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Direitos Reais II - Prof.

Felipe Palhano

 Noções de Direitos Reais

1) Direitos Existenciais: são direitos da personalidade


2) Direitos Patrimoniais: se dividem em direitos obrigacionais e direitos reais.

Obs.: Alguns autores têm defendido que os direitos reais devem ser vistos também sob o
aspecto existencial, vez que a propriedade promove direitos da personalidade. Ex.:
Quem é proprietário de um imóvel (moradia) tem o resguardo de sua privacidade,
integridade física, saúde, etc. Só imaginar: quem mora numa rua e quem mora numa
casa, quem tem seus direitos existenciais mais protegidos?

 Conceito: “O direito real consiste no poder jurídico, direito e imediato do titular


sobre a coisa, com exclusividade e contra todos. No polo passivo, incluem-se os
membros da coletividade, pois todos devem abster-se de qualquer atitude que
possa turbar o direito do titular. No instante em que alguém viola esse dever, o
sujeito passivo, que era indeterminando, torna-se determinado.” (Carlos Roberto
Gonçalves, p. 109)

 Características

1) Eficácia: Os direitos reais possuem eficácia erga omnes, enquanto os direitos


obrigacionais possuem eficácia entre as partes (inter partes).

2) Rol taxativo: os direitos reais são enumerados no art. 1.225 do CC. O CC/02
excluiu a enfiteuse e a constituição de renda sobre imóvel, que constavam da
codificação de 1916, e incluiu o direito de superfície e o direito do promitente
comprador do imóvel.

3) Direitos absolutos: oponíveis à coletividade. O objeto da relação entre o titular


do direito real e a coletividade é o dever geral de abstenção. Havendo violação a
tal dever nascerá a pretensão do titular de impedir a agressão, ter seus prejuízos
ressarcidos, etc.

Obs.: Nenhum direito é absoluto no sentido de que pode ser exercido sempre e de
qualquer maneira. Quando o direito absoluto é exercido de forma abusiva, não haverá
proteção.

4) Direito de sequela: o titular do direito real tem o poder de perseguir a coisa,


reavendo-a de quem quer que injustamente a possua ou a detenha.

Exemplo: João pegou $ emprestado no banco e concedeu seu apartamento em garantia,


por meio de hipoteca. Se João vender seu imóvel para Maria, e não pagar a dívida com
o banco, este poderá alienar o imóvel para pagamento da dívida, mesmo que o imóvel
não mais esteja com o devedor. Diz-se que os direitos obrigacionais não possuem direito
de sequela.

5) Caráter atributivo: o titular não depende da colaboração de ninguém para exercer


os poderes inerentes ao direito real.
 Aquisição dos direitos reais
Os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou transmitidos por ato inter
vivos, em regra só se adquirem com a tradição. Exemplo de exceção: usucapião. A
sentença declaratória da usucapião transfere a propriedade automaticamente.

Já os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos inter vivos, em
regra só se adquirem com o registro no RGI. Exemplo de exceções: avulsão, usucapião,
comunicação de bens por celebração de casamento. Antes da tradição ou registro existe
apenas um direito obrigacional (mas não real).

 Poderes (ou faculdades) inerentes à propriedade

No direito de propriedade, o titular detém consigo todos os poderes inerentes à


propriedade: usar, fruir, dispor e reaver de quem quer que a injustamente possua ou
detenha.

Usar: poder de utilizar a coisa ou mantê-la a sua disposição, sem alterar a sua
substância. Ex.: O titular usa o imóvel quando mora nele ou o mantém em seu poder.

Fruir (= gozar): poder de extrair benefícios econômicos da coisa (frutos e produtos). Os


frutos possuem capacidade de renovação periódica, já os produtos, quando retirados,
esgotam o principal (ex.: ouro e prata).

Dispor: poder de decidir quanto ao destino a ser dado à coisa: alienar totalmente
(vender, doar), alienar parcialmente (instituir servidão, usufruto, etc), abandonar e
inclusive destruir.

Reivindicar: poder de reaver a coisa de quem quer que injustamente a possua ou


detenha.

Quando todos esses poderes se acham reunidos em uma só pessoa, diz-se que ela é
titular da propriedade plena. O proprietário, no entanto, pode transferir algum ou alguns
dos poderes a um terceiro. Nesse caso, a propriedade passa a ser limitada. Assim, por
exemplo, no usufruto: o usufrutuário recebe os poderes de usar e fruir da coisa,
enquanto o nu-proprietário permanece com os poderes de reivindicar e dispor.

 Direitos reais sobre coisa alheia

A propriedade se classifica como direito real sobre coisa própria. Já os demais direitos
reais se estabelecem na coisa alheia, onerando ou limitando o direito do respectivo
dono. Podem ser divididos, didaticamente em:

1) Direitos reais de fruição: proporcionam o aproveitamento de utilidades materiais


em bem alheio. Ex.: superfície, servidão, usufruto, uso, habitação, concessão de
uso especial para fins de moradia, a concessão de direito real de uso, direito de
laje.

2) Direitos reais de garantia: vinculam bem alheio à satisfação de um direito de


crédito. Ex.: penhor, hipoteca, anticrese.
3) Direitos reais de aquisição: buscam proteger o direito do titular em tornar-se
proprietário de um bem alheio. Ex.: direito do promitente comprador do imóvel.

 Superfície (arts. 1369 a 1377, CC)

Origem

O instituto possui raízes no Direito Romano.

Conceito

Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar


em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente
registrada no Cartório de Registro de Imóveis.

De acordo com o Código Civil, o direito de superfície é um direito real, por meio do
direito do qual o proprietário (fundeiro, fundieiro ou concedente) transfere a outrem
(superficiário ou concessionário), por tempo determinado, o direito de construir ou
plantar em seu terreno mediante escritura pública registrada no RGI.

Na superfície, há a instituição de dois patrimônios autônomos: o solo e a superfície. Por


isso, alguns autores defendem que não há propriamente um desdobramento dos poderes
dominiais, mas sim a criação de duas propriedades autônomas.

Utilidade prática: Allianz Park – Palmeiras (fundeiro/fundieiro/concedente) concedeu a


uma empresa o direito de construir e utilizar o estádio durante 30 anos. O benefício do
clube é que ao final do contrato ele recebe a superfície de volta com todas as
construções e plantações existentes. Para a superficiária a vantagem é a construção do
estágio e a obtenção de lucro na administração desse estádio.

Código de 2002 e Estatuto da cidade (Lei 10.257/2001)

Enunciado 39, CJF/STJ: “As normas previstas no CC sobre o direito de superfície não
revogam as relativas a direito superfície constantes no Estatuto da Cidade por ser
nstrumento de política de desenvolvimento urbano.

Norma geral posterior não revogaria norma especial anterior:

LINDB, Art. 2º, §2º: “A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par
das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior”.

Direito de superfície no CC/02 x Direito de Superfície no Estatuto da Cidade:


Características

 Superficiário pode construir e/ou plantar.


 Pelo CC/02, deve ser por prazo determinado (art. 1.370, CC)
 Pode ser gratuita ou onerosa (a remuneração denomina-se solarium ou cânon) –
art. 1.370, CC
 O fundeiro pode transferir o direito de superfície (art. 1373, CC)
 Mitiga (ou suspende a eficácia) dos efeitos da teoria das acessões (ar. 1253, CC):
durante a vigência do direito de superfície, a propriedade das construções e
plantações pertencerão ao superficário.

Obs. 1: Muitas vezes o fundeiro pode instituir de forma gratuita a superfície, com o
benefício de aquisição ao final da concessão, sem pagamento de indenização, das
construções e plantações que o superficiário tiver feito em seu terreno.

Obs. 2: Mitigação dos efeitos da teoria das acessões (ou principialidade do solo): a regra
é a de que toda construção ou plantação existente em um terreno presume-se (presunção
relativa) feita pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário. (art. 1.253,
CC). Na superfície, todavia, a presunção é a inversa, ou seja, de que as plantações e
construções foram realizadas pelo superficiário.

Fundamento

Facilitar o cumprimento da função social da propriedade.

É comum prever em um contrato de superfície que o superficiário construa coisas em


seu terreno. Então, o proprietário tem interesse em obter proveito em conceder seu
terreno ao superficiário.

Exemplo: Pessoas que possuem um terreno, mas não tem dinheiro para construir no
mesmo, podem permitir que outro construa e usufrua da superfície por um determinado
período de tempo.

Finalidade
As partes podem instituir a superfície com vistas a uma finalidade específica. Ex.:
plantação de laranja, construção de uma garagem ou estádio de futebol.

Havendo uma finalidade definida no título constitutivo, o superficiário deve obedecer ao


estipulado, sob pena de o fundeiro promover a extinção do direito de superfície (art.
1.374, CC).

Se não for prevista finalidade, o superficiário é livre para exercer os seus direitos para
qualquer fim legítimo.

Constituição (deve haver registro na matrícula do imóvel no RGI)

A lei prevê apenas o contrato (gratuito ou oneroso), na forma de escritura pública, como
forma de se constituir a superfície.

Obs.: Alguns autores defendem que poderia ser constituída também por testamento e
por usucapião.

Tributos e encargos relativos ao imóvel

Art. 1.371. O superficiário responderá pelos encargos e tributos que incidirem sobre o
imóvel.

A lei prevê que o superficiário responde pelos encargos e tributos que incidirem sobre o
imóvel: tanto relacionados à superfície quanto ao solo. Ex.: cota condominial, IPTU,
ITR.

Entende-se que as partes podem prever de forma diversa. Nesse sentido, o Enunciado n.
94 do CJF/STJ: “as partes têm plena liberdade para deliberar, no contrato respectivo,
sobre o rateio dos encargos e tributos que incidirão sobre a área objeto da concessão do
direito de superfície”.

Transmissão do direito de superfície

Art. 1.372. O direito de superfície pode transferir-se a terceiros e, por morte do


superficiário, aos seus herdeiros.

Parágrafo único. Não poderá ser estipulado pelo concedente, a nenhum título, qualquer
pagamento pela transferência.

O direito de superfície pode transferir-se a terceiros e, por morte do superficiário, aos


seus herdeiros. Afinal, a propriedade superficiária, recaindo sobre bem jurídico
independente, afigura-se propriedade autônoma.

Direito de preferência

Art. 1.373. Em caso de alienação do imóvel ou do direito de superfície, o superficiário


ou o proprietário tem direito de preferência, em igualdade de condições.
Em caso de alienação do terreno, o superficiário tem direito de preferência, em
igualdade de condições.

Já em caso de alienação do direito de superfície, o proprietário (fundeiro) tem direito de


preferência, em igualdade de condições.

Obs.: Parte da doutrina ressalta que “o direito de preferência não se aplica quando a
transmissão for gratuita ou tiver por objeto a permuta por bens infungíveis, uma vez que
nessas hipóteses não se mostra viável igualar a oferta do adquirente” – Tepedino.

Qual seria a consequência do descumprimento do direito de preferência?

Não indenização pelas acessões ao fim do contrato:

Art. 1.375. Extinta a concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o
terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não
houverem estipulado o contrário.

Extinta a concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o terreno,


construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem
estipulado o contrário.

Muitas das vezes, essa é a principal vantagem para o fundeiro.


Caso concreto:

Matheus celebrou com Pendotiba Empreendimento Ltda. Um contrato concedendo o


direito de superfície de determinado terreno de sua propriedade, pelo prazo de 25 anos,
mediante o pagamento de um valor mensal de R$ 10.000,00. Com o passar dos anos, a
região se valorizou e Matheus solicitou um aumento no valor pago (solarium), havendo
recusa por parte da empresa. Diante disso, Matheus ajuizou ação judicial alegando, em
síntese, que o contrato de concessão de direito de superfície encontra-se em total
desequilíbrio financeiro (em função da valorização da região comercial de Niterói),
requerendo a revisão do contrato celebrado, para reajustar o valor das mensalidades ao
valor do mercado atual. Como você decidiria?

Extinção da concessão (deve haver o cancelamento do registro no RGI – art. 172, LRP)

 Pelo fim do prazo da concessão


 Por morte do superficiário, caso não tenha herdeiros.
 Se o superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para a qual lhe foi
concedida.
 Em caso de desapropriação da propriedade

Art. 1.376. No caso de extinção do direito de superfície em consequência de


desapropriação, a indenização cabe ao proprietário e ao superficiário, no valor
correspondente ao direito real de cada um.

Deve-se avaliar a expressão econômica do direito de superfície separadamente da do


terreno, levando em consideração, entre outros fatores, o prazo restante da
concessão, o valor das construções ou plantações realizadas e as perspectivas de
geração de caixa decorrentes da exploração da concessão.

A doutrina entende que as hipóteses de extinção previstas em lei são


exemplificativas, podendo haver outras, como, por exemplo: violação dos deveres
do superficiário, acordo entre as partes – “distrato”, consolidação (fusão, na mesma
pessoa, das qualidades de fundeiro e superficiário).
Questões de Concurso:

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