O documento discute como o conceito de raça foi construído socialmente para justificar práticas discriminatórias e hierarquias raciais, e como essas ideias influenciaram a antropologia e a sociedade brasileira no final do século XIX, quando a nacionalidade passou a ser vista como qualidade biológica e os europeus eram vistos como capazes de progresso ao contrário de negros e mestiços.
O documento discute como o conceito de raça foi construído socialmente para justificar práticas discriminatórias e hierarquias raciais, e como essas ideias influenciaram a antropologia e a sociedade brasileira no final do século XIX, quando a nacionalidade passou a ser vista como qualidade biológica e os europeus eram vistos como capazes de progresso ao contrário de negros e mestiços.
O documento discute como o conceito de raça foi construído socialmente para justificar práticas discriminatórias e hierarquias raciais, e como essas ideias influenciaram a antropologia e a sociedade brasileira no final do século XIX, quando a nacionalidade passou a ser vista como qualidade biológica e os europeus eram vistos como capazes de progresso ao contrário de negros e mestiços.
(orgs.). Por que “raça”?: Breves reflexões sobre a questão racial no cinema e na antropologia. Santa Maria: Ed. UFSM, 2007. “O que caracteriza o conceito de raça é sua imponderabilidade, o fato de ser, antes de tudo, uma construção social que interfere nas relações sociais, informa comportamentos individuais e coletivos, instrui determinadas práticas discriminatórias na medida em que fornece signos e símbolos de pertencimento – fatores que interferiam também nos sistemas classificatórios produzidos no campo científico. A ideia de “tipo” contornou as dificuldades classificatórias através do percentuais de características que permitiam lidar com a heterogeneidade própria dos fenótipos: além do uso do critério mais popular da cor da pele e da similitude anatômica fornecida pelas estatísticas antropológicas, os cientistas apelaram para pressupostos estéticos, comportamentais e morais e a consequente desqualificação da humanidade de pele mais escura” (p.106-107). “A omelete chamada “raça” não tem existência fora da frigideira na qual foi transformada pelo calor da imaginação antropológica” (ASHLEY-MOTANGU, 1945, p.32) Tal figuração é exemplar e mostra a falta de sentido da forma classificatória, pois o “tipo”, afinal, não se aplica à realidade, é coisa artificialmente criada e ajudou a conformar o conceito de raça como sinônimo de grupo de pessoas que se distinguem pela ancestralidade comum, supondo uma totalidade fixa, quando a realidade biológica aponta para a variedade de espécie humana”. (p.108). “A questão fundamental nessa discussão não é, portanto, o conceito de raça, mas o racismo, palavra que, segundo Banton (1977, p.156), foi introduzida na língua inglesa “no final dos anos 30, para identificar um tipo de doutrina que, em essência, afirma, que a raça determina a cultura”. Os termos “racismo” e “racista” passaram a ser usados por aqueles que criticaram as doutrinas da desigualdade das raças que vicejaram dentro e fora do campo científico desde o início do século XIX” (p.110). “O trabalho de Gobineau foi escrito em um momento de grande agitação na Europa, marcado por movimentos sociais de grande abrangência, envolvendo a massa (ou classes subalternas), e pelo comunismo, sendo a ideia de “luta de raças” concorrente direta da tese da “luta de classes”, lembrando que o Manifesto Comunista de Marx e Engels surgiu em 1848, ano marcado pela revolução popular em vários estados alemães e pelo início da II República da França. O pessimismo de Gobineau, assentado na crença de que muita mistura de sangues produz degeneração, obviamente tinha relação com a perda do poder político da sua própria classe aristocrata. Segunda Hannah Arendt (1976, p.76), a peculiaridade de Bobineau “reside no fato de que, em meio a ideologias que louvavam o progresso, ele profetizava a ruina e o fim da humanidade numa lenta catástrofe natural”. Por outro lado, numa perspectiva estritamente política, o recado do Essai era simples: o poder devia estar nas mãos de uma elite racial ariana – espécie de aristocracia natural mais apta a governar em lugar dos regimes democráticos que ameaçavam a civilização” (p.111). “A partir de Gobineau e do argumento da maior antiguidade das línguas germânicas foi fácil inventar a “raça ariana” e sua vinculação aos povos germânicos transformados na raça mais pura e progressista do ocidente. O mito ariano e o dogma da desigualdade das raças, segundo Gobineau, voltaram à baila em fins do século XIX, apropriados pelos doutrinadores racistas chamados “darwinistas sociais”. Estes acreditavam que os “tipos permanentes” prevaleceriam apesar da grande variação, presumindo que a mestiçagem, com o correr do tempo, acabaria produzindo híbridos estéreis. A expressão “darwinismo social” significa, simplesmente, uma interpretação peculiar dos princípios da evolução segundo Darwin, aplicados à sociedade. O desfecho imaginado para a “luta de raças”, afinal, era a “sobrevivência dos mais aptos”. Isto é, próceres das ciências raciais como Lapouge, Otto Amon e muitos outros, falavam em “seleção social” – o mecanismo que devia completar e até suplantar a seleção natural – reduzida a conflitos de elementos “antropológicos” (ou de “luta de raças”). Aí entra em cena o pior dos racismos: a noção de que a seleção social deve ser dirigida para o melhoramento da raça, um pressuposto que também marcou outra ciência: a Eugenia”. (p.111-112). “Tais concepções acerca da variabilidade humana tiveram ressonância no Brasil, particularmente os enunciados sobre a mestiçagem – obstáculo maior à coerência das tipologias. De certo modo, por aqui, as desigualdades sociais também foram atribuídas à ordem natural, o que explica porque raça se tornou a palavra-chave na concepção do progresso e da ordem social. A influência das teses racistas intensificou-se no final do século XIX com a expansão imperialista e o avanço do capitalismo e, conforme Malik (1996), a hierarquia baseada na cor foi reforçada: a linha de cor, como meio de compreender e dividir o mundo, deixou em segundo plano a ideia da inferioridade das classes baixas europeias (que continuavam sendo alvo da Eugenia). Para Mailik (1996), a noção de raça não deu lugar à desigualdade; foi a desigualdade que produziu a raça, isto é, as diferenças sociais originaram a ideia de hierarquização racial e não o contrário. Por isso mesmo, o conceito foi desenvolvido na Europa para interpretar novas relações sociais no interior do Estado-nação e, apropriado pelos nacionalistas, ajudou a demarcar pertencimentos nacionais e excluir minorias incômodas” (p.114-115).
O negrito expõe um ponto importante da documentação que analiso. A nacionalidade
transformou-se em qualidade, antecedendo o referente racial que marca os textos da segunda metade do século XIX. “As apropriações simbólicas da teoria da evolução e a própria naturalização da História contribuíram para criar a imagem das raças históricas, enunciadas no ensaio de Gobineau, o que possibilitava, por exemplo, converter a nacionalidade num conceito biológico. Também no Brasil a ideia de raça serviu para muitas interpretações da “formação nacional”, refletida nos interesses geopolíticos de consolidação do território pela colonização europeia. Os debates sobre a abolição da escravatura e a questão do povoamento vinculado à imigração europeia marcaram os primeiros enunciados de referência racial. No momento histórico em que se iniciava a diáspora europeia para as Américas, no início do século XIX, temia-se a ocorrência de rebeliões escravas, a exemplo do Haiti. Em 1818, a imigração suíça para Nova Friburgo (RJ) foi considerada parte de um processo civilizatório e início de um possível reforço aos batalhões de “brancos”. Sem usar a palavra raça, ainda pouco conhecida, fez-se a associação entre cor de pele e capacidade de progresso: negros e mestiços podiam ser escravos, servos, coadjuvantes, mas não eram considerados adequados para o trabalho livre ou para agir por livre iniciativa”. (p.115-116). USAR O TRECHO FINAL.
04.a SEYFERTH, Giralda Construindo A Nação Hierarquias Raciais e o Papel Do Racismo Na Política de Imigração e Colonização in Raça, Ciência e Sociedade