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Universidade Aberta ISCED

Instituto de Educação à Distância-Online

Limites a Aplicação do Direito Estrangeiro

Guilhermina Marcos

Curso de Licenciatura em Direito

Cadeira: Direito Internacional Privado

Ano de Frequência: 4°

Pemba, Março 2023


Universidade Aberta ISCED

Instituto de Educação à Distância-Online

Limites a Aplicação do Direito Estrangeiro

Trabalho de Carácter Avaliativo da Cadeira de Direito


Internacional Privado a ser entregue no Instituto de
Educação à Distância-Online

Tutor:

Pemba, Março 2023

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Sumário
1. Introdução.................................................................................................................................1

1.1. Objectivos do Trabalho..........................................................................................................2

1.1.1. Objectivo Geral..................................................................................................................2

1.1.2. Objectivos Específicos.......................................................................................................2

1.2. Metodologias........................................................................................................................2

2. Revisão Literária........................................................................................................................3

2.1. Aspectos Gerais do Direito Internacional Privado.................................................................3

2.1.1. Limites à Aplicação do Direito Estrangeiro........................................................................3

2.1.2. Ordem Pública como Limitador à Aplicação de Direito Estrangeiro..................................3

2.1.3. Aplicação e Interpretação do Direito Estrangeiro Material...............................................4

3. Considerações Finais.................................................................................................................7

4. Literatura Citada........................................................................................................................8

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1. Introdução

Nas sociedades antigas, o estrangeiro, como regra, não gozava de direitos e, como
consequência, não havia conflitos entre ordens jurídicas diversas, razão de ser do direito
internacional privado. A eventual necessidade de julgar os estrangeiros levou à criação de
tribunais excepcionais, como o do Pretor Peregrino, em Roma, e o do Polemarca, em Atenas. Por
outro lado, o Pentateuco continha normas sobre o tratamento equânime do estrangeiro entre o
povo judeu.

Com as invasões bárbaras do século V e o fim do Império Romano, surgiu o sistema da


personalidade da lei, segundo o qual cada indivíduo, em território estrangeiro, gozava do direito
de reger sua vida pelas leis da sua origem. Como cada grupo conservava os seus próprios
costumes, conviviam, portanto, no mesmo território, o direito romano (para reger os antigos
cidadãos romanos) e o de diferentes povos bárbaros. De modo a procurar resolver os conflitos de
leis naturalmente provocados por este estado de coisas, criaram-se certas regras de conflito de
leis, como as que aplicavam a lei do vendedor à compra e venda a da origem nacional do falecido
à sucessão, e a da origem nacional do marido à mulher.

Com isto, posteriormente, a fixação do homem na terra, a organização dos feudos e a


autonomia do senhor feudal marcaram o fim da fase da personalidade da lei e o início da
aplicação do princípio oposto, o da territorialidade da lei. As populações passaram a submeter-se
exclusivamente à lei em vigor em seus territórios, o que impedia o aparecimento de conflitos de
leis.

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1.1.Objectivos do Trabalho

O sucesso de qualquer trabalho de pesquisa depende em parte da clareza na definição


dos objectivos que se pretendem alcançar. Para o presente trabalho definem-se os seguintes
objectivos:

1.1.1. Objectivo Geral


 O objectivo geral deste trabalho de pesquisa é conhecer os limites e a aplicação do direito
estrangeiro.
1.1.2. Objectivos Específicos

Como objectivos específicos cabem destacar dois principais a serem tratados no presente
trabalho de pesquisa:

 Caracterizar os limites da aplicação do direito estrangeiro;


 Analisar aplicação e interpretação do direito estrangeiro material.
1.2.Metodologias

A metodologia aplicada a este trabalho de pesquisa foi bibliográfica com abordagem da


revisão sistemática deu os determinados critérios que a compõem. Assim, a pesquisa sistemática,
“como o nome sugere, tais revisões são sistemáticas na abordagem e usam métodos explícitos e
rigorosos para identificar textos, fazer apreciação crítica e sintetizar estudos relevantes” (Lopes &
Fracolli 2008, p.2).

Toda pesquisa necessita de procedimentos adequados para uma investigação planeada,


desenvolvida de acordo com as normas técnicas, quanto aos fins, meios e tipo de pesquisa. Nesse
sentido, o método utilizado foi a pesquisa bibliográfica, por ter sua relevância para este estudo:

Como a pesquisa bibliográfica tem sido um procedimento bastante utilizado nos trabalhos
de caráter exploratório descritivo, reafirma-se a importância de definir e de expor com
clareza o método e os procedimentos metodológicos (tipo de pesquisa, universo
delimitado, instrumento de coleta de dados) que envolverão a sua execução, detalhando
as fontes, de modo a apresentar as lentes que guiaram todo o processo de investigação e
de análise da proposta (Lima & Mioto, 2007, p.3).

iv
2. Revisão Literária
2.1.Aspectos Gerais do Direito Internacional Privado

A análise conceitual do Direito Internacional Privado (DIPr), para início de discussão


acerca dos temas que o circundam, é de extrema importância para o entendimento da matéria e
da sua abrangência extraterritorial que lhe confere o status de “direito sobre direito”, conforme
será explicado mais adiante. Pontes de Miranda (1935, p. 17) demonstra com clareza o seu
entendimento acerca do conceito de DIPr quando afirma que:

O Direito privado nacional, quando tem de ser obedecido ou aplicar-se fora das fronteiras,
e o Direito privado estrangeiro, quando se obedece ao aplica dentro do território nacional,
constituem conteúdo de certas regras de obediência e de aplicação, ao conjunto das quais
se deu o nome de Direito internacional privado (Pontes de Miranda, 1935, p. 17).

Por outro lado, segundo as lições do Sidney Guerra (2009, p. 33) “o Direito Internacional
Privado se caracteriza pelo conjunto de normas que regulam as diversas relações existentes entre
os múltiplos atores que compõem a sociedade internacional”. Neste sentido, podemos dizer que:

O Direito Internacional Privado é a parte do Direito que cuida (busca disciplinar) das
relações internacionais existentes entre países ou entre pessoas de nacionalidades
diferentes (Sidney Guerra, 2009, p. 33).

2.1.1. Limites à Aplicação do Direito Estrangeiro

Segundo Seitenfus & Ventura (1999, p. 23) afirmam que o princípio da autonomia da
vontade quando relacionado aos limites à aplicação do direito estrangeiro não é um princípio
absoluto e ilimitado. Pode ocorrer de a legislação estrangeira escolhida pelas partes ser
inaplicável em virtude dos óbices impostos pela ordem pública e pelas leis imperativas do foro no
qual o eventual litígio estiver sendo julgado.

Sendo assim, trata-se de identificar a qual ordenamento jurídico está vinculado à pessoa
jurídica de direito internacional privado, o que, não obstante as críticas da doutrina pode-se
chamar de nacionalidade da pessoa jurídica, instituto que é inclusive invocado por convenções
internacionais (Jacob Dolinger, 1976. p. 65).

2.1.2. Ordem Pública como Limitador à Aplicação de Direito Estrangeiro

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A ordem pública é considerada um dos mais importantes princípios do DIPr, pois ela cria
óbices não só à aplicação de leis estrangeiras (escolhida pela vontade das partes ou indicada pelas
regras de conexão) como também ao reconhecimento de atos realizados no exterior e à execução
de sentenças proferidas por tribunais de outros países (Jacob Dolinger, 1994, p.329).

Conforme assegura Jacob Dolinger ( 1994, p.330) a definição de ordem pública é tarefa
difícil ou mesmo impossível. Contudo, Guilherme Moulin Simões Penalva Santos (2010) propõe
defini-la como um mecanismo através do qual se pretende preservar valores fundamentais de
uma dada sociedade.

Conforme a doutrinadora Nádia de Araújo (2011) a ordem pública guarda também estrita
ligação com os direitos fundamentais.

A ordem pública e as normas de carácter imperativo estão subordinadas aos critérios de


protecção garantidos pelos direitos fundamentais. Sua valoração não prescinde de uma
hermenéutica ligada à eficácia dos princípios, cuja positivação pode ser encontrada nas
Constituições dos Estados e nos tratados internacionais de direitos humanos. Com isso se
quer prevenir resultados inconstitucionais na aplicação da lei estrangeira, tal como ocorre
com a aplicação das leis em geral no plano interno. As normas de DIPr também são
baluartes de defesa desses princípios, agora alçados à categoria de normas-chave de todo
o sistema jurídico (Nádia de Araújo, 2011).

Conforme Jacob Dolinger (1994) “a ordem pública se afere pela mentalidade e


sensibilidade médias de determinada sociedade em determinada época. Aquilo que for
considerado chocante a esta média será rejeitado pela doutrina e repelido pelos tribunais. Em
nenhum aspecto do direito o fenômeno social é tão determinante como na avaliação do que fere
e do que não fere a ordem pública. Compatível ou incompatível com o sistema jurídico de um
povo- eis a grande questão medida pela ordem pública para cuja aferição a Justiça deverá
considerar o que vai à mente e no sentimento da sociedade”.

A ordem pública possui como características a relatividade/instabilidade (pois varia no


tempo e no espaço), a contemporaneidade (o estado da situação à época de um julgamento) e o
fator exógeno (mesmo a lei sendo imperativo, o fundamento da ordem pública é exógeno, de
modo que esta não é factor imanente à norma jurídica.

2.1.3. Aplicação e Interpretação do Direito Estrangeiro Material

vi
Quando se trata da aplicação e interpretação do direito estrangeiro cabe, primeiramente,
ressaltar sobre qual direito estrangeiro se está tratando. Segundo Basso (2020) ao se discutir a lei
estrangeira, deve-se ter em mente que esta lei refere-se ao direito substancial/material
estrangeiro, chamado também de privado comum estrangeiro, não se devendo confundir com o
direito privado especial, também chamado de internacional privado estrangeiro, por sua vez
proibido pela lei moçambicana por ir contra princípios aplicados nacionalmente. Estes princípios,
a que se fez referência, nada mais tratam do que da impossibilidade da lei internacional
moçambicana fazer referência à outra lei internacional estrangeira, o que, de forma simples, não
resolveria a lide em questão, não apontando um direito material a ser escolhido para resolver,
mas sim passando a decisão para outro estado decidir.

Após essa diferenciação é interessante citar-se uma das principais leis, não sendo
descartadas outras que também têm dispositivos auxiliares, que faz referência a aplicação de leis
estrangeiras na ordem jurídica moçambicana, sendo esta, a lei nº12. 376/10, conhecida como Lei
de introdução às normas do direito moçambicano (LINDM). A citada lei é a base para a
interpretação de dispositivos estrangeiros e sua recepção no ordenamento pátrio. A lei citada traz
uma imperatividade das normas de direito internacional privado, exigindo do juiz do caso em
análise uma profunda observância em sua resposta aos conflitos de leis no espaço.

Na obra de Dolinger e Tibúrcio (2020) quando se trata de lei estrangeira, estes são
categóricos ao afirmar que após a identificação de que se trata de uma lei e não somente de um
facto estrangeiro, a aplicação da lei estrangeira deve ser feita ex ofício, podendo ser suscitada e
aplicada a qualquer momento ou fase do processo, tendo a possibilidade, inclusive, de ser objecto
de recurso especial perante o STJ ou de acção rescisória. Em relação a essa aplicação, é
importante salientar que foi decidido na Conferência Interamericana Especializada Sobre Direito
Internacional Privado de Montevidéu em 1979, que em seu art. 2º dispõe que os juízes devem
aplicar o direito internacional da mesma forma como este seria aplicado pelos juízes do estado ao
qual este direito pertence, ou seja, preservando o direito das partes de pleitear e provar a
existência e o conteúdo da lei invocada seja ela de qual estado pertencer.

Quando se aplica o direito estrangeiro, deve haver mecanismos que garantam que a lei
está sendo corretamente aplicada na sua essência, ou seja, além de estar traduzida da forma
correta, deve-se atestar a sua veracidade e atualidade em relação à vigência. Sobre esse assunto
Dolinger e Tibúrcio (2020) apontam em sua obra que ao juiz ou à parte cabe apurar o direito
estrangeiro, o que inclui o seu conteúdo, vigência e existência, utilizando-se do direito

vii
comparado, quando couber, para sanar possíveis embates. Como não existe uma legislação única
ou uma forma de garantir o conhecimento uniforme de toda a comunidade internacional das leis
de cada estado, o código de Bustamante á ainda utilizado para sanar esse tipo de dúvida.

Neste código, nos arts. 409 a 411 são dadas duas opções para a prova do direito
estrangeiro, sendo estas: 1) Certidão atestada por dois advogados em exercício no país do qual a
legislação se queira provar; 2) Por meio de informação diplomática fornecida pela mais alta
tribunal, ou pela procuradoria-geral ou mesmo o ministério da justiça do país cujo direito do qual
tenha o interesse de se aplicar.

Além disso, segundo Basso (2020) a figura do affidavit também merece destaque, sendo
esta abrangente no ordenamento jurídico brasileiro, configurada como uma forma de parecer
jurídico de um profissional do próprio país do qual se deseja aplicar a lei em questão ou até
mesmo por profissional brasileiro com notório saber jurídico sobre o direito estrangeiro que será
aplicado ao caso em análise.

Sobre a análise e interpretação da lei estrangeira, Mazzuoli (2015) cita que tudo o que for
relativo às leis estrangeiras, o que inclui, por exemplo, sua vigência e revogação devem ser
analisadas de acordo com as próprias normas de origem, e não de acordo com o Lex fori (Lei do
foro), no caso, a lei moçambicana.

Dessa forma, ao se aplicar as normas estrangeiras o juiz deve pensar de forma como se
estrangeiro o fosse, mesmo que a norma que esteja aplicando seja estranha ao seu ordenamento
jurídico. Ao mesmo tempo em que aplica a norma estrangeira, o juiz deve-se atentar às limitações
que essa interpretação da norma estrangeira deve contemplar. Pois de acordo com o art. 5º da
LINDM, ao aplicar a norma estrangeira o juiz deve atentar para os fins sociais a que ela se dirige e
às exigências do bem comum, ou seja, buscar a essência da norma que este está aplicando
buscando satisfazer o legislador ao criar aquela norma, mas ao mesmo tempo aplicando filtros
que possam detectar as violações não permitidas como à ordem pública, da moral e dos bons
costumes. Em Moçambique, a última instância sobre as normas de direito internacional privado
cabe ao STF, pois este dirá se o juiz ou tribunal aplicou corretamente a norma estrangeira,
comprando inclusive com a jurisprudência existente no estado de origem.

Para terminar esta temática, a aplicação e interpretação do direito estrangeiro material


do direito internacional privado a um caso concreto ocorrem por meio de três conceitos: o de
“categoria de relações jurídicas” (ou “qualificação”), o de “elemento de conexão” e o de “lei

viii
competente”. Por exemplo, o direito internacional privado moçambicano dispõe que “para
qualificar e reger as obrigações aplicar-se-á a lei do país em que constituírem”.

3. Considerações Finais

Proponho-me, ao final deste trabalho de cunho científico, escrever algumas


considerações que são importantes para uma melhor fixação dos termos e temas tratados
durante este itinerário do Direito Internacional Privado.

Assim sendo, das análises, leituras feitas nas referências bibliográficas e outras consultas,
conclui-se que, o Direito Internacional Privado tem por objectivo maior estabelecer, em razão do
elemento de conexão, as regras e os princípios para a extraterritorialidade da lei, razão pela qual
ele irá definir, em diversas situações, se a legislação a ser aplicada em determinada relação
jurídica é a legislação nacional ou a estrangeira.

Nas situações em que as regras e princípios de Direito Internacional Privado


determinarem a aplicação do direito estrangeiro, caberá ao juiz apurar a sua existência, seu
conteúdo e sua vigência. Contudo ele poderá determinar que essa tarefa seja realizada pela parte
que alegar a necessidade de aplicação dessa norma.

A norma do direito internacional privado será a aplicada como ela própria ordena razão
pela qual incumbe ao próprio juiz tomar a iniciativa de aplicar o direito estrangeiro ao processo.

De uma forma sintética à aplicação do direito estrangeiro deve obedecer a regras


processuais próprias, distintas daquelas que se referem à aplicação do direito interno, não há
necessidade de configurá-lo como fato, socorrendo-se do meio artificial da ficção jurídica.

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4. Literatura Citada

Araújo Nádia de. (2011). Direito internacional privado: teoria e prática brasileira. (5ª. ed.). Rio de
Janeiro: Renovar.

Basso, Maristela. (2020). Curso de direito internacional privado. (6ª. ed.). São Paulo: Atlas.

Dolinger, Jacob; Tibúrcio, Carmem. (2020). Direito internacional privado. (15ª. ed.). Rio de janeiro:
Forense.

Dolinger, Jacob. (1976). A sociedade anônima brasileira-Critério determinador de sua


nacionalidade. Revista de direito mercantil: industrial, econômico e financeiro. São Paulo:
Malheiros, v.15, n. 23, jul.

Dolinger, Jacob. (1994). Direito Internacional Privado: parte geral. (3ª. ed.). Rio de Janeiro,
Renovar.

Guerra, Sidney. (2009). Curso de direito internacional público. (4ª. ed.). Rio de Janeiro: Lúmen
Juris.

Lima, T.C.S & Mioto, R.C.T. (2007). Procedimentos metodológicos na construção do conhecimento
científico: a pesquisa bibliográfica. Revista Katálysis, v. 10, 37-45.

Lopes, A. L. M.; Fracolli, L. A. (2008). Revisão sistemática de literatura e metassíntese qualitativa:


considerações sobre sua aplicação na pesquisa em enfermagem. Texto & Contexto-
Enfermagem, 17 (4), 771-778.

MazzuoliA, Valério de Oliveira. (2015). Direito Internacional privado: curso elementar. Rio de
Janeiro: Forense.

Miranda, Pontes de. (1935). Tratado de Direito Internacional: Tomo I. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional.

Santos, Guilherme Moulin Simões Penalva. (2010). A autonomia da vontade nos contratos
internacionais: a cláusula de eleição de lei no direito brasileiro. 157f. Dissertação

x
(Mestrado em Estado, Processo e Sociedade Internacional) – Faculdade de Direito,
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

Seitenfus, R.; Ventura, D. (2001). Introdução ao direito internacional público. Porto Alegre: Livraria
do Advogado.

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