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TÓPICOS ESPECIAIS DE DIREITOS REAIS

AULA 01

1. DIREITO DE SUPERFÍCIE
Art. 1369 a 1377 do CC e Estatuto da cidade – Lei 10.257/01 (art. 21 a 24)

Art. 1369: No direito de superfície nó s temos duas partes envolvidas:

 Proprietá rio do solo, também chamado de concedente ou fundeiro;


 Superficiá rio ou proprietá rio superficiá rio ou concessioná rio

O proprietá rio do solo vai conceder ao superficiá rio o direito de construir ou de plantar em seu
terreno. O legislador exige aqui escritura pú blica, o que vem em consonâ ncia com o art. 108 do CC,
porque estamos falando de direitos reais sobre bens imoveis e o art. 108 do CC também exige
instrumento pú blico como regra para constituiçã o de direitos reais incidentes sobre bens imó veis;
e o CC também exige aqui o registro.

OBS.: O CC diz apenas que o proprietá rio do solo vai conceder ao superficiá rio o direito de construir
ou de plantar em seu terreno. Mas, na realidade, o proprietá rio do solo, além de conceder ao
superficiá rio o direito de construir e de plantar em seu terreno, através desse instituto se atribui
ao superficiário o propriedade resolúvel sobre estas construções ou plantações por ele
realizadas. Entã o, o superficiá rio além de receber o direito de construir ou de plantar no solo, vai
também adquirir a propriedade resolú vel sobre essas construçõ es ou plantaçõ es realizadas.

Entã o, na realidade, quando nó s tivermos o direito de superfície nó s teremos duas propriedades


paralelas:

 Propriedade do solo: que é de titularidade do concedente ou fundeiro; sendo que esse


proprietá rio do solo vai conceder ao superficiá rio o direito de construir ou de plantar em
seu terreno;
 e na medida em que o superficiá rio fizer uma determinada construçõ es, o superficiá rio vai
imediatamente adquirir a propriedade superficiária (que é uma propriedade resolú vel)
sobre essa construção ou plantação.

Logo, nó s teremos duas propriedade paralelas, distintas: uma incidente sobre o solo e a outra
propriedade incidente sobre a construçã o ou plantaçã o.

Vejam que isso se parece, mas não se confunde, com o condomínio. Se parece, pois nó s
estamos falando de dois proprietá rios distintos; mas percebam que o tema é diferente do
condomínio, pois no condomínio duas ou mais propriedades recaem sobre o mesmo objeto, ou seja,
nó s temos dois ou mais proprietá rios em conjunto sobre a mesma coisa. E aqui na verdade nó s
temos dois proprietá rios diferentes, sobre objetos diferentes: uma propriedade recai sobre o solo e
a outra propriedade sobre a construçã o.

Percebam inclusive que nada impede que haja copropriedade do solo – imaginem que um casal seja
proprietá rio do solo e conceda a outrem o direito de superfície; como nada impede que tenhamos
copropriedades superficiá rias – vamos imaginar que um casal também venha a adquirir o direito de
superfície de construir ou plantar em terreno alheio. Nesse sentido, Enunciado 321 do CJF.

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Isso nos conduz à afirmativa de que o direito de superfície representa uma das duas
exceções ao brocado: “SUPERFICIES SOLO CEDIT” – essa é a regra geral no direito brasileiro. Por
essa regra geral, aquele que construi ou planta em terreno alheio perde a titularidade sobre tais
construçõ es ou plantaçõ es em favor do proprietá rio do solo, porque, pela regra geral, a titularidade
sobre o solo tem natureza principal e pelo princípio da gravitaçã o juridica (acessó rio segue o
principal) tudo aquilo que é construido naquele terreno passa a ser de titularidade do proprietá rio
do solo. Em alguns casos, se o construtor está de boa-fé ele tem direito a ser indenizado – art. 1255,
caput do CC (manifestaçã o nítida dessa regra geral).

Nó s temos duas exceções a essa regra geral:

1) Art. 1255, pará grafo ú nico do CC – que trata da chamada ACESSÃO INVERTIDA.
2) DIREITO DE SUPERFÍCIE – o superficiá rio vai construir ou plantar em terreno alheio e nã o
perderá a titularidade de tais construçõ es em favor do proprietá rio do solo, ao menos nã o
perderá de imediato.

O tema de direito de superfície é tratado tanto no CC, quanto no Estatuto da Cidade. A


sistemática não é identica em ambos os diplomas legais. Ex.: no CC o direito de superfície tem
que se dar por tempo determinado (art. 1369, caput); já no estatuto da cidade (art. 21), o legislador
prevê que o direito de superfície pode se dá por tempo determinado ou indeterminado. Ex.: no CC o
objeto do direito de superfície consiste no direito de construir ou de plantar; já no estatuto da
cidade o legislador foi mais genérico: o objeto é mais amplo, mais abrangente.

Assim, temos pontos de conflito entre o CC e o estatuto da cidade. Então, quando aplicamos o
CC e quando aplicamos o estatuto da cidade?

Num primeiro momento, houve até quem defendesse que o CC teria revogado o Estatuto da cidade
pelo sistema cronoló gico – lei posterior revoga a lei anterior. Isso, hoje, está absolutamente
ultrapassado. O entendimento amplamento dominante, hoje, é no sentido de que tanto o CC quanto
o Estatuto da Cidade permanecem em vigor, porque, em que pese, o CC ser lei posterior, o estatuto
da cidade é lei especial. Entã o, pelo sistema da especialidade o CC e o Estatuto da cidade convivem
harmonicamente no sistema a respeito desse tema.

Todos devem se lembrar que no conflito aparente de normas temos o: sistema cronoló gico; sistema
da especialidade; sistema hierarquico. E nã o há dú vidas de que o sistema da especialidade
prevalece sobre o sistema cronoló gico; assim como o sistema hierarquico prevalece sobre o sistema
da especialidade.

Entã o, se nó s estivermos diante de um direito de superfície envolvendo imó vel rural, de plano nó s
já sabemos que será aplicá vel o CC, porque em se tratando de imó vel rural, obviamente que nã o
haverá incidencia do estatuto da cidade. Por outro lado, o simples fato do imó vel ser urbano nã o
assegura a aplicaçã o do estatuto da cidade. Porque o que há de especial no estatuto da cidade é o
fato dessa legislaçã o ser um instrumento de política de desenvolvimento urbano. Nisso consiste a
especialidade do estatuto da cidade. Entã o, se nó s tivermos um direito de superfície sobre um
imó vel urbano absolutamente descomprometido com a política de desenvolvimento urbano, ou
seja, um direito de superfície constituído com fins puramente privados, nã o atrairá a incidencia do
estatuto da cidade, porque esse direito de superfície nã o está atrelado à política de
desenvolvimento urbano; está na verdade atrelado ao atendimento dos interesses particulares do
seu titular.

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Diversamente se nó s tivermos um direito de superfície em imó vel urbano vinculado à construçã o
de casas populares, parece que, nesse caso, resta evidente a incidencia do estatuto da cidade. Nesse
sentido, enunciado 93 do CJF.

Sobre a exigencia do CC de que o direito de superfície tem que ter prazo determinado
(diversamente do estatuto da cidade, que admite prazo determinado ou indeterminado), qual foi o
objetivo primordial do legislador do CC?

Foi enaltecer uma das diferenças entre o direito de superfície e a enfiteuse. Porque uma das
características da enfiteuse é a perpetuidade. Quando CC exige tempo determinado, um dos
objetivos aqui é sem dú vida tornar nítida essa diferença entre o direito de superfície e a enfiteuse.

E aí imaginemos o seguinte: vamos supor que alguém pactue um direito de superfície por 800 anos.
A princípio, esse prazo determinado de 800 anos atende ao comando do art. 1369, mas, na
realidade, trata-se fraude à lei – que é prevista como causa de nulidade absoluta no art. 166, VI do
CC – trata-se de fraude à lei, pois é um ato que goza de aparente licitude, mas a licitude é apenas
aparente, porque em uma interpretaçã o sistemá tica de percebe que o ato colide contra os
interesses do sistema.

O CC prevê apenas que pelo direito de superfície o proprietá rio vai conceder a outrem o direito de
plantar ou de construir em seu terreno. Ou seja, o CC não prevê direito de superfície sobre
construções ou plantações pré-existentes. Em que pese o silencio do CC, nó s temos um
enunciado do CJF – enunciado 250 – que diz que admite a constituiçã o do DIREITO DE
SUPERFÍCIE POR CISÃO. Entã o, o direito de superfície por cisã o consiste justamente no direito de
superfície constituído pelo proprietá rio do solo sobre construçõ es ou plantaçõ es já existentes.

Mas porque foi feita essa interpretação diante do silencio do CC (direito de superfície por
cisão)? Um ó timo argumento para justificar tal admissibilidade é a funçã o social da propriedade.
Vamos imaginar que alguém tenha um imó vel com uma determinada construçã o e nã o tem nenhum
interesse em dar qualquer destinaçã o aquele imovel. O ú nico interesse do proprietá rio é o interesse
especulativo. Percebam que se nó s nã o aplicarmos esse instituto aquele imó vel estará fadado ao
abandono durante aquele lapso temporal de 10 anos e consequentemente fadado a inatender a
funçao social da propriedade. Através do direito de superfície por cisã o, o proprietá rio pode
constituir um direito de superfície em favor de outrem por aquele lapso temporal de 10 anos e
vejam que o superficiá rio, por ter adquirido o direito de superfície, terá a intençã o de conferir
destinaçã o social aquela construçã o ou plantaçã o.

Outro bom argumento trazido pelo TEPEDINO e CHAVES: aplicaçã o do princípio da autonomia
privada na ceara dos direitos reais. Quase sempre quando se fala em autonomia privada, se fala em
direito contratual. E um dos obstá culos a se cogitar de autonomia privada na ceara dos direitos
reais resulta do fato de que o rol dos direitos reais é um rol taxativo, numerus clausus; divesamente
dos contratos, que podem ser típicos ou atípicos. O rol dos direitos reais é taxativo, mas os tipos
legais dos direitos reais sã o tipos abertos que admitem algum tipo de conformaçã o, sã o tipos
elasticos. Ex.: sistema do time sharing. E aqui o direito de superfície por cisao vem dentro dessa
perspectiva. Em que pese nã o haver explícita previsao normativa, o princípio da autonomia privada
também justificaria a sua incidencia.

A propriedade superficiária é resolúvel, temporária (tanto no CC, como no estatuto da cidade).


Em se sabendo que a propriedade superficiária é resolúvel, ainda assim, ela é alienável,
transmissível a terceiros?

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Sem dú vida! A propriedade resolú vel em geral é passível de alienaçã o – o art. 1359 basicamente diz
que quem tem propriedade resolú vel, transfere propriedade resolú vel. Vem dentro do contexto
segundo o qual ninguém pode transferir mais direitos do que tem. Entã o, quem tem propriedade
resolú vel, transfere propriedade resolú vel. O que se exige doutrinariamente é que essa condiçã o
resolutiva ou termo final que recai sobre a propriedade resolú vel esteja averbada junto ao registro,
para que terceiros saibam que estã o adquirindo propriedade resolú vel.

Só que em se tratando de direito de superfície, nó s temos uma regra específica aqui: art. 1372 – o
direito de superfície é transmissível intervivos ou mortis causa. Remissao do art. 1372 ao art.
1359.

OBS.: Tem uma posiçã o aqui defendida por MARCO AURÉ LIO VIANA, CHAVES : é lícito as partes
pactuarem clá usula de reversã o. Nã o há previsã o normativa explícita no direito de superfície, mas
seria aplicá vel por analogia o art. 547 do CC – doaçã o com clá usula de reversã o. Pela doaçã o com
clá usula de reversã o, se o donatá rio morre antes do doador, os bens voltam para o patrimonio do
doador, desde que haja cláusula de reversã o.

A regra geral nã o é essa, mas sim: falecendo o donatá rio, os bens vao para seus sucessores. Mas
uma vez inserida a clá usula de reversã o, o pré falecimento do donatá rio faz com que os bens
retornem ao patrimonio do doador e nã o sejam direcionados aos herdeiros do donatá rio.

Entã o, com a clá usula de reversã o aqui inserida em sede de direito de superfície, no caso de pré
falecimento do proprietario superficiá rio, os bens retornariam ao proprietá rio do solo e nã o seriam
direcionados aos sucessores do superficiá rio. A cláusula de reversão não se presume!

Se a propriedade superficiá ria pode ser transferida a terceiros, parece nítido que quem pode o
mais, pode o menos. Entã o, se a propria titularidade do direito de superfície pode ser transferida,
parece evidente que é cabível a constituiçã o de direitos reais de gozo ou fruiçã o pelo proprietá rio
superficiá rio sobre a construçã o ou plantaçã o. Ex.: o proprietá rio superficiá rio pode conceder a
construçao ou plantaçã o em usufruto. Nesse sentido, Enunciado 249 do CJF. É evidente que nesse
caso o direito real de gozo ou de fruiçã o nã o poderá ultrapassar o lapso temporal do direito de
superfície. Se a propria titularidade do direito de superfície é resolú vel eventual direito real de gozo
ou fruiçã o concedido por este proprietá rio também será reslú vel, pois ninguém pode transferir
mais direitos do que tem.

Da mesma forma, é possivel que haja a constituiçã o de direito real de garantia sobre a propriedade
superficiá ria. Entã o, pode proprietá rio superficiá rio conceder a sua construçã o em hipoteca. Tem
agora explicita previsao no CC – art. 1473, X – é evidente que a hipoteca incidente sobre a
propriedade superficiá ria tambem será resolú vel.

Há ainda regra contemplando o cabimento de alienaçã o fiduciá ria da propriedade superficiá ria –
art. 22, § 1º, IV da lei 9514/97.

PROVA ORAL: Utilização do subsolo pelo proprietário superficiário. A redaçã o do CC é um


pouco restritiva em relaçã o à utilizaçã o do subsolo pelo superficiá rio – art. 1369, pará grafo ú nico. A
letra fria do CC traz a presunçã o relativa de que o superficiá rio nã o pode realizar obra no subsolo.
EXCEÇÃO: se for inerente ao objeto da concessã o. Ex.: imaginemos que haja a constituiçã o do
direito de superfície pelo proprietá rio do solo em favor de um empreendedor que vai construir um
shopping center; e no projeto acordado com o proprietá rio do solo há a previsao de garagens
subterraneas. É evidente que nesse caso é inerente ao objeto da concessao que haja obras no
subsolo e, portanto, aplicá vel a parte final do paragrafo ú nico do art. 1369.

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Já no estatuto da cidade o legislador nã o foi tao restritivo – art. 21, § 1º – nã o restringe a utilizaçã o
do subsolo. Na verdade, prevê inclusive que essa utilizaçã o se dará nos moldes previstos no
contrato.

Percebam que a utilizaçã o do subsolo pelo superficiá rio deve respeitar a titularidade dos recursos
minerais pelo Uniã o federal – art. 20, IX da CF – que confere à Uniã o a titularidade sobre tais
recursos minerais.

Enunciado 568 do CJF – diz que o direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o
subsolo ou espaça aereo relativo ao terreno na forma estabelecida no contrato. O que fundamenta o
enunciado é a funçã o social da propriedade – na medida em que o direito de superfície é um
instituto nitidamente atrelado a funçã o social, deve-se dar a interpretaçã o que lhe confira a maior
eficá cia possivel.

O art. 1373 do CC contempla direito de preferencia recíproco entre o proprietário do solo e o


proprietário superficiário (o art. 22 do estatuto da cidade vem no mesmo sentido) – se o
proprietá rio superficiá rio quiser tranferir o bem a terceiros, o proprietá rio do solo tem direito de
preferencia. Por outro lado, se o proprietá rio do solo quiser transferir a titularidade do solo a
terceiros, o proprietá rio superficiá rio também terá direito de preferencia. Esse direito de
preferencia recíproco busca a consolidaçã o da propriedade numa ú nica pessoa.

Questã o controvertida: o legislador nã o sistematiza o direito de preferencia; por exemplo, o prazo


para o exercicio do direito de preferencia; ele também nã o diz quais sã o as consequencias oriundas
da inobservancia do direito de preferencia. Ou seja, o legislador se retringe a contemplar o direito
de preferencia recíproco, mas nã o sistematiza esse direito de preferencia recíproco. E aí diante da
lacuna legislativa, surgem três correntes:

1ª corrente: defende a aplicaçã o por analogia do art. 33 da lei 8245/91, ou seja, preve a aplicaçã o
por analogia do direito de preferencia do locatá rio. (MARCO AURELIO BEZERRA DE MELLO)

2ª corrente: defende a aplicaçao por analogia dos art. 513 a 518 do CC – que trata da chamada
preempçã o ou preferencia.

Crítica a essas primeiras correntes: tanto a locaçã o quanto a preempçã o ou preferencia sã o


institutos de natureza contratual. E, em regra, na ceara contratual aplicá vel é o princípio da
relatividade, que comporta muitas exceçõ es, mas é a regra. Pelo princípio da relatividade o contrato
vincula apenas os contratantes e, portanto, o direito de preferencia do locatá rio e o direito de
preferencia oriundo da preempçã o sã o direitos de preferencia inoponíveis ao terceiro adquirente.
Tais direitos de preferencia sã o oponíveis apenas em face do outro contratante. Por isso, pela regra
geral, o locatá rio preterido nã o pode perseguir o bem do terceiro adquirente; ele faz jus apenas a
perdas e danos em face do locador, porque o direito de preferencia dele nã o é oponível em face do
terceiro adquirente de boa-fé pelo princípio da relatividade. A locaçao nã o vincula o terceiro
adquirente do bem. Só que nó s estamos falando em direito de preferencia em sede de direito de
superfície que tem natureza juridica de direito real, oponível erga omnes. Diante disso, surge a 3ª
corrente!

3ª corrente (absolutamente predominante): aplicaçao por analogia do direito de preferência do


condô mino – art. 504 do CC. Na sistemá tica do art. 504 o condomino preterido vai poder reaver o
bem do terceiro, porque o condomínio também é direito real. O legislador fixa o prazo de 180 dias.
Nesse sentido, enunciado 510 do CJF.

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OBS.: Para que haja a incidencia do direito de preferencia é preciso que a alienação seja
onerosa. Então, havendo uma doação, por exemplo, não há direito de preferencia.

Art. 1371 do CC: Encargos e tributos – “O superficiário responderá pelos encargos e tributos que
incidirem sobre o imóvel.”

Surgiu num primeiro momento sobre o tema o Enunciado 94 do CJF – diz que as partes tem plena
liberdade para deliberar no contrato respectivo sobre o rateio dos encargos e tributos que incidirã o
sobre a area objeto da concessã o do direito de superfície. Esse acordo entre o proprietá rio do solo e
o superficiá rio na verdade nã o vinculará o Fisco! Esse acordo previsto no enunciado 94 pode
apenas funcionar como uma espécie de direito de regresso. Perante o fisco vai responder o
superficiá rio; se as partes ajustaram algo diverso, esse acordo nã o é oponivel ao fisco. O
superficiá rio responderá perante o fisco e depois exercerá direito de regresso em face do
proprietá rio do solo (interpretaçã o nos termos do direito tributá rio).

Há ainda quem defenda a inconstitucionalidade formal do art. 1371 do CC, porque a


definição de contribuinte em matéria tributária é reservada a LC, nos termos do art. 146, III
da CF. Na medida em que o CC é lei ordinária, o CC não teria possibilidade de definir
contribuinte em matéria tributária.

O que a fazenda pública defende? Interpretaçã o conforme a CF: a alternativa aqui é defender que o
art. 1371 nã o define contribuinte e sim a figura do responsá vel tributá rio. Entã o, o superficiá rio
aqui nã o seria o contribuinte, seria o responsá vel tributá rio e a definiçã o de responsavel tributá rio
pode vir por lei ordiná ria. Enunciado 321, parte final do CJF.

A previsao do art. 1371 do CC é diferente do art. 21, § 3º do estatuto da cidade, porém vem em
consonancia com a sistemá tica do usufruto – art. 1403, II do CC – que é repetido no direito real de
uso – art. 1413 – e no direito real de habitaçã o – art. 1416 do CC.

DIREITO DE SOBRELEVAÇÃO  seria a possibilidade de se constituir direito de superfície em 2º


grau. O superficiá rio poderia conceder a um terceiro o direito de construir ou de plantar sobre a sua
propriedade superficiá rio, ou seja, sobre a construçã o por ele realizada.

Tanto o CC quando o estatuto da cidade são omissos.

Quem defende direito de sobrelevaçã o traz aqui os seguintes argumentos:

 A aplicaçã o por analogia do art. 21, § 1º do estatuto que explicitamente preve que o direito
de superfície abrange o espaco aereo. E essa abrangencia do espaço aereo implicitamente
permitiria que o superficiá rio concedesse em 2º grau um dirieto de superfície.
 Além disso, o direito de superfície em 2º grau, o direito de sobrelevaçã o seria uma
decorrencia da faculdade de disposiçã o da propriedade superficiá ria; seria um
desdobramento da faculdade de disposiçã o.

Contra essa entendimento, se sustenta:

 Ausencia de previsã o normativa


 Ausência de previsã o na lei de registros pú blicos

Enunciado 568 do CJF – preve a possibilidade de direito de sobrelevaçã o.

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Sob a égide do estatuto da cidade, o direito de superfície pode ser por prazo determinado ou
indeterminado. Vamos imaginar que tenhamos um direito de superfície por prazo indeterminado.
Vamos supor que o direito de superfície esteja direcionado a construçã o de uma fá brica; o
superficiá rio demora 1,5 ano para construçã o a fá brica e depois de determinada a construçã o do
fá brica vem o proprietá rio do solo e diz: nã o quero mais! Se o direito de superfície é por prazo
indeterminado eu posso extinguir o direito de superfície a qualquer tempo e aí nesse caso inclusive
aplicá vel por analogia o art. 397, pará grafo ú nico; porque a rigor se o direito de superfície é por
prazo indeterminado, a qualquer tempo o proprietá rio do solo pode extingui-lo, mas a mora do
superficiá rio nesse caso é ex persona. Entã o, 1,5 ano depois do inicio do direito de superfície no
exato momento que o superficiá rio termina de fazer a construçã o da fá brica e ela passaria entao a
explorá -la, vem o proprietá rio do solo e diz que nã o quer mais. Nesse caso, seria possível falar em
abuso do direito do proprietário do solo.

E nesta caso se aplica por analogia o art. 473, pará grafo ú nico do CC, que trata da resiliçao
unilateral na teoria geral dos contratos (lembrando que a resiliçao é a extinçã o do contrato pela
manifestaçao de vontade – se é bilateral, temos o distrato; se é uniteral o contrato é extinto pela
mera manifestaçao de vontade de uma das partes). Entã o, aplicando-se esse dispositivo por
analogia, o superficiá rio vai dizer o seguinte: o proprietá rio do solo pode até extiguir o direito de
superfície, mas voce terá que aguardar no mínimo, po exemplo, 02 anos, porque seria um prazo
razoá vel para eu obter o retorno dos investimentos que eu fiz para a construçã o da fá brica.

O direito de superfície pode ser gratuito ou oneroso – art. 1370 do CC. A remuneraçã o paga
pelo superficiá rio ao proprietá rio do solo é chamada de SOLARIUM. Entã o, o direito de superfície
nã o é essencialmente gratuito ou essencialmente oneroso. Ele pode ser dar pelas duas vias.

Art. 1372, parágrafo único:

No CC atual um dos movimentos legislativos foi a inserçã o do direito de superfície no CC e a


vedaçã o à constituiçã o de novas enfiteuses, que foi abolida da parte dos direitos reais – art. 2038 do
CC (disposiçõ es transitó rias) – houve uma vedaçã o a criaçã o de novas enfiteuses, contudo, foi
garantida a subsistencia das enfiteuses até entã o existentes.

E com isso o legislador, em alguns casos, teve em mira trazer diferenças essenciais entre os
institutos. E aqui nó s temos mais um exemplo disso: tanto na enfiteuse quanto no direito de
superfície, há direito de preferencia. Porque na enfiteuse, quando enfiteuta tem por objetivo
transferir o domínio ú til a um terceiro o proprietá rio tem direito de preferencia para a aquisiçã o do
domínio ú til. Lembrando que o titular do domínio ú til atua quase que como um proprietá rio
aparente na enfiteuse. Quais sã o as ú nicas restriçoes, limitaçõ es ao titular do domínio ú til? O
pagamento do foro anual e a questã o do laudênio.

O que justifica a incidencia do laudênio na enfiteuse? É que na enfiteuse, se o titular do domínio ú til
quiser transferir o domínio ú til a um terceiro, o proprietá rio do solo tem direito de preferencia. O
laudenio é uma contrapartida devida ao proprietá rio do solo, caso este nã o exerça o direito de
preferencia. Por isso que na prá tica quando se transfere o dominio ú til do enfiteuta a um terceiro é
devido o laudenio, porque o nã o exercicio do direito de preferencia pelo proprietá rio faz com que
haja a incidencia do laudenio.

Art. 1.372. O direito de superfície pode transferir-se a terceiros e, por morte do


superficiário, aos seus herdeiros.

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Parágrafo único. Não poderá ser estipulado pelo concedente, a nenhum título,
qualquer pagamento pela transferência.  ou seja, o legislador aqui está
proibindo o laudênio. E mais uma vez contrastando o direito de superfície
com a enfiteuse.

O estatuto da cidade é omisso em relação ao tema. Logo, em relação ao estatuto, sobre esse
tema, há duas correntes:

1ª corrente (MARCO AURELIO BEZERRA DE MELLO): mesmo sobre a incidencia do estatuto da


cidade nã o se admite laudenio em direito de superfície. Seria aplicá vel por analogia o CC, porque o
objetivo do legislador foi reforçar a diferença entre os institutos, ou seja, a impossibilidade de
laudênio seria da essencia do direito de superfície.

2ª corrente (TEPEDINO): diante do silencio do estatuto da cidade nada impede que as partes
pactuem laudenio – princípio da autonomia privada.

 PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE ENFITEUSE x DIREITO DE SUPERFÍCIE:

ENFITEUSE DIREITO DE SUPERFÍCIE


É perpétua Propriedade superficiá rio é temporá ria
O domínio ú til é ilimitado quanto ao fim (o Art. 1374 – o proprietá rio do solo pode
titular do domínio ú til pode conferir ao limitar a destinaçã o da propriedade
bem a destinaçã o que quiser) superficiá ria
Foro anual
Laudênio Nã o cabe laudênio em relaçã o ao direito de
superfície sujeito ao CC.
Em relaçao ao estatuto da cidade o tema é
controvertido.
Direito de resgate (o enfiteuta, obedecidos O que nã o ocorre na propriedade
alguns requisitos, pode adquirir a superficiá ria.
propriedade sobre o bem)

Art. 1374: Prevê o desvio de finalidade pelo superficiário (ou tredestinação)

O dispositivo deixa claro que o proprietá rio do solo pode delimitar o objeto da concessã o e a
inobservancia desta destinaçã o acordada entre as partes dá azo a extinçã o antecipada do direito de
superfície.

Ex.: vamos imaginar que tenhamos uma propriedade do solo numa area totalmente desabitada. O
proprietá rio daquela area acredita que ela terá um vocaçã o industrial futura num prazo de 10 anos.
Ele pode, entã o, estabelecer um direito de superfície sobre o seu imovel e deixar claro no contrato
que o superficiá rio poderá ali construir uma fabrica, uma industria, inclusive, delimitando o tipo de
atuaçã o da fá brica ou da indú stria. Vejam que se as partes assim acordam há uma destinaçã o da
propriedade superficiá ria pré acordado entre o proprietá rio do solo e o superficiá rio a
inobservancia dessa destinaçã o pelo superficiá rio dá margem a aplicaçã o do art. 1374 do CC –
poderá o proprietá rio do solo exigir a extinçã o antecipada do direito de superfície.

Remissã o do art. 1374 ao art. 130 do CC. A propriedade superficiá ria é resolú vel, temporá ria. Com o
implemento da condiçã o resolutiva ou do termo final o proprietá rio do solo é quem vai adquirir a
propriedade sobre aquela construçã o ou plantaçã o que antes era de titularidade do superficiá rio.

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Pode o proprietá rio do solo adotar medidas conservativas do seu direito eventual, ou seja, do seu
direito eventual à aquisiçã o da propriedade sobre as construçoes ou plantaçõ es.

Entã o, essa fiscalizaçã o do proprietá rio do solo em relaçã o aquilo que fora acordado no direito de
superfície em relaçã o à destinaçã o do bem conferida pelo superficiá rio, vem em consonancia com a
faculdade de fiscalizaçã o que é conferida ao proprietá rio do solo pelo art. 130 do CC.

Vamos imaginar que tenhamos um direito de superfície pactuado por 40 anos. E a 34 anos o
superficiário venha conferindo destinação diversa daquela que fora acordada. Será que
depois de 34 anos inerte pode o proprietário do solo num belo dia passar a exigir a aplicação
do art. 1374? Nã o! É possivel aqui mitigar a aplicaçã o do art. 1374 através da supressio – é um dos
desdobramentos do princípio da boa-fé objetiva – representa a perda de uma prerrogativa em
virtude da inercia prolongada do seu titular. É preciso que essa inercia desperte em outrem uma
legítima expectativa.

Também parece possivel mitigar a aplicaçã o do art. 1374 diante da teoria do adimplemento
substancial. Se o desvio de finalidade aqui é inexpressivo, ele nã o é substancial, nã o me parece
plausível que o proprietá rio do solo possa resolver antecipadamente o direito de superfície.
Percebam inclusive que a possibilidade de resoluçã o antecipada nã o afasta o cabimento de tutela
específica. Nada impede que o proprietá rio do solo o invés de buscar a resoluçã o antecipada,
busque a tutela específica por aquilo que fora acordado; busque exigir que o superficiá rio cumpra a
destinaçã o que fora anteriormente acordada.

OBS.: IPTU progressivo (CHAVES)  que na verdade resulta do descumprimento a funçã o social –
art. 7º da estatuto da cidade. Esse autor defende que a legitimidade passiva para responder pelo
IPTU progressivo é exclusiva do superficiá rio, porque diante do direito de superfície acordado,
caberia ao superficiá rio conferir a destinaçã o social ao bem. Como esse IPTU progressivo nã o deixa
de ter natureza sancionató ria, na verdade, caberia ao superficiá rio exclusivamente a legitimidade
passiva.

Isso é discutível, porque essas discussõ es de direito privado nã o sã o oponíveis ao fisco, por força do
proprio direito tributá rio. Entã o, na verdade, o afastamento da legitimidade passiva do proprietá rio
do solo nã o parece justificá vel diante da sistemá tica do direito tributá rio, porque essas questoes de
direito privado nã o sã o oponíveis ao fisco.

Além disso, ainda que o superficiá rio nã o esteja destinando o bem a sua funçã o social, nó s nã o
podemos nos esquecer do art. 130 do CC – que permite ao proprietá rio do solo exerer atos de
fiscalizaçã o sobre a conduta do superficiá rio, por ser titular do direito eventual ele pode e deve
adotar medidas conservativas. Logo, o proprietá rio do solo tem algum tipo de ingerencia sobre a
conduta do superficiá rio.

E seria ainda possivel aplicar por analogia o art. 1374 do CC, porque se o proprietá rio do solo pode
exigir a extinçã o antecipada da superfície por desvio de finalidade, o CC está nitidamente
permitindo ao proprietá rio do solo exercer atos de fiscalizaçã o sobre a conduta do superficiá rio.
Entã o, se o superficiá rio vem negando a funçã o social, pode o proprietá rio do solo exigir
antecipadamente a extinçã o da superfície ou a tutela especifica, exigindo que o superficiá rio
cumpra a funçã o social da propriedade.

Logo, para o professor a tese de CHAVES parece discutível!

Art. 1375 do CC: Consequências da extinção do direito de superfície

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Art. 1.375. Extinta a concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena
sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se
as partes não houverem estipulado o contrário.

Em regra, pelo direito de superfície o proprietá rio do solo vai conceder a outrem o direito de
construir ou de plantar – direito de superficie por concessã o. Entã o, na realidade, na medida em
que o superficiá rio faz a construçã o ele imediatamente adquire a propriedade sobre aquela
construçã o; ou seja, aquela construçã o em nenhum momento foi titularizada anteriormente pelo
proprietá rio do solo. Logo, o proprietá rio do solo nã o retoma a propriedade sobre a construçã o,
uma vez nunca a teve. Só haveria uma exceçã o a isso no caso de direito de superfície por cisã o.
Porque no caso de direito de superfície por cisã o a propriedade sobre a construçã o anteriormente
era exercida pelo titular do solo, mas nã o é a regra no direito brasileiro.

Entã o, o proprietá rio do solo nã o tem que indenizar o superficiá rio por aquela construçã o ali
realizada, salvo acordo em contrá rio. Mas a presunçã o relativa do CC é no sentido de que nã o cabe
indenizaçã o pelas construçõ es ou plantaçõ es realizadas. Mas podem as partes dispor diversamente.

Isso deixa claro que mesmo que o direito de superfície seja gratuito, em que nã o há o pagamento do
SOLARIUM, nã o necessariamente há gratuidade, há liberalidade pelo proprietá rio do solo. Ex.: o
sujeito tem um terreno numa localidade absolutamente abandonada, ele acha que daqui a 10 anos
aquela area terá uma vocaçã o industrial; ao inves de deixar largado o terreno ele estabelece ali o
direito de superfície e concede a outrem o direito de construir naquele terreno e destina a atividade
do superficiá rio a construçã o de uma fá brica ou industria. E ao termino do prazo de concessao, o
proprietá rio do solo vai adquirir a propriedade sobre aquele construçoes, independentemente de
indenizaçã o. Entã o, ainda que nã o haja o pagamento de qualquer remuneraçã o pelo superficiá rio ao
proprietá rio do solo há um nítido interesse economico do proprietá rio do solo com a utilizaçao do
instituto.

MARCO AURELIO BEZERRA DE MELLO defende que é possivel defender a extinçã o do direito de
superfície pelo nã o uso. Se o superficiá rio nã o realiza a construçã o por um lapso temporal
expressivo, o nã o uso permite ao proprietá rio do solo exigir a extinçã o do direito de superfície.
Seria aplicavel por analogia o art. 1389, III – que trata do direito real de servidao e art. 1410, VIII
que trata do usufruto.

Art. 1376 do CC: trata da desapropriação

Art. 1.376. No caso de extinção do direito de superfície em conseqüência de


desapropriação, a indenização cabe ao proprietário e ao superficiário, no valor
correspondente ao direito real de cada um.

Se há desapropriaçã o sobre o imó vel objeto do direito de superfície cai nã o apenas o direito do
proprietá rio do solo, mas também cai a propriedade superficiá ria, até porque desapropriaçã o é
aquisiçã o originá ria.

Nó s temos na verdade duas propriedade paralelas: a propriedade do solo e a propriedade


superficiá ria. Entã o, o valor da indenizaçã o pago pela fazenda pú blica vai ser dividido entre o
proprietá rio do solo e o proprietá rio superficiá rio.

Enunciado 322 do CJF – deixa claro que o valor do direito real de cada um há de ser vista a luz do
caso concreto.

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 FONTES DO DIREITO DE SUPERFÍCIE:
Usualmente se constitui por via contratual. É claro que o acordo por si só nã o constitui direito
de superfície; estamos diante de um direito real. O proprio art. 1369 do CC deixa claro que tem que
ter instrumento pú blico levado junto ao registro. O registro aqui tem natureza constitutiva – é o que
vai constituir o direito de superfície – mas esse registro tem como base um contrato.

Mas nada impede ainda a constituição do direito de superfície por via testamentária. O
sujeito pode ser proprietá rio de um determinado terreno, faz um testamento e diz que quando do
seu falecimento a titularidade do terreno vai para fulano e ao mesmo tempo o ciclano terá o direito
de construir sobre aquele terreno por um lapso temporal de 40 anos e terá propriedade resoluvel
sobre a construçao por 40 anos.

Uma possível terceira fonte seria a usucapião. Cabe usucapião de direito de superfície?

Num primeiro momento se entendia que nã o, porque era extremamente difícil visualizar uma
hipotese em que algume viesse a usucapir a propriedade superficiá ria sem usucapir a propriedade
do solo.

Mas, hoje, se percebe com nitidez que é possível sim falar em usucapiao de direito de superfície na
hipotese de concessã o a non domino da propriedade superficiá ria. Vamos supor que numa
determinada data X o suposto proprietá rio do solo constitua direito de superficie em favor de
outrem. 20 anos depois, o verdadeiro proprietá rio do solo aparece e diz que nã o há propriedade
superficiá ria alguma, porque aquele sujeito que há 20 anos atrá s lhe concedeu o direito de
superfície na verdade ele nã o era dono  concessã o a non domino. Qual será a tese defensiva em
favor do suposto proprietá rio superficiá rio? Será a usucapiã o do direito de superfície, porque
percebam que naquele caso o animus do sujeito nã o era animus de proprietá rio do solo e sim
animus de proprietá rio superficiá rio.

Se o verdadeiro proprietá rio do solo aparece 20 anos depois da concessao a non domino da
propriedade superficiá ria, nó s acabamos de ver que o proprietá rio superficiá rio, vai poder alegar
usucapiã o, porque na verdade o que vai viabilizar a aquisiçã o da propriedade superficiá ria é a via
da usucapiã o, na medida em que a concessã o a non domino nã o permite a transferencia da
propriedade superficiá ria. Mas vamos supor que naquele caso quem venha vindicar usucapiao seja
o concedente a non domino; o sujeito que supostamente era proprietá rio do solo. Vejam que
eventual usucapiã o em favor do suposto proprietá rio do solo, geraria uma PÓS EFICACIZAÇÃO DO
DIREITO DE SUPERFÍCIE, porque aquele que havia concedido a non domino a propriedade
superficiá ria veio a posteriormente adquirir a propriedade sobre o solo. Seria aplicá vel por
analogia aqui o art. 1268, § 1º que trata da pó s eficacizaçã o da tradiçao.

Art. 1377 do CC: prevê que o direito de superfície pode ser constituído por pessoa jurídica de
direito público interno.

No ambito do estado do RJ existe uma lei estadual que contempla direito de superfície sobre bens
pú blicos estaduais – art. 24 a 29 da LC estadual 131/09.

2. DIREITO DO PROMITENTE COMPRADOR


Art. 1.417 a 1.418 do CC.

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Esse tema guarda correlaçã o com o tema do contrato preliminar – art. 462 a 466 do CC (tema
tratado em TG dos contratos).

Nó s podemos ter contratos preliminares de diversas espécies, mas nã o há nenhuma dú vida de que
o contrato preliminar mais utilizado na prá tica é o contrato preliminar de compra e venda de
imó vel.

Será que todo o contrato preliminar de compra e venda de imóvel gera o direito do promitente
comprador dos art. 1.417 e 1.418 do CC? Nã o!

Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou


arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada
no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real
à aquisição do imóvel

1º requisito: que o contrato preliminar de compra e venda não contenha cláusula de


arrependimento. Porque na sistemá tica geral do contrato preliminar, o contrato preliminar pode
ou nã o conter clausula de arrependimento – art. 463 – entã o, se o contrato preliminar contém
clá usula de arrependimento nos moldes do art. 463, nó s nã o estaríamos já falando de direito de
promitente comprador.

2º requisito: registro – para que haja direito do promitente comprador nos moldes dos art. 1417 e
1418 o contrato preliminar tem que estar registrado; o que nã o é requisito geral à celebraçã o de
contrato preliminar de compra e venda de imó vel.

Então, o contrato preliminar de compra e venda de imóvel só irá atrair a aplicação dos art.
1417 e 1418 se não houver cláusula de arrependimento + se ele estiver registrado. O direito
do promitente comprador é previsto como espécie de direito real, logo, precisa de registro.

O art. 1417 exige o registro para que haja direito do promitente comprador. O art. 1418 contempla
a tutela específica para o descumprimento da obrigaçã o de fazer pelo promitente vendedor. Qual é
a obrigação do promitente vendedor? Manifestar uma nova vontade no sentido de celebrar a
escritura definitiva no caso da quitaçao pelo promitente comprador. Se ele descumpre essa
obrigaçã o de fazer, o art. 1418 preve o cabimento da adjudicação compulsória, que nada mais
representa do que tutela específica.

Entã o, aqui na verdade essa sentença do juiz na açã o de adjudicaçã o compulsó ria vai ter o condã o
de substituir manifestaçã o de vontade a que se obrigara a outorgar o promitente vendedor. Ela tem
o condao de apenas e tã o somente substituir a manifestaçã o de vontade do promitente vendedor.
Qual é a importancia prá tica disso? A ação de adjudicação compulsória é ação pessoal e por
isso não transfere imediatamente a propriedade, tal qual uma açao real (é diferente da açao
de usucapiã o que é açã o real – a sentença tem o condã o de viabilizar imediatamente a transferência
de propriedade). Aqui nã o, a sentença vai se restringir a manifestar a vontade a que se obrigara a
outorgar o promitente vendedor. Entã o, se vai extrair uma certidao da sentença e por essa certidã o
se permite a elaboraçã o de uma escritura definitiva pelo oficial do registro.

Efeito prá tico disso: será que pode o oficial do registro suscitar dúvida em relação ao registro
oriundo de uma sentença de adjudicação compulsória? Pode! Porque a sentença da açã o de
adjudicaçã o compulsó ria nã o determina a transferencia de propriedade; ela se restringe a
substituir a vontade a que se obrigara a outorgar o promitente vendedor. Essa vontade teria o
condao de viabilizar a celebraçã o da escritura definitiva e a escritura definitiva por si só nã o

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transfere a propriedade. Entã o, a sentença de adjudicaçao compulsó ria nã o tem o condã o de
transferir a propriedade, mas apenas de vialibizar a celebraçã o da escritura definitiva.

O art. 1418 prevê adjudicação compulsória que é na verdade uma tutela específica aplicável
no caso de descumprimento de obrigação de fazer pelo promitente vendedor. Só que o artigo
imediatamente anterior prevê o registro. Parece que só cabe tutela especifica (adjudicaçã o
compulsó ria) se o contrato preliminar tiver sido registrado.

Da mesma forma, isso se verifica lá na teoria geral do contrato preliminar, porque o art. 464 prevê
genericamente a tutela específica e o art. 463, paragrafo ú nico prevê o registro. Mais uma vez
parece que só cabe tutela específica se o contrato preliminar tiver sido registrado.

Sobre o tema existe a Sú mula 239 do STJ: “o direito à adjudicação compulsória não se condiciona
ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis” – entã o, a sú mula diz
que o direito à adjudicaçã o compulsó ria independe do registro. Houve quem defendesse que essa
sú mula teria caído por terra com a vigencia do CC atual (CARLOS ALBERTO DADOS MALUF),
porque o CC atual exige o registro para o cabimento da adjudicaçã o compulsó ria. Isso hoje está
superado!

O entendimento amplamente dominante hoje é no sentido de que a sú mula subsistente, nã o foi


desconstituida, mas ela precisa ser bem interpretada, porque pela sú mula a adjudicaçã o
compulsó ria sempre independe de registro quando na verdade nã o é bem assim. Para que haja
obrigação de fazer interpartes, entre os contratantes originários, é preciso que haja o registro? Nã o!
Entã o, se há obrigaçã o de fazer entre os contratantes originá rios, cabe tutela específica interpartes,
independentemente de registro. Entã o, entre os contratantes originá rios, a adjudicaçã o
compulsó ria independe de registro.

Mas por outro lado imaginem que o contrato preliminar nã o esteja registrado e o promitente
vendedor transfere o bem para um terceiro de boa-fé. Percebam que aquela obrigaçã o de fazer nã o
é oponível ao terceiro de boa-fé se o contrato preliminar nã o foi registrado. E na medida em que
aquela obrigaçã o de fazer nã o é oponível ao terceiro de boa-fé, nã o cabe tutela específica em face do
terceiro de boa-fé, ou seja, nã o cabe adjudicaçã o compulsó ria em face do terceiro de boa-fé.

Nesse sentido, temos Enunciados 30, 95 e 253 do CJF.

AULA 02
O contrato preliminar de compra e venda de imovel pode ser proprio ou improprio:

 O contrato preliminar proprio é aquele que admite arrependimento (não se presume – é


preciso que haja explícita cláusula de arrependimento)
 O contrato preliminar improprio é aquele que nã o admite arrependimento

O art. 463 do CC deixa claro que a presunção relativa no direito brasileiro vem no sentido de
que o contrato preliminar é improprio, ou seja, para que caiba arrependimento (para que o
contrato preliminar seja proprio) é indispensá vel que haja explícita inserçã o de cláusula de
arrependimento. O direito de arrependimento não se presume.

É importante destacar que em alguns casos o ordenamento juridico veda a inserçã o de clá usula de
arrependimento. Nesses casos, o contrato preliminar será impró prio por determinaçã o legal. Que
hipó teses seriam estas?

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 Art. 25 da Lei 6766/79
 Art. 22 da DL 58/37 c/c Sú mula 166 do STF (essas duas hipó teses mencionadas envolvem
compromisso de compra e venda de imó veis urbanos e rurais loteados)
 Art. 33, § 2º da Lei 4591/64 (incorporaçõ es imobiliá rias)

Entã o, nesses casos o contrato é preliminar impró prio por determinaçã o legal.

Qual é a relevância disso? Para que haja aplicabilidade do direito real de aquisição
contemplado nos art. 1417 e 1418 é preciso que o contrato preliminar seja impróprio, que
não haja cláusula de arrependimento.

OBS.: O art. 1418 prevê o cabimento da tutela específica: adjudicaçã o compulsó ria. Há uma regra
específica sobre o tema: art. 26, § 6º da lei 6766/79 – esse dispositivo trata de compromisso de
compra e venda de imó veis urbanos loteados. E esse dispositivo deixa claro que nesta hipó tese a
demonstraçã o de quitaçã o pelo promitente comprador autoriza o oficial do registro a transferir
administrativamente o propriedade. Entã o, se o promitente comprador vai a registro e comprova a
quitaçã o, a demonstraçã o desta quitaçã o permite ao oficial transferir a propriedade em cará ter
extrajudicial, sem que se exija uma nova manifestaçã o de vontade pelo promitente vendedor, ou
seja, independentemente da celebraçã o do contrato definitivo. O mero compromisso por si só
acompanhado da prova da quitaçã o é título aquisitivo há bil a transferência da propriedade junto ao
registro. Enunciado 87 do CJF.

Nesse caso específico nã o há margem para adjudicaçã o compulsó ria, porque se o promitente
comprador comprova a quitaçã o junta ao registro haverá imediatamente a transferência de
propriedade, independetemente de nova manifestaçã o vontade do promitente vendedor. A
tranferencia da propriedade se dará em carater extrajudicial, junto ao oficial do registro.

Só que há vários doutrinadores contemporâneos (isso é controvertido) que defendem a


aplicação extensiva dessa regra a todo e qualquer contrato preliminar impróprio. Há quem
defende que em se tratando de contrato preliminar improprio a comprovaçã o da quitaçã o pelo
promitente comprador já autoriza o oficial do registro a transferir a propriedade,
independentemente da celebraçã o da escritura definitiva e, portanto, independentemente de
adjudicaçã o compulsó ria. Nesse sentido: JOSÉ OSÓ RIO DE AZEVEDO JR.; CHAVES; SILVIO VENOSA.

Quais seriam os argumentos em favor dessa aplicaçã o extensiva?

O primeiro argumento seria a boa-fé objetiva, porque se nã o cabe arrependimento qual é o ú nico
ó bice a aquisiçã o da propriedade pelo promitente comprador nesse caso? A quitaçã o! E na
realidade com a comprovaçã o da quitaçã o nã o haveria razã o plausível para que o promitente
vendedor tenha que manifestar uma nova vontade; isso violaria o dever anexo de cooperaçã o, de
colaboraçã o oriundo da boa-fé objetiva. Além da boa fé objetiva, vá rios autores falam em funçã o
social da propriedade.

Outro argumento invocado pela doutrina é a tendência de desjudicializaçã o de procedimentos, que


é algo marcante no direito contemporâ neo, buscando desafogar o poder judiciá rio. E percebam que
essa possibilidade de transferencia administrativa da propriedade, independentemente de
intervençã o judicial, vem nesse contexto de desjudicializaçã o de procedimentos.

A doutrina também invoca o princípio da efetividade ou da operabilidade. E, em sendo o caso de


relaçã o de consumo, há quem invoque os art. 6º, VIII e 7º do CDC.

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OBS.: Tese do JOSÉ OSÓRIO DE AZEVEDO JR. (minoritária, mas interessante para a
defensoria): a doutrina maciçamente traz a classificaçã o de contrato preliminar proprio e
improprio. Sendo que o contrato preliminar improprio é o que nã o comporta arrependimento. Esse
autor diz que quando as partes celebram um contrato preliminar improprio em que nã o há direito
de arrependimento, qual é a real intençã o do promitente vendedor? É vender! E a real intençã o do
promitente comprador é comprar! Só que as partes nã o celebram a compra e venda de plano para
que a propriedade permaneça com o vendedor com escopo de garantia. Para garantir o
coumprimento das parcelas pelo promitente comprador, o promitente vendedor mantem consigo a
propriedade sobre o bem. Entã o, o compromisso de compra e venda aqui na verdade serve como
instrumento de garantia em favor do promitente vendedor, reservando para si a propriedade
enquanto nã o haja a quitaçã o.

E percebam que temos institutos parecidos a esse, com uma funçã o similar, como, por exemplo, a
compra e venda com reserva de domínio. Na compra e venda com reserva de domínio o vendedor
mantem consigo a propriedade com o ú nico escopo de garantia. E percebam que a partir do
momento em que o vendedor efetua a quitaçã o ocorre a imediata transferencia da propriedade ao
comprador, independentemente de qualquer nova manifestaçao de vontade pelo vendedor; porque
a condiçã o resolutiva era a quitaçã o pelo comprador. Entã o, o implemento da condiçã o por si só
resolve a propriedade do vendedor, que é imediatamente transferida ao comprador.

Percebam que de maneira similar ocorra a alienaçã o fiduciá ria em garantia, porque na alienaçã o
fiduciá ria a grosso modo o devedor fiduciante transfere a propriedade ao credor fiduciá rio e essa
transferencia de propriedade ao credor fiduciá rio tem por escopo a mera garantia. Na medida em
que o devedor fiduciante efetua a quitaçã o, cai automaticamente a titularidade do proprietá rio
fiduciá rio em favor do devedor fiduciante. Ou seja, aqui também a propriedade fica como mero
instrumento de garantia. E na medida em que haja a quitaçã o da prestaçao garantida, cai também a
propriedade que tinha como escopo aquela garantia.

Entã o, na realidade, esses dois institutos que tem uma funçã o similar evidenciam de acordo com o
JOSE OSÓ RIO a possibilidade de aplicaçã o extensiva do art. 26, § 6º da lei 6766/79. Na verdade,
para ele, o famoso contrato preliminar improprio sequer seria contrato preliminar, porque seria da
essencia do contrato preliminar que o promitente vendedor se obrigue a celebrar o contrato
definitivo e o suposto contrato preliminar improprio nã o obriga o vendedor a celebrar o contrato
defintivo, porque com a quitaçã o dá-se a imediata transferencia da propriedade
independentemente de nova manifestaçã o de vontade pelo vendedor. Entã o, o suposto contrato
preliminar improprio na realidade é espécie do gênero compra e venda. Para ele nó s nã o teríamos
sequer contrato preliminar propriamente dito no que a doutrina chama de contrato preliminar
improprio (tese minoritá ria).

OBS.: TUTELA DA POSSE DO PROMITENTE COMPRADOR POR DÍVIDAS DO PROMITENTE


VENDEDOR:

Nó s temos lá a promessa de compra e venda já celebrada e há dívidas que recaem sobre o


promitente vendedor. E esses credores do promitente vendedor conseguem a penhora do imó vel
objeto do compromisso de compra e venda. A dú vida é: em que medida o promitente comprador
sucumbe diante da penhora efetuada por credores do promitente vendedor?

Aqui é pacífico que nós temos duas situações distintas:

1) Promitente comprador NÃO INVESTIDO na posse

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Entã o, quando da penhora do imó vel, já há o compromisso de compra e venda, mas o promitente
comprador ainda nã o foi investido na posse.

Nesse caso, o promitente comprador sucumbe diante do registro da penhora. O art. 659, § 4º do
CPC deixa claro que o registro da penhora faz com que ela produza efeitos erga omnes e passe a ser
dotada de sequela. O promitente comprador perderá todos os seus direitos diante do registro da
penhora.

Exceção: Se o contrato preliminar havia sido anteriormente registrado, porque se o contato


preliminar foi registrado antes da penhora, pelo princípio da prioridade do sistema registral, o
promitente comprador terá primazia em detrimento da penhora viabilizada pelos credores do
promitente vendedor. Nesse caso, o promitente comprador terá os seus direitos assegurados.

Em havendo registro prévio do contrato preliminar o promitente comprador terá tutela em face da
penhora, ele terá preferencia em relaçã o a penhora. Exceção à exceção: se o contrato preliminar
foi celebrado em fraude contra credor ou fraude à execução! Nesse caso, os interesses dos
credores que penhoraram o imó vel terã o primazia em detrimento do promitente comprador.

2) Promitente comprador JÁ INVESTIDO na posse

Neste caso, a regra geral é no sentido de que se o promissá rio comprador já havia sido investido na
posse quando da penhora, o promissá rio comprador tem tutela jurídica em face da penhora. O
promissá rio comprador vai poder resistir, refutar a penhora através dos embargos de terceiro.

Há alguns anos atrá s havia a Sú mula 621 do STF que dizia que essa tutela da posse do promissá rio
comprador em face da penhora só se aplicava se o contrato preliminar tivesse sido registrado,
porque apenas com o registro a tutela da posse do promissá rio comprador seria dotada de
oponibilidade erga omnes. Só que esse entendimento hoje é superado, porque desde 1988 quem
enfrenta a questã o em ú ltima instancia é o STJ e o STJ tem a Súmula 84 (súmula hoje aplicável) –
“é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de
compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro”.

Entã o, essa tutela da posse do promissá rio comprador já investido na posse em face da penhora
independe do registro do contrato preliminar. Entendeu o STJ que o registro do contrato é
indispensá vel à oponibilidade erga omnes sim, mas no que tange ao direito de propriedade. O
registro aqui é pressuposto necessá rio a averiguaçã o dos interesses dominiais envolvendo
propriedade sobre o imó vel e aqui através desses embargos de terceiro o que o promissá rio
comprador está suscitando nã o é a aquisiçã o de propriedade e sim apenas a tutela da posse e a
tutela da posse especificamente independe do registro do contrato preliminar.

Atenção: Aqui é possível excepcionar essa solução se o compromisso de compra e venda foi
celebrado em fraude contra credores ou fraude à execução; nesse caso, haverá anulabilidade
ou ineficá cia do compromisso de compra e venda em relaçã o ao credor e aí nesse caso o
promissá rio comprador sucumbirá diante do credor, ainda que já investido na posse.

RESP 908.137/STJ  Esse julgado afirma que a Súmula 84 do STJ se aplica ainda que o
promissário comprador tenha posse indireta. Qual foi a hipó tese do julgado? Foi feito um
compromisso de compra e venda em que o bem permaneceu com o promitente vendedor, mas as
partes firmaram uma clá usula CONSTITUTI – constituto possessó rio (art. 1267, pu) – e com isso
aquela promessa de compra e venda gerou um desmebramento possessó rio e por esse
desmembramento possessó rio (posse ficta) o promissá rio comprador se investiu na posse indireta

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do bem, em que pese o bem ter permanecido com o promitente vendedor, o promissá rio
comprador adquiriu imediatamente a posse indireta por força da cláusula constituti. E essa clá usula
permitiu ao promissá rio comprador se insurgir em face da penhora, ainda que ele nã o tivesse se
investido no bem efetivamente.

RESP 769.731/STJ  houve desapropriaçã o indireta sobre um imó vel que era objeto de
compromisso de compra e venda. Sendo que esse compromisso de compra e venda nã o estava
registrado. E aí se instaurou a lide entre promitente comprador e promitente vendedor em relaçã o
à titularidade da indenizaçã o pelo poder pú blico. O poder pú blico depositou a indenizaçã o no juizo
e o promitente comprador e vendedor litigaram pela indenizaçã o. O STJ disse que o registro do
compromisso de compra e venda é determinante para solução de titularidade da
propriedade sobre o bem em relação a terceiros, mas o registro pouco importa para
solucionar questões entre os proprios contratantes (compromitente comprador e
vendedor); e aí nesse caso o STJ disse que apesar de inexistente o registro, o indenização
deveria ser direcionada ao promitente comprador.

Enunciado 253 do CJF:

“Art. 1.417: O promitente comprador, titular de direito real (art. 1.417), tem a
faculdade de reivindicar de terceiro o imóvel prometido à venda.”

O titular do direito real de aquisiçã o (art. 1417) também é adotado de tutela reivindicató ria!

OBS.: COTA CONDOMINIAL é exemplo típico de obrigação PROPTER REM. Sabendo que
obrigaçao propter rem é aquela que recai sobre o atual do titular do direito real. O art. 1345 do CC,
inclusive, evidencia com clareza que a cota condominial é obrigaçao propter rem. O comprador do
imóvel (o novo titular do imóvel) responde por cotas condominiais pretéritas, porque a
obrigação é propter rem. E sendo o caso, ele exercerá posteriormente o direito de regresso
em face do vendedor.

A princípio, a obrigaçã o propter rem recai sobre o atual proprietá rio, aquele que está averbado
junto ao registro. Só que o STJ já pacificou o entendimento de que o promissá rio comprador
investido na posse tem legitimidade passiva para responder por cota condominial. Então, o
promissário comprador investido na posse responde pelas cotas condominiais, ainda que
não tenha havido a transferência de propriedade e ainda que não haja registro! O que se
exige é que o promissá rio comprador esteja investido na posse e que o condomínio tenha ciencia
dessa investidura na posse. Embargos no RESP 489.647 (fala que a legitimidade surge a partir da
entrega das chaves).

Em regra, a obrigaçã o propter rem recai sobre o atual titular do direito real, sobre o atual
proprietá rio. Temos essa exceçã o trazida pelo STJ (promissá rio comprador desde investido na
posse), mas vale a pena mencionar também o art. 27, § 8º da lei 9514/97 – alienaçã o fiduciá ria de
imó vel – se o devedor fiduciante nã o paga a prestaçao dentro do prazo acordado e ele permanece
inerte quanto a este pagamento dentro do prazo previsto em lei, se consolida a propriedade em
favor do credor fiduciá rio. Entã o, o credor fiduciá rio que tinha apenas a propriedade fiduciá ria
passa a ter propriedade plena diante do inadimplemento do devedor fiduciante. E aí esse
dispositivo diz o seguinte: em que pese a consolidaçã o da propriedade em favor do credor
fiduciá rio, o devedor fiduciante continua respondendo pelas cotas condominiais, enquanto nã o
restitui o imó vel ao credor fiduciá rio. Entã o, o devedor fiduciante nã o proprietá rio é legitimado
passivo a responder por cotas condominiais enquanto ele nã o restitui o imó vel ao credor fiduciá rio,
que é proprietá rio pleno a partir da consolidaçã o da propriedade pelo nã o pagamento.

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 MORA DO PROMITENTE COMPRADOR
A mora do promitente comprador é EX PERSONA. A mora do promissá rio comprador é exceçã o à
regra geral do art. 397, caput do CC. O art. 397 do CC diz que quando há inadimplemento de
obrigaçã o com data certa a mora é EX RE. Entã o, se eu tenho uma determinada parcela para pagar
no dia 05, num contrato de locaçã o, por exemplo, se eu nã o pago no dia 05, no dia 06 a minha mora
se constitui automaticamente; a mora é ex re.

Só que no caso do promissá rio comprador nó s temos regras específicas que afastam a incidencia
geral do art. 397, caput. Nesse sentido, art. 32 da lei 6766/79; art. 14 do DL 58/37; art. 1º do DL
745/69; art. 63 da lei 4591/64. Em todos esses casos a mora é EX PERSONA por determinaçã o legal.

Será que a mora é EX PERSONA independentemente de registro? Sim – súmula 76 do STJ. O


fato da mora ser ex re ou ex persona diz respeito a interesses que envolvem as partes contratantes;
nã o envolve titularidade nem interesse de terceiro. Entã o, a ausencia de registro aqui nã o é ó bice à
aplicabilidade da mora ex persona, porque trata-se de interesse que envolve os contratantes
originá rios.

Percebam que nesses casos em que a lei impoe a prévia interpelaçã o para constituir em mora, é
inoperante a clá usula resolutiva expressa prevista no art. 474 do CC. Porque com a clá usula
resolutiva expressa, o contrato se resolve de pleno direito com o inadimplemento; o
inadimplemente por si só resolve o contrato.

OBS.: DESISTÊNCIA DO PROMITENTE COMPRADOR:

Pode ser que o promissá rio comprador esteja enfrentando dificuldades de efetuar os pagamentos e
diante dessas dificuldades haja a extinçã o do contrato. A questão importante aqui gira em torno
do que pode ou não ser retido pelo promitente vendedor em relação às parcelas já
adimplidas pelo promissário comprador.

Tem um dispositivo específico para compromisso de compra e venda de imó vel urbano loteado –
art. 35 da lei 6766/79. Mas a jurisprudencia aqui criou um standard independentemente deste
dispositivo.

Em se tratando de relaçã o consumerista, nó s nã o podemos nos esquecer do art. 53 do CDC, que


veda a chamada clá usula de decaimento, ou seja, veda a retençã o integral das parcelas pagas. Entã o,
ainda que haja inadimplemento do promissá rio comprador, e haja resoluçã o do contrato por força
desse inadimplemento, o promitente vendedor nã o pode reter integralmente as prestaçoes já
adimplidas e essa clausula que permitiria essa retençã o é nula – art. 53 do CDC.

Em nã o se tratando de relaçã o de consumo (nã o se aplicando o CDC), o ó bice à retençã o integral das
parcelas adimplidas é a aplicaçã o por analogia do art. 413 do CC – que prevê a reduçã o da clá usula
penal se ela for excessiva; e é excessiva a clá usula que permite ao promitente vendedor reter
integralmente as parcelas pagas pelo promitente comprador.

Logo, tanto o CDC quanto o CC vedam a retenção integral! Logo, a dúvida é: quanto pode ser
retido?

A jurisprudencia criou aqui um standard dizendo que, em regra, se justifica a retençã o de 25% das
parcelas adimplidas. INFORMATIVO 303/STJ. Se justificaria a retençã o desses 25% em virtude das
despesas administrativas, despesas com corretagem, despesas para recolocaçã o do imó vel no
mercado, eventual desgaste pelo uso do bem.

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Em se tratando de cooperativa habitacional – RESP 612.565/STJ – retençã o de apenas 10%, porque
o regime de construçã o em cooperativa é menos oneroso.

A jurisprudencia, inclusive, já entendeu que é nula a clá usula que impede a resiliçã o unilateral pelo
promissá rio comprador, sob a alegaçã o de dificuldades em efetuar o pagamento.

OBS.: Em relação ao compromisso de compra e venda de imóvel se aplica toda a sistemática


do direito de família que impõe a outorga conjugal – art. 1647, I do CC – que impoe a outorga
do conjuge para a celebração de compromisso de compra e venda – e art. 1649 do CC.

OBS.: SÚMULA 308/STJ  a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro nã o atinge
os promitentes compradores das unidades autonomas. Entã o, a construtora vai levantar um edificio
e para obter recursos para tal, ela celebra um contrato de mú tuo com a instituiçã o financeira e
como garantia a esse contrato de mú tuo, ela oferece o proprio imó vel que está sendo construído. A
obra vai avançando e a construtora vai celebrando compromissos de compra e venda com
particulares. Vamos supor que num determinado momento a construtora se torna inadimplemente
em relaçao à instituiçã o financeira. A instituiçao financeira vai atraves da hipoteca buscar a
excussã o judicial do imó vel. E pela regra geral a hipoteca em sendo direito real de garantia é dotada
de sequela, de ambulatoriedade e diante desta sequela da hipoteca, a instituiçã o financeira poderia
exigir a excussao judicial dos bens que se encontram com os promissá rios compradores, até porque
a hipoteca foi averbada junto ao registro e os promitentes comprador já tinham ciencia da hipoteca
pré-existente. Mas essa sú mula diz que nã o; afirma que essa hipoteca firmada entre a construtora e
a instituiçã o financeira nã o atinge os promissá rios compradores das unidades autonomas. Assim,
em que pese a hipoteca ser dotada de sequela e ambulatoriedade essa sequela é mitigada em favor
dos promissá rios compradores.

3. PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA ou ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM


GARANTIA
Vide modificações trazidas pela Lei 13.043/14 (comentários dizer o direito)

O art. 1361 do CC dá uma visã o introdutó ria sobre o tema.

O sujeito quer comprar um automovel, mas nã o tem dinheiro para pagar a vista o automovel ou nã o
quer se descapitalizar. Ele celebra, entã o, um contrato de mú tuo com uma instituiçã o financeira
para obter recursos para adquirir o automó vel. Só que para garantir o cumprimento daquele
contrato de mú tuo, ele transfere a propriedade fiduciá ria daquele automó vel à instituiçã o
financeira. Entã o, essa transferencia de propriedade do automó vel para a instituiçã o financeira tem
por ú nico objetivo garantir o cumprimento do contrato de mú tuo. Essa é a essencia da propriedade
fiduciá ria. A propriedade fiduciá ria serve como instrumento de garantia.

O nome propriedade fiduciá rio nos remete à classificaçao da parte geral do CC – negó cio fiduciá rio
– porque no negó cio fiduciá rio as partes se utilizam de um tipo negocial de efeitos mais
abrangentes do que o tipo usualmente adotado para atingir um determinado fim. Aqui nó s temos
um bem exemplo disso, porque ocorre a transferencia de propriedade que tem por objetivo a mera
garantia; o tipo negocial adotado é muito mais abrangente do que o tipo usualmente adotado para
atingir esse fim. Percebam que as demais hipó teses de direitos reais de garantia nã o geram a
transferência de propriedade, vide penhor, hipoteca, anticrese.

Súmula 28 do STJ  nada impede que no caso em que o sujeito está comprando o carro através do
mú tuo que ele faça a transferencia da propriedade fiduciá ria de um outro bem que nã o o

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automó vel. Por exemplo, ele pode ter uma lancha ou uma joia e nada impede que a transferencia da
propriedade fiduciá ria recaia sobre um outro bem que nã o aquele que está sendo adquirido através
dos recursos obtidos com o mú tuo.

Sobre o tema, nós temos várias legislações aplicáveis:

 O tema é disciplinado no CC –art. 1361 a 1368-B – o CC se aplica no caso de bem mó vel


infungível (art. 1361)

 Art. 66-B da lei 4728/65  se aplica para a garantia de créditos fiscais e previdenciá rios
(entã o, percebam que a alienaçao fiduciá ria pode servir como instrumento de garantia
desses créditos); para alienaçã o fiduciá ria de bem mó veis fungíveis (§ 3º); cessã o de
direitos sobre bens mó veis (cessã o fiduciá ria de crédito). Essa legislaçã o trata da alienaçã o
fiduciá ria no ambito do mercado financeiro e de capitais. Entã o, se a questã o se insere no
ambito do mercado financeiro e de capitais incide essa lei!

 Lei 9514/97  que trata da alienaçã o fiduciá ria de bens imó veis.

 No ambito processual, temos ainda o DL 911/69.

Diante dessa mú ltipla legislaçã o sobre o tema, nó s temos o art. 1368-A que nada representa do
que o sistema da especialidade. O CC deixa claro que as regras especiais continuam sendo
aplicá veis e o CC aplica-se subsidiariamente somente naquilo que essas legislaçõ es específicas
forem omissas e que nã o for incompatível com o CC.

O art. 1362 prevê a forma do contrato que prevê a alienação fiduciária em garantia. O CC aqui
se omitiu em relaçã o ao valor do bem. Logo, toda a doutrina afirma que também de conter o valor
do bem objeto da propriedade fiduciá ria, em que pese a omissã o do art. 1362 do CC.

Obedecidos os requisitos do art. 1362, o legislador exige ainda o registro – § 1º do art. 1361 –
porque com o registro é que surgirá o direito real da propriedade fiduciária, oponível erga
omnes.

Questão controvertida no que tange à alienação fiduciária de automóvel: pela letra fria do CC
(art. 1361, § 1º), em regra, o registro vai se dar no cartorio do registro de títulos e documentos. E
em se tratando de veículos, no DETRAN. Mas há dois entendimentos a respeito do tema:

1ª posição (CHAVES, MARCO AURELIO BEZERRA DE MELLO): defendem que a expressã o “ou” do
CC é inapropriada, porque sugere que em se tratando de veículos basta o registro no DETRAN,
dispensando-se o registro em cartó rio de títulos e documentos.

Qual seria o ó bice a isso? Art. 236 da CF – que diz que os serviços notoriais e de registro sã o
exercidos em cará ter privado por delegaçã o do poder pú blico. Ou seja, nã o pode o DETRAN exercer
serviço registral, porque eles sã o exercidos em cará ter privado por delegaçã o do poder pú blico.
Além do DETRAN ser uma autarquia, pessoa jurídica de direito pú blico, ele nã o recebeu delegaçã o
estatal para constituir garantia real.

Além disso, seria aplicá vel por analogia o art. 462 ao tratar do penhor de veículos. Outro argumento
seria o art. 129, nº 05 da lei 6015/73 que permanece em vigor – prevê a necessidade de registro da
alienaçã o fiduciá ria no cartó rio de títulos e documentos.

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Podemos citar ainda a sú mula 489 do STF por analogia – diz que a compra e venda de automó vel
nã o prevalece contra terceiros de boa-fé, se o contrato nã o foi transcrito no registro de títulos e
documentos.

Diante desses argumentos, esses autores afirmam que quando o § 1º fala em “ou” entenda-se “e”.
Nã o basta o registro no DETRAN; é pressuposto à constituiçã o da propriedade fiduciá ria oponível
erga omnes que ela seja registrada no cartó ria de títulos e documentos.

2ª posição (STJ, RESP 686.932): o STJ aqui aplicou por analogia a Sú mula 92 do STJ:

“A terceiro de boa-fé não é oponível a alienação fiduciária não anotada no


Certificado de Registro do veículo automotor”

E aliada à sú mula, o STJ diz o seguinte: qual é o instrumento mais eficaz para publicizaçã o da
alienaçã o fiduciá ria de veículos perante terceiros? Seguramente nã o é o cartó rio de títulos e
documentos e sim o certificado do registro de veículos, porque ninguem compra automó vel sem
antes verificar o certificado de registro de veículos. Logo, como o registro no DETRAN é o mais
eficiente à publicidade da alienaçã o fiduciá ria, teria andado bem o CC com a expressã o “ou”. Assim,
em relaçã o a alienaçaõ fiduciá ria de veículos bastaria o registro no DETRAN.

No meio dessa discussã o, surgiu o provimento nº 27/2012 da Corregedoria Nacional da Justiça,


no ambito do CNJ – deixa claro que o registro da alienação fiduciária é facultativo (em nã o
havendo registro só nã o haverá oponibilidade erga omnes) e que, se efetivado, o registro deverá
ser realizado no cartório de títulos e documentos. Logo, esse provimento adotou a 1ª corrente!
Quando o CC diz “ou” entenda-se “e”. Se nã o houver o registro no cartó rio de títulos e documentos
nã o há propriedade fiduciá ria constituída e nã o haverá , portanto, a projeçã o da alienaçã o fiduciá ria
perante terceiros.

 ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE AÇÕES


A propriedade fiduciá ria tem por escopo mera garantia; o proprietá rio fiduciá rio na realidade nã o
exerce aquelas faculdade jurídicas inerentes ao domínio do art. 1228 do CC – uso, gozo, disposiçã o e
reivindicaçã o. A propriedade fiduciá ria nã o abrange o exercício dessas faculdades jurídicas, porque
o ú nico objetivo da propriedade fiduciá ria é a garantia. Ela é uma propriedade esvaziada de
qualquer conteudo prá tico que nã o a mera garantia.

Sensível a isso o art. 113, paragrafo ú nico da Lei de S.A., deixa claro que o proprietá rio fiduciá rio
das açõ es nã o tem direito a voto, porque a transferencia da propriedade daquelas açõ es tem por
escopo mera garantia, nã o assegurando a esse proprietá rio fiduciá rio o exercício do direito de voto.

Como a alienaçã o fiduciá ria envolve transferência de propriedade do devedor fiduciante para o
credor, a princípio, é pressuposto a esta alienaçã o fiduciá ria que o devedor fiduciante fosse o
proprietá rio do bem, uma vez que ninguém pode transferir mais direitos do que tem. Então, é
premissa à constituição da propriedade fiduciária que o devedor fiduciante seja o
proprietário sobre a coisa para que ele venha a transferi-la.

O § 3º do art. 1361 prevê a chamada PÓS EFICACIZAÇÃO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA –


vamos supor que no momento da trasferencia da propriedade fiduciá ria do devedor para o credor,
o devedor nã o era o dono. Entã o, teria havido uma alienaçã o a non domino. E em sendo alienaçã o a
non domino, na realidade, nã o teria havido a transferência da propriedade fiduciá ria, porque
ninguém pode transferir mais direitos do que tem. Se o devedor fiduciante nã o era o dono, é obvio

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que ele nã o poderia ter transferido a propriedade fiduciá ria ao credor. E aí esse dispositivo diz o
seguinte: se posteriormente a essa transferencia a non domino da propriedade fiduciá ria o devedor
fiduciante vem a adquirir a propriedade, essa aquisiçã o superveniente da propriedade pelo
devedor fiduciante produz efeitos ex tunc, ou seja, essa aquisiçã o superveniente gera uma pó s-
eficacizaçã o da propriedade fiduciá ria; regulariza aquela alienaçã o fiduciá ria que havia sido
realizada a non domino.

Remissã o do § 3º do art. 1361 ao art. 1268, § 1º do CC (contempla a pó s-eficacizaçã o da tradiçã o).

 CLÁUSULA COMISSÓRIA
O nosso CC no que tange à propriedade fiduciá ria também contempla nulidade da cláusula
comissória – art. 1365 do CC. Remissã o para o art. 1428 (também prevê a nulidade da cláusula
comissó ria no contexto dos direitos reais em garantia)

Cláusula comissória seria a cláusula que pré-autorizaria o credor a ficar com o objeto da
garantia caso haja o inadimplemento pelo devedor.

Vamos supor que o devedor ofereça em hipoteca um determinado imó vel para garantir o
cumprimento de uma dívida de 500 mil reais. O contrato nesse caso pré-autorizaria o credor a ficar
com o imó vel caso o devedor viesse a descumprir o contrato. ESSA CLÁ USULA É NULA! Porque o
credor com garantia real nã o tem direito a ficar com o objeto da garantia, mas tem direito à
excussã o do bem; tem direito a receber o que lhe é devido com o produto da alienaçã o. Na prá tica,
se nã o houvesse a anulidade dessa clá usula prevista em lei, o credor com garantia real sempre
empurraria a inserçao dessa clá usula ao devedor.

Lembrar que a nulidade da cláusula comissória não impede a dação em pagamento! Isso está
tanto no paragrafo ú nico do art. 1365 quanto no pará grafo ú nico do art. 1428 do CC. Nada impede
que depois de vencida a dívida o devedor venha a quitar a sua obrigaçã o através de entrega de
prestaçã o diversa da pactuada (diversa de dinheiro), desde que haja anuência do credor. E nada
impede que essa prestaçã o diversa seja o proprio objeto da propriedade fiduciá ria. Mas isso
pressupoe que haja o vencimento da dívida.

Em relaçã o à alienaçao fiduciá ria submetida ao CC, nã o há dú vida: nulidade da clá usula comissó ria.
Mas se estivermos diante de alienação fiduciária no ambito do mercado de capitais, há uma
sútil controversia suscitada pelas instituições financeiras: a redaçã o atual do art. 66-B da lei
4728, que rege alienaçã o fiduciá ria no ambito do mercado de capitais, toda essa redaçã o foi trazida
por uma legislaçã o de 2004 – lei 10.931/04. Antes dessa lei, o art. 66, § 6º explicitamente dizia que
seria aplicá vel a alienaçã o fiduciá ria no ambito do mercado de capitais o dispositivo do CC que
contemplava a nulidade da cláusula comissó ria – art. 1428 do CC.

Só que esse artigo foi revogado pela lei 10.931/04 e, na verdade, ele agora consta do art. 66-B, § 5º.
A redaçã o do § 5º nã o manda aplicar à alienaçã o fiduciá ria no ambito do mercado de capitais
qualquer dispositivo do CC que contemple nulidade da clá usula comissó ria. Entã o, o que as
instituiçõ es financeiras suscitam? Que diante da redaçã o atual da lei 4728, que nã o determina a
aplicaçã o de qualquer dispositivo do CC que prevê a nulidade da clá usula comissó ria, a cláusula
comissó ria seria vá lida no ambito da alienaçã o fiduciá ria no mercado de capitais.

Isso viria em sintonia com a crítica de alguns autores em relaçã o à nulidade da clá usula comissó ria
na alienaçao fiduciá ria, porque diferentemente do penhor, hipoteca e anticrese, o credor fiduciá rio
é o proprietá rio, ele já tem a propriedade sobre a coisa. Na hipoteca o credor garantido nã o tem

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propriedade sobre a coisa. Na alienaçã o fiduciá rio nã o e na medida em que o credor já tem a
propriedade fiduciá ria, alguns autores sustentam que nada justificaria a nulidade da cláusula
comissó ria.

Essa posiçã o das instituiçõ es financeiras é minoritaríssima! O entendimento amplamente


dominante é no sentido de não se admitir cláusula comissória, sendo nula mesmo no ambito
do mercado de capitais, porque em que pese o § 5º ser omisso em relaçã o ao tema, seria possivel
aplicar no ambito do mercado de capitais o art. 1365 do CC por força do art. 1368-A.

 CARACTERÍSTICAS GERAIS DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA:


Há desmembramento possessório – § 2º do art. 1361 do CC. O devedor fiduciante fica com a
posse direta; ele transfere a propriedade ao credor fiduciá rio e o credor fiduciá rio passa a ter a
propriedade fiduciá ria e a posse indireta.

Quando o devedor fiduciante transfere a propriedade ao credor fiduciá rio mantendo consigo o bem,
nó s temos aqui uma situaçã o muito similar ao do constituto possessó rio, porque pelo constituto
possessó rio (art. 1267, pu) o vendedor transfere a propriedade, mas ele mantém consigo o objeto
da transferência. Mas através da clá usula constituti a mera celebraçã o do contrato gera tradiçã o
ficta. Entã o, em que pese o bem ter permanecido com o devedor, o comprador passa a ter
imediatamente posse direto.

Vejam que ocorre situaçã o muito similar aqui ao do constituto possessó rio, na medida em que o
devedor transfere a propriedade ao credor fiduciá rio, permanece com o bem a título de posse
direta e o credor fiduciá rio com a posse indireta.

Num 2º momento, quando o devedor fiduciante quita a dívida, cai a propriedade fiduciá ria e o bem
vai à titularidade do até entã o devedor fiduciante. O devedor fiduciante adquire a propriedade
sobre a coisa, sendo que ele já exercia anteriormente o poder de fato sobre o bem, ele já tinha posse
direta sobre o bem. Ocorre aqui nesse 2º momento uma outra hipó tese de tradiçã o ficta – tradiçã o
ficta BREVI MANU, que também está no art. 1267, paragrafo ú nico.

Logo, a alienação fiduciária envolve duas modalidades de tradição ficta: CONSTITUTO


POSSESSÓRIO na ida; e tradição ficta BREVI MANU na volta!

Sobre esse desmembramento possessó rio, atenção, pois há uma exceçã o no art. 66-B, § 3º da lei
4728/65 – em se tratando de alienaçã o fiduciá ria de bens moveis fungíveis o legislador presume
que a propriedade e a posse exclusiva se concentram no credor. Mas é justificá vel essa exceçã o à
regra geral do desmembramento possessó rio, porque em se tratando de bem fungível haveria
dificuldades praticas no manejo da busca e apreensã o do credor fiduciá rio no caso de
inadimplemento do devedor fiduciante. Se o bem é infungível, haverá menos dificuldade para busca
e apreensã o. Por isso, nesse casoo legisladorp resume excepcionalmente propriedade e posse
exclusivas em favor do credor, afastando a regra geral do desmembramento possessó rio.

A propriedade fiduciária é propriedade resolúvel – art. 1361 do CC. E qual é a condição


resolutiva da propriedade fiduciária? É a quitação pelo devedor fiduciante.

É propriedade resolú vel, mas tem uma peculiaridade: pela teoria geral da propriedade resolú vel –
art. 1359 – o proprietá rio resolú vel tem faculdade jurídica de disposiçã o. Quem tem propriedade
resolú vel pode transferir a propriedade? Pode! Só que como ninguém pode transferir mais direitos
do que tem, quem tem propriedade resolú vel, transfere propriedade resolú vel.

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Só que em relação à propriedade fiduciária nós temos a singularidade de que a propriedade
fiduciária tem por escopo a mera garantia. Então, no que tange a propriedade fiduciária, nós
temos a singularidade de que não pode o proprietário fiduciário praticar atos de disposição
sobre a propriedade fiduciária. Ele nã o pode, por exemplo, conceder a propriedade fiduciá ria em
usufruto, nã o pode conceder direito real de servidã o sobre a propriedade fiduciá ria, ele nã o pode
conceder a propriedade fiduciá ria em hipoteca, porque na verdade a propriedade fiduciá ria tem
por escopo a mera garantia. Entã o, nã o é lícito ao proprietá rio fiduciá rio praticar atos de
disposiçã o; nã o pode ele conceder direitos reais sobre a propriedade fiduciá ria. Nã o pode ele locar
a propriedade fiduciá ria. Nã o pode emprestá -la. O ú nico objetivo da propriedade fiduciá ria é a
garantia! Ela não atribui ao seu titular qualquer dos exercícios, das faculdades jurídicas
inerentes à propriedade. Tudo isso, porque se trata de negó cio juridico fiduciá rio.

Efeito prático disso: vamos supor que haja uma alienaçã o fiduciá ria de veículo e haja uma multa
que recai sobre o automó vel no seu manejo pelo devedor fiduciante que tem a posse direta.
Percebam que o proprietá rio fiduciá rio nã o tem legitimidade para responder por essas multas; em
que pese o proprietá rio fiduciá rio ser o proprietá rio, ele nã o responde pr multas impostas ao
devedor fiduciante, porque a propriedade fiduciá ria tem por escopo a mera garantia.

RESP 1.114.406/STJ  julgado a luz do art. 543-C do CPC – diz que o proprietá rio fiduciá rio nã o
responde por despesas de remoçã o e estadia do veículo apreendido.

O objeto da propriedade fiduciária responde por dívidas do devedor fiduciante? Na


pendência da alienação fiduciária o veículo, por exemplo, responde por dívidas do devedor
fiduciante?

Nã o, porque na vigencia da alienaçã o fiduciá ria o bem nã o pertence ao devedor fiduciante, o bem
pertence ao credor fiduciá rio. Sú mula 242 do TFR diz exatamente isso. E por outro lado, aquele bem
também nã o pode ser penhorado por credores do credor fiduciá rio. Se o bem respondesse por
dívidas do credor fiduciá rio seria frustrada a garantia do devedor. Logo, o bem objeto de
alienação fiduciária não responde nem por dívidas do devedor nem por dívidas do credor
fiduciário. Trata-se de um exemplo típico de patrminônio de afetação. Aquele bem está
afetado a servir como instrumento de garantia do mú tuo contraido pelo devedor fiduciante com o
credor fiduciá rio. Nada impede que os valores recebidos pelo credor fiduciá rio sejam penhorados
por seus credores; mas nesse caso haveria a penhora do crédito.

O devedor fiduciante é titular de um direito real de aquisição sobre o veículo. Ele tem direito
real de adquirir a propriedade caso haja a quitaçã o; ele nã o tem o direito de propriedade em si.
Enunciado 325 do CJF – deixa claro que é possivel a penhora nã o do veículo, mas sim a penhora do
direito real de aquisiçã o sobre o veículo, porque esse direito real de aquisiçã o já titularizado pelo
devedor fiduciante; ele nã o titulariza o direito real de propriedade, mas sim o direito real de
aquisiçã o.

É impenhorável, nos termos da Lei n. 8.009/90, o direito real de aquisição do


devedor fiduciante.  então, é evidente que se a hipótese é de alienação
fiduciária de imóvel e o devedor fiduciante do imóvel exerce ali a sua
moradia, atendendo aos requisitos da lei 8009/90, a impenhorabilidade do
bem de família se estende a benefício do devedor fiduciante; não vai ser
passível de penhora o direito real de aquisição do devedor fiduciante, caso
contrário, haveria frustração do direito real de moradia e da dignidade da

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pessoa humana, contemplados na lei 8009/90, ressalvadas as exceções do
art. 3º da propria lei.

A contrá rio senso, em nã o se tratando de alienaçã o fiduciá ria de imó vel e nã o estando em jogo a lei
8009/90, cabe a penhora do direito real de aquisiçã o do devedor fiduciante, mas nã o a penhora da
propriedade sobre o bem, porque a propriedade pertence ao credor fiduciá rio.

O devedor fiduciante transfere a propriedade ao credor fiduciário e em se tratando de


imóvel, a dúvida é: há incidência de ITBI? Porque há uma transferencia da propriedade imó vel
do devedor fiduciante em favor do credor fiduciá rio. Há ou nã o nesse caso o fato gerador do ITBI?

Nã o há ITBI – art. 156, II da CF – veda a incidencia de ITBI no caso de direito real de garantia.
Percebam que tudo isso pressupoe a ló gica do negó cio juridico fiduciá rio, porque em que pese
haver transferência de propriedade, essa transferencia da propriedade tem por escopo a mera
garantia. Entã o, como o negó cio juridico tem por objetivo a mera garantia, incide a vedaçã o do art.
156, II da CF. Portanto, nã o há incidência de ITBI.

AULA 03
O art. 1364 do CC deixa claro que diante do inadimplemento do devedor fiduciante, o credor
fiduciário tem a faculdade de promover alienação judicial ou extrajudicial do bem. Em geral,
dentro da sistemá tica dos direitos reais de garantia, o inadimplemento pelo devedor permite ao
credor apenas a alienaçã o judicial. Dentro da sistemá tica da alienaçã o judiciá ria se faculta ao credor
a alienaçã o judicial ou extrajudicial. No mesmo sentido nó s temos o art. 2º do DL 911/69 que teve a
redaçã o alterada pela lei 13.043/14.

Há uma sutil alteraçã o na redaçã o introduzida pela lei de 2014 em relaçã o à redaçao anteriormente
vigente; é na redaçã o atual o legislador continua prevendo que o produto da alienaçã o deve ser
aplicado no preço e o credor tem que devolver ao devedor o saldo apurado, se houver, “com a
devida prestação de contas” – essa é a novidade! Entã o, a exigencia de prestaçã o de contas aqui pelo
credor fiduciá rio em relaçã o ao devedor fiduciante é a grande novidade legislativa trazida pela lei
13.043/14 – vem num contexto de deveres anexos da boa-fé objetiva – dever de cooperaçã o e
colaboraçã o.

Posição minoritaríssima do MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELLO (defensoria): ele defende


que essa possibilidade de alienaçã o extrajudicial independentemente de avaliaçã o prévia, de leilã o,
sem nenhum procedimento prévio, violaria o principio da ampla defesa e do contraditó rio e violaria
o devido processo legal. A ausencia de qualquer garantia do devedor colidiria com esses princípios
constitucionais. Diante disso o autor defende a aplicaçã o por analogia do art. 27 da lei 9514/97,
exigindo ao menos leilã o pú blico.

O STJ já rechaçou esse entendimento no RESP 327.291 – basta para a validade dessa alienaçã o
extrajudicial que haja a prévia ciência do devedor, para que o devedor possa fiscalizar e adotar
eventual medida conservativa de seus direitos.

Como a lei agora exige a prestaçã o de contas, é possivel sustentar que nã o mais se exigiria sequer a
ciencia do devedor, porque o devedor poderia adotar as medidas conservativas do seu direito
diante da prestaçã o de contas oferecida pelo credor fiduciá rio. Ao professor nã o parece o melhor
entendimento; a exigencia de prestaçã o de contas nã o esvazia o dever de cientificar o devedor da
alienaçã o extrajudicial – boa-fé objetiva.

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O credor fiduciá rio tem a propriedade fiduciá rio como mero escopo de garantia e que nã o lhe
confere as faculdades de uso, gozo, disposiçã o. Mas no caso de inadimplemento o credor fiduciá rio
tem a faculdade de disposiçã o. O DL 911 contempla uma tutela privilegiada do credor
fiduciário no sentido de que se o devedor fiduciante se tornar inadimplente, o credor
fiduciário tem a sua disposiçao a busca e apreensão do bem – busca viabilizar a alienação
judicial ou extrajudicial. E como a propriedade fudiciá ria é sujeita à registro, o registro vai
conferir oponibilidade erga omnes a essa propriedade fiduciá ria e consequentemente o direito de
sequela. Entã o, essa busca e apreensã o, diante do registro, produz efeitos erga omnes, ou seja, ela
persegue a coisa onde quer que ela se encontre. Ela pode atingir nã o apenas o devedor fiduciante,
mas eventuais subadquirentes da coisa.

 BUSCA E APREENSÃO:
Está tratada no DL 911/69.

Legitimados para vindicar a busca e apreensão – art. 8º-A:

 Integrantes do mercado financeiro e de capitais (lei 4728/65)


 Poder pú blico em relaçã o a créditos fiscais e autarquias para créditos previdenciá rias.

Então, na realidade, se o credor fiduciário for pessoa física, se a relação for sujeito ao CC
descabida a busca e apreensão. Vai restar ao credor fiduciário a reintegração de posse.

Como premissa ao tema nó s precisamos nos deparar com a questã o da mora do devedor fiduciante:
art. 2º, § 2º e art. 3º do DL 911. Todas essas redaçoes foram alteradas pela lei 13.043/2014.

§ 2º A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá


ser comprovada por carta registada expedida por intermédio de Cartório de Títulos
e Documentos ou pelo protesto do título, a critério do credor.

§ 2o A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento (a mora


do devedor fiduciante é EX RE; se constitui automaticamente; vem em
consonancia com o art. 397, caput do CC) e poderá ser comprovada por carta
registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do
referido aviso seja a do próprio destinatário. (Redação dada pela Lei nº 13.043, de
2014)  a redação anterior não previa a possibilidade de mera carta
registrada com aviso de recebimento; exigia carta registrada expedida por
cartório de títulos e documentos ou protesto do título.

A jurisprudencia já vinha admitindo AR – sú mula 75 do TJ/RJ – dispensando a assinatura do


devedor fiduciante, bastando apenas a comprovaçã o de que a carta registrada foi entregue a
determinada pessoa no domicílio do devedor fiduciante. Logo, a modificaçã o legislativa aqui veio
em consonancia com a tendencia jurisprudencial anterior.

Se a mora é EX RE, qual é a necessidade de comprovar a mora através dessa carta registrada?

A carta registrada nã o é pressuposto à constituiçao da mora, porque se fosse, a mora seria ex


persona e nã o ex re; só que nã o é o caso! A mora é ex re e se constitui automaticamente. O que a lei
prevê na 2ª parte é apenas um meio para a comprovaçã o da constituiçã o da mora que já se operou
automaticamente. E a razã o de ser dessa demonstraçã o se extrai do art. 3º do DL 911, que também
teve a redaçã o alterada em 2014.

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Art 3º O Proprietário Fiduciário ou credor, poderá requerer contra o devedor ou
terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciàriamente, a qual será
concedida Iiminarmente, desde que comprovada a mora ou o inadimplemento do
devedor.

Art. 3o O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a


mora, na forma estabelecida pelo § 2 o do art. 2o, ou o inadimplemento,
requerer contra o devedor ou terceiro a BUSCA E APREENSÃO do bem
alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser
apreciada em plantão judiciário. (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)

O art. 3º deixa claro que a 2ª parte do § 2º do art. 2º, ou seja, a comprovaçã o da mora que já se
constituiu automaticamente, tem por objetivo viabilizar o cabimento da busca e apreensã o. A busca
e apreensã o pressupõ e comprovaçã o da mora constituída.

Sobre o tema nós temos ainda a súmula 245 do STJ: A notificação destinada a comprovar a mora
nas dívidas garantidas por alienação fiduciária dispensa a indicação do valor do débito.  então não
é preciso que se conste dessa carta registrada o valor da dívida!

O entendimento maciço do STJ admitia que essa interpelaçã o extrajudicial fosse promovida por
cartó rio de regiã o diversa da do domicílio do devedor. RESP 1.237.699; Enunciado 427 do CJF.

Ao professor essa questã o se esvaziou na medida em que a legislaçã o atual, de acordo com a
redaçã o trazida em 2014 sequer mais exige a intermediaçã o do cartó rio de títulos e documentos ou
do protesto do título; basta um AR para que se produza o efeito da comprovaçã o da mora. E com
mais razã o ainda se houver a carta registrada através do cartó rio de títulos e documentos, ainda
que de domicílio diversos do devedor, ainda assim a notificaçã o será vá lida, pois nó s teriamos uma
formalidade ainda maior do que a exigida por lei.

Vale a pena ressaltar que a busca e apreensão do DL 911/69 tem uma singularidade em
relação a busca e apreensão do CPC. Isso fica claro no art. 3º, § 8º do DL 911:

§ 8o A busca e apreensão prevista no presente artigo constitui processo autônomo e


independente de qualquer procedimento posterior.    (Incluído pela Lei 10.931, de
2004)  porque a busca e apreensão aqui é um processo autonomo e
independe de qualquer procedimento posterior; a busca e apreensão aqui
não é uma medida instrumental como no CPC (que está dentro do contexto
das ações cautelares); aqui a busca e apreensão é um fim em si mesmo.

OBS.: Art. 5º do DL 911: parece deixar claro que o contrato de alienaçã o fiduciá ria é título
executivo extrajudicial.

Art. 5o Se o credor preferir recorrer à ação executiva, direta ou a convertida na


forma do art. 4o, ou, se for o caso ao executivo fiscal, serão penhorados, a critério do
autor da ação, bens do devedor quantos bastem para assegurar a
execução. (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)  o credor fiduciário
pode optar pela busca e apreensão ou pode também se valer da via
executiva. Então, o contrato de alienação fiduciária por si só é titulo
executivo extrajudicial e permite ao credor promover diretamente a
execução.

Art. 4º do DL 911:

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Art. 4 º Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na
posse do devedor, o credor poderá requerer a conversão do pedido de busca e
apreensão, nos mesmos autos, em ação de depósito, na forma prevista
no Capítulo II, do Título I, do Livro IV, do Código de Processo Civil.     (Redação dada
pela Lei nº 6.071, de 1974)

Art. 4o Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na
posse do devedor, fica facultado ao credor requerer, nos mesmos autos, a conversão
do pedido de busca e apreensão em ação executiva, na forma prevista no Capítulo II
do Livro II da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo
Civil. (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)

Antes da modificaçã o trazida pela lei de 2014 o dispositivo dizia que se o bem alienado
fiduciariamente nã o fosse encontrado ou nã o se achasse na posse do devedor, o credor poderia
converter a busca e apreensã o em açã o de depó sito. A redaçã o atual nã o! Permite a conversã o da
busca e apreensã o em açã o executiva, ou seja, nã o mais se admite a conversã o para açã o de
depó sito. Aquela equiparaçã o do devedor fiduciante a depositá rio infiel, nã o mais é admitida pelo
STF para fins de prisã o civil e o CC aniquila aqui a possibilidade de conversã o de busca e apreensã o
em depó sito; a busca e apreensã o só pode ser convertida em açã o executiva.

Art. 2º, § 4º do DL 911:

§ 4o Os procedimentos previstos no caput (trata da alienação extrajudicial) e no


seu § 2o (constituição da mora e sua devida comprovação) aplicam-se às
operações de arrendamento mercantil previstas na forma da Lei no 6.099, de 12 de
setembro de 1974. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)  ou seja, a
sistemática da alienação extrajudicial e a sistemática da constituição da
mora e sua respectiva comprovação passam a ser aplicáveis aos contratos
de leasing.

OBS.: O professor se arrisca ainda a dizer o seguinte: a sú mula 369 do STJ para muitos sempre nos
conduziu à afirmativa de que a mora no contrato de leasing seria EX PERSONA. Diz a sú mula: “nos
contratos de arrendamento mercantil ainda que haja cláusula resolutiva expressa é necessária a
notificação prévia do arrendatário para a constituição em mora”.

Com a redaçã o do § 4º do art. 2º do DL 911 mandando aplicar o art. 2º, § 2º parece ao professor que
a sú mula talvez possa ser revista no sentido de se afirmar que a mora passa a ser ex re, mas a
demonstraçã o da mora através do AR é pressuposto ao cabimento da busca e apreensã o.

OBS.: Vá rios artigos desse DL 911 já haviam sido modificados por legislaçã o de 2004 – lei
10.931/04. E essa lei já havia trazido uma modificaçã o importante no seguinte sentido: a redaçã o
originá ria do DL 911 que é anterior a essa lei de 2004 subordinava o cabimento da purgaçã o da
mora pelo devedor fiduciante ao pagamento de no mínimo 40% das prestaçõ es. Esse dispositivo
sempre foi muito criticado na medida em que ele violaria o princípio da isonomia e de alguma
forma inibiria a purgaçã o da mora que vem em consonancia com o princípio da conservaçã o dos
contratos; porque com a purgaçao da mora o contrato será preservado e a preservaçã o do contrato
é matéria de ordem pú blica a luz do princípio da conservaçã o dos contratos.

Entã o, desde a lei 10.931/04 é inequivoco que caiu por terra a sú mula 284 do STJ, porque o
dispositivo do DL que subordinava a purgaçã o da mora ao pagamento de 40% das parcelas foi
aniquilado pela redaçã o introduçã o pela lei de 2004. Entã o, essa sú mula 284 do STJ nã o mais

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subsiste desde 2004; a purgaçã o da mora nã o mais se subordina ao pagamento de 40% das
parcelas pelo devedor fiduciante.

Art. 3º, § 1º:

§ 1o Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput, consolidar-se-ão a


propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário ,
cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novo certificado de
registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do
ônus da propriedade fiduciária. (Redação dada pela Lei 10.931, de 2004)

§ 2o No prazo do § 1o, o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida


pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial,
hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus. (Redação dada pela Lei
10.931, de 2004)

Executada a liminar da busca e apreensã o o devedor fiduciante tem 05 dias para pagar a
integralidade da dívida. Se ele paga a integralidade da dívida nesses 05 dias, ele recebe o bem de
volta livre de qualquer onus. Mas se ele nã o paga a integralidade da dívida, aplica-se o § 1º, ou seja,
a propriedade e a posse exclusivas se consolidam em favor do credor fiduciá rio.

O prazo para resposta do devedor fiduciante é de 15 dias – § 3º; quer dizer, a propriedade se
consolida em favor do credor antes mesmo de ultrapassado o prazo para resposta do devedor. É
uma norma que traz uma tutela privilegiada em favor do credor, mas há uma razã o de ser para isso:
antigamente, na prá tica, o credor fiduciá ri arcava com as despesas de conservaçã o do bem, logo
apó s a busca e apreensao, e quando da alienaçã o judicial ou extrajudicial do bem, aquela garantia já
havia se esvaziado, pois haveria a depreciaçã o natural do bem pelo decorrer do tempo. Hoje, a
legislaçã o permite uma alienaçã o á gil, visando conservar o poder economico, o valor do objeto
alienado.

Como contrapartida a essa tutela privilegiada os §§ 6º e 7º do mesmo art. 3º preveem


responsabilidade civil objetiva do credor fiduciá rio caso haja improcedência da pretensã o de busca
e apreensã o. Se for concedida a liminar e depois a sentença julgar improcedente, responsabilidade
civil objetiva do credor fiduciá rio.

O § 2º do art. 3º diz que dentro do prazo de 05 dias o devedor fiduciante pode pagar a integralidade
da dívida para evitar a consolidaçã o da propriedade em favor do credor fiduciá rio. E se ele paga a
integralidade da dívida ele vai receber o bem de volta livre do ô nus. Esse dispositivo estaria
contemplando em favor do devedor fiduciante a possibilidade ou nã o de purgar a mora?

Num primeiro momento vá rios autores afirmavam que sim, a hipotese é de purgaçã o da mora; até
porque nã o purgada a mora em 05 dias, a propriedade se consolida em favor do credor fiduciá rio,
nos moldes do § 1º.

Só que aí surgiu um entendimento trazido por alguns doutrinadores de que na realidade a


sistemá tica da purgaçã o da mora é diferente da prevista no § 2º do art. 3º do DL 911 – aqui o
legislador exige o pagamento da integralidade da dívida pendente, ao passo que a purgaçã o da
mora exige do devedor apenas o pagamento das prestaçõ es vencidas, nã o as vincendas; ao passo
que o DL exige o pagamento da integralidade, ou seja, das prestaçõ es vencidas e vincendas. A
sistemá tica da purgaçã o da mora vem nos art. 401, I do CC e art. 1071, § 2º do CPC.

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Entã o, alguns autores começaram a sugerir que na realidade esse § 2º do art. 3º deveria ser
interpretado em harmonia com esses dispositivos do CC e do CPC. Ou seja, para a aplicaçã o do § 2º
nã o se exigiria o pagamento da integralidade da dívida, bastaria o pagamento das prestaçõ es
vencidas. É uma interpretaçã o contra legem, mas seria justificá vel a luz do princípio da isonomia.
Todavia, essa posiçã o é minoritá ria, já tendo o STJ a repudiado.

Além disso, CHAVES afirma que em se tratando de relaçaõ de consumo, essa impossibilidade do
devedor fiduciante purgar a mora, ultrapassado o prazo de 05 dias, violaria o art. 54, § 2º do CDC –
só o consumidor pode optar pela resoluçã o do contrato. Entã o, para esse autor o § 1º do art. 3º do
DL seria incompatível com o CDC.

O STJ enfrentou essa questã o no RESP 1.418.593, apreciado sob a égide da legislaçã o de recurso
repetitivo. E o STJ disse que há impossibilidade de purgar a mora em contratos de alienaçã o
fiduciá ria firmados apó s a vigência da lei 10.931/04 – o STJ está dizendo que o que prevê o § 2º do
art. 3º efetivaçã o nã o é purgaçã o ou emenda da mora, porque a purgaçã o ou emenda da mora se
contenta com o pagamento das parcelas vencidas, nã o exige o pagamento da integralidade da
dívida. E que na realidade essa regra especial do § 2º, que nã o é emenda da mora, porque exige o
pagamento integral da dívida, afasta o cabimento de purgaçã o ou emenda da mora nos casos do DL
911/69.

Isso que estamos dizendo se aplica apenas nos moldes do art. 8º-A do DL 911. Se for
alienação fiduciária nos moldes do CC (credor fiduciário pessoa física) cabe emenda ou
purgação da mora, porque os procedimento do DL 911 se aplicam ao mercado de capitais e
para garantia de créditos fiscais de previdenciários.

Em relaçao à lei 13.043/14, outras alterações trazidas:

§§ 9º a 14º do art. 3º  que tratam basicamente do procedimento de alienaçã o fiduciá ria de


veículos.

§ 15º  diz que as disposiçõ es previstas no art. 3º se aplicam à reintegraçã o de posse de veículos
nas operaçõ es de arrendamento mercantil. Entã o, toda a sistemá tica do art. 3º em relaçã o à
reintegraçã o de posse de veículos se aplica a sistemá tica do lesing de veículos.

Art. 7º-A  dissemos que o bem objeto de garantia na alienaçã o fiduciá ria é patrimonio de
afetaçã o. Nã o responde por dívidas nem do devedor fiduciante, porque na realidade aquele bem
pertence ao credor fiduciá rio, mas também nã o responde por dívidas do credor fiduciá rio, porque
aquele bem integra a propriedade fiduciá ria do credor como mero escopo de garantia.

Entã o, o art. 7º-A é uma decorrencia dessa ló gica do patrimonio de afetaçã o. Nã o há como se atingir
judicialmente o bem objeto da alienaçã o fiduciá ria sob pena de esvaziamento de sua finalidade,
qual seja, a garantia.

Em relação ao termo inicial do prazo de 05 dias do § 1º do art. 3º: houve quem defendesse que
esse prazo de 05 dias fluiria a partir da juntada do mandado (art. 241 do CPC). Mas o STJ disse que
nã o! O STJ diz que se aplica a regra do § 1º do art. 3º - “05 dias apó s executada a liminar” – ou seja,
sã o 05 dias contados a partir da execuçao da liminar. RESP 986.517.

No caso de venda judicial do bem pelo credor fiduciá rio, se o valor apurado nã o for suficiente para
quitar a dívida, haverá execuçao do saldo remanescente – art. 5º do DL 911.

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Só que se houver alienaçã o extrajudicial e esta nã o for suficiente para alcançar todo o valor do
crédito, restará ao credor fiduciá rio exigir o valor remanescente. Só que como a alienaçã o é
extrajudicial, neste caso, falta a certeza e a liquidez do valor residual. Diante disso, a jurisprudencia
maciçamente afirma que no caso de alienaçã o extrajudicial o valor remanescente nã o pode ser
exigido pela via executiva. Na verdade, restará ao credor se valer da tutela monitó ria – açao
monitó ria. RESP 265. 256 e AR no AG 696.783.

E aí nesse contexto, vamos imaginar que o credor move a busca e apreensã o; promove a alienaçao
judicial do bem; que se mostra insuficiente para a quitaçã o de dívida; sendo judicial, cabe execuçã o
do saldo remanescente. A dú vida é: nesses casos, em que o credor já se valeu da busca e apreensã o,
se houve fiança ou aval, o credor nesse caso em que se demonstra insuficiencia da busca e
apreensã o, o credor pode penhorar bens do fiador ou do avalista para execuçã o do saldo
remanercente?

Tem um entendimento defendido por ARNALDO RISARDO (hoje nã o adotado pela jurisprudência):
se o bem já foi alienado judicial ou extrajudicialmente, diante da insuficiencia da busca e apreensã o,
o atingimento dos bens do fiador ou avalista aniquilaria desses garantidores uma prerrogativa que
lhes é inerente e que seria a subrrogaçã o legal na propriedade fiduciá ria (art. 6º). E isso frustraria
do fiador e do avalista uma legítima expectativa de subrrogaçã o na propriedade fiduciá ria. Logo, na
execuçã o de saldo remanescente o credor nã o pode atingir bens do fiador ou do avalista sob pena
de frustraçã o da prerrogativa do fiador ou do avalista de se subrrogarem na propriedade fiduciá ria.

STJ  entende que o que se exige é que o fiador ou avalista sejam cientificados da alienaçã o judicial
ou extrajudicial do bem. Entã o, para que o credor conserve a possibilidade de atingir bens do fiador
ou do avalista em eventual execuçã o de saldo remanescente, o credor fiduciá rio tem que cientificar
o fiador ou avalista da alienaçã o judicial ou extrajudicial do bem resultante da busca e apreensã o.
Se exige essa ciencia para que se oportunize ao fiador ou avalista a possibilidade de pagar a dívida
antes da alienaçã o e se subrrogar na propriedade fiduciá ria. RESP 749.199.

Art. 7º do DL 991 c/c art. 85 a 93 da lei 11.101/05:

O bem pertence ao credor fiduciá rio. Entã o, se houver falencia do devedor fiduciante o art. 7º deixa
claro que o credor fiduciá rio nã o tem que se habilitar na falência do devedor; nã o precisa habilitar
seu crédito. O credor fiduciá rio como proprietá rio do bem pode exigir o pedido de restituiçã o, nos
termos da lei de falência.

Art. 6º-A do DL 911:

Eventual recuperaçã o judicial ou extrajudicial do devedor nã o abrange o objeto da alienaçã o


fiduciá ria. Ou seja, nã o impede a busca e apreensã o. Entã o, o regime diferenciado dos bens
resultantes da recuperaçao judicial ou extrajudicial ao atinge o objeto da alienaçã o fiduciá ria. Nã o
frustra a garantia do credor fiduciá rio.

Art. 1368 do CC:

É uma exceçã o à regra geral, na medida em que diz que o terceiro, interessado ou nã o, que pagar a
dívida se subrrogará de pleno direito no crédito e na propriedade fiduciá ria. Isso é uma exceçã o,
porque a rigor a subrrogaçã o legal se opera apenas em favor de terceiro interessado. No que tange
a terceiro nã o interessado a regra geral é a do art. 305, caput do CC – que contempla direito de
regresso, mas sem subrrogaçã o.

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Art. 1368 do CC x art. 6º do DL 911  Essa singularidade do art. 1368 do CC se contrapõ e a
redaçã o do art. 6º do DL 911/69 que diz que o avalista, fiador ou terceiro interessado que pagar a
dívida se subrrogará de pleno direito no crédito e na garantia constituída pela alienaçã o fiduciá ria.
Entã o, ao que parece é que se a alienaçã o se subordinar aos termos do DL 911, apenas o terceiro
interessado se subrroga por força de lei. Ao passo que se a alienaçã o fiduciá ria se submete a
disciplina do art. 1368 do CC, ou seja, fora do mercado de capitais e fora da garantia de créditos
fiscais ou previdenciá rios, o terceiro nã o interessado também se subrroga.

A lei 13.043/14 inseriu o art. 1368-B no CC:

Art. 1.368-B.  A alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere


direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor. (Incluído
pela Lei nº 13.043, de 2014)  direito real de aquisiçao desde que haja a
quitação.

Parágrafo único.  O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por
efeito de realização da garantia, mediante consolidação da propriedade,
adjudicação, dação ou outra forma pela qual lhe tenha sido transmitida a
propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos sobre a
propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos,
tributários ou não, incidentes sobre o bem objeto da garantia, a partir da data em
que vier a ser imitido na posse direta do bem. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)

Traz uma mitigaçao à ideia de que as obrigaçõ es propter rem recaem necessariamente sobre o
proprietá rio. A propriedade fiduciá ria é uma propriedade esvaziada sob o aspecto economico,
porque trata-se de uma propriedade que tem por escopo a mera garantia. Entã o, a princípio, todos
os tributos que recaem sobre o bem, inclusive os de natureza propter rem, recaem sobre o devedor
fiduciante.

Só que é possível que o devedor fiduciante incorra em inadimplemento e diante do inadimplemento


do devedor fiduciante, a propriedade que era fiduciá ria pode se tornar propriedade plena,
consolidada em favor do credor. Se nó s pensarmos pela regra geral, a partir do momento da
consolidaçã o da propriedade em favor do credor, diante do inadimplemento do devedor, o credor já
passaria imediatamente a responder pelas obrigaçoes propter rem. Só que o dispositivo aqui,
reproduzindo o dispositivo da lei 9514/57, afirma que na realidade o credor fiduciá rio que
consolida a propriedade em seu favor, diante do inadimplemento do devedor, passa a responder
pelas obrigaçõ es propter rem (despesas condominiais, tributos) a partir da data em que ele tiver
efetivo acesso a posse do bem; a partir do momento que o bem for efetivamente entregue ao credor
fiduciá rio. Entã o, se o devedor fiduciante é inadimplente, a propriedade se consolida em favor do
credor fiduciá rio, mas o devedor fiduciante nã o restitui o bem ao credor, enquanto ele nã o restitui o
bem ao credor, o devedor fiduciante é quem tem legitimidade passiva para responder pelas
despesas condominiais e pelas obrigaçõ es propter rem de um modo geral. Exceção à lógica de que
pelas obrigaçoes propter rem responde o proprietário.

4. DIREITO REAL DE SERVIDÃO


Art. 1378 a 1389 do CC.

Direito real sobre imóvel que impõe restrições a um prédio (serviente) em benefício de
outro (dominante), pertencentes a proprietários distintos.

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Entã o, é da essencia do direito real de servidã o que tenhamos dois imó veis titularizados por
pessoas diferentes, sendo que um desses imó veis serve ao outro. O imó vel que ser ao outro é
chamado de serviente; e aquele que é contemplado é chamado de prédio dominante.

É premissa à servidã o que tenhamos proprietá rios diferentes. Se os prédios A e B sã o titularizados


por uma mesma pessoa, nó s nã o temos servidã o e sim a chamada serventia. A serventia ocorre
quando temos um imovel servindo o outro, porém ambos sã o titularizados pela mesma pessoa.
Nesse caso, nã o temos o direito real de servidã o.

PERGUNTA DE PROVA ORAL: Direito real de servidão pressupõe necessidade ou


comodidade? Para que haja direito real de servidã o basta comodidade, nã o se exige necessidade.

OBS.: DIFERENCIE PASSAGEM FORÇADA x SERVIDÃO DE PASSAGEM:

A passagem forçada (também chamada por alguns autores de servidã o legal) está disciplinada no
art. 1285 do CC e está dentro do capítulo do direito de vizinhança. Entã o, na realidade, quando há
necessidade nó s temos as normas típicas de direito de vizinhança – sã o normas limitadas, rol
taxativo e que estã o associadas a ideia de necessidade. Percebam que é premissa à passagem
forçada que haja um encravamento do imó vel; ele nã o pode ter acesso à via pú blica.

Já a servidã o de passagem nã o! A servidã o de passagem, em regra, nã o resulta da lei; ela resulta da


manifestaçã o de vontade e a servidã o, portanto, nã o pressupõ e a necessidade, basta que haja
utilidade. Entã o, nã o é necessá rio que o imó vel A esteja encravado, porque se houver encravamento
o instituto adequado nã o será a servidã o de passagem, mas sim a passagem forçada; o A poderá
impor a passagem em detrimento do B. Aqui o imó vel A nã o está encravado, mas talvez seja
interessante para o A aquele acesso à via pú blica, seja por finalidade economica, seja por interesses
pessoais. A comodidade é suficiente para que A e B acordem o exercício da servidã o de passagem.

 FORMAS DE CONSTITUIÇÃO DA SERVIDÃO:

1) CONTRATO (acordo de vontades): é evidente que o contrato por si só nã o constitui o


direito de servidã o, por se tratar de direito real. Mas o contrato é um instrumento pelo qual
é possível se constituir a servidã o mediante registro. O contrato que constitui direito real de
servidã o necessariamente deverá conter instrumento pú blico – art. 108 do CC – direito real
sobre bens imó veis. E evidente que esse contrato por instrumento pú blico, para constituir o
direito real, há de ser averbado junto ao registro, nos termos do art. 1227 do CC.

Em relação ao titular do prédio serviente se exige capacidade para alienar. Entã o, em se


tratando de menor, por exemplo, é necessá rio que haja a observancia do art. 1691 (intervençã o do
MP, nomeaçã o de curador especial).

Por outro lado, em se tratando de pessoas casadas, se exige em regra a outorga do conjuge – art.
1647 a 1649 do CC – exceto quanto ao regime de separaçao absoluta.

2) TESTAMENTO (art. 1378): vamos imaginar que o titular do imó vel B faz um testamento e
por via testamentá ria diz que apó s o seu falecimento, ele concede servidã o de passagem em
favor do imó vel A. Ou imaginemos que uma ú nica pessoa seja titular de todo o imó vel (A +
B) e por via testamentá ria ele diz que metade do imó vel vai passar para o herdeiro 1 e a
outra metade para o herdeiro 2. E nesse mesmo contexto do testamento ele grava o imó vel
do herdeiro 2 com uma servidã o de passagem.

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Nesse caso, é preciso lembrar que o registro nã o tem natureza constitutiva; porque o art. 1227 que
trata da natureza constitutiva do registro em relaçã o a direitos reais, envolve negó cios juridicos
intervivos. No caso de testamento é possível invocar aqui a teoria da saisine – art. 1784 – o registro
terá natureza meramente declarató ria. O falecimento vai transferir imediatamente o direito real de
servidã o nesse caso.

3) USUCAPIÃO DA SERVIDÃO (art. 1379): só cabe usucapião de servidão aparente! A


servidã o aparente é aquela que se manifesta por obras exteriores; é aquela que é
perceptível a olho nu. Entã o, uma servidã o de aqueduto, por exemplo, através da qual o
prédio serviente permite a retirada da agua através de um aqueduto; essa servidã o de
aqueduto é uma servidã o aparente.

Súmula 415 do STF: Servidão de trânsito não titulada, mas tornada permanente,
sobretudo pela natureza das obras realizadas, considera-se aparente, conferindo
direito à proteção possessória.  a súmula deixa claro que só as servidões
aparentes gozam de tutela possessória, pois apenas as servidões aparentes
são suscetíveis de posse. A servidã o de passagem/transito pode ser aparente ou
nã o conforme o caso. Se a passagem é exercida num local pré-existente a servidã o
será nã o aparente; agora se o sujeito, por exemplo, constroi uma passarela ou um
viaduto para o exercício da servidã o de passagem, é evidente que essa servidao
se manifesta por obras exteriores e nesse caso ela será considerada aparente.

O art. 1379, caput trata da usucapião ordinária de servidão aparente. Isso, porque o
dispositivo faz explicita referencia ao art. 1242 do CC, que é o artigo que trata da usucapiã o
ordiná ria de propriedade. Entã o, o caso típico do caput é o da concessã o a non domino de servidã o
aparente, quer dizer, o suposto titular do prédio serviente concede uma determinada servidã o
aparente ao titular do prédio dominante, só que 12 anos depois o verdadeiro proprietá rio aparece e
comprova que aquele suposto titular do prédio serviente que havia concedido a servidã o aparente
nã o era o dono; e como ele nã o era o dono ele nã o poderia conceder a servidã o aparente. Qual é a
tese defensiva em favor do titular do prédio dominante? Usucapiã o da servidã o aparente, porque
ele vinha exercendo a posse do direito real de servidã o; ele nã o tinha animus de proprietá rio sobre
o imó vel vizinho, mas sim o animus de titular da servidã o aparente que havia sido pactuada.

 Prazo: 10 anos
 Essa usucapião pressupõe justo título e boa-fé (art. 1242)

No caso do parágrafo único do art. 1379, nós temos a usucapião extraordinária da servidão
aparente. Aqui o sujeito nã o tem título. Ex.: um vizinho na marra constroi um viaduto que passa
sobre o imó vel vizinho. Depois de 20 anos ele poderá alegar a usucapiã o da servidã o aparente. Ele
nã o tem título para o exercício da servidã o aparente, mas ele pode usucapir pela via extraordiná ria,
independentemente de título, considerando a inercia por mais de 20 anos do titular do prédio
vizinho.

 Prazo: 20 anos

OBS.: esse prazo de 20 anos era o maior prazo de usucapiã o de propriedade previsto no CC/16. No
CC/16 o prazo má ximo da ususcapiã o da propriedade era de 20 anos. Só que no CC atual o prazo
má ximo da usucapiã o do direito real de propriedade é de 15 anos – caput do art. 1238. E aí o que a
doutrina afirma é que o legislador reduziu o prazo má ximo da usucapiã o da propriedade e se
esqueceu de alterar o prazo da usucapiã o extraordiná ria da servidã o aparente. Nã o faz nenhum
sentido que para usucapir o direito de propriedade, o direito real maior e pleno, o sujeito tenha que

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ter 15 anos e para usucapir um direito real menor, como a servidã o, o prazo seja superior, seja de
20 anos. Logo, temos hoje um forte movimento doutrinario no sentido de que aonde o CC no
paragrafo ú nico do art. 1379 diz 20 anos entenda-se 15 anos! Enunciado 251 do CJF nesse
sentido.

Divergindo da doutrina majoritá ria e do enunciado, temos MARCO AURÉ LIO BEZERRA DE MELLO
que afirma que os prazos de usucapiã o envolvem matéria de ordem pú blica – art. 192 do CC – diz
que os prazos de prescriçao nã o podem ser alterados por acordo das partes. E por se tratar de
matéria de ordem pú blica aplica-se o que está previsto na norma (posiçã o minoritaríssima).

4) POR SENTENÇA – AÇÃO DIVISÓRIA (art. 979, II, CPC): o juiz promove a divisã o de terras
e percebe que naquela divisã o um determinado imó vel é beneficiado em comparaçã o com o
outro. Entã o, com o intuito de estabelecer um tratamento paritá rio entre os imó veis e com o
intuito de mitigar, compensar as desigualdades naturais ou artificiais entre eles, o juiz pode
na sentença fixar uma servidã o que busque mitigar, compensar essa desigualdade a fim de
que se estabeleça um tratamento isonomico entre os imó veis objeto de divisã o.

5) SERVIDÃO PELA DESTINAÇÃO DO PROPRIETÁRIO (construção doutrinária e


jurisprudencial): requisitos:

 Que haja uma serventia aparente, ou seja, é preciso que tenhamos dois imó veis ou um
ú nico imó vel titularizado pela mesma pessoa. Sendo que o imovel B de alguma maneira
serve ao imovel A, por um longo lapso temporal; ex.: serventia de passagem
 Só que aquela serventia deixa de ser considerada como serventia, porque passa a haver
pluralidade de proprietá rios sobre aqueles imó veis. Entao, o sujeito que era titular dos
imoveis A e B, vende aqueles dois imoveis para fulano e ciclano. Percebam que
passamos a ter ali dualidade de titulares do direito real de propriedade.

Se entende que aquela circunstancia fá tica anterior que norteava a serventia gera para os futuros
proprietá rios do bem uma legítima expectativa na continuidade daquela circunstancia fá tica. Entã o,
em havendo superveniencia de pluralidade de proprietá rios sobre aquela anterior serventia
aparente, em nã o havendo clá usula em sentido contrá rio, se constitui a servidã o pela destinaçã o do
proprietá rio.

Então, quando de uma serventia aparente surgem duas titularidades diferentes, os dois
proprietários diversos tem uma legítima expectativa na subsistencia da serventia anterior. E
como passamos a ter dois proprietários, a posse não seria mais de serventia e sim de
servidão.

O projeto 6960 passa a tratar especificamente do tema – servidã o pela destinaçã o do proprietá rio.
Alguns criticam essa modalidade de servidã o, porque o art. 1378 do CC diz que a servidã o se
constitui mediante declaraçã o expressa dos proprietá rios. Ou seja, a servidã o nã o se presume.

Para o professor a boa-fé objetiva e a tutela da legítima expectativa parece reforçar a ideia da
servidã o por destinaçã o.

É evidente que eventual cláusula explicita em sentido contrá rio afasta a servidã o por destinaçã o do
proprietá rio. Imaginem que o sujeito titularize dois imoveis e vende um deles e explicitamente
nessa compra e venda há uma clá usula que diga que aquela serventia aparente nã o absistirá. Essa
clá usula obviamente afasta a legítima expectativa do adquirente da outra parte do imó vel e nã o há
como se falar em servidã o pela destinaçã o do proprietá rio.

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 CLASSIFICAÇÃO:

1) APARENTES/NÃO APARENTES
As servidõ es aparentes sã o aquelas que se manifestam por obras exteriores, sendo perceptíveis a
olho nu. Ex.: servidã o de aqueduto. Apenas as servidõ es aparentes sã o passíveis de posse e,
portanto, de usucapiã o.

As servidõ es nã o aparentes sã o aquelas que nã o se manifestam por obras exteriores, sendo


imperceptíveis a olho nu. Ex.: servidã o paisagística, porque a obrigaçao do prédio serviente é a
obrigaçã o de nã o edificar (nã o aparente).

2) RURAL/URBANA
A maioria da doutrina defende que o critério é o critério da destinaçã o e nã o da localizaçã o. Entã o,
se tivermos uma servidã o de pastagem na presidente vargas, centro do RJ, essa servidã o será rural;
servidã o de aqueduto também é servidã o rural.

Já a servidã o paisagística se enqudra como servidã o urbana. A servidã o urbana entra num campo
residual – aquilo que nã o for típico de á rea rural.

3) CONTÍNUAS/DESCONTÍNUAS
As servidoes continuas sã o aquelas que independem de um ato do respectivo titular. Ex.: servidã o
de aqueduto – a agua vai passar pelo aqueduto independentemente de uma conduta pontural do
titular do prédio dominante; servidã o de esgoto.

Nã o é o que ocorre, por exemplo, com a servidã o de passagem, que é eminentemente uma servidã o
descontínua, porque o seu exercício depende de uma conduta pontual, específica do titular do
prédio dominante.

4) POSITIVAS/NEGATIVAS
Positiva é aquela que depende de uma conduta proativa, comissiva. Ex.: servidã o de passagem. A
servidã o positiva se confundiria para alguna autores com a servidã o descontínua.

Ao passo que a servidã o negativa se exerce mesmo diante de uma postura omissiva; ela nã o
pressupoe uma conduta ativa.

 MECANISMOS DE PROTEÇÃO DO DIREITO REAL DE SERVIDÃO:

1) AÇÕES POSSESSÓRIAS
Mas como já vimos, as ações possessórias só se aplicam diante das servidões aparentes –
sú mula 415 do STF – porque apenas as servidoes aparentes sã o suscetíveis de posse.

Exceção: art. 1213, 2ª parte do CC – ressalvando a possibilidade a aplicaçã o das açõ es possessó rias
à s servidõ es nã o aparentes – “salvo quando os respetivos títulos provierem do possuidor do prédio
serviente”. Entã o, é possivel falar aqui em aplicaçã o das açõ es possessó rias nas servidõ es nã o
aparentes excepcionalmente nos casos do art. 1213, parte final. Basicamente quando a servidã o nã o
aparente é titulada + averbada junto ao registro.

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2) AUTODEFESA
Art. 1210, § 1º do CC – que trata da autodefesa da posse (nesse caso, do direito real de servidã o).

3) NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA


Para a tutela da servidã o paisagística, em regra. Art. 934, I do CPC.

Em relaçao a servidão por destinação do proprietário temos ainda dois mecanismos de


defesa:

4) AÇÃO CONFESSÓRIA
Que deve ser movida pelo titular do prédio dominante. Quando o titular do prédio dominante vai
vindicar o reconhecimento da servidã o pela destinaçã o do proprietá rio, ele vai mover a açao
confessó ria, seja em face do titular do prédio serviente, seja em face de terceiros.

5) AÇÃO NEGATÓRIA
Aplica-se a contrá rio senso a favor do suposto, aparente titular do prédio serviente. Através da açao
negató ria o suposto titular do prédio serviente vai negar a existencia da servidã o por destinaçã o do
proprietá rio.

 CARACTERÍSTICAS GERAIS DO DIREITO REAL DE SERVIDÃO:

1) INDIVISIBILIDADE (art. 1386): a princípio, a servidã o nã o recai sobre parte ideal do


prédio; ela grava todo o prédio serviente e beneficia todo o prédio dominante. E por isso a
servidã o subsiste mesmo no caso de divisã o do imó vel – as parcelas resultantes de tal
fracinamento continuam sendo gravadas ou beneficiadas com direito real de servidã o. Essa
é a regra geral.

Exceção: se por ventura há uma servidã o de passagem que incide especificamente numa
determinada parte do imó vel, se o imó vel serviente for fracionado em dois, por força de alienaçã o, é
evidente que essa servidã o de passagem nã o gravar a outra parte do bem. Por força do acordo de
vontades, fica evidente que a servidã o nesse caso só recaia sobre uma determinada parte do imó vel
e, portanto, apenas essa parte será objeto de servidã o de passagem.

2) PERPETUIDADE: a servidã o é perpétua. Só que a doutrina afirma que a perpetuidade da


servidã o goza de mera presunçã o relativa. Nada impede, pelo princípio da autonomia
privada, que as partes acordem a temporariedade da servidã o; nada impede que a servidã o
se dê por prazo determinado; mas para isso é preciso explícita manifestaçã o de vontade.
Nesse sentido, TUPINAMBÁ MIGUEL DE CASTRO, CHAVES.

3) DIREITO REAL SOBRE COISA ALHEIA: em sendo direito real, a servidã o serve à
coisa e nã o o titular do bem. Entã o, eventual mudança da titularidade do bem nã o interfere
na subsistencia da servidã o. Por ser direito real, a servidã o é dotada de sequela e
ambulatoriedade – oponibilidade erga omnes – e para isso se exige o registro.

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4) É PREMISSA À SERVIDÃO QUE TENHAMOS PROPRIETÁRIOS
DIFERENTES: caso contrario, nó s nã o temos servidã o e sim serventia - art. 1378 do CC.

5) A SERVIDÃO NÃO SE PRESUME: art. 1378 – nã o diz explicitamente isso, mas exige
declaraçã o expressa dos proprietá rios. Um reflexo disso é o art. 1385, § 1º do CC – se nó s
temos uma servidã o de pastagem, nã o se presume que da servidã o de pastagem nó s
possamos ter uma servidã o de agua; nã o é possivel ampliar o objeto do conteudo da
servidã o.

Exceção: § 3º do art. 1385 – exceçao que se justifica pela funçã o social da posse e da propriedade.

6) INALIENÁVEL: no sentido de que nã o é possivel a alienaçã o da servidã o isoladamente.


No caso de alienaçã o da propriedade, a servidã o como um direito real menor acompanhará
a alienaçã o da propriedade.

7) A SERVIDÃO É ILIMITADA: entenda-se, ilimitada quanto ao fim, quanto à finalidade.


Essa inclusive é uma das diferenças entre as servidoes e as regras de direito de vizinhança,
porque as regras de direito de vizinhança pressupoe necessidade, logo, o rol é taxativo. Já as
servidoes se associam a comodidade; entã o, ela é ilimitada quanto ao fim.

Exemplos de servidão: passagem/transito; aqueduto; pastagem; paisagística.

AULA 04
O art. 1385 diz que o exercício da servidão deve se restringir ao atendimento das
necessidades do prédio dominante, evitando-se o agravamento do encargo ao prédio
serviente.

SILVIO RODRIGUES traz o seguinte exemplo: vamos supor que o título da servidã o permita ao
titular do prédio dominante retirar até 5 mil litros de agua por dia. Se ele retira 15 mil, ele pratica
ato ilícito. Mas vamos supor que ele retira 5 mil litros de agua por dia tal qual autoriza o título, mas
ele só precisaria de 2 mil litros de agua por dia. Isso seria para o autor abuso do direito a luz do art.
1385.

O § 1º vem dentro da lógica de que a servidão não se presume. Entã o, a servidã o de pastagem
nã o pode ser estendida a servidã o de agua sem que haja previsã o no título nesse sentido. A servidã o
existe para determinado fim e nã o pode ser ampliada para finalidade diversa.

Por outro lado, o § 2º traz a perspectiva de que quem pode o mais pode o menos em relação
as servidões de transito. Se o sujeito tem servidã o de transito para passar com caminhõ es,
presume-se (presunçã o relativa) que a servidã o de transito abrange também a passagem de
bicicletas ou a pé.

§ 3º  é uma exceção à regra geral segunda a qual a servidão não se presume. E essa exceçã o
está intimamente correlacionada à funçã o social da posse e da propriedade. Vejam que há aqui um
direito potestativo do titular do prédio dominante em vindicar o alargamento da servidã o nã o
pactuado, em homenagem à funçã o social da posse e da propriedade, excepcionando a regra geral
de que a servidã o nã o se presume. O legislador prevê apenas o direito a indenizaçã o em favor do
titular do prédio serviente nesse caso.

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O art. 1383 impõe um dever de abstenção ao titular do prédio serviente.

O art. 1380 confere ao titular da servidão o direito potestativo de realizar as obras


necessárias. É o que os romanos chamavam de SERVIDÕES ACESSÓRIAS – “adminicula
servitutis”. Ou seja, o direito real de servidã o abrange o direito de realizar as obras necessá rias à
sua conservaçã o, ao seu exercício.

Dentro desse contexto das obras necessá rias, o art. 1381 vem em sintonia com o brocardo: “UBI
EMOLUMENTUM IBI ONUS” – aquele que suporta o onus, colhe o bonus. Quem é que vai colher o
bô nus das obras? O titular do prédio dominante. E como contrapartida, a quem cabe custear essas
obras? Ao titular do prédio dominante! Então, como o titular do prédio dominante é quem se
beneficia com as obras incumbirá ao proprio titular do prédio dominante custeá-las – essa é
a presunção relativa trazida pela lei (princípio da autonomia privada).

Art. 1382  disciplina a hipó tese em que as partes acordam em contrá rio. Quer dizer, a presunçã o
relativa é de que as obras sã o custeadas pelo titular do prédio dominante, mas as partes podem
acordar em contrá rio, ou seja, as partes podem atribuir que as obras incumbem ao titular do prédio
serviente. E esse artigo disciplina justamente essa hipotese em que as partes atribuem ao
titular do prédio serviente o custeio das obras. Só que o legislador prevê que ele pode se
eximir dessa obrigação de custear as obras abandonando o prédio serviente em favor do
titular do prédio dominante. Essa hipótese os manuais afirmam como sendo um exemplo
típico de obrigação facultativa.

(Nó s nã o podemos confundir obrigaçõ es alternativas com obrigaçõ es facultativas. As obrigaçõ es


alternativas estã o disciplinadas nos artigos 252 a 256; nelas a prestaçao devida é uma OU outra – o
carro OU a joia. Já as obrigaçõ es facultativas, nã o estã o sistematizadas no CC; aqui a prestaçã o
devida é apenas uma; porém se reserva a uma das partes (devedor) a possibilidade de se eximir
cumprindo prestaçã o diversa; mas o cumprimento da prestaçao facultativa é direito potestativo do
devedor, ou seja, o cumprimento da prestaçao facultativa é inexigível pelo credor; depende
exclusivamente da iniciativa do devedor).

A luz do art. 1382 qual é a prestaçã o devida pelo titular do prédio serviente? O custeio das obras! Só
que ele pode (direito potestivo) se eximir desta obrigaçã o de custear as obras abandonando o
prédio. Nã o se trata de obrigaçã o alternativa, porque o abandono pelo titular do prédio serviente
nã o é exigível pelo titular do prédio dominante, ele depende exclusivamente da iniciativa do prédio
serviente. Por isso seria hipó tese de obrigaçã o facultativa e nã o de obrigaçã o alternativa.

OBS.: Para o professor essa hipó tese do art. 1382 parece nã o mais se encaixar perfeitamente na
hipotese de obrigaçã o facultativa. Mas por que? Por conta do pará grafo ú nico do art. 1382 (que é
novidade em relaçã o ao CC/16)

Paragrafo único  o legislador permite ao titular do prédio dominante recusar o abandono por
parte do serviente. Isso parece ir contra a ló gica das obrigaçõ es facultativas, porque se a prestaçã o
facultativa é direito potestativo do devedor, só resta ao credor mero estado de sujeito; ele nã o pode
se insurgir em face do cumprimento da prestaçã o facultativa – o que é a hipó tese do paragrafo
ú nico.

O art. 1384 prevê a possibilidade da servidão ser removida de um lugar para outro. Houve
uma ligeira modificaçã o em relaçã o ao CC velho, porque à luz do CC/16 a remoçã o só era possível a
benefício do titular do prédio serviente. Hoje, nã o! A remoçã o pode ser a benefício de ambas as
partes.

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Se for possivel modificar o local da servidã o dentro do proprio prédio serviente sem prejuizo ao
titular do prédio dominante, haverá deslocamento da servidã o para outra localidade situada dentro
do mesmo prédio serviente. É claro que isso se dará à s custas do titular do prédio serviente.

Ou entã o pelo dono do prédio dominante e a sua custa se houver considerá vel incremento da sua
utilidade sem prejudicar o prédio serviente. Mas uma vez aqui a funçã o social da posse e da
propriedade é que inspira a novidade legislativa aqui permitindo que a remoçã o da servidã o hoje
também possa se dar a benefício do titular do prédio dominante.

 EXTINÇÃO DA SERVIDÃO
O art. 1388 prevê no:

 Inciso I: extinção da servidão pela renúncia (abdicaçã o voluntá ria do titular do prédio
dominante);

 Inciso II: cessação da utilidade ou comodidade para o prédio dominante (imaginemos


que tenhamos uma servidã o de pastagem e no decorrer da servidã o o titular do prédio
dominante deixa de se dedicar a pastagem e passa a se dedicar exclusivamente à atividade
agrícola; nesse caso, a servidã o de pastagem deixa de ter utilidade e com isso extingue-se a
servidã o);

 Inciso III: através do resgate (a doutrina critica a redaçã o do inciso III, porque na
realidade esse ‘resgate’ aqui diz respeito ao destrato – remissã o para o art. 472 – é hipotese
de resiliçã o bilateral) – em relaçã o a esse destrato, resgate se impõ e a observancia de
instrumento pú blico por força do art. 108 do CC (prevê que direitos reais imobiliá rios se
submetem a instrumento pú blico)

Quanto ao art. 1389:

 Inciso I: extinção da servidão no caso de confusão (é premissa à servidã o que predio


dominante e serviente sejam titularizados por pessoas diferentes; na medida em que eles
passam a ser titularizados pela mesma pessoa, nó s deixamos de atender o requisito exigido
no art. 1378 ; deixamos de ter servidã o e passamos a ter serventia);

 Inciso II: no caso de supressão de obras

 Inciso III: extinção da servidão pelo não uso durante 10 anos contínuos (em relaçã o ao
direito real de propriedade a faculdade juridica de uso abrange a possibilidade de usar e de
nã o usar; tanto que o nã o uso da propriedade por si só nã o acarreta na extinçã o da
propriedade; o que pode ensejar a extinçã o da propriedade é a usucapiã o, que contem
outros requisitos. Em relaçã o á servidã o nã o! Porque a servidã o impõ e uma restriçã o ao
direito de propriedade do titular do prédio serviente, que se justifica pela utilidade da
servidã o; tanto que a cessaçã o da utilidade gera extinçã o da servidã o; entã o, dentro da
servidã o a possibilidade de usar a servidã o nã o abrange o nã o uso; se impõ e ao titular do
prédio dominante o uso da servidã o)

OBS.: Discussão doutrinária a respeito da natureza jurídica desse prazo de 10 anos:

1ª corrente: defende que esse prazo tem natureza prescricional – MARCO AURELIO BEZERRA DE
MELLO; TUBINAMBÁ MIGUEL DE CASTRO; SILVIO VENOSA.

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Crítica a 1ª corrente: a prescriçã o gera a perda da pretensã o – art. 189 do CC – e nã o a perda do
direito subjetivo. E aqui está nítido que o nã o uso por 10 anos gera a propria perda do direito
subjetivo real de servidã o.

2ª corrente: defende que é hipó tese de prazo decadencial – TEPEDINO, CHAVES.

Crítica a 2ª corrente: a decadencia gera a perda do direito potestativo. O direito objeto de perda
aqui nã o é direito potestativo é direito subjetivo. Ocorre a perda do direito subjetivo real de
servidã o.

3ª corrente (ao professor a mais adequada): defende que a natureza juridica aqui é de prazo sui
generis, porque trata-se de uma hipotese de perda de direito subjetivo, que nã o se encaixa nem na
ló gica da prescriçã o, em que há perda da pretensã o, nem na ló gica da decadencia, em que há perda
de direito potestativo. Natureza sui generis, porque aqui há perda de direito subjetivo
propriamente dito.

Art. 1387, caput: a regra geral é de que é premissa à extinçao da servidã o perante terceiros o
cancelamento da servidã o, porque o registro gera oponibilidade erga omnes. A exceçã o aqui é a
desapropriaçã o – a desapropriaçã o é aquisiçã o originá ria e o registro na desapropriaçã o tem
natureza meramente declarató ria. Uma vez desapropriado o prédio serviente, cai o direito real de
servidã o do titular do prédio independentemente de cancelamento do registro, porque a aquisiçã o
pelo poder pú blico é originá ria e o registro na desapropriaçã o tem natureza meramente
declarató ria e nã o constitutiva (sendo exceçã o à regra geral dos direitos reais)

Entã o, se o poder pú blico compra o prédio serviente a servidã o do titular do prédio dominante só
se extingue com o cancelamento do registro. A regral excepcional só se justifica no caso de
desapropriaçã o. No caso de compra pelo poder pú blico continua sendo aplicá vel a regra geral.

Art. 1387, paragrafo único: se há hipoteca do prédio dominante, o prédio dominante serve como
instrumento de garantia em favor de determinado credor – credor hipotecá rio; e é evidente que a
servidã o valoriza o prédio dominante na medida em que a servidã o aumenta a utilidade ou
comodidade do prédio dominante. Entã o, fica claro que eventual extinçã o da servidã o repercute
negativamente nos interesses do credor hipotecá rio nesse caso, porque a extinçã o da servidã o gera
desvalorizaçã o ao prédio dominante, que no caso é objeto de hipoteca. Entã o, no caso de hipoteca
do prédio dominante, a extinçã o da servidã o nã o interessa ao credor hipotecá rio, porque isso ao
diminuir a comodidade ou utilidade do prédio dominante, desvaloriza o prédio dominante e
consequentemente há um decréscimo da garantia real que beneficia o credor hipotecá rio.

No paragrafo único o legislador exige o consentimento do credor para o cancelamento da


servidão caso a servidão esteja averbada no título hipotecário.

Ao professor parece que a exigencia de consentimento do credor hipotecá rio nã o se aplica em todos
os casos. Ex.: art. 1389, I – parece ser manifestamente dispensá vel a anuencia do credor
hipotecá rio, bastando a ciencia; se os dois prédios sã o reunidos na titularidade de uma ú nica pessoa
é da essencia que caia a servidã o e surja a serventia; da mesma forma o art. 1389, III – nã o uso por
10 anos, porque a inobservancia da funçã o social da servidã o por si só acarreta a extinçao da
servidã o, independentemente da anuencia do credor hipotecá rio, porque aqui está em jogo o
interesse socialmente relevante, qual seja a funçã o social da servidã o; da mesma forma o art. 1388,
II.

41
Entã o, em algumas hipoteses, parece ao professor nã o ser exigível o consentimento, bastando a
ciencia do credor hipotecá rio.

“USUCAPIO LIBERTATIS”:

Tem previsã o no CC portugues e nã o tem previsã o no CC brasileiro – construçao doutriná ria no


Brasil.

Quando o titular do prédio serviente exterioriza oposiçã o ao exercício da servidã o e o titular do


prédio dominante permanece inerte, diante dessa oposiçã o, se inicia o prazo de USUCAPIO
LIBERTATIS. Entã o, se diante de uma servidã o de passagem o titular do prédio serviente diz: “aqui
voce nã o passa mais” e o titular do prédio dominante permanece inerte, deixa de exercer a
passagem diante da oposiçã o do prédio serviente, se inicia o prazo de USUCAPIO LIBERTATIS.
Vejam que essa hipó tese nã o se confunde com a de nã o uso, porque o nã o uso pressupõ e mera
abstençã o pelo titular do prédio dominante; o titular do predio dominante simplesmente deixa de
se valer da servidã o, sem que tenha havido qualquer oposiçao pelo titular do prédio serviente.

Aqui a USUCAPIO LIBERTATIS pressupoe a oposiçã o pelo titular do prédio serviente e a inercia do
titular do prédio dominante. Entã o, a inercia prolongada pelo titular do prédio dominante diante da
resistencia do titular do prédio serviente gera a aplicaçã o da USUCAPIO LIBERTATIS, que por sua
vez, gera extinçã o da servidã o.

No CC portugues o prazo de nã o uso é de 20 anos e no nosso CC é de 10 anos. O prazo de usucapio


libertatis no CC portugues é o prazo de prescriçã o, que nã o se confunde com o prazo de nã o uso, é o
prazo ordiná rio de prescriçã o do CC portugues.

5. USUFRUTO
Art. 1390 a 1411.

No usufruto nós temos um direito real temporário através do qual o nuproprietário


transfere ao usufrutuário a titularidade das faculdades juridicas de uso e gozo, sendo da
essencia do usufruto que o usufrutuário respeite/mantenha a substancia da coisa.

Há no usufruto um desmembramento do direito de propriedade. O usufruto é uma manifestaçã o


típica da chamada ELASTICIDADE OU FRAGMENTARIEDADE DO DIREITO DE PROPRIEDADE.
Porque pela elasticidade ou fragmentariedade é possivel que uma ou mais faculdades juridicas
sejam destendidas; é possivel que haja transferencia da titularidade de parte das faculdades
juridicas inerentes à propriedade sem que haja perda da propriedade por aquele que a transfere. O
direito de propriedade abrange as faculdades de uso, gozo, disposiçao e reivindicaçã o. Pelo
usufruto o proprietário transfere o uso e o gozo, mas não perde o direito de propriedade.
Mesmo havendo a transferencia da titularidade de parte das faculdades jurídicas, ele
mantém consigo a nupropriedade graças a essa fragmentariedade do direito de
propriedade.

Não se pode confundir usufruto com locação ou comodato, especialmente locação. Isso
porque através da locaçã o e do comodato nã o se transfere a titularidade das faculdades juridicas,
mas apenas o seu exercício. Entã o, o locatá rio nã o titulariza as faculdades juridicas de uso e gozo,
ele apenas tem o exercício dessas faculdades. A titularidade se mantém com o proprietá rio.

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Tanto a locaçã o como o comodato sã o relaçõ es puramente obrigacionais, nã o sã o relaçõ es juridicas
de direito real, porque só é possível a transferência da titularidade das faculdades jurídicas através
de direito real; relaçõ es puramente obrigacionais nã o tem o condã o de transferir a titularidade, mas
apenas o exercício das faculdades jurídicas.

Como consequencia, locaçã o e comodato – princípio da relatividade – produz efeitos apenas


interpartes. Ao passo que o usufruto, direito real, no qual se transfere a titularidade das faculdades
juridicas, tem oponibilidade erga omnes.

 CARACTERÍSTICAS GERAIS DO USUFRUTO:

1) FINALIDADE ALIMENTAR
É uma característica que destoa da enfiteuse e do direito de superfície, por exemplo, porque em
ambos nó s temos como foco a funçã o social da posse e da propriedade; no usufruto nã o, nó s temos
como foco uma finalidade alimentar – o nuproprietá rio buscando de alguma forma beneficiar a
subsistência do usufrutuá rio.

2) NATUREZA PERSONALÍSSIMA
Isso está claro no art. 1393, 1ª parte que prevê a inalienabilidade do usufruto.

Entã o, o usufrutuá rio nã o pode transferir a terceiros a titularidade do direito real de usufruto; mas
ele pode alugar o bem ou emprestar o bem, porque nesse caso ele estaria apenas transferindo o
exercício das faculdades de uso e de gozo.

Então, não confundir a inalienabilidade do usufruto com a transferencia do exercício das


faculdades juridicas, o que é possível (2ª parte).

RESP 1.098.620 (informativo 416)  Tanto a fraude contra credores quanto a fraude à execuçao
pressupoe que a alienaçã o do bem cause prejuízo aos credores. Entã o, a doutrina afirma que a
fraude à execuçao e a fraude contra credores pressupõ e a alienaçã o de bens penhorá veis, porque se
há alienaçã o de um bem impenhorá vel, a alienaçã o do bem impenhorá vel nã o gera prejuízo aos
credores, porque se o bem era impenhorá vel ele nã o servia como instrumento de garantia aos
credores.

E aí o julgado diz o seguinte: o usufruto é inaliená vel e com isso ele é impenhorá vel, porque a
impenhorabilidade é uma decorrencia da inalienabilidade. Entã o, a renú ncia ao usufruto nã o
configura fraude à execuçã o, porque o usufruto é impenhorá vel.

Ao professor esse julgado parece discutível, porque nã o há dú vida de que o direito real de usufruto,
por si só , é impenhorá vel. Mas seriam passíveis de penhora os frutos eventualmente percebidos
pelo usufrutuá rio. Logo, a renuncia ao usufruto de alguma forma gera prejuizo aos credores do
usufrutuá rio.

3) OBRIGAÇÃO DO USUFRUTUÁRIO EM MANTER A SUBSTÂNCIA DA COISA


Isso fica nítido no art. 1399 – o usufrutuá rio nã o pode sequer mudar a destinaçã o economica da
bem sem autorizaçã o do proprietá rio. É uma projeçã o da obrigaçã o do usufrutuá rio em guardar, em
manter a substancia do bem.

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Por isso, inclusive, o usufrutuário só pode perceber os frutos e não os produtos – art. 1394.
Os frutos sã o renová veis; ao passo que os produtos nã o sã o renovaveis – ex.: petroleo, pedras de
uma pedreira – a percepçã o dos produtos atinge a propria substancia do bem.

4) RECAI SOBRE BENS INCONSUMÍVEIS


Faz todo o sentido, porque se o usufrutuá rio tem a titularidade das faculdades jurídicas de uso e
gozo, e se por outro lado ele tem o dever de manter, de conservar a substancia do bem, só é possível
que o usufruto recaia sobre bens inconsumíveis, porque se o usufruto recaisse sobre bens
consumíveis haveria a imediata destruiçã o do bem – art. 86 do CC.

EXCEÇÃO: se dá no chamado USUFRUTO IMPRÓPRIO – ex.: usufruto sobre título de crédito – art.
1395 do CC.

5) TEMPORARIEDADE
Art. 1410, I a III do CC. Fica claro que o usufruto pode ser acordado por prazo determinado, mas em
nã o havendo prazo, o limite má ximo do usufruto é a vida do usufrutuá rio. E em se tratando de
pessoa juridica o prazo máximo é de 30 anos.

 FORMAS DE CONSTITUIÇÃO DE USUFRUTO:

1) USUFRUTO VOLUNTÁRIO: aquele que resulta da manifestaçã o de vontade. Pode se


dar por:

a) CONTRATO: admite duas subespécies:

 Por alienação: é aquele em que o proprietá rio simplesmente transfere em favor de


um terceiro a titularidade das faculdades jurídicas de uso e fruiçã o.
 Por retenção: é aquele em que o proprietá rio so bem transfere a titularidade do
domínio em favor de outrem e retém para si o direito de usufruto sobre esse bem. O
proprietá rio aqui nã o transfere ao terceiro o direito real de usufruto; aqui o sujeito
transfere na realidade a propriedade em favor de um terceiro e retém para si o
direito real de usufruto. Ex.: doaçã o com reserva de usufruto; sucessã o/partilha em
vida – os ascendentes transferem todos os bens a cada um dos respectivos
descendentes em vida com reserva de usufruto para si.

b) TESTAMENTO: tem previsã o no art. 1921 – legado de usufruto.

2) USUFRUTO JUDICIAL: É o usufruto fixado por determinaçã o judicial – art. 716 do CPC
– o credor acaba obtendo usufruto de bens do devedor para que com a percepçã o dos frutos
daquele bem titularizado pelo devedor, ele venha a receber o seu direito de crédito (no
contexto da execuçã o).

Percebam que o usufruto judicial aqui ele tem singularidades em relação ao usufruto
voluntário:

 No usufruto judicial, o usufrutuá rio nã o faz jus ao uso da bem; ele nã o titulariza a faculdade
de uso do bem, tal qual ocorre com o usufruto de modo geral. Isso porque esse usufruto
tem por objetivo exclusivamente viabilizar a percepçã o dos frutos pelo usufrutuá rio para o

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recebimento de seu direito de crédito; ele nã o tem por objetivo transferir ao usufrutuá rio a
faculdade jurídica de uso.
 Nesse caso, a fruiçã o pelo usufrutuá rio nã o é plena, é limitada, porque a fruiçao nesse caso
se restringe à viabilizar o recebimento do direito de crédito.

Também há uma espécie de usufruto judicial prevista no art. 21, §§ 1º e 2º da lei 6515/77.

3) USUFRUTO LEGAL: usufruto por força de lei; ex.: art. 1689, I do CC; art. 231, § 2º da CF.

4) USUCAPIÃO: ou seja, é cabível usucapiã o de usufruto. Art. 1391 do CC.


Parece estranho que alguem venha a usucapir o direito real de usufruto sem que venha a usucapir a
propriedade, mas o caso típico aqui de usucapiao de usufruto é o de concessã o a non domino do
direito real de usufruto. Imaginem que o suposto proprietá rio de um imó vel venha a conceder em
favor de outrem o direito real de usufruto e tempos depois aparece o verdadeiro proprietá rio e
comprova que aquele suposto proprietá rio nã o era o dono, o registro em nome dele era falso. Como
nó s sabemos, o registro no direito brasileiro goza de presunçã o relativa de veracidade – art. 1247
do CC; qual será a tese aqui em favor daquele que exercia a posse do direito real de usufruto? Ele
vai alegar a usucapiã o de usufruto, por o animus dele nã o era de proprietá rio, ele tinha animus
apenas de titular do direito real de usufruto.

QUANTO À INSTRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO REAL DE USUFRUTO:

O usufruto tem natureza personalíssima, é inalieá vel – art. 1393. Esse intransmissibilidade do
direito real de usufruto propicia a vedação do usufruto sucessivo e também ao usufruto
progressivo. No usufruto sucessivo o nuproprietá rio concederia o direito real de usufruto em favor
de Fulano e quando do falecimento do Fulano, o usufruto passaria automaticamente a favor do
Ciclano – propiciaria dois usufrutuá rios distintos em momentos diferentes. A vedaçã o ao usufruto
sucessivo decorre nã o apenas da intransmissibilidade, mas também da ideia de que ninguém pode
ser compelido a uma liberalidade futura. Esse é o argumento que norteia a vedaçao à promessa de
doaçã o no direito brasileiro.

Já o usufruto progressivo, o nuproprietá rio concederia o direito real de usufruto para Fulano, por
10 anos, e ultrapassado o prazo de 10 anos o usufruto passaria automaticamente para o Ciclano. A
intransmissibilidade do usufruto também obstaculiza o cabimento de usufruto progressivo; além
disso, ninguém pode ser compelido a uma liberalidade futura.

OBS.: CHAVES  na doaçã o com reserva de usufruto gravada com clá usula de inalienabilidade,
esta clausula de inalienabilidade nã o pode superar a vida do doador. Vamos supor que o sujeito faça
a doaçã o com reserva de usufruto sendo que essa doaçã o é gravada com cláusula de
inalienabilidade – o donatá rio nã o faz jus à faculdade de disposiçã o sobre o bem e também nã o
exerce o titularidade das faculdades juridicas de uso e gozo por conta da reserva do usufruto em
favor do doador. Entã o, num primeiro momento o usufruto é titularizado pelo doador nesse caso.
Vamos supor que o doador venha a falecer. Se a clá usula de inalienabilidade perdurar, na prá tica,
vai cair o usufruto com a falecimento do doador, o donatá rio passa a titularizar as faculdades
juridicas de uso e de gozo, mas se a cláusula de inalienabilidade perdurar, o donatá rio vai exercer o
titularidade das faculdades juridicas de uso e de gozo, mas nã o poderá exercer a faculdade juridica
de disposiçao. Ele terá uma situaçã o equiparada à de usufrutuá rio; ele é o proprietá rio constante do
registro, mas na prá tica ele teria uma posiçao juridica equiparada à de usufrutuá rio, porque ele vai

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passar a fazer jus ao uso e ao gozo do bem, mas nã o terá a faculdade de disposiçã o em virtude da
clá usula de inalienabilidade.

Entã o, CHAVES diz que se a cláusula de inalienabilidade perdurar à vida do doador, nó s teriamos
uma espécie de usufruto sucessivo, em que num primeiro momento o usufruto é titularizado pelo
doador que reteve para si o direito real de usufruto, com a morte do doador cai o usufruto do
doador, as faculdades de uso e gozo passam ao donatá rio que em tese também nã o poderia alienar,
por conta da clá usula de inalienabilidade. entã o, nó s teriamos dois usufrutuá rios sucessivos:
doador e donatá rio. Porque o donatá rio com o falecimento do doador usufrutuá rio passaria a ter as
faculdades de uso e gozo, mas nã o teria faculdade de disposiçã o de modo equiparado ao de
usufrutuá rio.

Entã o, para CHAVES o falecimento do doador extingue a cláusula de inalienabilidade para que com
o falecimento do doador o donatario passe a titularizar todas as faculdades jurdiicas inerentes ao
domínio: uso, gozo e disposiçã o. Entã o, a vedaçao ao usufruto sucessivo imporia a extinçaõ da
clá usula de inalienabilidade no caso de falecimento do doador.

Não confundir isso com o entendimento do STJ de que a cláusula de inalienabilidade não
pode superar a vida do beneficiário. O STJ entende que nesse caso com o falecimento do
donatá rio, cairia a cláusula de inalienabilidade, porque o objeto da clá usula de inalienabilidade é
proteger determinada pessoa, é proteger o patrimô nio do beneficiá rio. Entã o, a proteçã o teria
cunho pessoal personalíssimo. Entã o, na medida em que o donatá rio viesse a falecer, cai a clá usula
de inalienabilidade imposta via doaçã o ou testamento.

Aqui não! A posição do CHAVES foca na questão da extinção da cláusula de inalienabilidade,


por força do falecimento do doador e não do donatário.

 OBJETO DO USUFRUTO:
O usufruto pode recair sobre bens móveis ou imóveis – art. 1390 do CC. Em relaçã o à imó veis,
regra geral, o usufruto pressupõ e o registro – art. 1391 do CC.

As exceções à exigencia de registro está no art. 1391: usucapião – a propria sentença de


usucapiã o tem natureza meramente declarató ria e o registro da sentença também tem natureza
meramente declarató ria.

E a outra exceção é no caso de usufruto legal; ex.: usufruto dos pais em relaçã o aos bens dos
filhos menores durante o poder familiar. Como o usufruto nesse caso resulta de determinaçã o legal,
o registro aqui nã o tem natureza constitutiva; a propria lei constitui o direito real de usufruto.

No que tange ao usufruto sobre bens móveis, em regra, o usufruto deve recair sobre bens
inconsumíveis e infungíveis, porque uma das obrigaçõ es do usufrutuá rio é manter a substancia
do bem. E se o usufruto recai sobre um bem consumível e fungível, o proprio uso e a propria fruiçã o
da coisa, atingiriam de imediato a substancia do bem. Basta lembrar do art. 86 do CC.

Exceção: no caso do chamado usufruto improprio ou quase usufruto – art. 1392, § 1º e 1395
do CC. RICARDO ARIONNE: o usufruto é um direito real menor sobre coisa alheia; só que para ele
no usufruto improprio nó s teriamos aqui uma exceçã o. Porque o usufruto improprio permite ao
nuproprietá rio transferir para o usufrutuá rio as titularidades de uso e de gozo de um bem fungível
e consumível. Só que quando o usufrutuá rio recebe um bem fungível e consumível, ele nã o se
obriga a restituir o mesmo bem que lhe fora entregue e sim outro de mesma quantidade, qualidade

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e espécie. Entã o, na realidade, o usufruto improprio gera a transferencia da propriedade em favor
do usufrutuá rio, porque aquele bem que é entregue ao usufrutuá rio nã o será restituído ao
nuproprietá rio ao termino do usufruto; o que será restituido é outro bem de mesma quantidade,
qualidade e espécie. Entã o, nó s nã o teriamos no usufruto um direito real sobre coisa alheia, porque
o usufrutuá rio acaba adquirindo a titularidade sobre o bem fungível e consumível que lhe é
entregue.

Também é possível que o usufruto recaia sobre direitos. Inclusive, direito de crédito! Porque
usufruto sobre direito real nã o é dificil de se imaginar. Ex.: superficiá rio pode conceder direitos
reais menores sobre o direito de superfície. Entã o, nada impede que o proprietá rio superficiá rio
conceda usufruto em favor de outrem sobre a propriedade superficiá ria. O que é precisa é que o
direito real sobre o qual se concede o usufruto seja aliená vel, porque de alguma forma a concessã o
de usufruto gera um ato de disposiçã o pela proprietá rio; ele transfere a outrem a titularidade das
faculdades juridicas de uso e gozo, o que pressupoe a transmissibilidade e a alienabilidade do
direito.

Mas é possível inclusive que haja concessã o de usufruto sobre direito de crédito – art. 1395 do CC –
é o caso típico de usufruto improprio ou quase usufruto. Entã o, é possível que haja a concessã o
de usufruto de um título de crédito; nesse caso, se transfere ao usufrutuá rio a faculdade jurídica de
cobrar o direito de crédito. O paragrafo único impoe ao usufrutuário a aplicação dos recursos
obtidos em títulos da mesma natureza ou em titulos da divida pública federal.

E ao fim do usufruto o usufrutuá rio vai ficar com os rendimentos e ele vai se obrigar a restituir o
nuproprietá rio os valores originariamente recebidos, com correçã o monetá ria (para que haja
observancia à substancia do bem). O usufruto sobre o título de crédito vai permitir ao usufrutuá rio
perceber apenas os rendimentos; ao termino do usufruto, o usufrutuá rio restitui o nuproprietá rio
pelo valor originariamente recebido com correçã o monetá ria.

Remissã o do art. 1395, paragrafo ú nico para o art. 1410, VII, parte final do CC – uma das causas de
extinçã o do usufruto se dá no usufruto dos títulos de crédito quando o usufrutá rio nã o dá as
importancias recebidas a aplicaçã o prevista no paragrafo ú nico do art. 1395. Ou seja, se o
usufrutuá rio ao receber o crédito nã o aplica os recursos em títulos da mesma natureza ou em
títulos da dívida pú blica federal, essa é uma causa de extinçã o de usufruto prevista no CC.

 DIREITOS DO USUFRUTUÁRIO:

 POSSE DIRETA – remissã o para o art. 1197 do CC (porque aqui há desmembramento


possessó rio e o nuproprietá rio fica com a posse indireta)

Então, para a defesa do direito real de usufruto, o usufrutuário dispõe de duas vias: a) ações
possessórias; b) ação petitória (nesse caso, o usufrutuá rio vai defender o seu direito nã o com
base na posse, mas com base no título do seu direito real de usufruto)

(hoje, o STJ entende que cabe açã o reivindicató ria em favor do usufrutuá rio; ele pode se valer de
todas as vias petitó rias – RESP 1.202.843 – INFORMATIVO 550/STJ – o usufrutuá rio pode se valer
de todas as açõ es petitó rias, seja em face do nuproprietá rio ou de terceiros; é claro que a
reivindicaçã o aqui nã o se dá para a defesa do direito de propriedade, mas sim para a defesa do
direito real de usufruto; o que o STJ afirma é que essa faculdade de reivindicar a coisa em face do
nuproprietá rio ou de terceiros é uma projeçã o da sequela, típica dos direitos reais, dentro eles o
usufruto)

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 FRUIÇÃO

E em relaçã o aos produtos? Porque o art. 1394 diz que o usufrutuá rio pode exercer a percepçã o dos
frutos. Essa possibilidade se estenderia aos produtos? Em que medida o usufrutuário pode
perceber os produtos da coisa?

1ª corrente: o usufrutuá rio pode perceber os produtos, desde que nã o venha a atingir a substancia
do bem. (CHAVES)

2ª corrente (predominante): vem no sentido de que o art. 1394 esgotou por completo a
regulamentaçao da percepçã o dos frutos e nã o há como se estender analogicamente a percepçã o
dos frutos a percepçã o dos produtos. Isso porque frutos e produtos tem natureza acessó ria e ambos
sã o utilidades que se extraem da coisa. Mas a principal diferença está no fato dos frutos serem
renovaveis (sã o utilidades que o bem periodicamente produz, logo, nã o se atinge a substancia do
bem) e os produtos nã o, atingem a substancia da coisa. É da essencia dos produtos a nã o
renovabilidade. O atingimento da substancia do bem pela percepçã o dos produtos descaracterizaria
o usufruto, porque é inerente ao usufruto a obrigaçã o do usufrutá rio em manter a substancia do
bem. Logo, não se permite a percepção dos produtos pelo usufrutuário.

Exceção defendida por alguns autores contemporâneos: vamos supor que eu seja titular de
uma pedreira e eu concedo seu usufruto em favor de outrem; a ú nica maneira do usufrutuá rio obter
algum benefício economico com aquele usufruto é com a percepçã o das pedras. E aí vamos supor
que diante de uma hipotese como essa, em que a ú nica forma do usufrutuá rio obter algum benefício
economico se dá com a percepçao das pedras, o usufrutuá rio vem a fazê-lo. E aí eu digo que ele nã o
pode perceber os produtos, só os frutos. O que o usufrutuário pode alegar em seu favor aqui?
VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM – teoria da contradiçã o com a propria conduta; boa-fé
objetiva.

O proprietá rio que concede a outrem usufruto sobre uma pedreira e nega ao usufrutuá rio os
direitos de perceber as pedras, incorre em venire, na medida em que a ú nica forma do usufrutuá rio
obter algum benefício economico com aquele usufruto seria com a percepçã o das pedras.

USUFRUTO SOBRE VAGA DE GARAGEM:

É preciso diferenciar se a vaga de garagem tem natureza autonoma ou se ela é acessó ria ao imó vel:

 Se ela tiver natureza autonoma, matrícula autonoma no RGI: eventual usufruto sobre o
imó vel presumidamente nã o recai sobre a vaga de garagem, porque nesse caso a vaga de
garagem nã o teria natureza acessó ria. Aplicá vel o art. 114 do CC.
 Se ela é acessória ao imóvel, não tem matrícula própria no RGI: neste caso, a vaga de
garagem tem natureza acessó ria e aí aplicá vel o art. 1392 do CC – princípio da gravitaçao
jurídica.

 DIREITO DE ADMINISTRAR A COISA: é consequencia da titularidade da faculdade de


fruiçã o.

Em que pese o usufrutuá rio ter a faculdade de administrar nã o pode o usufrutuá rio mudar a
destinaçã o economica da coisa – art. 1399 do CC. Logo, o direito de administrar nã o lhe confere o
direito de alterar a destinaçã o economica do bem. Ex.: se o imó vel era destinado ao plantio, o

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usufrutuá rio nã o pode sem anuencia do nuproprietá rio utilizá-lo como haras. Isso está associado à
obrigaçã o do usufrutuá rio em manter a substancia da coisa.

 DIREITO DE CEDER O SEU EXERCÍCIO EM FAVOR DE OUTREM: isso está no art. 1393,
parte final do CC.

O usufruto é personalíssimo, logo, inaliená vel. Mas permite-se a cessã o do seu exercício por título
gratuito ou oneroso. Ele não pode é transferir a titularidade das faculdades jurídicas de uso e
gozo, mas apenas o seu exercício.

Essa possibilidade de transferir a outrem o exercício das faculdades de uso e gozo em alguns casos
está associada à pró pria fruiçã o do bem, a percepçã o dos frutos da coisa. Porque a fruição do bem
pode ser pessoal ou mediata. Vai ser pessoal se o usufrutuá rio pessoalmente cultiva a terra e
percebe os frutos e lucros oriundos do imó vel. Mas percebam que se o usufrutuá rio aluga aquele
imó vel ou faz um arrendamento daquele imó vel a um terceiro, a fruiçã o aqui pelo usufrutuá rio é
mediata, ela nã o é pessoal. Porque na realidade com aquela transferencia do exercicio das
faculdades de uso e gozo, o usufrutuá rio estará percebendo os frutos da coisa através de uma
contraprestaçã o devida pelo locatá rio ou pelo arrendatá rio. Entã o, o pagamento do aluguel em
favor do usufrutuá rio sobre o imó vel nã o deixa de ser a fruiçã o do bem pelo usufrutuá rio de forma
mediata.

Nesse caso em que o usufrutuário transfere a outrem o exercício das faculdades juridicas de
uso e gozo, seja através locação ou comodato, há a vertilização em graus da posse – quando
há desmembramento possessó rio, regra geral, o possuidor indireto é o proprietá rio; a exceçã o é a
verticalizaçã o em graus – ex.: sublocaçã o – porque quando há sublocaçã o a posse direta vai se
concentrar no sublocatá rio, pois é ele quem exerce o efetivo poder de fato sobre a coisa e na
realidade a posse indireta vai recair nã o apenas sobre o proprietá rio, que é o locador, mas também
sobre o locatá rio sublocador (também exerce nesse caso a posse indireta com a verticalizaçã o em
graus da posse).

Vejam que se o usufrutuá rio aluga um imó vel para um terceiro para perceber os frutos sobre
imó vel através do recebimento dos alugueis, nesse caso, a posse direta vai se concentrar no
locatá rio e a posse indireta vai recair nã o apenas sobre o nuproprietá rio, mas também sobre o
usufrutuá rio. Entã o, nesse caso, o usufrutuá rio nã o exerce a posse direta, mas sim indireta sobre a
coisa, porque o efetivo poder de fato nesse caso é exercido pelo locatá rio.

Entã o, em regra o usufrutuá rio tem posse direta, mas nada impede que ele venha a transferir a
posse direta em favor de outrem.

Na medida em que o usufruto é inalienável, a consequencia dessa inalienabilidade é a


impenhorabilidade – RESP 1.098.620/STJ. Da mesma forma, no mesmo sentido, nó s temos o art.
649, I do CPC dizendo que os bens inaliená veis sã o impenhorá veis.

O direito real de usufruto é inalienável (logo, impenhoravel), mas os frutos percebidos pelo
usufrutuário são passíveis de penhora. Nesse caso, nó s teríamos uma penhora do crédito do
usufrutuá rio e nã o a penhora do direito real de usufruto. E a penhora de crédito é disciplinada nos
art. 671 e ss. do CPC. A exceçã o aqui sobre essa penhora de crédito do usufruto vem no art. 650,
parte final do CPC – se aqueles créditos se destinam à satisfaçã o de prestaçao alimentícia. Entã o, se
o usufrutuá rio recebe aqueles valores e os utiliza para o cumprimento de prestaçã o alimentícia,
nesse caso, nã o caberia penhora do crédito – exceçã o a regra geral.

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STJ, RESP 351.839  diz que a lei 8009/90 não se dirige ao usufruto. No caso concreto o
sujeito era usufrutuá rio de um imovel; ele nã o tinha outro imovel. E ele alugava aquele imó vel. O
STJ disse que a lei 8009/90, nesse caso, nã o protegeria o titular do direito real de usufruto, porque
tal lei se destina à tutela da propriedade.

Entã o, se o sujeito é proprietá rio de um ú nico imovel residencial nele nã o reside, mas se utiliza dos
alugueres recebidos para a sua subsistencia, já é pacífico no STJ que a lei 8009 protege aquele
proprietá rio. Esse julgado diz que na hipó tese de usufruto a lei 8009 nã o protege o usufrutuá rio.
Entã o, se o usufrutuá rio tem aquele ú nico imó vel, aluga aquele imó vel, recebe os alugueis como
fonte de subsistencia, a princípio, a lei 8009 nã o seria aplicá vel, porque nesse caso nó s estaríamos
tutelando o usufrutuá rio e nã o o proprietá rio.

Cabe a penhora da nuapropriedade por dívidas do nuproprietário. Entã o, nã o cabe a penhora


do direito real de usufruto, mas cabe a penhora da nuapropriedade em si. E aí é evidente que
nesse caso o arrematente terá que respeitar o direito real de usufruto. Entã o, se o usufruto se
dá por um prazo determinado de 20 anos, o arrematante terá que respeitar o prazo de 20 anos. É
evidente, entã o, que em tese cabe a penhora e a arremataçã o da nuapropriedade, mas há algum tipo
de esvaziamento economico na medida em que o arrematante terá que necessariamente respeitar o
direito real de usufruto.

Se por ventura a penhora ultrapassa a nuapropriedade e de algum modo atinge os direitos


do usufrutuário, cabe a este o manejo dos embargos de terceiros – art. 1046 do CPC.

Art. 619 do CPC  no caso de arremataçã o da nupropriedade é pressuposto a prévia intimaçã o do


usufrutuá rio, sob pena de ineficácia da arremataçã o em relaçã o ao usufrutuá rio. A lei exige a prévia
intimaçã o do usufrutuá rio para permitir que ele consolide a propriedade, ou seja, dar oportunidade
para que ele arremate a nuapropriedade e se termine a questao da elasticidade da propriedade e
esta se consolide numa ú nica pessoa.

 DEVERES DO USUFRUTUÁRIO
Art. 1400 e ss.

 DEVER DE INVENTARIAR OS BENS RECEBIDOS: essa obrigaçã o busca estabelecer um


controle pelo nuproprietá rio e a definiçã o do que efetivamente será restituido ao termino
do usufruto. É uma espécie de prova pré-constituida em favor do proprietá rio em questoes
relativas ao estado dos bens e os bens compoem efetivamente o usufruto.

MARCO AURELIO VIANA diz que a negativa pelo usufrutuá rio de realizar o inventá rio gera
presunçã o de que os bens recebidos pelo usufrutuá rio estã o em pleno estado de conservaçã o.

 OFERECIMENTO DE CAUÇÃO REAL OU FIDEJUSSÓRIA: que busca garantir a conservaçã o


e a restituiçã o dos bens objeto do usufruto. Essa exigencia de caução pelo usufrutuário
não é automática, não se dá por determinação legal; ela apenas se aplica quando
exigir o nuproprietário. Entã o, a lei permite ao nuproprietá rio exigir cauçã o – é uma
faculdade.

Essa exigência de caução não se aplica quando o usufruto se dá por retenção – doação com
reserva de usufruto. Como a doaçã o é ato de liberalidade e o atual usufrutuá rio já exercia
anteriormente a propriedade sobre a coisa, o legislador afasta aqui a possibilidade de exigencia de
cauçã o pelo donatá rio em relaçao ao doador – art. 1400, paragrafo ú nico.

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Art. 1401  traz as consequencias da negativa do usufrutuário em oferecer a caução exigida
pelo nuproprietário. Nesse caso, o legislador transfere a administraçao do bem objeto do usufruto
para o nuproprietá rio. O nã o oferecimento da cauçao nã o gera a extinçã o do usufruto. Será o
nuproprietá rio quem irá administrar o bem objeto do usufruto e ele vai ser compelido a entregar os
frutos ao usufrutuá rio. Ele vai perceber os frutos em nome do usufrutuá rio e vai entregar esse
frutos a ele.

Neste caso, é o nuproprietá rio quem oferecerá cauçao ao usufrutuá rio, porque na medida em que
ele passa a exercer a administraçã o, ele passa a perceber os frutos e se obriga a entregá -los ao
usufrutuá rio, ele é quem passa a dever cauçã o ao usufrutuá rio pelo repasse dos frutos percebidos.

 DEVER DE CONSERVAR O BEM

As despesas devem ser suportadas pelo usufrutuá rio.

Art. 1403 – atribui ao usufrutuá rio: a) as despesas ordiná rias (de custo mó dico) e; b) as prestaçõ es
e tributos devidos pela posse ou rendimento da coisa usufruida, ou seja, as obrigaçõ es e os tributos
de natureza propter rem – IPTU, cota condominial, etc.

CUIDADO: O inciso I fala em despesas ordiná rias, só que esse inciso tem que ser interpretado em
conjunto com o art. 1404, caput e § 1º - diz que incumbem ao dono as despesas que nã o forem de
custo mó dico – então, as despesas ordinárias que não forem de custo módico não cabem ao
usufrutuário, cabem ao nuproprietário. E aí o § 1º traz uma definiçã o do que é ou nã o custo
mó dico.

Além disso, o art. 1404 deixa claro que as despesas extraordiná rias também cabem ao
nuproprietá rio.

RESP 1.018.179/STJ  as obrigaçõ es e tributos de natureza propter rem incumbem ao


usufrutuá rio – art. 1403, II – nesse julgado a hipotese era de usufruto vitalício, só que o
usufrutuá rio se tornou inadimplente em relaçã o as cotas condominiais e em relaçã o ao IPTU
(obrigaçõ es que lhe incumbem). Só que o inadimplemento de cota condominial e de IPTU pode
trazer que consequências? A perda da propriedade. Sã o hipoteses, inclusives, que escapam da
impenhorabilidade da lei 8009/90 – exceçõ es do art. 3º: se permite a penhora do bem de família
nesses casos.

Entã o, o STJ entendeu que o inadimplemento pelo usufrutuá rio das cotas condominiais e do IPTU
geraria a extinçã o antecipada do usufruto vitalício, aplicando-se por analogia o art. 1410, VII do CC
– prevê a extinçã o do usufruto por culpa do usufrutuá rio quando aliena, deteriora ou deixa arruinar
os bens. O inadimplemento aqui das obrigaçõ es propter rem se equipararia a uma hipó tese de ruína
dos bens, porque com essa conduta o usufrutuá rio poderia gerar a extinçã o da pró pria propriedade
exercida pelo nuproprietá rio.

Art. 1404, § 2º  preve que se o dono nã o fizer as reparaçõ es a que está obrigado, ou seja, as
reparaçõ es extraordiná rias e as ordiná rias de custo elevado, se essas reparaçõ es forem
indispensá veis a conservaçã o da coisa, o usufrutuá rio pode adiantá -las e depois cobrar do
nuproprietá rio. O que se exige aqui é que elas sejam indispensá veis a conservaçã o da coisa.

 EXTINÇÃO DO USUFRUTO:
Art. 1410 e 1411 do CC.

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 INCISO I: MORTE DO USUFRUTÁRIO: a vida do usufrutuá rio é o limite máximo do usufruto
(ainda que o usufruto tenha sido acordado por um prazo determinado). O usufruto nã o
pode ultrapassar a vida do usufrutuá rio e nã o se admite usufruto sucessivo ou progressivo.
Logo, com a morte do usufrutuá rio o nuproprietá rio volta a reunir todas as faculdades
jurídicas sobre a coisa – ocorre a consolidaçã o da propriedade.

A morte do nuproprietário, todavia, em nada compromete o usufruto. Os sucessores do


nuproprietário terão que respeitar o usufruto anteriormente constituído pela falecido.

Remissã o do art.1410, I, parte para o art. 1411 do CC. Esse dispositivo deixa claro que em relaçã o ao
usufruto nã o se presume o direito de acrescer – se o usufruto for constituído em favor de duas ou
mais pessoas, o falecimento de uma delas nã o gera para os demais usufrutuá rios sobreviventes o
direito de acrescer. A presunçã o que o CC traz é que se o usufruto foi estabelecido em favor de A e
de B, se o A falece, a parcela do A retorna para o nuproprietá rio; o nuproprietá rio volta a titularizar
as faculdades de uso e gozo que haviam sido transmitidas para o A falecido. O direito de acrescer
nã o se presume – presunçã o relativa – é preciso que haja explícita previsã o.

Ex.: se há doaçã o por um casal de um imovel para o filho com reserva de usufruto (usufruto retido
em favor do casal); se um deles falece, a lei nã o presume direito de acrescer em favor do outro.
Extinçã o parcial do usufruto.

Exceção a essa presunção: usufruto por via testamentá ria – remissã o do art. 1411 ao 1946 do CC
– aqui o legislador presume o direito de acrescer – exceçã o à regra geral.

No caso de contrato de locação firmado pelo usufrutuário, nesse caso, aplicável o art. 7º da
lei de locações (lei 8245/91) – com a extinçã o do usufruto, o antigo nuproprietá rio tem o prazo
de 90 dias para manifestar a intençã o de romper a locaçã o, salvo se ele havia consentido com a
locaçã o. Entã o, se o nuproprietá rio nã o participou do contrato de locaçã o, ele tem 90 dias para
extinguir a locaçã o diante do termino do usufruto.

 INCISO I: RENÚNCIA PELO USUFRUTUÁRIO: a renuncia tem que ser expressa, até por
força do art. 114 do CC.

 INCISO II: PELO TERMO DE SUA DURAÇÃO: nada impede que o usufruto se dê por prazo
determinado.

O que a doutrina afirma é que nada impede que haja usufruto com condição resolutiva –
evento futuro e incerto – se nã o houver o implemento da condiçã o resolutiva, o usufruto expirará
quando do falecimento do usufrutuá rio.

 INCISO III: PESSOA JURÍDICA USUFRUTUÁRIA – PRAZO MÁXIMO DE 30 ANOS: nada


impede que seja acordado por prazo menor; ainda que instituído por prazo determinado, o
usufruto se extingue com a extinçã o da pessoa jurídica. Remissã o para o art. 1393 do CC.

 INCISO IV: EXTINÇÃO PELA CESSAÇÃO DO MOTIVO DE QUE SE ORIGINA – no caso de


usufruto legal dos pais dos bens dos filhos menores durante o poder familiar, cai o
usufruto legal dos pais quando do atingimento da maioridade dos filhos ou quando da
emancipaçã o, porque cessou o motivo gerador do usufruto.

 INCISO V: PELA DESTRUIÇÃO DA COISA: cuidado, pois o proprio dispositivo faz


referencia a artigos em que se opera a chamada subrrogaçã o real. Entã o, a destruiçã o da

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coisa extingue o usufruto, mas é preciso ressalvar a possibilidade de subrrogaçã o real – a
titularidade do direito real de usufruto que recaía sobre a coisa que agora está destruída,
vai recair sobre outros bens. Quais as hipó teses previstas no inciso V?

 Art. 1407 e 1408: Se o objeto destruído era objeto de seguro, o usufruto vai recair sobre
a indenizaçã o paga pela seguradora; e aí nó s passaríamos a ter na realidade um
usufruto impró prio, pois vai recair sobre um bem fungível e consumível.
 Art. 1409: trata da desapropriaçã o ou destruiçã o da coisa por culpa de terceiro –
hipó teses em que o usufruto vai se subrrogar na indenizaçã o paga pela administraçã o
pú blica ou da indenizaçã o paga pelo terceiro.

 INCISO VI: EXTINÇÃO PELA CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE – entã o, se o


nuproprietá rio vem a adquirir o direito real de usufruto ou se o usufrutuá rio vem a
adquirir a nupropriedade, haverá extinçã o do usufruto.

 INCISO VII: HIPÓTESES DE CULPA DO USUFRUTUÁRIO – quando ele aliena, deteriora ou


deixa arruinar os bens; nesse caso, a extinçã o do usufruto pressupõ e uma açã o judicial
para que haja a demonstraçã o de culpa.

 INCISO VIII: EXTINÇÃO PELO NÃO USO OU NÃO FRUIÇÃO DA COISA – lembrar que o
direito real de propriedade permite ao seu titular usar ou nã o usar o bem. Em relaçã o ao
usufruto, tal qual a servidã o, é diferente! Tanto na servidão quanto no usufruto é
premissa que o titular da servidão e o titular do usufruto venham a utilizar a coisa,
seja direta ou indiretamente (por locação ou arrendamento). O nã o uso ou nã o fruiçã o
da coisa gera extinçã o do usufruto, porque se trata de uma restriçã o que se impõ e ao
direito de propriedade e essa restriçã o ao direito de propriedade só se justifica se o
usufrutuá rio efetivamente se vale dessa direito real menor para usar e/ou fruir o bem.

Aqui há uma discussão em relação ao prazo do não uso:

1ª corrente: aplicaçã o por analogia do art. 1389, III do CC – prevê o prazo de 10 anos pelo nã o uso
da servidã o; art. 205 do CC que prevê o prazo ordiná rio de prescriçã o – 10 anos.

2ª corrente: enunciado 252 do CJF – a extinçã o pelo nã o uso independe do prazo previsto no art.
1389, III, operando-se imediatamente. Como nã o há prazo específico, nã o se exige o prazo de 10
anos, basta que tenhamos um lapso temporal suficiente para caracterizar a inobservâ ncia da funçã o
social do usufruto.

Aqui há a mesma discussã o quanto à natureza jurídica do prazo que vimos em relaçã o ao art. 1389,
III do CC (Prescricional? Decadencia? Prazo sui generis?).

6. DIREITOS REAIS DE USO E DE HABITAÇÃO


As disposições previstas sobre usufruto se aplicam, no que couber, ao direito real de uso e ao
direito real de habitação.

O direito real de uso está nos art. 1412 e 1413 do CC. A aplicaçã o subsidiá ria das disposiçõ es do
usufruto está no art. 1413 do CC.

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O direito real de habitaçã o está nos art. 1414 a 1416 do CC. Aplicaçã o subsidiá rio do usufruto está
no art. 1416 do CC.

O direito real de uso confere ao seu titular a possibilidade de usar ou de fruir do bem?

Aparentemente, o titular do direito real de uso só faria jus ao uso do bem e nã o a fruiçã o. Mas o art.
1412 deixa claro que o titular do direito real de uso tem sim a faculdade de fruição, mas é uma
fruição limitada às necessidades suas e de sua família.

O § 1º deixa claro que a variaçã o das necessidades pessoais do usufrutuá rio variam de acordo com
o caso concreto; ela nã o é está tica e sim dinâmica – vem em consonancia com a isonomia material.

§ 2º: conjuge aqui abrange também o companheiro, por força do art. 226, § 3º da CF.

Já o direito real de habitação não assegura ao seu titular a percepção dos frutos – o titular do
direito real de habitação faz jus apenas a habitar gratuitamente casa alheia.

Não pode:

 Alugar
 Nem emprestar

Só pode ocupar o bem com a sua família! O direito real de habitação só pode recair sobre bens
imóveis, o que é uma singularidade em relaçã o ao usufruto e ao uso (podem recair sobre bens
móveis e imóveis).

Art. 1415: deixa claro que se o direito real de habitaçã o for titularizado por duas ou mais pessoas,
qualquer delas pode habitar gratuitamente sem ter que pagar aluguel uma a outra, e nenhuma delas
pode exercer qualquer embaraço ao direito real de habitaçã o da outra.

É admissível aqui a usucapião do direito real de uso e do direito real de habitação,


notadamente quando houver concessã o a non domino do direito real de uso e de habitaçã o; nos
mesmos moldes em que vimos a usucapiã o de usufruto.

AULA 05

7. DIREITO DE VIZINHANÇA
Art. 1277 a 1313 do CC.

A definiçã o de propriedade vizinha para fins de direito de vizinhança nã o se restringe a


propriedades confinantes. Para fins de direito de vizinhança, a propriedade vizinha abrange
todos os bens que possam sofrer repercussões.

As regras de direito de vizinhança se aplicam a imóvel urbano ou rural. Seja para fins
residenciais ou comerciais.

As normas de direito de vizinhança, via de regra, impõ em-se obrigaçõ es propter rem; natureza
jurídica das obrigaçõ es oriundas das regras de direito de vizinhança: obrigaçao propter rem. Com a
peculiariedade de serem desprovidas de oponibilidade erga omnes; na realidade, a oponibilidade
das regras aqui se dá em face dos proprietá rios vizinhos e nã o oponibilidade erga omnes.

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As regras de direito de vizinhança se impõ em nã o apenas em face do proprietá rio, mas também em
face de titulares de direitos reais menores como, por exemplo, o usufrutuá rio, o superficiá rio,
dentre outros. E também se impõ e em face dos possuidores. Entã o, em que pese ser obrigaçã o
propter rem, as regras de direito de vizinhança se impõ em também em face dos possuidores.

As regras de direito de vizinhança atuam no caso de interferência mediata, ou seja, a interferencia


começa no prédio de quem a causa, repercutindo no prédio alheio. Ex.: fumaça, barulho, poeira – se
deslocam do imó vel de quem causa para os proprietá rios vizinhos.

Se por ventura os efeitos já se iniciam no prédio vizinho – o sujeito já canaliza a fumaça diretamente
ao prédio vizinho – nesse caso, nó s temos interferencia imediata. E para muitos autores isso
descaracterizaria a aplicaçã o das regras do direito de vizinhança; nesse caso, se aplicaria a
sistemá tica da responsabilidade civil por ato ilícito – nó s teríamos ato ilícito estrito senso, violaçã o
ao direito de propriedade.

As regras de direito de vizinhança são dotadas, em regra, de reciprocidade, ou seja, restriçõ es


recíprocas entre proprietá rios vizinhos.

As regras de direito de vizinhança pressupõem necessidade – por isso, elas resultam da lei.
Alias, trata-se de ROL TAXATIVO.

Essas caracteristicas diferenciam o direito de vizinhança X direito real de servidão: No


direito real de servidã o nã o há bilateralidade, a princípio. Nó s temos o prédio dominante que se
beneficia do predio serviente – o que há é uma via de mã o ú nica. E mais, o direito real de servidã o
nã o pressupõ e necessidade, basta comodidade ou utilidade. Isso é inclusive o que diferencia de
forma nítida a passagem forçada (direito de vizinhança) da servidã o de passagem.

Além disso, o direito real de servidã o nã o resulta da lei, mas sim do acordo de vontade. O rol de
direito real de servidã o é um rol puramente exemplificativo.

As regras de direito de vizinhança tem, em regra, incidencia gratuita, mas nada impede a sua
onerosidade. A onerosidade se dá basicamente quando nã o há reciprocidade. Nó s vimos que, em
regra, as regras de direito de vizinhança envolvem reciprocidade. Mas quando nã o há reciprocidade
(e usualmente essa ausencia de reciprocidade está associada a interesse pú blico), nesses casos, o
direito de vizinhança acaba sendo oneroso. Exemplo típico da passagem forçada – art. 1285 do CC.

 DO USO ANORMAL DA PROPRIEDADE


Art. 1277: traz o famoso trinômio segurança, sossego e saúde.

Enunciado 319 do CJF  impõ e a necessidade de interpretaçã o das regras de direito de vizinhança
do CC à luz de valores constitucionalmente tutelados.

O rol aqui é taxativo.

Vale destacar que o uso anormal da propriedade – que afeta o trinomio segurança, saú de e sossego
– pode se manifestar através do nã o uso. O uso anormal pode se dar com uma atuação
comissiva, mas também omissiva. Imaginem que a omissã o continuada de um proprietá rio ou
possuidor faça com que o prédio ameace ruína e essa ameaça de ruína atinge podetencialmente
proprietá rio vizinhos.

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Alem desses exemplos, nó s temos todas as regras de direito urbanístico – art. 182, § 4º da CF; e art.
5º a 8º do estatuto da cidade (lei 10.257/01) – preve as medidas de intervençã o do poder pú blico
na propriedade privada (edificaçã o compulsó ria, por exemplo).

Alguns exemplos de violaçã o à saú de: propagaçã o de gazes, mal cheiro, fumaça, infiltraçõ es,
transmissã o de antenas de telefonia de celular sem a observancia das normas regulamentares.

Exemplos de violaçã o à segurança: abrange a incolumidade das pessoas e de seus patrimonios.


Obras irregulares, animais de grande em condominio, queda constante de objetos do pavimento
superior.

Exemplo de violaçã o ao sossego: níveis de ruído e movimentaçã o intolerá veis.

As disposiçõ es sobre o uso anormal da propriedade no CC vem em consonancia com o que o


SANTIAGO DANTAS já defendia. Ele defende que em relação ao uso anormal da propriedade
existem tres situações distintas:

1) Uso normal da propriedade acarretando incômodos normais: os incomodos normais de


vizinhança sã o também chamados de encargos primá rios de vizinhança – ex.: choro de
criança, barulho de descarga, barulhos de porta batendo, latidos de cachorro. Como sã o
incomodos normais, inerentes à vizinhança elas nã o geram nenhuma pretensã o para seus
supostos agredidos, porque, na verdade, nã o há violaçã o à direito.

SANTIAGO DANTAS trabalha aqui com três requisitos para que se constate que o incomodo é
normal:

a) Defende a aplicaçã o do padrã o abstrato do homem médio; a sensibilidade do vizinho que


se sente agredido deve ser levado em conta a luz do parametro do homem medio; (isso
nã o é unanime! CHAVES defende que nã o deve ser aplicada a figura do homem medio
aqui; devem ser levadas em conta as condiçõ es especiais de terminados vizinhos – ex.: se
temos vizinhos enfermos, se há crianças recem-nascidas, idosos, etc.);

b) Zona do conflito – é preciso tratar diferentemente, por exemplo, á rea residencial de á rea
comercial. Para dimensionar a zona de conflito é possível levar em conta o plano diretor
municipal. (vale a pena destacar que o estudo de impacto de vizinhança previsto no art. 36
da lei 10257/01 serve como mero parametro; os resultados desse estudo nã o sã o
vinculantes em relaçã o ao juiz no caso concreto ao definir a aplicaçã o ou nã o das regras de
direito de vizinhança);

c) Teoria da pré-ocupaçã o ou anterioridade da posse: quem primeiro ocupa a á rea “dita”,


“define” o tipo de interferencia que os outros vizinhos suportarã o no futuro. Ex.: se alguém
se muda para as mediaçõ es de um aeroporto já instalado; por essa teoria nã o podem os
fututos adquirentes do imó vel nas vizinhanças do aeroporto vindicar a aplicaçã o das
regras do direito de vizinhança em face do aeroporto.

É evidente que a anterioridade aqui tem que ser interpretada de acordo com as normas de
zoneamento do bairro, com as normas urbanísticas municipais. Entã o, se de acordo com a norma
urbanística aquela determina á rea é eminentemente residencial, é evidente que o fato do sujeito
ocupar aquela area de maneira inicial nã o lhe permite praticar uma atividade industrial que vá
atingir toda a gama de moradores futuros daquela localidade.

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CHAVES afirma que o teoria da pré-ocupaçã o tem que ser interpretada com cautela para que nã o se
conceda um ‘alvará ’ para produçã o de danos a novos vizinhos. Ou seja, nã o se admite que haja
abuso de direito no que tange à aplicaçã o dessa teoria.

2) Uso normal da propriedade gerando incômodos anormais, porém socialmente


necessários: ou seja, temos uma justificativa social para a produçao desses incô modos
anormais. Imaginem, por exemplo, que numa determinada á rea a se instalar uma indú stria
num municipio do interior, gerando empregos para toda a localidade; arrecadaçã o de
tributos. Entã o, é evidente que se um determinado vizinho da industria se sente prejudicado
na saú de, sossego ou segurança, nã o parece justificá vel que aquele indivíduo prejudicado
pudesse exigir a cessaçã o ou fechamento da indú stria, porque o fechamento da indú stria
atingiria o interesse social, de toda a coletividade local. Nesse caso, aplicá vel o art. 1278 do
CC – nã o caberá cessaçã o da atividade, caberá apenas indenizaçã o por perdas e danos.
Nesse caso, a pretensã o do proprietá rio atingido é uma pretensã o que envolve
responsabilidade civil. Aqui a reparaçã o é integral, abragendo dano patrimonial e moral,
inclusive eventual depreciaçã o do valor do bem.

O art. 1279 prevê que mesmo que o proprietá rio tenha que tolerar aquele ato que violaçã o sua
segurança, saú de ou sossego, porque justificá vel por interesse social, possa exigir a reduçã o ou a
eliminaçã o da interferencia, quando a reduçã o ou eliminaçã o se tornarem possíveis. Ex.: instalaçã o
de filtros numa determinada industria pode pelo menos minimizar os impactos da atingimento à
saude dos vizinhos; a definiçã o de horá rios de funcionamento; novas tecnologias podem surgir
minimizando os danos aos vizinhos.

3) Uso anormal, gerando incômodo anormal (art. 1277): uso anormal, que gera incomodo
anormal, sem justificativa social, porque se houver justificativa social a regra aplicá vel é do
art. 1278, através da qual a proprietá rio só pode exigir perdas e danos. Aqui nã o, como nã o
há justificativa social, o proprietá rio ou possuidor podem fazer cessar as interferencias
prejudiciais à segurança, sossego e saú de. Entã o, aqui cabe a tutela específica ao
proprietá rio ou possuidor atingidos. Ex.: imaginem um bar ou uma boate que emitem ruídos
absurdos que atingem toda a vizinhança; é possivel a cessaçã o nas atividades. É claro que
aqui a tutela específica da cessaçã o da atividade nã o afasta o cabimento de perdas e danos.

O art. 1280 prevê a chamação AÇÃO DE DANO INFECTO – quando há risco de ruína de prédio
vizinho. Essa açã o abrange o pedido de demoliçã o ou a reparaçã o do prédio vizinho que ameaça
ruína.

A parte final do dispositivo prevê ainda o seguinte: “bem como que lhe preste cauçã o pelo dano
iminente” – pode o vizinho na iminência de sofrer com a ruína exigir cauçã o (garantia fidejussó ria
ou real) de indenizaçã o, caso venha a se concretizar a ruína do prédio vizinho – aqui o que nó s
temos é a chamada CAUTIO DAMNI INFECTI.

Ação de dano infecto X ação de nunciação de obra nova (art. 934 do CPC): nesta ú ltima o que
se busca é impedir o prosseguimento de obras prejudiciais aos vizinhos, ou seja, a obra está em
andamento na açã o de nunciaçã o de obra nova; aqui nã o! Aqui na realidade o que nó s temos é um
prédio que nã o está em obra e ameaça ruína.

Na açã o de nunciaçã o de obra nova a legitimidade ativa abrange proprietá rio ou possuidor;
legitimidade passiva: proprietá rio do prédio e o construtor.

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Art. 1281  prevê a hipótese em que obras realizadas por terceiros possam causar danos ao
titular do imóvel. Entã o, o sujeito tem lá um imovel e nesse imovel existem obras realizadas por
terceiros. Essas obras realizadas por terceiros podem vir a causar danos ao titular do imó vel. Entã o,
nesse caso de dano iminente, o proprietá rio do imó vel pode exigir cauçã o (fidejussó ria ou real)
daquele terceiro que realiza obra no seu proprio imó vel.

É hipotese típica de aplicaçã o do art. 1380 do CC – no caso do direito real de servidã o. Pode ser que
seja necessá rio ao exercício da servidã o a realizaçã o de obras no prédio serviente; e é possível que
o titular do prédio dominante venha a realizar essas obras necessá rias no prédio serviente. Ou seja,
o titular do prédio serviente, no caso do art. 1380, pode exigir do titular do prédio dominante a
cauçã o prevista no art. 1281 do CC (fazer remissã o recíproca).

Também é o caso da passagem forçada de cabos e tubalaçõ es – remissã o recíproca do art. 1281
para o art. 1287 do CC.

 ÁRVORES LIMÍTROFES
O art. 1282 prevê que a á rvore com tronco na linha divisó ria entre dois imó veis traz a presunçã o
IURIS TANTUM (relativa) de condomínio sobre a á rvore. Exceçã o: previsã o no título (no registro de
imó veis, p. ex.) ou as circunstancias. Como consequência disso deve haver a repartição dos
frutos e da madeira a ser abatida.

OBS.: há uma regra no CC portugues, que nã o guarda correspondente no direito BR, mas que a
doutrina defende ser aplicá vel aqui por analogia – em se situando no marco divisó rio, a á rvore nã o
pode ser abatida sem o consentimento do outro vizinho. Isso parece ser ao professor um
desdobramento do condominio presumido do art. 1282 do CC.

O art. 1283 prevê a hipótese típica de AUTOTUTELA – se a á rvore se situa num terreno e as
raízes e os ramos da á rvore se projetam para o terreno vizinho, o dispositivo prevê aqui a
autotutela em favor do vizinho, que vai poder cortar, até o plano vertical divisó rio, as raízes e os
ramos de á rvore que ultrapassem o limite divisó rio.

OBS.: CHAVES destaca que essa autotutela, esse direito ao corte aqui, tem que ser ponderado a luz
de interesses socialmente relevantes. Esse direito ao corte nã o é absoluto, especialmente pelo fato
das á rvores terem relevantes agentes despoluidores. Logo, só seria justificá vel o direito ao corte no
caso de dano iminente, no caso de prejuízo efetivo, tendo em vista a necessidade de tutela do mio
ambiente.

OBS.: Imaginem que o vizinho, no exercicio da autotutela, venha cortar a raiz a que ultrapasse o
limite divisó rio; ao cortar a raíz da arvore, a arvore simplesmente despenca sobre o imó vel em que
a arvore se situava. BEVILAQUA defendia que como nã o há ato ilícito por parte daquele que corta a
raiz até o limite divisó rio (já que a lei autoriza essa conduta) nã o haveria o dever de indenizar.

SILVIO RODRIGUES, por sua vez, diz que apesar do silencio do CC, aquele que vai cortar a raiz da
arvore tem o dever de previamente informar o dono da arvore, para que o dono da arvore possa
adotar medidas preventivas para evitar a queda da á rvore. Essa interpretaçã o parece ser a mais
adequada no CC atual com o dever anexo de informaçã o da boa-fé objetiva. Seria uma projeçã o da
boa-fé objetiva na seara do direito de vizinhança. Entã o, se nã o há observancia desse prévio dever
anexo de informaçã o haveria sim ato ilícito a justificar a responsabilidade civil daquele que corta a
raiz da arvore e com isso a arvore vem a despencar sobre o imó vel no qual a arvore se situa.

58
O art. 1284 merece remissão para o art. 1232, parte final do CC.

Art. 1232, parte final  “salvo se, por preceito jurídico especial, couberem a outrem” – e o art. 1284
é preceito jurídico especial. Entao, se a arvore se situa no imó vel A que é vizinho do imó vel B, mas
os frutos da á rvore situada no imó vel A caem no prédio B, o titular do imó vel B passa a ter a
titularidade sobre os frutos caídos. Logo, temos um preceito juridico especial que traz a ideia de que
os frutos separados nã o pertencerã o ao dono da á rvore.

A ratio desse dispositivo é evitar invasõ es de um imó vel em relaçã o ao outro; minimizar a
potencialidade de conflitos.

PEGADINHA! “SE ESTE FOR DE PROPRIEDADE PARTICULAR.” – se o fruto da á rvore cai em imó vel
pú blico o fruto vai pertencer ao titular da á rvore. Essa regra especial do art. 1284 pressupõe
que os frutos caiam em imóvel de propriedade particular.

 PASSAGEM FORÇADA
Art. 1285  A passagem forçada está associada à ideia de encravamento – o imóvel não tem
acesso à via pública, nascente ou porto.

Nesse caso, há um interesse social, pú blico que justifica a passagem forçada. Percebam que a
passagem forçada é direito de vizinhança e nã o contém a bilateralidade – as regras de direito de
vizinhança normalmente trazem reciprocidade, bilateralidade. Na passagem forçada nã o. Nã o há
bilateralidade; a passagem forçada é fixada em detrimento de um imó vel e em favor de outro.
Vejam que a unilateralidade aqui (benefício de um imó vel em detrimento do outro) decorre do
interesse pú blico de viabilizar o acesso à via pú blica, nascente ou porto à quele imó vel que se
encontra encravado.

E por essa razã o, por nã o ter bilateralidade, a passagem forçada é onerosa – “mediante indenizaçã o
cabal”. Tambem é uma exceçã o, pois normalmente as regras de direito de vizinhança se aplicam
independentemente de qualquer indenizaçã o.

A passagem forçada é:

 imposta judicialmente;
 pressupõe necessidade;
 encravamento;
 não tem bilateralidade, não sendo recíproca;
 onerosa, com fixação de indenização cabal.

A regra se inspira na funçã o social da propriedade e na solidariedade social.

O encravamento tem que ser absoluto? É necessário que o imóvel não tenha nenhum acesso
à via pública, nascente ou porto?

Pela letra fria do art. 1285 aparentemente sim! Mas, hoje, a doutrina contemporâ nea vem
afirmando que nã o. Imaginem se o acesso à via pú blica for extremamente penoso e perigoso.
Percebam que em que pese o encravamento nã o ser absoluto, o acesso á rduo, penoso, perigoso
viola o princípio da dignidade da pessoa humana, o que demonstra haver necessidade, mesmo nã o
sendo o encravamento absoluto, nesse caso.

59
E por outro lado, se o acesso à via pú blica nã o permite a normal exploraçã o economica do bem, esse
acesso inobserva a funçã o social da posse e da propriedade, também é interesse constitucional
tutelado – enunciado 88 do CJF – “consideradas inclusive as necessidades de exploração econômica”.

Entã o, a luz dessa interpretaçã o há quem entenda nã o haveria mais “necessidade” a justificar a
passagem forçada. Isso nã o é verdade! Se exige necessidade sim! O que há é um releitura, uma
revisã o da definiçã o de necessidade a luz dos interesses constitucionalmente tutelados. Hoje, há
necessidade se há violaçã o da funçã o social da posse e propriedade.

O art. 1285 em sua literalidade confere legitimidade ativa para exigir a passagem forçada apenas ao
dono. Em que pese o dispositivo só se referir ao dono, é unanime a doutrina no sentido de afirmar
que titulares de direitos reais menores também podem exigir a passagem forçada (ex.: usufruto,
direito de superficie)

E numa interpretaçã o ainda mais progressista, varios autores hoje defendem que o possuidor
também pode exigir passagem forçada. SILVIO VENOSA, NELSON ROSENVALD, MARCO AURELIO
BEZERRA DE MELLO, dentre outros. Até porque o possuidor tem o uso e o gozo sobre o bem e a
passagem forçada acaba privando o exercicio da posse pelo possuidor. E alem disso a teoria
sociologica da posse diz que a posse nã o é menos do que a propriedade.

§ 1º  diz que a passagem forçada tem que ser fixada pelo caminho menos oneroso.

§ 2º  prevê o caso de alienaçã o parcial do prédio. Imaginem que um determinado imó vel venha a
ser parcialmente vendido e com essa alienaçã o parcial a parte nã o alienada se torna encravada. O
dispositivo diz que o comprador deverá suportar a passagem forçada.

PASSAGEM FORÇADA x SERVIDÃO DE PASSAGEM:

PASSAGEM FORÇADA SERVIDÃO DE PASSAGEM

É direito de vizinhança – art. 1285 do CC. Direito real de goza ou fruiçã o

Pressupõ e o encravamento Associada à comodidade ou utilidade, nã o


se exigindo necessidade para a incidencia
Está associada à ideia de necessidade da servidã o da passagem.

É EX VI LEGIS – resulta da lei. Tanto que no EX VOLANTATE – resulta da manifestaçã o


caso de inobservancia pela outra parte de vontade e se constitui mediante registro
poderá ser fixada judicialmente de imó veis

Por ser obrigação PROPTER REM, a Passível de usucapiã o, desde que a servidã o
passagem forçada não é passível de seja aparente – art. 1379 do CC.
usucapião.

 PASSAGEM DE CANOS E TUBULAÇÕES

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Art. 1286  Trata-se da passagem forçada de canos, condutos e tubulações no subterrâneo,
desde que essa passagem esteja associada a serviços de utilidade pública. Ex.: tramissõ es
eletricas, de gá s, telefonia, á gua, etc.

Percebam que aqui também nã o há bilataralidade, assim como na passagem forçada. O interesse
pú blico impõ e que um determinado imó vel suporte unilateralmente a passagem de cabos e
tubalaçõ es. Há um interesse pú blico, social que justifica a unilateralidade. E como contrapartida,
nós temos aqui o direito à indenização previsto no dispositivo. O proprietá rio que suporta essa
passagem tem direito à indenizaçã o, que abrange dano patrimonial e moral. O dano patrimonial
abrange, inclusive, a desvalorizaçã o do imó vel.

Art. 1287  prevê a cauçã o que nó s já estudamos no art. 1281 – remissã o recíproca.

 DAS ÁGUAS
Art. 1288 a 1296 do CC.

Lembrando que a sistemá tica das á guas é regulamentada com maior detalhe na Lei 9433/97 – lei de
recursos hídricos.

O art. 1288 se aplica no caso de águas que correm naturalmente e não artificialmente.
Pressupõ e que a agua tenha curso natural.

Entã o, o proprietá rio inferior tem que receber as aguas e escoar as aguas, sem qualquer
indenizaçã o, no caso do art. 1288, em que o fluxo de aguas é natural.

A doutrina defende maciçamente que esse art. 1288 se aplica às chamadas AGUAS
ESCOLATÍCIAS ou SUBTERRÂNEAS.

Se a agua corre do prédio superior para o predio inferior artificialmente, nesse caso, passa a
ser aplicável o art. 1289 do CC. Ex.: no caso de má quinas, bombas, via cisterna.

E aí nesse caso o proprietá rio inferior pode exigir indenizaçã o ou desvio das á guas.

O paragrafo ú nico traz regra que se inspira na vedaçã o ao enriquecimento sem causa, porque é
possivel que esse fluxo arficial de aguas cause prejuízo ao proprietá rio inferior, mas pode lhe
causar benefícios; ex.: no caso de plantaçã o ou de gado no prédio inferior – o fluxo de aguas pode
beneficiar o prédio inferior. Nesse caso, da indenizaçã o pleiteada pelo titular do prédio inferior será
deduzido o valor do benefício obtido. Remissã o para os art. 884 a 886 do CC.

O art. 1290 proíbe obras que venham a atingir a condição natural do prédio inferior. Ex.:
drenos ou obras realizadas pelo titular do prédio superior nã o podem agravar a situaçã o do prédio
inferior; impedir o curso natural das á guas, por exemplo.

Art. 1291  o titular do prédio superior nã o pode poluir as aguas que busquem o atendimento das
necessidades bá sicas de vida dos possuidores dos imó veis inferiores.

A interpretaçã o literal do dispositivo (parte final) poderia nos conduzir a afirmativa de que haveria
um direito de poluir as aguas nã o essenciais, desde que se possa pagar por isso. O que nã o é
verdade!

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Ponderaçã o crítica: defende-se que esse dispositivo na parte final tem que ser interpretado à luz
dos valores constitucionalmente tutelados, notadamente a proteçã o ao meio ambiente – art. 225 da
CF.

Entã o, repudiando essa interpretaçã o literal, que permitiria em tese a poluiçã o de á guas nã o
essenciais desde se possa e indenizar por isso, nó s temos o enunciado 244 do CJF – ainda que nã o se
tratem de á guas necessá rias à tutelada da vida, é vedada a poluiçã o das aguas, diversamente do que
aparentemente sugere a literalidade do art. 1291.

Os art. 1293 a 1296 preveem uma servidão legal de aqueduto.

(há alguns autores que usam a expressã o “servidã o legal” para designar direito de vizinhança)

Está associada ao atendimento das primeiras necessidades de vida. Entã o, se for para a tutela de
necessidades vitais, é possível que alguém exija a servidã o legal de aqueduto construindo canais
através de prédios alheios para receber essas aguas necessá rias à tutela da vida.

Enunciado 245 do CJF – diz que apesar do art. 1293 se referir apenas à preservaçã o à tutela das
primeiras necessidades de vida também aplicá vel a servidã o legal de aqueduto para o atendimento
das necessidades da agricultura e da indú stria, em homenagem à funçã o social da posse e da
propriedade.

 LIMITES ENTRE PRÉDIOS E DO DIREITO DE TAPAGEM


Em que consiste o direito de tapagem do proprietário?

É a faculdade de cercar, murar, valar ou tapar seu prédio – art. 1297 do CC.

O dispositivo ainda prevê a fixaçã o de limites entre os prédios – “demarcaçã o entre os dois prédios”
– um vizinho pode, inclusive, constranger o outro à estabelecer a fixaçã o de limites.

§ 1º  presunçã o relativa de copropriedade dos intervalos, muros, cercas e tapumes divisó rios.
Mas pode ser que a obra tenha sido custeada por apenas um deles, por isso trata-se de presunçã o
relativa, admitindo prova em contrá rio.

Como consequencia disso, o proprio caput prevê a repartiçao de gastos no exercicio do direito de
tapagem. Como se trata de copropriedade, é justificá vel que haja repartiçã o de custos, por exemplo,
para o levantamente de um muro.

A legislaçã o fala ainda aqui de tapumes, marcos divisó rias e muros de acordo com os costumes
locais. Entã o, se é uma area humilde e um dos vizinhos quer levantar um muro extretamente
suntuoso, caro, é possível constranger esse vizinho a arcar com os custos acrescidos em relaçã o ao
muro mais simples.

§ 3º  preve tapumes especiais para impedir a passagem de animais de pequeno porte. Nesse caso,
apenas aquele que tem a necessidade do tapume especial arca com as despesas decorrentes da sua
construçã o.

Associada a esse tema, nós temos a ação demarcatória no CPC – art. 946 a 949 do CC. (fazer
remissã o) – cabe tanto no caso de incerteza, como no caso de inexistência de limites entre os
prédios.

62
Nã o há como se confundir a demarcató ria com a reivindicató ria, porque a demarcató ria pressupõ e
a incerteza ou a indefiniçã o de limites entre prédios; já a reinvindicató ria pressupõ e a plena
indicaçã o de limites. Se um vizinho ultrapassa o marco divisó rio nítido do outro, aí sim cabível a
reivindicató ria ou até mesmo a possessó ria. A reivindicató ria pressupõ e a certeza de limites –
necessidade de título pré-constituído.

Veja que no contexto da açã o demarcató ria a definiçã o de vizinhança é mais restrita do as regras do
direito de vizinhança, porque para fins de açã o demarcató ria, o vizinho corresponde ao
proprietá rio confinante; nã o há repercussõ es mediatas no caso da açã o demarcató ria. A definiçã o
de vizinhança para fins de açã o demarcató ria é mais restrita.

Em relaçã o à legitimidade ativa da açã o demarcató ria, o CPC prevê apenas a legitimidade ativa para
o proprietá rio para açã o demarcató ria – art. 946, I, CPC.

CHAVES defende que também tem legitimidade ativa para açã o demarcató ria o titular de direito
real menor – ex.: usufrutuá rio; aplicaçã o por analogia do art. 934, I do CPC.

MARCO AURÉ LIO BEZERRA DE MELLO, minoritá rio nesse ponto, defende que é possível estender a
legitimidade ativa para açã o demarcató ria aos possuidores. Justificativa: para evitar autotutela e
em homenagem à teoria socioló gica da posse (a posse nã o é menos do que a propriedade) – posiçã o
isolada.

Não confundir o art. 946, I do CPC (prevê a ação demarcatória) com a chamada ação de
divisão – art. 946, II – a açã o de divisã o recai sobre um ú nico imó vel que é objeto de condomínio;
busca obrigar os condominos a repartir a coisa indivisa.

O art. 1298 prevê que no caso de conflito de limites entre prédios aplicáveis 04 critérios
sucessivos:

1) Título (deve-se investigar o que diz o título);


2) Critério da posse justa
3) Divisão em partes iguais
4) Adjudicação com indenização em favor do outro.

 DIREITO DE CONSTRUIR
Art. 1299 e ss. do CC.

Art. 1299  prevê dois limites ao direito de construir:

1) Regras de direito de vizinhança;


2) Regulamentos administrativos

Mas nó s ainda podemos ter outros limites ao direito de construir:

 Limites convencionais (por clá usulas contratuais);


 Limites pela funçã o social da propriedade – art. 5º a 8º da lei 10.257/01; art. 182 da CF;

Art. 1300  prevê que nã o se pode construir despejando agua sobre o prédio vizinho – é a
chamada vedação ao ESTILICÍDIO.

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Art. 1301  traz regras para construçã o que buscam tutelar a intimidade a vida privada. Além
disso, visa também evitar que objetos caiam de uma propriedade para outra. Esse “metro e meio” se
conta a partir da linha divisó ria.

Exceção ao caput trazida no § 2º: pequenas abertas para luz e ventilaçã o a mais de 02 metros de
altura de cada piso nã o entram nesse limite de metro e meio. Cuidado: se o sujeito faz 50 aberturas
dessas uma ao lado da outra nó s podemos ter um caso típico de fraude à lei – pois ele terá na
prá tica uma janela. A fraude à lei está prevista no art. 166, VI – causa de nulidade absoluta.

§ 1º  torna sem efeito a Súmula 414 do STF! Porque havia discussã o se a janela com visã o
oblíqua, ou seja, sem visã o direta sobre a linha divisó ria, também obdeceria ou nã o a esse limite de
metro e meio previsto no caput.

E aí a sú mula 414 do STF diz: “NÃO SE DISTINGUE A VISÃO DIRETA DA OBLÍQUA NA PROIBIÇÃO DE
ABRIR JANELA, OU FAZER TERRAÇO, EIRADO, OU VARANDA, A MENOS DE METRO E MEIO DO PRÉDIO
DE OUTREM.”

Entã o, a epoca do CC/16 a sú mula em vigor dizia que haveria o limite de metro e meio ainda que a
janela tivesse visã o oblíqua.

Só que agora temos regra específica no § 1º  menos de 75 centímetros.

Subsiste intacta a sú mula 120 do STF, admitindo a parede de tijolo de vidro translú cido a menos de
metro e meio. Exceçã o a regra do caput.

No caso de imóvel em zona rural tem regra específica: art. 1303 – prevê uma distancia
maior: 03 metros.

Art. 1302  prevê a chamada ação demolitória – se há a construçã o aqui de janela, terrena,
varanda, a menos de metro e meio, compete ao proprietá rio atingido por essa construçã o que
inobserva as regras do art. 1301 mover a açã o demolitó ria. Prazo decadencial de (ATÉ ) ano e dia
apó s a conclusã o da obra.

ATENÇÃO: A açã o demolitó ria se aplica no caso de obra já finda. Se a obra está em curso, aplicá vel a
açã o de nunciaçã o de obra nova – art. 934 a 946 do CPC.

No que tange à legitimidade passiva da açã o demolitó ria – STJ: entende que abrange nã o apenas o
proprietá rio, mas também o possuidor dono da obra – ex.: locató rio, usufrutuá rio. Aplicaçã o por
analogia das regras da açã o de nunciaçã o de obra nova.

 Obra em andamento  ação de nunciação de obra nova


 Obra já finda que viola as regras do art. 1301 até o prazo de ano e dia  ação
demolitória
 Ação de dano infecto (art. 1280)  obra já consumada, já velha, que se torna lesiva.

No caso de danos a vizinhos, oriundos da construçã o, a responsabilidade solidá ria se dá entre o


dono da obra e o construtor – art. 618 do CC; art. 14 e 17 do CDC; art. 942 do CC.

AULA 06

64
8. TEORIA GERAL DOS DIREITOS REAIS DE GARANTIA
À luz do art. 942 do CC o patrimonio do devedor, ressalvadas as exceçõ es legais (temos bens
impenhorá veis como na lei 8009/90; os arrolados no CPC), serve como instrumento de garantia
para satisfaçã o das obrigaçõ es.

No que tange à garantia, ela pode ser:

 Fidejussória ou pessoal
 Real

No caso da garantia fidejussó ria, nó s temos como exemplos típicos: fiança e aval – o patrimonio de
um terceiro que nã o o devedor serve como instrumento de garantia para a satisfaçã o da obrigaçã o.

A princípio, o patrimonio do terceiro como um todo, ressalvadas as exceçõ es legais, responde como
instrumento de garantia.

Já na garantia real, um determinado bem do devedor ou de um terceiro deixa de servir como


instrumento geral de garantia e passa a servir como instrumento de garantia específica de
determinada relaçã o jurídica. Logo, um determinado bem é separado do patrimô nio do seu titular,
fictamente, e passa a servir como instrumento específico de garantia em favor de determinada
relaçã o jurídica, em favor de um determinado credor.

É flagrante que a garantia real é um instrumento relevante para riscos em relaçã o à insolvência do
devedor, porque mesmo que haja a insolvência do devedor, o objeto da garantia real serve como
instrumento de satisfaçã o para interesses do credor titular da relaçã o jurídica contemplada com a
garantia real.

 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS DIREITOS REAIS DE GARANTIA:

1) NATUREZA ACESSÓRIA
É claro que a garantia real pressupõ e a existencia de uma obrigaçã o principal. Aplicá vel, assim, o
princípio da gravitaçã o jurídica. Entã o, é claro que o pagamento da dívida gera a extinçã o
automá tica da garantia real.

Exceção ao princípio da gravitação jurídica: art. 1487 do CC – prevê a constituiçã o de hipoteca


para a garantia de dívida futura; ou seja, é possível que haja a hipoteca antes mesmo do surgimento
da relaçã o obrigacional principal.

2) PUBLICIDADE
Que se dá através do registro. Com o registro, se legitima a oponibilidade erga omnes, porque a
partir do registro surge a presunçã o absoluta de conhecimento.

3) SEQUELA/AMBULATORIEDADE
A garantia real incide sobre o bem aonde quer que ele se encontre (acompanha o bem). O credor
nã o suporta qualquer risco diante da alienaçã o pelo devedor do bem objeto da garantia real, porque
a garantia real vai acompanhar o bem aonde quer que ele se encontre; o adquirente da coisa
surportará o ô nus de ser o seu bem excutido, caso haja o inadimplemento por parte de devedor.

65
Por isso, inclusive, regra geral, o credor com garantia real não tem legitimidade para
suscitar fraude contra credores. Ele nã o tem interesse, porque pela sequela ou ambulatoriedade
da hipoteca ele nã o tem qualquer interesse seu atingido pela alienaçã o do objeto da garantia real.
Art. 158 – prevê que só os credores quirografá rios podem suscitar a fraude contra credores.

O art. 158, § 1º diz que os credores com garantia real poderã o suscitar a fraude contra credores
quando a garantia se tornar insuficiente. É evidente que se a garantia real se torna insuficiente, em
relaçã o à parte nã o abrangida pela garantia real, ele se torna credor quirografá rio.

A sequela ou ambulatoriedade das garantias reais é reforçada na redaçã o do art. 1419 do CC


quando se refere à “vínculo real”, porque sã o um desdobramento natural da oponibilidade erga
omnes dos direitos reais.

Temos duas exceções em relação à sequela ou ambulatoriedade:

a) Hipótese de aquisição originária de propriedade: o STJ vem se posicionando no sentido


de que diante da usucapiã o, diante da aquisiçã o originá ria, caem eventuais direitos reais
eventualmente incidentes sobre a coisa. Ex.: usucapiã o sobre imó vel hipotecado – a
usucapiã o desconstitui a hipoteca por se tratar de aquisiçã o originá ria. A aquisiçã o
originá ria propicia o surgimento de um direito novo, desvinculado das características
anteriores. Entã o, a sequela só se aplica diante de aquisiçã o derivada e nã o originá ria.

Mas será que o credor hipotecá rio tem que assistir passivamente à consumaçã o da usucapiã o?
Porque é evidente que nesse caso o credor hipotecá rio, com a queda da hipoteca, passa a ser credor
quirografá rio.

Na verdade, nã o! A consumaçã o da usucapiã o pressupõ e nã o apenas a inércia do proprietá rio, mas


também a inércia do credor hipotecá rio. O credor hipotecá rio pode se insurgir e interromper o
prazo de usucapiã o. O art. 1244 c/c art. 203 nos conduz a essa afirmativa, porque o art. 1244 diz
que as regras sobre impedimento, suspensã o e interrupçã o da prescriçã o se aplicam a usucapiã o. E
o art. 203 diz que a prescriçã o pode ser interrompida por qualquer interessado.

Logo, se a prescriçã o pode, a usucapiao também pode ser interrompida por qualquer interessado. E
quem seria aqui um terceiro interessado para interromper o prazo de usucapiã o? O credor
hipotecá rio – eventual titular do direito real incidente sobre o imó vel em vias de ser usucapido –
aquisiçã o originá ria.

b) Súmula 308 do STJ:

“A HIPOTECA FIRMADA ENTRE A CONSTRUTORA E O AGENTE FINANCEIRO,


ANTERIOR OU POSTERIOR À CELEBRAÇÃO DA PROMESSA DE COMPRA E
VENDA, NÃO TEM EFICÁCIA PERANTE OS ADQUIRENTES DO IMÓVEL.”

O que ocorre aqui? A construtora precisa de recursos para levantar o edifício. Para obter esses
recursos ela celebra um contrato de mú tuo com a instituiçã o financeira e oferece como garantia
real ao cumprimento desse contrato de mú tuo o proprio imó vel em vias de ser edificado. A obra
avança e a construtora vai celebrando promessas de compra e venda com particulares em relaçã o
aos apartamentos, unidades autô nomas.

Chega um determinado momento e a construtora se torna inadimplente perante a instituiçã o


financeira. Pela regra geral, a instituiçã o financeira titular de garantia real de hipoteca poderia

66
atingir os promitentes compradores das unidades autô nomas, porque a hipoteca é dotada de
sequela, de ambulatoriedade.

Mas a sú mula 308 do STJ diz que nã o! Diz que essa hipoteca firmada entre a construtora e a
instituiçã o financeira nã o é oponível aos promitentes compradores das unidades autô nomas. É uma
mitigaçã o à sequela ou ambulatoriedade da hipoteca, que se justifica pela funçã o social do contrato.

Alias, o STJ vem restringindo a aplicaçã o da sú mula à imó veis residenciais. RESP 427.410. É a
funçã o social, através da tutela do direito social de moradia.

4) PREFERÊNCIA (art. 1422)


O art. 1422 prevê a preferência do titular da garantia real em relaçã o a outros credores no que
tange à excussã o do bem objeto da garantia real.

Como exceção à preferência das garantias reais, nós temos os chamados PRIVILÉGIOS
(LEGAIS). Os privilégios sã o genericamente previstos no CC nos art. 1422, pará grafo ú nico e art.
958. Qual é a singularidade desses privilégios?

 Eles resultam da lei, sã o preferencias legais;


 Recaem sobre relaçõ es tidas pelo legislador como socialmente importantes (créditos
socialmente relevantes – ex.: créditos trabalhistas, créditos previdenciarios, créditos fiscais,
custas do processo de insolvência); vejam que as garantias reais independem da natureza
do crédito ou da natureza da relaçã o, porque em geral as garantias reais resultam do acordo
de vontades.
 Permitem essa preferência legal em favor de determinados credores e na realidade esses
privilégios recaem sobre todo o patrimô nio do devedor (ressalvadas as exceçõ es legais,
como os bens de família), incluindo o bem objeto da garantia real.

5) EXCUSSÃO
Pela excussã o, o titular da garantia real nã o tem direito a ficar com a coisa devida; ele tem direito à
alienaçã o do bem e o recebimento do crédito com o produto da alienaçã o do bem objeto da garantia
real.

Exceção à excussão: anticrese – art. 1423 do CC – na anticrese não há excussão; o credor


anticrético nã o recebe o seu direito de crédito através do produto da alienaçã o do bem objeto da
garantia real.

Na verdade, o credor anticrético vai receber o que lhe é devido através da percepção dos
frutos do bem que será por ele retido até a satisfação da dívida, observado o prazo máximo
de 15 anos.

Logo, o recebimento pelo credor anticrético nã o se dá pela excussã o e sim pela percepçã o dos
frutos no decorrer do tempo.

OBS.: Em regra, a excussão deve ser judicial; ou seja, a alienação do bem deve ser judicial.

Exceções (hipóteses em que se permite alienação extrajudicial do bem):

 Hipotecas constituídas no âmbito do sistema financeiro nacional – DL 70/66;


 Penhor – art. 1433, IV

67
 Propriedade fiduciá ria – art. 1364 do CC; e em relaçã o à alienaçã o fiduciá ria de imó veis –
art. 27 da Lei 9514/97

Art. 1428 do CC  contempla a chamada NULIDADE DA CLÁUSULA COMISSÓRIA – eventual


clausula contratual inserida em contratos de penhor e hipoteca que permita ao credor de antemã o
ficar com o objeto da garantia real no caso de inadimplemento do devedor, essa clá usula é tida
como nula!

O objetivo da regra é resguardar a livre manifestaçã o de vontade do devedor. Em regra, o devedor


que consente na constituiçã o de uma garantia real está em situaçã o de inferioridade em relaçã o ao
credor; e aí o credor sempre imporia ao devedor a clá usula comissó ria. Entã o, a característica geral
da excussã o nã o confere ao credor o direito de ficar com a coisa. Na verdade, a excussã o consiste na
possibilidade do credor alienar o bem e com o produto da alienaçã o receber o que lhe é devido.

Parágrafo único do art. 1428  prevê que a impossibilidade de cláusula comissória não é
óbice à dação em pagamento – art. 356 a 359 do CC. Depois de vencida a dívida, poderá o devedor
dar a coisa em pagamento.

Logo, é nula a clá usula comissó ria, porque ela pré-autoriza, desde a celebraçã o do contrato, o
credor a ficar com o objeto da garantia real, caso haja inadimplemento. Isso porque no momento da
celebraçã o do contrato o devedor se encontra em posiçã o de inferioridade. Mas, uma vez celebrado
o contrato, e uma vez vencida a dívida, pode o devedor, com o consentimento do credor, se eximir,
entregando prestaçã o diversa da devida – daçã o em pagamento. E nada impede que esta prestaçã o
diversa da devida seja inclusive o objeto da garantia real. Mas nesse caso a manifestaçã o de vontade
do devedor é livre e consciente. Portanto, a nulidade da cláusula comissória não impede a
dação em pagamento, desde que haja já o vencimento da dívida.

6) INDIVISIBILIDADE (art. 1421)


A indivisibilidade da garantia real goza de presunçã o relativa, ou seja, a regra é dispositiva – podem
as partes ajustar diversamente.

Vamos imaginar que o sujeito tem uma dívida de 600 mil reais e para garantir a satisfaçã o dessa
dívida ele constitui hipoteca sobre 03 imó veis e cada um deles vale aproximadamente 200 mil – a
garantia equivaleria a 600 mil reais. Vamos imaginar que o sujeito já tenha pago 400 mil reais. O
que o art. 1421 diz é que, salvo acordo em contrá rio, em que pese o pagamento parcial de 400 mil, a
hipoteca vai continuar incidindo sobre os tres imó veis. Quer dizer, o devedor não pode exigir a
extinção parcial da garantia real na proporção dos pagamentos efetuados. Na realidade, a
garantia real permanece integral, enquanto nã o houver a satisfaçã o integral da dívida.

Mas, em se tratando de regra dispositiva, podem as partes pactuarem de modo contrário.

OBS.: É sustentável que indivisibilidade da garantia real possa ser mitigada diante da teoria
do adimplemento substancial. Imaginem a dívida de 600 mil; hipoteca sobre 3 imó veis, cada um
deles vale 200 mil; e o sujeito já pagou 598 mil reais e o credor insiste em manter a garantia real
sobre os três imó veis hipotecados, com base no art. 1421 do CC.

É possível sustentar que neste caso excepcionalmente a teoria do adimplemento substancial possa
mitigar a indivisibilidade da garantia real e com isso afirmarmos que o credor que insiste na
subsistência da hipoteca sobre os tres imó veis, diante do adimplemento substancial, incorre em
abuso do direito. (tema controvertido)

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7) ESPECIALIZAÇÃO
A garantia real estabelece a vinculaçã o de determinado bem em relaçã o a determinada obrigaçã o.
Aquele bem deixa de ser instrumento de garantia geral e passa a ser um instrumento de garantia
específica em favor de determinada relaçã o jurídica.

Então, especialização, na realidade, busca a pormenorizar a coisa, detalhar a coisa objeto da


garantia real, com seu valor, juros (se houver) e prazo para o pagamento.

Está genericamente prevista no art. 1424 – traz requisitos formais de eficá cia da garantia real.

O CC/16 no art. 761 dizia que deveriam ser observados esses requisitos sob pena de ineficácia da
garantia real perante terceiros. O CC atual nã o; se restrige a dizer “sob pena de nã o terem eficácia” –
ele nã o especifica que sua inobservancia acarretaria ineficácia apenas perante terceiros. Em que
pese o silencio do CC atual a maioria das autores defende que a soluçã o a ser adotada é a mesma
prevista pelo CC antigo. Na realidade, esse dispositivo contempla requisitos formais de eficácia da
garantia real perante terceiros de boa-fé – terceiros que ignorem a existencia da garantia real.
Entã o, ainda que inobservados os requisitos formais do art. 1424 a garantia real vai ter eficácia
interpartes, entre os contratantes originá rios; a ineficácia seria apenas perante terceiros.

AFONSO FRAGA diz que é preciso que haja a observancia dos requisitos formais para que haja a
eficá cia da garantia real em relaçã o a terceiros que tenham algum título sobre o bem. Imaginemos
que haja um credor com garantia real sem a observancia dos requisitos formais do art. 1424 do CC.
Haveria ineficá cia da garantia real nesse caso perante terceiros. Só que o terceiro é um usurpador
do imó vel, é um esbulhador. É evidente que esse credor hipotecá rio pode se insurgir em face do
esbulho praticado por esse terceiro, porque ele é terceiro de má-fé, desprovido de qualquer título
sobre o bem.

Entã o, essa ineficá cia da garantia real perante terceiros vale apenas em relaçã o a terceiros que
tenham um título sobre a coisa – ex.: usufrutá rio – se se constitui um usufruto apó s uma garantia
real que inobserva os requisitos formais do art. 1424, a princípio o usufruto vai preponderar
perante a garantia real, porque essa garantia real nã o tem eficá cia perante o terceiro usufrutuá rio
que já tinha um título sobre a coisa. Mas nã o se aplica, por exemplo, no caso de esbulho; o
esbulhador vai sucumbir diante do credor hipotecá rio, ainda que inobservados os requisitos
formais do art. 1424 do CC.

Remissã o do art. 1424, I “valor má ximo” para o art. 1487 do CC – essa exigencia de valor má ximo
vale para hipó tese de hipoteca de dívida futura (exceçã o ao princípio da gravitaçã o jurídica).

O art. 1420 prevê que só pode constituir garantia real aquele que pode alienar. Entã o, nã o se
exige apenas a capacidade de fato para constituir garantia real; além da capacidade de fato é
preciso que aquele que constitui a garantia real tenha a possibilidade de alienar.

Isso faz sentido porque com a constituiçã o da garantia real há quase que um pontapé inicial a um
procedimento de alienaçã o, porque no caso de inadimplemento do devedor haverá excussã o do
bem – alienaçã o coativa, forçada da coisa. Entã o, é evidente que de nada adiantaria a garantia real
se nã o for possível a excussã o do bem e a excussã o pressupõ e a alienaçã o. Entã o, só é possivel
constituir garantia real por parte daqueles que tem a faculdade de alienaçã o.

Em relaçã o aos incapazes, há de se observar o art. 1691 – tem que ter autorizaçã o judicial,
intervençã o do MP.

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Em relaçã o aos conjuges, art. 1647, I – em regra, se exige o consentimento do conjuge, salvo regime
de separaçã o absoluta.

Em relaçã o a uniã o está vel o tema é controvertido. Há quem defenda que se aplica à uniã o está vel a
mesma disposiçã o relativa a casamento por analogia, por força do art. 226, § 3º da CF – é
modalidade família tal qual o casamento. Logo, haveria necessidade de outorga do companheiro
para constituiçã o de direito real de garantia.

Mas por outro lado, a uniã o está vel é ato nã o solene, desprovido de publicidade, o que a diferencia
do casamento. Entã o, a exigencia de outorga do companheiro, diante da ausencia de publicidade,
diante da ausencia de formalidade, abalaria a legítima expectativa de terceiros, porque os terceiros
credores que obtêm a garantia real de um dos companheiros nã o necessariamente tem
conhecimento da existencia da uniã o está vel. E a possibilidade do companheiro invalidar as
garantias reais abalaria a legítima expectativa de terceiros credores de boa-fé.

Entã o, a tendência (há julgado do STJ sobre o tema) é no sentido de, em regra, nã o exigir a outorga
do companheiro no caso de uniã o está vel sob pena de abalo à segurança das relaçõ es jurídicas,
SALVO se há averbaçã o no registro quanto à existencia de uniao está vel. Estando averbada no
registro de imó veis, para que haja hipoteca sobre aquele imó vel, aí sim se exige a outorga do
companheiro. Isso para que terceiros tenham ciência da existência da uniã o está vel. É uma
interpretaçã o que visa a tutela da legítima expectativa de terceiros; à luz da boa-fé objetiva.

Existem algumas questões na jurisprudencia, por exemplo, de hipotecas firmadas por sócio
gerente que não tem poderes para constituir garantia real. Uma pessoa juridica constitui uma
hipoteca sobre um determinaod bem que é de sua titularidade e esssa hipoteca foi constituída
através de um ato do só cio gerente que nã o tem poderes para conceder sozinho a hipoteca sobre o
bem da PJ.

RESP 704.546 – O STJ aqui aplicou a teoria da aparencia – pela teoria da aparencia, aquele só cio
gerente aparentemente tinha poderes para tal; mas na realidade nã o tinha diante da analise dos
atos internos da pessoa jurídica. Entã o, a teoria da aparencia aqui protegeria a legítima expectativa
do terceiro credor que consentiu com a constituiçã o da hipoteca firmada apenas pelo só cio gerente,
ainda que ele nã o tivesse poderes para isso.

Além da teoria da aparencia, o STJ nesse caso afirmou que aquela garantia real constituída pelo
só cio gerente acabou beneficiando a pessoa jurídica e os demais só cios. Entã o, nã o poderia os
demais só cios se beneficiarem daquela hipoteca e suscitar a sua invalidade por ausencia de poderes
do só cio gerente. Isso violaria a boa-fé objetiva. O STJ nesse caso chancelou a hipoteca firmada por
quem nã o tinha poderes para isso.

Em relação ao objeto da garantia, o penhor recai sobre bens móveis e a hipoteca sobre bens
imóveis – e além dos imó veis, também navios e aeronaves (art. 1473, VI e VII). Navios e aeronaves
nã o sã o bens imó veis! Sã o bens moveis, excepcionalmente passíveis de hipoteca. O fato de caber
hipoteca sobre navio e aeronave nã o desnatura esses bens como sendo mó veis.

Os bens passíveis de hipoteca estão arrolados no art. 1473 do CC.

O art. 1420 deixa claro que apenas os bens alienáveis podem ser dados em garantia real. Se o
bem nã o pudesse ser alienado, haveria frustraçã o da garantia real.

Não cabe garantia real sobre:

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 Bem público;
 Bem gravado com cláusula de inalienabilidade;

Da mesma forma é ineficaz o penhor sobre bens furtados.

Art. 1268  em regra, o penhor sobre bens furtados nã o produz efeitos, porque o verdadeiro
proprietá rio vítima do furto vai poder reivindicar o bem em face do credor pignoratício, já que foi
vítima de furto. Entã o, se alguém oferece em penhor um veículo furtado, a vítima do furto vai poder
reaver o bem, inclusive em face do credor pignoratício. E também em face de eventual terceiro
arrematante, no caso de inadimplemento da dívida.

Só que o art. 1268 traz uma exceção a essa regra geral: se por ventura aquele bem furtado foi
adquirido em leilã o ou estabelecimento comercial, em que pese o furto, a alienaçã o a non domino
vai transferir efetivamente a propriedade. Entã o, aquele terceiro que adquiriu o veículo furtado em
leilã o ou estabelecimento comercial vai poder constituir o penhor sobre aquele veículo. Esse artigo
faz com que aquela aquisiçã o à luz da teoria da aparencia venha a chancelar a alienaçã o a non
domino de propriedade. E como verdadeiro proprietá rio que agora é, ele vai poder constituir a
garantia real.

O art. 1420, § 1º prevê a PÓS-EFICACIZAÇÃO DA GARANTIA REAL. Imaginemos alguém que nã o


é dono que conceda garantia real sobre determinado bem – concessã o a non domino de garantia
real. Só que duas semanas depois ele vem a adquirir a propriedade sobre aquele bem. Essa
aquisiçã o superveniente da propriedade por aquele que havia concedido a non domino vai produzir
efeitos ex tunc, retroativos. Ou seja, haverá a pó s-eficacizaçã o da garantia real que havia sido
concedida a non domino.

Imaginem um filho que conceda em garantia real um determinado bem mó vel em favor de um
terceiro que pertença ao pai. O bem nã o pertence ao filho devedor, mas sim ao pai – a concessã o a
non domino da garantia real é ineficaz. E aí vamos supor que posteriormente a essa concessã o a
non domino o pai falece e o ú nico herdeiro é o filho. Há uma aquisiçã o superveniente da
propriedade pelo filho em virtude de direito sucessó rio. Essa aquisiçã o superveniente produz
efeitos retroativos, confirmando aquela garantia real que havia sido concedida a non domino. Nesse
caso a aquisiçã o superveniente da propriedade produz efeitos ex tunc para fins de pó s-eficacizar a
garantia real concedida a non domino.

Esse dispositivo – art. 1420, § 1º do CC – vem em sintonia com o art. 1268, § 1º do CC (trata da pó s-
eficacizaçã o da tradiçã o) – fazer remissã o.

Art. 1420, § 2º  prevê a constituição de garantia real sobre bem objeto de condomínio. Se
há condomonio há uma copropriedade sobre o bem. Cada coproprietá rio exerce a propriedade
sobre uma determinada cota ideal. Entã o, é evidente que o titular de uma cota ideal só pode
constituir garantia real sobre a sua respectiva cota ideal. Ninguém pode constituir garantia real
sobre um bem que nã o lhe pertence.

Remissã o para o art. 504 do CC – prevê na sistemá tica do contrato de compra e venda o direito de
preferencia do condô mino (esse direito de preferencia tem natureza real, é oponível em face do
terceiro; o condomino preterido pode reaver o bem do terceiro). É preciso interpretar o art. 1420, §
2º que prevê que cada um dos condominos pode conceder sua cota ideal em garantia real, com esse
direito de preferencia dos demais condominos.

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Numa interpretaçã o sistemá tica, qual é a conclusã o da jurisprudencia? Cada um dos condominos
pode conceder garantia real sobre a sua cota ideal; no caso de inadimplemento haverá excussã o
judicial ou extrajudicial sobre a cota ideal. Só que é requisito geral de validade para a hasta pú blica
da cota ideal que haja a prévia intimaçã o dos demais condominos – é requisito legal de eficá cia para
a excussã o da cota ideal do condomino inadimplente! É requisito para que se oportunize aos
demais condominos o exercicio do direito de preferencia (art. 504). RESP 229.247.

Em relação à remição da garantia real, nós temos o art. 1429 do CC.

Em que consiste a remiçã o da garantia real? É a liberaçã o da coisa gravada em virtude do


pagamento da dívida.

O art. 1429 afirma que os sucessores do devedor nã o podem remir parcialmente a garantia real na
proporçã o dos seus quinhõ es. Na verdade, essa impossibilidade dos sucessores remirem
parcialmente a garantia real na proporçã o dos seus quinhõ es é uma decorrencia da indivisibilidade
da garantia real. Remissã o para o art. 1421 do CC – entã o, se um devedor deixa lá dois herdeiros,
nã o pode o H1 remir apenas 50% da garantia real por conta da indivisibilidade da garantia real. A
garantia real permanece intacta enquanto nã o houver o pagamento integral da dívida.

Nó s já vimos que o indivisibilidade da garantia, porém, se aplica na ausencia de acordo em


contrá rio – trata-se presunçã o relativa. Entã o, no silencio do contrato, indivisibilidade da garantia
real e pelo art. 1429 nã o admite a remiçã o parcial.

A contrá rio senso, se a indivisibilidade da garantia real pode ser afastada pela vontade das partes,
nesse caso em que as partes afastam a indivisibilidade, também cai a incidencia do art. 1429 –
podem os sucessores, entã o, remir parcialmente a dívida. Mas isso pressupoe explicita
manifestaçã o de vontade. Na ausencia de explicita manifestaçao de vontade  indivisibilidade e
consequentemente impossibilidade de remiçã o parcial pelos sucessores.

Em relação ao vencimento antecipado da dívida, o CC traz as hipóteses de vencimento


antecipado no art. 1425. Remissã o para o art. 333 do CC (lá nó s temos na teoria geral das
obrigaçõ es também hipotese de vencimento antecipado da dívida).

Art. 1.425. A dívida considera-se vencida:

I - se, deteriorando-se, ou depreciando-se o bem dado em segurança, desfalcar a


garantia, e o devedor, intimado, não a reforçar ou substituir;  É preciso a
propositura de ação judicial para comprovar a necessidade do reforço da
garantia. Essa insuficiencia da garantia aqui pressupõ e uma insuficiente
superveniente da garantia real. Remissã o para o art. 158, § 1º (prevê que nesse
caso o credor além de exigir o reforço da garantia e consequentemente o
vencimento antecipado da dívida, ele vai poder suscitar a fraude contra credores)

II - se o devedor cair em insolvência ou falir;  pressupoe decisão judicial

III - se as prestações não forem pontualmente pagas, toda vez que deste modo se
achar estipulado o pagamento. Neste caso, o recebimento posterior da prestação
atrasada importa renúncia do credor ao seu direito de execução imediata ; 
impontualidade no pagamento pelo devedor. Se o credor recebe tardiamente
sem ressalva ele abre mã o da possibilidade de execuçã o imediata.

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IV - se perecer o bem dado em garantia, e não for substituído;  perecimento do
bem dado em garantia, desde que ele não seja substituído. OBS.: no penhor,
em regra, o bem fica com a posse direta do credor pignoratício; a dú vida é: e se é
o proprio credor quem dá causa ao perecimento do bem objeto da garantia? Será
que é possível falar em vencimento antecipado? Esse inciso parte da premissa de
que quem deu causa ao perecimento é o devedor. JUDITH MARTINS COSTA
defende que nã o! Nesse caso, nã o cabe ao credor exigir o vencimento antecipado
sob pena de venire contra factum proprium.

Remissã o para o § 1º que prevê a subrrogaçã o da garantia em eventual


indenizaçã o do seguro ou no ressarcimento de dano

V - se se desapropriar o bem dado em garantia, hipótese na qual se depositará a


parte do preço que for necessária para o pagamento integral do credor. 
desapropriação do bem dado em garantia. Haverá aqui o pagamento da dívida
com o valor objeto da indenizaçã o. Entã o, nã o há uma substituiçã o de ô nus. A
indenizaçã o já será direcionada ao pagamento imediato da dívida e com isso
haverá a propria extinçã o da garantia real.

O art. 1426 prevê que nas hipó teses de vencimento antecipado da dívida nã o se compreendem os
juros correspondentes ao tempo ainda nã o decorrido. Os juros remuneratórios vincendos não
incidem no caso de vencimento antecipado da dívida; só vao recair os juros até o momento
do vencimento antecipado. A incidencia de juros remunerató rios vincendos geraria
enriquecimento sem causa para o credor. Remissã o ao art. 885 do CC – que preve o enriquecimento
sem causa por fato superveniente. O fato superveniente aqui é o vencimento antecipado da dívida.

O art. 1427 prevê que se é um terceiro que oferece a garantia real, esse terceiro não é
obrigado a reforçar ou a substituir a garantia. O terceiro que oferece a garantia real nã o é
codevedor ou fiador. Como o terceiro aqui nã o responde com seu patrimonio, mas apenas em
relaçã o à quele bem objeto da garantia real, eventual depreciaçã o ou deterioraçã o daquela coisa
sem culpa sua nã o obriga esse terceiro a reforçar ou substituir a garantia real, pela propria
característica da garantia real, que se difere da garantia pessoal ou fidejussó ria.

Neste caso, essa obrigatoriedade de reforço ou substituiçã o vai recair sobre o devedor. O devedor
vai ser intimado a reforçar ou substituir a garantia real prestada pelo terceiro – aplicá vel o art.
1425, I do CC – se o devedor nã o reforça ou substitui haverá o vencimetno antecipado da dívida em
face do devedor.

FIM

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