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ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA
Quando falamos de órgãos, devemos ter na cabeça a teoria orgânica, que não é
exclusiva do direito público, já que é usada tanto no direito administrativo quanto no direito
público. Nesse sentido, importante percebermos que o conceito de pessoa jurídica é uma
abstração (diferentemente das pessoas físicas), uma ficção jurídica. Ela só existe porque o
direito não é uma realidade material. Desse modo, ela tem de manifestar sua vontade por
meio de pessoas físicas, que exercem funções dela. O conjunto dessas pessoas físicas é
organizado em órgãos.
Então, por exemplo: imaginemos a União Federal (pessoa jurídica prevista na
CRFB, com um monte de competências, tais como pugnar pela reforma agrária, estabelecer
relações diplomáticas, ter Forças Armadas, editar leis federais, julgar recursos judiciais,
manter o SUS, ter penitenciárias federais, realizar persecução penal de crimes federais,
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A partir daqui, sempre que citarmos “o Estado”, estaremos nos referindo à administração direta.
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Recapitulando: quando falamos de administração direta, usamos “órgão”; quando nos referimos a
administração indireta, dizemos “entidades”, ou “pessoas jurídicas”.
manter universidades federais, etc.). Não poderíamos jogar um milhão de servidores dentro
da União, cada uma fazendo o que quer – o que seria administração direta. Então, devemos
organizar, compartimentalizar essas competências. Vamos supor a existência somente de
três ministérios: da educação, da saúde e da previdência. Porém, mesmo dentro desses
ministérios, não é possível colocar um monte de gente fazendo o que quer. Então, mesmo
dentro deles, devemos fazer subdivisões. Assim, no ministério da previdência, teremos
superintendências do RJ, outra de SP, outra de MG, outra do ES, etc. E até mesmo dentro
dessas repartições haverá novas divisões, setores, etc. Até que, e.g. dentro do setor de
cálculos contábeis da divisão de cálculos do departamento de concessão de aposentadorias
da superintendência do RJ do Ministério da Previdência Social da União Federal, vai haver
4 contadores. Cada um deles ocupa um cargo, preenchido por concurso público. Quando
um deles disser “defiro sua aposentadoria”, na verdade, a concessão é da União Federal.
Essa é a relação de imputação de um órgão (e, conseqüentemente, de um ocupante de um
cargo) tem em relação a sua pessoa jurídica. O que ele fala, é a própria pessoa que fala.3
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O problema do direito administrativo é que, durante muito tempo, ele não foi legislado (apenas havia
portarias, decretos, etc.). Assim, muito de sua construção foi doutrinária. Assim, a explicação desses poderes
sempre foi uma. Quando chegou esse artigo da LPAF, 98% da doutrina fingem que ele não existe, tentando
adaptar a legislação à doutrina, e não o contrário.
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Esse ponto é mal resolvido. O que o professor acha, pela jurisprudência que ele conhece, é que as
competências específicas são as que visem, em algum ponto, à proteção de direitos fundamentais, ou do erário
público.
e, por isso, é sempre limitada)8 será maior ou menor de acordo com o que houver
disposto a norma superior que concedeu a autonomia, e que criou aquela pessoa
jurídica.9
No caso das entidades da administração indireta, o que dirá qual a menor e a
maior autonomia será a lei, de acordo com previsão constitucional expressa (art. 37
CRFB). Daí falar-se que só existe controle administrativo do ente federativo em
relação a suas entidades da administração indireta dentro do que a lei prevê. Não
haveria normas gerais sobre isso, devendo cada lei dispor sobre os limites. E, no
silêncio da lei, vale a autonomia. Assim, não há como determinarmos um regime
jurídico geral da autonomia das entidades da administração indireta, já que ela varia.
Sistematizando o que consta do DL 200, podemos enunciar os seguintes
tipos de controle administrativo:
Controle político: manifesta-se, sobretudo, pela possibilidade de livre nomeação
e exoneração dos dirigentes das entidades da administração direta. Assim, o
agente do ente federativo não pode se substituir ao presidente da autarquia, mas
pode demiti-lo e nomear outro.
Porém, há algumas entidades em que a lei define que não haverá a exoneração
ad nutum (ex.: agências reguladoras, conselhos profissionais, universidades
públicas, CADE, etc.). Aí entra a questão da constitucionalidade dessa lei: poderia
ela limitar o poder de exoneração do chefe do executivo sobre esses dirigentes?
Veremos isso melhor depois.
Controle administrativo: controle sobre os atos das entidades da administração
indireta. Pode, por exemplo, estabelecer diretrizes, metas a serem alcançadas.
Mas não pode dizer como serão atingidas.
Questão polêmica é se o ministro supervisor, dentro da administração direta,
pode rever atos das entidades da administração indireta. Exemplo: a CVM aplica
uma multa a uma corretora de ações. Pode-se recorrer dessa aplicação diretamente
ao Ministro da Fazenda? A maioria da doutrina entende que só se a lei da entidade
prevê essa possibilidade, que leva o nome de recurso hierárquico impróprio. A
hierarquia é imprópria porque, apesar de uma pessoa rever atos da outra, os agentes
dirigem órgãos de pessoas jurídicas diferentes.
Quanto a isso, há uma doutrina minoritária (como Medauar e Sérgio Guerra) que
defende essa possibilidade. Ela se divide em 3: a) com base na supervisão
ministerial prevista no art. 87 da CRFB; b) somente em caso de juízo de legalidade
(não em caso de inconveniência ou inoportunidade); c) se não atender às políticas
públicas do ministério, já que seria uma invasão de competência.
* Controle financeiro-orçamentário: de todas as autonomias das entidades, a
mais difícil, na prática, é a autonomia financeira. Muitas vezes, a lei da entidade até
assegura alguma verba própria dela – ex.: multas aplicadas pelo DETRAN
pertencem a ele. Mas vocês aprenderão ainda que no Estado há dois tipos de crédito:
o de verdade (“dinheiro na conta”) e o orçamentário (previsão de gastos). O que nos
interessa aqui é que o orçamento das entidades da administração indireta não é delas
próprias: o CRFB estabelece o princípio da unidade orçamentária. Assim, o
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Dizem que o único âmbito de atuação próprio ilimitado e originário é o da soberania.
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Vidal Moreira, constitucionalista português, dirá que a autonomia pode ir do quase nada ao quase tudo. Não
pode ser nada, caso contrário não se tratará de pessoa jurídica, mas de órgão; por outro lado, se for tudo, deixa
de ser autonomia para ser soberania.
orçamento é único, da União. Quem manda o orçamento, abrangendo toda a
administração direta e indireta, é o Presidente da República. Mais ainda: é ele quem
libera as verbas ao longo da execução orçamentária.