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Resumo: O presente artigo debruça-se sobre o atual sistema tributário brasileiro, explicitando a
intrínseca relação entre Justiça Tributária e Justiça Social e investigando a relação entre a insa-
tisfação social com o sistema tributário nacional e a incapacidade estatal de atender as demandas
sociais. Confronta-se tal sistema com os princípios da capacidade contributiva e da isonomia
tributária, expõe-se sua natureza predominantemente regressiva, bem como se propõem à pro-
gressividade, à proba e efetiva destinação dos recursos tributários, notadamente os advindos das
contribuições, e o aumento da participação política dos cidadãos como desafios para o alcance
de uma maior justiça tributária e social.
Palavras-chave: Justiça Tributária. Princípio da isonomia. Princípio da capacidade contributiva.
Justiça Social.
Introdução
Há muito a sociedade brasileira questiona a justiça do sistema tributário nacional, a
elevada carga tributária, a guerra fiscal e o arrocho ao contribuinte, não sendo inédito afirmar que
no Brasil há grande opressão da tributação sobre o cidadão comum e sobre as atividades produtivas.
A voracidade do sistema tributário, contudo, não guarda equivalência quantitativa e
qualitativa com as ações sociais do Poder Público, de forma a cumprir os direitos sociais previstos
na Constituição de 1988.
Daí surgem diversas questões a serem analisadas, a fim de responder se haveria
relação entre a insatisfação da sociedade com o sistema tributário nacional e a incapacidade do
Poder Público de atender de forma satisfatória às demandas sociais, bem como se a alegada in-
justiça na captação de tributos estaria entre as causas de um quadro de injustiça e desigualdades
sociais, notadamente naquelas áreas mais sensíveis e críticas para o bem-estar da população, as
que envolvem os direitos sociais previstos no art. 6º da Constituição da República.
Correlacionam-se a essas questões, a própria averiguação da compatibilidade do
sistema de captação de tributos com os princípios constitucionais tributários – mormente os
O mesmo autor (Mota, 2010, p. 201) também alerta para a necessidade de enxergar
no tributo não só sua função fiscal, arrecadatória, mas também sua função ética, enquanto meca-
nismo utilizado pelo ente estatal - na qualidade de criação da sociedade -, para buscar implementar
a justiça social:
Portanto, a tributação no Brasil atual não mais deve ser considerada um mero instrumento
de geração de recursos para o Estado, mas um instrumento que, embora tenha esse objetivo
mediato, ‘deve estar em sintonia com os demais objetivos constitucionais’.
A finalidade (objetivo, fim a que se destina o tributo) buscada pelo legislador infraconstitu-
cional impõe dever o tributo na atualidade cumprir indiretamente uma função (ação, utili-
dade para consecução de seus objetivos) que caberia diretamente ao Estado contemporâneo
cumprir: a função social. Dessa forma, o tributo na atualidade é instrumento de alcance
daquela função social do Estado e, ao mesmo tempo, também cumpre sua função social.
Não se pretende afirmar que a Justiça Social no Brasil pode ser alcançada, uni-
camente, por uma maior Justiça Tributária, haja vista que a injustiça social brasileira tem como
principal motor a má distribuição de renda, a qual envolve inúmeros fatores culturais e históricos
negativos que não podem ser ignorados.
Mesmo assim, entende-se que o Estado, ao atuar como gestor das riquezas nacionais
e como instrumento político de implementação dos direitos e garantias constitucionais, utiliza-se
do poder de tributar como uma das principais ferramentas para o desenvolvimento do ideal de
solidariedade social. Daí a íntima ligação entre uma necessária Justiça Tributária e uma almejada
Justiça Social.
Tal princípio é considerado por Carrazza (2006, p. 86) como “um dos meca-
nismos mais eficazes para que se alcance a tão almejada Justiça Fiscal”, instrumentalizando
a igualdade republicana:
f) O princípio da capacidade contributiva hospeda-se nas dobras do princípio da igualdade e
ajuda a realizar, no campo tributário, os ideais republicanos. Realmente, é justo e jurídico
que quem, em termos econômicos, tem muito pague, proporcionalmente, mais imposto
do que quem tem pouco. Quem tem maior riqueza deve, em termos proporcionais,
pagar mais imposto do que quem tem menor riqueza. Noutras palavras, deve contribuir
mais para a manutenção da coisa pública. As pessoas, pois, devem pagar impostos na
proporção dos seus haveres, ou seja, de seus índices de riqueza (Carrazza, 2006, p. 86).
A capacidade contributiva deveria estar subjacente em qualquer espécie tributária, revelada pelo
valor do objeto (materialidade). Tendo em vista que a tributação quantifica-se por uma base de
cálculo (a qual se aplica uma alíquota), salvo os casos excepcionais de tributo fixo, e como esta
nada mais é do que o próprio valor (econômico) da materialidade, sempre será possível medir
a intensidade (econômica) de participação do contribuinte no montante do tributo.
(...)
Observa-se que a capacidade contributiva não se refere apenas a impostos (art. 145, §1º),
pois é possível inferir sua aplicação às taxas (art. 5º, LXXIV e LXXVII, da Constituição), no
caso de o Estado ser obrigado a prestar assistência integral e tornar gratuito o registro civil
de nascimento e certidão de óbito, aos que comprovarem insuficiência de recursos. Trata-
-se de situações excepcionais, uma vez que as taxas levam em consideração os custos dos
serviços públicos, e não, particularmente, a situação patrimonial/econômica do beneficiário.
O princípio é aplicável, também, às contribuições sociais que tenham materialidades per-
tinentes aos impostos, tais como a Cofins (art. 195, I, b, da CF) e o PIS (art. 239 da CF)
relativamente ao faturamento e à receita (Melo, 2010, pp. 32-33).
A partir desse mesmo estudo, Leal (2012, p. 25) usa de certa ironia para qualificar
a matriz tributária brasileira:
A matriz tributária brasileira – em paradoxal incoerência com os princípios e objetivos
fundamentais da República instituída pela Constituição de 1988 – é cruelmente regressiva,
o que significa dizer que, em boa medida, quem tem menos capacidade contributiva paga
um percentual maior a título de tributos.
Em outras palavras, o sistema tributário brasileiro, globalmente considerado, funciona
como uma espécie de Robin Hood às avessas: tira dos pobres para dar para os ricos; isto
é, redistribui riqueza dos mais necessitados para os mais afortunados.
Além disso, urge que a sociedade brasileira também discuta o alargamento da vincu-
lação das receitas tributárias em detrimento da discricionariedade obscura da Administração Pública.
Tais desafios, segundo Machado Segundo (2009, pp. 229-230), só serão realmente
enfrentados a partir de um incremento da participação política dos cidadãos brasileiros na gerência
das riquezas nacionais, não somente através da eleição de representantes, mas sim na esteira do
ideal da democracia participativa, pela participação direta do povo na vida política e no controle
dos orçamentos e dos gastos públicos.
Conclusão
Em razão do que foi exposto anteriormente, podem ser apontadas as seguintes conclusões:
a) o Estado brasileiro, enquanto ente criado pelo meio social para atender seus interesses primor-
diais, expressos, hodiernamente, na Constituição Federal de 1988, tem, no poder de tributar,
Referências
ALVES, Henrique Napoleão. Tributação está na contramão dos Direitos Humanos. São Paulo:
Revista Consultor Jurídico, 25 de agosto de 2009. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-
-ago-25/tributacao-regressiva-contramao-direitos-humanos. Acesso em 15.ago.2010.
BALEEIRO. Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. 16 ed. atual. por Dejalma de
Campos. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
BRASIL. Constituição (2010). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: DF,
Senado, 1988.