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Edição nº 4 - Abril 2022

SOCIEDADE

"EU MORO NA MATA MAS


VENHO PELA CHAPADA"

C omeço estas palavras pedindo licença


às minhas matriarcas ancestrais e aos
Encantados para compartilhar um
PROFISSÃO
tempo do dia de vocês com este texto,
que nada mais é do que um apanhado
de reflexões sobre este mês, o chamado
abril indígena.

Não sou acadêmica de formação na área


de antropologia e tampouco pretendo
conduzir uma escrita pautada em dados
EDITORIAL
científicos ou estatísticos sobre
movimentos indígenas, venho aqui, sem
pretensões, promover reflexões, Pág. 04 A GESTÃO IFBA, DESUMANIZADA E AUTORITÁRIA:
RETRATO DA FALTA DE PLANEJAMENTO E
ENTREVISTA
DESRESPEITO À IN Nº 90/2021
DE PROJETOS DE UM D escortina-se um cenário autoritário e planejar, de forma eficiente, ações
CURUMIM À LICENCIATURA desumanizado! de combate à pandemia, a fim de
oferecer um retorno seguro aos
INTERCULTURAL INDÍGENA Dois anos de pandemia não foram servidores, prestadores de serviços e
suficientes para a gestão do IFBA estudar e
NO IFBA alunos. Pág. 02

A DANÇA DAS CADEIRAS NA ATÉ LOGO, DONA LYGIA!!!


GESTÃO ATUAL DO IFBA
M eu nome é Edson Kayapó, sou
professor do IFBA de Porto Seguro e A “dança das cadeiras” é um Não sei onde foi que eu li, a beleza
sou pertencente ao povo Mebêngôkre, jogo/brincadeira realizado como não está nem na luz da manhã nem
lá da Amazônia. Sou do Estado do Pará, diversão de um grupo de pessoas, na sombra da tarde, está no
nasci ali na floresta e atualmente sou independente das idades, e que consiste crepúsculo, nesse meio-tom, nessa
professor na Licenciatura Intercultural na disposição de um certo número de ambigüidade. Estou lhe dando um
Indígena e também em outras cadeiras em círculos, sempre menor crepúsculo numa bandeja e você se
licenciaturas, cursos técnicos integrados que o total de participantes. Tem como queixa.” - Lygia Fagundes Telles,
na Instituição. Realizo pesquisas objetivos, estimular a agilidade, a 1923-2022, no conto “Venha ver o
vinculadas à temática indígena, história percepção de espaço, a criatividade, pôr do sol”. Pág. 09
indígena e educação escolar indígena dentre outros. Pág. 03
que é o meu campo de atuação. Pág. 06

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EDITORIAL

A GESTÃO IFBA, DESUMANIZADA E AUTORITÁRIA: RETRATO DA


FALTA DE PLANEJAMENTO E DESRESPEITO À IN Nº 90/2021

D escortina-se um cenário autoritário e


desumanizado!
insuficiência cardíaca, miocardiopatia
isquêmica etc.); e) hipertensão arterial; f)
mil testes de COVID-19 (testes rápidos) e
“realizará” a compra de 6 mil máscaras N95
doença cerebrovascular; g) pneumopatias (o tempo verbal é maravilhoso!). Isso, só
Dois anos de pandemia não foram graves ou descompensadas (asma depois da mobilização e intenso debate dos
suficientes para a gestão do IFBA moderada/grave, DPOC); h) técnicos administrativos.
estudar e planejar, de forma eficiente, imunodepressão e imunossupressão; i)
ações de combate à pandemia, a fim de A pandemia começou no final de 2019, em
doenças renais crônicas em estágio
oferecer um retorno seguro aos março de 2020, alunos, prestadores de
avançado (graus 3, 4 e 5);j) diabetes melito,
servidores, prestadores de serviços e serviços, docentes e técnicos
conforme juízo clínico; k) doenças administrativos foram submetidos ao
alunos.
cromossômicas com estado de fragilidade isolamento social com o trabalho remoto e
Em que pese o Plano de Contingência imunológica; l) neoplasia maligna (exceto a gestão já queria o retorno em agosto de
Institucional prever ou apresentar ações câncer não melanótico de pele); m) cirrose 2021, mesmo com os indicadores
e estratégias para a construção do hepática; n) doenças hematológicas relacionados à pandemia mostrando que
retorno presencial ou, se possível, (incluindo anemia falciforme e talassemia); ainda não era a hora mas, só em 25 de
híbrido (atividade remota associada à e o) gestação.” fevereiro de 2022 resolveu comunicar que
presencial), a gestão elaborou o Plano “comprará” máscaras N95 e
de Retomada das Atividades Presenciais A mesma IN nº 90/2021, em seu Art. 3º, “disponibilizará” testes de COVID-19.
que inicialmente foi construído sem a impõe aos órgãos do SIPEC, seguir as Quando chegarão as máscaras e os testes?
participação, sem o debate e discussão orientações e recomendações do Onde ficou mesmo o planejamento de
com a comunidade. A insatisfação com Ministério da Saúde: I - orientações gerais; combate à COVID-19 tão propagado e a
essa decisão unilateral foi quase preparação eficiente para o retorno seguro
II - medidas de cuidado e proteção
generalizada, fazendo com que depois às atividades presenciais? Tomar as
individual; III - organização do trabalho e
de submetido à apreciação do Conselho medidas que deveriam ser tomadas antes
medidas em relação a casos suspeitos e mesmo de se pensar em retorno presencial,
Superior, o documento retornasse para
confirmados do coronavírus (COVID-19). isso sim, seria uma demonstração de
debate entre docentes, técnicos
administrativos, alunos e prestadores planejamento.
de serviços.
Decidiu-se pelo retorno presencial, mas
Sendo o Plano de Retomada aprovado não se definiu medidas para registro e
em 28 de setembro de 2021, em monitoramento de casos suspeitos e
dezembro fora submetido ao CONSUP confirmados, conforme exigido no inciso
tendo os requisitos para o retorno IV, do Art. 3º, da IN nº 90/2021. Teremos
seguro, flexibilizados a fim de acelerar a transparência com relação a tais
retomada das atividades presenciais. informações?
Isso, em meio à crescente onda da nova
variante Ômicron e os elevados índices Então, quem tem comorbidade ou se
associados à COVID-19, na Bahia. Não enquadra no Art. 4º e incisos, da IN nº 90,
se pensou na forma de retorno híbrido por decisão da gestão, desrespeitando uma
ou não se estudou a melhor norma hierarquicamente superior, deverá
organização do trabalho como definido retornar ao trabalho presencial e expor-se
no inciso III, Art. 3º, da Instrução aos riscos?
Normativa SGP/SEDGG/ME Nº 90, de
28 de setembro de 2021! Na sequência, Enquanto se impõe o retorno presencial
vieram os ad referenduns determinando A gestão já tinha determinado as entradas sem o planejamento prévio, servidores
as entradas das fases definidas no Plano relatam as condições estruturais de
das três primeiras fases do Plano sem
até mesmo a quarta e última, sem trabalho: setores que têm o teto escorado
cumprir o disposto no referido Art. 3º.
observar ou obedecer à referida por estacas de ferro, outros com o forro do
Como medida de proteção individual, teto desabado, paredes com infiltrações… é
Instrução Normativa nº 90/2021 que
alguns campi distribuíram máscaras de este o cenário preparado por uma gestão
em seu Art. 4º estabelece: “Art. 4º
Deverão permanecer em trabalho tecido (relato de servidores) que nada que planejou de forma eficiente o retorno
remoto, mediante autodeclaração, as protegem, conforme divulgado por presencial!
seguintes situações abaixo: a) idade autoridades de saúde, nos vários veículos
igual ou superior a 60 anos; b) de comunicação. Somente no dia 25 de Em meio a tudo isso, o silêncio do
tabagismo; c) obesidade; d) fevereiro de 2022 foi comunicado, através sindicato é ensurdecedor!
miocardiopatias de diferentes etiologias da página institucional que o IFBA
“disponibilizará”, aproximadamente, 40

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OPINIÃO

A DANÇA DAS CADEIRAS NA GESTÃO ATUAL DO IFBA

A “dança das cadeiras” é um


jogo/brincadeira realizado como diversão
de um grupo de pessoas, independente
das idades, e que consiste na disposição de
um certo número de cadeiras em círculos,
sempre menor que o total de
participantes. Tem como objetivos,
estimular a agilidade, a percepção de
espaço, a criatividade, dentre outros.

No mundo das grandes organizações


empresariais, assim como no meio
político ou governamental, a “dança das
cadeiras” tem significado particular. Nas
grandes organizações empresariais, é
traduzida pela substituição de pessoas
com melhor qualificação, atributos e
qualidades, como estratégia visando o
ganho de eficiência, a maximização do
lucro e, consequentemente, o aumento
patrimonial.

Geralmente, tais substituições são vistas


pelos colaboradores com um sentido
negativo, sempre associando-as à Não é comum, em pouco mais de dois anos Não se pode negar que tais
ocorrência de fato desabonador. No meio de gestão se ter um índice tão elevado de acontecimentos têm repercussão negativa
político ou governamental, a “dança das substituições ou rotatividade nos cargos do
cadeiras” pode ser entendida de forma entre os servidores, isto porque resulta na
alto escalão da administração do IFBA. falta de continuidade do planejamento ou
bem mais ampla e com sentidos Geralmente, isso é mais acentuado nos
diferenciados: se, por um lado, deve-se na dificuldade da sua retomada, provoca
últimos meses da gestão. instabilidade e ruptura dos processos,
analisar como estratégias de agentes
políticos a fim de buscarem outras formas afeta a credibilidade, transmite incertezas,
Fazendo-se uma análise mais criteriosa,
de se manterem no poder, como por inseguranças – a cada nova chefia
pode-se enumerar as ocorrências: saída do
exemplo, desvinculando-se de cargos Pró-Reitor de Ensino que posteriormente indicada exige-se um processo de
públicos, designados ou eleitos, para passou a exercer, inicialmente, o cargo de renovação ou reformulação das relações,
disputas eleitorais; por outro, pode ser Assessor de Assuntos Educacionais (cargo até pactuações e adaptações. A “dança das
entendido como decisões tomadas por então inexistente na estrutura administrativa cadeiras” no IFBA é resultado dos
que detém o poder de nomear e/ou da Reitoria) e, posteriormente, a Chefia do tropeços e insucessos, e reflete a
destituir, no caso dos designados, para Gabinete; saída do Pró-Reitor de Pesquisa, incapacidade de executar, de forma
satisfazer a interesses pessoais e de Pós-Graduação e Inovação, que passou a eficiente, o Plano de Gestão.
alinhados políticos ou para tentar exercer a Pró-Reitoria de Ensino; saída do
encobrir escândalos como os que estamos Pró-Reitor de Administração; Saída do Pró-
vivenciando no governo Bolsonaro. Note- O fato é raríssimo! Não se tem conhecimento
Reitor de Desenvolvimento Institucional, de ter havido anteriormente índice tão
se que no governo Bolsonaro, cedendo a chefia a uma docente que
qualificação, competência e habilidades elevado de rotatividade nos cargos do alto
posteriormente saiu para dar lugar à escalão da gestão do Instituto. Este pode ser
não são requisitos para nomeação ou anterior Chefe de Gabinete; saída da Chefe
designação aos cargos por ele indicados. um fenômeno revelador da falta de um Plano
de Gabinete que passou a exercer a Pró-
Sólido de Gestão (não basta só colocar no
Reitoria de Desenvolvimento Institucional;
No Instituto Federal da Bahia, o considera-se, ainda, outras mudanças na papel as ideias e externá-las, elas precisam ser
fenômeno, pode-se assim dizer, “dança estrutura de cargos da Diretoria de Gestão exequíveis), da falta de capacidade e de
das cadeiras” que não se enquadra em de Pessoas. Por último, e mais recente, caiu o habilidades de se identificar talentos… É como
nenhuma das situações abordadas até Chefe do Departamento de Movimentação um tabuleiro de xadrez em que cada peça
então, é muito comentado pelos de Pessoal. Tudo isso acontece naquele que tem as suas funcionalidades específicas e,
servidores, e por isso resolvemos escrever é visto como o órgão principal da saber usá-las, faz do jogador um vencedor.
sobre o assunto a fim de deixar os nossos administração do Instituto, a Reitoria, e em Assim, jamais se conseguirá jogar xadrez
leitores mais inteirados sobre os fatos da pouco mais de dois anos de gestão. usando-se as peças do jogo de damas, apesar
gestão.
dos tabuleiros serem idênticos.

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SOCIEDADE

“Eu moro na mata


Mas venho pela Chapada”

C omeço estas palavras pedindo licença


às minhas matriarcas ancestrais e aos
Algumas pessoas me perguntam: você é
“índia” de verdade? De qual “tribo”?
Encantados para compartilhar um tempo Desde quando você “virou índia”? Outras
do dia de vocês com este texto, que nada fazem estas mesmas perguntas, mas não
mais é do que um apanhado de reflexões tem a coragem de fazê-las para mim,
sobre este mês, o chamado abril indígena. espalham sementes ao vento, sem saber
que o vento é um grande polinizador e
Não sou acadêmica de formação na área dispersor da vida que se encontra
de antropologia e tampouco pretendo concentrada nas sementes.
conduzir uma escrita pautada em dados
científicos ou estatísticos sobre Primeiro: não usamos os termos “índio” e
movimentos indígenas, venho aqui, sem “tribo”, pois os mesmos são pautados na
pretensões, promover reflexões, seguindo lógica da colonização e se constituíram,
princípios da pedagogia da pergunta, de historicamente, em palavras com um
base freiriana. Respondo ao chamado da forte apelo pejorativo e depreciativo em
parente Valdelice Veron, do povo relação às populações indígenas.
Guarani Kayowá de Mato Grosso do Sul,
quando ela ecoa o que seu pai dizia: Segundo: o que seria uma pessoa
“temos que fazer o papel falar” e me indígena “de verdade”? Estaríamos nos
proponho a tecer alguns parágrafos a referindo aos estereótipos também
partir dos meus pés fincados no chão da construídos pela colonização? Quem
Chapada Diamantina, onde vivo e de impôs a condição de, para se declarar
onde escrevo nesse momento. indígena, será preciso viver em uma
aldeia?
Cantos ecoam em meu espírito, desde
que aqui pisei, em 2012, concursada para O processo de aldeamento de Pindorama
a vaga de Biologia do IFBA Campus (nome originário de nosso país) foi
Seabra. Vozes de minha bisa, minha avó, apenas mais um capítulo de uma história
minha tataravó, que durante toda a vida de genocídios, violências, a que nós,
estiveram silenciadas, começaram a povos indígenas, fomos submetidos, com
ressoar forte nos meus ouvidos, causando a promessa da “Terra sem males”. Qual o
arrepios dos pés à cabeça, que se resultado? Povos indígenas de todo o
intensificaram no dia em que estive na V Brasil colocados, aleatoriamente, em
Jornada de Agroecologia da Bahia, em pequenos espaços (como diz a liderança
2017, em Porto Seguro, ao ouvir o canto do povo Petiquara de Seabra, ficamos em
forte e impactante de Dona Maria Mayah, “currais”), muitos deles com terra
anciã e liderança do povo Pataxó contaminada, água envenenada,
Hãhãhãe de Pau Brasil e ao sentir a desmatamento, sem contar as
presença e reconhecer minha divergências que surgiram em função dos
ancestralidade na irmã Nádia Akawã do conflitos culturais, entre povos
povo Tupinambá de Olivença. campesinos e entre os próprios indígenas,
afinal, como esperar unificação de
Desde então, acatando ao chamado culturas entre mais de 305 etnias, falando
ancestral, sigo na missão de estabelecer mais de 274 línguas diferentes? E onde
pontes entre povos indígenas que se ficaram indígenas cujos avós, bisavós,
encontram em seus Territórios Indígenas tiveram suas línguas cortadas, quando
(TI) e povos nativos da Chapada não suas cabeças e toda sua aldeia
Diamantina que se encontram em queimada? Onde se encontram hoje estas
processo de “reflorescimento” de suas pessoas indígenas, arrancadas de sua
memórias, histórias e cultura originária. cultura, de suas memórias?

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A todo esse processo afrontoso e
absurdamente violento de nossas
culturas e memórias, chamamos de
etnocídio: sistematicamente, cada
vez que alguém ergue sua cabeça e
se declara indígena e outro vem e
questiona essa verdade, escancara a
face do racismo à indígenas que
vivem fora de aldeias –
modernamente e, por vezes,
controversamente – chamados de
indígenas em contexto urbano.

Por várias décadas a discussão sobre


autodeclaração indígena e sobre
indígenas fora de aldeias foi
silenciada, seguindo a lógica da
colonização; ainda que estejamos
em pleno século XXI, persistem os
mesmos métodos de racismo, de
genocídio, de etnocídio e tentativas Ativismo, ancestralidade e coletividade compreender que a nação brasileira é,
de apagamento das múltiplas caracterizam, no meu olhar, uma pessoa fundamentalmente, originada de mais
culturas originárias de nosso país. indígena de contexto urbano. de 305 povos indígenas, que vivem,
Quando a academia não é capaz de resistem, que simplesmente existem?
permitir a participação de lideranças Este trabalho se faz, sobretudo, no
indígenas, de mulheres anciãs
indígenas, de jovens indígenas e de
cotidiano das salas de aula, na inserção de “Desamarra essa corrente
textos, poemas, dissertações, podcasts,
todas as pessoas indígenas, de Deixa o índio trabalhar
dentro ou de fora das aldeias, em Lives e, sobretudo, na presença de
pessoas indígenas nos espaços escolares, Quem deu esse nó, não soube dar
eventos acadêmico-científicos,
quando a academia dificulta em todos os eventos e, nesse sentido, os Esse nó está dado, eu desato já”
pagamento de pró-labore de elos e parcerias são fundamentais:
participantes indígenas em eventos, precisamos abrir nossos olhos, olhar ao Concluo estas singelas palavras com esse
sob a alegação de que “não possuem nosso redor! poderoso canto, deixando entendido
currículo no sistema Lattes CNPq”, que, para além das aparências, existe
permanece reproduzindo as práticas Precisamos ir além do abril indígena: é uma força descomunal que ergue e
racistas que praticavam os europeus preciso construir elos e parcerias sustenta nós, povos indígenas, tecendo o
invasores, desde 1500. duradouras com os povos indígenas e, no fio que guia nossa ancestralidade através
caso do IFBA, é preciso refletir: são os dos caminhos, dentro e fora da
A nossa luta, acredito eu, indígenas povos indígenas que vivem próximos academia.
que vivem fora de aldeias, é no
aos Campi ou são os Campi que vivem
sentido de garantir a inserção da
próximos das aldeias indígenas? O que
população indígena em todos os
espaços, é realizar um verdadeiro temos proporcionado aos nossos Awery!
“abre alas que eu quero passar” “vizinhos”, que generosamente,
permitindo que, definitivamente, permitiram que estivéssemos em seus
cada povo indígena possa falar por territórios?
si mesmo; é preciso erradicar a visão
pestilenta da tutelagem, a ideia de Precisamos ir além da lógica de “artigo
que é preciso que uma pessoa científico”: é preciso, sobretudo, escutar
acadêmica estude e fale por um indígenas, ouvir seus desejos e seus
povo originário! Cientistas podem (e anseios, suas demandas, suas
devem) falar sim, desde que COM necessidades, afinal, o que querem e o
os povos indígenas e não POR eles. que precisam os povos indígenas? Por Therezinha Gauri
Therezinha Gauri Leitão - TherêPotîraGauri
Como indígena, servidora pública e
Quantos abris indígenas ainda serão (nome indígena) - filha de Elza, neta de Alice
educadora tenho trabalhado junto
necessários para compreendermos que e Cecília, bisneta de Gertrudes e Dudu, mãe,
com povos indígenas do sul, do
estamos aqui todos os meses dos anos? avó, ativista, mestre em Fisiopatologia
oeste e do centro-oeste da Bahia, no
Quantos Acampamentos Terra Livre Experimental, licenciada e bacharelada em
sentido de trazer visibilização de
(ATL) ainda serão necessários para que o Ciências Biológicas, todas elas pela
suas culturas, valorização de seus
Estado compreenda que existimos? Universidade de São Paulo. Atualmente
produtos, reconhecimento de suas
professora do IFBA Campus Seabra.
ancestralidades, através de projetos Quantos projetos e textos mais serão
de Pesquisa, Extensão e Ensino. necessários para que possamos

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ENTREVISTA
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De Projetos de um Curumim à Licenciatura


Intercultural Indígena no IFBA
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Um menino Mebêngôkre vestido para uma cerimônia de iniciação usando um colar cerimonial, ou ngâp ,
1984. Aldeia Bakajá, Município de São José Porfírio, Pará, Brasil. Foto de William Fishert..:
https://americanindian.si.edu/exhibitions/infinityofnations/amazon/239438.html#media
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Entrevista do Professor Dr° Edson Kaiapó ao Entrelinhas na Edição de número 4, em Abril de 2022. Os termos entre <> são subtendidos da fala.
Entrelinhas: É um imenso prazer essa Edson Kaiapó: Vou narrar um pouco da Entrelinhas: Sem dúvidas uma
oportunidade de conversar com o minha trajetória até aqui, bem transição brusca para uma criança
professor Edson Kaiapó e desde já rapidamente. De maneira resumida, eu levada dos rios e da floresta.
agradecemos muito a sua disposição. Fale- tive uma infância <como> criança, ali na
nos um pouco de você nesse contexto floresta, entre os grandes rios, densa Edson Kaaiapó: <Era> um internato
acadêmico. floresta, com brincadeiras ali tipicamente cristão, muito rigoroso, muito ortodoxo
e, alí o lema daquele internato era
da região, vinculada à natureza e, eu era
Edson Kaiapó: Meu nome é Edson Kayapó, “educar para a eternidade”, parece até
um menino bem levado, e aos mais ou
sou professor do IFBA de Porto Seguro e um recuo na história de educação dos
sou pertencente ao povo Mebêngôkre, lá da menos 8 anos de idade uns missionários Add a little bit of body text

povos indígenas no séc. XVI realizada


Amazônia. Sou do Estado do Pará, nasci ali da região pediram para meus pais que eu pelos jesuítas, mas não se tratava de uma
na floresta e atualmente sou professor na fosse para um internato, localizado no ordem jesuítica… era uma outra
Licenciatura Intercultural Indígena e município de Altamira no Pará. Eu nunca denominação religiosa.
também em outras licenciaturas, cursos tinha saído do meu estado de origem, da
técnicos integrados na Instituição. Realizo minha terra de origem e para mim foi Entrelinhas: Essa trajetória da floresta
pesquisas vinculadas à temática indígena, uma grande aventura! Uma viagem de para uma escola interna é narrada em
história indígena e educação escolar quase uma semana pelos grandes rios da um livro em 2016. Esse livro recebeu
indígena que é o meu campo de atuação. Amazônia até chegar em Altamira. O muitos prêmios, inclusive o prêmio
Sou Doutor em educação pela PUC de São internato não ficava exatamente dentro Tamoios de literatura da Fundação
Paulo, Mestre em História Social e da cidade, Altamira é um dos maiores Nacional de Literatura Infanto Juvenil,
graduado em história pela UFMG. municípios do Brasil e chegando na e foi premiado pela UNESCO também.
Esse internato que te atravessa tão
cidade fizemos mais uma longa viagem
Entrelinhas: E essa trajetória da floresta violentamente também vai contribuir
pela transamazônica até chegar no
para a formação acadêmica? Como para sua formação acadêmica e
aconteceu? internato. ativismo político. Como é olhar para
essa trajetória?

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Edson Kaiapó: Alí naquele internato sob
Add a subheading Edson Kaiapó: Depois então de uma longa
muita pressão, pressão psicológica e jornada alí na zona da mata mineira, no Sul
castigos físicos muito severos, nós de Minas também em Poços de Caldas,
aprendíamos, com muita rapidez a Varginha, Três Corações, Três Pontas, São
Add a little bit of body text
língua portuguesa escrita e falada. Lourenço, andando por ali como
Aprendíamos os códigos da “dita” missionário eu me retirei para Belo
civilização” ocidental e obviamente Horizonte onde eu pensei que a vida seria
aquele cristianismo impresso por aquela mais tranquila. E em Belo Horizonte eu
doutrina. Então nós éramos educados entrei na UFMG, pra fazer o curso de
<por> muito tempo nas normas cristãs, história, passei no vestibular, naquele
recebíamos muitos cursos de oratória.
Add a little bit of body text
tempo não tinha ainda política de cotas,
Eu particularmente fiz muitos cursos de isso foi em 1990. E na UFMG tive acesso a
oratória, o objetivo era que nós outras leituras Marxistas, anarquistas e de
fossemos excelentes oradores, outras linhas, outras escolas de pensamento
evangelizadores e éramos proibidos de e isso provocou em mim um outro
realizar atividades que nós gostávamos direcionamento. Eu até então abandonei a
Ngâp – colares cerimoniais feitos por muito que as crianças que estudavam ali orientação cristã e segui por um caminho
todas elas eram da floresta e, éramos que inicialmente foi pelo caminho do
mulheres Kayapó com conchas de acostumados então à liberdade dentro ateísmo, do anarquismo, me tornei uma
mexilhão de água doce, miçangas e da floresta. Só que no internato éramos liderança anarquista, uma liderança do
cordão de algodão (kadjât kunrâi) – são proibidos de tomar banho de rios e movimento estudantil na UFMG. Eu tinha
usados ​por adultos e crianças em rituais andar na floresta, subir em árvores… a facilidade da oratória que os cristãos me
como o Bemp, Takâk, Kworokangô e havia essas regras muito rigorosas que ensinaram e me tornei uma liderança bem
eu suspeito que era mesmo uma referencial dentro da UFMG. Fui da
Mebiok. Essas cerimônias são o foco tentativa de nos afastar do que coordenação do DCE, fui presidente do
central da vida social nas comunidades efetivamente nós éramos até ali. Eu diretório acadêmico da faculdade de
Kayapó. Neles, as pessoas recebem escrevi um livro chamado Projetos e Filosofia e Ciências Humanas, participei da
novos nomes, na maioria das vezes de Presepadas de um Curumim na primeira marcha do MST em Brasília e
Amazônia que saiu pela editora Positivo comecei a dialogar com outros
seus avós. As cerimônias ajudam a
e esse livro já recebeu alguns prêmios, movimentos, com o MST alí, bem
estabelecer e confirmar as identidades entre eles o prêmio Tamoios de incipiente e me tornei uma liderança,
Kayapó daqueles que recebem nomes e literatura da Fundação Nacional de andava muito pelo Brasil participando de
celebram o envolvimento de toda a Literatura Infanto Juvenil, além de eventos de movimentos sociais.
comunidade. prêmios pela UNESCO e outros. Nesse
livro eu faço a narrativa, de maneira Entrelinhas: De volta para sua terra e a
pormenorizada. reconexão com seu povo. Aquele
A participação de toda a comunidade afastamento precisava ser resgatado.
nas cerimônias Kayapó é muito Entrelinas: O internato chegou a te Como foi esse reencontro?
importante. Os Kayapó também convencer em ser um evangelizador?
buscam ser belos em seus rituais. O Edson Kaiapó: Quando eu terminei o
Edson Kaiapó: Aí eu então, quando curso de história eu retornei para minha
valor da beleza (mêtch) e seu poder terminei o ensino médio eu tinha o terra de origem lá do Amapá e chegando lá
(prã) são de grande importância para o objetivo de fazer teologia, de ser pastor. no Amapá eu percebi que eu tinha
povo Kayapó. Mas antes disso eu tinha que atuar como desaprendido minha tradição, que escola
missionário e, foi isso exatamente o que serviu para eu desaprender na verdade,
eu fiz. Saí do colégio com uma tanto no internato quanto na própria
—Piydjô Kayapó (Kayapó), detentor do
Add a little bit of body text

credencial de missionário e fui pra universidade… Foi um desaprendizado em


conhecimento, aldeia Kikretum Minas Gerais, pra Juiz de Fora onde relação à ancestralidade. Daí eu senti essa
atuei fazendo o trabalho de “bater nas necessidade de fazer essa viagem de volta
casas”, pregar o evangelho, vender em busca da minha ancestralidade que tava
literatura doutrinária. Foi um tempo adormecida. Tive apoio das lideranças, dos
muito difícil porque as pessoas não têm sábios, dos pajés, das curandeiras e comecei
disposição, obviamente, de comprar a andar muito com essas pessoas do campo
esse tipo de literatura e eu confesso que espiritualidade originária e em pouco
passei muito aperreio. Muita fome até, tempo essa espiritualidade que tava
nesses tempos. adormecida acordou com muita força,
com muita intensidade.
Entrelinhas: Você precisou recalcular a
rota. O ingresso na Universidade abre Entrelinhas: É nesse momento que você
um caminho para o ativismo político. se reconecta com a ancestralidade e entra
Isso parecia ser muito natural em você... de cabeça no ativismo político ambiental
da Amazônia?

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Edson Kaiapó: Eu comecei a fazer e estou por aqui atuando como professor Edson Kaiapó: O curso é vinculado
ativismo na Amazônia, ativismo de História Indígena e Educação diretamente ao MEC, a uma secretaria
ambiental, circulando pelos Intercultural Indígena e outras
Add a subheading
do MEC que é a SIMESP, os recursos
movimentos sociais na floresta. Só que disciplinas do curso e, ao mesmo tempo, financeiros para o funcionamento vêm
alí naquelas regiões as pessoas, as no ativismo do movimento local e diretamente de lá, mas são recursos
lideranças sofrem muita violência do também nacional. Hoje, queira ou não… insuficientes, são recursos que atrasam e
grande capital e isso não tem muita Add a little bit of body text seja ou não do meu consentimento… que nem são enviados de maneira que o
repercussão para fora da Amazônia. acabei sendo empurrado para o meio curso fica muito prejudicado, às vezes
Agora, ultimamente até tem mais, por daquilo que eu posso chamar de fica sem acontecer os módulos de aula.
conta das redes sociais. liderança do movimento nacional. O O curso funciona em regime de
movimento me vê como liderança alternância, pedagogia de alternância
Entrelinhas: As respostas ao ativismo e intelectual orgânica de grande relevância então nós professores vamos para as
os povos da Amazônia sempre foram e eu tenho atuado nesse sentido, de
Add a little bit of body text
aldeias e em outros momentos os
muito violentas... E sua atuação não colocar os meus conhecimentos à estudantes veem para Porto Seguro só
escapa disso. disposição do movimento inclusive por que nós não conseguimos realizar a
dentro da instituição. contento por conta de todas essas
Edson Kaiapó: Ali, por volta de 2005, eu dificuldades de recurso para transporte,
e mais três ativistas da Amazônia fomos Entrelinhas: A essa altura você já é uma combustível, pagamento de diárias para
espancados violentamente pela polícia referência de liderança para os povos motorista e muito menos pagamento de
do Amapá por estarmos envolvidos em indígenas e um Mebêngêkre do diárias para professores, nós nunca
denúncias de empresas mineradoras mundo. Qual o papel do IFBA nessa recebemos diárias da instituição, coisa
que queriam se instalar na floresta. A história? que era devida, mas enfim a gente faz…
repressão foi extremamente violenta. Eu o curso acontece pela boa vontade dos
fui ameaçado de morte e aí, naquele Edson Kaiapó: Então, o IFBA é aqui em professores mas também pelas
tempo, eu resolvi sair do Amapá e fui Porto Seguro eu posso dizer que tenho o lideranças indígenas e comunidades
pra São Paulo. privilégio de dialogar com os saberes indígenas.
indígenas dentro de uma licenciatura
Entrelinhas: Chegando em São Paulo intercultural não sem desafios e Entrelinhas: Além da formação na
mais uma mudança importante na sua dificuldades. Licenciatura o IFBA em Porto Seguro
vida! Essas mudanças te trazem até a também oferece formação continuada.
Bahia. Como foi que aconteceu esse Entrelinhas: Existe uma distância Há diferenças entre o LINTER e a
trajeto na sua história? grande entre o que deveria ser e o que é Formação continuada com ênfase para
efetivamente implementado para a a Educação Indígena?
Edson Kaiapó: Lá em São Paulo eu efetivação da Licenciatura Intercultural
ingressei no mestrado e na sequência no indígena. Há despesas que nunca foram Edson Kaiapó: O mesmo acontece em
doutorado. Meu plano era voltar pro pagas. No entanto o curso acontece. relação à formação continuada. O
Amapá, mas foi quando abriu um Como é essa realidade para professores programa chamado Saberes Indígenas
concurso para História Indígena aqui no e estudantes do LINTER/IFBA? na Escola, vinculado ao MEC que é
Instituto Federal da Bahia, em Porto voltado para formação continuada tem
Seguro. Eu fiz o concurso, fui aprovado funcionado de maneira muito precária
com recursos insuficientes de tal
maneira que a Licenciatura Intercultural
Indígena colabora para dar bem
visibilidade à instituição, mas
infelizmente as dificuldades são
imensas, sabe? De tal forma que às vezes
os alunos têm falado com a gente,
Add a little bit of body text

comigo assim: professor, será que esse


curso tem que continuar realmente no
IFBA? Porque não tá tendo a
responsabilidade que deveria.

Entrelinhas: Qual é o papel do IFBA na


efetivação desses recursos?

Edson Kaiapó: Eu sei bem que não


depende do IFBA exatamente. Em
grande parte, é o pouco esforço do
governo federal para que o curso
aconteça como deveria acontecer, de
acordo com a legislação, especialmente
Encontro Kayapó – foto: Flickr / Houston Museum of Natural Science nesse tempo agora de bolsonarismo, as
A foto em destaque, tirada em abril de 2006, mostra um encontro Kayapó na Aldeia Piaraçú, no portas se fecham mais ainda, mas nós
Xingú. O líder indígena Raoní, de amarelo, fuma cachimbo ao lado de outro índio da mesma etnia. arregaçamos as mangas da camisa para
fazer acontecer.
nasentrelinhas.informativo@gmail.com  | 08
Nós fazemos então o diálogo com as
comunidades e o curso vem acontecendo. Add a subheading

Já formamos uma turma e uma segunda


turma vai concluir agora no segundo
semestre de 2022, tem uma terceira turma
Add a little bit of body text

em andamento e uma quarta turma vai


ingressar por agora pelos próximos meses.

Entrelinhas: O LINTER e a Formação


Continuada Saberes Indígenas na Escola
tem funcionado pelo empenho dos Add a little bit of body text

professores e apoio das lideranças


indígenas. Já podemos sentir os efeitos da
presença desse curso na região e no País?

Edson Kaiapó: Muitos dos egressos do


curso se transformaram em referência
dentro das políticas indígenas e
indigenistas. São secretários,
superintendentes de assuntos indígenas, se
transformaram em coordenadores de Os Mebêngokrê -Kayapó (Acervo Museu Goeldi)
saúde indígena e, essas pessoas vêm
assumindo postos estratégicos dos projetos
societários das comunidades indígenas e Entrelinhas: No governo do presidente colocados e que cabe a nós todos,
isso particularmente me deixa muito Bolsonaro, eleito em 2018, os ataques à professores e professoras, gestores
educação têm acontecido em muitas fazermos todo o esforço para que o
contente porque a gente vê o resultado
frentes. É um governo que se apresenta curso aconteça de maneira mais
efetivo do trabalho que nós temos feito
claramente contra os povos indígenas, tranquila do que vem acontecendo,
com muito esforço. Então os professores mas, temos feito no formato que
da Licenciatura Intercultural Indígena população LGBTQIA+, mulheres,
podemos.
estão de parabéns e a instituição está de negros, artistas.... Tivemos cortes de
parabéns por ter aceitado o desafio de verbas na educação, nas artes e perdas
fazer acontecer esse curso, e aí nós de bolsa para estudantes. Parece um
precisamos então ajustar as dificuldades pouco óbvio que as bolsas da
para fazer esse curso acontecer de maneira Licenciatura Intercultural Indígena
mais tranquila. tenham sofrido cortes acima das demais
licenciaturas. Qual a situação de bolsas
no LINTER?

Edosn Kaiapó: É preciso dizer que a


bolsa permanência que é um bolsa que Por Edson Kaiapó
foi criada a partir de instrumentos Edson Kaiapó pertence ao povo Mebengokré,
jurídicos específicos para estudantes ativista do povo indígena e ambientalista.
indígenas e quilombolas é um valor Doutor pela EHPS/PUC-SP e mestre em História
devido para estudantes, então o governo Add a little bit of body text Social pela mesma instituição. Escritor
Premiado pela UNESCO e pela Fundação
federal já tem algum tempo que não abre
Nacional do Livro Infantil e Juvenil,
edital de novos bolsistas e esse recurso é conferencista e professor de História Indígena e
fundamental para que os alunos Educação Escolar Indígena na Licenciatura
continuem no curso. Essa bolsa tá Intercultura Indígena do Instituto Federal da
suspensa tem bastante tempo e fala-se Bahia.
em abrir novos editais com número
muito reduzido de vagas para novos
bolsistas, sendo que os documentos
dizem que todos os estudantes indígenas
e quilombolas teriam direito a essa bolsa.
Os estudantes do IFBA de Porto Seguro,
os indígenas, estão demandando a
construção de uma moradia estudantil
para facilitar essas articulações de aulas
India Mebêngokrê -Kayapó preparando ritual em Porto Seguro e, enfim são os desafios
(Acervo Museu Goeldi)

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ATÉ LOGO, DONA LYGIA!!!

Por Elenilson Nascimento

"N ão sei onde foi que eu li, a beleza não


está nem na luz da manhã nem na
Em 2012, quando eu escrevia em um
site de cultura no Rio de Janeiro, a Dona
sombra da tarde, está no crepúsculo, Lygia me ligou em casa. Levei um susto:
nesse meio-tom, nessa ambigüidade. "Queria te parabenizar pelo texto de
Estou lhe dando um crepúsculo numa hoje, ri muito!" Ela havia adorado uma
bandeja e você se queixa.” - Lygia crítica que eu escrevera sobre um show
Fagundes Telles, 1923-2022, no conto da Madonna e ligou para o tal site
“Venha ver o pôr do sol”. pedindo meu número. E, caindo da
cadeira, quase enfartei... Todos os
Tem uma outra frase ótima dessa grande aplausos para a autora! 👏👏👏
dama da nossa literatura que eu adoro:
"Literatura também é uma forma de Mas o meu único encontro com a
amor". E o que nos leva a escrever? autora não poderia ter sido mais
Dinheiro, certamente, não é. Aplausos? desajeitado, protocolar e sem graça. Já
Biscoito? Likes? Ilha de Caras? Comer um ano depois, em 2013, na sede da
gente? Só consigo pensar no absoluto ABL, onde eu tinha ido cobrir um
gesto de afeto que é contar uma história prêmio de um autor amigo, subimos
para alguém, mesmo que hoje as pessoas até à célebre sala do chá. Aí me
estejam bem distante desse ato generoso apresentaram a Lygia, que me lançou
de ouvir, ou no caso, ler livros!!! Amor, de aquele seu olhar maternal. Talvez não
fato pela literatura! E pelos livros! fosse tanto pela minha idade, embora
àquela altura eu parecesse o mais jovem
naquele ambiente de biscoitos e chá das
cinco.

Desconfio que ela se compadeceu ao


ver como eu olhava com desconforto
aquele salamaleque todo que quem já
participou de algo da ABL sabe bem
como é. E até hoje eu não sei qual é a
finalidade da ABL e suas solenidades
sem graça. Um lançamento de livro em
um boteco qualquer é mais
interessante. Mas a Lygia não escondeu
o sorriso, e aí eu notei que havia algo
mais ali, uma espécie de ternura
reinando sobre a convenção. E, desde
aquele dia, virei fã daquela mulher antes
mesmo de devorar seus livros.
Na prosa da autora, a sensualidade
“O escritor pode ser louco, mas não feminina e felina programa a criação de
enlouquece o leitor. Ao contrário, pode inúmeros e inesquecíveis personagens,
até desviá-lo da loucura. O escritor pode de que a ficcionista, sempre foi uma
ser corrompido, mas não corrompe. zelosa colecionadora. Eu confesso, nunca
Pode ser solitário e triste e ainda assim fui leitor devotado da Lygia, por
vai alimentar o sonho daquele que está inúmeros motivos, e um dos principais é
na solidão.” - escreveu a autora, sempre a minha incapacidade de ser mais
carinhosa com todos, até com os organizado, mas sempre a admirei como
chatinhos que, vez ou outra, enchem o a escritora talentosa que sempre foi.
saco!

nasentrelinhas.informativo@gmail.com  | 10
Ela escreveu (eu acho) uns quatro
romances e uns vinte livros de contos
e, agora, tá todo mundo citando a
mesma frase (que é genial , por sinal)
dela. Quer dizer né? Fazer post nas
redes para parecer leitor é fácil... Ler
que é bom? Nada!

E, no último dia 03/04, ela se foi, aos


98, quase 100. A dama da literatura
brasileira - recebeu vários prêmios ao
longo da carreira, tais como o Camões
(2005), e o Jabuti (1966, 1974 e 2001) e
tem diversas obras traduzidas para o
alemão, espanhol, francês, inglês,
italiano - encantou-se. 😢 ❤ "Não
cortaremos os pulsos, ao contrário,
costuraremos com linha dupla todas as
feridas abertas". Mas a escrita dessa
autora, mulher inteligentíssima, baiano Marcelino Freire, por ocasião Não cortaremos os pulsos, ao
mudou a minha visão rasa de mundo da morte da Lygia, e me emocionei e contrário, costuraremos com linha
para sempre. Gratidão Dona Lygia, sei chorei bastante. Tem ali uma coisa dupla todas as feridas abertas".
que está junto com Deus e com todos sobre honestidade, proximidade e Sigamos o exemplo dessa autora -
os poetas e escritores mortos agora. sorrisos que diz muito, muito… Aquela companheira de viagens deliciosas -
coisa de amar a literatura, os livros, os que nasceu para ser gigante e para
Lamentamos profundamente a morte amigos; não derrapar no orgulho e na transformar as coisas ao nosso redor.
de uma das mais relevantes e vaidade; ter paciência; aceitar a vida E salve e salve sempre essa gente
singulares vozes da literatura brasileira, como uma ordem, sendo fiel a si inteligente!
desde sua estreia no final dos anos mesmo. Um resumo perfeito dessa
1930. Perda imensa para a literatura grande mulher que soube acreditar
brasileira. Despede-se de nós uma das "nos milagres e nos sonhos". Ave!
vozes mais criativas e misteriosas que já
escreveu neste solo. Mestra absoluta do Triste coincidência: semana passada
conto, Lygia agora toma o seu lugar de assistindo a diversos vídeos da autora,
contista imortal ao lado de Machado, pelo Youtube, a ouvir contar como
Jorge, João Ubaldo, Hilda Hilst e tantos escreveu o seu livro premiado “As
outros. Quando nem o silêncio Meninas” e s sua relação com as
consegue expressar a imensidão da personagens. Ana era sua favorita e Por Elenilson Nascimento
tristeza, em luto a literatura mundial não queria morrer. Agora, a autora Elenilson Nascimento é ex-professor, jornalista
pede passagem. mudou de lugar, mas não nos deixará e autor de "Clandestinos", "Memórias de um
jamais, pois tem gente por quem a Herege Compulsivo", "Poemas Perversos Para
Mas o que também me deixou muito gente pede a Deus que seja eterna. E Cartas de Amor" e outros. @elenilson_escritor
comovido, entre tantos depoimentos, Deus responde que essa gente
inclusive nos posts de leitores nas redes escrevedora já nasce imortal pelo
sociais e na comunidade Literatura legado que deixa pra gente. E foi assim
Clandestina (no Face), foi o artigo da com a Lygia Fagundes Telles. Assim
Folha, assinado pelo também escritor mesmo: no presente.

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DIVERSÃO
Orientações editoriais
1  MISSÃO E LINHA EDITORIAL ou militância; c) vínculo profissional, se houver, com
indicação da instituição; d) e-mail, que será publicado
O Informativo “Nas entrelinhas” é uma publicação de no artigo, como meio de contato;
periodicidade mensal, com apenas quatro meses de
existência, portanto, bastante nova, mas inovadora. O 2.7.3  Textualidade – exige apresentação lógica e
informativo tem divulgado, ao longo de suas edições, sequencial de elementos textuais (introdução,
artigos inéditos, autorais, predominantemente nas desenvolvimento e conclusão).
áreas de Educação, Direito, Política e Sociedade. Tem
o viés crítico à gestão do IFBA mas, sustentado na
2.7.4  Notas de rodapé - não devem ser muito
ética e no respeito; busca a verdade dos fatos a fim de
contribuir para a análise e discussão de temas que são extensas.
de interesse para sociedade, e principalmente para a
comunidade do IFBA. 2.7.5  Citações - nas citações, o autor deve seguir as
normas da ABNT.
2  REQUISITOS PARA A SUBMISSÃO DE
ARTIGOS 2.7.6  Gráficos, tabelas e imagens - se indispensáveis
à clareza do texto, devem ser apresentados no corpo
Uma mão lava a outra 2.1  Publicações - serão aceitos textos autorais, apenas, do texto e também em arquivos separados (um
sindicato e reitoria ainda que anteriormente publicados, parcial ou
integralmente. A submissão será rejeitada nos casos de
arquivo para cada gráfico, tabela ou imagem).

plágio, autoplágio, quando contiver ofensas, Os gráficos devem apresentar: largura máxima de 10
Pérola: SINASEFE-IFBA faz barulho desrespeitos, ou qualquer outro elemento cm; formato vetorial aberto e editável; e legendas
ensurdecedor ao silenciar-se diante desqualificador.
curtas e autoexplicativas. Todo gráfico elaborado pelo
Os textos deverão ser encaminhados até o dia 07 do
das ações da gestão do IFBA . A mudez autor deve trazer incorporados os dados que o
mês de publicação do informativo, obedecendo às
jamais será perdoada! regras de formatação exigidas, para o endereço originaram. As imagens (png) devem apresentar
eletrônico: nasentrelinhas.informativo@gmail.com. largura mínima de 12 cm.
Ingerência ou falta de
3. AVALIAÇÃO DO CONSELHO EDITORIAL
competência 2.2  Áreas - serão aceitos artigos nas áreas de
Educação, Direito, Política, Sociedade e Cultura.
Na avaliação dos trabalhos o Conselho Editorial – a)
Pérola: Foi ingerência ou falta de 2.3  Idioma - os trabalhos deverão estar redigidos em manterá o sigilo quanto aos textos recebidos, até a sua
competência o que causou a português. publicação; b) atuará de forma objetiva, isenta e
interrupção dos contratos de imparcial na avaliação dos artigos; c) remeterá o texto
prestação de serviços? Se 2.4  Titulação - não se exigirá titulação mínima para ao autor para a aprovação das revisões necessárias; d)
autores. só publicará o texto se, após revisado, for aprovado
perguntarem, eu respondo como
o saudoso Joelino: "Num sei!" pelo autor, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas
2.5  Termo de Compromisso - para submeter o após o envio para aprovação.
artigo, o autor deverá assinar o Termo de
A PRPGI parece adivinhar o Compromisso em que declarará a autoria do texto e
concordará com sua publicação, sem ônus, nas versões
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
futuro impressa (quando houver) e on-line do informativo.
Em hipótese alguma o Conselho Editorial aceitará
Ao assinar o Termo de Compromisso, o autor estará textos ou complementações de textos após o dia 07
Pérola: Imaginem que agora prevê ciente de que o seu trabalho será submetido à análise e do mês de publicação do informativo. Caso isso
quando pode ou não, uma matéria revisão do Conselho Editorial e que o mesmo só será ocorra, será analisada a possibilidade de publicação na
ser apreciada pelo CONSUP. Coisas publicado após a sua aprovação, devendo esta se dar edição seguinte, dando conhecimento ao autor.
do outro mundo! em até 48 (quarenta e oito) horas, após o recebimento
do texto revisado. Findo este prazo, não se tendo a
aprovação, o autor será orientado a publicá-lo na
Equipe editorial:
Ainda sobre o sindicato... edição seguinte e, caso não haja manifestação, o texto
será desconsiderado sem comunicado prévio.

Pérola: Todo mundo percebe que a 2.6  Formatação do artigo - os textos deverão ser
omissão do sindicato é para proteger preparados de acordo com as seguintes normas: a)
a reitoria, mas foi ridículo ver o tipo de arquivo: .docx; b) Fonte: Times New Roman; c) LUISA SENNA
presidente do CONSUP defendendo tamanho: 12; espaçamento entre linhas: 1,5; d) página:
formato A4 (210 x 297 mm); e) margens: 2 cm e f) Doutora em Botânica, Docente do
o sindicato publicamente: “aqui não é número de páginas: não superior a 3, incluindo IFBA/Campus Feira de Santana.
o lugar de cobrar o sindicato. ” É um referências (se houver), não podendo o texto
tal de toma lá dá cá... Tá feia a coisa luisasenna@gmail.com
ultrapassar 7.900 caracteres.
viu!
2.7  Estrutura do artigo – o artigo deve conter: a)
Pérola: Alguém pode informar qual título; b) texto; c) minicurrículo do (s) autor (es); f)
seria o lugar correto para se cobrar referências (não necessárias em textos de opinião)
o sindicato? Se na AGE o servidor é
hostilizado, no CONUSP o 2.7.1  Título e subtítulo – o título deve ser claro,
conciso e representativo do assunto tratado. Deve PATRICIA SOUZA
presidente disse que não pode. A
coordenação geral do SINASEFE
conter, no máximo, 15 palavras. Quando houver Especialista em Educação, TAE, IFBA/
subtítulo, o limite para a soma dos dois (título e Reitoria. patysouza2@hotmail.com
ignora os e-mails e ofícios. E agora subtítulo) é de 20 palavras. Não deve incluir
José ?? abreviatura, nem ser acompanhado de nota de rodapé
com agradecimentos. Título e subtítulo devem
Pérola: Enquanto isso... na mais apresentar apenas a primeira palavra com inicial
antiga e uma das maiores seções do maiúscula, exceto nos casos em que o emprego da
SINASEFE continuamos sem saber inicial maiúscula seja obrigatório (por exemplo, nos
onde começa o sindicato e onde nomes próprios).
RAIMUNDO FRAGA
termina a inercia! Greve geral em
2.7.2  Minicurrículo – o autor deve apresentar Técnico em Contabilidade, TAE, IFBA/
defesa dos serviços e servidores currículo com a indicação de: a) titulação, com
públicos Já! indicação da instituição; b) área de atuação, pesquisa Reitoria. raifraga@gmail.com

EXPEDIENTE: Conselho Editorial - Coordenação Geral e Equipe de Edição: Raimundo Fraga, Patrícia Souza e Luísa Senna / Projeto Gráfico: Raimundo Fraga,
Patrícia Souza e Luísa Senna / Diagramação: Patrícia Souza / Revisão: Raimundo Fraga. As matérias não assinadas deste informativo são de responsabilidade
do Conselho Editorial. Quer colaborar? Quer sugerir uma pauta? Quer criticar ou elogiar? fale com a gente: nasentrelinhas.informativo@gmail.com .

nasentrelinhas.informativo@gmail.com  | 12

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