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Multiparentalidade: uma análise

entre o reconhecimento e seus


efeitos no âmbito do direito da
família
Multiparentalidade: uma análise entre o reconhecimento e seus
efeitos no âmbito do direito da família.

Lucicleide Monteiro dos Santos Lima[1]

João Paulo Lima Cavalcanti[2]

RESUMO

O presente trabalho vem apreciar o advento da multiparentalidade no


direito da família, partindo do pressuposto da possibilidade jurídica de
uma pessoa ter dupla maternidade ou paternidade. Contudo, faz-se
necessário análise histórica sobre o estado de filiação no ordenamento
jurídico nacional para entender o estado de filiação sob ótica da origem
genética e a filiação sob o prisma do princípio da afetividade. Cuida da
possibilidade do reconhecimento multiparental, e questionar suas
particularidades quanto à adoção. Buscar compreender às consequências
jurídicas do reconhecimento da multiparentalidade, em relação a
prestação de alimentos, o instrumento da guarda e averiguar os efeitos
jurídicos no âmbito civilista.

Palavras-chaves: Filiação biológica. Filiação socioafetiva.


Multiparentalidade. Reconhecimento multiparental.

ABSTRACT

The present work appreciates the advent of multiparentalidade in family


law, based on the assumption of the legal possibility of a person having
dual maternity or paternity. However, it is necessary historical analysis
about the state of affiliation in the national legal system, to understand the
state of affiliation from the perspective of genetic origin and affiliation
from the perspective of the principle of affectivity. Take care of the
possibility of multiparental recognition, ask why not adoption? It also
reflects on the possibility of multiparental recognition through
administrative channels. Seek to understand the legal consequences of
the recognition of multiparentalidade, in relation to the provision of
maintenance, the custody instrument and to investigate the legal effects
in the succession scope.

Keywords: Biological affiliation. Socio-affective affiliation.


Multiparentalidade. Multiparental Recognition.

INTRODUÇÃO

            O presente trabalho dedicar-se-á a explanar a possibilidade jurídica


de uma pessoa ter dupla maternidade ou paternidade, ou seja, ter
múltiplos pais ou mães. Para isso faz necessário uma breve análise geral
sobre a temática multiparental no direito da família.

 A metodologia deste trabalho é de cunho bibliográfico, no qual buscar


utilizar-se dos entendimentos doutrinários, julgados, em especial, do
Supremo Tribunal Federal para construção de um pensamento científico
sobre a matéria multiparentalidade.

O direito de família estimar estudo minucioso sobre as entidades


familiares, no qual o Estado tenta regulamentar através um conjunto de
normais coercitivas. Todavia, o Estado não conseguir acompanhar a
evolução da sociedade, e, tratando-se da estrutura familiar no Brasil não
seria diferente. Isso porque, a evolução do pensamento cognitivo da
sociedade não acontece na velocidade da luz, ou seja, para que suja uma
norma regulamentadora é necessário um conjunto de interesse visando
corresponder um direito para qual foi proposto.

A evolução do instituto da família, trouxe a possibilidade jurídica do


reconhecimento perante o Estado Democrático de Direito de novo estado
de filiação. Antes da constituição federal de 1988, existia distinções entre
filhos, nos quais eram tidos como legítimos e ilegítimos. Esse concebidos
fora do casamento, aquele fruto da união matrimonial civil.

            O presente trabalho tem como escopo analisar o advento da dupla


paternidade ou maternidade, no qual consiste na possibilidade de uma
pessoa ter mais de dois pais ou mais de duas mães no registro civil,
contudo ter “múltiplos” pais. Visar analisar o conceito da
multiparentalidade no direito da família, entender a diferença da filiação
biológica e filiação afetivas, quais as consequências jurídicas no direito da
família.

 A metodologia deste trabalho é de cunho bibliográfico, no qual buscar


utilizar-se dos entendimentos doutrinários, julgado do Supremo Tribunal
Federal e jurisprudências para construção de um pensamento científico
sobre a matéria multiparentalidade.

O conhecimento cientifico é obtido sobre uma análise logica-sistemática


de um pensamento cognitivo racional, ou seja, é um conhecimento exato
e verificável no campo da realidade, visto que acompanha um logica
racional.

Para desenvolver esse trabalho cientifico é preciso uma análise


sistemática da teoria e da história do estado de filiação no Brasil, como se
chegou a temática da multiparentalidade, quais os efeitos no mundo
jurídico do reconhecimento da multiparentalidade, há consequências
jurídicas? Para responde tal indagação, é necessário verificar o
entendimento doutrinário sobre o assunto, analisar de formar minuciosa
os julgados e as jurisprudência sobre à multiparentalidade.

O método cientifico abordado nesse trabalho de pesquisar, tem natureza


básica, na qual o escopo deve gerar conhecimentos novos, com utilidade
e possíveis avanços para ciências jurídicas.

Quanto o método de abordagem será qualitativo, tendo em vista que


devesse considera a relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito.
Quanto o objeto, terá natureza exploratória, cujo problema deve ser
resolvido por levantamento bibliográfico e análise de julgados. O
conhecimento técnico-cientifico deste trabalho terá procedimento de
pesquisar bibliográfica, teóricos e estudo jurisprudencial. O primeiro,
método de pesquisar bibliográfica retoma o conhecimento cientifico
acumulado a respeito sobre o problema, ocorrido através de assuntos já
publicados. O segundo, método de pesquisar, teórica, cuidar de analisar
determinadas teorias, com proposito de ampliar estruturar sistemas e
modelos teóricos. O terceiro, método de pesquisar, é analisar julgados e
jurisprudência sobre o desfecho da multiparentalidade.

O primeiro capitulo descreve breve análise histórica sobre o estado de


filiação no ordenamento jurídico nacional, como a sociedade compreendia
o conceito de filiação a luz da legalidade, as respectivas distinções entre
filhos legítimos e espúrios, até a evolução do ordenamento jurídico atual,
no qual a CF/88 trouxe igualdade sem distinções de filhos. Conceituar a
filiação sob ótica da origem genética e a filiação sob o prisma do princípio
da afetividade, trazendo um binômio, pelo direito da personalidade qual
filiação tem prevalência no registro civil: Filiação biológica versus afetiva.

O segundo capitulo cuida da possibilidade do reconhecimento


multiparental, em que pessoa poderá ter dois pais ou duas mães no
registro civil, ou seja, ter múltiplos pais. Levanta o questionamento, por
que não adoção? Explicar os efeitos jurídicos da adoção e relata qual
benefício de escolhe um instituto invés de outro, reflete também sobre a
possibilidade do reconhecimento multiparental pelas vias administrativas.

O terceiro capitulo buscar entende as consequências jurídicas do


reconhecimento da multiparentalidade. Para tanto, buscar entender o
dever da prestação de alimentos em relações que envolva pais e filhos,
quem tem dever de prestar verbais alimentares, e no caso de
multiparentalidade quais são os efeitos da responsabilização sobre a
prestação de alimentos. Buscar também compreender elemento jurídico
guarda, como ela é exercida sobre o filho, e como a multiparentalidade
afeta tal instrumento. Averiguar os efeitos jurídicos no âmbito sucessório
com relação a multiparentalidade, como fica a linha de sucessão em
relação ao descendente e os ascendentes. Ressalva, ainda, de forma
mitigada, a multiparentalidade como meio provável de proteção as
famílias poliafetivas.

1. BREVE ANÁLISE HISTÓRICA SOBRE O ESTADO DE FILIAÇÃO NO


ORDENAMENTO JURÍDICO NACIONAL.

            A sociedade brasileira sofreu uma gama de mudanças


significativas no instituto do direito da família. Sobretudo no estado de
filiação, os filhos eram aqueles nascidos na constância do matrimônio,
tidos legítimos ou legitimados e entre os filhos contraídos foram do
casamento civil, outrora classificados como ilegítimos ou espúrios. Neste
sentido, Barboza, entende:

Os filhos nascidos de relações adulterinas eram chamados de ilegítimos e


não possuíam qualquer reconhecimento jurídico. Já no âmbito do
casamento, a filiação era presumida, com raras exceções, o que
demonstra que a qualidade de filho estava intrinsecamente ligada ao
estado civil dos pais. (BARBOZA 2000 Apud VIEIRA 2015, p.81).

.           As distinções entre filhos e a impossibilidade do reconhecimento


do estado de filiação, mitigava o direito da personalidade ao nome. Visto
que, não permitia o pronome do pai no registro civil em caso de relação
extraconjugal. Conquanto para poder registra um menor fazia-se
necessário saber o estado civil do gênito, principalmente, para saber se
tratava de uma relação adulterina. Consequentemente impossibilitava
aquele concebido fora da relação conjugal ao direito personalíssimo, e,
por conseguinte os direitos fundamentais a herança. Nesta perspectiva,
Clovis afirmava: “ a falta é cometida pelos pais, e a desonra recai sobre os
filhos” (BEVILÁQUA, 1917 Apud BERENICE, 2015.p.387).

O reconhecimento do parentesco por ascendente aos respectivos


descendente advindos de relação adulterinas só passou a ser possível
depois do Decreto-Lei nº 4.737/42, no qual trouxe a em sua redação o art.
1 °, expressa, “ O filho havido pelo cônjuge fora do matrimônio pode,
depois do desquite, ser reconhecido ou demandar que declare sua
filiação”. Ou seja, os filhos, advindos de relação extraconjugais, só poderia
ter o direito ao reconhecimento em registro civil, caso houvesse um
desquite. Visto que, a legislação com intuito primário de protege a família
tradicional, fez por décadas descriminações entre filhos, até privá-lo do
direito hoje consolidado, no que tange o pronome dos seus ascendentes.

            Um marco importante para evolução do pensamento cognitivo


sobre o estado de filiação e seu respectivo reconhecimento, foi a
promulgação da Constituição Federal de 1988, no qual trouxe igualdade
sem distinção entre filhos existente ou não dá constância do casamento.
A Constituição Federal de 1988, em seu art.227, § 6º expressamente diz:
“filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os
mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações
discriminatórias relativas à filiação.

1.1 DO ESTADO DE FILIAÇÃO

A carta magna de 1988 veio sanar os vícios da lei anterior, a qual negava o
direito do filho em ter um pai e desse reconhecer seu respectivo
descendente. Contudo, passou a ser discutido estado de filiação com
base na origem biológica, como dita “verdade real”, através da descoberta
da cadeia de impressões digitais pelo exame de DNA, pelo pesquisador
Alec Jeffreys, no ano de 1985 (RUMJANEK 1997, Apud GLANZ, 2005,
p.533). Vieira explica:

A filiação passa a se fundar, especialmente, no vínculo de


consanguinidade, uma vez que se tornou possível aferir a existência ou
não de descendência genética com grau de certeza quase que absoluto.
A busca da verdade real foi simplificada pelo advento do exame de DNA,
fortemente utilizado nas ações de investigação de paternidade. (VIEIRA
2015, p.87)

Para reafirmar o entendimento da dita verdade real, o Superior Tribunal de


Justiça editou a súmula n° 301, na qual dispõe: “Em ação investigatória, a
recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção
juris tantum de paternidade”. Portanto, a presunção da paternidade condiz
a dita verdade real por origem genética. Todavia, com a evolução da
sociedade no quesito das relações familiares, foram surgindo outras
formas cognitivas de vínculos familiares, e consequentemente vínculos de
filiação. Nesse seguimento Paulo Lôbo aduz:

De um lado existe a verdade biológica, comprovável por meio de exame


laboratorial que permite afirmar, com certeza praticamente absoluta, a
existência de um liame biológico entre duas pessoas. De outro lado há
uma verdade que não mais pode ser desprezada: o estado de filiação, que
decorre da estabilidade dos laços de essencial da atribuição da
paternidade ou maternidade. ” (LÔBO 2003 Apud DIAS 2015, p.396).

            Portanto, a origem genética não é a única verdade para o


reconhecimento da filiação, visto que foca apenas na herança
biológica/consanguínea. Com isso, desvincular e depreciar outros liames
para o reconhecimento parental, exemplo: filiação adotiva e filiação
socioafetiva, nas quais decorre de laços não biológico.

O princípio norteado do âmbito do direito da família contemporâneo é o


princípio da afetividade, por se tratar de um princípio constitucional
implícito. Neste seguimento, Lôbo 2012, explica:

O princípio da afetividade especializa, no âmbito familiar, os princípios


constitucionais fundamentais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III)
e da solidariedade (art. 3º, I), e entrelaça-se com os princípios da
convivência familiar e da igualdade entre cônjuges, companheiros e filhos,
que ressaltam a natureza cultural e não exclusivamente biológica da
família. (LÔBO 2012 Apud SOUZA 2018, p.12).

            Para tanto, o princípio da afetividade basear-se nos laços do afeto,


pouco importando se há origem genética. Tal princípio é um dever entre
pais e filhos, partindo do pressuposto legal do direito das obrigações, ou
seja, caso fique comprovada a falta de afeto, ocorre ato ilícito e nasce o
dever legal de indenizar, exemplo: abandono afetivo e abandono afetivo
reverso. Desta forma, o princípio da afetividade é um direito fundamental
entre ascendente e descendentes, uma vez que o afeto é base essencial
da construção do seio família.Desta forma Jackelline Fraga Pessanha
compreende:

A família é a base da sociedade brasileira, haja vista ser ancorada


primeiramente em laços de afeto, sabendo-se que o amor é o elo da
comunhão de vida plena entre pessoas, de forma pública, contínua e
duradoura. (...) Afeto significa sentimento de afeição ou inclinação para
alguém, amizade, paixão ou simpatia, portanto é o elemento essencial
para a constituição de uma família nos tempos modernos, pois somente
com laços de afeto consegue-se manter a estabilidade de uma família que
é independente e igualitária com as pessoas, uma vez que não há mais a
necessidade de dependência econômica de uma só pessoa. (PESSANHA
2011, p.2).

Logo, pelo princípio da afetividade surge outros estados de filiação, entre


ela a filiação socioafetiva, na qual pouco importado a origem genética, o
que prevalece é o simples é animus de parentesco. Neste liame Fábio
Ulhoa Coelho aduz:

A filiação sócio-afetiva constitui-se pelo relacionamento entre um adulto e


uma criança ou adolescente, que, sob o ponto de vista das relações
sociais ou emocionais, em tudo se assemelha à de pai ou mãe e seu filho.
Se um homem, mesmo sabendo não ser o genitor de criança ou
adolescente, trata-o como se fosse seu filho, torna-se pai dele. Do
mesmo modo a mulher se torna mãe daquele de quem cuida como filho
durante algum tempo. (COELHO 2006 Apud  KOVALSKI 2007, p.24).

            A filiação subsequente do princípio da afetividade depende da


relação social e emocional entre indivíduos, cujo reconhecimento
transcende a biologia. Desse modo, o fato social ocorre através do vínculo
de convivência entre pessoas que por ter que adaptar às regras da
sociedade assumir status de pai/mãe perante outro indivíduo, esse
denominado de filho.
Ante exposto é inegável o reconhecimento da filiação decorrentes de
laços afetivos, tendo em vista aplicabilidade do princípio da afetividade.
Todavia, é válido destacar, nada impede que uma filiação originada de
laços sanguíneos não comine em laços afetivos, considerando que o afeto
poderá existir independente de genética. Entretanto, caso existam ambas
filiações, seja uma biológica e uma afetiva, e nelas esteja presente o
princípio da afetividade, qual prevalecerá no registro civil?

1.2 DO DIREITO DA PERSONALIDADE AO STATUS QUO DO REGISTRO


CÍVIL: FILIAÇÃO BIOLÓGICA X FILIAÇÃO AFETIVA.

´           A origem genética tem um peso concludente no ordenamento


jurídico brasileiro, trata-se de um direito personalíssimo, no que diz
respeito à existência da pessoa.

            Frisa-se que os bens tutelados pelos direitos fundamentais não são
objeto, mas sujeitos ou parte integrantes deles, evidenciando sua
substancialidade latente, a começar dos limites e extensão dos danos
sofridos. Logo, é intolerável que, reconhecidos constitucionalmente e
infraconstitucionalmente os aspectos não-patrimoniais dos direitos,
toRna-se insustentável que atingido algum direito personalíssimo, fique a
vítima irressarcida, na realidade, compensada, verificados no caso
concreto o ato ilícito e a lesão a um direito da personalidade.

Conforme leciona Maria Celina Bodin:

A tutela da pessoa humana não pode ser fracionada em isoladas


hipóteses, microssistemas, em autônomas fattispecie não
intercomunicáveis entre si, mas deve ser apresentada como um problema
unitário, dado o seu fundamento, representado pela unidade do valor da
pessoa. Esse fundamento, como é feito nas teorias atomísticas. A
personalidade é, portanto, não um “direito”, mas um valor, o valor
fundamental do ordenamento, que está na base de uma série (aberta) de
situações existenciais, nas quais se traduz a sua incessantemente mutável
exigência de tutela. (MORAES, Maria Celina Bodin. Danos à Pessoa
Humana, p. 121, 2017).
            A supracitada autora prossegue sua explanação:

Daí sustentar-se que a personalidade humana é valor, um valor unitário e


tendencialmente sem limitações. Assim, não se poderá, com efeito, negar
tutela a quem requeira garantia sobre um aspecto de sua existência para
o qual não haja previsão específica, pois quele interesse tem relevância
aos nível de ordenamento constitucional e, portanto tutela também em via
judicial. (MORAES, Maria Celina Bodin. Danos à Pessoa Humana, p. 127,
2017).

A teoria dos direitos de personalidade “teriam como finalidade proteger a


pessoa no que ela tem de mais essencial: a sua personalidade. ”
(CORTIANO JUNIOR 2000 apud BERTONCELLO 2006, p.15), alude ser
um direito primário da existência, o código civil brasileiro em seu Art.
2o dispõe “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com
vida [...]”, para ser garantido direito da personalidade, esse qual traz
direitos e deveres na ordem civil, faz apenas necessário nascer com vida.
Contudo, o direito da personalidade abarcar “[...] todas as condições
necessárias para a conservação e desenvolvimento da personalidade, e
para o reconhecimento e respeito da dignidade moral e jurídica do
homem” (PAIVA NETO 1850, Apud BERTONCELLO 2006, p.21).

            Assim, o direito da personalidade trata de um bem intrínseco à


pessoa humana, é um direito natural em que a pessoa não poderá dispor.
Visto que se trata de uma tutela jurídica garantidora do direito
fundamental a sua existência. Neste sentido “o direito à identidade
genética passou a ser reconhecido como direito fundamental integrante
do direito de personalidade, o que levou a jurisprudência a aceitar o
retorno das partes a juízo na buscar da identificação da paternidade”
(DIAS, 2015, p.423). Para defender o direito ad personam da essência
natural do ser humano o ECA dispõe “Art. 48.  O adotado tem direito de
conhecer sua origem biológica [...]”, isso ocorre porque, mesmo adoção
encerrando o vínculo como a família natural/biológica, retirar o direito
personalíssimo a sua existência é violar o princípio da dignidade da
pessoa humana. Segundo Silveira “Os direitos da personalidade
destinam-se, pois, a resguardar a dignidade humana[...]” (SILVEIRA Apud
BERTONCELLO 2006,p.23).

É inegável a importância do vínculo sanguíneo para o direito, neste


sentido o STJ editou Súmula 301“Em ação investigatória, a recusa do
suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris
tantum de paternidade”. A corte superior entendeu desta forma, tendo em
vista a preservação do direito da personalidade do filho, visto que a
recusar por parte do suposto pai feri o direito de outrem, no quesito de ter
conhecimento de sua origem. Além de ter o direito ao patronímico
frustrado, isso porque o reconhecimento a origem também possibilita o
status quo do pronome paterno/materno no registro civil.

            Diante o exposto, é relevante a indagação: numa relação que


envolva de um lado a paternidade afetiva, consubstanciada pelo registro
civil e de outro a verdade sobre a origem genética qual filiação tem
prevalência para o status quo do registro civil? Tal ocorrência não é
incomum: verifica-se quando um indivíduo assume a paternidade de filho
que sabe não ser seu, por exemplo. Mantendo o entendimento
jurisprudencial da jurisdição brasileira, no que tange a presunção de
paternidade em relação ao suposto pai biológico, no caso em que haja
negação do hipotético genitor em realizar o exame pericial de DNA,
ocorrerá presunção de paternidade, conforme o julgado que deu ensejo a
súmula 301 do STJ:

EMENTA Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Investigação


de paternidade. DNA. Recusa na realização do exame. 1. O
posicionamento desta Corte é no sentido de que a recusa injustificada à
realização do exame de DNA contribui para a presunção de veracidade
das alegações da inicial quanto à paternidade. 2. Agravo regimental
desprovido.AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N.
498.398-MG (2003/0002781-4)

No caso em tela, o hipotético genitor buscava anulação do registro civil na


corte superior, diante do entendimento que já tinha declarado ele como
pai de um infante. Contudo seu recurso restou desprovido,
consequentemente, mantendo a decisão de paternidade presumida, visto
que sua recusar ofendia o direito do menor e até mesmo ofendia o direito
personalíssimo em saber sua origem genética, como resultado, o direito
ao nome.

Em contraposição a esse entendimento sumulado há questionamento da


filiação socioafetiva, na qual é desencadeada pelo princípio da
afetividade, tal questão princiológica é essencial para o âmbito do direito
da família. Como já visto, o princípio da afetividade é implícito na
constituição, no qual têm primazia no amor, respeito, afeto e dever de
assistir a prole entre os quais participam da relação familiar. Diante tal
fato, não deve ser meramente descartado. Segundo Fachin, o que indicar
o estado de filiação não é o simples laço sanguíneo, mas sim o vínculo
derivado do afeto. Desta forma, aduz:

O reconhecimento da filiação socioafetiva se impôs a partir do


desenvolvimento da mesma engenharia genética que tornou inegável a
verdade biológica. Se, de um lado, a ciência permite a certeza sobre os
laços de sangue, ela admite, sobre outro aspecto, que tais laços sejam
postos à margem diante de uma realidade socioafetiva.(FACHIN Apud
KOVALSKI.2007, p.27).

Contudo, a indagação sobre o conflito entre estado de filiação biológica


versus afetiva, quando houver dupla paternidade ou maternidade, não
será uma resposta simples e objetiva. Pois a prevalência de uma filiação
em detrimento à outra, partindo do pressuposto que em ambas poderão
coexistir o princípio da afetividade, afetaria diretamente o interesse do
filho. Assim, emerge a tese da multiparentalidade. Essa qual será melhor
explicada no capítulo subsequente.

2. MULTIPARENTALIDADE

A Multiparentalidade surgiu como possibilidade de sanar a indagação


sobre qual o estado de filiação prevalece, a filiação biológica ou a afetiva.
Ao averiguar que ambas eram possíveis, surgiu a tese multiparental, a qual
consiste na possibilidade de uma pessoa física ter múltiplos pais, ou seja,
uma pessoa ter dois pais ou duas mães no assentamento do registro civil.
Tal alternativa visava garantir direito inerente a personalidade, no que
tange o direito de ter o nome. Neste seguimento, Garcia e Borges afirma:
“A multiparentalidade caracteriza-se pela possibilidade de a pessoa ter
em seu registro de nascimento mais de um pai ou mais de uma mãe. ”
(GARCIA e BORGES, p.6). Zamattaro, explica:

A multiparentalidade deve ser entendida como a possibilidade de uma


pessoa possuir mais de um pai e/ou mais de uma mãe, simultaneamente,
produzindo efeitos jurídicos em relação a todos eles, inclusive, ao que
tange o eventual pedido de alimentos e até mesmo herança de ambos os
pais. (ZAMATTARO Apud LIGIERO.2015, p.15)

O estado de posse sobre o filho é um requisito para entender como ocorre


a paternidade responsável. Diante disso, como garante-se o direito da
personalidade ao nome, quando acontece em caso fático duas
ascendências paterna ou materna? Em recurso extraordinário nº 898.060,
sobre matéria de repercussão geral, o STF entendeu:

Recurso Extraordinário a que se nega provimento, fixando-se a seguinte


tese jurídica para aplicação a casos semelhantes: “A paternidade
socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o
reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem
biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e
extrapatrimoniais”.

A possibilidade da tese multiparental na jurisdição brasileira já consiste


em uma realidade aceitável pelo STF, que reconheceu a cominação de
ambos os pais no registro civil. Entretanto, para haver multiparentalidade
é necessário atender alguns requisitos, os quais serão fragmentados a
seguir.

2.1 DA HIPÓTESE DE RECONHECIMENTO DA MULTIPARENTALIDADE

            A multiparentalidade é reconhecimento concomitante entre uma


pessoa e dois indivíduos, sendo um ligado por vínculo afetivo e outro por
um vínculo biológico e, ambos, tidos como pais. Uma pessoa poderia, por
exemplo, ter uma mãe, um pai de laço oriundo da afetividade e outro de
proveniente da consaguinidade.

Todavia, é válido salienta para ocorre dita multiparentalidade, é de


extrema importância haver uma relação de afeto entre os envolvidos, ou
seja, pais e filho multiparental. Desse modo, a multiparentalidade estar
ligada diretamente ao princípio implícito constitucional da afetividade.
Diante disso, não poderá ser reconhecida a multiparentalidade se inexistir
laços afetivos entre um dos envolvidos. Neste sentido, Madaleno entende
“[...] parentalidade científica só pode ter sentido como relação de filiação
quando coincidir com a vinculação afetiva, jamais invertendo esses
valores, muito menos se a intenção se traduz em gerar dinheiro no lugar
de amor”. (MADALENO.2011 Apud FRÓES e SCHMITT SANDRIS).

Em mesmo seguimento, STF negou Provimento no reconhecimento


pleiteado, no qual uma mãe buscava o reconhecimento da
multiparentalidade e o assentamento do nome do pai biológico em
proveito do filho menor. Entretanto, não havia vínculo afetivo entre o
menor e o genitor, desta forma o recurso restou improvido. Conforme
julgado:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE C/C


RETIFICAÇÃO DE REGISTRO DE NASCIMENTO. FILHO HAVIDO DE
RELAÇÃO EXTRACONJUGAL. CONFLITO ENTRE PATERNIDADE
SOCIOAFETIVA E BIOLÓGICA. MULTIPLICIDADE DE VÍNCULOS
PARENTAIS. RECONHECIMENTO CONCOMITANTE. POSSIBILIDADE
QUANDO ATENDER AO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. APLICAÇÃO
DA RATIO ESSENDI DO PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
JULGADO COM REPERCUSSÃO GERAL. SOBREPOSIÇÃO DO INTERESSE
DA GENITORA SOBRE O DA MENOR. RECURSO DESPROVIDO. (REsp
1674849 RS 2016/0221386-0)

Ainda sobre o referido julgado é valido ressaltar que o embasamento da


recorrente para o conhecimento e o provimento do recurso, seria a tese
firmada no julgado do plenário do STF, no qual reconheceu a possibilidade
do reconhecimento da paternidade biológica e socioafetiva em conjunto.
Todavia, para refutar a tese trazida pela recorrente, a digníssima colenda
turma, fundamentou:

5. O reconhecimento de vínculos concomitante de parentalidade é uma


casuística, e não uma regra, pois, como bem salientado pelo STF naquele
julgado, deve-se observar o princípio da paternidade responsável e primar
pela busca do melhor interesse da criança, principalmente em um
processo em que se discute, de um lado, o direito ao estabelecimento da
verdade biológica e, de outro, o direito à manutenção dos vínculos que se
estabeleceram, cotidianamente, a partir de uma relação de cuidado e
afeto, representada pela posse do estado de filho. 6. As instâncias
ordinárias afastaram a possibilidade de reconhecimento da
multiparentalidade na hipótese em questão, pois, de acordo com as
provas carreadas aos autos, notadamente o estudo social, o pai biológico
não demonstra nenhum interesse em formar vínculo afetivo com a menor
e, em contrapartida, o pai socioafetivo assiste (e pretende continuar
assistindo) à filha afetiva e materialmente. Ficou comprovado, ainda, que a
ação foi ajuizada exclusivamente no interesse da genitora, que se vale da
criança para conseguir atingir suas pretensões [...] RECURSO ESPECIAL
Nº 1.674.849 - RS (2016/0221386-0)

Pela análise do julgado acima, pode-se constatar que o STJ entendeu


pelo não provimento do recurso especial, por falta um pressuposto
essencial para o reconhecimento da multiparentalidade, ou seja, o
princípio da afetividade entre os correlacionados, mais especificamente
em relação ao genitor que detinha apenas o vínculo biológico.

Outro ponto, no qual é abordado no julgado ante exposto, é em relação ao


melhor interesse da criança ou adolescente, esse qual deriva do princípio
da paternidade responsável. No caso em tela, ficou evidentemente
provado que o pai biológico não tinha nenhum interesse em reconhecer o
menor, não havia laços afetivos. Em contraponto, o pai socioafetivo
reconhecia o menor como filho, havia laços de afetividade e ele atuava no
estado de posse sobre o filho, configurando assim a paternidade
responsável. Diante disso, ficou mantido o nome do pai socioafetivo no
registro civil e foi negado o pedido da configuração da multiparentalidade.
Em face disso, fica o questionamento a seguir.

2.2 DA NORMA À JURISPRUDÊNCIA: POR QUE NÃO ADOÇÃO?

Para Diniz (2009) a adoção é “(...) um vínculo de parentesco civil, em linha


reta, estabelecendo entre adotante, ou adotantes, e o adotado um liame
legal de paternidade e filiação civil. ” (p.521). Dias explicar que“ a adoção
cria um vínculo fictício de paternidade-maternidade entre pessoas
estranhas, análogo ao que resulta da filiação biológica” (DIAS, 2015,
p.481). A adoção é um elo de parentesco, no qual ligar uma pessoa a
outra por meio do registro civil, é o ato jurídico que permite que haja
parentesco em linha reta, sem existência de vínculo sanguíneo. Neste
seguimento, Vieira explicar:

Adoção é o ato jurídico solene pelo qual alguém recebe em sua família, na
qualidade de filho, pessoa a ela estranha, ou seja, filiação jurídica, pois
não é resultado de uma gravidez, mas de demonstração de vontade ou de
sentença judicial. Assim sendo a adoção diferencia-se da filiação natural,
exatamente, pelo vínculo, esta é determinada pelo vínculo jurídico,
firmado sobre uma relação afetiva. (VIEIRA.2011, p.11)

O Estatuto da criança e do Adolescente (ECA) dispõe em seu “Art. 41. A


adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e
deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com
pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais”. Deste modo,
entende-se que adoção encerra o vínculo jurídico com a família natural,
não podendo futuramente o adotado pleitear direito inerente a sua
personalidade, como por exemplo o direito ao pronome dos pais
biológicos, tendo em vista que tal direito foi desligado, em outras palavras
não existe vínculos de parentesco com a família natural. Posto que
adoção, praticamente o encerrar. Contudo escolher a adoção seria
romper com os outros laços familiares.

 Em contraposição, a multiparentalidade mantém a relação familiar


primária, já subsistente. A grosso modo, a multiparentalidade permite que
avôs e netos, tios e sobrinhos, irmãos e irmãos mantenham direitos
inerente a sua personalidade, ao conservar as relações familiares já
existentes, não há, portanto, qualquer rompimento, mas em contrapartida,
acréscimo. Neste sentido, foi dado provimento ao pedido de adoção, no
qual buscava o reconhecimento sócio-afetivo sem excluir do
assentamento civil o nome do pai biológico, em respeito à memória
paterna, com efeitos multiparentais. Vejam a ementa do caso em
comento:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ADOÇÃO. PADRASTO E ENTEADA. PEDIDO


DE RECONHECIMENTO DA ADOÇÃO COM A MANUTENÇÃO DO PAI
BIOLÓGICO. MULTIPARENTALIDADE. Observada a hipótese da existência
de dois vínculos paternos, caracterizada está a possibilidade de
reconhecimento da multiparentalidade. DERAM PROVIMENTO AO APELO.
(Apelação Cível Nº 70064909864, Oitava Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: AlzirFelippeSchmitz, Julgado em 16/07/2015). (TJ-
RS - AC: 70064909864 RS, Relator: AlzirFelippeSchmitz, Data de
Julgamento: 16/07/2015, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário
da Justiça do dia 22/07/2015)

No caso em tela, a sentença recorrida teria deferido o pedido de adoção


unilateral, todavia retirava o patronímico do pai da apelante. Essa qual,
irresignada com os efeitos da decisão a quo, apelou. Desta forma,
devolveu a matéria para re-análise da decisão ao órgão colegiado, no qual
entendeu que se tratava de um estado de filiação multiparental. Visto que
havia o pressuposto do princípio da afetividade. Conformo disposto no
mesmo julgado da Apelação Cível Nº 70064909864, pelo voto
desembargador relator Alzir Felippe Schmitz:

No que pertinente ao pedido de reconhecimento da multiparentalidade,


vejo o falecimento do pai de Juliane quando ela tinha apenas dois anos de
idade e o exercício da paternidade de fato pelo também autor Juan, são
fatores que não têm o condão de afastar a memória do pai biológico,
tampouco de romper os demais vínculos de Juliane com a família de seu
genitor.Portanto, observada a hipótese da existência de dois vínculos
paternos em relação à Juliane, caracterizada está a possibilidade de
reconhecimento da multiparentalidade.

No caso exposto, o douto relator Schmitz entendeu pela não exclusão do


pronome paterno, mesmo que pedido inicial fosse adoção unilateral. Visto
que acarretaria perda do vínculo família com seu pai biológico e, contudo,
afastaria a memória do seu genitor. Assim o julgado entendeu que
“observada a hipótese da existência de dois vínculos paternos,
caracterizada está a possibilidade de reconhecimento da
multiparentalidade”. Desta forma foi provido o apelo e reconhecida a
multiparentalidade.

3. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DA MULTIPARENTALIDADE

             A CF/88 trouxe igualdade sem distinções de filhos, que foi um


grande avanço para as concepções de entidade familiar, ao qual tirou do
descendente a cruel lástima de ser colocado diante da legislação
antecedente CF/88, antes da constituição cidadã vigente, os filhos
concebidos de relações extraconjugais, como já dito no primeiro capítulo,
eram tidos como espúrios, e o teor pejorativo ofendia o direito inerente a
personalidade. Não obstante, afetava tal discriminação por via legal o
princípio da dignidade da pessoa humana, pois acarretava distinções e
desigualdade entre o estado de filiação, nos quais os filhos concebidos no
casamento matrimonial tinham maiores garantias e direitos fundamentais.
Todavia tratamento discriminatório foi abolido pela atual Carta Magna,
visto que a Constituição de 1988 dispõe em seu art. 227, § 6º “Os filhos,
havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os
mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações
discriminatórias relativas à filiação”. Assim, ser pai ou mãe independe de
quaisquer sentimentos discriminatórios, isso porque a Carta Maior veda
distinção entre filho, para preserva o princípio da dignidade da pessoa
humana.

            A multiparentalidade é o reconhecimento jurídico de dupla


paternidade ou dupla maternidade, sendo ela reconhecida, significa dizer
que uma pessoa terá múltiplos pais/mães no status quo do registro civil.
Desta forma, o reconhecimento da multiparentalidade acarretará
consequências jurídicas advindas do estado de filiação, vejam a seguir
alguns efeitos no mundo jurídico do reconhecimento multiparental.

3.1 DA PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS

            A prestação de alimentos estar relacionada ao trinômio:


necessidade, possibilidade e proporcionalidade, no qual o devedor é
aquele que tem responsabilidade de dar verba alimentar, no qual deve
atender ao credor uma vida digna, para o mínimo de subsistência. Desta
forma, o art. 1.695, do CC/02, expressamente dispõe, “São devidos os
alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode
prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se
reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu
sustento”. Portanto, a prestação de verbas alimentar cuida do direito
fundamental e personalíssimo, e, consequentemente visa a assegurar
uma vida digna. Assim, “[...] o primeiro direito fundamental do ser humano
é o de sobreviver” (SILVIO Apud DIAS, 2015, p.558), e como garantir o
mínimo para subsistência, sem a responsabilidade de prestar verbas
alimentares aquele que necessita? Desta forma, segundo Lôbo surge o
trinômio, o qual questionar: o dever de prestar alimentos, necessidade de
quem receber verbas alimentares, e proporcionalidade da prestação de
tais verbas? Diante disso “a obrigação alimentar tem um fim precípuo:
Atender às necessidades de uma pessoa que não pode prover à própria
subsistência” (SILVIO Apud DIAS,2015, p.558). Nesta perspectiva,
Silmões de Sousa explicar:

O conteúdo dos alimentos envolve toda a prestação necessária para


ajudar o alimentando na manutenção da sua condição de vida. Assim, não
se limita ao que é necessário à subsistência, mas engloba também o que
é preciso para que a pessoa alimentanda mantenha o seu padrão de vida
anterior à circunstância excepcional que ocasionou a necessidade de
receber alimentos.  (SILMÕES DE SOUSA, 2014, p.4)

O dever de prestação de alimentos não se compreende apenas na


assistência básica para sobrevivência. A verba alimentar deve ser
ampliada a possibilidade daquele que tem obrigação de dar tal verba,
conforme a redação do art.1.694, §1° do CC/02“os alimentos devem ser
fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da
pessoa obrigada”. Segundo a CF/88 é dever dos pais ampara os filhos
menores, dado o necessário para uma vida digna, e em contrapartida
afirma que os filhos têm dever de prover os pais em sua velhice.

Assim há uma solidariedade recíproca, no qual a prestação de alimentos


entre pais e filhos inverter, pois devesse observa o trinômio necessidade,
possibilidade e proporcionalidade da prestação alimentar. Nesta
perspectiva, o CC /02 dispõe no Art.1.696. ” O direito à prestação de
alimentos é recíproco entre pais e filhos [...]”. Ante exposto, os pais têm
dever legal de prestar assistência aos filhos menores, e os filhos dever
legal de amparar os pais na velhice.

             Em casos que ocorra a multiparentalidade, em que consistem da


dupla paternidade/maternidade, o dever de prestação alimentos se
estende em relações aos múltiplos pais em prol do filho, isto é, a
prestação alimentar dever ser cobrado de ambos os pais, seja o pai
biológico, seja o pai sócio-afetivo, na proporção da possibilidade de cada
um, para atender as necessidades do alimentando. Da mesma forma, o
filho maior que tenha múltiplos pais, deve prestar alimentos a todos em
sua velhice, carência e necessidade, conforme o disposto na CF/88, Art.
229. Observa-se o maior amparo material entre ambos os pólos dessa
relação. Tanto o filho detém, além da afetividade de dois pais ou duas
mães alimentos, de ambos ou ambas, à medida que encontram,
igualmente, assistência do filho quando precisarem.

            Agora, passaremos ao estudo do instituto da guarda.

3.2. DA GUARDA NO ESTADO DE FILIAÇÃO MULTIPARENTAL

A guarda tem como escopo a proteção dos filhos, para tanto segundo
Lôbo, será aplicada em conjunto pelos respectivos pais. Entretanto, em
caso de separação conjugal, será individualizada (DIAS, 2015, p.523).
Pode-se conceituar guarda como um componente do poder familiar,
mediante o qual um indivíduo, encarregar-se da responsabilização civil de
cuidados inerente a idade da criança ou adolescente, como exemplo,
alimentos, saúde, educação e lazer (MELO, 2017, p.11). Strenger aduz:

A guarda dos filhos ou menores é o poder-dever submetido a um regime


jurídico-legal, de modo a facultar a quem de direito, prerrogativas para o
exercício da proteção e amparo daquele que a lei considerar nessa
condição (STRENG,1998, p. 71Apud MELO, 2017, p.12).

            Portanto a guarda estar diretamente ligada poder familiar, em que


os pais, originariamente, exercem sobre os filhos. Assim, “na guarda está
o dever de vigilância que, lenta e constantemente, atua decisivamente no
desenvolvimento da personalidade do menor e na sua formação integral”
(SILVA, 2006, p.22). Neste seguimento o art.33, § 1º “a guarda destina-se
a regularizar a posse de fato”, isto é, a guarda cuida de uma
instrumentalização de fato sobre o estado de posse sobre outrem, cujo
seja criança ou adolescente.

Em concordância com a redação do CC/02, art.1.566, IV, é dever dos pais


na constância do casamento a guarda dos filhos. É válido destacar que a
CF/88, equiparou a união estável a casamento, diante disso a guarda
também é aplicada em conjunto no caso de união estável. No fim da
sociedade conjugal ou dissolução da união estável, o CC/02 dispõe duas
possibilidades de guarda: unilateral e compartilha. Essa permite ambos os
genitores permaneçam com o elemento guarda, aquela atribuir a guarda
apenas a um único gênito. É importante ressalta que para determinar qual
espécie de guarda deve ser aplicada, é necessário respeita o princípio do
melhor interesse da criança ou adolescente.  Tendo como pressuposto
que a guarda unilateral priva o direito de um dos genitores em detrimento
de outrem, já guarda compartilhada, em primeira análise, dar um caráter
de igualdade entre pais. Em caso de multiparentalidade, qual guarda seria
mais adequada?  Bem para entender melhor instituto da guarda
compartilhada, Grisard Filho explica:

A guarda compartilhada é um plano de guarda onde ambos os genitores


dividem a responsabilidade legal pela tomada de decisões importantes
relativas aos filhos menores, conjunta e igualitariamente. Significa que
ambos os pais possuem exatamente os mesmos direitos e as mesmas
obrigações em relação aos filhos menores. Por outro lado, é um tipo de
guarda no qual os filhos do divórcio recebem dos tribunais o direito de
terem ambos os pais, dividindo, de forma mais equitativa possível, as
responsabilidades de criarem e cuidarem dos filhos (GRISARD, 2014 Apud
MELO, 2017 p.28)

            A guarda compartilhada garante o direito dos pais em comum


acordo no poder-dever em decisão de proteção dos filhos, trata de uma
prerrogativa estendida do direito anteriormente pré-existente, advindo da
sociedade conjugal ou da união estável, em que o casal exercia guarda em
conjunta, sem sofrer limitação do poder familiar. Neste sentido, Paulo
Lôbo explicar:

A guarda consiste na atribuição a um dos pais separados ou a ambos dos


encargos de cuidado, proteção, zelo e custódia do filho. Quando é
exercida por um dos pais, diz-se unilateral ou exclusiva; quando por
ambos, compartilhada. Nessas circunstâncias a guarda integra o poder
familiar, dele destacando-se para especificação do exercício.
(LÔBO,2008, p. s/n)

Em contraponto a guarda unilateral restringe direito do poder familiar,


podendo até mesmo em alguns casos, afetar o direito de convivência
entre pais e filho. Desta forma, Canezin compreende:

A guarda unilateral afasta, sem dúvida, o laço de paternidade da criança


com o não guardião, pois a este é estipulado o dia de visita, sendo que
nem sempre esse dia é um bom dia, isso porque é previamente marcado,
e o guardião normalmente impõe regras (CANEZIN, 2015 Apud
MELO,2017, p.24).

            Para poder escolhe a espécie de guarda mais adequada no caso de


filiação multiparental, em que três pais concorrerem pela guarda do
menor, faz de extrema necessidade respeitar o melhor interesse da
criança ou do adolescente. Visto que, a guarda serve como de
instrumento jurídico para atender as prerrogativas inerentes à
paternidade/maternidade responsável. A legislação nacional dar
preferência a guarda compartilhada conforme art.1.584, § 2º do CC/02,
pois garante um caráter de isonomia entre pais. Segundo Lôbo, “a guarda
compartilhada tem por finalidade essencial a igualdade na decisão em
relação ao filho ou co-responsabilidade, em todas as situações
existenciais e patrimoniais” (LÔBO, 2008, p.s/n), nessa espécie de guarda
o menor obterá domicílio na casa de um dos pais, mas isso não retirar a
tutela de frequenta a casa do outro gênito e nem muito menos interferir,
nem mitigar o instrumento da guarda, pois há um dever de solidariedade
entre os pais. Neste liame Lôbo afirma:

A guarda compartilhada é caracterizada pela manutenção responsável e


solidária dos direitos-deveres inerentes ao poder familiar, minimizando-se
os efeitos da separação dos pais. Ela incita o diálogo, ainda que cada
genitor tenha constituído nova vida familiar. Assim, preferencialmente, os
pais permanecem com as mesmas divisões de tarefas que mantinham
quando conviviam, acompanhando conjuntamente a formação e o
desenvolvimento do filho. (LÔBO, P., 2008, p. s/n).

            Ante disso, em caso de separação conjugal a guarda compartilhada


ressalta interferência mínima na vida do menor, pois frisa na manutenção
de convivência entre os pais e o filho, sem quer haja uma mudança
brusca, buscando o melhor interesse da criança ou adolescente. Em caso
de separação conjugal, na qual esteja presente o pai/mãe multiparente a
guarda compartilhada dever se estender a esse, visto que,
hipoteticamente, já dever ocorre o sistema de guarda compartilhada ao
pai/mãe biológico.  

3.3. MULTIPARENTALIDADE NO ÂMBITO SUCESSÓRIO

A sucessão decorre do direito fundamental, previsto no art.5°, XXX, da


CF/88, que garante a herança, que é a reunião de bens adquiridos pelo de
cujus, autor da herança. De acordo com o conceito Clóvis Beviláqua, o
direito sucessório trata sobre um conjunto de princípios, em que se passar
transmissão de um determinado patrimônio à determinada pessoa
(BAVILÁQUA Apud LEÃO CANDIL,2006, p.73). No mesmo liame “palavra
sucessão, em seu sentido amplo, implica continuação, no todo ou em
parte, em uma terceira pessoa, das relações jurídicas que cessaram para
o seu titular” (SCUSSEL, 2016, p. 10). Portanto, direito de sucessão
aborda sobre de direito uma pessoa em dar continuidade ao bem de
outrem, suceder o direito de propriedade do de cujus, isto é, em sentido
restrito, quando ocorre o evento morte, o direito real de propriedade
cessar para um e nascer para outro.

Sobre a temática sucessória, será restrita uma breve análise a respeito da


sucessão legitimas e como fica tal direito com o advento da
multiparentalidade. Antes de tudo, o art.1784, CC/02, dispõe “Aberta a
sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e
testamentários”. Os herdeiros legítimos são aqueles coexiste uma relação
de parentesco, como indicado pelo art. 1829 do Código Civil, não poderá
o excluir o herdeiro necessário, sem umas das restritas previsões legais.
Neste seguimento Scussel compreende:

A sucessão legítima, contudo, torna-se impositiva quando o autor da


herança possuir herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e
cônjuge ou companheiro). In casu, aquele só poderá dispor de metade do
patrimônio em testamento, ficando a outra parte bloqueada. A porção
patrimonial indisponibilizada chama-se legítima e sua justificação, por
óbvio, é a solidariedade social e familiar. (SCUSSEL, 2016, p.27).

O conceito acima está previsto no ordenamento jurídico nacional


conforme a redação do art.1.789, do CC/02, que diz “havendo herdeiros
necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança”, em
cumulação com o art.1.845, do CC/02, “são herdeiros necessários os
descendentes, os ascendentes e o cônjuge”. Desta forma, os filhos
herdam os bens dos pais falecidos, e os pais, no caso que inexista
descendente dode cujus, herdam os bens do filho, pois devesse respeito
a ordem de vocação sucessória prevista no art.1.829. Como já dito
anteriormente no primeiro capítulo deste presente trabalho, a CF/88 não
faz distinção entre filhos, assim no âmbito sucessório o filho multiparental
terá o mesmo direito garantido na sucessão legítima. Diante disso, o filho
multiparental terá um aumento na sua linha sucessória, pois poderá
herdam bens de até três ascendentes, visto sua condição decorrente do
reconhecimento multiparental.

Todavia é válido frisar quer em caso ocorra o evento morte do filho, e


neste exemplo o filho (de cujus) não deixe descendente, os parentes em
linha reta por ascendência serão legitimados para recebe o direito
fundamental a herança, na ordem de vocação em que o parente mais
próximo excluir o mais remoto, conforme a redação do art.1836, §1°, do
CC/02. Depara-se, então, em uma situação peculiar no âmbito da
multiparentalidade referente à quota parte dos respectivos pais, visto que
poderá haver o direito de suceder os bens do filho para três indivíduos.
Exemplo: dois pais e uma mãe ou duas mães e um pai. Conquanto o
CC/02, em seu art.1836, § 2° dispõe “havendo igualdade em grau e
diversidade em linha, os ascendentes da linha paterna herdam a metade,
cabendo a outra aos da linha materna”. Nesse viés, em caso de
multiparentalidade, quando ocorre o direito de suceder na relação aos
ascendentes em linha reta de primeiro grau, cabe a um gênito ficar com a
metade do espólio e a outra metade será dívida entre a dupla
paternidade/maternidade envolvida? Mesmo sendo a expressa previsão
legal, quanto ao direito sucessório do respectivo herdeiro, não seria justo
tal divisão, pois estaria claramente ferido igualdade entre os pais.

3.4. A QUESTÃO DA MULTIPARENTALIDADE COMO SALVAGUARDA DAS


FAMÍLIAS POLIAFETIVAS

Inicialmente, deve-se frisar, que o direito brasileiro não permite o


reconhecimento civil das famílias poliafetivas. São poliafetivas aquelas
famílias em que se verifica a pluralidade de membros no núcleo familiar,
isto é, uma verdadeira extensão de participantes em tal núcleo. Para
Anapol (2012, p. 1), Polyamory é um neologismo que designa um tipo
diferente de relacionamento. Explica a autora que o termo poly é oriundo
do grego, que significa muitos. Já Amory tem sua origem no latim. O
termo aportuguesado tem em sua tradução poliamor, como é comumente
empregado para designar uma espécie de relacionamento descrito
sinteticamente como aquele contrário às tradicionais regras
monogâmicas de se relacionar, ao caracterizar estar amando mais que
uma pessoa ao mesmo tempo (2012, P. 2). Nesta perspectiva, Paulo Lotti
explica:

[...]na união poliafetiva temos apenas um núcleo familiar, no qual três ou


mais pessoas mantém uma comunhão plena de vida entre si, ao passo
que nas famílias paralelas, temos mais de um núcleo familiar, no qual pelo
menos uma pessoa mantém uma comunhão plena de vida com diferentes
pessoas, as quais não se relacionam entre si.( PEREIRA,2015 apud
Silva,2017)

A poliafetividade, exemplificando, é compreendida como a união entre


três ou mais pessoas, à semelhasse ao casamento civil ou união estável
ambos monogâmico, contudo se distingue no ponto peculiar na amplitude
de membros na constituição familiar. Como dito, o ordenamento jurídico
nacional proíbe à constituição familiar de mais de duas pessoas, nos
termos do art. 1521, VI combinado ao art.1548, II, ambos do CC/02, no
qual considera-se impedidas de contraí novo casamento, caso ocorra
será nulo de pleno direito. Em que pese à realização de escrituras públicas
de registro de uniões poliamorosas o Conselho Nacional de Justiça (CNJ),
recebeu representação promovida pela Associação de Direito de Família e
das Sucessões (ADFAS), que se transformou em um Pedido de
Providências. O processo tombado sob o nº 0001459-08.2016.2.00.0000,
teve como pedido liminar a proibição da lavratura de tais escrituras até a
final regulamentação da matéria. A Ministra Nancy Andrighi negou a
liminar, mas sugeriu aos cartórios de todo país que suspendessem a
lavratura de escrituras de uniões poliamorosas até a conclusão dessa lide.

A tese sustentada pela ADFAS é que a poliafetividade nada mais é que


legitimação da constituição poligâmica nas uniões, em desacordo com
disposição constitucional do art. 226, §3º, sendo, portanto, uma formação
familiar inconstitucional, como exposto a seguir:

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. UNIÃO ESTÁVEL POLIAFETIVA. ENTIDADE


FAMILIAR. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILDADE. FAMÍLIA. CATEGORIA
SOCIOCULTURAL. IMATURIDADE SOCIAL DA UNIÃO POLIAFETIVA
COMO FAMÍLIA. DECLARAÇÃO DE VONTADE. INAPTIDÃO PARA CRIAR
ENTE SOCIAL. MONOGAMIA. ELEMENTO ESTRUTURAL DA SOCIEDADE.
ESCRITURA PÚBLICA DECLARATÓRIA DE UNIÃO POLIAFETIVA.
LAVRATURA. VEDAÇÃO.[...]4. A relação “poliamorosa” configura-se pelo
relacionamento múltiplo e simultâneo de três ou mais pessoas e é tema
praticamente ausente da vida social, pouco debatido na comunidade
jurídica e com dificuldades de definição clara em razão do grande número
de experiências possíveis para os relacionamentos.[...]10. A escritura
pública declaratória é o instrumento pelo qual o tabelião dá contorno
jurídico à manifestação da vontade do declarante, cujo conteúdo deve ser
lícito, uma vez que situações contrárias à lei não podem ser objeto desse
ato notarial. 11. A sociedade brasileira tem a monogamia como elemento
estrutural e os tribunais repelem relacionamentos que apresentam
paralelismo afetivo, o que limita a autonomia da vontade das partes e veda
a lavratura de escritura pública que tenha por objeto a união “poliafetiva”.
12. O fato de os declarantes afirmarem seu comprometimento uns com os
outros perante o tabelião não faz surgir nova modalidade familiar e a
posse da escritura pública não gera efeitos de Direito de Família para os
envolvidos. 13. Pedido de providências julgado procedente.

Entretanto, não se pode negar há existência de fato desse novo núcleo


familiar na sociedade brasileira, mesmo levando em conta o não
reconhecimento e tutela estatal. Logo, indaga-se se é possível
salvaguardar o direito do menor fruto de uma união poliafetiva? Bem,
numa relação envolvendo três indivíduos, exemplo, dois homens e uma
mulher, caso essa engravide, de fato existiria dois possíveis pais: apenas
um biológico, portem, certamente, dois sócio-afetivos. Mas ambos
reconhecendo sua posição de pai do infante, poderia se aplicar a
multiparentalidade, com o reconhecimento de filiação de ambos,
assegurando à prole, no mínimo, o dobro de amparo material, se focar-se
apenas em critérios objetivos, afinal afetivamente, a prole já teria todo
amparo factual dos dois.

            Outro exemplo, de possível aplicação da multiparentalidade para


salvaguarda às famílias poliafetivas seria, retomando a situação narrada,
se o nascituro fosse sujeito de direito constitucionalmente garantido à
herança.

Visto que há uma união de fato entre dois homens e uma mulher, diante
disso se aplicada a multiparentalidade poderia supri a lacuna da lei em
relação ao direito sucessório.

Ou seja, a multiparentalidade, em tese, poderia salvaguarda restritamente


às famílias poliafetivas, no que tange a aplicação do princípio do melhor
interesse da criança ou do adolescente. Pois, seria inexequível desprezar
o fato que o nascituro, no exemplo fático, ter em sua vida a presença de
dois pais. Mais que isso, agora lhe seria assegurado o dobro de suporte
material, com mais pessoas a concorrer por sua integridade, seja em
caráter alimentar, seja na garantia de mais uma linha sucessória.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

            O desenvolvimento deste presente trabalho possibilitou uma


análise sobre multiparentalidade, para tanto, fez-se necessário uma
averiguação histórica sobre o estado de filiação na sociedade brasileira.
Em que ficou evidentemente provado que a legislação fazia distinção de
filho, e consequentemente, os filhos concebidos de uma relação
extraconjugal eram taxados de espúrios, tal descriminação impedia o
reconhecimento do filho pelo respectivo pai. Houve uma minúscula
possibilidade do reconhecimento do filho nascido de relações
extraconjugais, foi com o decreto lei n°4.737/42, em que permitia gênito
reconhecer o filho fruto de relação adulterina, só depois do desquite.

O marco mais importante na legislação brasileira para evolução do direito


da família, no que tange o estado de filiação, foi promulgação da CF/88,na
qual deu igualdade formal sem distinção de filhos, o que possibilitou
discussão doutrinária de outra forma de filiação. A descoberta do exame
de DNA, trouxe para o direito a dita verdade real, em que possibilitou o
reconhecimento da filiação pela origem genética, tal exame garante ao
filho descobrir sua origem biológica, e como resultadogarante o direito da
personalidade a pronome paterno.Em contraponto a filiação decorrente
da genética, existe a filiação socioafetiva, derivada do princípio
constitucional da afetividade, sendo tal princípio a base da entidade
familiar. Contudo, foram travados questionamento sobre a qual filiação
deveria permanece no status quo do registro civil: Biológica ou afetiva.
Mas nada impedi que na filiação biológica inexista vínculo afetivo, até
porque o princípio da afetividade é a base para construção da entidade
familiar, a regra é que o pai tenha vínculo afetivo com seu descendente.
Ante exposto, para destrava o emblema, os tribunais começaram a
reconhecer a tese da multiparentalidade, que consiste na possibilidade
jurídica de uma pessoa ter dupla paternidade/maternidade no
assentamento do registro civil, sendo uma biológica e outra afetiva, para
tanto é de extrema importância estar presente o princípio da afetividade
na relação multiparental.

            O surgimento da multiparentalidade versa sobre a manutenção dos


vínculos familiares com a família dos pais, trata sobre uma extensão da
família decorrente dos laços afetivos. O reconhecimento multiparental
invés da adoção mantém a linha de parentesco entre a família natural
além de um vínculo civil culminando em uma verdadeira pluralidade de
parentesco, na qual possibilita mais direitos e deveres na ordem civil.
Portanto o reconhecimento multiparental acarreta consequências jurídicas
no ordenamento jurídico nacional, nos quais são derivam dos princípios da
paternidade responsável e da solidariedade familiar.

            A Multiparentalidade ampliar a assistência material do menor, seja


no dever da prestação de alimentos, seja no dever de guarda. Isso porque,
o reconhecimento multiparental causa consequências no âmbito jurídico,
decorrentes da paternidade responsável. Desta forma, o pai multiparente,
mesmo ocorrendo o fim da sociedade conjugal, dever dar apoio material
ao filho, além de dar amparo emocional e manter-se presente nas
decisões referente a prole. No caso de separação em que exista o pai/mãe
multiparente, a guarda compartilhada deve ser estendida ao mesmo, uma
vez que, reconhecido o vínculo multiparental não poderá ser desfeito.
Diante disso, a linha sucessória também é ampliada, o filho poderá
suceder em até três linhas retas, enquanto os pais poderão sofre um
emblema em relação a cota parte de sua herança, dado a omissão
legislava em relação a multiparentalidade. Já que a lei prever divisão em
50% na linha materna e 50% na linha paterna, o que é injusto em relação
a multiparentalidade, visto o caráter isonômico entre os pais.
            A multiparentalidade aparece como forma restrita de salvaguarda
às famílias porliafetivas, quanto ao direito da paternidade. Isto é, numa
família poliamorosa, formada por três pessoas, caso uma mulher
engravide poderá, visivelmente, buscar o reconhecimento multiparental
de um dos envolvidos.

            Ante exposto, concluir que o reconhecimento multiparental causa


efeitos jurídicos no âmbito nacional. Nos quais são decorrentes do
reconhecimento do estado de filiação, tal ligar um indivíduo a outro. Desta
forma, acarreta o dever legal de solidariedade familiar, em que traz o
dever de prestar alimentos, o dever a guarda e proteção do filho, além de
garantir o direito fundamental à herança.

REFERÊNCIAS

ANAPOL, Deborah. Polyamory in the 21st: Love and Intimacy with


Multiple Partners. Rowman & Littlefield Publishers. January 16, 2012.

BODIN, Maria Celina. Danos à personalidade humana: uma leitura civil-


constitucionalista dos danos morais. Editora Processo. 2ª Edição. Rio
de Janeiro: 2017

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em:


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[1] Bacharel em direito pela UNINASSAU.

[2] Pós Graduado em Direito Civil e Empresarial pela Universidade Federal


de Pernambuco (UFPE), Mestre em Direito, mestre em Antropologia pela
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), professor titular da
disciplina de direito civil da Faculdade UNINABUCO, advogado militante e
membro da comissão de direito de família da OAB, subseçãol de Olinda.

Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de


responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento
institucional do IBDFAM

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