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TÍTULO: INEXECUÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DA LOCAÇÃO


IMOBILIÁRIA NO CONTEXTO DA PANDEMIA DO COVID-19: uma análise dos seus
principais desdobramentos1

Gliciane Maria Silva Barros2


Nara Núbia de Almeida Aguiar3
Jossane Cristina Ribeiro Ferreira Facanha4

RESUMO
Durante o surto do vírus do covid-19 muitas pessoas se viram em uma situação
caótica, tanto na vida profissional como pessoal, uma vez que, muitos foram demitidos de seus
respectivos trabalhos, houve uma queda na economia brasileira e tiveram que se manter em
total isolamento dos demais. Nesse sentido, as pessoas que ficaram sem sua renda e que viviam
em casas alugadas encontram-se com uma grande dificuldade em fazer o debito dessa obrigação
e em contrapartida existem os locatários que necessitavam da renda obtida com o aluguel dessas
casas. Diante disso, o presente artigo visa analisar à obrigação dos inquilinos referente ao
pagamento de aluguel, levando em consideração a atual situação do Brasil, no intuito de
preservar o direito do locador e visando a dignidade do locatário. Ademais, o estudo para o
presente artigo ocorreu por meio de pesquisas exploratória, ou seja, elaborada para buscar
informações e análises de casos sobre os problemas advindos nas relações contratuais no
cenário da pandemia, utilizou-se também para o levantamento de informações, referencias
teóricos, livros doutrinários, trabalhos acadêmicos, legislação, artigos e documentos jurídicos.
E, vale salientar que foram utilizados os seguintes sites, Google Acadêmico, Jus Brasil e Scielo.
Além disso, as principais particularidades da relação jurídica contratual é a bilateralidade, cuja
ambas as partes possuem direitos e deveres e o inadimplemento resulta em infração contratual,
sendo assim o isolamento e o inadimplemento do contrato de aluguel trouxe transtornos e
dificuldades ao locador e locatário.
Palavras-chave: Direito das obrigações. Locador e Locatário. Inadimplemento. Pandemia do
covid-19. Debito da obrigação.

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2° Check do Paper apresentado à disciplina de Direito das Obrigações do Centro Universitário Unidade de
Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.
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Aluna do 3° Período do Curso de Direito da UNDB.
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Aluna do 3° Período do Curso de Direito da UNDB.
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Professora, Orientadora.
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1 INTRODUÇÃO

No Brasil, as adversidades advindas com a pandemia do COVID-19, faz-se


importante ressaltar sobre a inexecução do pagamento da locação imobiliária. Para tanto, sabe-
se que houve um aumento no cenário do desemprego, onde vários brasileiros viram-se sem sua
renda fixa. Mas deve-se considerar a importância da verba obtida com os alugueis para os
locadores, independente do contexto socioeconômico, pois, pode ser a sua única forma de
sustento.
Ante o exposto, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), o desemprego atingiu 13,4 milhões de pessoas em 2020, ano do início da pandemia da
COVID-19. De acordo com o levantamento feito pela Campanha Despejo Zero mais de 6373
famílias foram expulsas de suas casas em 2020, então, além da pessoa lidar com o vírus e o
desemprego, elas se veem em situação de vulnerabilidade social, pois acabam ficando sem
moradia também. Portanto, a relação entre esses contratos não pode ser negligenciada, fazendo
assim, com que seja necessário discutir e debater encontrar soluções possíveis para resolver
esse impasse.
Desse modo, faz-se necessário uma análise das formas de execução da obrigação
de pagamento e adapta-las ao atual cenário, de forma que, sob nenhuma circunstância o locador
e o locatário sejam afetados. Diante disso, a lei do inquilinato e as locações regidas pela lei
8.245/91 é possível encontrar novas formas de execução do pagamento do contrato de locação
imobiliária? Em outros termos, visa-se por meio deste artigo responder o questionamento
anteriormente apresentado.
Como solução para tal impasse, é necessária uma revisão do valor estabelecido
pelo locador em relação ao contrato de locação imobiliária em busca de um desconto ou
protelação parcial do pagamento para um momento posterior e o impedimento do despejo de
inquilinos dos seus respectivos imóveis durante o período pandêmico. Dessa forma, enquanto
não existir uma política que vise ajudar os menos favorecidos o direito à moradia no Brasil
continuará sem efetivação.
Nesse sentido, justifica-se a importância cientifica desse estudo em conformidade
com um a análise dos contratos imobiliários, bem como sua relação com as mudanças sócias,
uma vez que, os contratos firmados quando de sua criação, devem levar em conta nuances
fáticas, a possibilidade de surgimento de situações adversas, tal como a pandemia do COVID-
19. Sendo a motivação desse estudo o problema que atinge a economia da sociedade uma vez
que, essa restrição momentânea e temporária provocada pela pandemia atinge os locatários e
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os proprietários de maneira igual, pois, ao conceder desconto ou diferimento a um locatário,


implica a um sacrifício ao locador, que pode ter essa verba como única fonte de subsistência.
A relevância desse estudo pauta-se em observar os desdobramentos que o
isolamento social e a pandemia do covid-19, afetaram de maneira significativamente os
locadores e os locatários. No mais, trata de solucionar o problema e as dificuldades pessoais do
inquilino e do locador perante o cenário atual. Por fim, este trabalho visa esclarecer quais
medidas podem ser utilizadas no tocante a resolução desse conflito, com o objetivo de
esclarecer algumas questões para estudantes da área e contribuir para as discussões manifestas
além do corpo acadêmico.
O estudo para esse artigo cientifico foi elaborado utilizando-se do levantamento
de referenciais teóricos, constituídos pela leitura de livros doutrinários, trabalhos acadêmicos,
legislação, artigos disponíveis na internet e documentos jurídicos. Quanto ao tipo, a pesquisa
foi exploratória – elaborada para buscar informações e analise de casos sobre os problemas
advindos nas relações contratuais no cenário da pandemia. Ademais, vale salientar que serão
utilizados os seguintes sites de pesquisa: Google Acadêmico, JusBrasil e a Revista Super
Interessante. Por fim, com a tarefa de reunir informações pertinentes para a resolução do
problema estabelecido (BOOTH, COLOMB, WILLIAMS, 2000).
Em suma, de maneira genérica, objetiva-se por meio deste artigo, analisar a
obrigação dos inquilinos referente ao pagamento de aluguel, levando em consideração a atual
situação do Brasil, no intuito de preservar o direito do locador e visando a dignidade do
locatário. Dessa forma, o artigo se estruturou da seguinte forma: a evolução histórica do acesso
à propriedade ao direito à moradia no Brasil e sua inobservância. Em seguida, uma análise dos
impactos causados pela pandemia do COVI-19 nos contratos de locação imobiliária e os
reflexos das mudanças econômicas advindas da pandemia no modo de vida da população
brasileira.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ACESSO À PROPRIEDADE AO DIREITO À


MORADIA NO BRASIL E SUA INOBSERVÂNCIA

O percurso da política habitacional de interesse social no Brasil à luz do direito


à moradia e implica na integração da população mais pobre ao desenvolvimento econômico.
Uma vez que, é necessário observar de onde começa a precarização do acesso à moradia, quais
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tipos de pessoas foram prejudicadas (REIS, 2018). Sendo assim, moradia se entende como um
pedaço de terra e sua consecutiva utilização para proteção e uso da família. No mais, a terra é
essencial para a vida, pois é o local onde se fixa o povo e de onde se extraem os meios de
subsistência. A casa própria é um dos maiores desejos da atualidade, pois representa conforto,
segurança e dignidade (AUGUSTO, 2013).
Diante disso, tem-se no Brasil mais precisamente no século XIX, a Lei de Terras
que nasceu como forma a estabelecer os critérios para a aquisição de propriedade, de modo que,
imigrantes e ex-cativos teriam dificuldade em obter seu pedaço de terra (RODRIGUES, 1990).
Além disso, o direito à moradia vai ter importância com a abolição da escravidão, pois, com
essa mudança em que os escravas não viveriam mais com seus senhores e, eles vão para a cidade
em busca da sobrevivência e vendendo sua força de trabalho “livremente”. Assim, ocorreu o
surgimento das periferias devido a migração daqueles que viviam na zona rural e migraram para
as cidade em busca de melhores condições de vida (SANTOS; MARQUES). Então, como a lei
de terras os impedia de se apossarem de terrenos e construírem suas moradias, esses
trabalhadores negros foram em busca de outras soluções, terrenos em regiões íngremes, cortiços
e nos morros, dando início às favelas.
Nessa perspectiva, no século XX com o processo de urbanização brasileira as
migrações se acentuaram consideravelmente, como produto da industrialização das cidades,
gerando um rápido e desordenado crescimento demográfico, agravando a situação do acesso a
moradia. Pois, o fluxo de movimentos migratórios quanto de processos de imigração
aumentaram consideravelmente, além do êxodo rural, uma vez que, antes de 1930 o
desenvolvimento nacional era agrário-exportador (REIS, 2018). Além disso, em 1930 com a
revolução urbano-industrial o processo de industrialização se firma, para o desenvolvimento e
modernização da sociedade, o Estado passa a investir em infraestrutura urbana e regional
visando o desenvolvimento industrial, assim construindo conjuntos habitacionais.
Não foi só o governo. A sociedade brasileira em peso embriagou-
se, desde os tempos da abolição e da república velha, com as idealizações
sobre progresso e modernização. A salvação parecia estar nas cidades, onde o
futuro já havia chegado. Então era só vir para elas e desfrutar de fantasias
como emprego pleno, assistência social providenciada pelo Estado, lazer,
novas oportunidades para os filhos. Não aconteceu nada disso, é claro, e, aos
poucos, os sonhos viraram pesadelos (SANTOS, 1986, p.2).
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Seguidamente, em 1946 é criada a Fundação Casa Popular cujos objetivos eram


a construção de moradias, o apoio à indústria de materiais de construção e a implementação de
projetos de saneamento, entretanto, não chegou a produzir 17 mil unidades sendo extinta em
1964 (OSÓRIO, 2019). Assim, realizavam obras de saneamento básico para a eliminação de
epidemias, ao mesmo tempo em que se promovia o embelezamento paisagístico e era
implantadas as bases legais para um mercado imobiliário de corte capitalista (MARICATO,
2001, p.17). Nesse cenário, as cidades brasileiras passaram a receber indivíduos que
necessitavam de trabalho, moradia, educação, saúde e outras necessidades básicas e sócias,
como os direitos fundamentais de segunda geração. Sobre isso tem-se que
Os direitos fundamentais de segunda dimensão (ou geração),
ligados à igualdade material, compreendem os direitos sociais econômicos e
culturais. Os direitos sociais, a despeito de serem encontrados em alguns
textos dos séculos XVII e XIX, passaram a ser amplamente garantidos a partir
das primeiras décadas do século XX (NOVELINO, 2016, p. 272-3).

Contudo, não foi o que ocorreu, uma vez que, os centros urbanos não estavam
preparados para o grande número de habitantes, pois, não se tinha a infraestrutura necessária
para atender essa grande demanda. Assim, sem acesso às condições necessárias para a
satisfação de suas necessidades, as pessoas buscaram meios alternativos para se obrigar e
sobreviver (REIS, 2018). Nessa perspectiva, a habitação se tornou, portanto, um problema a ser
resolvido pelo estado, pois, o desenvolvimento das cidades brasileiras não comportou à inclusão
de todos ao acesso a moradia.
Logo, apenas coma Constituição Federal de 1988, em seu artigo 6º, o direito
social à moradia ficou expresso como direito fundamental. Sendo assim, os direitos sociais
englobantes do direito à moradia, tem-se que já nelas, de forma implícita, existia a necessidade
de se providenciar moradias aos cidadãos brasileiros (NOVELINO, 2016). Além disso, com a
norma da magna, passa-se a regulamentar a matéria por meio da Lei nº 10.257/2001 – o Estatuto
das Cidades, a qual prevê em seus artigos a garantia do direito à cidades sustentáveis, gestão
democrática, cooperação entre os governos, oferta de equipamentos urbanos e comunitários,
afim de promover o desenvolvimento urbano. Diante disso, o direito social não reside em
apenas garantir o acesso a qualquer moradia, mas sim o acesso a uma moradia digna, uma vez
que a dignidade da pessoa está atrelada a toda noção de direito (NOVELINO, 2016).
Por fim, apesar de conter garantias legais, a efetivação do direito à moradia ainda
se encontra de forma precária no Brasil. Assim sendo, as pessoas que não tem o aceso à moradia
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digna vivenciam processos de exclusão em vários níveis, provenientes da falta de concretização


de outros direitos sócias básicos. No mais, a falta de autonomia do Estados Nacionais, à
fragilidade do conceito de cidadania, à mercadorização dos direitos, à falta de compromisso
social das instituições demonstram como os impactos da urbanização e da globalização
trouxeram consequências destrutivas para os direitos sociais (GONÇALVESI; SANTANA,
2018).

2.2 IMPACTOS CAUSADOS PELA PANDEMIA EM RELAÇÃO AOS CONTRATOS


DE LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA

A atual pandemia do COVID-19 é considerada um evento imprevisível e


irreversível, principalmente, por conta da sua ocorrência e seus efeitos inevitáveis, ela foi
responsável por introduzir um novo cenário na sociedade brasileira. Diante disso, houve uma
transformação de maneira profunda nas mais diversas camadas sociais e trouxe inúmeras
consequências para as relações jurídicas, em especial aquelas relacionadas aos contratos
imobiliários (JUNIOR; AMARO, 2021).
Quanto aos imóveis alugados em todo o no país, de acordo com uma pesquisa
realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) no ano de 2019, esses
representam 18,3% das moradias em todo o Brasil, ou seja, essa é uma realidade de inúmeras
famílias brasileiras. Assim sendo, a lei nº 8.245/91, popularmente chamada de “Lei do
Inquilinato”, existe para regular as relações jurídicas acerca da locação de imóveis urbanos
presentes no território nacional, cujo objetivo é estabelecer parâmetros contratuais e normativos
e assegurar o amparo legislativo em relação a esse tema (FACHINI, 2019).
Nessa perspectiva, as principais particularidades da relação jurídica contratual é a
bilateralidade, cuja ambas as partes possuem direitos e deveres e o inadimplemento resulta em
infração contratual. Então, a onerosidade, que envolve o custo do imóvel para o locatário que
deve ser pago ao locador em dinheiro, a comutatividade, cujo valor pago mensalmente deve ser
definido no início do contrato firmado, a não solenidade, em que a Lei do Inquilinato não exige
um contrato formal para que seja caracterizado uma relação jurídica contratual de locação de
imóvel e por fim, a continuidade, pois a obrigação prevista no contrato é renovada assim que o
prazo estipulado para ela ocorre. Ademais, as relações contratuais não possuem um prazo
específico para serem validadas, ou seja, o contrato pode ter tempo determinado ou até mesmo
indeterminado (FACHINI, 2019).
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Concomitantemente, os referidos contratos imobiliários feitos entre as partes,


determinam obrigações que devem ser cumpridas para que haja a efetiva validade do contrato,
o locador e o locatário possuem direitos e deveres devidamente resguardados pela lei nº
8.245/91. Sendo assim, um dos principais direitos do locador é o recebimento do imóvel nas
mesmas condições na qual ele entregou e principalmente o pagamento que deve ser feito no
prazo estipulado em contrato, quanto aos seus principais deveres inclui-se, de acordo com o art
22 da lei supracitada, a entrega do imóvel em boas condições de uso e o pagamento de taxas
relacionadas a locação. Em relação aos deveres do inquilino, de acordo com o art 23 da Lei do
Inquilinato, inclui-se o pagamento devido e a utilização do imóvel de acordo com o que foi
acordado, quanto aos seus direitos, são todos os deveres que devem ser realizados por parte do
proprietário do imóvel (FACHINI, 2019).
Eventualmente de acordo com o que está devidamente tipificado no art. 9 da Lei do
Inquilinato, o locatário do imóvel poderá tomá-lo para si em alguns casos, a referida ação é
denominada “despejo” e resulta na saída do inquilino da propriedade. Certamente, a relação
contratual pode ser desfeita em comum acordo, mas também pela prática de infração legal ou
contratual e até mesmo para realizar reparações cuja determinação advém do poder público que
não podem ser realizadas com a presença do inquilino no local e possuem caráter de urgência.
Importante ressaltar que o não pagamento do aluguel é a causa mais comum do despejo, visto
que está é uma obrigação (dever) do locatário e um direito do locador (FACHINI, 2019).
Decerto, o Código Civil brasileiro apresenta formas de lidar com eventos
imprevisíveis e extraordinários, como a inexecução dos contratos imobiliários por conta do
estado de calamidade pública vigente no país, presente em seu Art. 393, o devedor não será
responsabilizado em caso fortuito ou força maior, se o mesmo não tiver responsabilidade
expressa em relação a esses eventos. Ademais, a partir do art. 378 até o art. 480 do referido
código, caso a execução de uma das partes se torne onerosa e cause vantagem de fora extrema
para a outra parte, o devedor pode pedir a resolução do contrato e retroagirá os efeitos da
sentença à data da citação. (JUNIOR; AMARO, 2021)
Por sua vez, a expressão em latim rebus sic stantibus, cuja origem advém do direito
canônico e significa “estando as coisas como estão”, está atrelada ao princípio da imprevisão.
Assim sendo, como o art. 317 do Código Civil (2002), em que a parte pode pedir a revisão do
valor da prestação, caso por motivo imprevisível ela não consiga executar a obrigação. O
referido princípio afirma que caso haja fato imprevisto ou imprevisível, após a celebração do
contrato entre as partes e a prestação torna-se excessivamente custosa para uma delas, é
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necessário a revisão contratual ou até mesmo fazer alterações nas condições da execução, tal
fato está corroborado no art. 478 do CC (GOLÇALVES, 2020).
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a
prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem
para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o
devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar
retroagirão à data da citação (BRASIL, 2002).

Por fim, ao período dos três meses do início das medidas de contenção da pandemia,
o projeto de lei 1.179/20 foi aprovado e contemplava regras emergenciais e transitórias
relacionadas ao direito privado quanto ao estado pandêmico causado pela COVID-19. Porém,
após algumas alterações realizadas no texto, tornou-se a lei 14.101/20, cuja principal demanda
era a suspensão de forma temporária do pagamento de aluguel residencial, a justificativa usada
para tal medida foi a mudança negativa do quadro financeiro e econômico do locatário, no
entanto, logo após a mesma foi revogada com a justificativa de que poderia trazer prejuízos
para os donos dos imóveis e que havia a possibilidade destes dependerem do valor contratual
para o seu sustento pessoal, além de terem sigo impactado também pela pandemia. Ao final,
nenhuma das regras tipificadas no texto da lei 14.101/20 tem impacto significativo na relação
contratual de locação de imóvel (JUNIOR; AMARO, 2021).

2.3 REFLEXOS DAS MUDANÇAS ECONÔMICAS ADVINDAS DA PANDEMIA NO


MODO DE VIDA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA

Ao longo da história houve diversas crises que afetaram o sistema econômico e a


vida das pessoas que presenciaram tais crises. Contudo a origem destas se divergem, podendo
ter caráter sanitário e de saúde global. Desse modo, destacam-se as pandemias de Gripe
Espanhola (1918-1920), a Gripe Asiática (1957-1958), a Gripe de Hong Kong (1968-1969), a
Gripe Russa (1977-1978), a Gripe Aviária (2003-2004) e a Gripe A (2009) (COSTA;
MERCHAN-HAMANN, 2016). Assim, todas trouxeram impactos na vida social e econômica
da população e mais recentemente a Covid-19 é a responsável pelas mudanças ocorridas no
modo de vida da população brasileira, especialmente devido ao isolamento e ao grande número
de desempregados.
Nessa perspectiva, o modo de vida dos brasileiros foi transformado por conta da
pandemia do COVID-19. Do mesmo modo, impactou não só de forma epidemiológica e
biomédica mas em escala global, trouxe repercussões econômicas, sociais, políticas, culturais
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e históricas, uma vez que, inúmeras pessoas foram infectadas e morreram em decorrência da
pandemia. Visto que, houve uma grande superlotação no sistema de saúde, faltando leitor para
os enfermos principalmente nos hospitais públicos do Brasil. Da mesma maneira, outras
milhões de pessoas sofreram impactos econômicos e financeiros por conta da doença, gerado
principalmente pela perda massiva de empregos em todo o território nacional, dessa forma, o
acesso à bens essenciais como alimentação, medicamentos e moradia ficaram ainda mais
difíceis durante o período pandêmico (IMPACTOS, 2021)
De acordo com os dados da Pnad Contínua referentes ao primeiro trimestre de 2021,
cerca de 14,8 milhões de pessoas encontram-se desempregadas, 33,9 milhões de trabalhadores
praticam atividade informal e 6 milhões estão desalentados, ou seja, são aqueles que não estão
em busca de um emprego, pois desistiram de buscar vaga no mercado de trabalho (PAIVA;
PAIVA, 2021). Por sua vez, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), o índice de inadimplência entre os cidadãos em janeiro de 2020 atingia
aproximadamente 66% da população do Brasil. (LUIZ, 2020).
Sendo assim, a pandemia afetou à economia e impôs um padrão de gestão
denominado stop and go, que pode ser entendido como uma medida tomada quando os dados
relacionados à saúde pioram, a economia se fecha. Porém, quando ela melhora, é reaberta, por
conta disso, setores como o do comércio sofreu impactos expressivos, pois as medidas adotadas
para conter o avanço da doença, em especial o isolamento social, gerou a redução de 1.7 milhões
de empregos no ano de 2020. No mais, antes da crise cerca de 16 milhões de pessoas dependiam
exclusivamente desse setor, tornando assim a crise da pandemia de tamanho agravo à economia.
Além disso, o setor de serviços que é responsável por 63% do PIB (produto interno bruto)
brasileiro, e 68% dos empregos em todo território nacional também foi bastante afetado pela
pandemia (PAIVA; PAIVA, 2021).
Da mesma forma, os serviços de alojamento e alimentação apresentaram uma
redução de 21, 3% em comparação com o ano de 2019, ou seja, uma perda de mais de 1,2
milhões de postos de emprego. Além disso, com relação aos dados de empregados domésticos
houve uma queda de 19,2%, significando a redução de 1, 2 milhões de postos, um dos fatores
que geraram essa queda, foi o estilo adotado por muitas empresas, o chamado home office, em
que muitas famílias precisaram trabalhar em casa e tiveram a sua renda reduzida e, por conta
disso, precisaram demitir seus trabalhadores domésticos (PAIVA; PAIVA, 2021).
Diante disso, o governo adotou uma política de distribuição de renda destinada ao
trabalhadores o auxílio emergencial. Assim, o benefício foi destinando aos trabalhadores
informais, microempreendedores individuais, autônomos e desempregados como forma de
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diminuir os impactos econômicos negativos sofridos por eles (SILVA; SILVA, 2020). Porém,
o auxilio não contemplou todos os que estavam vivenciando a crise e muitos continuaram
vivendo de maneira precária.
Por fim, os trabalhadores que sofreram maior impacto por conta da crise pandêmica
foram aqueles que tinham menor grau de instrução e possuíam subocupações, ou seja, aqueles
que trabalham menos de 40 horas em seus postos, mas gostariam de trabalhar mais ainda, esse
fator favoreceu o regime de trabalho intermitente, em que o empregado só trabalha algumas
horas por semana, o que gera perda de renda e a redução da jornada de trabalho. Além disso, o
estudo realizado também apontou que a pandemia afetou de forma incisiva as mulheres,
especialmente devido à dupla jornada de trabalho que recaí principalente sobre as pessoas do
sexo feminino. Similarmente, as escolas e creches nas quais as crianças ficam enquanto a mãe
trabalha, fecharam, o que impôs à essas mulheres o abandono dos seus postos de trabalho e o
cuidado dos filhos, assim como dos idosos da família. Dessa forma, é possível observar que a
pandemia afetou principalmente os grupos mais vulneráveis da sociedade, a população
assalariada, os trabalhadores informais, cujo índice de pessoas pretas nesses cargos são
expressivos (PAIVA; PAIVA, 2021)

3 AS MUDANÇAS OCORRIDAS NA PANDEMIA E SEUS IMPACTOS NA


RELAÇÃO CONTRATUAL DE LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA

Primeiramente é necessário estabelecer uma importante premissa que considera-se


uma discussão que locadores em abstrato e locatários em abstrato, assim como contratos de
locação residencial em abstrato, pois considerando que existem muitos casos concretos de
diferentes especificidades envolvendo locador e locatário tem-se a necessidade de não gerar
generalizações.
Nesse sentido, os contratos de locação residencial são negócios jurídicos e geram
obrigações (QUINTELLA, 2020) que devem ser cumpridas para o equilíbrio contratual. No
entanto, o impacto da crise foi sobre a situação econômica do locatário que incide sobre a do
locador, gerando um inadimplemento da obrigação de pagar os alugueis. Por isso, é
recomendável a negociação entre locador e locatário, para fins de alteração – enquanto dura a
pandemia – do valor do aluguel e de acordo com o art. 18 da Lei de Locações – Lei n°
8.245/1991 – admite expressamente a novação do valor do aluguel nos contratos de locação.
Nesse sentido, de acordo com o Instituto de pesquisa Insper, das 69 milhões de
famílias brasileiras, cerca de 17% são dependentes de aluguel, ou seja, 11.7 milhões de
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domicílios pagam aluguel, enquanto aqueles que recebem mais de 25 salários mínimos
representam 12% daqueles que recebem aluguel, ou seja, o locador, mesmo que esse grupo de
pessoas seja minoritário na sociedade brasileira, cerca de 2,5% da população (POBRES, 2020).
Dessa forma, podemos observar a distribuição de famílias, por renda, que pagam e
recebem aluguel e observa-se uma certa tendência, em especial com as pessoas de baixa renda
que são mais submetidas a esse tipo de contrato obrigacional, não por escolha, apenas por não
terem condições de adquirir casa própria, enquanto aqueles que possuem condições melhores
de vida se destacam por ocuparem o papel de locador, o dono e responsável do imóvel
(POBRES, 2020).
A população mais vulnerável, além de estarem expostos a mais riscos no aluguel,
com a pandemia da COVID-19 acabaram adquirindo mais uma carga para os seus rendimentos,
pois as medidas para conter o vírus acabam afetando principalmente os trabalhadores informais,
por conta da não circulação de pessoas, além de vários desses profissionais estarem menos
protegidos pelas regras previdenciárias e trabalhistas, o que configura um certo desemparo em
relação aos trabalhadores formais (POBRES, 2020).
De acordo com a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) trabalhadores informais e
aqueles que trabalham por conta própria são majoritariamente aqueles que mais aparecem na
classe de baixa renda, sendo essas duas categorias as mais prevalentes por domicílios ocupados
por adultos com até dois salários mínimos, somando cerca de 80% (POBRES, 2020). Ademais
um locatário gasta em média R$ 264,6 por mês com a despesa do aluguel e cerca de 1.7%
daqueles que vivem em domicilio alugado, o valor da prestação equivale aproximadamente 1/3
da renda familiar liquida mensal, essa situação é considerada um ônus excessivo de aluguel,
por conta do alto valor cobrado (BARROS, 2020).

4 CONCLUSÃO
Os fatos supracitados tiveram como objetivo principal a análise da
inexecução dos contratos imobiliários durante a pandemia do COVID-19 levando em
consideração os aspectos sociais e econômicos da sociedade brasileira em um contexto marcado
pela morte de milhares de pessoas, o aumento do desemprego e a perda de poder aquisitivo por
parte da população, em especial aqueles mais vulneráveis. Dessa forma, os tribunais brasileiros
consideraram a pandemia como um evento de força maior, cujo os resultados e impactos não
podem ser prevenidos ou evitados pelas partes de acordo com o art.393 do Novo Código Civil,
essa abordagem foi feita de forma cautelosa, a fim de não prejudicar o locador e o locatário,
pois a pandemia afetou de forma indistinta ambas as partes.
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Nesse contexto, é necessário que haja pro-atividade das partes para resolver esse
conflito, negociando e adotando medidas para mitigar a situação antes mesmo de leva-la aos
tribunais, para que só assim, as devidas sansões contratuais sejam aplicadas de acordo com o
real impacto provocado pela pandemia de forma econômica na vida do locatário.
Observa-se que as discussões levadas aos Tribunais em relação aos contratos de
locações imobiliárias estão girando em torno da possibilidade de redução do valor do aluguel
ou suspensão do pagamento por parte do devedor. De acordo com a jurisprudência do estado
de São Paulo, por exemplo, houve flexibilidade no cumprimento das obrigações contratuais,
visando um equilíbrio razoável das relações e mediante os impactos financeiros causados pela
pandemia na vida do requerente e das tentativas de solução amigável por parte da controvérsia.
Apesar dos julgados analisados se tratarem de questões liminares, por se referirem
a agravos de instrumentos interpostos contra tais decisões e se tratarem sobre um tipo de
contrato imobiliário especifico, essas decisões são fundamentais para privilegiar a autonomia
das partes em negociar e encontrar uma solução equitativa, baseada no bom-senso.
Portanto, é possível concluir que apesar da pandemia ter afetado principalmente a
economia do país e, consequentemente a receita da população, os Tribunais brasileiros estão
buscando tratar essa situação de forma cautelosa na hora de revisar ou suspender às cláusulas
presentes nos contratos privados de forma geral, buscando preservar a autonomia das partes
contratantes para negociar soluções extrajudiciais, visando o reequilíbrio das disparidades
causadas e privilegiando a segurança jurídica em torno das decisões.
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REFERÊNCIAS

AUGUSTO, Eduardo Agostinho Arruda. Registro de imóveis: retificação de registro e


georreferenciamento, fundamento e prática. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 19.

BARROS, Alerrandre. 30% da população com menores rendimentos vivem com menos que o
necessário. Agenda de notícias. Brasília, 25 de nov. de 2020. Disponível em:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agenciade-
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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... .2
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.......................................................................... .3
2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ACESSO À PROPRIEDADE AO DIREITO À
MORADIA NO BRASIL E SUA INOBSERVÂNCIA.........................................................3
2.2 IMPACTOS CAUSADOS PELA PANDEMIA EM RELAÇÃO AOS
CONTRATOS DE LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA ................................................................ .5
2.3 REFLEXOS DAS MUDANÇAS ECONÔMICAS ADVINDAS DA PANDEMIA
NO MODO DE VIDA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA...................................................8
3 AS MUDANÇAS OCORRIDAS NA PANDEMIA E SEUS IMPACTOS NA
RELAÇÃO CONTRATUAL DE LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA..........................................10
4 CONCLUSÃO...........................................................................................................11
REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 13

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