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Tema I
Direito de Família. Conceito. Noções Gerais. Evolução histórica. Princípios constitucionais. Formação da
família. Casamento. Natureza jurídica. Habilitação matrimonial. Celebração. Casamento civil e casamento
religioso com efeito civil. Capacidade matrimonial. Suprimento judicial. Impedimentos matrimoniais. Causas
suspensivas. Prova do casamento.
Notas de Aula1
Feita esta introdução, a definição de a que ramo está afeito o direito das famílias se
mostra bem difícil: é direito público ou privado? Hoje, em tempos de
neoconstitucionalismo, boa parte dos autores modernos entende que esta classificação em
público ou privado não tem mais cabimento, porque não há ramo que seja exclusivamente
público ou exclusivamente privado, e o direito das famílias é um bom exemplo desta
mescla, pois as relações são essencialmente privadas, mas de alta relevância social.
A interferência social na família se faz perceber na majorada importância que a
mediação assume nos conflitos desta seara. Mediação não se confunde com conciliação,
porque o mediador tem maior poder de interferir na relação, nas vontades, a fim de compor
a lide – o que o conciliador não faz.
“Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou
qualquer deles e seus descendentes.
Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se
estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por
parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém
vínculos de afinidade e afetividade. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009).”
altamente relevante, por exemplo, para a configuração ou não da união estável na nova
relação, o que será abordado com profundidade em tema próprio, adiante.
A doutrina prevê ainda o conceito de família solidária: para Ana Carla Matos, a
família solidária é aquela formada por pessoas que estão em relação de convívio por
circunstâncias da vida que as colocam em pé de solidariedade. O melhor exemplo é o de
idosos que residem em uma casa de saúde, os quais podem acabar por formar uma família
entre si, dado o nível de convivência, afeto e intimidade.
Maria Berenice Dias ainda fala na família eudomonista, que nada mais é do que
aquela família fundada puramente no afeto.
A discussão mais clássica sobre a responsabilidade civil em direito das famílias diz
respeito ao dano moral por dissolução de noivado, casamento, ou por abandono moral de
filhos. O embate é ferrenho, mas já se pode apontar uma tendência jurisprudencial ao
menos no que se refere ao abandono moral: STJ e STF entendem que não é cabível, porque
o afeto não pode ser imposto (apesar de haver decisões de tribunais regionais que entendem
que há violação do princípio do planejamento familiar responsável pelo pai que assim se
porta, havendo ato ilícito).
A função social da família é patente, e por isso Gustavo Tepedino reflete que a
família não é voltada para si mesma, e sim para a sociedade: é um meio de valorização do
homem, um pilar de estabilidade social, e só atinge sua função social quando cumpre esta
finalidade de valorizar as pessoas que dela participam.
2. Casamento
Nem a CRFB, nem o CC, traçam conceito normativo do casamento. O artigo 226 da
CRFB, há pouco transcrito, não traz conceito. E mais: ao tratar do casamento, não disse o
constituinte que seja entre homem e mulher, sendo que fez esta expressa menção quando
tratou da união estável, no § 3º deste artigo. Esta peculiar omissão, que pode ser vista como
um mero lapso legislativo ante a aparente obviedade, na mens legislatorum, de que o
casamento só se perpassava entre homem e mulher, dá hoje margem à tese de que a CRFB
não se opôs à união homoafetiva pelo casamento, mas somente pela união estável.
Ausente o conceito legal de casamento, a doutrina o define: é o ato solene e formal,
pelo qual o homem e a mulher se unem em matrimônio, formando a comunhão de vida.
Daqui surge a indefectível questão: qual é a natureza jurídica do casamento?
Três são as vertentes. A primeira reputa-o como um contrato, porque o casamento se
institui por meio da manifestação bilateral de vontades, e, além disso, há como se traçar os
elementos patrimoniais da relação e seus efeitos. Segunda corrente defende que o
casamento é uma instituição: o acordo de vontades, na verdade, não forma um contrato, e
sim expressa uma mera adesão dos nubentes aos efeitos legais do reconhecimento desta
relação. Por fim, o terceiro entendimento é uma corrente mista, que defende que o
casamento é tanto um contrato como uma instituição, a depender do aspecto que se
observe: é um contrato em relação à formação, e uma instituição em relação aos efeitos.
Não há posição majoritária, prevalecendo um pouco a corrente mista. Cristiano
Chaves ainda defende uma quarta leitura, que diz que o casamento não é contrato, nem é
instituição: o casamento está contrato ou está instituição, a depender do tempo e da
sociedade em que se o observa.
Há quem diga que o casamento tem por finalidade a procriação, como diz Maria
Helena Diniz. Não é uma assertiva verdadeira. Gerar prole pode ser um efeito do
casamento, mas não é a finalidade deste ato: a finalidade é promover a comunhão de vidas.
Nem todos podem se casar. A lei estabelece alguns requisitos para que haja a
legitimidade para se casar. Vejamo-los.
O primeiro requisito para poder se casar é ter idade núbil, que hoje é unificada para
homem e mulher: só pode se casar aquele que tenha ao menos dezesseis anos. Veja o artigo
1.517 do CC:
“Art. 1.517. O homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se
autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não
atingida a maioridade civil.
Parágrafo único. Se houver divergência entre os pais, aplica-se o disposto no
parágrafo único do art. 1.631.”
Esta regra pode ser afastada, permitindo o juiz o casamento do pré-núbil, nos casos
do artigo 1.520 do CC:
Há uma clara impropriedade deste artigo, porque o pré-núbil não pode cumprir pena
criminal – menores não cometem crime, mas ato infracional, e não recebem pena, mas
medida sócio-educativa.
Além disso, a interpretação deste dispositivo deve ser feita de forma ampla, a fim de
permitir a autorização do casamento do pré-núbil em casos que seja identificada a
necessidade, alheios aos exemplos ali mencionados. Veja o enunciado 329 do CJF:
“Enunciado 329, CJF: A permissão para casamento fora da idade núbil merece
interpretação orientada pela dimensão substancial do princípio da igualdade
jurídica, ética e moral entre o homem e a mulher, evitando-se, sem prejuízo do
respeito à diferença, tratamento discriminatório.”
Daquele que tem entre dezesseis e dezoito anos, é exigida a autorização de ambos
os pais ou representantes legais. Se houver negativa de ambos, não é possível o casamento;
se houver dissenso, apenas um dos pais concedendo, o casamento é anulável, na forma do
artigo 1.550, I e II, do CC:
Suprido o consentimento pelo juiz, quer porque os pais se negaram, aos maiores de
dezesseis, quer porque a pessoa está em idade pré-núbil, o casamento será sempre
necessariamente feito pelo regime da separação obrigatória de bens, na forma do artigo
1.641, III, do CC:
Vale mencionar que o parentesco por afinidade não se extingue com o fim do
casamento, como dispõe o artigo 1.595, § 2º, do CC:
“Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo
vínculo da afinidade.
§ 1º O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos
irmãos do cônjuge ou companheiro.
§ 2º Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou
da união estável.”
“Enunciado 98, CJF: Art. 1.521, IV, do novo Código Civil: o inc. IV do art. 1.521
do novo Código Civil deve ser interpretado à luz do Decreto-Lei n. 3.200/41 no
que se refere à possibilidade de casamento entre colaterais de 3º grau.”
Antes de se arrolar tais causas, cabe uma crítica: na verdade, não são causas
suspensivas do casamento. Não há suspensão de nada, e sim a mera condicionante de, se se
casarem nestas situações, o regime de bens será o da separação legal. Veja o artigo 1.523 do
CC:
Veja que o parágrafo deste artigo permite o afastamento das causas suspensivas
referentes à confusão patrimonial, o que se ocorrer implica na possibilidade de escolher o
regime de casamento – pois a única consequência das causas suspensivas é o regime legal,
e se não se aplica a causa, não se aplica a consequência.
O artigo seguinte diz quem pode, e até que momento, argüir as causas suspensivas:
“Art. 1.526. A habilitação será feita perante o oficial do Registro Civil e, após a
audiência do Ministério Público, será homologada pelo juiz.”
“Art. 1.532. A eficácia da habilitação será de noventa dias, a contar da data em que
foi extraído o certificado.”
A celebração do casamento, em regra, se dá na forma civil. Contudo, apesar do
laicismo estatal, o casamento religioso pode produzir efeitos civis. Veja, sobre a celebração,
os artigos 1.533 e 1.538 do CC, além do artigo 70 da Lei 6.015/73, Lei de Registros
Públicos:
“Art. 71. Os nubentes habilitados para o casamento poderão pedir ao oficial que
lhe forneça a respectiva certidão, para se casarem perante autoridade ou ministro
religioso, nela mencionando o prazo legal de validade da habilitação. (Renumerado
do art. 72 pela Lei nº 6.216, de 1975).”
“Art. 1.539. No caso de moléstia grave de um dos nubentes, o presidente do ato irá
celebrá-lo onde se encontrar o impedido, sendo urgente, ainda que à noite, perante
duas testemunhas que saibam ler e escrever.
§ 1º A falta ou impedimento da autoridade competente para presidir o casamento
suprir-se-á por qualquer dos seus substitutos legais, e a do oficial do Registro Civil
por outro ad hoc, nomeado pelo presidente do ato.
§ 2º O termo avulso, lavrado pelo oficial ad hoc, será registrado no respectivo
registro dentro em cinco dias, perante duas testemunhas, ficando arquivado.”
“Art. 1.540. Quando algum dos contraentes estiver em iminente risco de vida, não
obtendo a presença da autoridade à qual incumba presidir o ato, nem a de seu
substituto, poderá o casamento ser celebrado na presença de seis testemunhas, que
com os nubentes não tenham parentesco em linha reta, ou, na colateral, até
segundo grau.”
“Art. 861. Quem pretender justificar a existência de algum fato ou relação jurídica,
seja para simples documento e sem caráter contencioso, seja para servir de prova
em processo regular, exporá, em petição circunstanciada, a sua intenção.”
Veja que o artigo 1.547 do CC cria uma forte presunção in dubio pro casamento,
como regra de julgamento.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Esta vedação é bastante criticada pela doutrina, porque se entende que seja um
preconceito e discriminação legal inaceitáveis. Contudo, a jurisprudência a aplica quase à
unanimidade: o pacto antenupcial que fixe outro regime é nulo, nesta parte. Maiores de
sessenta anos só podem se casar em regime de separação legal.
Há apenas uma ressalva: se o nubente maior de sessenta anos já constituíra, com sua
companheira, união estável anterior a esta idade, o regime de então era o da comunhão
parcial, e este poderá ser mantido, ou um novo, qualquer, escolhido.
Veja a Apelação Cível 2004.001.09014, e a exceção, na Apelação 2005.001.20785,
ambas do TJ/RJ:
Questão 2
Josué, jovem de 17 anos de idade, e Josefa, com apenas 15 anos, após namoro pelo
período de 1 ano, resolveram se casar. O pai de Josué, que possui a sua guarda, autoriza o
casamento, apesar da objeção de sua mãe. Os pais de Josefa consentem e os jovens
convolam núpcias sem se valerem da autorização judicial. O casamento é válido, nulo ou
anulável?
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema II
Notas de Aula2
ou anulável precisa de um processo, destinado a alcançar uma sentença que o declare nulo
ou anulado; o inexistente, não precisa de ação alguma. Até pode haver uma ação
declaratória negativa, da inexistência do casamento, mas pode esta inexistência ser
declarada em qualquer processo, incidentalmente, porque é meramente constatável.
Outra diferença é que o casamento nulo ou anulável pode até ter produzido efeitos
jurídicos, mas o inexistente não produz efeito algum, jamais: ex nihilo nihil, ou seja, do
nada, nada surge.
O casamento putativo, inválido, pode produzir efeitos, se celebrado de boa-fé; o
inexistente, mesmo putativo, não produz efeito algum, porque se trata de um verdadeiro
não-ato.
A tripartição Pontiana dos atos jurídicos, teoria que primeiro separou os três planos
do ato jurídico – existência, validade e eficácia –, consiste em uma escalada, como se sabe:
só se passará à análise do plano da validade de um ato se o plano da existência foi
perfeitamente completado. O negócio só pode ser analisado em sua validade se for
considerado existente. No casamento, o plano da existência se aperfeiçoa com a presença
dos elementos cuja ausência já se mencionou serem causas de inexistência: se há
diversidade de sexos, pluralidade de consentimento e celebração por autoridade
competente, o casamento existe, e pode ser galgado um passo na análise de sua perfeição,
ou seja, pode-se passar à análise de sua validade.
1.2.1. Nulidades
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.”
1.2.2. Anulabilidades
O inciso I do artigo supra deve ser combinado com o artigo 1.553 do CC:
“Art. 1.553. O menor que não atingiu a idade núbil poderá, depois de completá-la,
confirmar seu casamento, com a autorização de seus representantes legais, se
necessária, ou com suprimento judicial.”
Se alguém se casa fora da idade núbil, pode o vício ser sanado quando o menor
alcançar dezesseis anos, mediante autorização dos pais ou suprimento judicial, ou,
No caso do inciso II, se a pessoa menor, mas em idade núbil, se casa sem
autorização do representante, o casamento é anulável, mas o vício pode ser sanado, no
prazo do artigo 1.555 (prazo que também se aplica para a hipótese do inciso I do artigo
1.550 do CC):
“Art. 1.555. O casamento do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu
representante legal, só poderá ser anulado se a ação for proposta em cento e oitenta
dias, por iniciativa do incapaz, ao deixar de sê-lo, de seus representantes legais ou
de seus herdeiros necessários.
§ 1º O prazo estabelecido neste artigo será contado do dia em que cessou a
incapacidade, no primeiro caso; a partir do casamento, no segundo; e, no terceiro,
da morte do incapaz.
§ 2º Não se anulará o casamento quando à sua celebração houverem assistido os
representantes legais do incapaz, ou tiverem, por qualquer modo, manifestado sua
aprovação.”
“Art. 1.551. Não se anulará, por motivo de idade, o casamento de que resultou
gravidez.”
“Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por
parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro.”
O artigo supra trata da hipótese do erro essencial quanto à pessoa do cônjuge. Esta
situação caiu em desuso, por uma simples questão social e cultural: nos idos de 1970, era
comum o casamento entre pessoas que não tinham tido oportunidade de muito convívio
prévio, e esta falta de conhecimento acerca do consorte permitia que coisas graves ficassem
desconhecidas pelo outro, ocultadas pela pouca intimidade. Na atual sociedade, é mais
difícil que haja esta ocultação de fatos graves, eis que a intimidade e convívio prévio ao
casamento torna conhecidas todas as características dos consortes.
Entretanto, também com a modernidade tem surgido causas novas de erro essencial,
ressuscitando esta anulabilidade no mundo dos fatos. Exemplo extremo é a possibilidade,
hoje, de se realizar uma cirurgia de mudança de sexo, de tal perfeição que o cônjuge pode
não ter conhecimento, até depois do casamento, desta qualidade do seu parceiro – o que
justificaria a anulação por erro essencial. Cristiano Chaves critica este exemplo,
entendendo-o como preconceituoso, na medida que a pessoa que mudou de sexo passa a ser
tida como do sexo oposto, para todos os efeitos.
É claro que o vício deve ser de alta gravidade, pois aquele mero defeito acidental
não desperta anulabilidade. A definição deste limite será sempre casuística, mas o artigo
1.557 do CC elenca parâmetros:
“Art. 1.560. O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento, a contar
da data da celebração, é de:
I - cento e oitenta dias, no caso do inciso IV do art. 1.550;
II - dois anos, se incompetente a autoridade celebrante;
III - três anos, nos casos dos incisos I a IV do art. 1.557;
IV - quatro anos, se houver coação.
§ 1º Extingue-se, em cento e oitenta dias, o direito de anular o casamento dos
menores de dezesseis anos, contado o prazo para o menor do dia em que perfez
essa idade; e da data do casamento, para seus representantes legais ou ascendentes.
§ 2º Na hipótese do inciso V do art. 1.550, o prazo para anulação do casamento é
de cento e oitenta dias, a partir da data em que o mandante tiver conhecimento da
celebração.”
“Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os
cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos
até o dia da sentença anulatória.
§ 1º Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos
civis só a ele e aos filhos aproveitarão.
§ 2º Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus
efeitos civis só aos filhos aproveitarão.”
2. Eficácia do casamento
3. Bem de família
à míngua o direito de moradia das pessoas solitárias. Neste sentido, veja a súmula 364 do
STJ:
Tudo que ultrapassar este teto de um terço não estará protegido pela
impenhorabilidade. Se for instituído bem de família convencional de valor maior do que
este limite, e o bem for divisível, será fracionado e a parcela excedente será alienada,
concentrando-se a proteção apenas na parte que restar, regularmente dentro do limite.
Sendo o imóvel indivisível, e ultrapassado o limite legal de um terço do patrimônio, ele
será penhorável, mas apenas reverterá aos credores a parte que sobejou o terço legal, ou
seja, até o limite de um terço do patrimônio do proprietário restará protegido pelo instituto,
mas não o excedente.
Se os instituidores do bem de família voluntário vierem a falecer, a sua afetação não
se desfaz – o imóvel continua impenhorável e inalienável.
Como se vê no artigo supra, e no artigo 1.714 do CC, o registro público é parte da
essência deste instituto, incidindo no plano da existência. Veja:
“Art. 1.714. O bem de família, quer instituído pelos cônjuges ou por terceiro,
constitui-se pelo registro de seu título no Registro de Imóveis.”
“Art. 1.715. O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua
instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas
de condomínio.
Parágrafo único. No caso de execução pelas dívidas referidas neste artigo, o saldo
existente será aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da
dívida pública, para sustento familiar, salvo se motivos relevantes aconselharem
outra solução, a critério do juiz.”
VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença
penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
(Incluído pela Lei nº 8.245, de 1991).”
Este artigo 3º traz algumas exceções, e a última, do inciso VII, referente ao fiador,
foi inserida pela Lei de Locações, como se vê. O que se pretendeu, com esta inserção, foi
permitir que o fiador que assume esta obrigação sobre seu bem de família não possa dela se
eximir pela proteção da impenhorabilidade, e o STF tem entendido que é constitucional esta
norma. Contudo, três ministros do quadro atual do STF já votaram pela
inconstitucionalidade da penhorabilidade do bem de família do fiador, porque se trataria de
uma quebra de isonomia severa – o fiador tem o bem penhorável, e o locatário, devedor
principal, não. Atualmente, porém, ainda vige a norma, e o bem de família do fiador é
penhorável, sendo amplamente majoritária a tese da não proteção deste bem, por prevalecer
a autonomia da vontade: se criou o gravame voluntariamente sobre seu bem de família, o
fiador não pode objetar que sua excussão seja feita, pois desde sempre soube desta
possibilidade.
O inciso IV do artigo supra também merece comentários, porque a jurisprudência
tem estendido esta exceção à impenhorabilidade para custeio das dívidas de condomínio,
também propter rem como as demais ali mencionadas.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
O prazo passado foi de noventa e dois dias, pelo que, se interpretada literalmente a
norma, que dita prazo de noventa dias, seria inválido. Porém, em uma interpretação calcada
nas diretrizes da socialidade e eticidade, pode-se considerar como exceção razoável esta
perda do prazo, validando o casamento religioso. Neste sentido, veja o Agravo de
Instrumento 2007.002.15211, do TJ/RJ:
“Processo: 0023741-26.2007.8.19.0000 (2007.002.15211). 1ª Ementa - AGRAVO
DE INSTRUMENTO. DES. ISMENIO PEREIRA DE CASTRO - Julgamento:
20/06/2007 - DECIMA QUARTA CAMARA CIVEL.
REGISTRO DE CASAMENTO RELIGIOSO. EFEITOS CIVIS. PRAZO PARA
REGISTRO. CELEBRAÇÃO DO MATRIMÔNIO DENTRO DO PRAZO DE
EFICÁCIA DA HABILITAÇÃO, OBEDIENTE À DICÇÃO DO ARTIGO 1.532
DO CÓDIGO CIVIL. ALEGAÇÃO DE JUSTO IMPEDIMENTO PARA A
REALIZAÇÃO TEMPESTIVA DO ATO. TUTELA ANTECIPATÓRIA
CONCEDIDA DETERMINANDO A EFETIVAÇÃO DO REGISTRO. DECISÃO
CORRETA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1.516, §1º, DO CÓDIGO CIVIL.
PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS QUE AUTORIZAM O PRECEITO
PREFACIAL. PROVIMENTO MONOCRÁTICO DO AGRAVO. ARTIGO 557,
§1º-A DO CPC.”
Questão 2
Resposta à Questão 2
A prática do tipo penal não a beneficia, mesmo porque já era ciente deste fato
quando do casamento. Não pode jamais se valer de sua própria torpeza – nemo auditur
propriam turpitudinem allegans.
Acerca da não consumação sexual do casamento, não se a pode reputar erro
essencial, podendo no máximo ser causa de pedir para a separação. A impotência coeundi,
porém, se desconhecida pelo cônjuge até depois do casamento, pode sim ser considerada
erro essencial.
Veja a Apelação Cível 70006550073, do TJ/RS:
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema III
Acordo. Cláusulas obrigatórias. Homologação. Negativa de homologação. A Lei 6.515/77 e o Código Civil.
Sentença. Natureza e efeitos. Averbação. Restabelecimento da sociedade conjugal. Discussão da culpa.
Notas de Aula3
3
Aula ministrada pela professora Isabella Pena Lucas, em 24/2/2010.
A separação de corpos é uma medida cautelar preparatória, que não pode ser
entendida como satisfativa. É possível, nesta cautelar, tratar da guarda de filhos, e até
mesmo de questões alimentares.
Há prazo de caducidade de trinta dias, após o deferimento da separação de corpos
cautelar, para propositura da ação de separação judicial principal. Os artigos 796 e 888 do
CPC são relevantes:
conjugal como uma das medidas protetivas da mulher em risco, como se vê no artigo 23,
IV, da Lei 11.340/06:
“Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
(...)
IV - determinar a separação de corpos.”
A cautelar pode ser deferida liminarmente, e até mesmo de forma inaudita altera
parte, porque há casos extremos em que a citação antes da decisão liminar pode gerar
prejuízos trágicos, por conta da violência entre os cônjuges. Há, porém, que se ter cuidado
nesta liminar, eis que a retirada do cônjuge apontado como algoz de seu lar, sem sequer
ouvi-lo, pode configurar uma enorme injustiça. Para prevenir esta situação, o juiz dispõe de
uma audiência de impressão pessoal, em que vai ouvir o cônjuge que requer a separação de
corpos e suas testemunhas, a fim de melhor instruir-se acerca do motivo cautelar para a
liminar.
2. Separação judicial
Há quem defenda que a separação consensual, após o advento desta norma supra,
deve necessariamente ser feita na via extrajudicial. Não prevalece esta tese, pois a maior
parte da doutrina e jurisprudência entende que a Lei 11.441/07 apenas abriu uma faculdade
aos consortes, não afastando completamente a via judicial em prol da via administrativa.
Dito isto, o objeto de estudo deste tópico se reduz às formas de separação judicial,
que pode ser consensual ou litigiosa.
“Art. 1.572. Qualquer dos cônjuges poderá propor a ação de separação judicial,
imputando ao outro qualquer ato que importe grave violação dos deveres do
casamento e torne insuportável a vida em comum.
§ 1º A separação judicial pode também ser pedida se um dos cônjuges provar
ruptura da vida em comum há mais de um ano e a impossibilidade de sua
reconstituição.
§ 2º O cônjuge pode ainda pedir a separação judicial quando o outro estiver
acometido de doença mental grave, manifestada após o casamento, que torne
impossível a continuação da vida em comum, desde que, após uma duração de dois
anos, a enfermidade tenha sido reconhecida de cura improvável.
§ 3º No caso do parágrafo 2º, reverterão ao cônjuge enfermo, que não houver
pedido a separação judicial, os remanescentes dos bens que levou para o
casamento, e se o regime dos bens adotado o permitir, a meação dos adquiridos na
constância da sociedade conjugal.”
“Art. 1.574. Dar-se-á a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges
se forem casados por mais de um ano e o manifestarem perante o juiz, sendo por
ele devidamente homologada a convenção.
Parágrafo único. O juiz pode recusar a homologação e não decretar a separação
judicial se apurar que a convenção não preserva suficientemente os interesses dos
filhos ou de um dos cônjuges.”
A separação de corpos já pode ter sido operada, tanto faticamente quanto por meio
da cautelar preparatória, já abordada. Não é a sentença de separação judicial que leva a esta
situação, necessariamente. Tampouco a partilha tem que ser realizada neste momento,
necessariamente, podendo ser feita posteriormente, mesmo após o divórcio.
Há quem diga que a sentença de separação imporá no marco para que não mais haja
a comunicabilidade de bens, mas a doutrina moderna defende que a comunicabilidade deixa
de existir desde quando houver comprovada separação fática, mesmo que ainda não esteja
juridicamente certificada por uma sentença. Interpretando literalmente este dispositivo,
fomenta-se as fraudes, porque no curso do processo, até a sentença, a pessoa que está
faticamente separada não adquirirá novos bens, ou o fará em nome de terceiros, a fim de
não levá-los a comunicar-se com o patrimônio do ex-cônjuge.
A decisão da separação de corpos também é um marco inegável do término da
comunicabilidade dos bens.
“Art. 1.577. Seja qual for a causa da separação judicial e o modo como esta se
faça, é lícito aos cônjuges restabelecer, a todo tempo, a sociedade conjugal, por ato
regular em juízo.
Parágrafo único. A reconciliação em nada prejudicará o direito de terceiros,
adquirido antes e durante o estado de separado, seja qual for o regime de bens.”
Casos Concretos
Questão 1
Barney propõe ação de separação judicial litigiosa contra Beth. Sustenta que a ré é
culpada pela separação, por ter infringido os deveres do casamento, artigo 1.573,I, IV e VI
Resposta à Questão 1
Não, a separação deve ser concedida. Apesar de a culpa não restar comprovada, sua
constatação não é o objetivo da demanda. O objetivo é desfazer o vínculo, o que se justifica
pela incompatibilidade e insuportabilidade na convivência, o que se prova pela simples
discussão em juízo da relação.
Veja a Apelação Cível 70020802278, do TJ/RS:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Há uma clara doação de um cônjuge ao outro, pelo que incide o tributo Estadual, o
ITD, na forma do artigo 155, I, da CRFB. A forma como foi feita a partilha demonstra a
nítida intenção de gratuitamente parte de sua meação ao outro, caracterizando o típico
imposto de transmissão por doação cujo recolhimento deve ser feito de acordo com o artigo
155, I da Constituição da República.
A este respeito, veja o Agravo de Instrumento 2001.002.09959, do TJ/RJ:
Tema IV
Divórcio. Histórico. A Lei 6.515/77 e o Código Civil. Noções Gerais. Divórcio direito e divórcio por
conversão. Ação direta de divórcio. Consensual e litigioso. Requisitos. Procedimento. Ação indireta de
divórcio. Consensual e litigioso. Requisitos. Procedimento. Competência. Efeitos do Divórcio. Sentença.
Natureza Jurídica. Efeitos da ausência sobre o vínculo matrimonial.
Notas de Aula4
1. Divórcio
“Art. 1.576. A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade
recíproca e ao regime de bens.
Parágrafo único. O procedimento judicial da separação caberá somente aos
cônjuges, e, no caso de incapacidade, serão representados pelo curador, pelo
ascendente ou pelo irmão.”
A separação, como se vê, não põe fim ao dever de mútua assistência, por exemplo,
dever este que se estende para além da resolução da sociedade, assim como o dever de
respeito e consideração mútuos, que extravasa até mesmo a quebra do vínculo pelo
divórcio.
O divórcio, a dissolução do vínculo conjugal, diferentemente da separação, não põe
apenas fim a esta parceria: a fulmina, permitindo até mesmo que nova relação familiar seja
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Aula ministrada pela professora Consuelo Aguiar Huebra, em 25/2/2010.
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Por esta clara diferença, mesmo que já tenha havido sentença de divórcio transitada em julgado, é possível
ajuizar-se uma ação anulatória do casamento, eis que se for anulado haverá diferentes efeitos para os
relacionandos do que a mera dissolução do vínculo opera.
contraída pelos divorciados. Quando apenas separados, não há esta quebra do vínculo, pelo
que novo casamento é impossível, e é possível a reconciliação, sem precisarem os
separados se casar novamente.
Como já se mencionou, o sistema dual da separação e divórcio é muito criticado por
todos os operadores do direito atual, e há, de fato, movimento em busca de se consolidar
esta dinâmica em um só instituto, apenas no divórcio. Há um projeto de emenda
constitucional, o PEC 413, que visa justamente a acabar com a separação, a fim de adequar
o fim do relacionamento à realidade social.
A morte, como dito, rompe o vínculo jurídico, e permite que o supérstite, o viúvo,
contraia novo matrimônio. Se os consortes já se divorciaram, transitando em julgado a
sentença, e um deles morre, o estado civil do que sobrevive é de divorciado, não passando a
ser viúvo, porque o vínculo já se rompera; já se a morte se dá no curso da separação, cessa
o vínculo, e o separado passa a ser viúvo.
Tanto a morte real como a presumida rompem o vínculo conjugal. A morte
presumida é prevista como causa de dissolução do vínculo no artigo 1.571, § 1º, do CC,
mas há uma controvérsia aqui: a presunção que induz à liberação do cônjuge remanescente
ocorre em qual momento? Na declaração da ausência, na abertura da sucessão provisória,
ou na sucessão definitiva?
A maioria maciça da doutrina entende que se opera a liberação quando da morte
presumida, ou seja, no fim do procedimento de ausência, ao termo do prazo de dez anos
desde a sucessão provisória. Nelson Rosenvald, isoladamente, entende que não é esta a
interpretação devida deste dispositivo, porque leva à sua completa inutilidade, eis que,
passados dois anos desde o desaparecimento da pessoa, já é possível ajuizar o divórcio
direto pelo abandono, separação de fato. Assim, defende que seria na abertura da sucessão
provisória, de forma a emprestar utilidade à norma.
presença do MP no feito, além da polícia bastante próxima realizada pelo juiz nesta seara –
inclusive contando com o famigerado artigo 1.574 do CC, que permite ao juiz negar-se a
homologar acordo que não reputar justo.
Outra característica da ação de divórcio diz respeito ao foro de competência, que,
segundo o artigo 100, I, do CPC, é o da residência da mulher:
“Art. 1.120. A separação consensual será requerida em petição assinada por ambos
os cônjuges.
§ 1º Se os cônjuges não puderem ou não souberem escrever, é lícito que outrem
assine a petição a rogo deles.
§ 2º As assinaturas, quando não lançadas na presença do juiz, serão reconhecidas
por tabelião.”
§ 1º Se os cônjuges não acordarem sobre a partilha dos bens, far-se-á esta, depois
de homologada a separação consensual, na forma estabelecida neste Livro, Título
I, Capítulo IX. (Renumerado do parágrafo único, pela Lei nº 11.112, de 2005)
§ 2º Entende-se por regime de visitas a forma pela qual os cônjuges ajustarão a
permanência dos filhos em companhia daquele que não ficar com sua guarda,
compreendendo encontros periódicos regularmente estabelecidos, repartição das
férias escolares e dias festivos. (Incluído pela Lei nº 11.112, de 2005).”
Os requisitos traçados neste artigo 1.121 não são todos indispensáveis à separação
ou ao divórcio consensual, como se vê no próprio § 1º deste artigo. Além disso, o artigo
1.581 do CC mitiga ainda mais o inciso I do artigo supra:
“Art. 1.581. O divórcio pode ser concedido sem que haja prévia partilha de bens.”
Este artigo consolidou na lei a posição da súmula 197 do STJ, que tem a exata
redação deste dispositivo.
O assunto do inciso II do artigo 1.121 do CPC também pode ser deixado para outro
momento, porque esta postergação da solução sobre guarda e visitação facilita a dissolução
do vínculo, o que é a diretriz maior para se interpretar estas questões.
Vale mencionar que a guarda compartilhada é hoje a regra de preferência para
solução de questões de guarda. Ao contrário do que se pensou originalmente, a guarda
compartilhada é a mais saudável das opções, não representando uma perda do referencial de
lar para a criança. Não só para as questões diretamente relacionadas ao cuidado do filho, a
guarda compartilhada também impõe responsabilidade civil aos pais pelos atos da criança,
em conjunto – e não só a um, como na guarda unilateral.
O inciso III do artigo 1.121, porém, é cláusula obrigatória, indispensável.
Já o inciso IV deste artigo em questão segue a mesma esteira da postergabilidade,
podendo ser assunto legado a tratamento posterior para que não obste a extinção do
vínculo, objetivo precípuo do divórcio. Vale mencionar que a cláusula de dispensa de
alimentos pode ser trazida neste acordo, cláusula esta que não se confunde com a renúncia
(que é perene, como se sabe), a qual é vedada, na forma do artigo 1.707 do CC:
“Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a
alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou
penhora.”
“Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros
os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição
social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
(...)”
posterior, dez ou mais anos depois. Percebida esta injustiça, o STJ passou a restringir a
previsão legal, dispondo que o pedido de alimentos só será possível, pelo cônjuge ao outro,
até o divórcio; após este, cessa a possibilidade de pedir alimentos, o que significaria uma
verdadeira renúncia tácita – raciocínio que não se aplica aos parentes, que não têm vínculo
quebrado jamais.
Hoje, o STJ vai ainda além na restrição: para esta Corte, a impossibilidade de
renúncia trazida no artigo 1.707 do CC só se aplica aos parentes, e não mais aos cônjuges
ou companheiros. Renunciando expressamente, ou tacitamente (quando há o divórcio, findo
o vínculo, sem pedido de alimentos até então), não mais poderá o ex-cônjuge pedir
alimentos. Se na separação há dispensa, e não há pedido no divórcio, entende-se que houve
renúncia tácita.
Em síntese, então, assim se vê a situação da renúncia a alimentos: pelos parentes, é
impossível, podendo no máximo haver a dispensa; pelos ex-cônjuges ou companheiros, é
possível, expressa ou tacitamente.
Há ainda que se tratar da questão do uso do sobrenome do ex-cônjuge. Mesmo que
o artigo 1.121 do CPC não fale deste tema, é um assunto relevante, podendo ser tratado no
acordo de divórcio consensual. A ausência da cláusula que trata do uso do nome não
impede que o divórcio consensual se opere, mas é recomendável que se a faça constar, a
fim de evitar imbróglios subseqüentes ao fim do vínculo conjugal. Na prática, ausente a
cláusula, a presunção é de que o nome de casado pode ser mantido pelo ex-cônjuge que o
adotara, sendo necessária expressa menção à retirada do nome, se assim quiser seu titular
natural.
Sobre o direito a manter o nome do ex-cônjuge, a perda deste direito só ocorre se
forem reunidos alguns requisitos cumulativos: o cônjuge for declarado culpado (o que só
ocorre na separação judicial, por óbvio); haver pedido neste sentido por parte do cônjuge
inocente; e a retirada do nome não causar prejuízos ao culpado, quer materiais, quer em
relação à identificação deste com o filho.
A culpa, por si só, não é suficiente para derrogar o direito, como se pode pensar.
Além disso, o prejuizo, hoje, é conceito com abrangência bastante larga, podendo ser
relevante até mesmo o prejuizo moral pela perda da identidade que se tem de si mesmo,
porque o nome passa a integrar a personalidade da pessoa.
Se o cônjuge mantiver o nome do seu ex-consorte, e, no futuro, contrair novo
casamento, será possível a alteração de deu nome, agregando o sobrenome do novo
cônjuge? Há corrente minoritária que vê impedimento nesta mudança, pois se houve tal
importância na manutenção do nome após o divórcio, não se justifica agora sua alteração;
contudo, a maioria não vê os direitos da personalidade como forma de restrição a opções do
seu titular, pelo que seria possível sim este desejar mudar seu nome, para aderir ao
sobrenome do atual marido. Vale mencionar que a Lei de Registros Públicos não cria óbice,
reforçando esta segunda tese, como se vê no artigo 109, caput:
Trata-se do divórcio requerido por apenas uma das partes, e é processo contencioso
que segue o rito comum ordinário.
O único argumento do réu, nesta ação, é a não completitude do prazo para tanto, vez
que o único requisito para tal divórcio é o preenchimento do tempo legalmente exigido.
Por esta peculiaridade, não seria possível que se cumule o pedido de divórcio direto
com petição de alimentos, por exemplo. Os ritos são diferentes, havendo quem diga que
seja inadmissível a cumulação, por dificultar a dissolução do vínculo, especialmente se
inserir discussão de culpa. No entanto, a jurisprudência tem admitido a cumulação de
pedidos, e quando a questão dos alimentos se demonstrar muito problemática, pode adotar a
seguinte postura: decretar alimentos provisórios e dissolver o vínculo, remetendo a decisão
final sobre os alimentos à via procedimental adequada (onde haverá melhor instrução, por
exemplo) – tudo em prol da facilitação da dissolução do vínculo. A mera cumulação, sem
esta ressalva da possibilidade de fracionar posteriormente, de fato, é incoerente com este
princípio, mas há quem a admita – inclusive o TJ/RJ.
A prova dos dois anos de separação de fato, no divórcio direto consensual, se faz na
forma do artigo 1.122 do CPC:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
De início, vale dizer que por muito tempo se discutiu a validade da promessa de
doação, a força coercitiva desta promessa, eis que um ato de liberalidade não pode ser
forçoso, obrigatório. Entretanto, hoje, prevalece a corrente que diz que esta promessa é
possível e exigível, em função da autonomia da vontade do promitente doador.
Sendo assim, a promessa era exigível. Contudo, o meio de se a exigir escolhido – a
impugnação ao divórcio por seu descumprimento – não mais subsiste no ordenamento. O
dispositivo apontado não foi recepcionado pela CRFB, porque a negativa ao divórcio, por
motivo diverso da falta de tempo para a conversão, é inaceitável, por violar o princípio da
facilitação do desfazimento do vínculo.
Por isso, a conversão deve ser operada, debalde o descumprimento da obrigação,
que deve ser demandado em via própria.
Com a vinda da atual Constituição da República, instaurou-se controvérsia sobre a
questão. Posição majoritária é no sentido de que o inciso XI do parágrafo único do artigo
36 da Lei do Divórcio não foi recepcionado, uma vez que exige a Carta Constitucional tão
só o lapso temporal, para a obtenção do divórcio. Assim, o descumprimento da obrigação
não pode obstar a sua decretação, até porque a parte interessada poderá buscar o
adimplemento forçado através da via executiva. Em sentido contrário, há posição que
mantém íntegro o referido dispositivo, não havendo incompatibilidade com a CF, porque
entender o contrário é incentivar o descumprimento das obrigações. Deve-se atentar que o
atual Código Civil possibilita o divórcio apenas com a satisfação do prazo legal, sem
qualquer outra exigência.
Quanto à doação, entendem uns que por tratar-se de ato de liberalidade, não se pode
obrigar o seu cumprimento. Em sentido contrário, a cláusula de doação feita pelos cônjuges
aos filhos, em acordo de separação homologado judicialmente, não se trata de promessa de
doação, mas representa por si mesma negócio jurídico perfeito e acabado, produzindo os
seus efeitos entre doadores e donatários e erga omnes, após seu registro no registro
imobiliário.
Veja o seguinte julgado, do TJ/RJ:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema V
Efeitos patrimoniais e pessoais da separação e divórcio em relação aos filhos. Proteção legal aos filhos.
Partilha de bens. Ratificação. A Lei 11.441/07. Separação e divórcio consensual nos cartórios.
Notas de Aula6
1. Procedimento cartorário
6
Aula ministrada pela professora Consuelo Aguiar Huebra, em 25/2/2010.
“Súmula 305, STF: Acordo de desquite ratificado por ambos os cônjuges não é
retratável unilateralmente.”
“Art. 1.576. A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade
recíproca e ao regime de bens.
Parágrafo único. O procedimento judicial da separação caberá somente aos
cônjuges, e, no caso de incapacidade, serão representados pelo curador, pelo
ascendente ou pelo irmão.”
Casos Concretos
Questão 1
grave, o que levou André a aforar pedido de separação judicial em março de 2003.
Verificando o Juiz que a doença realmente era grave e de cura improvável, julgou
procedente o pedido. Considerando-se que mantinham, até o momento da separação, o
patrimônio acima apresentado, como deverá ser feita a partilha?
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Tema VI
Parentesco. Espécies. Parentesco natural e civil. Classificação. Afinidade. Filiação. Paternidade presumida.
Técnicas de reprodução assistida. Reconhecimento voluntário e forçado de filiação. Métodos de pesquisa do
vínculo filial. Prova genética pelo DNA. Ações filiatórias. A Lei 8.560/92 e o Código Civil. Paternidade
socioafetiva.
Notas de Aula7
1. Parentesco
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Aula ministrada pela professora Katylene Collyer Pires de Figueiredo, em 26/2/2010.
Parentesco é a relação que liga pessoas que descendem umas das outras ou de um
tronco comum – ascendentes, descendentes e colaterais – bem como a que liga os cônjuges
aos parentes do outro cônjuge – parentesco por afinidade.
Para a lei, o parentesco não supera o quarto grau, quando colateral, algo que é
relevante também para outros ramos do direito: causa impedimentos ou suspeições para
juizes e peritos, inelegibilidades eleitorais, etc.
Todo e qualquer tipo de filiação tem o mesmo valor para o direito. Não há qualquer
diferenciação entre filhos naturais ou adotados, surgindo o parentesco do adotado com
todos os que são do tronco ou da linha, até o quarto grau. Trata-se de um princípio
constitucional, da proibição à diferenciação entre os filhos, naturais ou não. Uma única
diferença que pode o ascendente promover entre seus filhos diz respeito à liberdade de
testar: pode ele optar por favorecer um filho qualquer com até a metade de seus bens, sem
desfigurar a participação daquele filho que recebe tal vantagem no bojo da herança
legítima. Afora isto, filhos não podem ter tratamento desigual. Esta exceção, inclusive,
consiste em uma ponderação legal entre a liberdade patrimonial e o dever familiar.
O vínculo pode ser por linha reta ou colateral. Na linha reta, entre ascendentes e
descendentes, o parentesco se estende ao infinito; na colateral, limita-se ao quarto grau.
Veja os artigos 1.591 e 1.592 do CC:
“Art. 1.591. São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as
outras na relação de ascendentes e descendentes.”
“Art. 1.592. São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as
pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra.”
Vale a pena traçar um esquema gráfico que ilustre a genealogia básica. O quadro
abaixo representa toda a gama de parentesco consangüíneo reconhecida no direito
brasileiro, demonstrada somente por um lado da árvore genealógica – o lado paterno –,
lembrando que o mesmo se espelha no lado materno. As relações em linha reta se
prolongam ao infinito, pois não há limitação de graus neste tronco; contudo, as relações de
parentesco colateral são limitadas ao quarto grau8, segundo o artigo 1.592 do Código Civil:
Prolongamento indefinido
Legenda:
Bisavô
Indivíduo em análise
Avô Tio-avô
Parentesco consangüíneo em linha reta de 1º grau
Pai Tio
Parentesco consangüíneo em linha reta de 2º grau
Filho Sobrinho
Parentesco consangüíneo colateral de 2º grau
8
No antigo CC, de 1916, a relação se estendia até o 6º grau. Neto Sobrinho-Neto
Parentesco consangüíneo colateral de 3º grau
Bisneto
MichellParentesco
Nunes Midlej Maron
consangüíneo colateral de 4º grau 53
Prolongamento indefinido
EMERJ – CP V Direito Civil V
biológico consolidar-se como pai socioafetivo, mas não pode o pai biológico derrogar-se
desta qualidade alegando não ter vínculo socioafetivo com o filho.
A pessoa não pode ter dois pais, um biológico e um socioafetivo. Isto é pacífico na
doutrina e jurisprudência. Há apenas um autor, Rolf Madaleno, que defende que se o pai
socioafetivo for pessoa pobre, pode o filho investigar sua origem genética (investigação
esta, diga-se, que é sempre possível, pois todos têm o direito a buscar sua origem genética)
com o fito de buscar alimentos junto ao pai biológico – posição bem isolada.
O parentesco por afinidade, fixado entre o cônjuge e o companheiro e os parentes
do outro cônjuge ou companheiro, está no artigo 1.595 do CC:
“Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo
vínculo da afinidade.
§ 1º O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos
irmãos do cônjuge ou companheiro.
§ 2º Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou
da união estável.”
Não existe parente por afinidade do parente por afinidade: a sogra de um dos
cônjuges não se torna parente da mãe dele, por exemplo.
Outra peculiaridade do parentesco por afinidade vem no § 2º do artigo supra: na
linha reta, não se extingue jamais. Mesmo que os cônjuges ou companheiros dissolvam a
relação, os parentes por afinidade permanecerão ligados ao ex-consorte (sogra, de fato, é
para sempre). Assim, os impedimentos gerados por esta situação são perenes.
Maria Berenice Dias defende que os parentes por afinidade, na linha reta, tem
também obrigações alimentares entre si, em razão do princípio da solidariedade. É voz
isolada.
2. Filiação
Até mesmo a menção a uma adoção, por exemplo, poderia ser considerada uma
certa discriminação, a depender da forma com que se menciona tal condição. Filho é filho,
sem adjetivação.
O artigo 229 da CRFB consagra o princípio da paternidade responsável:
“Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os
filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou
enfermidade.”
“Abandono intelectual
Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade
escolar:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.”
O abandono afetivo, por seu turno, não é ainda reconhecidamente um ato ilícito,
sequer cível. Há julgado do TJ/MG reconhecendo que a falta de afeto é uma quebra do
dever de paternidade responsável, mas o STJ não manteve esta tese – mas a não
manutenção não é unânime. Nos votos do julgado do STJ, diga-se, há quem reconheça a
possibilidade de ilicitude nesta falta de afeto pelo pai, apenas não reconhecendo o dano no
caso concreto apresentado. Por isso, a discussão persiste.
Por conta desta presunção, a mulher casada que comparece ao cartório de registro
civil de pessoas naturais para registrar seu filho, munida da certidão de casamento, poderá
registrá-lo em nome do marido, sem que este esteja presente. Esta presunção não se aplica
na união estável, sequer se esta união for titulada por escritura pública – é uma previsão
exclusiva para o casamento.
As presunções dos incisos I e II do artigo supra dizem respeito aos prazos
gestacionais, como se pode perceber. A presunção do inciso II gera uma controvérsia, pois
pode conflitar diretamente com a presunção do inciso I: se a pessoa se casar imediatamente
após a dissolução da relação anterior, e o filho nascer após cento e oitenta dias após este
Os pais biológicos são pais para todos os fins, não havendo qualquer direito para a
doadora temporária de útero. Por isso, em uma eventual negativa de entrega da criança, os
pais podem ajuizar de plano a busca e apreensão do filho.
“Art. 1.604. Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de
nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro.”
Não havendo erro ou falsidade, não pode haver negação da paternidade: se o pai,
por exemplo, sabia da condição de não-pai biológico, e mesmo assim assumiu a criança por
vontade plena não viciada, não poderá questionar este registro, mesmo que a prova genética
seja-lhe favorável. A respeito, veja a Apelação Cível 2005.001.05757, do TJ/RJ:
regularmente, daí não ser decisivo o exame de DNA, porquanto as partes sempre
souberam que não tinham filiação sangüínea. Não há que se falar em ofensa aos
princípios constitucionais invocados pelo apelante, porquanto as causas de pedir
para a anulação do registro de nascimento de cada filha são distintas, a da menor
que presumia ser sua filha, em razão do erro, e a segunda, que sabia não ser sua
filha, e registrou por razões afetivas, fundado apenas no arrependimento de tê-lo
feito, o que se revela inviável em sede de família, em que se prestigia a
consolidação e segurança das relações jurídico-afetivas. Ademais, ao simular
paternidade inexistente, registrando filho alheio como próprio, não pode se valer
da própria torpeza para, arrependido, desconstituí-lo, caso em que tal perfilhação
deve ser equiparada a uma adoção, para todos os efeitos, tornando irrevogável o
ato. Precedentes desta Corte. DESPROVIMENTO DO RECURSO.”
Esta presunção é relativa, e se exige, de fato, mais algum elemento mínimo que dê
indício de que existiu relação entre a mãe e o suposto genitor, sob pena de gerar situações
injustas. Um mínimo de prova da existência de uma relação é necessário, pois se assim não
o for poderia qualquer pessoa apontar qualquer outra como suposto pai.
Pode o sujeito se negar a fazer o exame, sendo presumidamente pai, portanto.
Ocorre que esta presunção é relativa, e ele poderá, posteriormente, produzir o exame e
provar a ausência do vínculo biológico, mas até que momento pode o pai presumido
questionar esta presunção?
Quando não existia o exame de DNA, a sentença que fixava a paternidade o fazia
com base em outras provas; surgido o DNA, estas sentenças puderam ter a coisa julgada
desconsiderada, em função da nova prova, demonstrando que a sentença era
inconstitucional. Mas a situação questionada acima é diferente: o exame existia, e o suposto
pai simplesmente não o fez, sendo fixada sua paternidade em coisa julgada. A questão ainda
não tem solução jurisprudencial9.
Se a investigação de paternidade apontar mais de um suposto pai na mesma ação, e
ambos se negarem a realizar o exame, não há solução, porque não se pode presumir que
haja dois pais. Com base nisso, inclusive, parte da doutrina entende incabível a cumulação
de réus no pólo passivo da investigatória, pelo que a presunção se imporá para aquele que
for demandado primeiro e se negar ao exame.
A ação de investigação de paternidade pode ser cumulada com pedido de alimentos,
e mesmo que não o seja, pode o juiz fixá-los de ofício. Os alimentos correm desde a
citação, como já se posicionou o STJ em entendimento sumulado:
A lei traz prazo de quatro anos para o menor, desde a completitude da maioridade
ou da emancipação. Contudo, este prazo não é aplicado, por questão de isonomia e mesmo
de lógica: se o pai pode contestar a paternidade a qualquer tempo, sendo a ação
imprescritível, não há justificativa para a limitação ao direito de o filho questionar tal fato,
sobremaneira por se tratar de ação de estado, imprescritível por natureza.
O reconhecimento da paternidade é irrevogável, mesmo quando feito em
testamento, ato que é revogável por natureza: se o testador reconhece a paternidade no ato,
e depois o revoga, todos os efeitos do testamento revogado desaparecem, à exceção do
reconhecimento realizado, que permanece por ser irrevogável.
9
Em opinião pessoal, entendo que se o pai se nega ao exame no curso da ação, e por isso é declarado pai na
sentença, uma vez esta transitada em julgado não mais poderá ser derrogada. Se a sentença foi calcada na
presunção que poderia ter sido elidida pelo réu, não pode ele se valer desta negativa para, posteriormente,
relativizar a coisa julgada, porque estaria se valendo de prova que poderia ter sido utilizada à época e não o
foi. Fica a questão.
Esta previsão não se coaduna com a nova sistemática, e por isso não foi mantida,
tendo sido derrogada pelo artigo 1.609 do CC, que não traz esta vedação:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
provas orais produzidas, sao o bastante para que o pedido da investigante seja
julgado procedente. Recurso improvido.”
Questão 2
Nádia, já com 25 anos de idade, sabedora de que Alex não é seu pai, promove ação
de anulação de registro civil, o qual foi declarado por sua mãe, em razão da presunção
legal da paternidade, já que seus pais eram casados à época de sua concepção. O Réu
contesta alegando a decadência, com fundamento no artigo 1.614 do Código Civil, já que
teria ela apenas o prazo de quatro anos, contados do momento em que atingiu a
maioridade ou a emancipação, o que ocorrera há muito. Pode ser acolhida a pretensão
autoral?
Resposta à Questão 2
Este prazo normativo é inaplicável, porque mesmo que a lei preveja este prazo, a
questão de fundo discutida nesta ação é uma questão de estado, e por isso naturalmente
imprescritível, eis que ligada aos direitos da personalidade.
Veja o Ag. Rg. no REsp. 440.472:
Questão 3
Alexandre, menor púbere assistido por sua mãe, ajuizou ação de indenização por
danos morais em face de seu pai Vicente, por ter o demandado se afastado do lar há quinze
anos. Alega, na inicial, que até seus seis anos de idade manteve contato com seu pai de
maneira razoavelmente regular, mas após o nascimento de sua irmã, a qual ainda não
conhece, fruto de novo relacionamento conjugal de seu pai, este afastou-se definitivamente.
Em torno de quinze anos de afastamento, todas as tentativas de aproximação efetivadas
pelo demandante restaram infrutíferas, não podendo desfrutar da companhia e dedicação
de seu pai, já que este não compareceu até mesmo em datas importantes, como
aniversários e formatura. Fundamenta o seu pedido, afirmando que a Constituição
Federal de 1988, no artigo 227, quando prevê o direito da criança à convivência familiar e
a coloca a salvo de toda forma de negligência, não se dirige somente ao Estado, à
sociedade ou a estranhos mas a cada membro da própria família. Alega, ainda, que
desenvolveu sintomas psicopatológicos e que o tratamento psicológico ao qual se submete
há mais de dez anos advém da desestruturação causada pelo abandono paterno. Vicente,
devidamente citado, contestou o feito sob o fundamento de que não há lei que o obrigue a
conviver com alguém com quem não sente qualquer afinidade e, além do mais, não há
nexo de causalidade entre o seu afastamento e o desenvolvimento de doenças psicológicas
pelo demandante. Concluiu, afirmando que, quando à sua obrigação alimentar, sempre
supriu as necessidades do filho. Diante do caso, decida fundamentadamente.
Resposta à Questão 3
A posição majoritária é de que a falta de afeto não gera danos morais. Contudo, a
questão ainda é discutível.
Veja o REsp. 757.411, dispondo incabível, mas logo abaixo veja a decisão do
TJ/MG que gerou este REsp., na qual o dano moral foi reconhecido:
Tema VII
Poder familiar. Histórico. Titularidade. Exercício quanto à pessoa do filho. Do usufruto e da administração
dos bens dos filhos menores. Bens que se excluem da administração e do usufruto. Suspensão, perda e
extinção. Procedimento. Competência. Da família substituta. Guarda com fins previdenciários. Adoção no
Código Civil de pessoa maior de idade.
Notas de Aula10
1. Poder familiar
10
Aula ministrada pela professora Katylene Collyer Pires de Figueiredo, em 26/2/2010.
Este instituto representa o que outrora se chamava de pátrio poder, que refletia um
poder dos pais em relação aos filhos. Historicamente, o pai tinha até mesmo poder de vida e
morte sobre os filhos.
Com o CC de 2002, a nomenclatura se modificou, passando a ser poder familiar, e
mesmo este nome é criticado pela doutrina. Isto porque na verdade não se trata de um
poder, realmente, estando mais claro como poder-dever, tendo a faceta de dever mais
imposição do que a de poder. Também o termo “familiar” é criticado pela doutrina, pois os
titulares do poder familiar são somente os pais, e não a família inteira, como o nome parece
indicar. Morto um dos pais, o poder familiar se concentra no outro, supérstite. Veja os
artigos 1.630 e 1.631 do CC:
“Art. 1.631. Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos
pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.
Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é
assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo.”
Não é porque um dos pais tem a guarda exclusiva que o outro deixou de ter poder
familiar sobre o filho: o poder persiste para os dois. Veja o artigo 1.632 do CC:
“Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
I - dirigir-lhes a criação e educação;
II - tê-los em sua companhia e guarda;
III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais
não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após
essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua
idade e condição.”
Os pais, com o poder familiar, têm direito a reclamar o filho de quem quer que
ilegalmente o esteja detendo. O instrumento para tanto é a busca e apreensão do menor.
O inciso VII deste artigo supra permite que os pais exijam do filho a realização de
pequenos serviços domésticos, como a arrumação da casa. Não permite, este dispositivo,
que os pais empreguem seus filhos em trabalhos árduos, tampouco que obriguem-nos a
trabalhar em emprego regular.
As obrigações dos pais se estendem apenas até os dezoito anos, mas a obrigação
alimentar tem se estendido potencialmente até os vinte e quatro anos, quando o filho estiver
cursando ensino superior. Esta idade não se limitou pela duração do curso, mas sim por
uma analogia à legislação do IR, na qual o filho pode ser declarado como dependente até
esta idade. Sobre a extinção do poder familiar, veja o artigo 1.635 do CC:
Pode haver também a suspensão do poder familiar, na forma do artigo 1.637 do CC:
“Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a
eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum
parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela
segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando
convenha.
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à
mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a
dois anos de prisão.”
A condenação criminal por prazo maior do que dois anos leva à suspensão
automática do poder familiar; por prazo menor, pode haver ação de suspensão do poder
familiar, na qual se deve comprovar que o fato penal é também atentatório aos deveres do
pai.
A perda do poder familiar tem as causas arroladas no artigo 1.638 do CC:
“Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
I - castigar imoderadamente o filho;
II - deixar o filho em abandono;
III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
O abandono não tem prazo fixo para se configurar. Pode ser imediato – pais que
lançam seus filhos na rua, deixando-os à própria sorte –, ou pode ser no curso de um
período longo, variando na doutrina de três meses a um ano, quando abandonado em
abrigos públicos, por exemplo.
Os atos atentatórios à moral ou costumes, para causar a perda do poder familiar,
devem ser graves, capazes de expor a criança a desvirtuamentos morais severos. A
constatação é casuística.
A Defensoria Pública poderia ajuizar ação de perda ou suspensão do poder familiar,
em nome do filho? A jurisprudência não tem admitido, porque se trataria de uma auto-
nomeação do defensor como curador especial, enquanto que o artigo 1.692 do CC fala que
quem nomeia o curador é o juiz. Contudo, a DP tem tese de que tem esta legitimidade, esta
prerrogativa de se auto-nomear. Veja o artigo mencionado:
“Art. 1.692. Sempre que no exercício do poder familiar colidir o interesse dos pais
com o do filho, a requerimento deste ou do Ministério Público o juiz lhe dará
curador especial.”
“Art. 1.691. Não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os imóveis dos
filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da
simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole,
mediante prévia autorização do juiz.
Parágrafo único. Podem pleitear a declaração de nulidade dos atos previstos neste
artigo:
I - os filhos;
II - os herdeiros;
III - o representante legal.”
“Art. 1.692. Sempre que no exercício do poder familiar colidir o interesse dos pais
com o do filho, a requerimento deste ou do Ministério Público o juiz lhe dará
curador especial.”
3. Família substituta
A livre postura à adoção do menor abandonado não é a primeira opção. A nova Lei
de Adoção, Lei 12.010/09, comanda que, antes de abrir esta opção, se pesquise se na
família extensa – os demais parentes consangüíneos remanescentes da criança – desejam
ter-lhe a guarda, adotando-a, a fim de manter os laços originais da criança. Não havendo
este interesse da família extensa, ou não havendo possibilidade desta fazê-lo, buscar-se-á a
família substituta.
Na família extensa, os parentes de grau mais próximo terão preferência sobre o grau
mais remoto. Veja o artigo 28 do ECA, alterado pela Lei 12.010/09:
Casos Concretos
Questão 1
A avó de José Maria, criança com 7 anos de idade, requereu a guarda do neto
através de processo judicial. Alega que sua filha Maria Alice, mãe da criança, se encontra
desempregada e passou a residir na casa da autora, juntamente com o menino, informando
que o pai da criança não o registrou e é desconhecido. A autora teme que venha a falecer e
seu neto fique sem o amparo previdenciário como seu dependente. O estudo social
esclarece que a situação perdura há mais de um ano e que a avó materna ampara José
Maria moralmente e materialmente, pois ela colabora nos cuidados com o menino e arca
com todas as despesas de alimentação, vestuário e escolares. O Ministério Público
ressaltou que a Lei nº 9.528/97, que conferiu nova redação ao artigo 16 da Lei de
Benefícios da Previdência Social, suprimiu o menor sob a guarda do rol de dependentes do
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Não está correta a orientação pois já tem a mãe a guarda legal do filho e o direito-
dever de tê-lo em sua guarda e companhia, decorrentes do poder familiar, podendo reclamá-
lo de quem ilegalmente o detenha. A ação própria é a busca e apreensão, pelo procedimento
comum ordinário, já que de nenhuma ação principal tem que se valer para ter a guarda de
seu filho.
Tema VIII
Guarda compartilhada. Regulamentação de convívio entre pais e filhos. Imposição de multa. Uso do nome e
abandono afetivo. Dano moral nas relações familiares. Síndrome da alienação parental. Aplicação do
Estatuto da Criança e do Adolescente nas Varas de Família. Direito de convivência dos avós com os netos. A
Lei 11.698/08.
Notas de Aula11
1. Guarda
seriam os pais: o menor ficaria estável em sua casa, e cada dia um dos pais para lá se
deslocaria, a fim de com ela permanecer, revezando-se. Vê-se que é uma teoria
absolutamente infactível, além de não ter qualquer comprovação científica de que seja mais
benéfica ao menor.
O que se pode afirmar é que a guarda compartilhada ainda não é necessariamente a
melhor opção, nem a pior. A casuística ainda continua sendo a guia do juízo do que é
melhor para a criança. Contudo, o legislador parece ter entendido que a guarda
compartilhada é um sistema preferencial, como se vê na redação do artigo 1.584, § 2º, do
CC, que diz que com ou sem acordo a guarda compartilhada será preferida. Veja os artigos
1.583 e 1.584 do CC, que tratam da guarda unilateral e da compartilhada (sem exaurir as
espécies possíveis, pois há a guarda partilhada e a dada a família substituta, por exemplo) :
“Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. (Redação dada pela Lei nº
11.698, de 2008).
§ 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a
alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a
responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que
não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.
(Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 2º A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições
para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes
fatores: (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; (Incluído pela Lei nº
11.698, de 2008).
II – saúde e segurança; (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
III – educação. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 3º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar
os interesses dos filhos. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 4º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).”
“Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: (Redação dada pela
Lei nº 11.698, de 2008).
I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação
autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida
cautelar; (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em
razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a
mãe. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 1º Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da
guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos
atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas.
(Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será
aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada. (Incluído pela Lei nº
11.698, de 2008).
§ 3º Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência
sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério
Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe
interdisciplinar. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 4º A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de
guarda, unilateral ou compartilhada, poderá implicar a redução de prerrogativas
atribuídas ao seu detentor, inclusive quanto ao número de horas de convivência
com o filho. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 5º Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da
mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da
medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de
afinidade e afetividade. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).”
“Art. 1.586. Havendo motivos graves, poderá o juiz, em qualquer caso, a bem dos
filhos, regular de maneira diferente da estabelecida nos artigos antecedentes a
situação deles para com os pais.”
“Art. 1.588. O pai ou a mãe que contrair novas núpcias não perde o direito de ter
consigo os filhos, que só lhe poderão ser retirados por mandado judicial, provado
que não são tratados convenientemente.”
“Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-
los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for
fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.”
Estes dois eventos tratam-se de duas faces de uma mesma moeda, na maior parte
das vezes. Também correlato ao tema se pode abordar o cabimento de dano moral em
relações familiares, podendo-se adiantar desde logo: é possível a causação de dano moral
compensável na esfera familiar; contudo, a perturbação real da personalidade deve ser bem
verificada, na casuística.
O abandono afetivo consiste no descaso emocional de um dos pais, ou ambos, pelo
filho. A assistência moral, o afeto, não está presente, mesmo que a assistência material
esteja em perfeita ordem. A geração de dano moral pelo abandono afetivo, porém, é
controversa, sendo difícil se admitir esta possibilidade, pela exclusiva sonegação afetiva.
Mais que isso, é fundamental apreciar, em um pleito de reconhecimento deste dano moral,
se o pai imputado realmente se alheou afetivamente por sua exclusiva vontade, e não pela
ocorrência de alienação parental contra si empreendida pelo outro genitor. A verdade é que,
na maior parte das vezes, é a alienação parental determinada pelo outro guardião a causa do
abandono afetivo.
A síndrome da alienação parental consiste em uma manipulação da criança por um
dos pais, que, consciente ou inconscientemente, a afasta afetivamente do outro. Esta
manipulação se dá por meio de críticas freqüentes ao outro pai, chantagens, e diversos
outros meios de tornar a figura do outro pai menos afetuosa ao filho, praticamente criando
uma sensação de culpa na criança por gostar do outro pai. O reflexo disso é o afastamento
do genitor pela influência do outro, o que gera o abandono afetivo, só que não imputável
exclusivamente ao que abandonou.
A rejeição afetiva, portanto, pode sim causar danos morais, mas a sua imputação
deve ser bem aferida, sob pena de se condenar à compensação aquele que, de fato, era
também uma vítima das circunstâncias, quando da ocorrência de alienação parental.
Casos Concretos
Questão 1
Paulo casou-se com Ana e tiveram dois filhos. Formaram uma família com
convivência harmoniosa, baseada no afeto. Porém, separam-se, mas Paulo continuou
cumprindo com suas obrigações de pai, inclusive a alimentar. Ana casou com Jorge e ficou
com a guarda dos filhos. Após 20 anos, ao guardar documentos antigos, Paulo, verificou
as cadernetas escolares de seus filhos e descobriu que o tipo sangüíneo dos meninos era
diferente do seu, sendo impossível ser o verdadeiro pai. Realizado exame de DNA, restou
comprovado biologicamente que os filhos não eram de Paulo, mas de Jorge. Pergunta-se:
Cabe indenização por danos morais ao pai que cuidou e criou os filhos nascidos durante
seu casamento com a mãe deles e que, após 20 anos, descobre que não são seus filhos
biológicos? Fundamente.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Alexandre propôs ação em face de Vicente, seu pai, pleiteando indenização por
danos morais decorrentes do abandono afetivo por ele perpetrado. Sustenta o autor,
nascido em março de 1981, que, desde o divórcio de seus pais em 1987, época do
nascimento da filha do réu com sua segunda esposa, por ele foi descurado o dever de lhe
prestar assistência psíquica e moral, evitando-lhe o contato, apesar de cumprir a
obrigação alimentar. Aduz não ter tido oportunidade de conhecer e conviver com a meia-
irmã, além de terem sido ignoradas todas as suas tentativas de aproximação do pai, que
não comparecia a ocasiões importantes, e tinha atitude displicente. Tal situação lhe causou
extremo sofrimento e humilhação, restando caracterizada a conduta omissa culposa, a
ensejar reparação. O genitor, a seu turno, esclarece ser a demanda resultado do
inconformismo da mãe do autor com a propositura de ação revisional de alimentos, pela
qual pretende a redução da verba alimentar. Aduz ter, até maio de 1989, visitado
regularmente o filho, trazendo-o em sua companhia nos finais de semana, momento em que
as atitudes de sua mãe, com telefonemas insultuosos e instruções ao filho para agredir a
meia-irmã, tornaram a situação doméstica durante o convívio quinzenal insuportável.
Relata, além disso, ter empreendido diversas viagens, tanto pelo Brasil, quanto para o
exterior, permanecendo atualmente na África do Sul, o que compromete ainda mais a
regularidade dos encontros. Salienta que, conquanto não tenha participado da formatura
do filho ou de sua aprovação no vestibular, sempre demonstrou incentivo e júbilo por
telefone. Afirma, nesse passo, não ter ocorrido qualquer ato ilícito. Decida a questão.
Resposta à Questão 2
O autor da ilicitude não foi o pai: a própria mãe, com a alienação parental, causou o
afastamento do pai, e por isso ele não pode ser imputado. O pedido deve ser julgado
improcedente.
Veja o REsp. 757.411:
Tema IX
A Lei Maria da Penha - Lei 11.340/06. Competência Cível. Medidas protetivas de urgência à ofendida e que
obrigam o agressor. Afastamento do lar. Proibição de determinadas condutas. Restrição ou suspensão de
visitação. Prestação de alimentos provisionais ou provisórios. Aplicação nas Varas de Família.
Notas de Aula12
A Lei 11.340/06, Lei Maria da Penha, é bastante peculiar: este diploma tem
aplicação subsidiária do CPC e do CPP, concomitantemente, como determina o seu artigo
13:
12
Aula ministrada pelo professor Octávio Chagas de Araújo Teixeira, em 1/3/2010.
“Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a
mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26
de setembro de 1995.”
Ocorre que ao tornar inaplicável a Lei Maria da Penha a crimes 13 de gênero, surgiu
séria discussão sobre a necessidade ou não de representação da ofendida na persecução
criminal do crime de lesão corporal leve, eis que este crime só tem a ação condicionada à
representação por conta da previsão do artigo 88 da Lei 9.099/95:
“Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá
de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões
culposas.”
Como o artigo 41, supra, torna inaplicável a Lei 9.099/95, e este dispositivo acima
está neste diploma, há quem sustente que a ação penal ainda seria incondicionada, mas o
STJ já vem decidindo que a restrição da aplicação do artigo 41 se refere, tem por mens
legis, apenas afastar as medidas despenalizadoras da Lei 9.099/95, e não todas as suas
providências. Veja:
“HC 157416 / MT. HABEAS CORPUS. Relator Ministro ARNALDO ESTEVES
LIMA. Órgão Julgador - QUINTA TURMA. Data do Julgamento 15/04/2010. Data
da Publicação/Fonte DJe 10/05/2010.
Ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE LESÃO
CORPORAL LEVE. LEI MARIA DA PENHA. NATUREZA DA AÇÃO PENAL.
REPRESENTAÇÃO DA VÍTIMA. NECESSIDADE. ORDEM CONCEDIDA.
1. A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) é compatível com o instituto da
representação, peculiar às ações penais públicas condicionadas e, dessa forma, a
não aplicação da Lei 9.099, prevista no art. 41 daquela lei, refere-se aos institutos
despenalizadores nesta previstos, como a composição civil, a transação penal e a
suspensão condicional do processo.
2. O princípio da unicidade impede que se dê larga interpretação ao art. 41, na
medida em que condutas idênticas praticadas por familiar e por terceiro, em
concurso, contra a mesma vítima, estariam sujeitas a disciplinas diversas em
relação à condição de procedibilidade.
3. A garantia de livre e espontânea manifestação conferida à mulher pelo art. 16, na
hipótese de renúncia à representação, que deve ocorrer perante o magistrado e
representante do Ministério Público, em audiência especialmente designada para
esse fim, justifica uma interpretação restritiva do art. 41 da Lei 11.340/06.
13
Como o artigo fala em “crimes”, não se aplica esta vedação às contravenções. A respeito, veja o enunciado
8 do Fonavid:
De qualquer sorte, sempre que a condicionante for exigida, a sua ausência implica
extinção da punibilidade.
A mesma discussão se repete em relação à suspensão condicional do processo,
porque é instituto que consta do artigo 89 da Lei 9.099/95, mas que a doutrina defende ser
instituto processual penal geral, apenas incidentalmente ali colocado. Contudo, neste caso,
por entender que é medida despenalizadora que o legislador quis afastar dos Juizados da
Mulher, a jurisprudência não tem permitido sua aplicação nesta seara. Veja:
“Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um
ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia,
poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o
acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime,
presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena
(art. 77 do Código Penal).
(...)”
Entretanto, a questão está longe de ser pacífica, pois o próprio Fonavid emitiu
enunciado contrário a esta jurisprudência:
As penas alternativas, por sua vez, já que trazidas pelo CP e não pela Lei 9.099/95,
são cabíveis, à exceção das eminentemente pecuniárias, como dispõe o artigo 17 da Lei
Maria da Penha. Veja o dispositivo e o enunciado 6 do Fonavid:
“Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra
a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a
substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.”
O sursis penal é também aplicável, eis que é sediado no CP. Veja o enunciado 7 do
Fonavid:
1.1. Competência
“Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra
a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio
permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente
agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por
indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por
afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha
convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de
orientação sexual.”
Por isso, qualquer medida que não seja estritamente adstrita ao que é da
competência dos Juizados não deve ali ser tratada. Os alimentos, por exemplo, são um bom
exemplo: se não se tratar de alimentos que se tenha tornado necessários em razão da
violência de gênero contra a mulher, não serão enquadrados como medida protetiva da Lei
11.340/06, e sim como matéria de família, e a competência para sua fixação é das varas das
famílias.
A competência recursal dos Juizados da Mulher é do Tribunal, eis que o sistema que
a Lei 9.099/95 instalou não é aplicável a este juízo, por conta da expressa redação do artigo
41 da Lei Maria da Penha, já transcrito. Assim, será competente a Câmara Cível ou a
Criminal, a depender do caso – é determinado em razão da matéria –, inexistindo turma
recursal para o Juizado da Mulher.
A aplicabilidade da Lei Maria da Penha, como se sabe, é para as relações em que a
vítima mulher tenha algum vínculo com o agressor, vínculo que pode ser afetivo, de
coabitação ou mero parentesco. Para este último caso, o limite do alcance é o das relações
civis de parentesco, como se vê no enunciado 2 do Fonavid:
Destarte, quer seja vínculo natural, civil ou por afinidade, aplica-se a Lei 11.340/06
se estiver presente.
O artigo 20 da Lei Maria da Penha é dos mais conturbados neste diploma. Veja:
Diante deste dispositivo, pode-se afirmar sem medo que é cabível a prisão em
flagrante do agressor mesmo por crime de ameaça, por exemplo, em que a pena de
detenção máxima é de seis meses, como se vê no artigo 147 do CP, se houver
descumprimento de medida protetiva. Veja:
“Ameaça
Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio
simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante representação.”
previsão do artigo 20, supra, combinado com o artigo 313, IV, do CPP, inserido pela Lei
11.340/06:
Mas, como dito, esta prisão tem sido altamente controvertida, nos crimes que não
levam à prisão quando do julgamento definitivo, porque o seu título é um tanto quanto sui
generis. É uma prisão imposta cautelarmente em crime que jamais acarretará prisão
definitiva, por seu pequeno potencial ofensivo, pelo que há quem sustente que se trate de
prisão inconstitucional, por ofensa à proporcionalidade, homogeneidade. Contudo, tem sido
aplicada, como se vê nos julgados abaixo, do STJ e do TJ/RJ, nessa ordem:
É ainda mais estranha esta prisão quando se observa sua aplicabilidade após a
sentença final do processo, que impõe medida protetiva. Se esta medida for descumprida,
ensejará esta prisão, mas não há como se dizer que haja cautelaridade ao processo, eis que
este findou-se. É, de fato, um título prisional bastante atípico.
Esta prisão não tem prazo determinado, sendo mantida pelo tempo que o juiz
entender necessária e razoável, podendo se parametrizar pelas prisões cautelares existentes,
preventiva ou temporária.
Casos Concretos
Questão 1
Marialva foi vítima de pelo menos três episódios de violência doméstica, tendo seu
cônjuge, Belarmino, a agredido com empurrões e socos na cabeça na frente do filho do
casal. Além das agressões físicas sofridas durante o relacionamento, em uma oportunidade
Belarmino invadiu o local de trabalho de Marialva e passou a ofendê-la e desprestigiá-la
perante seus colegas, clientes e chefia, colocando em risco seu emprego. Marialva ingressa
com pedido liminar de afastamento do cônjuge do convívio do lar, pedindo um salário
mínimo de alimentos provisionais. Encaminhada a ação ao Juizado Especial da Violência
Familiar contra a Mulher, o juiz poderá decidir sobre o afastamento do cônjuge do lar
conjugal e fixar alimentos provisionais? Justifique.
Resposta à Questão 1
Tema X
Regime de bens. Princípios gerais. Regime legal e convencional. Pacto antenupcial. Forma e registro. Atos
que dependem de consentimento conjugal. Suprimento do consentimento. Regime da comunhão parcial.
Regime da comunhão universal. Regime da participação final nos aqüestos. Regime da separação legal e
separação convencional. Aplicação da Súmula 377 do STF.
Notas de Aula14
1. Regime de bens
14
Aula ministrada pela professora Elisa Costa Cruz, em 2/3/2010.
1.1. Principiologia
“Enunciado 331, CJF: Art. 1.639. O estatuto patrimonial do casal pode ser definido
por escolha de regime de bens distinto daqueles tipificados no Código Civil (art.
1.639 e parágrafo único do art. 1.640), e, para efeito de fiel observância do
disposto no art. 1.528 do Código Civil, cumpre certificação a respeito, nos autos do
processo de habilitação matrimonial.”
Uma vez que os nubentes não elejam qualquer regime, não pode o casamento ser
celebrado sem que esteja vigente algum regramento, e a lei estabelece que o regime da
comunhão parcial de bens é a regra a ser seguida quando da omissão de escolha pelos
nubentes. Veja o artigo 1.640 do CC:
“Art. 1.640. Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará,
quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.
“Art. 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e
ineficaz se não lhe seguir o casamento.”
“Art. 1.657. As convenções antenupciais não terão efeito perante terceiros senão
depois de registradas, em livro especial, pelo oficial do Registro de Imóveis do
domicílio dos cônjuges.”
O pacto antenupcial pode reger matérias alheias ao escopo patrimonial, tais como
direitos alimentares, indenizações em caso de separação, etc? Paulo Lobo diz que qualquer
cláusula que não seja de conteúdo exclusivamente patrimonial, e que não discipline as
relações patrimoniais dos cônjuges não é inválida, mas simplesmente não compõe
essencialmente o pacto antenupcial. Nada obsta que dali constem, mas não se inserem
materialmente sob a essência de pacto antenupcial – estarão ali apenas formalmente, e não
materialmente. Maria Berenice Dias, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald dizem que é
possível constarem tais cláusulas dos pactos, mas não discutem se sua natureza é
materialmente de norma de pacto antenupcial ou não. Apenas reputam válidas quaisquer
cláusulas que não aflijam a dignidade da pessoa humana.
Uma cláusula que violaria a dignidade da pessoa humana, para estes autores, é a
indenização por tempo de casado, o que é bem comum no direito estadunidense: se a pessoa
requerer a separação com tantos anos de casada, indenizará o outro em tal valor; se requer
com mais tempo, o valor é outro, e assim por diante. Para estes autores, esta cláusula
interfere violentamente na liberdade, impondo temor pela separação.
Já a cláusula que prevê afastamento do dever de coabitação é válida, para eles, não
ofendendo nenhum direito fundamental – os direitos e deveres entre os cônjuges, hoje, têm
sido entendidos como matérias de ordem eminentemente privada, podendo ser por eles
regulados, a não ser que ofendam preceitos constitucionais maiores. A doutrina mais
clássica, entretanto, ainda vê os deveres conjugais como matéria de ordem pública, e, se for
esta corrente a observada, seria nula qualquer derrogação destes preceitos – inclusive este
exemplo do afastamento do dever de coabitação.
Se o pacto antenupcial for inválido como um todo, será simplesmente
desconsiderado, e passará a viger o regime legal, da comunhão parcial. Se apenas uma
cláusula ou outra for inválida, o pacto é mantido, afastando-se apenas aquela cláusula
viciada.
Sendo o casamento invalidado, por óbvio que o pacto perderá sentido, eis que dele é
dependente: anulado o casamento, anulado o pacto antenupcial. Trata-se da mera gravitação
jurídica entre acessório e principal. Surge a questão: reconhecida putatividade no
casamento inválido, como fica a situação do pacto antenupcial? Como o casamento produz
efeitos válidos para o cônjuge de boa-fé, o pacto produzirá efeitos, mas há uma divergência,
que há no próprio casamento putativo, sobre até que momento este produz efeitos, se até a
sentença ou mesmo após esta. Se o casamento putativo produz efeitos até a sentença, assim
também ocorre com o pacto; se produzir efeitos ulteriores à sentença, o pacto igualmente
seguirá produzindo efeitos.
Sobre a invalidade de cláusulas que subvertem normas cogentes, veja o artigo 1.655
do CC:
No inciso III do artigo supra se inserem aqueles em idade pré-núbil, que se casarão
por autorização judicial nos casos que a lei permite (gravidez ou alheação de condenação
criminal); ou daqueles que, menores em idade núbil, têm o casamento negado pelos
representante legal, e autorizado pelo juiz.
Quanto aos incisos I e III, a doutrina entende que, superadas as causas que
ensejaram a separação legal, os cônjuges podem requerer a mudança de regime, ou seja:
desaparecida a causa de suspensão, o regime pode ser alterado pelos cônjuges; atingida a
plena capacidade para se casar, em que se dispensaria o suprimento judicial, também
poderão alterar o regime, se quiserem. Esta alteração do regime é oriunda da mutabilidade
do regime, que é um outro princípio deste instituto. A respeito, veja o enunciado 262 do
CJF:
Mas é o inciso II deste artigo supra que é altamente criticado pela doutrina. A
separação obrigatória para o idoso é considerada por muitos como inconstitucional,
discriminatória, e há jurisprudência isolada que reconhece esta inconstitucionalidade, no
TJ/RS. No TJ/RJ, e na maioria da jurisprudência nacional, a restrição é legal e
constitucional.
Vale mencionar que se o idoso convivia em união estável antes de completar
sessenta anos, mas se casa posteriormente à completitude desta idade, não será restrita a sua
opção de regime, podendo optar por qualquer um. Isto porque na união estável já vigia para
ele o regime da comunhão parcial, pelo que o casamento não estará forçado à separação
legal. Veja o enunciado 261 do CJF:
Há que se salientar, ainda, que o regime da separação obrigatória de bens está hoje
muito mitigado, ante a posição sumulada do STF no seu enunciado 377:
De certa forma já abordado, este princípio proclama apenas que os cônjuges têm a
seu dispor uma diversa gama de regimes optativos, e além disso podem criar um novo
regime, desde que não subvertam normas de ordem pública.
“Art. 977. Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros,
desde que não tenham casado no regime da comunhão universal de bens, ou no da
separação obrigatória.”
Deve se convocar por edital todos os credores para se manifestarem. Pelo ensejo,
como se modulam os efeitos da sentença? O regime passa a viger apenas desde o trânsito
em julgado da sentença, operando efeitos ex nunc, ou retroage desde o início do casamento,
tendo efeitos ex tunc?
A sentença de alteração é constitutiva do novo regime, inegavelmente, mas a
retroação de seus efeitos é discutida. Pende-se a entender que se operam efeitos ex nunc,
mas na casuística pode ser que a retroação dos efeitos proteja melhor os direitos de
terceiros, e esta será a modulação de tal sentença. Esta solução casuística é a adotada no
segundo acórdão supra.
Veja o REsp. 730.546, e os enunciados 113 e 260, do CJF:
“Enunciado 113, CJF: Art. 1.639: é admissível a alteração do regime de bens entre
os cônjuges, quando então o pedido, devidamente motivado e assinado por ambos
os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com ressalva dos direitos de
terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição de inexistência de dívida
de qualquer natureza, exigida ampla publicidade.”
“Enunciado 260, CJF: Arts. 1.639, § 2º, e 2.039: A alteração do regime de bens
prevista no § 2º do art. 1.639 do Código Civil também é permitida nos casamentos
realizados na vigência da legislação anterior.”
“Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher
podem livremente:
I - praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao
desempenho de sua profissão, com as limitações estabelecida no inciso I do art.
1.647;
II - administrar os bens próprios;
III - desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou alienados
sem o seu consentimento ou sem suprimento judicial;
IV - demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a invalidação do
aval, realizados pelo outro cônjuge com infração do disposto nos incisos III e IV
do art. 1.647;
V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo
outro cônjuge ao concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos
pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de cinco
anos;
VI - praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente.”
“Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e
a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida
com o objetivo de constituição de família.
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521;
não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar
separada de fato ou judicialmente.
§ 2º As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união
estável.”
“Art. 1.645. As ações fundadas nos incisos III, IV e V do art. 1.642 competem ao
cônjuge prejudicado e a seus herdeiros.”
Por fim, veja o artigo 1.646 do CC, que trata do direito de regresso:
“Art. 1.646. No caso dos incisos III e IV do art. 1.642, o terceiro, prejudicado com
a sentença favorável ao autor, terá direito regressivo contra o cônjuge, que realizou
o negócio jurídico, ou seus herdeiros.”
“Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem
autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
“Art. 3º O contrato de locação pode ser ajustado por qualquer prazo, dependendo
de vênia conjugal, se igual ou superior a dez anos.
Parágrafo único. Ausente a vênia conjugal, o cônjuge não estará obrigado a
observar o prazo excedente.”
Os atos constritivos sobre bens móveis não estão inseridos no inciso I do artigo
1.647 do CC, que, norma restritiva que é, não pode ser ampliado. Há uma só exceção a este
inciso I quanto a bens imóveis, constante do artigo 1.656 do CC:
“Art. 1.656. No pacto antenupcial, que adotar o regime de participação final nos
aqüestos, poder-se-á convencionar a livre disposição dos bens imóveis, desde que
particulares.”
No inciso II, combine-se sua leitura com os artigos 10 e 13 do CPC, bem como com
a súmula 134 do STJ:
“Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do outro para propor
ações que versem sobre direitos reais imobiliários. (Redação dada pela Lei nº
8.952, de 13.12.1994)
§ 1º Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para as ações: (Parágrafo
único renumerado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
I - que versem sobre direitos reais imobiliários; (Redação dada pela Lei nº 8.952,
de 13.12.1994)
II - resultantes de fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou de atos
praticados por eles; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1.10.1973)
III - fundadas em dívidas contraídas pelo marido a bem da família, mas cuja
execução tenha de recair sobre o produto do trabalho da mulher ou os seus bens
reservados; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1.10.1973)
IV - que tenham por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus
sobre imóveis de um ou de ambos os cônjuges.(Redação dada pela Lei nº 5.925, de
1.10.1973)
§ 2º Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente
é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos praticados.(Incluído
pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994).”
“Súmula 332, STJ: A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica
a ineficácia total da garantia.”
Esta súmula é de redação bastante imprecisa. Isto porque, na leitura dos precedentes
que a propiciaram, o STJ é claro em dizer que adota a tese de invalidade total do ato, mas a
redação consigna, como se vê, a expressão “ineficácia total”. É de se ressaltar, portanto, que
a ausência da vênia conjugal, quando exigida, é caso de invalidade, e não de ineficácia,
para o STJ, a despeito do que diz a súmula. Segue à risca, o STJ, o artigo 1.649 do CC:
“Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art.
1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a
anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal.
Parágrafo único. A aprovação torna válido o ato, desde que feita por instrumento
público, ou particular, autenticado.”
O inciso IV do artigo 1.647 do CC, que diz que fazer doação, não sendo
remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação, depende de
outorga conjugal, ressalva justamente os casos dos artigos 540, 1.659, I, e o próprio
parágrafo único do mesmo artigo 1.647 do CC:
Negada a outorga quando necessária, sem motivo justo, pode o cônjuge que se viu
obstado pleitear o suprimento da autorização em juízo, na forma do artigo 1.648 do CC:
“Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga,
quando um dos cônjuges a denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível
concedê-la.”
A legitimidade para requerer anulação do ato praticado sem outorga está no artigo
1.650 do CC:
“Art. 1.650. A decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem
consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo cônjuge
a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros.”
As verbas de indenização de seguro, por seu turno, são exclusivas do titular, não se
comunicando ao bojo comum, por ter natureza indenizatória, inserida no inciso VII do
artigo 1.659 do CC, supra.
Quanto ao financiamento de bens, contrato firmado antes da relação conjugal, a
questão é intrincada. A regra é que bens adquiridos por causa firmada antes do casamento
não se comunicam, neste regime, na forma do artigo 1.661 do CC:
“Art. 1.661. São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa
anterior ao casamento.”
pelo bem antes do casamento pertence apenas ao titular, mas das parcelas pagas depois do
casamento celebrado, metade é do outro cônjuge.
O TJ/RS tem uma decisão em que entendeu que se houver prova sólida de que a
aquisição de um bem, na constância do casamento, foi realizada inteiramente sem a
participação do outro cônjuge, conseguindo-se afastar inclusive a presunção de esforço
comum, poderá ser o bem deferido apenas ao titular dos pagamentos. Ocorre que esta
posição é verdadeiramente contra legem, porque a presunção de esforço comum, de
participação nos aquestos, na aquisição dos bens no curso da sociedade, é absoluta, não
podendo ser afastada de modo algum.
Vale começar dizendo que a comunhão universal nem tão universal o é: as dívidas
anteriores ao casamento, e que não foram contraídas em função daquele casamento, não se
comunicam ao bojo comum. O regime está nos artigos 1.667 a 1.671 do CC, estando as
ressalvas no artigo 1.668:
Ocorre que esta separação também não é tão absoluta como o nome indica: a
administração dos bens necessários à manutenção da família é conjunta, e é dividida na
proporção da capacidade econômica de cada cônjuge.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
impedindo a modificação do regime de bens ser uma relação jurídica de cunho patrimonial
de eficácia continuada, gerando efeitos durante todo o tempo de subsistência da sociedade
conjugal, até a sua dissolução, a alteração pode ocorrer mesmo em face de matrimônios
anteriores (pensamento de Pablo Stolze Gagliano, Luiz Edson Fachin, Zeno Veloso, Álvaro
Vilaça entre outros). Veja o artigo 2.039 do CC:
Questão 2
Resposta à Questão 2
A cláusula “a” é perfeitamente válida, eis que o pacto se destina justamente a tratar
de aspectos patrimoniais, estando estes dados à liberdade de estipulação, ditada pelo artigo
1.639 do CC.
Já a cláusula “b” é inválida: é nula, porque ofende dispositivo de ordem pública,
norma cogente que tutela os direitos dos menores, não podendo ser afastada pelas partes.
Assim, o pacto deve ser mantido, à exceção da cláusula “b”, cuja nulidade deve ser
proferida de ofício.
Tema XI
Notas de Aula15
1. Alimentos
poder de sujeição – pelo que não haveria lógica em se entender que há um dever, que
sujeitaria o devedor, mas não há presunção de necessidade.
Quanto à natureza jurídica da obrigação alimentar, uma primeira corrente defende
que os alimentos têm natureza patrimonial: os alimentos são bens materiais para
subsistência. De outro lado, considerando que os alimentos se ligam à dignidade da pessoa
humana, ante seu caráter subsistencial, outra corrente defende que os alimentos têm
natureza de direitos da personalidade. E para um terceiro entendimento, os alimentos têm
natureza jurídica mista, híbrida entre direitos patrimoniais e direitos da personalidade.
1.1.1. Personalidade
A doutrina critica veementemente esta leitura feita pelo STJ, porque há uma
ilogicidade conceitual nesta interpretação, sendo impossível coadunar o caráter
personalíssimo da obrigação com a sua transmissibilidade. E mais: há uma dificuldade real,
prática, em se operacionalizar esta transmissão, não havendo solução para tal problemática.
De qualquer forma, mesmo para a corrente do STJ, a transmissão só se dá daquilo
que já foi constituído: se a obrigação de alimentos não estava estabelecida, porque sequer
havia ajuizamento de seu pedido em face do de cujus, não pode o suposto alimentado
pretender em face do espólio ou dos herdeiros.
Seguindo-se a posição do STJ, surge ainda outra discussão. Suponha-se que o
alimentando é filho do de cujus, ou seja, é seu herdeiro. Havendo pluralidade de herdeiros,
os demais deverão arcar com os alimentos em favor daquele herdeiro alimentando? Ou
seja: há transmissibilidade, quando o alimentando é também herdeiro do alimentante?
Cristiano Chaves entende que não é admissível a transmissibilidade, neste caso, pela
só razão de que representaria, o pagamento de alimentos ao herdeiro, um desequilíbrio na
partilha, eis que estaria recebendo sua parcela da herança mais a prestação alimentar.
Contudo, o entendimento majoritário tem sido de que há, ainda quando herdeiro, o direito a
receber os alimentos dos demais herdeiros, operando-se a transmissibilidade, portanto.
Sobre a transmissibilidade, veja o REsp. 775.180, e suas notas trazidas no
informativo 420 do STJ:
“REsp 775180 / MT. RECURSO ESPECIAL. Relator Ministro JOÃO OTÁVIO
DE NORONHA. Órgão Julgador - QUARTA TURMA. Data do Julgamento:
15/12/2009. Data da Publicação/Fonte: DJe 02/02/2010.
Ementa: DIREITO CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS. ESPÓLIO.
TRANSMISSÃO DO DEVER JURÍDICO DE ALIMENTAR.
IMPOSSIBILIDADE.
1. Inexistindo condenação prévia do autor da herança, não há por que falar em
transmissão do dever jurídico de prestar alimentos, em razão do seu caráter
personalíssimo e, portanto, intransmissível.
2. Recurso especial provido.”
1.1.2. Irrenunciabilidade
“Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a
alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou
penhora.”
“Enunciado 263, CJF: Art. 1.707: O art. 1.707 do Código Civil não impede seja
reconhecida válida e eficaz a renúncia manifestada por ocasião do divórcio (direto
ou indireto) ou da dissolução da “união estável”. A irrenunciabilidade do direito a
alimentos somente é admitida enquanto subsista vínculo de Direito de Família.”
“Súmula 336, STJ: A mulher que renunciou aos alimentos na separação judicial
tem direito à pensão previdenciária por morte do ex-marido, comprovada a
necessidade econômica superveniente.”
Destarte, ainda que haja renúncia, esta não aproveita ao ente previdenciário, que
deverá arcar com a prestação alimentar, por conta do princípio da solidariedade típica das
questões previdenciárias.
Veja os seguintes julgados:
Código Civil. O juiz, guiando-se pela prudência e pelo bom senso, deve considerar
a situação econômica das partes, de forma a averiguar a real possibilidade do
alimentante e a necessidade do alimentando, bem como se houve alteração na
fortuna dos litigantes, observando, sempre, o princípio da proporcionalidade como
critério para tal aferição.
3 - Os elementos trazidos aos autos fazem prova convincente das alegações da
Embargante, sendo de se considerar que as seqüelas e a debilidade física
decorrentes da doença que a acometeu decerto não permitem seu retorno às
atividades laborais senão de forma lenta e gradual. O pleito de alimentos deveu-se
tão-só ao fato de seu paulatino reingresso no mercado de trabalho, servindo como
meio de complementar sua renda, necessidade que se presume cessada quando de
sua alta médica. Em contrapartida, restou inequivocamente demonstrada a
capacidade do Embargado de arcar com o pensionamento temporário requerido,
por se tratar de engenheiro bem sucedido, sócio de grandes empresas de
engenharia e de vasto patrimônio.
4 - O dever de sustento decorrente da união estável subsiste mesmo após a
separação do casal. E ainda que da escritura declaratória de união estável conste
cláusula relativa à prestação de assistência material, tal disposição não deve ser
interpretada como renúncia aos alimentos, mas como mera dispensa.
Recurso a que se dá provimento.”
“Art. 373. A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação, exceto:
(...)
II - se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos;
(...)”
É com base nesta exceção que se admite a penhora de salário para pagamento de
pensão alimentícia, por exemplo.
A doutrina ainda cria algumas exceções à irrepetibilidade e à impossibilidade de
compensação. Outrora, estas características foram tidas por absolutas, mas na vigência do
neoconstitucionalismo, mitigações são admitidas, e aqui se fundamentam na tutela da boa-
fé: os tribunais têm admitido a restituição ou compensação de verba alimentar para evitar
que o credor de alimentos se locuplete injustamente. Bom exemplo é quando, por qualquer
que seja a causa, o devedor de alimentos paga-os em duplicidade: faz o depósito e também
os tem descontados no salário. É clara situação em que o credor tem ciência de que está
recebendo o dobro do que deveria, devendo restituir o excesso.
Quanto à compensação, a sua admissibilidade é bastante casuística, podendo ser
ilustrado um caso pelo REsp. 982.857:
Até a edição da Lei de Alimentos Gravídicos, Lei 11.804/08, era discutível o termo
inicial da obrigação alimentar. O nascituro, em nosso ordenamento jurídico, não tem
personalidade jurídica, porque nosso sistema adota a teoria natalista para determinar o
início da personalidade com o nascimento. Até nascer com vida, há mera expectativa de
direitos para o nascituro, portanto. O feto, porém, tem direito à vida, direito a nascer, e por
isso os alimentos gravídicos lhe são conferidos: o termo inicial dos alimentos surge com o
mero fato de o feto ter sido concebido.
Materialmente, então, o termo a quo dos alimentos é a concepção. Processualmente,
porém, os alimentos têm início na citação, e o termo final se liga ao elemento necessidade.
Enquanto for necessária a prestação alimentar, ela é devida.
Nos alimentos devidos ao consorte, cônjuge ou companheiro, o termo inicial surge
quando surge o dever de mútua assistência, ou seja, desde o início da relação.
“Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros
os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição
social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§ 1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante
e dos recursos da pessoa obrigada.
§ 2º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação
de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.”
“Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens
suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de
quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu
sustento.”
Na hipótese do artigo 1.695, supra, insere-se também aquela pessoa que tem bens,
mas não são líquidos o suficiente para garantir a mantença da pessoa. Pode um ex-cônjuge
restar proprietário de um imóvel, mas não colher renda mensal alguma, dependendo de
alimentos para subsistir, portanto.
Por fim, uma terceira classificação divide os alimentos em provisórios, provisionais
e definitivos. Provisionais são os alimentos fixados na ação cautelar típica do CPC, trazida
nos artigos 852 a 854 deste diploma:
“Art. 853. Ainda que a causa principal penda de julgamento no tribunal, processar-
se-á no primeiro grau de jurisdição o pedido de alimentos provisionais.”
Estes alimentos provisionais estão em desuso, e, como toda cautelar, são criticados,
porque não há necessidade de se colher uma providência exclusivamente cautelar quando se
pode obter similar satisfativa, no bojo do próprio processo principal, através da antecipação
da tutela. Vale mencionar, porém, que no curso desta cautelar é possível a antecipação da
tutela, calcada em mera possibilidade de que os alimentos sejam devidos, só que isto não
empresta maior utilidade a esta ação, porque a Lei 5.478/68, que trata da ação especial de
alimentos, é ainda mais célere, determinando que o juiz fixará de plano alimentos
provisórios, salvo se o credor dispensar esta liminar, como se vê no artigo 4º desta lei:
lhe-á nomeado um. Concluso o pedido, o juiz deferirá desde logo os alimentos provisórios,
como visto no artigo supra, salvo se a parte declarar que não necessita destes alimentos
liminares.
Designada audiência e determinada a citação, a lei curiosamente não traz prazo para
contestação, o qual será fixado pelo juiz, com razoabilidade.
A audiência é una, concentrado toda a instrução probatória. A cisão da audiência é
excepcional. Após realizada a audiência, o juiz proferirá sentença.
Havendo interesse de incapaz, o MP tomará parte no feito, por óbvio.
Nos alimentos pleiteados em investigação de paternidade, separação ou divórcio, o
STJ, recentemente, decidiu que na ação de investigação de paternidade, quando procedente,
o juiz deverá fixar os alimentos em sentença, definitivamente, ainda que não haja pedido
expresso. Veja o REsp. 819.729:
final dos alimentos gravídicos. Tem certa prevalência a corrente que defende ser da
propositura da ação.
A competência para as ações de alimentos é sempre do domicílio do alimentado.
O ECA dispõe, no artigo 201, III, que o MP tem legitimidade para pleitear alimentos
em prol do menor, atuando como substituto processual. O TJ/RJ acolhe esta regra
literalmente, mas em nível federal, o STJ ressalva: para esta Corte, a legitimidade do MP só
surge quando o menor estiver em situação de risco. Veja o dispositivo e o REsp. 1.072.381:
no efeito suspensivo, com base no poder de cautela, mas são minoritários, e o STJ é
pacífico em atribuir apenas efeito devolutivo ao recurso.
A sentença de alimentos é o que se chama de sentença determinativa, que contém
em si uma cláusula rebus sic stantibus, mantendo-se enquanto a situação fática que a
ensejou naqueles moldes perdure. Isto não significa que a possibilidade de que os alimentos
sejam revistos ou mesmo exonerados faça com que a sentença não transite em julgado
materialmente: há transito em julgado, porque a alteração nos fatos que enseja a revisão faz
com que novo processo seja inaugurado, com nova pretensão sob nova causa de pedir – a
revisão se pauta na alteração fática, e não na situação original (ser pai, por exemplo), a qual
transitou, sim, em julgado. A ação revisional é uma nova ação, com novo pedido e nova
causa de pedir, e por isso não perturba a coisa julgada fixada na sentença de alimentos
original, que se fundou em outra causa de pedir e outro pedido.
Pelo ensejo, vale abordar uma peculiaridade sobre a ação de exoneração de
alimentos: a sentença que exonera o devedor alimentar só produzirá efeitos quando do seu
trânsito em julgado, não podendo o devedor deixar de pagar alimentos até então, senão
quando amparado por uma antecipação da tutela neste sentido, concedida antes ou na
própria sentença.
Casos Concretos
Questão 1
Fábio, jovem de quinze anos de idade, representado por sua mãe, propõe execução
por quantia certa contra seu pai, Edgard, com o fito de haver sete anos de prestações em
atraso. Durante todo este tempo, Fábio foi sustentado apenas por sua mãe que tinha de
valer-se da generosidade de parentes e amigos, não obstante os insistentes apelos junto à
Edgard, que sempre deixava uma esperança de saldar seu débito, sem contudo adimplir a
obrigação. Citado, não paga no prazo legal, nem oferece bens à penhora. Fábio então
requer ao Juiz que proceda a penhora no único imóvel que possui o executado, um imóvel
residencial, que lhe restou da partilha por sua separação judicial. Edgard apresenta
embargos, argüindo a prescrição da pretensão do Exeqüente, e ainda o benefício do bem
de família, já que o imóvel penhorado é residência sua e da nova família, o que restou
comprovado. Diante dos fundamentos de defesa, devem ser acolhidos os embargos?
Resposta à Questão 1
Quanto à exceção do bem de família, não deve igualmente ser acolhida, pois não
goza de impenhorabilidade o imóvel residencial do devedor de alimentos, conforme artigo
3°, III, da Lei 8.009/90:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Para uma corrente, os efeitos da putatividade para o cônjuge de boa-fé persistem até
o trânsito em julgado da sentença, quando então se desfazem todos os vínculos. Neste
sentido, veja o REsp. 69.108:
Numa outra corrente, defende-se que todos os efeitos de um casamento putativo são
reconhecidos ao cônjuge de boa-fé, perdurando a obrigação alimentar como em qualquer
outro casamento válido.
Tema XII
Obrigados aos alimentos. Natureza da obrigação alimentar. Chamamento ao processo dos demais obrigados.
Transmissibilidade da obrigação. Alimentos requeridos aos avós. Alimentos prestados aos pais idosos e
solidariedade. Alimentos ao nascituro. Vigência dos alimentos. Sentença. Modificação dos alimentos.
Natureza jurídica. Execução da dívida alimentar. Recurso. Coisa julgada. Exoneração. Súmula 358 do STJ.
Notas de Aula16
1. Alimentos ao nascituro
O nascituro tem direito a alimentos, pelo menos para a corrente civilista mais
moderna. Até pouco tempo, persistiu forte a divergência, porque o Brasil adota a teoria
natalista da personalidade jurídica. De fato, prevalecia a tese da não titularização dos
alimentos pelo nascituro, justamente com este enfoque natalista. Contudo, desde a Lei
11.804/08, Lei de Alimentos Gravídicos, o entendimento se inverteu, passando a haver
direito alimentar ao nascituro.
Esta Lei 11.804/08, porém, é um pouco contraditória quanto à titularidade dos
alimentos que estabelece. Isto porque em seu artigo 1º, diz que disciplina os alimentos
devidos à mulher gestante, mas no artigo 6º, parágrafo único, passa esta titularidade ao
menor. Veja:
Se o menor não fosse parte do processo, não poderia receber esta entrega de direitos
por este parágrafo único. Compatibilizando os dispositivos, deve-se entender que o titular
desta obrigação alimentar gravídica é o nascituro, e não a mãe, interpretando-se o texto do
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Aula ministrada pela professora Elisa Costa Cruz, em 4/3/2010.
artigo 1º com a devida técnica processual. E mais: o feto tem direito a nascer com vida, e é
daí que se colhe sua titularidade aos alimentos gavídicos, necessários a este nascimento.
É fato que o valor dos alimentos é calculado com base nas necessidades da gestante,
porque é ela quem está despendendo recursos maiores em função da gravidez. O titular dos
alimentos é o feto, mas a sua medida é pautada nas despesas da mãe.
O STJ já decidiu pela legitimidade ativa do nascituro. Veja o Ag. Rg. no Agravo de
Instrumento 1.092.134:
irrepetível, sendo mera liberalidade de quem a presta. Veja o REsp. 1.032.846, constante do
informativo 381 do STJ:
“REsp 1032846 / RS. RECURSO ESPECIAL. Relatora Ministra NANCY
ANDRIGHI. Órgão Julgador - TERCEIRA TURMA. Data do Julgamento:
18/12/2008. Data da Publicação/Fonte: DJe 16/06/2009.
Ementa: Direito civil. Família. Recurso especial. Ação de alimentos ajuizada pelos
sobrinhos menores, representados pela mãe, em face das tias idosas.
- Conforme se extrai da descrição dos fatos conferida pelo Tribunal de origem, que
não pode ser modificada em sede de recurso especial, o pai sempre enfrentou
problemas com alcoolismo, mostrando-se agressivo com a mulher e incapaz de
fazer frente às despesas com a família, o que despertou nas tias o sentimento de
auxiliar no sustento dos sobrinhos. Quanto à mãe, consta apenas que é do lar e, até
então, não trabalhava.
- Se as tias paternas, pessoas idosas, sensibilizadas com a situação dos sobrinhos,
buscaram alcançar, de alguma forma, condições melhores para sustento da família,
mesmo depois da separação do casal, tal ato de caridade, de solidariedade humana,
não deve ser transmutado em obrigação decorrente de vínculo familiar,
notadamente em se tratando de alimentos decorrentes de parentesco, quando a
interpretação majoritária da lei, tem sido no sentido de que tios não devem ser
compelidos a prestar alimentos aos sobrinhos.
- A manutenção do entendimento firmado, neste Tribunal, que nega o pedido de
alimentos formulado contra tios deve, a princípio, permanecer, considerada a
cautela que não pode deixar jamais de acompanhar o Juiz em decisões como a dos
autos, porquanto os processos circunscritos ao âmbito do Direito de Família batem
às portas do Judiciário povoados de singularidades, de matizes irrepetíveis, que
absorvem o Julgador de tal forma, a ponto de uma jurisprudência formada em
sentido equivocado ter o condão de afetar de forma indelével um sem número de
causas similares com particularidades diversas, cujos desdobramentos poderão
inculcar nas almas envolvidas cicatrizes irremediáveis.
- Condição peculiar reveste este processo ao tratar de crianças e adolescentes de
um lado e, de outro, de pessoas idosas, duas categorias tuteladas pelos respectivos
estatutos protetivos – Estatuto da Criança e do Adolescente, e Estatuto do Idoso,
ambosconcebidos em sintonia com as linhas mestras da Constituição Federal.
- Na hipótese em julgamento, o que se verifica ao longo do relato que envolve as
partes, é a voluntariedade das tias de prestar alimentos aos sobrinhos, para suprir
omissão de quem deveria prestá-los, na acepção de um dever moral, porquanto não
previsto em lei. Trata-se, pois, de um ato de caridade, de mera liberalidade, sem
direito de ação para sua exigibilidade.
- O único efeito que daí decorre, em relação aos sobrinhos, é o de que prestados os
alimentos, ainda que no cumprimento de uma obrigação natural nascida de laços
de solidariedade, não são eles repetíveis, isto é, não terão as tias qualquer direito de
serem ressarcidas das parcelas já pagas.
Recurso especial provido.”
“ALIMENTOS. SOBRINHOS.
A Turma decidiu que as tias dos menores representados pela mãe na ação de
alimentos não são obrigadas a pagar alimentos aos sobrinhos após a separação dos
pais. No caso dos autos, a mãe não trabalha e o pai, com problemas de alcoolismo,
cumpre apenas parcialmente o débito alimentar (equivalente a um salário mínimo
mensal). Ressalta a Min. Relatora que a voluntariedade das tias idosas que vinham
ajudando os sobrinhos após a separação dos pais é um ato de caridade e
solidariedade humana, que não deve ser transmudado em obrigação decorrente do
vínculo familiar. Ademais, a interpretação majoritária da lei pela doutrina e
jurisprudência tem sido que os tios não devem ser compelidos a prestar alimentos
aos sobrinhos. Por tratar-se de ato de caridade e de mera liberalidade, também não
há o direito de ação para exigibilidade de ressarcimentos dos valores já pagos.
Invocou, ainda, que, no julgamento do HC 12.079-BA, DJ 16/10/2000, da relatoria
do Min. Sálvio de Figueiredo, reconheceu-se que a obrigação alimentar decorre da
lei, que indica os parentes obrigados de forma taxativa e não enunciativa, sendo
assim são devidos os alimentos, reciprocamente, pelos pais, filhos, ascendentes,
descendentes e colaterais até segundo grau, não abrangendo, consequentemente,
tios e sobrinhos. REsp 1.032.846-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em
18/12/2008.”
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Em opinião pessoal, esta subvertente que entende que deve ser retirada a solidariedade prevista para os
idosos não tem cabimento, eis que abalroa frontalmente o princípio da vedação ao retrocesso nos direitos e
garantias fundamentais.
“Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em
condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau
imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem
concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma
delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.”
A exoneração, portanto, depende de decisão judicial, que pode vir inclusive por
antecipação de tutela.
Há também que se mencionar a fixação de alimentos entre ex-cônjuges por prazo
certo, o que se justifica para que se estipule um período razoável para a reinserção do ex-
cônjuge no mercado de trabalho, a fim de poder se sustentar. Como não há a presunção de
necessidade forte, neste caso, não se aplica a súmula, ou seja, findo o prazo estipulado na
sentença ou no acordo de alimentos, cessa a obrigação de plano, independentemente de
exoneração judicial.
5. Alimentos gravídicos
O tema já foi bastante abordado, mas ainda há alguns aspectos a serem firmados.
Veja o artigo 2º, e reveja o 6º desta Lei 11.804/08:
Questão que se coloca, aqui, é qual é o alcance destes “indícios de paternidade” que
justificam os alimentos gravídicos. De fato, a melhor interpretação deste dispositivo leva a
crer que se trata de um juízo de verossimilhança muito perfunctório, tal como na liminar em
ação cautelar: trata-se de um juízo de possibilidade da paternidade, não se exigindo a
probabilidade que se exige nas antecipações de tutela regulares do processo de
conhecimento.
Destarte, documentos, fotos, quaisquer provas superficiais de que um
relacionamento existiu entre a mãe e o suposto pai, à época da concepção, são suficientes a
este deferimento.
Comprovada a união estável, por exemplo, fica clara a possibilidade de que haja a
paternidade, e os alimentos gravídicos serão devidos. Se o suposto pai fizer prova de que
não é possível que seja o pai, de forma contundente, é claro que a obrigação ficará afastada,
e a ação será julgada improcedente. A análise tremendamente é casuística.
Vale mencionar que o exame de DNA no feto é vedado: este exame, altamente
invasivo, é prejudicial à sua saúde, pelo que esta prova não é admitida, somente sendo
possível após o nascimento.
O artigo 11 desta lei remete à aplicabilidade da Lei de Alimentos e do CPC, mas não
remete ao CC:
“Art. 11. Aplicam-se supletivamente nos processos regulados por esta Lei as
disposições das Leis nos 5.478, de 25 de julho de 1968, e 5.869, de 11 de janeiro
de 1973 - Código de Processo Civil.”
“Art. 734. Quando o devedor for funcionário público, militar, diretor ou gerente de
empresa, bem como empregado sujeito à legislação do trabalho, o juiz mandará
descontar em folha de pagamento a importância da prestação alimentícia.
Parágrafo único. A comunicação será feita à autoridade, à empresa ou ao
empregador por ofício, de que constarão os nomes do credor, do devedor, a
importância da prestação e o tempo de sua duração.”
“Art. 735. Se o devedor não pagar os alimentos provisionais a que foi condenado,
pode o credor promover a execução da sentença, observando-se o procedimento
estabelecido no Capítulo IV deste Título.”
733, supra, não haveria que se seguir o rito do cumprimento de sentença, mantendo-se
hígida sua previsão ritual – o legislador não os alterou propositadamente.
Este raciocínio sofreu a seguinte crítica: a defesa do executado nos alimentos era
feita por meio de embargos, sendo que a reforma excluiu da execução judicial esta forma de
defesa, mantendo-a apenas para a execução contra a Fazenda Pública e para a execução de
título extrajudicial – ou seja, o executado alimentar ficaria indefeso, carente de instrumento
para se manifestar. Redargüindo, esta corrente defendeu que bastaria estender o regramento
dos embargos existentes, da execução de título extrajudicial, para a execução de alimentos,
sem ressalvas.
Todavia, a posição que triunfou amplamente foi a de que as alterações reformistas
são aplicáveis à execução de alimentos, de forma que, estabelecida a obrigação alimentar
em título judicial, o rito sincrético do cumprimento de sentença deve ser observado.
Há, porém, controvérsia dentro desta própria corrente, bipartindo-a: de um lado há
quem defenda esta aplicação plena, a qualquer execução alimentar, do processo sincrético
(mas a multa de dez por cento não se aplica, porque a medida de coerção, mesmo adotando
o processo sincrético, é a prisão civil); de outro, há corrente que defende que somente nas
execuções de alimentos pretéritos, estipulada no artigo 732 do CPC, supra, se pode falar no
rito de cumprimento de sentença, porque na execução pelo rito especial do artigo 733, que
comina prisão civil como medida de coerção, não é compatível a aplicação do cumprimento
de sentença.
Definindo os “alimentos novos”, veja a súmula 309 do STJ:
“Súmula 309, STJ: O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é
o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as
que se vencerem no curso do processo.(*).
(*) julgando o HC 53.068-MS, na sessão de 22/03/2006, a Segunda Seção
deliberou pela ALTERAÇÃO da súmula n. 309. REDAÇÃO ANTERIOR (decisão
de 27/04/2005, DJ 04/05/2005):
O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende
as três prestações anteriores à citação e as que vencerem no curso do processo.”
célere satisfação do débito alimentar seja pelo meio coercitivo da prisão civil do
devedor seja pelo desconto em folha de pagamentos da importância devida.
Todavia, é inconcebível que a exequente da verba alimentar, maior interessada na
satisfação de seu crédito que detém efetivamente legitimidade para propor os
meios executivos que entenda conveniente, seja compelida a adotar procedimento
mais gravoso para o executado, do qual não se utilizou voluntariamente. Vale
ressaltar que a prisão civil não deve ser decretada ex officio, isso porque é o credor
quem sempre estará em melhores condições que o juiz para avaliar sua eficácia e
oportunidade. Deixa-se, pois, ao exequente a liberdade de pedir ou não a aplicação
desse meio executivo de coação, quando entenda que lhe vai ser de utilidade, pois
pode acontecer que o exequente, maior interessado na questão, por qualquer
motivo, não julgue oportuna e até considere inconveniente a prisão do executado.
HC 128.229-SP, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 23/4/2009.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Se Zilma não renunciou aos alimentos, se limitando apenas a deixar de exercer seu
direito a eles, terá direito a pleiteá-los aqui, mesmo após tanto tempo. Contudo, se ao abrir
mão dos alimentos ela renunciou expressamente a seu direito a percebê-los, não mais
subsiste a obrigação alimentar para Paulo César.
Questão 2
Lívia, representada por sua mãe adotiva, Roberta, propôs ação de investigação de
paternidade cumulada com alimentos. Sustenta que, ao nascer, foi registrada apenas com o
nome da mãe biológica e que posteriormente, foi adotada unicamente por uma mulher,
viúva, com quem reside. Em contestação, alegou o réu que havendo registro prévio, a ação
de investigação de paternidade não pode ser movida sem que se peça a nulidade do
existente, provando-se ainda, que esse é resultante de erro ou falsidade. Ponderou não
haver permissão legal, a teor do que dispõe o Código Civil no seu artigo 348, para a
convivência de duas formas de filiação, da adotiva com a biológica, pois que uma e outra
estão equiparadas, por força de preceito constitucional. Invocou os artigos 41 e 48 do
Estatuto da Criança e do Adolescente. Questionou qual o efeito do desligamento dos
vínculos entre o adotado e seus pais e parentes naturais, se se permite que possa ele
investigar a sua paternidade. Ressaltou, também, não existir o dever de prestar alimentos
entre pais e filhos genéticos se ocorre a adoção. Em réplica, aduz a autora que o direito de
filiação pode ser exercitado sem qualquer restrição, como dispõe o artigo 27 do Estatuto
da Criança e do Adolescente, e que a regra do artigo 48 da mesma lei não pode atingir o
pai biológico, já que não participou da adoção autorizada pela mãe biológica. Pergunta-
se: É possível o pai biológico reconhecido por exame de DNA, após adoção da criança, ser
condenado a pagar alimentos à filha?Decida a questão fundamentadamente.
Resposta à Questão 2
A adoção rompe os vínculos biológicos anteriores, desde que estes vínculos sejam
conhecidos de todos os envolvidos. Esta é a melhor interpretação possível, porque o pai
biológico que sequer era conhecido quando da efetivação da adoção não pode ter-se
desvinculado antes mesmo de ter-se vinculado – não se pode desfazer um vínculo que ainda
estava indefinido. Mais do que isso, pode o pai biológico, inclusive, impugnar a adoção
feita à sua revelia – afinal, ele também tem direito a ser pai.
Esta é a leitura que o STJ faz desta situação, como se vê no REsp. 813.604:
Há quem defenda, porém, que os vínculos se rompem, como postulado pela parte ré
do caso, mas é posição minoritária.
Tema XIII
União estável. Evolução histórica e a Lei 8.971/94. O Código Civil e a Lei 9.278/96. Tutela constitucional.
Requisitos. Sociedade de fato e concubinato. Impedimentos. Efeitos jurídicos. Direitos e deveres dos
companheiros. Concomitância ao casamento.
Notas de Aula18
1. União estável
Muito já se disse da origem histórica deste instituto, que veio com a relativização do
conceito de família, antes fundada unicamente no casamento, e agora baseada no afeto
dedicado de seus membros (a família eudomonista, de Maria Berenice Dias). É desta
concepção de família, fundada na ética e no afeto, que exsurge o reconhecimento
constitucional da união estável.
A união estável é um fenômeno de fato, exatamente oposto, em sua constatação, ao
casamento, que é fenômeno jurídico absolutamente solene. Por ser desta forma, a união
estável não conta com um marco inicial expresso muito claro.
Este fenômeno, que sempre existiu, se tornou socialmente visível em meados da
década de sessenta, em que a dissolução do vínculo conjugal era impossível, no nosso
ordenamento, mas só foi realmente reconhecida como entidade familiar muito adiante no
tempo, só surgindo, inclusive, este nomen juris, na CRFB de 1988. Até então, o que existia
era aquilo que se chamava de concubinato puro – predecessor da união estável – e o
concubinato impuro, que hoje é simplesmente denominado concubinato, pelo CC de 2002.
O concubinato puro de outrora era o reconhecimento civil da relação empreendida por duas
pessoas que não tinham impedimentos para o casamento, mas não formalizaram sua união.
Há que se atentar para o conceito de posse de estado de casado, que para alguns é
sinônimo da união estável, mas tecnicamente, porém, se trata de outra situação: consiste no
estado das pessoas que efetivamente se casaram, mas não contam com o registro deste ato
solene, porque este registro se perdeu, e não há como se obter nova certidão porque o
registro civil perdeu seus arquivos, por qualquer motivo. É situação exatamente análoga à
posse de estado de filho, que já se abordou, e a solução é a mesma: deve ser ajuizado
procedimento de jurisdição voluntária, denominado de justificação, a fim de certificar esta
18
Aula ministrada pela professora Elisa Costa Cruz, em 4/3/2010.
situação dos cônjuges sem registro. Na união estável, não há casamento jamais – é clara a
diferença entre os conceitos.
Um casamento religioso não registrado, por exemplo, não é casamento legalmente
considerado. Contudo, esta cerimônia certamente é um marco bastante sólido para se
investigar uma eventual formação da situação fática de união estável.
Outro conceito que deve se diferençar da união estável é o de sociedade de fato.
Este conceito, típico do direito das obrigações, está associado ao concubinato, mas é
instituto regido ainda pelo direito obrigacional. Se a união de duas pessoas findou-se antes
da CRFB, a regência dos direitos das partes será definida por meio desta sociedade de fato,
porque antes da CRFB não se reconhecia esta união como entidade familiar.
O constituinte, ao disciplinar no § 3º do artigo 226 da CRFB que “para efeito da
proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade
familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”, quis colocar a união estável
em um patamar de inferioridade axiológica ao casamento?
A discussão perdurou forte por um bom tempo, havendo duas correntes. A primeira
entende que a facilitação da conversão realmente significa que a união estável é um minus
em relação ao casamento, pelo que estabelecer direitos desiguais ao cônjuge e ao
companheiro é constitucional – o que ocorre no direito das sucessões. A segunda vertente,
no entanto, defende que a facilitação para o casamento, mencionada pelo constituinte, nada
mais é do que o fomento a esta formalização, eis que a presunção de que haja a união é
muito mais sólida no casamento do que na união estável, mas não significa que as
sociedades maritais sejam desiguais, que a união estável tenha desvalor perante o
casamento. Por isso, diz esta doutrina, o tratamento diferenciado dado ao companheiro em
relação ao cônjuge, na sucessão, é inconstitucional.
A Lei 8.009/90 também reconheceu esta entidade, assim como o artigo 42 do ECA:
“Art. 11. Morrendo o locatário, ficarão sub - rogados nos seus direitos e
obrigações:
I - nas locações com finalidade residencial, o cônjuge sobrevivente ou o
companheiro e, sucessivamente, os herdeiros necessários e as pessoas que viviam
na dependência econômica do de cujus , desde que residentes no imóvel;
II - nas locações com finalidade não residencial, o espólio e, se for o caso, seu
sucessor no negócio.”
quando a Lei 8.971/94, seguida da Lei 9.278/96, que acabaram com esta ideia de prazo
mínimo.
Finalmente, o CC de 2002 é pródigo em previsões sobre a união estável, mas
representa, de fato, retrocesso em alguns aspectos, como na sucessão.
Antes da Lei 8.971/94, o companheiro não tinha direito a alimentos. A situação se
resolvia em indenização por serviços prestados por um companheiro ao outro: era a única
solução para se fazer justiça, computando os anos de união como anos de serviço, se a
companheira (ou o companheiro) cuidasse do lar.
A Lei 9.278/96, porém, já veio expressamente para regular o artigo 226, § 3º, da
CRFB. Apesar de tratar de pontos em comum, o entendimento que primou foi o de que não
houve revogação da lei de 1994 por esta última, vigendo ambas em conjunto.
Quando veio ao ordenamento o CC de 2002, ressurgiu esta discussão: este diploma
revogou as leia anteriores? O entendimento principal foi de que não houve revogação: as
leis anteriores permaneceram vigentes, especialmente sobre temas que o CC não aborda,
como o direito real de moradia do companheiro, mesmo havendo quem defendesse que
houve revogação.
Veja que, mesmo se se entender que houve a revogação dos diplomas pelo CC, este
ponto, do direito real de habitação, não se altera, porque com a revogação da norma
expressa para o companheiro, o entendimento que prevalece é o de que o direito real de
moradia previsto para o cônjuge se estende ao companheiro. Veja o enunciado 117 do CJF:
“Enunciado 117, CJF: Art. 1831: o direito real de habitação deve ser estendido ao
companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da Lei n. 9.278/96, seja em
razão da interpretação analógica do art. 1.831, informado pelo art. 6º, caput, da
CF/88.”
“Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e
a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida
com o objetivo de constituição de família.
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521;
não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar
separada de fato ou judicialmente.
§ 2º As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união
estável.”
A Lei 8.971/94 trazia conceito mais restrito, porém. Veja seu artigo 1º:
Note que esta lei não admitia a união estável de pessoa separada apenas de fato, o
que só surgiu em 1996, como visto no artigo 1º da Lei 9.278, supra. Para além disso, o
prazo de cinco anos, exigido em 1994, deixou de existir como requisito em 1996,
providência legislativa esta absolutamente correta, porque o escopo estável da união pode
ser percebido em prazo muito menor, a depender da casuística.
Entenda: os requisitos da convivência pública, contínua e com finalidade clara e
bilateral de estabelecer família são inarredáveis, mas o elemento “duradoura” é altamente
relativo, não sendo impossível se pensar em uma união estável com muito breve tempo.
Veja um exemplo: um casal promove uma festa para comunicar aos seus amigos que está se
unindo, está formando família. Está claramente assumindo a relação de união estável. No
dia seguinte, um deles falece. É justa a configuração da relação de união estável, mesmo
que o marco concreto tenha sido há apenas um dia.
Tratando já dos requisitos, a duração é altamente relativa, portanto. A estabilidade,
por seu turno, consiste na constância, na invariabilidade do escopo de constituir família. A
publicidade é requisito óbvio: não há constituição familiar às escondidelas, devendo ser
reconhecida esta união no meio social dos convivas, tendo a sociedade em conta que
aqueles companheiros vivem como se casados fossem.
A jurisprudência tem dispensado a coabitação para reconhecer a união estável, como
se vê na súmula 382 do STF:
“Súmula 382, STF: A vida em comum sob o mesmo teto, ‘more uxorio’, não é
indispensável à caracterização do concubinato.”
Vale abordar uma prática um tanto peculiar que tem surgido: o contrato de namoro.
Consiste, este termo, em uma pactuação pela qual as pessoas que se unem declaram
expressamente que a sua relação não é uma união estável, certificando que se trata de uma
relação mais superficial, sem cunho familiar. A doutrina contesta a própria validade do
objeto deste pacto, e também sua eficácia: como a união estável é uma situação fática, ela
não se pauta na literalidade de um contrato. Este pacto deve ser entendido, no máximo,
como um indício forte de que não há união estável, mas esta presunção por ele criada é
perfeitamente afastável, eis que no seu curso podem se alterar os intentos das partes. Sendo
assim, pode a relação passar, no seu iter, a preencher todos os requisitos da união estável,
caso em que a existência de um termo contratual expresso contrário à realidade se torna
irrelevante – o contrato passa a ser um nada jurídico, diante da realidade fática que lhe
prova o contrário.
O fato de a união estável ser uma constatação colhida da realidade fática não afasta,
contudo, a possibilidade de se firmar um termo declaratório de sua existência, ou de sua
inexistência. A declaração cartorária de existência se presta a duas coisas: possibilitar a
alteração do regime de bens que regerá a união estável (que, na omissão das partes, é o da
comunhão parcial); e criar uma forte presunção de que ali se constituiu a união estável,
presunção esta que, como visto, pode ser afastada provando-se que a realidade é a
inexistência da relação.
Da mesma forma ocorre com a declaração de que inexiste a união estável: tal como
no contrato de namoro, esta declaração gera uma presunção de que não existe a união
estável, mas se esta situação se demonstrar contrária à realidade dos fatos, não prevalecerá
– a união se constatará.
A dificuldade prática na constituição da união estável é a sua prova, em verdade. É
preciso constatar com cuidado os requisitos, dada a magnitude de efeitos que este
reconhecimento produz na sociedade.
Um dos principais requisitos para que a união estável se constitua é negativo: é
preciso que não haja impedimentos para o casamento, presentes no artigo 1.521 do CC, já
abordado, mas que merece ser revisto:
Vale ressaltar que, havendo o impedimento do inciso VI, mas sendo a pessoa casada
separada de fato, é possível que a união estável se consolide. A separação de fato permite
que a pessoa casada contraia união estável com outra, na forma do artigo 1.723, § 1º, do
CC:
“Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e
a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida
com o objetivo de constituição de família.
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521;
não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar
separada de fato ou judicialmente.
§ 2º As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união
estável.”
Um requisito para constituição da união estável, que a todo ver estaria expresso na
lei, é o da diversidade de sexos dos companheiros, pois a CRFB fala em “homem e
mulher”, como visto no artigo 226, § 3º, transcrito há pouco.
Contudo, esta questão, hoje, é das mais discutidas. Há quem defenda que a redação
da CRFB disse mais do que intentava o legislador constituinte – deveria ter dito “pessoas”,
e não “homem e mulher”. Sendo assim, a união entre pessoas do mesmo sexo não teria
óbice. Pelo outro lado, há corrente que defende que a união estável homoafetiva é
impossível, baseando-se justamente na literalidade constitucional, na expressa menção à
diversidade de sexos.
De qualquer forma, a união homoafetiva existe na realidade fática, bastando analisar
se será reconhecida como união estável ou não, pois daí decorrem os direitos dos consortes,
que, se reconhecidos como companheiros, terão sua relação equiparada ao casamento. A
discussão será aprofundada em tópico próprio.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
o impedimento para a constituição de nova família não mais subsiste, e a união estável deve
ser reconhecida.
De outro lado, se se entender que não há separação de fato – o que, repita-se, é
questão de provas nos autos –, haverá o impedimento do artigo 1.521, VI, do CC, e a
presença deste impedimento, segundo a jurisprudência hoje unânime, impede que a união
estável seja reconhecida.
A respeito, veja a Apelação Cível 2004.001.09609, do TJ/RJ:
Questão 2
Em 2003, Carlos passou a viver com Maria, tendo recebido em sua casa alguns
parentes que assistiram a um culto em razão da união. Na mesma semana, fizeram um
contrato de união e o registraram no registro de títulos e documentos. Em 2005, Maria
faleceu. Atualmente Carlos pretende contrair matrimônio com Glória, mãe de Maria.
Indaga-se:
a) Há algum vínculo jurídico entre Glória e Carlos? Em caso positivo, de que
natureza?
b) Com a morte de Maria é possível o casamento de Carlos com Glória? Justifique,
indicando os dispositivos legais pertinentes.
Resposta à Questão 2
Questão 3
Tema XIV
União estável. Regime de bens. Contrato convivencial. Obrigação alimentar. Conversão da união estável em
casamento. Dissolução por via judicial. Consensual e contenciosa.
Notas de Aula19
19
Aula ministrada pelo professor Sandro Gaspar Amaral, em 5/3/2010.
“Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-
se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de
bens.”
Casos Concretos
Questão 1
Ronaldo, mantendo união estável com Moema há dois anos, não desejando mais
manter a relação, propõe perante o Juízo de Família, Ação Declaratória de Existência e
Dissolução de União Estável c/c Oferecimento de Alimentos em face de Moema. Citada,
esta pede a extinção do feito, sem julgamento do mérito, alegando falta de interesse de
agir, já que da união não restou prole nem bens a partilhar. Chegando os autos às suas
mãos, você, juiz, como decidiria?
Resposta à Questão 1
Deverá ser acolhido o pedido do autor, pois tem ele legítimo interesse em formalizar
a extinção da união que mantinha com a ré, ainda que inexistam bens a partilhar. E nenhum
óbice há em cumular a ação de natureza declaratória com o oferecimento de alimentos, com
inspiração no artigo 24 da Lei 5.478/68, mas que aqui seguirá pelo procedimento comum
ordinário.
A respeito, veja o REsp. abaixo:
Questão 2
Maria, alegando a existência de união estável com João, falecido em 2005, propôs
ação em face dos herdeiros do de cujus, inclusive sua esposa, Madalena, pleiteando o
reconhecimento da entidade familiar. Sustenta, em síntese, que, embora formalmente
casado, João mantivera com ela relacionamento amoroso nos últimos trinta anos. Afirmou
que a convivência entre os dois era pública, contínua e estável, tal como o casamento, e
que a legislação pátria não impõe monogamia para a caracterização da união estável.
Regularmente citados, os réus apresentaram resposta na qual alegaram que o casamento
de João e Madalena perdurara por cerca de quarenta anos sem que o cônjuge houvesse
abandonado o lar; inclusive, as contas pessoais eram endereçadas ao domicílio do casal e
a família era vista unida em eventos sociais e familiares. Afirmaram que a sociedade
conjugal só foi dissolvida com a morte do cônjuge para, ao final, postularem o julgamento
de improcedência da pretensão autoral. Em audiência de instrução e julgamento, as
testemunhas elencadas pelas partes ratificaram as alegações de cada uma delas. Os autos
vieram conclusos para sentença. Decida a questão.
Resposta à Questão 2
Restaram provados os fatos alegado tanto por uma quanto por outra parte, e por isso
a análise se reduz a definir se há a união estável ou não. Se há união estável, há direito à
meação e direito sucessório; se não há, não há estes direitos.
Admitindo-se que haja união estável, sobre a sucessão, neste caso, a corrente que
predomina é que os bens adquiridos até o início da união estável serão sucedidos pelo
cônjuge sobrevivente; nos bens adquiridos a partir da união estável, sucede a companheira.
Se Maria não for considerada companheira, mas sim concubina, os direitos
sucessórios assistem somente à cônjuge supérstite. No caso, a todo ver, há união estável, e a
solução é a apresentada acima, ou seja, a sucessão separada pelos períodos de casamento ou
união estável, cada uma sucedendo nos bens do respectivo período.
Tema XV
Da tutela e da curatela. Sujeitos à tutela. Tutela testamentária, legítima e dativa. Exercício. Garantia.
Protutor. Administração dos bens. Prestação de contas. Cessação da tutela. Curatela dos interditos. Sujeitos
à curatela. Interdição. Procedimento. Sentença de interdição. Natureza jurídica e efeitos. Levantamento da
interdição. Curatela do nascituro. Curatela do deficiente físico.
Notas de Aula20
1. Tutela
20
Aula ministrada pela professora Lucia Mothe Glioche, em 5/3/2010.
“Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
(...)
IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais
não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
(...)”
Para que os pais possam nomear tutor, é preciso que estejam eles ainda no exercício
do poder familiar, eis que, destituídos deste poder, não mais têm esta faculdade, que a ele é
inerente.
Não havendo tutela testamentária, não havendo tutor válido nomeado pelos pais,
tem lugar a segunda classe de tutela, a legítima, prevista no artigo 1.731 do CC:
“Art. 1.731. Em falta de tutor nomeado pelos pais incumbe a tutela aos parentes
consangüíneos do menor, por esta ordem:
I - aos ascendentes, preferindo o de grau mais próximo ao mais remoto;
II - aos colaterais até o terceiro grau, preferindo os mais próximos aos mais
remotos, e, no mesmo grau, os mais velhos aos mais moços; em qualquer dos
casos, o juiz escolherá entre eles o mais apto a exercer a tutela em benefício do
menor.”
A ordem de escolha do tutor não é rígida: pode o juiz optar por quem seja mais
benéfico ao menor, mesmo subvertendo esta ordem legal.
A terceira classe de tutela é a dativa, ou judicial, prevista no artigo 1.732 do CC:
Aos irmãos deve ser nomeado tutor comum, como dispõe o artigo 1.733 do CC, o
que é dito também no artigo 28, § 4º, do ECA:
Sendo nomeados dois ou mais tutores para os irmãos órfãos, sem que os pais
tenham traçado preferência, a tutela se concentrará no primeiro.
O § 2º do artigo 1.733, supra, estabelece previsão que não está muito bem colocada
aqui, porque trata de bens: consiste no curador especial de bens do menor, que também não
se confunde com o curador que será estudado no instituto da curatela.
O artigo 1.735 do CC trata dos que não podem ser tutores. O CC fala de
incapacidade para a tutela, mas se trata, tecnicamente, de ilegitimidade. Veja:
“Art. 1.735. Não podem ser tutores e serão exonerados da tutela, caso a exerçam:
I - aqueles que não tiverem a livre administração de seus bens;
II - aqueles que, no momento de lhes ser deferida a tutela, se acharem constituídos
em obrigação para com o menor, ou tiverem que fazer valer direitos contra este, e
aqueles cujos pais, filhos ou cônjuges tiverem demanda contra o menor;
III - os inimigos do menor, ou de seus pais, ou que tiverem sido por estes
expressamente excluídos da tutela;
IV - os condenados por crime de furto, roubo, estelionato, falsidade, contra a
família ou os costumes, tenham ou não cumprido pena;
V - as pessoas de mau procedimento, ou falhas em probidade, e as culpadas de
abuso em tutorias anteriores;
VI - aqueles que exercerem função pública incompatível com a boa administração
da tutela.”
Diferente da ilegitimidade, que é não poder ser tutor, é a escusa à tutela, que é uma
defesa que aquele nomeado que pode ser tutor, mas não o quer, podendo se opor à sua
indicação para este encargo. O artigo 1.736 do CC trata destas escusas:
O inciso I fala em mulher casada, mas pela isonomia constitucional a mesma escusa
é permitida ao homem de família, ou a qualquer pessoa que já se vê na contingência de ter
uma família sob seus cuidados.
1.2. Procedimentos
Qualquer das três classes de tutela que seja será seguida pela prestação do
compromisso pelo tutor, o que se vê no artigo 1.187 do CPC:
“Art. 1.188. Prestado o compromisso por termo em livro próprio rubricado pelo
juiz, o tutor ou curador, antes de entrar em exercício, requererá, dentro em 10 (dez)
dias, a especialização em hipoteca legal de imóveis necessários para acautelar os
bens que serão confiados à sua administração.
Parágrafo único. Incumbe ao órgão do Ministério Público promover a
especialização de hipoteca legal, se o tutor ou curador não a tiver requerido no
prazo assinado neste artigo.”
O artigo seguinte, 1.189 do CPC, determina que o MP será o tutor do menor e seus
bens:
O CC prevê que a caução pode ser dispensada pelo juiz, como se vê no seu artigo
1.745, a pessoas por ele consideradas idôneas:
Vê-se que o tutor desempenha verdadeiro papel que incumbiria aos pais, exercendo
os atos de gerência da vida do menor tal como aqueles deveriam exercer. Todas estas
incumbências requerem dinheiro para seu custeio, pelo que o artigo 1.746 do CC dispõe
que:
“Art. 1.746. Se o menor possuir bens, será sustentado e educado a expensas deles,
arbitrando o juiz para tal fim as quantias que lhe pareçam necessárias, considerado
o rendimento da fortuna do pupilo quando o pai ou a mãe não as houver fixado.”
Em relação aos bens do tutelado, diz o artigo 1.745 do CC, supra, que são entregues
ao tutor para que os gerencie, mediante caução. O artigo 1.741 do CC fala que a
administração dos bens do tutelado incumbe ao tutor, sob a inspeção do juiz. Veja:
“Art. 1.742. Para fiscalização dos atos do tutor, pode o juiz nomear um protutor.”
“Art. 1.750. Os imóveis pertencentes aos menores sob tutela somente podem ser
vendidos quando houver manifesta vantagem, mediante prévia avaliação judicial e
aprovação do juiz.”
Vê-se então que a regra, para os bens imóveis do menor tutelado, é a sua
inalienabilidade, porque a sua venda será sempre excepcional e burocrática. São legalmente
indisponíveis, portanto.
Há atos que a lei veda ao tutor, sem qualquer exceção: nem mesmo sendo
judicialmente autorizados serão válidos, sendo esta autorização uma providência errônea do
juízo que assim proceder. São aqueles previstos no artigo 1.749 do CC:
“Art. 1.749. Ainda com a autorização judicial, não pode o tutor, sob pena de
nulidade:
I - adquirir por si, ou por interposta pessoa, mediante contrato particular, bens
móveis ou imóveis pertencentes ao menor;
II - dispor dos bens do menor a título gratuito;
III - constituir-se cessionário de crédito ou de direito, contra o menor.”
“Art. 1.752. O tutor responde pelos prejuízos que, por culpa, ou dolo, causar ao
tutelado; mas tem direito a ser pago pelo que realmente despender no exercício da
tutela, salvo no caso do art. 1.734, e a perceber remuneração proporcional à
importância dos bens administrados.
§ 1º Ao protutor será arbitrada uma gratificação módica pela fiscalização efetuada.
§ 2º São solidariamente responsáveis pelos prejuízos as pessoas às quais competia
fiscalizar a atividade do tutor, e as que concorreram para o dano.”
Assim, se o tutelado não mais demanda tutela, por se tornar maior ou emancipado,
ou ainda sobrevier poder familiar que torne descabida tutela alheia, a tutela se extingue.
Também se finda por causas relacionadas ao tutor: se o tempo de múnus do tutor se expirar
(dois anos, no mínimo, como dispõe o artigo 1.765 supra), ou se sobrevier escusa que o
permita exonerar-se do múnus, ou ainda por ser removido ou destituído, termina a tutela
para aquele tutor – se ainda for necessária tutela, outro tutor será nomeado.
O artigo 1.766 do CC, supra, define que será destituído o tutor se for negligente,
prevaricador, ou tornar-se incapaz.
“Art. 1.755. Os tutores, embora o contrário tivessem disposto os pais dos tutelados,
são obrigados a prestar contas da sua administração.”
É exigido um balanço anual das contas da gerência dos bens, na forma do artigo
seguinte, 1.756 do CC:
Além disso, a cada biênio, o tutor deverá apresentar prestação de contas detalhada.
Pode o juiz entender que esta prestação de contas seja necessária em períodos menores, ou
a qualquer tempo, a seu critério. Veja o artigo 1.757 do CC:
“Art. 1.757. Os tutores prestarão contas de dois em dois anos, e também quando,
por qualquer motivo, deixarem o exercício da tutela ou toda vez que o juiz achar
conveniente.
Parágrafo único. As contas serão prestadas em juízo, e julgadas depois da
audiência dos interessados, recolhendo o tutor imediatamente a estabelecimento
bancário oficial os saldos, ou adquirindo bens imóveis, ou títulos, obrigações ou
letras, na forma do § 1º do art. 1.753.”
Note que também quando do termo final da tutela será necessária uma última
prestação das contas gerais, qualquer que seja o motivo do fim da tutela.
1.7. Competência
“Art. 1.773. A sentença que declara a interdição produz efeitos desde logo, embora
sujeita a recurso.”
Esta posição, majoritária, não é a única, porém. Isto porque há casos em que a
enfermidade mental ensejadora da incapacidade não estão evidentes, tomando-se de
exemplo o inciso I do artigo 1.767 do CC: a falta de discernimento nem sempre está
evidente. Por conta disso, não se pode reputar que esta pessoa tenha sido desde sempre
incapaz, sob pena de se agredir a confiança depositada pela sociedade, que não podia
perceber sua incapacidade, com ele celebrando tratos. Neste sentido, a sentença de
interdição seria constitutiva, passando a dar segurança social sobre o estado daquela pessoa
– é uma sentença que altera a situação jurídica do interditado, e por isso é constitutiva. O
CPC suporta esta tese, no artigo 1.184:
“Art. 1.184. A sentença de interdição produz efeito desde logo, embora sujeita a
apelação. Será inscrita no Registro de Pessoas Naturais e publicada pela imprensa
local e pelo órgão oficial por três vezes, com intervalo de 10 (dez) dias, constando
do edital os nomes do interdito e do curador, a causa da interdição e os limites da
curatela.”
Para a pessoa necessitar da curatela, ela deve estar em uma das situações do artigo
1.767, supra, e é preciso que seja maior de idade, como diz a doutrina clássica civilista.
Para os menores, a incapacidade é legal, e já há suprimento desta pelos pais ou pelo tutor,
não sendo caso de curatela – menor não precisa de interdição, eis que já está protegido pelo
poder familiar ou pelo tutor.
Esta falta de interesse na interdição é incontroversa no que diz respeito ao menor
absolutamente incapaz. Ocorre que o menor relativamente incapaz não tem o mesmo nível
de proteção que tem o absolutamente incapaz, porque a assistência não é tão acobertante
quanto a representação. Sendo assim, uma segunda parcela da doutrina afirma que a partir
da completitude de dezesseis anos, aquele menor que está inserido numa das situações do
artigo 1.767 do CC precisa, sim, ser interditado, porque a absoluta incapacidade que deve
ser-lhe reconhecida só pode vir por meio desta sentença, eis que não vem da conformação
natural dos fatos, porque a idade não mais lhe empresta tal característica.
Assim, de forma unânime, o menor absolutamente incapaz, até dezesseis anos,
mesmo que diante de uma das situações do artigo 1.767 do CC, não precisa ser interditado.
Já o menor relativamente incapaz, se estiver sob uma das circunstâncias que demandem
curatela, para os processualistas deve ser interditado – mas para os civilistas não há esta
diferenciação.
O menor emancipado, maior que é para efeitos legais, não mais está sob poder
familiar. Sendo assim, se se amoldar a uma das circunstâncias do artigo 1.767 do CC, será
alvo de interdição, e jamais tutela.
Ainda que se diga que a sentença de interdição é declaratória, ela tem um efeito
claramente constitutivo: é a partir dela que nasce a figura do curador, situação que inexiste
até então. É na sentença que se nomeia o curador.
São legitimados para pedir interdição aqueles arrolados no artigo 1.768 do CC:
II - se não existir ou não promover a interdição alguma das pessoas designadas nos
incisos I e II do artigo antecedente;
III - se, existindo, forem incapazes as pessoas mencionadas no inciso antecedente.”
“Art. 1.181. O interditando será citado para, em dia designado, comparecer perante
o juiz, que o examinará, interrogando-o minuciosamente acerca de sua vida,
negócios, bens e do mais que lhe parecer necessário para ajuizar do seu estado
mental, reduzidas a auto as perguntas e respostas.”
“Art. 1.770. Nos casos em que a interdição for promovida pelo Ministério Público,
o juiz nomeará defensor ao suposto incapaz; nos demais casos o Ministério Público
será o defensor.”
“Art. 1.183. Decorrido o prazo a que se refere o artigo antecedente, o juiz nomeará
perito para proceder ao exame do interditando. Apresentado o laudo, o juiz
designará audiência de instrução e julgamento.
Parágrafo único. Decretando a interdição, o juiz nomeará curador ao interdito.”
Este artigo fala de duas classes de curador: o legítimo, previsto em lei, ou o judicial,
ou dativo, eleito pelo juiz quando não houver legítimo presente e hábil. A ordem de escolha
do curador legítimo não é rígida, tal como a ordem da tutela legítima, porque o juiz deverá
primar pela nomeação que seja mais favorável, mais interessante ao curatelado.
Na sentença de interdição, o juiz traçará os limites do exercício da curatela,
traçando os atos que o curador pode ou não pode praticar. Veja o artigo 1.772 do CC:
“Art. 1.772. Pronunciada a interdição das pessoas a que se referem os incisos III e
IV do art. 1.767, o juiz assinará, segundo o estado ou o desenvolvimento mental do
interdito, os limites da curatela, que poderão circunscrever-se às restrições
constantes do art. 1.782.”
“Art. 1.778. A autoridade do curador estende-se à pessoa e aos bens dos filhos do
curatelado, observado o art. 5º.”
O feto nascituro não precisa de curador, por óbvio. Sua representação, para efeito de
proteção a seus direitos futuros, incumbe à mãe, na forma do artigo 1.779 do CC:
Se a mulher grávida for ela própria interditada, o seu curador é também curador do
feto. Se ela estiver fora do poder familiar, o representante é o pai. Não havendo pai, ou
estando ele também sem poder familiar, somente então nomear-se-á curador.
Não corre ação de interdição contra o nascituro, por óbvio.
Trata-se de curador de bens, apenas, e não da pessoa deficiente. Este curador não é
nomeado em ação de interdição, pois o deficiente físico não será interditado. Seguir-se-á o
procedimento geral de jurisdição voluntária.
Casos Concretos
Questão 1
Tendo falecido a mãe, sendo o pai doente, uma de suas filhas, Paula, foi nomeada
curadora provisória de Cintia, jovem de dezesseis anos, portadora de anomalia psíquica.
Estando em curso a ação de interdição, morre o pai, que antes, fizera testamento deixando
toda sua disponível para Cintia, com o objetivo de possibilitar a ela maior conforto e
possibilidade de tratamento, em razão da anomalia. Ocorre que não se conformando em
que a irmã tivesse maior benefício com a herança, impugnou em juízo o testamento.
Analise o pedido, inclusive quanto à possibilidade da interdição de pessoa menor de idade.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Deve ser rejeitado o pedido, pois somente se sujeita a tutoria menor de dezoito anos,
não emancipado, que esteja fora do poder familiar, o que pode ocorrer por falecimento de
ambos os pais; se forem destituídos; ou se forem julgados ausentes. No caso sob análise,
trata-se de pedido único de tutela de criança que encontra-se sob o poder familiar do pai, o
que torna impossível o pedido. Trata-se da mera aplicação dos artigos 1.728, 1.630 e 1.631
do CC, e 21 do ECA.
Questão 3
Resposta à Questão 3
O código civil de 1916 exigia hasta pública no artigo 429, o que muitas vezes era
prejudicial, pois toda hasta pública traz despesas altas pagamento de leiloeiro, etc. Veja o
revogado artigo:
“Art. 429. Os imóveis pertencentes aos menores só podem ser vendidos quando
houver manifesta vantagem, e sempre em hasta pública.”
“Art. 1.750. Os imóveis pertencentes aos menores sob tutela somente podem ser
vendidos quando houver manifesta vantagem, mediante prévia avaliação judicial e
aprovação do juiz.”
“Art. 1.109. O juiz decidirá o pedido no prazo de 10 (dez) dias; não é, porém,
obrigado a observar critério de legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a
solução que reputar mais conveniente ou oportuna.”
Assim, a venda não mais precisa ser feita em juízo, bastando a sua autorização em
juízo – e, in casu, a venda é recomendável.
Tema XVI
Notas de Aula21
1. Bioética e biodireito
A discussão central também passou pelo critério de morte hoje adotado. Isto porque
se a morte for ausência de manifestação cerebral, o anencéfalo jamais teve ou terá esta vida
cerebral, sendo desde sempre considerado morto – e por isso a sua retirada do ventre não
seria aborto, por não haver vida intrauterina, que é o bem jurídico penalmente protegido.
A ADPF não foi ainda julgada. Segue abaixo sua última decisão relevante:
Casos Concretos
Questão 1
Zenaide, casada com Antero, que padece de azoospermia, foi autorizada pelo
marido a inseminar-se com sêmen de doador estranho, através de técnica de reprodução
assistida hetoróloga. Ao nascer a criança, o marido nega a paternidade em razão de não
haver identidade biológica entre ele e a criança. Pode recusar-se a esta paternidade?
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
O autor ajuíza pedido de alteração de registro para que seu nome seja alterado de
Victor para Paloma, afirmando que desde cedo manifesta comportamento
predominantemente afeito ao genótipo feminino. Afirma que foi submetido à cirurgia de
redesignação sexual em agosto de 2002. A sentença julgou procedente o pedido para que
seja procedida a retificação pretendida no assento de nascimento do requerente,
determinando que seu nome seja alterado, bem como para que o sexo seja alterado de
masculino para feminino, vedando por ocasião do fornecimento de certidões, referência à
sua situação anterior. O expediente deverá ser arquivado em segredo de justiça.
Informação ou certidão não poderá ser dada a terceiros, salvo ao próprio interessado ou
no atendimento de requisição judicial. O Ministério Público apelou, alegando, em suma, o
possível prejuízo aos terceiros de boa-fé que venham a se envolver com o recorrido pela
não-publicidade da condição transexual do apelado. Decida a questão
fundamentadamente.
Resposta à Questão 3
Tema XVII
Famílias homoafetivas. Sociedade de fato. União Estável. Adoção. Bens. Legislações estaduais protetivas de
relações homoafetivas (Lei estadual/RJ 285/79 e suas alterações). Resolução Normativa nº 77, 29/01/08 -
Ministério do Trabalho e Emprego (Conselho Nacional de Imigração). Decisões judiciais.
Notas de Aula22
1. Famílias homoafetivas
Como já se pôde ver, as famílias hoje têm sua definição muito mais baseada no
afeto do que em qualquer estruturação clássica. Sendo assim, é possível se cogitar de uma
família formada por pessoas do mesmo sexo em relação de união? E, se o é, como
qualificar esta família, enquadrando-a juridicamente?
Que a união homoafetiva é uma realidade, consubstanciando uma família, não se
questiona. No TJ/RJ, ainda há jurisprudência vacilante, mas a jurisprudência do STJ já é
relativamente pacífica em admitir a existência desta modalidade familiar. É no seu
enquadramento, porém, que se encontram as maiores problemáticas.
Do TJ/RJ, negando ainda a possibilidade de família fundada em união do mesmo
sexo, veja os julgados:
22
Aula ministrada pela professora Elisa Costa Cruz, em 8/3/2010.
Ocorre que esta suposta tipicidade constitucional não persiste, porque a família é
um conceito aberto, e o principal parâmetro para configurá-la, hoje, é a presença de afeto
sólido e com ânimo de continuidade a reunir os membros – a família eudomonista, como se
viu. A Constituição meramente exemplifica famílias possíveis.
Uma vez que seja reconhecida a união homoafetiva como entidade familiar, passa-
se ao próximo passo: como se qualificar esta entidade familiar? É uma entidade autônoma,
uma espécie própria, ou é uma modalidade de união estável?
Neste ponto, a divergência ainda é severa. Há quem defenda que seja união estável,
por realizar interpretação histórica da CRFB: o constituinte não previu esta modalidade não
por um silêncio eloqüente, mas sim por uma mera questão temporal, pois não se podia
prever a evolução social neste sentido. Outra corrente defende que, mesmo sendo entidade
familiar, a união homoafetiva não se configura união estável, pela literalidade do
dispositivo constitucional.
Sendo reconhecida união estável homoafetiva, o regramento desta modalidade se
aplica diretamente. Não sendo reconhecida, ainda assim se aplicam as regras da união
estável à entidade familiar homoafetiva, mas agora por analogia.
Neste regramento da união estável, que, diga-se, é legislação parca, encontra-se por
exemplo a Instrução Normativa do INSS de número 25/2000. Esta IN teve origem numa
ACP movida pelo MPF da Quarta Região, em que se pediu a inserção do companheiro
homoafetivo como dependente previdenciário do consorte. Esta ACP foi julgada
procedente, e em razão dela se editou a IN mencionada: reconhece-se o companheiro para
fins previdenciários, portanto.
No Rio de Janeiro, a Lei Estadual 5.260/08 regula o benefício previdenciário no
âmbito das entidades da administração pública do Estado, e nesta há suporte ao
companheiro homoafetivo. Veja o artigo 14, I, deste diploma estadual:
Esta posição, inclusive, por reputar mera questão obrigacional, sequer reconhece a
competência da vara da família para estas relações – encaminha à vara cível. Veja o Agravo
de Instrumento 2009.002.28923, do TJ/RJ:
Casos Concretos
Questão 1
Dois homens moram juntos há sete anos, dividindo as despesas da casa, como
qualquer casal heterossexual. Ambos são portadores do vírus HIV, o que levou o primeiro
a aposentar-se e pedir a inclusão do companheiro em seu plano de saúde, o que foi negado
pela Caixa Econômica Federal, ao argumento de que a Constituição e as leis brasileiras
vedam o reconhecimento da união estável nesses casos, uma vez que esta só é possível
quando se trata de pessoas de sexos opostos. Se você fosse o juiz da causa, como decidiria
a questão? Justifique.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Caio manteve durante 15 anos relação homoafetiva com Tício. Durante os anos do
enlace amoroso, Caio, hoje com 45 anos, engenheiro formado, jamais trabalhou, pois era
desejo de Tício que aquele desempenhasse as atividades do lar. Hoje, solteiro e
desempregado, ingressa com ação de reconhecimento e dissolução de união estável
homossexual combinada com pedido de alimentos em face de Tício, na qual sustenta a
existência de união estável homoafetiva com fulcro no artigo 226, §3º, da CRFB c/c artigos
1723 e ss. do Código Civil. Tício, por sua vez, apresenta defesa, na qual não nega os fatos,
mas afirma ser o pedido juridicamente impossível, e sem provar, sustenta que mesmo
reconhecida a união estável, o término da relação amorosa se deu por motivo de traição de
Caio com Mévio, fato que, por si só, afasta o suposto direito a alimentos. Decida a questão
fundamentadamente.
Resposta à Questão 3