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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO
Prof. Pablo Stolze

Fontes dos nossos slides: Novo Curso de Direito Civil e Manual


de Direito Civil – Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo P. Filho (Ed.
Saraiva).
PRINCIPAIS ESPÉCIES DE USUCAPIÃO
Usucapião Extraordinária (art. 1.238, CC)

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir
como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e
boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá
de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o
possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele
realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
MIGUEL REALE:

Em virtude do princípio de socialidade, surgiu também um novo conceito de


posse, a posse-trabalho, ou posse “pro labore”, em virtude da qual o prazo de
usucapião de um imóvel é reduzido, conforme o caso, se os possuidores nele
houverem estabelecido a sua morada, ou realizado investimentos de interesse
social e econômico.
(Visão geral do projeto de Código Civil)
Usucapião Ordinária (art. 1.242, CC)

Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e


incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.
Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel
houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do
respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele
tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse
social e econômico.
IV Jornada de Direito Civil - Enunciado 303 - Considera-se justo título, para a
presunção relativa da boa-fé do possuidor, o justo motivo que lhe autoriza a
aquisição derivada da posse, esteja ou não materializado em instrumento público
ou particular. Compreensão na perspectiva da função social da posse.
Usucapião Ordinária (art. 1.242, CC)

Art. 1.242. (...)


Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel
houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do
respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele
tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse
social e econômico. Usucapião Tabular
OBS: Usucapião Tabular

FLÁVIO TARTUCE:
A norma apresenta sério problema. Isso porque traz um requisito ao lado da
posse-trabalho, qual seja, a existência de um documento hábil que foi registrado
e cancelado posteriormente, caso de um compromisso de compra e venda. Tal
requisito gera o que se convencionou chamar usucapião tabular, especialmente
entre os juristas da área de registros públicos (MANUAL, citado, Ed. Gen).
Usucapião Constitucional (ou especial) Rural ou Pro Labore (art. 191, CF; art.
1.239, CC)

Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua
como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona
rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho
ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
STJ

RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO RURAL CONSTITUCIONAL. FUNÇÃO SOCIAL DA


PROPRIEDADE RURAL. MÓDULO RURAL. ÁREA MÍNIMA NECESSÁRIA AO
APROVEITAMENTO ECONÔMICO DO IMÓVEL. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DA
NORMA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PREVISÃO DE ÁREA MÁXIMA A SER
USUCAPIDA. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL DE ÁREA MÍNIMA.
IMPORTÂNCIA MAIOR AO CUMPRIMENTO DOS FINS A QUE SE DESTINA A
NORMA.
6. Assim, a partir de uma interpretação teleológica da norma, que assegure a
tutela do interesse para a qual foi criada, conclui-se que, assentando o legislador,
no ordenamento jurídico, o instituto da usucapião rural, prescrevendo um limite
máximo de área a ser usucapida, sem ressalva de um tamanho mínimo, estando
presentes todos os requisitos exigidos pela legislação de regência, parece
evidenciado não haver impedimento à aquisição usucapicional de imóvel que
guarde medida inferior ao módulo previsto para a região em que se localize.
7. A premissa aqui assentada vai ao encontro do que foi decidido pelo Plenário
do Supremo Tribunal Federal, em conclusão de julgamento realizado em
29.4.2015, que proveu recurso extraordinário, em que se discutia a possibilidade
de usucapião de imóvel urbano em município que estabelece lote mínimo para
parcelamento do solo, para reconhecer aos recorrentes o domínio sobre o
imóvel, dada a implementação da usucapião urbana prevista no art. 183 da CF.
8. Na oportunidade do Julgamento acima referido, a Suprema Corte fixou a
seguinte tese: Preenchidos os requisitos do art. 183 da CF, o reconhecimento do
direito à usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação
infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área onde
situado o imóvel (dimensão do lote) (RE 422.349/RS, rel. Min. Dias Toffoli,
29.4.2015)
9. Recurso especial provido.
(REsp 1.040.296/ES, rel. Min. MARCO BUZZI, rel. p/ acórdão Min. LUIS FELIPE
SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 2-6-2015, DJe 14-8-2015) (grifamos)
Usucapião constitucional (ou especial) urbana ou pro misero (art. 183, CF; art.
1.240, CC; art. 9.º do Estatuto da Cidade)

Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e
cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição,
utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde
que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1 o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à
mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2 o O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo
possuidor mais de uma vez.
CARLOS JOSÉ CORDEIRO:
Deve-se considerar a metragem de até duzentos e cinquenta metros quadrados
de área de terreno onde se tenha, para efeito de objeto de usucapião, uma
edificação para moradia de até duzentos e cinquenta metros quadrados de área
construída. Tal regra deve ser levada em conta, a fim de que a teleologia da
norma do art. 183 da Constituição Federal se coadune com a proteção que visa a
dar àqueles que detenham a posse de porções moderadas de áreas urbanas e
não a criação de novos magnatas citadinos.
(CORDEIRO, Carlos José. Usucapião constitucional urbano: aspectos de direito
material. São Paulo: Max Limonad)
STF

Recurso extraordinário. Repercussão geral. Usucapião especial urbana.


Interessados que preenchem todos os requisitos exigidos pelo art. 183 da
Constituição Federal. Pedido indeferido com fundamento em exigência
supostamente imposta pelo plano diretor do município em que localizado o
imóvel. Impossibilidade. A usucapião especial urbana tem raiz constitucional e
seu implemento não pode ser obstado com fundamento em norma
hierarquicamente inferior ou em interpretação que afaste a eficácia do direito
constitucionalmente assegurado. Recurso provido.
1. Módulo mínimo do lote urbano municipal fixado como área de 360 m2.
Pretensão da parte autora de usucapir porção de 225 m2, destacada de um todo
maior, dividida em composse. 2. Não é o caso de declaração de
inconstitucionalidade de norma municipal. 3. Tese aprovada: preenchidos os
requisitos do art. 183 da Constituição Federal, o reconhecimento do direito à
usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação
infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área em que
situado o imóvel (dimensão do lote). 4. Recurso extraordinário provido.
(RE 422.349, rel. Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 29-4-2015,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-153 DIVULG 4-8-
2015 PUBLIC 5-8-2015)
I Jornada de Direito Civil - Enunciado 85 - Para efeitos do art. 1.240, caput, do
novo Código Civil, entende-se por "área urbana" o imóvel edificado ou não,
inclusive unidades autônomas vinculadas a condomínios edilícios.
Usucapião especial urbana coletiva (art. 10 do Estatuto da Cidade)

Art. 10. Os núcleos urbanos informais existentes sem oposição há mais de cinco anos e cuja
área total dividida pelo número de possuidores seja inferior a duzentos e cinquenta metros
quadrados por possuidor são suscetíveis de serem usucapidos coletivamente, desde que os
possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.
(Redação dada pela lei nº 13.465, de 2017)
§ 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua
posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.
§ 2o A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante
sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis.
§ 3o Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor,
independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese
de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais
diferenciadas.
§ 4o O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de
extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos
condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do
condomínio.
§ 5o As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão
tomadas por maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando também os
demais, discordantes ou ausentes.
Novo Curso de Direito Civil – Vol. 5 – Dir. Reais - Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo
Pamplona Filho (Ed. Saraiva):
“O dispositivo sob comento não apenas consagra o direito de propriedade
derivado da prescrição aquisitiva em favor de ‘núcleos urbanos informais
existentes sem oposição há mais de cinco anos e cuja área total dividida pelo
número de possuidores seja inferior a duzentos e cinquenta metros quadrados
por possuidor’, mas também prevê a criação, por ato judicial, de um condomínio.
Na linha da redação anterior deste artigo, que fazia menção à ‘população de
baixa renda’, pensamos que o instituto sob comento tem, de fato, por meta
precípua, contemplar os menos abastados.
Ao menos é assim na letra da lei, e esperamos que, na prática, os menos
afortunados – que, efetivamente, imprimam destinação socioeconômica ao
imóvel – sejam beneficiados.
Reforça essa linha de entendimento a constatação de a Lei n. 13.465 de 2017,
que alterou o art. 10 do Estatuto da Cidade, haver, expressamente, previsto, em
seu art. 9.º, que seriam instituídas, nacionalmente, normas gerais e
procedimentos aplicáveis à Regularização Fundiária Urbana (Reurb), a qual
abrangeria medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais destinadas à
incorporação dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano
e à titulação de seus ocupantes”.
Usucapião coletiva “especial”, “desapropriação judicial" (art. 1.228, §§ 4.o e 5.o,
do Código Civil)

Art. 1.228. (...)

§ 4 o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado


consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco
anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em
conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse
social e econômico relevante.
§ 5 o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida
ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do
imóvel em nome dos possuidores.
STJ
Quem paga a indenização?

11. O Município de Rio Branco, juntamente com o Estado do Acre, constituem


sujeitos passivos legítimos da indenização prevista no art. 1.228, § 5.º, do
CC/2002, visto que os possuidores, por serem hipossuficientes, não podem arcar
com o ressarcimento dos prejuízos sofridos pelo proprietário do imóvel (ex vi do
Enunciado 308 Conselho da Justiça Federal).

(REsp 1.442.440/AC, rel. Min. GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em


7-12-2017, DJe 15-2-2018)
Atenção!

Usucapião Administrativa é tema pertinente à grade de Direito Processual Civil


(art. 1.071 do Código de Processo Civil).
Usucapião indígena (art. 33 da Lei nº 6.001/73)

Art. 33. O índio, integrado ou não, que ocupe como próprio, por dez anos
consecutivos, trecho de terra inferior a cinqüenta hectares, adquirir-lhe-á a
propriedade plena.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às terras do domínio
da União, ocupadas por grupos tribais, às áreas reservadas de que trata esta Lei,
nem às terras de propriedade coletiva de grupo tribal.
TAUÃ RANGEL:

O primeiro dos requisitos materializadores da usucapião indígena atina-se à


metragem máxima da área usucapienda que não poderá superar 50 (cinquenta)
hectares. Trata-se, pois, de modalidade limitada à área rural, não havendo
previsão de tal espécie de usucapião em áreas consideradas urbanas.
O segundo, por seu turno, exige que a posse, tal como ocorre com as demais
espécies de prescrição aquisitiva, seja exercida de modo manso e pacífico, sem
oponibilidade, pelo período de dez (10) anos. Ao lado disso, o terceiro requisito é
que a posse seja exercida por indígena, independentemente de ser ele integrado
ou não; este último elemento é o aspecto caracterizador do instituto em
comento, porquanto não sendo indígena, por óbvio, não poderá valer-se das
disposições que os protegem.
RANGEL, Tauã Lima Verdan. Da usucapião indígena: explicitações à modalidade
consagrada no Estatuto do Índio (Lei n. 6.001/1973), Boletim Jurídico,
Uberaba/MG, ano 13, n. 1.237.
Usucapião familiar (art. 1.240-A do Código Civil)

Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem
oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m²
(duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-
cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia
ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja
proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
(Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)
§ 1 o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais
de uma vez.
V Jornada de Direito Civil - Enunciado 500 - A modalidade de usucapião prevista
no art. 1.240-A do Código Civil pressupõe a propriedade comum do casal e
compreende todas as formas de família ou entidades familiares, inclusive
homoafetivas.
VII Jornada de Direito Civil - Enunciado 595 - O requisito "abandono do lar" deve
ser interpretado na ótica do instituto da usucapião familiar como abandono
voluntário da posse do imóvel somado à ausência da tutela da família, não
importando em averiguação da culpa pelo fim do casamento ou união estável.
Revogado o Enunciado 499.
JOSÉ FERNANDO SIMÃO:

Também em razão do caráter constitucional do instituto, prevê o par. primeiro do


art. 1240-A que este direito não será reconhecido ao mesmo possuidor, mais de
uma vez. Imagino a seguinte situação concreta. Determinada mulher casada
permanece no imóvel comum, residência da família, enquanto seu marido vai
voluntariamente embora de casa e constitui nova família em cidade distante.
Passados dois anos do abandono, a esposa reúne os requisitos para a usucapião
familiar. Sendo proprietária do bem em razão de sentença que declara a
usucapião, a esposa vende o bem.
Iniciando agora uma união estável surge a mesma situação. O companheiro
abandona o imóvel e a companheira dois anos depois promove a ação de
usucapião. De acordo com o dispositivo, como esta mulher já usucapiu imóvel se
utilizando da usucapião familiar, só poderá usucapir o bem por outra modalidade,
seja ela prevista no Código Civil (usucapião extraordinária do art. 1.238) ou pela
Constituição (art. 183).
SIMÃO, José Fernando. Usucapião familiar: problema ou solução? Jornal Carta
Forense, 4 jul. 2011.
ELPÍDIO DONIZETTI:

A concretude auxilia na compreensão. Marido e mulher possuem um imóvel de


morada (casa ou apartamento na cidade) de até 250 m², pouco importa se
adquirido com economia de ambos ou se o condomínio se formou em
decorrência de união estável ou do regime de bens do casamento. O marido se
engraçou por uma moçoila e foi viver esse novo amor nas ilhas Maldívias, ficando
mais de dois anos sem querer saber notícias do mundo, muito menos da ex.
Resultado da aventura: se a mulher continuou a morar na casa e não era
proprietária de outro imóvel urbano ou rural, adquire a totalidade do bem por
usucapião. Para ver o seu direito reconhecido, basta ingressar na justiça e provar
os requisitos legais. O que não vai faltar é testemunha com dor de cotovelos para
dizer que o marido era um crápula.

DONIZETTI, Elpídio. Usucapião do lar serve de consolo para o abandonado,


Consultor Jurídico, 20 set. 2011.

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