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PARTICULARIDADES DO RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO


SOCIOAFETIVA POST MORTEM
PARTICULARITIES OF THE RECOGNITION OF POST MORTEM SOCIO-
AFFECTIVE AFFILIATION

Ana Carolina Stefan Armenio1


Flávia Eberle2

RESUMO: O presente artigo se insere na discussão acerca das


particularidades do reconhecimento da filiação socioafetiva post
mortem. A família sofreu diversas alterações no decorrer do tempo,
tanto na sua composição quanto no seu significado, deixando de ser
um ambiente de manutenção de patrimônio para se tornar um lugar
de proteção e desenvolvimento do indivíduo participante. Portanto, é
possível o reconhecimento após a morte desde basta ajuizar
uma ação declaratória pedindo que se reconheça que havia entre o
suposto pai e o filho uma relação de paternidade socioafetiva, ou
seja, que o falecido era seu pai socioafetivo. Por fim, os reflexos do
reconhecimento da filiação socioafetiva são o reconhecimento
jurídico da afetividade, vínculo socioafetivo e biológico em igual grau
de hierarquia jurídica e possibilidade jurídica da multiparentalidade, o
acolhimento da possibilidade dessa multiplicidade de vínculos
familiares, coloca o Supremo Tribunal Federal na linha de frente do
direito de família.

PALAVRAS CHAVES: Afetividade, Filiação socioafetiva,


Reconhecimento da socioafetividade por mortem.

ABSTRACT: This article is part of the discussion about the


particularities of recognizing post-mortem socio-affective affiliation.
The family has undergone several changes over time, both in its
composition and in its meaning, moving from being an environment for
maintaining heritage to becoming a place of protection and
development for the participating individual. Therefore, recognition
after death is possible as long as it is sufficient to file a declaratory
action asking for it to be recognized that there was a socio-affective
paternity relationship between the alleged father and the child, that is,
that the deceased was his socio-affective father. Finally, the
reflections of the recognition of socio-affective affiliation are the legal
recognition of affectivity, socio-affective and biological bonds at an
equal level of legal hierarchy and the legal possibility of
multiparenthood, the acceptance of the possibility of this multiplicity of
family bonds, puts the Federal Supreme Court in line front of family
law.

KEYWORDS: Affectivity, Socio-affective affiliation, Recognition of


socio-affectivity by mortem.

1
Acadêmica do Curso de Direito na Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC).
2
Advogada. Graduada e pós-graduada (especialização) pela Unoesc Campus de Xanxerê.
Docente de nível superior.
2

SUMÁRIO: 1. Socioafetividade no Direito de família 1.1 Principio da


afetividade 1.2 Conceito de família no Direito contemporâneo
2.Reconhecimento da Filiação 2.1 Espécies de filiação 2.2 Princípio da
igualdade entre os filhos 3.Filiação socioafetiva 3.1 Reconhecimento da
socioafetividade post mortem 3.2 Efeitos jurídicos decorrentes da filiação;
Considerações finais; Referências.

INTRODUÇÃO

O reconhecimento da filiação socioafetiva post mortem é de suma


importância para aqueles que por algum motivo, não puderam registrar sua
vontade formalmente em vida.
Pela análise dos processos julgados, torna-se evidente as lacunas
existentes no direito brasileiro com relação à filiação socioafetiva,
principalmente no sentido de haver o reconhecimento dessa condição post
mortem, notadamente, considerando a inexistência de regulamentação legal.
Por essa razão, os casos concretos se apresentam como verdadeiros desafios
aos magistrados, que precisam buscar fundamentos não positivados na norma
para proferirem as decisões.
Considerando os apontamentos acima, revela-se importante ao passo
que buscará apontar os critérios que vêm sendo observados para que haja o
reconhecimento do vínculo socioafetiva quando um dos envolvidos já tiver
falecido.
No que diz respeito ao vínculo formado, passou-se a priorizar as
relações afetivas em detrimento à verdade biológica, a ponto de ser pacífico o
reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva, com inclusão ou
alteração dos dados do registro civil do filho por conta de tal supremacia.
Ocorre que, quando ambos os envolvidos são vivos, pode ser requerido o
reconhecimento da filiação socioafetiva de maneira até mesmo extrajudicial.
Todavia, quando um dos envolvidos já houver falecido, existe uma maior
dificuldade com relação a tal reconhecimento por conta da certeza necessária
que permeia a vontade do indivíduo, a qual não deve ser maculada de qualquer
vício com relação à manifestação da vontade.
O presente trabalho tem como objetivo geral analisar as particularidades
para o reconhecimento da filiação socioafetiva post mortem. O embasamento
3

teórico está dividido em três capítulos, o primeiro aborda temas relacionados a


socioafetivadade no direito da família, princípio da afetividade, conceito de família
no direito contemporâneo, segundo descreve sobre reconhecimento da filiação, espécies de
filiação, princípio da igualdade entre os filhos e o terceiro é sobre filiação
socioafetiva, reconhecimento da socioafetividade post mortem e efeitos
jurídicos decorrentes da filiação.

1 SOCIOAFETIVADADE NO DIREITO DA FAMÍLIA

A socioafetividade é um conceito que tem sido cada vez mais utilizado


no Direito de Família o qual trata-se da relação afetiva entre indivíduos,
independentemente de laços biológicos ou jurídicos. A partir desta perspectiva,
a socioafetividade pode influenciar diretamente em questões de filiação,
adoção, reconhecimento de paternidade/maternidade e até mesmo em
questões de guarda e convivência familiar.
O que vivemos hoje, no moderno Direito Civil, é o reconhecimento da
importância da paternidade (ou maternidade) biológica, mas sem fazer
prevalecer à verdade genética sobre a afetiva, ou seja, situações há em que a
filiação é ao longo do tempo construída com base na socioafetividade,
independentemente do vínculo genético, prevalecendo em face da própria
verdade biológica3.
Esse reconhecimento de socioafetiva pode ser pedida tanto na esfera
judicial quanto na esfera extrajudicial, hoje em dia as famílias não são como
eram antigamente, temos a família tradicional de forma biológica e de laços
consanguíneos pai, mãe e filhos. Também existe a família moderna que é a
maioria, que são as famílias atípicas, formada pelo afeto que pode ser
reconhecido como socioafetiva, esse modelo de filiação o que une o pai ou a
mãe que não é biológico é o afeto, e esse é o objeto ao qual deve ser
demonstrado tanto na esfera judicial quando na esfera extrajudicial.
Se o parentesco natural decorre da cognação, ou seja, do vínculo da
consanguinidade, o denominado parentesco civil resulta da socioafetividade
pura, como se dá no vínculo da filiação adotiva, no reconhecimento da
paternidade ou maternidade não biológica calcada no afeto, na filiação oriunda
3
GAGLIANO, Pablo Stolze et al, Manual de Direito Civil (2016) p. 1299.
4

da reprodução humana assistida (em face do pai ou da mãe não biológicos),


enfim, em todas as outras situações em que o reconhecimento do vínculo
familiar prescindiu da conexão do sangue4.
Os requisitos devem ser demonstrados muito além do convívio de
madrasta e padrasto e o enteado, precisa ser demonstrado um laço estreito de
amor onde se considera pai e filho, o reflexo do reconhecimento da filiação
socioafetiva, toda a obrigação ética e moral e legal vai incidir nesse tipo de
relacionamento, para fins sucessórios, alimentos, regulamentação de visita se
for o caso, vai haver a necessidade de que isso seja regulamentado no
reconhecimento da filiação socioafetiva.
O reconhecimento socioafetiva carece de previsão legal, porém, a
dificuldade de implantar a lei não poderá ser uma barreira em seu
reconhecimento legal, considerando-se o fato de que o ordenamento jurídico é
composto também, por princípios, os quais devem proporcionar uma melhor
orientação e interpretação do direito no caso concreto, dando uma
oportunidade complementar de preencher ocasionais falhas que possam surgir
e adaptando o sistema jurídico à veracidade social, em vez que a vida e as
relações sociais são muito mais ricas e amplas do que é possível conter uma
legislação5.
A socioafetividade, portanto, amplia os conceitos tradicionais de
filiação, levando em conta a importância da afetividade também na construção
da identidade de um indivíduo. A inclusão deste conceito no Direito de Família
é fundamental para garantir que as decisões judiciais levem em consideração
não apenas os laços biológicos ou jurídicos, mas também as relações afetivas
que unem pessoas e famílias.

1.1 PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE

A afetividade tem muitas faces e aspectos e nessa complexidade,


temos apenas a certeza de que se trata de uma força elementar, propulsora de
todas as nossas relações de vida. Vale ressaltar que a existência formada

4
GAGLIANO, Pablo Stolze et al, Manual de Direito Civil (2016) p. 1307.
5
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores do direito de família.
Belo Horizonte: Del Rey, (2005) p. 129.
5

pelos membros de uma família é moldada pela relação socioafetiva que os


vincula, sem aniquilar as suas individualidades.
Ao enfatizar o afeto, a família passou a ser uma entidade plural,
calcada na dignidade da pessoa humana, embora seja, ab initio, decorrente de
um laço natural marcado pela necessidade dos filhos de ficarem ligados aos
pais até adquirirem sua independência e não por coerção de vontade, como no
passado. Com o decorrer do tempo, cônjuges e companheiros se mantêm
unidos pelos vínculos da solidariedade e do afeto, mesmo após os filhos
assumirem suas independências. Essa é a verdadeira diretriz prelecionada
pelo princípio da afetividade6.
Antes prevalecia um antigo paradigma da legalidade onde era
reconhecida como família legitima a família matrimonial onde apenas eram
reconhecidos como filhos legítimos os filhos oriundos desse relacionamento
matrimonial, todos esses paradigmas relacionados a essa legalidade que o
legislador impunha eles foram cedendo espaço ao novo paradigma que é a
afetividade, nesse caso o afeto não é relacionado a um sentimento parecido
com um sentimento de amor, e sim como um afeto de valor jurídico que
inclusive pode ser exteriorizado, comprovado através de analises e conduta
desses atos representativos dessas relações afetivas, ele pode ser aferido
através do cuidado que as famílias tem um com o outro, que pode ser
percebido através da convivência.
Os princípios jurídicos caminham junto com as leis, doutrinas e
jurisprudências, são a base para o ordenamento jurídico, pois são as estruturas
que traçam regras ou preceitos para toda a espécie de operação jurídica. O
Direito de Família é o mais humano de todos os ramos do direito e em razão
disto, e também pelo sentido ideológico e histórico de exclusões, é necessário
pensá-lo atualmente com a ajuda e pelo ângulo dos direitos humanos, cuja
base e ingredientes estão diretamente relacionados à noção de cidadania7.
Portanto, destaca-se que no Direito de Família podem ser identificados
alguns princípios norteadores, que são eles: princípio da dignidade da pessoa
humana, princípio da afetividade, princípio da solidariedade familiar, princípio

6
PEREIRA, Caio Mário da Silva et al, Instituições de Direito Civil, Volume V, p. 86.
7
CARVALHO, Dimas Messias de. Direito das Famílias. 4ª ed. Minas Gerais: Saraiva; 2015,
p. 41.
6

da igualdade entre os filhos e princípio da proteção da criança e do


adolescente.
O princípio da dignidade da pessoa humana enfatiza a visualização do
sujeito humano enquanto indivíduo pleno e digno de ter sua autodeterminação
contemplada e protegida e o princípio da afetividade trata-se de um princípio
que coloca o afeto como um valor jurídico, como elemento embrionário da
estruturação familiar8.
Princípio da Solidariedade Familiar enseja o pedido de alimentos entre
irmãos. O fato de o alimentado ser incapaz para os atos da vida civil e estar em
situação de vulnerabilidade justifica o pleito direcionado contra a única parente
possível: a irmã. Princípio da Igualdade entre os Filhos; em regra, não deve
existir diferença no valor ou no percentual dos alimentos destinados aos filhos
pelo genitor, pois, se presume que a prole possui as mesmas demandas vitais
e as mesmas necessidades para o exercício da dignidade da pessoa humana9.
Princípio da Proteção da Criança e do Adolescente é dever da família,
da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e
à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.10
O afeto também pode ser visualizado através da continuidade dessa
relação afetiva, do cuidado e da convivência, também pode ser percebido pela
sociedade, dando publicidade a esses atos afetivos e relacionamentos que as
pessoas nutrem umas com as outras, entretanto todos esses requisitos de fato
o que vai identificar esse grupo de pessoas como uma entidade familiar e quão
importante é a presença desse vínculo afetivo para essa configuração.
Essas pessoas devem se identificar como uma entidade familiar, elas
devem ter a intenção de constituir a família, uma vez preenchido todos esses
requisitos estarão diante a uma entidade familiar não importa se ela é parental
ou conjugal, o afeto passa a ser um elemento embrionário dessas relações

8
PEREIRA, Caio Mário da Silva et al, Instituições de Direito Civil, Volume V, p. 87.
9
CARVALHO, Dimas Messias de. Direito das Famílias. 4ª ed. Minas Gerais: Saraiva; 2015,
p. 41.
10
SANTOS, Jessica Vaz. Filiação socioafetivapost mortem. 45 f. Trabalho de Conclusão de
Curso (Graduação em Direito) – Centro Universitário Facvest – Unifacvest, Lages, 2019.
7

familiares, além disso o princípio da afetividade cada vez mais é utilizado e


embasado nas decisões dos tribunais e tribunais superiores, todas as decisões
relacionas ao direito das famílias ao reconhecimento desses novos formatos de
família nós temos o princípio da afetividade presente como fundamentação
desse reconhecimento11.
O princípio da afetividade está presente no ordenamento jurídico, em
algumas situações e modo implícito e outras em modo explícito, por exemplo
na Constituição Federal nos artigos 22612 e 22713 o legislador traz uma
fundamentação, a importância ao direito a convivência familiar, justamente
através dessa convivência familiar que pode-se ter uma manifestação do afeto.
No art. 159314 do Código Civil, o legislador reconhece como parentesco, além
do parentesco natural ou consanguíneo, um parentesco de outra origem,
possibilitando assim o reconhecimento do parentesco socioafetivo.
Para Carbonera15 o afeto é um novo elemento a ser considerado
juridicamente, ganhou dimensões significativas um elemento que anteriormente
estava à sombra: o sentimento. E, com ele, a noção de afeto, tomada como um
elemento propulsor da relação familiar, revelador do desejo de estar junto a
outra pessoa ou pessoas, se fez presente.

11
PEREIRA, Caio Mário da Silva et al, Instituições de Direito Civil, Volume V, p. 87.

12
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é
civil e gratuita a celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. In:
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
13
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e
ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão. In: BRASIL. Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988.
14
Art. 1593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra
origem”. Conforme é cediço, o parentesco é natural ou consanguíneo, caso decorra do mesmo
tronco ancestral, podendo ser na linha reta e na colateral. In: BRASIL, Lei nº 10.406, de 2002.
15
CARBONERA, Silvana Maria. O papel jurídico do afeto nas relações de família In:
FACHIN, Luiz Edson (coord.). Repensando Fundamentos do Direito Civil
Brasileiro Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2018, p. 296.
8

Também no Código Civil no art. 1584, § 5º 16, o legislador ao permitir que


a guarda compartilhada seja atribuída a um terceiro, um dos requisitos para
esse terceiro seja escolhido são as relações de afeto e afinidade com a
criança. Existe ainda a chamada Lei Clodovil que permite que os enteados
acrescentem ao seu nome o sobrenome da madrasta e do padrasto
reconhecendo assim a afetividade entre esses membros enteados as
madrastas e os padrastos.A Lei Maria da Penha no art. 5° 17, ela diz de modo
expresso que o afeto ele é uma forma de constituição familiar. A lei de
alienação parental traz de modo expresso que a alienação parental prejudica a
realização do afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar, fica
muito claro a presença do princípio da afetividade como um valor jurídico no
ordenamento e cada vez mais a afetividade está presente na formação dos
núcleos familiares.
Portanto, destaca-se que o afeto um laço que que por meio de
sentimentos externos põe humanidade em cada família 18. O princípio da
afetividade possui uma dupla face cuja compreensão auxilia na exata
percepção do seu sentido, a primeira delas é a face de dever jurídico, voltada
para as pessoas que possuam algum vínculo de parentalidade ou de
conjugalidade19. Essa face do princípio vincula tais pessoas a condutas
recíprocas representativas da afetividade inerente a tal relação.

16
Art. 1584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: I – requerida, por consenso, pelo
pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de
dissolução de união estável ou em medida cautelar; II – decretada pelo juiz, em atenção a
necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao
convívio deste com o pai e com a mãe. § 5º Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer
sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda a pessoa que revele compatibilidade com a
natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de
afinidade e afetividade. In: BRASIL, Lei nº 10.406, de 2002
17
Art. 5º. Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher
qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico,
sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. I - no âmbito da unidade doméstica,
compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo
familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como
a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços
naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na
qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação
sexual. In: BRASIL, Lei Maria da Penha nº 11.340, de 2006
18
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias, 14ª ed. revista, atualizada e
ampliada. Salvador: Editora JusPodivm, 2019, p. 74.
19
CALDERÓN, Ricardo Lucas. Princípio da Afetividade no Direito de Família. Rio de
Janeiro: Forense, 2017, p. 96.
9

A segunda faceta do princípio é a face geradora de vínculo familiar,


voltada para as pessoas que ainda não possuam um vínculo reconhecido pelo
sistema, pela qual a incidência do princípio da afetividade consubstanciará um
vínculo familiar entre os envolvidos. Nesta particularidade resta abarcada a
noção da posse de estado. Ou seja, a presença de um dado conjunto fático
fará incidir o princípio da afetividade de modo a configurar, a partir de então,
um vínculo familiar decorrente daquela relação20.
Sendo assim, percebe-se que as duas faces do princípio não se
confundem, e não se excluem, de modo que a partir de um reconhecimento de
vínculo familiar decorrente da incidência da face geradora de vínculos do
princípio automaticamente incidirá sua outra face, a de dever jurídico 21. Apesar
de se relacionarem, constituem duas facetas distintas, com características e
consequências próprias que devem ser observadas.

1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA NO DIREITO CONTEMPORÂNEO

Até recentemente a família que conhecíamos como família moderna era


composta por uma organização chamada de nuclear em que havia o pai a mãe
e os filhos, havia uma estrutura hierárquica nessas famílias, o pai era o
provedor o responsável pelas normas e Leis, a mãe ficava em casa cuidando
dos filhos, responsável pela educação dos filhos e do cuidado com a casa.
O Direito da família é uma área do Direito Civil, suas normas e leis
regulam as jurisprudências familiares. Direito de família é o complexo das
normas, que regulam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos,
que dele resultam, as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal,
a dissolução desta, as relações entre pais e filhos, o vínculo do parentesco e os
institutos complementares da tutela e da curatela22
O casamento era uma instituição que precisava durar para sempre, seja
pelo julgamento da mulher e por ela depender economicamente do marido,
havia uma relação de poder estabelecida entre os pais e os filhos

20
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. STF. ADIN 4277/DF e ADPF 132. Brasilia, 2019, p. 2.
21
CALDERÓN, Ricardo Lucas. Princípio da Afetividade no Direito de Família. Rio de
Janeiro: Forense, 2017, p. 96.
22
BEVILÁQUA, Clóvis. Código civil dos estados unidos do Brasil comentado. 5. ed. São Paulo:
Francisco Alves, 1937, p 678.
10

especialmente entre o pai e os filhos, cabia aos filhos obedecerem aos pais, os
pais estavam preocupados tanto com a manutenção dessa hierarquia, como
com a educação dos filhos a disciplina e no caso das meninas a manutenção
da virgindade com a garantia que essa menina fosse casar virgem, pois havia
uma preocupação social em relação a isso para ela ser bem vista pela
sociedade.
Foi a partir desses pequenos grupos que as famílias e a sociedade
começaram a existir. As leis nasceram na família, era o pai quem detinha
autoridade sobre a família, ele era a religião doméstica - lar família e pater.
Pela religião doméstica a família se constituía em um pequeno corpo
organizado, uma pequena sociedade, que tinha seu chefe e seu governo23.
O primeiro Código Civil brasileiro, descrevendo que a família era
caracterizada pela figura do pai detentor do poder patriarcal, semelhante ao
do pater famílias no direito romano, como consequência, as relações familiares
eram baseadas nos mesmos princípios, em que pai, mãe e filhos tinham papéis
específicos24.
Com o passar do tempo algumas transformações começaram a
aparecer, sendo que essa mulher que antigamente ficava em casa cuidando
dos filhos, passa a ter direitos sociais de voto de participação, passa também a
trabalhar isso começa a garantir para mulher uma certa independência
econômica e uma participação maior também nas decisões da casa, então o
pai que era antes o provedor começa a dividir suas responsabilidades com a
mulher, gerando uma transformação nos papeis dos dois dentro da família.
Ressalta-se que quando os pais adquirem este status, são
contemplados com direitos e deveres que inclusive, antecedem ao nascimento
ou à concepção dos filhos, fundamentando-se no empenho que aqueles devem
ter em relação a estes, onde, além de suprir as necessidades materiais, devem
proporcionar-lhes carinho, afeto e companheirismo25.

23
COULANGES, Numa-Denys. A cidade antiga. Trad. Frederico Ozanam Pessoa de Barros.
São Paulo: Editora das Américas S.A. – EDAMERIS, 2016.p. 234.
24
BARROS, Sérgio Resende de. A ideologia do afeto. Revista Brasileira de Direito de Família.
Porto Alegre: Síntese e IBDFAM, v. 4, n. 14, p. 5-10, jul./set. 2012.
25
ROLLIN, Cristiane Flores Soares. Paternidade responsável em direção ao melhor interesse da
criança. In: PORTO, Sérgio Gilberto; USTÁRROZ, Daniel (Org.). Tendências Constitucionais
no Direito de Família: estudos em homenagem ao Prof. José Carlos Teixeira Giorgis. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 432.
11

Por conta dessa maior autonomia financeira da mulher nas decisões da


família, ela percebe que pode separar do homem que não precisa ficar casada
com ele para sempre, isso vai gerando uma mudança no modo como as
separações vão sendo vistas, os casamentos hoje não são vistos mais que
devem durar a vida toda tanto o homem quanto a mulher se sentem mais livres
para se separar, com o tempo as separações e as novas uniões vão gerando
um novo jeito de se constituir a família, muito mais ampla, que por exemplo os
filhos de um casal convivam com os filhos de outro casal, irmãos que não
tenham laços consanguíneos convivam juntos.
Esses modos de organização de família se transformaram
historicamente, transformação social e histórica, a criança na idade média era
vista e tratada pela família de um modo completamente diferente dos dias
atuais, era vista como um adulto em miniatura em que se já estivesse se
alimentando sozinho, teria que participar das atividades que os adultos faziam,
esse cuidado com a infância com o estado de desenvolvimento não existia,
completamente diferente do conceito família que temos hoje.
O Direito de Família Contemporâneo, de forma inequívoca, vem
sofrendo uma mudança de paradigma no que se refere às relações familiares.
Se antes os vínculos biológicos eram privilegiados sob diversos aspectos, hoje
se observa a valorização dos vínculos afetivos, com o reconhecimento da
paternidade socioafetiva, apta a gerar direitos e deveres jurídicos26.
A família como uma instituição social vem passando por modificações
em sua estrutura. A família dos dias atuais possui como premissas: o afeto e a
dignidade da pessoa humana, e vai além de um meio familiar constituído pelo
casamento e unido pela herança genética, agora, são os laços afetivos que
determinam as relações familiares27.
Com o passar dos anos, o conceito de família mudou assumindo uma
concepção múltipla de família, plural, podendo dizer respeito a um ou mais
indivíduos, ligados por traços biológicos ou sócio-psico afetivos, com intenção

26
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de Direito Civil, Volume V, p. 655.
27
CARVALHO, Dimas Messias de. Direito das Famílias. 4ª ed. Minas Gerais: Saraiva; 2015,
p. 41.
12

de estabelecer, eticamente, o desenvolvimento da personalidade de cada um 28.


Com isso, nota-se que o conceito da família passa a ser o indivíduo.
A família é a base da sociedade, desempenha o papel de consentir a
todos os indivíduos que a compõem a sua realização. Ela passa a ser o meio
de possibilidades, de recurso para a conquista de sonhos, projetos de vida, de
progresso humano e existencial, é o contexto da valorização do ser humano e
de sua dignidade29.
Embora das modificações sofridas, a família continua sendo a instituição
fundadora da sociedade e as normas do Direito de Família se destinam não
somente a família a tutela passa a ser a pessoa humana que faz parte dessa
instituição.

2 RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO

Os filhos havidos ou não da relação do casamento, ou por doação, terão


os mesmo direito e qualificações, proibidas quaisquer designações
discriminatórias relativas à filiação. Antes dessa disposição os filhos não tinham
o mesmo status, os filhos nascidos na constância do casamento os legítimos, e
os filhos nascidos fora do casamento, também chamados de bastardos.
Também existiam casos na legislação que proibida o pai de assumir o filho
mesmo que fosse de sua vontade, porém o estado compreendia que os filhos
não eram dignos de receber a filiação porque foram concebidos de forma
inadequada aos conceitos morais da época.
Cabe destacar que foi com a Constituição Federal de 1988 que a
distinção entre filhos legítimos, legitimados e ilegítimos apartou-se do sistema
do Código Civil de 1916, cujo paradigma em matéria de filiação adotava a
presunção baseada na centralidade do casamento e desconsiderava tanto o
critério biológico quanto o afetivo30.

28
ROSENVALD, Nelson e FARIA, Cristiano Chaves. Direito Civil:Teoria Geral. Rio de
Janeiro: Lúmen Júris. 2017, p. 236.
29
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:
obrigações. São Paulo: Saraiva, v. 2. 2023, p. 85.
30
MEDINA, Tamires Cezimbra et al. Multiplicidade de vínculos parentais: uma análise a
partir do princípio do melhor interesse. Research, SocietyandDevelopment, v. 10, n. 8,
e51510815753, 2021.
13

O direito à filiação, que integra o Direito Civil, referente ao Direito de


Família, foi um dos temas que mais sofreu mudanças com a publicação da
Constituição Federal de 1988. A filiação é o parentesco entre pais e filhos, além
dessa união a filiação constitua objeto de apreciação áreas a genética, que
procura descobrir os traços comuns transmitidos de pai para filho31.
Um dos temas no ramo do Direito de Família que mais sofreram
influência dos valores consagrados pela Constituição Federal de 1988 foi,
indubitavelmente, o da filiação, que consiste em síntese conceitual, na situação
de descendência direta em primeiro grau. Com efeito, antes deste marco
histórico o ordenamento jurídico brasileiro consagrava diferenciais de
tratamento entre filhos (legítimos e ilegítimos), que, hoje, não são mais
aceitos32.
De acordo com Silvio Rodrigues, filiação é a relação de parentesco, em
primeiro grau e em linha reta, o qual da união de duas pessoas concebem uma
criança, ou da união de duas pessoas recebem uma criança como se
houvessem gerado. A partir do momento que uma criança foi concebida como
se filho fosse, adquiri essa qualidade de filho. O código civil traz a presunção
de filiação aqueles casos que já tem a filiação estabelecida. Conforme Art
1.597, do Código Civil, presumem-se concebidos na constância do casamento
os filhos33.
Se a mulher deixa de estar casada com uma pessoa e ela contrai novas
núpcias e nasce algum filho precisa fazer essa contagem de prazo para saber
qual será a presunção da filiação, se é filho do casamento anterior ou se vai ser
considerado essas novas núpcias será desse segundo marido. Essa presunção
é relativa. De acordo com o Artigo 226 da Constituição Federal de 1988, que a
família é a base da sociedade, sendo dever do Estado, reconhecer a união

31
LÔBO, Paulo. Direito Civil: família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
32
GAGLIANO, Pablo Stolze et al, Manual de Direito Civil (2016) p. 1289.
33
Art. 1597 do Código Civil. Nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida
a convivência conjugal; Nascidos nos trezentos dias subsequentes a dissolução da sociedade
conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento; Havidos por
fecundação artificial homologa, mesmo que falecido o marido; Havidos, a qualquer tempo,
quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes da concepção artificial homóloga;
Havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha previa autorização do marido.
Art. 1.598, CC. Salvo prova em contrário, se, antes de decorrido o prazo previsto no inciso II do
art. 1.523, a mulher contrair novas núpcias e lhe nascer algum filho, este se presume do
primeiro marido, se nascido dentro dos trezentos dias a contar da data do falecimento deste e,
do segundo, se o nascimento ocorrer após esse período e já decorrido o prazo a que se refere
o inciso I do art. 1597. In: BRASIL, Lei nº 10.406, de 2002.
14

estável entre um homem e uma mulher, bem como facilitar a sua conversão em
casamento34.
O STJ, na mesma linha, já reconheceu a aplicação do disposto no artigo
1.597 do Código Civil a união estável. Ignorar a aplicabilidade da presunção de
paternidade seria violar a igualdade entre os filhos concebidos na constância
do casamento e fora dela, violaria frontalmente tal preceito constitucional.
De qualquer modo, no campo do Direito, por maior que seja a
possibilidade da verdade técnica, nem sempre o fato natural da procriação
corresponde à filiação como fato jurídico. O legislador procura o possível no
sentido de fazer coincidir a verdade jurídica com a verdade biológica, levando
em conta as implicações de ordem sociológica e afetiva que envolvem essa
problemática. A filiação é, destarte, um estado, o status familiae, tal como
concebido pelo antigo direito. Todas as ações que visam a seu
reconhecimento, modificação ou negação são, portanto, ações de estado. O
termo filiação exprime a relação entre o filho e seus pais, aqueles que o
geraram ou o adotaram35.

2.1 ESPÉCIES DE FILIAÇÃO

A filiação está fundada nos laços de afeto, para o Ministério Público é o


reconhecimento jurídico da maternidade e/ou paternidade com base no afeto,
sem que haja vínculo de sangue entre as pessoas, ou seja, quando um homem
e/ou uma mulher cria um filho como seu, mesmo não sendo o pai ou mãe
biológica da criança ou adolescente36.
O artigo 27 da lei 8. 069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA)
estabelece o seguinte: O reconhecimento do estado de filiação é direito
personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os

34
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do estado. §3° Para efeito da
proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e a mulher como entidade
familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. (BRASIL 1988). In: BRASIL.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
35
VENOSA Sílvio de Salvo. Direito Civil Família, (2017) p. 238 e 239.
36
DIAS, Maria Berenice. Manual do Direito das Famílias. 5ª Ed. São Paulo: Editora RT, 2019,
p. 324.
15

pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de


Justiça37. Diniz destaca que38:
A filiação é o vínculo existente entre pais e filhos; vem a ser a relação de
parentesco consanguíneo em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e
aqueles que lhe deram a vida, destaca-se que filiação é a relação que o fato da
procriação estabelece entre duas pessoas, uma das quais nascidas da outra.
Chama-se paternidade, ou maternidade, quando considerada com respeito ao
pai, ou à mãe, e filiação, quando do filho para qualquer dos genitores.
Filho é uma relação descendente em linha reta em primeiro grau. Os
parentes mais próximos e mais diretos dos genitores são os filhos, essa filiação
se divide basicamente em a biológica, presumida, sócio afetiva e civil.
A biológica que é a pautada no DNA “ácido desoxirribonucleico”, o qual é
um ácido nucléico que apresenta todas as informações genéticas de um
indivíduo; Com o avanço de a ciência investigar a paternidade se tornou muito
fácil através dos exames de DNA, pois a exatidão do resultado diminuiu em
quase zero as chances de constituir uma paternidade mediante erro39. Destaca-
se que o filho biológico é aquele que provém de um ancestral com a mesma
informação genética, também conhecido como filho de sangue.
A presumida a qual acredita-se os filhos havidos na constância do
casamento são filhos presumidos, porém não possuí uma certeza absoluta, o
que permite a prova em sentido contrário. Sendo assim, os filhos nascidos
cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência
conjugai; II — Os nascidos dentro nos trezentos dias subsequentes à
dissolução da sociedade conjugai por morte, desquite, ou anulação40.
Nessas hipóteses a Lei diz que não precisa provar uma paternidade pois
haverá uma presunção. Também presume-se pai da fecundação chamada
homologa e a fecundação chamada heteróloga41. A fecundação homóloga
37
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ECA. Lei nº 8.069, de 13 de julho de
1990. Brasilia, 2019.
38
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. 23. ed. São Paulo:
Saraiva, 2018.
39
BORGES, Gabriella. Os tipos de filiação no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus
Navigandi, p. 7. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/56161/os-tipos-de-filiacao-no-
ordenamento-juridico-brasileiro. Acessado em 23-06-2023.
40
AGO, Roberto — Filiazione (Diritto Civile). In: Nuovo Digesto Italiano. Turim, 2018. v. 5, p.
1.137-68.
41
BORGES, Gabriella. Os tipos de filiação no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus
Navigandi, p.11 e 12. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/56161/os-tipos-de-filiacao-
no-ordenamento-juridico-brasileiro. Acessado em 23-06-2023.
16

envolve o material genético do casal, ainda que utilizado após a morte do


doador e que a heteróloga (com material de 3º) somente terá a presunção de
que o marido é o pai se este autorizar a utilização do material de outro.
A sócio afetividade o que conjuga é o amor, o que une é o afeto, o que
consolida a sociedade conjugal e paterno filial numa clara aplicação do jargão
popular “o pai é quem cria”. É certo que mais importante que os laços
biológicos são os socioafetivos, sendo assim, conseguindo a paternidade
reconhecida não por laços biológicos e nem adotivos e sim por laços de
socioafetividade e de convivência42.
O filho de criação é aquele que adentra aos lares de uma determinada
família a convite destes e passa a viver ali como se fizesse realmente parte do
núcleo família. A essência que o iguala aos filhos biológicos da casa é o afeto,
mesmo que esse sentimento seja nutrido só pelo pai ou só pela mãe43.
A filiação civil socioafetiva é prevista na adoção e na reprodução
medicamente assistida heteróloga, ao considerar pai/mãe jurídicos aqueles que
não forneceram o material genético, mas consentiram na fecundação utilizando
material do parceiro e de terceiro doador para procriação do filho do casal44.
Todo ser humano possui pai e mãe. Mesmo a inseminação artificial ou
as modalidades de fertilização assistida não dispensam o progenitor, o doador,
ainda que essa forma de paternidade não seja imediata. Desse modo, o Direito
não se pode afastar da verdade científica. A procriação é, portanto, um fato
natural45. Por fim, percebe-se que sob o aspecto do Direito, a filiação é um fato
jurídico do qual decorrem inúmeros efeitos.

2.2 PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE OS FILHOS

Antigamente havia cinco formas de especificar a filiação: a legítima,


legitimados, ilegítimos bastardos/adulterinos, sacrílegos e adotados. Os
42
BORGES, Gabriella. Os tipos de filiação no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus
Navigandi, p.11. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/56161/os-tipos-de-filiacao-no-
ordenamento-juridico-brasileiro. Acessado em 23-06-2023.

43
BORGES, Gabriella. Os tipos de filiação no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus
Navigandi, p.11. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/56161/os-tipos-de-filiacao-no-
ordenamento-juridico-brasileiro. Acessado em 23-06-2023.
44
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Socioafetividade no Direito de Família: a Persistente Trajetória de
um Conceito Fundamental. Porto Alegre: Magister; Belo Horizonte: IBDFAM, 2018. p.6.
45
VENOSA Sílvio de Salvo. Direito Civil Família, 2017 p. 238 e 239.
17

legítimos eram aqueles nascidos na vigência do casamento, os legitimados não


nascidos na vigência do casamento poderiam ser futuramente legitimados caso
houvesse o casamento entre seus pais. Durante a vigência do Código Civil de
1916 só ele detinha o corpo de lei que disciplinava as regras de filiação e,
portanto, fazia clara distinção entre filiação legítima e filiação ilegítima 46.
Os ilegítimos bastardos e os adulterinos eram aqueles nascidos fora do
casamento, os que seus pais tinham fora do casamento. O sacrílego era o filho
do padre da pessoa que tinha um voto de castidade e acabava tendo um filho.
E os adotados muito comum ainda nos dias atuais.
A filiação está fundada nos laços de afeto, para o Ministério Público é o
reconhecimento jurídico da maternidade e/ou paternidade com base no afeto,
sem que haja vínculo de sangue entre as pessoas, ou seja, quando um homem
e/ou uma mulher cria um filho como seu, mesmo não sendo o pai ou mãe
biológica da criança ou adolescente.
Com a promulgação da Magna Carta de 1988, o constituinte tornou
inaceitável quaisquer diferenças entre os filhos, aplicando-se o princípio da
igualdade, instituído no caput do art. 5º47, declarando no art. 227, § 6º os filhos,
havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos
direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias
relativas à filiação48.
Em suma, juridicamente, todos os filhos são iguais perante a lei,
havidos ou não durante o casamento. Essa igualdade abrange também os
filhos adotivos, os filhos socioafetivos e aqueles havidos por inseminação
artificial heteróloga (com material genético de terceiro). Diante disso, não se
pode mais utilizar as odiosas expressões filho adulterino ou filho incestuoso
que são discriminatórias. Igualmente, não podem ser utilizadas, em hipótese
alguma, as expressões filho espúrio ou filho bastardo, comuns em passado não
tão remoto. Apenas para fins didáticos utiliza-se o termo filho havido fora do
casamento, eis que, juridicamente, todos são iguais.
46
BORGES, Gabriella. Os tipos de filiação no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus
Navigandi, p. 13 e 14. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/56161/os-tipos-de-
filiacao-no-ordenamento-juridico-brasileiro. Acessado em 23-06-2023.
47
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade.
48
SILVA, Leandro Dias Alcolumbre da et al. O reconhecimento post mortem da filiação
socioafetiva. Academia Brasileira de Direito Civil, v. 2, n. 1, p. 18-26, 2018.
18

Isso repercute tanto no campo patrimonial quanto no pessoal, não


sendo admitida qualquer forma de distinção jurídica, sob as penas da lei. Trata-
se, desse modo, na ótica familiar, da primeira e mais importante especialidade
da isonomia constitucional49.
Diante da nova perspectiva de segurança, o artigo 227, passa a ter uma
redação fundada no direito da igualdade, onde os filhos extraconjugais têm
assegurado os mesmos direitos que os filhos do matrimônio, cabendo a
investigação de paternidade com direitos à igualdade. Após 1988, foi editada a
Lei 8.069/1990, que representou um grande avanço ao reconhecimento de
paternidade, e que para acurar mais ainda o caso, foi alterada pela lei
12.004/09. Assim, consolidou a referida proteção50.
Ao longo dos tempos tivemos uma serie de nomenclaturas pelas quais
referimos à filiação. Este cenário no Brasil começou alterar de fato na
Constituição de 1988, que consta no artigo 1° § III 51, mais especificamente no
artigo 22752 parágrafo 6° da Constituição Federal, diz que os filhos nascidos ou
não no casamento terão os mesmos direitos e a mesma qualificação.
Portanto, não há distinção entre os filhos, seja ele adotado, biológico ou
socioafetivo. Assim, dentro da mudança de paradigmas iniciada após a
promulgação da Carta Constitucional, fica clara a igualdade jurídica
estabelecida entre a filiação sanguínea e as formas de filiação afetiva, qual
seja, como por exemplo, a filiação por adoção.

3 FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA

49
TARTUCE Flávio. Direito Civil Direito de Família 5, (2017) p. 24
50
MOREIRA, Emyus José. Investigação de paternidade e seus efeitos no âmbito jurídico.
[s.d.]. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/investigacao-
paternidade-seus-efeitos-no-ambito-juridico.htm#indice_8. Acesso em: 22 out. 2021.
51
1° § III, o princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento da república, justifica a
igualdade da filiação, mas especificamente no artigo 227parágrafo 6° da Constituição Federal,
diz que os filhos nascidos ou não no casamento terão os mesmos direitos e a mesma
qualificação. Não há distinção entre os filhos, seja ele adotado, biológico ou socioafetivo.
52
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e
ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão. In: BRASIL, Constituição da República
Federativa do Brasil.
19

A filiação socioafetiva funda-se na clausula geral de tutela da


personalidade humana, salvaguardando a filiação como elemento fundamental
para a formação da identidade da criança e formação de sua personalidade.
Com isso, destaca-se que não é possível exercer a paternidade independente
de ser biológica ou não sem ter afeto.
A filiação socioafetiva nasce por meio da convivência familiar, no
conceito de Jorge Fujita, filiação socioafetiva é aquela consistente na relação
entre pai e filho, ou entre mãe e filho, ou entre pais e filho, em que inexiste
liame de ordem sanguínea entre eles. Quando o Código Civil de 2002, em seu
artigo 1.593, possibilita a constituição de parentesco por consanguinidade ou
por outra origem, ele cria a possibilidade não só da filiação advinda de laços
biológicos, mas também da filiação decorrente de laços afetivos, chamada de
filiação socioafetiva53.
A filiação socioafetiva necessita da relação recíproca de afetividade
entre as pessoas, tornando-se assim pai, mãe e filho socioafetivos. Além de a
relação existir de fato, tem que ser notória perante a sociedade, ou seja, a
sociedade tem que identificar na relação a presença da filiação, o pai agir como
pai e o filho agir como filho54.
O conceito de parentalidade socioafetiva é o vínculo de parentesco civil
entre pessoas que não possuem entre si um vínculo biológico, mas que vivem
como se parentes fossem, em decorrência do forte vínculo afetivo existente
entre elas55.
Essa nova modalidade de filiação, ainda que não haja menção expressa,
encontra-se fundamentada no artigo 1.593 do Código Civil 56. Isso porque, como

53
MELO, Bruna Trentino de. O reconhecimento da filiação socioafetiva no ordenamento
jurídico brasileiro. [s.d.]. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/o-
reconhecimento-da-filiacao-socioafetiva-no-ordenamento-juridico-brasileiro.htm#indice_5.
Acesso em: 22 out. 2021.
54
CASSETTARI, Christiano. Multiparentalidade e parentalidadesocioafetiva: efeitos
jurídicos.3. ed. rev. atual., e ampl. São Paulo: Atlas, 2017.
55
MELO, Bruna Trentino de. O reconhecimento da filiação socioafetiva no ordenamento
jurídico brasileiro. [s.d.]. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/o-
reconhecimento-da-filiacao-socioafetiva-no-ordenamento-juridico-brasileiro.htm#indice_5.
Acesso em: 22 out. 2021.
56
O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.
DAMASCENO, Nathália de Souza. Os desafios no reconhecimento da filiação socioafetiva
no Direito Brasileiro: uma análise a partir dos julgados no Tribunal de Justiça de Santa
Catarina.
20

aponta Carlos Roberto Gonçalves57, tanto a doutrina quanto a jurisprudência


têm adotado uma interpretação mais ampla deste dispositivo que, ao fazer uso
da expressão “outra origem”, estaria abrangendo também o parentesco
socioafetivo58.
Portanto, a paternidade socioafetiva é até mais importante que a
biológica e considerando a formação de novas famílias a partir de outras que
findaram, como no caso das famílias mosaico ou reconstruídas, em que um
dos pares possui filhos da relação anterior, é natural e até frequente o
desenvolvimento do afeto do padrasto ou madrasta para com o filho do outro,
por isso ser tão importante a questão da afetividade para reconhecimento da
filiação.

3.1 RECONHECIMENTO DA SOCIOAFETIVIDADE POST MORTEM

O reconhecimento do afeto surge como resposta às situações


existenciais, que antes não eram compreendidas pelo sistema patrimonialista,
centralizado no casamento. Assim, a parentalidade também pode ser
construída através de uma análise de conjuntos fáticos, caracterizando o que a
doutrina denomina “posse de estado de filho”.
Contudo, aquele quem sempre exerceu as funções parentais pode vir a
falecer, sem ter buscado o reconhecimento do vínculo socioafetivo. Não
obstante à falta de previsão legal expressa da declaração de parentesco
socioafetivo post mortem, sua existência vem sendo admitida pelo sistema
jurídico brasileiro.59
O reconhecimento da filiação pautada na socioafetividade não encontra
fundamentação expressa no diploma civil vigente. Desse modo, não existe
surpresa ao afirmar que o reconhecimento post mortem tampouco encontra
previsão legal. É necessário, portanto, fazer um esforço conjunto entre doutrina
57
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família. 11. ed. São Paulo:
Saraiva, 2014, p. 45.
58
DAMASCENO, Nathália de Souza. Os desafios no reconhecimento da filiação
socioafetiva no Direito Brasileiro: uma análise a partir dos julgados no Tribunal de Justiça de
Santa Catarina. 87 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade
Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2019 p. 235.
59
MELO, Bruna Trentino de. O reconhecimento da filiação socioafetiva no ordenamento
jurídico brasileiro. [s.d.]. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/o-
reconhecimento-da-filiacao-socioafetiva-no-ordenamento-juridico-brasileiro.htm#indice_5.
Acesso em: 22 out. 2021.
21

e jurisprudência, de modo a demonstrar a admissão no ordenamento jurídico


pátrio.60
Compreende-se que a declaração da filiação socioafetiva após a morte
do pai/mãe é possível se, além da caracterização do estado de posse de filho,
tiver havido clara e inequívoca intenção em vida, por parte do de cujus, de ser
reconhecido como pai/mãe daquele indivíduo61. Não havendo indícios dessa
vontade, improcede qualquer pretensão de se atribuir a parentalidade
socioafetiva.
É juridicamente possível à ação declaratória de filiação socioafetiva ser
proposta após o falecimento de quem desempenhou as funções de pai 62. O
reconhecimento da filiação socioafetiva post mortem se dá quando o suposto
filho socioafetivo busca, por meio judicial, o reconhecimento da
paternidade/maternidade socioafetiva após a morte do suposto pai/mãe.63
Sendo assim, já foi consagrada a ideia de que o parentesco civil pode
advir da socioafetividade, o que não é vedado pelo ordenamento, e
consequentemente, plenamente possível, prescindido de disposição legal
explícita.64
O Superior Tribunal de Justiça já emprestou interpretação ao citado
dispositivo, para permitir como meio de comprovação da inequívoca vontade
do de cujus em adotar as mesmas regras que comprovam a filiação
socioafetiva, o tratamento do adotando como se filho fosse e o conhecimento
público daquela condição.65

60
PEREIRA, Aléssia. Reconhecimento da filiação socioafetiva post mortem: análise de julgados
do STJ acerca do tema. Revista Conversas Civilísticas, Salvador, v. 1, n. 1, jan./jun. 2021.
61
MELO, Bruna Trentino de. O reconhecimento da filiação socioafetiva no ordenamento
jurídico brasileiro. [s.d.]. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/o-
reconhecimento-da-filiacao-socioafetiva-no-ordenamento-juridico-brasileiro.htm#indice_5.
Acesso em: 22 out. 2021.
62
SANTOS, Jessica Vaz. Filiação socioafetivapost mortem. 45 f. Trabalho de Conclusão de
Curso (Graduação em Direito) – Centro Universitário Facvest – Unifacvest, Lages, 2019, p.
765.
63
MELO, Bruna Trentino de. O reconhecimento da filiação socioafetiva no ordenamento
jurídico brasileiro. [s.d.]. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/o-
reconhecimento-da-filiacao-socioafetiva-no-ordenamento-juridico-brasileiro.htm#indice_5.
Acesso em: 22 out. 2021.
64
MELO, Bruna Trentino de. O reconhecimento da filiação socioafetiva no ordenamento
jurídico brasileiro. [s.d.]. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/o-
reconhecimento-da-filiacao-socioafetiva-no-ordenamento-juridico-brasileiro.htm#indice_5.
Acesso em: 22 out. 2021.
65
PEREIRA, Aléssia. Reconhecimento da filiação socioafetiva post mortem: análise de julgados
do STJ acerca do tema. Revista Conversas Civilísticas, Salvador, v. 1, n. 1, jan./jun. 2021.
22

Embora a paternidade e a maternidade socioafetivas não tenham, ainda,


sido disciplinadas pela legislação vigente, os seus reconhecimentos
jurisdicionais são admitidos pela jurisprudência emanada do Superior Tribunal
de Justiça, mediante aplicação por analogia das regras contidas nos artigos 27,
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e 1.606 do Código Civil (CC), que
asseguram a toda pessoa o direito de investigar e de ter reconhecida a
paternidade ou maternidade consanguínea66.
Foi com esse entendimento que o juiz Sílvio José da Silva, titular da 2ª
Vara Regional de Mangabeira, reconheceu a relação de filiação socioafetiva de
um homem que, desde os 6 anos de idade foi criado como filho pela tia,
convivência essa que durou 50 anos67.
Portanto, em situações em que fica amplamente demonstrada a
inequívoca vontade de adotar, diante da sólida relação de afetividade, é
possível o deferimento da adoção póstuma, mesmo que o adotante não tenha
dado início ao processo formal. Tal compreensão só consagra a ideia de que a
filiação não advém exclusivamente da origem consanguínea, podendo florescer
da socioafetividade.
No entanto, para que esse reconhecimento seja deferido, o filho que
deseja ser reconhecido como tal deverá demonstrar comprovadamente a
relação afetiva que tinha com o pai, seja por meio de fotos, bilhetes, vídeos,
posts virtuais e quaisquer outros documentos68, seja pelo arrolamento de
testemunhas que atestem a relação de afeto.

3.2 EFEITOS JURÍDICOS DECORRENTES DA FILIAÇÃO

O instituto da paternidade relacionam-se aos laços afetivos, pois, para


se estabelecer uma relação socioafetiva é preciso investigar criteriosamente a

66
GUEDES, Gabriela. Justiça reconhece relação de filiação socioafetiva entre sobrinho e tia
que conviveram durante 50 anos. Paraiba, 2021.

67
GUEDES, Gabriela. Justiça reconhece relação de filiação socioafetiva entre sobrinho e
tia que conviveram durante 50 anos. Paraiba, 2021.
68
MELO, Bruna Trentino de. O reconhecimento da filiação socioafetiva no ordenamento
jurídico brasileiro. [s.d.]. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/o-
reconhecimento-da-filiacao-socioafetiva-no-ordenamento-juridico-brasileiro.htm#indice_5.
Acesso em: 22 out. 2021.
23

real vontade do pretenso pai sob pena de não revelar a verdadeira


paternidade.69
Preleciona Moura, citado por Gonçalves70, o reconhecimento tem
natureza declaratória. Serve apenas para fazer ingressar no mundo jurídico
uma situação que existia de fato. Christiano Cassettari 71 aponta quatro
requisitos para a configuração da parentalidade socioafetiva: o laço de
afetividade, o tempo de convivência, a existência de forte vínculo afetivo e a
posse de estado de filho.
Este último critério mostra-se o mais relevante para fins de
reconhecimento da filiação socioafetiva, pois se trata da externalização de uma
relação paterno-filial estruturada no afeto72. A posse de estado de filho é
verificada a partir da presença de três elementos: 1) trato: quando o suposto
filho socioafetivo é tratado assim pela família, fornecendo-lhe meios de
subsistência, educação, entre outros; 2) nome: uso do sobrenome da família; e
3) a fama, ou seja, a reputação ou notoriedade no meio social73.
A doutrina conceitua a posse de estado da seguinte maneira 74: posse de
estado de filho é uma relação afetiva, íntima e duradoura, caracterizada pela
reputação frente a terceiros como se filho fosse, e pelo tratamento existente na
relação paterno-filial, em que há o chamamento de filho e a aceitação do
chamamento de pai.75
Posse de estado de filho é quando a vida privada vai além da intimidade
do lar e se manifesta publicamente, recebendo reconhecimento público e
notório, tratamento social ostensivo. Essa relação identificada como
69
CASSETTARI, Christiano. Multiparentalidade e parentalidadesocioafetiva: efeitos
jurídicos. São Paulo: Atlas, 2014, p. 88.
70
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 2017, p.
567.
71
CASSETTARI, Christiano. Multiparentalidade e parentalidadesocioafetiva: efeitos
jurídicos. São Paulo: Atlas, 2014, p. 90.
72
DAMASCENO, Nathália de Souza. Os desafios no reconhecimento da filiação
socioafetiva no Direito Brasileiro: uma análise a partir dos julgados no Tribunal de Justiça de
Santa Catarina. 87 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade
Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2019, p. 89.
73
PEREIRA, Aléssia. Reconhecimento da filiação socioafetiva post mortem: análise de julgados
do STJ acerca do tema. Revista Conversas Civilísticas, Salvador, v. 1, n. 1, jan./jun. 2021.
74
DAMASCENO, Nathália de Souza. Os desafios no reconhecimento da filiação
socioafetiva no Direito Brasileiro: uma análise a partir dos julgados no Tribunal de Justiça de
Santa Catarina. 87 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade
Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2019, p. 91.
75
BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de paternidade: posse de estado de filho:
paternidade socioafetiva. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2019, p. 56.
24

socioafetiva que traduz a vida como ela é, e pode ser objeto do


reconhecimento judicial, para ensejar efeitos jurídicos de ordem pessoal e
patrimonial.76
Belmiro Pedro Welter elenca três requisitos para a configuração da
posse de estado de filho: o nominativo (ter o sobrenome da família do pai
socioafetivo), o tractatus (ser tratado como filho) e a reputatio (ser considerado
filho pela família e pela sociedade).77 Segundo Christiano Cassettari78, a ação
pode ser movida pelo filho, mas também pelo pai ou mãe, se não tiver o
objetivo dele o genitor registral, mas tão somente acrescer a sua parentalidade,
após prova da socioafetividade79.Para o reconhecimento é necessário o
consenso entre as partes, pois o afeto deve ser mútuo. Compreendendo que
não se pode obrigar uma pessoa a ter vínculo de parentesco voluntário com
outra pessoa que não queira.
O reconhecimento de filhos, previsto no código civil, refere-se aos filhos
havidos fora do casamento, o reconhecimento também denominado como
perfilhação é o ato pelo qual alguém declara a sua condição de pai, com a
consequência do reconhecimento da paternidade o nome do pai constará no
assento de registro civil80.
Com isso, nota-se que o reconhecimento de paternidade poderá ser feito
de forma voluntária , quando o suposto pai reconhece por mera liberalidade a
paternidade do filho, ou de forma judicial, quando a sentença declara a
paternidade do filho, visto o resultado de exame de DNA ser positivo81.
O reconhecimento é do interesse direto dos filhos e das famílias e
indireto da sociedade em um todo, haja vista, a ausência da paternidade

76
DIAS, Maria Berenice. Filhos do afeto: questões jurídicas. 2.ed. rev. e atual. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 453.
77
DAMASCENO, Nathália de Souza. Os desafios no reconhecimento da filiação
socioafetiva no Direito Brasileiro: uma análise a partir dos julgados no Tribunal de Justiça de
Santa Catarina. 87 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade
Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2019, p. 111.
78
CASSETTARI, Christiano. Multiparentalidade e parentalidadesocioafetiva: efeitos
jurídicos. São Paulo: Atlas, 2014.
79
SILVA; Gleice Ane Alves Justino da et al. Do reconhecimento da paternidade
socioafetiva. Pesquisa e Ação, v. 2, n. 2, set. 2016.
80
GIRARDI, Rose Glace. O Reconhecimento de paternidade e suas consequências
jurídicas. Jusbrasil. São Paulo, 2020, p. 3.
81
DAMASCENO, Nathália de Souza. Os desafios no reconhecimento da filiação
socioafetiva no Direito Brasileiro: uma análise a partir dos julgados no Tribunal de Justiça de
Santa Catarina. 87 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade
Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2019, p. 111.
25

implicar a regularização do registro civil, além do exercício dos direitos e


deveres decorrentes da filiação82. Assumir a paternidade do filho constitui
imperativo a ordem moral e dever jurídico, configurando a um direito
personalíssimo, não podendo ser negado a qualquer fundamento, não sendo
este reconhecimento feito de forma espontânea, caberá ao filho, quando menor
de idade, representado pela mãe o ajuizamento da ação de investigação de
paternidade83.
Com o reconhecimento da paternidade, o filho passa a ter iguais direitos
e deveres aos seus irmãos e como se registrado fora ao logo ao nascer, tais
efeitos, decorrentes da filiação são de ordem patrimonial e moral. Sendo menor
o filho, o progenitor passará a exercer o poder familiar, poder de guarda ou
direito de visitas, além de assumir o dever de assistência, que é reciproco entre
os pais e filhos, pois passara a ser um herdeiro potencial, em conformidade
com o direito das sucessões.
O ato de Reconhecer a Paternidade é irrevogável, conforme preceitua o
artigo 1610 do Código Civil84, de acordo com o entendimento do Supremo
Tribunal de Justiça (STJ) o reconhecimento de paternidade pelo pai que sabe
que não possui vinculo biológico com uma criança, não poderá, posterior a um
arrependimento ser objeto de Ação Anulatória de Paternidade, a não ser que
haja uma caracterização de vício de consentimento, assim como erro ou
coação85.
Assim, o ato de reconhecimento de paternidade é o ato de assumir os
deveres de realização dos direitos fundamentais da pessoa em formação,
direitos inerentes à saúde, alimentação, educação entre outros, assim deveres
de caráter patrimonial e pessoal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

82
SILVA; Gleice Ane Alves Justino da et al. Do reconhecimento da paternidade
socioafetiva. Pesquisa e Ação, v. 2, n. 2, set. 2016.
83
GIRARDI, Rose Glace. O Reconhecimento de paternidade e suas consequências
jurídicas. Jusbrasil. São Paulo, 2020.
84
Art. 1610 . O reconhecimento não pode ser revogado, nem mesmo quando feito em
testamento.
85
GIRARDI, Rose Glace. O Reconhecimento de paternidade e suas consequências
jurídicas. Jusbrasil. São Paulo, 2020.
26

O direito de família é um dos ramos mais dinâmicos do direito, sujeito a


constante evolução. Ele pode ser melhor compreendido quando se analisa a
sociedade mais de perto, pois ela está sempre se reinventando, aderindo a
novas ideias, conceitos e valores. O direito está em um processo contínuo de
adequação à realidade social, com o intuito de responder às necessidades
daqueles que a ele recorrem em busca de seus interesses.
A família sofreu diversas alterações no decorrer do tempo, tanto na sua
composição quanto no seu significado, deixando de ser um ambiente de
manutenção de patrimônio para se tornar um lugar de proteção e
desenvolvimento do indivíduo participante. Com a evolução da sociedade, o
conceito de família sofreu profundas modificações ao ponto de atualmente ser
vedada qualquer tipo de discriminação seja com relação à forma de
composição do grupo, seja com relação aos filhos.
Percebe-se que a nova Constituição trouxe junto os novos conceitos
sobre família que ultrapassam a união que advém do casamento passa a
alcançar a união estável entre o homem e a mulher. Essa nova realidade
mostra uma nova visão dos vínculos familiares constituídos pela afetividade.
Para os doutrinadores e jurisprudentistas o afeto é um elemento
fundamental nas relações familiares e essa mesma importância deve ser dada
nas decisões judiciais, assegurando ao ser humano o princípio da dignidade
humano garantido na Constituição Federal. Ações requerendo indenização por
dano moral aos filhos ainda são raras nos tribunais brasileiros, o que mais se
vê são decisões relacionadas a pensão alimentícia.
Nos dias de hoje o novo conceito de família surgiu das novas formas de
convívio ou das novas formas de uniões amorosas temporárias, a atual
definição de família engloba famílias formadas entre por tios e sobrinhos, avós
e netos, onde só exista a figura do pai ou só da mãe, e até mesmo, entre
irmãos.
Isso nos leva a entender que tal ato é para que não exista somente um
modelo familiar preferido pela sociedade, pois, a família deve ser
compreendida como o centro na qual homem consiga desenvolver suas
particularidades por meio do princípio da dignidade da pessoa humana, além
dos princípios do Direito das Famílias.
27

Para que haja o reconhecimento da filiação socioafetivo é necessário


preencher alguns critérios, dentre eles a afetividade, tempo de convivência e
vínculo sólido, além da exteriorização dessa relação e da intenção de serem
reconhecidos como pais e filhos.
Portanto, é possível o reconhecimento após a morte desde basta ajuizar
uma ação declaratória pedindo que se reconheça que havia entre o suposto pai
e o filho uma relação de paternidade socioafetiva, ou seja, que o falecido era
seu pai socioafetivo.
Por fim, os reflexos do reconhecimento da filiação socioafetiva são o
reconhecimento jurídico da afetividade, vínculo socioafetivo e biológico em
igual grau de hierarquia jurídica e possibilidade jurídica da multiparentalidade, o
acolhimento da possibilidade dessa multiplicidade de vínculos familiares,
coloca o Supremo Tribunal Federal na linha de frente do direito de família.

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