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PROPÓSITO
Proporcionar uma visão descritiva dos fenômenos e comportamentos disfuncionais, tomando
como ponto de partida o entendimento das alterações mentais, e promover a discussão acerca
da diversidade humana, normalidade e patologia são pontos fundamentais para o profissional
psicólogo ter uma visão mais integrada sobre a realidade humana.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
MÓDULO 2
MÓDULO 3
Reconhecer a conceituação de transtornos e doenças mentais, e os sistemas classificatórios
existentes
MÓDULO 4
INTRODUÇÃO
O campo da Psicopatologia pode ser entendido como o conjunto de conhecimentos acerca do
processo de adoecimento mental em seres humanos. Esses fenômenos são marcados pela
especificidade psicológica relativa às vivências dos que adoecem e sua dimensão própria,
genuína, não sendo apenas exagero do que é considerado corriqueiro e funcional. E, também,
são marcados por suas conexões complexas com a Psicologia, no que diz respeito ao mundo
da doença mental como um mundo não totalmente estranho às experiências psicológicas
funcionais. Embora o conceito de saúde inclua as dimensões de bem-estar biológico, psíquico
e social, ainda há uma forte influência enraizada pelo modelo biomédico no estudo da
Psicopatologia. Sendo assim, cabe ao campo de conhecimento da Psicologia considerar, para
além do modelo de observação de comportamentos disfuncionais e desadaptativos, para então
considerar as características sociais presentes na formação da personalidade, tanto funcional
como disfuncional.
MÓDULO 1
O CAMPO DA PSICOPATOLOGIA
Em uma concepção clássica, Campbell (1986, apud Dalgalarrondo, 2000) define a
Psicopatologia como um campo científico que trata a natureza da doença mental incluindo suas
causas, mudanças de estrutura e funções, em conjunto com a forma pela qual a doença se
manifesta.
Dalgalarrondo (2000) apresenta uma definição mais complexa ao defender que nem todo
estudo psicopatológico segue a rigor os ditames de uma ciência stricto sensu, ou seja, de uma
ciência exata como a Matemática e a Física.
Foucault (1975), ao realizar uma historiografia do conceito de loucura, apresenta sua evolução,
desde o Renascimento até a Modernidade, como algo diagnosticável, mas que reflete os
deslocamentos de poder e os mecanismos de controle emergentes das produções discursivas
de cada época, seja no sentido do exílio dos loucos em manicômios, que ocorreu até o
estabelecimento de um Movimento de Reforma Psiquiátrica, por exemplo, até sua
estigmatização, no sentido de associação de comportamentos socialmente indesejáveis à
loucura.
Ainda que possamos reconhecer a função de assistência que as internações tiveram ao longo
do tempo, não podemos negar a triste realidade em que essas medidas foram empregadas em
muitos casos, nos quais os asilos e hospitais psiquiátricos eram locais onde ficavam excluídos,
de modo permanente, diversas pessoas apenas por motivos morais e de controle.
HISTÓRIA DA PSICOPATOLOGIA
Ao olhar para a história da Psiquiatria, pode-se notar que, por muito tempo, as “doenças” da
mente eram vistas como algo que remetia à alma, algo do campo imaterial. Entretanto, no
século XIX, Kraepelin traz a ideia de que existe um órgão por trás do sofrimento psíquico, e
esse órgão seria o cérebro. Além disso, ressaltava que era importante classificar esses
quadros de sofrimento, visto que cada um demonstrava um padrão de sintomas e de evolução
da doença.
Bebendo da fonte de Charcot, Sigmund Freud se dedicou bastante ao estudo da histeria, que
Charcot denominava como doença sine materiae (doença sem matéria).
Freud, então, começou a considerar que haveria uma causa para as doenças da mente, e que
essas deveriam ser causas psicodinâmicas.
Ele trouxe, desse modo, a ideia, já muito difundida atualmente, de que acontecimentos na vida
de uma pessoa, principalmente os que dizem respeito aos estágios iniciais do
desenvolvimento, poderiam alterar o psiquismo dela.
Com isso, surgiu a ideia da clínica em Psicologia, na qual trazer à tona esses acontecimentos
traumáticos passados poderia, de alguma forma, reverter suas consequências indesejadas no
presente. Consequentemente, surgiu, também, a ideia de diagnóstico na clínica psicológica,
sendo que o diagnóstico, dentro da abordagem de Freud, deveria ser feito pelo acesso ao
inconsciente do sujeito, elaborado ao longo da análise, lançando mão do uso da transferência e
da escuta do discurso do analisando.
A Teoria Comportamental, que até então era mais marcada pelo aspecto experimental e pela
utilização em laboratórios, migra também para a clínica, percebendo que a compreensão do
comportamento adquirido segundo o paradigma behaviorista teria muito a acrescentar.
Logo passa a ser nomeada como Teoria Cognitiva Comportamental (e teve como figura de
destaque Aaron Beck), pois deixa de estudar apenas o comportamento para investigar também
os aspectos cognitivos.
Nessa teoria, o pensamento é a base para o trabalho na clínica. Dessa forma, o diagnóstico
para a TCC é a conceituação cognitiva com o reconhecimento dos pensamentos automáticos,
das crenças nucleares e intermediárias.
Por volta dos anos 1960, surge a Abordagem Centrada na Pessoa, de Carl Rogers, seguida
de outras terapias humanistas, com uma forte rejeição ao modelo diagnóstico médico e
psicométrico. Segundo essa teoria, o adoecimento psíquico é entendido como um bloqueio na
tendência atualizante. Além disso, surge a ideia de que ninguém poderia saber mais sobre o
cliente do que ele mesmo. Desse modo, a terapêutica deveria direcionar o paciente para
redescobrir a ele mesmo, e dessa forma ele evoluiria bem. Em outras palavras, aqui o
diagnóstico era considerado algo que rotulava as pessoas.
Ainda dentro do movimento humanista, surge a Gestalt-terapia, de Fritz Perls, também com
essa ideia de rejeição ao modelo diagnóstico médico. Para a Gestalt-terapia, o adoecimento
psíquico ocorreria quando a capacidade de ajustamento criativo da pessoa fosse interrompida.
Dessa forma, o diagnóstico veio voltado para o reconhecimento de padrões de evitação de
contato. Logo, a ideia era não diagnosticar pessoas, mas diagnosticar padrões em que essas
pessoas estão “presas”. Sendo assim, o processo de diagnóstico não é fechado, e se dá
simultaneamente ao processo terapêutico, pois uma mesma pessoa pode apresentar
determinado padrão de evitação de contato, e na outra sessão ela já pode manifestar outros
padrões, por exemplo.
Na atualidade, todos esses enfoques teóricos são considerados e, geralmente, não se exclui o
diagnóstico sindrômico e nosológico, assim como tampouco o diagnóstico psicodinâmico. Ao
contrário, é possível eles caminharem juntos. Veja o resumo das três!
NOSOLÓGICO
ABORDAGEM SINDRÔMICA
Apresenta uma visão descritiva dos sintomas e tem uma clínica pautada na eliminação dos
sintomas.
ABORDAGEM NOSOLÓGICA
Busca compreender a doença pela observação e caracterização nosográfica do quadro,
visando à intervenção mais investigativa e supostamente mais profunda.
DIAGNÓSTICO PSICODINÂMICO
Preocupa-se em compreender a origem e a dinâmica do transtorno.
CORRENTES DE ESTUDO DA
PSICOPATOLOGIA
O campo multidimensional da Psicopatologia tem influência e contribuições de diversas
correntes teóricas da Psicologia, Psiquiatria e Filosofia. Veja os detalhes, a seguir!
PSICOPATOLOGIA DESCRITIVA
Dedica-se, basicamente, ao estudo das alterações psíquicas e da estrutura dos sintomas.
Portanto, busca conhecer a experiência geral e típica. Para Jaspers (1987), nesse campo, as
formas importam mais para os estudiosos. Já os conteúdos resultantes de funções psíquicas
disfuncionais têm caráter individual, sendo esses conteúdos considerados acidentais.
PSICOPATOLOGIA DINÂMICA
Tem como objeto de investigação científica o conteúdo da vivência patológica e normal, nos
movimentos internos dos afetos, desejos, temores do indivíduo, ou seja, em sua experiência
individual. Bleuler, no final do século XIX (apud DALGALARRONDO, 2008), ao estudar tais
fenômenos, destacou que quando nos defrontamos com pessoas psiquicamente enfermas
(termo usado na época), podemos optar por nos concentrar nos sinais e sintomas ou podemos
optar pela escuta qualificada do sujeito, para tentar compreender uma pessoa humana em sua
singularidade, suas aflições, seus temores, seus desejos e suas expectativas pessoais.
BLEULER
Paul Eugen Bleuler (1857-1939), psiquiatra suíço conhecido pelas suas contribuições para o
entendimento da esquizofrenia.
PSICOPATOLOGIA MÉDICA
Domina a perspectiva médico-naturalista, na qual a noção de homem é centrada no ser
biológico e o adoecimento é visto como desregulação do cérebro (DALGALARRONDO, 2008).
PSICOPATOLOGIA EXISTENCIAL
O sujeito que adoece é entendido como uma existência singular, como um ser lançado a um
mundo que é apenas natural e biológico na sua dimensão elementar, mas fundamentalmente
histórico e humano (DALGALARRONDO, 2008).
PERSPECTIVA COGNITIVA
Traz um homem visto como conjunto de comportamentos, que podem ser observados e
condicionados por estímulos específicos e gerais, e entende que o sintoma resulta de
comportamentos e representações disfuncionais.
POSTURA PSICODINÂMICA
Entende-se o homem como ser determinado e dominado por pulsões, desejos, e conflitos
inconscientes; e os sinais e sintomas observados são considerados como forma de expressão
de conflitos inconscientes recalcados, desejos que não podem ser realizados, temores aos
quais o indivíduo não tem acesso.
Por último, mas não menos importante, na formação do campo que estamos estudando
coexiste a ideia dimensional do sintoma, que entende as doenças como compostas por
dimensões (espectros), que incluem diferentes graus de comprometimento e de alteração de
funções psicológicas, noção presente no DSM-V com a dimensão categorial, a qual
compreende “entidades nosológicas completamente individualizadas, com contornos e
fronteiras bem-demarcados” (DALGALARRONDO, 2008, p. 37).
AS PRINCIPAIS CORRENTES EM
PSICOPATOLOGIA
O especialista Diogo Bonioli reflete sobre as diferenças entre a Psicopatologia descritiva,
dinâmica, médica, existencial, e as influências das abordagens teóricas na compreensão dos
sintomas e dos transtornos.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 2
Para podermos gerar uma base epistemológica sólida e clássica sobre essa reflexão em
relação à definição de normal e patológico, usaremos o pensamento de Georges Canguilhem
(1904-1995) importante filósofo e médico francês, autor de importantes obras em diferentes
áreas.
[...] O ESTADO PATOLÓGICO EM ABSOLUTO NÃO
DIFERE RADICALMENTE DO ESTADO FISIOLÓGICO,
EM RELAÇÃO AO QUAL ELE SÓ PODERIA
CONSTITUIR, SOB UM ASPECTO QUALQUER, UM
SIMPLES PROLONGAMENTO MAIS OU MENOS
EXTENSO DOS LIMITES DE VARIAÇÕES, QUER
SUPERIORES QUER INFERIORES [...] SEM JAMAIS
PRODUZIR FENÔMENOS REALMENTE NOVOS [...].
Em outras palavras, para esse autor, o que é dito normal é aquilo que acontece e é observado
no âmbito da vida cotidiana e, precisamente, a patologia nos permite entender melhor o que
seria saúde.
A partir desse tipo de conceituação, é necessário sempre ter em mente que a definição de
normal vem a partir de um valor, e não de um fato (CANGUILHEM, 1982, p. 95-97).
No que por muitos é entendida como o antônimo desse conceito está a ideia de anormalidade.
Ela é definida pelo mesmo autor não como um dado objetivo ou um conceito, nem mesmo
como medidas estatisticamente aferidas, mas a partir da implicação que esse desvio tem, ou
seja, em função do julgamento ou o valor positivo ou negativo que se atribui, relativo à sua
funcionalidade no processo de preservação e reprodução. Desse modo, Canguilhem (1982)
comprova que uma mesma variação objetiva pode ser sinal de normalidade ou de patologia,
dependendo do contexto em que se apresenta.
Essa citação tão importante para o campo da saúde significa que, para fins de definição da
saúde ou da doença, indivíduo e meio não podem, de maneira alguma, ser considerados de
forma única e isolada. A normalidade ou a patologia, ao contrário do que o senso comum
aponta, não são dois polos ou conceito opostos, mas duas faces de uma mesma moeda, a
moeda que na Psicologia entendemos como sujeito ou ser humano.
Canguilhem contesta os autores que se opõem à compreensão da patologia como uma
variação de grau de um estado considerado sadio.
O autor defende a tese de que uma patologia, ao ser semanticamente classificada, deve:
Usar os prefixos hipo ou hiper.
Assim, considerando a relação entre o sujeito e seu meio e a visão de doença como uma
variação, para esse autor, uma patologia pode ser a expressão da presença ou ausência de
uma determinada característica, que passa a ser vital para a adaptação a um determinado
contexto. É precisamente nas condições patológicas que a Medicina pode se deparar com
importantes descobertas sobre saúde.
A vida em si implica um processo criativo que demanda resolver a solução para o problema de
adaptação, que envolve mais do que apenas aspectos físicos relativos ao funcionamento de
um órgão, tecido ou estrutura.
É nesse contexto que Canguilhem nos oferece uma reflexão incrivelmente importante:
Esse pensamento, que pode parecer complicado no começo, aponta para aspectos muito
importantes. Em primeiro lugar, nos permite refletir em relação à necessidade de procurarmos
construir as ciências do cuidado em saúde livre de preconceitos. Vale lembrar que o que pode
ser saúde em um determinado momento ou contexto pode ser entendido como doença em
outras condições.
Quando o autor aponta a ausência de qualquer norma, isso nos permite refletir sobre a
necessidade de, como psicólogos, consideremos a Psicopatologia como possibilidade de
entendermos a experiência de sofrimento como centro do processo terapêutico e de nossa
atuação. Esse conceito dialoga com a perspectiva e a crítica fenomenológica apresentadas
anteriormente. Precisamos entender que focar apenas a dimensão chamada patológica e seus
sinais pode sacrificar o sujeito que ali existe. Assim, independentemente de comportamento
disfuncional, não se pode priorizar uma objetividade que não faz sentido, se não traz a
promoção de bem-estar para quem se encontra em sofrimento psíquico. E mais ainda, não
podemos apenas categorizar o sujeito sem compreender a sua condição em relação à sua
totalidade.
Também é importante retomarmos o conceito de normatividade vital para o estudo da
Psicopatologia. Mas o que isso quer dizer? O que seria essa normatividade vital?
Esse autor, central em nossa discussão, conceitua como aquela norma superior de sanidade,
ou seja:
Um sujeito normal é aquele que está dentro das determinações sociais e constrói meios de
superar os obstáculos que se oponham a seu funcionamento.
Logo, ele é capaz de criar padrões para si, sempre que necessário. Já um órgão/organismo é
considerado patológico por não poder exibir essa plasticidade.
O objetivo do autor é, exatamente, conciliar uma visão materialista do mundo sem deslizar para
um fisicalismo reducionista, que não seria capaz de contemplar a singularidade dos fenômenos
vitais frente aos demais fenômenos do universo.
2
O pensamento desse autor nos permite ter uma visão integrada do processo saúde doença
como processo, promovendo a valorização da diversidade e o respeito à singularidade.
IMPLICAÇÕES DO PENSAMENTO DE
CANGUILHEM
O especialista Diogo Bonioli reflete sobre o pensamento de Canguilhem e os conceitos de
normatividade vital na Psicopatologia e suas implicações.
VEM QUE EU TE EXPLICO!
Normatividade e anormalidade segundo Canguilhem – Norma, normalidade e anormalidade
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 3
SEMIOLOGIA PSICOPATOLÓGICA
Na Psicopatologia, Psiquiatria e em outras áreas da saúde, são empregados termos como
sinais e sintomas para referência aos aspectos observáveis do comportamento de sujeitos em
uma sociedade que determinarão classificações como funcional ou disfuncional. Dessa
maneira, é importante ressaltar que a Psicopatologia parte de um sintoma, seja para definir a
esfera existencial, seja para classificar comportamentos.
SEMIOLOGIA MÉDICA
É o estudo dos sintomas e sinais das doenças, permitindo “identificar alterações físicas e
mentais, ordenar os fenômenos observados, formular diagnósticos, e empreender terapêuticas”
(DALGALARRONDO, 2008, p. 23).
SEMIOLOGIA PSICOPATOLÓGICA
Kaplan e Sadock (2007, p. 306) destacam que “os sinais são observações e descobertas
objetivas, como os afetos constritos ou retardos psicomotores do paciente. Os sintomas são as
experiências descritas por este, expressadas muitas vezes como suas principais queixas, como
humor depressivo ou falta de energia”. Assim, enquanto o sinal é o comportamento observável
e classificável, o sintoma se liga à experiência vivida e sentida pelo paciente.
A partir dessa visão, é possível entender que a semiologia psicopatológica determina grupos
de sinais e sintomas representando síndromes para, dessa forma, estabelecer categorias ou
definições identificáveis, que se apresentam mais ambíguas do que uma doença ou um
transtorno determinado (KAPLAN; SADOCK, 2007).
DOENÇA
Para entendermos melhor uso da terminologia, precisamos esclarecer a inadequação do uso
do termo doença na nosologia psicopatológica. No passado, você já deve ter escutado falar
sobre doenças mentais. No entanto, essa identificação foi descartada por vários motivos. Por
um lado, o termo doença se refere ao prejuízo das funções de um órgão ou do organismo
como um todo, resultando na evidência de sintomas e sinais característicos.
Existem vários critérios que determinam que uma condição seja considerada doença:
TRANSTORNO
No caso dos transtornos, entendemos que eles se apresentam com uma alteração na saúde,
nem sempre associada a uma doença propriamente dita. As diversas categorias nosológicas
em Psicopatologia se comportam como transtornos porque não cumprem os critérios
supracitados de doença: não apresentam uma etiologia determinada; e ainda contando com
sinais e sintomas identificáveis, eles são mais variados do que no caso de uma doença, assim
como a diversidade das consequências que podem acarretar.
Dessa maneira, o termo transtorno passa a ser o usado no caso de alterações no psiquismo,
inclusive porque a palavra doença, nesse meio, acarretou historicamente um estigma social,
que buscamos eliminar em Psicopatologia.
SÍNDROME
A delimitação do conceito síndrome se liga ao fato de que não são identificáveis etiologias
específicas de uma natureza essencial do processo psicopatológico (pode existir mais de uma
causa, em alguns casos). Uma síndrome representa um conjunto de sinais e sintomas que,
sem causa específica, resultam em vários processos patológicos, com manifestações clínicas
de uma ou mais doenças e/ou transtornos.
Como exemplo, temos a síndrome de Burnout, a síndrome do pânico, a síndrome de Down,
entre outras. Nelas, não se fala de uma etiologia determinada, mas é possível observar uma
série de moléstias e problemas de ordem psíquica e física no sujeito que padece. Por exemplo,
na síndrome de Burnout existem alterações no sono, falta de concentração, alterações no
sistema imune e outras condições diversas.
DISTÚRBIO
Diferentemente da síndrome, não necessariamente aponta para um diagnóstico fechado, e
apresenta anormalidades funcionais de um órgão ou de um sistema, como, por exemplo, os
distúrbios alimentares que envolvem diversas causas.
Para a construção das características semiológicas (conjuntos de sinais e sintomas que
caracterizam uma síndrome ou transtorno) são considerados os seguintes fatores:
etiologia;
curso temporal;
desfechos típicos;
Fenômeno Descrição
Fenômenos
Fenômenos que são próprios para certas doenças e estados
qualitativamente
mentais.
novos
Quadro de Ordenação dos Fenômenos Psicopatológicos
O problema reside no fato de que há muitos traços semelhantes entre fenômenos normais e
patológicos, ao mesmo tempo em que há uma variedade de definições que se aplicam a
ambos. Apenas os fenômenos qualitativamente novos nos permitem identificar melhor
transtornos específicos, como no caso de delírios, alucinações, entre outros. Entretanto, na
Psicopatologia não contamos com sinais chamados de patognomônicos, quer dizer, sinais que
são considerados como diacríticos ou que nos permitem identificar uma doença de forma
característica.
EXEMPLO
No diagnóstico de doença de Chagas, temos o sinal de Romaña e que se caracteriza por
oftalmia unilateral. Isso quer dizer que, na presença desse marcador ou indicador (sinal), a
doença é diagnosticada sem sombra de dúvidas.
Ainda sem esses sinais, na Psicopatologia, a classificação é importante uma vez que é por
meio dela que determinamos se um dado transtorno mental é válido e se a categoria
representa de forma eficiente e uniforme as ocorrências do transtorno, para apoiar as
inferências sobre o tratamento. Além disso, é pelos sistemas classificatórios que acessamos a
história causal do transtorno e podemos julgar quão informativa é a categoria classificatória.
Como já explicamos, devemos nos lembrar de que na Psicopatologia existe um debate entre as
definições do que é considerado normal e o que é considerado patológico, mas isso não
descarta o fato de pressupor que algumas alterações comportamentais ou cognitivas são parte
de um transtorno e não de outro. Nesse contexto, vale ressaltar:
Além disso, sistemas de classificação pouco confiáveis estão sujeitos a vieses por parte dos
clínicos, assim, é obrigatório que um sistema de classificação passe por um processo de
validade (BARLOW; DURAND, 2016, p. 84).
Barlow e Durand (2016) entendem a validade desses sistemas como valor de construto, nos
quais sinais e sintomas escolhidos como critério para a categoria estão consistentemente
associados, e o que identificam difere de outras categorias. Nesse contexto, há o valor
preditivo/de critério, que se liga à capacidade de prever o curso e o desfecho em um paciente
prototípico e o valor de conteúdo, atrelado a critérios diagnósticos que devem refletir a maneira
como a maioria dos especialistas do campo veem a categoria.
Nos estudos sobre validade, também se destacam sua conceituação como um construto
diagnóstico válido apenas se sua estrutura interna corresponde a como os sintomas são
estruturados na população, o que mais uma vez remete à lógica dialógica dos conceitos de
normalidade e patologia (ZACHAR; JABLENSKY, 2015).
Mesmo os modelos que afirmam se opor ao modelo biomédico têm essa característica. Assim,
modelos mais contemporâneos buscam interpretar as alterações do comportamento como
resultantes de múltiplas influências – perspectiva sistêmica – isso “implica que qualquer
influência particular contribuindo para a Psicopatologia não pode ser considerada fora do
contexto [que], nesse caso, refere-se à biologia e ao comportamento do indivíduo, bem como
ao ambiente cognitivo, emocional, social e cultural” (BARLOW; DURAND, 2016, p. 29).
Fatores psicológicos e sociais influenciam fortemente esses circuitos; mais uma vez é possível
remeter à questão da interrelação biopsicossocial se provando como estritamente importante
para o estudo da psicopatologia.
Estudos como o de Tseng (2007) apontam de um ponto de vista conceitual que existem seis
modos diferentes com os quais a cultura pode contribuir para os transtornos mentais:
EFEITOS PATOGÊNICOS
Ligam-se a situações nas quais a cultura é um fator de efeito direto na formação da doença.
Isso se dá quando a síndrome que ocorre tende a ser relacionada à vivência cultural.
EFEITOS SELETIVOS
Dizem respeito à tendência de algumas pessoas, diante de acontecimentos vitais, de
selecionar certos padrões de reação determinados pela cultura que resultam na manifestação
de certos transtornos.
EFEITOS PLÁSTICOS
Estudam como a organização social contribui para a modelagem das manifestações da
patologia (p. ex., conteúdo de sintomas).
EFEITOS ELABORADORES
São as reações exageradas em algumas culturas, por meio do reforçamento cultural (p. ex.,
suicídio honroso em algumas culturas orientais).
EFEITOS FACILITADORES
Incidências de transtornos por meio de costumes (p. ex., transtornos alimentares nas
sociedades ocidentais pós-industriais).
EFEITOS REATIVOS
Entendimento dos membros de uma cultura acerca de uma síndrome e/ou transtorno.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 4
O contexto no qual a entrevista acontece pode ser diverso: uma paciente que procura um
serviço de psicologia voluntariamente; ou para ele é encaminhado; a ida a um hospital geral;
uma visita domiciliar do Núcleo de Apoio à Saúde da Família etc.
RAPPORT
Este termo deriva do francês rapporter, que significa trazer de volta. Refere-se à oportunidade
de criar uma sintonia e empatia com outra pessoa. O rapport pode incluir elementos como,
atenção mútua, positividade e coordenação, muito utilizado nas relações pessoais e
profissionais.
Para que o rapport e o vínculo terapêutico sejam bem estabelecidos, é importante que a
entrevista aconteça em um ambiente seguro, agradável e no qual a obrigação de sigilo possa
ser mantida.
Caso necessário, familiares podem ser entrevistados também. Isso acontece, frequentemente,
no caso de crianças e adolescentes, pois só é possível prosseguir com qualquer processo
diagnóstico e terapêutico nessa população, caso haja autorização de pelo ao menos um dos
responsáveis.
ATENÇÃO
Fique atento a dois importantes requisitos para que um bom exame psíquico ocorra: o treino e
o estudo. É preciso se preparar antes de cada atendimento, treinar a capacidade de
observação da linguagem falada e corporal do paciente.
Não formular as perguntas de maneira monótona ou mecânica. O diálogo deve ser tão
informal quanto possível.
Evitar perguntas muito sugestivas, fechadas, que podem ser respondidas com um
simples sim ou não. É melhor perguntar: Como você está se sentindo? Você está
ansioso?
Não aceitar jargões fornecidos pelos pacientes, como nervoso, deprimido, tenho pânico:
pedir que ele explique o que quer dizer com essas palavras.
Geralmente, segue-se um roteiro preestabelecido, do qual o estudante ou profissional deve se
lembrar.
No entanto, o uso desse roteiro não deve afetar a espontaneidade e a naturalidade do
processo de condução de uma entrevista clínica.
A seguir, serão destacados alguns itens de extrema importância para o exame psíquico em
Psicopatologia.
Os itens essenciais para um bom exame psíquico para identificação de sinais e sintomas que
caracterizam síndromes e transtornos são:
Identificação;
queixa principal;
motivo do atendimento;
história fisiológica;
história pessoal;
história social;
história familiar.
Além da anamnese, incluem-se na avaliação do paciente, um completo exame psíquico e a
conduta terapêutica.
Para fins didáticos, no quadro a seguir estão listados os itens e suas definições:
Item Conceituação
Queixa É o foco na história da doença atual, deve ser redigida nas palavras
principal do paciente.
História da Relato sobre a época do início dos sintomas até o presente momento.
doença Fornecida pelo paciente ou informantes, em caso de menores de
atual idade ou pacientes psicóticos em episódios de surto.
História Esse tópico pode ser fundido com a história pregressa e elementos da
pessoal identificação. É importante pesquisar acerca de infância,
adolescência; sexualidade; vida laboral; personalidade em momentos
anteriores ao da queixa atual.
Quadro dos Itens essenciais na anamnese e exame psíquico
Dessa maneira, esse processo deve ser considerado como fluido e altamente mutável. Daí a
noção utilizada pela Psicologia não de diagnóstico, mas de hipótese diagnóstica.
O examinador deve estar atento à interseção entre as funções psíquicas e suas alterações,
avaliando-as de forma simultânea e observando a presença de alterações qualitativas e
quantitativas.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste conteúdo, estudamos a história e as principais correntes da Psicopatologia, entendendo
suas origens, principais contribuições, bem como seu caráter multidimensional e observacional.
Também nos aprofundamos na discussão entre normal e patológico, discutindo como a
sociedade influencia os conceitos de normalidade e disfuncionalidade. Dessa maneira,
procuramos nos distanciar da visão cartesiana do conceito de saúde como total ausência de
doença. Também foi possível notar a interdependência do estudo da dimensão
multidimensional da Psicopatologia para compreensão de tais conceitos e discussão.
Por fim, fizemos uma importante transição entre teoria e prática, ao nos dedicarmos ao estudo
do exame psíquico, com características e requisitos para sua realização. Entendemos a
diferença entre entrevista, anamnese e como essas técnicas compõem a totalidade de
questões relativas ao exame mental.
PODCAST
Neste podcast, o especialista Diogo Bonioli destaca a importância do uso de terminologia e
sistemas classificatórios adequados, assim como a relevância do exame psíquico para o
desempenho responsável e ético do psicólogo em saúde mental na identificação dos
transtornos mentais.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
BARLOW, D. H; DURAND, V. M. Psicopatologia: Uma abordagem integrada. 7. ed. São
Paulo: Cengage Learning Nacional, 2016.
BEZERRA JR., B. O normal e patológico: uma discussão atual. In: SOUZA A. N.; PITANGUY,
J. (org.). Saúde, corpo e Sociedade. Rio de Janeiro. Editora UFRJ, 2006.
TSENG, W.-S. Culture and psychopathology: A general view. In: BHUGRA, D.; BHUI, K.
Textbook of Cultural Psychiatry. Cambridge: Cambridge University Press, 2007, p. 95-112.
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