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Arquiteto FAU/UFRGS (1966), Mestre em Planejamento Regional e PhD em Ciências Sociais pela Syracuse
University (1972), criador/ coordenador PROPUR / UFRGS, Coordenador do texto e execução da PNDU do
II PND. Dirigiu entidades federais (EBTU, DENATRAN) e lecionou na UFRGS, UFSM, Universidade de
Paris XII, CNAM, FGV, UnB. Consultor BIRD e BID. Membro INSPER, IHG DF E ICOMOS CO.
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Direito Urbanistico e Direito Urbano são sinônimos neste texto. A advogada Claudia Dutra entende que "O
direito urbanístico é o que temos consagrado na CF, e é uma disciplina com suas e "que direito
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Cada conferência estadual que assisti adotou um rumo próprio. Alguns exaltaram o
Estatuto da Cidade, outros avaliaram temas transversais, outros entenderam que a "lei não
e/ou que seus instrumentos foram pouco usados. Em alguns estados houve palestras
que ofereceram visões aprofundadas sobre o direito urbano, com novos conceitos e
importantes proposições. Como ocorreu no Congresso de Direito Urbanistico da OAB/RS,
onde Fernando Alves Correia tratou da evolução e do cenário atual do direito urbano
português enquanto utopias e conceitos jurídicos eram analisados por Vanêsca Buzelato
Prestes, em palestra sobre "Corrupção Urbanística e o Estatuto da Cidade" e Victor Carvalho
Pinto avaliava instrumentos do direito urbano ao tratar do "Passado, Presente e Futuro do
Estatuto da Cidade." Fábio Scorel Vanin também tratou do conceito de Grandes Projetos
Urbanos (GPU) outra proposta inovadora.
urbano é toda a normatividade de demais disciplinas que incidem nas áreas No documento adoto os
conceitos de "stricto sensu" e "lacto sensu", respectivamente.
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ver MEIRELLES, Hely Lopes. O Direito de Construir. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 1979.
Escreve Hely: "Esse anteprojeto de lei foi elaborado por nós e pelo Prof. Eurico de Andrade Azevedo, sob
orientação do Secretário da CNPU, urbanista Jorge Guilherme Franciscone (sic), após exame de todos os
subsídios apresentados pelos demais integrantes da mesma Comissão, técnicos de órgãos oficiais e de
Prefeituras." p.101. Claudia Dutra coordenou a área jurídica da Secretaria Executiva da CNPU.
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A territorialidade é aqui destacada porque o território é componente inerente e
essencial à questão urbana. Tanto no saber como na prática urbanística. O território é o
de usos, ocupações, transformações, direitos e da práxis no solo, no solo-criado e no
sub-solo urbano. Apesar disso, perdeu importância depois que houve uma ruptura nos
fundamentos do direito urbanístico que acompanhou a redemocratização do país, nos anos
80 Até então, o direito urbanístico era aquele ramo do direito que estuda o conjunto de
legislações reguladores da atividade urbanística, isto é, aquelas destinadas a ordenar os
espaços habitáveis. Como destacou Claudia Dutra, coordenadora jurídica da SE / CNPU,
"havia uma clara estratégia de desenvolvimento territorial e urbano para a qual a atualização
da legislação urbanística era peça fundamental."
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direito urbano" porque orientado para aspectos abstratos e conceituais do direito urbano, em contraponto ao
direito aplicado e pedestre adotado na gestão, governança e na práxis urbana.
5 FERNANDES, Edésio.A Nova Ordem Jurídico-Urbanística no Brasil. Revista Magister de Direito Imobiliário,
Ambiental e Urbanistico. nº2, pp.5 - 26. Ver Anais do V Congresso Brasileiro de Direito Urbanistico. Manaus 2008. O
Direito Urbanístico nos 20 anos da Constituição Brasileira de 1988 - Balanço e Perspectivas.. Organizado por Nelson
Saule Junior et al. Porto Alegre, Magister. 2009
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no fruto das relações sociais que devem ser juridicamente reguladas, isto é, na regulação da
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produção social do espaço urbano.' Linha de pensamento que tornou-se dominante e
alterou profundamente os marcos teóricos, prioridades e práticas do planejamento urbano e
territorial, a partir dos anos 80.
6 MEDAUAR, Odete. Caracteres do Direito Urbanístico. Revista dos Direitos Difusos, Rio de Janeiro, Instituto
Brasileiro de Advocacia Pública. (IBAP), agosto 2000, in Direito urbanístico, pt.wIkipedia.org.
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climáticas, com adesão ao plano nacional de energia e clima estabelecido pelo governo
português. Dentre outros.
Quanto a reabilitação urbana tema atualíssimo para que haja a revitalização das
áreas centrais de grandes cidades, a preservação do valor econômico de bens imobiliários e
a preservação do patrimônio histórico cultural lembrou como seu uso foi essencial na
recuperação de áreas degradadas em Lisboa e em o Porto, no suporte ao turismo e nas
atividades econômicas locais. Destacou a importância da segurança, do desenho e da
morfologia na reabilitação urbana e de a comunidade ser os "olhos das Os PDUs sendo
instrumentos que utilizam o direito urbanístico para incentivar e promover a valorização do
patrimônio cultural.
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Ao escolher o tema da licitude e da corrupção urbanística sensu Vanêsca
Prestes recupera uma preocupação central de juristas, gestores e urbanistas do século
passado. Como Hely Lopes Meirelles, que na minuta do projeto de lei para o parcelamento
do solo urbano incluiu penalidades claramente explicitadas para ilicitudes em cada
atividade.11 Como magistrado, professor, Promotor e Secretário Estadual de Justiça, Hely
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Outras formas de expressão da corrupção urbanística sendo "Corrosão do Sistema da "Corrosão dos Sistemas
que operam na Cidade (ex: direitos e política; economia e temas que não são vistos como corrupção,
mas que existem "o espaço que não se
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Agradeço à conferencista pela leitura e correções de versão preliminar. Indico abaixo as transcrições de seu
e-mail e destaco citações de transparências e transcrições de sua conferência . O texto é de minha inteira
responsabilidade.
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Outras formas de expressão da corrupção urbanística sendo "Corrosão do Sistema da "Corrosão dos
Sistemas que operam na Cidade (ex: direitos e política; economia e
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Há inúmeras áreas do saber cientifico que tratam da dinâmica, da gestão e da governança do território urbano
e por isso integram a ciência urbanística e regional. A validade do conhecimento, em cada uma destas áreas da
ciência, depende de hipóteses, estudos e aferições cientificas para que se estabeleça o que é falso e aquilo que
é verdadeiro.
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Projeto de Lei do Senado nº18 / 1977, que sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras
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entendia que as leis são inócuas sem a clara indicação de procedimentos administrativos e
de penalidades para procedimentos ilícitos seu tratamento ao conceito de lícito/ilícito
sendo diferente daquele adotado pela Prof. Vanêsca.
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Na origem e gênese de códigos e leis urbanas estão acampamentos militares e cidades planejadas, normas de convivência
e "códigos de postura", normas e leis de ordenamento territorial e edilício, planos de embelezamento, de saneamento e de
infra-estrutura viária urbana. Bom exemplo sendo a "Recopilación de Leyes de las Indias" de 1680 modelo de código
urbanístico. Nos dias de hoje, a Wikipedia define Direito Urbanístico como aquele do direito que estuda o conjunto
de legislações reguladores da atividade urbanística, isto é, aquelas destinadas a ordenar o s espaços Mas logo
muda de rumo e adota o entendimento do MNRU: disso, o enfoque está menos na ordenação do território e mais
no fruto das relações sociais que devem ser juridicamente reguladas, isto é, na da produção social do espaço
Fato correlato foi a Emenda Constitucional nº 19/1977, que alterava "a redação da alínea e, item XVII do artigo
8º da CF, atribuindo competência à União para legislar sobre normas gerais de desenvolvimento urbano." Emenda apoiada
pelo Executivo, aprovada em Comissão e que não chegou a Plenário.
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O entendimento da conferencista é que o direito urbanístico, como disciplina constitucional, tem sua gênese na CF 88.
O que coloca no limbo e no esquecimento o direito urbano que sustentou leis de planos diretores urbanos implantados a
partir do século XVIII, bem como leis estaduais e federais, e normas jurídico-administrativas que atenderam preceitos
constitucionais do século passado, que "tratavam do ordenamento dos espaços habitáveis." Ou seja: havia um direito urbano
naquela época. Desta forma, a conferencista segue o pensamento dominante, em Seminários de OABs e IABs, no atual
"estado da arte do direito urbano. Observe-se que, em eventos comemorativos do Estatuto da Cidade, a maioria dos
expositores considerou que o direito urbanístico brasileiro surgiu a partir da Constituição, nos anos 80. O entendimento foi
corrigido na palestra de Victor Carvalho Pinto (abaixo), que recolocou a questão do território urbanizado como foco da
teoria e da prática da gestão, da governança e do planejamento urbano.
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Após afirmar que sem os atuais princípios constitucionais "não poderiam fazer a
Reforma Urbana, pois esta faz parte, integra o sistema da Vanêsca Prestes lembra
que "Os princípios de direito urbanístico decorrem da análise jurídica da Dimensão
Constitucional do e que direito urbanístico é baseado nos fundamentos
constitucionais que tem como objetivo a construção de um meio urbano Eéa
partir da sustentabilidade urbana que a Prof. Vanêsca estabelece seu mais criativo e
desafiante conceito.
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FRANCISCONI, Jorge Guilherme. Quando e como renascem as políticas urbanas. São Paulo. Ensaios INSPER,
2021 https://www.insper.edu.br/wp-content/uploads/2021/03/ensaio_jorge_guilherme_francisconi__032021.pdf
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Segundo Lucia Bogus e Luis Cesar de Q. Ribeiro, do Observatório das Metropoles do RJ, Brasil, essa utopia urbana
está traduzida nos princípios da função social da cidade e da propriedade, da descentralização das politicas urbanas e na
gestão democrática
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A conferencista entende que as duas dimensões (direito urbanístico e direito à cidade)
não existiam no sistema que precedeu a CF 88 e que surgiram fruto de processo evolutivo
de sistemas ao longo do tempo.
Isso porque, sem as varetas dos feixes de leis que são exigidas pela gestão e
governança do território urbano municipal e metropolitano, a utopia do direito à cidade não
será alcançada.
A questão extrapola, é bem verdade, o tema central da conferencista, mas sustenta os
conceitos que adota e constitui uma questão fundamental para estabelecer um direito urbano
para gestão e para governança urbana e, por extensão, que demarque a fronteira
do lícito/ilícito e da corrupção urbanística de forma ampla, transparente e integral.
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Voltando à conferência, a Prof. Vanêsca expôs o conceito de
como produtos do entendimento que "corrupção/não corrupção são facetas de uma mesma
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moeda, a corrupção é dos sistemas e não das pessoas, motivo pelo qual precisamos enxergar
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os espaços abertos/propícios para incidir. Isso porque o "ilícito se transforma em lícito
devido às "fragilidades contumazes que facilitam e oportunizam espaços corruptivos de
nosso sistema jurídico. Como exemplo cita:
"Excesso de discricionariedade administrativa, enorme espaço para concentrações
administrativas, a falta de controle dos processos urbanísticos, a carência de
publicidade das regras, a falta de publicidade dos instrumentos e das possibilidades
existentes, o enorme número de legislações e a precária informação destas."
Por isso há que possibilitam a adoção de intervenções personalíssimas,
muito vez casuísticas, que atentam contra o princípio da mas sem avaliar
se o casuísmo é necessário ou não, se é a única forma de resolver problemas criados por
normas administrativas conflitantes ou por conflitos do próprio direito urbano com outros
ramos do direito que afetam o uso do território. E conclui lembrando o procedimento de
"criar dificuldades para vender facilidades."
Para reduzir espaços corruptivos e vencer fragilidades sugere a adoção de práticas
inovadoras tal como descritas pelo Jurista Fernando Correia, quando tratou da adequação do
direito urbanístico português ao desenvolvimento sustentável exigido pela União Europeia
(UE). E aponta para possível criação de normas de desenvolvimento urbano sustentável para
evitar casuísmos, por exemplo, no processo participativo, em núcleos habitacionais de
interesse social, na expansão urbana, na preservação de sítios históricos. Temas importantes
que não avançam porque, destaca a conferencista, não dispomos de estudos com a qualidade
exigida para orientar a elaboração de marcos jurídicos e normas administrativas de
qualidade. E conclui lembrando o limitado impacto de planos diretores como componente
inerente ao direito plural da sustentabilidade urbana, na ocupação do território urbano.
*** ***
A palestra trata do licito/ilícito e da corrupção urbanística, mas licito/ilícito é tema
mais amplo porque produzido por inúmeras causas. As fragilidades contumazes, por
exemplo, acontecem por inúmeras razões e muito dos ilícitos que ocorrem se devem:
A falta de normas jurídico-administrativas para cada instrumento urbanístico da
legislação vigente. Essa ausência de normas complementares mais precisas, com
definição de procedimentos, responde pelo escasso uso de instrumentos que o
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PRESTES, V., e-mail, op.cit.
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SANTOS JUNIOR, Orlando Alves e MONTANDON, Daniel T., org., Os Planos Diretores MUNICIPAIS Pós-
Estatuto da Cidade: balanço crítico e perspectivas. Rio de Janeiro. Letra Capital, Observatório das Cidades.
IPPUR/UFRJ, 2011.
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A ilicitude também é reforçada pelo fato de que cada estado, município, entidade ou
cidadão aplica as normas legais na forma que melhor lhe convém. Como ocorreu com
estados na questão metropolitana e como acontece quando quando os municípios adotam
conceitos e normas como melhor lhes parece. Uma autonomia que cria uma colcha de
retalhos na gestão e planejamento do território nacional. Na prática, temos hoje cerca de
5.700 "repúblicas cada uma com suas normas urbano-territoriais, enquanto que
ilicitudes só serão reduzidas quando o direito urbanístico for homogeneizado e qualificado.
Para tanto sendo necessário incluir -laws" que estabeleçam, por exemplo, o padrão
cartográfico nacional para planos diretores, tributação, meio ambiente e tudo mais. Ou para
estabelecer o conteúdo e procedimentos para elaboração, aprovação e implantação de planos
urbanos, com procedimentos diferenciados segundo a escala territorial e experiências no país
e no exterior.
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integrador que permitisse definir o marco jurídico regulatório para áreas de territórios urbano
e de expansão urbana.
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A importância que Vanêsca Prestes atribui ao Estatuto da Cidade, como marco do
direito urbano brasileiro, é indiscutível, ao contrário de seus comentários sobre o passado e
sobre aspectos de nosso direito urbanístico. Como quando observa que o EC
"rompeu com o paradigma urbano/rural (planos diretores também legislam sobre a
área rural, respeitadas as competências constitucionais do direito agrá mas
Hely Lopes Meirelles escreveu que 'Plano Diretor' ou 'Plano Diretor de
Desenvolvimento Integrado' (PDUI), como modernamente se diz, é o complexo de
normas legais e diretrizes técnicas para o desenvolvimento global e constante do
Município, sob os aspectos físico, social, econômico e administrativo, desejado pela
comunidade local." Definição que corresponde às práticas adotadas por IBAM e
SERFHAU, por Prefeituras e por empresas de consultoria durante as década dos 60
aos 80.18
"criou instrumentos mas a grande maioria dos instrumentos do EC
foi copiada do PL 775/83, que, na época, tramitava na Câmara Federal. Victor
Carvalho Pinto tratou desse tema em sua conferencia (ver abaixo) e Roberto Bassul
descreve o fato em sua dissertação de doutorado.19 Vale destacar que o EC
transcreveu, a grosso modo, a maioria destes instrumentos, mas não há normas legais
para seu uso.
disciplinou os instrumentos para regularização fundiária mas ainda carecemos de
marco jurídico que corresponda à magnitude do problema da regularização fundiária
. Apesar dos esforços administrativos do Ministério das Cidades e programas do BID.
estabeleceu procedimentos mínimos para planos diretores, mas sem definir objetivos
e o conteúdo mínimo dos planos. O que resultou em planos diretores urbanos pré-EC
serem idênticos aos planos diretores urbanos pós-EC.
Decorridos 20 anos do Estatuto da Cidade e 40 anos do Movimento da Reforma
Urbana, o impacto do direito à cidade no marco jurídico urbano, assim como na gestão,
18
MEIRELLES, H.L., op. cit., ps. 101, 102. Ver Direito Municipal Brasileiro, do mesmo autor. e FERRARI, Celson.
Curso de Planejamento Municipal Integrado - Urbanismo. São Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1977.
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BASSUL, Roberto. Estatuto da Cidade- Quem ganhou? Quem perdeu? Brasília. Senado Federal, 2005
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cidadania e governança urbana, ainda não foi devidamente avaliado. Há opiniões favoráveis,
outros acham que a lei "não colou" e outros entendem que pouco mudou com o EC.
Dentre os aspectos mais comentados, pelos que utilizam o EC, está a falta de normas
legais complementares da União, de Estados, IBGE e da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT) quanto ao uso dos instrumentos; a falta de segurança jurídica para
aplicação das normas vigentes na elaboração e implantação de planos diretores de
ordenamento urbano e, em especial, no uso do planejamento participativo. Outros apontam
demandas e instrumentos não previstos no EC para atender novas demandas (reparcelamento
do solo, "retrofit" urbano e edilício), assim como a necessidade de atualizar normas legais
que caducaram, como a lei de desapropriações. Por último há também aqueles que apontam
para a quantidade de direitos que a CF 88 e várias leis garantem ao cidadão, mas sem indicar
a quem cabe o provimento do serviço.
# # #
A metáfora-paradigma da Prof. Vanêsca Prestes, para coexistência de diferentes
áreas do direito, corresponde a mais criativo e instigante momento de sua conferência. O
ponto de partida são os balões que englobam "feixes de da sustentabilidade urbana
e que estão abrigados dentro de um cilindro. Cada balão corresponderia a um direito
constitucional meio-ambiente, moradia, patrimônio cultural (material e imaterial),
acessibilidade, mobilidade, gestão democrática, propriedade, saneamento básico, dentre
outros.
Sua metáfora tridimensional para coexistência de "feixes de e "feixes de
(conceitos usados como sinônimos) foi de como se
diante de um cilindro dentro do qual há vários balões. Estes balões
representam os direitos hoje protegidos e não podem furar, precisam viver em
equilíbrio, pois a função da cilindro é garantir a coexistência de todos, sendo uma
especie de proteção a corrosão destes."
O entendimento sendo de que, se mantidos os balões no cilindro, os "temas
protegidos pela sociedade (estariam livres) das mudanças ocasionais e de composição das
maiorias, característicos do sistema da Isso porque cabe "proteger o espaço do
direito frente decisões politicas e evitar que o espaço do direito seja substituído por decisões
da politica. Tudo para combater o lícito / ilícito, visto que quando o espaço do direito
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rompe com seus códigos e adota decisões assumindo posição política, estamos diante da
corrosão, da corrupção do sistema.
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Observe-se que, na medida em que cada balão abriga o "feixe de direitos" de uma
atividade inerente à em cada de direitos" estarão definidos os
objetivos, diretrizes e conceitos de competência de cada atividade da sustentabilidade. Mas
será necessário acrescentar de leis" relativos a gestão e governança urbana bem como
para adequação no território.
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Este desafio não pode ser ignorado porque a territorialização do direito urbanístico é
condição "sine qua non" para promover a implantação ("enforcement") de normas urbanas
destinadas a melhorar as condições de vida da população mediante implantação do ideário
social, econômico, cultural, ambiental e urbano de nossos dias. Bem como por ser essencial
para combater a corrupção urbana e o licito / ilícito que observamos nas atividades
multifuncionais de cidades e metrópoles. Onde infraestrutura e práxis urbana têm nas
atividades econômicas, sociais e ambientais seu tripé de sustentação.
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O território é um espaço cartesiano bidimensional quanto a usos e funções. O somatório de pontos cartesianos (x,y)
determina a dimensão do território dedicado às cada uma das diferentes funções urbanas (habitação, meio ambiente,
serviços, etc).Aos eixos cartesianos horizontais podem ser acrescidos eixos cartesianos verticais que definiriam fatias
("slices") verticais sobre linhas traçadas no território. Poderiam servir para mostrar o skyline de cada cidade, bairro, rua,
parque. Eixos cartesianos verticais que permitem planejar e/ou avaliar a morfologias e as funções da urbanização vertical
em diferentes áreas da cidade.
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O Projeto de Lei dispunha os objetivos e a promoção do desenvolvimento urbano e dá outras providências."
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Responsável solitário pelo texto, agradeço ao palestrante pela leitura e correções de versão preliminar.
23
A CNPU, no transcorrer de 1976 / 1978, elaborou e aprovou dois projetos de lei: a minuta da futura Lei nº. 6.766/79,
que trata do parcelamento do solo urbano, e o "anteprojeto da Lei de Desenvolvimento Urbano", publicada no jornal O
Estado de São Paulo em 24 / 05 / 1977, depois transformado no PL 775/83. Ver
https://www.jorgefrancisconi.com.br/2021/09/o-anteprojeto-da-lei-de-desenvolvimento_8.html
24
A minuta de minuta do projeto ide lei que trata do sistema nacional de planejamento e do desenvolvimento urbano foi
aprovada pelos membros da CNPU em reunião realizada em Curitiba, em julho de 1976.
25
O Projeto de Lei do Estatuto da Cidade surgiu no Senado Federal em 1989. Projeto de Lei nº181 de 1989 Estabelece
diretrizes gerais da Politica Urbana e dá outras providências."
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vários de seus itens foram transcritos no Estatuto da Cidade (EC) e, nas décadas seguintes á
sua apresentação, tornou-se objeto de dissertações e teses, de mestrado e doutorado, no
âmbito do direito, arquitetura e geografia.
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Informações sobre uso de instrumentos do EC foram obtidas aleatoriamente. Não encontrei estudos qualificados do
tema.
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Aproveitamento (CA) = 1, que passaria a ser adotado em cidades sem planos diretores para
estimular o planejamento urbano; (ii) Medidas de salvaguarda visando suspender a análise
de projetos pelas prefeituras sempre que novo PDU fosse apresentado para, assim impedir o
protocolo de projetos em conflito com o novo PDU; (iii) Macrozoneamento que estabelece
e define cindo tipos de áreas especiais: de urbanização preferencial, de renovação urbana, de
urbanização restrita, de regularização fundiária e de integração regional; (iv) Cumprimento
obrigatório do PDU municipal pela União e pelos estados, um problema frequente visto que
nem mesmo as Prefeituras respeitam PDs; (v) Expansão urbana para 10 anos, com projeção
demográfica para definir a área a ser urbanizada; (vi) Licenciamento para edificação, o que
difere da exigência de autorização prevista na Lei 6.766/79 para parcelamento do solo, a
autorização permitindo ao poder público negar o parcelamento solicitado de forma
discricionária.
*** ***
Quanto ao Estatuto da Cidade (EC), seu entendimento é de que o Estatuto incorporou
itens que se somaram aos transcritos do PL 775/83, mas sempre orientados para o futuro e
ignorando o presente. Por conta deste enfoque, que chamou de desenvolvimentista , o EC
incluiu nem excluiu o zoneamento , ignora temas como o parcelamento do solo e
demandas urbanas quando excluiu conservação, reforma, reabilitação e regeneração urbana
da edificação e da cidade. Mais importante, o EC não tratou da desapropriação, que é hoje o
mais importante instrumento do setor público para "alterar a cidade e que
permanece regido por decreto lei de 1941 (DL 3.365/41).
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leis de planos diretores. Fato que cria conflitos jurídicos, os quais estão sendo reforçados por
novas leis, como aquela que trata de situações de risco e que exige inscrição em Cadastro
Federal que sequer existe.
Victor Carvalho Pinto também destacou que a evolução de nosso direito urbanístico
exige Código de Urbanismo. Algo similar aos adotados em países ibéricos, França e países
saxônicos, aqui com outras denominações. Tema que nos remete ao Código de Urbanismo
ou Lei Geral de Urbanismo citados por Hely Lopes Meirelles,27 mas sobre o qual Carvalho
Pinto vai além porquanto sugere procedimentos e temas para o novo Código, com avaliação
de códigos similares, muitos em vigor desde a década de 1950. Sua proposta aponta para
importância de fortalecer o que chama de de planos o que exigiria
uma normalização mediante regulamentos aprovados por entidades, como a ABNT quando
estabelece o conteúdo de planos diretores. Ou normas técnicas, como os do IBGE para
definir regiões metropolitanas e aglomerados urbanos.
27
MEIRELLES, H. L., op.cit, p.101
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Lei 10.116/1994 RS, de Desenvolvimento Urbano. O anteprojeto da lei foi apresentado pelo economista e
ex-prefeito de Porto Alegre, ex-Deputado Guilherme Socias Villela.
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país. Cabe revisar leis que caducaram, aperfeiçoar outras e criar normas legais que
introduzam e/ou aperfeiçoem instrumentos que estão sendo exigidos do direito urbano.
Dentre esses, um Código de Urbanismo que defina bases conceituais, instrumentos
normativos, práticas técnico-administrativas e normas técnicas e processuais, dentre outros
tópicos que serão adotados na gestão, governança, estudos e pesquisas sobre a questão
urbana no país.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASSUL, Roberto. Estatuto da Cidade- Quem ganhou? Quem perdeu? Brasília. Senado
Federal, 2005
PINTO, Victor Carvalho. Direito Urbanístico - Plano Diretor e Direito de Propriedade. São
Paulo, Revista dos Tribunais. 2005 / 2010 / 2011.
CHOAY, François. O Urbanismo - Utopias e Realidades Uma Antologia. São Paulo, Editora
Perspectiva, 1992, 3ª Edição.
167
https://www.jorgefrancisconi.com.br/2021/09/o-anteprojeto-da-lei-de-
desenvolvimento_8.html
DEÁK, Csaba, SCHIFFER, Sueli Ramos, orgs. O processo de urbanização no Brasil. São
Paulo, Editora da Universidade de São Paulo, 1999
MEDAUAR, Odete. Caracteres do Direito Urbanístico. Revista dos Direitos Difusos, Rio de
Janeiro, Instituto Brasileiro de Advocacia Pública. (IBAP), agosto 2000, in Direito
urbanístico, pt.wIkipedia.org.
MEIRELLES, Hely Lopes. O Direito de Construir. São Paulo. Editora Revista dos
Tribunais, 1979.
_______. Direito Municipal Brasileiro, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1977
(3ª edição.
SANTOS JUNIOR, Orlando Alves e MONTANDON, Daniel T., orgs., Os Planos Diretores
municipais Pós-Estatuto da Cidade: balanço crítico e perspectivas. Rio de Janeiro. Letra
Capital, Observatório das Cidades. IPPUR/UFRJ, 2011.
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SENADO FEDERAL Projeto de Lei nº18 / 1977, Dispõe sobre o parcelamento do solo
urbano e dá outras providências
- Projeto de Lei nº181 / 1989, Estabelece diretrizes gerais da Politica
Urbana e dá outras providências."
SILVA, José Afonso. Direito Urbanístico Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 2010. In:
Direito urbanístico, pt.wWikipedia.org.