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A perspetiva deontológica de Kant

1. Por que razão é a ética de Kant uma ética deontológica?


Considera – se que a ética kantiana é deontológica porque defende que o valor moral de uma
ação reside em si mesma – na sua intenção – e não nas suas consequências.
Em geral, uma teoria é deontológica se considera que agir moralmente consiste em cumprir o
dever pelo dever e que há deveres absolutos, ou seja, deveres que é obrigatório cumprir
independentemente das consequências.

2. Segundo Kant, uma ação pode ter boas consequências e não ter valor moral. Porquê?
As consequências de uma ação não têm qualquer relevância para determinar o valor moral dessa
ação, quer essas consequências sejam boas ou más, uma vez que o valor moral de uma ação é
determinado pela intenção do agente. Uma ação com valor moral pode ter boas consequências
mas não são as boas consequências que a tornam moralmente valiosa.

3. O que é agir por dever?


Agir por dever é fazer do cumprimento do dever a única razão de ser da minha ação. Faço do
cumprimento do dever um fim em si: é isso que quero e mais nada.
A intenção de cumprir o dever não se apoia em mais nenhuma outra. Não há “segundas
intenções”. O cumprimento do dever é o único motivo em que a ação se baseia.
Ex: Não roubo quando podia fazê – lo e era conveniente.
Se cumpro o dever de não roubar por medo das consequências não estou a agir por dever. Se
cumpro o dever de roubar porque considero que é sempre errado roubar então estou a agir por
dever. Não roubo porque considero que assim é que deve ser, isto é, porque esse ato é errado em
si mesmo por melhores que até possam ser as consequências.
Agir por dever é cumprir o dever pelo dever.

4.Para Kant, basta cumprir o dever?


Não. O que importa é o modo ou a forma como cumprimos o dever. Por outras palavras, a
intenção ou o motivo que nos leva a fazer a coisa certa – não matar, não roubar, não mentir – é
que conta. É que podemos fazer a coisa certa por interesse ou conveniência. Isso, para Kant,
retira valor moral à ação. Quando o propósito do agente é cumprir o dever pelo dever é que
verdadeiramente agimos bem. Para que uma ação seja correta não basta cumprimos os nossos
deveres, porque não é o que fazemos mas a intenção com que o fazemos que determina se a
nossa ação é moralmente valiosa.

5.Quando é que a intenção tem valor moral ou é boa?


Quando o propósito do agente é cumprir o dever pelo dever.

6. Kant distingue ações feitas por dever e ações em conformidade com o dever. O que são
ações conformes ao dever?
Ações conformes ao dever são ações que têm como única motivação o cumprimento do dever,
mas um interesse pessoal. São ações que cumprem o dever com a intenção de evitar uma má
consequência – perder dinheiro, reputação – ou porque daí resulta uma boa consequência – a
satisfação de um interesse. O comerciante que pratica preços justos para criar boa reputação e
aumentar a clientela, cumpre o dever por interesse mas não cumpre o dever por dever.

7. Uma ação pode ser conforme ao dever e não ser por dever. Justifique.
O que determina se uma ação é realizada por dever ou em conformidade ao dever é a sua
intenção. Duas ações podem ter as mesmas consequências, mas só a que é realizada com a
intenção de cumprir o dever pelo dever é uma ação por dever.

8. O que são ações contrárias ao dever? Dê exemplos.


Ações contrárias ao dever são ações que violam o dever. Por exemplo, matar, roubar, mentir.

9. Por que razão distingue Kant entre ações por dever e ações em conformidade com o
dever?
A razão de ser ou o objetivo da distinção é duplo:
1. Defender que o valor moral das ações depende unicamente da intenção com que são
praticadas.
2. Mostrar que duas ações podem ter consequências igualmente boas e uma delas não ter valor
moral.

10. O que é a lei moral?


É uma lei da nossa consciência racional que exige que se cumpra o dever por dever.
A lei moral exige respeito absoluto pelo dever, pelo cumprimento de certas normas como não
matar, não roubar e não mentir.
Obedeço à lei moral quando respeito absolutamente o dever, quando não preciso de mais
nenhum motivo – a não ser a honestidade – para cumprir o dever (para ser honesto).

11. Por que razão, Segundo Kant, a lei moral tem um caráter formal?
Porque me diz a forma como é correto cumprir o dever. Não é uma regra concreta como «Não
matarás!» mas um princípio geral que deve ser seguido quando cumpro essas regras concretas
que proíbem o roubo, o assassinato, a mentira, etc. Pense em normas morais como «Não deves
mentir»; «Não deves matar»; «Não deves roubar». A lei moral, segundo Kant, diz-nos como
cumprir esses deveres, qual a forma correta de os cumprir. Assim sendo, é uma lei puramente
racional e puramente formal.

12. Por que razão, segundo Kant, a lei moral tem a forma de um imperativo categórico?
A lei moral exige respeito absoluto pelo dever, pelo cumprimento de certas normas como não
matar, não roubar e não mentir. A palavra imperativo designa dever, ordem, obrigação. A palavra
categórico significa absoluto, incondicional.
Assim, respeitar a lei moral ou o que ela ordena é uma obrigação absoluta.
O que a lei moral ordena – cumprir o dever por puro e simples respeito pelo dever – é, para Kant,
uma exigência que tem a forma de um imperativo categórico.
Ordena que uma ação boa seja realizada pelo seu valor intrínseco, que seja querida por ser boa
em si e não por causa dos seus efeitos ou consequências. O cumprimento de deveres como não
roubar ou não mentir é uma obrigação absoluta.

13. O que são deveres absolutos?


Deveres absolutos, ou perfeitos, são deveres que não admitem exceções. Os deveres absolutos
são deveres incondicionais (não dependem de condições ou interesses). Os deveres morais
propriamente ditos são deveres absolutos. A lei moral enquanto imperativo categórico diz – nos
que deveres é obrigatório respeitar de forma absoluta.

14. Por que razão o cumprimento do dever é uma obrigação absoluta ou categórica?
Se cumprir o dever dependesse dos nossos interesses ou sentimentos, teríamos a obrigação, por
exemplo, de cumprir a palavra dada apenas em certas condições, mas não sempre. Esta
obrigação dependeria, digamos, do desejo de ficarmos bem vistos aos olhos de Deus ou aos
olhos dos outros, do desejo de agradar a alguém, etc. Se agradar a Deus ou aos outros deixasse
de nos preocupar, a obrigação de cumprir a palavra dada simplesmente desapareceria. Ora, não é
isso que deve acontecer, segundo Kant. Continuamos a ter o dever de cumprir a palavra dada
quer isso nos agrade quer não.

15. O que são deveres relativos?


Deveres relativos são deveres cujo cumprimento depende de se querer ou desejar algo, isto é,
que se devem cumprir apenas quando se deseja algo.

16. O que são imperativos hipotéticos? Dê exemplos.


Os imperativos hipotéticos são ordens que expressam deveres relativos, isto é, deveres que
devemos cumprir na condição de querermos ou desejarmos uma dada coisa. Os imperativos
hipotéticos expressam ações conformes ao dever. Exemplos: «Deves cumprir o Código da
Estrada se não queres ser multado»; «Se queres ser louvado pelos teus concidadãos, deves fazer
apenas ações que a comunidade aprove.»
17. Exponha as duas formulações principais do imperativo categórico.
As duas formulações do imperativo a que Kant dá mais importância são a fórmula da lei universal
e a fórmula da Humanidade. A primeira diz que devemos agir apenas segundo uma máxima tal
que possamos querer ao mesmo tempo que se torne uma lei universal; a segunda afirma que
devemos agir de tal maneira que usemos a humanidade, tanto na nossa pessoa como na pessoa
de outrem, sempre e simultaneamente como fim e nunca apenas como meio.

18. Qual é a função destas duas fórmulas? Para que servem?


Para sabermos, em cada circunstância da vida, se a ação que queremos praticar está, ou não, de
acordo com a moral, temos de perguntar se aquilo que nos propomos fazer poderia servir de
modelo para todos os outros e se não os transforma em simples meios ao serviço dos nossos
interesses. Se faltar a uma promessa, não é algo que todos possam imitar e viola os direitos dos
outros, então temos a obrigação de não o fazer, por muito que isso nos possa custar; se mentir
não serve de modelo para os outros e os reduz a meios que usamos para satisfazer o nosso
egoísmo, então não temos o direito de abrir uma exceção apenas para nós.

19.O que está presente nestas duas fórmulas do imperativo categórico?


Está presente a máxima que deve orientar a nossa ação para que ela tenha valor moral. A
máxima dá – nos a conhecer a intenção ou o motivo que está na base da ação do agente. Kant
atribui a estas duas formulações do imperativo categórico a função de critérios para determinar se
uma máxima expressa ou não um dever moral.

20. Analise a primeira formulação do imperativo categórico. Recorra a um exemplo.


A fórmula é: “Age apenas segundo uma máxima tal que possas querer ao mesmo tempo que se
torne lei universal”.
Cumpro o imperativo categórico (equivalente a obedecer à lei moral ou a agir por dever) quando a
minha máxima pode ser universalizada sem contradição.
Imagine – se a seguinte situação: Eva precisava de dinheiro. Pediu algum dinheiro emprestado a
Bernardo com a promessa de lho devolver. No entanto, já tinha a intenção de não lhe devolver o
dinheiro.
Eva agiu de acordo com a seguinte máxima: “Sempre que precisar de dinheiro, peço o dinheiro
emprestado, mas com a intenção de não o devolver”. Em termos mais gerais a regra que orienta a
ação de Eva é esta: “Mente sempre que isso for do teu interesse”.
Poderá esta máxima ser universalizada? Não será contraditória? O que aconteceria se esta regra
fosse universalizada, se funcionasse como modelo para todos, se todos a seguissem? Ninguém
confiaria em ninguém. Ora, a mentira só é eficaz se as pessoas confiarem umas nas outras. É
preciso que Bernardo confie em Eva, para poder ser enganado por ela. Mas se eu souber que
todos mentem sempre que isso lhes convém, deixarei de confiar nos outros e por isso Bernardo
não confiará em Eva. Não vale a pena Eva prometer porque Bernardo não irá acreditar em nada
que ela diga. Logo, Bernardo não lhe iria emprestar o dinheiro se a máxima de Eva fosse uma lei
universal. Por estranho que pareça, ao exigir que todos mintam, estou a tornar a mentira
impossível.

21. O imperativo categórico promove a ideia de imparcialidade?


Sim. Só podemos universalizar a máxima da nossa ação se não nos deixarmos influenciar pelos
nossos interesses e pelo egoísmo.

22. Como é que a fórmula da lei universal determina se uma máxima expressa um dever
moral?
A primeira formulação do imperativo categórico determina se uma máxima expressa um dever
moral verificando se ela é universalizável, isto é, se é possível que todos ajam segundo essa
máxima. Se for possível universalizar a máxima, ela expressa um dever moral. Se não for
possível, não expressa.

23. Analise a segunda formulação do imperativo categórico.


A fórmula é: Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de
outrem, sempre e simultaneamente como fim e nunca apenas como meio.
Segundo esta fórmula, cada ser humano é um fim em si e não um simples meio. Por isso, será
moralmente errado instrumentalizar um ser humano, usá-lo como simples meio para alcançar um
objetivo. Os seres humanos têm valor intrínseco, absoluto, isto é, dignidade. Por exemplo, a vida
de um ser humano não vale mais do que a de outro.
Quem pede dinheiro emprestado sem intenção de o devolver está a tratar a pessoa que lhe
empresta dinheiro sem respeito pela sua dignidade. É evidente que está a tratá-la como um meio
para resolver um problema e não como alguém que merece respeito, consideração. Pensa
unicamente em utilizá-la para resolver uma situação financeira grave sem ter qualquer
consideração pelos interesses próprios de quem se dispõe a ajudá-lo.

24.A segunda formulação do imperativo categórico impede-nos de tratar os outros como


meios?
Não. Se impedisse, poria em causa a própria existência da sociedade e de muitas relações entre
os seres humanos, que dependem de que nos tratemos uns aos outros como meios para os
nossos fins. O que a segunda formulação do imperativo categórico proíbe é que tratemos os
outros apenas como meios para os nossos fins, sem qualquer respeito pela sua dignidade e
racionalidade.

25. Qual é o principal objetivo de Kant ao apresentar estas duas formulações do imperativo
categórico, sobretudo a segunda fórmula?
Kant pretende mostrar que a sua ética é uma ética do respeito absoluto pelos direitos da pessoa
humana e não simplesmente uma ética do dever.
Para Kant, a pessoa tem de ser tratada sempre como um fim em si mesma e nunca somente
como um meio, porque é o único ser de entre as várias espécies de seres vivos que pode agir
moralmente. Se não existissem os seres humanos, não poderia haver bondade moral no mundo e,
nesse sentido, o valor da pessoa é absoluto.
Assim, a fórmula da humanidade, também conhecida por fórmula do respeito pelas pessoas,
exprime a obrigação moral básica da ética kantiana.
Como pessoa o ser humano tem direitos que, em circunstância alguma podem ser violados ou
infringidos. A ética kantiana parece a ética de um fanático do dever mas mais do que isso é a ética
dos direitos da pessoa humana.

26. Estabeleça a relação entre cumprimento do dever, imparcialidade e respeito pela


pessoa humana.
A ação moralmente correta é decidida pelo indivíduo quando adota uma perspetiva universal.
Como? Colocando de parte os seus interesses, a pessoa pensará como qualquer outra que
também faça abstração dos seus interesses adotando, portanto, uma perspetiva universal. Pense
em deveres morais comuns como “ “Paga o que deves”, “Sê leal”, “Não roubes”. Só o interesse e
parcialidade do agente pode levar à violação de tais regras ou deveres morais. Eliminada a
parcialidade, pensamos segundo uma perspetiva universal e aprovamo-los. Sempre que fazemos
da satisfação dos nossos interesses a finalidade única da nossa ação, não estamos a ser
imparciais e a máxima que seguimos não pode ser universalizada. Assim sendo, estamos a usar
os outros apenas como meios, simples instrumentos que utilizamos para nosso proveito.

27. O que é a boa vontade?


É uma vontade que age de forma moralmente correta independentemente das consequências da
ação.
É uma vontade que cumpre o dever respeitando absolutamente a lei moral, ou seja, cuja única
intenção é cumprir o dever.
É uma vontade que age segundo regras ou máximas que podem ser seguidas por todos.
É uma vontade que respeita todo e qualquer ser humano considerando – o uma pessoa e não
uma coisa ou um simples meio ao serviço deste ou daquele interesse.
É uma vontade autónoma porque decide cumprir o dever por sua iniciativa e não por receio de
autoridades externas ou da opinião dos outros.
A boa vontade é a vontade que age por respeito pela lei moral. A boa vontade é a única coisa
absolutamente boa. O que a torna boa é a intenção que preside à realização da ação. Quando um
agente age com a intenção de cumprir o dever pelo dever age de boa vontade.
28. O que é uma vontade autónoma?
É a vontade que age com a intenção de cumprir o dever pelo dever. Por isso é também dita uma
boa vontade ou uma vontade que respeita a lei moral. A autonomia da vontade designa a
capacidade de a vontade decidir respeitar uma lei – a lei moral – que exige o respeito absoluto
pela dignidade e autonomia da pessoa humana. A autonomia da vontade não é fazer o que
apetece. O agente autónomo aceita a lei moral porque essa lei é criada por ele mesmo, quando
faz escolhas morais imparciais e desinteressadas determinadas pela sua razão. Uma vontade
autónoma é uma vontade puramente racional, que faz sua uma lei da razão, que diz a si mesma
«Eu quero o que a lei moral exige”. Ao agir por dever obedeço à voz da minha razão e nada mais.

29. O que é a vontade heterónoma?


É a vontade que não cumpre o dever pelo dever. Não é uma boa vontade. O cumprimento do
dever não é razão suficiente para agir tendo de se invocar razões externas como o receio das
consequências, o temor a Deus, etc. A vontade submete-se a autoridades que não a razão.
É a vontade que é incapaz de vencer o conflito entre o dever e os interesses e inclinações
sensíveis. Nestas circunstâncias, a vontade não tem a razão como fonte da obrigação e rege-se
pelo que a religião ou a sociedade em geral pensam, o que é um sinal de menoridade moral.

30.Para Kant há deveres morais absolutos? Porquê?


Para Kant, há ações que, apesar das boas consequências previsíveis, nunca devem ser
praticadas.
Há ações que é sempre obrigatório ou sempre errado fazer. Há ações que são moralmente
erradas quaisquer que sejam as consequências que resultem delas. Matar, roubar, mentir são
exemplos de ações que são sempre erradas, por mais vantagens que resultem delas, e temos a
absoluta obrigação de não matar, não roubar e não mentir. Isto quer dizer que há deveres morais
absolutos, ou seja, obrigações que devemos cumprir sempre.
Mas por que razão há deveres morais absolutos? Porque há direitos invioláveis. Os direitos da
pessoa humana. Como pessoa, o ser humano tem direitos que, em circunstância alguma, podem
ser violados ou infringidos. Estes direitos implicam deveres, e estes deveres implicam restrições.
Nem tudo é permissível em nome, por exemplo, do bem-estar geral ou da felicidade do maior
número.
O que defende o objetivismo?
O Objetivismo defende que o homem tem livre-arbítrio – a capacidade de pensar ou não
pensar, de usar a razão ou não usá-la, de seguir os fatos ou seguir os sentimentos. Uma
pessoa não tem que usar a razão; essa escolha cabe a ela fazer.

Qual a diferença entre objetivismo e subjetivismo?


Enquanto no subjetivismo, há o foco no sujeito, no objetivismo existe o foco na estrutura.
Apesar da aparente dicotomia entre os conceitos, os autores postulam o diálogo entre o
indivíduo e o outro, pois a sua escolha é compartilhada com outros sujeitos discursivos.

Será Kant um objetivista?


Para ser mais precisa, a filosofia kantiana compatibiliza subjetivismo e objetivismo:
subjetivismo quanto à matéria do querer, objetivismo quanto à forma do querer.

Que relação existe entre relativismo cultural e subjetivismo?


Toda verdade é relativa, tem validade restrita. Mas enquanto o subjetivismo faz o
conhecimento humano depender de fatores que residem no sujeito cognitivo,
o relativismo enfatiza mais a dependência que o conhecimento humano tem de fatores
externos.

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