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JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL
= 2015 =
ÍNDICE
I – PARTE
1 – Lista de abreviaturas……………………………………………………………… 2
1. 1- Introdução………………………………………………………………………. 3
1.2 – Noção de Hermenêutica………………………………………………………… 5
1.3 – Os aspectos relevantes da Hermenêutica jurídica………………………………... 6
1.4 – A Integração de lacunas da lei……………………………………………………. 9
1.5– A hermenêutica constitucional………………..…………….…………………… 11
1.6 – Os princípios orientadores da hermenêutica constitucional…………………… 11
II – PARTE
2. O Impacto dos princípios da hermenêutica no ordenamento jurídico Angolano…... 14
2.2 – Análise do acórdão do Tribunal Constitucional………………………………… 14
2.1.1 – Acórdão n.º 326/2014 relativo ao processo 403 – D/2013……………………. 14
2.3 – Necessidade de conformação das normas infra-constitucionais à Constituição… 21
3 – Conclusão…………………………………………………………………………23
4 – Bibliografia ………………………………………………………………………..26
I - PARTE
C. C. – Código Civil
C. F. - Código de Família
CRA – Constituição da República de Angola
C. P. – Código Penal
C. P. P. – Código de Processo Penal
C. P. C. – Código de Processo Civil
C. COM – Código Comercial
C. R. N. – Código de Registos e Notariado
1.2 – INTRODUÇÃO
O tema que doravante iremos abordar, é intitulado “PRINCÍPIOS
ORIENTADORES DA HERMENÉUTICA CONSTITUCIONAL” e se insere na
Jurisdição Constitucional, ministrada no âmbito do VIII - Curso Regular de Formação
Inicial de Magistrados.
A palavra “Hermenêutica” é etimologicamente de origem grega e significa a
arte ou a técnica de interpretar, analisar, descrever, explicar um texto, um discurso ou
um facto. O interpretar enquanto tal, é um exercício natural ao homem por via do qual
este decifra os códigos que a vida o apresenta, sendo tão natural que numa das vertentes
filosófica o é homem definido como um ser pensante.
Diferentemente das outras áreas de formação, embora não queiramos com isto
afirmar que o Direito seja de per si a única, entendemos que o Direito enquanto tal
enquadra-se nas ciências hermenêuticas, pois a actividade desenvolvidas pelos seus
cultores,1 é fundamentalmente interpretativa, ou seja, hermenêutica.
Assim, da mesma forma que o pastor precisa dominar minimamente as técnicas
da teologia para melhor conduzir o seu rebanho, também o jurista precisa dominar as
regras da interpretação, sob pena de chegar a resultados que fiquem longe de
materializar a justiça enquanto fim último do Direito.
A escolha do tema foi motivada pela admiração ao Direito Constitucional por ser
o ramo fundamental do Direito Público e sobretudo pelo facto de com a aprovação da
Constituição em 2010, grande parte do tecido legislativo ter ficado descontextualizado e
justificar-se a necessidade de conformar as normas infra-constitucionais e o exercício da
conformação, passar também obviamente pela correcta interpretação das normas
constitucionais.
Assim sendo, o presente trabalho terá duas partes: na primeira iremos fazer uma
abordagem teórica referente a hermenêutica e os princípios orientadores da
interpretação jurídica numa perspectiva doutrinária, sem conduto fazermos recurso a
grandes afloramentos por não ser este escopo do trabalho e na segunda, iremos analisar
1
Convém-nos esclarecer que não queremos com esta afirmação, passar a ideia de que o Direito seja a
única ciência que faz recurso a hermenêutica, pois tal como dissemos acima, o Direito se enquadra na
ciência que assenta na interpretação dos fenómenos sociais com relevância jurídica. Todas as ciências,
pelo facto de o serem, têm necessariamente um conjunto de regras visando estabelecer os métodos de
interpretação e explicação dos fenómenos, todavia o que acontece com o Direito e grosso modo com as
ciências sociais é que o recurso a hermenêutica é sem sombra de dúvida muito mais acentuado.
um acórdão do Tribunal Constitucional de forma a aferirmos em concreto a
materialização dos princípios orientadores da hermenêutica constitucional.
Portanto, apesar de a institucionalização do Tribunal Constitucional ter sido feita
em 1992 com a aprovação da Lei 23/92 de 16 de Setembro, (Lei de Revisão
Constitucional, nos artigos 127.º, 134.º e 135.º), no entanto, o Tribunal Constitucional
só foi efectivamente criado com a aprovação da Lei 02/08 de 17 de Junho (Lei Orgânica
do Tribunal Constitucional), de tal modo que as suas funções eram anteriormente
desempenhadas pelo Tribunal Supremo nos termos do artigo 6.º Lei 23/92 de 16 de
Setembro.
Entretanto, recente ou não, reconhecemos o valor do Tribunal Constitucional,
pois embora não seja o único, é por excelência, o garante e guardião da Constituição
que tem por natureza a competência geral de administrar a justiça em matéria jurídico-
constitucional, razões mais do que suficientes para a escolha do tema que nos propomos
abordar.
.
1.3 – Noção de Hermenêutica jurídica
Já acima frisamos a origem etimológica da palavra hermenêutica a qual nos
remetemos. Visto numa perspectiva genérica, todas as ciências, pelo facto de o serem,
fazem recurso a hermenêutica, pelo que, é categórica a afirmação segunda a qual, não
existe ciência sem hermenêutica. Assim, sem prejuízo do carácter universal da
hermenêutica no mundo das ciências, interessa-nos somente a hermenêutica jurídica.
A hermenêutica jurídica visa a determinação do sentido jurídico-normativo de
uma fonte jurídica interpretanda, em ordem a obter dela um critério jurídico de decisão
do caso em concreto.
A hermenêutica, segundo o Professor Vicente Ráo, “tem por objecto investir e
coordenar de modo sistemático os princípios científicos e leis decorrentes, que
disciplinam a apuração do conteúdo, do sentido e dos fins das normas jurídicas e a
restauração do conceito orgânico do Direito, para efeito de sua aplicação e
interpretação”.2
Em nossa opinião, em qualquer das definições avançadas, ressalta-nos a ideia de
que com a hermenêutica jurídica, procura-se primeiro reconstituir o pensamento jurídico
contido na norma e em segundo lugar, em retirar da norma um critério para resolver o
problema em concreto, portanto teremos sempre por um lado a norma por interpretar e
por outro o problema por solucionar. Abordaremos no ponto a seguir, os elementos da
interpretação jurídica, onde veremos com maior acuidade o problema da norma ou da
fonte jurídica enquanto primeiro elemento da interpretação.
Sendo o objecto do presente tema, os princípios orientadores da hermenêutica
constitucional, a questão que se tem levantado na doutrina, é a de saber se a
interpretação jurídica é apenas um problema interpretativo, ou seja, a determinação do
significado textual da fonte interpretanda, ou se é um problema normativo, com o
sentido de retirar da norma um critério para solucionar o caso em concreto.
A resposta a questão, segundo a doutrina maioritária, passa por considerar que
não se afasta da interpretação o problema da compreensão hermenêutica ou textual da
norma jurídica, pois deve-se-lhe sempre ter em conta porquanto, é o primeiro elemento
com que o interprete tem contacto, todavia não é a construção puramente textual que
encerra o problema, mas sim, o retirar do texto normativo um critério para resolver o
problema, ou seja, sem desprimor pelo respeito que se deve ter ao texto normativo, o
2
RÁO, Vicente, O direito e a Vida dos Direitos, Vol. 2, São Paulo, Max Limonad, 1953, pág. 542
que deve polarizar a atenção do interprete, é sim, o encontrar no texto normativo um
critério para resolver o problema em concreto.
3
Pedro Manuel Luís, Curso de Direito Constitucional Angolano, Luanda, 1.º Edição, Edição Qualificada,
2014, pág. 141.
obstante esta constatação, é defensável a ideia da consagração constitucional implícita
do direito ao recurso.4
4
Hermenegildo Cachimbombo, Manual dos Recursos no Direito Processual Civil Angolano, Editora Casa
das Ideias, Luanda, 2012, pág. 15.
5
CANOTILHO, J. J. Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição 6.ª edição, revista, Coimbra,
Almedina, 1993, pág. 212-213.
6
Pedro Manuel Luís, op. cit., pág. 129.
7
Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra, Almedina, 1989, pág.
159.
na verdade as normas legais não podem fundamentar-se no arbítrio”. Se pretenderem
ser válidas e justas, as normas positivas têm de respeitar os princípios.
O que dissemos acima, vale para qualquer ramo do Direito, pelo que, feito este
parênteses, podemos falar então dos princípios da hermenêutica constitucional que
constitui a primeira parte do presente trabalho. Dentre os vários princípios da
interpretação constitucional, iremos abordar os seguintes: o da unidade constitucional, o
do efeito integrador, o da máxima efectividade ou eficiência, o da justeza ou
conformidade funcional, o da concordância prática ou harmonização, o da força
normativa da Constituição e da interpretação das leis em conformidade com a
Constituição.
Sem prejuízo desta incursão, convém reter que para efeitos de interpretação os
preâmbulos das Constituições, servem de guia para a interpretação constitucional, razão
pela qual, a doutrina aborda o seu valor. Em nossa opinião, o preâmbulo encerra em si,
as linhas mestras e orientadoras da interpretação, de que ela em si mesma traça as linhas
gerais de fundamentação política, social, filosófica, ideológica e económica, dentre
outros, informadores da nova ordem constitucional.8
II – PARTE
1 – Que interpôs junto da Camara dos Crimes Comuns do Tribunal Supremo uma
providência de “habeas corpus” com fundamento no excesso de prisão preventiva, nos
termos dos artigos 68.º da CRA, 25.º e 26.º da Lei 18-A/92 de 17 de Julho e na al.) c) do
artigo 315.º do C.P.P.
2 – A Camara dos Crimes do Tribunal Supremo, através do acórdão sobre o processo n.º
306/2013, deu provimento ao pedido de “habeas corpus”, ordenando a restituição
provisória à liberdade da arguida mediante caução no valor de kz 3.000.000,00 com a
obrigação de não se ausentar de Luanda, do país e a de apresentar-se quinzenalmente ao
respectivo tribunal.
3 – A decisão que constitui o acórdão proferido no processo n.º 306, foi efectivada entre
os dias 19.07.2013 e 29.07.2013. Contudo decorridos 10 dias, a contar da data referida
supra e apesar de ter sido interposto recurso do despacho de pronúncia nos termos dos
artigos 371.º e 655.º do C.P.P., o Juiz da causa pronunciou a arguida, ordenando a sua
detenção imediata e emitindo o mandado de captura e condução à cadeia no dia
05.08.2013. O recurso foi admitido com efeito suspensivo tendo sido mantido a prisão.
4 – A Recorrente entendeu que a atitude do Juiz da causa principal representa uma clara
violação à lei, nomeadamente aos n.ºs 2 e 3 do artigo 177.º da CRA e a al.) c) do artigo
323.º do C.P.P., não cumprindo deste modo a decisão do um Tribunal Superior, sendo a
nova prisão ilegal, nos termos do n.º 3 do artigo 291.º do C.P.P.
5 – Entretanto, a Camara dos Crimes do Tribunal Supremo entendeu no seu segundo
pronunciamento sobre a questão, que o Juiz da causa não desrespeitou a decisão do
Tribunal Superior, nem violou a lei, por se tratar de fases distintas e de um crime cuja
pena abstractamente aplicável não admite caução.
9
Manuel Lopes Maia Gonçalves, Código Penal Português na Doutrina e na Jurisprudência, Coimbra,2.º
Edição, Livraria Almedina 1972.
3 – Conclusão
Depois de toda incursão feita, chegou o momento de concluirmos o presente
trabalho, certo de que longe de esgotarmos a sua apreciação, o que fica aqui registado,
servirá de base para elaboração de futuro e melhores trabalhos, ou como se diz, o
presente trabalho é somente de uma gota de água no oceano.
Tal como referimos aquando da introdução, o trabalho foi dividido em duas
partes, a primeira referente aos princípios orientadores da hermenêutica constitucional e
a segunda centrada na análise do acórdão do Tribunal Constitucional. Entretanto, sem
prejuízo disto, o epicentro do trabalho foi sem dúvida a análise e apreciação do acórdão
do Tribunal Constitucional n.º 326/2014 relativo ao processo 403 – D/2013, em causa
está como vimos o recurso extraordinário de inconstitucionalidade, tal qual nos foi
orientado pelos ilustres formadores.
Entretanto para melhor sedimentar análise do trabalho, partimos da apreciação
dos princípios orientadores da hermenêutica constitucional para no momento da
apreciação do acórdão referido, subentendermos a consagração dos princípios da
hermenêutica constitucional, ou seja, a lógica subjacente no trabalho, foi a de partir de
uma apreciação geral ou doutrinária para uma apreciação concreta.
O âmago trabalho foi analisar o acórdão do Tribunal Constitucional e a pergunta
que procuramos responder ao longo do trabalho foi a de saber se o Tribunal
Constitucional andou bem ou não.
Ora, por tudo quanto dissemos não restam dúvidas quanto a nossa resposta, pois
a título de resumo diremos o seguinte: 1.º a Recorrente era menor na altura prática da
infracção; 2.º a CRA nos termos do artigo 80.º consagra a protecção das crianças; 3.º a
República de Angola ratificou pela resolução n.º 20/90 da Assembleia do povo, a
Convenção sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Assembleia Geral das Nações
Unidas em 20 de Novembro de 1989 e em várias disposições da convenção alude-se que
os Estados Partes comprometem-se em cumprir as várias obrigações e uma delas é a de
respeitar o princípio do superior da criança, 4.º acreditamos que independentemente do
recurso a CRA e a Convenção dos Direitos da Criança e tal como bem, frisou o Tribunal
Constitucional no acórdão em apreço que da interpretação das disposições combinadas
dos artigos nos termos dos artigos 108.º do C.P., 291.º al.) a) parágrafo 2 do C.P.P., 10.º
da lei 18-A/92 de 17 de Julho e porque no caso em apreço a Recorrente já tinha
caucionado a prisão, não havia razões para que o Tribunal Supremo revogasse a
segunda providência de “habeas corpus”, por último e não menos importante 5.º há
como dissemos no outro subtítulo do presente trabalho, necessidade de conformar a
normas infra-constitucionais a Constituição.
Sem prejuízo de tudo quanto dissemos, podemos em jeito de conclusão destacar
o seguinte:
1. O valor social do acórdão: o acórdão objecto da presente trabalho, é de grande
impacto social, porquanto nele o Tribunal Constitucional chama-nos sobretudo
atenção a necessidade de conformar as normas infra-constitucionais a
Constituição, por um lado e por outro, a necessidade de protecção do superior
interesse da criança, cristalizado no presente acórdão no princípio da presunção
da inocência e na aplicação de medidas com maior carácter ressocializador,
atento as orientações do Direito Penal Moderno, onde as medidas não privativas
de liberdade se sobrepõe as privativas
2. A inconstitucionalidade e o problema da correcta interpretação: o problema
central do acórdão do Tribunal Constitucional não está necessariamente na
inconstitucionalidade como tal, mas sim na correcta interpretação das normas a
luz da Constituição, pois ficou patente que no caso em apreço o segundo pedido
de “habeas corpus” ao Tribunal Supremo deveria ter sido julgado procedente,
por que da correcta interpretação, das disposições combinadas dos artigos 108.º
do C.P., 291.º do C.P.P., e 10.º da lei 18-A/92 de 17 de Julho, não resulta a
inadmissibilidade da liberdade provisória. Por isso, em nossa opinião e sem
prejuízo da supremacia da Constituição, ainda que não se fizesse recurso a ela,
seria sempre viável a concepção da liberdade provisória a Recorrente.
3. Importância prática do Tribunal Constitucional: já frisamos noutra parte
deste trabalho que o Tribunal Constitucional tem desenvolvido um trabalho de
grande relevância no nosso ordenamento jurídico e sem precisarmos fazer
grandes afloramentos gostaríamos destacar aqui duas particularidades. A
primeira resulta do facto de que com a criação do Tribunal Constitucional ficou
salvaguardada a defesa dos direitos e liberdades fundamentais sobretudo no que
concerne a questão relativa a possibilidade que as partes têm em não se
conformando com a decisão proferida em sede dos tribunais de jurisdição
comum, poderem recorrer a jurisdição constitucional e a segunda o facto de, da
análise dos vários acórdãos do Tribunal Constitucional constatarmos o esforço
deste Tribunal em procurar soluções atentas aos princípios orientadores da
hermenêutica constitucional, ou seja, procura-se sempre dar maior dignidade a
Constituição enquanto Lei suprema.
Portanto, concordamos com a apreciação feita pelo Tribunal Constitucional
porquanto o sentido dado as normas interpretandas no problema em questão, resulta
claro o respeito a Constituição enquanto diploma mais importante do nosso
ordenamento jurídico e o dever de obediência a que estão sujeitos as normas infra-
constitucionais sob pena de serem incostitucionais.
4 – BIBLIOGRAFIA