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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE DIREITO

ABEL PEDRO NOVE

ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA LAICIDADE FACE AS


MANIFESTAÇÕES RELIGIOSAS NO ORDENAMENTO
JURÍDICO MOÇAMBICANO

NAMPULA
2022
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE
FACULDADE DE DIREITO

ABEL PEDRO NOVE

ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA LAICIDADE FACE AS


MANIFESTAÇÕES RELIGIOSAS NO ORDENAMENTO
JURÍDICO MOÇAMBICANO

Trabalho de caracter avaliativo, para obtenção de grau de


licenciatura, no curso de Direito na Universidade Católica de
Moçambique na Faculdade de Direito. A ser submetido ao
Conselho Cientifico da mesma Faculdade.

Supervisor: Dr. Farci Aníbal

NAMPULA
2022
II
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE
FACULDADE DE DIREITO

“A ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA LAICIDADE FACE AS MANIFESTAÇÕES


RELIGIOSAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO MOÇAMBICANO”

Abel Pedro Nove

Aprovado em: ___/____/____

Resultado:_______________________________________

Membro do Júri

Presidente:

________________________________________________

Supervisor:

________________________________________________

Examinador:

________________________________________________

Estudante:

________________________________________________

Nampula

2022

III
DECLARAÇÃO DE HONRA
Eu Abel Pedro Nove, declaro por minha honra que esta Monografia, é resultado da
minha pesquisa e das orientações do meu supervisor, sendo que o seu conteúdo é original e todas
as fontes consultadas estão devidamente citadas no texto, e no final nas referências bibliográficas.
E declaro ainda, que o mesmo nunca foi apresentado em nenhuma outra instituição para
obtenção de qualquer grau académico.

Nampula, Junho de 2022

O Declarante

____________________________________________

Abel Pedro Nove

III
Agradecimentos

IV
Dedicatória

V
Epígrafe

“Qualquer pessoa que não esteja a


cometer erros, é porque não está
tentando o suficiente” Pearl Harbor

VI
Lista de Abreviaturas

 Al. - Alínea

 Art.º. – Artigo;

 Pág. – Páginas;

 DC – Decreto-lei;

 CRM – Constituição da República de Moçambique

 Nº - Número;

 DL – Decreto-Lei;

 Cfr – Confira;

 Ss – Seguintes;

 Lda – Limitada;

 Vol. – Volume;

VII
RESUMO
Como forma de compreender o nosso trabalho, constata-se que prende-se na ideia análise do princípio da laicidade
face as manifestações religiosas no ordenamento jurídico moçambicano. O tema em si se enquadra na área de
Direito Constitucional. suportou-se no método hermenêutico e tipo de pesquisa exploratória, tendo atenção que
prescindível faz a interpretação de alguns artigos mencionados no discorrer do trabalho e na pesquisa do tipo
bibliográfica. O debate da laicidade face as manifestações religiosa, tem uma discussão sob uma perspectiva
constitucional e doutrinaria envolve dois conceitos fundamentais: a liberdade de religião e a laicidade do Estado. A
liberdade de religião está garantida na Constituição da República de moçambique como um direito fundamental, no
artigo 54º. A proteção da liberdade de religião engloba a liberdade de crença, de culto e de organização religiosa.
Somente com a consagração destas três vertentes o direito à liberdade religiosa estará plenamente garantido. As
garantias constitucionais vão mais além. A Constituição da Republica de Moçambique, prevê a existência de uma
Separação entre Estado e Igreja. Como consequência deste cenário de protecção, são garantidos pelo nosso
ordenamento alguns institutos como a objeção de consciência e assistência religiosa. O trabalho tem como objectivo
geral: analisar do princípio da laicidade face as manifestações religiosas no ordenamento jurídico moçambicano.
Portanto, apesar da consagração de um Estado Laico, é possível pensar numa forte influência religiosa sobre o
Estado. Esta influência gera a discussão sobre a relação entre a adopção de uma religião pelo Estado e o respeito à
tolerância religiosa e à amplitude da liberdade religiosa. Com base nos princípios e nas situações expostas, será
possível analisar o caráter da laicidade face as manifestações religiosas e sua influência na proteção do direito à
liberdade religiosa e os limites impostos.
Palavras-chave: Direito Constitucional. Liberdade Religiosa. Laicidade. Principio. Estado

VIII
ABSTRACT
As a way of understanding our work, it appears that it is based on the idea of analyzing the principle of secularism
in the face of religious manifestations in the Mozambican legal system. The topic itself falls within the area of
Constitutional Law. it was supported by the hermeneutic method and type of exploratory research, taking into
account that the interpretation of some articles mentioned in the discourse of the work and in the bibliographic type
research is indispensable. The debate on secularity in the face of religious manifestations, has a discussion from a
constitutional and doctrinal perspective, involves two fundamental concepts: freedom of religion and the secularity
of the State. Freedom of religion is guaranteed in the Constitution of the Republic of Mozambique as a fundamental
right, in article 54. The protection of freedom of religion encompasses freedom of belief, worship and religious
organisation. Only with the consecration of these three aspects will the right to religious freedom be fully guaranteed.
Constitutional guarantees go further. The Constitution of the Republic of Mozambique provides for the existence of a
Separation between State and Church. As a consequence of this protection scenario, some institutes such as
conscientious objection and religious assistance are guaranteed by our legal system. The work has as general
objective: to analyze the principle of secularism in the face of religious manifestations in the Mozambican legal
system. Therefore, despite the consecration of a secular state, it is possible to think of a strong religious influence on
the state. This influence generates discussion about the relationship between the adoption of a religion by the State
and respect for religious tolerance and the breadth of religious freedom. Based on the principles and situations
exposed, it will be possible to analyze the character of secularism in the face of religious manifestations and its
influence on the protection of the right to religious freedom and the limits imposed.
Keywords: Constitutional Law. Religious freedom. secularity. Principle. State.

IX
ÍNDICE
DECLARAÇÃO DE HONRA.......................................................................................................III

AGRADECIMENTOS...................................................................................................................IV

DEDICATÓRIA..............................................................................................................................V

EPÍGRAFE.....................................................................................................................................VI

LISTA DE ABREVIATURAS.....................................................................................................VII

RESUMO.....................................................................................................................................VIII

ABSTRACT...................................................................................................................................IX

INTRODUÇÃO..............................................................................................................................10

CAPÍTULO I: METODOLOGIA USADA PARA ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA LAICIDADE


FACE AS MANIFESTAÇÕES RELIGIOSAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO
MOÇAMBICANO.........................................................................................................................12

1. Metodologia Científica...........................................................................................................12

1.1.Tipo de Pesquisa...................................................................................................................12

1.1.1.Quanto aos Objectivos.......................................................................................................12

1.2. Tipo de método....................................................................................................................12

1.2.1.Quanto a natureza ou abordagem.......................................................................................13

CAPITULO II: CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA SOBRE ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA


LAICIDADE FACE AS MANIFESTAÇÕES RELIGIOSAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO
MOÇAMBICANO.........................................................................................................................15

2.1. Origem e noção da laicidade............................................................................................15

2.1.1. Conceito de laicidade...............................................................................................15

2.1.2. Princípios regentes da laicidade do Estado..............................................................16

2.2. Tipos de laicidade............................................................................................................17

2.2.1. Laicidade separatista................................................................................................17

2.2.2. Laicidade antirreligiosa............................................................................................18


2.2.3. Laicidade do tipo autoritário....................................................................................18

2.3. Liberdade religiosa..........................................................................................................18

2.3.1. Origem e noção da liberdade religiosa.....................................................................18

2.3.2. As concepções da liberdade religiosa.......................................................................22

3.1. O princípio da laicidade face as manifestações religiosas...................................................25

3.1.1. As restrições à liberdade religiosa face ao princípio da laicidade................................25

3.1.1.1. Neutralidade negativa.................................................................................................27

3.1.2. A liberdade religiosa.....................................................................................................27

3.1.3. A razão de ser da laicidade e da liberdade religiosa no ordenamento jurídico


moçambicano..........................................................................................................................31

3.1.4. O cenário actual da liberdade religiosa no ordenamento jurídico moçambicano actual


.................................................................................................................................................32

3.1.4.1.1. Transfusão de Sangue e Testemunhas de Jeová.............................................................37

3.1.4.1.2. A liberdade Religiosa e o Direito a Vida........................................................................39

3.1.4.1.3. O quadro legal da laicidade no ordenamento jurídico moçambicano............................40

3.1.4.1.4A liberdade religiosa no Direito constitucional actual.....................................................41

CONCLUSÃO................................................................................................................................46

SUGESTÕES.................................................................................................................................48

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...........................................................................................49
Introdução
O trabalho apresentado tem como tema, análise do princípio da laicidade face as
manifestações religiosas no ordenamento jurídico moçambicano. O mesmo se insere na área do
Direito de constitucional, mas fez-se menção de outros ramos de Direito como é o caso de Direito
civil.
O embate sobre a Laicidade do Estado e as manifestações religiosas sempre
estiverem presente em diversos âmbitos de discussão, sociais, acadêmicos e políticos, uma vez
que carrega consigo a consolidação de diversos outros princípios, direitos e garantias de enorme
relevância na formação democrática do Estado. A efectivação do Princípio da Laicidade é um
processo em construção, desse modo, se faz necessário o amadurecimento democrático nacional,
bem como esforço positivo das instituições públicas para sua realização devidas.
A actuação efectiva das instituições religiosas na política moçambicana
interferência na composição de normas que regem o País, imposição de seus princípios, preceitos
e valores perante a uma colectividade, são amostras de que certos eventos ultrapassam o limite
criado pelo carácter Laico do Estado
É indispensável a este estudo, quando se fala em aspectos de manifestações
religiosas, mencionar a laicidade, que de facto é digno de destaque, por ser causador de diversos
embates, que é acerca da invocação do nome Deus nas ditas manifestações.
No ordenamento jurídico moçambicano, a manifestação religiosa é respeitada,
porém, apesar de tal respeito, actualmente o termo Estado laico vem sendo utilizado como
fundamento para a insurgência contra o próprio Estado, partindo do pressuposto que estas
manifestações têm extravasado o limite. Até mesmo a expressão “sob a protecção de Deus, se usa
para questões de tumultos. Vale ressaltar que Estado Laico é aquele que não se deixa interferir
por dogmas religiosos, mas pode interferir em alguns aspectos do clero eclesiástico
Alguns aspectos podem ser levantados em relação às circunstâncias do princípio
da laicidade face as manifestações religiosas no ordenamento jurídico moçambicano. Durante
muito tempo o tema da laicidade e a liberdade religiosa ganhou ímpeto na sociedade
moçambicana.
O crescimento da lei é um processo evolucionário. Seus princípios consistem em
generalizações que são feitas por várias instâncias individuais. As instâncias mudam conforme a

10
sociedade muda, com o clima, com o crescimento da população, com o progresso através das
invenções, com a seleção social.
A negligência será a violação de um dever objectivo de cuidado. Nesse aspecto,
da evolução social atendendo e considerando a liberdade religiosa se pode levantar e analisar
sobre os contornos da liberdade religiosa em Moçambique.
Por tanto esse sobressalto, deu origem ao problema e consequentemente a seguinte
questão de partida: até que ponto pode ser fazer as manifestações religiosas em respeito ao
princípio da laicidade, para que a liberdade religiosa não passe a ser libertinagem religiosa?
Como hipótese e possível resposta, se pode referir desde já que, em rigor, o cerne
da liberdade religiosa esta na proposta de lei sobre a liberdade religiosa, partindo do pressuposto
de que esta proposta surge do grito de socorro nascido no seio do povo, tendo em atenção que
maquina legislativa e o governo têm visto o o extravaso do limite da liberdade religiosa, ferindo
assim o principio da laicidade.
Com esses componentes foi possível determinar o objectivo geral da pesquisa que
se baseia em analisar o princípio da laicidade face as manifestações religiosas no ordenamento
moçambicano. Sendo assim os objectivos específicos são os seguintes: (I) analisar as restrições à
liberdade religiosa face ao princípio da laicidade; (II) analisar a liberdade religiosa e prática de
crenças contraposta ao direito à igualdade; (III) analisar a razão de ser da laicidade e da liberdade
religiosa no ordenamento jurídico moçambicano (IV) analisar o cenário actual da liberdade
religiosa no ordenamento jurídico moçambicano actual.
Para a elaboração do trabalho, quanto ao objectivo foi suportado pela pesquisa
exploratória, quanto a recolha de dados pautou-se na pesquisa bibliografia, quando a abordagem
usou-se a pesquisa qualitativa e no que tange ao método foi hermenêutico, tendo em atenção que
foi necessário fazer a devida interpretação de alguns artigos e diplomas legais.
O trabalho divide-se em três capítulos, sendo o primeiro capítulo a parte
metodológica, o segundo é a fundamentação teórica e o ultimo é o capítulo de apresentação,
analise e discussão de resultados.

11
CAPÍTULO I: METODOLOGIA USADA PARA ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA
LAICIDADE FACE AS MANIFESTAÇÕES RELIGIOSAS NO ORDENAMENTO
JURÍDICO MOÇAMBICANO

1. Metodologia Científica
Metodologia científica é o estudo dos métodos ou dos instrumentos
necessários para a elaboração de um trabalho científico. É o conjunto de técnicas e processos
empregados para a pesquisa e a formulação de uma produção científica. Salienta-se que a ciência
e a metodologia estão mãos dadas.
Neste capítulo, abarcou em demostrar a metodologia usada para a elaboração do
trabalho em análise, dai que ilustramos a seguir.
1.1.Tipo de Pesquisa
1.1.1.Quanto aos Objectivos
Quanto aos objectivos, CASTRO, ensina que, genericamente, as pesquisas
científicas podem ser classificadas em três tipos: exploratória, descritiva e explicativa. Cada uma
trata o problema de maneira diferente1. O trabalho foi realizado baseando-se numa pesquisa
exploratória, utilizando-se como forma de auferir a análise do princípio da laicidade face as
manifestações religiosas no ordenamento jurídico moçambicano, sendo um estudo sistematizado
por material publicado em livros, oferecendo assim o material analítico para o acesso do
pesquisador a matéria necessária, a bibliográfica é desenvolvida com base em material já
elaborado constituído principalmente livros e artigos científicos.2 .
1.2. Tipo de método
Nesse sentido, esse estudo envolveu método hermenêutico, no sentido de
interpretar, examinar ou fixar o sentido de um texto escrito ou teor de um texto legal para que
dele se tenha sua exacta significação, foi suportando-se neste método, que nos permitiu
interpretar e perceber a análise do princípio da laicidade face as manifestações religiosas no
ordenamento jurídico moçambicano.
Segundo LAKATOS e MARCONI3, estes defendem que os métodos são meios
encontrados para se guiar a fim de chegar a uma conclusão. Estes referenciam dois métodos a par
daquele já mencionado, que são o método dedutivo e indutivo. Frisam que o método indutivo ou
1
CASTRO, Cláudio de Moura, Estrutura e apresentação de publicações científicas, Mc Graw-Hill, São Paulo,
1976, pp. 17
2
THIOLLENT, Michel, Metodologia da pesquisa. 2. Ed são Paulo: Cortez, 1986, pág. 14
3
LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Mariana, Metodologia científica, editora atlas, 2003, pág. 86.
12
a indução é um processo metal por intermédio do qual, partindo de dados particulares,
suficientemente, constatados, infere-se uma verdade geral ou universal, não contidas nas partes
examinadas, sendo assim o nosso objectivo é chegar a conclusões mais amplos possíveis para
poder melhor trazer possíveis respostas credíveis.
De outro modo, o método indutivo procede inversamente ao dedutivo: parte do
particular e coloca a generalização como um produto posterior do trabalho de colecta de dados
particulares. De acordo com o raciocínio indutivo, a generalização não deve ser buscada
aprioristicamente, mas constatada a partir da observação de casos concretos suficientemente
confirmadores dessa realidade. Constitui o método proposto pelos empiristas (Bacon, Hobbes,
Locke, Hume), para os quais o conhecimento é fundamentado exclusivamente na experiência,
sem levar em consideração princípios preestabelecidos4.
1.2.1.Quanto a natureza ou abordagem
Quanto à natureza, as pesquisas científicas podem ser classificadas em dois tipos
básicos: qualitativa e quantitativa. De Acordo com TRIVIÑOS citado pelo professor MAXWELL
FERREIRA DE OLIVEIRA, diz que, a abordagem de cunho qualitativo trabalha os dados
buscando seu significado, tendo como base a percepção do fenómeno dentro do seu contexto5.
Sendo assim, no trabalho apresentado, no que tange à abordagem, tipo de pesquisa
usada foi a pesquisa qualitativa pois, os dados foram trabalhados procurando seu alcance, tendo
como suporte a compreensão da análise do princípio da laicidade face as manifestações religiosas
no ordenamento jurídico moçambicano.
1.3. Técnicas de Colecta de Dados
Do ponto de vista dos procedimentos técnicos, tratou-se de uma pesquisa
bibliográfica. Ou melhor, para MARCONI e LAKATOS, a técnica de colecta de dados de
pesquisa bibliográfica, tem como base os dados já tornada pública em relação ao tema estudado,
desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses,
materiais cartográficos, etc.6. Partindo do princípio dos autores acima citados, a pesquisa é
bibliográfica quando for desenvolvido de materiais já publicados, onde o investigador faz leitura

4
GIL, António Carlos, Métodos e Técnicas de Pesquisa Social, São Paulo: Atlas, 1989, pág. 29.
5
OLIVEIRA, Maxwell Ferreira de, Metodologia Científica: um manual para a realização de pesquisas em
administração, UFG, Catalão, 2011, p. 25.
6
MARCONI, Mariana de Andrade, LAKATOS, Eva Maria, Técnicas de Pesquisa: panejamento e execução de
pesquisas, amostragens e técnicas de pesquisas, elaboração e interpretação de dados, 2ª edição, Editora Atlas, São
Paulo: 1998. pág. 57
13
de obras que desenvolvem um determinado estudo e que desperte em si, a necessidade de
aprofundar esse assunto a partir. Durante a realização da pesquisa, é fundamental a exploração de
jornais, revistas, materiais de internet, livros e bem como artigos.
A recolha de dados foi feita com base na revisão bibliográfica, tendo atenção que
foi necessário recorrer aos manuais, doutrinas para a elaboração da mesma monografia.

14
CAPÍTULO II: MARCO TEÓRICO SOBRE ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA
LAICIDADE FACE AS MANIFESTAÇÕES RELIGIOSAS NO ORDENAMENTO
JURÍDICO MOÇAMBICANO
2.1. Origem e noção da laicidade
A partir dos séculos XIV e XV, no entanto, o vocábulo é substituído do sentido de
distinção para o de oposição, designando as iniciativas que contestam a supremacia do clero e
reivindicam maior participação dos fiéis no governo eclesiástico. Entretanto, com o iluminismo, a
expressão passa a ser utilizada para denominar a doutrina política que prega o afastamento da
religião da vida sociopolítica. A ideia de um Laico surge com as ideias iluministas e quando os
revolucionários defenderam a separação total da Igreja do Estado Francesa. Para preencher o
vazio criado com a falta da religião, crie uma série de cerimônias cívicas e festas nacionais. A
expressão laicidade deriva do termo laico, leigo.7
Etimologicamente laico se origina do grego primitivo laós, que significa povo ou
gente do povo. De laós deriva a palavra grega laikós de onde surgiu o termo latino laicus. Os
termos laico, leigo exprimem uma oposição ao religioso, àquilo que é clerical. 8
É preciso enfatizar que a laicidade é sobretudo um fenômeno político e não um
problema religioso, ou seja, ela deriva do Estado e não da religião. É o Estado que se afirma e,
em alguns casos, impõe a laicidade.
A laicidade exige determinada separação entre o Estado e os grupos religiosos. O
grau de separação, a importância que se atribui à neutralidade estatal e a valoração que se faz do
fenômeno religioso são elementos que, combinados, permitem estabelecer dois modelos distintos
de laicidade, na forma proposta por Costa da Ferreira, um forte e um débil.9
2.1.1. Conceito de laicidade
No ordenamento jurídico moçambicano, a laicidade esta regulada no artigo 12 da
CRM10, onde dispõe no seu todo que a laicidade assenta na separação entre o Estado e as
confissões religiosas, sendo que o Estado reconhece e a valoriza as actividades das confissões
visando promover um clima de entendimento tolerância, paz e reforço da unidade nacional, o

7
ALTUNA, R. R, De Asúa, Cultura Tradicional banta, 2ª edição, Luanda: Edições Paulinas, 2006,pag 564
8
Idem, pág. 567
9
FERREIRA, Da Costa, L., Igreja Ministerial em Moçambique: Caminhos de hoje e amanhã. Lisboa: Editora
Silvas, 1987;
10
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República, Edição Revista e actualizada, Minerva Press,
Maputo, 2018.
15
bem-estar espiritual e material dos cidadãos e o desenvolvimento económico e social. Por
definição, a laicidade desloca da fé o status organizador da discussão política e a coloca como
uma questão de foro íntimo, mas, paralelamente, torna o espaço público aberto para a discussão
de temas do interesse de todos os cidadãos. Em outras palavras, o vínculo religioso deve estar
separado de pertença política. A laicidade compreende a doutrina de imparcialidade do Estado
democrático frente a qualquer convicção relativa à religião, incluídas as crenças não religiosas.11
Laico significa o que ou quem não pertence ou não está sujeito a uma religião ou
não é influenciado por ela. O termo “laico” tem sua origem etimológica no grego laikós que
significa “do povo”. Está relacionado com a vida secular (mundana) e com atitudes profanas que
não se conjugam com a vida religiosa.
Originalmente a palavra laico servia para descrever cristãos devotos mas que não
faziam parte do clero. Só a partir da segunda metade do século XIX esta palavra ganhou o sentido
de uma pessoa, organização ou actividade autónoma e sem ligação à esfera da religião.
Um comportamento secular é o oposto de um comportamento eclesiástico,
direccionado para actividades da Igreja. A qualidade de ser laico pressupõe a não interferência da
igreja em assuntos políticos e culturais. Quando se fala em Estado laico, existe a ideia de
neutralidade sobre questões religiosas. Deve haver liberdade para os cidadãos manifestarem a sua
fé religiosa, qualquer que ela seja, sem haver controle ou imposição de uma religião específica.
2.1.2. Princípios regentes da laicidade do Estado
2.1.2.1. O princípio da autonomia
Considera a delimitação correcta das competências tanto do Estado quanto da
Religião, cada qual com jurisdição e matéria próprias. Trata-se da distinção entre ordem política e
ordem religiosa, sem prevalência de uma sobre a outra, uma vez que o Estado considera a
presença do religioso como factor relevante para o indivíduo e para sociedade e, por isso,
reconhece o espaço ao qual pertence cada confissão religiosa que busca atender à finalidade
espiritual da sociedade. O Estado é laico por não constituir uma realidade clerical e por pertencer
a uma ordem autônoma diferente da religiosa, “com base e vértice diversos. Nesse sentido, uma
autoridade política não pode impor preceitos que dizem respeito a questões de crença, nem
interferir na autodeterminação das confissões religiosas, como seria o caso de estabelecer
critérios para a adesão a um culto religioso. Da mesma forma, as fontes confessionais, como as

11
MACHADO, Jónatas Eduardo Mendes, Liberdade religiosa numa comunidade constitucional inclusiva,
Coimbra: Coimbra, 2006, pag 541
16
do Direito Canônico, consideradas à maneira de normas estatutárias que regem privadamente
uma única confissão religiosa, não têm significado jurídico direto, a menos que estejam
explicitamente referidas em alguma norma estatal.12 Assim sendo, há soberania da Igreja em seu
ordenamento autônomo em matéria religiosa, e há soberania do Estado no ordenamento estatal
em matéria política.13
É importante notar que o princípio da autonomia não representa a
incomunicabilidade entre o Estado laico e as confissões religiosas. É possível que haja um
reconhecimento recíproco entre ordem pública e ordem religiosa, sem prejuízo das suas
autonomias, que resulta em uma relação de coordenação.14
2.1.2.2. Princípio da liberdade religiosa
O princípio da liberdade religiosa abarca toda a construção normativa vista até
agora: uma vez radicada na ideia de dignidade da pessoa humana, torna-se preceito chave dos
ordenamentos jurídicos contemporâneos. É direito de todos, em condições de igualdade, a
manifestação individual e colectiva, em público e em privado, de suas convicções, quaisquer que
elas sejam, considerando o respeito pelos direitos de outros e pelos bens ou interesses da
comunidade e do Estado, constitucionalmente protegidos. Seguindo o princípio da liberdade
religiosa, o Estado democrático determina que os valores básicos de uma ordem constitucional
considerem a igual liberdade religiosa de todos, assumindo para si a tarefa principal reconhecer,
respeitar, harmonizar, defender e promover todas as confissões religiosas. É esse o modelo que
mais se aproxima da construção do conceito de laicidade, que, para tanto, depende de uma correta
delimitação das competências tanto do Estado quanto das religiões.15
2.2. Tipos de laicidade
2.2.1. Laicidade separatista
A laicidade separatista se caracteriza pela ênfase na divisão quase tangível entre os
espaços da vida privada e a esfera pública. Esta concepção tornou possível construir o governo
civil de modo autônomo e sob parâmetros seculares em sociedades marcadamente religiosas e
com expressivo poder das Igrejas. As formulações mais notáveis deste arranjo se encontram nas

12
MACHADO, Jónatas Eduardo Mendes, Liberdade religiosa numa comunidade constitucional inclusiva,
Coimbra: Coimbra, 2006, pág. 542
13
CRUZ, Manuel Braga Da, O Estado Novo e a Igreja Católica, Maputo, 1998, pag 739
14
MACHADO, Jónatas Eduardo Mendes, Liberdade religiosa numa comunidade constitucional inclusiva,
Coimbra: Coimbra, 2006, pág. 544
15
CRUZ, Manuel Braga Da, O Estado Novo e a Igreja Católica, Maputo, 1998, pag 740
17
reflexões dos filósofos ingleses do século XVIII, principalmente em John Locke, cuja obra Cartas
sobre a tolerância apontou a imprescindível necessidade de distinguir os domínios concernentes
ao Estado e aqueles pertencentes à religião. Esta concepção teve relevante influência na
elaboração da 1° Emenda da Constituição dos Estados Unidos e na Lei de Separação entre Estado
e Igreja na França em 1905.16
2.2.2. Laicidade antirreligiosa
A laicidade anticlerical ou antirreligiosa se define nas situações em que o Estado e
sectores da sociedade marginalizam as instituições religiosas e quaisquer intenções destas em
intervir no debate público com base em suas crenças. As críticas de Voltaire ao catolicismo
compõem a principal base de construção deste modelo. Para os movimentos anticlericais da
França e do Uruguai no século XIX, influenciados pelas ideias iluministas e liberais, a religião
era sinônimo de atraso e obscurantismo. Esta concepção teve maior adesão nos países de maioria
católica do que em países protestantes, tinha por orientação deslegitimar a hegemonia do poder
clerical nos assuntos públicos.17
2.2.3. Laicidade do tipo autoritário
A laicidade de tipo autoritário é verificada nos casos em que o Estado se torna
abruptamente independente dos poderes eclesiásticos. Este modelo, em algumas circunstâncias,
se aproxima da intolerância, pois o Estado age de modo arbitrário para eliminar qualquer nicho
de influência das instituições religiosas sobre a sociedade. Os regimes totalitários do século XX,
como a União Soviética, se notabilizaram por implementar este modelo, ao estipular o Estado
como ateu e proibir actividades religiosas.18
2.3. Liberdade religiosa
2.3.1. Origem e noção da liberdade religiosa

A religião é algo presente na vida dos homens desde os mais remotos tempos. Os
membros de uma determinada comunidade deveriam crer naquilo que o chefe da tribo/clã cresse;
caso contrário o “rebelde” seria sancionado com uma perseguição que lhe poderia valer a vida. 19
Depois da Antiguidade, a imposição religiosa sempre se fez presente na Idade Média e Moderna.

16
ALTUNA, R. R, De Asúa, Cultura Tradicional banta, 2ª edição, Luanda: Edições Paulinas, 2006, pág. 512.
17
FERREIRA, Da Costa, L., Igreja Ministerial em Moçambique: Caminhos de hoje e amanhã. Lisboa: Editora
Silvas, 1987, pág. 509.
18
ALTUNA, R. R, De Asúa, Cultura Tradicional banta, 2ª edição, Luanda: Edições Paulinas, 2006, pág. 517.
19
CNBB, A Igreja e a Política: Subsídios teológicos. IIIª Edição, São Paulo: Edições Paulinas, 1974, pág. 643.
18
A liberdade religiosa só veio aparecer verdadeiramente no Bill of Rights da Inglaterra, no Século
XVII.. Todavia essa liberdade não atingia todos os credos cristãos e não teve resultados gerais.20
Nos Estados Unidos surgiu na primeira emenda a liberdade religiosa, que era um
dos motivos do povoamento das treze colônias. Na França, com a publicação da Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão foi assegurada a liberdade de opinião religiosa, desde que não
viesse a intervir na ordem pública, conforme previsto em seu artigo. Na africa, a liberdade
religiosa demorou a ser conquistada, sendo que durante o Império havia uma religião oficial; o
catolicismo. Hoje vivemos em um Estado Democrático de Direito e ela é presente em nossas
vidas21.
A Reforma Protestante, influenciada por Martinho Lutero, Calvino e outros
“reformadores”, foi responsável pelo renascimento da autonomia individual em relação aos
demais comportamentos da sociedade. Essa autonomia de poder de escolha provocou um entrave
com a Igreja e com o Poder Absolutista. Essa mesma Reforma trouxe consigo um ideal para que
fossem reconhecidos os Direitos Humanos (isso relacionados com os direitos de primeira
geração, nas quais a liberdade religiosa está inclusa).22
Com a descoberta dos Estados Unidos, houve, posteriormente, o interesse de
habitar esse Novo Mundo ou, como alguns autores preferem denominar, Novo Continente. Os
puritanos anglo-saxões, com o intuito de fazer normas para os EUA totalmente adversas do país
oriundo, tiveram a intenção de criar um Estado “mais liberal”, onde os Direitos Humanos fossem
tutelados. Por isso, na Declaração de Independência dos Estados Unidos, bem como no Bill of
Rigths houve o surgimento da guarda dos Direitos Humanos.23
Os princípios da Igualdade e da Liberdade foram previstos tanto na Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão (1789), quanto no Bill of Rights. Nos dias actuais os Direitos
humanos são valores universais que atingiram o patamar de direitos humanos internacionais,
conforme previsão da ONU
O artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos discorre: “Toda pessoa
tem direito à liberdade de pensamento, consciência, religião; este direito inclui a liberdade de

20
MACHADO, Jónatas Eduardo Mendes, Liberdade religiosa numa comunidade constitucional inclusiva,
Coimbra: Coimbra, 2006, pag 549
21
SORIANO, Aldir Guedes. Liberdade religiosa no direito constitucional e internacional. São Paulo: Juarez de
Oliveira, 2002, pág. 64
22
CNBB, A Igreja e a Política: Subsídios teológicos. IIIª Edição, São Paulo: Edições Paulinas, 1974, pag 645
23
Idem
19
mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela
prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular.
2.3.1.1. Conceito da liberdade religiosa
A liberdade, direito humano fundamental de primeira geração, é algo basilar ao
homem e aos Estados Democráticos. Sua existência é baseada na capacidade de pensamento do
ser humano (homo sapiens = homem que pensa), bem como na sua autonomia. A liberdade
religiosa é um método de expressar a capacidade de consciência, onde cada indivíduo tem o
direito de escolher sua religião ou não, conforme suas convicções e crenças.24
A Bíblia, livro sagrado adotado pela maioria dos cristãos, ressalta que toda e
qualquer crença não deve ser imposta, todavia deve ser escolhida por livre e espontânea vontade
do indivíduo. Portanto, a liberdade religiosa é prevista na Bíblia.
Para, Aldir Guedes, “a Liberdade Religiosa é o direito que tem o homem de
adorar a seu Deus, de acordo com sua crença e seu culto”. A liberdade religiosa é, segundo
Pontes de Miranda, uma especialização da liberdade de pensamento. Ela (liberdade religiosa)
abrange o direito de escolher, de mudar e/ou de manifestar sua convicção ou religião. 25
A Liberdade Religiosa subdivide-se, conforme Aldir Guedes Soriano, em quatro:
 Liberdade de consciência: é o direito de crer ou não em algo;
 Liberdade de crença: é o direito de escolher a uma crença/religião. Também compreende
mudar de crença/religião;
 Liberdade de culto: manifestação da crença ou da religião; -e liberdade de organização
religiosa: é a consequência do Estado Laico, está sobre da CRM.26
2.3.1.2. Princípios que norteiam a liberdade religiosa
2.3.1.2.1. Liberdade e Igualdade
No ordenamento jurídico moçambicano o princípio da liberdade religiosa
encontrasse consagrado no artigo 54º da CRM, no seu número 1 preconiza que todos os cidadãos

24
MACHADO, Jónatas Eduardo Mendes, Liberdade religiosa numa comunidade constitucional inclusiva,
Coimbra: Coimbra, 2006, pág. 782
25
SORIANO, Aldir Guedes. Liberdade religiosa no direito constitucional e internacional. São Paulo: Juarez
de Oliveira, 2002, pág. 67
26
SORIANO, Aldir Guedes. Liberdade religiosa no direito constitucional e internacional. São Paulo: Juarez
de Oliveira, 2002, pág. 68
20
tem a liberdade de praticar ou não uma religião. Em contrapartida o princípio da igualdade esta
regulado no artigo 35º do mesmo diploma legal, onde ressalta que todos são iguais perante a lei.27
A liberdade consiste em algo que ao homem não é impossibilitado de realizar.
Tratando de liberdade religiosa, a liberdade que preconiza é a de pensamento, pois conforme o
raciocínio de cada indivíduo é que este passará a crer ou deixar de crer em algo. Através da
liberdade, outro princípio fortemente tutelado pela nossa Magna Carta é alcançado: a dignidade
humana28. Esta só será alcançada quando um indivíduo puder realizar tudo aquilo que deseja,
ressalvados os casos em que a ordem pública possa ser desestruturada. A igualdade de direitos
deve ser atribuída a todos, independentemente das crenças individuais. Portanto, é ilícito que uma
pessoa goze de mais ou menos direito do que outra em decorrência de sua crença.29
2.3.1.2.2. Liberdade de Consciência, Crença e Culto
No ordenamento jurídico moçambicano este princípio encontra seu regime jurídico
na CRM no seu artigo 54º especificamente nos números 3, 4 e 5, se preconiza no seu todo de que
as confissões religiosas gozam do direito de prosseguir livremente os seus fins religiosos, possuir
e adquirir bens para a materialização dos seus objectivos, ainda é assegurada protecção dos locais
de culto e é garantido o direito a objecção de consciência.
A liberdade de crença, bem como a liberdade de consciência é algo íntimo e que
não necessita de exteriorização, ou seja, que não necessita ser manifestada. Entretanto, as
acepções de ambas não são as mesmas e, portanto, não podem ser confundidas:

 A liberdade de consciência é algo que o homem não pode renunciar, que, tendo ou não
previsão legal, é natural do homem. Ela é algo amplo que pode não estar voltada à
religião;
 A liberdade de crença é, como já dito alhures, uma extensão da liberdade de pensamento.
Ela é algo totalmente voltada à religião. As liberdades de consciência e de crença poderão
ser, ao contrário do que diz a norma constitucional, violadas. Isso ocorrerá se elas
causarem danos à ordem pública. Portanto, exemplificando, se uma seita religiosa pregar

27
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República, Edição Revista e actualizada, Minerva Press,
Maputo, 2018, artigo 54º e 34º
28
FERREIRA, Da Costa, L., Igreja Ministerial em Moçambique: Caminhos de hoje e amanhã. Lisboa: Editora
Silvas, 1987, pág. 509
29
Idem
21
o terrorismo, seus membros que o cometerem serão sancionados, pois o terrorismo é
ilícito, conforme determina o artigo 4º, inciso VIII, da Magna Carta.
2.3.1.2.3. Assistência Religiosa
A assistência deve ser proporcionada aos jovens infratores internos, aos presos, às
pessoas hospitalizadas, às Forças Armadas e àquelas citadas no artigo acima descrito. Ela
funciona como uma fonte de energia que irá acelerar o tempo de recuperação do interno, do
preso. Quanto aos enfermos ela será um modo de aliviar o sofrimento, a tensão, proporcionando
uma melhoria mental onde poderá (em alguns estudos isso foi comprovado que ocorre) refletir na
melhoria física. Mesmo a assistência religiosa tendo um comportamento benéfico na maioria dos
factos, ela não deve ser obrigatória, pois seria um ato inconstitucional que feriria o que é o tema
desse estudo, a liberdade religiosa.30
2.3.2. As concepções da liberdade religiosa
2.3.2.1. Concepção jurídica
No que se refere à liberdade religiosa na acepção jurídica, a mesma compreende,
essencialmente, a liberdade religiosa como um direito fundamental da pessoa humana. Nesse
sentido, Segundo Jorge Miranda, a liberdade religiosa ocupa o cerne da problemática dos direitos
humanos.31 Ora, no curso da história da humanidade, o direito à liberdade religiosa representa
uma conquista extremamente recente.32 Pode ser identificada nas três fases da era dos direitos,
mencionadas por Norberto Bobbio. Segundo o autor italiano, os direitos humanos "nascem como
direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particulares, para finalmente
encontrarem sua plena realização como direitos positivos universais". Como direito natural, a
liberdade religiosa surgiu no século XVIII, com as primeiras declarações de direitos de 1776
(americana) e 1789 (francesa). Como direito efectivamente tutelado, a liberdade religiosa surgiu
com a Constituição Americana. Como direito internacional, a liberdade religiosa surgiu no
Segundo Pós-Guerra, com o desenvolvimento do sistema global de protecção aos direitos
humanos ligados à Organização das Nações Unidas – ONU.33

30
AUGUSTO, Lacerda, liberdade religiosa e a lacidade em Moçambique, Vol. 1, Plural editores, Maputo, 2006,
pág. 879
31
MIRANDA, Jorge, direito de crença e a liberdade religiosa, Vol. 1, Coimbra, lisboa 2002, pág. 453
32
FERREIRA, Da Costa, L., Igreja Ministerial em Moçambique: Caminhos de hoje e amanhã. Lisboa: Editora
Silvas, 1987, pág. 986
33
GARCIA, Maria Da Glória, Liberdade de consciência e liberdade religiosa, in Direito e Justiça, 1997, pág. 980
22
2.3.2.2. Concepção teológica
O discurso teológico da liberdade religiosa compreende uma doutrina teológica na
qual só se reconhecem os direitos nos limites da Igreja Católica. Essa doutrina foi fundamentada
no pensamento de Santo Agostinho (Guerra Justa) e de Santo Tomás de Aquino.
2.3.2.3. Concepção bíblica
A liberdade religiosa no sentido bíblico é um "Dom de Deus", como observa John
Graz. O Criador concedeu o livre arbítrio para os homens. "Ora, o Senhor é o Espírito; e, onde
está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade." (Coríntios 3: 17) Porém, todos prestarão conta a
Deus.".34
2.3.2.4. Comparado do Princípio da Laicidade: caso da França e Portugal
2.3.2.4.1 França
O Estado laico não é uma especificidade francesa, todavia foi na França que as
discussões sobre separação de Estado e Igreja chegaram a um nível de aprofundamento notável.
conhecido pela Declaração dos Direitos do Homem, de 1789. Essa tolerância passa pelo respeito
ao culto dos outros, à aceitação de sua opinião, como assinala o artigo 10 da referida declaração:
«Ninguém pode ser perseguido por suas opiniões, mesmo religiosas, contanto que sua
manifestação não perturbe a ordem pública». Ou ainda, o artigo 18 da Declaração Universal dos
Direitos do Homem: «Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e
religião». Tolerância e laicidade caminham então, necessariamente, lado a lado. E, enquanto
princípio, a tolerância deve ser compreendida como algo que explica, fundamenta e orienta. A
este respeito assinalava Xavier Darcos, Ministro Delegado do Ensino Escolar, em sua palestra de
abertura do seminário o ensino dos fatos religioso.
A separação entre Estado e Igreja, na França, assumiu um carácter de tal interesse
que acabou por tornar-se lei. Promulgada em 9 de Setembro de 1905, a lei concernente à
separação das Igrejas e do Estado marcou claramente a posição do Estado laico, assumido pelo
país pós-Revolução Francesa. Se o Estado não reconhece ou subvenciona nenhum tipo de culto
religioso, nem mantém como assalariado nenhum representante religioso, inclui, porém, no seu
orçamento verba destinada à manutenção de serviços de capelania em estabelecimentos públicos
como instituições educativas, hospícios, asilos, hospitais e prisões, de forma a assegurar o livre
exercício dos cultos. Ou seja, em lugares onde o cidadão está impossibilitado, por razões que

34
CNBB, A Igreja e a Política: Subsídios teológicos. IIIª Edição, São Paulo: Edições Paulinas, 1974, pág. 187
23
independem de sua vontade, de sair para procurar o auxílio religioso ou um local para exercício
do seu culto, cabe ao Estado assegurar os serviços que lhe garantam esse Direito. Se formos falar
em laicização do saber, o período compreendido entre 1880 e 1886 é aquele que marca a origem
das Ciências das Religiões no país. O ano de 1880 marca a criação da «cadeira» de História das
Religiões no Colégio de França, assinalando a emergência de um ensino superior consagrado.

2.3.2.5 O princípio da laicidade face as manifestações religiosas


A laicidade no ordenamento jurídico moçambicano se encontra regulada no artigo
12º35 da CRM, em sua acepção corrente, compreende o processo de separação institucional e
autonomia do Estado com relação às religiões. 36 Contudo, a noção de laicidade não se restringe a
uma norma legal que busca apenas promover a separação institucional entre ditas esferas. Sua
função também consiste em reconhecer e garantir de modo equânime a legitimidade das distintas
clivagens de pensamento e crenças presentes na sociedade. Sendo assim, seu propósito também
consiste em assegurar que a pluralidade de ideias seja preservada, de modo a impedir que
determinadas concepções de bem se imponham a distintos grupos que não partilham da mesma
concepção.37

Segundo Oliveira Martins, a dimensão institucional do princípio de laicidade se


manifesta pela aplicação de dispositivos legais por parte do Estado, com a finalidade primordial
de separá-lo das organizações religiosas e obstruir sua interferência nos assuntos públicos.38:
Borges de Pinho, referencia que para esse sentido, a laicidade também está
intimamente relacionada com a promoção de princípios na esfera pública, como a liberdade de
consciência e religiosa, autodeterminação individual e colectiva, tolerância e a igualdade. A
sedimentação e adesão a estes valores outorgam à laicidade o status de paradigma para um
modelo de sociedade desejável do ponto de vista democrático, em que ninguém é privado de (ou
obrigado a) crer em algo e adoptar um estilo de vida específico.39

35
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República, Edição Revista e actualizada, Minerva Press,
Maputo, 2018, artigo 12º
36
Comentários nossos
37
Comentários nossos
38
MARTINS, Oliveira, Liberdade de Culto, in Política e História, Plural Editores, Maputo 1998.
39
PINHO, Borges De, Liberdade religiosa e ecumenismo, in Liberdade religiosa – realidade e perspectivas, obra
colectiva, Lisboa, 1998, pág. 637
24
2.3.2.5.1 As restrições à liberdade religiosa face ao princípio da laicidade
Em termos legais e no ordenamento jurídico moçambicano, poucas vezes se tem
visto as restrições da liberdade religiosa gorada do principio da laicidade, todavia a doutrina não
se cala, em função de restringir a liberdade religiosa, mas para isso, ela mexe a laicidade como
sendo um instrumento para impor limites a liberdade religiosa para que não se estravasse de
forma categórica essa liberdade, que muita das vezes é confundido como libertinagem.
Como todo direito fundamental, a liberdade religiosa também tem como uma de
suas características a sua relatividade, cujo principal objectivo é permitir a convivência
harmónica entre os demais direitos fundamentais inscritos no texto constitucional.40
Não se tratará aqui do tema da restrição dos direitos fundamentais em geral, mas
tão-somente das especificidades atinentes à liberdade religiosa em contraposição ao princípio da
laicidade.
Para Borges Pinho, este princípio de liberdade religiosa não é um princípio
absoluto; os princípios, como os direitos e as liberdades, são relativos e estão submetidos ao
jogo de recíprocas limitações com o fim de dosar seu exercício e fazer frente a um hipotético
abuso cometido por algum deles. Também são relativos porque seu conteúdo e alcance admitem
internamente diversas configurações em função das opções ideológicas e das políticas.41
Para António de Sousa Franco, a Constituição da República de Moçambique,
coloca explicitamente três princípios aptos a restringir a liberdade religiosa, quais sejam: a
igualdade religiosa, a cooperação e a ordem pública. Na verdade, o autor entende que a
liberdade é mais um limite à igualdade religiosa do que o contrário, já que é forte o risco de a
liberdade tornar- se um privilégio e nesta medida ameaçar a igualdade. Do mesmo modo, o
princípio da cooperação seria mais um limite à igualdade do que à liberdade. O único limite
verdadeiramente imposto à liberdade religiosa seria a ordem pública.42
Como integrantes da ordem pública poderiam ser incluídos os direitos alheios, a
segurança, a saúde e a moralidade públicas. Contudo, todos os altos valores constitucionais
podem ser opostos ao exercício da liberdade religiosa. Remonta-se à ideia de que todas as
normas constitucionais tanto as que prevêem a liberdade quanto as que impõem as restrições

40
Comentários nossos
41
PINHO, Borges De, Liberdade religiosa e ecumenismo, in Liberdade religiosa – realidade e perspectivas, obra
colectiva, Lisboa, 1998, pág. 637
42
FRANCO, António De Sousa, A Liberdade Religiosa e o Projecto do Código Civil, Braga, 1967, pág. 456
25
vivem num regime de concorrência normativa e não de exclusão.43
Para Maria da Gloria, a restrição válida está submetida a condições gerais44:
a) Deve-se aplicar somente à liberdade de manifestar a religião em condições que não
coloque em causa a ordem pública;
b) Deve estar prevista em lei;
c) Deve ser medida necessária à sobrevivência de uma sociedade democrática. Ademais,
a restrição deve ser fundada em alguns motivos, como a garantia da segurança, da ordem, da
saúde, da moralidade pública ou a protecção a direitos e liberdades alheios.
A dimensão de restrição da liberdade religiosa é sistematizada via adopção de quatro
normas, são elas:
2.3.2.5.1.1 Neutralidade negativa
Institui a ausência de intervenção do Estado à livre expressão da religiosidade e
das convicções dos indivíduos ou grupos, com vistas a garantir o direito à liberdade religiosa,
desde que não estravasse essa liberdade.
Segundo Maria da Gloria a neutralidade negativa no ordenamento jurídico
moçambicano, reflecte uma realidade diferente, partindo do pressuposto que há forte intervenção
do Estado na religião, ou seja, a religião é também influenciada pelos ditames estatais.45
Relativamente o que avança Maria da Gloria, Oliveira Martins, frisa, dizendo que,
a neutralidade negativa não espelha a realidade do ordenamento jurídico moçambicano46
2.3.2.5.1.2 Neutralidade positiva
Se caracteriza pela concepção de isonomia do Estado frente às religiões,
impedindo-o de outorgar qualquer auxílio, subsídio ou influência, directa ou indirecta, em favor
das instituições ou de suas organizações, tampouco a uma ou algumas delas;
 Liberdade de apostasia, que determina a igual dignidade jurídica e o respeito ao
princípio da laicidade;
 Neutralidade das leis civis, que estabelece a separação entre as leis que regem o
conjunto da sociedade das normas morais religiosas.47

43
Idem
44
GARCIA, Maria Da Glória, Liberdade de consciência e liberdade religiosa, in Direito e Justiça, Vol.1, Maputo,
1997, pág. 738
45
GARCIA, Maria Da Glória, Liberdade de consciência e liberdade religiosa, in Direito e Justiça, Vol.1, Maputo,
1997, pág. 739
46
MARTINS, Oliveira, Liberdade de Culto, in Política e História, Plural Editores, Maputo 1998, pág. 732
47
Idem
26
2.3.2.6 A liberdade religiosa
2.3.2.6 .1 Conceito de Religião
Não é uma tarefa fácil conceituar religião. Toda sociedade seja de qual época for é
um empreendimento em constante evolução, sendo a religião parte deste empreendimento. Na
sociedade ocidental prevalece a ideia da religião como um conjunto de princípios e regras pelos
quais as pessoas se relacionam com o numinoso.
o termo religião vem da expressão latina religare ou religação. Significa a vontade
do ser humano de se “religar” com uma dimensão com a qual supostamente perdeu sua relação
essencial. Justamente por isso é que a prática da religião estaria sempre relacionada ao espírito de
busca, de religação com a divindade. Segundo o autor citado no parágrafo anterior, a palavra
religião teria sua origem na expressão religar que teria como significado a junção do profano com
o sagrado, ou seja, do homem com a divindade, do corpus com o espiritus.
A exteriorização dessa busca seria mediante alguns elementos tais como símbolos,
ritos e mito. A busca por tais elementos procuram dar um sentido a vida humana a fim de
conceder respostas às perguntas que dão significado ao homem natural. Numa visão sociológica,
observa-se que a religião é composta por um conjunto de crenças e comportamentos pelos quais
certos valores e ideais sociais são representados.
Qualquer elemento pode ser transformado em símbolo ligado à religiosidade. A
conformidade exterior da conduta aos modelos simboliza a adesão interior do sujeito a uma
ordem de valores. E a adesão aos valores, por sua vez, é o símbolo de que se pertence a uma
sociedade ou colectividade. Pode mesmo afirmar-se que a acção humana é social porque
simbólica.
O símbolo implica três 1) um significante; 2) um significado e 3) a significação. O
símbolo é algo usado para dar sentido a alguém ou alguma coisa. O símbolo é significante porque
tem finalidade de dar sentido a um significado relacionado de maior sentido. A própria palavra
símbolo tem significação através de imagens, objectos, palavras e o símbolo pode ser
compreendido como “um objecto, um acontecimento, uma pessoa, uma realidade experimentável
que está carregada de uma transignificação”, define o homem como um animal simbólico, pois
se é racional, deve-o à aptidão que adquiriu de representar as coisas de maneira simbólica, pelas
palavras e pelos conceitos, e de manipular simbolicamente as realidades.

27
O simbolismo confere ao homem o seu poder sobre o mundo, não é apenas
resultado de uma evolução biológica, mas também de uma evolução social. Os símbolos remetem
o indivíduo ao conhecimento das inúmeras possibilidades interpretativas. As expressões
simbólicas superam os aportes racionais, pois o símbolo vincula-se a uma força integrativa na
medida em que há algo invisível que se faz representar através do símbolo. O símbolo propicia
que os humanos estabeleçam uma relação de identidade com o sagrado, pois a fé é exteriorizada
de forma a gerar representações simbólicas.
A compreensão dos símbolos pressupõe um entendimento das representações
simbólicas veiculadas pelos mitos, corporificadas nos ritos e exteriorizadas nos comportamentos
sociais. Outro elemento da religião é o rito. Os ritos constituem um terreno de investigação
privilegiado. O rito é uma acção seguida de consequências reais; é talvez uma espécie de
linguagem, mas é também algo mais.
O homem moderno, qualquer que seja a sua posição filosófica, não pode deixar de,
à primeira abordagem, julgar estranhos os ritos dos seus semelhantes menos evoluídos. O rito é
um ato que pode ser individual ou colectivo, mas que sempre, mesmo quando é bastante flexível
para comportar uma margem de improvisação, permanece fiel a certas regras que constituem
precisamente o que há nele de ritual. A palavra latina ritus designava não só as cerimónias
ligadas as crenças relativas ao sobrenatural, como também os simples hábitos sociais, os usos e os
costumes (ritus moresque), isto é, a maneira de agir reproduzida com uma certa.
2.3.2.6.2 Conceito de Liberdade Religiosa
De acordo com o dispositivo acima, a liberdade religiosa abarca duas garantias. A
primeira diz respeito à liberdade de crença que consiste no direito de acreditar ou não em algo, ou
seja, ninguém é obrigado a seguir uma determinada religião, credo, seita, ou até mesmo de não
seguir qualquer religião. Já a segunda garantia é a liberdade de culto que é o modo pelo qual as
religiões se utilizam para exercitarem as suas liturgias, ritos, cultos e tradições. O direito à
liberdade religiosa é tido como direito fundamental de 1ª geração e tem carácter negativo, vez
que exigem do Estado uma abstenção. São direitos individuais assegurados ao indivíduo em face
do Estado. Tal direito tem somente eficácia vertical, ou seja, oponível ao Estado e não a outros
indivíduos.
A criação de um direito em um contexto constitucional não o assegura por si só a
sua efectividade diante da falta de mecanismos capazes de protegê-lo contra ameaças de

28
violações. As garantias não colimam um fim em si mesmo, mas sim um dispositivo a serviço
daquele que necessita com o intuito de assegurar a protecção e a efectividade dos direitos
fundamentais
O Estado não pode favorecer nenhuma religião específica e não se pode vincular sanções
ou incapacidades a nenhuma afiliação religiosa ou ausência dela, nesse contexto se tem assistido
no ordenamento jurídico moçambicano as diversas manifestações religiosas que contrapõem ao
direito de igualdade e consequentemente a violação do princípio da laicidade. A lei protege o
direito de culto no sentido de que a apostasia não é reconhecida, e muito menos penalizada, como
ofensa jurídica, assim como não o é o facto de se não ter nenhuma religião. Desta forma é que o
Estado defende a liberdade religiosa e moral. Todos concordam que a liberdade de consciência é
limitada pelo interesse geral na segurança e ordem públicas. Essa mesma limitação é facilmente
dedutível do ponto de vista contratualista. Essa limitação não significa que os interesses públicos
sejam, em qualquer sentido, superiores aos interesses religiosos e morais, nem implica na
possibilidade de o governo reivindicar o direito de suprimir convicções filosóficas quando há
conflito destas com os assuntos de Estado.48
Em alguns casos concretos poderá ocorrer colisão entre os valores insertos em uma
norma jurídica e entre um princípio. Nesses casos, caberá ao julgador fazer uma ponderação de
valores entre os direitos consagrados na norma e nos princípios e decidir qual terá prevalência
sobre o outro. Esse fenómeno também pode ser observado nas normas referentes ao direito de
liberdade religiosa à medida que os valores insertos tanto nas normas quanto nos princípios
podem entrar em choque, como o caso dos professantes da religião Testemunhas de Jeová que
não aceitam transfusão sanguínea. Nesse caso, observa-se uma colisão entre o direito à vida e o
direito à liberdade religiosa, razão pela qual deve o operador do direito fazer uma ponderação e
decidir concretamente, a Constituição é um sistema normativo aberto composto de princípios e
regras, pois as normas que compõem o sistema podem se mostrar tanto sob a forma de regras
quanto sob a forma de princípios.
As regras são mandamentos de definição, ou seja, normas que ordenam que algo
seja cumprido na medida exacta de suas prescrições. Costuma-se dizer que as regras obedecem à
lógica do tudo ou nada. Isso quer dizer que quando se tem uma regra ela não é ponderada, ou se
aplica tudo ou não se aplica nada4 . As regras são normas que devem ser automaticamente

48
Comentários nossos
29
aplicadas quando as condições nela previstas são implementadas. Em verdade temos que as
regras consistem na positivação de determinada norma, que pode ser cumprida ou não. Uma regra
só é considerada válida quando é observada e cumprida na íntegra.
2.3.2.6.3 A razão de ser da laicidade e da liberdade religiosa no ordenamento jurídico
moçambicano
Moçambique é um estado laico, ou seja, assegura o princípio da laicidade nos
termos do artigo 12º da CRM49. Sendo um Estado laico centra-se no fato de que a liberdade
religiosa é um direito humano fundamental, o qual que deve ser garantido. Somente um
Estado laico pode resguardar o respeito e a igualdade entre toda e qualquer religião, sem
privilegiar algumas ou depreciar outras. O Artigo 10º da mesma proposta preconiza que o
princípio da liberdade religiosa deve ser exercida em respeito a constituição da Republica de
Moçambique, nesta senda, a laicidade, contudo, não impede a regulamentação do direito à
liberdade religiosa.50
Para Adriano Baritussio, a laicidade é a marca constituinte para uma república
livre, sendo compreendida como o regime não monárquico e das liberdades civis em que o
Estado é controlado pela sociedade para que ele não se torne dominador.51 
Lacerda Augusto, propõe dois critérios analíticos:
a) A existência ou não de um projecto previamente elaborado de laicidade que anteceda a
sua institucionalização;
b) Que na formulação dos seus princípios informativos a laicidade esteja vinculada aos
processos sociopolíticos específicos de cada país. O autor apresenta dois modelos de laicidade: a
laicidade de princípio, e a laicidade de compromisso.52
A primeira vertente adoptada como princípio de liberdade a recusa da
confessionalidade estatal, posto que a relação entre os cidadãos e Estado deva se restringir à
política, não lhe cabendo a imposição de sua opinião sobre os cidadãos. Na segunda vertente, o
Estado laico é uma solução de compromisso diante da impossibilidade dos diferentes credos de se
imporem social e politicamente. Nesse modelo, a laicidade não é apreendida como um

49
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República, Edição Revista e actualizada, Minerva Press,
Maputo, 2018, artigo 12º
50
Comentários nossos
51
BARITUSSIO, Adriano, Moçambique, 50 anos de Presença dos Missionários Combonianos, Roma: MCR, 2015,
pág. 356
52
AUGUSTO, Lacerda, liberdade religiosa e a lacidade em Moçambique, Vol. 1, Plural editores, Maputo, 2006,
pág. 382
30
condicionante da liberdade pública, porém como produto da incapacidade de uma religião se
sobrepor em relação às demais.53
O ordenamento jurídico moçambicano, adopta a laicidade como princípio,
partindo do pressuposto as entidades e associações religiosas e instituições de ensino religioso
estão separadas do Estado e são livres na organização e exercício das suas actividades, nos
termos da Constituição e da lei.54
2.3.2.6.4 O cenário actual da liberdade religiosa no ordenamento jurídico moçambicano
actual
Olhando sobre o cenário da liberdade religiosa no ordenamento jurídico
moçambicano, vale ressaltar que não se vislumbra o respeito por parte do cidadão enquanto ser
integrado na sociedade, facto que demostra várias manifestações de cariz religiosa associado a
política, a liberdade religiosa em moçambique carece de legislação específica, aliado a este facto
a máquina legislativa se ocupou em responder o respeito da liberdade religiosa, criando uma
proposta de lei que visa regular a liberdade religiosa.55
A proposta de lei sobre a liberdade religiosa, ela preconiza no seu artigo 4º, que
ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, perseguido, prejudicado, discriminado, privado de
qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão da sua religião ou práticas religiosas. 56 As
entidades religiosas tem direito a igual tratamento, ressalvadas as diferenças impostas pela sua
diversa representatividade. O Estado e os demais poderes e instituições públicos darão tratamento
igualitário, sem discriminação, a todas as colectividades religiosas.57
Segundo o constitucionalista Gil Cistac, 58a Constituição define o país como um
Estado laico. Proíbe a discriminação baseada na religião, prevê o direito dos cidadãos de
praticarem ou não uma religião, e estipula que nenhum indivíduo pode ser privado dos seus
direitos por causa da fé ou prática religiosa. Os partidos políticos estão constitucionalmente
proibidos de usar nomes ou símbolos associados a grupos religiosos. A Constituição protege os
locais de culto e o direito dos grupos religiosos de se organizarem, adorarem e seguirem
livremente os seus objectivos religiosos e adquirirem activos na prossecução desses objectivos.

53
Idem, pág. 473
54
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55
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56
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Proposta de lei da liberdade religiosa, 2020, artigo 4º
57
AUGUSTO, Lacerda, liberdade religiosa e a lacidade em Moçambique, Vol. 1, Plural editores, Maputo, 2006,
pág. 423
58
CISTAC, Gil, Direito constitucional e os direitos fundamentais, Vol. 2, plural Editores, Maputo, 2012, pág. 986
31
Reconhece o direito de objecção de consciência ao serviço militar por razões religiosas. Estes e
outros direitos podem ser temporariamente suspensos ou restringidos apenas na eventualidade de
uma declaração de estado de guerra, sítio ou emergência, em conformidade com os termos da
Constituição.59
A lei exige que todas as organizações não-governamentais se registem junto ao
Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos. Ao abrigo da lei, as “organizações
religiosas” são organizações de caridade ou humanitárias, ao passo que “grupos religiosos”
refere-se a denominações particulares. Os grupos religiosos registam-se a nível denominacional
ou a nível congregacional caso não estejam afiliadas. Os grupos e organizações religiosas
registam-se através da apresentação de um pedido, fornecendo documentos de identificação dos
líderes locais, e submetendo documentação de declaração de vínculos com qualquer grupo ou
organização religiosa internacional. Não há penalizações pela falta de registo; contudo, os grupos
e organizações religiosas devem apresentar prova de registo para abertura de contas bancárias,
pedidos de isenções de direitos aduaneiros para bens importados, ou submissão de pedidos de
visto para membros estrangeiros.60
Nas palavras de Costa da Ferreira, Um acordo entre o governo nacional e a Santa
Sé rege os direitos e responsabilidades da Igreja Católica no país. O acordo reconhece a Igreja
Católica como tendo “personalidade jurídica” e reconhece o direito exclusivo da Igreja de
“regular a vida eclesiástica e nomear pessoas para postos eclesiásticos”. O acordo exige que os
representantes da Igreja Católica se registem junto ao governo a fim de beneficiarem do estatuto
da Igreja. O acordo dá ainda à Igreja Católica o direito exclusivo de criar, modificar ou eliminar
as fronteiras eclesiásticas; porém, estipula que os territórios eclesiásticos devem reportar a uma
autoridade da Igreja no país. Se tem assistindo o extravaso da laicidade no cenário moçambicano,
dentro desse cenário se tem violado o princípio da laicidade.61
Outrossim, o autor Oliveira Martin referencia que a liberdade religiosa é
moçambique é muita das vezes afastada pelo principio da laicidade. Para este autor, a laicidade é
uma noção que possui carácter negativo, restritivo. Sucintamente pode ser compreendida como a
exclusão ou ausência da religião da esfera pública. A laicidade implica a neutralidade do Estado

59
Idem
60
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61
FERREIRA, Da Costa, L., Igreja Ministerial em Moçambique: Caminhos de hoje e amanhã. Lisboa: Editora
Silvas, 1987, pág. 766
32
em matéria religiosa. Esta neutralidade apresenta dois sentidos diferentes, o primeiro já destacado
acima: exclusão da religião do Estado e da esfera pública. Pode-se falar, então, de neutralidade-
exclusão. O segundo sentido refere-se à imparcialidade do Estado com respeito às religiões, o que
resulta na necessidade do Estado em tratar com igualdade as religiões. Trata-se neste caso da
neutralidade-imparcialidade62
No ordenamento jurídico moçambicano A laicidade não se confunde com a liberdade
religiosa, o pluralismo e a tolerância. Estas são consequências, resultados da laicidade. Pode
haver liberdade religiosa, pluralismo e tolerância sem que haja laicidade, como é o caso da Grã-
Bretanha e dos países escandinavos. A constituição de, a constituição de 1992 já garantia o
direito à liberdade religiosa a outras religiões além do catolicismo.63
Segundo Adriano Baritussio, apesar da união entre Estado e Igreja Católica, sendo
esta a religião oficial do império, já existia neste período um determinado grau de liberdade
religiosa. É mister frisar que a laicização assim como a secularização são processos sociais que
não podem ser generalizados e universalizados, devendo ser contextualizados histórica e
socialmente.64
Para António Montes Moreira, a laicização e a secularização não ocorrem de
forma idêntica e única nos mais diversos países. Cada país possui um conjunto de características
e circunstâncias sociais e culturais que possibilitam formas variadas e peculiares de laicidade e
secularização. A laicização não é de forma alguma um processo linear ou irreversível. Depois de
um violento processo de laicização ocorrido em Moçambique que levou a perda dos privilégios
que a Igreja Católica possuía na nação moçambicana, há um retorno a uma situação de
confessionalidade de Estado, de monopólio religioso. Fazendo com que este retomasse uma série
de privilégios que foram perdidos, dentre eles a volta do ensino religioso confessional católico
nas escolas públicas.65
Na actualidade, o principal ponto de avanço na consolidação da laicidade foi a
aprovação, da constituição da república de moçambique em Dezembro de 2004, que recomendou

62
MARTINS, Oliveira, Liberdade de Culto, in Política e História, Plural Editores, Maputo 1998, pág. 832
63
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64
BARITUSSIO, Adriano, Moçambique, 50 anos de Presença dos Missionários Combonianos, Roma: MCR, 2015,
pág. 562
65
MOREIRA, António Montes, A liberdade religiosa, Braga, 1971, pág. 652
33
e visa assegurar a observância do princípio constitucional da laicidade nas funções executiva,
legislativa e judiciária no Estado moçambique.66
Inclusive com a adopção de políticas públicas que reforcem a neutralidade estatal
em sua actuação frente às questões religiosas. Outrossim já surge a proposta de 2020 sobre a
liberdade religiosa. Por meio dessa proposta, recomenda-se aos ramos do Ministério Público e às
unidades dos Ministérios Públicos dos Estados a empenharem esforços para a elaboração e a
implementação de políticas públicas e medidas administrativas pautadas no princípio da laicidade
frente às orientações religiosas. Dentre as directrizes a serem adoptadas por esses órgãos, está a
de fomentar medidas representativas da aplicação da laicidade, e a conscientização de seus
agentes e servidores.67
2.3.2.6.4.1 A liberdade religiosa no Direito constitucional actual
A liberdade religiosa aparece indissociável, como não podia deixar de ser, da
liberdade de consciência. No entanto, não se lhe assimila, visto que a liberdade de consciência é
mais ampla e compreende quer a liberdade de ter ou não ter religião (e de ter qualquer religião)
quer a liberdade de convicções de natureza não religiosa (filosófica, designadamente); e, depois
porque a liberdade de consciência vale, por definição, só para o foro individual, ao passo que a
liberdade religiosa possui (como já se acentuou) também uma dimensão social e institucional.
Numa análise sistemática do texto constitucional cabe apontar diferentes níveis de
conteúdo da liberdade religiosa: os direitos individuais, os direitos institucionais e as respectivas
garantias; os direitos conexos e as garantias institucionais; e as interferências com outros direitos
e garantias e ela compreende a liberdade de manifestar a religião, separadamente ou em comum,
tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto ou pelos.
Ninguém pode ser perseguido, privado de um direito ou isento de obrigações ou
deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa ninguém pode ser perguntado
por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou práticas religiosas, salvo para recolha de
dados estatísticos não individualmente identificáveis, nem ser prejudicado por se recusar a
responder.
A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes à fé
religiosa garantindo o direito à objecção de consciência nos termos da lei e não se confinando a
objecção ao serviço militar, pois pode abranger quaisquer adstrições colectivas que contendam
66
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67
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34
com as crenças e convicções; – A liberdade de consciência e de religião é um dos direitos
fundamentais que, em caso algum, podem ser suspensos em estado de sítio ou em estado de
emergência.
A separação das Igrejas do Estado e a liberdade religiosa constituem limites
materiais de revisão constitucional, cláusulas pétreas no plano institucional, a Constituição
assegura: as Igrejas e outras comunidades religiosas estão separadas do Estado e são livres na sua
organização as Igrejas e outras comunidades religiosas são livres no exercício das suas funções e
do culto é garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticado no âmbito da respectiva
confissão é garantida a utilização de meios de comunicação social próprios das confissões
religiosas para o prosseguimento das suas actividades e, por conseguinte, os jornalistas que neles
trabalhem não podem intervir na sua orientação editorial conexas ou complementares da
liberdade religiosa são, muito particularmente, as regras que estabelecem: o direito à reserva da
intimidade da vida privada A diversidade de formas de celebração do casamento, com requisitos
e efeitos regulados por lei formas essas que devem propiciar a celebração do casamento de
harmonia com as crenças e convicções dos nubentes.
O direito e o dever dos pais de educação dos filhos, incluindo a educação religiosa
(ou não religiosa); não poder o Estado atribuir-se o direito de programar a educação e a cultura
segundo quaisquer directrizes religiosas ou seja, não poder afectar o pluralismo religioso, nem
interferir nas opções e orientações de sentido religioso que se manifestem no domínio da
educação e da cultura;
Não ser o ensino público confessional o que carece de ser devidamente
interpretado, conforme se tentará fazer mais adiante; – Ser garantido o direito de criação de
escolas particulares e cooperativasas quais podem optar por projectos educativos mais
consentâneos com esta ou aquela religião. V – Interferências com outros direitos ou delimitação
do âmbito da liberdade religiosa e de outros direitos (para garantia dela e destes) vêm a ser ainda:
não poderem os partidos políticos, sem prejuízo da filosofia ou ideologia inspiradora do seu
programa, usar denominação que contenha expressões directamente igualdade, de separação, de
não confessionalidade, de cooperação e de tolerância.
No essencial, o princípio da não confessionalidade consiste em o Estado não
adoptar nenhuma religião, nem se pronunciar sobre questões religiosas (art. 4º, nº 1). O Estado
cooperará com as igrejas e comunidades religiosas radicadas em Portugal28 , tendo em
35
consideração a sua representatividade, com vista designadamente à promoção dos direitos
humanos, do desenvolvimento integral de cada pessoa e dos valores da paz, da liberdade, da
solidariedade e da tolerância Segundo o princípio da tolerância, os conflitos entre a liberdade de
consciência, de religião e de culto de uma pessoa e a de outras ou outras resolver-se-ão com
tolerância, de modo a respeitar quanto possível a liberdade de cada uma. A lei depois trata,
sucessivamente, dos direitos individuais de liberdade religiosa dos direitos colectivos– tudo de
acordo com o princípio da igualdade – do estatuto das Igrejas e comunidades religiosas dos
acordos entre pessoas colectivas religiosas e o Estado da Comissão de Liberdade Religiosa e da
Igreja Católica, ressalvando a Concordata entre Portugal e a Santa Sé). Nas comunidades
religiosas avultam as radicadas aquelas com mais de 30 anos de presença social organizada em
Portugal e as igrejas ou comunidades religiosas fundadas no estrangeiro há mais de 60 anos São
elas, ou as suas federações, que celebram acordos com o Estado sobre matérias de interesse
comum, sujeitos a aprovação do Parlamento.
Quanto à Comissão de Liberdade Religiosa é um órgão consultivo, em que entram
pessoas designadas pelas confissões religiosas e que, à semelhança de outros órgãos existentes no
Direito português, é instrumento de defesa e de realização desse direito fundamental, do princípio
fundamental da separação entre o Estado e as Igrejas não resulta qualquer imposição
constitucional da adopção de uma regulamentação geral totalmente indiferenciada do fenómeno
religioso – numa lógica de estrita e absoluto separação – em detrimento de uma regulamentação
pactícia das relações entre o Estado e as confissões religiosas. Daí a admissibilidade e a razão de
ser da nova Concordata do Estado Português com a Santa Sé, de 2004, e dos acordos com outras
Igrejas, comunidades religiosas radicadas no País ou as federações em que as mesmas se
integram.

Pode perguntar-se se este dualismo se compagina com a ausência de qualquer


menção específica à Igreja Católica no texto constitucional, ao contrário do que faziam as
Constituições anteriores, menos a de 1911, e do que ainda fazem Constituições doutros países.
Mas o essencial consiste em que qualquer diferenciação não envolva privilégio ou discriminação;
se não envolverá, não poderá considerar-se inconstitucional. Trata-se, de resto, de um dualismo
muito menos significativo do que prima facie se suporia, porque, no essencial, o novo estatuto
concordatário não se afasta do regime e porque o sentido útil hoje deste diploma não é senão o de

36
não aplicar à Igreja Católica as disposições relativas às Igrejas ou comunidades religiosas
inscritas ou radicadas no País. De resto, a diferença entre a Concordata e os acordos com outras
confissões está em que estes são actos de Direito interno e a Concordata é um tratado, por a Santa
Sé, organização suprema da Igreja Católica, ser um sujeito de Direito internacional.

Com isto, nota-se que Desde os primórdios, as sociedades humanas estão


directamente ligadas a uma determinada religiosidade. Diversas civilizações se desenvolveram
sob a égide do Estado Teocrático, onde a figura do governante era absoluta e justificada como
vontade divina, ou seja, a limitação do poder era feito pela divindade. Podemos observar que na
história da humanidade sempre se procurou demonstrar que ao longo dos tempos, os Estados se
utilizaram da religião como forma de domínio sobre seus governados. E exactamente por pensar
assim, a vontade estatal devia prevalecer a qualquer custo, pouco importando a vontade
individual. Todo aquele que não se adequasse às regras, era tido como criminoso e condenado à
perda de direitos, bens, liberdade de locomoção e à própria vida e ainda que se reconhecesse que
a consciência e as convicções de cada um eram íntimas e incoercíveis, sua exteriorização não era
livre.
Os movimentos sociopolíticos e culturais, tais como o Renascimento, o
Iluminismo, a Reforma Protestante, as Revoluções Americanas e Francesa, contribuíram de
forma preciosa para a conquista do direito à liberdade religiosa, à medida que propagavam que o
homem devia pensar por si próprio. Esses movimentos procuraram se rebelar contra esse modelo
teocrático, pois acreditavam que cada indivíduo tinha o direito de viver conforme suas próprias
convicções e consciência. Essa ideia de autodeterminação do indivíduo ganhou força, culminando
no reconhecimento do direito fundamental à liberdade de pensamento, de crença e, por fim, de
religião.
A liberdade religiosa ou de crença consiste na liberdade de pensamento, seja no
campo espiritual ou religioso. Importante mencionar que o reconhecimento do direito à liberdade
religiosa só ganhou maior relevo no século XX, quando foi universalizado por quatro
documentos internacionais: Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948); Convenção
Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966); Declaração das Nações Unidas sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e de Discriminação com base na Religião ou
Crença (1981) e o Documento Final de Viena (1989). Os documentos mencionados não são os

37
únicos, mas são os pilares do princípio do direito à liberdade religiosa, porque reconheceram
direitos religiosos de suma importância e reconheceram a liberdade religiosa como um direito
universal.
A Carta Magna de 1988 prevê em seu texto a liberdade religiosa como um
princípio constitucional implícito o qual não necessita de regulamentação, tendo este aplicação
imediata. O No período Colonial, Estado e Igreja andavam lado a lado e a religião oficial do país
era a Católica Apostólica Romana, sendo que aos colonos era vedado qualquer tipo de
manifestação religiosa diferente da adoptada. Com o fim do período colonial e a entrada do
período Monárquico, houve maior tolerância com as questões religiosas.

38
CAPÍTULO III: ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS SOBRE O PRINCÍPIO
DA LAICIDADE FACE AS MANIFESTAÇÕES RELIGIOSAS NO ORDENAMENTO
JURÍDICO MOÇAMBICANO
3. À liberdade religiosa e aplicação efectiva no ordenamento jurídico moçambicano
Moçambique é um estado secular (artigo 12.º CRM)68. A liberdade religiosa está
consagrada na Constituição e nas leis do país. A Constituição proíbe a discriminação por motivos
religiosos e garante a liberdade de expressão religiosa. O artigo 54 69
da CRM afirma: “Todos os
cidadãos têm liberdade para praticar ou não praticar uma religião.” “As denominações religiosas
têm direito a procurar realizar os seus objectivos religiosos livremente e a serem proprietários ou
adquirirem bens para a realização dos seus objectivos.”70
Segundo o relatório 2021, sobre a liberdade religiosa, salienta que em geral, estes
princípios têm sido respeitados por cada Governo desde que a guerra civil (1977-1992) terminou.
Até essa altura, a liberdade religiosa era, na melhor das hipóteses, tolerada pelo então regime
marxista-leninista no poder. Actualmente, as ONG, incluindo as ONG religiosas, devem registar-
se junto do Ministério da Justiça. As organizações religiosas são autorizadas a terem a
propriedade e a gestão de escolas. A instrução religiosa nas escolas públicas é proibida.71
Um acordo entre a República de Moçambique e o Vaticano assinado em 2012 governa a
relação entre o Estado e a Igreja Católica. O acordo firma que a Igreja é legalmente independente
e que tem direito a organizar os seus assuntos internos e a nomear pessoal e outros
colaboradores.72
Em Moçambique, o sul e as cidades são predominantemente cristãos, e é no norte
e nas zonas costeiras que se encontram muitos muçulmanos (a maioria sunitas). Mas as religiões
tradicionais africanas estão também fortemente representadas, em particular nas zonas rurais.
A vida religiosa em Moçambique é diversificada e muito dinâmica. Devido à partilha da língua, o
país atrai muitos missionários evangélicos do Brasil, como por exemplo os da Igreja Universal do

68
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República, Edição Revista e actualizada, Minerva Press,
Maputo, 2018, artigo 12º
69
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República, Edição Revista e actualizada, Minerva Press,
Maputo, 2018, artigo 54º
70
GABINETE PARA A LIBERDADE RELIGIOSA INTERNACIONAL https://www.state.gov/reports/2018-report-
on-international-religious-freedom/mozambique/ Acessado no dia 14 Maio de 2022;
71
LIBERDADE RELIGIOSA NO MUNDO-RELATÓRIO 2021: https://mz.usembassy.gov/pt/mozambique-2018-
international-religious-freedom-report-pt/ Acessado no dia 09 Maio de 2022). 
72
LIBERDADE RELIGIOSA NO MUNDO-RELATÓRIO 2021: https://mz.usembassy.gov/pt/mozambique-2018-
international-religious-freedom-report-pt/ Acessado no dia 09 Maio de 2022). 
39
Reino de Deus. As relações entre o Cristianismo e o Islamismo em Moçambique têm sido
historicamente calmas, marcadas pela coexistência respeitadora e pela deferência às tradições de
cada um. Recentemente, no entanto, as relações têm sido desafiadas por uma crescente
insurreição islamista no norte do país.73
A violência, consequência da pobreza, da corrupção e da frustração entre os jovens
desfavorecidos, é alimentada por insurgentes islâmicos fundamentalistas que entram através dos
países vizinhos e por jovens pregadores islâmicos que regressam a Moçambique com estudos em
países como o Egipto, Kuwait, Arábia Saudita e África do Sul imbuídos de uma interpretação
estrita do Islão.74
As Igrejas, em especial a Igreja Católica, desempenharam um papel crucial no fim
da guerra civil entre a Renamo e a Frelimo. Graças a este envolvimento, a Igreja ganhou
credibilidade e influência em Moçambique.
Apesar de décadas de paz, a situação política do país não está, de forma alguma,
livre de problemas. A Frelimo, partido no poder, mudou do marxismo para a social-democracia e
tem estado no poder sem interrupção desde a independência em 1975. Mas as últimas eleições,
em Outubro de 2019, foram contestadas.
3.1. Transfusão de Sangue e Testemunhas de Jeová
A religião denominada Testemunha de Jeová foi fundada nos Estados Unidos por
volta de 1870, mais precisamente no Estado da Pensilvânia. Charles estava desapontado com as
religiões e acabou perdendo sua fé na Bíblia, todavia, após assistir a um culto de uma Igreja
Adventista no ano de 1869 recuperou sua fé e fundou um grupo independente de estudos
bíblicos17 . Na década de 30, esses estudiosos passaram a demonstrar a importância no nome de
Deus, como também o testemunho ora devido fazendo referências a textos bíblicos tais como de
Isaías 43,8-12, que diz: “Vós sois as minhas testemunhas, é a pronunciação de Jeová, e eu sou
Deus”. Assim passaram a adoptar na nomenclatura Testemunhas de Jeová como a mais adequada.
As Testemunhas de Jeová crêem que a Bíblia é a palavra de Deus e a interpretam
em seu sentido literal. Acreditam que somente cento e quarenta e quatro mil pessoas irão para o
céu e governarão com Cristo. Essa religião não crê na Trindade, não comemora o Natal, a Páscoa

73
GABINETE PARA A LIBERDADE RELIGIOSA INTERNACIONAL https://www.state.gov/reports/2018-report-
on-international-religious-freedom/mozambique/ Acessado no dia 14 Maio de 2022;
74
LIBERDADE RELIGIOSA NO MUNDO-RELATÓRIO 2021: https://mz.usembassy.gov/pt/mozambique-2018-
international-religious-freedom-report-pt/ Acessado no dia 09 Maio de 2022).
40
ou os aniversários; não acredita que Jesus tenha morrido na cruz, mas sim em um poste ou estaca;
pregam que a alma continua viva após a morte.
Condenam a prática do aborto; não admitem o maltrato e a morte de animais por
exporte ou prazer (Provérbios 12,10), etc . Uma das questões mais polémicas envolvendo os
adeptos da religião Testemunhas de Jeová diz respeito à restrição no tocante a transfusão
sanguínea e qualquer outro tratamento que envolva sangue, pois a controvérsia gira em torno de
vários direitos fundamentais como o direito a liberdade religiosa, aí englobando o direito de
crença, o direito à vida e o exercício da autonomia privada. Os professantes da religião
Testemunhas de Jeová não admitem qualquer tipo de transfusão de sangue, seja para receber ou
doar, seja esta total ou contendo qualquer dos quatro elementos sanguíneos, tais como glóbulos
vermelhos, glóbulos brancos, plaquetas e plasma.
Inobstante a maioria dos textos sagrados façam menção somente ao sangue animal
e sua ingestão através da alimentação, as Testemunhas de Jeová acreditam que o sangue humano
também faz parte da proibição divina. Segundo as testemunhas de Jeová, aqueles que não
respeitarem o ensinamento divino sobre a abstenção de sangue, deveriam ser desassociados da
congregação. No entanto, a recusa ao tratamento feito por transfusão sanguínea nunca foi bem
aceita pela sociedade, pela classe médica e jurídica, motivo pelo qual as testemunhas de Jeová
passaram a ser pressionadas, até mesmo porque era o bem da vida que estava ameaçado. No
início da década de 1960, os praticantes dessa religião passaram a visitar seus médicos
requerendo que tal restrição fosse devidamente anotada em seus prontuários.
Nos idos de 1970, as testemunhas de Jeová passaram a portar um cartão de
identificação informando que não aceitavam receber transfusão sanguínea. Finalmente, foram
criadas as Comissões de Ligação com Hospitais (COLIH) que tinham a finalidade de auxiliar
médicos, hospitais e juízes nesta questão, expondo alternativas aceitas pela religião. Segundo os
praticantes da religião testemunhas de Jeová, existem tratamentos alternativos que não requerem
uso de sangue ou plasma sanguíneo. Segundo os adeptos dessa religião, com relação ao plasma
podem ser utilizados expansores sanguíneos (líquidos com propriedades especiais) e tratamento
em câmaras hiperbáricas.
Quanto aos glóbulos vermelhos, sugerem que sejam ministrados aos fiéis altas
concentrações de ferro, que auxiliaria na produção desse componente sanguíneo, ou pela

41
utilização de hormônio sintético eritropoietina, que estimula a medula óssea à produção de
hemácias.
Contudo, e não poderia ser diferente, na medicina não há consenso sobre esse
assunto, pois os médicos que se posicionam de forma contrária, argumentam que as alternativas à
transfusão sanguínea através dos chamados substitutos do sangue ou sangue artificial não se
mostraram eficazes e seguras. Argumentam que a utilização isolada desses líquidos “substitutos
do sangue” não substituem os componentes do sangue e, na maioria dos casos, os efeitos
adversos são maiores que os riscos gerados pelo uso dos componentes sanguíneos . Para
explicitar melhor a questão, necessário se faz a análise de casos concretos, tomando como base os
textos sagrados e as normas jurídicas que regem o assunto. A situação da transfusão de sangue
em Testemunhas de Jeová é muito delicada e coloca em conflito dois princípios individuais: o
direito à vida e a liberdade religiosa.
3.1.4.1.2. A liberdade Religiosa e o Direito a Vida
O Direito à Vida, encontra-se consagrado constitucionalmente, dai que sendo tal
direito garantido constitucionalmente, cabe ao Estado assegurar o direito à vida em sua dupla
acepção, garantindo aos cidadãos o direito de continuar vivo e o de viver de forma digna, “o
direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à
existência e exercício de todos os demais direitos”. Por ser um direito absoluto, inato e
indisponível, a sua tutela independe da vontade do indivíduo, sendo que qualquer manifestação
de vontade no sentido de alterar esse aspecto do direito à vida é totalmente ineficaz.
Temos que são totalmente nulos os actos da pessoa que coloca sua vida à
disposição ou submete-se a grave perigo. Já o direito à liberdade religiosa consiste no direito
conferido ao indivíduo de adorar Deus de acordo com sua crença e seu culto. Dessa forma, não
cabe ao Estado impor a seus governados determinada religião e tampouco impedir alguém de
professar determinada crença, mas sim propiciar aos cidadãos um ambiente em que ele possa ser
livre para cultuar a religião que melhor lhe aprouver.
A liberdade religiosa contempla uma tríplice vertente: a liberdade de crença, a
liberdade de culto e a liberdade de organização religiosa. Segundo o mencionado doutrinador, a
liberdade de crença consiste na liberdade de escolha da religião a ser seguida, a liberdade de
mudar de religião, como também a liberdade de não aderir a nenhuma religião ou simplesmente
de não crer em nada. Já a liberdade de culto consiste no direito que o indivíduo de tem

42
exteriorizar sua crença através da prática dos ritos de sua religião. Ao Estado não cabe embaraçar
ou subvencionar a prática de qualquer culto ou cerimónia religiosa. Já a liberdade de organização
religiosa diz respeito a possibilidade de estabelecimento e organização de igrejas. Conforme dito,
baseado em convicção religiosa e na interpretação dos textos bíblicos, as Testemunhas de Jeová
não aceitam nenhum tratamento que envolva transfusão sanguínea, mesmo em situações de
urgência ou perigo iminente. Argumentam que existem tratamentos alternativos que evitam a
transfusão sanguínea. Contudo não se pode olvidar que existem casos em que o tratamento
alternativo não é suficiente para garantir a vida do paciente, sendo a transfusão o único meio,
como por exemplo, no caso de uma hemorragia aguda.
Evidentemente diante dos casos concretos podemos observar que cabe ao poder
judiciário analisar os mesmos de forma mais aprofundada a fim de evitar qualquer prejuízo ao
direito fundamental. Nesse caso, há evidente conflito entre o direito à vida e o direito à liberdade
religiosa. Nesse caso, como o princípio fundamental consistente no direito à vida orienta todo o
sistema normativo, deve preceder e prevalecer sobre todos os demais direitos fundamentais,
inclusive sobre o direito à liberdade religiosa.
3.1.4.1.3. O quadro legal da laicidade no ordenamento jurídico moçambicano
A Constituição define o país como um estado laico. Proíbe a discriminação
baseada na religião, prevê o direito dos cidadãos de praticarem uma religião, e estipula que
nenhum indivíduo pode ser privado dos seus direitos por causa da fé ou prática religiosa. Os
partidos políticos estão constitucionalmente proibidos de usar nomes e símbolos associados a
grupos religiosos. A Constituição protege os locais de culto e o direito dos grupos religiosos de se
organizar, adorar e seguir livremente os seus objectivos religiosos e adquirirem activos na
prossecução desses objectivos. Reconhece o direito de objecção criteriosa ao serviço militar por
razões religiosas. Estes e outros direitos só podem ser temporariamente suspensos ou restringidos
na eventualidade de uma declaração de estado de guerra, sítio ou emergência, em conformidade
com os termos da Constituição.
Para Gil Cistac, a liberdade religiosa aparece indissociável, como não podia deixar
de ser, da liberdade de consciência. No entanto, não se lhe assimila, visto que a liberdade de
consciência é mais ampla e compreende quer a liberdade de ter ou não ter religião (e de ter
qualquer religião) quer a liberdade de convicções de natureza não religiosa (filosófica,
designadamente); e, depois porque a liberdade de consciência vale, por definição, só para o foro

43
individual, ao passo que a liberdade religiosa possui (como já se acentuou) também uma
dimensão social e institucional. Numa análise sistemática do texto constitucional cabe apontar
diferentes níveis de conteúdo da liberdade religiosa: os direitos individuais, os direitos
institucionais e as respetivas garantias; os direitos conexos e as garantias institucionais; e as
interferências com outros direitos e garantias.
Como fenómeno que penetra nas esferas mais íntimas da consciência humana e,
simultaneamente, se manifesta em grandes movimentos colectivos, o fenómeno religioso tem tido
sempre importantíssima projecção política e jurídico-política. Tem influído constantemente não
só na história cultural mas também na história política. Nenhuma Constituição deixa de o
considerar e repercute-se ainda no Direito internacional. Apresentam-se, no entanto, muito
diferentes, conforme as épocas e os lugares, os tipos de Estado e os regimes políticos, o sentido
da sua relevância e o teor das relações entre poder público e confissões religiosas. E não admira
que seja assim, em consequência da própria diversidade de religiões, das concepções subjacentes
à comunidade política, das finalidades assumidas pelo Estado, de todos os mutáveis
condicionalismos culturais, económicos e sociais.

44
CONCLUSÃO
No término trabalho, chegamos a seguinte visão conclusiva, em primeiro lugar,
numa sociedade moderna como a nossa, tem-se assistido diversas complicações ao princípio da
laicidade e abusos fraudulentos a liberdade religiosa. Por muito tempo se viveu este problema
dentro da sociedade e ainda tem-se vivido, em que as pessoas têm perdido a ciência do respeito
ao princípio da laicidade e consequente o extravaso da liberdade religiosa, apos muito se ter
notado este desrespeito, houve focos de criação de norma específica sobre a liberdade religiosa.
No discorrer do trabalho se entendeu que há varias dimensões de restrições da
liberdade religiosa pelo princípio da liberdade religiosa numa sociedade em que é necessário uma
resposta imediata. Para que o princípio da laicidade possa ser aplicado em respeito a liberdade
religiosa, é imperioso que o ordenamento jurídico declare por uma norma a concretização dos
limites da liberdade religiosa. Além disso, se faz necessário que o ordenamento jurídico considere
a existência desses limites.
Dai que nos prendemos de que, conferir limites a liberdade religiosa será um meio
que o sistema jurídico moçambicano encontrará para as tornar eficaz o uso deste direito e no seu
respeito, lhes conferindo uma norma e estatuto próprio, inclusive permitindo o cidadão, até, tenha
a sua responsabilidade limitada ao acionar o direito a liberdade religiosa enquanto ser integrado
na sociedade. E que o principio da laicidade é de longe e meramente, é uma forma de barrar e
criar obstáculos para que os cidadãos não usem fraudulentamente a o direito que lhes é conferido
por lei e que os direitos fundamentais estejam protegidos, pese em bora tendo uma visão
holística, se esta a violar intimamente o princípio da laicidade.
A maquina legislativa ao tentar introduzir esta nova figura (liberdade religiosa
numa norma especifica) no ordenamento jurídico moçambicano, quer se acreditar que estaria a
pensar na protecção dos direitos fundamentais, para isso, será necessário usar este instituto
jurídico a quando o uso ilícito da liberdade religiosa, dito e feito que o legislador trouxe na CRM
situações em que se deve limitar o direito a liberdade religiosa, mas não sendo claro fazendo com
que aparentemente se esteja num intervalo fechado.
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Mas não se pode negar que o Estado superou-se a nível de controlo das
manifestações religiosas, superação essa que se dá por intermédio da limitação, que deve ser
aplicada de modo parcimonioso, com cautela, a fim de que seja evitada a negação do princípio
básico da laicidade, que é a distinta da liberdade religiosa.

No entanto, ao contrário do que muitos pensam, o instituto da laicidade não vem


para acabar com o princípio da liberdade religiosa, e sim fortalece-lo, haja vista que algumas
pessoas se aproveitando da condição de não ter uma norma específica sobre os limites da
liberdade religiosa, agem de má-fé.

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SUGESTÕES
Já terminado o trabalho e tendo instrumentos necessários que foram
imprescindíveis para a elaboração do mesmo, me sinto na divida de deixar ficar aqui algumas
sugestões, para tal as sugestões são:
 Criação de um regime jurídico específico para a regulamentação da figura da liberdade
religiosa;
 Esclarecimento do princípio da laicidade e da liberdade religiosa;
 Demonstração da situação real e do cenário da liberdade religiosa no ordenamento
jurídico moçambicano;
 Indicação de situações gerais e abstractas do princípio da laicidade;
 O extravaso da liberdade religiosa e é em si mesmo um desvio aos vectores fundamentais
do direito. Sugere-se que não deve ser decretada de ânimo leve, mas apenas quando
da sua não aplicação resultar um dano mais intenso. Nessa medida, deve ser
preferida sempre que possível a solução menos gravosa desde que adequada e suficiente
aos contornos do problema. Tal como sustentámos neste trabalho bastará para a
generalidade das ocorrências a mera suspensão, concreta e temporária;
 Elaboração e publicação imediata da lei sobre a liberdade religiosa no ordenamento
jurídico moçambicano.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Legislação

 REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República, Edição Revista e


actualizada, Minerva Press, Maputo, 2018
 REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Proposta de lei da liberdade religiosa, 2020

Doutrina

 FRANCO, António De Sousa, A Liberdade Religiosa e o Projecto do Código Civil,


Braga, 1967;
 MOREIRA, António Montes, A liberdade religiosa, Braga, 1971;
 ALFARO, Juan, Teologia da Justiça, Edições Paulinas, Vol: III, São Paulo: Paulinas
Editora, 1978.
 BORGES DE PINHO, Liberdade religiosa e ecumenismo, in Liberdade religiosa –
realidade e perspectivas, obra colectiva, Lisboa, 1998;
 ALTUNA, R. R, De Asúa, Cultura Tradicional banta, 2ª edição, Luanda: Edições
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 BARITUSSIO, Adriano, Moçambique, 50 anos de Presença dos Missionários
Combonianos, Roma: MCR, 2015;
 CNBB, A Igreja e a Política: Subsídios teológicos. IIIª Edição, São Paulo: Edições
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amanhã. Lisboa: Editora Silvas, 1987;
 GARCIA, Maria Da Glória, Liberdade de consciência e liberdade religiosa, in Direito e
Justiça, 1997
 CISTAC, Gil, Direito constitucional e os direitos fundamentais, Vol. 2, plural Editores,
Maputo, 2012;
 CRUZ, Manuel Braga Da, O Estado Novo e a Igreja Católica, Maputo, 1998;
 ADRAGÃO, Paulo Pulido, A liberdade religiosa e o Estado, Coimbra: Almedina, 2002;

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 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional. Coimbra: Almedina, 2002;
 MACHADO, Jónatas Eduardo Mendes, Liberdade religiosa numa comunidade
constitucional inclusiva, Coimbra: Coimbra, 2006
 MARTINS, Oliveira, Liberdade de Culto, in Política e História, Plural Editores, Maputo
1998;
 AUGUSTO, Lacerda, liberdade religiosa e a lacidade em Moçambique, Vol. 1, Plural
editores, Maputo, 2006.

Sites

 GABINETE PARA A LIBERDADE RELIGIOSA INTERNACIONAL


https://www.state.gov/reports/2018-report-on-international-religious-freedom/
mozambique/ Acessado no dia 14 Maio de 2022;

 "Governo procura colocar ordem no mundo religioso”, Portal do Governo de


Moçambique, https://www.portaldogoverno.gov.mz/por/Imprensa/Noticias/Governo-
procura-colocar-ordem-no-mundo-religioso Acessado no dia 11 Maio de 2022). 
 LIBERDADE RELIGIOSA NO MUNDO-RELATÓRIO 2021:
https://mz.usembassy.gov/pt/mozambique-2018-international-religious-freedom-
report-pt/ Acessado no dia 09 Maio de 2022). 

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