci a bela melancolia que misturava Pauline em sua interpretação,
a menina e o seu destino, o seu corpo sem vida sendo levado e se diluindo pelo rio; o
rio, e sua luz, as folhas caídas, e a água esverdeada e turva, atravessada de raios de
sol...
Prakash, na verdade Columbus Salvsen, um norueguês que voltava da
vivência de um ano em um ashram na índia, onde recebera o nome Hindu.
Uma garota da Iugoslávia, que, do meio para o fim do grupo, começou a ficar
ansiosíssima, com o pressentimento de que algo de horrível poderia acontecer a sua
mãe e a sua família, em sua terra natal (fico arrepiado quando penso no que
efetivamente aconteceu na Iugoslávia, anos depois...)... Tentamos, eu e Prakash, dar-
lhe um apoio. Mas, em vão. Ela não agüentou a angústia, e voltou para casa antes do
grupo se encerrar...
Lembro uma deliciosa "facção" de auto declarados ‘anarquistas’ Italianos, de
origem operária, com quem o vinho, e a festa, a alegria e a bagunça, estavam sempre
garantidos... Recusavam-se alegremente a falar comigo em Inglês... Latinos son una
famiglia, he... Diziam marotamente, profusamente gesticulando...
Lembro que uma noite, quando saíamos do Cabaret do Giggia, na madrugada,
ouvimos o som melódico de um orgão atravessando a noite.
Saímos à procura do insólito e inesperado concerto.
Não era música sacra, mas era na pequena capela do local onde estávamos.
Entramos silenciosa e discretamente...
Era um dos 'anarquistas', que seguira à frente do nosso grupo de alegres
noctívagos, e que descobrira e se apossara do órgão.
A capela era muito pequena e singela. Mas bela. Com muito mármore branco.
Deitamos ali pelo chão... E ouvimos, por mais umas horas, o concerto de
música clássica, cujo estilo tanto contrastava com o da música do Cabaret, que
acabara então de encerrar suas atividades naquela noite...
Éramos uns vinte e poucos, junto com os simpáticos e farristas anfitriões
anarquistas. Prakash dançava como mulher, e fazia toda uma performance de trejeitos
femininos. Não era homossexual, e não fazia de brincadeira. Dizia que era uma
meditação muito importante, que aprendera na Índia. Na qual um homem se
vivenciava por um tempo na condição de mulher...
Lembro um jovem psicanalista austríaco, que terminou o grupo meio
desconcertado. Um ainda jovem e elegante, nas roupas e no estilo, terapeuta
dinamarquês. Uma mulher que se dizia fazer parte de uma nobreza européia, e que
tinha espalhafatosos ‘ataques histéricos’, literalmente no meio do grupo, esperneando
convulsivamente. Uma jovem senhora israelense, que, num momento de discussão,
me instigou a não desistir, quando eu desanimava com as dificuldades da língua...
Rindo marotamente quando eu consegui me colocar, não sem alguma agressividade.
Lembro-me de Melissa, uma mulher que já tinha passado da juventude, mas que se
achava a Miss do Cabaret; e, às gargalhadas, se comportava como tal, nas
performances com o Giggia, que era o mestre de cerimônias...
Quando a vivência no grupo se encerrava, pela manhã, ou à tarde, o John
aparecia de shorts, com uma bola de basquete, convidando para irmos para a quadra
próxima, bater uma bolinha. Apesar de gostar de basquete e de jogar um pouco,
minha habilidade era precária. O John, como todo Norte Americano que se preze,
jogava muito bem a bola ao cesto. Jogávamos, e conversávamos muito, no calor
daquele sol morno. Terminávamos com umas cervejas, no barzinho próximo... Foi
assim que nos tornamos mais próximos.
Entre eu e John isto terminou virando uma prática comum quando nos
encontrávamos. Era uma das formas como atualizávamos os papos. E os papos eram
sempre interessados e interessantes, frequentemente profundos, e bem humorados...
Essa era uma das qualidades do John, o bom humor... Assim, batemos bola e
conversamos em Rocca di Papa, em La Jolla, em Princeton, no México, em Fortaleza,
em Maceió, em Jaguariúna...

Nos Estados Unidos, as atividades eram também com o John, a Maureen, e o


Rogers; mas eram frequentemente com equipes diferentes também. Eu que
participara de atividades radicais no novo modelo rogeriano de trabalho com grupos,
no Brasil, e na Itália, não podia me conformar com atividades meio anacrônicas e
precariamente concebidas, realizadas, e facilitadas por outras equipes de rogerianos
mais tradicionais. Estava, não raro, indignado, e em choque com os facilitadores
daquelas atividades. Frequentemente eu me sentia lesado.
O apoio de John e de Maureen foi fundamental nesse momento.
Encontrávamo-nos mais nos momentos informais, do que nos programas
propriamente ditos. Encontrávamos nas festas, em particular nas "beach parties".
Tenho uma foto, tirada por Gay, sua esposa naquele momento, numa destas festas,
em que estou abrindo uma lata de cerveja de um modo algo desastrado. O John ria
muito desta foto, porque, dizia ele, que eu estava abrindo a lata como o personagem
de um comercial da TV, que abria a cerveja rasgando violentamente a parte de cima
da lata.
Estas festas com os grupos dos programas eram particularmente alegres.
Preparávamos barbecue, cachorros quentes, salgados e doces. Ouvíamos
música e dançávamos. Às vezes todos os participantes do grupo abraçados. Era muito
especial.
Nos intervalos entre os programas eu era hospedado por Maureen em
Encinitas, e desfrutava da alegre comunidade da casa.
De La jolla eu fui para Princeton, em New Jersey, onde nos encontraríamos
mais uma vez, em mais um programa vivencial internacional. O PCA International
Workshop.
Era um momento particularmente difícil para a equipe que se juntara em torno
do Rogers naqueles anos. Eles tinham experimentado juntos, e desenvolvido um
paradigma fenomenológico existencial revolucionário de trabalho com grupos. Viveram
de um modo muito forte amizades, amores, e conflitos intensos, assim como
importantes conquistas...
E estavam, naquele momento, se dissolvendo e se separando enquanto equipe
de trabalho. O PCA International Workshop seria a última atividade da equipe. E o
processo, elaborado naquele workshop, não parecia fácil.
O grupo foi uma experiência internacional de comunidade muito rica, na qual
podíamos vivenciar as diferenças e as identidades, através das diferentes
nacionalidades. Como cidadãos de nacionalidades diferentes, que se conheciam e
desconheciam; e como pessoas, simplesmente, que se tornavam íntimas na vida
comunitária, para além das nacionalidades... Uma experiência muito marcante, na
qual, durante doze dias fizemos parte da comunidade do grupo, e da comunidade da
Princeton University. Dos banhos alegres e pueris, bem década de sessenta, nos
laguinhos com fontes, defronte dos prédios vetustos; dos restaurantes, dos
dormitórios, das “conversas” com os esquilos; da convivência, a partir do pátio do
campus, com a sala de trabalho de Einstein, cuja janela, sempre aberta, num dos
prédios próximos, todos apontavam...

Quando o grupo vivencial se encerrou, vinte de seus participantes foram


escolhidos para ser facilitadores de um grupo vivencial de abertura da Reunião da
Associação Americana de Psicologia Humanista, que se realizaria na Universidade, e
que contou com dois mil participantes. No gramado do Campus.
Fui um dos do grupo de vinte facilitadores. E aí, na minha indicação,
certamente havia o dedo do John e da Maureen.
Por questão de privacidade, digamos, eu tinha saído do dormitório que me
tinha sido destinado, ainda durante o workshop, para ficar com uma colega num sala
improvisada em dormitório. Dormíamos em colchonetes, no chão, lençóis e
travesseiros subtraídos aos dormitórios oficiais...
Às vezes, nesse dormitório improvisado, sob a batuta irada dos Holandeses,
tínhamos até reuniões reservadas das quais não participavam Norte Americanos.
Justamente para discutir a desproporcional participação dos Americanos no Grupo...
Um Canadense chegou a ser injustamente barrado numa dessas reuniões, por ser
Norte Americano...
Ou aí fazíamos reuniões menos políticas, regadas a vinho californiano,
acompanhado de queijos, salgados, que um e outro que chegava ia trazendo, e de um
pequeno aparelho de som. O vinho e o som rolavam noite à dentro...

No final de semana do grande workshop, já depois do grupo internacional,


permanecíamos ainda no dormitório. Discretamente, como se estivéssemos passando
despercebidos. Ou como se alguma alma generosa estivesse fazendo vista grossa
para nossa clandestina presença ali, depois do grupo. Inesperadamente, isto parecia o
mais provável; enquanto curtíamos o dormitório, e aproveitávamos para nos divertir
em Princeton.
Para nossa surpresa alegre, permanecemos ainda por cinco dias, enquanto
chegavam e se instalavam – nos dormitórios oficiais -- participantes de outros
programas. Para nossa surpresa, ninguém nos colocava para fora, como obviamente
esperávamos... Ainda hoje agradeço à alma generosa...
Até que precisamos mesmo partir, e nos despedirmos, e despedirmo-nos da
bela e gótica universidade...

No grupo de Princeton surgira entre eu, o John e a Maureen a idéia de


publicarmos em Português, na forma de um livro, alguns ensaios da Maureen, do
John, e do Rogers que eu estava lendo, e me dispondo a traduzir.
Eu traduziria os ensaios para o Português, Maureen sugeriu que
acrescentássemos uma parte minha, e publicássemos sob a forma de livro.
Assim nasceu o germe do Em Busca de Vida.
De volta ao Brasil, uma amiga e colega de São Paulo, em cuja casa eu ficara
hospedado quando lá cheguei, sugeriu a editora. Entrei em contato, e o projeto foi
aceito.
Comunicávamo-nos -- eu, o John, a Maureen, e eventualmente o Rogers -- por
cartas. E eu tocava as traduções dos capítulos deles. Por cartas discutíamos o título,
os capítulos, prefácio, capa, etc.
O John escrevia sempre, tratando dos trabalhos, das possibilidades de trabalho
no Brasil, e do processamento do livro.

Para mim, a possibilidade de e o interesse por escrever surgira muito


precocemente.
Tenho a nítida impressão de que fui influenciado ainda na infância. Não sei
muito bem nem como, nem por quê. Mas os maiores suspeitos são meus avós. Minha
avó, apesar de não ter nada especial para as letras (tinha para a dança, e para a
alegria de viver...) havia sido uma amiga mais jovem do Graciliano Ramos, ainda em
Palmeira dos Índios. Eram vizinhos. E trazia a presença próxima de um escritor,
apesar de nunca ter se animado para a escrita. Meu avô, bibliotecário, modestamente
culto e humilde --... Vês?! Ninguém assistiu ao formidável enterro de tua última
quimera. Somente a ingratidão esta pantera... eu lia, tentando entender, do Augusto
dos Anjos, numa folha de papel por debaixo do vidro de seu birô... -- tinha festejados
intelectuais na família. De modo que creio ter recebido deles a influência precoce.
Certamente mamãe, também. Eu gostava das redações, e composições (nunca gostei
de “Ditados”), Me achando...
Mas fui também enormemente influenciado, no sentido da escrita profissional,
pelos ensaios de John e de Maureen sobre grupos, e sobre a abordagem rogeriana,
que eu lia naquele tempo. O modo informal e apaixonado como escreviam. A vontade
de falar coisas em seu próprio nome... A pouca consideração com o formal tradicional.
Mas um compromisso profundo e radical com a inspiração... Com a criatividade...
Desde esse tempo, com a minha parte no Em Busca de Vida, eu desenvolvi a
atividade, e o prazer da escrita profissional, integrando as influências que eu recebera
na infância com as influências que eu recebia de John e de Maureen naquele
momento.
Encontramo-nos depois em Pirassununga, em São Paulo, num grupo vivencial
de longa duração, promovido por Rachel Rosenberg. Aí conheci muita gente da
comunidade de interessados na abordagem rogeriana que até então eu não
conhecera.
Logo em seguida, veio o Fórum Internacional da abordagem rogeriana, em
Oaxtepec, no México, organizado por Alberto Segrera.
Era inesperado, mas, vindo das experiências de Arcozelo, de Itapoan, de
Roma, de La Jolla e de Princeton, eu me sentia muito integrado com John e com
Maureen...
Neste momento, o Em Busca de Vida era recém-publicado.
E nós celebrávamos alegremente o projeto gerado em Princeton... Tudo aquilo
já tinha uma história, que sorvíamos com prazer...
De minha parte, foi a última vez que vi o John e a Maureen juntos, como os
'amigos de fé irmãos camaradas', como eu os entendera desde Arcozelo... Encontrei-
os depois, mas sempre separadamente... Pareceu-me que chegaram até a se
estranhar em alguns momentos, e a se reconciliar...
E, profissionalmente, em termos da amizade deles, e dos projetos que eu
sentia que podíamos desenvolver, eu tinha uma enorme sensação de "orfandade".
Não podia entender, nem aceitar, por que, com tantas possibilidades boas,
aquela equipe do Rogers se dissolvera. E por que, agora, o John e a Maureen tendiam
a se afastar.
Naquele momento, em Oaxtepec, bem ao estilo, era como se brilhasse, com o
livro, um projeto que não fora planejado, mas que se desdobrava efetivamente.
Depois do México só encontrei-os separadamente, e isto me dava a sensação
de desalento e orfandade.
No México, paralelamente ao encontro oficial, um grupo de Latinos
Americanos, do qual participei ativamente, discutiu as possibilidades e limites da
Abordagem na região. E criou o Encontro Latino da ACP. Mauro Amatuzzi, Jaime
Doxsey, que também participavam do grupo Latino, e eu, ficamos encarregados de
organizar o primeiro Encontro Latino no Brasil. Depois, Luiz Henrique Sá juntou-se ao
grupo.
Realizamos, de modo bem sucedido, um ano depois, o primeiro Encontro
Latino da ACP, em Petrópolis.
Nessa época eu já morava em São Paulo, e ia freqüentemente ao Rio. As
primeiras reuniões do primeiro Encontro Latino foram realizadas em meu improvisado
apartamento de São Paulo.
O John se manteve afastado de tudo isso. Mas já teve uma participação
quando da organização do Encontro Nordestino. No próprio Encontro Latino, em
Petrópolis, começamos a discutir as possibilidades, e a viabilizar o Encontro
Nordestino da Abordagem Rogeriana.
Depois do Encontro de Petrópolis, eu e John facilitamos um grupo juntos em
Fortaleza, organizado pela Gerci Campos. E o John participou de reuniões de
discussão do Encontro Nordestino, sob a especial hospitalidade da casa de Virgínia
Moreira.
A idéia ficou em seguida um pouco parada. Até que Iaraci Advíncula, e um
grupo de Recife, tomaram a iniciativa de organizar, em Gravatá, o primeiro Encontro
Nordestino da ACP.

O John manteve-se distante desses Encontros. Mas aproximou-se


visceralmente do Brasil, ao casar com Lucila, e vir morar na Estância Jatobá, em
Jaguariúna. Perto de Campinas.
Por volta desse período eu taduzia dele o Vestígios de Espanto. E encontramo-
nos em Jaguariúna para revisar, e dar acabamento no livro.
De certa forma, eu estava contrariado, porque, depois do Em Busca de Vida,
eu achava que deveríamos fazer um esforço mais sistemático de teorização do
modelo de trabalho com grupos que estava então se desenvolvendo. Comecei a
escrever nessa direção. O livro do John ia em outra direção, constituindo-se como
uma coletânea de histórias psicológicas.
Algumas vezes pude desfrutar da hospitalidade amiga de John e de Lucila, em
Jaguariúna. Como sempre, jogávamos basquete na quadra, conversávamos
longamente. Quando conversávamos íamos fundo, e conversávamos por muito tempo.
Apesar de conversarmos muito sobre abordagem rogeriana, os temas eram livres, e
variavam enormemente. Podíamos conversar sobre o último atentado na Chechênia,
sobre as relações dos EUA com a América Latina, sobre o Brasil, ou sobre coisas de
grupos ou da abordagem rogeriana... O início era sempre meio randômico, como nos
grupos. Mas o papo evoluía progressivamente, e ganhava em intensidade e
profundidade. John era muito inteligente e perspicaz, tinha uma originalidade muito
grande, um modo muito particular de pensar, e abordar a realidade. E era
especialmente bem humorado. Apesar de muito discreto.
Eu morava em São Paulo. E ele era sempre uma referência em Jaguariúna.
Quando lá eu ia, em geral depois de dar aula em Itatiba ou Campinas, pegava
o ônibus na Rodoviária de Campinas, e ia até a Estação Rodoviária de Jaguariúna. E
eles me pegavam de carro. Na volta eles me traziam até a Rodoviária de Jaguariúna.
Ou até Campinas.

De uma das últimas vezes em que estive na Estância Jatobá, eu chegara há


um dia ou dois de Maceió. Passei por lá o final de semana, e na Segunda Feira eu
retornaria a São Paulo. Na volta, da Rodoviária de Campinas, liguei para a minha
família em Maceió. Soube então que as dores de uma suposta bursite que minha mãe
vinha sentindo eram devidas na verdade a um tumor no intestino e fígado. E que no
dia seguinte minha mãe chegaria a São Paulo para tratamento...
Fiquei transtornado. E caminhei a esmo, por horas, por ruas de Campinas que
eu nem conhecia. Ainda acalentando a esperança de que o tempo houvesse entrado
por um atalho errado... E de que ainda pudesse ser revertido...
Mas eu precisava voltar para onde eu não queria. Eu precisava voltar para São
Paulo. Volta que era tão diferente de todas as outras... E que tinha, como retorno a
realidade, um peso enorme de incerteza, e muito amargor. Minha mãe, meu pai e uma
irmã chegariam no dia seguinte, e eu precisaria tomar umas providências. Falei com
John ainda, pelo telefone, e comentei a situação.
De volta ao meu apartamento chorei da hora que cheguei ao momento da
manhã em que a prestativa namorada veio me apanhar para irmos ao aeroporto.
Foram quinze dias muito difíceis, e dolorosíssimos, em São Paulo.
Do quarto do hospital, na madrugada, enquanto minha mãe e minha irmã
dormiam, eu contemplava a ascensão iluminada da Augusta, o relógio em cima do
Conjunto Nacional... E sabia que daquele quarto eu iria para Maceió. E que
abruptamente eu estava me despedindo de São Paulo. Da vida que eu sabia, e queria
transitória, mas tão rica, e da qual eu tanto gostava...
Eu pensava que o processo de minha mãe ainda demoraria. E que eu estaria
com ela em Maceió.
Voltamos juntos com minha mãe para Maceió.
E minha mãe faleceu três dias após retorno.

Minha vida tomou então rumos radicalmente diferentes. E eu tive mesmo que
me direcionar cada vez mais para Maceió.
E me afastar de São Paulo...

Enquanto isso, eu finalizava o Grupo - Fugacidade, Ritmo e Forma, publicado


um ano depois.
John fez a ‘apresentação’. E surpreendeu-me com o comentário de que estava
impressionado com a quantidade de possibilidades que o livro abria.
Por um tempo ainda, eu continuei transitando entre São Paulo e Maceió...
E reinstalou-se progressivamente a distância que era típica na amizade da
gente.
Falávamo-nos de vez em quando por telefone, ou por e-mail, e encontramo-nos
algumas das vezes em que estive em São Paulo, e em que pude ir a Jaguariúna.
Encontramo-nos, ele e Lucila, no Encontro da ACP do Centro Sul, em Petrópolis...
Mas, de fato, o meu ponto de equilíbrio se deslocara para Maceió, onde eu
restabeleci minha vida pessoal e profissional, trabalhando em Maceió e outras cidades
do Nordeste.
John foi mergulhando na vida e no trabalho com Lucila em Campinas e
Jaguariuna.
Como sempre, das vezes que estive em Jaguariúna, desfrutei da hospitalidade
e da amizade deles.
Havia uma paz e beleza muito grandes na Estância. A casa sempre
ornamentada com os trabalhos da arte de Lucila. Eles transmitiam integração e
harmonia, uma relação madura e afetiva. Logo no início ele me confidenciou que fazia
muito tempo que não se apaixonava... Davam bem a impressão de terem, juntos, uma
vida feliz, de bom gosto e qualidade.
Das últimas vezes que conversamos o John estava metido em programas
ecológicos, para os quais se mobilizava de um modo particular.

Ligou um dia para mim...


Estava calmo, leve e jovial. Deu-me a impressão de que não tinha um assunto
específico. Queria só conversar... No início eu tentei falar em Inglês, como
frequentemente fazíamos... Mas ele insistiu em falar em Português...
Falou dos trabalhos na Estância em Jaguariúna... Da última viagem aos
Estados Unidos, e de uma série de assuntos assim...
Despediu-se alegre e normalmente como sempre. E, como sempre, eu
asseverei que iria procurá-lo, assim que fosse a São Paulo...

Num Congresso que houve da Abordagem Rogeriana, em João Pessoa, pouco


tempo depois, uma colega me falou de que o John estava muito doente, e
praticamente terminal...
Eu fui pego completamente de surpresa, e fiquei desorientado.
Ele não me falara nada, nem eu desconfiara. Como muitos, eu não imaginava
que o John pudesse morrer assim tão logo. Guardava dele a nossa última conversa ao
telefone...
Mas a informação era segura...
E a ficha começou a cair.
Com o tempo, entendi que o John ligara para se despedir. E, bem ao seu
modo, se despedira, deixando para mim uma imagem tranqüila, leve, bem humorado e
jovial...
Fizemos alguns trabalhos juntos. Vivemos momentos de camaradagem alegre,
de muita, e desinteressada e despropositada, conversa. Apenas pela alegria dos
assuntos, e pela alegria de conversar. Mas nunca entendi muito bem por que o John
me escolhera como amigo. Naturalmente isso não era nenhum mérito. Não o era em
si, por um lado; e o John era uma pessoa que fazia amizades facilmente, e tinha uma
legião de amigos.
Para mim, foi uma amizade preciosa e rica. Porto incomum, de aprendizagens
incomuns...
Do final da graduação, ao exercício da profissão, a amizade com John foi um
porto seguro de inteligência, lucidez, bom humor, bom astral, abertura para o equilíbrio
do mundo, para o incomum, visto de um modo simples. Um porto seguro de amizade...
Sou profundamente grato pela dádiva, por sua generosidade, e pela
generosidade de ser do John.

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16. Nem Teorético, nem Prático.
Muito menos Pragmático
O Paradigma Rogeriano.
Fenomenológico Existencial: Poiético.

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

affons@uol.com.br

http://www.geocities.com/eksistencia/

Uma das características mais marcantes e específicas do paradigma rogeriano,


do paradigma fenomenológico existencial, é a de que ele não é da esfera do prático, ele
não é uma prática.

A característica do modo vivencial, fenomenológico existencial, que o


paradigma rogeriano preconiza, como modo privilegiado de vivência -- para o cliente,
e para o desempenho metodológico do terapeuta, ou psicólogo – se descompromete
com, e não privilegia, as características fundamentais do prático e da prática.Tais como a
ação voluntária, a utilidade, a hegemonia do princípio de sobrevivência como critério (mas a
superação). O vivencial, fenomenológico existencial, dialógico e poiético, é um modo de
sermos no qual dão-se, como vivência, a força do possível, e da possibilitação, de sua
atualização.

Diferentemente do prático e da prática, as características peculiares do modo


fenomenológico existencial, poiético e dialógico, são a ação espontânea (em
contraposição com a ação voluntária, própria à prática), a vivência fora do plano da
dicotomização sujeito-objeto; e fora do modo de sermos em que vigora a causalidade,
em que vigoram os fins e os meios. São características definidoras, ainda, do modo
fenomenológico existencial de sermos a vivência de superação, característica e intrínseca
à atualização de possibilidades (em contraposição ao predomínio do princípio de
sobrevivência, à adaptação e à conservação, característicos do prático e da prática).

Esta característica não prática do paradigma fenomenológico existencial


rogeriano talvez seja um pouco mais sutil, e até mais desconhecida. Uma vez que é
mais disseminada a compreensão de que a vivência do paradigma rogeriano, não é da
esfera do teórico e da teorização.

Automaticamente assume-se, então, freqüentemente, que o paradigma


rogeriano seria da esfera da prática. Com o risco de confundi-lo, como freqüentemente
ocorre, de um modo articulado teoricamente, ou não, como um modelo pragmático.
A. O paradigma rogeriano, nem teorético, nem prático; nem
pragmático. Fenomenológico existencial dialógico e poiético.

Fenomenológico existencial dialógico, poiético, caracteristicamente, o


paradigma rogeriano, assim, não é teorético, e teorizante em sua vivência. A
Fenomenologia e o Existencialismo privilegiam um modo de vivência, um modo de
“consciência”, que não é teórico, que se caracteriza como “consciência” pré-reflexiva,
pré-conceitual, pré-teórica. É especificamente isto que define o empirismo da
Fenomenologia, e do existencialismo, da filosofia da vida. O fato de se caracterizarem
como abordagens da realidade na própria vivência fenomenal, pré-reflexiva, pré
teórica. E não através da mediação do teórico, da teoria e do conceitual. Enquanto não
teorizantes, não conceituais, as abordagens fenomenológico existenciais serão sempre,
como tais, empiristas.

Vale observar, como observamos, que este empirismo é, especificamente, um


empirismo fenomenológico existencial, e não o empirismo objetivista, do objetivismo e
do pragmatismo.

Vivencial, portanto, o paradigma rogeriano não é, na sua vivência, um


paradigma de privilégio da experiência abstrativa, não é um paradigma de privilégio
da abstração, de privilégio da reflexão, da teorização.

Não teorético, assim, o paradigma fenomenológico existencial rogeriano é


facilmente concebido, de modo algo automático, como sendo então da ordem da prática,
da ordem de um modo prático de sermos.

É fundamental para a compreensão do paradigma rogeriano, do paradigma


fenomenológico existencial, compreendermos que, da mesma forma que a sua vivência
não é da ordem da teorização, ela não é, igualmente, da ordem da prática. Não é da
ordem do prático, não é da ordem de uma prática.

O que pode parecer desconcertante, num primeiro momento. Mas, nada mais
natural, e específico ao paradigma fenomenológico existencial, ao paradigma
rogeriano.

Certamente que esta característica não estava muito clara nas primeiras fases do
modelo rogeriano, nem na sua teorização. Mas era muito clara nas fases finais, sendo
uma característica fundamental do modelo de trabalho com grupos ou do modelo na
relação diádica da última fase de Rogers e companheiros.

É fundamental assim observarmos que, em se tratando do existencial, do


fenomenológico existencial, e de uma concepção e metodologia para a psicologia e
psicoterapia fenomenológico existencial, Rogers cabalmente entendeu que, se, por um
lado, a questão não era da esfera do teórico -- já que, como vimos, o fenomenológico
existencial é um modo de vivência anterior, e heterogêneo com relação, ao modo
teorizante de sermos --, do ponto de vista fenomenológico existencial, igualmente, a
questão de sua concepção e método não era a questão de uma prática. Ou seja, não era da
esfera do modo prático de sermos.
E isto era e é fundamental, e fundador, em termos do paradigma rogeriano. Na
medida em que, como Rogers e a sua tradição entenderam, a existência, o
fenomenológico existencial, não são nem da ordem do teórico, nem da ordem do prático,
da ordem de uma prática.

São, mais especificamente, da ordem do poiético. Não teorético, não prático, em


sua vivência, o paradigma rogeriano é eminente e especificamente poiético.

O modo de sermos alternativo a uma teorética não é, necessária e simplesmente,


o modo prático de sermos, a prática. Podemos ser, também, e de um modo
ontologicamente mais fundamental, de modo fenomenológico existencial poiético. O
modo de fenomenológico existencial de sermos, no qual, em especial e especificamente,
vivenciamos, agenciamos, potencializamos, e consumamos possibilidades.

Intuitivamente, isto estava muito claro para Rogers e seus colaboradores, ainda
que não tivessem articulado isto teórica e filosoficamente.

Assim, se, por um lado, a vivência do paradigma rogeriano, seja em grupo ou


na relação diádica, não era, e não é, uma vivência de teorização, uma experiência
abstrativa (que abstrai o corpo, o vivido, os sentidos); se não era, e não é, assim, uma
experiência teorizante, reflexiva, igualmente, não é uma experiência orientada para a
prática, uma experiência de natureza prática. Que, igualmente, se distingue essencial e
radicalmente do paradigma fenomenológico existencial poiético.

O paradigma rogeriano não é prático, sua vivência não é da ordem da prática...


Diferente do modo de sermos abstrativo, teorizante, reflexivo; e diferente do modo
prático de sermos, a vivência do paradigma rogeriano é, assim, da ordem do
fenomenológico existencial poiético: o modo de sermos vivencial (estético) no qual
propriamente agenciamos, potencializamos, atualizamos e consumamos
possibilidades.

Assim é que o modo de vivência, caracteristicamente privilegiado pelo


paradigma rogeriano, não se situa no âmbito da prática. Não se caracteriza como
prática. E isto é um dos seus aspectos mais peculiares e definidores, e um dos aspectos
mais peculiares e definidores do paradigma da psicologia e psicoterapia
fenomenológico existencial.

Coube a Carl Rogers, em particular na última fase de sua obra, a partir de 1974,
a radicalização de um paradigma fenomenológico existencial em psicologia e
psicoterapia. Tendo, em particular, o campo experimental de vivência do modelo
fenomenológico existencial de concepção e de facilitação de grupos.
Ainda que explícito (Rogers, Psicoterapia e Relações Humanas), Carl Rogers
não fazia grandes definições teóricas, epistemológicas, ou ontológicas, com relação à
natureza fenomenológico existencial de sua abordagem.

Isto decorria certamente da postura tradicionalmente empirista que ele


compartilhava com o meio da cultura, da filosofia e da ciência norte americanas. A
questão qualitativamente crítica, não obstante, é a de que, com a Fenomenologia da
tradição de Brentano, à qual ele aderiu, o próprio estatuto do empirismo se transforma.
O empirismo que Rogers praticava, especificamente, o empirismo fenomenológico
existencial. Enquanto que o empirismo que vigorava na cultura norte americana era um
empirismo objetivista.

O empirismo é, em essência, uma abordagem da realidade na própria vivência


da realidade, sem a mediação da teoria. Radicalmente empirista, nesse sentido,
segundo a definição de Brentano, a Fenomenologia se distingue, radicalmente, do
empirismo objetivista, comum ao meio da cultura, da filosofia e da ciência norte
americanas, de que Rogers compartilhava. O empirismo fenomenológico considera e
privilegia o modo fenomenológico existencial de sermos que se configura fora do
modo de sermos no qual vigora a estrutura da relação sujeito-objeto. E que,
evidentemente, não assume, nem poderia uma atitude de privilegiamento do objeto.

Rogers e colaboradores profundamente entenderam e praticaram os diferenciais


do empirismo especificamente fenomenológico. Ainda que não o tenham especificamente
tematizado teoricamente, era evidente a sua adesão a este. A falta de clareza com
relação aos dois tipos de empirismo foi, e é, motivo de vários tipos de confusão.

Decididamente, não obstante, não era um empirismo de tipo objetivista o que


praticavam Rogers e colaboradores.

Daí ser de grande interesse elucidarmos as características fundamentais do


paradigma fenomenológico existencial, em sua vivência empírica, para
compreendermos, vivenciarmos e desdobrarmos o paradigma rogeriano em psicologia
e psicoterapia. Em, particular, no que concerne a sua característica fenomenológico
existencial poiética. Característica que aparece plenamente no último período da obra
de Rogers, em especial na concepção, vivência e metodologia do trabalho com grupos.
Na verdade, aparece em toda a concepção e metodologia da abordagem rogeriana, na
medida em que o modelo de trabalho com grupos exerce uma influência
qualitativamente decisiva nas reformulações concepção e metodologia do trabalho ao
nível das relações diádicas, a ponto de John Wood observar que só existia trabalho com
grupos na abordagem rogeriana, sendo, especificamente,.o trabalho diádico um “grupo
de duas pessoas”.

Coerentemente, Carl Rogers adentrou, fenomenológico, existencial


experimentalmente, a esfera do poiético, como modo privilegiado de vivência e como
logos metódico de sua abordagem.
A característica poiética do modo fenomenológico existencial de sermos
caracteriza-o como um modo natural e particular de sermos no qual, como vivência
fenomenal, se dá a possibilidade, e o seu desdobramento, a sua atualização.

Peculiarmente, dentre outras características, o modo fenomenológico existencial


poiético de sermos, que permite a vivência do possível e de sua atualização, dá-se na
esfera da ação espontânea; e não na esfera da ação voluntária, deliberada, intencional,
que caracteriza o prático.

Ou seja, a ação, ao nível do poiético, da vivência da tensão projetativa do


possível, e da sua possibilitação, de sua ato-ação, é, especificamente, espontânea,
desproposital.

Por outro lado, apesar de ser, assim, o domínio por excelência da vivência do
possível, e de sua atualização, a própria vivência poiética não é da ordem dos úteis e da
utilidade. De modo que, ainda que todos os úteis e suas utilidades sejam produzidos
poiéticamente, na vivência poiética, em si, não vigora a utilidade e a utilização, e o
valor delas; que são, caracteristicamente da ordem da prática.

Esta distinção entre teórico, prático e poiético já está presente em Aristóteles, em


sua distinção das três áreas de ciência.

O termo poiese consagrou-se na Fisiologia e na Medicina, e na Ontologia,


quando falamos, por exemplo, em Fisiologia, da hematopoiese, designando o processo
através do qual, nas células da medula dos ossos largos do corpo, as células do sangue
são geradas, criadas, produzidas. Poiese tem, assim, este sentido, de geração, de
engendramento, de produção.

Em Ontologia podemos falar de ontopoiese. Como o processo no qual, através do


desdobramento vivencial do possível, engendramos o próprio ser-no-mundo. O poiético
refere-se assim a este modo vivencial de sermos no qual o possível é possível, e se
atualiza, no engendramento de nosso ser-no-mundo, que é criação e recriação, e
resolução existenciais.

Carl Rogers concentrou-se, progressivamente, na definição, e na criação, das


condições para a vivência fenomenológico existencial poiética, no encontro diádico e
no encontro grupal.

No desenvolvimento experimental de seu paradigma de trabalho com grupos,


estas características vão sendo progressivamente radicalizadas, até a constituição, em
seu paradigma metodológico, de um privilégio soberano da vivência inter humana
fenomenológico existencial espontânea e -- fenomenológico existencial -- experimental,
poiética, como elemento central. Ao mesmo tempo em que ele experimenta e busca
definir as condições metodológicas de propiciamento desta vivência no âmbito do
processo grupal.

Como Vera Cury apontou, as aprendizagens com a experimentação no


desenvolvimento do paradigma de trabalho grupal vai ter uma marcante influência na
reelaboração do modelo de trabalho inter individual.
É importante observar que estas características do paradigma rogeriano não
negam a existência e a importância da própria da esfera da prática e do prático, em sua
dimensão própria. A importância do modo prático de ser. Apenas não generalizam
nem supervalorizam o valor do prático na condição do humano. Não o elegem a
condição de critério. Entendem o modo fenomenológico existencial humano como
nosso modo especificamente ontológico de sermos, o modo especificamente existencial,
no qual se dão a existência e o processo de sua resolução; o possível, a possibilidade, e
a sua atualização.

Mais que isto, o paradigma fenomenológico existencial assume a perspectiva de


que, ainda que não sendo da ordem da prática, é ao nível de sua vivência
fenomenológico existencial poiética, dialógica, que constituímos a nós mesmos, e ao
mundo que nos diz respeito, aos úteis e a suas utilidades, como atualização de
possibilidades, como resolução existencial. Ou seja a esfera da prática, de sua
vitalização e revitalização, de sua criação e recriação, depende fundamentalmente da
criatividade vivencial do fenomenológico existencial poiético.

De modo que podemos pensar numa eficácia criativa, numa pragmática, deste
modo não pragmático e fenomenológico existencial poiético de sermos.
B. Do Pradigma Teorético

Era eu o poeta estimulado pela filosofia, não o filósofo interessado pela


poesia.

F. Pessoa.

É muito importante atentar para o fato de que não se trata, no paradigma


dialógico, fenomenológico existencial poiético, empiricamente fenomenal, de um
desapreço pela teoria, pela teorização, e pelo modo teorizante e teorético de ser.

Empirista, significa que o modo de ser privilegiado pelo paradigma


fenomenológico existencial será sempre não teorizante em sua vivência.

Mas, ainda que o momento de sua vivência seja, especificamente, assim, não
teorizante, e privilegiativo do modo de sermos da vivência pré reflexiva, pré-
teorizante, pré-conceitual, a perspectiva fenomenológico existencial não desqualifica a
importância do teórico e da teorização, em seu momento próprio.

Apenas busca colocar as coisas em seus devidos lugares: a vivência fenomenal é


ontologicamente prioritária, na medida em que especificamente ontológica. Ou seja, o
nosso modo próprio de ser em que se constitui o logos, o sentido, a emergência
fenomenal do sentido, que caracteriza o humano, como vivência do possível e vivência
de sua atualização. Modo poiético sermos de geração de nosso ser-no-mundo.

O teórico tem a sua diferença e importância próprias, na perspectiva do


paradigma fenomenológico -- ainda que este seja especificamente empirista, não
teorizante, em sua vivência. Mas o momento da teoria e da teorização, anteriormente
ou posteriormente ao momento da vivência fenomenal, tem uma importância própria,
e valorizada em suas características e poderes próprios. O fenomenologista valoriza a
boa teoria e a boa teorização, e está motivado para estudar toda a teoria efetivamente
interessante sobre seus objetos de interesse. Ciente sempre de que o momento
hierarquicamente superior é o momento não teorizante, empírico, da vivência
fenomenal, dialógica e poiética.

Assim é que o empirismo fenomenológico convive de um modo produtivo,


sinérgico, com a teoria e com a teorização interessantes.

Isto é diferente da postura anti-teórica, e anti-teorizante, do empirismo


objetivista, radicalmente avesso à teoria e a teorização.

Cabe, portanto, uma atenção cuidadosa na distinção, neste sentido, e no sentido


de suas peculiaridades e diferenças, entre o empirismo fenomenológico (que se situa e
privilegia um modo de vivência que está fora do modo de ser da relação sujeito objeto;
e, muito mais, fora de um modo de ser que, no âmbito da relação sujeito objeto,
privilegia o pólo objeto desta relação), e o empirismo objetivista. Empirismo objetivista
que não só privilegia o modo de sermos da relação sujeito-objeto, como privilegia o
pólo objeto desta relação, e a sua descrição, supostamente objetiva. Ao tempo em que
rejeita e afasta-se. de qualquer forma de teoria ou de teorização.

O que não podemos prescindir, é de que, fenomenológico existencial empirista,


ainda que conviva com o interesse da teoria e da teorização, fora de seus momentos
específicos, o momento da vivência fenomenológico existencial não é teorizante. Sua
característica é a de privilegiar no momento de sua vivência o modo de sermos da
“consciência” não teorizante, não reflexiva, não conceitual, pré-conceitual, pré-
reflexiva, pré-teorizante.

O modo teorético de sermos caracteriza-se pela representação, ou seja a re-


apresentação, de algo que se apresenta enquanto vivência fenomenal. E que, na
representação, demanda, própria e especificamente, o afastamento deste modo de ser
da vivência fenomenal. No seu sentido mais essencial teoria significa visão de um
espetáculo9.
Desta forma, a teoria e a teorização constituem-se, especificamente, como
afastamento do modo de ser da vivência, e articula relações explicativas de natureza
objetiva.

Alguns elementos, assim, caracterizam o modo teorético de sermos. Dentre eles:

1. O fato de que, especificamente, o modo teorizante de sermos se configura como um


afastamento para com o modo de ser encarnado do vivido fenomenológico
existencial, dialógico e poiético.
O modo teorético de sermos é um modo de ser abstrativo, contemplativo. No qual
o vivido, o corpo e os sentidos, ou seja, o especificamente fenomenológico e
existencial – e, vale dizer, o especificamente poiético --, estão especificamente
abstraídos, em privilégio do abstrato do conceito, e do teórico.

Desnecessário mencionar que o modo de ser fenomenológico existencial é


especificamente encarnado, pontual e momentaneamente vivido, na vivência
imediata de corpo e sentidos. Intuitivo, no sentido fenomenológico existencial, não
comporta, na pontualidade de sua vivência, própria a abstração, a mediação
conceitual.

2. Uma distinção essencial e definidora é a de que o modo teorético de sermos funda-


se na explicação.
O vivido fenomenológico existencial configura-se como, e especificamente é,
compreensão.

9
LALANDE, André Vocabulário Teórico e Crítico da Filosofia. São Paulo, Martins Fontes, 1999.
O vivido fenomenológico existencial constitui-se, em especial, como vivência
compreensiva, e desdobramento de possibilidade. Desdobramento este que se
constitui como a interpretação, interpretação num sentido especificamente
fenomenológico existencial. O que o constitui como um modo poiético de sermos.

3. O modo teorético de sermos vigora como articulação de relações explicativas de causa


e efeito. Enquanto que o modo de ser fenomenológico existencial, além de dar-se,
primária e originariamente, como vivência compreensiva, dá-se como vivência pré-
compreensiva de possibilidade, como desdobramento, compreensão e consumação
de possibilidade. Processo do qual se exclui não só o modo de ser da explicação,
como a articulação explicativa de causas e efeitos.
4. O modo de ser teorético se constitui na experienciação da dicotomização sujeito-
objeto. Enquanto que o modo de ser fenomenológico existencial dialógico e poiético,
ser-no-mundo, não comporta esta dicotomização sujeito-objeto, ainda que se
constitua, na sua momentaneidade, na tensão do âmbito dialógico da relação eu-tu.
(BUBER,)

C. O prático e o pragmático;

A partir desta constatação de que o modelo fenomenológico existencial


rogeriano não é da ordem da prática, da mesma forma que não é da ordem do
teorético, é interessante observar e compreender algumas características que
constituem o paradigma da prática, o prático. Compreender as características
fundamentais do paradigma teorético. E as características, e diferenciais, com relação a
estes dois, do paradigma fenomenológico existencial, dialógico e poiético.

Algumas características sobressaem no paradigma prático:

1. O valor prioritário do útil e da utilidade;


2. O valor da utilidade, segundo o princípio de sobrevivência;
3. O prático, a prática, tem com referência o valor da utilidade em termos de
adaptação e do princípio de sobrevivência;
4. A prática caracteriza-se pela ação voluntária deliberada.
5. A prática se dá no âmbito do modo de sermos da relação sujeito-objeto.
6. A prática se dá no âmbito do modo de sermos das relações de causa e efeito.

A prática exige o caráter voluntário e deliberado da “ação”. E o critério de sua


avaliação é o da utilidade. Em particular, da utilidade para a adaptação e para a
sobrevivência. Uma característica fundamental do paradigma fenomenológico
existencial rogeriano é a da entrega à espontaneidade, a entrega à ação espontânea do
vivido; ou seja, a entrega à espontaneidade generativa (poiética) do vivido, com sua
característica espontaneidade desproposital de vivência do desdobramento da força do
possível, e da performação de sua atualização. De modo que no modo privilegiado por
sua vivência, o que vigora é o modo de ser da ação espontânea, e não o modo de ser da
ação voluntária e intencional.
Na vivência existencial, não vigoram a utilidade e a utilização, características da
esfera da prática. E a prioridade de sua força consuma-se na superação, e não,
simplesmente, no primado da sobrevivência, da manutenção e da adaptação.
As características do vivencial fenomenológico existencial, privilegiado pelo
paradigma rogeriano, não se enquadram portanto no âmbito do prático, e da prática.
Mas, especificamente, no âmbito do poiético.

O prático10 tem sempre o sentido de uma atividade voluntária que modifica o


ambiente, tendo como critério o primado da utilidade, em particular a utilidade para a
sobrevivência. Na esfera do modo prático de ser vigoram os úteis e as utilidades; e a
efetividade da causalidade e dos meios e dos fins.

D. O fenomenológico existencial poiético.

Sumariando características do nosso modo fenomenológico existencial poiético


e dialógico de sermos, cabe dizer, em primeiro lugar, que é este o nosso modo onto-
lógico de sermos, para uma perspectiva fenomenológico existencial.
Em essência (que é existência), somos sentido (logos), e ação. Ontologicamente
somos logos (sentido); ontologicamente somos onto-lógicos. Sentido e ação, como
atualização sentida, que se dá na vivência do possível, que é própria ao modo
fenomenológico existencial dialógico e poiético de sermos.
O sentido, o logos, que continuamente nos constitui, se nos dá como pré-
compreensão da força de possibilidade, como compreensão, e desdobramento desta
força (interpretação fenomenológico existencial) em criação; ação propriamente dita.
Este modo de sermos é um modo que, ainda que comporte a dualização eu-tu,
não comporta a dicotomização sujeito- objeto, própria de nosso modo acontecido,
realizado, ôntico, de sermos (Buber,).
Neste modo de sermos, a causalidade não vigora. Ele é imediatamente vivido e
vivência. Presença que se desdobra, diria Buber.
Imediato, não comporta a mediação dos meios e dos fins. Seja dos meios e dos
fins teóricos, seja a dos meios e dos fins práticos. Ao mesmo tempo, que nada tem do
automatismo comportamental.
O modo fenomenológico existencial, enquanto modo de incontornável
atualização de possibilidade, é especificamente o modo de dar-se da ação. Mas em seu
âmbito, a ação como atualização de força de possibilidade, em sua incerteza,
10
op. cit.
tentatividade, e riscos próprios (experimentação), não é, especificamente, a ação
voluntária, deliberada e intencional, característica da prática. A ação, no âmbito da
vivência fenomenológico existencial, é, especifica e propriamente, a ação espontânea e
experimental (no sentido fenomenológico existencial). Ou seja a ação propriamente
desproposital, tendencialmente desmotivada, ainda que intensamente estésica e
estética, .atualizante de possibilidades, criativa.
A ação assim vivida é eminentemente inconveniente. Ou seja, no sentido de que
não tem “convênio”, não tem contrato, com o real, com a realidade e com acontecido.
Ela não serve à adaptação, à conservação, à sobrevivência, uma vez que, em sua
inconveniência, ela é a própria força da superação e de reordenamento.
Assim, enquanto a prática, por exemplo, está fortemente fundada na utilidade,
pautada pelo valor desta para a adaptação e sobrevivência, o fenomenológico
existencial poiético atualiza sempre a superação daquilo que a prática busca conservar.

E. Conclusão.

Caracteristicamente, pois, o paradigma rogeriano não se define na esfera


teórica, nem na esfera da prática. Ou seja, em sua essência não se trata do investimento
em uma atividade de teorização, por parte do cliente ou do terapeuta, do facilitador; de
um empreendimento em que o teórico e a teorização sejam relevantes. Da mesma
forma, não se trata de uma atividade prática. Ou seja, naquilo que lhe é mais essencial,
o paradigma rogeriano em sua vivência não guarda o caráter de valorização do modo
de sermos que permite útil e da utilidade, ou o caráter de ação voluntária que
caracterizam a prática. Muito menos está orientado pelos princípios da adaptação, e da
sobrevivência.
O modo de vivência fenomenal que lhe é próprio, não se dá no eixo da relação
de causa e efeito, nem no âmbito da realidade da dicotomia sujeito-objeto.
O que lhe interessa é a espontaneidade generativa do modo de sermos da
vivência do possível, e de sua possibilitação, como superação. Que não é da esfera do
modo de sermos que é caracteristicamente da ordem da prática.
A vivência fenomenológico existencial não é da ordem das relações sujeito-
objeto, ou da ordem das relações de causa e efeito; não é da ordem do útil e da
utilidade, e, ainda que de âmbito eminentemente ativo, a ação em seu âmbito é da
ordem da ação espontânea, caracteristicamente desproposital.
Em sua atividade, o paradigma rogeriano centra-se, assim, não na contemplação
do espetáculo do possível acontecido, objetificado na abstração da vivência física de
sua atualização. Nem num esforço e desempenho práticos.
Centra-se, sim, na própria vivência não dicotômica (dicotomia sujeito-objeto) e
integrada; vivência que não se situa no âmbito da causalidade das causas e dos efeitos,
dos fins e dos meios (Buber); vivência que se centra na performação, do possível e de
sua possibilitação, em per-feito; de sua atualização -- como atualização meramente
compreensiva, ou como atualização objetivativa.
É a vivência empática, (em)patética, da ação -- como vivência do possível, e de sua
atualização -- que caracteriza o paradigma rogeriano. Vivência, portanto, que não é
nem da ordem do teórico, nem da ordem do prático. Especificamente vivencial, e
poiética. Situando-se fora das pretensões, dos pré requisitos, da teorização, e da
prática.
Longe de dizermos, não obstante, que este paradigma não tem uma eficácia
específica. O que enfatizamos é que a sua eficácia é mais básica, mais radical, e
abrangente, do que a eficácia do teórico, do que a eficácia do prático, e do que a eficácia
do comportamental, ao nível do existencial. Ou seja: ao nível da constituição, do
próprio engendramento, do sujeito, e do mundo. Engendramentos poiéticos, como
vividas atualizações despropositativas de possibilidades. Diferente-mente da prática,
ou mesmo de qualquer pragmática da “ação” voluntária, e do princípio de
sobrevivência como prioridade criterial.
O âmbito do vivencial é, especificamente, o âmbito propriamente da ação. Ação
que engendra o possível, o novo, e cria. Diferentemente da teorização, da prática, ou do
comportamental.
Com isto, mesmo que a teorização rogeriana discrepe, eventualmente, com
relação a um paradigma fenomenológico existencial -– em particular com relação a
uma concepção biologizante da tendência atualizante, e em termos de uma concepção
pobremente fenomenológica de compreensão -–, a vivência experimental de Rogers
evolui a passos largos, e firmes, no sentido de uma metodologia empírica e
experimental de uma abordagem fenomenológico existencial de psicoterapia e de
psicologia.
E, diga-se de passagem, exceção feita a Fritz Perls, ninguém foi fenomenológico
existencial experimentalmente tão longe, quantitativa e qualitativamente, quanto
Rogers, neste sentido.
17. Carl Rogers, o patético.
Empatético, peripatético.
Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

ahl.fonseca@gmail.com

Creio que é muito necessário, e até urgente, e fundamental, compreender e


definir o sentido do logos metódico do modelo de Carl Rogers como eminentemente
patético. Creio que ele, Carl Rogers, muito apreciaria ser desta forma entendido. Na
verdade, creio que, pela compreensão de uma patética podemos compreender o sentido
essencial do logos metódico do modelo epistemológica e ontologicamente compreensivo
de Carl Rogers, esclarecê-lo e desdobrá-lo. De resto, o que não é pouco, estaremos
compreendendo iguais qualidades da psicologia e da psicoterapia fenomenológico
existencial.
Eu, por certo, não utilizaria termos possivelmente chocantes para o senso
comum, se não estivesse convencido do profundo interesse, neste sentido, de sua
utilização.
Naturalmente que alguma operação de limpeza e de esclarecimento precisa ser
feita, acerca destes termos, antes de prosseguirmos no argumento. Limpeza,
certamente. Porque nenhuma palavra, talvez, tenha sido tão pesadamente torcida e
distorcida, difamada e degradada quanto à palavra pathos. Na cultura contemporânea,
o termo pathos lembra a condição de um rei destronado, em desgraça. Pathos, na
verdade, expressa o modo de sermos, no qual vigoram, em seus plenos e efetivos
poderes, eminentemente ativos, o afetivo, a emoção, o corpo, o sentido, os sentidos; o
vivido, no sentido da vida vivida em sua imediaticidade. Pré-conceitual, pré-reflexiva,
não teórica, não prática, não técnica, não comportamental, poiética. Caracteriza o que
Buber chamou de modo de ser eu-tu; a vivência que Heidegger chamou de ser-no-mundo;
a dimensão de ser que Dilthey caracterizou como vivido, vivência.
Ou seja, esse modo de sermos da ‘vida vivida em sua imediaticidade
aparescente’, existencialmente fenomenal, ativa e criativa, potente de possível. Modo
diverso do modo de sermos no qual vigoram a mediação do conceitual, da teoria, da
moral, do científico, do técnico, do prático, do comportamento, da memória, da
história.
Esse modo pático de sermos. Que, nas suas tonalidades de embriagues, mais se
configura como um drible de corpo na consciência. Do que plena e lúcida consciência.
Dionisiacamente, sempre, mais uma tomada de inconsciência, do que uma tomada de
consciência.
Este modo de sermos, fundamental, imprescindível, ontológico e ontogênico.
No qual subpercebemos propriamente, vivemos em sua qualidade própria, o possível, a
possibilidade. E acolhemos e acalentamos a sua potencialização, o seu desdobramento, e
ato ação. Este modo de sermos que é prerrogativa ontológica nossa de mergulho no Ser,
na potência, no eterno retorno da força. Existencialmente, momento de uma ins-pir-
ação. Meramente porque nele, e só nele, o possível, a possibilidade da superação, que
qualificam o humano, são possíveis e se desdobram.
Estas são qualidades do pathos, enquanto modo humano de ser. E o sentido de
uma ética, um modo de proceder, que o privilegia. O sentido de uma pathética. Path
Ética. Ou seja, de uma ética que privilegia as qualidades de um modo páthico de ser.

Pois bem. Na medida em que o corpo foi desqualificado, no decorrer do


desenvolvimento socrático-platônico da civilização ocidental; na medida em que o
possível e a força, a potência, foram abominados, o pathos, que é corpo ativo, e morada
e agência do possível, a dimensão do possível que constitui o nosso ser, e de sua
atualização, o pathos foi, igual e concomitantemente abominado. A palavra (pathos), o
conceito, este modo de sermos, foram virulentamente assacados, massacrados, torcidos
e distorcidos, difamados, degenerados... Até representarem, e intensa e
predominantemente conotarem, o sentido de doença, na concepção de patologia. Ou de
“doença” mental, em sua mais soturna apropriação pelo ressentimento, na expressão
psicopatologia*...
Foi necessário o Humanismo da filosofia européia do Século XIX, na sua volta
ao Renascimento e à antiguidade grega; foi necessário Nietzsche, e a Fenomenologia,
para resgatar o sentido e o valor do corpo, do vivido e dos sentidos. Para resgatar o
valor do pathos, e de uma path-ética. Para que se pudesse afirmar e resgatar o pathos, o
modo de ser da vivência pática, como um valor.
Até que se pudesse entender que este modo pático de ser faz parte de nosso ser,
faz parte de nossa saúde, e é, não só, a fonte desta saúde, como a fonte de nosso ser.
Fonte seminal de geração e regeneração de nós mesmos, e do mundo que nos diz
respeito. Aos quais podemos criar e recriar, gerar e regenerar, na medida em que
aceitamos e integramos, em que afirmamos, em que vivenciamos na sua propriedade o
nosso modo páthico de ser. Que, de resto, só pode ser extinto muito depois que
estivermos, nós mesmos, extintos. Isto por um motivo muito simples, e comum a todos
nós: somos seres do possível, e é especificamente nesse modo páthico de ser que o
possível é possível, e se desdobra.
Na verdade, é a restrição, em nossa vida, desse modo páthico, o seu
sufocamento, na reiteração excludente dos ditames e limites da hegemonia da
consciência lúcida, calculativa, asséptica, repetitiva, medíocre, obsessiva; a restrição e
sufocamento do páthico na hegemonia do limite, do individual e da individualidade,
que é a base para o que metaforicamente podemos chamar de “doença”, num sentido
existencial, e para todos os distúrbios somáticos que podem daí decorrer.

Patéticos sempre houve. Aqueles que entendiam a loucura da interdição de


nosso modo páthico de ser, imolado no altar da vontade de abstração, da racionalidade
**
Na verdade, aí, um predomínio do sentido latino do termo, de sofrente, paciente, que amálgama ao
sentido grego original.
conceitual, da abstração do corpo e dos sentidos da vida vivida em sua imediaticidade.
Vontade que mal se escondia e se esconde como má vontade para com tudo que é vivo,
e que de vida palpita. Patéticos que assumiram uma ética do pathos. Ou seja, um modo
de proceder que não exclui a afirmação do pathos, do páthico. Que na verdade o
privilegia como modo ontológico de sermos.
Os pré socráticos, que privilegiavam o corpo, o vivido e os sentidos, assumiam
uma perspectiva de privilegiamento do pathos. A escola filosófica de Aristóteles ficou
conhecida como escola dos peripatéticos.
Normalmente, quando se indaga o que significa termo peripatético, responde-se,
apressada e sumariamente, que ele designa o fato de que os filósofos desta escola
filosofavam andando. Daí, diz-se, este termo como designação (!?).
Esta “explicação” sumária deixa de fora o sentido maior. De que, à medida que
se caminha, a abstração mental, a mente reflexiva, conceitual e calculativa, cede
progressivamente lugar ao modo de ser de uma vivência pática. A mente reflexiva cede
lugar a uma acentuação do pathos. De modo que o que os filósofos peri-path-éticos
buscavam era esta acentuação do pathos, e a filosofação a partir desta vivência acentuada
do pathos.
Patéticos, então, na medida em que assumiam uma ética, um modo de proceder,
que privilegiava o pathos, a vivência páhtica, enquanto método de filosofação.
Mais que isso, peri path éticos, na medida em que não apenas privilegiavam a
vivência páthica como método, mas assumiam uma atitude ativa de afirmação, e ativo
mergulho, no modo pático de ser como estilo de filosofação. Uma querência pelo risco e
pela tentativa poiética de atualização de seus possíveis. Daí também o sentido de ex-
peri-mentação, num sentido fenomenológico existencial.
Aristóteles, seus colegas e discípulos, eram, assim, peripatéticos. E propriamente
pode-se, assim, dizer que fizeram escola. Não só patéticos, como peripatéticos, o foram
também, dentre outros, Brentano, Nietzsche, o Expressionismo e os expressionistas,
Heidegger...
De modo que quando descobriram como método não só a path ética, mas, em
específico, a peri path ética, como modo privilegiado de ser, para o terapeuta e para o
cliente, os psicoterapeutas fenomenológico existenciais, como Carl Rogers e F. Perls,
não só não estavam sendo exatamente originais, como estavam em muito boa
companhia...
Começou lentamente, com a qualitativa contribuição de C. G. Jung e de Otto
Rank, e Sandor Ferenczi, que entenderam que a psicoterapia não tinha a ver com o
tecnicismo inerente a um modelo objetivista, o modelo médico, em particular, que
preconizava a intervenção de um sujeito, o psicoterapeuta, sobre um objeto, paciente.
Evoluiu com as mudanças paradigmáticas dos psicoterapeutas fenomenológico
existenciais europeus, como M. Boss e L. Binswanger, e os psicoterapeutas relacionais,
que enfatizavam a imediaticidade da relação inter humana como elemento
fundamental do processo terapêutico. Até desaguar nos modelos peripatéticos das
abordagens de Carl Rogers e de Fritz Perls. Ambos preconizando, e buscando criar
condições para o, patético mergulho ex-peri-mental do cliente, mergulho efetivamente
peripatético, como recurso fundamental do logos metódico de seus modelos.
Concomitantemente, vale observar que, a preconização de uma vivência
peripatética para o cliente, a partir dos vetores de sua atualidade e atualização
existenciais (e não de uma experiência moralista, científica, técnica ou teorizante), como
recurso fundamental de método psicoterapêutico e psicológico, é acompanhada por
igual prescrição de disposição metodológica para o terapeuta. Uma disposição
fenomenológico existencial experimental, peripathética, como disposição metodológica
hábil a facilitar e a potencializar a vivência e desdobramento da vivência do cliente.
Não podemos dizer que Carl Rogers tivesse, ao tempo de sua morte, uma
articulação teórica, ou consciência plenas, do alcance de suas intuições peripatéticas.
Mas podemos certamente dizer que é ele que vai mais longe na preconização e na
prática da vivência peripatética como logos metódico de uma abordagem de psicologia e
de psicoterapia.
Muito particularmente, em especial, porque ninguém certamente, como Rogers,
percebeu, e amplamente exercitou, de um modo preponderantemente empírico, o
poder pático, o poder de propiciamento peripático do grupo, como ambiência
terapêutica, de trabalho psicológico e de crescimento humano. A vivência do processo
grupal, e de seus desdobramentos vivenciais, como ambiência propícia para a vivência
peripatética, e suas implicações, como modo de ser no âmbito dialógico no qual o
possível é possível e se desdobra.
Se podemos dizer que Rogers não tinha uma consciência plena, e, em particular,
uma articulação teórica cabal, do alcance de suas intuições, não podemos deixar de
ressaltar que, desde o início, suas intuições eram neste sentido distintas. O que se
configura muito claramente a partir do momento em que ele passa a falar de empatia –
em-pathia. E que Empatia, especificamente, significa “dentro do pathos”.
Como formulador de uma abordagem de psicologia e de psicoterapia, Rogers
opera um verdadeiro striptease de concepção e método, em direção a uma preconização
da vivência pática como ambiência e recurso psicoterapêutico. Preconização
amplamente protagonizada experimental e empiricamente por ele próprio, seja ao
nível da vivência da prática da psicoterapia individual, seja ao nível da vivência
grupal.
Rogers vai abrindo mão, enquanto psicólogo, enquanto psicoterapeuta, e
enquanto facilitador de grupo -- e libertando o cliente --, de uma concepção e de uma
prática técnicas, de uma concepção e de uma prática científicas, de uma concepção e de
uma prática moralistas, de uma concepção e de uma prática realistas. Como
característica de prática e de concepção de si próprio enquanto psicólogo,
psicoterapeuta, e enquanto facilitador de grupo.
Rogers vai abrindo mão de um desempenho moralista, de um desempenho
técnico, de um desempenho reflexivo, de um desempenho científico, ou cientificamente
assentado, e mesmo desempenho prático, em direção ao privilegiamento de uma
vivência páthica, de uma path-ética, em-pathética, na verdade peripathética. Nem teoria
nem prática, na verdade uma poiética.
Não é outro o reconhecimento que ele faz do valor de saúde no exercício da
liberdade experiencial, da avaliação organísmica da experiência. De resto já preconizadas por
F. Nietzsche.
Rogers evoluiu decidida e alegremente no sentido de um modelo que se
esmerava em criar condições para que o cliente pudesse dar-se aos influxos de sua
experiência organísmica, aos influxos dos poderes de sua atualização e avaliação
organísmicas, no âmbito de uma vivência páthica. Isto é o que podemos entender como
uma patética. Peripathética.
O Rogers que encontramos na segunda metade da década de setenta, até o final
de sua vida, é um Rogers imerso no privilegiamento da vivência peripatética no
contexto da vivência grupal.
Evidentemente que existe em Rogers uma consideração substancial sobre o
método do terapeuta, sobre o seu modo de ser e de proceder na criação das condições
para que a vivência páthica do cliente possa ser privilegiada. E, na verdade, o que
Rogers propõe, no essencial, como modo de ser do terapeuta e do facilitador de
grupos, é o modo de ser da vivência páthica, empáhtica. Rogers propõe, em essência, um
terapeuta, um facilitador de grupos, em-páticos. Que privilegiem se situar, nos melhores
momentos de vivência de seu logos metódico, dentro de sua vivência páthica, como
modo de ser do terapeuta e do facilitador de grupo. Modo de ser este que pode
potencializar a vivência páthica do cliente e dos membros do grupo, o modo próprio à
atualização de seus possíveis.
Patético, Empatético, Peripatético, é o modo de ser privilegiado pelo terapeuta e
pelo facilitador de grupo que adota o modelo rogeriano, seguindo o caráter e o estilo
patético, Empatético e peripatético de seu preconizador.
Foi ousado, muito ousado, Carl Rogers, abrindo mão dos sisudos referenciais
da ciência de antanho, dos poderes e pseudo poderes que esta faculta, dos poderes que
permitem a postura técnica, a postura teorizante, a postura moralista, e mesmo e em
especial, os valores da prática --, mesmo sem ver claramente o outro lado da travessia.
Hoje, podemos claramente entender que a ciência, o científico, o técnico, o
teórico, o prático, o moralista, não dão conta da laboração ao nível do existencial, não
dão conta da existência, na projetatividade do possível e da possibilitação a ela
imanentes.
Numa imagem ainda insuficiente, podemos dizer que a relação da ciência com
a existência é análoga ao pegar em pétalas com luvas de siderúrgica. O técnico
constitui-se como uma acentuação, ainda, da discrepância. Na medida em que se
configura como aplicação do conhecimento científico.
Rogers entendeu isto claramente. E, ainda que não o tivesse articulado
teoricamente, fez os movimentos decisivos para definir e constituir a prática da
psicologia, da psicoterapia, da facilitação de grupos, no âmbito própria e
especificamente da hermenêutica fenomenológico existencial. Diante das insuficiências
e inespecificidades da ciência, da técnica e do moralismo, em relação à existência e ao
processo de sua atualização.
Limitações e insuficiências na articulação teórica, ainda que carentes de
superação, não impediram Rogers, não obstante, de experimentar amplamente, ao
nível da prática empírica, o modo de privilegiamento do pathos, a patética, peripatética, a
ética, como modo de procedimento, de uma hermenêutica fenomenológico existencial,
no âmbito da psicologia, da psicoterapia e da facilitação de grupos.
Em particular porque este modo de procedimento é o modo próprio e hábil
para que experimentalmente se possa engendrar respostas para questões sobre “o que
é que esta pessoa pode?” “O que é que pode este grupo?” “O que podem os seus
participantes?” “O que posso eu...”
Na medida em que descobrimos e redescobrimos que é ao modo de ser de uma
ex peri path ética que o possível -- que nossa atualidade existencial reivindica, solicita, ou
desesperadamente demanda – que o possível é efetivamente possível, e se desdobra.
Possibilita-se.
Temos a descortinar-se diante de nós os primórdios e toda uma história
possível, teórica e prática, teórica e empírica, poiético empírica, da psicologia, da
psicoterapia, e da facilitação de grupos, pertinente a um paradigma peripatético, um
paradigma fenomenológico existencial hermenêutico.
E temos a saudar, efetivamente, um grande e sincero pioneiro, com suas
ousadas experimentações. O Dr. Carl R. Rogers, um membro distinto da “confraria”
dos patéticos, empatéticos, peripatéticos...
18. O RISCO E O ÔNUS DO ROGERISMO VULGAR

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

O paradigma rogeriano de concepção e método de trabalho em psicologia,


psicoterapia, de trabalho com grupos, e em áreas afins, é danadamente simples. E aí residem,
de um modo importante, alguns riscos, e a fonte do ônus dos riscos, de seus mal entendidos, e
de suas degenerações. Tão operativas, desde a sua concepção. Um dos mais importantes
motivos: a confusão fácil entre o simples e o simplório... É esta a confusão que sempre operou,
e opera o rogerismo vulgar.
Apesar de bastante simples, efetivamente, o modelo rogeriano é dono, e se
caracteriza, por um sutil e importante refinamento conceitual, metodológico, e em sua
vivência. Este refinamento, que garante a simplicidade do modelo, passa despercebido ao
senso comum, simplório senso comum, nesta instância particular. Na medida em que se funda,
simplesmente, no privilegiamento de nossa condição ontológica compreensiva,
fenomenológico existencial, e poiética. Ou seja, em nossa condição básica de atualização
fenomenológico existencial e poiética de possibilidades -- nossa condição humana básica,
empírica e experimental --; e na consideração incondicional pela alteridade dialógica do outro,
e de nós próprios. Sem maiores rebuscamentos teóréticos, práticos, ou técnicos, na sua
vivência.
A simplicidade, e a própria orginalidade, e competência, do modelo desvanescem, e se
perdem, quando ele é apreendido, e concebido, de um ponto de vista objetivista, ou
meramente positivista, ainda que dissimulados. Ou do simples ponto de vista de nossa normal
cotidianidade coisificada.
E o paradigma rogeriano sempre correu, e corre, o risco de uma apreensão objetivista,
ou a partir do senso comum de nossa cotidianidade coisificada. Nas confusões de suas origens,
no objetivista meio da cultura anglo saxã, do qual procurou, em essência, se diferenciar; e em
função de posturas pouco laboriosas na sua recepção, que cuidam de não se ocupar dos
fundamentos do modelo, de sua história, e de sua história conceitual; e, inclusive, da
responsabilidade profissional por este conhecimento. Como se estas condições fossem
inerentes ao modelo, e não simples distorção, ou o pressuposto da própria Filosofia
Objetivista. Não se ocupam nem de entender, por exemplo, o que quis Rogers dizer quando
explicitou que a tendência atualizante opera de modo especificamente fenomenológico
(ROGERS, 1975), e as implicações disto.
É mais fácil o simplório, sob a justificativa da simplicidade do modelo. O que,
naturalmente, não se sustenta.
Não é preciso se tornar filósofo, mas entender certas questões básicas, e simples. É
uma questão de especificidade. Estudar um pouco pode ajudar.
Filosofia não! Epistemologia, Ontologia, não! dizem, firmemente situados na postura
da Filosofia Objetivista, e do Positivismo; e/ou na cômoda e pouco laboriosa cotidianidadee
coisificada do senso comum; instalada, então, em postura de saber profissional especializado.
Essa não era a postura de Rogers, nem da abordagem rogeriana, nem são por eles
preconizadas...
Não é assim. É preciso um pouco mais de disposição de estudo. E, efetivamente, não
precisa se tornar filósofo para isto. Apenas um profissional responsável pelos pressupostos e
fundamentos da abordagem, da concepção e método, que utiliza. O caráter empírico
(fenomenológico existencial) da abordagem rogeriana não se desinteressa, nem se exime da
responsabilidade por sua fundamentação teórica, e pela teorização que da vivência decorre.
Na verdade, o senso comum, instalado no âmbito profissional, baseado em suas
premissas de entendimento do modelo rogeriano, e lhe pressupondo um caráter que, na
verdade, é apenas simplório, e objetivista, lhe tem causado danos e mal entendidos
significativos. Não raro, o ridículo no âmbito especializado. Nesse caso, não se trata de
preconceitos decorrentes de diversidades de escola. Mas de ridículo, especificamente,
decorrente puramente de inconsistência, e irresponsabilidade conceitual e metodológica.
Ridículo no meio especializado, e no meio de muitos dos que optam por aprender o modelo
rogeriano, e por se dedicar a ele, e terminam por desistir, face às inconsistências e bazófias
triunfantes, e açucaradas, do simplorismo do senso comum, instalado em suposto saber
especializado.
Naturalmente, o rogerismo vulgar é, felizmente, cada vez mais escasso e anacrônico. E
existe uma disposição cada vez mais geral, cada vez mais generalizada principalmente nos
novos, para o estudo, e para a apreensão e desdobramento dos fundamentos da abordagem
rogeriana. Muitos se dedicam ao estudo acadêmico, com interessantes resultados,
freqüentemente. Muitos produzem e refletem a partir de longa e significativa prática. Entre
estes, por exemplo, os estudos das relações do modelo rogeriano com o Pragmatismo, que,
nem de longe se dá a uma atitude simpolória.
Não é difícil a qualquer mortal entender o que é organismo, o que é experiência
organísmica, auto atualização organísmica, ação, tendência atualizante, compreensão,
empatia, objetivismo, empirismo, empirismo objetivista, empirismo fenomenológico, dialógica,
encontro, inter humano...
O senso comum objetivista não dá conta de entender, não obstante. E estas
concepções e posturas estão definitivamente perdidas quando concebidas a partir dos
referenciais e posturas positivistas, de um objetivismo positivista, de um empirismo
objetivista; de uma perspectiva simplória, antes que simples, muito essenciais, todas elas, e
intrínsecas, ao rogerismo vulgar.
Não sem razão. A compreensão fenomenológico existencial, dialógica, desses
conceitos é conditio sine qua non do entendimento do paradigma rogeriano, como mostra a
sua natureza, como mostra a sua história, e a história de seus conceitos. Esses conceitos
possuem essencial enraizamento filosófico, e é muito precário, senão fatalmente distorsivo,
tentar entendê-los, sem recursar às fontes teóricas e filosóficas que essencialmente lhe dão
origem. Como dissemos, no âmbito do empirismo objetivista, ou da simplória postura do
rogerismo vulgar, eles estão definitivamente perdidos.
Em particular porque o paradigma rogeriano, fenomenológico existencial, cresce e se
desdobra, heterogeneamente, no âmbito hostil do objetivismo e do empirismo objetivista, do
positivismo norte americano. O simplório senso comum objetivista, guindado à condição de
fundamento de entendimento e prática profissional, no rogerianismo vulgar, em sua
arrogância típica e caracteristicamente objetivista, positivista, reivindicando a “simplicidade”
do modelo rogeriano, confunde, essencialmente, o que é da ordem da simplicidade com o
mero simplório. E recusa a exploração filosófica que busca entender a especificidade do
paradigma rogeriano, a especificidade de seus conceitos e de sua metodologia. E o óbvio
enraizamento deles nas filosofias humanistas da Fenomenologia, da Filosofia da Vida e dos
Existencialismos.
Nos mal entendidos, no âmbito objetivista, positivista, em que o modelo rogeriano
heterogeneamente se desenvolveu, o rogerismo vulgar elege a sua posição, de cunho
eminentemente objetivista e positivista, como caudatária do Positivismo e do Objetivismo.
Mesmo quando recorre a precárias correntes da “Fenomenologia” norte americana.
Tudo que Rogers e a abordagem rogeriana buscou superar, e de que buscou se
diferencia e afastar, quando se situou tipicamente no âmbito de uma postura compreensiva,
eminentemente fenomenológica e existencial, como a postura própria para um respeito
incondicional pela diferença do outro, o rogerianismo vulgar tende a malbaratar, com o seu
entendimento curiosamente objetivista e positivista do paradigma rogeriano.
Filosofia, não! É complicada, e nós não queremos ! Inscientes, certamente, de que esta
é, simplesmente, a reiteração da postura mais típica da filosofia empirista objetivista, e
positivista...

Para um entendimento e explicitação do modelo compreensivo rogeriano, é


necessário se dedicar à sua história e a sua história conceitual; a sua situação no âmbito das
filosofias humanistas, fenomenológico existenciais, e no âmbito do paradigma compreensivo
da filosofia da vida. Felizmente, parece que podemos perceber que o rogerianismo vulgar é
cada vez mais anacrônico no âmbito da abordagem rogeriana, à medida que emergem
problematizações críticas, como a busca de um entendimento das relações entre o paradigma
rogeriano e o paradigma do Pragmatismo Norte Americano.

Referências Bibliográficas
ROGERS, Carl PSICOTERAPIA E RELAÇÕES HUMANAS, Interlivros, 1975.
19. Carl Rogers. Sobre o sentido da concepção e do
logos metódico de seu paradigma em psicologia e
psicoterapia I
Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo

affons@uol.com.br

O Carl Rogers que encontramos na culminância de sua obra, e de sua vida, era, de um
modo evidente, superlativamente despojado, e despretensioso.
De várias formas. E aqui nos interessa no que concerne a sua atividade profissional, a
suas concepções e método, e ao sentido ensaístico de sua produção escrita. Carl Rogers era,
então, o empirista fenomenológico existencial por excelência; na tradição de Brentano.
Fenomenológico existencial, dialógico (Buber), na tradição de Brentano. Mesmo que se pudesse
observar a prevalência de toda uma teorização, metafísica, e mesmo retórica, da tendência
atualizante, Carl Rogers já tinha ido, experimentalmente, além; no sentido do logos metódico de
um empirismo humanista*, fenemenológico existencial, dialógico, em psicologia e psicoterapia,
no âmbito das relações humanas.
Desinvestido de qualquer pressuposto de condição e desempenho técnicos, na sua atuação.
Destituído de aspirações científicas tradicionais. Ou de veleidades práticas, e pragmáticas.
Destituído da crença na efetividade do teórico e da teorização, e do moralismo, em particular, ao
nível do existencial.
Sua produção escrita, igualmente, perdera, cada vez mais, as veleidades
especificamente teorizantes, explicativas, ou científicas. E, cada vez mais, se configurava como
ensaística, brotando espontaneamente da experiência existencial, e vivência fenomenológico
existencial, empírica, e experimental de seu trabalho.
Como meio e como via, como jeito de ser, do psicólogo e do psicoterapeuta, do
educador, da pessoa -- em processos de co-laboração na plasmação de metamorfoses, e de
destinos existenciais11 --, o sentido do logos metódico de Rogers radicalizou-se, progressiva, e
firmemente, numa postura de abertura para, de privilegiamento, e de afirmação, dos momentos
de dialógica interhumana (Buber).
O sentido do logos metódico de Rogers radicalizou-se numa postura de afirmação da
concrescência da existência, na pontualidade de seus desdobramentos. Consistentemente
arraigado em pré condições de respeito radical -- pessoal e metodológico -- pela alteridade, pela
diferença, do cliente; e de respeito pela diferença e frescor de sua vivência empírico fenomenal.
Como imprescindíveis condições do privilegiamento do encontro, nesta dialógica interhumana. O
encontro como vivência de momentos de um modo de ser generativamente existencial, existenciativo,
poiético.
O quanto, e o como, nos acostumamos a ver -- na vivência de sua relação com o cliente,
ou com o grupo, a guisa de metodologia -- a obstinação de Rogers, e de seus colaboradores mais
imediatos, no privilegiamento, radical, da mera, nua, crua, e simples, dialógica interhumana. Não
raro, de um modo exasperante, caótico, desconcertante, irritante... Mas pacientemente
**
Na tradição do Humanismo de filósofos do Século XIX, como Brentano e Nietzsche, que voltavam à
Filosofia do Renascimento, e aos gregos pré-socráticos, na recuperação da vivência humana como
critério.
11
BUBER, Martin
elaborado, até que, como dizia Perls, o deserto começasse a florescer. Ou, como dizia John Wood,
até que a orquestra se afinasse, e estivesse em condições de uma performance poiética.
Mal entendido, muito mal entendido, foi Carl Rogers, muito freqüentemente, em sua
postura metódica. Mal entendido pelos de fora. E, freqüentemente, mal entendido por muitos
dos “de dentro”, que assumiam a incorporação de seu modelo.
Estes, muito freqüentemente, pelo equívoco banal, e danoso, de confundir, e trocar, por
motivos vários, o simples pelo simplório. Descurando do elementar, mas tão precioso, e
sutilmente conquistado, empirismo humanista , fenomenológico existencial, dialógico na relação
inter humana.
Substituindo por atitudes retóricas, e estereotipadas, ou meramente manipulativas, a
essência incontornável de vivência de incerteza, de vivência de confirmação da, e de interação
com a, diferença do outro; negando-se à vivência de desconcerto, não raro de desconforto, ou de
conflito, inerentes à vivência deste empirismo inter humano -- fértil, como tal, à germinação da
ação, da criação, da existenciação.
Mal entendido pelos técnicos, Carl Rogers. Técnicos que surpreenderiam, evidente e
obviamente, a indigência de técnicas, de uma metodologia técnica, no paradigma rogeriano.
Inscientes, talvez, de que Rogers já havia, de há muito, passado pela questão da técnica ao nível
existencial das relações inter humanas. E entendido que a existência, em seu caráter fenomenal
essencial de atualização de possíveis inéditos, essencialmente irrepetíveis em sua qualidade e
processo, não é acessível à efetividade de competência da técnica. A existência, como observou
Heidegger12, resolve-se apenas existencialmente. E Rogers entendia isto muito bem, e
profundamente; e entendia a inefetividade, e mesmo o dano, sempre iminente e atual, do abuso
da impropriedade de uma abordagem técnica em questões existenciais. Na verdade, foi esta
uma primeira constatação e uma das primeiras condições de método dos psicoterapeutas e
psicólogos fenomenológico existenciais.

Mal entendido pelos científicos. Que – pertinentemente -- não reconheciam no


paradigma rogeriano, e em sua atividade profissional, a aplicação do método científico formal.
Nem a aplicação tecnológica, por este paradigma, de um conhecimento elaborado através dos
procedimentos científicos consagrados.
Rogers entendeu que -- da mesma forma que o paradigma técnico -- o paradigma
científico não dava conta da, nem se aplicava à, ato-ação ao nível do existencial. Na medida, em
particular, em que o existencial se configura como sendo da ordem do modo humano de ser do
poiético, e não da ordem do epistemológico.
Bem ao gosto de Nietzsche13, Rogers entendia que o existencial não se conforma ao
pressuposto científico da busca de verdades. Nem às esferas do conhecer e do conhecimento e de
suas vontades. Não é por outro motivo que o coração tem razões que a própria razão desconhece
(Pascal); e que seria enloquecedor se amor tivesse a ver com verdade... (Maffesoli). Mas, mais
propriamente, o existencial a-ventura-se, de um modo essencial, na incerteza, e na
improvisação, da pot-ência criativa, na possi-bilidade humanamente ontológica da criação do
verdadeiro.

Mal entendido pelos moralistas. Especial e inconformadamente destronados. Moralistas


que, similarmente aos científicos, não encontravam no paradigma rogeriano a preocupação
12
HEIDEGGER, M.
13
MACHADO, Roberto... NIETZSCHE, F. GAYA CIENCIA,
tradicional com a busca da verdade, com uma busca de adequação a verdades, ou a valores
preconizados, nem com a transmissão, ou imposição, de verdades estabelecidas. Nem mesmo,
inclusive, uma preocupação com o positivismo do real, ou com o princípio de realidade.

Os pragmatistas chocavam-se, certamente, com a enorme inutilidade e “desperdício” de


tempo da metodologia vivencial rogeriana. Essencialmente incompatível com o prático; em
especial, incompatível com o pragmático.
Sem advertirem-se, talvez, de que, em sua especificidade, a existência humana --
eminentemente da ordem do modo de ser do poiético -- dá-se e desdobra-se, cria-se, engendra-
se, resolve-se, ao nível deste humano modo de ser que não é da ordem do modo de ser no qual
se dão o útil e a utilidade; um humano modo de ser que não é da ordem do modo de ser no qual
se dão a prática, o valor do prático e da pragmática. Ainda que deste poiético modo de ser tudo
provenha, e provenham, inclusive, em suas especificidades, todos os úteis, e as suas utilidades.
Na verdade, como observa Buber 14, o modo humano ontologicamente existencial de ser
não só não é da ordem do útil e da utilidade, como não é, igualmente, da ordem do modo de ser
no qual vigoram os fins e os meios; não é da ordem do modo de ser da arbitrariedade, não é da
ordem do modo de ser em que vigora a causalidade das causas e dos efeitos, dos meios e dos
fins; nem mesmo é da ordem do modo de ser que entendemos como realidade, no sentido objetivo
do modo de ser no qual vigora o eixo dicotômico das relações sujeito-objeto...

Para os teóricos... Para os teóricos, Rogers, a santa incoerência... Uma verdadeira


metamorfose ambulante. Congenitamente ingênuo...
De vários tipos, os teóricos, em uníssono, e estereotipadamente, balançam,
desaprovadoramente, a cabeça, diante do paradigma rogeriano.
Sem precatar-se de que, fundamentalmente, Rogers compreendera, em sua efetividade,
a distinção específica entre teoria e existência, a distinção entre ação e teoria. E estava
convencido de que, para lidar efetivamente com a condição humana -- com suas questões, com
suas crises, superações e crescimento; para lidar com a sua efetiva e específica possibilidade de
ação -- é imperativo fazer-se ao largo do teórico, da teoria e da teorização, e direcionar-se,
decidida e radicalmente, no sentido deste delicioso (cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é...), e
ontológico, modo existencial de sermos. Que é perfeita aderência à ação, à incerteza, e ao devir,
fenomenais. E que, especificamente, e por definição, e radicalmente, não é da ordem do modo
de sermos em que somos teóricos e conceituais.
Não que Rogers fosse um anti teórico. Nada disso. Rogers tinha uma grande
consideração pela teoria e pela teorização. Está aí a sua obra escrita. Mas, ainda que se
interconectem, e interajam, cada coisa no seu lugar. O desafio de Rogers era lidar com a
potência humana de superação, e as dificuldades existenciais neste processo de superação,
lidando com clientes de psicoterapia, e de psicologia. Rogers entendeu que a atuação, a
efetivação, desta potência humana de superação se dá, especificamente, no âmbito do modo de
sermos que é pré-teórico, pré-reflexivo, pré-conceitual. Na vivência deste modo de sermos, a
teoria e a teorização são supérfluos, de pouca valia, inefetivos, quando não perturbadores,
repressivos e danosos. Este modo de sermos demanda outras habilidades, equivalentes às de
um dançante ou de um nadador, de um artista, em suas atividades.

14
BUBER, M.
Quanto a sua própria teorização, Rogers, assim como Perls, viu-se preso, e desafiado,
portanto, na teoria e na teorização, e na elaboração do logos metódico, de uma metodologia de
psicologia e de psicoterapia no âmbito de um modo de ser, radicalmente não teórico,
fenomenológico, existencial, empírico. Modo de ser próprio da existência e da existenciação, sua
e de seus clientes, e dos participantes dos grupos que facilitava; modo de ser próprio à dialógica
inter humana, interpessoal, e coletiva. E, coerente, e concernentemente, sua teorização vai se
tornando cada vez mais despretensiosa, em termos especificamente teóricos e explicativos, cada
vez mais ensaística, à medida em que ele mergulha na perplexidade da vivência de atitudes
comensuráveis com as qualidades fenomenológicas, fenomenoativas, do próprio modo de ser
da existência. Atitudes cada vez menos explicativas, e teóricas, cada vez mais implicativas e
compreensivas. Rogers sempre privilegiou a experimentação fenomenológico existencial. A
linguagem da existência. E, com isso, abriu possibilidades preciosas para a psicologia, para a
psicoterapia, para o trabalho ao nível do humano. Possibilidades nem sempre compreensíveis
de um ponto de vista teórico.
É fundamental considerar deste ponto de vista a obra teórica de Rogers. A sua evolução
à medida que se desenvolve a sua experimentação; a natureza especificamente não teorizante
de seu método; e a própria perplexidade da experimentação profissional de uma metodologia,
que por existencial, era especificamente empírica, não teórica, não conceitual.

É muito importante considerar que a elaboração do paradigma rogeriano, um


paradigma não teorético, e, por isso, empirista -- mas empirista num sentido fenomenológico
existencial dialógico -- se dá, exatamente, no âmbito hegemônico e forte de um empirismo, mas,
especificamente, o empirismo objetivista, vigente na cultura norte americana e anglo saxã. Carl
Rogers destaca-se, assim, com a contribuição de uma concepção e método de psicoterapia
fenomenológico existenciais empíricos, radicalmente heterogêneos com relação ao empirismo
objetivista predominante.
Tudo isto aponta para questões extremamente importantes, que dizem respeito ao fato
de que o importante, em termos da obra de Rogers, não é exatamente a sua teorização, mas a
sua metodologia não teorizante. Ou seja, o melhor ponto de vista para a compreensão e a
apreciação do paradigma rogeriano não é exatamente o ponto de vista de sua teoria. E, neste
sentido, é importante considerar a insuficiência da teorização, mesmo a teorização de Rogers,
para captar e expressar teoricamente a especificidade de seu logos metódico.
O mesmo podemos dizer com relação ao ponto de vista científico, com relação ao ponto
técnico, e com relação ao ponto de vista prático, e com relação ao ponto de vista pragmático.
Como pontos de vista inespecíficos e impróprios para a apreensão e compreensão do
existencial, do fenomenológico existencial empírico, e, portanto, do paradigma rogeriano.

Como observamos, longe estamos de dizer que o paradigma rogeriano não é teorizável,
ou que a teoria e a teorização não sejam importantes no seu âmbito, ou que não existe, na sua
aprendizagem, reprodução, e recriação, uma dimensão teórica efetiva. Nada disso. Apenas é
necessário colocar as coisas em seus devidos lugares.
Em primeiro lugar, afirmar que o ponto de vista teórico não é o melhor ponto de vista
para a compreensão do paradigma rogeriano. Na verdade, é o teórico um paradigma
impróprio. A teoria é possível, sim, inevitável, necessária, interessante. Mas, quando efetiva, no
caso do paradigma rogeriano, trata-se da teorização de um paradigma cuja vivência é
qualitativamente descontínua com o teórico. Da mesma forma que podemos contemplar e
imaginamos a água da piscina quando dela nos aproximamos. Outra coisa é mergulhar na água,
vivenciá-la, e nadar, com ela interagir e desfrutá-la, das várias formas possíveis. O momentâneo
mergulho exige, e implica, outras formas de conhecimento e habilidades que própria e
especificamente não são teóricos, ou teoricamente providos. São fenomenais, fenomenológico
existenciais, fenomenativos, pré-conceituais, pré-reflexivos, empíricos.

É interessante observar que Rogers movimentou-se e evoluiu, em termos humanistas,


dos contrafortes norte americanos da ciência positivista, e objetivamente empirista; e do
moralismo religioso puritano; em direção ao existencial, ao empírico fenomenológico
existencial. Em sua trajetória, guardava em si, desde o início, o germe do fenomenológico e do
empatético. Mas esta trajetória careceu de se configurar como uma imensa atividade de
desconstrução. Imensa -- não tanto em quantidade como em qualidade -- atividade de
desconstrução dos paradigmas objetivista, do paradigma técnico, do paradigma científico, do
paradigma moralista, do paradigma teórico, do paradigma pragmático, e do paradigma
prático...
De modo que quando Rogers culmina, em seu paradigma, com o privilegiamento da
nua dialógica interhumana – ou interlógica diahumana -- de sua empatética, um imenso trabalho
de desconstrução e cascavilhamento já havia sido operado.
Creio que podemos dizer que, como não poderia deixar de ser, Rogers deixa a sua
teoria bastante inconclusa. Na verdade, o ponto culminante de seu modelo é, num certo sentido,
em termos teóricos, um ponto zero. Ele chega às proximidades do ponto zero de uma teoria do
privilegiamento fenomenológico existencial empírico, nu e cru, da dialógica interhumana, como
logos metódico de sua empatética.
Podemos ver que, se, por um lado a sua teoria vai ganhando um caráter
despretensiosamente ensaístico; e mesmo se são eventualmente flagrantes contradições,
descontinuidades, com relação a um modelo, a uma ontologia fenomenológico existencial; por
outro lado, a sua atividade profissional vai ganhando um caráter cada vez mais vivencial, cada
vez mais empírico e experimental, num sentido genuinamente fenomenológico e existencial.
Caráter que Rogers experimentou vivencialmente, de um modo intenso, em vários contextos, na
psicoterapia individual, na vivência de grupo, na resolução de conflitos, na pedagogia...
Ancorado, é certo, eventualmente, na metafísica de uma tendência atualizante, concebida em
bases exorbitantemente biológicas, e apenas entrevista em seu caráter propriamente
fenomenológico existencial de vivência da dimensão humana do possível, e de sua
possibilitação.

É fundamental observar que, em se tratando do existencial, do fenomenológico


existencial, e de uma concepção e metodologia para a psicologia e psicoterapia fenomenológico
existencial, Rogers cabalmente entendeu que, se, por um lado, a questão não é da esfera do teórico
-- já que, como vimos, o fenomenológico existencial é um modo de vivência anterior, e
heterogêneo com relação, ao modo teorizante de ser --, do ponto de vista fenomenológico
existencial, igualmente, a questão não é a de uma prática. Ou seja, não é da esfera do modo prático de
ser.
E isto é fundamental, e fundador, em termos do paradigma rogeriano. Na medida em
que, como Rogers e a sua tradição entenderam, a existência, o fenomenológico existencial, não
são nem da ordem do teórico, nem da ordem da prático, de uma prática. Mas, especificamente, da
ordem do poiético. E o paradigma rogeriano configura-se, então, como um paradigma que não é
nem da ordem da teorização, nem da ordem da prática. Mas da ordem de uma poiética. (E, vale
dizer, um paradigma eminentemente estético).
Assim é que o modo de vivência, caracteristicamente privilegiada pelo paradigma
rogeriano, não se situa no âmbito da prática. Não se caracteriza como prática. E isto é um dos
seus aspectos mais peculiares e definidores, e um dos aspectos mais peculiares e definidores do
paradigma da psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial.
A prática exige o caráter voluntário e deliberado da “ação”. E o critério de sua avaliação é o
da utilidade, em particular da utilidade para a sobrevivência. A característica principal do
paradigma rogeriano é a da entrega à espontaneidade, a entrega à ação espontânea, do vivido; ou
seja, a entrega à espontaneidade generativa (poiética) do vivido, com sua característica
espontaneidade desproposital de vivência da força do possível, e da performação de sua
atualização. Na vivência existencial, não vigora a utilidade e a utilização características da
esfera da prática. E a prioridade de sua força consuma-se na superação, e não, simplesmente, no
primado da sobrevivência, da manutenção e da adaptação. As características do vivencial
fenomenológico existencial, privilegiado pelo paradigma rogeriano, não se enquadram portanto
no âmbito do prático, e da prática. Mas, especificamente, no âmbito do poiético.

Interessante, atentar, assim, na compreensão do paradigma rogeriano, para as


distinções entre os modos de ser teórico, prático e poiético, apontadas por Aristóteles na sua
divisão das ciências.
O teórico caracteriza-se pela representação, ou seja a re-apresentação de algo que se
apresenta enquanto vivência fenomenal. E que, na representação, demanda, própria e
exatamente, o afastamento deste modo de ser da vivência fenomenal. No seu sentido mais
essencial teoria significa visão de um espetáculo15. Assim a teoria constitui-se especificamente como
afastamento do modo de ser da vivência, e articula relações explicativas de natureza objetiva.
O prático16 tem sempre o sentido de uma atividade voluntária que modifica o ambiente, tendo
como critério o primado da utilidade, em particular a utilidade para a sobrevivência . Na esfera
do modo prático de ser vigoram os úteis e as utilidades; e a efetividade da causalidade e dos
meios e dos fins.
Caracteristicamente, pois, o paradigma rogeriano não se define na esfera teórica, nem
na esfera da prática. Ou seja, em sua essência não se trata do investimento em uma atividade de
teorização, por parte do cliente ou do terapeuta, do facilitador; ou de aplicação de uma teoria.
Da mesma forma, que não se trata de uma atividade prática. Ou seja, naquilo que lhe é mais
essencial, o paradigma rogeriano não guarda o caráter de valorização do útil e da utilidade, ou
o caráter de ação voluntária que caracterizam a prática. Muito menos está orientado pelos
princípios da adaptação, e da sobrevivência. O que lhe interessa é a espontaneidade generativa
do modo de ser da vivência do possível e de sua possibilitação, como superação.
Em sua atividade, o paradigma rogeriano centra-se, não na contemplação do espetáculo
da vivência do possível em sua possibilidade. Nem na contemplação dos possíveis acontecidos,
objetificados.
Centra-se, sim, na própria vivência não dicotômica e integrada, na performação, do
possível e de sua possibilitação, de sua atualização -- como atualização compreensiva, ou como
atualização objetivativa. É a vivência empática, (em)patética, da ação -- como vivência do possível, e
de sua atualização -- que caracteriza o paradigma rogeriano. Vivência, portanto, que não é nem
da ordem do teórico, nem da ordem do prático.

15
LALANDE, André Vocabulário Teórico e Crítico da Filosofia. São Paulo, Martins Fontes, 1999.
16
op. cit.
De modo que a vivência característica do paradigma rogeriano é especificamente
vivencial, e poiética. Situando-se fora das pretensões, dos pré requisitos, da teorização, e da
prática.
Longe de dizermos que este paradigma não tenha a sua eficácia. O que enfatizamos é
que a sua eficácia é mais básica e abrangente, ao nível do existencial, ou seja: ao nível da
constituição, do próprio engendramento, do sujeito, e do mundo. Engendramento poiético, como
vivida atualização despropositativa de possibilidades. Diferentemente da prática, ou mesmo de
qualquer pragmática da “ação” voluntária, e do princípio de sobrevivência como prioridade
criterial.

Com isto, mesmo que a teorização rogeriana discrepe, eventualmente, com relação a um
paradigma fenomenológico existencial -– em particular com relação a uma concepção
biologizante da tendência atualizante, e em termos de uma concepção pobremente
fenomenológica de compreensão -–, a vivência experimental de Rogers evolui a passos largos, e
firmes, no sentido empírico e experimental de uma abordagem fenomenológico existencial de
psicoterapia e de psicologia. E, diga-se de passagem, exceção feita a Fritz Perls, ninguém foi
fenomenológico existencial experimentalmente tão longe, quanto Rogers, neste sentido.
Carl Rogers. Sobre o sentido da concepção e do logos metódico de seu paradigma em
psicologia e psicoterapia II

Afonso H Lisboa da Fonseca, Psicólogo.


affons@uol.com.br
1. INTRODUÇÃO À ABORDAGEM ROGERIANA.......................................4

2. PERSONA... PERSONALIDADE, & PERSONAGEM (Personagente,


personator, personação).......................................................................14

3. A PESSOA DE CARL ROGERS É EMPÍRICA. FENOMENOLÓGICO


EXISTENCIAL EMPÍRICA....................................................................... 17

4. ABORDAGEM ROGERIANA. DE ONTOLOGIA, ÉTICA,


EPISTEMOLOGIA, E MÉTODO...............................................................19

5. PSICOLOGIA AMBIENTAL. FENOMENOLÓGICO EXISTENCIAL.


ABORDAGEM ROGERIANA. ABORDAGEM GESTÁLTICA......................21

6. ABORDAGEM ROGERIANA. DE ONTOLOGIA, ÉTICA,


EPISTEMOLOGIA, E MÉTODO...............................................................42

7. Abordagem Rogeriana. Algumas questões......................................44

8. AVALIAÇÃO ORGANÍSMICA DA EXPERIÊNCIA: CONSICIÊNCIA,


LIBERDADE EXPERIENCIAL E AFIRMAÇÃO NO TRABALHO
PSICOLÓGICO E PSICOTERÁPICO........................................................47

9. AVALIAÇÃO ORGANÍSMICA DA EXPERIÊNCIA: CONSCIÊNCIA,


LIBERDADE EXPERIENCIAL E AFIRMAÇÃO, NO TRABALHO
PSICOLÓGICO E PSICOTERÁPICO........................................................49

10. A COMPREENSÃO É EMPÁTICA. A EMPATIA É COMPREENSIVA.


(Aliás, Compreensão Empática é uma redundância...)........................55

11. Dialógica......................................................................................... 61

12. DIALÓGICA, HERMENÊUTICA E ESTÉTICA DO CONFLITO Conflito,


Mediação, e Facilitação da resolução de conflitos em Psicologia e
Psicoterapia Fenomenológico Existencial...........................................65

13. Genuinidade na Abordagem Rogeriana. A autenticidade


fenomenativa, empática, dialógica, de ser outro, em sendo ator.......94

14. DA INCONDICIONALIDADE DA PESSOA NA ABORAGEM


ROGERIANA........................................................................................ 103

15. JOHN............................................................................................. 108

148
16. Nem Teorético, nem Prático. Muito menos Pragmático O
Paradigma Rogeriano. Fenomenológico Existencial: Poiético..........120

17. Carl Rogers, o patético. Empatético, peripatético......................133

18. O RISCO E O ÔNUS DO ROGERISMO VULGAR.............................139

19. Carl Rogers. Sobre o sentido da concepção e do logos metódico


de seu paradigma em psicologia e psicoterapia I.............................142

Carl Rogers. Sobre o sentido da concepção e do logos metódico de


seu paradigma em psicologia e psicoterapia II.................................149

20. TENDÊNCIA ATUALIZANTE E EMPATIA.......................................154

21. TENDÊNCIA FORMATIVA..............................................................157

22. TENDÊNCIA ATUALIZANTE..........................................................161

23. A AÇÃO NÃO É SÓ AÇÃO MUSCULAR..........................................166

24. COMPREENSÃO E PERCEPÇÃO....................................................169

25. SINERGIA SINESTÉSIOLÓGICA DA COMPREENSÃO, E


SINESTESIOLOGIA DA SINERGIA DA MUSCULAÇÃO COMPREENSIVA.
SINERGIA SINESTESIOLÓGICA DA COMPREENSÃO-MUSCULAÇÃO:
SINERGIA DA AÇÃO. Sinetésica estética da sinergia implicativa da
ação, da compreensão, e da musculação compreensiva..................177

25. ESTÉTICA, ESTESIA E SINESTESIA, SINESTESIOLOGIA.


DIALÓGICA, EXPERIMENTAÇÃO E HERMENÊUTICA DRAMÁTICA DA
CINEMÁTICA DA AÇÃO....................................................................... 182

26. CONCEITUAÇÃO. O TEMPO, O CONCEITO, E O PRECONCEITO. O


conceito e o Tempo............................................................................ 199

Na medida em que consideramos a dimensão existencial humana, as suas crises e


questões, e as suas resoluções, especificamente existenciais, compreendemos que a concepção e
a metodologia de Rogers são muito sensíveis e refinadas. Não podemos nos iludir com o seu
despojamento. Sobretudo, apesar de simples o seu método, não podemos cair no equívoco de
confundir o simples com o simplório. A confusão do simples com o simplório se tornou às
vezes quase que epidêmica entre os “centrados”.
Isto porque, freqüentemente, as fontes da concepção e método de Rogers foram mal
compreendidas, ou mesmo desconhecidas. E sua abordagem freqüentemente entendida como o
modelo pronto do objetivismo, ou da pragmática, de uma certa tecnologia da compreensão,
adoçada de fragmentos açucarados de uma ideologia “humanista”.

149
Na verdade, como estamos comentando, o despojamento da abordagem de Rogers
atualiza um desinvestimento de posturas, de concepções, de métodos, de epistemologias, de
ontologias, incompatíveis com o privilegiamento da dimensão do existencial, com o
privilegiamento da dialógica fenomenológico existencial do interhumano; incompatíveis com a
sua empatética. Foram-se, então, na vivência do paradigma rogeriano, como observamos, os
procedimentos técnicos, as pretensões científicas, o moralismo, o pragmatismo, as reflexões
teóricas, a teoria e teorização, e mesmo as condições definidoras específicas de uma prática.
Cascavilhando, Rogers bucou as condições que pudessem garantir o veio rico do
privilegiamento da dialógica do interhumano, como concepção e como logos metódico de sua
abordagem de psicologia e de psicoterapia.
Primeiro a não diretividade, um dos pilares clássicos de seu paradigma, que marca o
seu afastamento do paradigma moralista.
A não diretividade é enriquecida pelas condições terapêuticas da compreensão
empática, da consideração positiva incondicional e da genuinidade do terapeuta, na relação
com o cliente. O privilégio da “experienciação”. A empatética -- patética, peripatética -- do
privilegiamento dos momentos próprios de vivência dos desdobramentos da dialógica do
interhumano.
De fato, Carl Rogers efetivamente experimentava, em um processo vigoroso, os
fundamentos da concepção e método de uma psicoterapia, e de uma psicologia,
fenomenológico existencial. Paradoxalmente, o seu despojamento representava, na verdade,
uma apuração experimental, cada vez mais refinada, de características fenomenológico
existenciais de concepção e de método de psicologia e de psicoterapia.

A psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial afirma-se e desdobra-se, no


âmbito da cultura brasileira, e mundial, como um interessante recurso de assistência e trabalho
psicológico e psicoterápico, e de produção cultural. Quer seja ao nível da psicoterapia, e nas
áreas do seu desenvolvimento e diferenciação; quer seja ao nível do trabalho nas várias áreas da
psicologia, que se diversificam cada vez mais, e, cada vez mais, ganham em importância. Como,
por, exemplo, no trabalho de desenvolvimento comunitário, na empresa, na psicologia jurídica,
no atendimento psicológico hospitalar, na mediação e resolução de conflitos, entre outras...
No que podemos entender como Psicologia e Psicoterapia Fenomenológico existencial --
efetivamente emergente, assim, e florescente em nossos dias, com ricas e importantes
possibilidades de fruição e de aplicação --, o trabalho de Carl R Rogers tem um papel inegável,
fundamental, e fundador. Muito importante, pois, atentar para isso, uma vez que é seminal e
essencial a relação das concepções e método de Carl Rogers com surgimento, desenvolvimento
e consolidação da psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial.
Não podemos, naturalmente, deixar de atentar para a importância do trabalho pioneiro
de um L. Binswanger, ou de um M. Boss. E, a seguir, o trabalho de um A. Maslow, e de um R.
May, no desenvolvimento desta perspectiva em psicologia e psicoterapia, inclusive no próprio
desenvolvimento e formação de Carl Rogers. Mas coube a Rogers e a F. Perls o momento da
experimentação e caracterização da vivência de metodologias fidedignamente fenomenológico
existenciais, e, neste sentido, empíricas, experimentais, performáticas, e poiético-hermenêuticas.
Durante um certo momento, a teorização de Rogers, como não poderia deixar de ser,
atrelou-se aos vieses das psicologias e psicoterapias vigentes no meio cultural norte americano.
Desde muito cedo, não obstante, é nítido o movimento de diferenciação do modelo rogeriano
com relação ao hegemônico paradigma do empirismo objetivista vigente nos EUA. Creio que,
teoricamente, apesar de algumas idas e vindas, Rogers evolui para uma crise conceitual, que

150
morre na formulação de condições hermenêuticas do empirismo especificamente fenomenológico
existencial e poiético-hermenêutico, que se configurava como característica forte da vivência de seu
método, em particular da sua última fase.
Creio que, de um modo importante, o trabalho de Rogers, a partir de um certo
momento, e em significativas dimensões, deixa de receber simplesmente os influxos da
fenomenologia, do existencialismo, da psicologia fenomenológico existencial existente, e passa a
contribuir, de um modo significativo, com o desenvolvimento destas.
Em particular, como é notório, e característico, a sua abordagem foi assumindo um
verdadeiro e corajoso strip tease fenomenativo existencial da teoria, da prática teorizante e
conceitual (WOOD, J.) -- algo muito pouco visto --, e centrando-se de modo cada vez mais
empírico e experimental (num sentido fenomenológico e existencial) (v. FONSECA, ) no que
podemos entender como o provimento empírico e experimental, por parte do terapeuta, do
psicólogo, do facilitador, do pedagogo, de condições hermenêuticas experimentais, fenomenológico
existenciais, para que o cliente, o educando, o grupo, o participante do grupo, pudessem
efetivamente interpretar – num sentido fenomenológico existencial, especificamente (v.
FONSECA, ) –, a sua vivência, as suas questões existenciais, as suas possibilidades de ser, as
suas possibilitações e resoluções.
Como observamos, não é só da teorização e da conceituação que Rogers vai,
fenomenológico existencial, experimentalmente, abrindo mão, em sua concepção e método.
Fenomenológico existencial e experimentalmente, Rogers vai superando, progressiva e
sucessivamente, em sua experimentação, o paradigma reflexivo em psicologia e psicoterapia, o
paradigma técnico, o paradigma comportamental; vai superando, igual e sucessivamente, o
paradigma científico, o paradigma moralista, o paradigma prático e pragmático. Em privilégio
de um paradigma fenomenológico existencial, de cuja elaboração (e, aí, entender o sentido
essencial desta palavra) ele contribui decisiva e seminalmente. Um paradigma que podemos
dizer fenomenológico existencial experimental, fenomenológico existencial empírico, dialógico,
e poiético hermenêutico.
A importância das elaborações de Rogers dão-se, principalmente e em especial, não ao
nível de sua teorização, mas, como seria de se esperar em uma abordagem empírica (não
teorética), fenomenológico existencial, ao nível de sua resoluta experimentação fenomenológico
existencial de condições de método.
Assim, não se pode apreender o modelo rogeriano meramente a partir da sua
teorização, ou mesmo da sua escrita ensaística. Fenomenológico existencial empirista, no
melhor sentido da tradição de Brentano, é no desenvolvimento de sua de sua metodologia que
reside a sua especificidade, e a sua riqueza.
Na realidade, juntamente com Fritz Perls, Carl Rogers foi, progressivamente,
assumindo um inquestionável papel de liderança no desenvolvimento da psicologia e
psicoterapia fenomenológico existencial.
Pouca gente foi tão longe, e, em particular, tão fidedignamente, quanto Carl Rogers
neste sentido.

Cremos que a história conceitual e metodológica da Psicologia Fenomenológico


Existencial centra-se e centrar-se-á, cada vez mais, no provimento -- no âmbito da relação
psicológica e psicoterapêutica -- de condições hermenêuticas para o processo hermenêutico da
interpretação fenomenológico existencial, empírica e experimental, por parte do cliente. Interpretação
da força -- da posse -- do possível, constituído como vivido; e em sua ato ação. Num certo sentido,

151
junto com Perls – este com um outro estilo, com uma outra história, com outros pré-textos e
textos mais ou menos teóricos --, fortemente bafejados, neste sentido, por Buber ( ), e por
Nietzsche, Rogers parece ser um dos propositores maiores destas condições, em psicologia e
psicoterapia.
De modo que Carl Rogers, e Fritz Perls têm, assim, efetivamente, um lugar bastante
diferenciado na gênese, constituição e desdobramentos das Psicologias e Psicoterapias
Fenomenológico existenciais, que emergem e florescem em nossos dias, pejadas de interessantes
e ricas possibilidades.
É importante que se distinga claramente esta contribuição, uma vez que,
freqüentemente, ela não é notada, ou considerada, ou é meramente incompreendida.
Por outro lado, não é raro que se fale de um modo retórico em psicologia e psicoterapia
fenomenológico existencial, já que ela está em moda, sem nenhuma referência a concepção e
método específicos, e sem referência , ou até negando-se as importantes contribuições de Rogers
e de Perls. Quando os métodos de Rogers e de Perls, amplamente aplicados, apesar de suas
limitações, em particular conceituais, coadunam-se e contribuem, diferenciada e
significativamente, com o caráter fenomenológico e existencial, em particular com a perspectiva
de um empirismo aporético e experimental, da metodologia em psicologia e psicoterapia.

152
20. TENDÊNCIA ATUALIZANTE E EMPATIA

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

A vivência do processamento da tendência atualizante, que na verdade se efetiva no


processo da ação, é especificamente fenomenenológica. E, como tal, se dá no âmbito da
compreensão, da vivência compreensiva, que é especificamente empática. Atualização é
especificamente o processo fenomenal da ação, vivido como vivência e desdobramento de
possibilidades. A empatia, remete ao caráter páthico, sensível, pré-conceitual e emocionado
do processo de vivência da atualização de possibilidades, ou seja, da vivência específica da
efetivação, em ação, da tendência atualizante. (FONSECA, 2007a.)
Freqüentemente, numa postura objetivista, a concepção da compreensão empática,
passa por ser uma qualidade atitudinal que se oferece a outrém. Este entendimento
objetivista, como seria de se esperar, se exime de esclarecer, dentre outros aspectos cruciais,
que vínculos podem existir entre tendência atualizante e compreensão empática. A própria
concepção de atualizante, de ato, de ação, de compreensão, de empático... é precária e
insuficiente, permitindo uma ampla gama de mal entendidos e distorções. Esta postura
objetivista é imprópria e inadequada para o entendimento e vivência da concepção e método
da abordagem rogeriana, de cunho eminentemente fenomenológico e existencial.
A compreensão empática e o exercício da tendência atualizante fazem parte do
mesmo processo fenomenal. A operação da tendência atualizante, que se dá, especificamente,
como ação, ato ação, especificamente se dá no âmbito da compreensão, empática. De modo
que não se trata de processos independentes, mas de dimensões simultânes de um mesmo
processo fenomenológico, e dialógico.
Este processo pode, naturalmente, se dar no âmbito que configura a vivência da
pessoa singular e “isolada”. No âmbito dialógico de sua relação “consigo mesmo”. Ou no
âmbito da dialógica da sua relação com a natureza não humana, ou da relação com o sagrado
(BUBER,). O processo vivencial empático não carece então, desta forma, de ocorrer,
necessariamente, ao nível do inter humano, da relação interpessoal, para ser empaticamente
compreensivo, atualizante, ato, ação. Nestes mencionados momentos de dialógica que não é
especificamente inter humana, interpessoal, a vivência da pessoa, singular, é, igualmente,
empática, compreensiva, e atualizante, ação, apesar de não se dar na condição da inter ação
inter humana: é exercício da tendência atualizante, ato, ação; que, necessariamente se dá
como o modo compreensivo e empático de sermos.
Na esfera própria do interpessoal inter humano (BUBER,), é como, em geral, nos
referimos à empatia. Da mesma forma, nesta modalidade, interpessoal e inter humana, a

153
empatia é, igualmente, inter ativa, ativa, ação. Necessariamente da ordem do atualizante,
também da ordem do ato, da ação; da efetivação da tendência atualizante, e da compreensão.
Normalmente não nos referimos à empatia na relação com a natureza não humana, e na
relação com o sagrado, tal é, em geral, a desvinculação com relação ao caráter
fenomenológico, e dialógico, da empatia.
Assim, em essência, podemos falar da vivência empática inter humana, e da vivência
empática ao nível da relação com a natureza não humana, e da relação com o sagrado. Todas
as três formas necessariamente compreensivas e atualizantes, ação, inter-ação – dia-ação dia-
lógica. De modo que não existe vivência empática sem ação, sem a atualização de
possibilidades, sem o exercício da tendência atualizante. Da mesma forma que não existe
ação, efetivação tendência atualizante, atualização que não seja no âmbito da vivência
empática. Mais que isto, todo o processo é de natureza eminentemente fenomenológica, e
dialógica, em sua essência.
Em qualquer caso, a vivência empática ato ativa pode se limitar exclusivamente a seu
caráter compreensivo, sendo meramente compreensiva; ou se desdobrar como simultânea e
progressivamente compreensiva e motora, de um modo mais diferenciado.
A duplicidade de termos da expressão compreensão empática para expressar o sentido
de empatia é uma redundância, uma tautologia. Toda compreensão é empática, e toda
empática é, necessariamente, compreensiva. Ou seja, compreensão e empatia designam
características do processo fenomeno(dia)lógico da vivência, que é eminentemente páthico,
de logos páthico, pathos. Na mesma medida em que o pathos é eminentemente
compreensivo, fenomenológico -- ainda que nada tenha de conceitual, de apolíneo. E se
caracteriza inerentemente pela apreensão e desdobramento do possível, a apreensão e
desdobramento da possibilidade contingente à vivência páthica, empathica (FONSECA, 2006).
A empatia é, assim, a vivência pática, pathos-lógica, poderíamos dizer. Mas não na
acepção latina do sentido de pathos, de paixão, paciência, sofrência, doença; mas na acepção
grega, como "sensibilidade", como vivência emotiva, emocionada, pré-reflexiva e pré-
conceitual, fenomenológica, fenomeno ativa, por suposto (v. FONSECA. Carl Rogers, o
Patético..).
Uma questão fundamental, e crucial, para nós, é esta, assim, de que a vivência pática,
empática, compreensiva, é própria e especificamente, coincide com, o modo de vivência da
ação. Com o modo de vivência ativo, ato ativo, atualizante. O modo empático de sermos é o
modo de sermos no qual vivenciamos o possível, a possibilidade, e, em ato, os desdobramos,
os ato-alizamos. De modo que a atualização, que efetiva a tendência atualizante, que nos
constitui, se constitui, efetivamente, no âmbito da empatia, páthicamente, empáticamente.
Existe assim um nexo mais que casual, mais que conceptual, ou metodológico, entre
empatia, atualização e tendência atualizante, na media em que as expressões indicam
dimensões necessárias de um mesmo processo ontológico, fenomenal, fenomenológico e,
necessariamente, dialógico.
A empatia, e a atualização, fenomenológica e operativa da tendencia atualizante, estão
para além do modo de sermos da dicotomia sujeito-objeto, para além das determinações de

154
causas e efeitos, para além das relações de utilidade, e aquém da realidade positiva e da
objetividade.
De modo que ninguém é objeto de empatia, ninguém oferece empatia, como
normalmente se pensa, como se oferecesse algo a um outro objetivo. A empatia se dá no
âmbito fenomenológico da vivência de uma dialógica interhumana, que ainda que se dê na
ambiguidade tensa da relação eu-tu, não se constitui como relacionamento objetivo, mas
fenomeno(dia)lógico, existencial.
O que o entendimento, desta forma, da vivência empática indica é que ela é da ordem
de uma interática, ou seja da inter-ação, da momentaneidade da dialógica inter humana. Esta
empatia, dialógica, poderia se dar, como o dialógico (BUBER,), no âmbito da natureza não
humana, no âmbito da relação com o sagrado; além de poder se dar na esfera, empática, da
interática, inter humana.
O âmbito da vivência empática compreensiva, em suas propriedades características, é,
assim, condição de possibilidade dialógica da atualização de possibilidades, da efetivação de
nossa tendência atualizante. De modo que, como dissemos, é mais que casual o nexo entre
empatia e tendência atualizante, é mais do que conceitual, e metodológico. É um vínculo
ontológicamente necessário, na medida em que faz parte, como dimensão diversa, do mesmo
processo fenomenológico, fenômeno ativo.
Este caráter fenomen(dia)lógico do processamento da atualização empáticamente
compreensiva de possibilidades – da efetivação da tendência atualizante, da ação, da
interação, em particular na dimensão da interação inter humana, não é oferecida por alguém
a um outrém objetivo, nem é uma qualidade subjetiva. Mas vivência dia(fenomeno)lógica inter
humana e inter ativa, eminentemente ativa, de atualização de possibilidades.
Não se trata de uma atitude, mas de um modo de vivência fenomenológico. Que em
sua especificidade, demanda, como modo de proceder, para a sua abertura, uma atitude
habitual e natural de aquiescência com o modo fenomenológico existencial dialógico de
sermos no encontro com o(s) outro(s). Uma aquiescência com e vivência do nosso modo de
pré-coisa de sermos. Numa relativização regular e habitual do objetivismo, do positivismo, do
princípio de realidade positivista.
De fato o privilegiamento deste modo de proceder configura uma ética. Patética
(empatética), peripatética. Estética.

BUBER, M. EU E TU. São Paulo, Cortês. 1985.


FONSECA, A. Tendência Atualizante. Maceió, 2007, inédito.
FONSECA, A. Carl Rogers, o patético. Maceió. 2006.

155
21. TENDÊNCIA FORMATIVA
Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

É a partir da tendência para a ação, a tendência atualizativa,


tendência atualizante, que, ontologicamente, nos mobilizamos,
agimos, nos atualizamos. Sempre e constantemente.
A tendência atualizante, a tendência para a ação, que nos
é inerente, manifesta-se fenomenologicamente. (Rogers, .).
Ou seja, a tendência atualizante -- tendência para a ação,
atualização -- caracteristicamente, impregna toda a momentaneidade
da vivência de nosso modo fenomenológico e existencial, ativo,
hermenêutico, e dialógico, de sermos. O nosso modo fenomenológico
e existencial de sermos é, todo ele, ação, como diria Buber (Buber,).
A ele referindo-se como o modo eu-tu de sermos.
Nosso modo de sermos fenomenológico existencial -- todo ele
impregnado pela tendência atualizante, portanto, é, todo ele,
impregnado pela ação. Assim o é, na medida em que é, todo ele,
impregnado de possibilidade, de potência; que é força, no sentido
plástico de potência criativa.
Potência que se atualiza, que se constitui em ação. Que
constitui, fenomenologicamente, as formas compreensivas, e
implicativas da vivência, e dos produtos da ação.

A vivência de nosso modo fenomenológico existencial de


sermos, a vivência de nossa tendência atualizante, a vivência da
ação, é, por isto, compreensiva, e poiética. Na mesma medida em
que é implicativa, e páthica.
É compreensiva porque, na sua vivência, a possibilidade, em
sua potência formativa, se constitui, compreensivamente, como
consciência fenomenológico existencial, pré-reflexiva – cum-
preensão.
De modo que há uma constituição da possibilidade como
consciência, pré-reflexiva -- fenomenológica. Há uma preensão da
possibilidade como consciência, uma apreensão da possibilidade,
compreensão, em sua formação, em seu desdobramento, em seu
attum.

156
A possibilidade, que se desdobra em ação, inter-pret-ação -- a
que se refere a tendência atualizante -- é possibilidade de quê?
Precipuamente, é possibilidade de Forma (Gestalt, Gestaltação).
É possibilidade de Formação.
A possibilidade, a potência, que se manifesta fenomenológico
existencialmente, é, característica e eminentemente, form-ativa,
form-ação compreensiva.
Este é, assim, fenomenológico existencial, o modo de sermos
cum(a)preensão (da possibilidade) em seu desdobramento; em sua
ação, atualização.
Por isso, pois, que a vivência de nosso modo fenomenológico
existencial, a vivência de nossa tendência para a ação, de nossa
tendência atualizante, de nossa ação, atualização, como
desdobramento fenomenológico existencial de possibilidades, como
tendência formativa, é, eminentemente, compreensiva, é própria e
especificamente da ordem da compreensão.

O modo teorético, e o modo comportamental de sermos não


comportam a compreensão, não são compreensivos, nem
implicativos; mas explicativos.

A vivência do nosso modo fenomenológico existencial de


sermos, a vivência de nossa tendência atualizante, tendência para a
ação, de nossa ação, atualização; a vivência de nossa tendência
formativa é, ainda, característica e eminentemente, Poiética.
Ou seja, se configura como o modo Poiético de sermos, e de
conhecermos. Modo este de sermos preconizado por Aristóteles, em
alternância ao modo Teorético, e ao modo Prático de sermos-e-de-
conhecermos. Sua característica Poi-ética sendo, própria e
especificamente, a de que nele, criativamente, vivenciamos Possi-
bilidade, e o desdobramento das possibilidades, a ação, em suas
formas criativas, de vivência, e de objetivação.

A vivência da ação, decorrente das possibilidades do que


podemos chamar de tendência para a atualização, em nosso modo
fenomenológico existencial, poiético, de sermos é ainda da ordem da
implicação – e não da ordem da ex-plicação.
A ex-plicação caracteriza o modo teorético, e o modo
comportamental de sermos. Ou seja, na explicação, no modo
teorético de sermos, nós contemplamos e apreciamos teóricamente –
como espectadores -- os produtos de nossa poiese, os produtos
objetivados da vivência de nossa ação. Explicativamente, ou seja,

157
não implicativamente, no modo comportamental de sermos nós
repetimos atividades padronizadas, que,em sua repetição não trazem
a possibilidade, a vivência de possibilidade, e o seu desdobramento,
na ação.
Na implicação, não somos espectadores. Nem nos
movimentamos mecanicamente ao modo de sermos de nossa
atividade padronizada e repetitiva, de nosso comportamento.
Na implicação, no modo de sermos, fenomenológico existencial,
da Implicação, somos atores na vivência da ação, como
desdobramento de possibilidades. Estamos implicados – e não
na ex-plicação – estamos na vivência do desdobramento da
possibilidades.
Ou seja, na implicação, no modo implicativo de sermos, na
dialógica do desdobramento da possibilidade, não nos damos como
sujeitos, na relação com objetos. Mas como agentes, na inter-
ação de uma dialógica eu-tu.
E, tudo que o tu não é, na dialógica eu-tu, é objeto.
Nem o eu é sujeito.
Na ação, na atualização da possibilidade, eu e tu estão
necessariamente vinculados, na dialógica da vivência. E é esta
viculação dialógica que chamamos de implicação.
Na ex-plicação, teórica, ou comportamental, rompe-se a
vinculação dialógica entre eu-tu; e se constitui o isso, e o eu do eu-
isso. O objeto – o isso do eu-isso --, e o sujeito, que originariamente
não têm a vinculação dialógica. Não estão implicados.

Páthicas, Empthicas, são, ainda, a tendência atualizante, a


atualização, a ação; e a sua correlativa Tendência Formativa.
O aspecto páthico, Empático da Tendência Atualizante e da
Tendência Formativa remetem à característica de que, em sua
operação, elas são eminentemente fenomenológico existenciais. O
seu aspecto Páthico, Empáthico referindo-se ao fato de que, em sua
operação fenomenológico existencial elas são da ordem pathica,
empathica de nossa sensibilidade emocionada.
O Pathos em sua acepção Grega originária, e não na acepção
Latina, tem este sentido de que, fenomenológico existencial, é o
modo de sermos que é marcado pela emoção, o modo de sermos no
qual naturalmente vigora a emoção. O pathos, a Empatia,
fenomenológico existencial, é o modo de sermos da sensibilidade
emocionada.
A atualização, a ação – da tendência atualizante; e a formação,
a performação – de sua tendência formativa; eminentemente

158
fenomenológico existenciais, hermenêuticas e dialógicas, são, assim,
eminentemente páthicas, empáticas, em suas operações.

Assim, a partir da emergência, configuração, e desdobramento


da possibilidade, a ação, em nossa tendência para a ação, é sempre
form-ação, per-form-ação. É, sempre, assim, tendência formativa.
E, portanto, performance, sempre.
A ação é sempre, igualmente, inter-pret-ação. É, sempre,
hermenêutica.
Naturalmente, interpretação, hermenêutica, compreensivas,
fenomenológico existenciais, implicativas – ao contrário da
interpretação ex-plicativa.
A ação, a tendência atualizante, e sua tendência formativa são
ainda pathicas, empathicas, patéticas, empatéticas.

Form-ação, sempre, assim, a ação é sempre formativa.

De modo que a tendência atualizante é sempre tendência


formativa – em seu caráter intrinsecamente compreensivo,
fenomenológico existencial, e hermenêutico. É a tendência para as
intrínsecas formas da vivência da ação, e de seus produtos.
As formas da tendência formativa da tendência atualizante são
as formas intangíveis, e as formas tangíveis da vivência, da
sequência da ação, da atualização; e a forma de seus produtos.
Podem estas formas ser (1) meramente compreensivas, ou (2)
compreensivas e musculativas; e as suas resultantes criativas,
coisificadas, objetivas.

De modo que é a tendência formativa que deriva, que é uma


dimensão, da tendência atualizante. A formação é uma característica
da ação – que é compreensiva.
Toda ação é formação, toda a ação é formativa. Performativa,
per-form-ática, per-formação, performance.
E é esta vivência da form-ação que é especificamente a ação –
da tendência atualizante que nos constitui, e que constitui o mundo
que nos diz respeito.
De modo que a tendência atualizante, a tendência formativa,
são vivenciais, são fenomenológico existenciais, e dialógicas, são
hermenêuticas, compreensivas, poiéticas, e empáticas.

159
22. TENDÊNCIA ATUALIZANTE
Ação, Atualidade e Atualização na Abordagem Rogeriana e em Psicologia e
Psicoterapia Fenomenológico Exisatencial

Afonso H Lisboa da Fonseca, psicólogo.

Como sabemos, a concepção de tendência atualizante é um elemento central da


concepção e metodologia da Abordagem Rogeriana. Está implícita na Gestalt Terapia; e
é, certamente, fundamental em qualquer abordagem fenomenológico existencial de
psicologia e psicoterapia. Na formulação rogeriana, a concepção teve e tem um
importante papel na definição de uma prática humanista, fenomenológico existencial,
de psicologia e de psicoterapia. O conceito tem, nessa formulação, um enfoque
demasiadamente biologizante, deixando em falta a sua dimensão especificamente
existencial. Para quem trabalha ao nível da psicoterapia, do trabalho com grupos, e do
trabalho psicológico em geral, a questão não é simplesmente de potencialidades, no seu
sentido genérico, biológico, mas de possibilidades existencialmente vividas, e do
processo de sua atualização.

Somos, todos nós, ativos, nas dimensões mais originárias e essenciais da


vivência de nós próprios; fenomenológico existenciais, ativos, precisamente, atualizantes,
atuantes. Ou seja, somos seres que são, originariamente -- em sua vivência mais
originária, mais essencial --, vivência fenomenológico existencial de força, potência, de
força de possibilidade, de possível; que constantemente se desdobra, em vivência de
ação, atu-ação, atu-aliz-ação.

Tendemos, assim a esta atualização de possibilidades. À ação.

Secundariamente, esta ação nos constitui, constantemente. E constitui ao mundo


que nos diz respeito.

Secundariamente, porque o nosso mundo, a nossa realidade, e o nosso ser/vir a


ser identitário, são sub produtos da nossa vivência; fenomenológica, existencial, ativa; do
processo de nossa atualização, da vivência de nosso núcleo, de nossa dimensão, de

160
força, de potência, de possibilidade, em seu perene e potente desdobramento vivencial,
ativo. No que chamamos de poiese.

Poiese é, assim, a produtividade, e resultantes, deste processo vivencial, ativo,


atualizativo, no qual, enquanto consciência fenomenológico existencial, vivenciamos a
constância desta dimensão de nosso ser possível, e vivenciamos a atualização, o
desdobramento, de possibilidades.

Poiética, na verdade, é a ética da poiese. Ou seja, um modo de ser e de proceder


que privilegia, como referência vital, a vivencia, e a expressividade, deste processo
fenomenológico existencial, poiético, de ser/devir.

Para a poiética, a possibilidade, e a sua atualização, é mais importante do que a


realidade.

Inúmeros são os poiéticos. Classicamente, podemos entender assim a


Aristóteles e a seus peripatéticos, a Brentano, a Nietzsche, a Heidegger, aos
fenomenológico existenciais, a Buber... Da mesma forma que assim podemos entender
a Carl Rogers e a Fritz Perls.

Nos tempos de Aristóteles, a questão sobre o ser se colocava como resolvida


pela perspectiva de que o ser é tudo que é... Aristóteles vem a colocar a questão do
possível, do que pode vir a ser. Quando coloca que o ser não pode simplesmente ser tudo
o que é; na medida em que, igualmente, existe o possível, e o seu devir, a sua
atualização, o seu vir a ser. De fato, o ser é o que é, e o que pode se atualizar, o que
pode vir a ser.

Com isso, Aristóteles introduz no pensamento ocidental o possível, e o


movimento de sua atualização; a potência e o ato, a atualização. Dados na imediaticidade
empírica da vivência de consciência fenomenológica, fenomenoativa.

Franz Brentano é o grande receptor e mediador moderno de Aristóteles e de


suas perspectivas. Dentre as suas inúmeras e importantes contribuições, estão o
desenvolvimento da Fenomenologia, e da psicologia fenomenológico existencial; talvez
possa mesmo ser reconhecido como o iniciador da Psicologia da Gestalt.

O certo é que os formuladores da Psicologia da Gestalt foram seminalmente


influenciados pelas concepções de Franz Brentano. Foram alunos do principal
discípulo de Brentano, Carl Stumpf. Ainda quando Brentano era vivo.

Neste caso, entre os psicólogos da Gestalt, Kurt Goldstein.

As perspectivas e concepções de Brentano e de Aristóteles, vão aparecer de um


modo importante nas concepções de Kurt Goldstein. Tais como as concepções de
organísmico, de organismo, de auto regulação organísmica, de auto-atualização, de
experiência organísmica... E as concepções de Kurt Goldstein vão ter uma influência
fundamental no desenvolvimento das idéias, e na formulação da concepção e método

161
da abordagem de Carl Rogers. Assim, concepções como as de auto-regulação
organísmica, auto-atualização, experiência organísmica, tendência atualizante, são concepções
que constam já do arcabouço conceitual da psicologia organísmica de Kurt Goldstein, e
têm um lugar e papel essenciais em momentos básicos do sistema conceitual de Carl
Rogers.

A concepção de tendência atualizante vai ser a pedra fundamental do paradigma


rogeriano. Vai permitir a Carl Rogers desenvolver experimentalmente um interessante
paradigma fenomenológico existencial de psicologia e de psicoterapia.

Este paradigma só vai depurando plenamente as suas características


fenomenológico existenciais, livrando-se, em sua prática, dos resíduos de
pressuposições metafísicas e teorizantes, na última, e qualitativamente produtiva, fase
da vida de Carl Rogers. Quando o trabalho com grupos, em suas várias modalidades --
de grupos residenciais e não residenciais, com pequeno, médio ou grande número de
participantes, de curta ou longa duração, e outras modalidades -- leva a uma
assombrosa radicalização fenomenológico existencial do paradigma de Rogers, e da
experimentação, por parte dele, e de seu grupo de colaboradores.

A radicalização é tal que, neste momento, toda a produção teórica anterior --


que já experimentara, durante anos, um intenso processo de mudança e de
metamorfose -- parece, de um modo muito propriamente fenomenológico existencial,
distante e supérflua, apenas relativamente necessária. Em privilégio de um logos
metódico fenomenológico existencial empírico, que se ancora simplesmente na
constação fenomenológica, e existencial, de nossa ontológica condição de sermos ativos,
atualizativos; da condição ontológica básica de ativos dos grupos humanos, e das
pessoas.

O conceito de tendência atualizante permanece um instrumento interessante.


Tanto do ponto de vista da Abordagem Rogeriana, como do ponto de vista de um
paradigma fenomenológico existencial de psicologia e de psicoterapia. Ainda que ele
seja, no âmbito da abordagem rogeriana -- onde está melhor elaborado e mereceu
maior atenção, na psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial -- um conceito
vago, impreciso, freqüentemente equívoco. Em razão de uma precária elaboração. Em
particular, em função de um viés abusivamente biologista na sua formulação.

O conceito sempre se referiu à tendência, e ao exercício da tendência dos seres


vivos para atualizarem as suas potencialidades, e se constituir como espécimens
adultos, maduros, socialmente ajustados e produtivos, no caso dos seres humanos. É
conhecida a ilustração que Rogers faz de sua idéia lembrando os brancos brotos das
batatas que cresciam nos estoques invernais do porão da casa de sua infância... Pálidos
e obstinados, em sua tendência atualizante em direção à luz...

É impressionante, porque, em seguida, Rogers dá ainda um passo "atrás" -- do


biológico ao cósmico --, ao vincular o que ele entende como tendência atualizante a

162
uma tendência formativa do universo, usando idéias de Ilya Prigogine, muito vigentes na
new age, para corroborar as suas próprias concepções.

Não é que não seja interessante considerar a tendência atualizante de suas


potencialidades por parte dos seres vivos, no sentido biológico, e evolucionista... Ou
indicar a tendência sintrópica que caracteriza a vida, em contraposição aos movimentos
deletérios da entropia... Mas, direto, do cósmico, e do biológico, para o pessoal? Sem
passar pela mediação da história? Sem passar pela mediação do cultural e do social?
Sem passar pela mediação da existência, e do existencial?

Há, efetivamente, aí uma incontornável lacuna. Em especial para quem se


remete aos humanos, e aos grupos humanos: no que diz respeito à relação história-
pessoa, e no que diz respeito à concepção existência-pessoa, em termos da concepção
de tendência atualizante.

É interessante observar que a vivência, a experimentação, e o desenvolvimento


do modelo rogeriano, como seria de se esperar, vai se deslocando, e se tornando cada
vez mais independente dos pressupostos teóricos, com o privilégio de uma vivência
fenomenológico existencial empírica. A um ponto tal que a teoria prossegue
reincidindo em crises, de crescimento, e, defitivamente, não acompanha os resultados
da experimentação, quedando-se em níveis muito precários, no que concerne à rica
fase final do trabalho de Carl Rogers, principalmente com relação ao seu modelo de
trabalho com grupos, e às repercussões dos resultados da experimentação com grupos
sobre o modelo de trabalho na relação interindividual1.

Aí também presente, de modo importante, as confusões determinadas pela crise


epistêmica decorrente:

1. Do fato de que a abordagem rogeriana, de cunho fenomenológico existencial


empírico, cresceu no meio de um empirismo objetivista, avêsso à teorização. Com os
praticantes da abordagem rogeriana ainda influenciados, de um modo significativo,
por esse tipo de empirismo objetivista; condição associada ao pouco conhecimento das
perspectivas da Fenomenologia no meio da abordagem rogeriana;

2. Dos mal-entendidos e confusões relativos à precária compreensão acerca de


qual é o lugar da teoria numa abordagem que é, em sua vivência, não teorizante; ou
seja, acerca de qual o lugar da teoria numa abordagem fenomenológico existencial
empírica e experimental.

Aparentemente confundida, ainda, influenciada e desorientada pela aversão à


teoria e à teorização da cultura anglo-saxã, a cultura da abordagem rogeriana se
quedou, e se queda, inteiramente baratinada com relação à questão dos nexos entre a
vivência experimental empírica, não teorizante, e a teoria, a teorização, e a crítica...

A teoria foi evoluindo para uma fértil crise de perspectivas epistemológicas e


ontológicas, até que Rogers e os seus colaboradores mergulharam na intensa

163
experimentação fenomenológico existencial empírica de seus referenciais, num
contexto grupal, com uma teorização ainda incipiente, e freqüentemente pautada pelos
referenciais do empirismo objetivista -- incompetente para dar conta da riqueza e da
complexidade dos produtos e processos de sua experimentação. De fato, neste
momento, o fato de que Rogers e colaboradores estavam ricamente imersos nas
dimensões existenciais de um tal processo, e em suas densidades e complexidades
teóricas, não permitia, ainda, um afastamento que possibilitasse uma reflexão e
produção teórica. Sem dúvida, o pouco conhecimento no seu meio, e no meio da
cultura da abordagem, dos referenciais da Fenomenologia e do existencialismo,
dificultava sobremaneira esta empreitada teórica.

O momento posterior à morte de Rogers é um momento de paralisia teórica,


pelo menos em termos paradigmáticos, em que a teoria vai sendo cada vez mais
alienada e alienígena, ainda que a força da obra ensaística de Rogers permaneça
fazendo adeptos. E que o empirismo fenomenológico existencial característico de seu
paradigma possa ser compreendido e desenvolvido por profissionais competentes e
criativos.

A concepçao de atualização, e mesmo de tendência atualizante -- esta


importante contribuição de Aristóteles, Brentano e Goldstein, que Carl Rogers soube
valorizar, conceitual e metodológicamente, em psicologia e psicoterapia -- permanecem
assim como concepções básicas, do paradigma rogeriano, e da psicologia e psicoterapia
fenomenológico existencial.

No caso da abordagem rogeriana, em particular, no sentido de sua


reformulação e atualização. Isto porque são concepções que guardam a originalidade
da formulação rogeriana, ao mesmo tempopermanacem como concepções atuais --
produtivas --, não só no contexto da abordagem rogeriana, como no contexto da
psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial.

A atualidade da concepção de tendência atualizante, em sua acepção


fenomenológico existencial, em psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial,
advém do fato, simplesmente, de que, ainda que um conceito teórico, ela se remete à
dimensão vivencial, especificamente experienciável. Eespecificamente existencial.
Remete-se ao próprio processo humano de realização, e de superação. Dimensão
ontológica humana fundamental, e fundamental para a concepção e vivência da
psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial, em específico da abordagem
rogeriana, e da gestalt terapia, que são psicologias e psicoterapias do ato e da
atualização, da atualidade. Abordagens poiéticas, estéticas.

164
23. A AÇÃO NÃO É SÓ AÇÃO MUSCULAR.
COMPPREENSÃO TAMBÉM É LEGITIMAMENTE AÇÃO
NA MUSCULAÇÃO, A COMPREENSÃO TAMBÉM É MUSCULAR
Afonso Fonseca, psicólogo.

Restou como aspecto negativo de Freud uma idéia de que o psíquico é só o mental. O
corpo seria uma instância heterogênea, não raro alienígena. Fantasmática.
Reich trouxe o corpo para a psicologia e para a psicoterapia, de um modo enfático.
Não importa quais sejam os seus equívocos, é seu este mérito.
Podemos dizer que Fritz e Laura Perls são mais um degrau nesta trajetória ascendente
em direção à integração do corpo.
Com motivos, enfatizaríamos a Laura Perls neste sentido.
Trabalhando com expressão corporal, Laura tinha uma intuição profunda da integração
da consciência-corpo. E muitas vezes indicou para a Gestalt o caminho do corpo, pelo caminho
da arte. Uma via diferente do holismo científico de Kurt Goldstein.
Mas não podemos ignorar as fortes intuições de Fritz Perls em direção ao corpo.
Primeiro, mas sem ordem de precedência, por influência do próprio Reich. Influência pessoal e
das idéias. Nessa ordem da terapia, as influências das metodologias terapêuticas de Ida
Hoffmann. E, evidentemente, do próprio Goldstein.
Dentre estas influências, sobressai a influência da expressão corporal no teatro
expressionista, a experiência da expressão corporal do Expressionismo sobre Fritz Perls. A
própria importância do corpo para a expressão na expressividade expressionista.
Há um nexo não explicitado, em termos desta integração do corpo, que envolve a
Fenomenologia, os teóricos da Gestalt, teoria da Gestalt, Kurt Goldstein, W. Dilthey, Max
Wertheimer, Brentano, Expressionismo – porque não colocar a Max Reinhardt? –Fritz Perls...
Não sei se um nexo não explicitado, não sei se um nexo que eu não atino. Não seis se
um nexo que eles não atinavam. Mas que intuíam.
O expressionismo vai muito longe em experimentar, e explorar, teatralmente esta
integração organísmica de compreensão e muscularidade.
De que Kurt Goldstein vai se aproximar, pela via de sua Neurologia Organísmica.
Certamente temos que trazer a Brentano, sua Fenomenologia. Principalmente em
termos de sua compreensão da ação, sua compreensão de que a ação não é comportamento.
E de que o sujeito não é o ator...
E Martin Buber e sua abordagem da dialógica...

Fato é que a vivência da ação é a dimensão de nossa ontologia em que


participam cognição e muscularidade. Porque, em específico, a ação é compreensão e
muscularidade.
Compreensão e musculação são vivência da atualização de possibilidades.
Têm, assim, todas as características da ação.

165
A compreensão e a musculação são, enquanto atualização de possibilidades,
moção, emoção, cognição, criação e superação. São estéticas e poiéticas. São pré-
reflexivas e pré-conceituais, não pragmáticas, não reais...

A ação é pré-reflexiva. Mas, não existe ação, efetivamente, sem cognição: ação
como cognição pré-reflexiva. Que é a compreensão.

E não existe ação sem a dimensão da muscularidade da ação. Sem a


musculação.

Compreensão e musculação, pre-reflexivas, a ação é apresentação.

E não representação (re-apresentação).


De modo que, na fenomenologia da ação, na ontologia da ação, no episodio
fenomenológico existencial da ação, cognição e muscularidade, compreensão e
musculação são intrínsecas dimensões, que se dão necessariamente.

A compreensão -- própria e especificamente no âmbito da implicação – é própria


à ação. Dá-se no modo de - sermos do pathos da sensibilidade emocionada. A
compreensão impregna-se da emoção. E, sobretudo, é diversa da percepção.
Que é conceitual. E reveste-se das características do modo coisa de sermos.
Apartando-se do ontológico modo de sermos do fazer.

Como um resíduo freudiano, ainda que nas abordagens fenomenológico


existenciais, mesmo quando fenomenológicamente inspiradas, efetivamente, resta o
resíduo de que as resoluções seriam mentais. Que se dariam ao nível psicológico da
compreensão, em seu aspecto cognitivo.
Compreendeu, em particular, compreendeu o que eu quero, tá bom...
Não. As resoluções dão-se ao nível da ação.
E a ontológica fenomenológica da ação é inspectativa, cognitiva e muscular.
Compreensiva e musculativa. Na sinestesiologia da fenomeno ontológica da ação.
A compreensão não é subjetiva. E não se dá isoladamente, mas
improvisativamente acompanha pari passum todos os momentos do desdobramento do
episódio fenomenológico existencial da ação.
Mas é necessário entender, substancialmente, o caráter pre-reflexivo e pre-
conceitual da ação. O caráter pre-reflexivo e pré-conceitual específico da compreensão
e da musculação, como dimensões da ação.
Mais simples, talvez, o caráter de prereflexividade da ação significa que ela se
dá no modo de sermos do fazer, do acontecer. E não do fato.
Que é o modo de sermos do ator, e não o modo de sermos do sujeito. E do
objeto.

Em seu caráter pré-conceitual, a vivência da ação se constitui a partir de uma


vivência de multiplicidade de possibilidades. Multiplicidade esta que, na vivência do
episódio da ação, se organiza, pela implicação, pela gestaltificação, em linhas de ação.
No seu desdobramento, a ação, o fazer, transita do modo ontológico para o
modo ôntico de sermos; do fazermos para o fato, o feito. Da ação para o teorético. Com
a tendência à redução de sua multiplicidade à unidade do conceito.
E isto significa a passagem, no episódio existencial, do modo pré-conceitual ao
modo conceitual de sermos. A par da transição do modo pré-reflexivo ao modo reflexivo
de sermos...

166
Na duração do episódio fenomenológico existencial da ação, todavia, a
compreensão e a musculação dão-se de modo pre-reflexivo e pré-conceitual.
Compreensão e musculação pré-reflexivas e pré-conceituais.
Compreensão que, além de cognitiva, é, também, muscular.
A musculação, além de especificamente muscular, é propriamente cognitiva.
Compreensiva.
A musculação é compreensiva, a compreensão é musculativa.
Compreensão e musculação são dimensões da ação.
A ação, a fenomenologia ontológica da ação, é compreensiva e musculativa.

167
24. COMPREENSÃO E PERCEPÇÃO.
A apuração implicativa gestaltificativa, e a decepação
purificativa, putativa.

Afonso Fonseca, psicólogo.

Como a raiz do termo conceito, a raiz de percepção tem o sentido


forte de capturado, prisioneiro de guerra, capado...

Se assim o são, o conceito e a percepção enquanto tais veem de um


território alienígena, e inimigo. Invasores contumazes de um exército de
diabos...
Invasores, sem dúvida. Uma vez que, travestido de instalação
coisificativa, o ontológico em sua dramática constante e continuamente
invade a esfera do acontecido. Mesmo à custa de se coisificar, e de se
desatualizar, em acontecido.
Seria um inimigo?
Viria de um território inimigo, e alienígena?
Teria que ser assim? (Dionísio, o estrangeiro do interior?).
É certo que o processo de sua constituição é eivado de incerteza. A
percepção e a conceituação...
Para uma postura que rigidamente encistou-se na (suposta) certeza
da coisidade, e do acontecido, o percepto, o concepto, não enganam, são
inimigos que emergidos de terras alienígenas e ignotas, profanas, a serem
capturados e aprisionados. Captados, capturados, decapitados, como a mão
que captura um saco de cunhões, prestes a ser decepado.
Digo: conceptuado, perceptuado. Apenas...
Mas, para que o escândalo? ...
O prisioneiro em breve estaria inevitavelmente instalado em seu
ataúde de coisa. Desprovido de sua dramática furibunda, de suas nuances e
detalhes. Paralítico, rígido, unificado... Mumificado...
Naturalmente oferecer-se-ia, entregar-se-ia assim, como cap-turado.
Como prisioneiro, como aprisionado. Ao findarem as suas forças...
Tratar-se-ia de se garantir, como morto, e investir contra a vida da
possibilidade... Inevitável e indestrutivelmente refugiada no recôndito da
instalação da coisa.
Não vejo como poderia...
Do mesmo modo que não se pode evitar a instalação da dramática
possibilidade na coisidade da coisa, não podemos evitar a ressurgência, a
insurgência, a re-volta, como diria Maffesoli, da possibilidade, ao estalo da
instalação da coisa.

168
Quando a prenhez da coisa pela possibilidade estiver a termo...
... E é tempo todo tempo... Mas não basta um século para fazer a
pétala... Que um só instante faz, ou não... Mas a vida muda... 17

Estará então prestes e a postos a estética, como parteira...

17
Ferreira Gullar: ... A vida muda, rapidamente/como a cor dos frutos/A vida muda lentamente/Como a
flor em fruto/Mas quando é tempo/E é tempo todo tempo/Mas não basta um século para fazer a
pétala/Que um só instante faz/Ou não)/Mas a vida muda)/...

169
Compreensão e Percepção são processos experienciais
radicalmente distintos.

E aqui, não nos enganemos com o sentido comunal do termo


experiência.
Experiência é, naturalmente, um termo que serve tanto à
epistemologia de um empirismo fenomenológico, quanto à epistemologia de
um empirismo objetivista. E pode, portanto, referir-se tanto à ontológica
fenomenológico existencial da presença e da atualidade da compreensão,
como à ôntica da instalativa da percepção.

Normalmente distingue-se que só a percepção, objetiva, é


experiência.

Apesar de o sentido original do termo experiência designar


fidedignamente a ontológica fenomenológica intrínseca à vivência pré-
reflexiva. Eminentemente experimental.

De fato, a compreensão é efetivamente experiência no sentido de que


é insperiência...

Na própria distinção diversa dos dois sentidos do termo experiência


está dada a pista para a radical distinção de sentidos entre Compreensão,
e Percepção...

Este ensaio busca tematizar esta distinção.

Assim, antecipadamente digamos que a Compreensão,


naturalmente, é ontológica. E a Percepção é ôntica.

Mas não seria a compreensão um tipo de percepção?

Podemos dizer que o processamento da compreensão, como


processamento cognitivo da ação, culmina na percepção. Mas é crucial
distinguir a momentaneidade e a temporalidade própria à presença e
atualidade da compreensão, com relação ao caráter ôntico, coisificado,
acontecido, da percepção.
Poderíamos identificar compreensão e percepção se o processo de
constituição da percepção não fosse uma decepagem, uma decepção.

170
Um limite, uma limitação, e um corte da multiplicidade característica da
implicação da vivência de sentido que é a compreensão.

A compreensão é uma apuração, uma apuria.

A percepção uma purificação, uma puria.

O processo gestaltificativo de constituição da compreensão –


apuração, apuria -- reside exatamente na preservação da integridade da
multiplicidade da implicação. Na preservação do processo apurativo da
interação -- competição e argumentação -- entre os elementos da
multiplicidade de possibilidades da implicação. Que resulta na constituição
de seu processo formativo, na constituição da formação figurativa da
vivência fenomenológica, e na figurativa formação das coisas...

Isto, é, assim, uma decorrência da distinção entre o caráter


ontológico da compreensão, e o caráter ôntico da percepção.

A purificação conceitual da percepção, o conceito, decorre, em


princípio, do próprio processo do decaimento das possibilidades e de sua
instalação coisificativa. No decorrer paulatino do qual a multiplicidade de
possibilidades da vivência pré-reflexiva, atualizadas, tem desatualizadas, e
instaladas coisificativamente, como coisa, a intensidade de suas forças.
De uma rede infinita de possibilidades que constituem a implicação,
resta os eixos de seu esquemático esqueleto coisificado. A coisa, então, a
ser percebida, o conceito.
O que Fink chamava de a casca vazia que outrora inervava a
intuição...

A distinção entre compreensão e percepção não é, assim, uma


distinção quantitativa. Mas uma distinção eminentemente qualitativa, que
envolve distintos modos de sermos. Distintos modos de sermos, que se
constituem como distintos modos de conhecermos.

A apuração pré-reflexiva específica da implicação, que


especificamente se constitui como compreensão. Característica do modo
ontológico, fenomenológico existencial, de sermos, do acontecer.

E a puria, purificação, putificação, putabilidade, característica do


conceptual. Do perceptual
Intrinsecamente decorrente do decaimento da ação, da conceituação.
O conceito -- reflexivo, objetivo, ou subjetivo, coisificado, e explicativo --

171
que se constitui como a percepção. Característica do modo coisificado de
sermos, explicativo, do acontecido.
A conceptualização, assim, decorre do desbaste da presença, e da
atualidade, da multiplicidade de possibilidades da vivência
momentaneamente instantânea da implicação, da vivência fenomenológica
da ação.

A compreensão é conhecer, epistemológica, conhecimento,


intrínsecos à momentaneidade instantânea e dramática da ação. Da
implicação, em sua intrínseca multiplicidade apuriativa, apurativa. O
conhecer, a epistemologia ontológicos, pré-conceituais, pré reflexivos,
inspectativos, implicativos, gestaltificativos. O processo apuriativo de
constituição de sentido, especificamente como apuração da vivência das
competições e argumentações entre os elementos da multiplicidade de
possibilidades, da multiplicidade de forças criativas, da vivência ontológica.
Fenomenológico existenciais e dialógicas, compreensivas, implicativas,
gestaltificativas.

A percepção -- explicativa, a não implicação --, o conhecimento


acontecido, característico da epistemológica ôntica – reflexiva, teorética,
conceitual. Putativa. Produzida pela putação, pela pu(t)rificação, pela
decepação, pela castração, capação -- dos elementos da multiplicidade das
possibilidades ontológicas.

Possibilidades estas que apurativamente se afiguram, na


momentaneidade instantânea da ação, como os sentidos da compreensão,
como a própria epistemológica fenomenológica da implicação ontológica da
ação. Para serem a seguir desbastadas, podada – com o decaimento da
ação --, na constituição da instalação coisificativa característica do modo
acontecido de sermos.
Como concepto. Como percepto. Como percepção.

COMPREENSÃO PERCEPÇÃO

ONTOLÓGICA ÔNTICA

INSTALAÇÃO COISIFICATIVA
FENOMENOLÓGICA
INSISTENSIAL EXISTENSIAL

INTENSIONAL DISTENSIONAL

DIALÓGICA EU-TU NÃO DIALÓGICA, EU-ISSO

172
SEM-PREENSÃO
COM-PREENSÃO
EXPLICAÇÃO
IMPLICAÇÃO
PUTATIVA. PURIA. PURAÇÃO.
APURIA. APURAÇÃO. INIMPUTÁVEL.
INCONTÁVEL. IMPUTÁVEL. CONTÁVEL.

AÇÃO. ATOR INSTALAÇÃO

INSPECTAÇÃO ESPECTAÇÃO

FAZER DIALÓGICO FATO. FEITO.

SUJEITO. OBJETO.
TEATRO. DRAMÁTICA. FATO. FEITO.

GESTALTIFICATIVA GESTALT

Como a raiz do termo conceito, a raiz de percepção tem o sentido


forte de capturado, prisioneiro de guerra, capado...

Se assim o são, o conceito e a percepção enquanto tais veem de um


território alienígena, e inimigo. Invasores contumazes de um exército de
diabos...
Invasores, sem dúvida. Uma vez que, travestido de instalação
coisificativa, o ontológico em sua dramática constante e continuamente
invade a esfera do acontecido. Mesmo à custa de se coisificar, e de se
desatualizar, em acontecido.
Seria um inimigo?
Viria de um território inimigo, e alienígena?
Teria que ser assim? (Dionísio, o estrangeiro do interior?).
É certo que o processo de sua constituição é eivado de incerteza. A
percepção e a conceituação...
Para uma postura que rigidamente encistou-se na (suposta) certeza
da coisidade, e do acontecido, o percepto, o concepto, não enganam, são
inimigos que emergidos de terras alienígenas e ignotas, profanas, a serem
capturados e aprisionados. Captados, capturados, decapitados, como a mão
que captura um saco de cunhões, prestes a ser decepado.
Digo: conceptuado, perceptuado. Apenas...
Mas, para que o escândalo? ...

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O prisioneiro em breve estaria inevitavelmente instalado em seu
ataúde de coisa. Desprovido de sua dramática furibunda, de suas nuances e
detalhes. Paralítico, rígido, unificado... Mumificado...
Naturalmente oferecer-se-ia, entregar-se-ia assim, como cap-turado.
Como prisioneiro, como aprisionado. Ao findarem as suas forças...
Tratar-se-ia de se garantir, como morto, e investir contra a vida da
possibilidade... Inevitável e indestrutivelmente refugiada no recôndito da
instalação da coisa.
Não vejo como poderia...
Do mesmo modo que não se pode evitar a instalação da dramática
possibilidade na coisidade da coisa, não podemos evitar a ressurgência, a
insurgência, a re-volta, como diria Maffesoli, da possibilidade, ao estalo da
instalação da coisa.
Quando a prenhez da coisa pela possibilidade estiver a termo...
... E é tempo todo tempo... Mas não basta um século para fazer a
pétala... Que um só instante faz, ou não... Mas a vida muda... 18

Estará então prestes e a postos a estética, como parteira...

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Ferreira Gullar: ... A vida muda, rapidamente/como a cor dos frutos/A vida muda lentamente/Como a
flor em fruto/Mas quando é tempo/E é tempo todo tempo/Mas não basta um século para fazer a
pétala/Que um só instante faz/Ou não)/Mas a vida muda)/...

174
BIBLIOGRAFIA

BUBER, Martin Eu e Tu
GOULART, Ferreira Dentro da Noite Veloz.
HEIDEGGER, Martin Ser e Tempo.
HOUAISS, Antonio Dicionário Eletrônico Houaiss.
MAFFESOLI, Michel A Conquista do Presente.

175
25. SINERGIA SINESTÉSIOLÓGICA DA
COMPREENSÃO, E SINESTESIOLOGIA DA SINERGIA
DA MUSCULAÇÃO COMPREENSIVA.
SINERGIA SINESTESIOLÓGICA DA COMPREENSÃO-
MUSCULAÇÃO: SINERGIA DA AÇÃO.
Sinetésica estética da sinergia implicativa da ação, da
compreensão, e da musculação compreensiva

Afonso H L Fonseca, psicólogo.

O INCENSÁRIO
Uma mulher de Nagasaki chamada Kame dedicava-se à
fabricação de incensários. Os incensários são, no Japão, um delicado
trabalho de artesanato, e são utilizados nas salas de chá ou diante
dos oratórios familiares.
Kame, cujo pai havia sido um destacado artista do mesmo
grêmio, era bastante chegada à bebida. Também fumava, e bastava-
se para associar-se com homens e tocar o seu pequeno negócio.
Sempre que conseguia reunir algum dinheiro, celebrava uma festa,
para a qual convidava artistas, poetas, carpinteiros e trabalhadores,
homens de todas as vocações e profissões. Falava com eles e
apreendia novas idéias para seus desenhos.
Kame era extraordinariamente lenta em sua atividade criativa.
Sua produtividade, em consequência, era escassa. Uma vez
concluídos, entretanto, seus trabalhos eram considerados, sem
exceção, como obras de arte. Seus incensários acumulavam-se em
lares cujas mulheres nuca bebiam, nem fumavam, nem se
associavam livremente com homens.
Um dia, o alcaide de Nagasaki encomendou-lhe um incensário.
Kame, ao cabo de quase meio ano, não havia ainda encontrado o
desenho definitivo. O alcaide, que esperava ser transferido em breve
para uma cidade distante, apressou-a para que desse início ao
trabalho.
Recebida, enfim, a inspiração, Kame fabricou o incensário. Uma
vez concluído, colocou-o sobre uma mesa, olhando-o longa e
detidamente. Fumou e bebeu diante dele como se se tratasse de um
companheiro de conversa. Passou todo o dia a observá-lo.
Fê-lo por fim em pedaços com um martelo.
Não era a criação perfeita que sua mente havia imaginado.

176
(Incensário. CARNE DE ZEN OSSOS DE ZEN. Org. Paul Weiss).

177
178
INTRODUÇÃO. Da sinergia sinestésica da ação. O sinestésico é
sinestesiológico
Em sua efetividade e eficácia, a ação, efetivamente, é sinérgica.
Na medida em que é articulação vivencial eficaz de multiplicidade de
forças.
Sinérgica, efetivamente a ação, não só mobiliza as suas forças,
as possibilidades, mas -- na homogeneização e concentração na
vivência pré-reflexiva, e pré-conceitual, que lhe é própria --,
otimamente mobiliza, e potencializa, na dialógica da implicação, a
dinâmica da organização perplexiva do desdobramento de
possibilidades.
Permitindo a otimização do desdobramento da ação, da
efetividade e eficácia da ação. Em seu caráter de moção existencial,
em seu caráter de emoção, de cognição compreensiva e implicativa --
sinestesiológica --, de motivação, de criação, de superação, e de
regeneração.
Esta sinergia sinestesiológica da efetividade e eficácia da ação
decorre da experimentação vivencial na dialógica da implicação --
constituinte do caráter estético da vivência pré-reflexiva, e pré-
conceitual. Vivência ontológica, fenomenológico existencial, própria
ao caráter estésico, à estesia, à estética da vivência pré-reflexiva.
Enquanto vivência de forças, as possibilidades.
Que, na implicação, se organizam como perplexidade.
O movimento e a dramática da perplexidade é a própria
sinestesesia, sinestética, sinestesiológico, da cinemática da ação.
Cinemática da compreensão e da musculação compreensivas --
sinestesiológica. Que configuram a ação, na dialógica da
experimentação fenomenológico existencial.
Ontológica, fenomenológica existencial e dialógica,
compreensiva, implicativa, gestaltificativa – enquanto o modo de
sermos do acontecer – a ação guarda, na momentaneidade
instantânea de sua duração, as condições fundamentais deste modo
de sermos.
Ou seja, de ser pré-reflexiva e pré-conceitual, ao modo de
sermos inspectativo do ator (e não do sujeito). De não ser teorética,
nem moralista, portanto. De não ser causal, e estar fora das
determinações de causa e feito. De não ser prática, nem pragmática;
já que configura o modo poiético de sermos, que está fora do modo
de sermos dos úteis, dos usos, e das utilidades. De não ser da ordem
do modo de sermos da realidade, mas de ser da ordem do modo de
sermos da experimentação da vivência do desdobramento de
possibilidades...
Da mesma forma que a ação guarda as características do modo
ontológico de sermos. O seu caráter de moção existencial, de
emoção, de cognição, motivação, de criação, superação, e de
regeneração.

179
A cognição que se desdobra na pontualidade do evento da ação,
é a compreensão implicativa. Que é a própria constituição do sentido
(logos) que deriva da organização implicativa do desdobramento de
multiplicidade de possibilidades, a sinestesia. De modo que, vivência
de constituição e desdobramento de sentido (de logos), a sinestesia é
sinestesiológica. O fenomenológico, o ontológico, o dialógico, é
sinestesiológico.
Critério para a vivência da efetividade e eficácia da ação, e para
sua avaliação.
CONCLUSÃO
Temos, assim, que a ação se constitui como o modo pré-
reflexivo e pré-conceitual de sermos. O modo ontológico de sermos.
Fenomenológico existencial e dialógico, compreensivo, implicativo,
gestaltificativo. O modo de sermos da implicação e da compreensão,
em contraposição ao modo de sermos da explicação. O modo de
sermos do acontecer, em contraposição ao modo de sermos do
acontecido. O modo de sermos da atualidade e da presença, em
contraposição ao modo coisa de sermos.
A dialógica da dramática da ação é atualidade e presença.
O modo de sermos da atualidade e da presença, o modo
ontológico de sermos da dramática da ação, é o modo de sermos da
vivência, como implicação e compreensão, de multiplicidade de forças
plásticas que constituem a ação. O modo estético de sermos, que
sinestesicamente, pela implicação gestaltificativa, organiza a
multiplicidade de forças em plexos, gestaltificações, cognitivas e
musculativas, que compreensiva e musculativamente constituem os
episódios pulsativos, fenomenológico existenciais, da dramática da
ação.
É o envolvimento estético, sinestesiológico, na implicação da
vivência pré-reflexiva e pré-conceitual da ontológica da ação que
determina a qualidade sinestésica da efetividade e eficácia de seu
episódio.
Ou seja, a eficácia e efetividade da ação dependem sempre da
radicalidade da experimentação da dialógica estética de sua
sinestesiologia.
Da mesma forma que as possibilidades de sua avaliação.

180
25. ESTÉTICA, ESTESIA E SINESTESIA,
SINESTESIOLOGIA. DIALÓGICA, EXPERIMENTAÇÃO E
HERMENÊUTICA DRAMÁTICA DA CINEMÁTICA DA
AÇÃO.
... A pior coisa que pode acontecer com um
ator é ele sair preparado. (pré-parado?).
Você sai quase...
Com vontade de jogar...

Bruno Gagliasso. Ator.

O modo de sermos da ação, o modo de sermos do acontecer,


presença e atualidade -- fenomenológico existencial e dialógico,
compreensivo, implicativo, gestaltificativo, o modo ontológico de
sermos --, é, em específico, própria e especificamente, o modo de
sermos da estesia. O modo de sermos de vivência das forças da
ação, forças lógicas, ontológicas, fenomenológicas, que permitem a
criação e o conhecimento sensíveis. E que são chamadas de
possibilidades. Modo de sermos que é o ethos da estesia. A
Estética.

A vivência das possibilidades organiza-se como implicação.


Implicação é o modo de organização do fluxo do
desdobramento das possibilidades, como ação, no modo
ontológico de sermos.

Na implicação as possibilidades competem e argumentam entre


si. Constituindo plexos (plics), que são as dominâncias na
constituição cognitiva e musculativa da ação. A sua sinestesia,
sinestética. Que, compreensão, conhecimento pré-reflexivo, é
vivência sinestesiológica.

As possibilidades são forças plásticas, formativas, criativas,


gestaltificativas. Que se atualizam operacionalmente, enquanto tais,
nos seus desdobramentos na momentaneidade instantânea do
episódio da ação.

São, igualmente, forças lógicas -- fenomenológicas,


ontológicas, dialógicas --, que na atualidade e presença de seu
desdobramento como ação são cognoscíveis, são cognição de criação
pré-reflexiva, pré-conceitual – compreensão.

181
A compreensão é imediata vivência de sentido, de logos.

Que se constitui, como consciência fenomenológica, na


pontualidade do desdobramento da ação. Esta consciência é
sinestesiologia, é sinesteiológica. Na medida em que se constitui,
intrinsecamente, como o desdobramento auto-organizativo da
multiplicidade de forças da implicação, a estesia, a sinestesia das
possibilidades. Que se constitui fenomenológicamente como
sinestesiologia.

Fenomenologicamente, a sinestesiologia não é, de modo algum,


o estudo de um objeto – não estamos no modo de sermos da
dicotomia sujeito-objeto, da objetividade, do objetivismo. Na qual, na
teorética, um sujeito contempla, é espectador, de objetos.

No modo ontológico de sermos da ação não existe o sujeito,


mas o ator. Pré-reflexivo (anterior à dicotomia sujeito-objeto), é o no
qual não se dá a existência do sujeito espectador, o sujeito que
contempla objetos.

No modo ontológico de sermos, fenomenológico existencial e


dialógico, o ator é inspectador.

O ator é cognoscente, compreensivo, compreensão, na estesia


da cinemática, na estética, sinestesia, sinsestética, sinestesiológica,
da ação.

Não como teorética explicativa, mas como implicação


compreensiva. Que, inspectação, é a sinestesioiologia da ação.

Estesia, estética, sinestesia, sinestesiologia, sinestesiológica, da


ação.

Não acontecendo no modo, reflexivo, de sermos da dicotomia


sujeito-objeto -- mas no modo pré-reflexivo de sermos, implicação
compreensiva --, a sinestesiologia da ação, inspectação, dá-se como
interação do eu com uma alteridade absoluta, o tu. Um tu da
natureza não humana, um tu humano, ou um tu sagrado... Segundo
Buber.

Numa interação que é a vivência compartilhada da implicação


da emergência e do desdobramento de possibilidades, e da produção
de sentidos que lhe é concomitante. Como dia-lógica. A
sinestesiologia é dialógica.

As possibilidades vividas no modo ontológico, pré-reflexivo e


pré-conceitual de sermos, forças plásticas, e a sua compreensividade
implicativa, são afirmativas, são afirmação. E não são vividas como
objetos, mas como tu. E, para o seu efetivo desdobramento, elas

182
demandam a disposição de uma afirmação. Que se configura, assim,
como afirmação da afirmação.

Atualidade e presença, dialógica – antes projeto, e não objetos


– que não acontecem sem nós, mas que não somos nós que
produzimos (Buber) –, as possibilidades não são certezas. Mas
possibilidades, que demandam a confirmação de sua inerente
incerteza, na afirmação de sua afirmação.

E isto constitui a vivência de sua experimentatividade


fenomenológica existencial.

A ação só se dá ao modo de sermos da experimentação


compreensiva e implicativa; fenomenológico existencial,
compreensiva. Implicativa, gestaltificativa...

Precipuamente, experimentar originariamente significa


arriscar, tentar... Este é o sentido da experimentação fenomenológico
existencial...

E é especificamente pelo risco, e pela tentatividade, pela


experimentação da possibilidade possível, potente, no âmbito do
modo ontológico de sermos, que a ação é possível. Que é possível o
vir a ser que gestaltificativamente se anuncia projetativamente na
vivência do despontar da ação.

Mas não existe certeza... Se não não existiria o possível.

Só existe o arriscar e o tentar do possível potente. A


experimentação fenomenológica.

Perire, que é o radical que dá origem ao termo


experimentação, é o mesmo radical que dá origem ao termo e ao
conceito de perícia (ainda que seja, também, o mesmo radical que
dá origem a perigo).

É na perigação, o tentar e o arriscar da experimentação


fenomenológica, que se desenvolve a perícia experimental da ação.

A ação, assim entendida, em específico é a interpretação


implicativa e compreensiva. A hermenêutica (arte da interpretação)
fenomenológico existencial. Da cinemática cinestésica, sinestésica, e
sinesiológica, da estética da ação.
INTRÍNSECA ESTÉTICA DA AÇÃO, INTRÍNSECA ESTÉTICA DO
ACONTECER
Entendido que -- na momentaneidade instantânea do episódio
da ação --, o envolvimento, a absorção, na implicação da ação, em
seu caráter ontológico, pré-reflexivo e pré-conceitual, a ssua

183
sinestesiologia, é o natural e efetivo caminho, o único, estésico,
estético, para a eficácia e efetividade da ação.
Para a efetiva sinestesia e sinestética da sinergia da ação. Da
sua poiese, de sua cognição, e de sua musculatividade.
Dito de outro modo: é o envolvimento sinestesiológico na
fenomenológica da momentaneidade instantânea do episódio da ação
que é a condição de sua sinestesia. Da efetividade e eficácia de sua
sinergia.

A ação, a fenomenológica da ação, é assim a vivência do que


entendemos como estesia, sinestesiologia. A ética da estesia, a
estética.
Estesia, estética, em seus melhores momentos, a ação é
sinestesia, é sintestésica, sinestesiológica, em sua sinergia. Em sua
sinestética.

A ação é estesia, é estética, é sinestética. Estésica, é


sinestésica. Sinesiológica.

O caráter sinestético da ação em específico remete ao seu


caráter de movimento, como vivência do desdobramento, da
atualização, de possibilidades. Da sua condição estésica, da sua
condição estética, derivam as condições da ação, e em específico a
sua cinestesia, e o seu caráter cinemático.

Em sendo estética, estésica -- sinestética, sinestésica – a ação


é vivência de movimento. E, movimento, a vivência da ação é
cinemática, em suas dimensões próprias de compreensão, e de
musculação -- componentes própria e especificamente intrínsecos, e
incontornáveis, da ação. A musculação é vivência fenomenológico
existencial de movimento. Da mesma forma que o é a compreensão.
A musculação é compreensiva. A sinestesiologia da cognição
compreensiva e a sinestesiologia da musculação compreensiva são
cinemáticas.

O caráter, e a qualidade cinemáticos, estéticos, da vivência


sinestesiológica da ação decorrem, em particular, do envolvimento
pré-reflexivo, da absorção, na vivência do fluxo sinestesiológico da
implicação. Na sua momentaneidade instantânea, enquanto processo
organizativo, gestaltificativo, da vivência do desdobramento de
possibilidades. Enquanto organização, lógica, ontológica,
fenomenológica, do processo de constituição, em sua episodia, da
ação. Pela vivência gestaltificativamente intuitiva das competições e
argumentações --, inerentes aos desdobramentos das forças lógicas,
ontológicas, fenomenológicas, da ação: as possibilidades.
Quanto mais envolvimento sinestesiológico, quanto mais
imersão, quanto mais radicalização, na estética da implicação da

184
vivência do episódio de sua momentaneidade instantânea, mais
sinestética, mais sinestésica, mais sinérgica, a vivência da sinergia da
ação.

Na sinestésica de sua sinestética, como vivência do


desdobramento de possibilidades, em sua sinestesiologia, a ação é
cognitivamente vivenciada, na duração de sua momentaneidade
instantânea, como compreensão.
Além de forças, formativas, forças plásticas, implicativas, da
ação, forças criativas, as possibilidades são forças lógicas,
cognoscíveis, como compreensão, na vivência de seu desdobramento.
A vivência do desdobramento de possibilidades constitui o
sentido, na vivência de sua duração. Sinestesiologicamente, o sentido
se dá como compreensão.
Própria e especificamente, as possibilidades são as forças
constituintes da compreensão, musculativa; e da musculação,
compreensiva. E que se desdobram na duração da vivência da
momentaneidade instantânea da episoidial vivência da ação.
Compreensão, assim, é ação. Da mesma forma que a
musculação. Que, eminentemente, é compreensiva.

Ação, a compreensão e a musculação -- o modo pré-reflexivo e


pré-conceitual de sermos --, o mesmo não se pode dizer da reflexão
ou do comportamento. O mesmo não se pode dizer da objetividade.
Nem da subjetividade.

Presente e atual, vivência ontológica, fenomenológica,


sinestesiológica, da presença e da atualidade, a ação é acontecer. O
modo de sermos do acontecer. A reflexão, o comportamento, a
objetividade a subjetividade, incontornavelmente se configuram como
o nosso modo passado de sermos. O modo coisa, acontecido, de
sermos.
SOBRE A INTRÍNSECA CINEMÁTICA DA ESTÉTICA DA AÇÃO
Fluída e eficaz, a ação é especialmente estética, estésica.
Nos seus melhores momentos, a ação é sinestésica, sinestética,
sinestesiológica, em sua sinergia... Vivência de multiplicidade de
forcas, em sua instataneidade momentânea, a implicação da ação,
sinestesia, é organização fluída e eficaz destas forças, na sinestésica
da fluidez e eficácia compreensiva e musculativa da ação.
Em sua sinergia, a estética e a estesia da ação, sua sinestética,
sinestésica, sinestesiológica, em especial, decorre da vivência
consistente do padrão de sua implicação.
Ou melhor, a sinergia sinestética da ação é diretamente
proporcional à consistensia da imersão na estética de sua implicação
– na sua sinestesiologia.
Que envolve, na momentaneidade instantânea do episódio da
ação, da vivência do interesse que naturalmente decorre da ação, a

185
vivência de suas características, fluentes e eficazes: de movimento
fenomenológico existencial, como cognição, e como musculação—
moção, como cognição compreensiva, e como musculação
compreensiva --, de emoção -- de alegria --, de cognição –
implicação e compreensão --, de motivação, de criação – poise --, de
superação; e de regeneração...
A ação é interessante. Porque é cinemática cinestésica. É
emoção, é emocionada. É conhecer sensível do poiético inédito. É
motivação. É criação. É superação. E regeneração.
Por tudo isso, mas, em particular, isso quer dizer: por ser
dialógica. Interessante é outro termo para dialógica. E a ação é
interessante porque é dialógica. É dialógica, porque é interessante.
Vivência da atualização motiva de possibilidades, motricidade
cognitiva e muscular, em específico, a ação é própria e
especificamente cinemática. Mocionante. E mocionante,
emocionante...
Ação, intrinsecamente, a compreensão, e a musculação
compreensiva, são, portanto, estéticas, estésicas; mais ou menos
sinestéticas, sinestésicas; e, própria e especificamente, cinestéticas,
cinestésicas. Cinemáticas... A compreensão e a musculação
compreensivas são cinemáticas. Sinestesiologicamente cinemáticas.

Siergicamente, sinestética, e sinestesicamente, cinemática,


estética, a ação é, em específico, fenomenológica existencial e
dialógica, em sua vivência sinestesiológica. Compreensiva,
implicativa, gestaltificativa...

Os Gregos chamaram de estética à ética da estesia. A ética da


vivência da estesia.
O pathos da vivência emocionada, a vivência da implicação do
desdobramento de multiplicidades de possibilidades, em seu caráter
cognitivamente compreensivo, e musculativo – a vivência do modo
pré-reflexivo e pré-conceitual de sermos. Fenomenológico existencial
e dialógico; compreensivo, implicatvo, gestaltificativo.
Como vivência de multiplicidade de forças, o modo de sermos
pré-reflexivo e pré-conceitual, da vivência fenomenológica da
implicação, da ontológica da ação, foi especificamente associado,
pelos Gregos, ao vento estesio – que, na Grécia, sopra e impulsiona
as velas dos navios a fazerem-se ao mar, numa certa época do ano.
De modo que eles chamaram de estesia à vivência deste modo
de sermos da vivência fenomenológica ontológica de possibilidades,
as forças pré-reflexivas e pré-conceituais que em sua organização se
configuram como ação. O modo de sermos, o ethos, da estesia da
ação, a estética.
Que, eminentemente, própria e especificamente, é moção –
motricidade cognitiva e musculativa, existencial. Que é emoção;

186
cognição – compreensiva --; motivação, criação, superação, e
regeneração...
Em suas características de compreensão e de musculação.
A compreensão constitui-se e prolonga-se em musculação. A
musculação é vivenciada, necessariamente, de modo compreensivo.

Em suas próprias característica de movimento, compreensiva e


musculativa, a ação, sinergicamente, é, assim, estética, estésica;
sinestésica e sinestésica. Sinestesiologicamente cinemática.
Isto define características peculiares da vivência da ação. Em
particular, que, acontecer, pré-reflexivo e pré-conceitual, a ação em
tudo se diferencia da reflexão, e do comportamento. Reflexão não é
ação; comportamento não é ação. Mais se configura a vivência da
ação (mais que com/portamento) como um desportamento –
estésico, estético, sinestésico, sinestético, cinemático,
sinestesiológico no desdobramento de possibilidades... Um mergulho
na atualidade e na presença da vivência do desdobramento de
possibilidades...
Como compreensão, a ação pode dar-se, predominantemente,
na ausência de musculação. Ou pode se dar de modo mais, ou
menos, compreensivamente musculativo.
Por definição, toda ação é fenomenológica. Toda fenomenologia
é fenomenologia, própria e especificamente, da ação.
Fenomenologia da ação, meramente cognitiva,
compreensivamente. Ou fenomenologia da ação compreensivamente
musculativa...
FORMATIVIDADE, CRIATIVIDADE, DA AÇÃO
A ação é eminentemente criação, e superação: a ação é
formativa. Gestaltificativa.
Precipuamente isto quer dizer que a ação é criativa.
A ação é o processamento do vir a ser de algo que não existe. A
atualização de possibilidades. Tanto em termos vivenciais, como em
termos materiais. A ação é o devir fenomenológico de formas –
formas vivenciais, e formas materiais --, que não existiam. Mas que
vêm a ser, na intrínseca poiese da duração de sua momentaneidade
instantânea.
A ação, o fenomenal, a vivência ontológica --, compõe-se de
compreensão, na vivência da implicação, como uma de suas
intrínsecas dimensões. E compõe-se, com relação à muscularidade,
de musculação. Musculação que é, intrinsecamente, própria e
especificamente, musculatividade compreensiva.
Compreensão e musculação, deste modo, são as dimensões
constituintes da vivência da ontológica fenomenológica da ação.
Enquanto o vir a ser de algo que não existia anteriormente à
eventualidade do episódio da ação.
Tanto ao nível da cognição, como ao nível da musculação, a
ação é a cinemátia sinestesiológica da criação, e da superação.

187
Um específico fazer, um específico modo de fazer, feição,
gestaltificativa.
Em seu fazer, em sua constituição de formas, a ação é sempre
original e única, na criação gestaltificativa das formas da vivência
fenomenológica -- gestaltificação --, e na criação, no fazimento, das
formas das coisas. Na sua efetividade eficácia, a ação resulta sempre
na completude, na completa complementação de sua conclusão. Na
complementação do projeto gestaltificativo, como totalização
significativa, com o qual ela se anuncia enquanto tal.
DE PERFEIÇÃO, E PERFORMANCE, DA CRIAÇÃO NA AÇÃO
Gestaltificativamente, a vivencia formativa, o fazer da ação,
inicia-se pela vivência de uma totalidade significativa, que se
apresenta original e originariamente, como projeto – projetação --;
rascunho, como esboço, disegno, Gestalt, de todo o transcurso da
ação.
Esta totalidade significativa, composta de partes, participações,
se apresenta originariamente, enquanto totalidade. Anteriormente a
qualquer manifestação de suas partes constituintes.
De modo que as partes se explicitam -- em seguimento à
vivência da apresentação do projeto --, na duração do transcurso da
ação, como vivência do desdobramento de possibilidades. Com
contingências eventuais, reconstituindo, com as contingências, a
totalidade significativa que se apresenta originariamente.
Para, em seguida, objetivar a gestaltificação, na Gestalt da
coisa instalada, agora como coisa, e como acontecido, que se
constitui depois, e em decorrência, da ação.
De modo que podemos dizer que termos e conceitos como
possibilidade, Interpretação, Ação, Implicação, Jeto, Projeto, disegno,
esboço, rascunho, Gestaltificação... são sinonímias.
A ação é a terceira margem.
Como sabia Rosa, a verdade não se põe no início nem na
chegada, mas na travessia...
Ou Pessoa: o mundo não s fez para aqueles que pensam que
podem conquista-lo, mesmo que tenham razão... Mas para os que de
fato o conquistam...
A momentaneidade instantânea da vivência do episódio da
ação, da gestaltificação, é o movimento de uma travessia.
Vivencialmente percorrê-la é o que se chama de interpretação,
experimentação, gestaltificação, ação; perfeição, enquanto específico
modo de fazer, na completa e conclusiva vivência da atualização do
possível. No específico sentido implicativo, compreensivo;
fenomenológico existencial e dialógico, gestaltificativo. Estético,
estésico, sinestesiológico...
A ação é a vivência fenomenológica que medeia, como vivência
do desdobramento das possibilidades, entre, e inclusive, a
apresentação do projeto gestaltificativo, e a conclusão de sua
explicitação, na inevitável constituição da instalação da coisa.

188
A ação é a vivência do PERcurso do trânsito, da travessia,
entre a apresentação vivencial do projeto gestaltificativo e o seu
fechamento. A efetiva conclusão de sua explicitação..
De modo que, enquanto fazer, enquanto feição; enquanto
FORMação, o PERcurso da ação, o PERcurso da gestaltificação, é o
PERcurso de um PERfazer, o PERcurso de uma PERfeição. Que, em
específico é, enquanto fazer, o PERcurso de uma formação; uma
PERformação, uma PERformance...
As coisas, materiais e não materiais, necessariamente feitas no
transcurso da ação efetiva e eficaz, são perfeitas. No sentido de que
são feitas completamente, perfeição, em relação ao projeto
gestaltificativo. Desde a vivência, compreensiva e musculativa, da
apresentação deste, à sua conclusão, na específica duração do
episódio da ação.
Observe que perfeição aqui nada tem a ver com a aproximação
a um modelo ideal. Mas define o modo de fazer da ação, em especial
a conclusão de sua completude, desde a vivência da apresentação de
seu projeto gestaltificativo, à vivência de sua conclusão, enquanto
ação, na coisificação.
E PERfazer é PERformar na performance. É, do mesmo modo,
formar completamente. Na vivência de todo o processamento do
episódio da ação. Desde a vivência fenomenológico existencial da
apresentação do projeto gestaltificativo da ação, à conclusão da sua
projetação, na coisidade.
Agir é perfazimento, agir é perfazer. É perfeição, e
performance.
Agir é criar. É viver, performaticamente, a dialógica da
formatividade do que não existe, e vem a ser como perfeito, na
duração do episódio da ação.

Agir é a performance da perfeição.


É a perfeição da performance...
SOBRE A ONTOLÓGICA FENOMENOLÓGICA, IMPLICAÇÃO, DA
COMPETIÇÃO E ARGUMENTAÇÃO ENTRE AS POSSIBILIDADES --
AS FORÇAS VIVENCIAIS DA VIVÊNCIA DA AÇÃO
A ação é o que entendemos como o modo fenomenológico
existencial de sermos da estesia, o modo estético de sermos,
sinestesiológico. Sinestesia, sinestética, nos melhores momentos de
sua sinergia.

A implicação da multiplicidade de forças que se configuram, em


suas dominâncias, como vivência da momentaneidade instantânea do
episódio da ação, constitui a ação como vivência das competições e
das argumentações entre as forças, entre as possibilidades que se
desdobram na constituição da ação.
Competições e argumentações estas que, gestaltificativamente,
configuram os plexos, as gestaltificações, da episódica da ação.

189
Intuitivamente fenomenológica, como compreensão - estética,
estésicamente vivenciadas --, a fluidez e a eficácia efetiva e
efetivante da ação, decorrem, assim, do caráter mais ou menos
problemático, e intenso, intensional, das competições e
argumentações gestaltificativas entre as possibilidades, na implicação
da ação.
De modo que o caráter especificamente sinestésico, sinestético,
sinestesiológico da sinergia da ação, a sinergia da ação, propriamente
dita -- da cognição e da musculação da ação --, decorre e depende --
já como vivência --, das competições, e das argumentações, entre as
forças, que são as possibilidades, na constituição gestaltificativa da
cognição e da musculação do episódio da implicação da ação.
SINESTESIOLOGIA E SINERGIA DA COMPREENSÃO
Cinemática, como a musculação -- ao nível da cognição --, a
compreensão é estésica, sinestésica, na medida em que se dá, se
desdobra, esteticamente, sinestéticamente, sinestesiologicamente.
Como vivência do desdobramento de possibilidades.
Cognição, eminentemente, intrinsecamente constituinte da
fenomenológica ontológica da ação, a compreensão também é
musculação compreensiva. Quando a ação propende para a
musculação.
Ainda que tenda a ser “meramente” compreensiva, quando a
ação propende predominantemente para uma modalidade
“meramente” cognitiva.
Mas é interessante entender que a compreensão é cognição e
musculação. Musculação e cognição.
Podendo ser mais ou menos musculativa. Mas, sempre
compreensiva...
Sendo eminentemente cognitiva quando é musculação.

Em termos de ação, podemos ter assim um espectro em que,


na cinemática de sua sinergia sinestésica, a compreensão vai desde a
condição de ser “meramente” cognitiva; até à condição de ser
compreensão musculativa.
Posto sempre que, tanto como cognição, como como
musculação, a compreensão é sempre cognição & musculação.
Compreeensiva & muscular. Compreensiva e musculativa. Na medida
em que em sua inerência a musculação é propriamente
compreensiva. A vivência da musculação é compreensão. A vivência
sinestesiológica da ação é cognitiva e musculativa.

Interessante observar que, em termos de musculação, de


compreensão musculativa, estamos, em específico, nos referindo,
sempre, naturalmente, à motricidade da musculatura esquelética
voluntária. Uma vez que o funcionamento vegetativo da musculatura
estriada, involuntário, não obedece aos comandos e intuições da

190
ação. Não é voluntário. Nem consciente, em sua funcionalidade
fisiológica.
Mas é importante entender que, em sua intrínseca cinestésica,
cinestética, sinestesiológica, mesmo quando “meramente”
compreensiva, a compreensão inerente à ação é, eminentemente,
cinemática. É eminentemente motricidade.
Meramente dado o seu intrínseco caráter de ação, movimento,
como vivência do desdobramento de possibilidades.

Estranhativo, para a civilização socrática – explicativa --, é o


entranhado caráter intuitivo da cognoscibilidade da compreensão.
Eminentemente implicativo. Implicação. Especificamente pré-
reflexivo, e pré-conceitual.
Não se pode questionar é o seu intrínseco caráter de
conhecimento, enquanto ato, ação, atualidade e presença de
conhecer. Que é eminentemente, própria e especificamente, pré-
reflexivo e pré-conceitual. O conhecer inédito e original, como ação, o
conhecer do ator, pré-reflexivo e pré-conceitual. Impossível para o
sujeito.
Porque -- implicação e compreensão, e não explicação --, trata-
se do próprio logos. Sinestesiológos. Da vivência de sentido – o
logos, privativo da vivência da ação. Que é inerente, e intrínseca,
própria e especificamente, à pontualidade da momentaneidade
instantânea da vivência da duração do episódio da ação.
O ontologos, o fenomenologos, o diálogos.
Este é o logos, o sentido, vivenciado, em sua cinemática
cinestesica, estética e sinestesicamente, sinestesiologicamente, na
pontualidade da duração da compreensiva da implicação da ação.
Cinemática, a cinestésica cognitiva da implicação, e da
compreensão -- meramente compreensiva, ou compreensiva e
musculativa --, como sinestésica e sinestética, sinestesiológica,
depende da imersão na estesia, na estética afirmativa, da duração da
momentaneidade instantânea da ação.
Seu caráter mais ou menos sinérgico, mais ou menos
sinestésico, sinestético, sinestesiológico, depende da homogeneidade
sincrônica da imersão na vivência da estética compreensiva e
implicativa da momentaneidade instantânea da duração da ação.
Ontológica. Fenomenológico existencial e dialógica. Compreensiva,
implicativa, gestaltificativa.
O que quer dizer, atualidade, e presença.
A ação, o desdobramento, pré-reflexivo e pré-conceitual, de
possibilidades, na específica vivência e condição do ator constitui a
implicação e a compreensão como modo específico de conhecer, pré-
reflexivo e pré-conceitual. Distinto do modo de conhecimento,
reflexivo e conceitual, a explicação do sujeito.

191
E este particular conhecer sensível do ator dá-se como vivência
intuitiva da implicação da sinestesia, sinestesiologia, da competição e
argumentação da multiplicidade de possibilidades da
momentaneidade instantânea do episódio da ação. É esta sinestesia
que responde pela efetividade e eficácia da ação.
Implicação e compreensão, pré-reflexivo e pré-conceitual, este
modo de devirmos, e de conhecer, é absolutamente incomensurável
com o conhecimento, reflexivo e conceitual, do sujeito: a explicação.
Em particular porque o conhecer sensível e criativo, poiético,
que é a implicação e a compreensão inerente à ação, inerente ao
ator, tem suas características e critérios próprios.
Além de ser pré-reflexivo (está fora da dicotomia sujeito-
objeto), e pré-conceitual, está fora da dicotomia causa e efeito, não é
causal; está fora da utilidade, não é da ordem do modo de sermos
dos úteis, das utilidades, e dos usos; está fora do modo de sermos da
realidade, porque é da ordem do modo de sermos da vivência da
possibilidade (O modo de sermos de vivência da realidade é o modo
acontecido de sermos. O modo de sermos da vivência do
desdobramento de possibilidades, o modo de sermos da ação, é o
modo de sermos do acontecer).
À sinestesia, sinestesiologia, compreensiva e pré-compreensiva,
da vivência do desdobramento de possibilidades, da ação, no âmbito
destas características do modo pré-reflexivo e pré-conceitual de
sermos, deve à implicação e à compreensão as suas características
enquanto modo ontológico de sermos da ação, modo particular e
sensível de conhecermos.
A metaforização é a sua mais pura e sinestésica,
sinestesiológica, expressão.

No próprio conhecimento, o que sinto não é ainda senão a


alegria de minha vontade a gerar e a crescer; e, se há
inocência no meu conhecimento, é porque há nele a
vontade de gerar.
(F. Nietzsche. Zaratustra).
SINERGIA E SINESTESIOLOGIA DA MUSCULAÇÃO
O passo de cada um revela se ele se encontra já no seu
próprio caminho. Vede-me, portanto, caminhar! Mas
aquele que se aproxima do seu fim... Esse dança.
E, na verdade, não me transformei em estátua, ainda não
estou entorpecido, pesado, petrificado, colocado como se
fosse uma coluna; gosto da corrida veloz.
E, ainda que na terra haja pântanos e uma profunda
tristeza, aquele que tem os pés leves corre por cima da
lama e dança como sobre gelo polido.
Corações ao alto, meus irmãos, ao alto, ainda mais alto! E
não esqueçais as pernas! Levantai as pernas, bons

192
dançarinos, e, melhor, ainda: sabei aguentar-vos sobre a
cabeça.
(...)
Mais vale ainda ser louco de felicidade do que louco de
infelicidade, mais vale dançar pesadamente do que
arrastar a perna. Aprendei, portanto, comigo, a minha
sabedoria: mesmo a pior das coisas tem dois lados bons.
Mesmo a pior das coisas tem boas pernas para dançar:
aprendei, portanto, vós próprios, homens superiores, a
manter-vos direitos sobre as vossas pernas!
Esquecei, portanto, a melancolia e toda a tristeza do
populacho!
(...) E que por nós seja considerado perdido o dia em que
não dançamos! E que por nós seja considerada falsa a
verdade que não é acompanhada por uma risada!
(F. Nietzsche. Zaratustra).

Na ação, a musculação também é naturalmente sinérgica.


Em sua cognoscibilidade intuitivamente sinestésica,
sinestesiológica, a musculação, como dissemos, é própria e
especificamente, compreensiva. Integrando-se cognoscibilidade e
musculação, gestaltificativamente, como um todo que é diferente da
soma das partes, na compreensão.
Estética, estésica, sinestésica, sinestesiológica, assim, a
muscularidade aufere a sua efetividade e eficácia da implicação
sinestésica da implicação, na momentaneidade instantânea da ação.
É muito importante entender que, para o modo pré-reflexivo de
sermos da ação, o corpo não é um objeto. Nem a compreensão um
atributo mental, muito menos neurológico, de um sujeito. Muito
menos, na ação, o corpo é um sujeito.
Na dialógica sinestesiológica da ação, a muscularidade e a
sinergia musculativa é um tu. Na dialógica da dramática da ação.
Indissociável de um eu que, ativo e dialógico, não é um eu subjetivo.
Mas um eu jetivo, projetativo, enquanto estética poiética do
desdobramento de possibilidades, da ação.
Eu e tu, eu-tu, interessantes, desdobramento de possibilidades,
atualização, na instantaneidade momentânea da dialógica da
dramática da ação.

Implicação gestaltificativa, compreensão, fazem com que a


atualização de cerca de 200, 300 ou 400 músculos esqueléticos, e
mais suas centenas de articulações, e outras estruturas, organize-se
intuitiva e sinestesicamente, sinestesiologicamente, em sua cinestesia
cinemática, e produzam a ação, em sua momentaneidade
instantânea, como totalizações significativas de compreensão e
musculação, efetivas e eficazes. Ação, que nunca é a ação de um

193
sujeito voluntário, mas que é permeável à experimentação de um eu
dialógico, na momentaneidade instantânea de sua duração e
performance.
Na cinestésica de sua sinestesia, sinestesiológica, a musculação
guarda todas as características e condições da ação. As
características de moção fenomenológica existencial, de emoção, de
cognição implicativa e compreensiva, de motivação, criação, de
superação, e de regeneração.
E guarda, em especial, as condições de possibilidade da ação,
do modo pré-reflexivo e pré-conceitual de sermos.
Assim, em primeiríssimo lugar, as de dar-se, em sua
momentaneidade instantânea, como a atualização de possibilidades
no modo pré-reflexivo e pré-conceitual de sermos. Como implicação
compreensiva, fenomenológica existencial e dialógica, compreensiva,
implicativa, gestaltificativa. A sua condição não teorética. A sua
condição de dar-se, no episódio de sua duração, no modo não causal
de sermos. De ser desproposital. Não útil e não pragmática. E a
condição de não ser, na duração de sua momentaneidade
instantânea, da ordem da realidade; mas da específica ordem da
atualização de possibilidades, sinérgica e sinestesiologicamente
musculativas. Musculativas, e compreensivas.
SINESTESIA SINESTESIOLÓGICA E SINERGIA DA
COGNIÇÃO/MUSCULAÇÃO COMPREENSIVAS.
SINESTESIOLOGIA E SINERGIA DA AÇÃO
A ação pode dar-se predominantemente como cognição,
compreensiva. E aí a ação é meramente cognitiva.
Ou pode dar-se como musculativa.
Esta distinção é meramente didática. Porque toda ação,
meramente cognitiva, ou cognitiva e musculativa, dá-se como
cognição compreensiva.
A cognição da ação prolonga-se e prolonga na musculaidade
gestual a sua explicitação. É compreensiva a muscularidade, a
musculação, do gesto.
Mas as possibilidades da gestualidade muscular têm as
qualidades de um tu particular, na dialógica da ação. Da mesma
forma que dão-se com um outro tu, na mesma dialógica, as
possibilidades meramente cognitivas da ação.
A gestualidade musculativa, e as possibilidades cognitivas da
ação dão-se, ambas, e encontram-se, na implicação, e na
compreensão. Como implicação e compreensão meramente cognitiva,
e implicação cognitiva e muscular. Ou muscular e cognitiva.
O importante é que, dialógicas – ontológicas, e
fenomenológicas --, as possibilidades, quer sejam compreensão
meramente cognitiva, ou compreensão cognitiva e musculativa têm a
condição da alteridade de um tu. Através da qual a ação, como devir
do inédito, pode dar-se como dialógica.

194
Efetivamente, na duração da sinestesia dialógica da ação,
cognição pré-reflexiva, e muscularidade compreensiva, igualmente
pré-reflexiva, fenomenológico existencial, e dialógico, compreensivo,
implicativo, gestaltificativo...

AVALIAÇÃO DA AÇÃO
Por suas próprias características implicativas, a ação e a sua
avaliação podem ser comunicadas dialogicamente, o que quer dizer,
compreensiva e implicativamente, mas a ação e sua avaliação são
refratárias à objetividade, ou subjetividade, à explicação e à
avaliação explicativa. Constituindo-se sempre a ação em sua
característica implicação e compreensão, em seu caráter de
acontecer, mais especificamente, como inovação e superação, e
criando, como tais, os critérios de avaliação.
Por suas características, a ação é pré-reflexiva, não se submete
à condição do sujeito ou do objeto, não é do âmbito da teorética.
O modo ontológico de sermos da ação não é da ordem da
causalidade. Nem da ordem da utilidade. Não é da ordem da
realidade.
De modo que, se a ação pode ser vista e avaliada partir destes
critérios da perspectiva ôntica explicativa, esta não pode
evidentemente ser o critério último de avaliação de suas motivações,
processsamento, e efeitos.
Refratária à perspectiva ôntica explicativa, a ação tem decisivos
determinantes ontológicos implicativos e compreensivos.
Não menos importante deles, a alegria – que levava Nietzsche a
designar o conhecimento que emana com a ação como gaya scienza
– a ciência alegre.
Que se contrapõe à ciência triste, que é a ciência explicativa.
que bane e opõe-se ao modo de sermos da alegria.

O conhecer implicativo e compreensivo, oriundo da duração da


dramática da ação, é o próprio modo de sermos da alegria. Isto, em
particular, porque, dentre outros aspectos, é o modo de sermos da
emoção. Moção, movimento, cognitivo e musculativo, a ação é o
próprio modo de sermos da emoção.
Poderosamente, é o modo de sermos da constituição e da
vivência de sentido – de logos --, o modo de sermos da
compreensão, da implicação. É o modo de sermos da motivação, da
força das possibilidades, que nos movem existencialmente, como
ação. É o modo de sermos da criação, e o modo de sermos da
superação. Superação do acontecido, e da própria compreensão. Na
medida em que se constitui a compreensão a partir dos fortes
influxos da implicação pré-compreensiva...
Não fosse suficiente, a ação é o modo de sermos da
regeneração. Na medida em que é o modo de sermos do eterno

195
retorno das forças de vida, e da ação. As possibilidades. Força que
quanto mais vivida, mais se potencializa. Promovendo uma
superabundância de forças de vida, vivida como alegria, e como
saúde existencial.

Se a ação é refratária à avaliação explicativa, objetiva ou


subjetiva, teorética, ela constitui-se a partir de poderosos
condicionantes compreensivos e implicativos, que podem ser
compartilhados à compreensão e implicação da dialógica, mas que
não são plausíveis à objetividade, nem à subjetividade.
A avaliação da ação tem os seus próprios critérios intrínsecos
de constituição e de avaliação na própria vivência pré-conceitual,
ontológica, da ação. Esteticamente. Sinesteticamente.
Sinestesiologicamente.
CONCLUSÃO
Temos, assim, que a ação se constitui como o modo pré-
reflexivo e pré-conceitual de sermos. O modo ontológico de sermos.
Fenomenológico existencial e dialógico, compreensivo, implicativo,
gestaltificativo. O modo de sermos da implicação e da compreensão,
em contraposição ao modo de sermos da explicação. O modo de
sermos do acontecer, em contraposição ao modo de sermos do
acontecido. O modo de sermos da atualidade e da presença, em
contraposição ao modo coisa de sermos.
A dialógica da dramática da ação é atualidade e presença.
O modo de sermos da atualidade e da presença, o modo
ontológico de sermos da dramática da ação, é o modo de sermos da
vivência, como implicação e compreensão, de multiplicidade de forças
plásticas que constituem a ação. O modo estético de sermos, que
sinestesicamente, pela implicação gestaltificativa, organiza a
multiplicidade de forças em plexos, gestaltificações, cognitivas e
musculativas, que compreensiva e musculativamente constituem os
episódios pulsativos, fenomenológico existenciais, da dramática da
ação.
É o envolvimento estético, sinestesiológico, na implicação da
vivência pré-reflexiva e pré-conceitual da ontológica da ação que
determina a qualidade sinestésica da efetividade e eficácia de seu
episódio.
Ou seja, a eficácia e efetividade da ação dependem sempre da
radicalidade da experimentação da dialógica estética de sua
sinestesiologia.
Da mesma forma que as possibilidades de sua avaliação.
INTRODUÇÃO. Da sinergia sinestésica da ação. O sinestésico é
sinestesiológico
Em sua efetividade e eficácia, a ação, efetivamente, é sinérgica.
Na medida em que é articulação vivencial eficaz de multiplicidade de
forças.

196
Sinérgica, efetivamente a ação, não só mobiliza as suas forças,
as possibilidades, mas -- na homogeneização e concentração na
vivência pré-reflexiva, e pré-conceitual, que lhe é própria --,
otimamente mobiliza, e potencializa, na dialógica da implicação, a
dinâmica da organização perplexiva do desdobramento de
possibilidades.
Permitindo a otimização do desdobramento da ação, da
efetividade e eficácia da ação. Em seu caráter de moção existencial,
em seu caráter de emoção, de cognição compreensiva e implicativa --
sinestesiológica --, de motivação, de criação, de superação, e de
regeneração.
Esta sinergia sinestesiológica da efetividade e eficácia da ação
decorre da experimentação vivencial na dialógica da implicação --
constituinte do caráter estético da vivência pré-reflexiva, e pré-
conceitual. Vivência ontológica, fenomenológico existencial, própria
ao caráter estésico, à estesia, à estética da vivência pré-reflexiva.
Enquanto vivência de forças, as possibilidades.
Que, na implicação, se organizam como perplexidade.
O movimento e a dramática da perplexidade é a própria
sinestesesia, sinestética, sinestesiológico, da cinemática da ação.
Cinemática da compreensão e da musculação compreensivas --
sinestesiológica. Que configuram a ação, na dialógica da
experimentação fenomenológico existencial.
Ontológica, fenomenológica existencial e dialógica,
compreensiva, implicativa, gestaltificativa – enquanto o modo de
sermos do acontecer – a ação guarda, na momentaneidade
instantânea de sua duração, as condições fundamentais deste modo
de sermos.
Ou seja, de ser pré-reflexiva e pré-conceitual, ao modo de
sermos inspectativo do ator (e não do sujeito). De não ser teorética,
nem moralista, portanto. De não ser causal, e estar fora das
determinações de causa e feito. De não ser prática, nem pragmática;
já que configura o modo poiético de sermos, que está fora do modo
de sermos dos úteis, dos usos, e das utilidades. De não ser da ordem
do modo de sermos da realidade, mas de ser da ordem do modo de
sermos da experimentação da vivência do desdobramento de
possibilidades...
Da mesma forma que a ação guarda as características do modo
ontológico de sermos. O seu caráter de moção existencial, de
emoção, de cognição, motivação, de criação, superação, e de
regeneração.
A cognição que se desdobra na pontualidade do evento da ação,
é a compreensão implicativa. Que é a própria constituição do sentido
(logos) que deriva da organização implicativa do desdobramento de
multiplicidade de possibilidades, a sinestesia. De modo que, vivência
de constituição e desdobramento de sentido (de logos), a sinestesia é

197
sinestesiológica. O fenomenológico, o ontológico, o dialógico, é
sinestesiológico.
Critério para a vivência da efetividade e eficácia da ação, e para
sua avaliação.

198
26. CONCEITUAÇÃO. O TEMPO, O CONCEITO, E O
PRECONCEITO.
O conceito e o Tempo.

Afonso H L da Fonseca, psicólogo.

INTRODUÇÃO
É interessante considerar que, em específico, o conceito é coisa, acontecido. Um tipo de
excrescência, excretude, concrescência, concretude, explicativa, da duração da
momentaneidade instantânea de episódio da implicação. Explicação.

A conceituação, ao contrário, que o precede, é vivência fenomenológico insistensial de ação.

Fenomenodialógica, pré-coisa, atualidade e presença. É acontecer. A conceituação é


ontológica, ação, implicação. Fenomenológico existencial e dialógica, compreensiva,
implicativa, gestaltificativa.

O conceito é ôntico, ente, objeto, explicação. Que não é presença nem atualidade.

E é interessante considerar as próprias e específicas condições e características que disto


derivam.

CONCLUSÃO
O conceito, em suas características de acontecido, própria e especificamente deriva da
conceituação.

A conceituação é vivência do acontecer fenomenodialógico da ação.

A ontológica e a epistemológica do conceito demandam uma dedicação própria às


características interpretativas, hermenêuticas -- no sentido fenomenológico compreensivo --,
da ontológica fenomenológica da conceituação, da ontológica da ação. Nietzsche diria, a
temporalidade da Filologia19. O que permite a boa qualidade, não só da vivência ontológica

19
PIMENTA, Silvia Crítica do Conceito de Consciência na Filosofia de Nietzsche. Relume-Dumará.

199
ativa, fenomenológico insistensial, epistemológica, epistemogênica, epistemocoativa, assim
hermenêutica -- o próprio processo da hermenêutica, compreensiva e implicativa, formativa,
da unidade, da clareza, da objetividade do conceito.

Como toda vivência ontológica, fenomenológica, como vivência do desdobramento de


possibilidades, ação, a vivência da conceituação é um pulsar, que se desdobra em começo,
meio e fim. Concluindo-se num anticlímax. Em que as forças múltiplas, e compreensivas, da
implicação da ação apuram-se dramática e compreensivamente -- na formação do que vão ser
as grandes linhas da abstração conceitual. Constituída a abstração conceitual, a seguir
definham e fenecem. Restando, enquanto experiência da abstração conceitual, apenas os
grandes eixos da formação apuriativa da conceituação. A unidade, a clareza ônticas do
conceito.

Isto significa que a apuração conceitual implicativa, a apuração formativa, e hermenêutica, do


conceito é, enquanto vivência ontológica, a vivência dialógica de uma temporalidade própria e
específica, a temporalidade da momentaneidade instantânea da ação, em suas características
e condições particulares.

Que envolvem o momento da emergência de uma multiplicidade de forças, na implicação, a


apuração delas, num processamento ontológico de competições e argumentações, e a
constituição dos eixos predominantes da abstração conceitual.

Coisificando-se e fenecendo as demais forças, em seus vários níveis, da implicação


conceituativa, em seguida à constituição dos eixos principais desta abstração conceitual.

Em suas características ontológicas -- fenomenológico insistensiais e dialógicas,


compreensivas, implicativas, gestaltificativa --, a vivência da temporalidade da ação, da
implicação, da conceituação, é: pré-reflexiva, é não causal, desproposital, é inútil, não
pragmática, e irreal.

Diversa e heterogênea com relação às características do modo acontecido de sermos. Modo


acontecido de sermos do conceito, da abstração conceitual.

Que é ôntico, explicativo (não implicativo), reflexivo, causal, útil, pragmático, e real...

A vivência própria da ontológica da temporalidade da conceituação demanda uma dedicação a


suas características próprias, em particular a esta sua temporalização. Que envolve o
surgimento e o desdobramento da multiplicidade de forças da implicação, a sua apuração,
enquanto ação compreensiva; e a constituição do conceito, explicativo. Com a decapitação,
pelo decaimento, da maior parte das forças que apuraram para a constituição dos eixos
principais da abstração conceitual. Do conceito.

Este processo fenomenológico hermenêutico, em suas características próprias, constitui um


todo, com começo, meio, e fim... Levando, da vivência do ontológico, à experiência ôntica; da
vivência da compreensão, e da implicação, à experiência da explicação; da atualidade da
presença do acontecer, à coisidade do acontecido. Da conceituação, ao conceito.

200
A duração da instantaneidade momentânea do modo ontológico de sermos pode ser invadida
e interrompida disruptivamente pelas características do modo acontecido de sermos. Na
forma do comportamento proposital e deliberado. Invasão esta que precipita o processo da
vivência ontológica, precipitando disruptivamente o processo da conceituação.

Resultando num conceito pobre, aquém de suas possibilidades. Ou no puro e simples


preconceito.

Na conceituação, a epistemologia ontológica compreensiva e implicativa, fenomenológico


insistensial e dialógica; e, efetivamente, a própria epistemologia explicativa dependem de um
respeito à, e uma dedicação à, um usufruto, da duração da momentaneidade instantânea da
temporalidade da vivência ontológica. Fenomenológico insistensial e dialógica, compreensiva,
implicativa, gestaltificativa.

Sob o risco do empobrecimento substancial do conceito. Ou de operar na mera produção, e


operação, do preconceito.

Operado, equívoca ou oportunisticamente, pela precipitação explicativa da implicação.

TEMPORALIDADE E CONCEITUAÇÃO. E O TEMPO CRÔNICO DO


CONCEITO
Fundamentalmente, medeia uma questão de tempo entre a vivência da conceituação, e o
conceito,

Própria e especificamente, a questão da duração da vivência da temporalidade ontológica da


ação. Implicação.

Já que, ontológica, a conceituação, especificamente, é a vivência da ação. A vivência


ontológica de sua temporalidade, como ação, implicação. Fenomenológica insistensial, e
dialógica, compreensiva, implicativa, gestaltificativa.

E, ainda enquanto tal, a culminância da momentaneidade instantânea do episódio de seu


pulsar, sua necessária culminância, portanto – a culminância da conceituação -, no modo
acontecido de sermos. Própria e especificamente, explicativo. A sua culminância no decurso
inerte do tempo cronificada do conceito; na sua própria instalação, enquanto coisa. A coisa
conceito.

Que assim prevalece, até o momento estético da estalação de sua instalação, pela poiética de
seu eterno retorno ao possível. Uma vez mais, o retorno da vivência da ação.

201
Ontológica, a vivência da conceituação é, propriamente, a vivência da duração da
temporalidade fenomenodialógica da ação, da implicação. O que quer dizer, a vivência
propriamente da temporalidade própria do desdobramento do possível, do desdobramento de
forças plásticas, criativas, as possibilidades, enquanto a instantaneidade momentânea da ação.
A vivência da hermenêutica, a hermenêutica da vivência da ação.

Fenomenológico insistencial e dialógica, compreensiva, implicativa, gestaltificativa. Ou seja,


especificamente pré-reflexiva, não causal, desproposital, inútil, irreal. Ainda que moção,
comoção insistensial, emoção, cognição fenomenológica, fenomenativa; criação, superação, e
regeneração –, não obstante.

Coisa, instalação da coisa, a experiência do conceito é a experiência do acontecido.

Efetivamente, enquanto tal, o conceito é atemporal, atemporativo, a atemporalidade.

No sentido de que o seu tempo é o tempo inerte, a inércia, da coisa. O tempo crônico, o tempo
cronificado do acontecido, do passado...

Distinção de tempo e atemporalidade, medeia entre a possibilidade da conceituação e a


realidade do conceito a hermenêutica temporalidade fenomenativa da ação, da implicação.
Até a culminância e anti clímax da culminância de sua duração, no modo de sermos, em
específico, que não é implicação: no modo de sermos da explicação.

Assim sendo, a unidade, a clareza e a distinção apolíneas do conceito; a unidade, a clareza e a


distinção apolíneas do conceitual, só resultam efetivas enquanto tais, depois que, chegando à
explicação, fenecem as potências múltiplas da temporalidade da implicação. No transcurso
fenomenológico da ação, da implicação. Da conceituação.

Apuração hermenêutica, própria e inerente à duração da vivência da temporalidade múltipla e


potente das forças ativas, criativas, formativas, da implicação.

Que, fatalmente, direcionam-se, decadentemente, na momentaneidade instantânea da ação,


de seu pulsar, em direção ao fato, ao acontecido. À factualidade, do conceito. Em toda a sua
unidade, clareza, e distinção apolíneas. Conceituais.

Ao se exaurirem, assim, as forças múltiplas da ação, da implicação, na vivência da


conceituação, elas se coisificam, no conceito.

202
DECAPITAÇÃO, DECEPAÇÃO, CONCEITUAL. E CONCEITO.
Desculpe esta primeira metáfora, mas é análogo a uma lepra seca. Na qual os dedos, os
membros, vão se desvitalizando, fenecendo, morrendo; até caírem...

Ou como o belo e colorido molde em plástico da árvore vascular de um órgão.

Depois do órgão morto, e retirado todo o tecido orgânico vital.

Analogamente, assim é a constituição do conceito, como resultante do decaimento das


múltiplas forças da implicação, na vivência da duração do episódio de seu pulsar, na duração
do epsódio da ação... Na vivência da duração da temporalidade conceituação. E de
constituição da coisa, o conceito coisa, a coisa conceito, em sua instalação.

Maravilhoso objeto de estudo, o molde em plástico... Para a Anatomia Patológica...

E quão diverso da maravilha do órgão vivo, e funcional. Com a atividade de todos os seus vasos
vivos, até à micro capilaridade dos espaços do tecido intersticiais.

Analogamente, só que muito mais ricas e ativas, assim é a multiplicidade, e a multiplicação, de


forças criativas da vivência da duração da momentaneidade instantânea da ação, da
implicação, da conceituação. Com seus elementos múltiplos multitudinariamente interagindo,
apurativamente, na constituição da dramática fenomenodialógica da ação, da implicação.

Como o ciclo diário do sol, no seu momento de intensidade máxima, o pulso da reiteração do
episódio da momentaneidade instantânea da ação é sucedido por um declínio. E, ao
declinarem, decaem, e fenecem, as forças que, como implicação, constituíram-se como a ação
– compreensiva, e musculativa. Na conceituação, em particular.

Resta o que, analogamente, seria o molde de plástico da árvore vascular. Com seus vasos e sua
rede vascular plastificados, acontecidos, mortos. Prestes a preciptarem-se numa inexorável
decapitação e decepação.

Até que, decapitados, só restem, tétricos, devidamente enrijecidos, unificados e claros,


conspícuos, os seus eixos principais.

Na analogia, os eixos principais restantes são os conceitos. Em sua unidade e clareza individual
– desabilitados e desprovidos da multiplicidade da implicação. Efetivamente mortos,
acontecidos, tétricos em sua rigidez.

Mas este é, apenas, o momento da instalação conceitual, da instalação da coisa, da instalação


desta coisa que é o conceito.

Instalação que permanece -- não como duração, mas como inércia --, até o momento em que a
estética estala a instalação da possibilidade na coisa conceito, no conceito coisa. E este

203
retorne, por seu turno, à abertura da momentaneidade instantânea da vivencia do
desdobramento da possibilidade. De modo que, mais uma vez possível, ele retorne
revoltosamente à ação, conceituação. À Implicação.

Inexorável, a conceituação, como toda ação, direciona-se e conclui-se, em seu decaimento, na


precipitação, a ciptação, da decapitação, conceitual.

A toda conceituação -- ontológica, fenomenológica existencial e dialógica, compreensiva,


implicativa, gestaltificativa -- segue-se a constituição ôntica do conceito – acontecido,
desistencial, não dialógico, em sua inércia e cronicidade dura de coisa, explicativo... Para isto,
um decaimento e fenecimento da multiplicidade de suas forças implicativas, e a decapitação, a
decepção, do que não forem os seus eixos principais. Acontecidos, coisificados.

Não há, então, porque temer. Como prometido, a conceituação, inexorável e irreversível, no
conceito resulta.

Não obstante, cumpre considerar que, como ação, ontológica, em especfico, a conceituação,
implicação, é a vivência fenomenológica, dedicada e hermenêutica, de uma temporalidade
própria. Ontológica, e epistemologicamente, cumpre a consideração, e a dedicação, à
temporalidade própria à ontológica da conceituação.

Pré-reflexiva, não causal, desproposital, inútil, irreal...

Mas moção insistencial, ação, emoção, cognição, criação, superação, motivação,


regeneração...

Na sua culminância de desdobramento da instantaneidade momentânea da duração desta


temporalidade, dá-se a decapitação natural da multiplicidade de forças ativas... No seu
anticlímax, a conceituação entrega-se ao conceito... Ao conceito, bem fornido, e bem
constituído...

Natural...

204
DESTEMPÊRO. O TEMPO DA MISTURA, E A EXPLICATIVA
COMPORTAMENTAL DO PRECONCEITO.
PRECARIZAÇÃO DA ONTOLÓGICA INSISTENCIAL, DA
EPISTEMOLÓGICA COMPREENSIVA DA IMPLICAÇÃO. ... E DA
EPISTEMOLÓGICA
EXPLICATIVA.

Má epistemologia, entretanto, precária epistemologia, é não se dar à dedicação própria, à


vivência da duração da temporalidade ontológico da ação, implicação. Da conceituação.
Desqualificando-se este tempo. Pela imposição, e impostura, do preconceito. Ou
desqualificando-se a vivência da duração desta temporalidade da conceituação, pela
precipitação...

A cipitação é a culminância natural da vivência da duração da conceituação, que resulta no


conceito. Ontológica, como ação, implicação, a conceituação -- a decepação dos elementos da
árvore multitudinária de forças da vivencia da implicação, depois que elas decaem, e fenecem,
na sua atualização -- é a sua natural, e desproposital, culminância. Processo no qual desvelam
o conceito, como acontecido, em sua unidade, clareza e pureza apolíneas.

A precipitação pode invadir, como cipitação prematura -- deliberada, reflexiva, causativa,


utilitária, realista --, o modo desproposital de sermos da ação, da implicação, da conceituação.
E determinar um prematuro corte, precipitado, precipitante, da multiplicidade de forças da
implicação – processo este que naturalmente se daria, em sua efetividade ontológica, na
culminância da vivência da natural duração pré-reflexiva da conceituação. Preciptado,
precipita desta forma, o conceito, por uma prematura decapitação, precipitação, da
implicação. Da ação. Da ação da conceituação...

Precipitado, prematuro, o corte da implicação determina uma pré-conceituação.

A constituição de um conceito pobre, aquém de suas possibilidades.

Ou a mera intromissão de um preconceito. Um conceito predeterminado, precário e


fraudulento. Resultante do prejuízo, da prejudicação, da vivência própria da ontológica e da
epistemológica da ação, da implicação. Da conceituação. E da intromissão fraudulenta de um
conceito prévio.

Assim, o conceito pobre ou deliberadamente empobrecido, e a intromissão são as


consequências da precipitação da momentaneidade instantânea da implicação, na
conceituação.

205
Como ocorre com o termo precipitação, são dois os sentidos do termo preconceito.

Precipitado é todo o vigor da vivência pré-reflexiva, anterior ao decaimento, e ao fenecimento,


das forças ativas, criativas, da ação, da implicação. No caso, da conceituação. A cipitação dá-se
naturalmente, a seguir, a decapitação, dos membros do esqueleto das forças decaídas e
desnaturadas, fenecidas, da implicação. Toda a vivência anterior a cipitação é pré-ciptação.
Plenamente vigorosa, e não pré-matura.

Não obstante, preciptado é o corte prematuro destas mesmas forças, ainda ativas. E que
naturalmente resulta não no conceito, em sua instalação de coisa. Mas na coisa preconcebida
que é o preconceito.

Este preconceito, preconceitual, é anterior à natural constituição, compreensiva, e implicativa,


do conceito. É o preconceito.

Mas todo o vigor da vivência implicativa intensional da duração da temporalidade da ação, da


implicação, da paulatina apuração do sentido -- promovida pela interação das forças múltiplas
da implicação, anteriormente à natural decapitação, que sucede ao seu decaimento e
fenecimento --, é prévia, e prepara, na conceituação, o conceito. É pré-conceitual, e assim
prepara. o conceito. Preconceitual no sentido de que é anterior e prepara o conceito. Toda a
vivência da ação, da implicação, na instantaneidade momentânea de sua duração,
especificamente é preconceitual. Naturalmente resulta no conceito. Mas não em sua
precipitação...

Toda a vivência da conceituação é especificamente, assim, pré conceitual. Na medida em que é


o processo anterior à constituição do conceito, e o prepara, e o gera, e determina.

Mas o termo pré-conceito também remete ao conceito pré-maturo, imaturo, o preconceito.


Determinado pela inconclusa vivência da conceituação, e sua precipitação conceitual, a
precipitação de sua cipitação. Resultando na tosca elaboração, e empobrecimento do
conceito, em sua constituição, em sua conceituação. E dando espaço -- não para a ativa,
implicativa, constituição fenomenológica do conceito --, mas para a específica imposição do
preconceito. Quer seja pela pobreza conceitual resultante. Quer seja pela imposição
fraudulenta de um conceito prévio. Com o intuito de interromper a efetiva conceituação.

206
INTRODUÇÃO
É interessante considerar que, em específico, o conceito é coisa, acontecido. Um tipo de
excrescência, excretude, concrescência, concretude, explicativa, da duração da
momentaneidade instantânea de episódio da implicação. Explicação.

A conceituação, ao contrário, que o precede, é vivência fenomenológico insistensial de ação.

Fenomenodialógica, pré-coisa, atualidade e presença. É acontecer. A conceituação é


ontológica, ação, implicação. Fenomenológico existencial e dialógica, compreensiva,
implicativa, gestaltificativa.

O conceito é ôntico, ente, objeto, explicação. Que não é presença nem atualidade.

E é interessante considerar as próprias e específicas condições e características que disto


derivam.

CONCLUSÃO
O conceito, em suas características de acontecido, própria e especificamente deriva da
conceituação.

A conceituação é vivência do acontecer fenomenodialógico da ação.

A ontológica e a epistemológica do conceito demandam uma dedicação própria às


características interpretativas, hermenêuticas -- no sentido fenomenológico compreensivo --,
da ontológica fenomenológica da conceituação, da ontológica da ação. Nietzsche diria, a
temporalidade da Filologia20. O que permite a boa qualidade, não só da vivência ontológica
ativa, fenomenológico insistensial, epistemológica, epistemogênica, epistemocoativa, assim
hermenêutica -- o próprio processo da hermenêutica, compreensiva e implicativa, formativa,
da unidade, da clareza, da objetividade do conceito.

Como toda vivência ontológica, fenomenológica, como vivência do desdobramento de


possibilidades, ação, a vivência da conceituação é um pulsar, que se desdobra em começo,
meio e fim. Concluindo-se num anticlímax. Em que as forças múltiplas, e compreensivas, da
implicação da ação apuram-se dramática e compreensivamente -- na formação do que vão ser
as grandes linhas da abstração conceitual. Constituída a abstração conceitual, a seguir
definham e fenecem. Restando, enquanto experiência da abstração conceitual, apenas os

20
PIMENTA, Silvia Crítica do Conceito de Consciência na Filosofia de Nietzsche. Relume-Dumará.

207
grandes eixos da formação apuriativa da conceituação. A unidade, a clareza ônticas do
conceito.

Isto significa que a apuração conceitual implicativa, a apuração formativa, e hermenêutica, do


conceito é, enquanto vivência ontológica, a vivência dialógica de uma temporalidade própria e
específica, a temporalidade da momentaneidade instantânea da ação, em suas características
e condições particulares.

Que envolvem o momento da emergência de uma multiplicidade de forças, na implicação, a


apuração delas, num processamento ontológico de competições e argumentações, e a
constituição dos eixos predominantes da abstração conceitual.

Coisificando-se e fenecendo as demais forças, em seus vários níveis, da implicação


conceituativa, em seguida à constituição dos eixos principais desta abstração conceitual.

Em suas características ontológicas -- fenomenológico insistensiais e dialógicas,


compreensivas, implicativas, gestaltificativa --, a vivência da temporalidade da ação, da
implicação, da conceituação, é: pré-reflexiva, é não causal, desproposital, é inútil, não
pragmática, e irreal.

Diversa e heterogênea com relação às características do modo acontecido de sermos. Modo


acontecido de sermos do conceito, da abstração conceitual.

Que é ôntico, explicativo (não implicativo), reflexivo, causal, útil, pragmático, e real...

A vivência própria da ontológica da temporalidade da conceituação demanda uma dedicação a


suas características próprias, em particular a esta sua temporalização. Que envolve o
surgimento e o desdobramento da multiplicidade de forças da implicação, a sua apuração,
enquanto ação compreensiva; e a constituição do conceito, explicativo. Com a decapitação,
pelo decaimento, da maior parte das forças que apuraram para a constituição dos eixos
principais da abstração conceitual. Do conceito.

Este processo fenomenológico hermenêutico, em suas características próprias, constitui um


todo, com começo, meio, e fim... Levando, da vivência do ontológico, à experiência ôntica; da
vivência da compreensão, e da implicação, à experiência da explicação; da atualidade da
presença do acontecer, à coisidade do acontecido. Da conceituação, ao conceito.

A duração da instantaneidade momentânea do modo ontológico de sermos pode ser invadida


e interrompida disruptivamente pelas características do modo acontecido de sermos. Na
forma do comportamento proposital e deliberado. Invasão esta que precipita o processo da
vivência ontológica, precipitando disruptivamente o processo da conceituação.

Resultando num conceito pobre, aquém de suas possibilidades. Ou no puro e simples


preconceito.

208
Na conceituação, a epistemologia ontológica compreensiva e implicativa, fenomenológico
insistensial e dialógica; e, efetivamente, a própria epistemologia explicativa dependem de um
respeito à, e uma dedicação à, um usufruto, da duração da momentaneidade instantânea da
temporalidade da vivência ontológica. Fenomenológico insistensial e dialógica, compreensiva,
implicativa, gestaltificativa.

Sob o risco do empobrecimento substancial do conceito. Ou de operar na mera produção, e


operação, do preconceito.

Operado, equívoca ou oportunisticamente, pela precipitação explicativa da implicação.

209
BIBLIOGRAFIA

ALBETAZZI, Lilian The School of Franz Brentano.

BUBER, Martin Eu e Tu.

HEIDEGGER, Martin Ser e Tempo.

PIMENTA, Silvia Crítica do Conceito de Consciência na Filosofia de Nietzsche. Relume-


Dumará.

210
1
Vera Cury trabalhou esta última temática em sua tese de Doutoramento.

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