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Iniciamos esta unidade por um fato que marcou a História: o encontro, a partir
do século XVI, entre os europeus e as sociedades das Américas, da África e da
Ásia, que os europeus até então desconheciam. E por que escolhemos esse
momento? Porque o contato entre essas civilizações possibilitou a construção do
sistema social que predomina no mundo atual. Muito mais tarde, no século XIX, o
próprio nascimento das Ciências Sociais teve origem na reflexão sobre o encontro
entre diferentes culturas e suas consequências.
Inicialmente, vamos tomar como base os modelos que os europeus utilizaram
para pensar os nativos daqueles lugares que consideravam “distantes”. A partir
dessa visão de mundo, vamos refletir sobre as diferenças — sociais, culturais,
étnicas, políticas, entre outras —, um tema fundamental para entender as
sociedades de um ponto de vista antropológico.
1 - A CONSTRUÇAO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
Eles observaram que elas não possuíam uma organização burocrática que
centralizasse decisões. Não tinham um Estado, que é um elemento importante e
fundamental na organização moderna do mundo. As sociedades primitivas
pareciam desorganizadas.
Para eles o que chamamos de "família" nada mais é que um nome para o
sistema de parentesco. Há sociedades matrilineares (descendência pela linha
materna).
Em diversos lugares do mundo se tem um estilo onde não é encontrado o
"padrão" que é mãe, pai e filhos;
Algumas sociedades não tem Estado, mas seguem regras baseadas no sistema de
parentesco.
Numa sociedade com Estado diversas questões são resolvidas por um sistema
jurídico criado para regular a vida social.
Numa sociedade sem Estado não há regras separadas, é um conjunto de regras
relativas à ordem do parentesco e são elas que permitem a vida em sociedade.
Para os intelectuais, sociedades organizadas pelo parentesco representam um
estágio anterior de desenvolvimento.
Nesta foto de 1918, vemos Malinowski entre os nativos das ilhas Trobriand.
3 - SOCIEDADES INDÍGENAS E O MUNDO CONTEMPORÂNEO
CONCLUSÃO
Apesar dos números e relatos que demonstram a dizimação de grupos indígenas
durante os séculos pós-conquista colonial, as nações indígenas praticaram ações e
estratégias de resistência física e cultural. Ao longo do século XX, muitas delas se
mobilizaram para defender seus direitos. O fim do século XX testemunhou uma
revitalização das populações indígenas, embora em muitos lugares do mundo os
processos de opressão permaneçam.
Na aldeia Ipatse, no Parque Indígena do Xingu, integrantes do Coletivo Kuikuro
de Cinema entrevistam visitante. Foto de 2007.
4 - MITOS, NARRATIVAS E ESTRUTURALISMO
Nossa ideia das sociedades indígenas é bastante deturpada porque elas são
diferentes demais da nossa própria sociedade e essa diferença parece uma
barreira intransponível. Mas a Antropologia, desde o começo do século XX, vem
procurando construir uma ponte, dando sentido à experiência das populações
indígenas (e de outras populações, como as camponesas, as tribos urbanas, as
elites, os grupos religiosos, os imigrantes, etc.)
Ao "atravessarmos a ponte", deparamo-nos com mundos cujas complexidade e
sofisticação estavam como que escondidas por nossos preconceitos. Ajudar a
enxergar essa complexidade é uma das tarefas da Antropologia, e um dos efeitos
dela é desestabilizar aquelas certezas evolutivas produzidas no século XIX e até
hoje presentes em nossa vida. Assim, qualquer tentativa de estabelecer uma linha
de evolução entre as sociedades é equivocada.
O francês Claude Lévi-Strauss (1908--2009), o mais célebre antropólogo do século
XX, cuja obra influenciou e continua a influenciar o pensamento social
contemporâneo, desenvolveu um método de análise que chamou de
ESTRUTURALISMO e fez um mergulho pela enorme complexidade dos MITOS
provenientes de diversas populações, do sul até o norte das Américas, revelando
por meio deles o que denominava PENSAMENTO AMERÍNDIO.
Para Levi-Strauss, os mitos demonstram um pensamento sofisticado e
complexo. Segundo ele, os mitos traduzem preocupações
fundamentais das populações que os criam e fazem uma distinção
entre natureza e cultura. Essas populações estariam empenhadas em
se separar da natureza, aspecto que o olhar etnocêntrico tem
dificuldade de entender.
A essência de uma teoria complexa como o estruturalismo, que
pretende demonstrar que o pensamento humano se organiza em torno
de oposições (alto e baixo, fora e entro, quente e frio, etc.) deve muito
ao próprio pensamento ameríndio. É como se Levi-Strauss pensasse o
mito a partir do pensamento dos nativos das Américas. O
estruturalismo, um método quase matemático, foi aplicado também ao
estudo do parentesco, buscando reduzir a multiplicidade de sistemas e
chegar a uma conjunto de sistemas genéricos, que serviriam de
modelos ou padrões para todas as variedades de pensamento.
A arte também foi objeto da reflexão sistemática de Lévi-Strauss, e,
nesse caso, a sensibilidade artística das populações ameríndias foi
fundamental para sua análise.
Claude Lévi-Strauss (1908-2009) foi um grande antropólogo,
etnólogo e professor francês. Formado em direito e filosofia
na França e produtor de uma vasta obra, Lévi-Strauss foi o
criador da antropologia estrutural e um dos maiores
pensadores do século XX.
Após completar seus primeiros estudos de graduação, foi
convidado, em 1935, a lecionar na recém-criada
Universidade de São Paulo através de uma missão
universitária francesa. A estadia, que foi até 1939, não
poderia ter sido mais produtiva: muito mais do que
colaborar para o estabelecimento da maior universidade
brasileira, durante esse período, Lévi-Strauss fez diversas
expedições pelo interior brasileiro, onde estudou comunidades indígenas e teve a sua grande
vocação para a etnologia desperta. É o registro dessas viagens que está presente em Tristes
Trópicos (1955), livro que mescla elementos antropológicos de estudos acadêmicos com a
descrição pessoal e narrativa literária.
Contrário à ideia de superioridade e privilégio da civilização ocidental, acreditava e enfatizava
que a mente selvagem e tribal é igual à mente civilizada. O antropólogo rejeita a ideia de
privilégio do ser humano no mundo, e acredita que nós devamos mudar nosso
comportamento em prol de um mundo melhor, conforme sua célebre frase dita em 2005,
quando recebeu o 17º Prêmio Internacional Catalunha: " Meu único desejo é um pouco mais
de respeito para o mundo, que começou sem o ser humano e vai terminar sem ele - isso é
algo que sempre deveríamos ter presente".
Curare, cipó Indígena com zarabatana na Aldeia Rouxinol,
venenoso para habitada por grupos Barasano e Tuiuca, as
flecha, Floresta margens do igarapé Tarumã-Açu. Manaus
Amazônica, 2008. (AM), 2008.
Antes da chegada dos portugueses o que viria a ser o Brasil era uma área
densamente povoada por uma enorme diversidade de populações indígenas.
Os processos levados a cabo por esse contato resultaram em grandes
mudanças, como o avanço da mortalidade, a desestruturação de sociedades
e sua dispersão, grandes deslocamentos, que por sua vez produziram
conflitos entre populações indígenas, ajuntamentos remanescentes de
diferentes etnias.
A história das populações indígenas no Brasil desmente a imagem fantasiosa
de povos cujo modo de vida permaneceu o mesmo desde a chegada dos
europeus ao continente americano. Estudos antropológicos, arqueológicos e
linguísticos indicam intensos processos de transformação, adaptação e
mudança entre as populações indígenas, processos dos quais temos apenas
alguns vislumbres, já que as fontes para o estudo são raras ou inexistentes.
Segundo a antropóloga luso-brasileira, Manuela Carneiro da Cunha, em
1500 havia entre 1 e 8,5 milhões de indígenas (as estimativas são muito
imprecisas). Em 150 anos, acredita-se que até 95% dessa populações tenha
sido dizimada, seja por doenças espalhadas pelos europeus, seja pelo
confronto direto, seja por guerras decorrentes dos deslocamentos
provocados pela colonização ou ainda pelos rigores do trabalho forçado.
No início da colonização, os portugueses mantiveram contatos
relativamente amigáveis com os indígenas, mas logo passaram a escravizá-
los, obrigando-os a trabalhar. Entretanto, os indígenas foram também
aliados dos colonizadores nas lutas para conter ou expulsar franceses,
holandeses e espanhóis, como uma "fronteira viva", segundo afirma a
antropóloga brasileira Nádia Farage.
Entre os séculos XVII e XVIII, prevaleceu o modelo de catequização jesuítica,
o que gerou conflitos em torno do trabalho forçado e disputas políticas com
a Coroa portuguesa. No século XIX, com o avanço da escravidão africana, o
foco mudou: nesse momento interessavam mais as terras do que o trabalho
dos indígenas.
A constituição de 1988 marcou uma virada na percepção dos indígenas:
foram deixadas de lado as iniciativas de "civilizá-los" e formulados artigos
que reconhecem o direito de suas populações à posse da terra e à
conservação de seus costumes e tradições. Hoje, segundo o Instituto
Socioambiental (ISA), há no Brasil cerca de 240 povos indígenas, falantes de
mais de 180 línguas diferentes. De acordo com dados do Censo 2010 do
IBGE, somam 817.963 pessoas, das quais 502.783 vivem em áreas rurais.
Correspondem a 0,42% da população brasileira.
Em fotografia de 1972, construção da rodovia Transamazônica no trecho iniciado em
Altamira-PA.
Bibliografia: Sociologia Hoje
Henrique Amorim
Celso Rocha de Barros
Igor José de Renó Machado
FIM