Tema I
Serviços Públicos I. Conceito. Características. Classificação. Titularidade: serviços da União, dos Estados e
dos Municípios. Serviços comuns e serviços privativos. Regulamentação. Princípios.
Notas de Aula1
1. Serviços públicos
1
Aula ministrada pelo professor Cláudio Brandão de Oliveira, em 8/10/2009.
José dos Santos Carvalho Filho entende que se o serviço for compulsório, não será
permitida a suspensão porque os serviços são prestados pelo Estado investido de seu ius
imperii, sendo inerente a sua soberania, de forma que não podem ser transferidos ao
particular, pois o pagamento por esses serviços visa apenas a cobrir os custos da execução,
daí porque remunerados por taxa, como por exemplo a taxa de incêndio e a taxa judiciária.
Segundo o doutrinador, isso se dá não somente porque o Estado impôs tal serviço como
obrigatório, mas também porque, sendo remunerado por taxa, tem a Fazenda mecanismos
privilegiados para a cobrança da dívida.
Já no que tange ao serviço de caráter facultativo, ele entende que o Poder Público
pode suspender a prestação no caso de não pagamento, porque a remuneração tem natureza
contratual, e os serviços que possibilitam a obtenção de lucros podem ser delegados aos
particulares, como é o caso das concessionárias de serviços públicos de energia elétrica, de
telefone, de transporte. Ressalta o doutrinador que quando é o próprio Estado que os
executa, sem haver delegação, ele despe-se de sua potestade, atuando como particular, o
que guarda a coerência com a facultatividade em sua obtenção pelo particular.
Surgiu controvérsia, já ultrapassada, sobre a possibilidade ou não de interrupção da
prestação de serviço de energia elétrica, ao argumento de que este serviço era essencial.
Contudo, essencialidade ou não são critérios que não se confundem com obrigatoriedade ou
não do serviço: pode este ser essencial, e ao mesmo tempo ser facultativo, não obrigatório.
É exatamente o caso da energia elétrica: não é forçoso ao administrado haver a ligação da
rede elétrica em sua casa, pois é-lhe facultado simplesmente não querer este serviço
(porque se vale de fontes alternativas, ou simplesmente por não querer). Por isso, nada
impede que, em prol do interesse público, este serviço essencial seja interrompido por
inadimplemento do usuário individualizado.
Outro princípio desta seara é o da modicidade das tarifas: o preço que remunera a
prestação de serviços públicos deve ser fixado de forma a não inviabilizar o acesso do
usuário em potencial àquele serviço. É de acordo com o usuário alvo do serviço que a tarifa
será considerada módica ou não. Como exemplo, o serviço de metrô: é prestado por
empresa concessionária, sendo que a concessão somente foi outorgada para gerenciamento
do sistema, e não para realização de obras de expansão da via. Quem custeia a ampliação
das linhas é o Poder Público concedente, justamente porque a obra é tão dispendiosa que se
for realizada pelo concessionário, com repasse do custo à tarifa, esta ficará inacessível aos
potenciais usuários deste meio de transporte2.
Sérgio de Andréa Ferreira entende que esse princípio traduz a noção de que o lucro,
meta da atividade econômica capitalista, não é objetivo da função administrativa, devendo
o eventual resultado econômico positivo decorrer da boa gestão dos serviços, sendo certo
que alguns deles, por seu turno, têm de ser, por fatores diversos, essencialmente deficitários
ou, até mesmo, gratuitos.
Vige também o princípio da segurança: o prestador do serviço deverá adotar as
providências necessárias para não colocar em risco o usuário, até mesmo porque sua
responsabilidade é objetiva.
O prestador de serviços deve observar também o princípio da cortesia: os usuários
devem ser atendidos com urbanidade e educação. Por mais simples que seja, este princípio
está positivado, no § 1° do artigo 6° da Lei 8.987/95, supra.
Outro princípio dos serviços públicos é a regularidade: o serviço deve ser prestado
de forma a atender a demanda dos usuários com presteza, sem falhas na prestação – o que
foi violado, por exemplo, na crise aérea. A regularidade está relacionada à freqüência e
confiabilidade do serviço.
José dos Santos Carvalho Filho ainda elenca como princípio norteador do serviço
público a eficiência, que tem por base o dever de o Estado prestar seus serviços com maior
eficiência possível, reclamando que o Poder Público se atualize com os novos processos
tecnológicos, de modo que a execução seja mais proveitosa com menor dispêndio.
Diógenes Gasparini entende que o fator importante para a Administração reside na
necessidade de, periodicamente, ser feita avaliação sobre o proveito do serviço prestado.
Desse modo, poderá ser ampliada a prestação de certos serviços e reduzida em outros casos,
procedendo-se à adequação entre o serviço e a demanda social.
2
Em apreço à modicidade, a parceria público-privada patrocinada permite justamente que haja a repartição
do custeio do empreendimento entre parceiro público, contratualmente, e o usuário, por meio da tarifa. Será
tópico de estudo apartado adiante.
1.2. Titularidade
“Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios:
I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e
conservar o patrimônio público;
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas
portadoras de deficiência;
III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e
cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de
outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;
VIII - fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar;
IX - promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições
habitacionais e de saneamento básico;
X - combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a
integração social dos setores desfavorecidos;
XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e
exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios;
XII - estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito.
Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a
União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio
do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 53, de 2006)”
No desempenho de tais competências, é preciso que a lei venha delimitar qual será o
alcance de cada ente. Como exemplo, a educação é prestada, pela municipalidade, de forma
a priorizar o ensino fundamental; pelo Estado, de forma a priorizar o ensino médio; e pela
União, o ensino superior. Mas todos são responsáveis comuns por estes serviços.
O artigo 25, § 3°, da CRFB, previu a criação de regiões metropolitanas,
aglomerações urbanas e microrregiões, a fim de disciplinar a gestão de matérias de
interesse comum dos entes ali compreendidos:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
O Estado não pode impor ao Município a observância de lei estadual que verse
sobre a prestação de serviço municipal. É clara ofensa à distribuição de competências. A lei
é inconstitucional por ofender a repartição de competências.
Questão 3
Resposta à Questão 3
a) Os Estados não podem interferir na esfera das relações estabelecidas entre poder
concedente diverso e as concessionárias, violando a regra de competência, portanto.
b) Como dito, não é dado a este ente tratar daquela relação contratual de que não faz
parte.
c) A infração é clara: não é possível esta ingerência do Estado, eis que provocaria
desequilíbrio econômico-financeiro em contrato alheio a sua competência.
Questão 4
Resposta à Questão 4
Tema II
Serviços Públicos II. Execução Direta e Indireta: descentralização, delegação legal, delegação negocial,
privatização, gestão associada, parcerias, convênios administrativos e outras formas. Direitos dos usuários.
Aplicação do Código do Consumidor.
Notas de Aula3
A prestação pode ser direta ou indireta. É direta a prestação do serviço que é feita
por um dos entes estatais – União, Estados, Distrito Federal ou Municípios –, através de
seus órgãos ou agentes. Há serviços que somente desta maneira podem ser prestados:
segurança pública, segurança externa, e serviços judiciais, são exemplos desta qualidade.
Note que a obrigatoriedade de que a prestação destes serviços seja de forma direta é
muito mais calcada na tradição do que em normas. Por vezes, há exigência constitucional
ou legal de prestação direta pelos entes de determinados serviços, mas a grande maioria é
assim definida por mera questão histórica. Veja: enquanto no Brasil é impensável a
formação de exército privado para prestação de serviço de segurança externa de forma
indireta, nos Estados Unidos é corriqueira a contratação de tropas mercenárias para missões
externas, como se viu no Iraque. É questão de costume pátrio. No Brasil, até a CRFB de
1988, havia, por exemplo, cartórios judiciais privatizados.
A prestação indireta, por sua vez, pode ser feita mediante outorga ou delegação. A
outorga, também chamada delegação legal, consiste na prestação feita por meio de pessoas
jurídicas criadas e controladas pelo Estado com esta finalidade. Autarquias, empresas
públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas – a administração pública
indireta – assumem este papel, com o cuidado de se atentar para o fato de que nem todas as
empresas públicas e sociedades de economia mista criadas se prestam à prestação de
serviços públicos, havendo aquelas que se dedicam à exploração de atividade econômica.
A outorga é delegação legal porque a entidade que vai prestar o serviço público é
criada diretamente por lei, como as autarquias; ou tem a sua criação autorizada por lei,
como nas demais. De uma ou de outra forma, há um controle legislativo prévio da criação
destas entidades para a entrega do serviço público.
A delegação stricto sensu, diversa da delegação legal, pode se dar por meio de ato
administrativo ou por contrato administrativo. Nesta, o Poder Público simplesmente
entrega a particulares a prestação do serviço público. O ato administrativo para atribuição
de serviço público a particulares está em desuso, pois concentrar-se-ia mormente na
autorização, que é ato altamente precário, pelo que não há interesse de particulares em
realizar investimentos para explorar serviços quaisquer, se o vínculo pode ser desfeito a
qualquer tempo pela administração.
Exemplo de autorização de serviço público que ainda persiste é o serviço de táxis,
municipal, definido em cada Município. A questão que se levanta é que esta autorização de
táxis, na verdade, não é tão precária assim, porque é tolerado pela administração que o
particular autorizatário negocie com terceiros a sua “autonomia”, como é chamado o ato
administrativo de delegação do serviço, o que gera uma certa expectativa de solidez no
vínculo.
Outra forma de delegação por ato administrativo sempre foi a permissão de serviço
público. O artigo 40 da Lei 8.987/95, porém, prevê que as permissões de serviço público
3
Aula ministrada pelo professor Cláudio Brandão de Oliveira, em 8/10/2009.
serão firmadas por meio de contrato, ou seja, esta modalidade não mais pode ser chamada
de delegação por ato administrativo – houve verdadeira contratualização da permissão de
serviço público. Veja:
Veja que este tipo de contrato, em tese, é bastante interessante, porque reparte seu
custo por aqueles que efetivamente se utilizam da obra (como os que transitam pela via
pedagiada).
Surge, agora, a parceria público-privada – doravante PPP –, criando mais dois tipos
de concessão: a PPP patrocinada e a PPP administrativa. Na patrocinada, o Poder Público
escolhe o concessionário que prestará o serviço ou a obra pública, e parte da remuneração
por esta prestação será custeada pelo usuário, enquanto parte será custeada pelo próprio
Poder Público. Assim ocorre porque há casos em que a remuneração usual, feita totalmente
pelo usuário, não se demonstra viável, justamente por gerar tarifa acima da módica, ou
mesmo intolerável.
Na PPP administrativa, toda a remuneração do concessionário é paga pelo Poder
Público concedente. Se presta a casos em que a cobrança de tarifa é inviável. Como
exemplo, a concessão da operação de presídios públicos, que já existe em Minas Gerais,
que não permite a tarifação dos presos como meio de remuneração do concessionário.
Na PPP, inclusive, é possível o afastamento de diversas cláusulas exorbitantes,
justamente porque o que as fundamenta – o interesse público – pende para sua ausência,
nestes contratos de concessão: é interesse público que não haja a cláusula exorbitante,
porque do contrário não se conseguirá captar interessados no investimento necessário.
No Brasil, tem-se operado uma migração do sistema de delegação legal, outorga,
para o sistema de delegação contratual. Diversas entidades controladas pelo Estado estão
sendo privatizadas, passando a ser concessionárias do serviço público. Por exemplo, todo o
sistema de telefonia, ou mesmo o de energia elétrica. As funções inquestionavelmente
típicas do Poder Público, porém, como a função regulatória, não podem ser delegadas
contratual ou administrativamente: as agências reguladoras, por exemplo, precisam ser
entidades de direito público, como as autarquias, recebedoras da delegação legal, da
outorga.
2. Desestatização
José do Santos Carvalho Filho leciona que o termo “desestatizar” significa retirar o
Estado de certo setor de atividades, ao passo que “privatizar” indica tornar algo privado,
converter algo em privado. Ressalta o doutrinador que, anteriormente, a Lei 8.031/90 usava
o termo privatização, mas a nova idéia proveniente do vocábulo acabou gerando
interpretação desconforme ao preceito legal, entendendo algumas pessoas que significaria
privatizar as atividades, o que não é verdadeiro, porque as atividades continuam sendo
serviços públicos; a privatização, assim, não seria da atividade ou serviço, mas sim do
executor da atividade ou do serviço.
Segundo o Professor Carvalhinho, a Lei 9.491/97 passou a denominar de
desestatização o que a lei anterior chamava de privatização, de modo que o termo, além de
se tornar compatível com o próprio nome do Programa Nacional de Desestatização, indicou
claramente que o objetivo pretendido era apenas o de afastar o Estado da posição de
executor de certas atividades e serviços, ampliando um pouco mais o conceito anterior.
Acrescenta o referido doutrinador que o objetivo fundamental da desestatização é
reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada
atividades indevidamente exploradas pelo setor público, mostrando que a busca desse
objetivo acarretará, por via de conseqüência, a redução da dívida pública líquida e a
concentração da Administração Pública em atividades nas quais seja fundamental a
presença do Estado em vista das prioridades nacionais.
Poderão submeter-se à desestatização: as empresas, incluídas as instituições
financeiras, controladas direta ou indiretamente pela União; as empresas criadas pelo setor
privado que, por qualquer razão, passaram ao controle da União; os serviços públicos
objeto de concessão, permissão ou autorização; e as instituições financeiras públicas
estaduais que tenham sofrido desapropriação de ações de seu capital social.
São formas pelas quais se processam as desestatizações: alienação de participação
societária, inclusive de controle acionário; abertura de capital; aumento de capital, com o
Estado renunciando aos direitos de subscrição ou cedendo-os, total ou parcialmente;
alienação, arrendamento, locação, comodato ou cessão de bens e instalações; dissolução de
sociedade ou desativação parcial de seus empreendimentos, sendo alienados os seus ativos;
e concessão, permissão ou autorização de serviços públicos.
Assim, hoje restam poucas as empresas estatais que desempenham atividade
econômica, como a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, por razões
históricas e por representarem importantes papeis no fomento de determinadas áreas de
interesse. Também grande parte das empresas estatais prestadoras de serviço público foi
alienada, privatizada, como as empresas de telefonia e energia elétrica.
A desestatização também se manifesta na alienação de bens públicos, de patrimônio
público desafetado. Os bens imóveis que não estejam afetados ao interesse público não
precisam permanecer no patrimônio público, inchando o Estado desnecessariamente:
devem ser alienados. O mesmo se dá com ações e quotas de entidades privadas, que em
nada interessem ao Estado.
Existem mecanismos de parceria entre o Estado e a sociedade para a prestação de
serviços por esta, diretamente. Como exemplo, a celebração de convênios, para que
associações privadas desempenhem determinadas atividades por si mesmas, contando com
o fomento estatal, por meio de incentivos diversos – é o fomento ao terceiro setor, que será
abordado amiúde adiante.
Recentemente, um novo instrumento de gestão surgiu com a Lei 11.107/05: o
consórcio público. Trata-se de um instrumento pelo qual os entes estatais, em conjunto,
criam uma pessoa jurídica de direito público ou privado, com a finalidade de exercer
determinada atividade de interesse comum a estes entes consorciados. Este tema também
terá estudo dedicado adiante.
3. Relação de consumo
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime
de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços
públicos.
Parágrafo único. A lei disporá sobre:
I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o
caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de
caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;
II - os direitos dos usuários;
III - política tarifária;
IV - a obrigação de manter serviço adequado.”
A Lei 8.987/95 trata genericamente desta questão, nos artigos 7° e 7°-A, mas a
CRFB exige lei específica para disciplinar a matéria, como visto no artigo 175, supra.
“Art. 7º. Sem prejuízo do disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, são
direitos e obrigações dos usuários:
I - receber serviço adequado;
II - receber do poder concedente e da concessionária informações para a defesa de
interesses individuais ou coletivos;
III - obter e utilizar o serviço, com liberdade de escolha entre vários prestadores de
serviços, quando for o caso, observadas as normas do poder concedente. (Redação
dada pela Lei nº 9.648, de 1998)
IV - levar ao conhecimento do poder público e da concessionária as irregularidades
de que tenham conhecimento, referentes ao serviço prestado;
V - comunicar às autoridades competentes os atos ilícitos praticados pela
concessionária na prestação do serviço;
VI - contribuir para a permanência das boas condições dos bens públicos através
dos quais lhes são prestados os serviços.”
Casos Concretos
Questão 1
c) diferenças fundamentais; e,
d) emitindo exemplos típicos.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
d) Não: a interrupção não deve ser feita enquanto não se decidir a questão em
definitivo, eis que é serviço essencial cuja carência é altamente prejudicial.
Importa destacar decisão recente da Corte Especial do STJ referente ao tema, sendo
que a pessoa inadimplente foi um Município. Discutiu-se a impossibilidade de interrupção
da prestação dos serviços de água e esgoto para o Município inadimplente, sob o argumento
de que traria sérios prejuízos à sociedade como um todo. No entanto, o STJ entendeu ser
plenamente possível a interrupção desses serviços em casa de inadimplência do ente
federativo:
“Informativo nº 378
Período: 24 a 28 de novembro de 2008. Corte Especial
INTERRUPÇÃO. ÁGUA. MUNICÍPIO. INADIMPLÊNCIA.
Por dívida de quatorze milhões de reais com a companhia concessionária de água e
esgoto, o município teve interrompido o fornecimento desses serviços em órgãos
administrativos, inclusive a própria prefeitura. O município impetrou mandado de
segurança com pedido de concessão de liminar e o juiz a deferiu, determinando o
imediato restabelecimento dos serviços. A companhia, então, formulou pedido de
suspensão de liminar perante a presidência do TJ, que a deferiu. Daí a presente
suspensão de segurança formulada pelo município nos termos do art. 4º da Lei n.
8.437/1992, art. 25 da Lei n. 8.038/1990 e art. 271 do RISTJ, a qual foi concedida,
tendo a companhia agravado dessa decisão. A Corte Especial, por maioria, deu
provimento ao agravo regimental para restabelecer os efeitos da decisão proferida
pelo Presidente do TJ. Destacou-se que, no caso, o corte desses serviços deverá
atingir os responsáveis pelo inadimplemento com a concessionária de serviço
público e, ainda, que não faria sentido admitir-se o fornecimento gratuito mesmo a
um órgão público, porque ele também tem de cumprir suas obrigações. Ressalvou-
se que se abre exceção apenas para a interrupção de fornecimento de água nos
casos dos hospitais e das escolas públicas (atividades essenciais), a qual necessita
de procedimentos como prévia notificação. AgRg na SS 1.764-PB, Rel. originário
Min. Barros Monteiro, Rel. para acórdão Min. Ari Pargendler, julgado em
27/11/2008.”
Tema III
Notas de Aula4
4
Aula ministrada pelo professor Sérgio Luiz Ribeiro de Souza, em 9/10/2009.
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime
de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços
públicos.
Parágrafo único. A lei disporá sobre:
I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o
caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de
caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;
5
É por ocorrer a transferência da titularidade que a Administração não pode encampar o serviço público
outorgado a entidades da administração pública indireta: a encampação é a retomada, pelo titular do serviço,
da sua execução, das mãos daquele que somente detinha esta prestação efetiva. Havendo entrega da
titularidade ao prestador indireto, não pode haver encampação. Poderá, é claro, haver a extinção da pessoa
jurídica da administração indireta, por meio de lei, o que acarretará o retorno da titularidade ao Poder Público,
e com isso a execução daquele serviço – mas não se trata de encampação, tecnicamente.
“Art. 3°-A Além das competências previstas nos incisos IV, VIII e IX do art. 29
da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, aplicáveis aos serviços de energia
elétrica, compete ao Poder Concedente: (Incluído pela Lei nº 10.848, de 2004)
(...)
§ 3° A celebração de contratos e a expedição de atos autorizativos de que trata o
inciso II do caput deste artigo poderão ser delegadas à ANEEL. (Incluído pela Lei
nº 10.848, de 2004)
(...)”
Veja que o dispositivo fala em “proposta de entidade estatal”, o que faz concluir que
estas entidades podem concorrer em licitações para concessões. Assim, a entidade estatal da
administração pública indireta pode ser concessionária de serviço público, de fato, mas não
de forma irrestrita, como o próprio dispositivo diz: a entidade não pode pertencer à esfera
político-administrativa do poder concedente, por óbvio, porque se um determinado ente
pretender realizar uma atividade qualquer que possa ser prestada por uma entidade de seu
quadro administrativo indireto, não precisará licitar, conceder o serviço: a sua própria
estrutura realizará a atividade, bastando um convênio, um contrato de gestão, dentre outros
mecanismos. Por isso, a única lógica é que a entidade estatal concorra em licitações para
concessões de outros entes administrativos.
Repare que há, além deste destacamento necessário e lógico entre a entidade estatal
e o poder concedente, mais um limitador essencial para que a entidade da administração
indireta seja concessionária do serviço público: o artigo 173 da CRFB determina que a
entidade administrativa indireta só pode ser criada por haver relevante interesse público ou
imperativo de segurança nacional, o que permite concluir que a empresa estatal não tem
objeto social livre, mesmo quando criadas para desempenhar atividade econômica. O
desempenho desta atividade depende da presença destas condicionantes, e por isso não é
qualquer atividade em que se poderá imiscuir a estatal, por simples interesse em perseguir
lucro.
Destarte, poderá uma empresa pública do Rio de Janeiro, por exemplo, concorrer a
uma concessão de serviço público em São Paulo, desde que esteja afeita ao interesse que
fez surgir tal estatal. Para a estatal poder ser concessionária do serviço público, o objeto da
licitação deve ser atinente à atividade para que foi criada tal estatal, e terá que ser cumprido
na área de atuação desta estatal. Noutro exemplo, se a União pretender conceder um serviço
público a ser prestado no Município do Rio de Janeiro, pode uma empresa pública deste
Município, que tenha sido criada para aquela atividade que estará sendo licitada,
candidatar-se à prestação do serviço. O mesmo se repete na esfera inferior, ou seja, pode a
estatal municipal participar da licitação promovida pelo seu respectivo Estado-Membro, ou
o Estado participar da licitação para concessão feita pela União.
O inverso, porém, não procede. A União não poderá ser concessionária de serviços
licitados por Estados e Municípios, porque sua atuação nacional lhe emprestaria vantagens
desmedidas, e há instrumentos outros, como os convênios e consórcios, para atuar nestas
esferas. O mesmo raciocínio se repete no degrau abaixo da escala federativa, não podendo o
Estado participar de licitações para concessões feitas por Municípios de seu território.
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime
de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços
públicos.
(...)”
Outra pergunta que se faz pertinente é: pode quem não participou da licitação ser
concessionário daquele serviço público?
A resposta é positiva: pode ser criada uma sociedade de propósito específico, se
assim o exigir o edital, e quem terá participado da licitação não é esta sociedade, que será
criada após o procedimento, mas sim as pessoas que integrarão o quadro societário de tal
sociedade. A Lei 8.987/95 fala que o edital pode exigir esta criação, no artigo 20, enquanto
a Lei 11.079/04 faz obrigatória tal dinâmica nas concessões em PPP. Veja os artigos 9° da
Lei da PPP e 20da Lei 8.987/95:
1.1.1. Subcontratação
1.1.2. Subconcessão
1.1.3. Transferência
transferência da concessão inteira, não fez esta exigência. É de fato uma dinâmica bastante
estranha.
Críticas à parte, trata-se, formalmente, de uma hipótese em que alguém que não teve
qualquer participação no certame se verá na condição de concessionário do serviço público.
Há ali ainda a figura do financiador, que é um terceiro investidor captado pela
concessionária para que esta consiga realizar o objeto social. Esta figura será remunerada
pelo próprio concessionário, e não pelo concedente. Ocorre que se o concessionário furtar-
se ao pagamento do financiador, o § 2° permite que o poder concedente passe a arcar com
este ônus, e o agente financeiro assumirá a concessão, passando a figurar como
concessionário, nesta “transferência forçada”, por assim dizer, quando então se dispensa,
inclusive, o requisito técnico, como se vê no artigo supra. É uma situação absolutamente
criticada pela doutrina.
“Art. 9° A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta
vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no
edital e no contrato.
§ 1° A tarifa não será subordinada à legislação específica anterior e somente nos
casos expressamente previstos em lei, sua cobrança poderá ser condicionada à
existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário. (Redação dada
pela Lei nº 9.648, de 1998)
§ 2° Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de
manter-se o equilíbrio econômico-financeiro.
§ 3° Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de
quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando
comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos,
conforme o caso.
§ 4° Em havendo alteração unilateral do contrato que afete o seu inicial equilíbrio
econômico-financeiro, o poder concedente deverá restabelecê-lo,
concomitantemente à alteração.”
A modicidade significa que a tarifa deverá ser fixada de forma que não seja tão
baixa que impeça a prestação satisfatória do serviço, nem tão alta que impeça o acesso do
potencial usuário a este serviço.
Para chegar a esta equação, o principal elemento do contrato de concessão é o
prazo, que será modulado de acordo com a necessidade de diluição da tarifa. Pela
relevância, veremos a questão dos prazos de concessão de forma apartada.
Vale deixar claro que a questão da cobrança de tarifa mínima pelo serviço já
encontra uma certa pacificação na jurisprudência, tendo o STJ encontrado-a perfeitamente
válida, porque é preço pago pela manutenção dos sistemas necessários à prestação dos
serviços. Resta discutível, somente, o quantum desta tarifação mínima, que precisa ser
correspondente à realidade da necessidade para a manutenção do sistema.
Há ainda que se tratar do instituto da tarifa social, que é uma tarifa especial
subsidiada pela coletividade, em prol de parcelas da população que não poderia arcar com o
preço ordinário a ser pago pelo serviço. A coletividade paga a tarifa “cheia”, por assim
dizer, que engloba em si algum valor responsável pelo suprimento da defasagem criada
pelo pagamento de tarifa reduzida por parte carente da população.
Vige, na tarifação, a necessária atenção ao equilíbrio econômico-financeiro do
contrato, pelo que o poder concedente pode intervir no valor da tarifa, aumentando-o ou
reduzindo-o quando a este equilíbrio for perturbado.
O prazo da concessão jamais poderá ser indeterminado, pela simples razão de que
nenhum contrato administrativo será pactuado com prazo indeterminado. O problema,
porém, é delimitar qual será o prazo máximo ou mínimo das concessões, ante a lacuna legal
sobre este elemento. Na PPP, a Lei 11.079/04 é expressa: o contrato será de cinco a trinta e
cinco anos, como dispõe no seu artigo 5°, I:
A Lei 8.987/95 não trata do prazo das concessões, como dito. Sabe-se que esta lei é
especial em relação à Lei 8.666/93, que se aplica subsidiariamente quando o diploma
especial for omisso e não houver conflito. Todavia, se se buscar a aplicação supletiva da Lei
8.666/93 neste assunto, se encontrará o artigo 57, II e § 4°, deste diploma, que dispõe que:
“Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência
dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:
(...)
II - à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter
a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção
de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta
meses; (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)
(...)
§ 4° Em caráter excepcional, devidamente justificado e mediante autorização da
autoridade superior, o prazo de que trata o inciso II do caput deste artigo poderá ser
prorrogado por até doze meses. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)”
Destarte, desde que haja notícia prévia ao usuário, a suspensão é possível, não
consistindo em quebra da continuidade do serviço, tanto pela inadimplência do consumidor
quanto pela necessidade técnica ou de segurança. Qualquer outra causa é violação ao
princípio da continuidade, e violação ao contrato de concessão.
A defesa daquele que tem o serviço suspenso calcada na essencialidade deste não
prospera, hoje. Não é porque é essencial que será vedada sua suspensão, porque se entende
que o interesse da coletividade é superior. Contudo, há que se levantar uma defesa do
consumidor inadimplente, em prol da não suspensão do serviço, mesmo que o dispositivo
supra possa parecer incontestável. Parte-se do artigo 22, caput, fine, do CDC:
I - prestar serviço adequado, na forma prevista nesta Lei, nas normas técnicas
aplicáveis e no contrato;
II - manter em dia o inventário e o registro dos bens vinculados à concessão;
III - prestar contas da gestão do serviço ao poder concedente e aos usuários, nos
termos definidos no contrato;
IV - cumprir e fazer cumprir as normas do serviço e as cláusulas contratuais da
concessão;
V - permitir aos encarregados da fiscalização livre acesso, em qualquer época, às
obras, aos equipamentos e às instalações integrantes do serviço, bem como a seus
registros contábeis;
VI - promover as desapropriações e constituir servidões autorizadas pelo poder
concedente, conforme previsto no edital e no contrato;
VII - zelar pela integridade dos bens vinculados à prestação do serviço, bem como
segurá-los adequadamente; e
VIII - captar, aplicar e gerir os recursos financeiros necessários à prestação do
serviço.
Parágrafo único. As contratações, inclusive de mão-de-obra, feitas pela
concessionária serão regidas pelas disposições de direito privado e pela legislação
trabalhista, não se estabelecendo qualquer relação entre os terceiros contratados
pela concessionária e o poder concedente.”
“Art. 32. O poder concedente poderá intervir na concessão, com o fim de assegurar
a adequação na prestação do serviço, bem como o fiel cumprimento das normas
contratuais, regulamentares e legais pertinentes.
Parágrafo único. A intervenção far-se-á por decreto do poder concedente, que
conterá a designação do interventor, o prazo da intervenção e os objetivos e limites
da medida.”
1.7.1. Encampação
1.7.2. Caducidade
1.7.3. Rescisão
inadimplemento contratual da administração na Lei 8.666/93 (em que há prazo fixo), aqui
há uma vantagem para o concessionário prejudicado: ao menos, quem o remunera é o
usuário, pelo que seu prejuízo certamente é menor do que o contratado na Lei 8.666/93,
remunerado pela Administração inadimplente.
II – respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes
privados incumbidos da sua execução;
III – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do
poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado;
IV – responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias;
V – transparência dos procedimentos e das decisões;
VI – repartição objetiva de riscos entre as partes;
VII – sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de
parceria.”
O inciso III, supra, traz um forte argumento para a corrente administrativista que
defende a indelegabilidade do poder de polícia, pois se trata de uma hipótese de vedação
legal a esta delegação, sem fazer qualquer ressalva quanto às fases do poder de polícia,
como o faz parte da doutrina (que entende delegável a fiscalização).
A Lei da PPP traz garantias aos parceiros privados, que são um dos principais
aspectos desta concessão especial. Veja o artigo 8º desta Lei:
O fato é que a PPP ainda não teve muita aceitação na praxe das relações entre o
Estado e a iniciativa privada, por um motivo pragmático: as garantias não são consideradas
suficientes pelos investidores. Nem mesmo a vinculação orçamentária, que faz dedicar
rubrica no orçamento do ente concedente o valor a ser pago ao parceiro privado, é
considerada segura o suficiente. Entenda: o orçamento é anual, seguindo a lei orçamentária
anual; mais que isso, somente o plano plurianual. Sendo assim, a garantia referente à
vinculação orçamentária não terá, com certeza, duração maior do que a do plano plurianual,
de quatro anos – pois o próximo administrador eleito pode não computar tal garantia no seu
próprio orçamento –, enquanto que a menor PPP possível é de cinco anos. Simplesmente
não há garantia de vinculação orçamentária por todo o contrato.
A PPP pode envolver quatro figuras, sendo no mínimo três: o concedente; a pessoa
jurídica ou consórcio de empresas que vence a licitação; a sociedade de propósito
específico que será obrigatoriamente criada para pactuar o contrato de concessão; e o
eventual financiador.
O financiador, como já se adiantou, é a instituição financeira captada no mercado
para custear investimentos do objeto da PPP, e é remunerado pelo concessionário – o poder
concedente paga o que for contratado ao concessionário, e este administra, pagando com o
montante global tudo aquilo que for necessário à consecução do objeto, inclusive a
amortização do investimento que captou junto ao financiador. Como se viu, se o
concessionário porventura inadimplir sua obrigação perante o financiador, o poder
concedente poderá assumir tal encargo, repassando o que deveria pagar ao concessionário
diretamente ao financiador, e, se mesmo assim o contrato não estiver sendo cumprido pelo
concessionário, passar a concessão à instituição financeira, que assumirá o objeto do
contrato (dispensada do requisito técnico, que decerto não preencheria). Veja o artigo 5°, §
2°, I, da Lei da PPP:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
O entendimento que prevalece é que a tarifa mínima pode ser cobrada mesmo de
quem não esteja se utilizando efetivamente do serviço, por conta da necessária manutenção
da estrutura, ou de sua expansão, prevista no contrato de concessão. Há, porém, correntes
contrárias, que defendem que não pode haver o custeio da expansão pela tarifa, pois este
investimento deveria ser custeado pelo próprio concessionário.
Veja o REsp. 690.609:
ocorrência de mais de cinco anos do início da data em que o referido tributo podia
ser exigido.
8. Recurso especial provido para reconhecer prescrita a exigibilidade tributária dos
valores referentes aos períodos anteriores a 01/08/1996, nos termos fixados pelo
artigo 177 do Código Tributário Nacional. Ônus sucumbenciais na forma como
fixados na sentença.”
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema IV
Permissão de Serviços Públicos. Conceito, natureza, referências constitucionais. Aplicação de regras das
concessões. Extinção. Serviços públicos autorizados e delegados.
Notas de Aula7
7
Aula ministrada pelo professor Sérgio Luiz Ribeiro de Souza, em 9/10/2009.
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime
de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços
públicos.
(...)”
Este dispositivo fez exigida a licitação também para a permissão de serviço público.
A doutrina, em primeiro momento, defendeu que continuava, a permissão de serviço, sendo
um ato administrativo, mas excepcionalmente precedido de licitação.
Contudo, a Lei 8.987/95 sobreveio e, no seu artigo 40, pôs fim à discussão:
O que este artigo supra fez foi contratualizar a permissão de serviço público. Hoje,
portanto, esta é a natureza da permissão de serviço público: contrato administrativo,
precedido da devida licitação.
Com isso, uma tarefa que era simples se demonstra, agora, intrincada: como
diferenciar a concessão da permissão de serviço público. O STF, por exemplo, não vê mais
quase nenhuma diferença entre os institutos. Na Lei 8.987/95, há pequena diferença apenas
quanto a quem pode figurar em um ou outro contrato, como concessionário ou
permissionário: na concessão, pode ser concessionária pessoa jurídica ou consórcio de
empresas, mas não pessoa natural; na permissão, pode ser permissionária a pessoa jurídica
ou a pessoa natural, mas não o consórcio de empresas.
Outra pequena diferença que poderia ser apontada, mas é facilmente questionável,
reside na forma do contrato: na permissão, o contrato é de adesão, como expressamente diz
o artigo supra; na concessão, não há menção expressa. Mas perceba que, em verdade, toda
concessão será também um contrato de adesão, dada a alta vinculação do edital à minuta do
contrato, que constará do edital, vinculando praticamente todo o contrato administrativo de
concessão, à exceção de pequena área flexível dedicada à proposta vencedora – que pode
ser apenas o preço. É essencialmente contrato de adesão.
Outra diferença apontada é quanto à estabilidade do contrato: o de permissão é
considerado precário, enquanto o de concessão é estável. Ora, a concessão pode ser extinta
por razões de interesse público, como se passa quando há a encampação, o que demonstra
também certa precariedade.
Aponta-se ainda, como peculiaridade da permissão, a sua revogabilidade unilateral
por parte da Administração, tal como se revoga um ato administrativo discricionário. A
maioria absoluta da doutrina, porém, diz que esta revogação não é possível, podendo,
outrossim, haver a extinção do contrato por iniciativa da Administração, nas mesmas
situações em que se extingue o contrato de concessão, pois assim comanda o parágrafo
único do artigo 40 da Lei 8.987/95, supra – tudo que se disse sobre extinção das
concessões8, se aplica nas permissões de serviço.
Como se vê, a linha diferencial, hoje, é muito tênue. Para saber se será procedida
uma concessão ou uma permissão do serviço público, a Administração, na prática, deverá
8
As previsões sobre extinção do contrato de concessão de serviço público se aplicam também às parcerias
público-privadas.
Trata-se da permissão de serviço público que conta com prazo de duração pré-
estabelecido. Esta classificação perdeu um pouco da importância, em se tratando de
permissão de serviço público, ante a sua contratualização, mas tem relevância forte, ainda,
na permissão de uso de bem público.
Isto porque esta permissão de uso, não contratualizada, se trata de ato administrativo
discricionário e precário, firmado sem prazo certo, em regra, pelo que o ato pode ser
revogado a qualquer tempo, bastando que o interesse público recomende esta revogação,
sem que represente nenhuma frustração de expectativas do permissionário, que sempre foi
sabedor da precariedade de seu título – ou seja, não há qualquer indenizabilidade.
Se, então, a permissão de uso de bem público for qualificada, com prazo de duração
fixado, o permissionário já terá uma expectativa legitimamente criada pelo título. Veja que
a permissão qualificada continua sendo precária, ou seja, a revogação continua sendo livre,
mas o permissionário poderá haver indenização, se a revogação antes do tempo fixado
causar-lhe prejuízos. Esta indenização se atém aos danos emergentes, para a maioria da
doutrina, mas Celso Antônio Bandeira de Mello defende, isoladamente, que também os
lucros cessantes são indenizáveis ao permissionário qualificado frustrado9.
Como dito, com a contratualização da permissão de serviço público, sempre haverá
prazo, ou seja, sempre haverá direito à indenização pela extinção induzida pela
Administração, sem culpa do permissionário.
Primeiro questionamento é se existe ou não este instituto. A CRFB diz, no artigo 21,
XI e XII, que este instrumento é vigente:
9
O mesmo raciocínio se reproduz nas autorizações qualificadas.
O problema está na leitura do artigo 175 da CRFB, já transcrito, que não fala da
autorização de serviço público.
Há autores que defendem que a autorização de serviço público pode ser pactuada
sem qualquer óbice, valendo-se do critério que a Administração entender melhor para
eleger este instrumento. De outro lado, há quem entenda que a autorização de serviço
público é sim cabível, mas não livremente, devendo ater-se às hipóteses taxativamente
arroladas no artigo 21, XI e XII, da CRFB, supra. Esta segunda corrente, inclusive,
argumenta que as hipóteses deste artigo 21 da CRFB, na essência, não são delegações de
serviços públicos: são apenas afastamentos de óbices a que tais serviços sejam prestados
por particulares, sendo, na verdade, uma autorização para realização de determinada
atividade, que d’outrarte seria vedada ao particular – raciocínio que faz esta autorização
assemelhar-se a uma autorização para porte de arma, por exemplo.
Há situações da praxe que geram discussões, a exemplo do serviço de táxis: tratar-
se-ia de permissão ou autorização de serviço público? Veja que se for permissão, deveria
ser precedida de licitação, o que se sabe não ocorrer nunca. Se for autorização, é precária,
podendo ser revogada a qualquer tempo – o que também jamais ocorre. É zona nebulosa, de
fato.
A Lei 9.074/95, que trata de concessões e permissões de serviço público, nos artigos
7° e 8° dispõe que:
Casos Concretos
Questão 1
população; a alegada captação de clientela é matéria de fato que não pode ser
comprovada na via mandamental; Decreto Estadual nº 3.893/81 permite a instalação de
linha experimental.
Pugna pela denegação da ordem. O Ministério Público opina nesse sentido.
Decida, fundamentadamente.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
a) É cabível, porque o artigo 40, parágrafo único, da Lei 8.987/95 faz aplicáveis à
permissão as previsões dadas à concessão.
Questão 3
Resposta à Questão 3
Agência Reguladora. Fonte normativa. Natureza jurídica. Função. Regime jurídico dos servidores.
Notas de Aula10
1. Agências reguladoras
A sede normativa maior é a CRFB, por certo, sendo o primeiro grande marco
regulatório a promulgação das Emendas Constitucionais 8 e 9 de 1995, que introduziram,
respectivamente, as redações atuais dos artigos 21, XI, e 177, § 2°, na CRFB:
- Lei 8.854/94 – Cria, com natureza civil, a Agência Espacial Brasileira (AEB).
Para alguns autores, como Marçal Justen Filho, a não previsão das agências
reguladoras na CRFB torna-as inconstitucional. Sendo assim, apenas a Anatel e a ANP são
constitucionais, eis que têm matrizes constitucionais, como visto. É posição minoritária,
mas relevante. Diogo de Figueiredo Moreira Neto, José dos Santos Carvalho Filho e
Marcos Juruena, por seu turno, aceitam tranqüilamente a idéia da regulação com base em
lei, não carecendo de porto constitucional direto, como diz Marçal.
Crítica quase uníssona, porém, sofre a Ancine, eis que o instrumento de criação
desta agência não é sequer lei em sentido formal. A MP 2.228-1 é de difícil justificação,
sendo mesmo desconsiderada a sua validade para alguns autores, como Diogo de
Figueiredo. Para a doutrina maior, esta entidade existe com nomenclatura de agência
reguladora, mas não o seria, tecnicamente, uma agência.
A doutrina majoritária ainda admite que haja exercício de atividade regulatória sem
que haja a alcunha de agência reguladora. Por exemplo, a CVM é reconhecidamente
regulatória do mercado de valores mobiliários, sem ser formalmente uma agência
reguladora (à exceção de Alexandre Aragão). O Cade – Conselho Administrativo de Defesa
Econômica – tem sido apontado como entidade reguladora, mas é mais frágil sua
concepção como tal. Se for unido à SDE – Secretaria de Desenvolvimento Econômico –, aí
então certamente assumirá caráter de agência reguladora.
De uma ou de outra forma, formalmente instituída como agência reguladora ou não,
se a entidade preencher os caracteres notáveis de uma agência, assim o será. As
características serão abordadas logo adiante.
Uma lei é deveras importante no tratamento das questões relativas à estruturação
das agências reguladoras: a Lei 9.986/00. Este diploma trata de normas gerais sobre a
gestão de recursos humanos das agências reguladoras, dentre outras providências. Esta lei
será estudada pontualmente, no que for mais relevante.
Em nível estadual, no Rio de Janeiro, a atividade regulatória é bem mais enxuta.
Hoje, há duas agências reguladoras estaduais, quais sejam, a Agetransp, de transportes em
geral, tratada na Lei Estadual 4.555/05, e a Agenersa, de energia e saneamento básico, vista
na Lei Estadual 4.556/05.
A tendência do modelo regulatório, atualmente, é a redução. Na onda do primeiro
marco regulatório, houve um verdadeiro boom de criação de agências reguladoras, tidas por
solução para a guia de todos os mercados. Ocorre que o custo de tal estrutura é elevado, e
infla o Estado de forma pouco saudável. Assim, a atuação regulatória tem sido vista, hoje,
como necessária apenas em mercados estratégicos, atividades de majorado interesse
público. Aos demais setores, a autoregulação é suficiente.
Para definir a natureza jurídica das agências reguladoras, pode-se partir da leitura do
artigo 8°, § 2°, da Lei 9.472/97 (Anatel):
“Art. 8° Fica criada a Agência Nacional de Telecomunicações, entidade integrante
da Administração Pública Federal indireta, submetida a regime autárquico especial
e vinculada ao Ministério das Comunicações, com a função de órgão regulador das
telecomunicações, com sede no Distrito Federal, podendo estabelecer unidades
regionais.
§ 1º A Agência terá como órgão máximo o Conselho Diretor, devendo contar,
também, com um Conselho Consultivo, uma Procuradoria, uma Corregedoria, uma
Biblioteca e uma Ouvidoria, além das unidades especializadas incumbidas de
diferentes funções.
§ 2º A natureza de autarquia especial conferida à Agência é caracterizada por
independência administrativa, ausência de subordinação hierárquica, mandato fixo
e estabilidade de seus dirigentes e autonomia financeira.”
11
Evita-se o uso da expressão jurisdicional, preferindo-se judicante, porque classicamente se define que
jurisdição é monopólio do Poder Judiciário, e por isso correr-se-ia o risco de atecnia ao se falar em jurisdição
por entidades do Executivo.
Veja que a redação anterior vinculava o tratamento à lei interposta, e a atual parece
dispensar a lei formal. Por isso, a corrente é forte.
Diogo de Figueiredo, ao tratar da agência reguladora, escapa desta discussão sobre
regulamentos autônomos, defendendo que a função legiferante destas agências é fruto de
um processo de deslegalização, ou seja, a lei formal que institui a agência reguladora, no
mesmo momento que cria a entidade, cria também um vácuo legislativo a ser preenchido
por esta agência, a partir de então. Assim, não se tratará de caber ou não regulamentos
autônomos em nosso ordenamento (porque, em verdade, este autor não os admite), eis que
os atos normativos destas agências terão sempre por pressuposto a lei formal que as
instituiu, não sendo essencialmente autônomos.
Este argumento da deslegalização é desnecessário para aqueles que defendem que o
regulamento autônomo é uma realidade possível, como Gustavo Binembojm. Basta se
reconhecer que é cabível este ato normativo autônomo para que a função legiferante da
agência reguladora esteja perfeitamente validada.
Vale dizer que as normas regulamentares editadas pelas agências reguladoras devem
sempre se pautar na já mencionada tecnicidade, discricionariedade técnica, que fundamenta
a atuação destas entidades.
A legitimidade da norma reguladora é outro ponto de discussão, porque não há
eleição popular dos diretores da agência reguladora. Carece, de fato, esta norma, da
legitimidade formal, oriunda do voto. Contudo, há legitimidade substancial, se a norma for
submetida previamente à participação popular em sua formulação, o que se dá por meio de
audiências públicas, consulta a órgãos civis especializados no tema, canais abertos para
ouvidoria da opinião pública, etc. Se assim for ouvida a sociedade, a norma reguladora tem
legitimidade substancial.
A quarentena proíbe a atuação do dirigente, pelo prazo de quatro meses após sua
saída do cargo, em atividades relacionadas à atividade regulada, no setor público ou no
privado. O prazo pode ser maior, como o é na Lei da Anatel, em que é de um ano.
Durante este período, o ex-dirigente será remunerado pela agência que dirigia, eis
que estará limitado em seu atuar profissional.
Marcos Juruena critica com veemência este instituto, por dois motivos: é claramente
ineficaz, porque o fato de se colocar este impedimento na atuação do ex-dirigente não
impede que ele exerça a influência no mercado, que é o que se quer afastar; e a
remuneração é absolutamente dispensável, eis que aquele que assume tal cargo não o faz
pela remuneração, mas por diversos fatores outros, como o prestígio curricular em sua área
profissional que ganha com tal posição.
Nomeados, os dirigentes só perdem o cargo mediante apuração de falta grave em
processo regular, ou se renunciarem ao posto, como dispõe o artigo 9° da Lei 9.986/00:
A Lei 9.986/00, quando editada, previu que os cargos do quadro de apoio seriam
prestados por analistas em regime celetista. Imediatamente, o PT ajuizou a ADI 2.310-1, e
o STF suspendeu a eficácia do artigo 1° desta Lei, continente desta norma, porque os
analistas destas agências são servidores que desempenham a sua função fim, que é função
pública, devendo ser regidos pelo regime estatutário.
Vale mencionar que a lei só pôde criar esta confusão porque a redação do artigo 39
da CRFB, após a EC 19/98, admitiu por um longo período a convivência entre regimes
celetista e estatutário no serviço público típico, sendo que o regime único, estatutário, era
vigente antes da referida emenda, e vige agora, após a declaração de inconstitucionalidade
desta EC 19/98, em partes, desde 2007. Veja o informativo 474 do STF:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Pelo ensejo, vale apontar outra exceção semelhante, que vem no artigo 82, IX, da
Lei 10.233/01 – ANTT e Antaq – que entrega tal competência ao DNIT:
Questão 2
Resposta à Questão 2
A decisão não pode ser proferida em única instância, porque a lei impõe
revisibilidade de tais decisões, em todos os processos administrativos. Como exemplo, o
artigo 57 da Lei 9.784/99, que dita a pluralidade de instâncias administrativas:
“Art. 57. O recurso administrativo tramitará no máximo por três instâncias
administrativas, salvo disposição legal diversa.”
do recurso que foi interposto para suscitar tais vícios ao Governador do Estado: a decisão
da agência reguladora, em última instância administrativa, pode ser alvejada pelo recurso
hierárquico impróprio, ante a independência política destas autarquias especiais?
Há três correntes sobre o tema. Hely Lopes Meirelles defende que o recurso
hierárquico impróprio é possível se a lei o previr expressamente; nesta leitura, não caberia o
recurso em tela, eis que nenhuma lei instituidora de agências reguladoras prevê tal recurso.
Segunda corrente, de Odete Medauar e Marcos Juruena, defende que a revisão pelo
ente político é possível, cabendo este recurso, porque é atributo inerente à tutela
administrativa, controle que a administração direta exerce sobre a indireta e que não se
confunde com controle hierárquico. Vale ressaltar que o controle calcado na tutela
administrativa não é livre, devendo ser acionado apenas quando há abuso de poder ou
desvio de finalidade por parte do dirigente da entidade da administração indireta – é
controle finalístico, somente.
Esta corrente de Odete Medauar, diga-se, é a mesma que adota a AGU, no parecer
vinculante AC 51.
Terceira corrente, de Alexandre Aragão, defende descabido qualquer recurso
hierárquico impróprio, em respeito à independência das entidades indiretas. Somente o
Judiciário pode rever tais decisões.
No Rio de Janeiro, a Lei Estadual 5.427/09, que trata do processo administrativo
estadual deste Estado, permite expressamente o cabimento de recurso hierárquico
impróprio neste âmbito. Veja o artigo 66 desta Lei Estadual:
“Art. 66. Das decisões finais produzidas no âmbito das entidades da administração
indireta caberá recurso administrativo, por motivo de ilegalidade, nas mesmas
condições estabelecidas neste capítulo, para o titular da Secretaria de Estado à qual
se vinculem.
§1º O recorrente deverá demonstrar, em preliminar do recurso, para apreciação
exclusiva do Secretário de Estado, a existência da repercussão geral.
§2º Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de
questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que
ultrapassem os interesses subjetivos do caso específico em exame.
§3º O recurso não será conhecido quando a questão jurídica nele versada não
oferecer repercussão geral, nos termos deste artigo.
§4º A decisão do recurso será precedida de manifestação do órgão de
assessoramento jurídico da Secretaria de Estado.
§5º A decisão do recurso limitar-se-á à declaração da ilegalidade da decisão e, em
sendo o caso, devolverá o processo à entidade de origem para prolação de nova
decisão.”
Questão 3
Respostas fudamentadas.
Resposta à Questão 3
a) O concurso público é a regra para os quadros de apoio, ante o regime estatutário que
os rege, só não sendo exigido para os cargos de dirigentes destas agências.
Questão 4
Resposta à Questão 4
tal recurso. Também no Estado do Rio de Janeiro é cabível, vindo previsto na Lei
Estadual 5.427/09, que regulamenta o processo administrativo nesta esfera.
Tema VI
Atuação do Estado no Domínio Econômico. Estado Regulador, Estado Executor e Estado Monopolista.
Regime jurídico da empresa prestadora de serviços públicos e da empresa que explora atividades
econômicas pelo Estado.
Notas de Aula12
José dos Santos Carvalho Filho aborda, de forma breve, os antecedentes históricos
da atuação do Estado no domínio econômico. Basicamente, duas são as escolas precedentes
à atual conjuntura, a do liberalismo econômico, permissiva da auto-regulamentação dos
mercados, vigente até o final do século XVIII (erigida na doutrina de Adam Smith, A
Riqueza das Nações, de 1776); e a do dirigismo econômico, fenômeno da
12
Aula ministrada pela professora Alexandra da Silva Amaral, em 13/10/2009.
Como se disse, o artigo 173 da CRFB sedia a figura do Estado executor. Já no caput
deste artigo se vê os fundamentos que permitem a criação de novas estatais econômicas,
quais sejam, segurança nacional ou o interesse coletivo, ambos conceitos abertos.
“Art. 64. Para o estrito cumprimento de atividades de seu objeto social que
integrem a indústria do petróleo, fica a PETROBRÁS autorizada a constituir
subsidiárias, as quais poderão associar-se, majoritária ou minoritariamente, a
outras empresas.”
“Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o
auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
(...)
II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens
e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e
Veja que ali, no inciso XI, se fala apenas na administração direta, em autarquias e
fundações, não estando mencionadas as estatais, econômicas ou não. Mas veja que o § 9°
do mesmo artigo, fruto da reforma da EC 19/98, estende esta previsão às estatais que
dependerem de verbas públicas para pagamento de pessoal, as quais recebem nome de
estatais dependentes. Desta forma, se resume a questão: os empregados públicos de estatais
dependentes estão sujeitos, sim, ao teto remuneratório do serviço público.
Os empregados públicos estão sujeitos também à norma de direito público que
impõe vedação à acumulação remunerada de cargos ou empregos públicos, conforme
incisos XVI e XVII do artigo 37 da CRFB:
“(...)
XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando
houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no
inciso XI. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
a) a de dois cargos de professor; (Incluída pela Emenda Constitucional nº 19, de
1998)
b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; (Incluída pela
Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com
profissões regulamentadas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 34, de
2001)
XVII - a proibição de acumular estende-se a empregos e funções e abrange
autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas
subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público;
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
(...)”
É claro que o TCU lê esta súmula de forma diferente, entendendo que tem poder
para exigir que a norma que reputar inconstitucional não seja observada por quem esteja
sob seu espectro de atuação. Por isso, e por ser entidade autônoma e independente, o TCU
manteve sua posição, emitindo multas sempre que se fizesse a licitação simplificada com
base nos diplomas mencionados.
A cada multa, portanto, a Petrobrás impetrava mandado de segurança no STF, sendo
que em todos, até a presente data, foram proferidas liminares favoráveis à estatal, contra o
TCU. Veja um paradigma importante, o MS 25.888:
As liminares, como é cediço, são proferidas em juízo perfunctório, pelo que não se
pode ainda asseverar que a posição da Corte é definitivamente favorável à Petrobrás. Há,
hoje, um recurso extraordinário pendente que é de alto interesse na matéria, pois
provavelmente ali será proferida a decisão definitiva sobre este imbróglio. Trata-se do RE
441.280, cujas discussões constam do informativo 522 do STF:
1.2.2.1. Inalienabilidade
Não é correto dizer que o regime privado dos bens das estatais faz com que estes
sejam livremente alienáveis. O artigo 17 da Lei 8.666/93, que se dirige a toda a
Administração Pública, sem distinção, dispõe no seu caput que:
1.2.2.2. Imprescritibilidade
1.2.2.3. Impenhorabilidade
O STF entendeu que os Correios têm seus bens impenhoráveis por serem afetos à
prestação de serviço público, e mais, disse que esta empresa pública é tão peculiar que sua
natureza se aproxima muito à de uma autarquia, merecendo o mesmo tratamento das
autarquias para a questão tributária ali enfrentada. É preciso ressaltar que esta equiparação a
autarquias é pontualmente feita parta a ECT, não sendo um paradigma geral para qualquer
empresa pública: o STF não criou uma regra geral de equiparação das empresas públicas
prestadoras de serviço público às autarquias, longe disso. Apenas aos Correios, ante as
peculiaridades encontradas pela Corte nesta empresa, se aplicou esta equiparação, dada a
sua íntima ligação com a segurança nacional.
Quatro são as repercussões da equiparação dos Correios às autarquias: a
impenhorabilidade dos bens; a aplicabilidade da imunidade tributária recíproca; o
pagamento de seus débitos judiciais responde ao regime de precatórios; e a execução é feita
na forma dedicada à Fazenda Pública, do artigo 730 do CPC em diante. Destas
repercussões, o STF tem estendido às demais empresas estatais apenas a impenhorabilidade
dos bens afetos ao serviço público, e não os demais efeitos – pelo que a aplicação do
precedente dos Correios deve ser bastante cautelosa, atendo-se tão somente a este aspecto.
Assim, a tendência segura a ser apontada é que os bens da estatal prestadora de
serviços públicos são impenhoráveis, desde que afetos diretamente a esta prestação. Há
consenso jurisprudencial sobre esta questão. Mas há que se apontar, porém, um conflito real
entre a jurisprudência do STF e a do STJ, no que se refere a bens cuja afetação direta ao
serviço público é questionável, como se pode ilustrar pela transcrição do REsp. 343.968 e
do informativo 404 do STF, pela ordem:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
A questão não trata das estatais, que são regidas pelo artigo 173 da CRFB, mas sim
das concessionárias do serviço público, regidas no artigo 175 da CRFB. Contudo, um ponto
é comum a ambas as matrizes: a subsunção ao artigo 37, § 6°, da CRFB:
a pessoas outras que não ostentem a condição de usuário. Exegese do art. 37, § 6º,
da C.F. II. - R.E. conhecido e provido.”
Tema VII
Parceria Público-Privada.
Notas de Aula13
1. Parceria público-privada
13
Aula ministrada pelo professor Sérgio Alexandre Cunha Camargo, em 14/10/2009.
Estas duas modalidades de PPP tentam, de fato, conglobar os melhores atributos das
concessões que já existiam por aqui antes, regulamentadas pela Lei 8.666/93 e Lei
8.987/95. Assim como a primeira previu regras gerais para licitações e contratos
administrativos, a Lei 11.079/04 também previu regras gerais sobre PPPs. A sede
constitucional dos diplomas é a mesma, o artigo 22, XXVII, da CRFB:
públicos. O foco, neste diploma, não é a obra pública, com o serviço público sendo mero
colateral, meio remuneratório, como na Lei 8.666: o foco é o próprio serviço público, que é
entregue ao setor privado.
Com esta lei, a limitação orçamentária como meio de contraprestação não se impõe,
o que soluciona o principal problema que se tinha na captação da parceria privada com a
Lei 8.666/93. Na Lei 8.987/95, o que remunera o parceiro privado é o preço público, a
tarifa, paga pelo usuário do serviço, e não o orçamento público. O concessionário obtém
seu lucro, de forma relativamente estável, e implementa o serviço com atenção à
generalidade, modicidade, e continuidade do serviço. O lado negativo da Lei 8.987/95 é
que esta tarifa nem sempre se mostra realmente atrativa ao concessionário, porque a
necessidade de se atentar para a modicidade, por vezes, torna o preço público máximo
praticável muito aquém do necessário para atrair investimentos de peso.
É neste contexto que a PPP surge como bom instrumento de captação: quando a
concessão ordinária não oferece atrativos suficientes para que a iniciativa privada se
interesse por investir, por deficiência tarifária, a PPP se demonstra uma possível solução. A
Lei 11.079/04 vem tentar corrigir os erros do modelo ordinário de concessões.
Na PPP, o custeio da concessão é feito não somente pelo usuário, mas também pelo
Poder Público concedente. Há contraprestações do Estado, visando a equilibrar a
participação dos usuários e do setor público na remuneração do concessionário, que,
sozinhos, um ou outro, provavelmente não seriam capazes de suportar o serviço com o
mínimo de eficiência.
Como dito, há a PPP administrativa e a patrocinada. A grande distinção entre elas é
que, na administrativa, o próprio Poder Público é o destinatário da concessão, beneficiário
imediato desta. O usuário até pode ser alcançado, mas apenas de forma reflexa. Bom
exemplo desta modalidade é a parceria para gestão de presídios, que contempla o interesse
público em geral, mas destina-se a atender, imediatamente, a própria Administração
pública.
A Lei 11.079/04 é a regra geral destas concessões, mas não é plena. Os artigos 14 a
22 da Lei 11.079/04 apresentam regras específicas que não podem, segundo José dos
Santos Carvalho Filho, serem aplicadas aos Estados e Municípios, porque estão insertos em
capítulo dedicado expressa e exclusivamente à União. Por isso, devem os entes menores
legislar sobre tais aspectos, sem contrariar as regras gerais ali impressas.
O artigo 173, § 1°, da CRFB impõe ainda outra reflexão:
Este dispositivo trata do famigerado e ainda inexistente estatuto geral das estatais.
Nesta lei complementar que ainda reside no porvir, poderá haver tratamento de matérias,
como as licitações nas estatais, que derrogarão previsões da Lei 11.079/04. Esta lei,
portanto, é diploma geral que tem grande chance de ser posto de lado em diversos aspectos.
As PPPs se caracterizam por duas formas de cooperação mútua entre o Estado e o
parceiro privado: a cooperação mútua técnica e a cooperação mútua financeira. Ao
contrário do que se pode pensar, nem só de rateios financeiros é formada a parceria: a
cooperação técnica, por vezes, é tão ou mais importante do que a financeira.
Vale, pelo ensejo, trazer o conceito de PPP firmado por José dos Santos Carvalho
Filho: trata-se de “o acordo firmado entre a Administração Pública e pessoa do setor
privado, com o objetivo de implementação ou gestão de serviços públicos, com eventual
execução de obras ou fornecimento de bens, mediante financiamento do contratado por
meio de contraprestação econômica do Poder Público, e compartilhamento de riscos e
ganhos entre os pactuantes”. O objetivo central, portanto, é o serviço público. É este o
objeto da PPP, qualquer que seja.
A grande característica diferenciadora dos contratos de PPP para os demais
contratos de concessão é a presença da contraprestação econômica por parte do Estado. O
contrato de concessão que, mesmo intitulado de PPP, não preveja contraprestação estatal,
não é de fato uma PPP – é mera concessão ordinária. Sem contraprestação, não há a
parceria especial que se pretende com esta modalidade especial de concessão.
Como dito, os riscos e os ganhos são compartilhados entre os parceiros privado e
público. Isto reflete severa diferença no que pertine à responsabilidade dos pactuantes. Na
Lei 8.987/95, apenas uma minoria da doutrina e jurisprudência vê responsabilidade
solidária entre o poder concedente e o concessionário. Na PPP, a solidariedade é expressa.
Assim, ao lado da contraprestação, a solidariedade é uma segunda diferença entre a PPP e a
concessão ordinária.
A natureza jurídica dos contratos de PPP é de um contrato administrativo de
concessão de serviço público. Como contrato administrativo, a Administração que pactua
PPP teria a seu dispor as cláusulas exorbitantes, ou estaria afastada esta prerrogativa? A
todo ver, as previsões de mutabilidade do contrato, rescisão unilateral, e demais cláusulas
exorbitantes, ainda que não tenham sido repetidas da Lei 8.666/93, ainda têm aplicação nas
PPPs. O regramento geral dos contratos administrativos não fica plenamente afastado pelo
regramento geral das concessões especiais, aplicando-se neste regime aquilo que o não
contrarie.
Como dito, a PPP não tem vinculação ao orçamento como fonte de remuneração. Há
um fundo gestor das PPPs, hoje administrado pelo Banco do Brasil, que é o responsável
pelo custeio das contraprestações.
Quando a prestação tarifária for maior do que a prevista, por circunstâncias de
mercado – maior busca pelo serviço, por exemplo –, a contraprestação estatal será
proporcionalmente reduzida. O mesmo ocorre no sentido contrário: se a tarifação prevista
for inferior à efetivada, a contraprestação deverá ser majorada para compensar a defasagem.
O equilíbrio entre as duas fontes de recursos deve ser sempre perseguido. É claro que, para
tanto, o parceiro privado deve ter as suas obrigações contratuais corretamente observadas,
corretamente adimplidas.
A contraprestação estatal deve corresponder a um mínimo de trinta por cento do
valor contratual final, sendo permitida uma substituição gradual desta participação estatal
pela majoração tarifária, quando o serviço tiver procura suficiente para se auto-sustentar.
O artigo 2°, § 4°, III, supra, veda a celebração de PPP para realização de obra ou
serviço, porque estas contratações respondem especificamente à Lei 8.666/93.
O artigo 37, § 3°, da CRFB, previu que a lei traçaria a dinâmica da participação dos
usuários na administração pública direta e indireta, mas esta lei não veio ao ordenamento,
expressamente, nem de forma incidental na Lei 8.987/95. A doutrina entende que a Lei
11.079/04 veio corrigir esta situação, dando efetividade ao artigo 37, § 3°, da CRFB, neste
artigo 4°, nos incisos II e V.
oficial, onde houver, até o prazo de 15 (quinze) dias após apresentação da fatura,
razões fundamentadas nesta Lei ou no contrato para a rejeição da atualização.
§ 2° Os contratos poderão prever adicionalmente:
I – os requisitos e condições em que o parceiro público autorizará a transferência
do controle da sociedade de propósito específico para os seus financiadores, com o
objetivo de promover a sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da
prestação dos serviços, não se aplicando para este efeito o previsto no inciso I do
parágrafo único do art. 27 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995;
II – a possibilidade de emissão de empenho em nome dos financiadores do projeto
em relação às obrigações pecuniárias da Administração Pública;
III – a legitimidade dos financiadores do projeto para receber indenizações por
extinção antecipada do contrato, bem como pagamentos efetuados pelos fundos e
empresas estatais garantidores de parcerias público-privadas.”
A mais importante das cláusulas essenciais já foi abordada: a repartição dos riscos.
Outra cláusula essencial relevante é a do prazo contratual, que não pode ser inferior
a cinco, nem superior a trinta e cinco anos. O prazo do contrato deve se compatibilizar com
as contraprestações que o Poder Público pretenda implementar. Não se pode prever um
contrato com aporte de recurso público de trinta e cinco anos, por exemplo, para uma obra
cuja previsão de duração seja de dez anos. A cláusula assim prevista será certamente
incompatível com a lei.
Os incisos IV e V do caput deste artigo indicam a necessidade de mecanismos que
atualizem a prestação do serviço, de forma a ser evitado o sucateamento deste. É preciso
que, em prol da eficiência, haja a constante modernização do instrumental.
O inciso VI dize deve haver previsão no contrato de hipóteses taxativas de situações
em que a inadimplência do poder concedente será tolerada. Caso não haja possibilidade de
se eximir do aporte, por ali se prever a situação, o Poder Público deverá arcar com o que for
devido.
As demais hipóteses são bem literais. Vale apenas comentar que o inciso IX exige
que no contrato seja previsto o compartilhamento dos ganhos, em caso de redução de risco
no objeto. Favorecido um dos parceiros, concedente ou concessionário, o outro deverá
também o ser.
Casos Concretos
Questão 1
admite que os parceiros privados recebam seus créditos com a Fazenda através do referido
Fundo, sem a necessidade de expedição de precatórios, de forma a privilegiá-los em
desrespeito aos demais credores, em clara ofensa ao princípio da isonomia (art. 5º, II, CF).
Pela defesa da constitucionalidade do dispositivo impugnado, o Advogado-Geral da União
afirma que o FGP tem personalidade jurídica de Direito Privado, conforme determina o
artigo 16, parágrafo 1º da Lei 11.079/2004, pelo que, da mesma forma que as empresas
públicas e as sociedades de economia mista, está afastado do regime dos precatórios. No
desempenho da função de Ministro do STF, descompatibilize as controvérsias e decida a
questão.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
b) Segundo José dos Santos Carvalho Filho, PPP é “o acordo firmado entre a
Administração Pública e pessoa do setor privado, com o objetivo de implementação
ou gestão de serviços públicos, com eventual execução de obras ou fornecimento de
bens, mediante financiamento do contratado por meio de contraprestação econômica
do Poder Público, e compartilhamento de riscos e ganhos entre os pactuantes”. O
fundamento legal, como dito, é a Lei 11.079/04. Quanto às modalidades, há duas: a
PPP administrativa e a patrocinada.
Tema VIII
Estado Gestor.
Notas de Aula14
1. Estado gestor
O Estado moderno tende a ser cada vez mais gerencial, valendo-se cada vez mais de
premissas e da participação do setor privado para operacionalizar a máquina administrativa.
A noção inicial de Estado gestor, no Brasil, veio no Governo Fernando Henrique
Cardoso, em que se começou a abandonar o Estado burocrático, maciçamente concentrado,
em prol do Estado gerencial.
No governo Lula, entretanto, é que foram traçadas as “megadiretrizes” do Estado
gestor: a inclusão sócio-econômica; e a reconstrução do Estado. Estas diretrizes se
14
Aula ministrada pelo professor Sérgio Alexandre Cunha Camargo, em 14/10/2009.
implementarão a partir de ações que o governo deve implementar em três áreas: a área de
atuação do próprio Estado gestor; a do Estado provedor; e a do Estado indutor.
Em qualquer destas áreas, a figura da iniciativa privada parceira do Poder Público é
fundamental. Não há mais como se dissociar a atividade estatal da participação privada.
Com isso, se põem em xeque os conceitos do jus imperii, da supremacia do interesse
público, de cláusulas exorbitantes, e do próprio regime jurídico de direito público como se
conhece hoje.
Isto é uma tendência tão forte, mundialmente, que na França, por exemplo, até
mesmo parcelas da soberania foram cedidas em função da migração do Estado pleno para o
Estado gestor.
É claro que, com isso, não significa que o corporativismo empresarial fará as vezes
de Estado. É certo que haverá, como meta, a contenção, a limitação do poder corporativo,
sob pena de se perder até mesmo o conceito de Estado. A figura do Estado gestor não é nem
será frágil face representativa do seu povo, sem poder sobre a iniciativa privada. Ao
contrário, esta será sua principal função: tomar as rédeas dos mercados, evitando abusos do
setor privado.
O Estado não pode mais ser tido por garantidor universal, como se tem visto,
especialmente nas questões de direitos fundamentais de segunda geração, direitos
prestacionais, quando alcançam o Judiciário. O Estado será o grande gerente das relações.
No Estado gestor, o administrador vai buscar identificar os fins, e os meios, da
política econômica, a fim de orientar tais políticas, especialmente as reformas que o Estado
deverá promover a fim de que a economia ande bem. Neste Estado gerencial, há uma
necessidade permanente de interação com o setor privado, pois a cada tomada de decisão
estatal haverá impacto sobre a iniciativa privada, devendo esta ser consultada.
Em suma, pode-se entender o Estado gestor como um grande regulador das
atividades da coletividade, mediador dos interesses públicos e privados. Não vige mais o
regime público onipotente, em detrimento dos interesses privados, porque se assim o for o
Estado simplesmente não terá como manter atendidas suas necessidades: sem equilíbrio de
interesses, o setor privado deixará de formar parcerias com o Estado, em qualquer nível. As
atividades públicas devem ser interessantes à iniciativa privada, ou o Estado simplesmente
não conseguirá repassá-las aos prestadores privados.
A esta gestão praticada por este Estado gerencial se chama gestão macroeconômica,
que prevê o ajuste permanente de custos e benefícios públicos e privados. As ações
conjuntas do Estado gestor e da iniciativa privada, nesta gestão macroeconômica, são o
aprofundamento das reformas de base do país; a gestão do risco do país; e a gestão do
custo do Brasil, aumentando a eficiência, através da menor despesa per capita. Tudo isso
atrai investimentos privados, nacionais e internacionais.
Como considerações gerais finais sobre o Estado gestor, tem-se que este intenta
desestimular políticas paternalistas, além de contemplar o conceito de pós-burocracia: dá-
se muito mais valor ao resultado do que ao meio empregado para se alcançá-lo. As
descentralizações, neste modelo, têm, em regra, objetivos sociais. As privatizações, nesta
fase estatal, têm grande relevância, bem como a diminuição da carga de deveres do Estado,
passando atribuições ao terceiro setor.
O Estado gerencial pretende apenas operar um dirigismo político, auxiliando o
implemento das atividades pela própria sociedade, a fim de, no final, poder alcançar o hoje
famigerado conceito de Estado mínimo.
Trata-se da forma do Estado que prevê a atuação conjunta com o setor privado de
forma preponderante. Nesta modalidade, o Estado vai alocar recursos públicos em áreas
definidas de sua atuação, e com isso proverá a execução de atividades de interesse geral
pelo setor privado, que é quem vai prestá-las, efetivamente.
Os objetivos do setor privado e do Estado, neste modelo, são de certa forma
compartilhados. O setor privado, executor, pretende desempenhar a atividade que o Estado
pretende que seja desempenhada. Há uma comunhão de desígnios.
Com esta forma provedora, não se quer falar em assistencialismo. Ao contrário,
quer o Estado provedor afastar tais técnicas filantrópicas. Por isso, pode-se dizer que o atual
governo federal do Brasil não está, ainda, caminhando para este molde provedor de Estado:
o assistencialismo ainda é muito forte, em nosso governo.
O papel do Estado provedor, em suma, é dar condições ao setor privado para que
este desempenhe as atividades que são interessantes ao Estado, e ao próprio setor privado.
A inclusão sócio-econômica é buscada no Estado provedor por meio da educação e
da cultura, precipuamente, sem descurar dos demais aspectos fundamentais: saúde,
saneamento básico, habitação e urbanização, além de projetos sociais específicos.
Também é alvo deste Estado a gestão do meio-ambiente, conciliando os interesses
do desenvolvimento e da sustentabilidade.
Como o próprio nome indica, o papel do Estado, aqui, é induzir a que o particular
atue. O Estado exerce o devido fomento, a fim de que o setor privado atenda, ele próprio, a
suas necessidades. Este é o modelo ideal, diga-se.
Esta dinâmica funciona melhor quando se está tratando de políticas regionais, ou
nacionais de alcance setorial. Talvez, em uma visão macro, seja difícil conceber toda a
atuação estatal neste formato, sobremaneira em um país continental e populoso como o
nosso.
As ações conjuntas para expansão econômica deste Estado indutor precisam de
políticas públicas setoriais, e não globais. Por isso, fomenta-se as micro e pequenas
empresas com maior prioridade. Além disso, o turismo, e as políticas na área internacional
também merecem foco especial, neste modelo.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
antes de atender aos imperativos do Estado, precisam passar por filtros que atendam a
interesses privados. Afinal, por definição, a gestão macroeconômica nada mais é do que o
ajuste permanente de custos e benefícios públicos e privados.
No âmbito do Estado provedor, a atuação conjunta é irrecusável. Em todas as áreas
definidas de atuação, o Estado aloca recursos para provisões que se executam via produção
preponderantemente realizada no setor privado. Aqui cabem extensos corredores de ação
conjunta, com objetivos compartilhados. E quanto mais se migra de objetivos menos
filantrópicos e assistencialistas para políticas estruturais, centradas no crescimento
econômico e na geração auto-sustentada de empregos, mais a interação público-privado se
aprofunda.
Por último, e ainda mais importante, é no âmbito do Estado indutor que a interação
é vital. Por definição, o governo tem poder de induzir; o setor privado, o de realizar. Isto é
válido tanto para políticas regionais e setoriais, quanto para transações externas reais e
financeiras.