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MULTIPARENTALIDADE

FAMÍLIA SOCIOAFETIVA

A concepção de família brasileira tem sofrido constante transformações.


Contudo, porém, mas os traços do modelo familiar grego, tem influenciado o atual
modelo familiar. Onde núcleo familiar dar-se-ia com o casamento onde o exercício do
pátrio poder era conferido ao homem e, a mulher, cabia a função de cuidar dos filhos
(Machado, 2020). Tal entendimento encontrava guarida no Código Civil de 1916.

O advento da Constituição Federal Brasileira de 1988, trouxe uma nova


compreensão das relações familiares, entre os quais, a igualdade de direitos e deveres
dos pais, pluralismo familiar, abarcando a possibilidade de constituição da família
socioafetiva.

Segundo Caio Mario da Silva Pereira.

“Nova estrutura jurídica se constrói em torno do conceito da


família socioafetiva, à qual alguns autores identificam como
“família sociológica”, onde se identificam, sobretudo, os laços
afetivos, solidariedade entre os membros que a compõem,
família em que os pais assumem integralmente a educação e a
proteção de uma criança, que independe de algum vínculo
jurídico ou biológico entre eles.8

Para Caio Mario, família socioafetiva constitui-se da:

“(...) relação afetiva estabelecida entre os membros da família,


podendo, muitas vezes, haver a priorização deste vínculo em
detrimento do fator puramente biológico.9

1. Conceito

A multiparentalidade, no contexto jurídico, incide na probabilidade de


constar no registro, certidão de nascimento, mais de um pai ou mais de mais uma mãe,
podendo ser feito simultaneamente ao registro da parentalidade biológica e/ou
socioafetiva.
Assim sendo, entendemos a multiparentalidade, como a constituição
familiar baseada na afetividade entre indivíduos, que por vezes suplantam às relações
meramente biológicas.

Maria Helena Diniz conceitua família como:

“Família no sentido amplíssimo seria aquela em que indivíduos estão


ligados pelo vínculo da consanguinidade ou da afinidade.” 1 (Diniz,
2008, p.9)

Para Berenice assim conceitua:

“Coexistindo vínculos parentais afetivos e biológicos, mais do que


apenas um direito, é uma obrigação constitucional reconhecê-los na
medida em que preserva direitos fundamentais de todos os
envolvidos, sobretudo a dignidade e a afetividade da pessoa
humana”.

Assim afirma o doutrinador TARTUCE, dissertando sobre o tema:

(…) parte da doutrina nacional aponta para a possibilidade de


reconhecimento da multiparentalidade, o que conta com apoio do
presente autor. O que se tem visto na jurisprudência é uma escolha de
Sofia, entre o vínculo biológico e o socioafetivo, o que não pode mais
prosperar. Como interroga a doutrina consultada, por que não seria
possível a hipótese de ter a pessoa dois pais e duas mães no registro
civil, para todos os fins jurídicos, inclusive familiares e sucessórios?
(2014, p. 936)

Acompanhando tal entendimento, Teixeira e Rodrigues (apud ALMEIDA e


RODRIGUES JÚNIOR, 2010, p. 381) entendem que:

1
Fontes de pesquisa:
1) https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-de-familia/multiparentalidade-a-possibilidade-da-multipla-filiacao-
registral-e-seus-reflexos-juridicos/
2) https://jus.com.br/artigos/29422/multiparentalidade-reconhecimento-e-efeitos-juridicos
3) https://jus.com.br/artigos/43284/multiparentalidade-a-possibilidade-juridica-do-reconhecimento-simultaneo-da-
paternidade-biologica-e-socioafetiva-e-seus-efeitos
4) https://www.aurum.com.br/blog/multiparentalidade/#:~:text=que%20%C3%A9%20multiparentalidade%3F-,A
%20multiparentalidade%20consiste%20na%20possibilidade%20de%20registrar%20um%20filho%20por,parentalidade
%20biol%C3%B3gica%20e%2Fou%20socioafetiva.&text=A%20posse%20do%20estado%20de,constitui
%20modalidade%20de%20parentesco%20civil%E2%80%9D.
(…) a multiparentalidade garante aos filhos menores que, na prática,
convivem com múltiplas figuras parentais a tutela jurídica de todos os
efeitos jurídicos que emanam tanto da vinculação biológica como da
socioafetiva, que, como demonstrado, em alguns casos, não são
excludentes, e nem haveria razão de ser, se tal restrição exclui a
tutela aos menores, presumidamente vulneráveis.

Tais mudanças nos valores sociais, impactaram sensivelmente o conceito de


família tradicional, criando novas formatações de família, bem como, aqueles
estabelecidos entre casais sem filhos, pai ou mãe sozinhos com os filhos, avós e netos,
casais homoafetivos.

Cumpre salientar que, estes formatos de família sempre existiram, mas a


dotação e reconhecimento jurídico tem dado novos contornos e desdobramentos quanto
a deveres e direitos oriundas destas configurações familiares.

Umas das repercussões sensíveis da família socioafetiva consiste na questão


enfrentada pelo STF, no Agravo em Recurso Extraordinário 62.186/PB, cuja a tese de
repercussão geral 622, sobre a possibilidade de prevalência da paternidade socioafetiva
sobre a paternidade biológica. O relator ministro Luz Fuz, assim proferiu o seu parecer:

“A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público,


não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante
baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO


CIVIL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ASSENTO DE
NASCIMENTO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE.
IMPRESCRITIBILIDADE. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO.
PATERNIDADE BIOLÓGICA. PATERNIDADE SOCIOAFETIVA.
CONTROVÉRSIA GRAVITANTE EM TORNO DA
PREVALÊNCIA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA EM
DETRIMENTO DA PATERNIDADE BIOLÓGICA. ART. 226,
CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PLENÁRIO VIRTUAL.
REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA (SUPREMO
TRIBUNAL FERERAL, 2012).
Um caso interessante para analisarmos, trata-se, de pedido de
reconhecimento da paternidade da criança, com correção de seu registro de nascimento,
fazendo constar como seu pai (biológico), com anulação do registro anterior. Ocorre
que, a genitora do requerente, manteve uma relação amorosa, com o seu pai (biológico)
pelo período de 10 meses, mas quando tomou ciência da gravidez já vivia em uma união
estável com outro homem optando por registrar a criança no nome do seu novo
companheiro.

A mãe alega que a criança teria sido fruto desta curta relação. Como já
estava envolvida em outra relacionamento, o ex-namorado questionou a veracidade da
afirmação, fato que contribuiu para sua tomada de decisão em relação ao registro do
infante. Acrescenta, a mãe que, ao tomar conhecimento, seu atual companheiro muito se
alegrou e passou a exercer o papel de pai dedicado desde o nascimento da criança.

Passado alguns meses o ex-namorado solicitou um exame de DNA, que


confirmou sua paternidade biológica.

A solução jurídica encontrada pelo juiz natural foi de incluir no registro da


criança o nome do pai biológico, sem excluir do registro o nome do pai afetivo.

2. Do Direito

O art. 1.593 do Código Civil Brasileiro traz um desdobramento favorável a tal


entendimento.

Art. 1593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de


consanguinidade ou outra origem.

O objetivo do legislador, aqui, é esclarecer a existência de parentes que não


seja apenas de origem biológica. O próprio código civil assegura os direitos dos filhos
adotado em igualdades com os de origem biológicas.

No enunciado 103 do CEJ dispõe que:

“[...] o código civil reconhece, no art.1593, outras espécies de


parentesco civil além daquele decorrente da adoção, acolhendo,
assim, a noção de que há também parentesco civil no vínculo parental
proveniente quer das técnicas de reprodução assistida heteróloga
relativamente ao pai (ou mãe) que não contribuiu com seu material
fecundante, quer da paternidade socioafetiva, fundada na posse de
estado de filho.”

Na mesma linha, apronta o enunciado 256 do CEJ:

“A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui


modalidade de parentesco civil”

A jurisprudência do STJ tem aceitado a prevalência da paternidade


socioafetiva em relação a paternidade biológica, desde que, com a anuência do filho.

A Lei 6.015/73, em seu art. 54, aponta que deverá constar no registro de
nascimento:

Art. 54. O assento do nascimento deverá conter:

(...) 7º) Os nomes e prenomes, a naturalidade, a profissão dos pais,(...)

8º) os nomes e prenomes dos avós paternos e maternos;(...)

A função do registro é comtemplar a verdade social vida real, desta forma, o


art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988 e o art. 16, do Código Civil, põe o
registro, o nome e o identificação dos pais como sendo um direito fundamental. A
própria lei de registro, em seu art. 54, determina que, no assento de nascimento deva
constar o uso do nome e do prenome e do apelido de família de todos os pais. Desta
forma, não existe vedação legal quanto a possibilidade da multiparentalidade, desde que
ocorra com a anuência da criança.

Todavia, os desdobramentos legais, bem como, a filiação (art. 1.596, CC), a


nacionalidade, as relações de parentescos (art. 1.591 e seguintes do CC), a proteção da
pessoa dos filhos e os desdobramentos quanto a guarda, alimentos, direitos sucessórios,
entre outros, terão desdobramentos na vida subsequente dos que constarem no registro.

Contudo, desta forma Heloisa Szymanski considera:


“as trocas afetivas na família imprimem marcas que as pessoas
carregam a vida toda, definindo direções no modo de ser com os
outros afetivamente, e no modo de agir com as pessoas. Esse ser com
os outros, apreendidos com pessoas significativas, prolonga-se por
muitos anos e frequentemente projeta-se nas famílias que se formam
posteriormente”

Fontes bibliográfica:

ALMEIDA, Renata Barbosa de; RODRIGUES JÚNIOR, Walsir Edson. Direito civil: Famílias. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2010.

CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO 2002.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA de 1988.

DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 51.

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2015, p. 51.

DIAS, Maria Berenice. Manual do Direito das Famílias. 5ª Ed. São Paulo: Editora RT, 2009.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. 23. ed. São Paulo: Saraiva.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 6. Direito das Sucessões, 21 ed. Saraiva, 2007.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 27. ed. vol. 5. São Paulo (SP): Saraiva, 2012.

Enunciado 103, Conselho da Justiça Federal, https://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/734

Enunciado 256, Conselho da Justiça Federal, https://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/501

HELOISA SZYMANSKI, “Viver em família como experiência de cuidado mútuo: desafios de um mundo em
mudança” in Revista Serviço Social e Sociedade. n. 71 – ANO XXIII – São Paulo: Cortez, 2002, pp. 10/11.

JUSBRASIL, https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/311629178/repercussao-geral-no-recurso-extraordinario-
com-agravo-rg-are-692186-pb-paraiba

Lei 6.015/73 - Lei de Registro.

PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil – Vol. V / Atual. Tânia da Silva Pereira. – 25. ed. rev.,
atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Volume único. 4. ed. São Paulo: Método, 2014.

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