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DIREITO REAL À LAJE

• Art. 1.510-A.  O direito real de laje consiste na possibilidade de


coexistência de unidades imobiliárias autônomas de titularidades
distintas situadas em uma mesma área, de maneira a permitir que o
proprietário ceda a superfície de sua construção a fim de que terceiro
edifique unidade distinta daquela originalmente construída sobre o
solo.
     É instituto sui generis, com requisitos e efeitos próprios, que
não se confundem com o direito de superfície (art. 1.369 e
seguintes do CC), e nem com a amplitude da propriedade plena
(art. 1.228 CC). O legislador procurou regularizar e solucionar
situação de fato que aflige milhares de famílias no país, em
especial as de baixa renda: o proprietário de determinado imóvel
aliena a terceiros o direito de construir sobre a laje de sua
edificação, e de se tornar o adquirente dono da nova construção
erigida, independente daquela original, que se encontra abaixo.
      É nova modalidade de propriedade, na qual o titular adquirente
torna-se proprietário de unidade autônoma consistente de
construção erigida sobre acessão alheia, sem implicar situação de
condomínio tradicional ou edilício.
NATUREZA JURÍDICA
• Não se trata de condomínio tradicional (arts. 1.314 e seguintes CC),
nem condomínio edilício (arts. 1.331 e seguintes CC), muito menos
de direito de superfície temporário.
• O direito de laje fica a meio caminho entre a superfície e a
propriedade plena.
• Tem o mérito de solucionar situação irregular que afeta a população
de baixa renda, e os defeitos de imprecisão de redação e de
conceitos, o que certamente dificultará – e muito – a tarefa da
doutrina e dos tribunais.
•      
Direito Real de Laje = Superfície?
•       Um exame ligeiro do direito real de laje leva à enganosa equiparação ao
direito real de superfície, na modalidade de sobrelevação (direito real de
superfície sobre superfície, ou superfície em segundo grau), que não se
encontra regulado no Código Civil.
• A doutrina, amparada em lição de Ricardo Pereira Lira, já anotava a existência
informal do direito de laje, presente em comunidades da baixa renda,
mediante o qual “moradores permitem que um terceiro construa sobre sua
laje, ficando de posse exclusiva desse terceiro a moradia por ele construída”
(Gustavo Tepedino e outros, Código Civil Interpretado, vol III, Renovar, p. 754),
•       Optou o legislador, porém, por não regular o direito real de laje como
modalidade do direito de superfície. As diferenças entre os dois institutos são
marcantes, segundo a figura positivada pelo artigo 1.510-A d Código Civil.
CONSTITUIÇÃO
•       A constituição do direito real de laje, embora omisso o artigo, pode ocorrer em diversas modalidades.
• 1. mediante celebração de negócio jurídico inter-vivos levado ao Oficial de Registro de Imóveis. Claro que o
registro está subordinado à regularidade dominial do imóvel do concedente, pena de grave violação ao princípio
da continuidade registral. O registro é constitutivo do direito real. Antes dele existe entre as partes simples relação
obrigacional de direito de laje, contrato translativo, mas que somente se converte em direito real após o ingresso
no registro imobiliário, mediante descerramento de matrícula própria. Anoto que, na realidade, o negócio
comportará duplo ato registrário. O primeiro, de averbação na matrícula do imóvel do concedente transmitente,
que sofrerá o ônus. A averbação é de suma importância, para que terceiros tenham conhecimento que o imóvel
não abrange a construção existente sobre a laje. O segundo ato é de registro em sentido estrito, a ser lançado na
matrícula especialmente aberta para a nova unidade imobiliária receber o direito de laje. A descrição do imóvel
na matrícula deverá deixar absolutamente claro que o objeto é apenas a construção sobe a laje, e jamais o
terreno onde ela se assenta. A menção ao terreno terá apenas a finalidade de localização da unidade objeto do
direito de laje.
• 2. Pode também ser criado por negócio jurídico causa mortis – testamento - no qual o testador atribua a primeira
construção a um legatário, e a segunda construção, sobreposta, em favor de outro legatário. A aquisição do direito
real, em tal hipótese, se dá pela morte, por força do princípio da saisine (art. 1.790 CC), e o registro terá natureza
meramente regularizatória.
CONSTITUIÇÃO -continuação
• 3. Mediante usucapião, em diversas modalidades: extraordinária, ordinária, especial urbana, ou mesmo
entre ex-cônjuges ou companheiros. Apenas as modalidades de usucapião especial rural e coletiva são
incompatíveis com o novo instituto. Os requisitos de cada modalidade se encontram nos artigos 1.238 e
seguintes do Código Civil. A usucapião pode ter por objeto a propriedade ou outros direitos reais. Logo,
nada impede que  o titular de posse prolongada e qualificada sobre a construção erigida sobre laje alheia
possa requerer a usucapião somente da unidade que ocupa, sem abranger a acessão abaixo, nem o
terreno onde se assenta. O problema pode surgir se o concedente, titular de direitos sobre o terreno, não
tiver o domínio formal do imóvel. Embora singular, pode ser declarada a usucapião e descerrada a
matrícula, levando em conta a natureza originária da aquisição, com descrição da construção e mera
menção ao terreno onde está erigida. Nada impede, também, a usucapião administrativa, desde que com
a concordância do titular dominial do terreno e confrontantes.
•        Finalmente, a aquisição pode ocorrer mediante sentença judicial, especialmente útil nas ações de
família. Tome-se como exemplo partilha judicial em divórcio, na qual, diante da impossibilidade da divisão,
ou inconveniência da venda, determine o juiz que o primeiro piso seja atribuído a um dos cônjuges e o
segundo piso ao outro, mediante realização de obras que permitam acessos independentes.
OBJETO
• Construções erigidas sobre acessão alheia. Como acima dito, não admite a lei o direito de sobrelevação, ou seja, direito real de
laje de segundo grau. Disso decorre que o concedente deve ser proprietário do terreno e da acessão, para que possa instituir
direito real de laje em favor de terceiro.
• Não menciona a lei o número de pavimentos, tanto da construção original, de titularidade do concedente proprietário do
terreno, como do próprio direito de laje. Nada impede, assim, que o concedente seja titular de um prédio com dois
pavimentos – um “sobrado”, na linguagem comum – e conceda o direito de laje para construção de mais dois pavimentos.
Evidente que deve haver prévia aprovação administrativa para a construção, pena de sério risco à segurança e incolumidade
dos ocupantes de toda a edificação.
• O § 2º dispõe que o direito de laje pode incidir tanto sobre o espaço aéreo como o subsolo de terrenos públicos ou privados.
Vê-se que o instituto é mais amplo do que o direito real de superfície, que contempla preferencialmente o espaço aéreo. Não
deixa de ser curioso que todo o instituto tenha por pressuposto a construção de pavimento superior, mas admita a cessão de
subsolo. Há manifesta contradição a respeito do objeto do novo direito real.
• O direito de laje pode ter por objeto imóveis públicos ou particulares. Em relação aos primeiros, causa estranheza a inserção
do tema no CC, que no livro do direito das coisas se limita a tratar dos direitos reais sobre a propriedade privada. Além disso, o
preceito exige como requisito que a construção seja tomada em “projeção vertical”. Significa que as construções devem
ocorrem em planos horizontais, uma (laje) sobre a outra (original). Não se admite a utilização do instituto para situações
conhecidas como “condomínios deitados”, consistentes de conjuntos de casas sem sobreposição de umas sobre as outras (art.
8º. L. 4.591/64). Também não se admite que as edificações objeto do direito de laje se estendam sobre outros imóveis
vizinhos, pertencentes a proprietários diversos do imóvel original. Significa dizer que a constituição do direito de laje
pressupõe homogeneidade dominial do imóvel original. As limitações acima são de natureza cogente e não podem ser
derrogadas pela vontade das partes.
EXTINÇÃO
•      Finalmente, deixou o legislador de regular a extinção do direito real de laje. A regra geral é que tal direito é perene, e
não temporário, como os direitos reais de gozo e fruição. É propriedade, e não direito real sobre coisa alheia. Como
vimos, não é personalíssimo (tal como ocorre com o usufruto), de modo que a morte do titular não extingue o direito.
Nada impede, porém, que as partes convencionem, mediante cláusula expressa, a aposição de termo ou de condição
resolutiva, cujo implemento provoca a extinção de pleno direito da laje. No silencio do contrato, a laje tende à
perpetuidade. Se a propriedade plena pode ser resolúvel, também se admite a criação de tal modalidade para o direito
real de laje.
•       A desapropriação e a usucapião por terceiro possuidor também provocam a extinção da laje. Na desapropriação a
indenização será rateada proporcionalmente entre o concedente e o titular do direito real de laje. A usucapião somente
da construção sobre a laje não importa aquisição do terreno onde se assenta.
•       O perecimento da construção também é causa extintiva do direito real. Em tal hipótese, remanesce apenas o
terreno, de titularidade exclusiva do concedente. Caso o perecimento seja causado por terceiro, ou a construção se
encontre segurada, o titular do direito real de laje fará jus a indenização proporcional.
•       Indaga-se: no caso de perecimento, se a construção original for novamente erigida, se restaura o direito de laje? Não
há solução única. Se tiver ocorrido o cancelamento do direito de laje no registro imobiliário e o terreno vier a ser
alienado a terceiro, que erige nova construção, não há restauração. Ao contrário, se o registro do direito de laje não for
cancelado e o próprio concedente reconstruir o primeiro piso, a laje se restaura, e o titular pode erigir nova construção.

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