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Souza (2006) aponta que, com isto, a Linguística Histórica teve de sistematizar
processos de mudança linguística como a assimilação (progressiva e regressiva), a
dissimilação, as deleções (síncope, apócope, aferese), a epêntese ou inserção (prótese,
excrescência, paragoge), alongamento, rotacismo, entre outras leis fonéticas. De acordo
com Souza (2006), para que chegasse a resultados mais consistentes, a Linguística
Histórica desenvolveu a abordagem histórico-comparada, que acrescentou a dimensão
documental: a combinação da reconstrução linguística com a busca de registros
passados.
Desta forma, Souza (2006) afirma que o fenômeno da mudança linguística pode
ser considerado fruto da mistura entre línguas, ao adotar-se uma perspectiva histórico-
evolutiva, pois nesta perspectiva teórica, as línguas são mistas, resultado dos inúmeros
contatos linguísticos, ou seja, de interferências externas à língua, apesar de haver
inicialmente, proposições opostas, como a de M. Muller, por exemplo.
Segundo a autora, “a língua não escolhe estar ou não no tempo” (p. 20), por isso
é preciso trabalhar nas duas direções, já que a sincronia se interessa por cada etapa da
língua e a diacronia, pelo processo que leva de uma etapa a outra ao longo do tempo. Na
língua, cada termo tem seu valor por oposição a outros termos, o sistema varia e
depende também das regras que o compõem e as mudanças inferem apenas sobre
elementos isolados.
No entanto, segundo Souza (2006), todos estes estudos contribuem para elucidar
a relação entre ambiente linguístico e gramática universal no processo de surgimento da
gramática internalizada dos falantes, principalmente os do gerativismo, que aproxima-se
da linha socio-variacionista, desenvolvendo estudos estatísticos e populacionais, mas
para quem o fenômeno da mudança linguística é concebido como um fenômeno de
aquisição da linguagem.
Deste modo, Souza (2006) afirma que a mudança é vista pelo funcionalismo a
partir de seus resultados através do tempo e pelo gerativismo, como um processo. A
perspectiva histórica, relativa à passagem do tempo, foi se desenvolvendo pouco a
pouco. No recorte saussureano, a diacronia pertence à esfera da fala (parole) e não da
língua (langue) (p. 23), já no recorte chomskiano, a diacronia pertence à língua e não à
gramática. Apesar das diferenças, ambas as abordagens abordam o ponto de vista socio-
histórico. Por outro lado, o socio-variacionismo constrói um objeto de língua
heterogêneo, como objeto central.
Diante deste quadro, Souza (2006) aponta que a Linguística Histórica se fez por
diversos caminhos teóricos, porém, para a autora, nem todo estudo dito histórico é de
fato, histórico, pois a abordagem dos fatos linguísticos em uma escala cronológica não
constitui por si só característica de um estudo histórico.
Souza (2006) afirma que esse processo de mudança, fruto do contato entre
línguas distintas e dessemelhantes é chamado por Duarte Nunes de desencaminhamento
das regras. E à medida que uma língua se sobrepõe à outra, caminhando lado a lado da
história das civilizações, novas transformações vão ocorrendo, sob diferentes
circunstâncias, distanciando as línguas da sua concepção original, até que não seja
possível reconhecer com naturalidade de onde vem cada particularidade da língua.
De acordo com Souza (2006), mesmo o Latim Vulgar já havia passado por
transformações, diferenciando-se nos vernáculos medievais e depois se re-latinizando.
Souza (2006) cita Otto Jespersen, para quem os fenômenos de divisão e fragmentação
das línguas não ocorrem apenas da unidade para a variedade, mas também o contrário.
A exemplo disto, depois de 1500, quando toda a Península Ibérica se torna cristã,
também passa a se encontrar culturalmente inserida em um movimento de re-
romanização.
Entretanto, segundo Souza (2006), não foi somente o latim que contribuiu para a
formação dessas línguas, mas também o árabe e o germânico, já que os povos
vinculados a estas línguas também habitaram essas regiões e exerceram influência
política e social nestes espaços. Conforme Souza (2006), na disputa de narrativas
históricas sobre a identidade linguística, o romanismo cristão se sobressai, no entanto,
as outras línguas não deixam de influenciar por este fato, pois também motivaram
efeitos linguísticos de alguma expressão nas línguas que se formaram.
Assim, Souza (2006) alerta mais uma vez para o sentido histórico da história que
se fez contar, da narrativa que vence a disputa e observa que raramente foram
formuladas perguntas diferentes sobre outras marcas linguísticas além dos estudos
latinizantes. Do árabe, por exemplo, destaca-se poucas influências lexicais da toponímia
e vocabulário tecnológico, por exemplo e menospreza-se as possíveis semelhanças
fonéticas existentes tanto no espanhol quanto no português, tomando ainda por senso
comum que não há grandes consequências estruturais na influência do árabe nessas
línguas. Souza (2006) sinaliza que alguns poucos contestaram a origem latina da língua
portuguesa, mas não conquistaram grande repercussão na “linhagem científica” da
Linguística Histórica.
Souza (2006) reforça o pensamento de que não podemos trabalhar com os fatos,
mas com os registros que se têm deles, que são apenas fragmentos dos acontecimentos,
destacando que o único argumento disponível é documental e atribui também os
resultados de nossos estudos ao lugar teórico vinculado ao contato linguístico, à
concepção de língua e de temporalidade nas diferentes abordagens históricas da
Linguística, percebendo que o que julgamos útil examinar também é resultante de um
momento histórico. Logo, para além do que não foi digno de registro ou de preservação,
há o que consideramos digno de ser estudado. Outro dado importante é o falar das
camadas mais populares das sociedades, que, normalmente, são os que mais impactam
nas mudanças linguísticas.
Para Souza (2006), isto não faz sentido, pois se a linguagem for reduzida à
gramática, as gêneses dos processos estruturais não devem ser buscadas nos rastros
deixados por essas estruturas. Segundo Souza (2006), as observações feitas pelo
gerativismo, como os deslocamentos populacionais e as inúmeras situações de contato
que resultam em mudanças catastróficas na língua, ou mesmo implicações menores
oriundas do contato dialetal, quando vistas como experiência linguística, são ingerências
externas que implicam em mudança nas línguas. Esta discussão, segundo Souza (2006)
retorna ao problema sobre a mudança ser motivada interna ou externamente.