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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE DIREITO

DENÍLSON ZEFERINO RAIMUNDO


ELOISA CALADO
OSVALDO MANUEL MAQUIA
PALMIRA NICOLE JUSTINO ARTUR
SIMÃO ALBERTO
VILOY PEDRO MOMADE

INTERPRETAÇÃO DA NORMA ESTRANGEIRA

NAMPULA
2022
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE
FACULDADE DE DIREITO

DENÍLSON ZEFERINO RAIMUNDO


ELOISA CALADO
OSVALDO MANUEL MAQUIA
PALMIRA NICOLE JUSTINO ARTUR
SIMÃO ALBERTO
VILOY PEDRO MOMADE

INTERPRETAÇÃO DA NORMA DE CONFLITO

Trabalho de carácter avaliativo da cadeira de


Direito Internacional Privado, referente ao 1o
semestre, Curso de Direito, 4o ano, Curso
Diurno, leccionada pela docente: MA.
Desejado Gabriel Mepina.

NAMPULA
2022
Lista de abreviatura
Art. – Artigo
CC- Código Civil
Cfr. - Conferir
CPC - Código Processual Civil
DIP - Direito Internacional Privado
Ed. - Edição
Idem - o mesmo que o anterior
Nº - Número
Ob. Cit. - Obra Citada
P. - Página
SS - E seguintes
Vol. - volume
Índic
e
Introdução...................................................................................................................................2

INTERPRETAÇÃO DA NORMA ESTRANGEIRA................................................................3

1.1. Noções preliminares 3

1.2. Prova Da Existência E Averiguação Do Conteúdo Do Direito Estrangeiro.............6

1.3. Solução Adoptada Pelo Legislador Moçambicano......................................................7

1.4. Consequências Da Falta De Provas..............................................................................8

Conclusão..................................................................................................................................10

Referências Bibliográficas........................................................................................................12
Introdução

O presente trabalho em grupo de carácter avaliativo da cadeira de Direito


Internacional Privado, Interpretação da norma estrangeira, vem fazer uma abordagem de
forma sintética e esgotada dos aspectos relevantes que vai desde os conceitos relacionados ao
tema até aos aspectos que dizem respeito de forma concreta a interpretação da norma
estrangeira.
Numa primeira instância importa salientar que a Interpretação da lei vai
consistir numa actividade intelectual ou uma operação técnico- jurídica, em vista a determinar
o verdadeiro sentido e alcance da normas jurídica. Nesta senda dizer, que a actividade de
interpretação da lei não pertence apenas ao legislador, mas também a todos os que entram em
contacto com a lei, quer seja advogado ou juiz ou procurador quer seja um cidadão comum.

Indo mais além ,concretamente aos objectivos, importe frisar que o trabalho
tem como objectivo geral:
 Esclarecer como é feita a interpretação da norma estrangeira.

Objectivos específicos:
 Fazer uma breve conceituação dos aspectos relevantes para o tema com vista a dar
mais ênfase ao trabalho como um todo;
 Identificar os artigos capazes de resolver a problemática da interpretação da norma
estrangeira;
 Trazer a solução adaptada pelo legislador moçambicano.

Para alcançar os objectivos elencados, a metodologia usada na elaboração deste


trabalho foi a dedução onde houve a recolha de informação através de manuais e legislação,
de em seguida, feita a análise e compilação. O presente trabalho segue uma estrutura lógica,
estando dividido em partes sendo a primeira parte referente a introdução, a segunda o
desenvolvimento e a terceira a conclusão ou considerações finais e a quarta bibliografia.

2
INTERPRETAÇÃO DA NORMA ESTRANGEIRA

1.1. Noções preliminares

De forma a tornar a abordagem do tema em apreço, convém fazer referência


dos conceitos as palavras que compõem o tema, nesta ordem, a palavra interpretação, em
sentido amplo significa sentido em que se toma o que se ouve ou o que se lê, e que se julga
ser o verdadeiro1.

Por outro lado, em sentido restrito – jurídico, interpretação traduz – se na


operação técnica jurídica tendente a determinar o conteúdo e o sentido das normas jurídicas.
A interpretação pode assumir o carácter de uma norma jurídica e isso acontecera se um ou
vários preceitos de um diploma esclarecerem o sentido de outros ou outros preceitos desse
mesmo diploma ou se, após a publicação de uma lei, se publica uma outra tendente fixar o
sentido da primeira e a eliminar dúvidas que na sua aplicação se tenham suscitados2.

Portanto, na temática sobre a interpretação da norma estrangeira tencionamos


discutir em torno da interpretação que consiste na actividade que o juiz levara a cabo com o
intuído de desmistificar o verdadeiro sentido e alcance da norma estrangeira para posterior
aplicação em um caso concreto.

A interpretação das normas de conflitos de Direito Internacional Privado


comporta, como se verifica, em regra um critério de conexão. Este critério de conexão pode
ser indeterminado, carecendo de ser em função das circunstâncias do caso concreto. O critério
de conexão indeterminado pode ser formulado positivamente (por exemplo, a regra que
atribua competência aos tribunais de um Estado quando este seja o foro mais apropriado) ou
negativamente (por exemplo, a regra que declara. Os tribunais de um Estado
internacionalmente competentes para todas as acções de certo tipo, salvo se o caso não tiver
uma ligação suficiente com o Estado do foro)3.

As normas de competência internacional vigentes na ordem jurídica


moçambicana utilizam, porém, elementos de conexão determinados (por exemplo, domicílio
do réu, lugar do cumprimento da obrigação, lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto

1
Interpretação” in COSTA, João, Dicionário Moderno da língua portuguesa, escolar editora, p. 885.
2
“Interpretação” in PRATA, Ana, Dicionário Jurídico, vol. I, 5ª ed. Editora Almedina, 2006, p. 803.
3
FERNANDES, Carlos, Lições de Direito Internacional Privado I, Volume I, Coimbra Editora,
Coimbra, 1994, p. 39

3
danoso).

Suscitam-se, pois, problemas paralelos de interpretação dos conceitos


designativos do elemento de conexão e de concretização dos elementos de conexão.

A interpretação dos conceitos técnico-jurídicos utilizados para delimitar a


previsão normativa e para designar os elementos de conexão e a concretização dos elementos
de conexão que constituem dados normativos colocam, em ambos os casos, a questão de saber
a que sistema jurídico-material recorrer para o efeito. Por exemplo, qual o significado a
atribuir às expressões “matéria contratual” e “matéria extracontratual” utilizadas em normas
de competência internacional; como determinar o domicílio do réu e o lugar de cumprimento
da obrigação.4 A resposta a estas questões e, até certo ponto, comum no Direito de Conflitos e
no Direito da Competência Internacional. Assim, os critérios de interpretação aplicáveis são
os que regem a interpretação de cada uma destas categorias de normas. Relativamente às
normas de fonte interna deve ter- se em conta o disposto nos arts. 8 e 9 CC e a metodologia
desenvolvida pela ciência disposto jurídica.5

Pode dizer-se que é hoje doutrina geral a de que as normas jurídicas, nacionais
ou internacionais, devem interpretar-se de acordo com o sistema a que pertencem. O n o 1 do
art. 23 do CC6, remete-nos a um direito estrangeiro, no sentido de que o julgador orienta-se
pelas lições da jurisprudência e da doutrina do Estado estrangeiro.

Se o nosso Direito internacional privado nos remete para um direito


estrangeiro, isso significa que há- de ser actuada a valoração jurídico-material desse direito.
Mas o verdadeiro significado e alcance de qualquer norma de um sistema jurídico é algo que,
frequentemente, só a sua aplicação jurisprudencial e a sua interpretação através de certas
regulae artis permitem estabelecer. Por isso se assenta hoje pacificamente na seguinte regra: o
juiz que aplica o direito estrangeiro há-de interpretá-lo de conformidade com a jurisprudência
e doutrina dominantes no país de origem. É esta também a orientação seguida pelo Tribunal
Internacional de justiça7. Por conseguinte, são de observar antes de mais as regras

4
FERNANDES, Carlos, Lições de Direito Internacional Privado I, Volume I, Coimbra Editora, Coimbra,
1994, p. 41.
5
FERNANDES, Carlos, Lições de Direito Internacional Privado I... p.41.
6
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Código Civil, actualizado pelo Decreto-lei 3/2006 de 23 de
Agosto, 5ª edição, Plural Editores, Maputo, 2020.
7
MACHADO, João Baptista, Lições de Direito Internacional Privado, 3a Edição., Almedina
Editora, Coimbra, 2002, p. 244.

4
estrangeiras sobre interpretação.

Assim, o juiz continental que aplica a statute law anglo-saxónica deve ater-se a
uma interpretação predominantemente gramatical e lógica, tal como é de uso nos países
anglo-saxónicos, renunciando à interpretação teleológica. Inversamente, o juiz anglo-
saxónico, ao aplicar regras dos continentais deverá dar preferência à interpretação teleológica
sobre a interpretação lógico-gramatical8.

A jurisprudência e a doutrina estrangeiras devem ser observadas e seguidas


com o mesmo respeito que no respectivo Estado lhes for tributado. O juiz moçambicano só
deverá afastar-se da interpretação usual no Estado estrangeiro cujo direito aplica se tiver bons
fundamentos para crer que essa interpretação, no caso sub judice, não é correcta. Sem dúvida,
ele não é forçado a imitar servilmente, sempre e em cada caso, a interpretação que a uma
regra jurídica é dada no país de origem, não se lhe impõe um tal sacrificium intellectus. No
entanto, como ponto de partida, há que presumir que tal interpretação é a exacta e dela não
deve o juiz arredar-se sem necessidade e bons fundamentos. Se não pode rigorosamente dizer-
se que na interpretação do próprio direito se é arquitecto, ao passo que na interpretação do
direito estrangeiro se é fotógrafo, convém, todavia, ponderar que, no exercício desta ars
inveniendi que é a aplicação do direito, a ousadia ou liberdade na forma de operar deve
proporcionar-se ao conhecimento da matéria, e sem dúvida que o juiz do foro não está tão
familiarizado com o direito estrangeiro como com o seu próprio. Tacto e prudência são
especialmente de recomendar.9

Assim, chama-se especial atenção, ao facto de que, o facto de a mesma regra


jurídica vigorar simultaneamente em vários países não impede que a respectiva interpretação
seja diferente de país para país. Em hipóteses desta natureza, bem como em todos os casos de
disparidade interpretativa, deve sempre ter-se em conta a interpretação que à regra aplicanda é
dada na ordem jurídica que no caso for competente. Isto, mesmo que a referida regra esteja
integrada no próprio ordenamento do foro e aí receba uma interpretação diversa.

Mas frequentemente sucederá encontrar-se a jurisprudência estrangeira


dividida quanto à interpretação de determinado preceito. Como deverá o juiz proceder nesta
hipótese? Se envereda por uma interpretação inteiramente autónoma, corre o risco de
desvirtuar a norma aplicanda, dando a noções jurídicas estrangeiras, ao inseri-las nos quadros
8
MACHADO, João Baptista, Lições de Direito Internacional Privado, 3a Edição., Almedina Editora, Coimbra,
2002, p. 244-245.
9
MACHADO, João Baptista, Lições de Direito Internacional Privado… p.245.
5
conceituais do direito local, um sentido que lhes não é adequado.

Para obviar a tais inconvenientes, convirá que o juiz se integre, na medida do


possível, nas concepções jurídicas próprias do direito aplicando, procurando sempre ater-se à
interpretação que razoavelmente lhe apareça como aquela que virá a prevalecer na
jurisprudência do respectivo país10. Para tanto, basear-se-á eventualmente na opinião da
doutrina dominante nesse país, nas práticas correntes ou nas doutrinas estabelecidas em
sistemas jurídicos aparentados, ou ainda nos princípios gerais de direito.

1.2.
Prova Da Existência E Averiguação Do Conteúdo Do Direito Estrangeiro

Para decidir juridicamente um caso precisa o tribunal de conhecer duas coisas:


os factos e o direito. Em regra, os factos são alegados e provados pelas partes (princípio
dispositivo), ao passo que o direito deverá ser conhecido pelo tribunal, ou ser investigado e
determinado por sua própria iniciativa (princípio da oficiosidade): iura novit cúria14.

Perante o exposto, surge uma questão: poderá exigir-se do tribunal o


conhecimento e a aplicação oficiosa do direito estrangeiro?

Para responder a esta questão, a doutrina apresenta diversas soluções


dependendo do sistema jurídico em vigor em determinado Estado.11 Assim, sucede que:

Nos países anglo-saxónicos, o direito estrangeiro é tratado como um facto que


tem de ser alegado e provado pelas partes. Todavia esta prova, que deve ser feita
principalmente através de peritos, não é actualmente apreciada pelo júri (como a prova dos
factos), mas pelo juiz;

Na França, os tribunais não aplicam por via de regra o direito estrangeiro


oficiosamente, mas apenas quando as partes nele se baseiam. A prova é geralmente posta a
cargo das partes (certificats de coutumes). Na doutrina francesa, porém, continua em aberto a
discussão sobre o problema da aplicação ex officio do direito estrangeiro, bem como a questão
de saber se é susceptível de cassação a sentença que tenha violado esse direito.

Na Alemanha, admite-se que o tribunal deve aplicar ex officio o direito

10
MACHADO, João Baptista, Lições de Direito Internacional Privado, 3a Edição., Almedina Editora,
Coimbra, 2002, p. 246.
11
MACHADO, João Baptista, Lições de Direito Internacional Privado… p.246.
6
estrangeiro e, na medida do possível, investigar por sua iniciativa o respectivo conteúdo. Em
caso de necessidade, poderá exigir a prova deste conteúdo à parte que fundamenta a sua
pretensão vem tal direito.12

1.3.
Solução Adoptada Pelo Legislador Moçambicano

Para o caso de Moçambique, toma-se por base, ao que se encontra disposto no


no 1, art. 348 do CC13, que diz: aquele que invocar direito estrangeiro compete fazer a prova
da sua existência e conteúdo; mas que o tribunal deve procurar, oficiosamente, obter o
respectivo conhecimento. Por outro lado, o no 2 do mesmo artigo resolve uma outra questão
que noutros países tem suscitado dúvidas e que é a da aplicação oficiosa da regra de conflitos
resolve-a no sentido afirmativo, referindo-se à hipótese de nenhuma das partes ter invocado
direito estrangeiro, o que é incontestavelmente a melhor solução14.

Porém, salientar que por força do no 2, art. 348 do CC, o juiz, sempre que lhe
cumpra decidir com base em direito estrangeiro, deve conhecer e aplicar este ex officio, isto é,
independentemente da sua invocação pelas partes.

Com efeito, o objecto da regra de conflitos é promover a justiça do Direito


Internacional Privado, designando a lei que se considera mais apropriada, e não conferir aos
indivíduos prerrogativas as quais eles seriam livres de renunciar. Por outra via, esta atitude
seria de molde a encorajar o forun shopping, isto é, a busca pelos particulares na ordem
internacional de uma autoridade complacente, que seria a lex fori, a fim de obter o que não
poderia ser obtido segundo a lei aplicável18.

Assim, é aquele que invocar direito estrangeiro que compete fazer a prova da
sua existência e conteúdo; mas que isto não isenta o tribunal do dever de procurar obter,
oficiosamente, o respectivo conhecimento. Trata-se, porém, para as partes de uma pura e
simples obrigação de meios, pois que atarefa se pode revelar impossível ou extremamente
difícil.

12
O mesmo se passa no ordenamento austríaco. Solução idêntica vigora na Suécia. É esta também a orientação
actualmente dominante em diversos outros países: o juiz deve conhecer e aplicar oficiosamente o direito
estrangeiro, mas poderá exigir das partes a sua prova, sempre que tal se revele necessário. De igual modo, a
doutrina largamente dominante vota decididamente no sentido da aplicação ex officio do direito estrangeiro e
da admissibilidade de um recurso de cassação ou revista para o Supremo Tribunal com fundamento em
violação, falsa interpretação ou incorrecta aplicação de tal direito.
13
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Código Civil, actualizado pelo Decreto-lei 3/2006 de 23 de Agosto, 5ª
edição, Plural Editores, Maputo, 2020.
14
CORREIA, A. Ferrer, Lições de Direito Internacional Privado I, Almedina Editora, Coimbra, 2002, p. 428.
7
Por outra o art. 721, do CPC15, resulta que a violação do direito estrangeiro,
quer consista em erro de interpretação ou aplicação quer em erro de determinação da norma
aplicável, constitui fundamento do recurso de revista20.

Temos assim que o direito estrangeiro é tratado pela nossa lei, mesmo sob o
aspecto processual, como direito e não como puro facto.

1.4.
Consequências Da Falta De Provas

As consequências da falta de prova do direito estrangeiro aplicável são as


seguintes:

 Uma primeira orientação seria aquela conforme a qual o tribunal deveria pronunciar
um non lique16. Trata-se de uma orientação inaceitável, já que o juiz não pode abster-
se de julgar, a pretexto de falta ou obscuridade insanável da lei 17. Pois a denegação de
justiça é em qualquer caso inadmissível.

 Uma outra solução que pode-se referir é quando o conteúdo geral da lei estrangeira foi
estabelecido, mas não um seu preceito particular, a lei estrangeira deve ser aplicada na
medida em que o tribunal, segundo a sua apreciação, a considere provada. Daqui
resultará que a causa será julgada contra a parte que fundamenta a sua pretensão
justamente no preceito de direito estrangeiro cuja existência e conteúdo não puderam
ser estabelecidos. Com efeito, é de presumir neste caso que a decisão de rejeitar a
pretensão esteia de acordo com o sentido geral da lei estrangeira.

Mas o mesmo se não dirá quando nenhum elemento de prova convincente tiver sido
apresentado relativamente à lei estrangeira considerada no seu todo. São de considerar
duas soluções: Em primeiro, o Juiz decide contra a parte que não conseguiu provar o
conteúdo do direito estrangeiro. Esta solução é tão somente de aprovar na hipótese da
alínea anterior; quanto ao mais, ela estaria em oposição com a concepção do nosso
sistema jurídico, segundo a qual o direito estrangeiro não é tratado como matéria de
facto. Em segundo o tribunal decide de conformidade com a lex fori, sendo esta

15
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Decreto-Lei no 1/2009 de 24 de Abril, Código de Processo Civil.
16
Declaração feita pelo tribunal, de que não lhe é possível decidir litigio que lhe foi submetido.
17
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Código Civil, actualizado pelo Decreto-lei 3/2006 de 23 de Agosto, 5ª
edição, Plural Editores, Maputo, 2020.
8
aplicável a título subsidiário.

Contudo, nenhum argumento de fundo dá base a esta doutrina, nem àquela conforme a
qual, na hipótese que estamos a analısar, deverá presumir-se que as normas da lei
competente não diferem das do direito moçambicano.

Na verdade, o recurso sistemático à lei do foro, como lei subsidiariamente aplicável


ou em virtude da referida presunção de coincidência, poderia conduzir a resultados
que tudo indicasse não estarem de acordo com os preceitos da lei designada pela regra
de conflitos do foro, como por exemplo no caso de a acção a julgar tender ao
reconhecimento da legítima dos filhos do testador, sendo certo que da lei nacional do
de cujus apenas se sabe (mas isso com segurança) que ela pertence ao grupo dos
sistemas jurídicos dos países de Common law. Ora, é de todos conhecido que uma das
características gerais comuns a estes sistemas, em matéria de sucessões por morte, é
exactamente a liberdade de testar (ausência de legitima) dominante não sendo possível
averiguar o conteúdo do direito.25

 Segundo a orientação preconizada pela doutrina alemã actualmente vigente num


determinado Estado, deverá recorrer-se ao direito nele provavelmente vigente. Este
critério levará à aplicação do sistema que se tiver por mais chegado ao designado pela
norma de conflitos do foro. E uma presunção legítima.

1.5.
Desconhecimento Do Conteúdo Do Direito Estrangeiro

Determinado qual o direito estrangeiro aplicável, pode excepcionalmente


acontecer que, apesar das diligências desenvolvidas nesse sentido, em conformidade com o
disposto no citado art. 348 do CC18, pelas partes e pelo tribunal, se não consiga obter a prova
do conteúdo desse direito19. Logo, não sendo possível o conhecimento directo do direito
estrangeiro, impõe-se o recurso as presunções, que são também um modo legitimo de provar.

Assim, no caso em que não for possível operar o art. 348 do CC, para formar a
convicção do juiz poderão contribuir sem dúvida certos elementos de direito comparado,
18
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Código Civil, actualizado pelo Decreto-lei 3/2006 de 23 de Agosto, 5ª
edição, Plural Editores, Maputo, 2020.
19
CORREIA, A. Ferrer, Lições de Direito Internacional Privado I, Almedina Editora, Coimbra, 2002, p. 431
9
como sejam o conhecimento do modelo legislativo que seguiu a legislação estrangeira cuja
aplicação está em causa ou do conteúdo de um dos direitos pertencentes à mesma família ou
grupo de leis, bem como o conhecimento de certos princípios ou tradições jurídicas que
inspiram o direito aplicando. Sendo assim, podemos ter as seguintes situações:

a. Se o tribunal não consegue estabelecer de modo preciso o conteúdo das normas do


direito estrangeiro relativas ao caso sub judice mas consegue informar-se com
segurança acerca dos princípios gerais desse direito na matéria em questão, deverá
decidir o ponto litigioso de harmonia com tais princípios.

b. Imagine-se agora que tudo quanto se conhece acerca do direito estrangeiro aplicável
é ter ele sido fundamente influenciado por outro sistema jurídico. A acção a julgar é
uma acção de divórcio com fundamento em abandono do lar conjugal. No segundo
sistema jurídico (o sistema jurídico-modelo), o divórcio só é admitido com base no
adultério. Posto isto, é de presumir que as normas da legislação competente se não
apartem muito desta linha de orientação e a acção de divórcio será julgada
improcedente: não deve o juiz recorrer aqui aos preceitos da lex fori que autorizariam
o divórcio.

Deverá proceder-se em termos semelhantes, isto é, deverá recorrer-se ao sistema


jurídico inspirador da lei aplicável, sempre que a matéria da causa, pela sua natureza,
contenda directamente quer com linhas gerais do ordenamento jurídico, quer com
características básicas da instituição em apreço, e não com simples aspectos
particulares e por assim dizer insignificativos da regulamentação legal do instituto
em causa. Pode também admitir-se o preenchimento da lacuna do conhecimento do
juiz acerca do direito estrangeiro aplicável através da regra decorrente dos princípios
gerais de direito comuns às nações civilizadas.20

c. Outra relevante presunção a utilizar pelo tribunal é a de que, tendo-se operado no


ordenamento estrangeiro quanto à matéria sub judice uma alteração de regime e não
sendo possível estabelecer directamente o conteúdo da lei nova, a solução que era
dada ao caso pela lei antiga continua a ser válida. Mas esta presunção cederá se a
referida solução se não casar com o espírito (esse conhecido) da nova lei e bem
assim na hipótese de se averiguar que a lei nova (desconhecida tanto nas suas normas
concretas como nas suas características gerais) veio estabelecer uma regulamentação
20
CORREIA, A. Ferrer, Lições de Direito Internacional Privado I, Almedina Editora, Coimbra, 2002, p. 432.
10
inteiramente distinta da anteriormente vigente.

d. Para além dos tipos de situações anteriores, torna-se extremamente arriscado,


cremos, guardar fidelidade ao sistema das presunções, isto é, ao propósito de
averiguar por essa via o conteúdo do direito estrangeiro, sendo, aquele direito
provavelmente vigente no Estado cuja legislação se trata de aplicar.

Persistindo nessa orientação para além dos limites indicados, o risco de se observar
uma norma inteiramente distinta da do ordenamento competente passa, a superar a
probabilidade contrária.

Por isso, pareceu de bom conselho mudar de rumo, adoptar o ponto de vista de que a
conexão estabelecida pela norma de conflitos utilizada nos não permite atingir o alvo
(a designação do direito aplicável) e procurar a solução do problema utilizando a
conexão subsidiária daquela, se uma tal conexão subsidiária estiver adrede prevista
no direito conflitual do foro. Exemplo: na impossibilidade de averiguação do
conteúdo do direito nacional das partes, deverá recorrer-se à lex domicilii;

Conexões há, porém, que não têm sucedâneo: assim, a situação da coisa, como
conexão decisiva em matéria de direitos reais. Por outro lado, o próprio direito
estrangeiro indicado pela conexão subsidiária pode ser, ele também, de conteúdo
incerto. Em todos estes casos, impõe-se a utilização da lex materialis fori: não
porque seja legítimo em geral admitir que as normas da lei estrangeira coincidem
com as da lei do foro, senão apenas para se evitar uma denegação de justiça.

e. Tais as soluções que se preconizam quando encarado o problema em tese geral.


Aparentemente, não está de acordo com as ideias expostas a norma do n° 2 do artigo
23 do CC, porquanto nele se estabelece que, sendo impossível determinar o conteúdo
do direito aplicável, se recorrerá imediatamente à lei que for designada pela conexão
subsidiária. Mas o desacordo só existe na aparência. Com efeito, o texto citado não
exclui pela sua letra a legitimidade do recurso a presunções para se determinar o
conteúdo da lei aplicável. Enquanto não estiver estabelecida a impossibilidade de
determinar, mesmo com o auxílio de presunções, o conteúdo da lei designada como
aplicável pela norma de conflitos, não se verificará manifestamente a hipótese que
condiciona a utilização da conexão subsidiária.

Em suma, a doutrina preconiza que antes da aplicação da lex fori e do direito

11
subsidiariamente competente há que procurar resolver o problema com recurso às seguintes
presunções, que entendem não serem excluídas pelo art. 23:

 Aplicação dos princípios gerais do ordenamento estrangeiro, se forem conhecidos;

 Recurso ao sistema-modelo (conhece-se o sistema que serviu de modelo ao


sistema que se desconhece);

 Recurso à lei antiga se houver razões para presumir que não houve alterações
significativas na matéria jurídica em causa.

Outro problema é o da impossibilidade de determinação da conexão. Os


critérios a seguir serão, neste caso:

 Aplicar a lex fori quando não for possível aplicar a conexão subordinada, por
também ser desconhecida;

 Quando se tratar de optar entre duas conexões possíveis - duas nacionalidades


(não se tem a certeza de qual é verdadeira), dois locais, entre outros - deverá tentar
apurar-se até à exaustão qual a mais provável, se não for possível fazê-lo aplica-
se, então, a lex fori.

1.6.
Impossibilidade De Determinação Da Conexão Relevante

A respeito da verificação concreta da conexão utilizada por certa Regra de


Conflitos pode pôr-se um problema: se não ser possível determinar com segurança se uma
determinada conexão se verifica ou não (por exemplo, se certo indivíduo tem a nacionalidade
de determinado Estado, ou se é apátrida), ou qual o Estado em relação ao qual essa conexão se
verifica (por exemplo, não se sabe se certo indivíduo é holandês ou belga).21

Nestes casos se deve começar por recorrer à regra da maior probabilidade. Se


certo indivíduo é mais provavelmente apátrida do que nacional de certo Estado, deve ser
tratado como apátrida.22 Se o apátrida tem a sua residência mais provavelmente na Bélgica do
que na França, deve aplicar-se o direito belga ao seu estatuto pessoal. Se certo indivíduo é
mais provavelmente alemão do que holandês, será considerado alemão. Porque na verdade, se

21
MACHADO, João Baptista, Lições de Direito Internacional Privado, 3a Ed., Almedina,
Coimbra, 2002, p. 250.
22
Irá pautar-se por esta solução só depois de comprovadamente se averiguar que é impossível determinar, das
duas referidas nacionalidades, qual a mais provável, ou qual o mais provável lugar de domicilio da referida
parte.
12
um indivíduo é de certeza ou holandês ou alemão, não faria sentido considerá-lo apátrida 37.
Tudo depende, evidentemente, de os elementos de prova disponíveis serem ou não bastantes
para criar aquele grau de probabilidade considerado suficiente para as decisões humanas. E o
certo é que, quando a dúvida respeita apenas à questão de saber em relação a qual de dois
Estados a conexão efectivamente se verifica, só muito raramente deixará de haver indícios ou
circunstâncias capazes de fazer presumir como bastante mais provável uma das hipóteses
postas em alternativa38.

É nestes termos que se deve interpretar a segunda parte do no 2 do art. 23 do


CC.

Para a hipótese, porém, de se revelar impossível determinar com suficiente


probabilidade “os elementos de facto ou de direito de que depende a designação da lei
aplicável”, conforme a segunda parte do no 2 do mencionado art. 23 do CC23, este manda
proceder do mesmo modo que na hipótese de impossibilidade de averiguação do conteúdo da
lei aplicável. Quer dizer: deverá recorrer-se a uma conexão subsidiária.24 Na hipótese
extremamente improvável de também não ser possível resolver a dificuldade por esta via,
haverá que, em último termo, aplicar ao caso a lex fori.

23
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Código Civil, actualizado pelo Decreto-lei 3/2006 de 23 de Agosto, 5ª
edição, Plural Editores, Maputo, 2020.
24
MACHADO, João Baptista, Lições de Direito Internacional Privado, 3a Ed., Almedina, Coimbra, 2002, p.
251.
13
Conclusão

Em jeito de conclusão, a que destacar certos pontos referenciais que representam pontos
importantes quando se refere aos Contratos Mercantis.

14
Referências Bibliográficas  

Legislação:

 REPÚPLICA DE MOÇAMBIQUE, Decreto-lei no. 47 344, de 25 de Novembro de


1966: Aprova o Código Civil.

 REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Código de Processo Civil, 2ª edição


revista, minerva editores, Maputo, 2016.

Doutrina:

 CORREIA, A. Ferrer, Lições de Direito Internacional Privado I, Almedina,


Coimbra, 2002.

 COSTA, João, Dicionário Moderno da língua portuguesa, escolar editora,


s/d.
 FERNANDES, Carlos, Lições de Direito Internacional Privado I: Teoria Geral do
DIP com incidência no Sistema Português, Vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 1994.

 MACHADO, João Baptista, Lições de Direito Internacional Privado, 3a


Ed., Almedina, Coimbra, 2002.

 PRATA, Ana, Dicionário Jurídico, volume I, 5ª edição, Almedina Editora, Coimbra,


2008.
 RIBEIRO, Manuel Almeida, Introdução ao Direito Internacional Privado,
Almedina, 2ª reimpressão da edição, Coimbra, 2009.

15

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