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ABSTRACT: This article analyzes the conflicts within the Government, between
agencies or departments. The paper addresses its causes, its avoidance methods
and the ways to solve intragovernmental litigation under Brazilian law, focusing
on arbitration procedures. From bibliographical research and decision analysis,
especially from a qualitative perspective, it is proposed standards that recommend
or contraindicate each of the dispute resolution methods that will be examined.
1 Introdução
1 Não há tutela administrativa sem expressa previsão legal (tradução interpretativa). Não há tutela sem
texto (tradução literal).
art. 4o, XI, de sua Lei de regência: “unificar a jurisprudência administrativa, garantir
a correta aplicação das leis, prevenir e dirimir as controvérsias entre os órgãos
jurídicos da Administração Federal” (BRASIL, 1993).
Por maior que seja a importância dos mecanismos de solução de controvérsias,
a prevenção de litígios é sempre preferível; deve ser a meta. A litigiosidade intra-
administrativa recorrente, especialmente a intragovernamental, é uma patologia, que
compromete a eficiência administrativa e obstaculiza a consecução das atividades-
fim incumbidas ao Estado.
2 Por razões didáticas, optou-se por tratar no corpo do artigo apenas do sistema federal de solução de
conflitos intragovernamentais. No âmbito dos Estados e Municípios, os Governadores e Prefeitos fazem às
vezes do Presidente e – se assim dispuser as Constituições ou Leis locais – as procuradorias respectivas
assumem o papel desempenhado pela AGU e CGU no contexto da União. Não há notícia de órgão local
análogo à CCAF. Quanto à possibilidade de autocomposição, arbitrabilidade e apreciação judicial do
litígio não há diferença entre os entes federativos.
A Lei no 13.140, de 2015, em seu art. 35, também permite que órgãos e entidades
de direito público da Administração Pública Federal ponham fim a suas controvérsias
por transação, com fundamento em autorização do Advogado-Geral da União,
A arbitragem que ora se menciona não é aquela prevista pela Lei no 9.307, de 1996.
Aliás, é de se questionar se tal método compositivo merece mesmo esse rótulo. Embora
haja quem pense diferente (GODOY, 2015, p. 186), parece mais adequado caracterizar
o ato resolutório praticado pelo CGU como espécie de poder administrativo dirimente,
incidente sobre conflitos endógenos, tal qual aquele conferido ao Advogado-Geral
da União pela LC no 73, de 1993 (OLIVEIRA, 2018, p. 35). Outro exemplo de função
administrativa dirimente pode ser encontrado no contexto das Agências Reguladoras,
em que é comum existir procedimentos administrativos de solução de disputas entre
particulares ou entre autoridades administrativas e particulares (e.g., Lei no 9.478,
de 1997, art. 20 e Lei no 9.984, de 2000, art. 4oA, §4o). Também nesses casos o ato
administrativo de composição do conflito apreciado é judicialmente sindicável em
ampla extensão. No Direito Comparado, fenômenos correlatos também têm sido
diferenciados da arbitragem e de outras formas de prestação jurisdicional:
El órgano regulador al imponer una resolución obligatoria entre las partes resuelve
sobre relaciones en principio jurídico privadas y sometidas a la Ley de autonomía en
la contratación. En cierto modo dirime o arbitra un conflicto inter-privatos, al resolver
sobre pretensiones de las partes. Esta circunstancia ha hecho reflexionar a cierta
doctrina que se ha decantado por la atribución de una potestad arbitral en manos
de la Administración y configuradora de una actividad arbitral así mismo como una
categoría básica de la actividad administrativa. El problema planteado es sin duda
de amplio calado puesto que existen imperativos constitucionales que determinan
el fin de la actuación administrativa en cumplimiento de los intereses generales
3 “O órgão regulador, ao impor uma resolução obrigatória entre as partes, decide sobre as relações que, a
princípio, são privadas e estão submetidas à regra da autonomia da vontade. De certa forma, resolve ou arbitra
um conflito entre particulares, ao decidir a respeito das pretensões das partes. Essa circunstância fez com
que parcela da doutrina tenha reconhecido à Administração um poder arbitral, configurando a arbitragem
como uma categoria básica da atividade administrativa. O problema proposto é, sem dúvida, abrangente,
uma vez que existem imperativos constitucionais que determinam que a atividade administrativa deve
estar orientada a consecução de interesses públicos e não para resolver conflitos privados, sob formatação
essencialmente jurisdicional. O direito à tutela judicial efetiva e o princípio geral de submissão da
Administração à legalidade também constituiriam obstáculos importantes para a categorização dessa
função dos órgãos reguladores como arbitragem. A intervenção regulatória é direcionada ao cumprimento
da lei e à satisfação do interesse público, e não diretamente à composição de conflitos de interesses
particulares. Para diferenciar essa função administrativa resolutória de eventual função arbitral em sentido
estrito, dos órgãos reguladores, preferimos falar neste caso de uma atividade administrativa dirimente do
órgão regulador, sujeita ao esquema típico do Direito Administrativo Público” (tradução nossa).
5 O entendimento parece constituir uma interpretação corretiva, de base sistemática, que, considerando
o feixe de atribuições institucionais da Procuradoria-Geral Federal, atraiu para tal autoridade uma
competência normativamente alocada ao Consultor-Geral da União. Na última edição do Regimento
Interno da Procuradoria-Geral Federal, veiculado pela Portaria no 338/2016, já se prevê dentre as
competências do Departamento de Consultoria (DEPCONSU/PGF/AGU) a função de “assistir o Procurador-
Geral Federal no tocante à análise de controvérsias jurídicas que envolvam autarquias e fundações
públicas federais submetidas à Câmara de Conciliação e Arbitragem da Advocacia-Geral da União”
(art. 33, VIII). Dentre outros, essa tese é acolhida no Parecer no 00032/2015/DEPCONSU/PGF/AGU. Não
voltaremos, nas páginas seguintes, a reiterar essa diferenciação criada por via hermenêutica. Por razões
didáticas, continuaremos a referir somente à competência de arbitramento atribuída ao Consultor-Geral
da União; embora já se tenha esclarecido que, no caso de ambos os confrontantes serem autarquias
ou fundações públicas federais, a autoridade para o arbitramento será o Procurador-Geral Federal, com
auxílio do Departamento de Consultoria da Procuradoria-Geral Federal.
No que toca aos conflitos travados entre entidades administrativas (que dispõem
de personalidade jurídica própria) e nas contendas entre estas e a Administração
Direta (sempre representada judicialmente pelo ente político), as disputas judiciais
não só são teoricamente possíveis, como largamente verificadas. No entanto, desde a
promulgação da Lei no 13.140, de 2015, a “propositura de ação judicial em que figurem
concomitantemente nos polos ativo e passivo órgãos ou entidades de direito público
que integrem a administração pública federal deverá ser previamente autorizada pelo
Advogado-Geral da União” (BRASIL, 2015).
Passa-se a analisar agora as circunstâncias nas quais cada mecanismo de
solução de disputas intra-administrativas é mais adequado. De modo geral, deve-se
evitar a judicialização de conflitos entre órgãos ou entidades administrativas. Não
sendo possível prevenir a formação das lides, é preferível resolvê-las internamente
e, caso seja viável, por conciliação. Assim, para Godoy:
5 Conclusão
A amplitude e a heterogeneidade das funções confiadas aos Estados
contemporâneos redundaram em máquinas administrativas complexas, policêntricas
e multiorganizativas. Com o crescimento e a diversificação dos interesses
carecedores de tutela, das demandas sociais, das tarefas estatais e das entidades
8 Observe-se excerto da justificativa à Emenda no 07 ao PLS no 406, de 2013: "a Advocacia Pública,
seguramente, é o espaço institucional mais adequado para a arbitragem dos conflitos entre órgãos e
entidades do Poder Público. Primeiro, porque é regida pelo Direito Público. Segundo, porque conhece
bem as leis do país, sobretudo, as que regem a Administração Pública. Terceiro, porque conhece
profundamente as instituições públicas brasileiras (sistemas, estrutura, cultura, dificuldades, limitações,
diretrizes, etc.). E, quarto, porque possui experiência na solução de litígios entre órgãos e entes públicos,
vez que, como mencionado, já há algum tempo, vem atuando com sucesso nessa seara". Documento
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