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Ou seja, Kant defende que a razão obriga a vontade a agir segundo princípios
racionais (“uma razão que determina a vontade por motivos a priori”) mesmo que na
experiência não exista nenhum exemplo do que a razão determina. Por isso, pode
afirmar-se que, na amizade, ser leal é uma obrigação que a razão impõe à vontade,
ainda que até hoje nunca tivesse existido um amigo leal.
Kant defende que a liberdade da vontade decorre de o homem ser o único que pode
agir segundo leis, segundo princípios que a si próprio impõe, que não lhe são impostos
externamente. A possibilidade de agir segundo leis que a vontade impõe a si própria só
existe porque o homem é um ser racional. Ter uma vontade livre é, para Kant, agir de
acordo com um princípio de ação que é ditado pela razão. A ação moral só pode ser
realizada por um ser racional, pois apenas ele tem a possibilidade de agir segundo
princípios que ele próprio define.
A boa vontade - A boa vontade é aquela que age exclusivamente por dever, por
respeito à lei moral, independentemente das consequências que advenham da ação
ou das inclinações que podem levar à ação. Kant distingue agir por dever ou agir em
conformidade ao dever. Esta distinção é fundamental para saber se uma ação se pode
ou não considerar moralmente boa.
O imperativo categórico – Kant diz-nos que o dever é uma ação que se impõe por
respeito à lei (moral). Essa lei moral, que se impõe racionalmente como uma obrigação
absoluta, independentemente das circunstâncias empíricas do agente e das
consequências da sua ação, é designada/expressa pelo imperativo categórico.
A fórmula mais conhecida, diz-nos: “Age sempre segundo uma máxima tal que possas
ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal.”
Assim, o imperativo categórico é uma lei formal que não nos diz o que fazer em
concreto, mas dá-nos uma orientação para avaliarmos se a ação que pretendemos
fazer é ou não moralmente aceitável. Assim, ao ponderarmos se devemos fazer uma
ação, temos de:
1. Identificar qual a regra que estaríamos a seguir se fizéssemos a ação;
2. Perguntar se estaríamos dispostos a que a regra fosse seguida por todos em todas
as situações iguais, isto é, se pode ser universalizável;
3. Realizar, ou não, a ação de acordo com a conclusão obtida.
Kant apresenta exemplos de ações e analisa-os de modo a determinar a sua
moralidade:
Exemplo 1:
Um merceeiro tem um cliente novo na loja, um turista que não sabe falar ou ler em
português. O turista quer um kilo de maçãs que acabaram de chegar e que ainda não
têm o preço marcado. O merceeiro pode aumentar o preço das maças, mas vende-as
ao turista ao mesmo preço a que estavam no dia anterior. Como sabemos se a ação do
merceeiro foi moralmente boa?
Somente a razão “não se deve enganar os outros”, independentemente das
consequências que isso possa ter para nós, torna a ação moralmente boa.
Exemplo 2
Imagina que recebeste dinheiro inesperado que te permite viver bem e ter tudo o que
queres. Passas na rua por um jovem que está a pedir com um cartaz “Por favor ajude-
me! Preciso de pagar as propinas do meu último ano de curso.” Ponderas dar-lhe algum
dinheiro. Porém, pensas: nada lhe tirei e nada lhe invejo, porque hei de contribuir para
os eu bem-estar? Decides, então, continuar o teu caminho e não partilhar algum do teu
dinheiro com o jovem.
Poderá esta ação ser moralmente boa?
Primeiro temos de determinar a máxima da ação que orientou a decisão da vontade:
“não devemos preocupar-nos com as dificuldades alheias”; logo decidimos se a mesma
se pode tornar um princípio universal. Kant considera que não existe contradição lógica,
pois seria possível viver num mundo onde os que mais têm não ajudam os mais
necessitados. No entanto, defende Kant, nenhuma vontade racional oderia viver num
mundo regulado por semelhante princípio universal, uma vez que, futuramente, também
o agente se poderia encontrar na mesma situação.
A dignidade do homem como fundamento do imperativo categórico:
Kant considera que falta ainda uma obrigação que justifique a necessidade da razão se
submeter ao imperativo categórico.
MUITO IMPORTANTE:
Kant considera que existe um fim que se impõe à vontade de todos os seres racionais:
o homem. O homem impõe-se como um fim absoluto e nunca como um meio para que
esta ou aquela vontade possa atingir as suas finalidades. Esta ideia levou Kant a
apresentar uma nova formulação do imperativo categórico:
“Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa, como na pessoa de
qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como
meio.”
Mas porque o homem é um fim que se impõe a todas as vontades?
Segundo Kant, a racionalidade dá ao homem uma dignidade intrínseca que impede a
instrumentalização do ser humano, isto é, a sua redução a um mero meio. O homem
deve ser respeitado como um fim em si mesmo,
ou seja
O homem tem um valor intrínseco, ou seja, não sendo um meio para alcançar uma
finalidade; o homem vale por si mesmo. Este valor é-lhe dado pela sua racionalidade e,
por isso, por ter projetos, objetivos, por ser capaz de, por si, conduzir a sua ação.
E para que a ideia de que “o homem é um fim em si mesmo” se imponha de forma
inequívoca à vontade” é necessário que eu considere que os fins de cada homem
(objetivos ou projetos) são igualmente importantes e considerados por mim como algo
de bom.
Objeções à ética Kantiana: a dificuldade da aplicabilidade de regras morais
absolutas
Parece-nos moralmente óbvio que devemos mentir, pois o mal a evitar, a morte de uma
pessoa, é um mal maior do que a mentira. No entanto, defende Kant, dizer a verdade é
um dever imperioso da razão por muito más que possam ser as consequências.
O exemplo da mentira por razões altruístas mostra-nos que, para Kant, se não
cumprirmos a lei moral agimos mal e somos responsáveis pelos possíveis efeitos
negativos das nossas ações. Mas, se cumprimos a lei moral, fazemos o que devemos
e agimos corretamente, independentemente das consequências que venham a ocorrer.
No entanto, objeta James Rachels, a resposta de Kant parece controversa. Dificilmente
poderemos considerar que não somos responsáveis pela morte de uma pessoa se a
pudermos evitar, mesmo que tenhamos de mentir.
Outra objeção tem a ver com a possibilidade de existirem máximas universalizáveis
contraditórias:
Kant Mill
De que depende o valor moral De que depende o valor moral das ações?
das ações? Do princípio da utilidade ou da maior
Do cumprimento do dever: Uma felicidade. Uma ação é boa em função do seu
ação é boa se foi feito por dever. resultado, se trouxe a maior felicidade ao
Da intenção do agente, do respeito maior número de pessoas- ética
pela lei moral e cumprimento do consequêncialista.
dever.