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UNIVERSIDADE SÃO TOMÁS DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE ÉTICA, CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS


Coordenação do Curso de Direito

Direito Económico

______________

CAPÍTULO 5: Organização Económica e Função Social


da Propriedade

Capítulo 5: ORGANIZAÇÃO ECONÓMICA E FUNÇÃO SOCIAL


DIREITO ECONÓMICO - 2º Ano
Curso de Licenciatura em Direito

DA PROPRIEDADE

26. ESTRUTURA DE PROPRIEDADE DOS MEIOS DE PRODUÇÃO ......................................... 1


26.1. Noção de propriedade e conteúdo do direito de propriedade .............................................. 1
26.2. Intervenção estatal no domínio económico como instrumento da efectivação da função
social da propriedade .................................................................................................................... 2
27. ESTRUTURA DE PROPRIEDADE DOS MEIOS DE PRODUÇÃO ......................................... 3
27.1. Sector Público (Propriedade e Gestão Pública) .................................................................. 4
27.2. Sector Privado (Propriedade e Gestão Privada) ................................................................. 4
27.3. Sector Cooperativo e social (Propriedade Cooperativa)...................................................... 5
28. AS COOPERATIVAS.............................................................................................................. 5
28.1. Noção e espécies ............................................................................................................... 5
28.2. Princípios Cooperativos ...................................................................................................... 6
28.3. Regulação jurídica das Cooperativas.................................................................................. 7
29. A INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA E AS NACIONALIZAÇÕES ...................... 9
29.1. Noção de nacionalização .................................................................................................... 9
29.2. História das nacionalizações .............................................................................................. 9
29.3. Confronto com figuras afins ou semelhantes .................................................................... 11
a) A expropriação por utilidade pública ................................................................................. 11
b) Requisição ........................................................................................................................ 12
c) Confisco ........................................................................................................................... 13
d) Intervenção do Estado na gestão de empresas privadas .................................................. 14
30. AS PRIVATIZAÇÕES ........................................................................................................... 15
30.1. Noção de privatização ...................................................................................................... 15
30.2. Fundamentos da privatização ........................................................................................... 16
30.3. Classificação .................................................................................................................... 16
30.4. As Privatizações em Moçambique .................................................................................... 17
31. A CONCESSÃO DE BENS E SERVIÇOS PÚBLICOS ......................................................... 19

26. ESTRUTURA DE PROPRIEDADE DOS MEIOS DE PRODUÇÃO

26.1. Noção de propriedade e conteúdo do direito de propriedade

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Propriedade é comummente qualificada como o direito real máximo. Traduz-se no vínculo
jurídico que sujeita uma coisa ao pleno e exclusivo poder de uma pessoa que fica tendo o direito de
usar, fruir e dispor dela (alienar a título oneroso ou gratuito) dentro dos limites da lei.

Segundo o artigo 1305º do Código Civil, com a epígrafe «conteúdo do direito de propriedade»,
“o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposições das
coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela
impostas”.

A Constituição de 2004, no seu artigo 82 nº 1 reconhece e garante o direito de propriedade.

O direito de propriedade privada inclui 4 componentes:

1) O direito de a adquirir,
2) O direito de usar e fruir dos bens de que se é proprietário;
3) A liberdade na sua transmissão;
4) O direito de não ser privado dela.

26.2. Intervenção estatal no domínio económico como instrumento


da efectivação da função social da propriedade

A propriedade é um elemento essencial ao ser humano, à ordem económica capitalista e ao


Estado. É meio de segurança e subsistência pessoal, é núcleo da actividade e poder económico, e
é instrumento de desenvolvimento do Estado.

Esta essencialidade requer que em todas as esferas de actuação e interesse a propriedade


tenha função social, sendo capaz de produzir uma vida digna com justiça social. Por isso, o Estado
como agente primeiro de atendimento e intermediação do interesse público deve actuar para que o
princípio da função social da propriedade seja observado e efectivado.

Nem sempre a propriedade foi regrada com a perspectiva de instrumento de bem-estar social.

O direito de propriedade no Estado Liberal era absoluto e individualista e não permitia


interferência. Contudo, através dos tempos, o direito de propriedade mudou de perfil. Esta
mudança foi fruto das desigualdades sociais geradas pelo exercício sem limites do direito de
exploração da propriedade privada e de outros factores históricos, jurídicos e sociais, tais como a
revolução industrial, a Constituição de Weimar, as duas Grandes Guerras, os movimentos sociais e
o surgimento das Constituições Económicas.

O novo perfil jurídico da propriedade é de um direito individual de livre fruição, mas condicionado
ao atendimento da função social. Com isso a exploração económica da propriedade passou a ser
fundada por objectivos e princípios específicos regrados pelo Direito e impositivos à ordem
económica e social.

Dentro desta realidade a estrutura social, estatal e económica adoptada pelo país demonstra a
importância do direito de propriedade e a necessidade de sua exploração ser direccionada e
baseada por princípios e objectivos jurídicos de bem-estar e desenvolvimento social.

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A Constituição moçambicana de 2004 no seu artigo 82 nº 1 reconhece e garante o direito de
propriedade.

Ora, o direito de propriedade não é um direito absoluto podendo ser objecto de limitações ou
restrições, as quais se relacionam desde logo, com os princípios de Direito (ex: a função social da
propriedade), com razões de utilidade pública ou com a necessidade de conferir eficácia a outros
princípios ou normas Constitucionais, incluindo os direitos económicos ou sociais e as disposições
da organização económica.

Restrições ao direito de propriedade:

a) Na aquisição ou acesso – há bens insusceptíveis de apropriação privada – é o caso dos


bens de domínio público (artigo 98 da Constituição). No entanto, note-se que alguns desses
bens poderão, por vezes, ser explorados por entidades privadas ou cooperativas em regime
de concessão. Trata-se, portanto, de uma reserva de propriedade pública mas não uma
reserva de actividade económica pública.

b) No uso e fruição – para além do dever geral de uso relativo aos meios de produção (a
propriedade de meios de produção implica o seu uso), devem considerar-se outras
condicionantes por razões ambientais ou de ordenamento do território (ex: delimitação de
áreas de reserva agrícola, reserva ecológica, planeamento urbano, etc).

c) Na transmissão inter vivos ou mortis causa – é por vezes limitada por direitos a favor de
terceiros, como o direito de preferência atribuído por vezes aos proprietários confinantes.

d) Limites Constitucionais ao direito de o titular ser privado da sua propriedade – ao


admitir-se a possibilidade de requisição e expropriação por utilidade pública, sujeita a
pagamento de justa indemnização.

27. ESTRUTURA DE PROPRIEDADE DOS MEIOS DE PRODUÇÃO

Os três sectores de propriedade dos meios de produção, consistem em formas de


compatibilidade e de coexistência, entre iniciativas económicas diversas – Iniciativa Pública,
Iniciativa Privada e Iniciativa Cooperativa e Social, bem como entre três tipos de propriedade
que se complementam entre si – Propriedade Pública, Propriedade Privada e Propriedade
Cooperativa e Social.

A propriedade e o modo social de gestão são critérios determinadores dos sectores de


propriedade dos meios de produção, designadamente o Sector Público, Sector Privado e o
Sector Cooperativo e Social.

A actividade económica distribui-se por qualquer destes sectores, tendo como base objectivos
diferenciados.

O Sector Público tem que ser entendido no âmbito das incumbências gerais do Estado em
matéria económica e social e articulado com outras formas de regulação constitucionalmente
previstas.

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No Sector Privado concentra-se a actividade económica que se organiza e desenvolve


livremente de acordo com objectivos lucrativos que lhes são inerentes, sujeitando-se aos
condicionamentos e às restrições constitucionais ou legalmente previstas.

O Sector Cooperativo e Social possui a sua filosofia própria em matéria de objectivos,


combinando os económicos e os sociais, que se reflectem na sua organização.

Enquadramento jurídico-legal:

A estrutura da propriedade dos meios de produção, ou os sectores de produção, encontram-se


definidos nas seguintes disposições constitucionais:

a) Artigo 97, alíneas d) e e) da Constituição de 2004, que referem que a organização


económica e social da República de Moçambique assenta na “coexistência do sector
público, do sector privado e do sector cooperativo e social” e “na propriedade pública dos
recursos naturais e de meios de produção, de acordo com o interesse colectivo”;

b) Artigo 99 da Constituição, que trata dos sectores de propriedade dos meios de


produção.

27.1. Sector Público (Propriedade e Gestão Pública)


Artigo 99, nº 2 da Constituição:

O Sector Público é constituído pelos meios de produção cuja titularidade e gestão pertencem ao
Estado ou a outras entidades públicas. A acumulação da propriedade e gestão é condição
necessária, dado que pode haver bens públicos geridos por empresas privadas ou cooperativas e
pode haver intervenção publica na gestão de empresas privadas, embora a título excepcional.

Assim, fazem parte do sector público os meios de produção públicos geridos directamente pela
Administração Pública ou por outras entidades públicas, que poderão assumir a forma de institutos
públicos, empresas públicas ou sociedades de capitais mistos quando maioritariamente
controlados pelo Estado e desde que este tenha também a maioria nos órgãos de gestão.

Através do Sector Público o estado produz ou presta serviços, ora em concorrência com
empresas privadas ou cooperativas, ora em monopólio natural ou legalmente protegido.

27.2. Sector Privado (Propriedade e Gestão Privada)


Artigo 99, nº 3 da Constituição:

O Sector Privado é constituído pelos bens e unidades de produção cuja propriedade ou gestão
pertençam a pessoas singulares ou privadas.

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Estão assim abrangidos todos os meios de produção que sejam propriedade de entidades
privadas, excepto se forem geridos por cooperativas em obediência aos princípios cooperativos.

Pertencem igualmente ao Sector Privado todos os meios de produção que sejam propriedade
pública mas cuja gestão tenha sido, por via contratual ou não, entregue a entidades privadas.
Podem ser bens do domínio público ou de empresas públicas cuja gestão tenha sido concedida a
entidades privadas, ou simplesmente empresas de capital misto em que o estado não tenha
nomeado a maioria dos gestores, tendo a isso direito, além de todas as restantes onde o estado
seja minoritário.

27.3. Sector Cooperativo e social (Propriedade Cooperativa)


Artigo 99, nº 4 da Constituição:

O Sector Cooperativo e Social compreende os meios de produção geridos por cooperativas de


acordo com os princípios cooperativos (independentemente da forma de propriedade, que tanto
pode ser pública, privada ou cooperativa), e abrange:

a) Os meios de produção comunitários, possuídos e geridos por comunidades locais;

A expressão “meios de produção comunitários” parece indicar que se trata de bens de


propriedade comunitária, ou seja, de uma comunidade concreta, eventualmente sem personalidade
jurídica pública ou privada. Os casos mais conhecidos são os “baldios” em que os titulares da
propriedade são os “povos”, as “aldeias”, “ os agregados populacionais”. De notar que estes meios
de produção só integram o sector social quando são possuídos e geridos pelas respectivas
comunidades locais.

b) Os meios de produção destinados à exploração colectiva por trabalhadores;

Esta figura refere-se à autogestão das empresas pelos respectivos trabalhadores e é um direito
que parece pressupor a gestão aos trabalhadores e a propriedade a outrem. Considera-se que os
bens podem ser de titularidade de entidades privadas ou públicas, pressupondo-se o assentimento
dos titulares da propriedade ou um motivo legal que confira o direito á autogestão.

c) Os meios de produção possuídos e geridos por pessoas colectivas, sem carácter


lucrativo, que tenham como principal objectivo a solidariedade social,
designadamente entidades de natureza mutualista.

Trata-se de estender o sector social às entidades que desenvolvem uma actividade económica
tendo em vista a solidariedade social, e por isso, sem intuito de apropriação lucrativa pública ou
privada, antes dirigida à ajuda mútua.

28. AS COOPERATIVAS
28.1. Noção e espécies

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As Cooperativas são organizações de natureza colectiva que visam a satisfação, sem fins
lucrativos, das necessidades económicas, sociais ou culturais dos seus membros, através da sua
cooperação e entreajuda e na observância dos princípios cooperativos.

Ou seja, a cooperativa é tida como uma associação autónoma de pessoas que se unem livre e
voluntariamente para fazer face as suas necessidades e aspirações económicas, sociais e culturais
comuns, por meio de uma empresa de propriedade conjunta e colectiva e democraticamente
controlada.

As cooperativas têm dupla natureza: são «associações» e, simultaneamente uma «empresa»


que permite financiar, com os seus resultados, os objectivos sociais da associação, pois uma
cooperativa é um agrupamento de pessoas que prosseguem objectivos económicos, sociais e
educativos através duma empresa.

São empresas que agem como qualquer uma com vista a obtenção de ganhos de modo a que
possam cumprir com as funções sociais dos seus membros e o bem estar de toda a comunidade.

É nessa dupla vocação onde reside a característica ímpar das cooperativas e que fundamenta
a sua autonomia e uma regulamentação específica e especial.

Os tipos de cooperativa podem ser:

 Cooperativas de Consumo,
 Cooperativas de Comercialização,
 Cooperativas de Indústria,
 Cooperativas Agrícolas,
 Cooperativas de Crédito,
 Cooperativas de Construção e Habitação,
 Cooperativas de Artesanato,
 Cooperativas de Pesca,
 Cooperativas de Cultura,
 Cooperativas de Serviços e Ensino.

28.2. Princípios Cooperativos


A nível internacional, a institucionalização do movimento cooperativo encontra expressão na
Aliança Cooperativa Internacional, que aprovou em 1937 os seguintes princípios cooperativos:

1º. Princípio: Adesão voluntária e livre.

– As Cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as pessoas aptas a utilizar os


seus serviços e dispostas a assumir as responsabilidades de membro, sem discriminações de
sexo, sociais, políticas raciais ou religiosas. A admissão ou demissão dos sócios é livre e não pode
ser objecto de quaisquer discriminações do sexo, nacionalidade, religião, instrução, situação
económica e social. Qualquer pessoa, não obstante não ter participado na constituição da
cooperativa, pode a ela associar-se participando na vida desta.

2º. Princípio: Gestão democrática pelos membros ou democracia interna.

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– As Cooperativas são organizações democráticas geridas pelos seus membros, os quais


participam activamente na formulação das suas políticas e na tomada de decisões. Os homens e
as mulheres que exerçam funções como representantes eleitos são responsáveis perante o
conjunto dos membros que os elegeram. Nas Cooperativas do primeiro grau, os membros têm
iguais direitos de voto (um membro, um voto), estando as Cooperativas de outros graus
organizadas também de uma forma democrática;

3º. Princípio: Participação económica dos membros.

– Os membros contribuem equitativamente para o capital das suas Cooperativas e controlam-


no democraticamente. Pelo menos parte desse capital é, normalmente, propriedade comum da
Cooperativa. Os cooperadores, habitualmente, recebem, se for caso disso, uma remuneração
limitada pelo capital subscrito como condição para serem membros. Os cooperadores destinam os
excedentes a um ou mais dos objectivos seguintes: desenvolvimento das suas Cooperativas,
eventualmente através da criação de reservas, parte das quais, pelo menos, será indivisível;
benefício dos membros na proporção das suas transacções com a Cooperativa, apoio a outras
actividades aprovadas pelos membros;

4º. Princípio: Autonomia e independência.

– As Cooperativas são organizações autónomas de entreajuda, controladas pelos seus


membros. No caso de entrarem em acordos com outras organizações, incluindo os governos, ou
de recorrerem a capitais externos, devem fazê-lo de modo que fique assegurado o controlo
democrático pelos seus membros e se mantenha a sua autonomia como Cooperativas;

5º. Princípio: Educação, formação e informação.

– As Cooperativas promovem a educação e a formação dos seus membros, dos


representantes eleitos, dos dirigentes e dos trabalhadores, de modo que possam contribuir
eficazmente para o desenvolvimento das suas Cooperativas. Elas devem informar o grande público
particularmente, os jovens e os líderes de opinião sobre a natureza e as vantagens da cooperação;

6º. Princípio: Intercooperação.

– As Cooperativas servem os seus membros mais eficazmente e dão mais força ao movimento
cooperativo, trabalhando em conjunto, através de estruturas locais, regionais, nacionais e
internacionais;

7º. Princípio: Interesse pela comunidade.

– As Cooperativas trabalham para o desenvolvimento sustentável das suas comunidades,


através de políticas aprovadas pelos membros.

28.3. Regulação jurídica das Cooperativas

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A regulação jurídica das Cooperativas encontra-se assente na Lei nº 23/2009, de 8 de
Setembro (Lei Geral das Cooperativas) que revogou a Lei nº 9/79, de 10 de Julho (Lei das
Cooperativas).

Segundo a Lei nº 23/2009, de 8 de Setembro, no seu artigo 10, as cooperativas constituem-se


através de um Contrato de Sociedade que pode ser celebrado por documento escrito com
assinatura reconhecida presencialmente pela autoridade competente, devendo ser celebrado por
escritura pública nos casos que a lei determinar.

O Contrato de Sociedade deve ser publicado no Boletim da República e deve conter: a


identificação dos membros, a denominação da cooperativa, o objecto e ramo de actividade a que
pertence ou de integração, a sede social, data da celebração do contrato de sociedade, o capital
inicial da cooperativa, as condições de admissão, suspensão ou exclusão e demissão dos
cooperativistas, os direitos e deveres dos membros, as normas de funcionamento da Assembleia
Geral, da Direcção e do Conselho Fiscal, regras de distribuição dos excedentes, etc (artigo 13 da
Lei nº 23/2009).

O número de membros de uma cooperativa é variável e ilimitado, não podendo ser inferior a 5
membros nas cooperativas de primeiro grau (artigo 11 da Lei nº 23/2009).

As cooperativas estão sujeitas ao registo na Conservatória do Registo das Entidades Legais


(artigo 14 da Lei nº 23/2009).

As cooperativas deverão possuir uma denominação, a qual deverá ser sempre seguida das
expressões “Cooperativa”, “União de Cooperativas”, “Federação de Cooperativas”, “Confederação
de Cooperativas” e ainda de “responsabilidade limitada” ou “responsabilidade ilimitada”.

De acordo com o artigo 36 da Lei nº 23/2009, os órgãos sociais das cooperativas são:

 Assembleia Geral;
 Direcção;
 Conselho Fiscal ou Fiscal Único.

A “Assembleia Geral” é o órgão mais alto da cooperativa e nela participam todos os


cooperativistas no pleno gozo dos seus direitos, cujas deliberações são obrigatórias para os
restantes órgãos da cooperativa, bem como para todos os membros desta.

A “Direcção” é o órgão de administração e representação da cooperativa.

O “Conselho Fiscal” é o órgão de controlo e fiscalização da cooperativa.

Os titulares dos órgãos sociais das cooperativas são eleitos de entre os seus membros por um
período previsto nos Estatutos.

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29. A INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA E AS
NACIONALIZAÇÕES
29.1. Noção de nacionalização

Por nacionalização entende-se o acto político-legislativo que transfere a propriedade dos


bens económicos da propriedade privada para a propriedade pública.

Juridicamente, a nacionalização é uma espécie de expropriação, traduzindo-se na transferência


forçada, por acto de autoridade, de uma unidade económica (exploração, estabelecimento,
empresa) da propriedade privada para a propriedade pública.

A nacionalização é um acto político, implicando a entrada das empresas na propriedade do


Estado. A figura da nacionalização afecta simultaneamente o direito de propriedade e o direito de
iniciativa privada.

O acto de nacionalização é sempre um acto do Estado, no qual este manifesta o seu ius
imperii, que aliás se manifesta também na possibilidade deste dar o destino que lhe aprouver a
esses bens.

Características Especiais da Nacionalização:

A figura da nacionalização pressupõe a existência simultânea dos seguintes componentes e


características:

a) Uma componente ideológico-política implicando, fortemente, a subordinação do poder


económico ao poder político, o que, juridicamente, se vem a formalizar em um acto
legislativo;

b) O objecto da nacionalização é um bem económico em sentido estrito. O que provoca a


nacionalização é o facto de ser uma “unidade produtiva” (e não o valor real do património).
Os bens continuarão como unidades produtivas na posse da Nação;

c) A titularidade e posse útil dos bens transferem-se para a Nação.

O termo de referência da nacionalização é a Nação e não o Estado. Ou seja, o interesse da


colectividade (Nação) pode exigir formas de detenção e gestão dos bens nacionalizados não
necessariamente estatais, reconhecendo-se que a prossecução do interesse colectivo pode
aconselhar formas mais amplas e diversificação de gestão dos bens nacionalizados.

No entanto, note-se que o acto de nacionalizar é sempre um acto Estatal. A gestão e detenção
útil dos bens é que poderá levar a formas de estatização ou de propriedade social, ou o seu retorno
propriedade e gestão privadas.

29.2. História das nacionalizações

As nacionalizações iniciam após a 1ª Guerra Mundial.

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O ano de 1917 traz elementos a considerar:

 A Revolução Soviética;
 A Constituição Mexicana

Na Rússia, a revolução implicou a colectivização (estatização) total da economia.


Nacionalizaram-se: a terra, a banca, os seguros, os transportes, a indústria, as empresas que
ocupavam mais de 10 operários (ou mais de 5 se utilizassem equipamentos a motor) e todo o
comércio que não corresponde à venda de produção própria.

Na Constituição Mexicana aparece um novo conceito de propriedade: a propriedade da terra e


das águas interiores é da Nação, a qual tem o direito de a transferir para pessoas privadas para
seu uso, limitada pelo interesse público.

Daqui decorre que a terra é propriedade da Nação (e não do Estado) e que a sua aquisição
privada é sempre limitada pelo interesse colectivo. Esta disposição constitucional esteve na base
da reforma agrária no México nos anos seguintes.

Na Alemanha no seguimento da Constituição de Weimar de 1919, nacionalizaram-se os bens


colectivos essenciais (electricidade, água, gás, caminhos de fero, indústria de guerra, etc.)

Em França, em 1936/1937, nacionalizam-se fábricas de material de guerra, caminhos de ferro,


aviação civil, etc.

Mas é sobretudo após a 2ª Guerra Mundial que se verifica, na Europa, um surto de


nacionalizações mais alargado, em termos qualitativos e quantitativos. Interessa agora oa Estado
controlar sectores-chave da economia. Nacionalizam-se bancos, companhias de seguros,
explorações e indústria de carvão, transportes aéreos, transportes ferroviários e siderurgias.

Também nas democracias populares de Leste que, depois da 2ª Guerra Mundial, se inseriram
na órbita Soviética, se generalizaram as nacionalizações, abrangendo a quase totalidade dos
meios de produção.

Na República Popular da China, após 1949, colectiviza-se a terra e, posteriormente,


nacionalizam-se as indústrias.

A emancipação e independência política das nações do Terceiro Mundo implicaram também


nacionalizações (ex.: Canal do Suez no Egipto em 1956, indústria petrolífera no Irão em 1951, e
nas ex-colónias Portuguesas).

Numa perspectiva Marxista defensora de uma economia socialista, as nacionalizações são o


instrumento privilegiado para alterar radicalmente o sistema anteriormente vigente, dado que se
defende, por princípio, a apropriação colectiva de todos os meios de produção.

As nacionalizações são, em regra, consequência de um acto político-ideológico, ao contrário do


clássico instituto da expropriação por utilidade pública, medida pragmática de atenuação do
individualismo e do puro liberalismo económico.

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Não foi só o pensamento Marxista que defendeu as nacionalizações. Também o pensamento
social-democrata, no final da 2ª Guerra Mundial, defendeu a figura da nacionalização com as
seguintes justificações:

a) Existência de sectores de actividade económica que desempenham um papel social


relevante e decisivo;
b) A necessidade de subtrair ao controlo dos monopólios privados sectores-chave da
economia;
c) A necessidade de fazer face a situações de subdesenvolvimento e desigualdades
regionais;
d) Necessidade de colmatar lacunas da iniciativa privada económica;
e) Tentar um melhor aproveitamento dos meios disponíveis e dos recursos naturais
mediante a utilização de técnicas de planeamento.

O pensamento social-democrata manifesta-se, no entanto, contra uma alteração radical do


sistema económico de mercado, já que não aceitava uma nacionalização maciça e integral da
economia. A social democracia aponta para uma economia onde coexistem três sectores de
produção, já que considera que o colectivismos de Estado é incompatível com a eficiência
económica, com a liberdade e com a democracia.

29.3. Confronto com figuras afins ou semelhantes

A figura da nacionalização ganha contornos mais claros quando confrontada com outras figuras
que com ela concorrem na constituição da propriedade e/ou gestão pública ou colectiva que,
embora com estruturas semelhantes, têm naturezas diversas e até divergem quanto aos fins.

a) A expropriação por utilidade pública

A expropriação por utilidade pública consiste na desapropriação de qualquer bem privado


(terrenos, edifícios, entre outros) em benefício de uma entidade pública ou mesmo privada, por
motivos de utilidade pública (construção de estradas, urbanização e outros).

A expropriação é um acto administrativo-público que incide exclusivamente sobre


bens imóveis.

Esta figura vem prevista no nº 2, do artigo 82 da Constituição de 2004 nos seguintes termos:

“A expropriação só pode ter lugar por causa de necessidade, utilidade ou interesse públicos,
definidos nos termos da lei e dá lugar a justa indemnização.”

Por sua vez, o artigo 1308º do Código Civil, refere-se à expropriação nos seguintes termos:

“Ninguém pode ser privado, no todo ou em parte, do seu direito de propriedade, senão nos
casos fixados na lei.”

Diferenças entre nacionalização e expropriação:

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NACIONALIZAÇÃO EXPROPRIAÇÃO

a) A nacionalização é um acto de soberania a) A expropriação obedece à lei, mas pode


e um acto político-legislativo, que se ser feita por um acto administrativo.
reveste sempre da forma de lei.

b) A nacionalização tem fundamentos b) A expropriação é um acto normal de


político-ideológicos ou político- Administração pública (acto
económicos, nomeadamente a administrativo), determinado pela
necessidade de retirar da entidade situação dos bens que os torna
privada o domínio sobre sectores-chave indispensáveis à realização de tarefas
da economia a favor da Nação. próprias da Administração.

c) A nacionalização é uma providência c) A expropriação é uma providência


extraordinária. corrente.

d) A nacionalização limita o direito de d) A expropriação limita o direito de


empresa e direito de iniciativa económica. propriedade, por se entender que a
utilidade pública desse bem impõe tal
restrição.

e) A nacionalização tem por objecto uma e) A expropriação incide sobre bens


unidade produtiva ou bens económicos imobiliários.
em sentido restrito (a empresa, quotas,
ramos de actividade, etc.

f) O acto de nacionalização não pode ser f) A declaração de expropriação pode ser


impugnado judicialmente, senão com atacada com base em ilegalidade, porque
base em inconstitucionalidade (é um acto é um acto administrativo sujeito ao
materialmente político-legislativo). princípio da legalidade.

g) A lei que leva a efeito a nacionalização, g) A lei que autoriza a expropriação,


produz efeitos automáticos. pressupõe actos jurídicos posteriores.

Entretanto, tanto a nacionalização como a expropriação obrigam ao pagamento de


indemnização, nos termos do nº 2, do artigo 82 da Constituição de 2004 (Expropriação), e da Lei
de Investimentos (Lei nº 3/93, de 24 de Junho), cujo artigo 13, nº 2, determina que “a
nacionalização de bens e direitos que constituem investimento autorizado e realizado nos termos
da lei será objecto de indemnização justa e equitativa”.

b) Requisição

Na requisição a Administração Pública impõe aos particulares a obrigação de,


temporariamente, prestarem certos serviços ou de consentirem a utilização de alguns bens
disponíveis, no interesse público, cabendo o direito à indemnização.

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A requisição relaciona-se com a possibilidade de a Administração ou as autoridades militares
poderem impor a um particular a obrigação de prestar serviços ou dispor um bem para utilização
temporária.

Tem como pressuposto a necessidade por interesse público, a submissão ao princípio da


legalidade e a justa indemnização.

Segundo o artigo 1308º do Código Civil (Requisições), “só nos casos previstos na lei pode ter
lugar a requisição temporária de coisas do domínio privado”.

Mais adiante, o artigo 1310º do Código Civil (Indemnizações), refere que “havendo
expropriação por utilidade pública ou particular ou requisição de bens, é sempre devida a
indemnização adequada ao proprietário e aos titulares dos outros direitos reais afectados”.

Diferenças entre nacionalização e requisição:

NACIONALIZAÇÃO REQUISIÇÃO

a) A nacionalização tem carácter definitivo a) A requisição tem carácter temporário.


ou pelo menos de indeterminado (não se
conhece o horizonte temporal de
vigência).

b) A nacionalização tem fundamentos b) A requisição é um acto normal de


político-ideológicos ou político- Administração pública (acto
económicos, nomeadamente a administrativo).
necessidade de retirar da entidade
privada o domínio sobre sectores-chave
da economia a favor da Nação.

c) A nacionalização tem por objecto uma c) A requisição incide sobre bens móveis ou
unidade produtiva ou bens económicos imóveis.
em sentido restrito (a empresa, quotas,
ramos de actividade, etc. d) A requisição é uma providência urgente
excepcional no interesse público (ex.:
d) A nacionalização é uma providência guerra, calamidade natural, etc).
extraordinária.

c) Confisco
O confisco tem carácter sancionatório, consistindo na perda, a favor do Estado, da totalidade ou
parte do património em virtude do cometimento de actos ilícitos ou criminosos. Sendo uma sanção,
não lhe corresponde nenhuma indemnização.

A nacionalização, por sua vez, sabe-se que não tem carácter de sanção e pressupõe uma
indemnização ao ex-titular do bem, o que não ocorre quando haja confisco.

O Decreto-Lei nº 16/75, de 13 de Fevereiro previa a conduta dolosa dos particulares na


actividade económica de Moçambique, quer por acção, quer por abandono (artigo 1) a que

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correspondia, em última instância, o confisco sobre os meios de produção (artigo 10, nº 3), sobre
a presunção de abandono.

d) Intervenção do Estado na gestão de empresas privadas


No caso da intervenção do estado na gestão da empresa privada trata-se unicamente da
“gestão” que se torna pública e não a propriedade do bem. A titularidade dos bens continua a ser
pertença dos particulares.

A intervenção é necessariamente temporária, e termina de 3 formas possíveis:


1. Através do retorno da gestão da empresa aos seus titulares,
2. Através de um processo de falência, caso a empresa demonstre ser absolutamente
inviável;
3. Através da nacionalização da empresa, caso o interesse público o exija.

A figura da intervenção do Estado na gestão da empresa privada é de carácter excepcional e


transitório, pois o normal é que o titular da propriedade detenha igualmente a gestão.

Em Moçambique, a figura da intervenção do Estado na gestão da empresa privada está


prevista no Decreto-Lei nº 16/75, de 13 de Fevereiro, que indica no nº 1, do seu artigo 1, que
“sempre que as empresas, singulares ou colectivas não funcionem em termos de contribuir,
normalmente, para o desenvolvimento económico de Moçambique e para a satisfação dos
interesses colectivos, ficarão sujeitas à intervenção do Conselho de Ministros”.

Fundamentos ou justificações da intervenção do Estado nas empresas privadas, segundo o nº


3, do artigo 1 do Decreto-Lei nº 16/75:

a) Encerramento total ou parcial de secções significativas da empresa ou ameaça de


despedimento do respectivo pessoal;

b) Despedimento iminente ou efectivo de parte importante do pessoal da empresa, sem justa


causa;

c) Abandono das instalações ou estabelecimentos e de prédios rústicos ou urbanos pelos seus


proprietários, considerando-se como tal as empresas ou prédios rústicos ou urbanos cuja
propriedade os seus donos, tácita ou expressamente, não se verifique a uma utilização
normal das empresas, ou dos prédios, por período superior a 90 dias (ver artigo 10);

d) Descapitalização ou desinvestimentos significativos ou injustificados, nomeadamente pela


retirada, distracção ou imobilização de equipamentos ou outros bens da empresa, ou actos
preparatórios desse procedimento;

e) Incumprimento ou demora no cumprimento de forma reiterada das obrigações da empresa;

f) Desvio e fundos da actividade corrente da empresa;

g) Empolamento injustificado das despesas gerais da administração.

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Na prática, o que aconteceu é que as empresas intervencionadas foram extintas e o seu


património transferido para o Estado, tendo algumas delas sido transformadas em Empresas
Estatais. O Estado agiu assim ao abrigo do estabelecido no artigo 1 do Decreto-Lei nº 18/77, de 28
de Abril, que foi revogado pela Lei nº 13/91, de 3 de Agosto.

30. AS PRIVATIZAÇÕES
30.1. Noção de privatização

A privatização designa uma técnica pela qual o Estado reduz ou modifica a sua
intervenção na economia a favor do sector privado, implicando, por isso, a redução do
domínio económico e do sector público.

O conceito de privatização, consiste genericamente no movimento redutor do peso do sector


empresarial público efectuado através da transformação legal e factual de empresas com
personalidade jurídica de direito público em empresas de estatuto jurídico privado.

Estreitando o conceito, pode entender-se privatização como:

a) Transferência total ou parcial da propriedade de empresas e/ou bens públicos para


entidades privadas. A natureza pública desses bens ou empresas tanto pode ser
originária como resultar de nacionalizações anteriores (neste caso fala-se de
reprivatização);

b) Concessão a entidades privadas, mediante contrato, da gestão de empresas públicas


ou serviços públicos (ex.: a exploração de petróleo ou a gestão de estabelecimentos de
saúde);

c) Contratação de serviços por entidades públicas a entidades privadas (subcontratação


de serviços públicos a privados);

d) Abertura à iniciativa privada de sectores anteriormente explorados pelo sector público


em regime de monopólio (ex: as telecomunicações, a televisão ou a distribuição de
energia) – trata-se da remoção de restrições à iniciativa. Apesar de não se verificar
verdadeiramente privatização na medida em que não há alienação da titularidade das
empresas públicas, há uma privatização no sentido da abertura aos privados de um
sector de actividade antes restrito ao sector público.

e) Desregulação sempre que o Estado alivia a carga normativa reguladora de um sector de


actividade na produção ou distribuição de um bem ou serviço (ex.: o regime e preços)
permitindo o livre funcionamento das regras de mercado.

f) Processo de submissão dos serviços ou da empresas públicas a regras de gestão de


natureza privada – entende-se como privatização formal.

Entende-se, assim, que nem todas as formas de privatização implicam que o Estado abandone
o financiamento e mesmo o planeamento dos respectivos serviços e que, nalguns casos, não se

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trata de transferência de propriedade ou de gestão públicas mas a de ampliação do papel da
actividade privada ao lado da actividade pública, em concorrência ou conjugação.

30.2. Fundamentos da privatização

O grande movimento de privatizações começa nos anos 70 e 80 do séc. XX, respondendo a


uma lógica crescente de redução do papel do Estado na economia e na vida social. Este
movimento é impulsionado pelo reaparecimento das doutrinas neoliberais e neo-individualistas.

Foram apontadas várias razões para a necessidade das privatizações:

a) A ineficiência das empresas públicas, provocada em parte pelo facto de a gestão


pública sacrificar objectivos económico-financeiros e comerciais aos objectivos políticos
e sociais – ex: contracção de empréstimos, redução de tarifas e preços e manutenção
de emprego;

b) A necessidade de diminuir o desequilíbrio dos orçamentos públicos, aliviando-os dos


défices de algumas empresas públicas e acrescendo-os das receitas provenientes da
venda do respectivo capital e património;

c) A redução do peso político dos sindicatos (Grã-Bretanha) ou das clientelas político-


partidárias (Itália);

d) A intenção de promover o capitalismo popular, ou seja, a distribuição popular de capital


através da participação neste dos trabalhadores das empresas a privatizar.

Como se vê, argumentavam-se razões de ordem financeira, económica, política e ideológica


para justificar o movimento das privatizações.

30.3. Classificação

A privatização pode classificar-se em:


 Formal ou Legal;
 Material;
 Económica e Financeira.

a) Privatização Formal ou Legal: traduz-se, apenas, no recurso pelo Estado de regimes


jurídicos de direito privado, não obstante manter a respectiva titularidade e direcção da
gestão.

b) Privatização Material: traduz-se na transferência da propriedade ou da gestão dos


meios de produção do sector público para o sector privado.

c) Privatização Económica e Financeira: traduz-se na abertura das empresas ao capital


privado, mas sem o estado abdicar do controlo jurídico que lhe advém de uma
participação maioritária.

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30.4. As Privatizações em Moçambique

Ainda em 1989, antes portanto da Constituição de 1990 que haveria de consagrar a abertura à
economia de mercado, o Decreto nº 21/89 já pretendia regular o novo fenómeno da alienação de
parte do sector público a favor de privados.

I. Regime Jurídico

Mas, será a Lei nº 15/91, de 3 de Agosto que irá definir, de forma clara, identificando as
modalidades de alienação a título oneroso de empresas, estabelecimentos, instalações, quotas e
outras formas de participação financeira do Estado. De facto, e mais profundamente, esta lei veio
regular o processo de reestruturação empresarial do Estado (artigo 3).

Definiram-se os sectores de carácter estratégico que obrigavam à permanência nas empresas


públicas (artigo 4) independentemente de posterior alargamento a ser determinado por Decreto do
Conselho de Ministros.

II. Objectivos

Os objectivos para as privatizações são de natureza diversa, económicos , financeiros, sociais


e políticos.

a) Económicos – modernização e aumento da competitividade económica, reforço da


capacidade empresarial nacional e desenvolvimento do mercado de capitais;

b) Financeiros – diminuição dos encargos com o sector público, utilização das receitas das
privatizações para amortização da dívida pública, da dívida do sector empresarial do
Estado;

c) Sociais – intenção de promover uma ampla participação dos trabalhadores das próprias
empresas e dos pequenos subscritores na titularidade do capital das empresas;

d) Políticos – redução do Estado na economia.

Os objectivos desta reestruturação empresarial do Estado estão contemplados no artigo 6.

III. Processo requerido para a alienação

A Lei nº 15/91, de 3 de Agosto consagra, as seguintes modalidades:

a) CONCURSO PÚBLICO - este método é aplicado quando se preveja a afluência de um


considerável número de candidatos. Em caso de igualdade de pontuação dá-se
preferência aos proponentes de nacionalidade moçambicana e aos combatentes da
Luta de Libertação Nacional.

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b) OFERTA OU VENDA PÚBLICA DE ACÇÕES - também consagrada no artigo 3º do
Decreto nº 28/91 de 21 de Novembro, com ela se faculta ao pública a possibilidade de
aquisição de acções de determinada sociedade anónima de responsabilidade limitada.
A venda pode ser feita com base na melhor oferta ou preço a fixar, fixando-se
igualmente o limite de acções que um único accionista pode adquirir.

c) NEGOCIAÇÃO PARTICULAR OU CONCURSO RESTRITO - aqui procede-se a


negociação autónoma após prospecção de potenciais interessados. As propostas
recebidas são avaliadas com base em duas ordens de critérios: técnicos -
compreendendo a análise dos planos de desenvolvimento e viabilização da empresa; a
capacidade técnica de gestão demonstrada pela vocação e experiência do concorrente
e as garantias quanto à idoneidade comercial, financeira, industrial e fiscal, financeiros -
é levada em linha de conta o preço e as condições de pagamento.

d) REALIZAÇÃO DE INVESTIMENTOS PRIVADOS INCLUINDO PELA VIA DE


EMISSÃO DE NOVAS ACÇÕES - recorre-se a esta modalidade sempre que haja
necessidade de aumentar o capital para permitir a realização de novos investimentos,
tendo em vista a reabilitação ou expansão da capacidade produtiva ou de prestação de
serviços, com o objectivo de melhorar a gestão, modernização tecnológica,
diversificação de produções ou actividades e acesso a mercados.

e) ALIENAÇÃO OU VENDA A GESTORES, TÉCNICOS E TRABALHADORES - a lei


prescreve determinadas condições nomeadamente:

i. Prestem serviço a tempo inteiro há pelo menos 5 anos e sejam por ela
remunerados. Poderão também adquirir os reformados e aposentados da
empresa ou do estabelecimento objecto de alienação.

Para as aquisições individuais estabelece-se um limite máximo de 25% da


parcela de capital social reservada a esta categoria de subscritores, ou de 10%
do capital da sociedade.

ii. As acções adquiridas por esta via são intransmissíveis durante um período de 5
anos, dentro do qual estas serão nominativas, exceptuando, obviamente, as
situações jurídicas sucessórias que envolvam transmissibilidade. Em relação aos
gestores, técnicos e trabalhadores da empresa o prazo de intransmissibilidade é
de 3 anos.

IV. O investimento estrangeiro nos processos de alienação

A alienação é aberta ao investimento estrangeiro podendo mesmo ser o capital maioritário


(artigo 18 nº 1), sem prejuízo do acesso ao capital pelos gestores, técnicos e trabalhadores da
empresa. O capital decorrente do investimento estrangeiro não poderá, no entanto, corresponder a
100 por cento (artigo 18 nº 3).

V. O Fundo de Privatizações

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O produto gerado pela alienação constituirá receita de um fundo próprio a ser criado pelo
Conselho de Ministros (artigo 25) e essas receitas terão como destino prioritário:

a) Estimular o investimento em actividades produtivas e de prestação de serviços;


b) Criação de emprego e introdução de novas tecnologias;
c) Promoção e dinamização de actividade do empresariado nacional de pequena e média
dimensão;
d) Reinvestimento no sector empresarial do Estado.

VI. Outras leis sobre a matéria de Privatizações

No seguimento desta Lei nº 15/91, são de particular importância:

a) O Decreto nº 28/91, de 21 de Novembro – regulamenta mais detalhadamente o


quadro legal, os critérios e modalidades de privatização das empresas,
estabelecimentos, instalações e participações financeiras do Estado;

b) A Lei nº 17/92, de 14 de Outubro – clarifica a aquisição de capital por parte de


Gestores, técnicos e trabalhadores;

c) O Decreto nº 19/93, de 14 de Setembro – visa criar condições para regular a situação


jurídica de empresas, prática necessária ao processo de reestruturação do sector
empresarial do Estado;

d) O Decreto nº 20/93, de 14 de Setembro – estabelece um regime especial quanto a


modalidades e prazos de realização de participações do capital por parte Gestores,
técnicos e trabalhadores nacionais;

e) Resolução nº15/2001, de 10 de Abril – define as linhas gerais da Política de


Reestruturação do Sector Empresarial com Participações do Estado.

31. A CONCESSÃO DE BENS E SERVIÇOS PÚBLICOS

A concessão de bens e serviços públicos consiste na atribuição, por contrato, pela


Administração Pública a uma entidade externa (concessionária), da gestão e/ou da exploração de
uma catividade ou serviço público.

O facto de os contratos de concessão preverem com frequência um longo período de validade,


torna os concessionários numa espécie de colaboradores permanentes da Administração, tendo
levado, inclusive a sua qualificação como “órgãos indirectos” da Administração.

A entidade concessionária poder uma empresa de capital privado, misto ou público.

A concessão faz-se através de um contrato de natureza administrativa celebrado entre o


Estado e a entidade concessionária. No âmbito deste contrato, o concessionário compromete-se a

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prosperar e/ou explorar bens do domínio público, a projectar, construir e manter uma obra e/ou
fazer funcionar um serviço.

Nos actuais esquemas de concessão de obras públicas o concessionário é encarregado de


tudo: projectar, financiar, construir as infra-estruturas e explorar o serviço, cobrando as tarifas ou
taxas aos utentes e transferindo, no final o serviço para o Estado.

O concessionário assume o exercício de actividade por sua conta e risco. Determina (sujeita a
um limite máximo contratual) e cobra, como já vimos, valores de taxas ou preços, na quilo que
constitui em princípio um direito seu, mas à autoridade pública reserva-se um poder de controlo.

No caso da construção de uma obra, o contrato pode prever a atribuição de poderes


necessários à sua execução, nomeadamente o de proceder a expropriações de utilidade pública.

As recentes alterações ao sector empresarial do Estado transformando muitas empresas


públicas em sociedades comerciais e em empresas privadas deram uma maior relevância a esta
figura da concessão de bens e serviços públicos.

* * *

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