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A DOENÇA COMO

LINGUAGEM DA
ALMA NA CRIANÇA
Rüdiger Dahlke
Vera Kaesemann

A DOENÇA COMO
LINGUAGEM DA
ALMA NA CRIANÇA
Interpretação e significado de quadros
clínicos
em crianças e seu tratamento holístico

Tradução
KARINA JANNINI
Título original: Krankheit als Sprache der Kinderseele.
Copyright © 2009 C. Bertelsmann Verlag, uma divisão da Verlagsgruppe Random
House GmbH, Munique, Alemanha.
Copyright da edição brasileira © 2014 Editora Pensamento-Cultrix Ltda.
Texto de acordo com as novas regras ortográficas da língua portuguesa.
1ª edição 2014.
 
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Editor: Adilson Silva Ramachandra
Editora de texto: Denise de C. Rocha Delela
Coordenação editorial: Roseli de S. Ferraz
Produção editorial: Indiara Faria Kayo
Assistente de produção editorial: Estela A. Minas
Editoração Eletrônica: Join Bureau
Revisão: Liliane S. M. Cajado e Nilza Agua
Produção de ebook: S2 Books

CIP-Brasil Catalogação na Publicação


Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ
D129d
Dahlke, Rüdiger
A doença como linguagem da alma na criança : interpretação e
significado de quadros clínicos em crianças e seu tratamento holístico /
Rüdiger Dahlke, Vera Kaesemann ; tradução: Karina Jannini. – 1. ed. São
Paulo : Cultrix, 2014.
544 p. : il. ; 23 cm.
Tradução de: Krankheit als sprache der kinderseele
ISBN 978-85-316-1264-0
1. Pediatria. 2. Medicina. 3. Medicamentos. 4. Saúde Holística. I.
Kaesemann, Vera. II. Título.
14-09262
CDD: 618.92
CDU: 616.053.2
1ª edição digital: 2014
e-ISBN: 978-85-316-1276-3

Direitos de tradução para o Brasil adquiridos com exclusividade pela


EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA., que se reserva a
propriedade literária desta tradução.
Rua Dr. Mário Vicente, 368 – 04270-000 – São Paulo – SP
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Foi feito o depósito legal.
Para Jens, Hanna e Lara. Com amor da
mamãe.
Para Naomi,
Atlanta, Parmita
e todas as outras crianças deste mundo.
Do Papap

“Lidar com crianças faz bem à alma.”


Fiodor M. Dostoiévski
Sumário

Capa

Folha de rosto

Ficha catalográfica

Dedicatória

1 Introdução
1.1 Como surgiu este livro
1.2 Como usar este livro
1.3 A utilização de medicamentos homeopáticos
1.4 Sobre “os riscos e os efeitos colaterais” deste
livro!

2 Fundamentos gerais
2.1 Amor como fundamento da vida
2.2 Critérios da infância
2.2.1 O afeto dos pais
2.2.2 Critérios da puberdade e da
juventude como marcos deste livro
2.2.3 Problemas sociais
2.3 Três pilares da saúde
2.3.1 Alimentação
2.3.1.1 Leite materno como alimento e
remédio
2.3.1.2 A alimentação infantil
2.3.1.3 Outras dicas de alimentação para
uma vida saudável
2.3.1.4 A alimentação da criança doente
2.3.2 Movimento
2.3.3 Relaxamento
2.4 Contato físico como base da vida
2.4.1 Desenvolvimento da inteligência e
contato físico
2.4.2 A criança imatura
2.4.3 Contato físico e amamentação
2.4.4 Terapia através da pele
2.4.5 O “método canguru”
2.4.6 Do Reiki ao Deeksha – imposição das
mãos e bênção
2.4.7 Moderna magia por contato
2.5 Pais e filhos no espelho da alma
2.6 Filhos e sugestão ou A história da verruga-mãe
2.7 Proibições e o desenvolvimento cerebral
2.8 A Lua – o princípio primário da infância e do
aspecto materno
2.9 Educação
2.9.1 Campos que geram formas
2.9.2 Formação do caráter através de
exemplos
2.10 Ferramentas para os pais entenderem melhor
os filhos
2.10.1 A família representada em figuras de
animais
2.10.2 Desenhando a figura de uma ilha
2.10.3 Colocando ou desenhando a família
em figuras
2.11 Conversando com Deus ou rezando antes de
dormir
2.12 Meditações induzidas
2.13 Ritmos e rituais
2.14 Confiança no reino mágico-mítico
2.15 As regras do jogo da vida
2.16 Exercícios para o crescimento, o
desenvolvimento e o bem-estar
2.16.1 Riso
2.16.2 Exercícios de confiança
2.16.3 Todo dia uma boa ação ou espírito
de equipe para iniciantes
2.16.4 Animais como companheiros de vida
2.16.4.1 Os animais e o sétimo sentido
2.16.4.2 Animais como terapeutas
2.16.5 Encontrando o próprio animal totem
2.17 Terapias especiais para crianças
2.17.1 Constelação familiar sistêmica
segundo Hellinger
2.17.2 Essências florais para crianças
2.17.3 Superando o trauma por meio dos
movimentos oculares
2.17.4 Outros exercícios fáceis e eficazes

3 Febre
3.1 A febre pode ser tolerada sem problemas?
3.2 Argumentos contra a diminuição da febre
3.3 Auxílio homeopático e médico em caso de
febre?
3.4 Remédios homeopáticos para a febre
3.5 Convulsões febris
3.5.1 O que é uma convulsão febril?
3.5.2 Quais crianças correm esse risco?
3.5.3 Sinais perigosos e esclarecimento
médico

4 Doenças infecciosas
4.1 Doenças infantis – o pequeno ser humano no
grande mundo
4.1.1 Doenças infantis fortalecem
4.1.2 História da vida e da humanidade
4.2 Lidando, na prática, com as doenças infantis
4.3 Sarampo
4.4 Caxumba
4.5 Rubéola
4.6 Coqueluche
4.7 Catapora
4.8 Febre dos três dias
4.9 Escarlatina

5 Vacinas
5.1 Vacinar ou lavar? Erro de pensamento no
exemplo da vacina do câncer de colo do útero
5.2 Verdadeira prevenção em vez de diagnóstico
precoce

6 Cefaleias e enxaquecas
6.1 Cefaleias
6.1.1 A corrida cabeça com cabeça
6.1.2 O local do acontecimento (da dor)
6.2 Enxaqueca

7 Doenças oculares e distúrbios da visão


7.1 Conjuntivite
7.2 Terçol
7.3 Estenose do canal lacrimal
7.4 Estrabismo
7.4.1 Falta de capacidade de coordenação
7.4.2 Tipos de estrabismo
8 Doenças relativas à garganta, ao nariz e ao ouvido
8.1 Predisposição a infecções – baixa imunidade
8.2 Graus de escalada da agressividade
8.3 Otite
8.3.1 O que acontece na otite?
8.3.2 Pressão de dentro e de fora
8.4 Medicamentos homeopáticos para dor de
ouvido
8.5 Dor de garganta
8.6 Resfriado
8.7 Sinusite
8.8 Anel de Waldeyer, pólipos
8.9 Complementação homeopática a partir da
concha
8.10 Hemorragia nasal

9 Problemas nos órgãos respiratórios


9.1 Tosse e bronquite
9.2 Medicamentos homeopáticos para tosse e
bronquite
9.3 Pneumonia
9.4 Pseudocrupe
9.5 Asma brônquica
9.5.1 Polaridades
9.5.2 Medo como tema central
9.5.3 O aprendizado a partir de modelos e
um ambiente natural

10 Problemas no trato digestório, doenças


gastrointestinais
10.1 Dor abdominal
10.1.1 Cólica dos três meses
10.1.2 Medicamentos homeopáticos em
casos de dores abdominais
10.2 Gases
10.3 Vômito
10.3.1 Vomitando o leite materno
10.3.2 Indicações para as mães
10.3.3 Homeopatia: Silicea, lágrimas de
anjo em cristal de rocha ou a parede de
vidro entre a mãe e a criança
10.4 Diarreia
10.5 Medicamentos homeopáticos para vômito e
diarreia
10.6 Diarreia e vômito
10.7 Constipação
10.8 Fungos
10.9 Vermes

11 Doenças alergênicas
11.1 Alergias
11.1.1 Guerras de fronteiras
11.1.2 Jogos de poder
11.1.3 O estranho e o próprio
11.1.4 A alergia e a reconciliação com a
mãe (natureza)
11.1.5 Prevenindo-se contra as alergias
11.1.6 Possibilidades e oportunidades
terapêuticas
11.1.7 A simbologia dos alérgenos na
infância ou uma interpretação dos objetivos
da guerra
11.1.7.1 Alérgenos do grande círculo (a
simbologia da sujeira)
11.1.7.2 Alérgenos do pequeno círculo (da
simbologia da fertilidade e da
sensualidade)
11.2 Dermatite atópica e crosta láctea

12 Problemas do aparelho locomotor


12.1 Postura e desenvolvimento
12.2 Cifose e lordose
12.3 Escoliose
12.4 Doença de Scheuermann
12.5 A síndrome KISS
12.6 Dores do crescimento
12.7 Sinovite do quadril

13 Doenças de pele
13.1 Piolho
13.2 Verrugas

14 Problemas do metabolismo: Diabetes mellitus


14.1 O doce e a energia da vida
14.2 A falta de insulina e suas consequências
14.3 Tarefas
14.4 “Diabete senil” em crianças
14.5 Desafios para os pais e para o ambiente

15 Problemas espirituais e emocionais


15.1 Medo
15.1.1 A nova epidemia do medo: os
ataques de pânico
15.1.2 O nascimento como chave para o
medo
15.1.3 Medos típicos das crianças nos
vários estágios do desenvolvimento
15.1.3.1 Medo do escuro
15.1.3.2 Medo de fantasmas
15.1.3.3 Medo de ficar sozinho
15.1.3.4 Medo de trovões
15.1.3.5 Medo de cães, insetos, aranhas e
cobras
15.1.3.6 Medo do novo
15.1.3.7 Medo de repetir o ano ou de não
conseguir progredir
15.1.3.8 Medo de ladrões, sequestradores e
de estranhos de modo geral
15.1.3.9 Medo de guerras e catástrofes
ambientais
15.1.3.10 Medo de doenças e da morte
15.1.3.11 Medo da água e do fogo
15.1.3.12 Medo pela família, medo da
família
15.1.4 O medo e o reflexo de Moro (da
doutora Wibke Bein-Wierzbinski)
15.1.5 Princípios gerais sobre a terapia do
medo
15.2 Enurese
15.2.1 Enurese noturna
15.2.1.1 Base evolutiva do “quadro clínico”
15.2.1.2 Choro no nível mais inferior
15.2.1.3 Compensação noturna da pressão
15.2.1.4 Ajuda em vez de vingança
15.2.2 O reflexo de Galant: déficit de
endireitamento como causa da enurese (da
doutora Wibke Bein-Wierzbinski)
15.2.3 Enurese diurna
15.3 Distúrbios do sono
15.3.1 Ritmos e rituais confiáveis
15.3.2 Problemas específicos do sono da
criança
15.3.2.1 Sonambulismo ou lunatismo
15.3.2.2 Pavor nocturnus
15.3.2.3 Falar durante o sono
15.3.2.4 Pesadelos
15.4 Sobrepeso
15.4.1 A epidemia do futuro
15.4.2 O corpo como espelho da alma[33]
15.4.3 A armadilha moderna da gordura
15.4.4 Soluções
15.5 Distúrbios da fala
15.5.1 Gagueira
15.5.1.1 Subcategorias da gagueira
15.5.1.2 Soluções
15.5.2 Ceceio
15.6 Tiques
15.6.1 Redimindo o princípio uraniano
15.6.2 Diversos tipos de tiques e seu pano
de fundo
15.7 Maus hábitos
15.7.1 Estalar os dedos
15.7.2 Enfiar o dedo no nariz
15.8 Distúrbios comportamentais
15.8.1 Distúrbios comportamentais na
infância
15.8.1.1 Ciúme
15.8.1.2 Competição
15.8.1.3 Rompantes de agressividade
15.8.1.4 Prazer com a desgraça alheia
15.8.1.5 Pedantismo
15.8.1.6 Tortura de animais
15.8.1.7 Agarramento
15.8.1.8 Fugas
15.8.1.9 Balançar-se com a cadeira
15.8.1.10 Mascar chiclete
15.8.1.11 Arroto contínuo
15.8.1.12 Fugir da mesa
15.8.1.13 Roer as unhas
15.8.1.14 Morder o lápis
15.8.1.15 Dependência da televisão
15.8.1.16 Dependência do computador
15.8.1.17 A dependência do telefone
celular
15.8.1.18 Inapetência
15.8.1.19 Pequenas personalidades que
atraem acidentes
15.8.1.20 Dislexia
15.8.1.21 Discalculia
15.8.1.22 Masturbação
15.8.1.23 Brincar de médico
15.8.1.24 Timidez
15.8.1.25 Hipersensibilidade à dor
15.8.1.26 Insensibilidade à dor
15.8.1.27 Colocar os cabelos na boca
15.8.1.28 Enrolar os cabelos
15.8.2 Distúrbios comportamentais na
adolescência
15.8.2.1 Ravers ou techno-kids
15.8.2.2 Os tecktoniks
15.8.2.3 Os punks
15.8.2.4 Os emos
15.8.2.5 Góticos
15.8.2.6 Os hip-hoppers
15.8.2.7 Piercing
15.8.2.8 Escarificações

16 Temas especiais
16.1 Autismo
16.1.1 Conhecendo outros mundos
16.1.2 Possibilidades e limites da terapia do
abraço para autistas
16.2 Síndrome de Down ou deficiência mental
como oportunidade?
16.2.1 Naomi
16.2.2 Tornem-se como as crianças
16.2.3 Dúvidas a respeito da sociedade
meritocrática

17 Epílogo

18 Agradecimentos

19 Anexos
19.1 Farmácia homeopática de emergência
19.1.1 Eritema alérgico
19.1.2 Feridas por mordidas
19.1.3 Hematoma
19.1.4 Hemorragias
19.1.5 Intoxicação sanguínea
19.1.6 Concussão cerebral
19.1.7 Picadas de insetos
19.1.8 Fraturas
19.1.9 Distúrbios circulatórios
19.1.10 Intoxicação alimentar
19.1.11 Desmaio
19.1.12 Lacerações (na cabeça)
19.1.13 Contusões
19.1.14 Enjoo em viagens
19.1.15 Cortes
19.1.16 Escoriações
19.1.17 Queimadura de sol
19.1.18 Insolação
19.1.19 Lascas, farpas, estilhaços
19.1.20 Choque elétrico
19.1.21 Torções em geral, torção do pé
19.1.22 Choque traumático
19.1.23 Queimaduras
19.1.24 Luxação
19.1.25 Constipação em viagens
19.2 Bibliografia
19.3 Publicações de Rüdiger Dahlke
Próximos lançamentos
1 Introdução

1.1 Como surgiu este livro


A ideia deste livro resultou de nosso encontro, meu e de Vera
Kaesemann. Há muito tempo eu já estava interessado em
cobrir todo o campo da medicina e, se possível, investigar e
interpretar todos os distúrbios e quadros sintomáticos em
sua dimensão psíquica. O livro Der Weg ins Leben[1] trata do
início da vida, desde a concepção até o nascimento. Como a
filosofia espiritual parte do princípio de que tudo está no
início e de que o caminho decisivo é preparado no começo
da vida, era evidente que eu também teria de me dedicar a
interpretar a pediatria. No entanto, faltava-me experiência
para tanto. Essa experiência foi trazida por Vera Kaesemann,
que não apenas manteve seus três filhos afastados da orgia
química da medicina acadêmica, como também, a partir de
1984, fez cursos de formação em homeopatia, a fim de
dirigir um consultório exclusivamente pediátrico. No mesmo
ano, ela também deparou com o livro Krankheit als Weg[2] e,
posteriormente, fez o curso de formação em “medicina
arquetípica”. A base deste livro foi preparada graças ao
nosso bom convívio de dois anos. No entanto, surgiu apenas
no período posterior.
Discutimos e interpretamos juntos os sintomas mais
importantes da infância, e Vera Kaesemann contribuiu com
relatos sobre crianças doentes. A maioria das dicas práticas
e todos os quadros medicamentosos também provêm de sua
experiência em consultório. Minha tarefa foi interpretar e
formular. Nesse sentido é que escrevi o livro. Quando falo de
“nós”, é nessa situação que penso. Em vez do “se”
impessoal, muitas vezes utilizei o termo “criança”, pois me
pareceu um contrassenso escrever sobre crianças, que
correspondem tão bem ao princípio arquetípico feminino, na
forma supostamente masculina do “se”.
Em seguida, oferecemos o manuscrito a terapeutas,
colaboradores e aos respectivos especialistas para que
fizessem uma leitura e uma revisão crítica.

1.2 Como usar este livro


Embora preferíssemos que os capítulos teóricos do início do
livro fossem realmente lidos primeiro, as experiências com
meus outros livros mostraram que, muitas vezes, na prática,
se começa por consultar os capítulos que tratam dos
próprios problemas; neste caso, aqueles dos próprios filhos.
O ideal seria que isso só ocorresse após a leitura inicial da
introdução geral, uma vez que assim se evitaria uma grande
quantidade de equívocos.
Sintomas que não foram tratados neste livro encontram-se
em outras obras do autor, elencadas na seção 19.3
(Publicações de Rüdiger Dahlke). Por exemplo, se um
sintoma tão importante quanto o TDAH, a hiperatividade,
não aparece aqui é porque ele foi explicado em um capítulo
do livro A Agressão como Oportunidade.[3] Muitos dos
sintomas também se encontram nos verbetes do manual A
Doença como Símbolo.[4]
Quanto ao modo de usar este livro, é recomendável que se
empregue uma estratégia dupla. Por certo, os pais que
sentem maior urgência porque estão com o filho doente logo
recorrerão às dicas práticas, que, dependendo da dificuldade
da situação, discutirão com seu médico ou terapeuta de
confiança e poderão empregar de imediato. Em seguida,
seria importante dedicar-se às interpretações, a fim de
conhecer o sentido mais profundo dos respectivos sintomas.
Ambos os aspectos nunca devem ser entendidos como
alternativas; ao contrário, eles se complementam. Isso vale,
sobretudo, em relação à homeopatia clássica, uma vez que o
próprio pensamento da interpretação dos quadros clínicos é
essencialmente homeopático. Entre as explicações e as
dicas naturopáticas também há uma relação de apoio.
Mesmo para as intervenções necessárias da medicina
acadêmica, as interpretações trazem subsídios coerentes e,
não raro, também outras indicações.
Muitas vezes, sobretudo as crianças pequenas não estarão
acessíveis para as interpretações. Por isso, é ainda mais
importante para os pais reconhecer os sinais do tempo e
preparar o caminho para seus filhos ou sua família em uma
direção que estimule o desenvolvimento. Nesse sentido
também foram elaboradas as questões que se encontram no
final da maioria dos capítulos.
Quanto mais nova a criança, tanto mais claramente elas
refletem os pais e a situação familiar. Nem sempre é fácil
aceitar esse fato, que tampouco deveria ser vivido como
culpa, e sim exclusivamente no sentido de uma
responsabilidade. Trata-se de encontrar as respostas
correspondentes para o desafio de cada momento.
Uma vez que, desde o início, os pais evitam encarar a
questão da culpa, as perguntas ao final dos capítulos
especiais, dirigidas a eles, facilitam sua consulta. Por outro
lado, as perguntas formuladas em seguida representam o
fundamento em que se assentam muitas das questões
ulteriores. Talvez nem todas sejam fáceis de responder.
Quando o são, podem esclarecer muita coisa e,
eventualmente, também levar a buscar auxílio terapêutico:
 

Em que circunstâncias internas e externas e com que
sentimento nosso filho foi gerado? Ou: Como tudo
começou?

Que consequências poderiam resultar disso?

Como essas circunstâncias influenciam nosso
relacionamento um com o outro e com o nosso filho?

Como foi e é nosso relacionamento com os pais, os
nossos próprios e os do parceiro, nossos sogros?

Como convivemos com ambas as famílias e quais
conclusões tiramos dessa convivência?

Que grandes e importantes temas familiares
existiram em nossas famílias? Como eles nos
influenciam hoje? Que papel desempenham esses
temas em nossa família?

Que tabus marcaram nossas famílias de origem?
Como lidamos com esses temas hoje?

Até que ponto a atual situação familiar pode
compensar as deficiências sofridas em nossas
famílias de origem?

Como foi o nascimento do nosso filho e o que ele
poderia nos mostrar simbolicamente?

Como se passou o nosso nascimento? Existem
paralelos com o do nosso filho?

1.3 A utilização de medicamentos homeopáticos


A homeopatia clássica, que influencia este livro como
nenhuma outra filosofia – uma vez que as explicações
também são, inicialmente e sobretudo, pensadas do ponto
de vista da homeopatia –, é uma medicina particularmente
individual, o que torna difícil apresentá-la em um livro de
maneira prática. Os quadros medicamentosos e os
sintomáticos são de fácil apresentação. No entanto, ambos
fornecem apenas uma moldura; por isso, em ambos os
casos, a verdadeira terapia deve ser feita sempre de modo
individual. Uma interpretação também só pode oferecer uma
moldura, enquanto os quadros medicamentosos oferecem
muitas. Portanto, cabe aos homeopatas e psicoterapeutas
fazer com que essas molduras universalmente válidas
coincidam com a originalidade de cada indivíduo.
A medicina interpretativa nos encoraja a perguntar: “Por
que isso está acontecendo justamente comigo, justamente
desse modo, justamente agora, nessa fase da minha vida?”
E ainda: “O que o sintoma me impede de fazer, o que me
força a fazer?” A homeopatia clássica tem de fazer uma
individualização bastante diferenciada para que, nesse caso,
não se apresente nenhum tipo de pergunta típica.
Nesse sentido, sem nenhuma pretensão à precisão ou à
perfeição, as descrições dos quadros medicamentosos e as
indicações são pensadas, antes, com a finalidade de mostrar
a genialidade dessa orientação de pensamento
fundamentalmente nova, introduzida na medicina por
Samuel Hahnemann, e que muitas vezes pode substituir e
quase sempre complementar a alopatia.
Grande parte dos especialistas, tanto homeopatas quanto
pediatras da medicina acadêmica, bem como as mães, que
leram e revisaram previamente nosso manuscrito, podem
testemunhar nossa tentativa de construir uma ponte entre
essas orientações da medicina e as mães em favor das
crianças doentes.
Todos os medicamentos sugeridos neste livro devem ser
tomados na potência C30 (trigésima centesimal), diluição
comprovadamente eficaz para casos agudos. Essa potência
elevada exige uma administração correta. Medicamentos
homeopáticos não podem simplesmente ser tomados de
maneira indiscriminada. Faça sua escolha com cuidado e, se
tiver dúvidas, consulte um homeopata experiente. As tabelas
inseridas aqui ajudarão a diferenciar os medicamentos
apresentados; por isso, elas se limitam aos respectivos
sintomas característicos. Vale a pena prestar atenção
também aos sintomas emocionais, que podem ser decisivos
na escolha do medicamento correto.
Posologia: coloque dois grânulos (glóbulos) do
medicamento diretamente na língua do seu filho; em
seguida, dissolva outros dois glóbulos em um copo com água
natural usando uma espátula de madeira ou uma colher de
plástico. Faça-o beber um gole da mistura a cada dez
minutos (sempre mexendo bem antes). Assim que perceber
uma melhora, interrompa o processo! Caso haja uma piora
ou uma estagnação, continue a administrar o medicamento.
Se após duas horas não houver nenhuma reação no
sentido de uma melhora, possivelmente você terá escolhido
o medicamento errado. Verifique mais uma vez a tabela e,
eventualmente, escolha outro remédio. No sentido
homeopático, também se deve considerar uma melhora, por
exemplo, um sono (reparador) profundo ou um alívio em
nível emocional; ou seja, talvez seu filho fique mais bem-
disposto e consiga lidar sem dificuldade com as dores,
embora os sintomas físicos talvez não se tenham alterado
visivelmente.

1.4 Sobre “os riscos e os efeitos colaterais” deste


livro!
Na época moderna, o peso de educar e cuidar dos filhos em
caso de doença costuma recair com frequência cada vez
maior sobre as mães, principalmente quando solteiras.
Assim, o que em outras circunstâncias poderia trazer alegria,
logo se torna uma sobrecarga. Nesse sentido, muitas das
indicações aqui fornecidas podem agravar a situação ou
provocar um efeito parcial se a responsabilidade que, em
uma situação ideal, deveria ser compartilhada, recair sempre
em ombros que, sozinhos, não são largos o suficiente.
Porém, com uma taxa de divórcio que nos últimos 50 anos
subiu de 10% para quase 50%, são pequenas as
possibilidades de os cônjuges se tornarem avós juntos, tal
como ocorreu quando se tornaram pais. Em relação às
situações problemáticas que decorrem dessa tendência e
das famílias “patchwork”, compostas por filhos de pais
diferentes, muita coisa pode dar errado no desenvolvimento
psíquico da criança. Obviamente, isso também pode
acontecer nas chamadas famílias “saudáveis”. Em todo
caso, este livro não pretende absolutamente exacerbar o
desequilíbrio que muitas vezes surge com a distribuição
parcial da responsabilidade ou com a intervenção do
sentimento de culpa.
Por outro lado, assumimos uma posição radical, ou seja,
que busca as raízes do problema em favor das crianças
doentes. Sobretudo a fim de lhes conferir voz no caso de
doença, uma vez que muitas vezes são mal compreendidas
ou avaliadas de maneira totalmente errônea, mas de modo
algum com o intuito de atribuir culpa a alguém. Em regra, os
pais fazem o melhor que podem por seus filhos. Não
obstante, muitas vezes isso não é suficiente ou pode até ser
prejudicial. Nesse sentido, o que pode soar como atribuição
de culpa é, antes, pensado com o objetivo de corrigir, ajudar
ou questionar. Mesmo que às vezes possamos parecer
advogados das crianças doentes, queremos envolver as
mães e, de preferência, também os pais e apoiá-los em seu
esforço para fazer a melhor escolha para seus filhos por
meio de uma compreensão mais profunda do significado e
da interpretação dos sintomas. Uma grande quantidade de
sugestões e indicações comprovadas deverá fornecer
auxílios rápidos e práticos, enquanto as interpretações
muitas vezes podem deparar com reformulações mais
demoradas e, por isso, mais duradouras.
Temos plena consciência de que, com frequência e
especialmente em tempos pouco solidários no que se refere
a crianças e, sobretudo, a crianças doentes, é muito difícil
fazer tudo corretamente. Chega a ser impossível. Porém, por
outro lado, também nunca é tarde para nos prepararmos
para uma situação melhor. Nossa intenção é encorajar as
pessoas para que isso possa ser feito.
Quem se encontra em um círculo vicioso difícil de dominar
poderia, justamente, tomar como provocação indicações de
como dar mais ritmo à própria vida e à vida da criança por
meio da meditação e do tai chi. Provavelmente, mães
solteiras que, por exemplo, não encontraram uma moradia
adequada, porque são discriminadas no mercado imobiliário,
terão outras preocupações que não o yoga e o qi gong pela
manhã. A lógica de quem cede um imóvel em locação é
clara: o que lhe importa é o pagamento pontual do aluguel e
a máxima preservação do seu imóvel. Na Alemanha, as
crianças passaram a correr risco de pobreza, sobretudo
quando a mãe tem de sustentá-las sozinha. Como essas
famílias não podem ser despejadas quando se veem em
dificuldades financeiras, muitos proprietários de imóveis
preferem mantê-las a distância. Nesse caso, acontece muitas
vezes de uma das regras pensada como medida de auxílio
para proteger do despejo acabar sofrendo um efeito
bumerangue. Quando, então, a mãe não pode ir de manhã
para o trabalho do qual depende porque não pode deixar o
filho doente no jardim de infância, muitas indicações deste
livro, bem como as questões discutidas ao final de cada
capítulo, poderiam soar como provocação. Obviamente, não
é essa nossa intenção, mas, por outro lado, não queremos
renunciar à possibilidade de tornar ideais situações que já
são favoráveis.
Por natureza, interpretações de sintomas, que sempre
revelam pontos obscuros, podem facilmente ser confundidas
com atribuições de culpa, o que, no entanto, nunca é
intencional. Trata-se, antes, de responsabilidade no sentido
descrito. O fato de que os adjetivos “responsável” e
“culpado” possam ser usados como sinônimos é sintomático
e possui, igualmente, uma importância simbólica.
Obviamente, ninguém mais quer ser responsável quando
isso também significa ser “culpado”. Todavia, temos de
assumir a responsabilidade por nossos filhos – de acordo
com a lei e além dela –, pelo menos até eles aprenderem a
encontrar as próprias respostas para a vida. Não obstante,
podem-se cometer erros que, mais tarde, se revelarão como
auxílios. Como bem diz o ditado popular, “errando é que se
aprende”. Nunca é tarde para mudar o rumo e ver o futuro
com novos conhecimentos, além de agir de maneira
diferente.
As mães obrigadas a administrar situações complicadas
poderão ver nosso alinhamento sempre ao lado da criança
doente e de seus direitos primários como algo ambicioso em
relação às suas responsabilidades. Contudo, apenas
partimos do ideal para a criança doente e não podemos
influir em sua situação social nem em circunstâncias
individuais.
Se fôssemos uma sociedade mais amiga das crianças,
poderíamos dispensar muitas coisas e nos poupar de outras
terríveis. De fato, não temos a escolha de “regressar na vida
e voltar a ser crianças”, para usar as palavras da Bíblia, mas
apenas de fazê-lo em algum nível. Sempre que o nível da
consciência for negado, o corpo deve fazer-se presente no
sentido descrito em A Doença como Símbolo. No entanto,
quando o “voltar a ser criança” se reduz ao nível do corpo,
ele passa a ser chamado de “doença de Alzheimer”, um
quadro clínico contra o qual (ainda) não há ou não foi
encontrado nenhum remédio. Em sociedades menos hostis
às crianças ou até mesmo amigas delas, em que as pessoas
se preocupam cada vez mais com sua criança interior, os
números de pacientes com Alzheimer são nitidamente
menores.
O objetivo deste livro é tornar a vida mais satisfatória,
compreensível e agradável para pais e filhos, em seus
aspectos bons e naqueles desafiadores. Por outro lado, hoje
temos uma situação em que “ter filhos” deixou de ser a
coisa mais natural do mundo para se tornar uma ocasião
bastante rara, o que reserva aos poucos e cada vez mais
numerosos filhos únicos uma posição que lhes confere um
poder prejudicial no sentido descrito no livro Kleinen
Tyrannen [O Pequeno Tirano], de Jirina Prekop (ver “19.2
Bibliografia”). O culto à juventude, quase cômico em nossa
sociedade e que, em contrapartida, despreza a velhice,
contribui ainda mais para reforçar essa moda preocupante.
Uma posição de poder, em que crianças pequenas
participam de todo tipo de conversa e dominam os pais e,
especialmente, as mães, além de querer e estar autorizadas,
por exemplo, a influir na escolha do novo parceiro, não é
vantajosa para nenhuma das partes.
Nesse sentido, hoje vivemos uma polarização: de um lado,
as mães, que fazem um enorme sacrifício no que diz respeito
à sua energia vital para criar seus filhos sozinhas ou quase
sozinhas, de modo que, muitas vezes, tornam-se verdadeiras
vítimas; de outro, as crianças também se tornam vítimas,
pois há pouco tempo para elas na sociedade moderna do
turbocapitalismo, inserida na armadilha da globalização.
Quando as crianças transformam seus pais e, sobretudo,
suas mães em suas vítimas, tudo se complica ainda mais.
Contudo, na longa história da humanidade, as mães quase
sempre criaram os filhos sozinhas.
Obviamente, crianças doentes têm direito a receber
compreensão por sua situação e pela tarefa de aprender, o
que não significa que podem dispor antecipadamente de
todos os direitos do mundo. Não nos cabe aqui discutir o fato
de em certos países já poderem dirigir aos 16 anos e votar
aos 15. As experiências com essas questões podem até
combinar com uma sociedade com mania de cultuar a
juventude; porém, de modo geral, não são animadoras.
2 Fundamentos gerais

2.1 Amor como fundamento da vida


O amor, especialmente aquele da mãe, do qual se trata aqui,
torna-se o principal fundamento vital da alma de toda
criança. Somente sobre esse fundamento é que se podem
enraizar os pilares da saúde. A criança vem ao mundo – não
apenas àquele cristão – com a necessidade fundamental de
ser amada e de amar a si mesma e ao próximo.
Estamos nos referindo aqui ao amor incondicional. “Me
ame, mesmo que eu esteja sujo. Pois, se eu soubesse me
lavar, todos me amariam.” Essa frase de Fiodor Dostoiévski é
citada por Jirina Prekop em seu livro Ich halte dich fest, damit
du frei wirst [Eu te seguro para que você fique livre]. Desde
sempre, em toda parte e independentemente de serem
portadoras de deficiência ou não, todas as crianças vêm ao
mundo com essa necessidade. Quando não recebem amor,
choram e chamam a atenção com sua infelicidade em forma
de doenças psíquicas e psicossomáticas. No entanto, quando
desfrutam do amor, sentem-se felizes para se
desenvolverem livremente de acordo com suas
potencialidades.
Contudo, há também circunstâncias de vida favoráveis e
temas como os que seguem, que vão de áreas pertencentes
à ética a outras tão sólidas como os pilares da saúde.

2.2 Critérios da infância


Algumas considerações fundamentais sobre a infância
podem ajudar a compreender melhor os princípios da
interpretação dos quadros clínicos aqui apresentados. As
crianças são a base da sociedade; tudo se constrói sobre
elas. Nesse sentido, é natural preocupar-se com qual deveria
ser o objetivo da infância e com quais devem ser as tarefas
dos pais.
O que nos transforma em seres humanos, em verdadeiros
seres humanos, do modo como formulam as tradições
espirituais? Por certo, a essa transformação pertencem o
comportamento social e a disponibilidade para ajudar não
apenas, mas sobretudo, os mais fracos; a capacidade e a
prontidão para dividir e agir contra uma injustiça manifesta;
a caridade e o respeito pela vida alheia ou, segundo as
palavras de Buda, por todos os seres capazes de sentir; a
compaixão pelos mais fracos e a vontade de perdoar, mas
também a capacidade de admitir os próprios erros e a
prontidão para pedir desculpas em caso de eventuais erros
cometidos, bem como demonstrar sinceridade e gratidão por
muitas coisas, em vez de tomar tudo como natural.
Nossa ética deveria nos permitir a grandeza de não fazer
tudo que parece factível, e sim refletir sobre nossa ação
diante do pano de fundo das possíveis consequências e
transmitir valores e educação, inclusive aquela relativa ao
coração. Nosso mundo deveria ser determinado não apenas
pelo QI, mas também pelo QE (quociente emocional): trata-
se de desenvolver capacidades emocionais. Os sentimentos
têm de poder crescer e desenvolver-se, e é preciso aprender
a lidar com eles. A cultura do debate tem de ser aprendida e,
com frequência, conquistada, para que discussões justas
sejam possíveis. A coragem tem de receber oportunidades
para crescer, para que depois, convertida em ações, possa
cuidar da justiça. Igualmente importante é a coragem de, em
caso de necessidade, também nadar contra a corrente, ser
autêntico e defender as próprias convicções quando
necessário. Ideias independentes e originais não ocorrem
simplesmente, mas podem ser aprendidas; e uma de nossas
esperanças seria que este livro contribuísse para esse
aprendizado.
Uma criança está autorizada a sentir-se o centro do mundo
e abrir-se a todos os lados e a todas as opções. Se possível,
deveria brincar muito para desenvolver a própria criatividade
e seu respectivo modo de expressar-se. No interior do lar, ela
pode e deve sentir-se à vontade em suas fantasias e
estimar, na mesma medida, o mundo interior e o exterior. O
que antes era representado pelo Menino Jesus e pelo Papai
Noel hoje costuma ser representado por pequenos magos
como o “Harry Potter”. As crianças aprendem por imitação e
devem ser estimuladas nesse sentido. No entanto, os pais
são os modelos mais importantes. As crianças podem
observar o mundo com os olhos surpresos do Pequeno
Príncipe e ainda experimentar muitas coisas pela primeira
vez: desde a primeira neve, passando pela primeira mentira
até o primeiro dia de aula. Não devem assumir
responsabilidades nem justificar-se, mas estão autorizadas a
experimentar uma proteção não merecida e a contar com o
fato de serem amadas, independentemente do que fizerem –
pelo menos em nosso tempo e em nosso mundo moderno,
em que poucas crianças desempenham um papel
proeminente. O amor dos pais estabelece a autoestima e
capacita para o amor.
Pois uma coisa é certa: como nos países industrializados o
número de crianças é cada vez menor, as poucas crianças
existentes recebem um status cada vez mais exposto, que
traz consigo algumas oportunidades, mas também múltiplos
perigos. Não raro, os direitos das crianças nas modernas
famílias com um único filho ultrapassam os dos adultos. Isso
prejudica ambos os lados, mas sobretudo as crianças, que
precisam de limites e de um espaço demarcado, não
determinado por elas, pois, do contrário, esse espaço
poderia perder suas margens e, por conseguinte, fazer com
que as crianças se perdessem.
Os pequenos devem saber que os pais estão prontos para
ajudá-los e disponibilizar para eles o espaço para o
aprendizado. Contudo, eles já têm de aprender na infância a
assumir a responsabilidade por seu modo de ser e por suas
ações, de acordo com sua idade, pois, do contrário, como
poderão fazê-lo na adolescência e como adultos? A
responsabilidade tem de ser dosada com cuidado e ser
assumida de acordo com a idade. Senão, a atitude da
criança conservará a seguinte projeção: se os pais não são
os culpados, então o são os parceiros, a sociedade, o Estado
ou o destino. Quando essas estruturas infantis de
vitimização permanecem, a vida corre o risco de decorrer de
modo pueril, e a passagem para a idade adulta fica
bloqueada.
Nos primeiros anos de vida até o ingresso na escola, aos 6
anos, poderia predominar um campo de proteção em que a
criança pode crescer livremente. Esse campo seria
sobreposto por outro, relativo à educação, que transmitiria
valores acima de tudo. As crianças precisam, podem e
querem aprender cedo que não estão sozinhas no mundo,
que partilhar traz alegria, que o respeito pelos mais fracos as
fortalece e que ajudar o próximo pode fazê-las felizes. Isso é
importante sobretudo para os filhos únicos, que se tornam
cada vez mais frequentes devido à redução na taxa de
natalidade e que, ao mesmo tempo, também são sempre os
primogênitos que chegam com todos os respectivos temas –
portanto, são crianças que crescem sem modelos infantis na
própria família e que dependem ainda mais dos adultos.
Quando esse campo de proteção e educação é forte e vivo,
toda educação restante pode ser simples, pois todo
elemento construtivo e necessário é espontaneamente
compreendido pelas crianças. Precisamos reaprender quase
tudo na vida, inclusive a adoecer. É para isso que existem as
doenças infantis, como a febre. Portanto, a doença torna-se
uma parte essencial, significativa e necessária do
desenvolvimento humano.
Esses pensamentos fundamentais podem ajudar a sair dos
conceitos de “errado” e “correto”, que ferem com tanta
facilidade através de sua valoração. Não obstante, se isso
ocorrer ao longo deste livro, não é intencional e já pedimos
desculpas de antemão – até por nós mesmos, pois pedir des-
culpa também significa liberar-se da própria culpa.
Este livro pretende e deve ajudar as crianças e seus pais.
Temos aqui uma situação clássica e magnífica, em que todos
só têm a ganhar: o que faz bem às crianças e as auxilia ao
longo de sua vida costuma ser o melhor também para os
pais.
Um problema é que as assistências oferecidas dependem
da idade, e não podemos nem queremos ficar passando
dados sobre a idade porque as crianças, e não apenas os
adultos, já são seres incrivelmente individuais e originais,
contra os quais quase sempre se comete alguma injustiça
quando se tenta igualá-las. Todas as normatizações e
padronizações contêm, no mínimo, tantos perigos quantos
auxílios e evoluíram até alcançar o programa mais efetivo de
criação de empregos para médicos acadêmicos. Confiamos
na sensibilidade dos pais e, algumas vezes, também lhes
fornecemos auxílios bastante abrangentes.
Obviamente, o resultado costuma ser muito melhor não
apenas quando a família é retratada pelos seus pequenos na
figura de animais, mas também quando a obra é
interpretada por um especialista em simbologia. Todavia, por
certo, nada é melhor do que os olhos dos pais e, sobretudo,
seu coração. Pois, quem olha com os olhos do amor
dificilmente erra. A esse respeito, a raposa em O Pequeno
Príncipe diz: “[...] só se consegue ver bem com o coração. O
essencial é invisível para os olhos”. E o amor materno se
aproxima muito do amor mais elevado e celestial.
2.2.1 O afeto dos pais

A questão sobre a medida correta de afeto por parte dos pais


toca em um problema central das famílias modernas. A
multitarefa, também conhecida pelo termo inglês
“multitasking”, e que, em geral, acomete sobretudo as mães
é excessiva, deletéria e – conforme demonstraram recentes
pesquisas – não chega a ser produtiva nem eficiente.
Diante desse pano de fundo, esboçaremos aqui apenas
brevemente a concepção ideal daquilo que as crianças
precisam para crescer melhor, com base nas concepções de
Peter Lang, pedagogo waldorfiano:
 

Tanto ele quanto muitos outros que se ocuparam
intensivamente de crianças, de seu desenvolvimento
e de seus problemas colocam em primeiro lugar o
amor de que toda criança precisa e que lhe garante
a melhor posição de partida.

Em segundo lugar vem a proteção, expressa no
conceito de “ninho”.

Em terceiro lugar, Lang vê relações sociais mais
seguras.

No quarto, a necessidade de compreender o próprio
mundo.

Na quinta posição, é importante que a criança
pequena viva em seu ambiente o decorrer de ações
compreensíveis, significativas e imitáveis.

Em sexto lugar, é importante experimentar a
“maneabilidade” do mundo, ou seja, ganhar
confiança para conseguir dominar, com as próprias
forças ou com o auxílio de pessoas próximas, as
tarefas propostas.

O sétimo lugar cabe ao significado do próprio modo
de vida: a criança tem de aprender a se esforçar e a
se engajar por objetivos e projetos importantes e a
assumir a responsabilidade por eles, para que sua
vida dê certo.
2.2.2 Critérios da puberdade e da juventude como marcos deste livro

É difícil traçar uma separação entre infância e juventude.


Atualmente, mais do que nunca, pois muitas coisas impelem
as crianças cada vez mais cedo para a vida, enquanto a
verdadeira maturidade, por sua vez, costuma demorar a
chegar. Por isso, mencionaremos aqui mais alguns critérios
do início da puberdade, ainda que este não seja
especificamente nosso tema.
Os jovens precisam afastar-se da proteção da infância e,
assim, também dos pais, da família e de todas as pessoas
mais velhas. Seu principal desejo é a busca de identidade,
que passa pela associação a determinados grupos e pela
preferência por determinadas roupas, hoje chamadas de
“out-fit”. No entanto, na verdade, é óbvio que ainda não
estão fora (out) e menos ainda em forma (fit); contudo,
querem e devem sentir-se assim. Portanto, buscam uma
roupa com a qual ousam sair e se sentem em forma em
relação à própria vida.
Querem aprender a sentir o próprio corpo. Na visão dos
pais, esse aprendizado tem como pano de fundo as terríveis
automutilações, que vão desde o piercing até as
escarificações, e até mesmo o coma alcoólico desempenha
um papel.
Por intermédio do corpo, querem conhecer e aprender a
experimentar a primeira manifestação do amor sob a forma
de sua sexualidade. “Eu sou mulher”, “eu sou homem”,
esses são os temas, e os papéis devem ser praticados. Não
apenas nesse contexto, mas também nele, a
responsabilidade e as consequências para a própria vida
devem ser assumidas.
Eles querem e devem conhecer limites e aprender a
questioná-los, a fim de encontrar seus próprios limites e
harmonizá-los com aqueles da família e da sociedade. Nesse
momento, trata-se de reforçar a realidade concreta em
relação aos mundos da imaginação, de desenvolver e impor
seu próprio modo de ser, sua originalidade e sua
individualidade. Sentimentos têm de ser experimentados
através da música, do primeiro amor e das preocupações a
ele pertencentes; além disso, devem ser familiarizados com
a dor do mundo e com a tese fundamental budista de que
toda vida também é sofrimento.
Porém, depois de toda a rebeldia, também há que se
aprender a adaptar-se às condições dadas de vida e a se
tornar (mais) razoável. O grande tema da polaridade tem de
ser vivido, aceito e idealmente compreendido no mundo dos
opostos. Uma nova e grande liberdade terá de ser
experimentada, mas também há que se aprender que só se
pode dispor dela ao preço da proteção e da segurança
familiar.
A entrada na sociedade meritocrática começa a ser
traçada – com todas as suas possibilidades, suas armadilhas
e suas oportunidades.
2.2.3 Problemas sociais

A Alemanha, um dos países mais ricos do mundo, que,


aparentemente, não tem dificuldade para desembolsar
centenas de bilhões de euros para sanar as dívidas de
banqueiros levianos, não teria – segundo as declarações de
seus “proeminentes” políticos – dinheiro para jardins de
infância, creches, formação nem trabalho juvenil. Desse
modo, as crianças são as que mais estão expostas à
pobreza. Com base nesse dado, que só é aludido nesse
âmbito, surgem muitos problemas sociais, que facilmente
marginalizam as famílias e os filhos únicos.
Aqui se inicia um problema que cresce rapidamente, para
o qual neste livro não podemos oferecer quase nenhum
auxílio nem solução. Nesse sentido, a sociedade deveria
estabelecer outras prioridades. Quem investe somas
inimagináveis em uma guerra contra terroristas, que é tão
sem perspectiva quanto sem sentido, e concede bilhões a
especuladores da economia, praticamente por vontade
própria, tem outros problemas que não a preocupação com
as crianças do país. Por conseguinte, essas crianças e seus
pais ficam por conta própria e, muitas vezes, fracassam.
Em nosso tempo cada vez mais materialista, quem não
consegue vangloriar-se entre seus coetâneos das
verdadeiras roupas de marca já tem os primeiros problemas.
Quando marcas mais baratas de roupa, como a L.O.G.G., da
empresa H&M, são traduzidas como “infelizmente nasci sem
dinheiro”,[5] isso é mais do que simbólico e mostra como é
pobre, cínico e desdenhoso o julgamento de muitas mães
supostamente “em melhor situação financeira” ou também
de alguns jovens. Quando então o celular fica ultrapassado
ou é inexistente e o computador é de três anos atrás, antes
de se darem conta os jovens já estão out. Nesse caso, os
pais sofrem uma considerável pressão financeira, cuja
encenação é tão certa quanto ausente é o auxílio da
sociedade às famílias. Mesmo quem, como mãe ou pai,
reconhece os métodos por trás dessa pressão, acaba caindo
na armadilha, e as crianças vão parar na esteira dos
marginalizados, que exige muita força e coragem.
Nesse caso, resta apenas ajudar a criança a desenvolver
suas qualidades especiais, estimulando sua própria
originalidade e encorajando-a a ser como apenas uma
criança pode ser, e não como se pretende que ela seja. Disso
também faz parte aprender a brigar e a rebater
verbalmente, defender-se energicamente e impor-se quando
for importante para seguir o próprio caminho.

2.3 Três pilares da saúde


2.3.1 Alimentação
2.3.1.1 Leite materno como alimento e remédio
É o primeiro e mais valioso alimento para as crianças.
Especialmente útil é o colostro, forma mais precoce do leite
materno que é produzida logo após o parto e também é
designada como “pré-leite”. Antigamente era jogado fora,
mas hoje se conhece sua importância, que se mostra na
grande riqueza de nutrientes e anticorpos. Nesse meio-
tempo, mesmo entre médicos acadêmicos eliminaram-se
aqueles trágicos erros de pensamento que fizeram com que
se rejeitasse a amamentação por mais de duas décadas.
Crianças amamentadas têm vantagens em todos os
sentidos, vantagens essas que foram cientificamente
comprovadas até mesmo em seus filhos, ou seja, uma
geração mais tarde.
Crianças amamentadas são favorecidas não apenas do
ponto de vista físico – através do reforço do sistema
imunológico –, mas também em muitos outros aspectos. O
vínculo entre elas e a mãe pode desenvolver-se com mais
facilidade e profundidade, pois a amamentação aumenta a
produção de oxitocina, hormônio da ligação. Por sua vez,
normalmente isso gera melhores condições iniciais de vida.
Através do contato físico mais intenso, todas as vantagens
descritas anteriormente passam para a nova vida. Assim, o
leite materno é não apenas o melhor alimento no primeiro
ano de vida, mas também um excelente remédio profilático
em quase todos os sentidos.
Potencializado de acordo com as regras da homeopatia, o
leite materno também pode alcançar bons efeitos
terapêuticos. A sabedoria de Paracelso, segundo a qual para
cada enfermidade existe um remédio que pode ser
encontrado no ambiente mais próximo do enfermo, encontra
aqui sua mais bela confirmação. Mais próximo e melhor é
difícil de encontrar.
Segundo seu quadro farmacêutico e as regras da
homeopatia aplicadas individualmente, o medicamento
homeopático Lac humanum também pode ajudar. No
entanto, em caso de coriza, o leite materno normal também
pode tornar-se um medicamento quando pingado no nariz.
Ainda vamos deparar com ele várias vezes nas dicas ao final
de diferentes capítulos.
Mesmo o leite precoce de vaca, também chamado de
“colostro”, é um remédio especial e pode, por exemplo, ter
resultados surpreendentes em crianças com dermatite
atópica. Hoje ele pode ser encontrado com excelente
qualidade biológica.[6]
2.3.1.2 A alimentação infantil
No que se refere à alimentação, vale para as crianças o
mesmo que para os adultos. O primeiro dos quatro pilares da
alimentação saudável é o alimento adequado à espécie.
Como onívoro com forte orientação vegetariana, o ser
humano deveria obter metade das suas calorias de
carboidratos, enquanto a outra metade fica por conta da
proteína e da gordura. Para a maioria dos nossos
contemporâneos, isso significa reduzir a gordura e a proteína
animal em favor dos carboidratos.
O segundo pilar requer um alimento integral,
simplesmente porque nos milhões de anos da nossa
evolução não aprendemos nada além disso. Para as crianças,
esse aspecto é ainda mais importante, pois elas não apenas
precisam manter o organismo, como os adultos, mas
também construí-los a partir do zero. Para tanto, obviamente
necessitam dos melhores nutrientes, que só podem ser
obtidos através de alimentos integrais, se possível frescos.
O seguinte episódio, presenciado por uma participante do
meu curso que trabalha em uma loja de produtos orgânicos,
dá uma ideia clara do ponto a que chegamos quanto a esse
assunto: uma dona de casa chega à loja com uma sacola de
plástico cheia de verduras e deixa a sacola no caixa para ir
pegar duas cenouras orgânicas e um pé de alface. Quando a
moça do caixa lhe pergunta por que ela havia comprado
tanta verdura no supermercado e, naquele momento, estava
levando tão pouca coisa saudável, ela respondeu: “Ah, isto
que estou levando agora é para os coelhinhos das crianças;
senão eles morrem...”
Para desenvolver as defesas do organismo da criança e
manter sua saúde, é necessária a ingestão de alimentos
integrais. A todos os produtos refinados sempre falta uma
parte de seu todo. Por isso, alimentos refinados sempre
requerem uma compensação. Crianças nutridas com
alimentos integrais dispõem fundamentalmente de uma
base mais equilibrada e conseguem encontrar seu centro.
O terceiro pilar seria a alimentação adequada ao próprio
tipo constitucional. Com um teste simples, como o descrito
no livro Richtig essen [Comer Corretamente], em poucos
minutos é possível descobrir o próprio tipo e, dependendo de
qual for, suprir-se de alimentos que refresquem, aqueçam ou
sejam neutros. Este é um ponto bastante essencial, por
exemplo, no caso das chamadas crianças com TDAH, que,
além do tratamento com homeopatia clássica e um
adequado programa de exercícios físicos e mentais, devem,
necessariamente, ter o excesso de nível de energia reduzido
através de uma alimentação refrescante.
Quando as exigências desses três pilares básicos da
alimentação são respeitadas, geralmente a quarta, aquela
do equilíbrio entre ácido e base, resulta por si só. Quem
cobre metade das suas calorias com carboidratos integrais
abastece com suficiência as partes alcalinas através de
elevadas porções de frutas e verduras.
Quase como quinto pilar, a bebida também é importante.
A água é um alimento decisivo e a base de todas as bebidas.
Ao mesmo tempo, também é nossa bebida mais importante,
e as crianças devem “desfrutar” dela com abundância;
portanto, dependendo da quantidade adicional de fruta e
vegetais crus, deve beber de um a dois litros por dia.
Contudo, se já não é fácil convencer as crianças a beber
água pura, menos ainda é fazer com que “desfrutem” dela.
Sucos de fruta diluídos em bastante água seriam uma
substituição possível. Limonadas feitas em casa também
seriam uma alternativa: um pouco de suco de limão ou de
laranja com mel ou, melhor ainda, estévia, um adoçante tão
natural quanto inofensivo de uma pequena planta. A maioria
das crianças gosta de experimentar; assim, por exemplo, um
chá gelado, preparado com ervas frescas e bagas,
rapidamente se torna uma atração competitiva.
Devido ao açúcar, deve-se evitar rigorosamente dar
refrigerante para crianças, pois eles prejudicam não apenas
os dentes e o sistema ósseo, mas também a saúde como um
todo. Por essa razão, hoje existem as versões “light” com
adoçante, que provavelmente são ainda menos saudáveis
por causa de substâncias como aspartame, entre outras. Um
adoçante natural e inofensivo seria a já mencionada estévia
vegetal.
Contudo, apesar de todas as vantagens da alimentação
saudável, deveríamos evitar transferir nossos medos ou
nossas ideologias para as crianças no que diz respeito à
alimentação saudável ou não. Uma boa dose de flexibilidade
e confiança, mostrando que o corpo também é capaz de lidar
com certa porção de “venenos”, seria útil. Provavelmente,
ele até precisa desse conflito, tal como dos vírus e das
bactérias. Precisamos de uma vida inteira para aprender a
integrar e encontrar o equilíbrio correto. Cada criança tem
suas peculiaridades, e cada nova fase da vida exige uma
nova orientação e novos critérios – desde o tamanho dos
sapatos até o estilo de vida de modo geral.
Assim, nos primeiros anos de vida, uma alimentação
saudável é ainda mais importante do que mais tarde.
Quando as crianças começam a ir para a escola, ocorre um
relaxamento forçado das regras de alimentação, uma vez
que elas dificilmente conseguem resistir ao espaço dado às
comidas prontas, solidamente ancorado na consciência da
população pela indústria da junk food. No entanto, quando
uma base saudável é instalada, o organismo consegue
tolerar esse campo com mais facilidade. Não obstante, no
que se refere à saúde das crianças, bem como aos custos do
sistema de saúde, seria útil se esse campo fosse reelaborado
e, na idade em que ocorre uma avalanche de casos de
obesidade e diabete tipo 2, a alimentação saudável se
tornasse uma matéria escolar.
2.3.1.3 Outras dicas de alimentação para uma vida saudável
Para a medicina tradicional chinesa, hoje como no passado,
uma refeição regular e quente durante o dia é
extremamente importante, tanto quanto um cardápio
elaborado de acordo com a estação do ano. Na época de
nossos avós, esses fatores também eram levados em conta,
bem como a presença de toda a família à mesa e uma boa
atmosfera durante a refeição. Embora hoje o espírito da
época exija uma atitude diferente, o valor de uma posição
como essa durante a refeição ainda é muito grande.
À situação atual correspondem, antes, as seguintes
medidas, sobretudo porque elas se tornaram possíveis
graças a novos conhecimentos científicos. Para que o
organismo da criança (e do adulto) possa produzir uma
quantidade suficiente de hormônio do crescimento, deve-se
evitar comer, ou mesmo beliscar, após o jantar. Somente
quando o café da manhã for realmente um breakfast, como
dizem os anglo-saxões, ou seja, quando se quebrar um jejum
de pelo menos 12 horas, é que o crescimento pode se
realizar durante a noite com base no relativo HGH (Human
Growth Hormone ou Hormônio do Crescimento Humano).
Além disso, seria útil se o quarto da criança estivesse livre
de radiação eletromagnética e permanecesse realmente no
escuro. Além do crescimento, o HGH é responsável por um
estado de espírito criativo, bem-disposto e até alegre, que
anima a encarar a vida. Esse estado de espírito também é
conhecido como euforia do jejum, nos períodos em que é
praticado.
Outro truque do hormônio refere-se à serotonina ou
hormônio do bem-estar, formado a partir do aminoácido L-
triptofano e que, por sua vez, é o estágio anterior da
melatonina, o hormônio noturno. Nossos antepassados, que
eram obrigados a se deslocar muito para obter escassos
alimentos crus, já dispunham desse hormônio. É provável
que se arrastassem pelo território, mastigando quase sem
parar o que conseguiam apanhar de plantas comestíveis,
obviamente cruas. Hoje, é muito difícil reproduzir esse modo
de vida. Quem vai querer praticar jogging, mastigando sem
parar algum vegetal cru e mantendo o nível de oxigênio em
equilíbrio?
Atualmente, uma variante simples de vegetais crus
triturados em fibras finas e conhecida como Aminas,[7] que,
além de tudo, não custa caro, pode nos ajudar nesse
sentido. Graças à mistura de vegetais, essa variante contém
o L-triptofano, estágio anterior da serotonina, que nossos
antepassados buscavam consumir diariamente, e, por ser
triturada em fibras finas, substitui a mastigação sem fim.
Portanto, não se trata absolutamente de uma
complementação alimentar, mas apenas de um alimento em
uma composição especial.
Contudo, para que a combinação funcione, é necessário
considerar mais um fator na ingestão, pois, do ponto de vista
bioquímico, não é muito fácil fazer com que o aminoácido L-
triptofano chegue ao cérebro, onde ele mais falta a nós,
homens modernos. Desse modo, meia hora antes de toda
refeição, deve-se tomar em jejum uma colher de sopa dessa
mistura diluída em um pouco de suco e, em seguida, um
copo cheio d’água ou, melhor ainda, dois em seguida. A
água garante que a mistura seja enxaguada em todo o
estômago, e o jejum, que o aminoácido L-triptofano passe
sem impedimentos pela barreira hematoencefálica.[8]
Somente assim se consegue alcançar como resultado uma
disposição melhor, um sono melhor e uma pele melhor
depois de um longo tempo de uso das Aminas. Como
adoçante, mostrou-se eficaz acrescentar uma colher de chá
de mel à mistura.
Informações mais detalhadas sobre esses truques
hormonais, mas também sobre os pilares da alimentação
saudável, você encontra no livro Richtig essen [Comer
Corretamente], e receitas com dados sobre ingredientes, o
teor ácido-base e o efeito térmico no livro Vom Essen,
Trinken und Leben [Sobre Comer, Beber e Viver].
2.3.1.4 A alimentação da criança doente
A regra mais importante diz: “Não obrigue ninguém a
comer” – muito menos ainda uma criança doente. Em casos
de febre, mas também com outros sintomas, muitas vezes
sente-se uma necessidade natural de jejuar, que também
pode ser tolerada por crianças. O jejum alivia em muito o
intestino, que, do contrário, consome uma parte
considerável de energia no trabalho de digestão. No jejum, a
digestão fica livre para as finalidades de regeneração e cura.
Deve-se dar à criança essa oportunidade caso ela demonstre
tal necessidade. Quanto mais um ser reage de modo
intuitivo em caso de doença, mais ele tende a recusar
alimento, a fim de ter à disposição todas as suas energias
para o restabelecimento. Nesse sentido, a carência de
alimento também é frequente em animais doentes, que
ainda vivem de acordo com a natureza.
2.3.2 Movimento

Para as crianças, o movimento é algo natural e,


antigamente, quase não era levado em conta. Pelo menos os
rapazes mostravam um condicionamento sólido quando
frequentavam a escola. Entre as moças da classe média,
geralmente educadas para dançar nos “bailes”, essa
condição já era menos garantida. Hoje, as crianças,
sobretudo as que vivem nas cidades, onde dispõem de
pouco espaço para correr e brincar, apresentam sintomas de
inatividade física, que vão desde um condicionamento ruim
até problemas de postura.
Entre as crianças, os movimentos também contêm uma
simbologia de fácil compreensão. As semelhanças com a
vida são evidentes. Geralmente, aqueles que desde o início
se movimentam muito também são os que, na vida,
movimentam alguma coisa. Se com as crianças treinamos,
por exemplo, a saltar barreiras, a atravessar valas ou a
equilibrar-se, além do aspecto do movimento, esses
exercícios também possuem um significado simbólico, que
seria o de testar sua coragem, superar obstáculos, não se
deixar abater por depressões profundas, bem como a
capacidade para manter seu equilíbrio interior. Contudo, o
aspecto mais importante no movimento é o “fator prazer”.
Quem cria os filhos em um ambiente tão inatural quanto
uma cidade grande deveria cuidar ativamente de seu
programa de exercícios físicos, para mais tarde não ter de se
preocupar com jovens que sofrem dos típicos problemas do
sedentarismo, como sobrepeso, diabete tipo 2 e postura
física anormal. O mais simples seria fazer com que
corressem e brincassem com crianças da mesma idade. Mas
é claro que os pais, que também carecem de exercícios por
causa de sua vida profissional moderna, também podem
levá-las junto para fazer jogging e caminhadas. Contudo, na
melhor das hipóteses, o resultado seria uma compensação
cansativa. Férias adequadamente movimentadas tampouco
são suficientes – se já não o são para os adultos, menos
ainda o são para as crianças. Além de seus efeitos benéficos,
programas de exercícios divertidos, como a ginástica
consciente, poderiam proporcionar prazer e estimular a
coordenação, a flexibilidade e até a inteligência da criança.
Você encontrará mais informações sobre esse assunto no
livro Das Gesundheitsprogramm[9]. Um exercício simples
pode dar uma ideia de como funciona. Com uma mão,
desenha-se o número oito no ar e, ao mesmo tempo, com a
outra, o número oito no plano horizontal. No início é difícil,
mas assim que a criança aprende o exercício, os efeitos
chegam a ser incríveis. Depois que realiza esse exercício, ela
pode passar para o próximo, que é desenhar um triângulo
com uma mão e um círculo no ar com a outra. Assim, com o
tempo, podem-se acrescentar exercícios com os pés ou
passar para malabarismos, que oferecem uma multiplicidade
de variantes e que, do mesmo modo, desdobram seus
efeitos benéficos – sobretudo quando ainda não tiverem sido
dominadas. Outro bom resultado desses exercícios é que,
depois de no máximo 90 minutos de concentração mental,
eles representam uma interrupção ideal. Em seguida, o
trabalho mental pode ser realizado novamente com uma
visível melhora. Em relação às crianças, existe a vantagem
de que a maioria delas se diverte ao praticá-los. Outra
vantagem é que, com esses exercícios simples, aos quais no
início não se dava muito crédito, se aciona um
desenvolvimento que amplia a consciência.
2.3.3 Relaxamento

Em uma época em que a pressa é sentida em toda parte, já


na infância o relaxamento recebe um lugar de destaque. A
vida começa com muitas horas de sono, que somente aos
poucos vão sendo reduzidas. Seria ideal que a sesta, ainda
comum entre crianças pequenas, fosse mantida ao longo de
toda a vida. Estudos de universidades americanas
comprovam, de maneira bastante impressionante, o quanto
uma sesta ou, melhor ainda, um bom relaxamento depois do
almoço levam a uma profunda regeneração e dão mais
energia para enfrentar o período da tarde. Se os pais
também participassem, o descanso dos filhos depois do
almoço ficaria mais fácil, e os pais poderiam ter mais energia
para acompanhá-los. Assim, à noite, pais totalmente
esgotados não precisariam tentar “embalar” crianças
despertas. Não é raro que depois a criança volte e chame a
mãe para dizer que o pai conseguiu dormir. Se uma criança
se cansar durante o dia, ela não custará a pegar no sono à
noite, como naturalmente também acontece com os adultos
em situação semelhante. Pais habilidosos estimulam o sono
dos filhos contando histórias antes de eles dormirem ou
conduzindo-os à meditação.
Na maioria das vezes, mantras cantados em forma de
ritual são excelentes para acalmar e relaxar rapidamente
crianças e adultos. Graças aos sons familiares e repetitivos,
adultos e crianças entram naturalmente primeiro em um
ritmo respiratório tranquilo e, depois, costumam adormecer
sem dificuldade.
Atualmente, o desafio dos pais é fazer com que os filhos se
cansem mental e fisicamente para que tenham uma noite
boa e inteira de sono.
Contudo, apesar de todos os esforços, são poucas as
crianças acima de 4 anos que conseguem dormir
regularmente depois do almoço. Antes que os pais se
envolvam em discussões constantes, é melhor motivar as
crianças a ver ou ler livros em silêncio, a concentrar-se em
uma brincadeira ou ouvir um CD de contos de fadas ou de
meditação. Quando o sono se instala sozinho, o objetivo terá
sido alcançado; quando isso não ocorre, um período de
repouso também é normal. Do contrário, surge aqui uma
disputa quase impossível de vencer a longo prazo, com o
risco de se condicionar, já na juventude, o sono ou o
adormecimento como um problema.
Quando estão agitadas, as crianças, assim como os
adultos, precisam de períodos de tranquilidade e voltar à
rotina. O símbolo do tai-chi exemplifica esse modelo. O
período noturno, com suas fases do sonho e as ondas
cerebrais beta em ação, é representado pelo ponto branco
no campo preto do yin; para o período do dia, seria
necessário um descanso após o almoço ou uma meditação
correspondente que marcasse o ponto preto no campo
branco do yang.
O ideal é que a criança não se esqueça de manter o
repouso após o almoço, assim como não deveria desistir de
sonhar nem de entrar cedo em contato com suas imagens
anímicas, contato esse que, inicialmente, talvez lhe
proporcione o acesso a seu anjo da guarda ou a seu animal
aliado e, mais tarde, a seu médico e à sua voz interiores,
que, ao longo de uma vida espiritualmente plena, possa
converter-se na voz de Deus.

2.4 Contato físico como base da vida


2.4.1 Desenvolvimento da inteligência e contato físico

De quanto contato físico o bebê precisa? Essa pergunta


acaba se traduzindo em quanto uma criança poderá se
tornar inteligente e capaz de amar, pois um contato físico
desde cedo estimula não apenas o desenvolvimento da
capacidade de amar, mas também a inteligência. Essa
dimensão pode até surpreender; no entanto, é comprovada
cientificamente. Todo toque estabelece estímulos que são
respondidos pelos nervos, uma vez que novas ligações
nervosas são criadas. A ligação complexa de vários milhões
de células nervosas é outra medida objetiva para a
inteligência. Nesse sentido, o número herdado de nervos e
gânglios é menos decisivo do que suas ligações entre si. Na
era do computador, isso é fácil de entender. Obviamente,
quem tem a maioria das calculadoras não é o que está mais
bem informado, e sim aquele que, com uma única máquina,
é capaz de produzir a maioria das ligações e combinações,
que entra na rede e “participa on-line”. Porém, é claro que
inteligência é apenas um aspecto da importância do contato
físico.
2.4.2 A criança imatura

Por que a criança precisa de tanto contato? Em sua


fundamentação, Jirina Prekop apoia-se nas pesquisas de
antropólogos e biólogos, que partem do princípio de que as
crianças, à diferença de todos os outros mamíferos, em geral
nascem precocemente. Tal como o canguru, que durante
muito tempo ainda carrega seu filhote na bolsa que tem no
ventre, as mães humanas são convocadas a possibilitar um
período mais longo de amadurecimento posterior. Para
atingir o amadurecimento, a criança teria de ser carregada
por cerca de dez meses no ventre da mãe. Mas então por
que ocorre o nascimento precoce justamente com os
humanos, que, ao que parece, desenvolvem e cultivam bens
supremos, como o amor, a ética e a linguagem? Teria o
Criador talvez errado a conta nesse caso? Ao contrário, pois
é justamente nesse ponto que se codifica a sabedoria da
criação. Para que o ser humano aprenda a sentir empatia e a
colocar-se no lugar do outro como condição para sua
capacidade de amar, ele teria de vivenciá-la não apenas no
ventre materno por meio do diálogo do toque com a mãe (e
o útero), mas também após o nascimento.
No entanto, o que acontece no útero já é fascinante o
suficiente. No fundo, nas últimas semanas de gravidez, a
criança é mantida de tal maneira no ventre materno que já
não consegue mudar de posição. Em compensação, ela
sente todo carinho feito pela mãe como resposta a seus
movimentos. Essa posição pré-natal em que é mantida
transmite uma espécie de proteção e de confiança primitivas
após as primeiras semanas de gravidez. Na livre suspensão
em que fica no útero, o bebê vive a situação ideal de
experiências extáticas de unidade e se sente em união com
o mundo, tal como comprovaram as pesquisas de Stanislav
Grof e nossas experiências desenvolvidas ao longo de trinta
anos com a terapia da reencarnação.
Entretanto, nem sempre o diálogo do toque no último terço
da gravidez é suficiente. Outros sentidos também devem
participar da percepção mútua. No ventre materno, eles são
percebidos apenas parcialmente. Embora a criança consiga
ouvir a voz da mãe, ela própria não é ouvida. Pode sentir o
cheiro da mãe, mas não pode ter seu cheiro sentido por ela.
Ambas ainda não podem se ver. Para viver a empatia com
todos os sentidos, a criança vem ao mundo o mais cedo
possível. Nesse momento, tanto na mãe quanto na criança
são despertados os neurônios-espelho, ou seja, aquelas
condições, também descobertas pela ciência, para que mãe
e filho se ajustem reciprocamente. Esses neurônios-espelho
fazem com que a mãe imite todo som e toda manifestação
mímica emitidos pelo filho. Como consequência, num caso
ideal, ambos ainda permanecem no mínimo mais dez meses
em contato simbiótico após o nascimento. A condição básica
para que isso aconteça é que, depois do parto, o bebê seja
colocado junto ao coração da mãe ainda sem ter sido lavado
e com o cordão umbilical pulsando. Essa união íntima
sobrevive de modo totalmente natural e praticável quando a
mãe mantém e carrega com frequência o filho no canguru,
tal como desde sempre e por toda parte fazem as pessoas
de círculos culturais ligados à natureza e conforme foi
introduzido na pediatria pela médica austríaca Marina
Marcovich com o “método canguru”.
Além disso, aparentemente o plano da criação prevê que
os seres humanos e seus filhos pertençam à espécie
biológica dos primatas, ou seja, dos filhotes que são
carregados. Assim, no mundo ainda ligado à natureza, até o
segundo ou terceiro ano de vida, as crianças ainda são
carregadas junto ao corpo da mãe ou por outras pessoas de
seu parentesco. Contudo, o sentido não está no ato de
carregar em si, mas nas experiências emocionais
transmitidas com esse ato. A criança recebe continuamente
calor, dedicação, proteção e amor incondicional. Pois é
carregada e suportada em toda situação, mesmo quando
fica irritada. O canguru impede tanto a fuga quanto ataques
brutais.
Um exemplo pode explicar isso melhor: quando o filho de
uma mãe esquimó fica com raiva dela, porque na geleira ela
não pode lhe dar liberdade de movimento nem o peito, ele
pode expressar sua raiva gritando e não será punido por
isso. Ambos se beneficiam de seu confronto emocional. Cada
um está autorizado a expressar livremente seus sentimentos
feridos de ventre para ventre, de coração para coração e de
rosto para rosto. Na situação ideal, conseguem sentir-se no
lugar do outro e renovar seu amor. A essas reações – que,
como bem sabemos hoje, são determinadas pelos hormônios
–, tanto a criança quanto a mãe tendem a reagir da mesma
maneira.
O que a criança aprendeu e fixou em seu cérebro jovem
como experiência fundamental também a ajudará mais
tarde, quando ela não conseguir dominar um conflito através
da linguagem. Por certo, não mais através do canguru, e sim
por causa de sua consciência, ela não se permitirá fugir e,
em vez disso, se recolherá em seu refúgio interior, a fim de
confrontar sua dor e se reconciliar. Uma experiência
bastante semelhante, vivida com o próprio marido, tornou-se
crucial para Jirina Prekop, pois a fez compreender o sentido
do abraço e, a partir disso, desenvolver uma terapia
especializada.
Muita coisa está relacionada ao contato físico, como a
capacidade que surge mais tarde de sentir prazer sensorial.
Esse prazer facilita a aceitação do amor, fazendo com que a
pessoa se abra para ele e o receba bem. Por isso, muitas
pessoas – sobretudo mulheres – não se dão muito bem com
ele. A razão para tanto poderia estar no fato de que as
meninas são menos tocadas por suas mães do que os
meninos, conforme mostrou um estudo. Infelizmente, o tema
“contato físico e capacidade posterior para amar” em uma
sociedade que, comparativamente, se interessa pouco pelo
amor, também é bem menos pesquisado do ponto de vista
científico do que o nexo com a inteligência. Por outro lado, é
evidente que a pele tem mais a ver com o sentimento de
amor do que com a inteligência. Tudo leva a crer que nossa
capacidade para receber amor e de desfrutá-lo é melhorada
com contatos físicos intensos e precoces, que simplificam o
acesso ao amor e estimulam a coragem de desfrutar mais
tarde do amor físico.
Sabemos da existência de povos primitivos que conservam
o contato físico com os filhos carregando-os sempre junto ao
corpo. Desse modo, é formada a base para uma consciência
ilimitada do direito de existir, que se exprime em uma
maravilhosa “capacidade de ser feliz”. Provavelmente,
muitas das causas do sofrimento físico e psíquico residem no
fato de que nossa civilização já não conhece esse contato
corporal contínuo ou o interrompeu por períodos muito
longos. Esta poderia ser uma das pedras fundamentais
assentadas já na infância para que muitas pessoas passem a
vida toda à procura de sua razão de ser e a terminem em um
vício (mais detalhes a respeito desse assunto você encontra
no livro de Jean Liedloff, Auf der Suche nach dem verlorenen
Glück [Em Busca da Felicidade Perdida]).
De todo modo, a maioria das pessoas sempre sonha em
receber amor e encontrar o grande amor. A infinita
dificuldade de muitas pessoas para recebê-lo e encontrá-lo
poderia ter como causa o fato de nunca terem aprendido
direito a aceitar demonstrações de amor. Entretanto, o
aprendizado precoce da criança passa praticamente de
maneira exclusiva pelas experiências sensoriais da pele e
das mucosas. Quanto mais pegarmos e “apertarmos” a
criança desde cedo, tanto mais ela será exigida e
estimulada, e mais prazeroso poderá ser seu
desenvolvimento nesse campo.
Em nossa “sociedade Maxi-Cosi”,[10] que tem especial
prazer em colocar as crianças em assentos de plástico em
forma de concha, facilmente transportáveis, as crianças são
sentadas ou afastadas muito cedo. Embora sempre estejam
por perto, no período inicial não conseguem aprender muito
através dos olhos e do olhar como através do toque e da
sensação, que no “sistema compacto Maxi-Cosi” é impedido
ao máximo.
2.4.3 Contato físico e amamentação

Atualmente, diversos estudos mostram como a


amamentação é importante para a criança e a mãe. Eis por
que até mesmo os médicos acadêmicos, que durante vinte
anos a rejeitaram e impediram devido a substâncias nocivas
no leite materno, voltam a recomendá-la. Sua composição
ideal é um fator seguro para as crianças. Por outro lado, se
hoje o leite materno de fato possui tantas substâncias
nocivas, ele não poderia simplesmente ser extraído e jogado
fora, e sim, por lei, ser depositado em um reservatório
especial. Se os estudos sempre demonstraram que, não
obstante, amamentar é muito melhor do que dar
mamadeira, a razão fundamental também tem a ver com o
fator do contato físico. Com efeito, do seio materno, os
recém-nascidos recebem não apenas calorias e substâncias
nocivas, mas também amor materno, e isso lhes dá
vantagens decisivas (para sua vida) em relação a crianças
que recebem mamadeira.
Além disso, por meio da amamentação e da sucção no
mamilo materno, é estimulada a produção de oxitocina na
mãe. Essa substância, nesse meio-tempo reconhecida como
“hormônio de ligação”, tem grande participação no
desenvolvimento do amor materno e na profunda ligação
entre mãe e filho.
2.4.4 Terapia através da pele

A pele também é o mapa ou o espelho de nossa alma. A


reflexologia esclarece o quanto o interior se reflete no
exterior. Assim, na sola dos pés vemos novamente
reproduzida a pessoa como um todo, tal como na orelha, nas
mãos e ao longo da coluna vertebral. A medicina acadêmica
também tem sua própria reflexologia nas chamadas zonas
de Head, que ela não desenvolveu nem aperfeiçoou. Isso
significa que, através da pele, podemos entrar em contato
com os órgãos internos e, quando isso ocorre com amor, os
órgãos têm seu desenvolvimento estimulado.
O psicanalista Alexander Mitscherlich diz em seu livro
Krankheit als Konflikt [A Doença como Conflito] que, se
subtrairmos a consciência de um órgão, ele adoece do ponto
de vista psicossomático. Todavia, o toque sempre irá
direcionar consciência aos locais tocados, possuindo,
portanto, segundo essa lógica psicanalítica, propriedades de
cura. Além disso, o toque da mão materna poderia gerar
verdadeiros milagres e, em todo caso, acalmar em grande
medida. Quem costuma fazer carinho no próprio filho, se
possível em todo o corpo, estimula seu desenvolvimento e,
além da pele, provê todo o mundo interior de estímulo e
afeto. Esta poderia ser uma das razões pelas quais as
crianças gostam tanto de fazer carinho, por exemplo, em
animais. No zoológico, elas se interessam, sobretudo, pelos
animais “comuns” que podem ser acariciados. Mas também
sua paixão por fazer cócegas umas nas outras também
poderia ser explicada como desejo por contato físico. Elas
adoram o contato com cães e gatos e permitem que estes –
apesar dos grandes temores das mães modernas – se
aproximem bastante delas, até mesmo de seu rosto.
Nos últimos tempos, os recém-nascidos chegam a ser bem
“embrulhados”, para que consigam ter uma percepção
melhor do próprio corpo e sentir-se amparados. Outra
incrível possibilidade nos foi transmitida por Frédérick
Leboyer, o reformador da obstetrícia moderna: massagear o
bebê com óleo aquecido, a partir da antiga tradição indiana.
Felizmente, esse recurso tem se tornado cada vez mais
popular entre nós. Quem já teve a oportunidade de ver a
carinha de felicidade dos pequenos quando são
massageados irá entender muito melhor o que queremos
dizer.
Nas unidades americanas de bebês prematuros,
comprovou-se que as crianças que eram afagadas na
incubadora tinham visivelmente mais chances de
sobrevivência do que aquelas que só eram tratadas com a
melhor técnica. A partir dessa conclusão, desenvolveu-se a
profissão – tipicamente americana – do chamado baby-
handler, cuja tarefa é “tocar” (do inglês to handle) recém-
nascidos que estão em incubadoras, transmitindo-lhes afeto
através das mãos. Igualmente típica é a falta de uma
pesquisa para saber se o afeto dos próprios pais daria
resultados ainda melhores. Em geral, os baby-handler são
aposentados que, desse modo, ganham um dinheiro a mais
para afagar recém-nascidos, já que, aparentemente, para
essa atividade, ninguém mais no mundo moderno tem
tempo, menos ainda os pais, cujo filho “funciona” tão mal
que precisa permanecer na incubadora. Na verdade, só de
pensar na necessidade de contratar aposentados para fazer
carinho no próprio recém-nascido já deveria fazer o alarme
soar...
2.4.5 O “método canguru”

A já mencionada neonatologista austríaca Marina Marcovich


deu um grande passo na direção correta com o “método
canguru”. Ela substituiu a incubadora pela própria mãe e fez
com que esta carregasse o filho junto ao próprio corpo, em
uma espécie de bolsa, tal como os cangurus e outros marsu-
piais. Os resultados se mostraram muito melhores do que
todas as possibilidades das incubadoras, e o método foi
adotado em quase todas as partes do mundo. Apenas na
Áustria demorou anos para que a corajosa médica
encontrasse reconhecimento.
A observação das populações arcaicas, que erroneamente
chamamos de “primitivas”, já poderia nos ter levado a essa
pista. Em quase todos os povos que até hoje vivem próximos
da natureza, as mães amarram panos na barriga ou nas
costas para carregar seus filhos, o que parece fazer bem a
ambos. Como efeito colateral, esse método também impede
o fiasco difundido na Europa Central, referente à criação de
hábitos de higiene, que gerou personalidades compulsivas
em grande estilo. Quando as crianças precisam fazer suas
necessidades, as mães indígenas as tiram do canguru,
dispensando todo o aparato de fraldas e faixas. As crianças
ficam limpas desde o início e, nesse sentido, não precisam
treinar nem condicionar o esfíncter como entre nós. Quando
um missionário viu pela primeira vez uma mãe dessas
segurando o bebê na barriga, perguntou-lhe –
provavelmente preocupado com as questões de higiene –
como ela fazia para saber quando a criança estava
“apertada”. Surpresa, a mãe teria respondido com outra
pergunta: como ele fazia para saber quando estava
“apertado”. Além disso, essa circunstância mostra quão
estreito se torna o vínculo entre mãe e filho nesse método
de contato físico. Ela sente a necessidade da criança como
se fosse sua própria – de modo totalmente semelhante à
época em que o bebê ainda flutuava no líquido amniótico em
seu ventre.
Há muito tempo, os panos amarrados no corpo da mãe
para carregar o bebê saíram das lojas do terceiro mundo
para conquistar o primeiro. Obviamente, logo foram
desenvolvidos modelos caros como o canguru “Snugli”, que
na Alemanha é vendido por preços relativamente altos.
Contudo, o erro decisivo em tudo isso foi a possibilidade que
surgiu com esses cangurus de evitar o contato com a pele.
Era justamente nesse contato que residia a vantagem desse
modo de cuidar das crianças. No “método canguru”, ele
também é o ponto crucial. Na maioria das vezes,
apresentam-se a temperatura e problemas de higiene como
argumentos principais contra o contato com a pele. Desse
modo, tudo é devidamente racionalizado, até o verdadeiro
efeito essencial desaparecer. As mães que confiam (e
acreditam) no método primitivo dão um enorme presente a
seus filhos, um presente cuja profundidade e cuja extensão
geralmente só se manifesta de fato mais tarde na vida. É
particularmente significativo o fato de que, em Bali, não se
ouvem crianças gritar. A razão poderia estar no fato de que
as balinesas partem do princípio de que, até os 2 anos de
idade, a criança não deve tocar o chão, pois ainda seria um
ser muito celestial. Por isso, as crianças são sempre
carregadas pela mãe ou por um irmão mais velho.
Por certo, não se pode simplesmente transferir um hábito
como esse para nossa cultura, considerando-se também que
uma criança que goste da liberdade sofreria com o excesso
de proximidade. Nesse contexto, por certo seria ideal se os
pais tivessem uma ideia fundamental do modelo de vida de
seu filho. Nesse sentido, pode ser útil a astrologia psicológica
que o psicanalista Fritz Riemann, autor de Grundformen der
Angst [Formas Fundamentais do Medo], tentou introduzir, já
em 1977, na medicina com seu livro Lebenshilfe Astrologie
[O Aconselhamento da Astrologia]. Provavelmente, ambas as
coisas são importantes: por um lado, a proximidade,
transmitida pelo contato físico, e, por outro, o apoio ao
desejo precoce de movimento e conquista, que também
contribui de maneira essencial para o desenvolvimento do
cérebro, para uma boa coordenação motora e para uma
ulterior autonomia. Além disso, as experiências sensoriais
através da sola dos pés, como a coordenação motora ao
engatinhar, são muito importantes.
Portanto, nesse sentido, muito cedo os pais serão
confrontados com a polaridade entre segurança e liberdade,
que persiste durante a vida inteira. Em seu livro Die Furcht
vor der Freiheit [O Medo da Liberdade], Erich Fromm já
apontava para esse conflito do ser humano.
2.4.6 Do Reiki ao Deeksha – imposição das mãos e bênção

A imposição das mãos tem efeitos curativos, segundo nos


descrevem as curas bíblicas de nossa tradição. O fato de a
enfermeira norte-americana Dolores Krieger poder ter
comemorado um sucesso tão grande e cientificamente
comprovado com sua abordagem sobre o therapeutic touch
[toque terapêutico] deve-se simplesmente ao efeito curativo
do contato físico. Ela encorajou as enfermeiras a tocar mais
os pacientes.
Hoje, no cenário espiritual, temos sistemas mais
elaborados, como o Reiki. Essa técnica, que no passado era
muito dispendiosa para quem quisesse atingir seus diversos
níveis, transmite, sobretudo, um afeto direto a outra pessoa,
com resultados surpreendentes. Deixando de lado todo o
aparato pseudoesotérico, o Reiki permanece um bom modo
de curar através do afeto, e, provavelmente, os símbolos e
pensamentos que acompanham o fluxo da energia de cura
parecem estimulá-la ainda mais. Pelo menos nos trinta anos
em que venho aplicando a técnica do Reiki, essa é a
impressão que tenho.
Ainda mais moderno parece ser o Deeksha, a transmissão
de energia divina, graça ou simplesmente bênção com a
imposição das mãos na cabeça. Seu funcionamento é
impressionante, e não haveria nada mais belo para uma
criança do que a graça divina, ainda que a atualidade tenha
um temor até mesmo sagrado a esse tipo de palavras. Os
pais não precisam de um curso na Índia para fazer com que
esta ou outra energia chegue a seus filhos através de suas
mãos. De resto, antigamente também era comum entre nós
que os pais dessem a bênção aos filhos.
Larry Dossey, especialista em medicina interna, fez uma
pesquisa científica que rompe a imagem moderna de mundo
e cujos resultados podem perfeitamente ser aplicados nas
crianças. Ele dividiu em dois grupos pacientes com graves
patologias cardíacas. Pediu a todos que escrevessem seu
nome em um pedaço de papel. No entanto, entregou apenas
os nomes da metade a um círculo de oração, como é comum
haver nos Estados Unidos, e pediu para que rezassem por
eles. Embora os participantes do círculo não conhecessem os
pacientes e estes não soubessem que estavam rezando por
eles, esse grupo teve uma melhora estatisticamente visível
e, em pouco tempo, destacou-se do outro grupo em muitos
aspectos, que sofreu mais complicações e teve até casos de
morte. O resultado é muito claro: rezar ajuda – e isso é
comprovado cientificamente.
Nesse sentido, em situações difíceis, seria natural não
apenas pegar a criança no colo, mas também rezar por ela,
contanto que se tenha condições para tanto. O ideal seria
animar até mesmo a criança a rezar, embora, nesse caso,
(ainda) não se tenha comprovado cientificamente algum
efeito...
2.4.7 Moderna magia por contato
Experimentei pessoalmente o efeito combinado desses
métodos tradicionais em um local onde eles não eram
esperados: no ambulatório cirúrgico de um moderno hospital
de cidade grande. Nosso procedimento normal em casos de
feridas com sangramento em crianças, geralmente meninos
depois de alguma queda, era simples. Enquanto um
enfermeiro segurava o menino no colo – se necessário, até
mesmo usando força física –, o médico aplicava a injeção de
anestesia, cuidava da ferida, costurava-a e dava outra
vacina antitetânica – pura rotina...
Certa noite, uma mãe chegou com um menino que havia
caído da cama e tinha um corte com forte sangramento na
cabeça. Eu estava de plantão com uma enfermeira mais
velha e estava a ponto de pedir reforço, quando ela me deu
a entender que daríamos conta sozinhos. Com prazer,
passei-lhe o bastão. Para minha surpresa, ela fez o menino
entrar com a mãe, tranquilizou a mulher com palavras claras
e, sobretudo, limpando o sangue que escorria da cabeça da
criança. O menino também logo se acalmou quando ela
conseguiu lhe mostrar que ele já não sangrava e que não
morreria por causa de um corte tão pequeno. Para a mãe
isso também ficou claro. Por fim, a enfermeira pediu que ela
segurasse o menino no colo e dissesse algo como “sare,
sare, meu menininho”. Até então, eu havia sido dispensável.
Mesmo assim, preparei a anestesia e fiquei surpreso quando
ela me perguntou se eu realmente achava necessário, pois,
para suturar o corte, que a essa altura era pouco visível,
bastavam dois pontos, exatamente o número de picadas da
injeção de anestesia. Espantado com tanta lógica, abri mão
da anestesia e deixei-me conduzir por ela. A enfermeira me
aconselhou a falar com o menino “de homem para homem”
e a aplicar os pontos durante a fase de expiração, o que,
diga-se de passagem, ocorreu sem problemas e sem dor.
Muitas vezes refleti sobre essa experiência e agradeci à
enfermeira uma das mais importantes lições de como lidar
com crianças na clínica. Em vez de submeter um menino em
pânico a um enfermeiro fisicamente mais forte, o que
equivaleria a uma “violência” e envenenaria sua relação com
a medicina por muito tempo, além de excluir a mãe e deixá-
la igualmente em pânico e preocupada, instituímos paz e
tranquilidade recorrendo a costumes antigos e eficazes.
Tivemos apenas de renunciar ao grande gesto de devolver
completamente são e salvo a uma mãe preocupada seu filho
abatido e esgotado, após uma luta heroica por sua saúde.
Certamente ambos não esqueceriam tão rápido essa noite
traumática, e pelo menos a mãe ficaria grata a essa
medicina heroica depois de sua experiência. Todavia, do
outro modo, possivelmente fizemos com que ambos
confiassem em suas próprias capacidades. Embora os
comentários da enfermeira – como “esse corte fecha
sozinho”, “em uma semana você não vai ver mais nada” –
minimizassem nossa atividade, por outro lado certamente
conferiram confiança e certeza. Pelo menos em pediatria, é
fácil responder se o médico deve fazer uma encenação
especial ou, em vez disso, trazer a medicina para um nível
mais terreno.
É uma grande arte tirar sangue de crianças sem fazê-las
chorar. Entretanto, na prática, sempre tivemos essa
experiência quando, procedendo com o devido cuidado,
consideramos a criança em sua particularidade e evitamos ir
contra sua vontade. Contudo, algumas mães tinham de
voltar três vezes até a criança concordar em tirar sangue.
Em geral, esse é um ritual que não precisa ser repetido a
cada vez, pois as crianças criam confiança nesse caminho
em comum.
Quais foram os fatores de cura que entraram no lugar da
autoridade médica? Por um lado, certamente a presença da
mãe, que inspirou confiança, e, sobretudo, seu colo.
Atualmente, pegar a criança com carinho e colocá-la no colo
é quase uma medida terapêutica, que, na prática, sempre
transmite proteção e segurança. Assim, a criança recebe
uma base, o colo no qual cresceu e que, mais uma vez, com
toda a consciência, está à sua disposição. Ela sentirá essa
energia materna de modo quase instantâneo, mesmo
quando for uma terapeuta a pegá-la no colo para realizar a
anamnese. Obviamente, o pré-requisito para tanto é que a
terapeuta de fato consiga transmitir essa sensação – será
ainda mais fácil quando ela já tiver filhos e os tiver segurado
muito no colo. Por fim, no consultório de homeopatia
pediátrica, em algum momento até mesmo a criança mais
inquieta e hiperativa acaba parando no colo, o que lhe
transmite uma sensação bem melhor.
Por outro lado, a antiga magia do traço também
desempenhou um papel na ocasião anteriormente
mencionada. A mãe fez um traço com a mão no ar, por cima
do local ferido, murmurando “sare, sare, meu menininho”.
No plano energético, ela reparou a aura perturbada, o que
muitas vezes já é o suficiente para dissipar o medo.
Por fim, foi uma ideia genial, simples e eficaz por parte da
enfermeira fazer cessar o sangue como que por mágica,
simplesmente limpando-o. O sangue, essa seiva especial,
como já evocado em Fausto, é capaz de assustar
sobremaneira mães e filhos, principalmente porque é muito
impressionante. Algumas gotas na água já simulam uma
profusão.

2.5 Pais e filhos no espelho da alma


“As crianças podem ter problemas psíquicos ou
psicossomáticos?” Esta é uma pergunta que se faz com
frequência. “Elas ainda não podem ter desenvolvido as
condições para tanto. Por que, então, têm tantas doenças?”
Há muitas respostas para essas perguntas. As crianças não
são absolutamente folhas em branco, no sentido de
pequenos anjos inocentes. A maioria das pessoas e suas
religiões partem do princípio de que a alma sempre retorna
até alcançar a perfeição. Mesmo o cristianismo conheceu
esse pensamento, até ele ser banido no século VI, sob o
imperador Justiniano, no segundo Concílio de Constantinopla
(553). Todavia, ainda encontramos na Bíblia antigos vestígios
dele, por exemplo, quando os discípulos de Cristo perguntam
se ele era Elias que havia retornado e ele responde que não,
que este era São João Batista. Na comunidade cristã
antroposófica, a ideia da reencarnação vive até hoje de
maneira bastante tranquila sob o teto do cristianismo.
Mesmo os médicos de hoje partem do princípio de que a
criança é fortemente marcada pelo patrimônio genético dos
pais. Além disso, a pesquisa moderna nos mostra que as
circunstâncias precoces de vida intrauterina têm uma
influência importante, bem como a amamentação. Filhos de
mães que se alimentaram mal ou fumaram durante a
gravidez permanecem marcados pela vida toda, e o efeito
pode ser – cientificamente – comprovado até mesmo em
seus filhos. Portanto, a influência do corpo da mãe alcança a
geração dos netos.
Por conseguinte, as crianças são a soma das tarefas (de
aprendizado) que trouxeram consigo e que se refletem tanto
no patrimônio genético como nos primeiros imprintings. Esse
conhecimento deveria nos estimular a tirar conclusões com
consciência, por exemplo permitindo que o recém-nascido,
se possível, marcasse em sua memória o rosto da mãe ou o
do pai, e não o de parteiras ou ginecologistas estranhos,
como acontecia antigamente por ignorância. O que a criança
percebe logo depois do nascimento é de suma importância;
porém, ainda mais importante é o que ela sente durante a
gravidez, e aqui, vale repetir, sobretudo no período inicial.
Ao flutuar sem gravidade no líquido amniótico, que tem o
calor do corpo, e em união com a mãe, ela está ligada a uma
unidade e sente a confiança primitiva, a base de toda a
autoconfiança posterior (saiba mais a esse respeito no livro
O Caminho para a Vida). Portanto, o dote mais importante
lhe é dado já no início da existência na Terra.
Consequentemente, já no início da vida, a criança é, por
um lado, expressão das experiências prévias que carrega
consigo e, por outro, dos pais por meio do patrimônio
genético. Quer isso nos agrade, quer não, está
cientificamente comprovado que, do ponto de vista material,
toda criança é 100% uma mistura de seus pais. Há muitos
indícios de que, mesmo posteriormente – mais no início de
sua vida na Terra do que depois –, ela reflete seus pais.
De acordo com nossa observação, temos de partir do
princípio de que, não raro, as crianças têm os mesmos
temas, problemas e tarefas de aprendizado, personificando-
os e ilustrando-os também para seus pais, do mesmo modo
como os pais refletem os problemas dos filhos. Assim, a
ressonância para os conflitos dos pais pode se manifestar
em forma de inflamações. Quanto maior a proximidade
temporal com o nascimento e aquela emocional com os pais,
tanto mais claro é esse fenômeno. Por conseguinte, em
recém-nascidos o paralelismo é ainda mais marcado.
Isso não seria nenhum problema se julgamentos de valor e
questões de culpa não entrassem em jogo. De acordo com
nossa proposta para este livro, o ideal seria substituir a culpa
pela responsabilidade e deixar a temática da culpa para a
equipe cristã e terrena e outros especialistas em religião,
que já têm muito trabalho com isso e se distanciaram
bastante de fontes como a Bíblia. Os pais são responsáveis
pelos filhos, mas não são culpados por aquilo que as
crianças carregam consigo. Os filhos receberam tarefas, no
sentido do conceito oriental de karma, e os pais deveriam
enfrentá-las junto com eles.
É evidente que pais que aceitam e controlam a própria
vida com todos os seus desafios e todas as suas tarefas
podem oferecer mais liberdade e oportunidade de
desenvolvimento aos filhos do que aqueles que se perdem
nos próprios problemas. Nesse sentido, o desenvolvimento
pessoal dos pais sempre é importante e, muitas vezes,
melhor para os filhos do que “tentar consertá-los”. Quando
os pais levam a própria vida de maneira honesta, sincera e
com responsabilidade, geralmente os filhos refletem sua
autoestima em seu modo de ser individual e corajoso.
Dificilmente ficam agarrados à barra da saia da mãe; ao
contrário, conquistam o mundo de maneira própria e
original.
Somente no amor incondicional por nossos filhos é que
conseguimos oferecer-lhes espaço ilimitado para um
desenvolvimento pessoal, pois, nesse caso, não sentimos a
necessidade de igualá-los a nós. E poderíamos sempre nos
questionar com o que sonha a alma das crianças – nossa
alma sonha com o mesmo.
Inversamente, os pais que não dão conta de si mesmos
nem de suas tarefas também poderão ver essa situação em
seus filhos. Por certo, isso fica mais evidente no caso da mãe
ou pai que cria o filho sozinho, uma vez que a problemática,
nesse caso, encontra apenas uma superfície de projeção, o
que não significa que a criança não tenha, na mesma
medida, a parte do pai ou da mãe que não está presente.
Todavia, eventualmente isso ainda é mais difícil de aceitar do
que o reflexo dos próprios problemas, pois as razões para a
outra parte faltar são sempre julgadas de maneira negativa.
Portanto, quando os filhos adoecem, os pais também
podem sempre perguntar que relação a doença teria com
eles, não no sentido horrível de “É culpa minha?”, e sim
naquele de “Que lição podemos tirar juntos disso?” e “O que
devemos melhorar em nós para facilitar a vida de nosso
filho, para que ele cresça conosco e do nosso lado?” Em uma
época de crescente individualismo, há muito que se
aprender a esse respeito, com aqueles que nos são mais
próximos e, em geral, mais queridos. Ninguém precisa ter
medo de associar a si mesmo coisas que não lhe dizem
respeito, pois só entramos em ressonância com aquilo com
que também temos alguma relação e que representam
alguma tarefa. Experiências do consultório de pediatria
homeopática, que incluem o nível interpretativo, evidenciam
isso de maneira bastante clara, e a maioria dos pais se
mostra aberta a essa confrontação com temas em comum.
É compreensível que hoje, nos países industrializados,
onde as crianças se tornam cada vez mais raras, elas
transmitam mais tarefas de aprendizado, pois não é fácil
para o destino fazer-nos entender essas tarefas em tempos
tão hostis ao desenvolvimento. Quase todos são garantidos e
vacinados contra tudo. Por conseguinte, a instância
responsável por nosso desenvolvimento tem de escolher
caminhos cada vez mais extravagantes. Se antigamente
havia muitas, hoje costuma haver apenas uma criança a
quem cabe essa tarefa.
Contudo, para nós, nada é mais importante nem merece
mais nossa consideração do que nossos filhos. Desse modo,
podemos ter um bom aprendizado sobre eles. E ninguém é
capaz de ter um relacionamento mais estreito conosco, mas
também nos enlouquecer mais e nos atingir de maneira mais
dramática. Muitas vezes, os pais pensam que seus filhos
podem perturbar os outros com seu choro ou com seu grito.
Em geral, de longe são eles próprios os mais atingidos.
A esse respeito, vale contar uma anedota: um pai carrega
nos braços, de um lado para outro, seu bebê que chora a
plenos pulmões, e diz constantemente: “Calma, Fritz, calma,
Fritz!” Uma mulher que observa a cena opina: “É bonito ver
a paciência com que o senhor cuida do seu pequeno Fritz”. –
“Oh”, respondeu o pai desesperado, “o menino se chama
Franz; Fritz sou eu”.
Ninguém, nem mesmo o melhor psicoterapeuta, tem mais
facilidade e habilidade para tocar em nossas feridas do que
nossos próprios filhos. E, quando o fazem, deveríamos ser-
lhes gratos – contanto que queiramos aprender e evoluir.
Quando eles colocam suas mãozinhas nos pontos fracos do
relacionamento, podemos sentir dificuldade, mas também
nesse caso se trata de uma psicoterapia entre parceiros
especialmente vantajosa, e as crianças sempre encontram o
momento em que suas intervenções são mais eficazes e
mais difíceis de suportar. Em comparação, o repertório e as
possibilidades temporais até mesmo dos melhores
psicoterapeutas são modestos.

2.6 Filhos e sugestão ou A história da verruga-mãe


A magia e a sugestão estão sempre presentes na pediatria,
quer se tenha consciência delas, quer não. Contudo, isso
também vale, em medida totalmente desconhecida, para a
medicina voltada aos adultos. Uma vez que a fé é capaz de
mover montanhas, médicos de verdade sempre a
empregaram, fazendo do medicamento “médico” o mais
importante de todos, além da própria força do paciente de
curar a si mesmo. Em todo caso, é muito melhor
conscientizar o paciente desde o princípio a respeito desse
assunto. Não é necessário explicar às crianças que o sangue
é nossa seiva vital. Elas sabem e, por si sós, lhe conferem
capacidades incríveis. Isso vai desde a irmandade de sangue
entre meninos pequenos até o medo irracional de perder
sangue e morrer por septicemia. Hoje, praticamente
ninguém mais morre da septicemia, que parte de uma ferida
periférica e atinge o coração através de uma via vermelha
em forma de tecido linfático inflamado. Não obstante, essa
história ultrapassada tem uma durabilidade semelhante à
lenda de que espinafre é rico em ferro e, por isso, é
importante para a formação do sangue. Em todos os casos, a
purificação do sangue é sempre um grande passo rumo à
cura em crianças, pois, quando o medo perde a intensidade,
a cura já pode começar.
No início, a concepção de mundo infantil é, sobretudo,
mágica, tal como foi a de crianças em épocas arcaicas
durante toda a vida. Quando essa compreensão mágica do
mundo por parte da criança se mantém, ainda que de
maneira inconsciente, mesmo em adultos será possível curar
verrugas, por exemplo, com as palavras mágicas,
pronunciadas em noite de Lua cheia. Cheguei a vivenciar
isso com crianças em uma clínica moderna. Durante um
estágio no ambulatório dermatológico, em que eu me
ocupava sobretudo em cauterizar verrugas, vi uma mãe que
trazia sua filhinha com mais de cem verrugas pelo corpo.
Nesse caso, o método normal de cauterização de verrugas
levaria a uma situação intensa e demoraria horas. O médico-
chefe, chamado para ajudar, fez as duas esperar até meio-
dia e, até então, me encorajou a criar uma situação mágico-
mítica na sala de tratamento. Na sala escurecida brilhavam
fontes especiais de luz, que contribuíam para criar uma
atmosfera espectral, enquanto com uma lâmpada de
inspeção procurávamos no corpo da menina a chamada
verruga-mãe. Eu não fazia a menor ideia de como ela era,
mas, naturalmente, colaborei. Por fim, o médico-chefe
encontrou a tal verruga, que eu tive de circular
imediatamente com uma caneta permanente e extrair do
modo convencional segundo a medicina acadêmica. De
resto, sem nenhum comentário, pediu-se à mãe e à filha que
retornassem em uma semana. De fato, a essa altura, todas
as verrugas tinham desaparecido, conforme a mãe
comunicara entusiasmada pelo telefone.
O que havia acontecido? A criança vira como a verruga-
mãe fora eliminada e, aparentemente, decidira (por
analogia) que as verrugas-filhas não poderiam continuar a
existir sem a mãe. Por conseguinte, seu inconsciente tirou a
base das verrugas, e estas se extinguiram.
De modo semelhante, certa vez “comprei” de um menino
uma verruga espessa, que estava alojada bem no meio de
sua mão. Obviamente, a condição para tanto foi o fato de
que, em primeiro lugar, a criança já tinha compreendido o
significado mágico do dinheiro e sabia que com ele é
possível obter quase tudo; em segundo lugar, era educado o
bastante para saber que simplesmente não podia ficar com
uma verruga pela qual recebera cinco euros. Entre as
crianças, essas ideias mágicas transformam-se com muito
mais facilidade em sugestões para a cura do que entre os
adultos.
2.7 Proibições e o desenvolvimento cerebral
Assim como é fácil conquistar a compreensão mágica das
crianças para a convalescença, é difícil lidar com as
proibições. Ambas estão interligadas. O pensamento infantil
depende diretamente de imagens, enquanto as capacidades
de abstração ainda são muito escassas. Nos primeiros anos,
por exemplo no âmbito da educação para a higiene pessoal,
que é marcada por muitas proibições, isso fica
dramaticamente claro. Quando se diz a uma criança: “Hoje
você não vai derrubar de novo seu chocolate” ou
diretamente: “Hoje você vai derrubar de novo seu
chocolate”, o resultado é o mesmo. Nos três primeiros anos,
a criança ainda não dispõe da capacidade de abstração
requerida para compreender a noção do “não”. Portanto, ela
só ouve a mensagem: “derrubar chocolate”.
Podemos imaginar esse fato quando tentamos não pensar
numa árvore ou num carro. A imagem é tão forte que
também desconsideramos facilmente a negação abstrata.
Nesse sentido, os dez mandamentos, que são, antes,
proibições para as crianças reais e para aquelas que existem
dentro dos adultos, também redundam em instruções diretas
para fazer o contrário. Nesse nível de compreensão, “não
roubarás” é uma instrução direta do contrário. Talvez
também por isso as pessoas sempre tenham tido dificuldade
para lidar com os dez mandamentos.
Quem estiver convencido de que seus filhos já entenderam
desde muito cedo todas as proibições é porque
simplesmente os adestrou. Mas, por certo, os pais não
gostam de ouvir uma coisa dessas. A verdade não agrada
nem um pouco. É claro que o filho percebe quando a mamãe
olha brava depois que ele derruba o chocolate; e, como ele
ama sua mamãe, no futuro tentará evitar derrubá-lo. Se ele
chegasse a levar um tapa, o condicionamento seria ainda
mais evidente. No futuro, funcionaria como desejado, mas
não porque ele entendeu, e sim porque foi condicionado ou
adestrado como os famosos cães de Pavlov: sempre que toca
uma campainha, os animais recebem sua comida. Depois de
um breve período, só de ouvirem a campainha já começam a
salivar, mesmo que não haja comida.
Como no relacionamento os adultos também não se
educam reciprocamente, mas talvez se deixem condicionar e
treinar, quando se tornam pais, em geral já alcançaram
alguns êxitos e reprimiram por muito tempo a diferença
entre treinamento e educação baseada em compreensão.
Portanto, quem quiser se comunicar com as crianças de
modo apropriado deveria servir-se de uma linguagem rica
em imagens e bastante explícita, tal como fazem os
psicoterapeutas, que conduzem seus pacientes ao mundo
das imagens anímicas. O arquétipo da Lua, que vale tanto
para o aspecto infantil quanto para o feminino, deveria
dominar esse nível de linguagem e ser moldado de maneira
suave e branda, com ritmo e figuras de linguagem fluentes e
melódicas. Contudo, é claro que, ocasionalmente, linhas
claras também devem ser traçadas: minha liberdade termina
onde começa a do outro. Isso as crianças podem aprender a
respeitar do terceiro ao quinto ano de vida.

2.8 A Lua – o princípio primário da infância e do


aspecto materno
A Lua está presente nos dois temas mais importantes deste
livro, que são o aspecto infantil e o materno, mas também
em tudo que diz respeito ao feminino, ao que cuida. A este
aspecto pertencem a cavidade acolhedora do ventre
materno e o líquido amniótico, mas também os seios que
amamentam, com seu tecido macio e fluido e seu leite que
alimenta – e o próprio lactente, com suas formas macias e
seus doces traços de bebê no rosto. O ritmo de vaivém
também entra nesse aspecto, bem como a água, entendida
em sentido concreto e simbólico, mas também as imagens
anímicas que alimentam os sonhos noturnos e as viagens
diurnas ao próprio interior. A força da fertilidade e a
dedicação amorosa das deusas da Lua Deméter/Ceres e
Selene/Luna (nomes em grego e em latim para “Lua”)
também fazem parte desse tema tal como seus caprichos e
melindres. Sob o princípio da Lua encontram-se, assim,
quase todos os aspectos simbólicos da gestação, do período
de lactação e da primeira infância.
A “Lua” é o tema comum da mãe e da criança. Em tempos
remotos, esses anos – pelo menos nas famílias abastadas –
orientavam-se muito mais para esse arquétipo, enquanto
hoje ele é bastante curto, o que se mostra claramente pela
típica licença-maternidade e pelas determinações de
proteção à mãe, no caso daquelas que trabalham. Algumas
semanas antes e alguns meses depois do parto devem
bastar. Mas esse período não é suficiente, pois a Lua precisa
de tempo e vive de seus ritmos.
Só pode entender esse tempo marcadamente feminino
quem se prepara a fundo para o arquétipo da Lua. Mas
depois fica claro de onde vêm todos os estados de espírito
durante a gestação, que também se estendem ao período de
amamentação. Por que às vezes as lágrimas simplesmente
caem sem razão e por que o parto sempre vem seguido de
um pouco de baby blues. O fato de que hoje este se tornou
um tema tão dominante tem a ver justamente com a pouca
atenção e o pouco tempo dedicados ao tema da Lua, que se
mostra, sobretudo, em aspectos como o humor e as lacunas
de disposição.
Nesse ponto também pode ficar claro por que a carreira é
tão pouco compatível com a maternidade, como se chamava
anteriormente esse período. A carreira pertence a um âmbito
de princípio primário totalmente diferente, ou seja, o Sol,
que não poderia ser mais oposto.
Somente agora o princípio da Lua volta a ser descoberto e
avança lentamente com seu ritmo, mas de forma cada vez
mais intensa, na vida da mulher. Sobretudo quando os filhos
se tornam mais raros e cada vez menos mulheres se sentem
atraídas pela maternidade, simplesmente porque não têm
vontade de fazer coisas para as quais não há salário nem
reconhecimento, como cuidar, se preocupar e consolar,
transmitir proteção e tornar um lar aconchegante e
acolhedor, é que chega, então, o grande período do princípio
da Lua. Os políticos passam a criar prêmios para novas
crianças, a distribuir amplas recompensas para famílias com
filhos, e os tempos passarão, uma vez que eles descobrem
as famílias apenas durante as campanhas eleitorais e, em
geral, logo depois voltam a esquecê-las. A lei da polaridade
cuidará disso.

2.9 Educação
Depois de trinta anos de aconselhamento e psicoterapia, por
um lado, e um longo trabalho com imagens internas e a
interpretação de quadros clínicos, por outro, minha confiança
em conceitos pedagógicos e diretrizes educativas já não é
tão marcada. Ainda me parece muito pouco conhecido o fato
de que as crianças passam seus primeiros anos inteiramente
no mundo de suas imagens internas e externas e, assim, no
início, não têm condição – e mais tarde a têm apenas
lentamente – de compreender abstrações intelectuais.
Nestas repousa, porém, a maioria das medidas educativas.
Como já foi dito, toda recusa e toda proibição constituem
uma abstração. Se pensarmos na quantidade de proibições e
recusas com que nós adultos do mundo ocidental
confrontamos nossas crianças, os problemas delas
resultantes se tornarão claros.
No ramo publicitário, o segredo das imagens é algo há
muito tempo evidente para os especialistas; nele, os erros
que ainda caracterizam a educação não aconteceriam.
Nunca os produtos da concorrência seriam rebaixados; ao
contrário, os próprios é que são enaltecidos com imagens e
cores reluzentes, de uma maneira da qual o inconsciente
dificilmente consegue escapar.
Em relação ao treinamento descrito, a educação através
do próprio modelo tem muitas vantagens. Nesse caso, é a
imagem que se torna imprinting. O poder desse imprinting já
foi demonstrado por Konrad Lorenz em seus famosos
experimentos com gansos. Depois de mostrar a gansos
recém-saídos do ovo seu próprio retrato, e não o da mãe,
eles o tomaram como pessoa de referência e,
evidentemente, passaram a segui-lo até o escritório e
quando nadava no lago. De uma dessas idas ao lago provém
a famosa imagem com o bando de gansos que, nadando,
segue o velho mestre da pesquisa comportamental. Desde
então, sabemos que também no reino animal tudo reside no
começo. Por isso, é muito importante que, logo após o
nascimento, a criança possa ver os próprios pais ou, pelo
menos, a mãe. Esse primeiro imprinting seria, portanto, o
passo mais importante para uma educação na primeira
infância. Obviamente, somos pessoas, e não gansos; no
entanto, se observarmos melhor, perceberemos cada vez
mais como a primeira impressão e, com ela, o primeiro
imprinting são importantes também para nós.
A linguagem popular já está familiarizada com a
importância dessa temática e sabe avaliar a função dos
modelos: por isso se diz que é importante dar um bom
exemplo. Também por causa do efeito no exemplo negativo,
já sabemos há muito tempo como esses princípios atuam. É
muito provável que pais fumantes tenham filhos fumantes.
Médicos fumantes são tão eficazes como exemplo negativo
que, na prática, dificilmente conseguem fazer seus pacientes
parar de fumar. Também no que se refere às chamadas
TPMs, as tensões pré-menstruais, sabemos hoje que não são
herdadas geneticamente, mas transmitidas de geração a
geração através dos efeitos de exemplos negativos. Durante
muito tempo se pensou em herança, pois, na prática,
sempre se encontrava uma mãe que sofria dessa síndrome.
Entretanto, podemos partir do princípio de que uma moça
que tenha passado a infância e a adolescência vendo a
própria mãe sofrer por sua condição de mulher assume
inconscientemente esse modelo e se torna, ela própria,
paciente.
2.9.1 Campos que geram formas

Inconscientemente, estamos sempre criando os chamados


campos de desenvolvimento – designados pelo biólogo
inglês Rupert Sheldrake (ver “19.2 Bibliografia”) de
“morfogenéticos”, ou seja, “campos que geram formas” –
que são muito mais importantes do que costumamos supor.
Pais leitores têm filhos leitores não porque, a princípio, os
exortam a ler, e sim porque os filhos os imitam. Contudo, em
parte, conscientemente ou não, os pais também criam um
campo que deixa poucas alternativas. Quando mais tarde
pais acadêmicos perguntam a seus filhos não se querem
fazer faculdade, mas que carreira querem seguir, criam um
campo unívoco. Assim, à criança resta apenas a
possibilidade de escolher sua disciplina. O que é
parafraseado de forma tão lapidar com o termo “imitar”,
refere-se não apenas à relação entre macacos pais e
macacos filhos, mas a todo relacionamento entre pais e
filhos.
É um truísmo dizer que pais que encontram o sentido de
sua vida visitando campos de futebol e desde cedo já levam
os filhos consigo, muito provavelmente têm meninos
apaixonados por esse esporte. Por isso, felizes daqueles
poucos, cujos pais jogam ativamente, e infelizes de todos
aqueles, cujos pais são consumidores passivos, pois,
também nesse sentido, com grande probabilidade irão segui-
los.
Por certo, também se torna problemático quando a criança
não tem absolutamente nenhuma ressonância com o
entusiasmo dos pais, preferindo, por exemplo, ler ou tocar
violino em vez de jogar futebol. Nesse caso, os pais são
solicitados em sua atenção e sua consciência, a fim de
descobrir e aceitar o que têm naturalmente em comum com
os filhos ou não. Se isso não for feito, a criança seguirá o
interesse dos pais, alienando-se de si mesma, ou então não
se sentirá compreendida nem levada a sério em suas
necessidades e preferências. A consciência do próprio
percurso existencial, tal como entendido pela astrologia[11]
psicológica, seria muito útil nesses casos.
Com seus modelos, a atmosfera familiar causa um
imprinting ainda muito subestimado. Crianças provenientes
de famílias que tomam chá tendem, posteriormente, a beber
chá, assim como crianças de famílias que tomam café
também precisarão da mesma bebida. Infelizmente, isso
também vale para as famílias que bebem álcool e seus
descendentes.
Walter Lechler, que introduziu os grupos dos Alcoólicos
Anônimos (AA) na Alemanha depois da guerra, conta uma
história esclarecedora. Quando perguntado sobre o que
gostaria de ser quando crescesse, um menino respondeu
espontaneamente: “Alcoólatra, como meu pai!” Ele julgava o
fato totalmente positivo, uma vez que usufruía da atmosfera
familiar e marcada pela solidariedade nos encontros das
famílias promovidos pelos grupos do AA.
De maneira semelhante, as bases para uma vida
determinada por formação e cultura são lançadas tão cedo
quanto aquelas para uma alimentação saudável, a atenção
ao lidar com os mais fracos ou deficientes, etc. Nelas
deveriam residir as vantagens dos conceitos pedagógicos,
como aqueles de Maria Montessori com o lema “ajude-me a
fazer isso sozinho” e das escolas Waldorf, de Rudolf Steiner.
Mesmo que ambas estejam distantes em muitas coisas, têm
a ideia em comum de que seus pedagogos também devem
ter vivido pessoalmente os conteúdos e, sobretudo, o modo
de pensar que transmitem às crianças. Assim, poderiam
atuar como exemplo e modelo e, no caso ideal, realmente
ter algum efeito.
Na pedagogia montessoriana, mostrou-se que as crianças
que desde o início aprendem a lidar de maneira cuidadosa e
compreensiva com os mais fracos e prejudicados pelo
destino tornam-se adultos mais atenciosos e compreensivos.
De acordo com a possibilidade, o conceito de Steiner
difundido pelas escolas Waldorf cuida para que cada classe
tenha mais ou menos o mesmo número de alunos com todo
tipo de temperamento, para que desde cedo as crianças se
conciliem com a extensa gama de seres humanos.
2.9.2 Formação do caráter através de exemplos

Por outro lado, no que se refere à formação do caráter,


programas pedagógicos de ensino são um conceito
realmente pouco eficaz; do contrário, nas escolas regulares,
por exemplo, a introdução das aulas de ética deveria trazer
alguns frutos. Todavia, o que se vê é que os costumes nas
escolas públicas se tornam cada vez mais rudes e cada vez
menos marcados por ponderações éticas.
Nelas, certamente o mais importante é a função exemplar
da própria família, o chamado peergroup e as imagens
transportadas inconscientemente pela equipe de ensino. No
que se refere às imagens, hoje à televisão também cabe
uma enorme função exemplar e de imprinting. Embora eu
não acredite que imagens agressivas, passadas na TV,
possam transformar um ser meigo em um monstro,
estruturas inerentes podem ser resgatadas e reforçadas de
forma impressionante. Contudo, principalmente sobre essa
fonte central de imagens são construídos campos de grande
alcance. Hoje podemos ver muito bem o resultado, embora,
naturalmente, nunca seja possível esclarecer com certeza o
que veio primeiro, se o ovo ou a galinha.
É provável que a brutalização crescente das crianças e dos
jovens tenha diversas fontes. Por um lado, eles recebem
muito pouca noção de responsabilidade e compreensão
pelas consequências de seus atos. A pressão reside na
educação voltada à motivação, em vez de promover com
convicção os valores no campo humanístico e religioso.
Por outro lado, a indústria do entretenimento produz as
necessidades que, posteriormente, se tornam visíveis nos
índices de audiência. Não houvesse uma demanda por filmes
de horror e violência, eles não seriam produzidos. Nas
famílias em que a televisão ganha o status de único
entretenimento disponível e degenera-se em principal babá,
suas imagens imprimem-se com mais força do que qualquer
outra coisa. Quando uma criança pequena cresce em um
ambiente em que as noites são dedicadas à brutalidade na
tela ou à agitação da constante mudança de programação,
isso influirá como um imprinting e reforçará os aspectos
agressivos e agitados da personalidade, como já vimos na
avalanche de crianças com o transtorno do déficit de
atenção e de hiperatividade (TDAH).
Exemplos extremos podem esclarecer ainda mais como as
crianças são marcadas pelo ambiente doméstico. Em
prantos, uma mãe suíça buscou conselho porque sua filha de
14 anos, em seu primeiro relacionamento sexual,
engravidara de um rapaz que não merecia sequer
comentários. Ao ser indagada se não tinha conversado sobre
sexo com a filha, ela respondeu: “Não, mas ela também
nunca perguntou”. Isso não exime a mãe de sua
responsabilidade, pois é ela quem cria o ambiente doméstico
em que a filha se sentirá à vontade ou não para perguntar.
Quando o interesse pela sensualidade e pelo erotismo
determina a atmosfera familiar, surge um ambiente de
prazer correspondente. Quando, porém, predominam a
inibição e a hostilidade ao prazer, o respectivo ambiente
também irá cortar pela raiz todas as perguntas pertinentes.
Desse modo, essa mãe, que vivera sua própria sexualidade
apenas como algo repulsivo e penoso, acabou criando um
ambiente doméstico correspondente à sua experiência, a
partir do qual sua filha provavelmente repetiu o mesmo
drama que ela sofrera quando jovem. Ela foi induzida a ter
exatamente a mesma vida que a mãe, sem que esta tenha
desejado isso ou agido de modo consciente.
Determinamos o mundo em que vivemos, muito além dos
modelos e campos que, com intenção ou não, criamos em
nosso ambiente. Por isso, seria evidente ter consciência
desses campos e tratá-los com muito cuidado e muita
cautela, ou melhor, criar campos que estimulem o
desenvolvimento. (O que é importante nesse caso é
apresentado com mais detalhes em livros como
Lebenskrisen als Entwicklungschancen e Woran krankt die
Welt?)[12]
Como já foi dito, mais determinante do que os conceitos
de educação é a antiga sabedoria sobre a eficácia do bom
exemplo. Quem trata os outros como gostaria de ser tratado
pode ter certeza de que os próprios filhos nada lhe farão que
ele não goste. Outra sabedoria de vida, igualmente
importante, diz que, neste mundo, só podemos colher o que
semeamos. Nesse sentido, seria óbvio semear apenas o que
gostaríamos de colher. Com efeito, a linguagem popular sabe
que o eco que vem da floresta reproduz o que a ela foi dito.
Contudo, há que se considerar que quase todas as
crianças passam por determinadas fases de oposição. Quase
toda criança, alguma vez na vida, irá roubar, mentir, usar um
tom impertinente, mostrar satisfação com a desgraça alheia,
etc. Isso ainda não significa que a casa dos pais seja
exatamente assim. As crianças podem manifestar esse tipo
de comportamento, por exemplo, com o intuito de testar a
reação dos pais e, assim, querer uma tomada de posição
clara ou um limite definido.
Portanto, seria necessário distinguir se a criança está
refletindo temas, por exemplo, se emprega o tom errado
quando está com raiva ou se está passando por uma fase do
desenvolvimento. Trata-se de ajudar a criança a lidar com o
mundo, de esclarecer-lhe que certos comportamentos não
são aceitáveis. Ou os pais procedem com um bom exemplo,
ou – quando possível, porque se trata de um problema
pessoal – enfrentam a questão juntos e trazem a consciência
adequada para a situação.
O maior perigo na educação está em usar dois pesos e
duas medidas, segundo o lema latino “Quod licet Iovi, non
licet bovi”, que significa: “O que é lícito a Júpiter não é lícito
a um boi”. Entre esses conceitos (muitas vezes
inconfessados), mesmo as medidas mais autoritárias não
poderão impedir que as crianças podadas de acordo com
outra medida obedeçam, no fundo de sua psique, não aos
mandamentos e às proibições, e sim ao “modelo de
injustiça” demonstrado pelo modo de vida dos pais. Porém, a
partir desse modelo se formarão os outros, que as crianças
adotarão posteriormente em seu ambiente – inclusive em
relação aos próprios pais, que na velhice sentirão e colherão
o que semearam em seus filhos.

2.10 Ferramentas para os pais entenderem melhor os


filhos
Quase todos os pais querem o melhor para seus filhos, pelo
menos aqueles que leem um livro como este. Só que, muitas
vezes, eles não sabem o que é o melhor para os pequenos.
Perguntar a eles não costuma ser ideal, pois, de acordo com
a experiência, as crianças tendem mais do que os adultos a
se decidir pela solução mais simples e pela satisfação
momentânea de sua vontade. Normalmente, também são
bastante conservadoras; apesar da curiosidade em muitas
esferas da vida, preferem deixar tudo por conta dos adultos
no que se refere a questões essenciais. Com relação a isso,
também costumam ser surpreendentemente egoístas. Nesse
sentido, a educação requer muito mais do que simplesmente
condescender com os pequenos adoráveis.
Em alguns aspectos, seria bom tratar as crianças como se
tratam os adultos, sabendo muito bem que não são como
eles, principalmente porque ninguém pode dizer com certeza
qual a idade da alma. Defender esse tratamento igualitário
seria defender a igualdade de direitos; porém, em outros
aspectos, isso simplesmente não funciona. Para descobrir do
que a alma infantil precisa e o que ela quer, comprovou-se
como eficaz recorrer a auxílios simbolicamente relevantes e
a pequenos truques, que só à primeira vista dão a impressão
de serem divagações, mas à segunda conferem uma visão
bastante orientada à vivência infantil.
A maioria das crianças precisa e até quer ser educada.
Elas reagem muito bem a acordos como: “Você será tratado
do mesmo modo como está se comportando”. À medida que
a criança pode e quer assumir uma responsabilidade, ela
também recebe mais liberdade e direito de
autodeterminação. Assim, as crianças aprendem no
cotidiano, de maneira totalmente concreta, que suas
palavras, suas ações e suas decisões acarretam
consequências – e que a liberdade também sempre tem a
ver com a responsabilidade.
2.10.1 A família representada em figuras de animais

Um método simples para diagnosticar a situação da criança


pode ser feito através de um psicoteste muito antigo para
crianças, ligeiramente modificado. Quando eu aconselhava
mães na presença do filho, sempre me via diante do
problema de que, mesmo com a maior boa vontade, elas não
podiam me fornecer os fatores psíquicos decisivos.
Obviamente, toda mãe quer o melhor para seu filho, mas
com frequência não sabe como esse melhor poderia ser. Na
maioria das vezes, é muito difícil conversar com a criança na
presença da mãe, sobretudo porque, nesse caso, ela sempre
fala tendo a mãe em vista. Entretanto, pedir para a mãe sair
da sala e conversar sozinho com a criança é eficaz no
máximo em casos isolados, pois geralmente ambas não se
sentem à vontade.
Para mim, a solução ideal foi utilizar a simples brincadeira
de desenhar. Enquanto eu conversava com a mãe, pedia à
criança que se desenhasse como se fosse um animal –
usando grossas canetas coloridas e uma folha de papel
tamanho A3. Em seguida, ela deveria pintar a mãe na forma
de animal. Só era preciso evitar que a mãe interferisse no
desenho, tentando corrigi-lo. Em seguida, chegava a vez do
pai e, por fim, de toda a família na respectiva forma de
animal. Enquanto a mãe achava que o essencial estava
acontecendo na conversa, a criança pintava sua situação
psíquica com uma honestidade simbólica impressionante e
revelava coisas sobre si própria e sua família que a mãe
nunca poderia ter expressado de maneira tão direta.
Em uma dessas experiências, via-se no desenho pronto um
gigantesco tigre-de-Bengala que dominava o centro do papel
e, com as fauces bem abertas, quase não deixava espaço
para os outros membros da família, imortalizados na forma
de aves. Portanto, foi uma brincadeira de criança que dirigiu
a consciência da mãe para a imagem do problema central de
seu filho. O menino representara com toda a clareza como
todos na família sofriam com esse problema. O tigre-de-
Bengala era uma reprodução do “pequeno tirano”, que, por
meio do desenho, se revelara insuperável. O pequeno
grande animal precisava de ajuda para defender-se de si
mesmo, pois, para um menino de 4 anos, aquela situação
não era adequada nem estimulava seu desenvolvimento; ao
contrário, era uma sobrecarga terrível o fato de ele poder
dominar a família inteira. Durante a longa conversa e
enquanto o desenho assumia a forma da família, a mãe nada
revelara a respeito dessa dramaticidade. Somente nas
entrelinhas foi possível intuí-la. O desenho tornou toda
argumentação superficial, de tão clara que havia sido a
representação feita pelo filho da complicada situação.
No desenho de outra criança, o pai, que a mãe nem
chegara a mencionar, foi representado como uma ave no
canto superior da folha. Depois de uma breve menção a essa
situação tão esclarecedora, pintada pela filha, estava
representado o ponto decisivo na problemática familiar. A
filha, que havia sido “planejada” pela mãe com o intuito de
prender o marido que vivia tentando escapar, representou o
problema que levara à sua concepção ao mesmo tempo com
sinceridade infantil e extrema clareza. Desarmada, a mãe se
permitiu chorar e trazer à tona a verdade junto com a
consciência pesada a ela ligada.
Histórias semelhantes de desenhos com surpreendente
simbologia foram antes a regra do que a exceção, e, no
início do meu trabalho de aconselhamento de mães, essa
brincadeira, pensada como ocupação para as crianças e, na
melhor das hipóteses, como auxílio adicional do diagnóstico,
acabou se transformando secretamente no objeto principal.
Desse modo, com o tempo, a conversa com a mãe tornou-se
mais uma manobra de digressão, para que ela não
perturbasse o processo central e importante do desenho
infantil com intervenções que pudessem trazer alguma
adulteração.
Quando os próprios pais empregam esse auxílio de
diagnóstico, que também diverte as crianças, obviamente
alguns cuidados precisam ser tomados. O importante é não
se intrometer. Trata-se apenas de uma descrição curta e
clara, e, quando o desenho estiver em andamento, os pais
devem se retirar. De preferência, devem observar o
resultado apenas no final. Em seguida, seria de esperar um
elogio, pois, mesmo que o resultado não agrade, ele contém
mensagens importantes.
Quando muito, talvez seja necessário estimular as crianças
a acrescentar membros esquecidos da família em forma de
animais. Nessa circunstância, naturalmente é muito
simbólico quando um irmãozinho é totalmente ignorrado e,
em vez dele, é desenhado o Nintendo em forma de animal,
conforme já me ocorreu certa vez. Não raro animais
domésticos aparecem com importantes formas simbólicas e
também deveriam ser considerados importantes e levados a
sério. Muitas vezes, o resultado é tão expressivo que nem é
necessário instruir-se em simbologia para interpretá-lo.
Quando isso não ocorre, de todo modo vale a pena aplicar a
agradável brincadeira de desenhar, e depois sempre se pode
submeter o desenho à interpretação e ao esclarecimento de
um especialista. Obviamente, este ainda poderia abrir
dimensões totalmente diferentes, mas o desenho superficial
também é muito útil para pais capazes de fazer uma
autocrítica.
Influenciar o resultado durante o desenho para tentar
embelezá-lo é uma forma de (auto)enganação. Há que se ter
coragem para se fazer um diagnóstico autêntico e honesto.
Em seguida, o modelo que se tornou comum e claro a todos
poderia ser modificado, o que se mostra em desenhos
posteriores.
Em uma analogia, isso pode ficar mais evidente: o estudo
PISA[13] abalou e sacudiu a Alemanha. Preparar melhor as
crianças para responderem as questões do teste, a fim de se
obter um resultado melhor no próximo estudo, seria
igualmente uma forma de enganar o sistema e as próprias
crianças. Em vez de ajudar os estudantes, isso só teria
serventia para o ego nacional, que da próxima vez passaria
menos vergonha diante do mundo. Ou então: a fim de sair-se
melhor nas estatísticas de avarias, seria preferível que a
Mercedes, em vez de melhorar seu sistema antiavarias,
produzisse veículos melhores ou mais confiáveis. Em última
instância, embelezar o sistema é sempre uma evidência de
incapacidade que, a longo prazo, traz prejuízos.
Se a brincadeira de desenhar a família em forma de
animais se repetir em intervalos maiores, ela pode se
transformar numa reprodução e num perfil da evolução dos
progressos infantis em sentido psíquico e social. Quase todos
os pais medem minuciosamente o crescimento de seus
rebentos no batente da porta e ficam felizes com os
progressos. Os desenhos dos familiares em forma de animais
poderiam desempenhar uma função semelhante para o
crescimento intelectual, psíquico e, sobretudo, social, só que
de maneira muito mais essencial e abrangente.
Mais tarde, esses desenhos também seriam um belo
presente para as crianças que já cresceram e amadureceram
para a vida.
2.10.2 Desenhando a figura de uma ilha

Esta simples brincadeira de desenhar sempre se revela como


um reflexo elucidativo da alma, sobre o qual os pais podem,
em seguida, ter uma boa conversa com o filho, a fim de
aprenderem a entender melhor seu mundo interior. A
instrução para o desenho é muito simples e clara:
 

Desenhe os contornos do seu corpo como se fosse
uma ilha, sem interrupção, com um só traço e uma
cor da sua escolha.

Agora, esta é sua ilha. Nela e em torno dela,
desenhe tudo que gostaria de ter por perto e que é
importante para você, de modo que tudo se torne
sua ilha.
 
A primeira coisa a fazer é observar a impressão geral, que
já permite certo esclarecimento sobre como a criança se
encontra e se sente no mundo. Até nos menores detalhes da
figura é possível encontrar temas, problemáticas e, muitas
vezes, também soluções, sobretudo quando a criança pode
expressar-se verbalmente. Posteriormente, os pais terão
uma informação mais clara, os filhos terão aliviado sua alma,
e todos terão se divertido. É óbvio que se pode observar com
um intervalo de tempo maior como a vida da ilha vai
evoluindo.
2.10.3 Colocando ou desenhando a família em figuras

A constelação familiar, segundo Hellinger (ver também a


seção “2.17.1 Constelação familiar sistêmica segundo
Hellinger”), é um método muito popular que também pode
ser usado no círculo familiar; contudo, nesse caso, seria
adequado um auxílio terapêutico. Pode-se utilizar o
procedimento do exemplo mencionado acima com os
animais simbólicos, fazendo com que a criança desenhe uma
espécie de zoológico familiar, ou então – o que é ainda
melhor por ser mais vivo e dinâmico –, com cuidado, os pais
recortam as figuras junto com o filho e permitem que, a
partir delas, a criança coloque a família em um modelo que,
obviamente, pode ser alterado com discrição.
De preferência, também deveriam ser levadas em conta
pessoas de fora da família, que podem igualmente fornecer
esclarecimentos sobre a percepção da vida na respectiva
posição. Em todo caso, a partir das figuras deitadas ou
posicionadas, podem-se tirar conclusões sobre a situação da
criança na família. Obviamente, isso não faz sentido no dia a
dia, mas, depois de alguns meses, uma mãe poderia
descobrir desse modo o que se fez por seu filho no modelo
familiar e em que direção ele se desenvolveu.
Se parecer muito complicado arranjar todas as figuras
necessárias, esse jogo de diagnóstico também pode ser
perfeitamente realizado com os sapatos das pessoas em
questão. Você deve mostrar com clareza como os donos dos
sapatos estão em pé um em relação ao outro. E os sapatos
combinam muito bem com seus usuários. Qualquer cachorro
os reconheceria com certeza.
Naturalmente, nas duas sugestões aqui mencionadas, é
bastante útil poder consultar um terapeuta competente, a
fim de manter-se nos limites das avaliações e das
interpretações errôneas.

2.11 Conversando com Deus ou rezando antes de


dormir
Com a decadência da religião, a boa e velha oração antes de
dormir corre o risco de sair totalmente de moda. Por isso, em
muitos aspectos, também hoje ela ajudaria muitas crianças,
para além de todas as ponderações religiosas, uma vez que,
por intermédio de Deus, introduz em sua vida uma instância
superior, que transmite proteção. Sem levarmos em conta o
mencionado fato de que rezar ajuda do ponto de vista
médico, a partir dela, como efeito secundário, é possível
desenvolver um excelente sistema de diagnóstico.
O ideal seria que a criança não recitasse mecanicamente
uma oração estereotipada e pré-formulada, mas se dirigisse
em pessoa a Deus, ou seja, no sentido de uma troca ou
conversa. Na maioria das vezes, não é muito difícil motivar
as crianças a se dirigirem a Deus, à Virgem Maria ou a seu
anjo (da guarda), contar-lhe como foi seu dia e comunicar as
próprias preocupações. Se isso ocorrer não apenas em
pensamento, mas também em palavras expressas, os pais
poderiam ficar sabendo o que se passa no íntimo de seu
filho. Desse modo, a criança expressará com muito mais
sinceridade o que sente.
Se ela tiver um estreito relacionamento de confiança com
a mãe, será tanto mais fácil transferir a conversa para a mãe
de Deus. Quando este não for o caso, a Grande Mãe pode
“vir em auxílio”. No caso de um pai pouco ou totalmente
ausente, com o tempo, o Pai do Céu pode crescer cada vez
mais nesse papel. Muitas vezes, os Grandes Pais ou avós são
uma instância muito útil de mediação.
Geralmente, figuras internas das imagens anímicas
assumem o papel de representantes e, além disso,
transformam-se em verdadeiros professores e advogados do
eu. Assim, durante crises de separação e outros desafios e
tensões da vida moderna, muitos caminhos e (muitas
soluções) se ofereceriam ao ânimo infantil.
No que se refere a anjos da guarda ou outras figuras
anímicas, como o “médico interno”, que é adequado
sobretudo para crianças maiores e adolescentes, aqui
também se mostram excelentes oportunidades de entrar em
contato precoce com capacidades anímicas mais
desenvolvidas. Quanto mais cedo esse contato ocorrer,
melhor. Assim, paralelamente ao mundo exterior, as crianças
podem desenvolver o interior, que em todas as situações
difíceis proporcionam apoio. Todavia, um crescimento
também pode ser iniciado com mais facilidade se a criança
souber que a Grande Mãe, o Grande Pai, um “irmão de
sangue” ou a Grande Irmã, a deusa da natureza ou um
espírito protetor do mundo xamânico, como aqueles ligados
aos animais, está do seu lado. Com esse auxílio do outro
mundo, que logo se torna tão importante quanto o do mundo
real, tudo ocorre de maneira mais fácil e melhor.
Uma breve história pode ilustrar bem esse fato. Uma
mulher de classe média alta, mãe de uma menina pequena,
extremamente mimada, sentia-se com a consciência pesada,
talvez por levar uma vida tranquila em uma mansão no
melhor ponto da cidade e dispor de serviçais para qualquer
eventualidade. Como na época predominava a guerra na
Bósnia-Herzegovina, ela decidiu acolher por um tempo duas
crianças oriundas da guerra em sua casa. Comunicou ao
marido e anunciou à filha, com muita gentileza, que ela
ganharia dois irmãozinhos. Nenhum dos dois apresentou
objeção. À noite, porém, durante a oração, a menina disse
diretamente a Deus que não estavam precisando de nenhum
irmãozinho na casa dela.
Por esse caminho indireto, a verdade veio à tona de
maneira bastante franca. Ao que parece, a filha havia
percebido a necessidade da mãe de ajudar (as crianças
estrangeiras e sua consciência pesada), mas não queria ou
não podia contradizê-la abertamente. Em contrapartida, à
noite, “junto a Deus”, sentiu-se livre dessa consideração e
disse com franqueza o que estava sentindo. Portanto, em
vez de amor ao próximo mostrou seu ciúme. Entretanto, o
ciúme expresso com honestidade é sempre melhor do que o
amor fingido pelo próximo. Obviamente, a situação dos pais
é melhor quando estão a par da situação e podem se
preparar.

2.12 Meditações induzidas


As meditações induzidas, que podem muito bem evoluir para
histórias antes de dormir, oferecem eventualmente uma
possibilidade mais praticável. Quando a história toma um
rumo que faz a criança fechar os olhos e imaginar todo o
cenário, ela própria também pode começar a falar e a
descrever suas imagens mentais. A maioria das crianças fica
feliz em fantasiar e revestir seus desejos com imagens.
Mesmo no que se refere a âmbitos muito livres, vê-se muito
rapidamente o que ocupa o mundo de imagens anímicas da
criança.
Obviamente, tudo que é concebível externamente pode
ser realizado nesse plano interno de imagens, mas, além
disso, uma infinidade de coisas. A família em forma de
animais também pode apresentar-se nesse plano; por isso, é
melhor ter em seguida um modelo fixo, como uma folha de
papel, as figuras dispostas ou sapatos, que podem ser
fotografados para esse fim.
No plano interno das imagens anímicas, quase tudo é
possível, do planejamento de uma grande festa de
aniversário até terapias futuristas e incrivelmente eficazes,
ainda não disponíveis na medicina real. Uma criança que
tenha tido precocemente acesso a essa dimensão terá
condições de encontrar um inestimável apoio, que em
situações patológicas mais graves poderá até salvar sua
vida.
Se as crianças aprenderem desde cedo esse tipo de
fantasia, mais tarde terão vantagens em muitos níveis.
Quase não há campo na vida que não lucre com a
possibilidade, no plano interno, de olhar retrospectivamente
para a superfície das aparências. Com o tempo, fica mais
familiar e mais fácil lidar com as imagens anímicas; as
próprias imagens tornam-se mais expressivas e claras.
Assim, consegue-se cada vez mais penetrar a essência das
coisas. Quando então as imagens míticas e de contos de
fadas do inconsciente coletivo se unem ao próprio imaginário
pessoal, toda a vida se inspira e se torna mais plena. Os
sonhos noturnos tornam-se mais vivos e direcionados, e a
vida pode ser vivenciada como outra forma de sonho. Assim,
desde cedo já se pode preparar o caminho para uma vida de
sonho. Quem abre ou mantém aberto para seu filho o mundo
das imagens anímicas, presenteia-o com um tesouro
precioso. E, ao mesmo tempo, os pais, nesse caso, dispõem
do método mais elegante para ter acesso à alma da criança.
Através das histórias contadas antes de dormir, entre
outras, dos contos de fadas, das lendas e dos mitos,
consegue-se um acesso mais fácil e pessoal. Também há
CDs com histórias predeterminadas ou meditações, que há
muitos anos se mostram eficazes.[14]

2.13 Ritmos e rituais


Tanto os ritmos quanto os rituais confiáveis dão segurança e
aliviam a vida sobretudo de crianças pequenas, mas às
vezes também das maiores, de um modo que os pais
modernos geralmente já não conseguem entender. Rudolf
Steiner dizia: “Toda vida é ritmo”.
Traduzida na prática, essa questão é a base ideológica da
empresa farmacêutica Wala, cujos medicamentos não têm
sua duração prolongada com conservantes químicos; ao
contrário, mantêm sua vitalidade porque respeitam os
diversos ritmos naturais. Richard Alpert, ex-professor de
Harvard, que posteriormente se tornou o guru Ram Dass,
disse: “Toda vida é dança”. Com isso, ele formulou a mesma
verdade com outras palavras, pois a dança também vive de
ritmo. E muito mais antiga é a formulação “tudo flui”: panta
rhei – um princípio fundamental atribuído ao pré-socrático
Heráclito. Mas o que flui desencadeia ritmo, que é visível nas
ondas. Por fim, a física moderna mostra que toda vibração é
o que, por sua vez, o ritmo traz para a vida.
Para a vida da criança, os ritmos têm uma importância
decisiva. Ela precisa deles para permanecer saudável e se
desenvolver. A forma mais simples de conferir-lhe um ritmo
estável é embalando-a nos braços, o que toda mãe faz
espontaneamente e já fez de maneira inconsciente com sua
respiração durante a gravidez. A passagem para o mundo
exterior, onde, nesse sentido, a criança está mais por conta
própria, é facilitada quando ela consegue, desde o princípio,
ter acesso a seu próprio ritmo. Segundo minha experiência,
uma possibilidade ideal é oferecida por um sistema de
vibração suíço chamado de “Sleepy”. Ele consiste em quatro
pequenas semiesferas azuis, que são colocadas nas hastes
verticais de sustentação ou no canto do berço. Só isso já é
suficiente para fazer com que todo o berço, através da
mistura do ritmo da respiração e do batimento cardíaco da
criança vibre de maneira suave, quase imperceptível, mas
muito eficaz. Assim, o estímulo ao sono é impressionante e
facilita os rituais para que o bebê adormeça e que costumam
ser tão trabalhosos.
Além disso, esse sistema traz excelentes resultados para
lactentes que sofrem de cólicas aos três meses e para
crianças com TDAH, o que se explica da seguinte maneira:
crianças com TDAH sentem muito pouco o próprio corpo, por
isso têm a constante necessidade de se movimentar. A
sensação do próprio corpo compõe-se de diversos fatores,
entre os quais o sistema vestibular no ouvido interno é
especialmente importante. Com o sistema de vibração, o
ouvido interno recebe durante toda a noite um leve estímulo,
o que deveria ser determinante para o mencionado efeito
benéfico.
No que se refere ao ritmo, também é importante que as
crianças possam crescer em um ambiente confiável, com
regras temporais e uma rotina regular, que já poderia
começar com os devidos períodos de amamentação. Ritmos
de sono e vigília também devem fazer parte dessa rotina.
Obviamente, esses ritmos sofrerão adaptações com o
avançar da idade; entretanto, mesmo mais tarde, para
muitas crianças continua sendo importante poder confiar em
uma rotina regrada.
Entretanto, é imperativo fazer uma distinção entre a
cadência apagada e fixa e o ritmo vivaz. O ritmo vive,
conhece exceções, e os tempos não devem ser mantidos de
forma rígida; o ideal é que se deem como esfera da vida a
partir da necessidade do convívio. Assim como os ritmos
respiratório e cardíaco sempre se adaptam às necessidades
atuais, os ritmos do dia no contato vivo entre as pessoas
também se renovam constantemente. E, apesar disso, ou
justamente por causa disso, eles transmitem segurança.
Regras fixas, como são conhecidas nos internatos
rigorosos e nas escolas severas, significam o oposto do ritmo
vivaz, obrigam a uma cadência que é estranha à vida. Na
medicina, um batimento cardíaco rígido é sinal de ausência
de regulação autônoma e fornece um prognóstico muito ruim
quanto à expectativa de vida.
Seria um bom conselho aos pais se eles criassem um
ambiente em que houvesse espaço para necessidades
individuais, ou seja, por assim dizer, como uma estrada com
seus guard-rails, que preestabelecem a direção, mas são as
crianças que devem escolher a faixa por onde circular.
Rituais flexíveis e conciliados individualmente ajudam os
ritmos naturais a conseguir uma brecha também no mundo
moderno. Eles vivem de campos estáveis. Quando muitas
pessoas fazem a mesma coisa ao mesmo tempo, um campo
se desenvolve. A seguinte sentença exprime essa relação
com clareza: “Quando uma pessoa sonha, tem-se um sonho;
quando muitas sonham, desenvolve-se uma nova realidade”.
Os campos se fortalecem à medida que muitas pessoas se
ajustam a eles, ou seja, os carregam com mais intensidade.
Nesse sentido, é importante que todos na família não apenas
participem dos campos, mas também os carreguem
emocionalmente consigo. Um ritual bem estruturado antes
de dormir pode anular o estresse de ir para a cama ou, pelo
menos, aliviá-lo em parte. De modo semelhante, rituais no
início do dia podem tornar mais fáceis atividades tão pouco
inspiradoras como escovar os dentes e lavar-se. Mesmo as
atividades vistas como desagradáveis, como a arrumação,
podem tornar-se um ponto alto no mundo familiar quando
são relacionadas a um belo ritual em conjunto. Para tanto,
pode contribuir uma música adequada ou uma conversa
enquanto se lava e seca a louça. Na era das máquinas de
lavar, talvez seja difícil encontrar rituais de trabalho em
conjunto, mas quem procura também nesse caso
encontrará.
Em geral, somente mais tarde as crianças conseguirão
avaliar o quanto esses rituais reforçam a estrutura familiar.
Portanto, os pais não devem desanimar muito rápido se, no
início, apesar do grande empenho e da motivação bem-
intencionada, as crianças se mostrarem recalcitrantes e
contrariadas. Qual a criança que prefere lavar a louça ou
arrumar o quarto a fazer justamente o que lhe dá prazer?
Que o trabalho em conjunto pode proporcionar alegria é algo
que deve ser aprendido e, mais tarde, consolidado com
rotulações pretensiosas como “espírito de equipe”.
Mas, naturalmente, os rituais e os campos também podem
ser mal utilizados, tanto nas famílias como na política. Eles
não são bons nem ruins; tudo depende de como são
utilizados e com que objetivo.
Quando a vida da criança adquire uma esfera confiável
através de um ritual matutino ou noturno, muito se ganha –
para a infância, mas também para toda a vida futura. Do
ponto de vista espiritual, trata-se, em última instância, de
viver a vida inteira como um grande ritual consciente.
Contanto que outros pequenos rituais se acrescentem, as
chances aumentam. Se todo ato de lavar as mãos,
amplamente superestimado por seu valor higiênico, se
transformasse em um ato de “lavar as mãos na inocência”,
ele voltaria a adquirir grande valor e, precedendo as
refeições, estas teriam igualmente mais chances de se
transformarem em um verdadeiro ritual.
Em vez de se aprontar de manhã na frente do espelho, o
que quase toda mãe faz e transmite à filha, sem reconhecer
esse ato em seu terrível duplo sentido, também podem ser
encontrados rituais construtivos para iniciar o dia. Em todo
caso, xingar-se diante do espelho e sobre a balança é a pior
maneira concebível de começar o dia. Sensato seria, antes,
uma meditação, por exemplo, com os movimentos do qi
gong e do tai chi, uma série de exercícios como a oração ao
Sol, praticada no yoga ou no campo da já mencionada
ginástica consciente. Esses exercícios são rápidos e, de
tempos em tempos, sempre aumentam a flexibilidade e a
capacidade de adaptação, além de significarem um
acréscimo mensurável à inteligência.
Se esses rituais não forem possíveis por motivos de tempo,
muitas vezes basta respirar conscientemente por cinco
minutos embaixo do chuveiro ou desenvolver hábitos que
não custem nenhum tempo adicional, como iniciar o dia
sempre de maneira agradável, por exemplo, sendo
despertado pela música preferida, e não pelo despertador.
Para encerrar o dia, recomenda-se um ritual como a
“meditação de retorno”, que passa em revista os momentos
mais importantes do dia. Assim, a criança aprende desde
cedo a encerrar regularmente seu dia. Mesmo quando
tarefas e trabalhos ficaram incompletos, a aceitação desse
fato é sempre uma boa possibilidade de terminar o dia, o
que possibilita um adormecimento e um sono tranquilos. Em
crianças maiores, escrever um diário também pode trazer
alívio.
Quanto mais vezes e mais cedo uma criança aprende a
fazer de hábitos conscientes seus rituais, tanto melhor será
seu desenvolvimento e tanto mais facilidade terão os pais
para educá-la. Quando isso se estabelece, também fica fácil
atualizar os rituais, caso o envelhecimento e as progressivas
fases de desenvolvimento assim exijam.
No que se refere ao tema “ritmo”, todos os respectivos
exercícios, de dança à equitação, mas também a simples
caminhada, são uma boa possibilidade. Se as crianças
tiverem dificuldade com seu próprio ritmo, é bom ensiná-las
desde cedo a caminhar com bastões de apoio, como é
comum nas caminhadas em montanhas e atualmente
também se tornou moda com o nordic walking (caminhada
nórdica). Se os braços e as pernas entram em um ritmo
comum, a criança acaba praticando a coordenação motora, o
que a ajudará, mesmo em outras áreas, a encontrar mais
facilmente o próprio ritmo e o próprio caminho.
Por certo, só o fato de marcar os compassos de uma
música já é um exercício de ritmo adequado, que está no
sangue de todos nós. Adultos também tamborilam os dedos
a qualquer momento todos os ritmos possíveis no volante do
carro e balançam os pés em toda ocasião, apropriada ou
não. Ainda hoje, a maioria das pessoas em sociedades
arcaicas é de músicos e, essencialmente, percussionistas.
Como todos nós temos esses ancestrais, o ritmo do tambor
logo se torna nossa segunda natureza. Quando as crianças
vivem essa referência desde o início, isso também as ajudará
mais tarde em muitas situações. Nesse sentido, tocar
instrumentos de percussão seria, obviamente, o acesso mais
fácil.
Acalentar os bebês também é sempre uma forma de
conferir ritmo, e é desse ritmo que viria o efeito
tranquilizador. Bem mais tarde, ainda reagimos
positivamente a esses impulsos: sentamos em cadeiras de
balanço, em balanços de jardim, dormimos em camas que
balançam e dançamos balançando os braços. Apaixonados
passeiam de canoa ou nas clássicas gôndolas de Veneza em
acalentadoras viagens de lua de mel. Como toda vida é
ritmo, damos mais vida à vida de nossos filhos quando os
induzimos a vibrar e a balançar. Mas, na maioria das vezes,
isso não é necessário, pois eles buscam gangorras e
balanços de maneira totalmente espontânea e por puro
prazer, trazendo movimento para a vida. Com efeito, assim
também se preparam. Essas considerações podem até
parecer simples, quase evidentes e banais, mas ajudam a
prevenir distúrbios do sono e outros distúrbios do ritmo, e
até de modo divertido. A pergunta: “Você quer ir comigo?”
significa, antes: “Você consegue me acompanhar no mesmo
ritmo?” Ela também mostra claramente quão importante é o
ritmo conjunto e permite perceber se duas pessoas
conseguem participar juntas de alguma coisa e vibrar juntas.
O exercício mais fácil de ritmo é dormir em uma cama que
oscile ou balance (“Sleepy”), o que é possível fazer em todas
as idades.

2.14 Confiança no reino mágico-mítico


A humanidade viveu parte predominante de sua história em
um mundo mágico-mítico. E, sejamos honestos, ainda hoje o
faz amplamente. Em primeiro lugar, de fato a maior parte de
nossa espécie ainda não chegou à era científica; em
segundo, entre nós, a superstição ainda domina a vida de
muitos contemporâneos. Isso pode ser manifestado em
anedotas como a do secretário de um partido comunista,
que, ao ser perguntado se acreditava em astrologia,
respondeu: “Não, nós virginianos somos céticos”. Com
efeito, aparentemente, nem sequer periódicos críticos e de
esquerda conseguem renunciar aos horóscopos semanais,
que realmente têm mais a ver com a superstição do que
com uma astrologia carregada do conhecimento de
princípios primitivos. Também na população de países
industrializados ainda predomina uma visão de mundo
bastante primitiva, com simpatias e pensamentos mágicos.
Em todo caso, depois de todos nós já termos passado por
uma fase de desenvolvimento como essa e de a maioria, em
parte, ainda estar nela, poderíamos, desde o início,
conseguir para nossos filhos o acesso para o mundo mítico
de nossos antepassados. Isso aprofundaria e, ao mesmo
tempo, aliviaria consideravelmente sua vida. As figuras
lendárias dos mitos e contos de fadas ainda estão vivas em
nossa alma, seja como arquétipos enterrados e submersos,
que nos assombram vindo das sombras, ou como partes
conscientemente integradas da personalidade. Obviamente,
nisso se fundamenta a importância dos contos de fadas e
mitos nos antigos sistemas educativos. É evidente que a
última opção é muito mais vantajosa para a criança. Uma
ligação com o subsolo da própria cultura é sempre mais
sensato e importante, além de configurar uma espécie de
alimentação da alma, à qual não se renuncia impunemente.
Se hoje sofremos com o fato de que os valores de nossa
cultura caíram no esquecimento, de que a juventude já não
tem objetivos e de que os exemplos e os ídolos, pelo menos
do ponto de vista das gerações mais velhas, deixam a
desejar, isso também tem a ver com a falta de alimentação
da alma a partir do campo mítico. De tudo isso resulta a
espantosa falta de sentido que ameaça muitas vidas
modernas. Os adultos da atual geração espelham nessa
circunstância apenas seus pais, que de muitas maneiras
também já perderam o acesso à própria base primária e
mítica da alma em períodos de guerra e pós-guerra. Em
muitos, essa base foi obstruída mediante o abuso inefável
que os nazistas exerceram com os mitos germânicos.
Ainda antes da fase mítica, a humanidade viveu uma fase
mágica, que, contudo, se manteve por muito tempo na
época mítica, cuja compreensão do mundo permaneceu
essencialmente mágica. O quanto ainda hoje essa ideia
determina os mundos da alma é o que demonstra a moderna
pesquisa sobre os placebos. Como as crianças estão
passando novamente por todas essas fases do
desenvolvimento, elas têm fácil acesso não apenas às
histórias, mas também a representações mágicas.
Provavelmente, é nisso que reside o fundamento para o
enorme êxito das histórias do Harry Potter.
Quando as crianças preservam essa referência, elas
conseguem compreender mais rápida e profundamente
coisas mágicas como o dinheiro, que, de maneira
extraordinária e, no início, quase incompreensível, cria
acesso a todas as possibilidades. De todo modo, como o
mundo mágico se revela em seus efeitos negativos e, na
maioria das vezes, assustadores à alma infantil, por exemplo
no medo de fantasmas ou do escuro, obviamente é melhor
entrar em contato também com as possibilidades positivas
desse plano. Quem já sentiu o efeito surpreendente de
placas com inscrições como “Proibida a entrada de
fantasmas!” ou a possibilidade de “comprar” das crianças
suas verrugas não irá querer renunciar a esse tipo simples e
gratuito de intervenção terapêutica. As mães podem ajudar
seus filhos se, por exemplo, no início de uma viagem,
traçarem um círculo (mágico) ao redor deles ou os benzerem
com água benta, pois, assim, a excursão inteira ocorrerá sob
uma boa estrela. De acordo com a experiência, se
acreditarem que desse modo estão protegidos, muito menos
coisas lhes acontecerá.
Muitos pais também usam a compreensão mágica do
mundo assumida na vida cristã, por exemplo quando, no
Advento, fazem vir São Nicolau,[15] que passa um sermão às
crianças que não se comportaram direito, as elogia por suas
boas ações e lhes dá esperanças para o futuro, para que elas
deem o melhor de si e mostrem seu lado bom. Nesse
sentido, amuletos também podem ajudar, quer se orientem
pela cruz cristã, quer por símbolos xamânicos.

2.15 As regras do jogo da vida


O que é evidente no esporte e nos jogos de sociedade, ou
seja, o aprendizado das regras desde o início, não costuma
ser comum em relação às regras da vida, muito mais
importantes. Mas a vida se sai tanto melhor quanto mais
cedo suas regras são aprendidas. No futebol, quem não é
substituído no primeiro tempo ainda acaba fazendo gol
contra no segundo. Na vida ocorre algo semelhante: quem
deixa de fazer as mudanças necessárias na metade da vida,
posteriormente também só fará gol contra. No futebol, quem
não conhece a regra do impedimento terá pouco êxito e não
encontrará nenhum reconhecimento para seus gols. Na vida,
quem age sempre a partir de posições de impedimento
também terá pouco êxito, e seus esforços encontrarão pouco
reconhecimento. No entanto, o que no futebol é
praticamente excluído, na vida se tornou rotina. A maioria
das pessoas vive sem sequer imaginar as regras da vida e,
portanto, tem pouco sucesso em seu jogo.
Quem deseja fazer algo bom a seus filhos deveria ensinar-
lhes o mais rápido possível as regras do jogo. Quanto mais
cedo, tanto mais rápido e melhor eles conseguirão encontrar
sua felicidade em “Lila”, o jogo cósmico, tal como os
indianos denominam a vida.
As formas básicas dessas regras podem ser encontradas
em praticamente todas as escrituras sagradas de quase
todas as religiões. Elas formam a espinha dorsal da filosofia
hermética e se encontram resumidas, por exemplo, no Livro
das Leis.
Em primeiro lugar está a lei da polaridade, que, por
exemplo, faz com que muitos matrimônios de casais
apaixonados, contraídos diante do padre, terminem em puro
ódio diante do juiz. Em segundo lugar na hierarquia está a lei
da ressonância, à qual está relacionado o fato de que
dinheiro atrai dinheiro, e felicidade atrai felicidade, mas
também infelicidade atrai infelicidade. Em seguida vêm
regras essenciais, como aquelas para os campos da
consciência, modelos e rituais e, por fim, a combinação dos
princípios primitivos.

2.16 Exercícios para o crescimento, o


desenvolvimento e o bem-estar
2.16.1 Riso

Infelizmente, as pesquisas referentes ao riso ainda são tão


escassas quanto recentes. No entanto, até agora, todas
mostram que uma boa risada representa um verdadeiro
elixir para a vida. Por certo, os adultos simplesmente não
perdem todo o seu duro sofrimento já com a primeira boa
risada, mas as crianças não são tão seletivas. Gostam de rir
pra valer, com todo o rosto, ou se sacodem de tanto rir, e
pelo menos uma vez por dia precisam de uma dessas
experiências verdadeiramente alegres. Não há dúvida:
“dobrar-se de tanto rir” é um dos mais importantes e belos
tipos de ginástica. Quanto mais, melhor. O medo de que elas
possam rir demais ou morrer de rir é infundado. Até hoje,
nunca aconteceu. Muito pelo contrário – rir é o melhor
remédio e extremamente contagioso. Nesse sentido, seria
muito mais perigoso entediar-se até a morte ou definhar
lentamente por rabugice. Os pais devem empenhar-se em
proteger as crianças disso através de desafios adequados,
que as solicite e estimule tanto física quanto psiquicamente.
Há muito tempo se sabe e, a essa altura, tornou-se
incontestável o fato de que quem solicita seus músculos os
estimula. O mesmo vale para o trato intestinal, e é por isso
que devemos comer alimentos ricos em fibras, mas também
vale para o cérebro, ao qual faz bem pensar e praticar a já
mencionada ginástica consciente.
Mesmo que ainda não saibamos exatamente por que rir é
tão saudável, podemos confiar nessa evidência. Sabe-se que
uma boa risada aciona um grande número de músculos;
porém, mais importante deve ser o efeito curativo, ainda
pouco pesquisado, sobre a alma. Simplesmente faz bem
quando as tensões são descarregadas em uma sonora
gargalhada e quando uma risada libertadora soa do fundo da
alma. Quem tem muitas ocasiões para rir tem sorte; quem
nada tem do que rir, está no reverso da vida boa. Por isso, é
bom rir muito e fazer as crianças rir. Elas gostam disso;
deixam que nelas façam cócegas e gostam de fazer cócegas
umas nas outras.
Quando os pais olham para os olhos sorridentes dos filhos,
isso sempre desencadeia um sentimento de felicidade. Os
nativos de Bali riem mais com os olhos do que outras
pessoas e chamam esse riso superior de celestial; em
contrapartida, o riso do coração é considerado por eles um
riso individual e pessoal. Com efeito, a criança também pode
rir e, sobretudo, sorrir com o coração. Porém, segundo a lei
da ressonância, quem se encaminha para a vida com o
coração sorridente e os olhos radiantes desencadeará
sorrisos por toda parte, além de reações radiantes e
sublimes. Com um sorriso no coração e outro em cada olho,
o mundo assume um aspecto totalmente diferente e,
principalmente, também enxerga a pessoa de modo
totalmente diferente. Por conseguinte, um exercício simples
para os pais é sorrir para pessoas desconhecidas na rua e
ver como isso (na maioria das vezes) conduz a um “sorriso
de retribuição” espontâneo. Normalmente também se fala do
sorriso aberto daquelas pessoas que nada têm a esconder...
2.16.2 Exercícios de confiança

O ideal seria que uma criança já viesse equipada com uma


boa porção de confiança primária, sobre a qual pudesse
construir sua autoconfiança para conquistar o mundo com
coragem e determinação. Se nos primeiros meses decisivos
da gestação houver deficiências nesse sentido, da falta de
confiança primária resultará facilmente uma falta de
autoconfiança, difícil de ser compensada mais tarde na vida.
De grande auxílio podem ser os exercícios que apresento no
livro Schwebend die Leichtigkeit des Seins erleben
[Experimentando a Leveza do Ser na Levitação]. Porém,
infelizmente, crianças pequenas e, sobretudo, lactentes
quase não têm condições para isso.
Em substituição, recomendo aqui exercícios adequados
para desenvolver a confiança (mais do que isso eles não
podem ser, pois a verdadeira confiança primária cresce
apenas a partir da experiência de unidade, que só pode ser
vivida nos primeiros meses de gestação). Eles ocorrem nas
chamadas peak experiences ou experiências de pico,
aqueles momentos mágicos em que, por exemplo, como
cavaleiro, a pessoa se sente unida ao cavalo e percebe que a
felicidade deste mundo está, de fato, no dorso do animal, ou
em que, após uma longa caminhada na montanha com a
mochila nas costas, todo o peso da existência cai de seus
ombros e a pessoa se sente unida a Deus e ao mundo e
profundamente ligada a eles.
Para crianças pequenas, consideram-se exercícios como
pular ou deixar-se cair de um muro baixo nos braços do pai
ou da mãe. Deixar-se cair em uma coberta, que é segurada
como uma cama elástica, pode intensificar essa experiência.
As crianças que aprenderam a flutuar na água também
devem ser encorajadas a pular ou deixar-se cair lenta e
conscientemente na água. Por fim, cair de maneira
totalmente consciente, e até de cabeça, na água, que é o
elemento da alma, pode ser um exercício libertador para
uma criança, contanto que ela seja adequadamente
preparada e convidada a isso como a um ritual. As
possibilidades são cada vez maiores, e o importante é que
não surjam nem ambição nem concorrência, que ambas
pertençam ao polo masculino e não favoreçam o surgimento
da confiança (primária). Quando as crianças ousam, por
exemplo, pular nas águas escuras de um lago pantanoso é
porque alguma coisa aconteceu no plano psíquico.
O chamado “círculo de confiança”, no qual a criança fica
no meio e se enrijece, para em seguida, ao cair, sempre se
deixar segurar por um círculo de outras crianças ou também
de adultos pode ajudá-la igualmente a se soltar. Já pela
postura das pernas é possível ver se elas estão rígidas ou se
denunciam pequenos passos de medo, até onde a criança
chega e até que ponto consegue confiar em alguém.
Um exercício prazeroso para soltar-se em qualquer idade é
também o inventado pelo terapeuta norte-americano Milton
Trager, no qual cinco pessoas se reúnem ao redor de outra e
cada uma movimenta suave e delicadamente uma parte do
corpo dela. Duas se ocupam das pernas e outras duas dos
braços, e a última, da cabeça. Por meio desses exercícios
totalmente individuais e nada sincronizados – eventualmente
acompanhados por uma música suave e delicada – a criança
perde o controle sobre as partes de seu corpo e pode, por
fim, sentir prazer e confiança ao soltar-se. O exercício
termina em uma magnífica disposição de serenidade e
profundo relaxamento. Essa disposição torna-se ainda
melhor dentro d’água, à temperatura do corpo e com uma
atmosfera adequada, que lembre aquela do nascimento.
Em geral, os exercícios do chamado trabalho na água, que,
na realidade, são tudo menos trabalho, mostram-se muito
apropriados para dar confiança às crianças (e a adultos que
buscam contato com sua criança interior). Por um lado,
porque fazem lembrar o período intrauterino, uma vez que a
água (termal) deve ter a temperatura corporal de 36 graus
como o líquido amniótico. Por outro, porque visam a que a
pessoa se solte e alcançam esse objetivo de modo suave,
feminino e lunar; portanto, totalmente adequado às crianças.
Estamos falando de “aqua-e-motion”, pois a água evoca
todas as emoções possíveis que estão ligadas ao mundo
aquático anterior. Como bem diz o nome “e-motion”, essas
emoções emergem a partir de dentro (o verbo latino
emovere significa “mover-se para fora”), colocam-nos em
movimento e, em seguida, permitem que nos soltemos e nos
deixemos cair.
Por fim, todos os desafios assumidos pela criança são
adequados para criar confiança em um mundo a ser
dominado. Nesse sentido, os pais podem facilitar muitas
coisas por meio de um acompanhamento sensível. Quem
aprende desde cedo a resistir em vez de recuar, a
posicionar-se em vez de fugir, irá avançar com confiança e
integridade, em vez de passar furtiva e timidamente pela
grande oportunidade da vida. Isso tem efeitos não apenas na
postura externa, que se abate na coluna vertebral, nosso
eixo no mundo, mas também, sobretudo, na postura interna,
que determinará como essa pessoa se posicionará mais
tarde na vida perante todas as outras.
Um exemplo adequado nesse caso seria uma variação da
“cabra-cega”, que também se mostrou muito eficaz com
adultos em meus seminários: um acompanhante conduz a
criança, que tem os olhos vendados, a diferentes lugares e
faz com que ela sinta e exercite, além da confiança,
diferentes estímulos sensoriais.
2.16.3 Todo dia uma boa ação ou espírito de equipe para iniciantes

Essa antiga regra de escoteiro parece há muito ultrapassada.


Hoje estão na moda os tipos que pouco ou nada se
preocupam com o próximo; ao contrário, mostram-se ainda
mais arrogantes e esclarecidos do que na verdade são. Mas
qual a situação de sua alma e daquela em geral? Nesse
sentido, ela é antiquada e ainda se sente bem quando pode
apoiar e ajudar os outros a levar a vida. Portanto, de modo
totalmente independente do espírito da época, a alma fica
muito melhor com a antiga filosofia de escoteiro.
Para a vida em família, o apoio mútuo também só traz
vantagens. Nesse caso, é ideal que se exercite para mais
tarde dar às crianças a base para seus próprios
relacionamentos. Não apenas a comunidade familiar tira
proveito disso, mas também toda criança.
Em última instância, obviamente isso também vale para
toda comunidade ou equipe, bem como para todo time.
Mesmo no futebol moderno, dominado por times
absurdamente caros de milionários, sabe-se que o dinheiro
não cria o espírito de equipe; ao contrário. Estrategistas da
economia moderna exigem dos colaboradores a capacidade
de trabalhar em equipe. Mas onde essa capacidade deve ser
aprendida, se não na família, no jardim de infância ou na
escola? Nesse sentido, as antigas brincadeiras de criança,
que envolviam todos os membros do grupo e, de algum
modo, também os unia, têm uma importância que ultrapassa
em muito a mera transmissão de conhecimento. As equipes,
mesmo as mais modernas, vivem essencialmente de apoio
mútuo – ou então simplesmente não vivem. Mas, nesse caso,
na maioria das vezes têm uma bela surpresa. Assim, no
contexto geral, a ideia de escoteiro tem uma importância
muito maior do que o tempo atual reconhece.
Um pedagogo social, que há muitos anos trabalhava com o
acompanhamento de jovens, contou-me sua experiência.
Entre todos os jovens fracassados que ele acompanhara,
nunca houvera nenhum que tivesse jogado em um time,
participado de um coro ou de uma orquestra ou sido um
escoteiro ativo. Ainda que esta não seja uma declaração
cientificamente relevante, ela não deixa de mostrar uma
tendência. Quem aprendeu a se inserir em um grupo e a
participar dele não agirá tão facilmente contra a
comunidade. Portanto, teríamos a possibilidade de resolver
os problemas dos jovens, e a solução reside, naturalmente,
no início, na infância.
Disso também resulta, em parte, a problemática dos filhos
únicos, que raramente têm a oportunidade precoce de se
inserir. Por conseguinte, para eles seria importante participar
de outros grupos o mais cedo possível, de preferência já em
idade pré-escolar. Entretanto, se no jardim de infância já
surgirem os “pequenos tiranos”, sobre os quais Jirina Prekop
escreve de maneira comovente em seu já citado livro, eles
terão dificuldade para aprender a se inserir e, assim,
tornarem-se “sociáveis ou socialmente competentes”. Esse
fracasso costuma ocorrer, sobretudo, quando uma mãe
solteira se vê confrontada com um filho que supera suas
forças e em relação ao qual ela sente a consciência pesada
porque o pai o deixou. Nessa situação, seria de central
importância fazer com que a criança tenha logo cedo acesso
a grupos nos quais consiga encontrar seu lugar e,
eventualmente, também conquistá-lo.
Em geral, a consciência pesada não é boa conselheira para
a educação, mesmo no caso de pais que trabalham muito,
que não conseguem controlar sua preocupação ou que
conduzem mal a própria vida. Quando então a interação
familiar fracassa, todos acabam por isolar-se, e a
preocupação com o outro, bem como a relação com ele,
entra na monotonia da rotina.
Um bom time vive da autoconfiança saudável dos
membros e, por sua vez, também tem a capacidade de
apoiá-los em períodos de crise. A definição de um bom time
ou de uma parceria adequada é: “Ao final, cada um recebe
mais do que dá”. Quando isso deixa de ser verdade, o
sistema do grupo se fragmenta com mais ou menos rapidez.
2.16.4 Animais como companheiros de vida

Provavelmente, em épocas mais remotas, os animais já


conviviam conosco e, além de sua utilidade, sempre
trouxeram um aspecto de amizade para nosso dia a dia. Os
pastores alemães e os cães de caça de hoje são os últimos
exemplos dessa antiga comunidade de trabalho, que, na
mudança dos tempos, se desenvolveu cada vez mais,
passando do aspecto de utilidade para aquele de
relacionamento. Progressivamente, o cão de guarda é
deslocado dos postos de alarme e se torna um animal de
estimação, como um bicho de pelúcia. Assim, embora alguns
cães policiais e aqueles utilizados para encontrar droga
ainda façam seu trabalho, a maioria cumpre tarefas de
relacionamento. À primeira vista parece estranho ver um
gato sentado à mesa e comendo azeitonas, como eu já vi.
Mas, na verdade, a cena combina com essa louca época
(urânica), em que os padrões de relacionamento mudam
rapidamente e, muitas vezes, de maneira inesperada. E por
que não fazer de tudo e dar tudo a um ser com o qual
partilhamos a vida?
Muitas pessoas teriam uma vida mais pobre sem a
companhia de seus animais de estimação. Mesmo em nossas
cidades grandes, deliberadamente hostis aos animais e às
crianças, o cão como acompanhante de pessoas idosas
constitui uma cena familiar. Para as crianças ele teria a
mesma importância, e, para essas pequenas pessoas que
têm a vida pela frente, teria consequências ainda mais
decisivas.
Quão estreita a relação entre o homem e o animal pode
ser é o que nos ilustram os cegos e seus cães. Nesse caso,
por ressonância, o animal empresta a seu parceiro humano
seus olhos, seu nariz e muitas vezes também suas patas,
tornando sua vida não apenas mais suportável, mas também
mais rica em termos de relacionamento. Quando um cão
como esse morre, é quase sempre um drama para as
pessoas que ficam sozinhas e voltam a ser cegas. Nesse
meio-tempo, até os minúsculos pôneis com sapatos
antiderrapantes preenchem essa tarefa como condutores de
cegos. Eles vivem por muito mais tempo e podem
acompanhar uma pessoa por 25 anos ou mais.
Em muitos lugares, cães adestrados facilitam a vida de
crianças com deficiência. Certa vez, um menino deficiente
formulou, de maneira muito clara, que tudo havia ficado
mais fácil para ele e que, graças a seu cão, ele sempre
ficava à frente de seus colegas. Esses animais, geralmente
os Golden Retriever, aprendem a apertar o interruptor e até
a acender e apagar o fogão. Não apenas protegem seu
parceiro, mas também cuidam dele. São, sobretudo,
companheiros de alma e, por isso, logo se tornam
insubstituíveis.
Um pouco mais à frente estão os cães para epilépticos nos
Estados Unidos. Eles aprendem a avisar antecipadamente o
ataque de seus “clientes”, pois o sentem claramente antes
dos próprios doentes. Assim, possibilitam-lhe uma vida
quase normal. Com os minutos ganhos, o epiléptico pode
preparar-se para o ataque, tomando medicamentos,
repousando na posição adequada, etc. Nesse sentido, as
crianças teriam uma enorme possibilidade de ficar bem sem
uma medicação a longo prazo que as incapacite. Contudo,
esse método exemplar requer uma vida de estreito
companheirismo com o amigo cão.
2.16.4.1 Os animais e o sétimo sentido
De acordo com o provérbio, os ratos deixam o navio no
último porto antes que ele naufrague. Com efeito, os animais
são capazes de sentir o perigo de erupções vulcânicas,
terremotos e tsunamis e de fugir em tempo. Eles também
teriam um “nariz” para as coisas importantes da vida (e da
sobrevivência) e talvez até um sentido especial. Foi o que
Rupert Sheldrake, descobridor dos campos morfogenéticos,
documentou e provou com elementos suficientes em seu
livro Der siebte Sinn der Tiere [O Sétimo Sentido dos
Animais]. Portanto, se os animais nos são semelhantes em
muitas coisas e ainda mais sensíveis do que nós, é evidente
que podemos confiar-lhes métodos de cura baseados na
sensibilidade, sobretudo porque, em regra, seus sistemas
energéticos são menos bloqueados do que os dos homens
modernos.
No campo restrito do centro médico em Johanniskirchen,
pudemos observar que dois de nossos quatro gatos sempre
procuravam ficar perto dos pacientes na sala de espera e
preferiam aninhar-se em regiões do corpo deles afetadas por
algum problema. Quem alguma vez já sentiu a suave
vibração de um gato ronronando sobre a barriga dolorida
perde suas dúvidas iniciais sobre a eficácia dessa “terapia”.
De resto, se até os pelos de gatos mortos são utilizados em
casos de reumatismo, quanto não devem ser ainda mais
eficazes os bichanos vivos que ronronam alegremente? Em
todo caso, no centro médico desistimos de todas as nossas
tentativas iniciais de afugentá-los da sala de espera e
acabamos por aceitá-los como “coterapeutas” bem-vindos,
para não falar da alegria que davam às crianças pequenas e
grandes da cidade.
Os animais nos mostram, principalmente, a forma mais
eficaz da terapia, que é dar e receber amor. Fazem de tudo
por seus parceiros humanos e, muitas vezes, mantêm-se
fiéis a eles depois da morte. Na relação entre crianças e
animais, vê-se claramente quão forte o amor pode ser.
Quanto maior o abismo que o amor deve superar, tanto mais
forte ele se torna. Romeu e Julieta amavam-se muito além
dos abismos sociais, e a lenda mostra que esse amor foi
mais forte do que a morte. Muitas histórias de amor que se
tornaram famosas seguem esse modelo até os nossos dias,
como no filme Titanic. As crianças amam seus animais para
além de um abismo muito maior, que é o que separa um
reino da natureza de outro.
É preciso ter matado a criança interior para se comportar
com os animais como costumam fazer os adultos no mundo
moderno. A minoria das crianças deseja consumi-los ou
torturá-los. A maioria quer acariciá-los, alimentá-los e amá-
los. Também nesse aspecto deveríamos voltar a ser como as
crianças. Elas ainda parecem sentir que somos de espécie
semelhante e, como os irmãos e as irmãs mais velhos se
responsabilizam pelos menores, gostam de fazer o mesmo
com os animais. O budismo e o cristianismo franciscano
correspondem àquilo que, por um lado, é a compaixão por
todos os seres sencientes e, por outro, é o desejo de voltar a
ser como as crianças.
Praticamente toda criança tem um profundo anseio de ter
um irmão mais novo na figura de um animal. Esta seria uma
oportunidade especial para os filhos únicos. Em regra, de
maneira bastante concreta, as crianças também querem ter
a seu lado um animal que seja seu aliado, e para os pais
nem sempre é fácil dissuadi-las justamente desse animal.
Transformar esse desejo pelo animal adorado como totem
em uma grande quantidade de animais de pano, fáceis de
cuidar, é mais perversão do que caricatura, mas corresponde
à moda moderna, que não quer saber de animais vivos, que
se adapta ao que está morto e que é inadequado. Porém,
mesmo um animal de pano pode se tornar um
acompanhante útil. Quando o bicho de pelúcia assume um
lugar no mundo mágico da criança, embora não possa lhe
transmitir capacidade de relacionamento e empatia, em
tempos de crise pode lhe transmitir o sentimento de
segurança que é tão necessário.
Na verdade, quem, por interesses de “adultos”, impõe a
uma criança a vida na atmosfera hostil da cidade grande
deveria ficar feliz por escapar dela de modo oportuno ao
adquirir um animal aliado. Obviamente, o ideal seria se a
criança pudesse viver internamente com esse animal da
alma e senti-lo externamente. Quando externamente isso
não for possível, o nível interno se tornará ainda mais
importante e irrenunciável.
Atualmente, os aspectos positivos desse tipo de relação
entre homens e animais podem ser alicerçados até mesmo
pela ciência. James Lynch, psicofisiólogo norte-americano,
recomenda cães como parceiros terapêuticos para
hipertensos, pois esses pacientes costumam ter problemas
com a autoridade, tendendo a ser ríspidos com quem lhes é
subalterno e submissos com quem lhes é superior, o que só
intensifica seus problemas. Com animais domésticos como
cães, eles poderiam, por assim dizer, comunicar-se no
mesmo nível, sem se irritarem.
Hoje é comum encontrarmos distúrbios de comunicação
entre as gerações. Entretanto, na prática, os animais
domésticos sempre viabilizam para as crianças uma
comunicação saudável e responsável. Elas aprendem a
assumir a responsabilidade pelos mais fracos, a estar ao lado
de alguém, a cuidar de alguém com alimento e afeto, e
recebem esse afeto de volta de maneira extraordinária.
Quando os pais trabalham fora, necessariamente se
produzem déficits que os animais conseguem captar com
sua maneira cativante. As boas histórias de animais, de
antigamente até hoje, com cavalos que vão de Fury a Flicka,
golfinhos e baleias que vão de Flipper a Willy, mas também
com cães, desde Lassie, passando por Rin-Tin-Tin, até Rex,
comprovam a necessidade de encontrar no animal um
verdadeiro parceiro, um companheiro para a vida toda.
2.16.4.2 Animais como terapeutas
Na terapia moderna, aprendemos gradualmente a aceitar e
estimar os animais e seu sexto sentido e até a “utilizá-los”, a
fim de desenvolver esse sentido e forças da alma que o
ultrapassem. Na terra dos caubóis, onde durante séculos os
cavalos foram brutalmente adestrados ou exauridos para
serem montados, desenvolveu-se o caminho sensível de
“cochichar ao ouvido do cavalo”, que se difundiu pelo
mundo. Agora os empresários e as mães conhecem a força
de seus pensamentos e de sua vontade em colaboração com
os cavalos, sentem até que ponto vai sua compreensão e o
que podem obter dos animais quando se dedicam
ilimitadamente a eles. Também reconhecem seu efeito real
em outros seres incorruptíveis.
Na equitação terapêutica, as crianças aprendem com os
cavalos coisas que as pessoas dificilmente podem lhes
transmitir. Por experiência própria, com os seminários de
equitação denominados “Equilíbrio em movimento”, sei que
cavalgar de modo consciente é uma possibilidade
extraordinária de encontrar o equilíbrio interior. Entre outras
coisas, os cavalos conseguem nos transmitir uma sensação
impressionante de centro. Depois de uma semana passada
predominantemente sobre a sela, já não se é o mesmo;
sente-se um equilíbrio maior e melhor, devido ao longo
tempo passado com o cavalo.
Mais popular ainda é a moda que surgiu nesse meio-tempo
no mundo dos animais aquáticos. Não importa se são
baleias, golfinhos, jamantas ou raias. Cada vez mais pessoas
engajadas espiritualmente retornam ao mundo aquático dos
primórdios e deixam-se inspirar pelos seres do mar. Em
termos coloquiais, a cena espiritual gosta de nadar com
golfinhos, sobretudo para desenvolver uma espécie de
consciência delfínica própria. E, de fato, por experiência,
posso dizer que nadar ou mergulhar com esses parentes
maravilhosos, que há milhões de anos voltaram ao elemento
anímico que é a água, podem causar efeitos em nós. Quem
já teve a oportunidade de nadar com golfinhos em uma
escola terá tido uma maravilhosa sensação de união com
esses grandes mamíferos marinhos. Certa vez me aproximei
com um amigo de um cardume de cerca de vinte golfinhos
que nadavam e brincavam lado a lado e, aparentemente, se
divertiam. Nós dois, seres humanos, éramos como que
deficientes entre os elegantes nadadores, mas logo fomos
tratados e integrados por eles com carinho. Nossa emoção e
nosso entusiasmo eram tão grandes que ficamos muito mais
tempo na água do que realmente podíamos. Raramente
senti esse tipo de proximidade com os animais, embora
tenha andado muito a cavalo e os adore. Evidentemente, o
espaço de experiência do elemento anímico água
desencadeou sentimentos ainda mais profundos, tocou
camadas mais profundas de nosso ser, talvez porque o
elemento água seja mais primário do que o elemento ar, que
na história da evolução também só se tornou importante
para a vida muito mais tarde.
Além disso, poderíamos aprender muito com os golfinhos
sobre como lidar com as crianças e com o polo feminino da
realidade. Sua hierarquia é exatamente contrária, e eles
privilegiam o princípio arquetipicamente feminino da Lua.
Assim, entram em contato, sobretudo, com deficientes,
como autistas e crianças portadoras da Síndrome de Down;
secundariamente, com outras crianças, mais com as
meninas do que com os meninos, depois com as mulheres
grávidas, outras mulheres e, somente por fim, com os
homens e os homens intelectuais, somente quando não lhes
resta alternativa.
Na sociedade moderna predomina exatamente a
hierarquia oposta. O intelecto arquetipicamente masculino é
dominante, e crianças com alguma deficiência são
marginalizadas e dela excluídas. Isso leva a muito trabalho e
pouco prazer. Os golfinhos, ao contrário, parecem organizar
sua vida em torno dos temas “brincadeira” e “prazer”.
Quando brincamos e aprendemos com eles, aproximamo-nos
do polo feminino dentro de nós, como ocorre no parto na
água, que o médico e obstetra francês Michel Odent teria
aprendido observando os golfinhos. Mas o mesmo se pode
dizer de quando nos entregamos ao elemento da alma, a
água, no chamado tanque samadhi ou floatarium e
flutuamos sem sentir nosso peso.
No convívio com os animais, as crianças ainda podem
entrar em contato com a vida como em um filme acelerado
e, por exemplo, conciliar-se mais cedo com a morte. Devido
à vida curta de praticamente todos os animais domésticos,
com exceção dos papagaios, elas podem aprender a se
adaptar ao ritmo dos vivos, a se despedir e a se desapegar.
Ideal também seria se as próprias crianças tivessem de se
responsabilizar pelos animais e cuidar deles. Ao alimentá-los,
aprendem a cuidar deles, mas também a manter limpos os
locais onde eles ficam, e as visitas ao veterinário poderiam
prepará-las muito bem para temas e tarefas posteriores.
Os pais só precisam prestar atenção para que os animais
não sejam relegados à condição de brinquedos e “objetos de
uso”, pois, nesse caso, se obteria justamente o contrário do
que se pretende. Na sociedade moderna, infelizmente os
animais são cada vez mais reduzidos a meios de produção e
artigos de consumo. Na indústria farmacêutica e de
cosméticos, são “explorados” às centenas de milhares, e há
muito tempo o uso de animais em testes tornou-se aceitável
e institucionalizado. Ele é justificado pelo valor da vida
humana, considerado mais elevado. Assim, mais de 90% dos
testes em animais – mesmo do ponto de vista médico – são
totalmente superficiais e servem apenas a áreas como a
indústria de cosméticos.
No âmbito da sociedade dos descartáveis, quem assume
essa postura também sente pouco remorso ao abandonar
animais que já perderam sua serventia, como se vê às
margens das rodovias alemãs no início das férias ou, como
nos Estados Unidos, onde eles simplesmente são
“descartados”: nesse país há comunidades que oferecem
instalações apropriadas onde as pessoas podem se desfazer
dos animais que se tornaram incômodos ou “supérfluos”.
Eles são empurrados através de uma portinhola e
escorregam em uma gaiola comum, na qual, sem água nem
comida, passam dias se dilacerando e devorando uns aos
outros. Seus restos são incinerados uma vez por semana. No
Japão e nas ilhas dinamarquesas Faroé, golfinhos são
igualmente dizimados de forma indescritivelmente cruel. As
águas nas baías ficam vermelhas com seu sangue durante
horas.
Essa extrema falta de piedade e de consciência mostra o
outro lado da medalha. O homem tem a escolha entre seu
lado de luz e seu lado de sombra. Como pais, deveríamos
conhecer este último em toda a sua extensão, a fim de
podermos escolher com mais segurança o lado de luz para
nossos filhos. Nesse caso, tanto as crianças quanto os
adultos poderiam aproveitar em grande medida o convívio
com os animais.
2.16.5 Encontrando o próprio animal totem

Mesmo quando circunstâncias externas impedem o convívio


com animais (domésticos) ou, em todo caso, com o animal
totem desejado, ainda resta o nível interior. Quanto mais
cedo as crianças aprenderem a entrar em contato com suas
imagens anímicas, tanto melhor será seu desenvolvimento.
Em muitas sociedades arcaicas, elas já aprendiam isso no
ventre materno, quando participavam, como parte do mundo
materno, de suas viagens interiores e meditações. Mais
tarde, esse contato podia ser revivido ou reconstruído por
meio de histórias contadas antes de dormir. Quando as
crianças descobrem essa ligação com suas imagens
anímicas já no início da vida, conseguem não apenas
encontrar seu anjo da guarda, como também o próprio
animal aliado.
O caminho prático para isso é mais do que simples. Ao
fazer a criança relaxar para adormecer, o pai ou a mãe que
conta a história insere-a em um ritual em que se trata
sempre de perceber e tomar como importantes os
pensamentos que emergem do próprio interior. Como em um
jogo, aprende-se a apanhar a primeira ideia logo que ela
surge. Depois de uma preparação adequada e certo
suspense, encoraja-se a criança a pensar no primeiro animal
que lhe ocorre e a dizer seu nome. Assim, ela encontra seu
animal aliado. No futuro, quando ele for convidado a
participar das histórias narradas antes de dormir,
rapidamente surgirão uma confiança e uma relação que, em
muitas situações da vida, terão grande valor.
Em meio às dificuldades da vida em uma cidade grande,
às vezes as crianças também encontram seu animal aliado
no mundo exterior em forma de animal de pano, com o qual
desenvolvem uma relação muito especial ou que está
presente desde o início. Não raro, as crianças o tratam como
se fosse vivo e tivesse alma, e o animal pode mais tarde
tornar-se o verdadeiro guardião de seus sonhos e
acompanhá-las em viagens desafiadoras. Um garotinho
bastante corajoso que se ferira em um curso de esqui longe
de casa e tivera de ficar sozinho no quarto, enquanto todos
os outros iam para a pista, explicou quando indagado que
não ficara absolutamente sozinho, e apontou decidido para o
ursinho de pelúcia que tinha a seu lado. Como professor de
esqui, vi na época apenas um ursinho desgrenhado, mas que
era o que o ajudara muito a superar um dia difícil. Ursos são
clássicos animais que dão força; basta pensarmos nos
inúmeros ursinhos de pelúcia em tantos quartos infantis.
Quando a história antes de dormir progride aos poucos
para a “meditação conduzida”, pelo menos no aspecto das
imagens anímicas a criança está no bom caminho. O ideal
seria se o contato com essas imagens fosse resgatado da
gestação para a infância. Obviamente, todas as noites antes
de dormir, a mãe pode contar uma história tanto para o
embrião quanto para o recém-nascido e, com o tempo,
ambos a distinguirão cada vez menos da meditação
conduzida. Manter uma coisa boa em bom estado é sempre
melhor e mais fácil do que ter de revigorá-la.
Analogamente, por certo é muito melhor preservar o
mundo aquático da fase intrauterina desde o início do que
reconquistá-lo mais tarde com penosas tentativas de nado.
Uma criança nascida na água, de preferência na
temperatura do corpo, é capaz de nadar desde o início da
vida, conforme mostram algumas experiências em “escolas
de natação para bebês”. Se sempre lhe for dada essa
oportunidade de experimentar a água, obviamente ela não
terá de aprender a nadar, pois será capaz de fazer isso
desde o princípio. Irá mover-se como um peixe dentro d’água
e, mais tarde, integrar facilmente alguns movimentos da
natação.
Mesmo que perca o contato com a água, como ocorre com
a maioria das crianças, poderá retomá-lo com brincadeiras e
de acordo com o princípio da Lua, em vez de conquistar o
mundo aquático de maneira arquetipicamente masculina.
Quem entra em contato com a água sem medo consegue
nadar porque seu corpo nela flutua. A partir disso, a
qualquer momento a natação pode evoluir com facilidade.
Uma criança que preserve o acesso ao mundo aquático
terá mais facilidade não apenas para lidar com a vida, mas
também com todo o mundo anímico, que simbolicamente
está ligado à água. Algo semelhante se dá com a criança que
desde o início da vida aceita o contato com o mundo das
imagens anímicas, proporcionado pela mãe. Desde o
princípio, ela irá aprender a apoiar-se nessas imagens
internas e sempre terá um segundo nível complementar para
o intelecto e suas inspirações.

2.17 Terapias especiais para crianças


Gostaríamos de apresentar aqui, separadamente, mais
algumas terapias que se mostraram muito eficazes quando
aplicadas a crianças.
2.17.1 Constelação familiar sistêmica segundo Hellinger

Quando a homeopatia e a psicoterapia parecem não fazer


efeito por períodos mais longos, o problema pode estar em
“emaranhados” no sistema familiar, que têm sua origem em
um passado mais distante do que muitos pais acreditam.
Nesse caso, para esferas mais amplas da população, a
constelação familiar ou terapia sistêmica segundo Hellinger
criou mais conhecimento e abertura do que a terapia
espiritual da reencarnação, na qual estamos acostumados a
observar e resolver emaranhados kármicos. Por fim,
confirmam-se as experiências em ambas as abordagens.
Comprovou-se que crianças apenas raramente ousam ter e
tomar mais da vida e, por conseguinte, ser mais felizes do
que seus pais, por mais que estes também desejem
exatamente o mesmo. Em vez disso, quase todas as crianças
permanecem fiéis e iguais ao modelo familiar,
independentemente de quão inadequado ou até terrível ele
possa ser, e repetem o exemplo dado pelos pais. Isso
acontece mesmo quando a família está há muito
desintegrada no sentido jurídico ou as crianças
aparentemente se afastaram dos pais.
Com o auxílio da terapia sistêmica e de suas constelações,
Bert Hellinger descobriu um meio simples e de rápida
aplicação para tornar conscientes esses “emaranhados” dos
chamados vínculos familiares. Por outro lado, o caminho que
passa pela terapia da sombra necessita de uma psicoterapia
incomparavelmente mais dispendiosa, que, no entanto, não
deixa de ser, ao mesmo tempo, uma terapia, o que o
trabalho sistêmico não afirma de si mesmo.
Quando esses vínculos, que agem praticamente a qualquer
momento, não alcançam a consciência, eles costumam
prender os envolvidos para o resto da vida. Desse modo, é
possível compreender que surjam muitos problemas graves,
que acometem cada vez mais a infância e vão da depressão,
passam por distúrbios psíquicos, como o sentimento de
culpa, e chegam à tendência ao suicídio.
A experiência da terapia da sombra, segundo a qual tudo
que foi reprimido em uma família ou em um clã permanece
preservado, confirma-se aqui de maneira impressionante. O
espectro é amplo e alcança desde os sentimentos
reprimidos, passando pela culpa profunda até os membros
familiares que foram excluídos ou exilados. Aparentemente,
essas “energias que rondam” o sistema (familiar) serão
assimiladas e vividas pelas crianças que nascerem
posteriormente. Desse modo, modelos e destinos inteiros
passam para outras gerações. O que à primeira vista pode
parecer sem sentido e arbitrário, à luz da terapia da
reencarnação se mostra perfeitamente compreensível. De
fato, por esse caminho também se descobre nas crianças
uma relação com a respectiva temática.
Entretanto, este não é o objetivo da constelação familiar,
que se limita a tornar conscientes os “emaranhados”
surgidos, a fim de conseguir que as pessoas em questão
possam se libertar deles. Em todo caso, o conhecimento de
que existe um sentimento estranho que prende e pesa sobre
a pessoa é espontaneamente libertador.
Por conseguinte, as crianças carregam consigo, desde o
início, o modelo ou o destino da família, à medida que
assumem em sua própria vida sensações como culpa, raiva e
dor e quando não recebem nenhum outro espaço no
sistema. A solução através da constelação familiar está em
restituir a responsabilidade e a culpa ao seu causador –
respeitando seu destino.
Segundo Hellinger, a gratidão e o respeito também são os
únicos fundamentos confiáveis para libertar a criança dos
pais. Quando uma criança corta a relação com os pais em
meio à raiva, ela apenas impele a temática para o subsolo.
Segundo a concepção de Hellinger, as crianças não têm o
direito de assumir a culpa dos pais, mas tampouco de
tornarem-se seus juízes. Ambas as coisas não lhes
competem. O ideal seria que não se intrometessem. No
entanto, geralmente as crianças são fiéis aos pais – no mais
verdadeiro sentido do termo – e se dedicam a eles até a
morte. Assim, como já foi dito, em geral não ousam ser mais
felizes que seus pais, pois sentem isso como uma traição.
Quando os filhos se transformam em “crianças-problema”,
apesar de receberem muito amor e dedicação, e quando
todos os esforços dos pais, dos professores e dos terapeutas
se mostram inúteis, deve-se pensar em um emaranhado no
sistema familiar. Outro indício típico é quando as crianças
sorriem quando ouvem o relato de experiências terríveis.
Com o sorriso, elas exprimem que, na realidade, sentem-se
felizes por entregar-se a seu destino aparentemente
predeterminado.
Se o ritual instintivo da constelação familiar realmente
ocorrer de maneira espontânea, são grandes as
oportunidades de conhecimento que podem facilitar em
muito para os pais a compreensão da situação familiar.
Contudo, a pré-condição para isso é que o terapeuta
reconheça quando alguém trabalha de modo não
espontâneo e estabelece (na consciência) um conceito que
traz consigo. Nesse caso, os condutores especializados
recusarão trabalhar com a pessoa em questão, uma vez que,
devido a um conceito pré-fabricado, não conseguem
construir o chamado “campo de conhecimento”, no qual as
pessoas colocadas podem perceber as sensações de
maneira representativa. Por meio de intervenções
orientadas, o condutor tenta encontrar uma solução melhor
para todos os membros da família.
Um exemplo talvez possa esclarecer essa situação. Uma
mãe se apresenta à constelação com o filho, cujo
rendimento escolar é cada vez menor, embora o menino seja
comprovadamente inteligente. Incentivos especiais não
deram resultado. Depois do casamento, o pai interrompeu a
faculdade de medicina e passou a trabalhar como enfermeiro
em um hospital.
Como resultado, a constelação mostra que a mãe despreza
o pai. Ela transmite ao filho: “Não se torne como seu pai, que
é um fracassado”. A criança obedece, mas apenas
superficialmente. No fundo de sua alma, permanece fiel ao
pai e expressa seu amor por ele com rendimento escolar
ruim – torna-se um “fracassado” como ele. Nesse caso, uma
solução melhor seria se a mãe dissesse: “Você pode ser
como eu e também como seu pai”. Assim, a criança não
teria de assumir o lado problemático do pai e poderia voltar
a ter um bom rendimento na escola. Melhor ainda seria se
tivesse a permissão de ser “ela mesma”.
Hellinger parte do princípio de que todo sistema almeja a
perfeição. Mesmo que não o formule desse modo, esse é o
pensamento fundamental das abordagens espirituais, que
partem do desenvolvimento até a perfeição ou libertação.
Porém, isso significa que tudo que obstrui o caminho para a
completude tem de desaparecer. Desse modo, até mesmo
distúrbios e sintomas transformam-se em indicadores que
levam à felicidade e à cura. Assim, por trás de muitos
sintomas podem esconder-se emaranhados, que se tornam
bastante claros em casos de distúrbios comportamentais
inexplicáveis, anseio pela morte ou sintomas concretos,
como o diabete juvenil.
2.17.2 Essências florais para crianças

Atualmente, as mais conhecidas são os originais florais de


Bach, que remontam ao médico inglês Edward Bach e que já
estão radicados na consciência das pessoas modernas
graças ao incansável trabalho de Mechthild Scheffer. A
principal combinação nessa área – preparada pelo próprio
doutor Bach – é o Rescue Remedy, que se comprovou eficaz
para milhões de crianças e adultos.
O sonho de Bach era encontrar um medicamento para a
alma que fosse simples e eficaz, a fim de que toda mãe
recebesse em mãos uma ferramenta que lhe permitisse
ajudar sua família em casos de doença e em situações de
conflito. O objetivo dessa forma de terapia é trazer a alma e
seu mais elevado eu de volta à harmonia e, assim, resolver
problemas espirituais que possivelmente poderiam levar a
doenças físicas. Isso faz da terapia floral de Bach um
excelente recurso para prevenir doenças já na infância, uma
vez que a alma das crianças, ainda relativamente informes,
é bastante receptiva a essas terapias sutis.
Em relação aos originais ingleses, há outros florais, como o
californiano, que é menos conhecido. Um sistema que, por
sua espécie, é excelente para crianças provém das “pessoas
dos primórdios”, os aborígines da Austrália. Nos países de
língua alemã, esse sistema é representado pelo médico Ingo
Hobert. Por ser especialmente apropriado para crianças, irei
apresentá-lo com mais detalhes.
As combinações de flores e arbustos também são ideais
para as crianças dos tempos modernos, que expõem a
sensibilidade infantil a grandes desafios. Muitas emoções,
sensações e necessidades, que hoje encontram pouca
atenção e expressão, podem ser integradas com mais
eficácia, e os desequilíbrios e bloqueios no fluxo de energia
podem ser corrigidos. Como resultado, observa-se uma
melhora nos distúrbios comportamentais, nos sintomas
físicos e em todos os quadros clínicos.
Devido ao método especial de colheita, que não causa
nenhum mal às plantas, os florais também são chamados de
“Love Remedies – essências do amor”. Com base em antigos
rituais dos aborígines, é amarrado um recipiente ao redor
das flores de uma planta medicinal, a fim de colher sua
essência. Com esse método, obtém-se a essência da planta
viva, sem feri-la de modo algum nem interferir em seu
crescimento. A pequena quantidade de líquido colhido em 24
horas contém a essência da planta ou toda a sua vibração,
uma vez que a água partiu do solo, passou pelas raízes, pelo
caule e pelos ramos, até chegar às flores por meio de forças
osmóticas.
O saber em torno das “verdadeiras” plantas medicinais
baseia-se nos conhecimentos de cura transmitidos pelos
aborígines, que atribuíam a cada planta um caráter
específico. Muitos estudos e muitas observações atestam
sua eficácia como catalisadoras e impulsoras, que atuam
dissolvendo os bloqueios em situações psíquicas de estresse
e, de maneira natural, recolocam em ordem os equilíbrios
que sofreram algum distúrbio. Com esse método brando, as
diferentes formas de medo e distúrbios comportamentais
podem ser tratadas de modo particularmente eficaz.
Como método de seleção, ele se mostrou bastante eficaz
ao fazer com que a própria criança encontre
“intuitivamente” o floral ou a combinação atual entre os 38
florais de Bach ou os 45 Love Remedies. É oportuno
introduzir esse processo na alma, por exemplo, fechando os
olhos e pedindo às fadas e aos elfos das flores que lhe
indiquem a essência floral adequada. Na infância, é
espantosa a precisão desse método. Quando não há à
disposição nenhum programa completo dos florais, também
se pode recorrer a um conjunto de fichas com o descritivo
das plantas.
Obviamente, o terapeuta também pode procurar
especificamente entre os 38 florais de Bach ou os 45 florais
de arbustos, ou ainda entre suas 18 combinações, seguindo
um processo que se assemelha à anamnese homeopática.
Cada combinação dos florais de arbustos (Love Remedy
Blends) contém a essência de cinco diferentes plantas
medicinais. Sua fundadora, Juta Stepanovs, classificou 18
preparados diferentes para determinadas circunstâncias e
situações problemáticas. Na infância, mostraram-se eficazes
sobretudo as combinações seguintes, que, naturalmente,
uma mãe atenta também saberá selecionar para seus filhos.
Apresento aqui as dez mais importantes para as crianças,
que também se encontram no livro de Vera Kaesemann,
Kinder-Haus-Apotheke [Farmácia Pediátrica Caseira]:
 
1.
Atenção: Coral Tree, Fan Flower, Guava,
Jacaranda, Sunshine Wattle.
Indicações: dificuldades para tomar decisões em
situações do cotidiano; falta de concentração;
incerteza; lapsos; crianças agitadas ou
hiperativas com excesso de movimentação,
muitas vezes em razão de um excesso caótico
de estímulo; dificuldade para permanecer
concentrado em alguma coisa; distração e
impaciência; espontaneidade e inconstância;
tendência a ficar sonhando; busca de atenção ou
aprovação; muitas vezes, tendência a isolar-se e
a afastar-se da vida social.
Efeitos: reforça a autopercepção; ajuda a criança
a centrar-se e a dedicar-se com mais
concentração às atividades efetivas; ajuda a
fazer uma pausa, a estabilizar o polo interior da
tranquilidade e a encontrar imaginação para
uma única coisa.
2.
Alteração ou Mudança: Pittosporum, Lantana,
She Oak Female, Silky Oak, Worrai.
Indicações: em situações de estresse ligadas a
viagens e mudanças; quando a criança começa a
frequentar o jardim da infância ou a escola;
mudança de escola; mudança de professor ou de
sala; excursão escolar; quando devem tomar
decisões; medo de não conseguir ir adiante;
medo do novo; problemas da puberdade.
Efeitos: reforça e proporciona coragem e
confiança para envolver-se com algo novo;
reforça a autoconfiança em mudanças iminentes.
3.
Confiança: Coral Tree, Fig, Lantana, Papaya,
Worrai.
Indicações: apego excessivo; exigência de
dedicação e atenção constantes; quando a
criança se prende muito à mãe; medo de passar
vergonha; medo de animais; timidez; dislexia;
medo da perda.
Efeitos: ajuda a criança a reencontrar a
confiança e a fé em si mesma, bem como seus
potenciais; reforça a autoestima e a confiança;
estimula a clareza, a presença e a segurança na
comunicação com amigos e colegas de escola;
ajuda a aceitar novos desafios.
4.
Compaixão: Everlasting, Passion Flower,
Plumbago, Silky Oak, Stinging Tree.
Indicações: tristeza; depressão em casos de
rompimento de relações e colapso nervoso;
doença e todas as situações difíceis da vida.
Efeitos: abre o coração para a empatia, a
compaixão e a compreensão dos outros e de si
mesmo; ajuda a sentir a comunicação e a ligação
com as outras pessoas.
5.
Feminilidade: She Oak Female, Pittosporum,
Illawarra Flame, Wild Rose, Waratah.
Indicações: puberdade; perturbação dos
sentimentos; confusão emocional; bloqueios.
Efeitos: revigora por meio de uma ligação
retrospectiva com o próprio potencial feminino
de energia; ajuda a confiar mais nas próprias
intuições e a aceitar as mudanças; os aspectos
femininos (Anima ou Yin) são reforçados; permite
que os sentimentos fluam.
6.
Concentração: Coral Tree, Fig, Ribbon Gum, Silky
Oak, Worrai.
Indicações: quando a inteligência está
excessivamente enfatizada, sobrecarregada e é
solicitada por muitas informações e estímulos.
Efeitos: ajuda a distinguir o que é importante do
que não é importante; valioso no aprendizado,
na preparação para provas e ao longo delas;
estabelece a ligação com a própria força interior;
ajuda a perceber mais claramente o próprio
potencial; reforça a capacidade de se concentrar
e evita a distração.
7.
Masculinidade: Coral Tree, Everlasting, Grey
Mangrove, She Oak (M), Silky Oak.
Indicações: medo de homens; acanhamento;
falta de consciência masculina; insensibilidade
ou hipersensibilidade à dor.
Efeitos: retoma a coragem e a confiança no que
se refere aos aspectos masculinos; maior
desenvoltura para demonstrar os sentimentos;
capacidade de resolver problemas masculinos;
adquire interesse e prazer no campo sexual.
8.
Relaxamento: Passion Flower, Pittosporum, Fig,
Manna Gum, Pigface.
Indicações: medo; tensão nervosa; distúrbios do
sono e inquietação.
Efeitos: ajuda a distinguir melhor o que é
importante do que não é importante; estimula o
relaxamento; reforça a tranquilidade e a paz
interiores; ajuda a reencontrar e a estabilizar o
próprio centro.
9.
Primeiros socorros: Grey Mangrove, Manna Gum,
Mistletoe, Sensitive Plant, Tea Tree.
Indicações: acontecimentos inesperados que
abalam o sistema.
Efeitos: tal como o Rescue Remedy dos florais de
Bach, que lhe é semelhante, essa combinação é
um “imperativo” em toda farmácia pediátrica.
Ela confere consolo e alívio em situações de
estresse e crises, como acidente, choque,
ferimento emocional, trauma, pânico e medo.
Ajuda a recuperação e a suportar as tormentas
que irrompem.
10.
Amor-próprio: Everlasting, Grey Mangrove,
Papaya, Passion Flower, Silky Oak.
Indicações: todos os medos típicos da infância,
bem como medo de trovões; distúrbios do sono;
todos os distúrbios graves de comportamento,
bem como problemas de sobrepeso e peso
insuficiente.
Efeitos: estimula as forças autorreguladoras do
organismo e a autoconsciência; preenche a vida
com confiança e paz; ajuda a descobrir a própria
beleza interior e a se alegrar com ela; reforça a
capacidade de aceitar-se como criança.
2.17.3 Superando o trauma por meio dos movimentos oculares

A chamada técnica EMDR (Eye Movement – Desensitization


and Reprocessing [Dessensibilização e Reprocessamento por
Movimentos Oculares]) mostrou-se muito eficaz na
superação de traumas. Com ela, a criança é instruída a
desenhar um oito na horizontal com o globo ocular, uma
barriga do oito com o olho esquerdo e a outra com o direito.
Em seguida, é encorajada a fazer com que a situação não
superada se passe do começo ao fim diante do seu olho
interior, ou melhor, em sua imaginação. Analogamente aos
movimentos oculares durante os sonhos à noite, os
movimentos nas chamadas fases REM (rapid eye movement
[movimento rápido dos olhos]), essas imitações simples
podem claramente ajudar a neutralizar traumas em
retrospectiva. Ainda não se conseguiu explicar realmente por
que isso acontece de maneira tão simples, mas já podemos
empregar essa técnica. No pequeno livro Notfallapotheke für
die Seele [Farmácia de Emergência para a Alma], há um
resumo desses exercícios fáceis, inclusive essa técnica dos
movimentos oculares, que podem ajudar a superar as
situações de emergência da alma.
2.17.4 Outros exercícios fáceis e eficazes

Igualmente simples é ensinar às crianças o sentido das


batidas, com as quais, por exemplo, podem ser introduzidos
no sistema energético dos meridianos os resultados obtidos.
Só o fato de bater as pontas dos dedos umas nas outras já
permite que se alcancem bons resultados. Normalmente, as
crianças até se divertem ao fazer esse exercício. Como
outros exercícios para superar o medo, resistir e superar as
dificuldades, este também é descrito no livro Notfallapotheke
für die Seele.
Um método bastante instrutivo, que, no entanto, necessita
de auxílio terapêutico é também a psicocinesiologia,
desenvolvida a partir do Touch for Health (Toque para
Saúde).
3 Febre

“Estou cozinhando.”
 
“Dai-me o poder de criar a febre, e eu curarei toda doença”,
já sabia o filósofo grego Parmênides muito antes de nossa
época. Febre não é doença, embora todo o organismo seja
acometido e prejudicado. A criança está preparada para
combatê-la e quer colocar à prova as próprias capacidades
(de defesa), confrontando-se com a ameaça vinda do mundo
exterior (bactérias, vírus, etc.). Em princípio, esse calor do
combate é bom e somente possível em um organismo
saudável, que ainda pode ter febre e está pronto para
assumir a luta pela vida em sentido figurado. O objetivo
ansiado é lutar contra agentes patogênicos, aniquilá-los,
cozinhar por dentro, queimar esses perturbadores da paz e,
assim, restaurar o equilíbrio no corpo. Na maior parte dos
casos, já não encontramos febre nos antecedentes de
doentes crônicos, como os alérgicos, os imunodeficientes ou
os pacientes que sofrem de câncer. As crianças modernas,
que hoje são tratadas praticamente desde o nascimento com
vacinas, antibióticos e outras medidas repressoras, muitas
vezes já carecem logo cedo desse sinal de uma defesa
saudável. Falta-lhes essa reação vital e, com ela, o
amadurecimento do sistema imunológico, a disposição para
o combate, bem como a proteção natural a partir de suas
próprias forças.
A cada grau de febre duplica-se o desempenho do sistema
imunológico, e toda febre o treina para ações posteriores.
Assim, a disposição ativa de defesa do corpo contra agentes
patogênicos torna-se uma formação rumo a uma
personalidade independente e apta para a vida. Muitos pais
vivenciam isso na autoconsciência reforçada da criança após
uma crise de febre. Realizou-se um processo de
amadurecimento. Essas crianças podem assumir sua vida de
forma totalmente diferente, testar seus limites ou também
protestar e brigar. Têm respostas prontas, são cheias de
entusiasmo e conseguem tomar decisões com coragem,
seguindo perfeitamente o lema “desde cedo se exercita
quem pretende se tornar mestre”. Pré-requisito para isso é
que a criança possa ter febre – eventualmente alta – e,
assim, superar o problema de base. Nesse processo, ela
precisa lidar com sua capacidade de sofrer e com seus
próprios limites. Tal como os adultos, as crianças aprendem
não quando todas as dificuldades são retiradas do seu
caminho. Ao contrário, elas precisam ser acompanhadas e
apoiadas com amor e total confiança enquanto passam por
suas crises e as dominam. Assim, conseguem sair
amadurecidas e fortalecidas das doenças infecciosas
superadas com seus acessos de febre.
Expressões como “ansiar febrilmente por alguma coisa”
deixam muito claro o tema agressivo da febre, a mobilização
geral do corpo como uma preparação para uma grande
insurgência. Na prática, é relativamente frequente encontrar
crianças que adoecem em datas como Natal ou aniversário,
porque aguardaram a festa ou a comemoração com tanta
ansiedade que literalmente ficaram febris. Não viam a hora
de convidar os amigos e comemorar, mas não conseguiram
expressar essa alegria adequadamente. Assim, o tema se
personifica como febre no palco que é o corpo.

3.1 A febre pode ser tolerada sem problemas?


O grau da febre é relativamente sem importância. Mais
significativa é a necessidade de a criança beber água
suficiente e eliminá-la através da urina, do suor e,
eventualmente, das fezes; de falar e estar consciente; de
conseguir dormir, relaxar e se recuperar. Em geral, mesmo
temperaturas acima de 40°C não costumam ser perigosas se
a criança for observada com atenção. Contudo, nesse
momento é imprescindível o auxílio de um homeopata
experiente. Já a partir de 38,5°C é necessário um
acompanhamento. A qualidade da febre é mais importante
do que a quantidade.
Há alguns anos, examinei um garotinho que, apesar dos
40,5°C de febre, das bochechas vermelhas e dos olhos
vítreos, entrou todo serelepe no consultório. Logo começou a
brincar e, após um exame minucioso, constatou-se que não
era necessário nenhum tratamento, apenas aconselhar e
tranquilizar a mãe.

3.2 Argumentos contra a diminuição da febre


Não deveríamos tirar o trabalho do sistema imunológico,
senão, ele se torna fraco e destreinado e, em um caso grave,
pode já não reagir adequadamente. Tanto os filhos quanto os
pais têm de aprender a suportar certa frustração até o
sistema imunológico passar por suas experiências.
Desse modo, os pais podem aprender a confiar nas forças
autorreguladoras do organismo da criança e auxiliar o
processo de amadurecimento apenas conduzindo-o de
acordo com a antiga regra da medicina, que diz: medicus
curat, natura sanat (“O médico cuida, a natureza cura”).
 
Perguntas para os pais:

Que confrontos ou conflitos nosso filho não vive
diretamente?

Como ele pode enfrentar seus conflitos de
maneira mais construtiva do que até agora?

Contra o que ele não está se defendendo de
maneira suficiente? – Como podemos ajudá-lo
em sua defesa efetiva?

Qual processo de desenvolvimento está para ser
realizado?

Como podemos ajudá-lo nesse processo de
amadurecimento?

Como transmitir-lhe confiança para superar
sozinho suas crises?

Estamos lhe dando o calor necessário e
permitindo que ele se exalte em uma discussão?
 
Medidas de apoio:

Os pais ou a pessoa de referência mais próxima
devem transmitir seu amor ao cuidar da criança,
ajudando-a e sentindo suas necessidades: bebês
e crianças pequenas poderiam dormir à noite na
mesma cama ou, pelo menos, no mesmo quarto
dos pais para sentir sua proximidade e seu amor.

Manter a tranquilidade na cama ou, pelo menos,
no quarto: a criança deve ser exortada a manter-
se tranquila ou a ouvir em silêncio os pais lerem
ou contarem histórias.

Proteção contra estímulos externos: nada de luz
clara nem de barulhos altos (TV, rádio, walkman,
iPod, etc.); contato físico, apenas se solicitado
pela criança.

Evitar temperaturas extremas: não sair para uma
área externa. A adaptação à temperatura
externa requer uma energia desnecessária. Não
aquecer demais os espaços internos, mas
também não deixar que haja corrente de ar.
Apenas arejar o ambiente por cinco minutos a
cada hora, enquanto a criança está deitada sob
as cobertas.

Não dar banho: com calor extremo e seco e/ou
se não houver erupção cutânea, todo o corpo
pode ser friccionado com uma solução morna de
água salgada, a fim de auxiliar as excreções.

Dar bastante líquido: chá de tília e de sabugueiro
com um pouco de mel estimulam a sudação e a
excreção de toxinas através da pele. Mas
também podem ser oferecidos sucos de fruta
diluídos. O principal é que a criança tome líquido.
Torne a bebida “atrativa”, por exemplo com um
copo especial, copinhos pequenos de aguardente
ou um canudo. Quando a criança não tiver
vontade de tomar líquido, você pode auxiliar a
absorção de líquidos através de um clister (ver
abaixo), como se estivesse fazendo com que ela
“bebesse por baixo”, uma vez que o líquido
também pode ser absorvido através do reto.

Permitir o jejum, mas apenas a pedido expresso
da criança; do contrário, oferecer uma
alimentação leve, com pouca ou sem proteína.

Sono: estimular o sono da criança,
independentemente do período do dia. Em geral,
a necessidade de dormir aumenta quando a
criança está doente. Mesmo que a criança durma
pouco à noite por ter dormido muito durante o
dia, não a desperte. O lema é: “O sono é o
melhor remédio”.

Roupa: providenciar roupas leves de algodão,
que absorvem melhor o suor. Calçar meias
quentes de lã apenas se os pés estiverem frios
(eventualmente, usar bolsa de água quente junto
aos pés). Apesar do custo adicional, fraldas
descartáveis deveriam ser trocadas por fraldas
de pano, devido ao risco de retenção do calor.

Clister: a experiência mostra que quase todas as
crianças toleram essa medida, que traz muito
alívio quando aplicada no momento oportuno e
com confiança e quando se lhes tira a sensação
de repulsa. Muitas vezes, são os pais que recuam
diante da ideia do clister. Antigamente, ele
estava entre os primeiros métodos de
tratamento, antes mesmo das compressas de
água morna em torno da panturrilha, em casos
de mal-estar e antes que a febre se instalasse.
Portanto, converse gentilmente com seu filho,
para que depois não haja resistência.
Como se faz: compre na farmácia um clister de
borracha (trata-se de uma bola de borracha com
uma ponta igualmente de borracha). Para lactantes,
o clister vai de 75 a 100 mililitros; para crianças
maiores, até 200 mililitros. Preencha-o com chá de
camomila morno e coado e um pouco de glicose. Em
seguida, unte a ponta de borracha com um creme
neutro ou, melhor ainda, com azeite, para que ela
possa deslizar suavemente no reto. Em seguida,
pressione delicadamente o clister para a saída do
líquido e peça a seu filho que comprima um pouco as
nádegas ou, caso se trate de um lactante, ajude-o a
comprimi-las. Depois de alguns minutos, a
necessidade de evacuar será tão grande, que ele
não se negará a ir ao banheiro, usar o penico ou
fazer na própria fralda. Elogie seu filho por ter
conseguido e deite-o na cama ou segure-o por mais
um tempo nos braços, sob uma coberta quente. Em
geral, após o uso do clister, as crianças ficam
cansadas e querem repousar. Antes disso, ofereça-
lhe ainda um pouco mais de líquido. O clister abaixa
a febre ou torna-a mais suportável, além de aliviar a
criança graças à excreção.

As compressas de água morna só devem ser
colocadas em torno da panturrilha se as pernas e
os pés da criança estiverem quentes. Nunca se a
criança estiver com calafrios ou com os pés
gelados! Embeba dois panos finos de algodão
em água morna (nunca fria, só um pouco mais
fria do que a temperatura do corpo da criança) e,
depois de torcê-los e alisá-los, envolva-os em
torno da perna. Fixe os panos com uma toalha de
rosto ou com meias de lã e cubra a criança com
uma coberta leve. Assim que os panos estiverem
bem aquecidos – geralmente após dez minutos –,
você poderá trocá-los até três vezes. Em
seguida, faça uma pausa de cerca de uma hora e
volte a colocar novas compressas.
Espere sempre um dia inteiro e uma noite inteira
sem febre para que a criança possa sair de casa.

3.3 Auxílio homeopático e médico em caso de febre?


O auxílio homeopático é sempre oportuno, e o médico é
indicado quando
 

a criança mudar tanto seu comportamento que os
pais passam a notar traços estranhos;

já não responder, ficar apática e não reconhecer os
pais;

delirar por um período maior ou sentir medos
inexplicáveis;

não tiver sede nem suar;

a febre durar mais de três dias (em crianças abaixo
de seis meses, já no segundo dia de febre deve-se
consultar um terapeuta experiente);

a criança sentir dores inexplicáveis, tiver convulsões
ou se sua nuca se enrijecer.

3.4 Remédios homeopáticos para a febre

Aconitum C30 Belladonna C30


Disposição Inquieto, com muito medo, Hipersensível a todos os
agitado estímulos e ao contato físico,
irritadiço, irado, delírio,
delírio
decorrente da febre,
pesadelos,
medo de cães
Agentes Susto, choque, frio seco, Frio úmido, corrente de ar,
desencadeadores vento frio vento frio, hipotermia,
hipertermia, sol
Febre Repentina, alta, intensa Sobe e desce rapidamente,
curva de febre bifásica
Sede Muita sede e vontade de tomar Sem vontade de beber água
bebidas frias
Dor nos ++* +
membros
Suor Ausente Intenso ou ausente, variável
Aparência Vermelhidão quando deitado; Com muito calor,
palidez quando sentado vermelhidão,
inchaço, olhos vítreos e
projetados, veias do pescoço
pulsantes
Melhora com Ar fresco, repouso Compressas frias locais e
uma coberta quente
Piora com À noite, até à zero hora, quarto Ruído, luz, barulho, contato
quente, luz, vento físico, sacudidela
Peculiaridades Primeiro antipirético antes de a Mãos e pés geralmente frios,
criança suar, calafrio intenso dores fortes de cabeça,
estira-se em demasia,
pupilas
dilatadas, febre depois de
lavar
a cabeça/cortar os cabelos
* + = fraco, ++ = mais forte, +++ = forte, ++++ = muito forte.
 
Ferrum phosphoricum C30 Gelsemium C30
Disposição Fraco, nervoso, sensível, Fraqueza, tremor,
obediente, paciente atordoamento, indiferença,
cansado, sem vontade,
sonolento, apático, como
que paralisado
Agentes Nenhum Agitação excessiva, por
desencadeadores exemplo, por nervosismo,
notícias ruins
Febre Não muito alta, até 39°C, Às vezes intermitente,
tranquilo alternância entre ondas de
calor e calafrios, alta a
moderada
Sede Pouca Geralmente ausente
Dor nos Nenhuma ++
membros
Suor Alternado, geralmente ausente Ausente
Aparência Palidez, bochechas vermelhas Pálpebras pesadas e cansadas,
quando agitado rosto muito vermelho, pupilas
dilatadas, lábios escuros e
rachados
Melhora com Compressas locais frias, Repouso, movimentos
movimentos lentos moderados, excreção de
urina, consolo
Piora com Frio no quarto, em repouso Tempo quente e úmido,
antes de um temporal,
emoções, agitação
Peculiaridades Sangramento nasal quando há Intensa sensação de frio,
febre; do contrário, nenhuma pernas fracas, sem firmeza
peculiaridade quando em pé ou caminhando
 
Bryonia C30 Apis C30
Disposição Irritado, quer ser deixado em Rigidez sonolenta, delírio,
paz, rejeita aproximação, grito agudo, apatia
fechado
Agentes Irritação, frio repentino em Nenhum
desencadeadores estação quente
Febre Início lento, alta, constante Alta e intensa
Sede Muita sede de água gelada Ausente
Dor nos +++ Ausente
membros
Suor Suor quente apenas no Seco e úmido alternadamente
começo; em seguida, ausente
Aparência Cor púrpura, aflito, desvia-se Rosto e lábios inchados
para proteger-se
Melhora com Repouso, deitado do lado Repouso, frio, cobrindo-se,
que está doendo ar fresco
Piora com Qualquer movimento, contato Movimento, calor, de manhã,
leve, calor, tempo muito após a sesta
quente, quando alguém lhe
dirige a palavra
Peculiaridades Lábios e mucosa secos, Séria diminuição na excreção
constipação intestinal frequente de urina, deixa objetos cair
quando há febre
 
Eupatorium perfoliatum C30 Rhus toxicodendron C30
Disposição Irrequieto, desanimado, Inquietação, alternância
resignado, fraqueza progressi constante de posição,
va, fadiga, tristeza sonolento, triste, tende a
chorar, não consegue relaxar
Agentes Frio Frio úmido, estar
desencadeadores completamente molhado,
esforço excessivo
Febre Fortes calafrios Adinâmica, com inquietação
Sede Muita sede de bebidas geladas, Muita sede, sobretudo de
que muitas vezes são leite frio
vomitadas
Dor nos membros ++++ ++
Suor Pouco a nenhum Seco
Aparência Exausto, aflito Com frequência, bolhas de
febre e herpes
Melhora com Suor Tempo quente e seco,
movimento continuado,
mudança de posição, calor
Piora com Ar frio À noite, em repouso, no início
de um movimento, tempo frio
e úmido
Peculiaridades Fortes dores nos músculos e Língua geográfica, triângulo
nos ossos, como que ferido vermelho na ponta da língua,
e abatido, couro herpes
cabeludo sensível
 
Pulsatilla C30 Nux vomica C30
Disposição Chora, queixa-se sem fazer Nervoso, muito irritado, difícil
barulho e para si mesmo, de suportar, irascível, não quer
geme, quer consolo, humor ser visto nem tocado, muito
muito variado, de irritado a sensível, mal-humorado
sensível, tímido, amável
Agentes Frio, umidade, sorvete, pés Ira, falta de sono,
desencadeadores gelados, calor excessivo superexcitação
Febre Calafrios, febre alternada: Com calafrios
ora alta, ora baixa
Sede Ausente Sede de bebidas quentes
Dor nos + +
membros
Suor Apenas no rosto e na cabeça Azedo
Aparência Veias dilatadas Rosto azulado, extremidades
marmorizadas
Melhora com Ar fresco, cobrindo-se, À noite, em repouso, tempo
movimentando-se, úmido e chuvoso, calor,
compressas cobrindo-se
frias, companhia
Piora com Calor, no fim da tarde, à noite, Frio, corrente de ar, depois de
quando está sozinho, e comer, quando se despe,
locais abafados quando tira a coberta, depois
da meia-noite
Peculiaridades Todas as secreções são Não consegue evacuar, dor
brandas para evacuar

3.5 Convulsões febris


“Estou cozinhando e lutando.”
Em geral, a convulsão febril é inofensiva para a criança e
não causa nenhum dano à saúde. Estudos[16] mostram que
o desenvolvimento mental também não é afetado. Mas os
pais se assustam quando presenciam uma convulsão febril e,
em seguida, ficam preocupados, uma vez que, na maioria
das vezes, não recebem explicações adequadas de
terapeutas experientes e que, nessa situação, os médicos
acadêmicos veem um indício para fazer com que os pais
fiquem mais flexíveis quanto à terapia que pretendem impor.
A convulsão pode acometer toda a musculatura, causando
rigidez persistente (convulsão tônica) ou uma mudança
constante da tensão muscular (convulsão clônica), o que
requer um enorme dispêndio de energia. Na fase de
aumento da febre, em que o organismo assume a luta contra
a ameaça vinda de fora através de agentes patogênicos, de
repente chega-se a um esforço generalizado, convulsivo e
incontrolável, que se assemelha a uma luta pela
sobrevivência. A temperatura sobe repentinamente, o que
significa um verdadeiro golpe contra os agentes
patogênicos. Essa reação indica dificuldades na regulação de
calor da criança, que devem ser compensadas o mais rápido
possível. Nesse caso, as compressas de água morna em
torno da panturrilha podem ajudar.
O grande dispêndio de energia durante a convulsão
poderia ser interpretado como uma reação de curto-circuito.
A luta passa, por assim dizer, para o nível dos músculos, que
é onde, em geral, se travam as lutas, mas que, nessa
situação, é de pouca ajuda. Também pode acontecer de os
pequenos pacientes ficarem antecipadamente na defensiva.
Como as convulsões febris se repetem apenas raramente,
deve-se partir do princípio de que a criança aceita e domina
a tarefa a ser aprendida, ou seja, encara a vida e suas
ameaças com coragem. Para prevenir esse tipo de escalada,
seria necessário fazer com que a criança se familiarizasse
antecipadamente com os temas da tensão e do relaxamento
(por exemplo, por meio do relaxamento progressivo dos
músculos segundo Jakobsen [a partir da idade pré-escolar]
ou, de maneira ainda mais aprofundada, com a terapia do
abraço, segundo Jirina Prekop).
3.5.1 O que é uma convulsão febril?

Acomete crianças entre o primeiro e o sétimo ano de vida. A


convulsão febril típica inicia-se na fase em que a febre
aumenta e a criança fica pálida, com sensação de frio pelo
corpo e nas mãos. Em seguida, alguns músculos começam a
contrair-se (possivelmente também os músculos da face), a
criança pode gritar ou gemer; revira os olhos e,
eventualmente, seu olhar torna-se fixo. É possível que ocorra
até mesmo uma perda da consciência. Os músculos se
contraem na fase tônica, que geralmente dura apenas
alguns segundos até, no máximo, cinco minutos. Em
seguida, ocorre a fase clônica, caracterizada por movimentos
descontrolados dos braços e das pernas, que dura, no
máximo, 15 minutos. A fase subsequente de recuperação ou
sono pode durar meia hora ou um período significativamente
maior.
3.5.2 Quais crianças correm esse risco?

De 2% a 4% de todas as crianças pequenas sofrem de


convulsão febril ao menos uma vez na vida. Um terço dessas
crianças sofre uma segunda convulsão, e um sexto, uma
terceira. Apenas uma a cada dez crianças tem mais de três
convulsões febris. Apenas em 1% das crianças, com a
convulsão febril se manifesta um problema cerebral
preexistente, como a epilepsia. Portanto, de maneira alguma
as convulsões febris causam epilepsia, mas muito raramente
podem apenas manifestá-la. Como não são nem um pouco
perigosas como afirmam muitos médicos acadêmicos, não se
justifica absolutamente ministrar antipiréticos de imediato.
3.5.3 Sinais perigosos e esclarecimento médico

Se aparecerem os seguintes sintomas, deve-se recorrer a um


atendimento especializado:

convulsões que atingem apenas um lado do corpo;

convulsões que se repetem após algumas horas ou
no mesmo dia;

quando a fase clônica durar mais de dez minutos;

convulsões que aparecem não na fase em que a
febre aumenta, mas com febre alta e constante;

se a criança que tiver convulsão for maior de 7 anos;

possíveis sintomas de meningite, como
enrijecimento da nuca.
 
Perguntas para os pais:

Como nosso filho pode tornar-se mais corajoso?

Que medos estamos transmitindo ao nosso filho?

Podemos permitir discussões acaloradas em
nosso convívio?

Nosso filho reflete nossa necessidade de
harmonia e nosso horror a conflitos?

O que o deixa tenso, e como podemos
providenciar o relaxamento de que precisa?

Em que âmbito ele carece de estabilidade?
 
Medidas de apoio:

Posição lateral: se possível, deite a criança de
lado, em uma posição estável, para que, em
caso de vômito, ela não o engula nem se
sufoque. Em seguida, apesar de todo pânico ou
medo, permaneça sentado ao lado do seu filho e
apenas aguarde. Em geral, a convulsão febril já
terá passado antes de o médico de emergência
chegar, de você ir a uma clínica ou ministrar um
medicamento anticonvulsivo (por exemplo,
Diazepam, Valium). Depois dela, qualquer exame
seria desnecessário e cansativo e poderia
perturbar a criança na fase de regeneração e, na
maioria das vezes, não trazer nenhum benefício.

Clister: se seu filho já teve convulsão febril
alguma vez, na próxima vez que adoecer e tiver
febre é imprescindível utilizar o clister no início
desta (ver acima), uma vez que, com ele, a
criança terá alívio e a febre será atenuada. Ao
mesmo tempo, a propensão à convulsão diminui.

Tratamento homeopático: depois de superada a
convulsão febril, descreva ao homeopata todo o
processo e todos os sintomas com precisão. Para
o caso raro de uma nova convulsão febril, ele lhe
dará um medicamento de emergência adequado
especialmente para seu filho.
4 Doenças infecciosas

4.1 Doenças infantis – o pequeno ser humano no


grande mundo
“Estou pronto para algo novo.”
 
Atualmente, as doenças infantis clássicas, como sarampo,
caxumba, rubéola, coqueluche e, mais recentemente, cada
vez mais catapora, praticamente não desempenham
nenhuma função, pois logo cedo a maioria das crianças é
vacinada contra elas e, por conseguinte, essas doenças
quase não aparecem. No entanto, o que é festejado pela
medicina acadêmica como um grande progresso,
infelizmente tem um considerável lado obscuro.
Mesmo do ponto de vista pediátrico, as vacinações no
primeiro ano de vida não se justificam, pois, nessa fase, o
desenvolvimento cerebral é muito sensível e pode ser
facilmente prejudicado, sobretudo pelos excipientes e
conservantes presentes na vacina. É provável que as vacinas
sejam aplicadas em crianças ainda muito pequenas
principalmente por razões logísticas, uma vez que os
chamados exames preventivos contínuos criam a estrutura
temporal ideal para vacinar o maior número possível de
crianças.
Segundo a lógica da medicina acadêmica, deveríamos ter
hoje apenas crianças saudáveis, cheias de força e energia,
uma vez que não são acometidas pelas doenças infantis nem
por outras enfermidades; nelas, até mesmo qualquer febre e
quase todo sintoma é combatido com sucesso. Entretanto,
infelizmente a realidade é outra. Em geral, as crianças
modernas, “tratadas” com toda sorte de vacina, têm tudo
menos vitalidade. Enquanto antigamente padecíamos das
doenças infantis mas éramos saudáveis, hoje, embora boa
parte dessas doenças tenha desaparecido, as crianças não
podem ser chamadas de saudáveis; ao contrário, adoecem
ao longo dos primeiros anos de vida. Infecções inespecíficas,
alergias, TDAH, sobrepeso, entre outros, determinam a
situação. No consultório, vemos com frequência mães
desesperadas querendo saber por que seus filhos não
conseguem se ver livres do lenço e sempre acabam com
otite toda vez que vão à piscina.
Nos Estados Unidos, que é o grande modelo do mundo
(ocidental), 50% dos jovens estariam acima do peso e 40%
seriam hiperativos. Como os hiperativos dificilmente se
tornam obesos, isso significa que nem mesmo 10% dos
jovens são saudáveis em relação a esses dois problemas.
Quando se consideram todos os outros quadros clínicos,
desses 10% não sobra quase ninguém saudável. Por certo,
nesse sentido, a situação nos Estados Unidos é claramente
pior, mas nós também estamos muito distantes da saúde por
seguirmos um caminho ruim, marcado por esse modelo. No
entanto, seria muito fácil preparar o caminho rumo a uma
vida saudável.
Na medicina antiga predominava uma concepção
totalmente diferente das doenças infantis, com a qual nós,
modernos, poderíamos muito bem aprender algumas coisas.
Consideravam-se necessários esses acontecimentos agudos,
e atribuía-se a eles certa proteção contra sintomas crônicos
e posteriores, como alergias, doenças autoimunes e até
mesmo câncer. Se pensarmos que, no início, o sistema
imunológico é estruturado de maneira muito rudimentar,
essa ideia se mostra evidente. A criança recebe da mãe um
“dote” de anticorpos para medidas de defesa específicas e,
mais tarde, é ideal que continue a ser tratada por ela por
meio da amamentação. Esta também é necessária, pois no
primeiro ano de vida apenas o sistema de defesa
inespecífico da criança está constituído, o que justamente
torna a vacinação sem sentido nesse período, mesmo do
ponto de vista da medicina acadêmica.
Segundo os médicos antigos, as doenças infantis valiam
como exercícios de treinamento para um sistema de defesa
em desenvolvimento, tal como, analogamente, todo exército
precisa de suas manobras, sobretudo na fase de sua
estruturação. A vacinação tira do organismo essas
possibilidades e o enfraquece a longo prazo. O que não é
aprendido no início da vida, mais tarde só poderá ser
recuperado com muita dificuldade.
Se toda febre que surge for combatida com antipiréticos, o
organismo desaprende, no verdadeiro sentido da palavra, a
desenvolver a febre e, por conseguinte, também perde sua
autoproteção. De fato, hoje no consultório vemos muitos
adultos que já não conseguem ter febre, o que, do nosso
ponto de vista, representa um problema sério a ser tratado e
do qual poderíamos facilmente poupar nossos filhos. No
histórico de pacientes com câncer, é muito frequente
encontrarmos as chamadas anamneses vazias, ou seja, por
muitos anos esses pacientes não adoeceram nem tiveram
febre. Assim, não é por acaso que, para quem tem câncer, a
hipertermia mostra-se uma terapia complementar muito
promissora, na qual o paciente é submetido a uma febre alta
e artificial. Mesmo no histórico de pacientes que sofrem de
alergia, faz-se notar a ausência de febre. Nesse sentido, as
doenças infantis, que geralmente decorrem com a presença
de febre, têm uma clara eficácia de proteção e preparam o
organismo para a vida no mundo, com sua abundância de
agentes patogênicos. Por certo é boa a intenção de privar as
crianças desses quadros sintomáticos, em geral amplamente
inofensivos quando tratados corretamente; porém, a longo
prazo, trata-se de uma decisão problemática.
Na verdade, as supostas complicações, usadas pela
medicina acadêmica como argumento para a necessidade
imprescindível da vacinação, costumam ser o resultado das
medidas repressivas. Quando os sintomas são reprimidos e,
por exemplo, os acessos de febre são privados de seu pico,
muitas vezes as erupções cutâneas não conseguem chegar à
superfície como deveriam e nela “desabrochar”. Para os
médicos antigos, e até hoje para os homeopatas clássicos,
essas erupções são consideradas um bom sinal, pois
enfatizam o caminho das secreções de dentro para fora e, a
longo prazo, livram a criança justamente desses incômodos.
Segundo essa concepção, as crianças devem expelir com as
próprias forças o que impede seu desenvolvimento. Quando
isso dá certo, geralmente também se mostra uma libertação
no nível psíquico e social, por exemplo, quando, depois de
superarem uma doença infantil, tornam-se mais
independentes dos pais e trilham seu próprio caminho com
mais autonomia.
No entanto, muitas vezes esse corte do cordão umbilical,
que é natural e importante, acaba sendo frustrado pelos pais
e pelos pediatras, pois lhes dá uma sensação de que não é
importante. Obviamente, isso vale para pais e, sobretudo,
para mães que não têm outra razão de ser na vida além dos
filhos, e infelizmente também para médicos que veem sua
atividade na repressão a sintomas clínicos. Geralmente, as
crianças que encontraram força dentro de si mesmas quase
não precisam da medicina acadêmica durante a vida toda.
4.1.1 Doenças infantis fortalecem

De modo geral, com as doenças infantis, as crianças podem


aprender a suportar certa medida de sofrimento e a
desenvolver em diferentes níveis a tolerância às frustrações,
que na vida futura poderá ser de importância decisiva. O
domínio de uma crise e a experiência de resistir a tal desafio
são claramente úteis para a vida futura e fazem com que
elas confiem nas próprias forças. O padrão da crise, tal como
se configura em toda crise febril, permanecerá significativo
por toda a vida. Quanto mais cedo isso se tornar um hábito,
tanto melhor; significa ter confiança em “conseguir” e, assim
como a Fênix renasceu das cinzas, também conseguir sair do
abismo, para depois abrir ainda mais as próprias asas e alçar
voos mais altos.
Quando se auxiliam as crianças nesse campo, deixando,
por exemplo, que sua febre aumente sob rigoroso controle,
seu organismo irá se livrar daquilo que já não quer, vencer
essas guerras precoces e não apenas reforçar o sistema
imunológico para a vida inteira, mas também adquirir
imunidade vitalícia para a doença em questão. Portanto, terá
aprendido do ponto de vista físico e corporal e feito avançar
a inteligência de seu corpo.
Paralelamente a esses aprendizados corporais, ocorrem
aqueles espirituais, tal como a toda forma corresponde um
conteúdo. Quase sempre após a superação da doença na
criança, é possível reconhecer uma evolução rumo à
individuação. A criança torna-se mais si mesma, desenvolve
sua personalidade e, a cada doença, sai um pouco mais do
mundo infantil.
Elas também saem psiquicamente fortalecidas e mais
maduras das doenças – o que muitas vezes é possível
perceber logo em seguida, com a nova aquisição de
capacidades psíquicas e sociais. Guerras vencidas
naturalmente fortalecem a autoconsciência. Guerras
rejeitadas e não travadas ou lutas reprimidas são vistas
como perdidas para a experiência. Também o fato de que as
próprias forças não podem receber uma chance, pois logo se
recorre a exércitos mercenários, por exemplo na forma de
antibióticos, é visto como uma oportunidade perdida para as
defesas do organismo.
Pela simbologia, fica claro que se trata realmente de uma
guerra. Em todas as doenças infantis, trata-se de processos
infecciosos, ou seja, o sistema imunológico luta contra
agressores externos, ou melhor, agentes patogênicos que,
no caso ideal, são vencidos e eliminados. Sempre se trata de
um acontecimento agudo, que normalmente não se torna
crônico. Em geral, as doenças só se tornam crônicas em
idade avançada, quando as defesas se enfraquecem e a
capacidade de ter febre já se esgotou. Do ponto de vista
psíquico, muitas vezes por trás disso estão a mudança de
nível, a chegada a uma nova fase do desenvolvimento ou
então conflitos que, na melhor das hipóteses, inflamam-se
nos sete primeiros anos e são controlados.
Após a infância, as doenças infantis são mais difíceis de
serem dominadas. As participações extremamente
problemáticas do cérebro chegam a ser frequentes. Depois
da puberdade, a caxumba leva – ainda que raramente – à
esterilidade; nos adultos, a coqueluche aparece muito ligada
à pneumonia; para a gravidez, a rubéola representa um
grave risco; a catapora é seguida por herpes-zóster como
doença tardia e, o que é interessante, este é tão mais raro
quanto mais frequente for o contato com a doença, de
maneira que pediatras quase nunca contraem herpes-zóster.
Tudo isso pode estar relacionado ao fato de que, na maioria
das vezes, os adultos modernos já não têm condições de
reagir a febres tão altas como as crianças saudáveis. Esta
seria outra razão para viver as doenças infantis na infância
em vez de reprimi-las.
Atualmente, não raro as doenças infantis se tornam
verdadeiras ameaças para os adultos. Quem foi vacinado na
infância acaba se infectando mais tarde, depois de passado
o efeito de proteção da vacina, com as crianças ou os
próprios filhos e muitas vezes passam por um verdadeiro
inferno. O fato de a proteção da vacina ter prazo de validade
é o que demonstra o argumento de seus próprios defensores
quando insistem nas revacinações, que, no entanto, quase
ninguém faz até a morte. Quem passou pelas doenças da
infância tem uma imunidade incomparavelmente maior do
que por meio de vacinações.
Nesse sentido, o retorno da infecção é lógico, uma vez que
as vacinas contra as doenças infantis não são renovadas. A
revacinação nem sequer é exigida pela medicina acadêmica;
entretanto, deveria ser obrigatória em seu sistema. Porém,
obviamente, esse tipo de “exigência” apenas demonstra o
contrassenso dessa abordagem. Quem se revacinaria aos 70
anos contra sarampo e caxumba?
Do ponto de vista da homeopatia, as doenças infantis são
conflitos internos que se refletem na parte externa da pele
em suas respectivas eflorescências e são consideradas muito
importantes para o desenvolvimento. Já o fundador da
homeopatia, Samuel Hahnemann, partia do princípio de que
o organismo da criança precisa dessas batalhas para se
reconciliar com o que herdou em termos patológicos, ou
melhor, para eliminar essa herança.
Se imaginarmos que ainda há poucos séculos 90% de
nossa população estava contaminada com sífilis e há menos
de um século a maioria sofria de tuberculose, esse
pensamento torna-se mais fácil de entender. Toda criança
deveria vencer com as próprias forças essa predisposição
herdada para certas doenças, a fim de poder viver sua
própria vida incondicionalmente livre delas. A prática da
pediatria homeopática confirma de modo impressionante
esse ponto de vista.
4.1.2 História da vida e da humanidade

Em muitas histórias de vida individuais, que, em muitos


aspectos, correspondem à história da vida, encontram-se
exortações para que se repita uma parte da história da
humanidade. Assim, toda criança tem de se esforçar para
conseguir dar o passo há muito tempo já conquistado pela
humanidade: a posição ereta. Esses paralelos entre a
história individual e a coletiva são expressos pelos cientistas
com a equação “ontogênese = filogênese”. Ela significa, por
exemplo, que a vida individual começa exatamente no
líquido (amniótico), tal como a vida de modo geral, e que as
crianças percorrem de novo a fase dos quadrúpedes e assim
por diante.
Sob esses aspectos, não é de surpreender que toda
criança tem de lidar novamente com temas patológicos que
desempenharam um papel na história do desenvolvimento
de seus antepassados. O que antigamente ainda causava
espanto, pois a herança parecia fixada nos genes, hoje é
mais facilmente concebível, pois descobrimos que
informações e características marcantes também são
transmitidas de geração a geração por outros caminhos.
Para conceber a predisposição a doenças hereditárias, que
os homeopatas chamam de “miasmas”, é adequado que as
doenças infantis sejam vistas como ocorrências cíclicas, que
se sucedem a ritmos regulares, além do indivíduo, como o
decurso do sarampo, que abrange um ciclo lunar, ou o da
coqueluche, que dura um ciclo lunar e meio. Além disso,
quando, por exemplo, o sarampo se propaga, muitas
crianças são infectadas ao mesmo tempo. Entre elas,
algumas não manifestam o início visível da doença.
Homeopatas partem do princípio de que, em sua linha
ancestral, o tema a ser elaborado e resolvido através dessa
doença não desempenhou um papel relevante, ou de que o
tempo para a elaboração não foi amadurecido. No entanto,
crianças que não adoecem, mesmo convivendo com irmãos
doentes, mostram como é importante a constituição
individual.
Portanto, a partir dessa perspectiva, as doenças infantis
são uma oportunidade ideal para a criança se preparar para
o conflito com as predisposições hereditárias dos ancestrais
que influem em sua vida e, de preferência, no primeiro ciclo
de sete anos, ou seja, antes de iniciar a escola. Antes de
passar a frequentar o mundo exterior, as crianças precisam
encontrar-se em si mesmas, ou melhor, no próprio corpo. A
imunidade assim adquirida é o resultado de um equipamento
ideal para a vida. Assim como Siegfried, que, com suas
próprias forças, venceu a luta banhando-se no sangue do
dragão e tornou-se imune aos mais diferentes ferimentos,
[17] ao vencerem as batalhas dos primeiros sete anos, as
crianças também podem se libertar da luta pela vida e
esperar por um futuro estando bem preparadas. Se Siegfried
pudesse ter recorrido a um batalhão de artilheiros
fortemente armados para acabar com o dragão, o resultado
não teria sido o mesmo.
Nestes tempos de desafio, a tarefa dos pais reside,
sobretudo, em proporcionar aos filhos o afeto necessário,
possibilitar a tranquilidade e aprender a confiar nas forças
inerentes aos filhos. Contrariamente ao atual espírito de
época, seria importante fazer com que a criança tivesse um
tempo de reconvalescença e não fosse requisitada muito
cedo. De modo geral, (também) vale aqui a boa e antiga
regra médica nil nocere (“sobretudo, não prejudicar”).
Hoje, um ponto importante é ter em conta que a criança
receba afeto suficiente, mas, se possível, não mais do que
quando está saudável, pois, do contrário, poderá reforçar os
sintomas tendo em vista o “ganho secundário com a
doença”: quando uma criança percebe que, quando tosse,
sua mãe fica por perto, enquanto em uma situação normal
vai para o trabalho, ela acaba sendo estimulada a tossir.
Assim, muitas crianças aprendem a fazer da tosse uma
bronquite. Aprendem até mesmo a produzir a respiração
asmática, conforme mostram certos exames. Nesse caso, é
importante encontrar um meio-termo adequado, impedindo
que a fase da doença se transforme em momento agradável
e, por outro lado, garantir à criança todas as condições de
regeneração e reconvalescença de que ela necessita.

4.2 Lidando, na prática, com as doenças infantis


As doenças infantis fazem parte da infância e, pelo menos
quando há boas condições e tratamento homeopático,
curam-se sem deixar sequelas. Se adiadas para a idade
adulta, podem transcorrer com dificuldade e levar a lesões
duradouras através das mais diversas complicações.
Sabemos muito bem que tudo tem seu tempo e que, fora
dessa fase do desenvolvimento, essas doenças podem se
tornar um problema. Se déssemos à infância aquilo que lhe
cabe, tal como fazem os povos arcaicos, e à idade adulta
aquilo que lhe corresponde, poderíamos nos poupar de
muitas coisas. Nossa tendência moderna de quase não
deixar que as crianças sejam crianças, para que depois, na
idade adulta, não se tornem realmente adultas, traz consigo
muitas dificuldades.
As antigas doenças típicas da infância são, sem exceção,
infecções e, como tais, de fácil interpretação. Inimigos
externos, ou melhor, agentes patogênicos ativam as
medidas de defesa do organismo. Inicialmente, o corpo tenta
cercar os agentes patogênicos no local com combatentes
não específicos do grupo dos glóbulos brancos ou
granulócitos. Ele constrói uma verdadeira parede ao redor
dos agentes patogênicos, independentemente de sua
espécie – bactérias, vírus ou esporos fúngicos. Se os agentes
patogênicos, cujo método de luta é a proliferação
desmedida, conseguem quebrar esse cerco, o organismo
tem de recorrer a contramedidas mais abrangentes. Aqui, há
que se mencionar primeiramente a febre, que corresponde a
uma mobilização geral. Nesse momento, todas as forças
estarão a serviço da defesa, mais uma razão por que não é
muito inteligente simplesmente fazê-la baixar. Com essa
medida, vai-se justamente contra as tentativas de defesa do
corpo, enfraquecendo-o a longo prazo, com o único intuito
de não precisar sentir os sintomas agudos de sua luta, como
calor e acessos de suor. No mais, como já dito, a febre não é
prejudicial; ao contrário, é muito mais favorável ao
organismo em seu conflito com o mundo.
Portanto, infecções significam guerra no nível físico. No
nível psíquico, há por trás delas um conflito incontrolável,
que, ao se aprofundar no corpo, pressiona por uma solução.
Idealmente, nessa solução física o tema psíquico também
volta a se tornar claro, chega à consciência e pode ser
esclarecido. Nesse sentido, já nas doenças infantis os pais
são convocados a levar em conta esse nível psíquico.
No entanto, como só conseguimos resolver nossos próprios
problemas, mas não aqueles dos nossos filhos, somos
desafiados a preparar-lhes o espaço interno e externo para a
experiência e a depositar confiança necessária na sabedoria
da alma infantil para que, também no momento de crise,
eles tenham a oportunidade de conhecer a cura. É cansativo
e contraria nossa natureza ocidental tomar ativamente as
rédeas da situação, em vez de simplesmente estar presente
“apenas” do ponto de vista emocional.
A pele, que é a superfície na qual sobretudo as doenças
infantis se tornam visíveis, é também nosso órgão de
contato e de limite; ou seja, nas doenças infantis, trata-se
prioritariamente de questionar primeiro os próprios limites
de dentro para fora e depois tornar a determiná-los e
possibilitar uma nova forma de contato com o mundo
exterior. No início da vida, o corpo parte do princípio de que
o novo se mostra inicialmente em nossa superfície, antes de
se manifestar na alma. As chamadas eflorescências, que são
erupções cutâneas, evidenciam simbolicamente a irrupção
da nova energia e da etapa de desenvolvimento que está
por vir. A criança quer desabrochar novamente, e sua alma
precisa do corpo como órgão de expressão ou como palco.
Por isso, é compreensível quando muitas crianças buscam
sossego e até preferem a escuridão enquanto o novo tema
persistir no escuro. Assim que ele irrompe e atravessa a
superfície da pele em forma de erupção cutânea, o pior já
terá sido superado, e a alma precisará apenas de um pouco
mais de tempo para completar a etapa. Nesse momento, o
tema – ainda que de forma simbolicamente codificada – está
marcado na pele, onde reproduz seu desejo.
Desse modo, tanto os pais quanto os filhos aprendem que,
na vida, muitas vezes os recomeços implicam crises e
precisam do seu tempo. Para que o desenvolvimento possa
continuar a transcorrer bem, esses recomeços têm de ser
superados com as próprias forças. O ideal seria que os pais
pudessem encarar abertamente esse acontecimento,
estimulando seus filhos a questionar com espontaneidade os
próprios limites e ajudando-os quando eles estiverem
prontos para o conflito de conquistar novos espaços de
experiência e novos níveis de vivência. Muitas vezes, o atrito
– fisicamente na forma de coceira – está presente quando se
chega a conflitos nas superfícies limítrofes. Pelo modo como
as crianças se coçam com vontade e se lesionam com o que
restou de suas unhas, percebe-se visivelmente o quanto a
manifestação do novo as provoca. Aquilo que acaba de
irromper causa-lhes forte comichão, e elas insistem com
ênfase e, muitas vezes, se autolesionando, em sua
libertação, mesmo quando isso deixa marcas de sangue.
Para um conflito que é profundo e talvez até sangrento, isso
pode parecer apropriado, mesmo que os pais advirtam como
um mantra que elas não devem se coçar. Não querem que
seus filhos estraguem a superfície da pele: como ficaria seu
aspecto? Mas como se sente aquele cuja tensão interna é
imensa e que tem algo em seu íntimo que o incita
profundamente, insistindo para que ele se salve e se liberte,
e que lhe causa tanta comichão que ele tem vontade de sair
da sua (antiga) pele? Às vezes, essa comichão atenua-se
com o atrito firme, não muito brando, mas com a pressão da
mão. O contato físico e a consciência de que a pele é um
limite costumam atenuar o desespero.

4.3 Sarampo
Além da pele como órgão limítrofe e de contato, no sarampo
também entram em jogo os olhos, que não raro ficam
inchados e lacrimejam. Com eles, toca-se não apenas nos
temas “visão” e “revisão”, mas, como espelhos e janelas da
alma, eles possuem uma relação abrangente com a visão de
mundo, bem como com a impressionabilidade psíquica. A
conjuntivite, que é frequente no caso do sarampo, mostra o
conflito que se trava com a nova visão de mundo. Toda
conjuntivite ilustra o desejo de fechar os olhos e não ter de
ver mais nada. Durante toda a fase do sarampo, essa
tendência ao recuo torna-se extremamente clara.
No total, o decurso da doença segue o ritmo de 28 dias do
ciclo da Lua, cujo arquétipo também imprime sua imagem
externa nos olhos inchados e lacrimejantes. Após o período
de incubação, que é de dez a onze dias, durante o qual a
criança não se sente nem totalmente enferma, nem
totalmente saudável na terra de ninguém da crise,
manifesta-se um forte resfriado: ela perde o apetite, seu
nariz fica bastante congestionado, não responde quando
solicitada e, assim, descarrega sua agressividade. Com os
olhos inchados e fechados, já não quer ouvir nem ver e, com
muito sofrimento, busca refúgio na escuridão. Quartos
escurecidos reduzem os estímulos externos e possibilitam
novas experiências, sonhos e fantasias.
O todo pode ser facilmente interpretado como uma
regressão no sentido do retorno ao ventre materno. Por puro
medo da irrupção incontrolável do novo, a criança retira-se
em um nível em que tudo se dá facilmente e como que por si
mesmo – a saber, no reino composto pelo líquido amniótico e
que pertence ao arquétipo da Lua. As pessoas sempre
sentem fotofobia quando estão incubando alguma coisa, e
este é o caso aqui. Todo o efeito submergiu, irrompeu e foi
repelido (para si mesmo). A isso sobrevêm a tosse e, não
raro, dores de cabeça.
Enquanto isso, interiormente, inicia-se a guerra total, que
se manifesta em forma de febre alta. O corpo inteiro está
preparado para o conflito, e a febre indica a mobilização
geral de todas as forças para a vitória. Inchada pelo choro e
pela constipação nasal, a criança expressa todo o seu
desânimo com os excessos da nova tarefa.
Somente quando as eflorescências aparecem nos limites,
inicia-se um novo período. As chamadas manchas de Koplik
na mucosa interna das bochechas, na altura dos molares, e
que se originam a partir de depósitos calcários, são os
arautos da erupção cutânea, que na parte externa da pele se
inicia com pontinhos avermelhados atrás das orelhas e se
alastram pelo tronco de cima para baixo, para depois
desaparecerem também pelas extremidades. No ápice da
doença, as erupções cutâneas confluem, provocando um
leve inchaço na pele até sua parte interna e, no final,
causam o efeito de um manto vermelho, que ilustra a
energia escondida por trás de todo o acontecimento. O novo
manto, a nova pele da criança cresce sob dores debilitantes.
Por fim, depois de passada a erupção cutânea, não raro
sobrevém a descamação das mãos e dos pés.
Aparentemente, trata-se de uma mudança de pele, uma
espécie de muda. A criança trocou de roupa; ela pode e quer
recomeçar como se tivesse renascido.
De fato, o que se vê aqui é quase a imagem de um
processo de nascimento. A incubação em forma de dores da
dilatação é seguida pelas dores da expulsão, com as
eflorescências que fazem pressão para sair. Portanto, as
doenças da infância poderiam ser uma repetição e uma
renovação simbólicas do processo de nascimento. A única
coisa trágica é quando as crianças modernas, nascidas de
cesariana, têm o desdobramento de sua força vital interior
impedido pelos diversos tipos de vacinas.
Do ponto de vista homeopático, trata-se de um típico
estado de Pulsatilla, que, não por acaso, também é um
oxitócico clássico usado antes do parto. A criança fica mal-
humorada, se lamenta, pendura-se na mãe e não quer ficar
sozinha de modo algum. Seu humor varia e se alterna como
o tempo na primavera, ou seja, do excessivo entusiasmo à
desolação total. Quando se encontram sob forte estresse
psicológico, as crianças necessitam manifestamente de
atenção, embora ao mesmo tempo chorem e sejam
afetuosas quando nada as satisfaz. Em um completo
regresso, querem colo e ser protegidas. Às vezes, renunciam
a tudo que aprenderam antes, precisam de ajuda para tudo
e em toda parte e tornam-se totalmente dependentes –
como no ventre materno. Naturalmente, a Pulsatilla pode
auxiliar e melhorar muitos quadros de sarampo.
Quanto aos pais, muito de sua sensibilidade é exigida para
ajudar a criança. Eles têm de se abrir com espontaneidade
para o próximo passo – mesmo quando a criança manifesta
claramente seu desânimo – e de restabelecer os limites
quando ela já está farta do velho, mas ainda não
(re)conhecer o novo.
 
Medidas de apoio:

Repouso na cama: enquanto houver febre, nada
de tomar banho de chuveiro ou banheira nem
sair de casa.

Atenda às necessidades individuais de seu filho
quanto a escurecer o quarto, proteger de
estímulos externos, ingerir algum líquido e
alimento de sua preferência, proximidade,
repouso e cuidados.

Arejamento: os cômodos devem ser sempre bem
arejados.

Não utilize antipiréticos da medicina tradicional,
a fim de evitar complicações!

Em caso de erupções cutâneas mal
desenvolvidas, lavar todo o corpo com água
morna e salgada. Logo em seguida, cobrir bem a
criança.

Clister: a cada dois dias, proceder ao clister
como medida de alívio (conforme descrito no
capítulo sobre a febre) e acompanhar a
evacuação.

Apoio fitoterápico e tratamento homeopático em
caso de tosse, conjuntivite, otite e febre (ver os
respectivos capítulos).

Reconvalescença: depois de superada a doença,
são aconselháveis de duas a três semanas de
reconvalescença, nas quais a criança não deve ir
ao jardim de infância ou à escola e, aos poucos,
acostumar-se novamente com o dia a dia.

4.4 Caxumba
O quadro clínico também conhecido como papeira ou
parotidite epidêmica manifesta-se através do inchaço das
parótidas, levando à deformação do local, com inchaço do
rosto, que às vezes pode ficar desfigurado. Uma
característica dessa desfiguração é a saliência dos lobos da
orelha. Ambos os lados podem ser alternadamente atingidos.
Junto com a coqueluche, trata-se da única doença infantil
sem manifestações cutâneas.
O rosto inchado realmente impressiona. Do ponto de vista
simbólico, trata-se, evidentemente, de mostrar mais e inchar
as próprias bochechas – a criança está treinando gestos
ameaçadores. Nesse sentido, trata-se de uma tentativa de
desenvolver uma personalidade mais poderosa. Em casos
normais, o inchaço do rosto deve-se a uma mastigação
intensa ou à compressão crônica dos maxilares. O tema por
trás disso seria “praticar bhoga” ou, como dizem os budistas,
“digerir o mundo”. No entanto, justamente isso lhes é
negado. O apetite desaparece, as bochechas incham até
ficarem doloridas e apenas simulam a boa mordida. Na
verdade, a criança acabou de perder toda capacidade de
morder e não consegue reduzir sua vida a pequenos pedaços
adequados à digestão.
Por trás de tudo isso há uma inflamação, portanto, um
conflito. A tarefa das parótidas tem menos a ver com as
orelhas, sob as quais se localiza, do que com a produção do
líquido viscoso, arquetipicamente feminino, da glândula
salivar. Também é possível que o conflito se alastre para as
outras glândulas salivares, até mesmo ao pâncreas, o que
pode levar a fortes dores abdominais. Nesse sentido, trata-
se aqui realmente de um conflito que diz respeito à digestão
da vida. A função da saliva é fazer com que tudo deslize
corretamente, o que deixa de acontecer na caxumba, para
não falar da falta de apetite condicionada pela doença.
Outras glândulas também podem ser acometidas. Nesse
caso, a temática se estende aos problemas de coordenação,
direção e transmissão de informações relativas a toda a área
do corpo. Nos homens em idade adulta, algumas vezes os
testículos são atingidos, o que pode gerar infertilidade.
Portanto, nesse caso, trata-se de uma extensão do conflito
para os temas “fertilidade” e “masculinidade”. Muitas vezes,
nos adultos, a caxumba se expande até as meninges. O
conflito atinge, portanto, o sistema nervoso central. Segundo
Friedrich Graf, isso ocorre em uma a cada duas crianças,
mas é “normal” e benigno. Nesse caso, fica claro o quão
importante é ter esse quadro clínico como doença da
infância em suas variantes inofensivas e que estimulam o
crescimento, e não, por exemplo, após a puberdade.
Como doença infantil, a caxumba geralmente decorre sem
problemas. O perigo de esterilidade por meio da inflamação
dos testículos não existe antes da puberdade. Desde a
introdução da vacina contra a caxumba, nos anos 1980,
observou-se um aumento dos casos de orquite, mas que, de
modo geral, permanece muito raro. Isso provavelmente se
explica pelo fato de que a média de idade de pessoas
acometidas pela caxumba agora é maior do que
antigamente.[18] Quem pensa em vacinar meninos, primeiro
deveria pensar bem em determinar o título, como se faz com
a rubéola no início da puberdade. Do nosso ponto de vista,
as meninas não devem absolutamente ser vacinadas contra
a caxumba. Segundo Friedrich Graf, seus ovários também
podem adoecer, embora com menor frequência.
Como em todas as doenças da infância, os pais podem
estimular a futura etapa de crescimento da personalidade
infantil. Ao que parece, seu filho quer ter mais controle sobre
seu próprio eu e infla as bochechas. Como a saliva, o
lubrificante no mecanismo da digestão, tornou-se um
problema, nessa fase, é difícil para a criança digerir sua
própria vida. Nem tudo desliza como desejado. Se o
pâncreas for atingido, é importante não subestimar uma
dificuldade maior na digestão das impressões materiais. Nos
adultos, o envolvimento do cérebro também pode indicar
problemas com a digestão imaterial.
A pergunta que se impõe é a seguinte: “Em que contextos
(familiares) fico com o pescoço tão inchado?” Às vezes, os
animais se eriçam para impressionar ou sobretudo assustar
os adversários. Por conseguinte, a pergunta seria: “Quem
meu gesto ameaçador deve assustar?” Ou então: “Quem
deve impressionar?”
Com efeito, em sentido figurado, trata-se de lutar com
coragem para dar outro passo e se desvencilhar da infância,
devendo-se aceitar conflitos com o polo feminino e materno,
como ocorre claramente na mucosa. O quadro clínico
também poderia ser entendido como um passo da
apoderação de si mesmo. Ainda que no início apenas
simbolicamente e sob o efeito das dores, a criança mostra
seu poder de vencer as dificuldades e assumir um aspecto
feroz.
Como terapia concreta, devem ser levados em
consideração o repouso na cama – caso desejado – e uma
alimentação leve. Se as crianças não demonstrarem apetite,
é melhor não insistir. Seja como for, a alimentação deve ser
sem gordura nem proteína. Se o pâncreas tiver sido afetado
e provocar dores abdominais, esquentar o centro do corpo
costuma fazer bem.
 
Medidas de apoio:

O repouso na cama deve ser absolutamente
mantido, mesmo na ausência de febre.

Não fazer a febre baixar; do contrário, podem
surgir complicações, como otite, etc.

Tratamento externo do inchaço: unguento de
Archangelica compositum (da Weleda).

Compressa com queijo quark: colocar 0,5
centímetro de queijo quark magro em uma
toalha limpa e aplicá-la na face acometida de
inchaço. Fixar com uma faixa. Tirar depois de
meia hora e, se necessário, repetir o
procedimento.

Bochecho ou chá: o bochecho com essência de
calêndula (dez gotas para um copo d’água) ou o
chá de sálvia têm efeito anti-inflamatório.

Renunciar a alimentos e bebidas ácidos, a fim de
não estimular a salivação desnecessariamente e,
assim, aliviar as parótidas.

4.5 Rubéola
A rubéola apresenta um quadro clínico inofensivo, pelo
menos se comparada ao sarampo. Após duas ou três
semanas de incubação, ela geralmente decorre sem
complicações, de forma atenuada, com um pouco de mal-
estar e sintomas não específicos, semelhantes aos da gripe.
Algumas vezes, notam-se inchaços nos gânglios linfáticos do
pescoço, atrás do esternoclidomastoídeo, músculo
responsável pelo movimento rotatório da cabeça. Mais
raramente ocorrem inchaços na região inguinal. Contudo, de
modo geral, esse fenômeno também é irrelevante e não
necessita de terapia. A temperatura do corpo eleva-se um
pouco, sempre abaixo dos 39°C. A leve erupção cutânea
inicia-se quase sempre atrás das orelhas, com pequenas
manchas, e, na maioria das vezes, desaparece em algumas
horas.
Embora geralmente não precise de tratamento, a rubéola
é uma doença necessária, pelo menos para as meninas, uma
vez que, durante a gravidez, pode causar doenças
devastadoras para o embrião. O perigo dessa embriopatia
torna necessário determinar o título nas meninas antes da
puberdade, e nunca ministrar diretamente a vacina. Como
em geral a rubéola transcorre de forma tão atenuada que
pode passar totalmente despercebida, pode acontecer que já
haja anticorpos suficientes que protegem mais do que uma
vacina. Qualquer médico pode realizar a determinação do
título. Em vez disso, muitos médicos tradicionais que não
levam em conta os perigos da vacina costumam aconselhar
logo a vacinação. Nesse caso, é recomendável procurar
outro médico.
 
Medidas de apoio:

Nenhum tratamento: na maioria das vezes, a
rubéola não necessita de tratamento.

Nenhuma vacina: apenas se não houver nenhum
anticorpo, para as meninas é fundamental a
vacinação ainda antes da puberdade. Para os
meninos, a vacinação é irrelevante.

4.6 Coqueluche
A coqueluche ou pertussis é desencadeada pela bactéria
Bordella pertussis. Além do pulmão, são tratados os temas
“contato”, “comunicação” e a necessidade nascente de
liberdade, sentida pela criança. Especialmente à noite – e
por isso se enfatiza o mundo do inconsciente –, surge a tosse
seca, incessante e, portanto, não libertadora. A criança ainda
não quer nem pode trazer para fora a agressividade que se
impõe a partir do reino inconsciente da alma. Desse modo,
no início, a tosse é improdutiva, ou seja, quase não promove
a expectoração.
Por um período que pode durar de uma a mais de três
semanas, uma luta crescente, muitas vezes intensa e
desesperada, é conduzida por ímpetos de agressividade
incontroláveis. Acessos de tosse que mais parecem latidos e
são exaustivos – interrompidos por uma inspiração
tipicamente ofegante – costumam desencadear outros
acessos mais fortes ainda. A criança oferece um quadro
agressivo, rumoroso; ela tosse alguma coisa ao mundo (ao
ambiente) e até cuspindo e vomitando nele quando a tosse é
muito forte. Assim, ela logo se torna o centro de atenção da
vida em família. Mesmo um pai que, em outras
circunstâncias, é menos afetuoso não consegue ficar alheio a
essa saraivada de tosse vinda de pulmões esgotados. A
verdadeira guerra no âmbito da comunicação também pode
ser sentida na família, na qual tudo se torna mais difícil
quando um membro luta no campo mais externo. De acordo
com sua ressonância, obviamente todos se lembrarão de
algum problema de agressividade ou liberdade não
resolvido.
O que acontece nos pulmões, muitas vezes acompanhado
de convulsões, também atinge a região do estômago e do
esôfago, causando ânsia de vômito e sensação de
sufocamento. É como se a alma da criança quisesse expelir
pela tosse e pelo vômito tudo que é estranho a seu interior,
promovendo, assim, uma limpeza abrangente. Em casos
extremos, até mesmo o ar respirado com tanto esforço é
vomitado junto com o muco ou expelido com os acessos de
tosse.
A criança expõe claramente sua agressividade represada e
concentrada e pratica a revolta, quando não a guerra. Ela
luta por sua própria expressão e liberdade, conquista com
muito barulho o centro do interesse e, durante semanas, não
o abandona. Desse modo, não poupa nem os pais nem a si
mesma, menos ainda seus pulmões, que sofrem grave falta
de ar com as contrações e os acessos de tosse. Por
conseguinte, esses testes de resistência para os nervos de
todos os envolvidos podem levar ao rompimento de tecidos
e à bronquiectasia, ou seja, à dilatação dos brônquios
através do rompimento de estruturas internas dos pulmões.
Contudo, em geral, nas crianças essas estruturas também
voltam a se refazer. Em contrapartida, a febre no sentido da
mobilização geral só aparece raramente. Ao que parece, a
temática da agressividade é revelada por acessos de tosse.
O fator mais tranquilizador nesse período de acirrada luta
é saber que, na maioria das vezes, a doença tem um
decurso típico, que prevê uma piora nas três primeiras
semanas e, por fim, atenua-se lentamente. Com o
tratamento homeopático nunca presenciamos os terríveis
efeitos colaterais acima mencionados.
Do ponto de vista da homeopatia, a coqueluche é uma
doença infantil importante, que não apenas ajuda as forças
de agressividade em sua manifestação final – forças essas
que, de maneira igualmente “incômoda”, começaram com o
nascimento dos dentes –, mas também compõe um quadro
clínico que pode levar a uma mudança de constituição. Não
raro, crianças que tiveram coqueluche tornam-se
nitidamente mais vivazes e aptas para a vida. Em termos
homeopáticos, a herança tuberculínica costuma enfraquecer-
se posteriormente.
De modo geral, trata-se de uma manifestação
acompanhada por intensas explosões de agressividade em
um novo estágio do desenvolvimento – a criança tem de
lutar para dar esse passo rumo a si mesma e à sua nova
liberdade. Obviamente de forma inconsciente, ela quer
conquistar uma nova posição na família e na vida,
colocando-se no centro através da dura decorrência de sua
doença. Assim, de maneira igualmente inconsciente, ela
reivindica o tempo integral dos pais ou, pelo menos, da mãe.
Nessa fase do desenvolvimento, os pais podem
reconhecer, em si mesmos e na vida do filho, a
agressividade como princípio (primordial) vital e ajudá-la
ativamente a se manifestar. Obviamente, acessos de tosse
que duram semanas também podem provocar toda a
agressividade represada da mãe, especialmente quando ela
está por conta própria em períodos de luta tão acirrada. O
ideal seria resolver com igual coragem os próprios conflitos
interpessoais. Isso esclareceria indiretamente às crianças
que elas podem iniciar sua vida com engajamento e luta e
devem aprender a se impor.
Como geralmente, no período de doenças infantis graves,
as mães têm de lutar com a escassez de sono e o
esgotamento e ficam cronicamente sobrecarregadas, esses
conflitos interpessoais precisam ser adiados para depois da
doença. Do pai se exige uma grande porção de tolerância,
bem como a disposição emocional ativa para ajudar a
resolver esse conflito. Se o tema for tratado de modo
construtivo na família, para todos ele proporcionará um
passo rumo à união.
Seria importante fazer com que crianças que não
demonstram (ou não conseguem demonstrar) nenhuma
agressividade conhecessem esportes adequados. Estes
podem ir do rugby e do futebol, passando pelo hóquei no
gelo, até um saco de boxe pendurado em casa. Em princípio,
todos são esportes ligados à ideia de agressividade, mas
também, e sobretudo, esportes de luta, que cada vez mais
são praticados também pelas meninas.
Em todo caso, o tema básico nesse período exige muita
força e coragem. Ele gravita em torno de uma educação que
visa um uso corajoso da energia, bem como em torno da
ideia de arriscar a vida para enfrentar incisivamente seus
desafios e lançar os alicerces para aquela preciosa atitude
que se mostra mais tarde na vida como coragem civil.
A coqueluche é realmente perigosa para lactentes nos seis
primeiros meses de vida. Na visão da maioria dos
terapeutas, nesse caso deve-se rapidamente fazer uso de
um antibiótico. Em contrapartida, o pediatra Martin Hirte
trata também os lactentes que sofrem de coqueluche sem
antibiótico, pois o único efeito desse medicamento seria
abreviar a fase contagiosa. Depois da primeira semana da
doença, os antibióticos já não fazem sentido, uma vez que a
tosse é desencadeada não pelas bactérias, mas pelos danos
já causados aos brônquios.
A vacina contra coqueluche – assim como todas as vacinas
que sempre pressupõem um sistema de defesa específico –
desenvolve tarde, a saber, um ano depois, sua total eficácia.
Aos lactentes, que ainda não produzem anticorpos, as
vacinas não podem trazer nenhum benefício. Com essas
vacinas duplamente perigosas em uma fase precoce em que
o cérebro ainda está se desenvolvendo, alguns médicos
transmitem aos pais uma suposta segurança que falta até
mesmo aos fundamentos da medicina tradicional. Por essa
razão, no primeiro ano de vida, as vacinas não deveriam ser
aplicadas simplesmente por serem perigosas. Todo o
restante que se diz a respeito é ilusão de quem as produz.
Nesse sentido, é imprescindível e necessário manter os
lactentes afastados de crianças com tosse. Uma distância de
cinco metros seria aconselhável como precaução. Medidas
como cobrir a cabeça com fraldas de pano são bem menos
seguras.
Medidas naturopáticas de acompanhamento seriam, por
exemplo, as compressas feitas com queijo quark. De resto, o
repouso, quando possível entre os acessos de tosse, é
decisivo. Também tem efeito benéfico a mudança de ares,
que geralmente é muito bem aceita pelas crianças, como
férias na praia ou nas montanhas, visitas a grutas
impressionantes (com estalactites e estalagmites) ou ainda
estábulos com vacas e cavalos. Nesse caso, pouco importa
se o que predomina é a atmosfera especial ou a mudança de
humor. Mesmo alterações abruptas de pressão atmosférica
podem ter um efeito benéfico, por exemplo, a decolagem ou
o pouso rápido de um avião.
Do ponto de vista psicológico, é útil transigir
excepcionalmente com a criança em questões conflituosas,
ou melhor, sempre que possível, não deixar que surjam
diferenças nem lutas pelo poder, uma vez que os conflitos
aumentam a disposição para a tosse ou os “ataques”, o que
evidencia a relação com o tema da agressividade ou de
Marte. Depois de longos períodos de reconvalescença, é
sempre recomendável planejar uma mudança de clima.
 
Medidas de apoio:

Repouso e relaxamento: em geral, os ataques
ocorrem de maneira mais atenuada quando os
pais proporcionam um ambiente tranquilo e
relaxado. Eles não devem transmitir nenhuma
ansiedade à criança, uma vez que isso poderia
piorar consideravelmente os acessos de tosse.

Postura positiva e confiante: os pais devem
adotar uma postura positiva e confiante, a fim de
apoiar a criança em seu processo de
amadurecimento.

Alimentação: oferecer com frequência refeições
leves e em pequenas porções, como frutas,
verduras e arroz.

4.7 Catapora
A catapora é uma doença infantil inofensiva, que só quando
adiada para a idade adulta pode assumir uma decorrência
difícil, como muitas outras doenças da infância. Por isso, os
pais devem resistir à tentação da nova vacina, que é
completamente desnecessária. Conforme já descrito, ela
simplesmente põe em risco os adultos.
Nomen est omen.[19] Os agentes patogênicos chegam a
ser carregados pelo vento, alastrando-se rapidamente e de
maneira incontrolável. O vento, como criança celestial, é
capaz de transportá-los a todos os lugares, no verdadeiro
sentido da palavra, e não pode ser detido. Ainda que
inofensiva na infância, a catapora é incômoda e deixa as
crianças inquietas, agitadas e algumas vezes realmente
histéricas. Pois, além dos poucos sintomas genéricos, a
erupção cutânea que causa prurido e se alastra por todo o
corpo provoca uma intensa vontade de se coçar, que,
embora momentaneamente ofereça algum alívio, a longo
prazo só piora e favorece a formação de cicatrizes devido a
superinfecções bacterianas. Nesse sentido, a difícil tarefa
dos pais é impedir que as crianças se cocem, o que, por
outro lado, estimula reações histéricas por parte delas.
Simbolicamente, é compreensível que elas cocem as
bolhas, pois desejam abrir seus limites e, para tanto,
chegam a rasgar a pele com o que resta de suas unhas. A
solução está apenas em plano metafórico, em que se trata
de abrir os limites para deixar que saia o velho (e venenoso)
e entre o novo, que promove o desenvolvimento.
Aos poucos, as pápulas convertem-se em bolhas, que, por
fim, se transformam em crostas. Estas, por sua vez,
geralmente saram sem formar cicatrizes. Medidas prévias
para reprimir a defesa, como tratamentos à base de
cortisona, estimulam a infecção secundária das bolhas.
Na tradução simbólica, a criança se aproxima aos poucos
do novo, que nela provoca coceira, ou seja, a excita
consideravelmente. Além da pele, são tratados os temas
“descoberta do limite”, “disposição para o contato” e,
sobretudo, “carinho”, em cujo campo são exigidos os passos
a serem dados para o crescimento.
Os pais são convocados a ajudar a criança a se posicionar
positivamente em relação aos novos impulsos, que já
provocam coceira e estimulam, a ajudá-la a ousar
ultrapassar os próprios limites de maneira corajosa, aberta e
decidida.
 
Medidas de apoio:

Repouso na cama somente se a criança tiver
febre.

Manter as unhas curtas.

Não se coçar: estimular a criança a apertar as
pústulas em vez de coçá-las.

Aplicações externas: talco Wecesin e
Combudoron líquido da Weleda.
Essência de calêndula (dez gotas em um copo
d’água para passar levemente nas feridas).
Aspergir chá de folhas frescas de hortelã-pimenta
com um spray sobre as partes da pele afetadas.
Não fazer aplicações que contenham zinco, cortisona
e antibióticos.

Uso interno: auto-hematoterapia potencializada
(ver a seção “11.2 Dermatite atópica e crosta
láctea”).

Tratamento homeopático: Rhus toxicodendron
C30, dois glóbulos uma vez ao dia. Os sintomas
do Rhus toxicodendron são grande inquietação,
inclusive à noite na cama, bolhas que causam
forte coceira, ardência após a coceira e desejo
de movimentar-se.

4.8 Febre dos três dias


Esse quadro clínico, que costuma ser o primeiro em
lactentes ou bebês, pode ser considerado o primeiro treino
imunológico da vida. Ele não oferece perigo. Como na
maioria das vezes a febre dos três dias se torna
relativamente intensa e a temperatura do corpo pode chegar
a 40°C, infelizmente os médicos tradicionais costumam
aplicar vacina, em detrimento do desenvolvimento da
criança.
Sobretudo mães jovens com o primeiro filho se assustam
com essa febre, que não é tão dramática para crianças
pequenas, e buscam auxílio médico. Todavia, praticamente
não há necessidade de tratamento. Quase sempre, os
sintomas se limitam à febre; raras vezes ocorre além dela
um exantema com leve descamação, que também não
deveria dar motivo para preocupação. Nesse caso, para a
febre, vale o que já foi dito anteriormente. Seria
recomendável permitir à criança esse treino para sua defesa
e observar como ela vence a sua primeira luta nessa área
com as próprias forças, ou seja, auxiliada apenas pelas
células de defesa que – é de esperar – ela recebe
regularmente por intermédio do leite materno.
 
Medidas de apoio:

Não fazer a febre baixar: a única coisa perigosa
da febre dos três dias seria adotar um
tratamento da medicina tradicional com o uso de
antipiréticos.

Outras medidas: ver o Capítulo 3 “Febre”.

4.9 Escarlatina
Esse quadro clínico já não pertence às doenças infantis
clássicas e só aparece de forma variada depois que a criança
passa a frequentar a escola. Dos mais de cem tipos do
estreptococo beta-hemolítico do grupo A, apenas três
produzem a toxina que desencadeia a verdadeira
escarlatina. Por essa razão, quando se colhe material da
garganta e se encontram estreptococos desse grupo, não faz
sentido falar de escarlatina. Não obstante, com frequência, é
exatamente o que ocorre. A diferença é importante, pois,
quando se trata da verdadeira escarlatina, a criança precisa
ser mantida afastada da escola ou do jardim de infância por
pelo menos três e, de preferência, por quatro semanas. Em
caso de febre, o repouso na cama é obrigatório! Quando não
há febre, basta que ela fique em casa. Naturalmente, tanto
tempo de recuperação não é necessário em caso de
amigdalite.
As três cepas mencionadas, ou melhor, sua toxina, levam
ao exantema pouco extenso por todo o corpo, que começa
no pescoço ou na região inguinal, fazendo com que a pele
seja afetada como órgão de limite e de contato. A língua
com aspecto de framboesa e a conhecida erupção cutânea
de cor vermelho-escarlate, com inúmeras manchas
vermelho-escuras em todo o corpo, revelam a energia de
agressividade vital e fortemente avermelhada que irrompe
para fora e se descarrega por todo o limite do corpo.
Contudo, em primeira instância vem a garganta
avermelhada e inflamada, com inchaço das tonsilas
palatinas e dos gânglios linfáticos do pescoço.
Simbolicamente, exprime-se aqui um difícil conflito no portão
de entrada para o mundo físico interior. Dor de garganta e
dificuldade para engolir são as consequências dessa
inflamação. A criança engoliu o suficiente, e toda tentativa
ulterior de engolir dói terrivelmente.
A isso se acrescentam o inchaço dos gânglios linfáticos
localizados e a vermelhidão intensa do palato posterior e da
garganta, bem como o triângulo descorado na boca, com
vermelhidão intensa nas bochechas e dor de garganta. A
febre alta revela o estado genérico de ameaça no sentido de
uma mobilização geral do organismo em vista da etapa do
desenvolvimento a ser controlada. De modo geral, a pele
fica seca e, no final, descama na palma das mãos e na sola
dos pés. Depois de vencida essa etapa, a criança terá se
desenvolvido, o que se vê claramente em seu corpo.
Em todos os outros casos em que a cultura de material da
garganta revela a presença de estreptococos, tem-se
simplesmente uma amigdalite, mas não a escarlatina! Se em
todas as vezes utilizarem-se antibióticos, a melhora até pode
ser rápida, mas, por outro lado, haverá recidivas, conforme a
medicina tradicional vergonhosamente nomeia o
recrudescimento da doença em recaídas constantes.
Teoricamente, uma criança pode ter a verdadeira
escarlatina três vezes, pois existem três diferentes agentes
patogênicos, que deixam de herança sua respectiva
imunidade. Em geral, porém, a criança já desenvolve uma
imunidade para a vida toda quando vive e supera a doença
corretamente pela primeira vez, sem o auxílio de
antibióticos.
No período que antecede a escarlatina, geralmente o
desenvolvimento mental da criança é antecipado, e o
intelecto domina sua vida. Durante a doença, o rosto adquire
uma aparência séria e com traços fortes, ao contrário do que
ocorre durante o sarampo, em que o semblante da criança
fica um pouco inchado, diluído, como o de um bebê.
Crianças com escarlatina geralmente são sobrecarregadas
com as exigências do ambiente, como a escola, o que, antes
do adoecimento, pode ser notado por meio de uma
intelectualidade aguçada, de quem tudo sabe, ou de um
abatimento. A doença surge com especial frequência quando
as crianças que estão no terceiro e no quarto ano escolares
são distribuídas entre outras escolas, onde continuarão seus
estudos e terão seu desempenho avaliado.
Nesse sentido, o pescoço é o ponto de ligação entre a
desorientada central nervosa e sensorial da cabeça e a
região torácica, responsável pela sensibilidade psíquica, que
tem o coração como órgão central do cenário predestinado
desse drama. A criança se agarra a esse ponto de
intersecção entre o intelecto e o sentimento e nele
experimenta seu principal conflito.
Depois de superada a doença, muitas vezes o lado cordial
da criança se fortalece e pode se abrir para o entendimento.
Quando bem-sucedido, esse equilíbrio se mostra até mesmo
nas pinturas infantis, que com frequência passam a ser
feitas de outra forma. Podemos partir do princípio de que
essas imagens externas são um bom espelho das imagens
anímicas internas, conforme comprovou claramente
Elisabeth Kübler-Ross. A mudança pode ir tão longe que,
depois de superada a escarlatina, meninos malcriados, com
tendência a maltratar animais, passam a ter compaixão e
amor pelos bichos.
O perigo da propagação dos conflitos inflamados para
outras regiões praticamente não existe com o tratamento
homeopático. Entretanto, no caso da inibição exercida pela
medicina tradicional, pode ocorrer um desvio da
problemática para palcos secundários. Inflamações nas
articulações anunciam dificuldades para articular-se; o
envolvimento dos rins indicam problemas de relacionamento
e harmonia. A febre reumática evidencia a batalha geral de
defesa que pode afetar todas as articulações. Inflamações
nas válvulas cardíacas, com as respectivas anomalias
cardíacas resultantes, mostram o quanto o mundo dos
sentimentos foi afetado, enquanto o envolvimento das
meninges indica problemas centrais de regulação e deixa
claro o já mencionado campo de tensão desse quadro clínico
entre o cérebro e o coração. Não é à toa que a medicina
tradicional conhece a expressão “a escarlatina lambe as
articulações e morde o coração”.
Também cabe aos pais a tarefa essencial de estimular e
auxiliar no controle desse equilíbrio entre cabeça e coração.
Muitas vezes, não é fácil assistir à luta solitária dos próprios
filhos. A melhor terapia é conseguir por si mesmo, ter
segurança ao ficar em pé nas próprias “pernas de adulto” e
atravessar a vida. Obviamente, é muito mais fácil dar-lhes a
mão e aquele afeto que também ajuda a atravessar
situações difíceis e permite se livrar de antigos modelos e do
estilo de vida já superado.
Quando os temas correspondentes são trabalhados do
ponto de vista psíquico e, sobretudo, levados em
consideração, o perigo de que haja um desvio para os palcos
secundários e extremamente problemáticos reduz-se
bastante. Nesse sentido, vale a pena encorajar a criança a
travar a luta que, externamente, se torna visível na pele e,
internamente, se enfurece na alma até a descamação da
epiderme, estimular sua capacidade infantil de articulação,
satisfazer suas necessidades de amor e harmonia, bem
como prestar atenção em questões centrais que regulam sua
vida. Especialmente desafiador para a vida da classe média,
mas absolutamente necessário, é o estímulo para
desenvolver a agressividade saudável, incentivando uma
vida com coragem, pensamento incisivo e sentimentos
inabituais ou até mesmo críticos.
 
Medidas de apoio:

É indispensável manter o repouso na cama!

Não fazer a febre baixar: ver Capítulo 3 “Febre”.

Limpar a pele com água e sal: diariamente, duas
colheres cheias de sopa de sal para um litro de
água.

Outras medidas: ver a seção “8.5 Dor de
garganta”.

Tratamento homeopático: Belladonna C30 (dois
glóbulos, três vezes ao dia) é o primeiro
medicamento caso a criança sinta dor de
garganta repentina e forte. Outros sintomas:
vermelhidão intensa e inchaço das tonsilas
palatinas, muita dor para engolir, sintomas
frequentes do lado direito, inchaço dos gânglios
linfáticos do pescoço, febre alta com olhos
vítreos, braços e pernas frios, eventual falta de
sede, hipersensibilidade de todos os sentidos
(luz, ruído, toque).
5 Vacinas

No que se refere a esse tema, não confie de maneira acrítica


em médicos nem em farmacêuticos, pois ambos podem lhe
dar conselhos que visam promover seu próprio negócio e
que, por conseguinte, prejudicarão seu filho. É melhor
pensar por si mesmo!
Além do que foi dito até agora, essa frase provocadora já
revela que, a partir de nossa experiência, desenvolvemos
uma aversão às vacinas, que, no entanto, não é
generalizada. Por exemplo, quando uma menina antes da
puberdade não teve nenhum contato com a rubéola, nós
também – tendo em vista uma eventual gravidez –
vacinamos oportunamente, contanto que já não tenha
havido um contato despercebido com a doença, o que pode
ser confirmado através da determinação do título.
Não consideramos adequada uma oposição categórica às
vacinas; antes, somos favoráveis a uma vigilância crítica.
Nossa preocupação é fornecer aos pais informações sobre o
tema, bem como suas consequências, para que eles
realmente possam decidir com responsabilidade, e não
intimidados por uma propaganda parcial, que os impele a
uma direção, da qual mais tarde podem se arrepender. As
incríveis possibilidades de manipulação da opinião, que vão
das multinacionais farmacêuticas até a corrupção rotineira
de supostas revistas especializadas, foram reveladas, por
exemplo, por um relatório do programa “Frontal 21”, da rede
de televisão Zweites Deutsches Fernsehen, em 9 de
dezembro de 2008.
Portanto, somos convocados a refletir sobre o sentido da
vacinação. Após a descoberta da relação com o destino na
filosofia espiritual, não podemos absolutamente nos negar a
olhar para a esquerda e para a direita antes de atravessar a
rua, seguindo o lema “O que tiver de acontecer acontecerá”.
Segundo um provérbio árabe, “Confie em Alá, mas não deixe
de amarrar seu camelo”. Portanto, podemos vacinar, desde
que ponderemos cada vacinação. Entretanto, após nossas
experiências com as vacinas aplicadas hoje em dia, somos
obrigados a desaconselhá-las em ampla medida –
especialmente aquelas em doses múltiplas.
Com o tempo, isso pode mudar. Pelo menos, a indústria
começou, com algum investimento, a substituir o
Thiomersal, conservante com mercúrio de muitas vacinas,
supostamente inofensivo, mas há muito tempo considerado
inadequado pelos homeopatas. Seja como for, termômetros
com mercúrio também merecem ir para o lixo especial.
Afinal, o que essa substância tem a ver com o corpo da
criança?
Também nos perguntamos por que agora sua substituição
gerou custos, se durante décadas foi considerada inofensiva.
Muitas questões sobre esse tema não foram esclarecidas.
Como se justifica, por exemplo, o fato de que, antigamente,
a vacina Salk contra a poliomielite, substituída pela forma
oral, foi retirada do mercado devido à ocorrência de várias
mortes e hoje retorna por supostamente já não oferecer
nenhum perigo? Teria alguma coisa a ver com o fato de que,
nesse meio-tempo, muito mais pessoas morreram em
consequência da vacina oral, de maneira que a Organização
Mundial de Saúde foi obrigada a proibi-la, e espera-se que a
população já não se lembre dos argumentos contra a vacina
Salk? Ou então, por que a indústria precisa encenar um
pânico como o ocorrido em torno da chamada gripe aviária?
Por que os médicos não contradizem esse teatro? Seria pelo
fato de que esta foi a ocasião ideal para superar a chamada
má vontade da população em se vacinar?[20]
Em princípio, a história da medicina ocidental infelizmente
mostra reiteradas vezes que a opinião científica de hoje é o
erro de amanhã. Contudo, aqueles pais que pretendem
trilhar o corajoso caminho (quase) sem vacinas têm de saber
que caminharão contra o vento da medicina tradicional e,
não raro, serão vítimas de acusações e até de verdadeiras
ameaças. Na Itália, as vacinações são obrigatórias e contam
até com força policial. Entretanto, de modo geral, a pediatria
italiana está entre as mais deploráveis que conhecemos. Na
França não é diferente. Ao que consta, nesse país, crianças
sem vacina não podem frequentar o jardim da infância, e os
pais que se recusam a vacinar seus filhos em idade escolar
podem até perder sua guarda.
Nos países mais liberais de língua alemã, quem não quiser
vacinar seu filho tem de criar para ele um lar que lhe
transmita proteção e saúde suficientes para que ele possa
desenvolver suas próprias forças com toda a tranquilidade.
Nesse sentido, a vida moderna, que a criança passa a
conhecer melhor aos oito meses na creche, a fim de não
impedir que a mãe tenha uma carreira, é pouco adequada.
Em contrapartida, quando existe um ninho protetor ideal,
que compreende o aleitamento por longo período e poucas
pessoas de referência em um ambiente caseiro e que seja
mantido nos três primeiros anos com ritmos seguros e
alimentação integral, as crianças podem se desenvolver
incomparavelmente melhor sem as vacinas e encontrar uma
vitalidade sem igual. Mesmo o excesso de estímulos que faz
parte da vida moderna precisa ficar longe desse ninho.
Nesse sentido, os pais prestam o melhor serviço até a si
mesmos se renunciarem à televisão.
Viagens longas também são desaconselhadas no caso de
crianças pequenas, uma vez que em outras regiões do
mundo predominam situações microbiológicas totalmente
diferentes, que podem sobrecarregar o sistema imunológico
da criança. Na África, por exemplo, a poliomielite é endêmica
como diarreia, ou seja, ocorre em toda parte; mas isso não
implica que leve automaticamente ao quadro patológico
completo, que inclui a paralisia.
Além disso, não faz diferença se a caixa de areia se
encontra na própria casa ou no playground do hotel em um
continente distante. Por outro lado, do ponto de vista
psicológico, é problemático renunciar a muitas coisas, pois
uma criança pequena também percebe isso na forma de
repreensões implícitas.
De extrema importância para um caminho sem vacinas é a
assistência confiável por meio de homeopatas experientes,
uma vez que parte dos pediatras que seguem a medicina
tradicional recusa-se até mesmo a tratar de crianças não
vacinadas e, de modo geral, recorrem rápido demais à
artilharia pesada, como cortisona e antibióticos.
Se as crianças já tiverem sido vacinadas, nem tudo está
perdido, mesmo que sejam necessárias algumas ações por
parte da homeopatia, a fim de compensar danos que tenham
surgido em decorrência das vacinas e que podem determinar
uma vida inteira. Entretanto, essas ações são possíveis e
sempre valem a pena.
Muito diferente seria se, depois de consumada toda a orgia
de vacinas, a criança continuasse a ser tratada com
antibióticos e antipiréticos em suas crises ao longo da
infância e da adolescência. Embora em tempos recentes
esses recursos ainda funcionem – e neles residem os
verdadeiros “sucessos” de uma medicina baseada na
química –, eles logo lançam os alicerces de todas as doenças
crônicas, contra as quais a medicina tradicional luta
relativamente em vão em uma fase posterior da vida, no que
se refere a soluções e, de modo mais lucrativo, aos custos. A
repressão à ocorrência de doenças graves leva – em muitos
casos, de maneira comprovada – a sintomas posteriores.
Excepcionalmente, até estudos realizados pela medicina
tradicional provam isso. Por exemplo, se nos dois primeiros
anos de vida a criança é submetida a um tratamento à base
de antibióticos, ela correrá um risco 50% maior de se tornar
alérgica no futuro. Portanto, o enorme aumento de alergias é
totalmente explicável e marcadamente produzido pelo uso
indiscriminado de antibióticos. Estes devem ser reservados
apenas a situações em que haja algum risco de vida; do
contrário, são eles que ameaçarão a vida através das
alergias e outros sintomas crônicos.

5.1 Vacinar ou lavar? Erro de pensamento no exemplo


da vacina do câncer de colo do útero
Depois de ter sido venerada durante décadas, a chamada
“prevenção” contra o câncer é cada vez mais debatida. A
Evidence Based Medicine, orientação introduzida pelo
médico e epidemiologista britânico Archibald Cochrane, que
submete a medicina acadêmica e seus efeitos a um rigoroso
exame científico, levanta muitas questões críticas. Quem
ainda mal conhece a diferença entre profilaxia e diagnóstico
precoce carece cada vez mais de explicações. Ingrid
Mühlhauser, professora e doutora em Ciências da Saúde na
Universidade de Hamburgo, ainda formula com frequência
essa ideia.[21] Segundo ela, no que se refere à maioria dos
exames para diagnóstico precoce, atualmente não se sabe
dizer com exatidão se eles são úteis. Além disso, sobretudo
exames de diagnóstico de câncer em pessoas saudáveis
causam mais danos do que ajudam.
Sabe-se que a prevenção é melhor do que a cura; por
conseguinte, os pacientes esperam, com razão, que a
medicina os ajude com a profilaxia. Entretanto, quem se
volta de maneira tão sistemática e alopática contra todos os
sintomas, tentando debelá-los com um arsenal de
medicamentos “anti” alguma coisa, dos antibióticos,
passando pelos antiácidos até chegar aos antidepressivos,
sem sequer saber como funcionam, obviamente não
consegue fazer uma prevenção de fato; afinal, não sabe
como fazê-la nem contra o quê. Para tanto, seria necessário
entender a essência dos sintomas no sentido da medicina
interpretativa, tratada no livro Krankhei als Symbol[22], e
antecipar-se a eles com um comportamento adequado. Por
certo, o diagnóstico precoce é sempre melhor do que o
tardio, mas também é preciso levar em conta a
proporcionalidade dos medicamentos, o que com frequência
é esquecido na medicina acadêmica. De acordo com a
professora e doutora Mühlhauser, no exame do câncer de
mama, é necessário partir do princípio de que, a cada cem
diagnósticos, pelo menos trinta são “superdiagnósticos”, ou
seja, diagnostica-se um câncer que ainda não pode ser
considerado tal ou que, em todo caso, nem de longe é tão
agressivo quanto apresentado por quem examina. Porém,
quando se diagnostica um câncer que jamais daria problema
se não tivesse sido encontrado, realizam-se tratamentos
errôneos, que vão desde operações, passando por
radioterapia e chegam à quimioterapia.
Edmund Lengfelder, professor e doutor em radioterapia,
considera que um a cada dois raios X na Alemanha seja
desnecessário, em especial muitas mamografias. Ele estima
a taxa de mortalidade em decorrência desses exames de 20
mil a 30 mil pessoas por ano – na grande maioria, mulheres.
Supostamente, há mais radiologistas em Berlim do que em
toda a Itália, e todos querem radiografar.
Um exemplo especialmente dramático são os recentes
exames em série, realizados em crianças em idade escolar
para a detecção de tuberculose. Antigamente, milhões de
crianças passaram por raios X, uma radiação inimaginável
nos dias atuais e que só deixou de existir graças a um
estudo sueco. Antes ainda, era costume radiografar, de
modo totalmente desnecessário, os pés das crianças a cada
prova de sapato – e no aeroporto, os viajantes.
No início de suas descobertas, a medicina acadêmica
costuma acreditar na total inofensividade delas e as vende
como tais – um erro fatal, como muitas vezes se constata
mais tarde. Como já dito, isso nada mais significa além do
fato de que os processos e os medicamentos empregados
hoje são aqueles que amanhã serão proibidos. Por isso, no
meu caso particular, falta a confiança de fazer prescrições
alopáticas inescrupulosamente, pois, para tanto, a meia-vida
do conhecimento da medicina acadêmica é curta demais. Se
hoje eu ainda prescrevesse os medicamentos que há trinta
anos receitava mecanicamente nas provas de farmacologia
para ser aprovado, estaria cometendo um crime. Grande
parte deles é proibida ou, pelo menos, está ultrapassada. O
mesmo vale para os procedimentos.
Hoje, felizmente os médicos se recusam a fazer das
operações de apêndice e tonsilas palatinas em crianças uma
rotina. A indescritível moda da histerectomia também
encontrou seu merecido fim. Em oposição a tudo isso, em
mais de duzentos anos, nem um único medicamento de todo
o tesouro homeopático foi proibido.
No campo da “prevenção” do carcinoma cervical (câncer
de colo do útero), há muitos anos é fornecido um quadro
igualmente problemático, que passa a repercutir nas
crianças. Só na Alemanha, 6.500 mulheres adoecem por ano
de carcinoma cervical. Há décadas se transmite insegurança
às mulheres submetidas ao exame de Papanicolaou. Do
ponto de vista da Evidence Based Medicine, a situação se
apresenta da seguinte maneira: para encontrar cerca de 40
mulheres com carcinoma cervical, 600 mil devem ser
regularmente submetidas ao chamado rastreamento.
Infelizmente, em 15 o carcinoma não pode ser encontrado
por meio desse método. Porém, enquanto nas 25 restantes
ele é descoberto, quase 100 mil recebem um diagnóstico de
câncer falso positivo. Essas mulheres, que são rendidas e
influenciadas pelo diagnóstico, submetem-se à cirurgia e à
conização (retirada do óstio em uma operação menor) – com
todos os efeitos colaterais resultantes. Muitas ainda ficam
gratas a seus médicos pela terrível combinação de medo,
operação, radioterapia e tortura química que lhes foi
oferecida, pois simplesmente não enxergam toda a cena.
Quem, como médico, cura um câncer que não existiu pode
até entrar para estatísticas impressionantes, mas falha com
a profissão e degenera-se ao praticar uma “medicínica”.
Mais uma vez, a professora e doutora Mühlhauser
apresenta uma sóbria conclusão: do ponto de vista analítico,
no grupo das mulheres que são regularmente
mamografadas, o rastreamento do câncer de mama não
prolonga a vida, e, na maioria das vezes, os dados que
deveriam justificar o uso da prevenção são enganosos. Como
expressão típica de sua profissão, ela emprega o termo
“prevenção”, quando na verdade refere-se claramente ao
diagnóstico precoce da medicina acadêmica.
Nessa terrível situação, na qual cada vez mais mulheres
recusam esse tipo de “prevenção”, que, na realidade, não
passa de mais um terrível diagnóstico precoce, tirou-se da
cartola a vacina contra o câncer de colo do útero. Por
conseguinte, meninas entre 12 e 18 anos devem submeter-
se a uma vacinação, com a qual não se tem nenhuma
experiência de longo prazo e cujos lados obscuros ninguém é
capaz de expor, como já se queixava, com razão, um
professor vienense de higiene. Entretanto, ninguém lhe deu
ouvidos. Os médicos acadêmicos ficam felizes por poder
substituir uma desgraça por outra, supostamente mais
inofensiva. Contudo, nesse meio-tempo, uma jovem morreu
na Áustria Setentrional depois de ter tomado essa vacina, de
maneira que, pelo menos nessa região, surgiram certo
cuidado e certa reserva entre os colegas médicos e pôde-se
impedir que essa vacina fosse adotada no programa de
vacinação austríaco.
No entanto, no caso do carcinoma cervical, tudo seria
extremamente simples. Em países em que os homens são
circuncidados, essa doença não existe; dela também são
poupadas as freiras. Para o surgimento do carcinoma, é
decisivo que o óstio cervical entre em contato com o
esmegma, substância pastosa e malcheirosa sob o prepúcio
não lavado. Esse esmegma é o único a apresentar o solo
fértil para o papilomavírus, que o câncer põe em
funcionamento e contra o qual se orienta a vacinação.
Entretanto, a solução é extremamente simples. Os homens
deveriam circuncidar-se ou lavar-se com água e sabão antes
do ato sexual. Como a circuncisão apresenta desvantagens,
como a redução da sensibilidade da glande, que ficaria
constantemente exposta ao atrito com a roupa, lavar o local
seria a melhor medida, que não ofereceria nenhum risco e
seria bastante eficaz. Essa higienização só tem vantagens e
nenhuma desvantagem, a não ser aquela de não render
nenhum lucro à indústria nem aos médicos, muito pelo
contrário. De uma campanha de higiene pessoal como essa,
para evitar a contaminação através do esmegma, não se
falou em lugar algum. E por que se falaria? Afinal, ninguém
lucraria nada com ela.
A respeito das campanhas de seus colegas em favor do
exame de “prevenção”, a professora e doutora Mühlhauser
diz: “Eles a superestimam totalmente, mas estão bem
informados ou então têm conflitos de interesse. Se os
médicos fossem mais críticos, o mito da prevenção não
existiria nessa medida”. No entanto, por experiência própria,
posso dizer que os médicos acadêmicos nunca são mal-
intencionados em suas ações; ao contrário, geralmente
chegam a acreditar que elas são boas. Todavia, nesse caso,
vale a frase de Bertolt Brecht, segundo a qual o contrário do
bom não é o ruim, mas o bem-intencionado. Infelizmente,
mesmo as boas intenções podem ter efeitos ruins. Nesse
sentido, quem tem amor por si mesmo e por seus filhos, tem
de permanecer muito crítico.
Para Ellis Huber, médico e ex-presidente do Conselho de
Medicina de Berlim, o excesso de exames de prevenção o faz
pensar em uma espécie de exorcismo moderno. A professora
e doutora Mühlhauser é lapidar: “Muitas coisas em nossa
medicina moderna são vodu”. Nesse sentido, deveríamos
sempre levar em conta que os médicos modernos empregam
instrumentos muito mais perigosos do que os sacerdotes no
vodu das culturas arcaicas. Estes dispõem de penas, cristais
e ervas, enquanto aqueles usam raios X, quimioterapia e
escalpelos para dar ênfase à sua magia.
Também temos de ter claro em mente que, em princípio, a
medicina alopática, apesar dos termos sofisticados e
correntes de “profilaxia” e “prevenção”, não tem condição
de oferecer nenhuma prevenção. Ela só pode oferecer o
diagnóstico precoce, que obviamente é melhor do que o
tardio, mas também apenas quando não emprega nenhum
método perigoso como a mamografia.

5.2 Verdadeira prevenção em vez de diagnóstico


precoce
Diante de todo sofrimento causado por esse modo
exagerado do diagnóstico precoce, com seus respectivos
superdiagnósticos, resta saber como se faz a verdadeira
prevenção. Como é uma prevenção real para merecer esse
nome? Seria uma medicina que enxerga a essência do
câncer e instrui as pessoas a fazer com que as energias que
podem se expressar em forma de câncer encontrem outros
canais e outras válvulas de escape. O câncer aponta para
um problema de crescimento. Quem vive seu potencial de
crescimento em planos mais convenientes do que o físico
acaba praticando uma autêntica profilaxia do câncer. De um
livro como A Doença como Símbolo podem ser extraídos
temas de cada tipo diferente de câncer e dicas para uma
prevenção eficaz.
Obviamente, para uma doença como o câncer, não é
suficiente um livro nem CDs; é preciso recorrer a todos os
meios e, certamente, incluir a medicina acadêmica, a
medicina complementar e a homeopatia para aumentar as
defesas do organismo, bem como a psicoterapia no sentido
da terapia da sombra. No entanto, a prevenção poderia
muito bem começar com um livro como esse e/ou com
meditações induzidas. Quem trilha seu próprio caminho, se
realiza e se desenvolve rumo ao que constitui sua
necessidade interna, tendo consciência de suas
potencialidades, pratica a prevenção mais eficaz contra o
câncer, pois em seu corpo não deverá ocorrer a redução de
nenhum crescimento. Em tal pessoa, o crescimento recebe
espaço suficiente no sentido psíquico e espiritual. Os
processos que requerem espaço e desencadeiam a suspeita
de câncer realizam-se melhor no contexto psíquico e
espiritual. O crescimento seria algo maravilhoso. Políticos de
todas as orientações sonham com ele. Temos “apenas” de
nos preocupar com o nível correto. Desse modo, seria
extremamente importante que as crianças já fossem
educadas nesse sentido.
Em uma próxima etapa, viria a prevenção do câncer de
colo do útero por meio da higiene. Pois já seria suficiente se
os rapazes aprendessem a se lavar uma vez por dia com
sabão depois de recolherem o prepúcio. Entretanto, hoje em
dia os rapazes se veem em uma situação difícil e, em virtude
de sua profunda insegurança, estão no caminho que leva ao
sentido contrário. Em pleno início do século XXI, não ousam
tomar um “banho quente”, pois, para seu grupo de
referência (peergroup), quem toma banho quente é chamado
de “covarde”. Além disso, para o grupo, os rapazes não
devem compreender as mulheres nem seus desejos, pois, se
o fizerem, serão considerados uns “bananas” e perderão
totalmente seu prestígio. No livro A Agressão como
Oportunidade, que também se dedica em pormenores à
problemática da vacinação, um capítulo sobre a socialização
com o homem revela os problemas dos rapazes de hoje
nesse sentido. No momento, não há que se esperar muita
cooperação da parte deles a esse respeito.
Por conseguinte, há que se apostar nas meninas. Toda
adolescente deveria aprender cedo com os pais a minimizar
o risco de câncer de colo do útero sem a vacinação e
exigindo de seu parceiro que se lave bem antes do ato
sexual. De preferência, ela deve mostrar a ele como
proceder, o que já proporcionará prazer. Além disso, em
tempos de Aids e outras doenças sexualmente
transmissíveis, por certo deve-se usar preservativo.
De modo geral, fica claro como é importante desenvolver
cedo a autoconsciência, pois apenas com sua ajuda as
mulheres e as adolescentes conseguirão ousar fazer
perguntas decisivas: “Vamos fazer amor ou câncer?” – “Você
já se lavou hoje?” Obviamente, os pais também poderiam
tentar ensinar desde cedo seus meninos a se lavarem
corretamente.
6 Cefaleias e enxaquecas

6.1 Cefaleias
“O principal, a cabeça, dói.”
 
Quando têm dor de cabeça ou, na maioria das vezes, dor de
barriga, crianças com menos de 6 anos declaram sintomas
que não facilitam o diagnóstico. Somente aos 6 anos as
queixas de dores de cabeça são precisas. Ou, em outras
palavras, os excessos que até os 6 anos dão dor de barriga
causam dor de cabeça em crianças maiores. Até os 6 anos,
tudo afeta a barriga se os pequenos não conseguem digerir
sua própria vida. Em seguida, as coisas sobem mais
rapidamente à cabeça ou até mesmo disparam nela. A
cabeça fica sobrecarregada e causa problemas. Crianças em
idade escolar têm dificuldade para digerir a vida
intelectualmente. Nesse contexto, a semelhança entre as
circunvoluções cerebrais e aquelas do intestino delgado se
destaca: as primeiras digerem o mundo imaterial, as
segundas, o mundo material.
Quase tudo pode causar dor de cabeça. A vida começa a
passar cada vez mais pela cabeça a partir da inscrição na
escola. Até então, a sensação e a percepção estavam em
primeiro plano, mas agora são suplantadas pelo
pensamento. Ficar quebrando a cabeça sem chegar a
nenhuma solução é uma ocupação típica do período que
antecede a puberdade e ao longo dela. O que prejudica
alguém pode mostrar-se na cabeça e junto a ela, que agora
se tornou decididamente a principal parte do corpo, como
antes era a barriga. Do ponto de vista primário, crianças são
“seres ventrais”, e, em todos os aspectos, o ventre, que
pertence ao princípio da Lua, encontra-se no centro,
enquanto a cabeça segue, antes, princípios como Mercúrio
ou Marte e, a partir do período escolar, assume os papéis de
liderança para não abandoná-los mais ao longo da vida. A
cabeça se torna a capital do país que é o corpo e defende
essa posição obstinadamente contra o coração e o ventre,
que, em geral, com sua sensação de ventre e de Lua, já não
recebe nenhuma oportunidade, com exceção de uma
eventual gravidez em um período posterior. Com o coração,
que está submetido ao princípio do Sol, a cabeça ainda tem
problemas na fase do enamoramento e, sobretudo, naquela
do amor, mas, em geral, em tempos modernos, a cabeça
(intelectualmente) fria também tem a primazia sobre um
coração quente ou a reconquista com rapidez.
Expressões como “manter a cabeça erguida”, “ser cabeça-
dura”, “quebrar a cabeça”, “dar tratos à bola” ou “espremer
a cabeça” evidenciam o quanto essa parte do corpo está no
centro de esforços agressivos, que sempre sobrecarregam o
indivíduo. Expressões como “cabeças vão rolar”, “estar sem
cabeça”, ou também “meter uma coisa na cabeça”, “tirar
uma ideia da cabeça”, “enfiar a cabeça na areia” ou
simplesmente “estar com a espada na cabeça” mostram os
perigos que a cabeça vive em tempos em que dela tanto se
exige.
Se tudo passa por essa parte do corpo e a criança precisa
constantemente “oferecer a própria cabeça em sacrifício”,
“tomando na cabeça” a cada ocasião, pode acontecer de a
cabeça sofrer todo tipo de dor que se pode imaginar. É de
“arrancar os cabelos”.
Com tudo isso, não se pode absolutamente “deixá-la na
mão”. Ao contrário, deve-se sempre levar em conta o lema:
“Cabeça erguida!” Se não houver alternativa, vale embelezar
um pouco, como no exemplo: “Cabeça erguida, mesmo que
o pescoço esteja um horror” – ou seja, mesmo que a base
não seja sólida, a cabeça deve permanecer erguida. Isso
pode ser difícil, mas é o mais certo a fazer.
Felizmente, também se pode “perder” a cabeça por amor
ou, o que é lamentável, arriscar o próprio pescoço por
alguma coisa que se diz em juízo. Seja como for, a cabeça
vive perigosa e marcialmente de acordo com seu princípio
primordial. Nesse sentido, não é de admirar que ela tenda a
ter dores que, de igual modo, pertencem ao princípio de
agressividade.
Atualmente, toda criança quer e precisa ter uma cabeça
esclarecida, ou seja, não pode ter ideias tolas nem
mirabolantes, mas também não pode ser cabeça-dura nem
cabeça-oca. Ao contrário, tem de afirmar-se e, se possível,
impor sua vontade.
Quando a nova fase da vida e as novas liberdades a ela
relacionadas sobem à cabeça das crianças, elas podem se
tornar bastante maduras, arrogantes, presunçosas,
superiores e, atualmente, até megalomaníacas, sobretudo
quando estão sob pressão. Nesse caso, parecem “não estar
com a cabeça no lugar” ou “não ser muito boas da cabeça”.
Na adolescência, os jovens quebram a cabeça, sem
sucesso, para dominar questões emocionais e sentimentais.
Nessa fase, não sabem “onde estão com a cabeça” e tudo
lhes parece “sem pé nem cabeça”; só “têm uma coisa na
cabeça” e sempre querem “virar a cabeça de alguém”. Em
pouco tempo, tudo parece ser questão de vida ou morte e
até custar a própria vida. Sua mente vibra de ideias e
pensamentos que não encontram o caminho para a
realidade, mas nem por isso lhes “saem da cabeça”. Uma
cabeça tão pesada de preocupações pode culminar em
um(a) “cabeça-dura”, que relega o coração ao segundo
plano, driblando-o, superando-o e fazendo com que o polo
material da vida, que é o corpo, não seja levado em conta,
para que a cabeça possa permanecer no alto, o que também
repercute na situação social alterada.
Se a vida na infância foi dominada pelas brincadeiras, a
inversão de polaridade, em que a cabeça passa a ser o
centro, começa a se desenvolver com o ingresso na escola.
Geralmente, ela se completa aos 10 anos. Os programas de
ensino de nossas escolas refletem esse deslocamento para a
cabeça e sua sobrecarga de maneira dramática. Oitenta por
cento das aulas destinam-se à cabeça e ao intelecto. Para o
programa, duas horas de ginástica têm como que o efeito de
inimigas do corpo.
Não obstante, nesse período favorável à cabeça, mas que
ao mesmo tempo a sobrecarrega, é difícil “manter a cabeça
fria e esclarecida”, pois ela será cobrada sem piedade.
Diante de todas essas circunstâncias, muitas vezes o ego
alcança precocemente seu melhor desempenho e começa a
proteger sua posição. “Hoje, mais do que nunca, uma cabeça
brilhante é bastante requisitada”, mas “o sucesso também
pode subir à cabeça”.
Quando os primeiros impulsos de pensamento deparam
com um obstáculo que impede sua concreta realização,
obrigando o indivíduo a quebrar a cabeça; quando as
pessoas querem impor sua vontade, seguindo o lema
“querer é poder”, e a cabeça se torna um aríete para a
imposição impiedosa do ego, a fim de que tudo corra de
acordo com a própria vontade, as dores de cabeça
originadas pela tensão ameaçam se manifestar já na
infância. Quando os impulsos (do pensamento) permanecem
presos na cabeça, vive-se forçosamente nela o que pertence
a outro lugar. Nesses “cabeças-duras”, que se
superestimam, “metem coisas na cabeça” que os
sobrecarregam, uma forte força de vontade, aliada a uma
excessiva reivindicação de poder, leva à dor de cabeça no
sentido de uma advertência de que eles estão no caminho
errado com um pensamento errado. Não é nada fácil “tirar a
cabeça dessa corda que eles mesmos fabricaram” e “salvá-
la”. Se crianças já “quebram constantemente a cabeça”,
obviamente terão cefaleia. Do mesmo modo, um cérebro em
contínuo esforço também é passível de dor e conduz à
respectiva “cabeça pesada”.
6.1.1 A corrida cabeça com cabeça

A sobrecarga devida à forte pressão para o desempenho,


bem como a ambição forçada e introduzida cada vez mais
cedo pelos pais e pelo ambiente, que sempre converge na
ideia de carreira a ela relacionada, pode bastar como causa.
Se a isso ainda se acrescentar uma exigência pessoal de
perfeição, e as possibilidades de ascensão e de carreira
forem ruins, a situação se torna crítica. Por si só, o esforço
cada vez maior e as exigências não cumpridas costumam
desembocar diretamente em problemas maciços de cefaleia
já nos anos da infância.
Na predominante “corrida cabeça com cabeça”, que a
criança precisa ou, no pior dos casos, até quer ganhar pelo
menos “por uma cabeça de diferença”, muitos se arriscam. E
“o que a criança não tem na cabeça precisa ter nas pernas”.
Desse modo, às vezes, esportes competitivos na infância
transformam-se em um eldorado para pais ambiciosos e em
cefaleia para crianças sobrecarregadas. Nesse caso, muitas
vezes não é o uso precoce de drogas, e sim a pressão
semelhante às drogas e exercida de todos os lados que leva
às dores. A pequena e graciosa ginasta ou a princesa da
patinação no gelo quer vencer por vontade própria ou tem
de alcançar a vitória para a mãe e o pai. Se não conseguir, a
pressão aumentará; se conseguir, o sucesso poderá subir-lhe
à cabeça.
Muitas vezes, em condições sociais piores, a pressão pelo
desempenho por parte dos pais, da escola, da igreja ou de
instituições estatais é ainda maior. Segundo o lema “cada
vez mais do mesmo”, cursos intensivos extras são oferecidos
para aumentar as chances individuais e contornar a miséria
coletiva. Justamente nessas situações podem se desenvolver
com mais facilidade tensões com os professores e outros
alunos que podem chegar ao mobbing. Continuar quebrando
a cabeça não trará nenhuma solução; ao contrário, exercerá
uma pressão ainda maior sobre o centro de interesse.
Situações em que a pressão é alta ou excessiva resultam
de uma ênfase do polo masculino e superior já nos pequenos
“trabalhadores intelectuais”, que muito cedo “não podem
mais ter cabeça de criança”. Com toda essa cefaleia
resultante do excesso de pressão, a tarefa estaria em
aprender a confiar nos primeiros impulsos e trabalhar no
nível do coração, do ventre ou dos músculos aquilo que não
cabe ao nível da cabeça. Uma disposição mais favorável ao
corpo e um campo correspondente seriam muito úteis nesse
sentido. De resto, trata-se de encontrar soluções em vez de
sempre quebrar a cabeça. Especialmente importante é
transmitir à criança a consciência de que ela nos dá alegria
quando consegue alguma coisa, mas que sempre iremos
amá-la, independentemente de como ela se comportar ou de
ser bem-sucedida ou não em determinado momento.
Se a criança já tiver condições, seria bom fazer com que
ela se conscientizasse da própria superestima e sentisse a
pressão sob a qual se encontra. “Coroa não é remédio para a
dor de cabeça.” Quando os jovens aprendem a encarar o ego
em seus limites e desejos restritos e reconhecem que o
pensamento “cada vez mais do mesmo” não traz boas
soluções, podem poupar-se de muitas visitas a becos sem
saída. Nesse caso, a cefaleia pode ajudar e fornecer as
primeiras indicações.
Se as crianças aprendessem a estimar seu eu em vez de
cultivarem a superestima de si mesmas no sentido de
enfatizarem o ego, poderiam evitar a unilateralidade da vida
moderna introduzindo precocemente o polo feminino em sua
existência. Quem se liberta espontaneamente da pobreza de
espírito do “eu quero”, da ambição, da teimosia e da
obstinação, poupa-se da sensação de limitação na testa e na
cabeça. Inicialmente, limitação produz medo e, com o
tempo, também dores (de cabeça). O melhor seria
concentrar-se a tempo em suas raízes na forma dos pés, mas
também de todo o corpo, a fim de aliviar a cabeça. Quem
desenvolve fantasias e pensamentos leves de brincadeira e
dá os primeiros passos corajosos em novos relatos, tomando
decisões ao desembainhar, em sentido figurado, a espada
(sua língua) e impor-se com sua fala e seus argumentos,
consegue aliviar a cabeça e liberar as tensões.
Quando a própria agressividade predomina no pensamento
e na fala e há estratégias de imposição disponíveis, o polo
contrário também pode ajudar sob a forma de uma atitude
solta e espontânea, que permite fazer as coisas
conscientemente com facilidade e, do mesmo modo, obter
soluções intuitivas. Nesse caso, um jovem que tenha se
desfeito de um pesado lastro de vontade também pode
caminhar com as próprias pernas e de cabeça erguida.
Assim, já nos primeiros anos de vida, é possível obter uma
harmonia agradável entre as exigências da cabeça, do
coração e do ventre, que permitisse uma afirmação em
cenários não intelectuais, a fim de que o indivíduo pudesse
avançar na vida com a mente livre.
6.1.2 O local do acontecimento (da dor)

Há ainda que se mencionar algumas diferenças quanto à


localização das dores de cabeça, das quais resultam campos
específicos de tarefas: a típica dor frontal, que parte do lobo
frontal do cérebro, no qual se aloja nosso raciocínio, leva-nos
a confrontar a vida real, a fazer frente aos problemas e nos
posicionarmos diante deles, a não apenas “refletir” e viver
mentalmente. Isso se mostra especialmente quando a dor
piora com a reflexão e o estudo. A testa enrugada de uma
pessoa obstinada revela a tensão e o esforço de uma atitude
que, a longo prazo, irá provocar sofrimento. Se a dor
melhorar com a reflexão, isso indica que se deve refletir
novamente e ir a fundo nas coisas. Desse modo, a testa se
torna a tela para o tipo de pensamento.
Quando a dor ocorre nas duas têmporas, a cabeça se
sente como se estivesse em um torno. As pessoas afetadas
sentem-se literalmente no aperto, muitas vezes não sabem o
que fazer, pois não conseguem ir para a frente nem para
trás e perdem totalmente a esperança. Nesse caso, o melhor
a fazer é procurar não se mexer e esperar, em vez de
combater a dor.
Cefaleias latejantes indicam que a vida real está batendo à
porta, lembrando um conflito e uma luta a ser travada, que
deveria corresponder ao ritmo do próprio coração.
Dores occipitais partem daquela área do cérebro, o
chamado cerebelo, que se ocupa do equilíbrio na vida. Quem
“tem alguma coisa em mente” ou cultiva segundas
intenções irá registrá-las para jogar na cara de alguém mais
tarde. Problemas que não foram resolvidos e contas em
aberto, que devem ser quitadas, podem gerar atenção.
Portanto, é aconselhável dar espaço e reconhecimento para
questões mal resolvidas e ir buscar as coisas no fundo da
consciência.
A dor no centro do crânio indica que a pressão vem de
cima. Pessoas acometidas por essa dor sentem-se oprimidas
e sempre prontas para “receber um duro golpe”. Nesse tipo
de situação, já não se espera nenhuma inspiração vinda de
cima; ao contrário, as pessoas afetadas por essa dor
geralmente ficam bloqueadas para cima e não querem
deixar que nada entre. A tarefa seria deixar-se influenciar
conscientemente pelo que vem de cima, aceitar
abertamente inspirações superiores e até enfatizá-las na
própria vida.
Ao contrário das situações descritas até agora, todas
desencadeadas por alta pressão, uma circulação sanguínea
deficiente e situações de baixa pressão também podem
predispor à dor de cabeça. A sensação de “ser tapado” é um
exemplo disso e leva a um raciocínio vago e a uma visão
deficiente. Geralmente, os jovens acometidos tendem a se
enganar, conforme indica a tontura comumente associada a
esse distúrbio. Ainda não têm o controle da situação, fato
que pode ser causado por um crescimento acelerado e pela
insegurança física e psíquica que o acompanha.
A pressão psíquica também pode desencadear dor de
cabeça, por exemplo, quando a preocupação estressante
pesa sobre as crianças ou quando elas temem pela própria
família. Aparentemente, a solução estaria em controlar a
preocupação e em poder “deitar a cabeça no ombro de
alguém”. “Chorar como um bezerro desmamado” e a própria
dor de cabeça são sempre melhores do que “estourar os
próprios miolos”.
No entanto, dores de cabeça também podem ser sinal de
anemia. O oxigênio não chega em quantidade suficiente ao
cérebro, tal como quando nos levantamos muito
rapidamente. Contudo, nesse caso, a razão estaria no
sangue “muito fino”. A seiva vital não contém portadores
suficientes de energia. Seria útil aqui não exigir demais de si
mesmo e, em muitas ocasiões, colocar os pés para cima.
Especialmente à noite, isso proporciona uma espécie de
transfusão de sangue, que melhora sensivelmente o sono e
aumenta o abastecimento de energia da central. Falta de
sono e, de maneira geral, uma regeneração e um
reconhecimento deficitários do polo feminino da realidade
podem terminar em cefaleia.
Pouca ingestão de líquido leva à falta do elemento anímico
água e, por conseguinte, à incapacidade do corpo de liberar-
se das substâncias não absorvidas e das toxinas. Bebidas
indevidas, como aquelas com altas doses de água açucarada
em forma de horríveis refrigerantes podem agravar o
problema. Essas dores de cabeça seguem o mesmo caminho
daquelas nos primeiros dias de jejum. Para uma
desintoxicação, o organismo precisa de muita água como
solvente.
Nesse sentido, uma alimentação inadequada, com
alimentos desnaturados, também contribui para o
surgimento de cefaleia. Assim, por um lado, sobrevêm
substâncias nocivas e toxinas; por outro, o organismo recebe
poucas vitaminas e poucos minerais importantes para poder
criar uma base saudável para a vida.
Quando se fala em inundação por ondas em ambientes
contaminados por redes de internet sem fio, trata-se de
outro tipo de cefaleia por desintoxicação. A essas ondas,
muitos adultos, especialmente as mulheres, reagem com
distúrbios do sono e dores de cabeça. Em geral, crianças e
jovens são igualmente sensíveis. Assim, o excesso de
estímulos através do barulho, da luz, dos meios de
comunicação de massa, do computador, da televisão, do
cinema, do celular e da “agenda das crianças” também
contribui para o problema da cefaleia crescente. Por um
lado, a base da existência se enfraquece; por outro, esses
estímulos também agem como um excesso de exigências.
Nos jovens, as dores de cabeça também surgem devido a
distúrbios não corrigidos da visão, muitas vezes como um
primeiro sinal da necessidade do uso de óculos. Quem já não
consegue reconhecer o mundo claramente pode e tenta
resolver o dilema da visão imprecisa concentrando-se com
mais obstinação, exercendo uma pressão sobre si mesmo e,
não raro, sentindo os efeitos com uma revolta em sua
central. Problemas nas costas e defeitos de postura também
podem causar cefaleia e sempre devem ser esclarecidos.
Um nariz cronicamente entupido e, por conseguinte, cheio
de muco, com uma constipação psíquica em segundo plano,
pode associar-se fisicamente a uma sinusite crônica,
deixando a cabeça “pesada”. As cavidades da face devem
estar sempre desobstruídas, para que a cabeça possa se
sentir, por um lado, livre e, por outro, leve. Se estiverem
repletas de líquido, a cefaleia se instalará.
Nos alérgicos, muitas vezes as dores de cabeça são
desencadeadas pelos respectivos alimentos que o corpo
rejeita. Sensibilidade à histamina, ou seja, a substância que,
com muitas outras, provoca o prurido nas alergias, também
é capaz de sitiar a cabeça com dores. A maior parte das
dicas alopáticas tem por objetivo eliminar rapidamente a dor
de cabeça provocada pela tensão. Do ponto de vista
homeopático, também é importante pensar que essas
energias de tensão querem e devem se descarregar, bem
como lutar para resolver o problema de base.
 
Perguntas para os pais:

Como nosso filho pode assimilar melhor e de
maneira mais relaxada as impressões
intelectuais?

O que lhe acontece quando ele quebra a cabeça?

O que não tem solução para ele? Como ele pode
lidar construtivamente com seus problemas?

Quando ele se sente sob pressão?

Em que situações ele teima com alguma coisa?
Como posso ajudá-lo a julgar quando ele deve se
impor ou quando é melhor ceder?

Como está nossa própria autoafirmação?
 
Medidas de apoio:

Postura relaxada: muitas vezes, as crianças
desenvolvem, de maneira totalmente intuitiva,
uma postura adequada ao relaxamento quando
estão sentadas ou deitadas, exercendo leve
pressão com as mãos nos respectivos locais
doloridos da cabeça. Se não o fizerem por si
mesmas, podem ser incentivadas a fazê-lo.

Água fria: comprovou-se eficaz segurar um cano
de água fria com água corrente, imaginando que
a dor passe para a água.

Exercícios de relaxamento: a dor de cabeça
resultante de tensão desaparece rapidamente
com o relaxamento. Nesse sentido, consideram-
se todas as técnicas de relaxamento que forem
adequadas às crianças.

Fitoterapia: o solidéu (Scutellaria lateriflora) tem
efeito relaxante e antiespasmódico, além de
fortalecer o sistema nervoso central. É
recomendável misturá-lo à melissa. A betônica
(Stachys officinalis) tem efeito calmante em
situações de medo e preocupação, além de
estimular a circulação no cérebro. É possível
misturá-la a outros tranquilizantes, como a
lavanda, a erva-de-são-joão e a verbena.

6.2 Enxaqueca
“Tenho de ser perfeito.”
 
A enxaqueca sempre foi um sintoma de adultos; porém,
como muitas outras dores, agora irrompe cada vez mais
cedo na vida. Como muitos colegas, o médico homeopata
Friedrich Graf acha que a razão é gerada por nós mesmos, e
diz: “As anamneses de pacientes jovens que sofrem de dor
de cabeça sempre mostram o início de uma autêntica
enxaqueca após revacinações no início da puberdade”. Em
grande parte, o problema das vacinações reside na
supressão de impulsos vitais.
Muitas vezes, crianças com enxaqueca estão submetidas a
uma exigência manifestamente alta em relação si próprias e,
por essa razão, têm uma imagem perfeccionista de si
mesmas. Com frequência, as exigências dos pais também
vão de altas a muito altas. Quando não há uma
transformação das próprias exigências ou das alheias, pode
surgir o medo de errar, que faz com que as crianças se
torturem em grande medida para cumpri-las.
A enxaqueca também parece surgir com mais frequência
em crianças que não se sentem amadas ou que obedecem
ao lema “(só) serei amado se trouxer notas boas para casa”.
De fato, “amor (apenas) em troca de desempenho” parece
ser um conceito que adoece.
Nas pessoas acometidas, também se nota uma grande
sensibilidade em relação aos estímulos externos. Luz,
barulho, contato e toda forma de (excesso de) estímulos são
pouco tolerados. A criança se fecha totalmente e procede
segundo o lema “não me toque”. A cabeça, que abriga todos
os sentidos, é sensorialmente vedada – a criança não quer
ver, ouvir, cheirar nem sentir o gosto de nada. O apetite
desaparece, os odores provocam náusea, sentir e ser tocado
são tabus. As aberturas do corpo são vedadas como se
fossem anteparas. O enjoo e o vômito mostram que a pessoa
acometida está “insuportável”. Nada consegue digerir nem
ingerir; ao contrário, tudo faz força para sair.
O distúrbio de visão conhecido como escotoma cintilante
(ponto cego), que costuma acompanhar a enxaqueca e com
o qual se anunciavam as enxaquecas desenfreadas, ou
melhor, as visões de Hildegard von Bingen, indica que a
pessoa acometida já não consegue enxergar nem controlar
sua vida normal nesse momento. A visão exterior lhe é
tirada, e a atenção é desviada para uma luz interior
imaginária. De fato, veem uma luz, mas no plano errado. A
luz do conhecimento seria tarefa de uma luz interior, que
ilumina a vida e poderia desencadear sensações totalmente
diferentes, ou seja, sensações extáticas, segundo o lema:
“Quando já não se consegue enxergar, sentir não é nenhuma
vergonha”. A enxaqueca, que nos adultos costuma imitar um
orgasmo, só que no plano inábil da cabeça, dirigiria a
atenção para dentro, razão pela qual todos os estímulos
externos precisam ser evitados e o corpo entra em
imobilismo. Assim, assimila o alívio e a regeneração de que
precisa. Na infância ou, em todo caso, na puberdade, a
enxaqueca seria uma indicação dramática para que se
integrem aspectos extáticos e prazerosos à vida e se dê
menos importância ao tema do desempenho.
 
Perguntas para os pais:

Como nosso filho pode aprender a confiar em
voos do pensamento ou da imaginação?

Como integrar à vida sentimentos e experiências
extáticos?
 
Medidas de apoio:

Evitar ou, pelo menos, reduzir o excesso de
estímulo, a pressão pelo desempenho e a
alimentação errada.

Chás que promovem o metabolismo do ferro:
rosa-canina, urtiga.

Tomar bastante líquido.

Usar fontes externas de calor ou frio,
dependendo das necessidades da criança.

Fazer com que a criança durma o suficiente.

Fazer com que a criança se movimente o
suficiente ao ar fresco.

Fitoterapia: aos primeiros sintomas, massagear
as têmporas com óleo de lavanda (dez gotas de
óleo de lavanda com 25 mililitros de óleo
neutro).
7 Doenças oculares e distúrbios da visão

7.1 Conjuntivite
“Já não consigo abrir os olhos!”
 
A conjuntivite é comum em crianças, o que não nos
surpreende, pois, até 1986, a vida sempre começava com
uma conjuntivite prescrita por lei que, com o nome de
“profilaxia de Credé”, era um direito civil de todo novo
cidadão alemão. Para evitar uma infecção dos olhos da
criança ao passar pela vagina, caso a mãe sofresse de
gonorreia, por lei os olhos do recém-nascido eram corroídos
com uma solução contendo de 1 a 2% de nitrato de prata. O
nitrato de prata é a pedra-infernal. Nos olhos, esse
medicamento realmente arde como o inferno. Como tudo já
se encontra no início, segundo a concepção da filosofia
hermética, com essa primeira conjuntivite programada se
criou um campo para esse quadro clínico. Seja como for,
todos aqueles que, no momento da impressão deste livro,
tinham mais de 23 anos iniciaram sua vida com um conflito
pela visão de mundo, ou seja, com uma conjuntivite.
A saudação infernal neste mundo por meio do batismo
com o nitrato de prata chega a ser (mito)lógica; afinal, Cristo
designa o diabo como o senhor deste mundo. Com “sua
substância”, as crianças são recebidas sentindo dores. O que
originariamente parecia fazer sentido, do ponto de vista
médico já era irrelevante há muito tempo. Com gotas de
antibiótico, teria sido possível obter o mesmo efeito sem dor.
Um teste prévio de gonorreia na mãe, e todo esse teatro
teria sido banido do mundo.
Entretanto, os médicos acadêmicos preferiam partir do
princípio de que os recém-nascidos não têm muita
sensibilidade. Seria porque eles próprios não têm
sensibilidade? Hoje, continuam partindo do princípio de que
o feto no ventre materno nada sente, ainda que
ginecologistas ingleses tenham exigido há duas décadas a
anestesia para embriões antes do aborto. Porém, mesmo
seguindo esse tipo de conhecimento, não se poderia
simplesmente continuar a proceder como até agora, sem
nenhuma crítica. Por isso, até hoje e enquanto for possível,
essas vozes serão reprimidas. Esta é uma das principais
razões pelas quais os médicos acadêmicos se queixam tanto
da migração em massa de pacientes para os chamados
charlatães sem estudo que, no entanto, costumam dispor de
mais sensibilidade, compreensão e tempo.
A maioria das crianças reagia de modo espontâneo e
assustado, fechando as pálpebras para as boas-vindas
“infernais” e, posteriormente, sofrendo uma inflamação nos
olhos e nas pálpebras. Primeiro, devido à dor infernal,
perdiam a vontade de ver este mundo; em seguida, surgia
um conflito para reabrir os olhos.
Tanto na primeira quanto em todas as conjuntivites
subsequentes, os sintomas são marcados por ardência nos
olhos, lacrimejamento e vermelhidão visível no branco dos
olhos. Com frequência, as pálpebras também incham e se
grudam devido à formação de pus, de maneira que, às
vezes, crianças pequenas não conseguem abri-las.
Do ponto de vista simbólico, os olhos grudados e sensíveis
à luz têm um significado extremamente claro. De fato, como
espelhos e janelas da alma, responsáveis pela visão e pela
compreensão, na conjuntivite são completamente privados
de sua tarefa. As pessoas acometidas já não querem ver
nem olhar. Fecham os olhos para o mundo e retiram-se atrás
de suas persianas. A sensibilidade à luz indica que não
querem ver a claridade nem deixá-la entrar. Assim, limitam-
se à escuridão em seu interior, atrás de cortinas que cobrem
as janelas da alma. Os olhos já não irradiam nada nem
querem permitir que a alma seja vista. Simplesmente se
fecham e interrompem a comunicação em ambas as
direções. “Fechado por conflito!”
Nessa circunstância, também é possível reconhecer logo a
tarefa de vedar-se para o que vem de fora e dedicar-se aos
próprios interesses, ou seja, àquela área que, quando
adultos, chamamos de “sombras”. Nas crianças, trata-se,
antes, de preocupações e medos ocultos.
Tive uma luz a respeito dessa doença depois de observar,
em um seminário, nove dentre oitenta participantes
desenvolverem conjuntivite ao mesmo tempo. A razão não
foi a contaminação através do agente patogênico. As
pessoas acometidas se fechavam inconscientemente para o
tema a ser tratado, oferecendo, assim, um solo fértil para a
doença e para seus agentes patogênicos.
Trata-se de um conflito altamente infeccioso, que afeta a
visão e o modo de lidar com o mundo; um conflito também
entre olhar e desviar o olhar. Quem costuma fechar os olhos
para discussões e, assim, não encarar o conflito, e busca sua
salvação (ou desgraça) bancando o avestruz e enfiando a
cabeça na areia precisa contar com o fato de que o
organismo, versado em honestidade, escolhe representar o
problema através de uma conjuntivite.
Nos adultos e, às vezes, também nas crianças, a
conjuntivite costuma incorporar uma tensão tão
inconfessada quanto insuportável entre as próprias opiniões
e a visão de mundo alheia; uma tensão que se inflama nos
olhos e fica claramente escrita no rosto de quem por ela é
acometido. Nas crianças, muitas vezes essa circunstância
ainda esconde pouca confiança na visão própria das coisas.
Conflitos sobre a visão de mundo logo se espalham, ou
melhor, são facilmente contagiosos. As crianças não podem
ir ao jardim de infância devido ao risco de contaminação. A
medicina acadêmica emprega antibióticos, a fim de ajudar o
organismo em seus esforços de guerra.
A tarefa que “salta aos olhos” é a de fazer com que os
olhos exteriores repousem, sejam poupados e não fiquem
simplesmente olhando tudo que há para ser visto no mundo.
Enquanto isso, deve-se abrir mais os olhos interiores,
tornando-os mais corajosos e até aptos ao conflito. Nesse
período em que as janelas exteriores da alma permanecem
fechadas, os sentidos também podem aguçar-se.
Em sentido figurado, trata-se de revelar com coragem as
estratégias infantis e até pueris segundo o lema “se não o
vejo, você não me vê” ou justamente o “comportamento do
avestruz”, contemplá-las e, por fim, praticar uma observação
corajosa e uma confrontação incisiva. Uma vez que, como
pais, temos poucas possibilidades de ensinar a crianças
pequenas esse posicionamento e essa disposição ao
confronto de maneira pedagógica, resta, sobretudo, a opção
de nós mesmos encararmos os fatos com coragem, o que
nunca faz mal e acaba transmitindo nossa ação por
ressonância às crianças. Quem olha de frente para a vida
interior da própria alma com seus conflitos ardentes e nela
toma conhecimento dos próprios padrões evita a
conjuntivite. Contudo, ao fazer isso, terá de encontrar tanto
seus lados iluminados quanto aqueles sombrios, o que
também é difícil para as crianças. É preciso ter uma coragem
especial para lutar contra o hábito de desviar o olhar ou não
ver, até de maneira consciente, e, em vez disso, posicionar-
se ofensivamente perante as imagens e os conflitos.
 
Perguntas para os pais:

O que nosso filho já não quer ver? O que ele não
consegue discernir?

Podemos ajudá-lo a lidar de modo consciente
com os conflitos?

Neste momento, qual o nosso problema?

O que nosso filho está querendo esconder de nós
e do mundo? Devemos respeitar esse segredo ou
observá-lo para ajudar?

Diante de qual conflito (não vivido) ele fecha os
olhos?
 
Medidas de apoio:

Proteção contra estímulos externos, como luz,
sol, frio, ar empoeirado, corrente de ar,
computador e televisão.

Escurecer os cômodos.

Fazer usar óculos escuros.

Melhor ler ou contar histórias do que deixar ver
televisão.

Tratamento homeopático (uso externo): colírio
Euphrasia, da Wala: pingar uma gota, de uma a
duas vezes ao dia, no saco conjuntival superior e
inferior; se necessário, aumentar a frequência
para três a cinco vezes ao dia.

Fitoterapia (uso externo): deixar esfriar dois
saquinhos de chá-preto depois da infusão e
colocá-los sobre os olhos fechados por 15
minutos.
Para lactentes: usar o efeito antisséptico do leite
materno pingando-o com um conta-gotas comprado
em farmácia no olho afetado.

Uso interno: chá de eufrásia (Herba Euphrasia):
verter uma xícara de água quente em meia
colher (de chá) desse chá, deixar em infusão por
dez minutos, coar e fazer beber três xícaras ao
longo do dia.

7.2 Terçol
“Não consigo enxergar direito.”
 
A primeira sensação é apenas a de ter areia nos olhos, um
grão de areia que incomoda e é desagradável – quase como
o grão de areia no molusco que, com dor, gera uma pérola.
O grão de areia é algo que não pertence àquele lugar, coloca
a pessoa acometida sob pressão, provoca-a, tende a
deslocar sua visão e a estimular um conflito inflamado, que
força uma explosão para fora. O que isso exprime? Afinal,
todo movimento ocular causa dor e evidencia um conflito
pelo olhar e não olhar. Sem nenhuma dúvida, uma questão
relativa à alma enrijeceu-se ao redor dos olhos. Estes
representam, ao mesmo tempo, o espelho e a janela da alma
e, naturalmente, também remetem à perspectiva, ao
discernimento e à introspecção. A inflamação na borda da
pálpebra leva a um enrijecimento isolado, que inicialmente
cresce até formar o terçol e passa a ser sentido como
enrijecimento e corpo estranho na totalidade da região
branca do olho. Por trás do grão esconde-se o germe de um
conflito junto ao portão de entrada e saída da alma. Além
disso, o olho também é parte do cérebro, a única parte que
conseguimos ver. Nesse sentido, o terçol desloca o olhar
para dentro da alma e do cérebro como central de nosso
modo de agir. Ele mostra um conflito de mediação entre a
alma e a central, por um lado, e o mundo exterior, por outro.
As pessoas acometidas não querem ser vistas em sua alma
nem em sua central. Quando o terçol se desenvolve, logo
todo o olho fica irritado. Entretanto, o conflito tem
claramente seu ponto central e de partida no enrijecimento,
o chamado grão.
Somente a imobilidade do olho traz algum alívio. De
preferência, a criança deve manter o olho fechado. Por
conseguinte, a tarefa reside na introspecção. Especialmente
de manhã cedo isso se torna evidente quando ela sente
dificuldade para abrir o olho, pois as pálpebras estão
realmente grudadas. Portanto, algo nas pessoas acometidas
não quer abrir os olhos, mas continuar a dormir e sonhar.
Essas pessoas colam as pálpebras de um olho para não ver
nem ter de enxergar em ocasiões que as colocam em
situações de conflito. Por outro lado, às vezes também se
trata de desviar o olhar e não reparar em coisas que não
interessam, ou seja, trata-se de “fechar um olho” para algo.
Com frequência, isso se refere a crianças que são muito
curiosas e metem o nariz em tudo, mesmo em questões
alheias que (ainda) não lhes fazem bem.
Por outro lado, a inflamação indica que, no fundo, também
se trata de se inquietar e ousar o conflito, a fim de usar o
“olho ardente” em interesse próprio. Os pequenos conflitos
na borda da pálpebra, à margem da área de percepção,
reproduzem o acontecimento psíquico com muita precisão e
revelam certa agressividade no olhar, que às vezes causa o
efeito quase de um olhar malvado.
A região bastante delimitada da inflamação aponta para
uma “mancha cega” bem definida, que antes não era
notada, uma barreira, que a criança não abrange com o
olhar. Mas o terçol também poderia representar um conflito
enclausurado que ameaça explodir. Por conseguinte, o
inchaço das inflamações seria uma fortificação que tira algo
do olhar. Nesse caso, seria conveniente que o medicamento
homeopático Staphisagria, muitas vezes útil, fosse usado
como uma espécie de “armamento” que auxilia nas
agressões reprimidas atrás da muralha.
No nível corporal, o conflito encontra alívio quando o grão,
o nó ou o germe do conflito irrompe e o pus, ou melhor, a
sucata de guerra pode ser descarregada para fora.
Obviamente, essas descargas em sentido figurado também
se dariam no sentido da solução psíquica.
A pálpebra superior representa simbolicamente o fecho do
olho, e a inferior torna o conflito bastante visível. O olho
esquerdo evidencia o polo feminino e a visão feminina de
mundo; o direito, o masculino. Assim, por exemplo, temas
relacionados às imagens anímicas encontram expressão no
olho esquerdo, e aqueles ligados à razão, mais no olho
direito.
A Staphisagria, medicamento homeopático mais
importante para esse sintoma, pode contribuir para
compreendermos a situação fundamental de aspectos
subsequentes. É indicada para crianças que abrem
precocemente os olhos e captam temas que ainda não são
adequados para sua idade. Muitas vezes, trata-se de
crianças mortificadas e humilhadas, que tiveram de passar
por experiências horríveis e até por abusos nas mais
diversas formas, a fim de preservar a harmonia em família
ou apaziguar conflitos. Tendem a emudecer e a aprisionar
agressividade dentro de si. Essa agressividade vem
isoladamente à tona por intermédio do terçol, lembrando o
germe do conflito que sobrecarrega a alma da criança. Com
frequência, o terçol mostra que agora o “ponto crucial” foi
alcançado e a criança precisa de uma conversa “de adulto”,
a fim de ampliar sua visão de mundo. Quem põe de lado
suas próprias necessidades pelo bem comum reprime
facilmente conflitos, que, mais tarde, recrudescem como
pequenas guerras circunscritas quando se trata da visão de
mundo da criança. Apenas isoladamente a criança consegue
ousar expressar as questões reprimidas; já o todo, ela nunca
consegue questionar.
 
Perguntas para os pais:

O que nosso filho já não consegue ou já não quer
ver?

A partir de agora, o que ele consegue ver de
modo diferente? Ele precisa de nossa ajuda para
isso ou apenas de tempo para si mesmo?

A que ele fecha os olhos?

Como podemos instruí-lo a respeito da dura
realidade de uma maneira adequada e sensível
para crianças?

Existem conflitos não manifestados que o
ocupam?

Quais preocupações ele não consegue
expressar?

Como podemos apoiá-lo para expressar de outra
maneira os conflitos ou as preocupações de sua
alma?
 
Medidas de apoio:

Exposição à luz vermelha: algumas crianças
gostam do calor da luz vermelha, o que provoca
o amadurecimento do terçol e, possivelmente, a
diminuição do inchaço, proporcionando alívio.
Sente ou deite seu filho com os olhos fechados a
uma distância de cinquenta centímetros de uma
lâmpada de luz vermelha, três vezes ao dia por
15 minutos. O mais adequado é segurá-lo no
colo e conversar com ele ou ler alguma coisa
para ele durante a aplicação da luz. Além disso,
o calor dos pais auxilia no processo de cura.

Compressas nos olhos com eufrásia: faça infusão
com um saquinho ou meia colher de chá de
eufrásia (comprado em farmácias ou em lojas de
produtos naturais) em água fervente por cinco a
sete minutos. Em seguida, embeba um lenço
macio de pano ou uma gaze com a infusão e
torça-o. Coloque-o se possível quente sobre o
olho afetado e fixe-o com uma faixa, um lenço ou
um tapa-olho. Se seu filho achar essa medida
desagradável porque não consegue enxergar
com um olho, sugiro que você relacione esse
tratamento a uma “brincadeira de pirata”, o que
geralmente faz com que o tapa-olho seja
tolerado pelo tempo necessário. Esfriada a
compressa, troque por outra quente ou deixe o
olho sem nada. Se a criança sentir alívio, você
pode repetir o tratamento três vezes ao dia.

Anel de ouro: um recurso oriundo da crença
popular e preservado de vários modos é passar
um anel de ouro de quilate elevado no terçol.
Antes disso, a criança deve lambê-lo e passá-lo
ela própria no terçol. Contudo, isso ajuda apenas
no começo. Se o terçol já estiver bem formado,
será tarde demais “para essa magia”. As
crianças também gostam do ritual porque
excepcionalmente podem usar a aliança valiosa
da mãe ou do pai.
Esses métodos não apenas parecem, mas são
superstição; contudo, costumam funcionar bem. Pelo
menos, os especialistas em princípios primitivos
notam que o valioso, o nobre é unido ao que é sujo,
escuro e doente. Tanto o reino da terra, as pedras
preciosas e os metais quanto as verrugas do reino
das bruxas e os segredos obscuros por trás do terçol
pertencem ao arquétipo de Plutão.

Tratamento homeopático: a Staphisagria C30 é o
medicamento mais eficaz. A criança sente dores
como se tivesse algo duro embaixo da pálpebra
(geralmente na superior esquerda). Tocar o local
é insuportável; o terçol não supura e não irrompe
direito. O agente desencadeador é uma briga ou
uma preocupação reprimida. A criança fica
taciturna e internamente irritada. Mostra-se
muito sensível a críticas e a conversas.
Hepar sulfuris C30: a inflamação já está avançada, e
o terçol começa a supurar. As crianças ficam muito
sensíveis à luz e a correntes de ar.
Importante! Em caso de terçol reincidente, é
aconselhável um tratamento homeopático
constitucional com um homeopata experiente.

7.3 Estenose do canal lacrimal


“Sou uma única lágrima.” – “Tenho sempre vontade de
chorar.”
 
Um estreitamento (em grego: sténosis) do canal lacrimal
impede o escoamento do líquido lacrimal, fazendo com que
as crianças pareçam estar sempre chorando. Os olhos
sempre banhados em lágrimas como que transbordam.
Nesses olhos, ou melhor, nesses rostos, o princípio da Lua
festeja triunfos irremissíveis. Os sintomas surgem apenas em
recém-nascidos e crianças pequenas, na maioria das vezes
desaparecem com o crescimento e raramente levam à
necessidade de perfurar o canal lacrimal.
Em todo caso, com esses sintomas, um período que já
costuma ser de muitas lágrimas acaba por produzi-las ainda
mais. As janelas da alma são limpas constantemente; as
crianças enxergam como que através de um véu e parecem
estar sempre chorando. Seja como for, desse modo
mobilizam a compaixão de seus pais e do restante do
mundo. Não têm uma visão clara deles; ao contrário, veem
tudo velado, como se estivessem embaixo d’água.
Nesse sentido, torna-se evidente certa necessidade de
regressão. Por um período, a visão de mundo da perspectiva
do ventre materno é mantida. Do ponto de vista óptico, as
crianças como que se refugiam no mundo interior das
últimas dez luas, com o qual estão familiarizadas. Do ponto
de vista mitológico, é de supor que, para elas, o mundo
exterior ainda esteja escondido atrás do véu de Ísis.
Será que ainda não querem se abrir direito para o mundo
exterior? Deve seu olhar permanecer ainda velado e
encantado até elas estarem maduras o suficiente para
rejeitar o efeito de difusão e olharem de frente para a
realidade dura e de contornos precisos? Deve o efeito do
esquema de aspectos infantis, que se intensifica dessa
forma, fazer com que elas recebam a compaixão de que
precisam nesse início de vida?
No estreitamento do canal lacrimal – como em qualquer
estreitamento – também se torna evidente certo medo de
encarar a dura realidade do mundo, que é um vale de
lágrimas. O olhar que irradia brandura e sentimento, como
se tivesse sido colocado debaixo d’água, ainda não quer
enxergar tudo de maneira tão realista nem com tanta
clareza e conquistar a última perspectiva.
A tarefa dos pais deveria ser a de preservar a tranquilidade
e permitir que seu bebê extravase seus sentimentos. Com
seus olhos cheios d’água, eles se transformam duplamente
em espelho para os pais. Será que estes deveriam
demonstrar mais sentimento para com a criança e entre si,
além de darem mais vazão às próprias lágrimas? Em todo
caso, devem munir-se de paciência, a fim de poupar as
crianças da perfuração precoce do canal lacrimal, apostar
em alternativas como a homeopatia clássica e simplesmente
dar-lhes mais tempo no mundo aquático do início da vida.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho está chorando?

Como podemos intermediar um contato mais
intenso de nosso filho com seus sentimentos?

Quando e como podemos ajudá-lo a entrar em
um contato mais familiarizado com a realidade?

Que tipo de situação ele não quer encarar?

Somos capazes de demonstrar nossos próprios
sentimentos e dar livre curso a eles?
 
Medidas de apoio:

Tratamento homeopático: um medicamento
eficaz é a Silicea C30, dois glóbulos uma vez ao
dia.

7.4 Estrabismo
“Não quero olhar os fatos nos olhos.”
 
Com o estrabismo abordam-se temas como “visão” e
“compreensão”. Como nossos olhos também são espelhos e
janelas da alma, esse sintoma nos atinge com muito mais
profundidade do que se supõe à primeira vista. De fato, os
estrábicos não conseguem olhar para ninguém diretamente.
Expressões como “não ter visão das coisas” ou “ter de olhar
duas vezes” mostram como é decisivo ter uma visão clara
nos dois olhos. Os estrábicos não conseguem ver nada “à
primeira vista”. Muito mais do que os outros, eles precisam
calcular tudo com a ajuda de seu cérebro para assim
conseguirem adquirir certa visão geral das coisas.
O momento em que ambos os olhos “se direcionam”, ou
seja, se colocam em determinada direção e se ajustam a
essa perspectiva, reside na primeira infância. Nesse período,
traumas psíquicos podem limitar ou, pelo menos, perturbar o
“ajuste” a um objetivo e, com ele, a orientação na direção de
um modo de ver claramente tridimensional. Esses olhos
ficam “desorientados” e desajustados, e a visão,
discrepante. Mais tarde, quando esse tema for tratado, a
criança precisa posicionar-se frente ao trauma de base e
olhá-lo com a máxima precisão, a fim de encontrar uma
visão adequada.
Provavelmente, não conseguir olhar ninguém nos olhos
está relacionado ao fato de que as pessoas acometidas de
estrabismo têm medo de terem sua alma reconhecida
(internamente) e serem punidas por alguma coisa. Nesse
sentido, com esse sintoma, tentam desviar-se dos erros e da
consciência pesada. Entre elas também há muitos daqueles
que encontram pretextos e que têm medo de que suas
desculpas e mentiras venham à tona. Suspeita-se que, em
sua educação, os padrões de duplo vínculo foram eficazes,
ou seja, aqueles duplos vínculos que não deixaram às
crianças nenhuma oportunidade de decidir direito; portanto,
situações em que tudo só podia dar errado para elas. Por
conseguinte, essas situações não lhes permitiram
estabelecer pontos de vista fixos. O olhar que é arrebatado
para direções diferentes e que não consegue se fixar em
nada é o que lhes dá expressão.
Por fim, revela-se no estrabismo certa busca insatisfeita,
pois constantemente um olho se volta para algo ausente,
que está isolado ou faltando.
Fisiologicamente, o estrabismo é um circuito de proteção
no cérebro em virtude da ametropia, ou melhor, da
incapacidade de coordenar os dois lados da realidade. Ele
conduz à visão monocular funcional, pois as imagens do olho
desviante são reprimidas. Precisamos dos dois olhos para ver
em perspectiva; somente com imagens a partir de dois
ângulos de visão diferentes é que se produz a ideia de
espaço. Os dois olhos um pouco separados um do outro
asseguram essa informação, e o córtex visual no cérebro
calcula a partir das imagens das duas câmeras oculares uma
única imagem plástica, que permite perceber o espaço.
No estrabismo, o cérebro rejeita as informações de um dos
olhos devido ao seu problema, o que faz com que a visão
perca a terceira dimensão e a segunda se torne plana.
Assim, perdem-se também a profundidade e, naturalmente,
a profundidade de campo. Portanto, os estrábicos veem um
mundo plano, sem relevo, e já não conseguem avaliar
nenhuma distância. Por assim dizer, resvalam em uma
regressão, pois o mundo lhes parece mais um disco do que
uma esfera; até mesmo uma bola lhes parece plana. Quando
se tira a profundidade de uma esfera, obtém-se um círculo.
Isso já pode atrapalhar as crianças em seus primeiros jogos
com bola e fazê-las parecer desastradas.
Com o tempo, contudo, o cérebro consegue compensar
algumas coisas, de maneira que, aos poucos, os estrábicos
aprendem a avaliar corretamente as distâncias. O cérebro é
tão hábil que, gradualmente, consegue, por exemplo, medir
cada vez melhor as distâncias a partir do número indicado
nas sinalizações pelo caminho, do intervalo entre as árvores
de uma alameda ou da quantidade de linhas tracejadas no
asfalto das vias públicas. Entretanto, no deserto, onde falta
tudo, essas compensações voltam à tona, conforme observei
certa vez em uma viagem que fiz em companhia de uma
pessoa estrábica. Contudo, mesmo nesse caso, depois de
algum tempo o cérebro é capaz de tirar conclusões a
respeito das distâncias a partir do tamanho do rastro de
poeira, entre outras coisas. Portanto, os estrábicos são
totalmente capazes de aprender a dirigir.
Embora os romanos já conhecessem procedimentos para
reproduzir situações espaciais, não deram continuidade a
esse conhecimento. Somente no Renascimento é que a
perspectiva central foi (re)descoberta. Talvez somente a
partir desse período é que as pessoas realmente passaram a
ter consciência de sua visão tridimensional. Com ambos os
olhos, nossos antepassados podiam até dispor de tudo que
era necessário para ter uma visão do espaço, mas
eventualmente utilizavam muito menos essas possibilidades.
Uma vez que levavam uma vida ainda muito lenta em um
mundo muito mais simples, também conseguiam proceder
sem a grande perspectiva, mesmo que, obviamente, já
tivessem de fazer estimativas de distância nas caçadas ou
nas fugas.
Isso significa que, possivelmente, nesse aspecto os
estrábicos regridem à situação daquela época, quando as
pessoas ainda tinham menos perspectivas e, em todo caso,
não conseguiam reproduzi-la na pintura. Bebês estrábicos
também estão aquém desse estágio do desenvolvimento. É
possível igualmente supor que, “ao verem a luz do mundo”,
os bebês ainda sejam seres tão celestiais que ainda não se
incomodem com a polaridade “e ainda não tenham de ver a
realidade de frente”. De fato, ainda não têm de “lançar
nenhum olhar a algo determinado ou concreto”. Tão logo se
cansam, recaem no nível anterior e mais relaxado, em que
os olhos ainda não precisam se coordenar. Até o quarto mês
de vida, isso é normal, pois somente o desenvolvimento
incipiente no nível do cérebro torna possível a coordenação
dos olhos. Posteriormente, só há reincidências em caso de
cansaço. Mais tarde, o estrabismo ainda pode voltar raras
vezes em períodos de fraqueza, sobretudo em situações em
que “resta apenas um olhar fugaz” e não há energia nem
força suficientes para manter a coordenação dos olhos e
sincronizá-los. Esse tipo de estrabismo permanece na
respectiva temática fundamental.
Analogamente, o estado de pessoas alcoolizadas pode
ajudar nossa compreensão. Muitas vezes, elas veem as
coisas duplicadas, pois, devido à intoxicação de seu cérebro
pelo álcool, ambos os lados da realidade já não se
combinam. Elas também perdem em outros níveis a
capacidade de coordenação, por exemplo, ao caminhar ou
falar. Se esse estado permanecesse por muito tempo, o
cérebro teria de desligar um olho, pois não conseguiria ir
adiante com imagens duplicadas.
7.4.1 Falta de capacidade de coordenação
No nível do significado, a falta de capacidade de
coordenação permite concluir que os estrábicos já não
conseguem harmonizar nem conciliar ambos os lados de sua
personalidade, o emocional e o racional, o coração e a razão.
Analogias correspondentes revelam que o lado materno e o
paterno ou justamente o Yin e o Yang também se
desintegram. Caso outros problemas venham a se
acrescentar, isso pode produzir o risco de um
desenvolvimento assimétrico da personalidade.
Muitas vezes, o estrabismo conduz a um olhar não
direcionado e à dificuldade de conferir uma direção clara à
própria vida. A criança é impedida de desenvolver um olhar
crítico. Por outro lado, quem sempre exclui um polo e
enxerga a realidade com um só olho facilmente adquirirá a
unilateralidade em vez do discernimento. Crianças que já
não conseguem conciliar imagens e percepções
experimentadas acabam por retirar-se a um único polo. Por
exemplo, se a discrepância entre a imagem materna e a
paterna for muito grande e as crianças forem
constantemente atraídas por uma e outra, sem conseguirem
se decidir, os olhos manifestam essa condição no nível do
corpo, e cada um segue seu próprio caminho. Então, com
base na alma, o cérebro decide qual olho se tornará
determinante para a vida e qual será desconsiderado.
Quando é o olho direito a sofrer de estrabismo, o pai, suas
opiniões e visões de mundo são excluídos, e o olho
esquerdo, voltado ao arquétipo do feminino, torna-se aquele
que conduzirá a vida. Quando o estrabismo se dá no olho
esquerdo, a visão materna cai para segundo plano, e o olho
direito, comprometido com o arquétipo do masculino, torna-
se aquele que conduzirá e determinará a vida. O resultado é
uma percepção unilateral sem perspectiva. Ambos os lados
da realidade já não podem ser mantidos ao mesmo tempo, e
as contradições se tornam insuportáveis. Inconscientemente,
essas crianças não querem enxergar um dos pais; por isso,
desviaram o olhar para o outro. Desse modo, o pai ou a mãe
que não é visto “fica com cara de bobo”. É sempre melhor
do que dirigir-lhe um “olhar fulminante”, “pungente” ou
“aniquilador”, ou até desenvolver em relação a ele um “olhar
de maldade”. “Simplesmente já não ocorre a troca de
olhares.” Isso permite “ver com profundidade” como é o
relacionamento com o pai ou a mãe que não é olhado, o que
certamente não ocorre “por descuido”. Muito poucas coisas
na vida acontecem “inadvertidamente”. Nesse caso, a língua
mostra-se em uma combinação extremamente clara com a
linguagem corporal.
Se apenas o pai ou a mãe recebe o olhar do filho, isso
aponta para um tema que requer especial atenção e
consciência. A direção do olhar da criança revela a que parte
da polaridade ela dirige seu olhar “orientado” e de que parte
se ocupa, sem se deixar desviar de sua tarefa pelo outro
polo.
Como crianças estrábicas realmente não conseguem ver
uma das duas pessoas, o pai ou a mãe sente-se relegado por
elas e não confrontado pelo contato visual que falta. Assim,
também surge um sentimento de uma ligação pessoal
menor. O fato de que, por sua vez, o pai ou a mãe também
não se deixam olhar nos olhos, pois sempre os desviam,
também é sentido pelos outros como algo incômodo: “Eles
não permitem ser olhados”.
Por que para nós é tão importante que, em um encontro ou
em uma conversa, alguém nos olhe com ambos os olhos?
Provavelmente porque, do contrário, não nos sentimos
realmente considerados quando o outro olha em outra
direção e talvez “apanhe” outros olhares. Queremos estar no
centro de seu interesse, e o estrábico já não obtém esse tipo
de centro.
Quem desvia o olhar ou simplesmente olha em outra
direção não está concentrado, não está “no momento”, como
dificilmente consegue estar, do ponto de vista técnico do
olhar, junto de alguém. Através das orientações divergentes
do olhar, voltadas para fora, produz-se uma espécie de
multitasking corporal, que, no entanto, é menos eficaz do
que o multitasking social, pois o cérebro simplesmente
desliga as imagens do olho desviante, a fim de evitar tontura
e mal-estar.
Quem enxerga o mundo como um disco plano, quem não
consegue reconhecer o que vem em sua direção e em que
momento nem é capaz de avaliar as distâncias
provavelmente tampouco conseguirá “prever” alguma coisa.
Sua relação com o mundo permanece vaga e unilateral – tal
como sua visão. Ele terá dificuldades para ver ambos os
lados de um problema e, sobretudo, de uma questão e,
desse modo, também para “discernir alguma coisa”.
Nossa visão do mundo corresponde às nossas próprias
convicções. Em uma situação ideal, pode-se ver o mundo e
comparar a realidade com as próprias convicções, a fim de
conciliar ambos. Assim, a observação do mundo sempre
corrigirá as próprias convicções. Este deveria ser o ponto
sobre o qual Alexander von Humboldt dizia que a pior visão
do mundo é aquela das pessoas que não viram o mundo.
Assim, do ponto de vista (fisio)lógico, aos estrábicos resta
apenas uma visão de mundo unilateral e, respectivamente,
convicções unilaterais. Em todo caso, é alta a probabilidade
de que, a partir disso, se desenvolvam, também em sentido
figurado, convicções unilaterais que levem a uma imagem
unilateral do mundo. Em geral, resta-nos apenas a seguinte
esperança: “Cada um vê um pedacinho do mundo; juntos,
vemos o todo”. Os estrábicos precisam ter claro em mente
que, para eles, isso tem peso ainda maior e que seu
pedacinho de mundo necessita absolutamente de
complementação através de outras visões. Em seu caso,
poder-se-ia falar até mesmo de vistas, visões e perspectivas
“desviantes”. Desse modo, os estrábicos ficam com a pior
parte.
O estrabismo é uma espécie de caricatura da visão ou uma
visão da espécie irremissível. Por sua natureza, os estrábicos
têm dificuldade para reconhecer a profundidade das coisas e
dos sentimentos, por exemplo, a profundidade do amor.
Como não conseguem ver o mundo em sua profundidade,
precisam confiar em outros níveis de percepção, como seu
sentimento. No amor, este poderia até mesmo ser o melhor
caminho.
De modo geral, porém, dificilmente encontram
perspectivas concordantes e honestas para sua vida. Em um
mundo plano, sem profundidade, muitas vezes a visão
estrábica se estrutura sobre dúvidas, pois lhe falta a outra
metade. Entretanto, quem não tem nenhuma dúvida a
respeito de suas perspectivas unilaterais acaba se
transformando facilmente em um problema para si mesmo e
seu ambiente. Hoje, o estrabismo é reconhecido e corrigido a
tempo em quase todas as crianças, o que, no entanto, em
nada muda a tarefa fundamental do aprendizado.
De fato, também existe uma interpretação remissível, que
permite “ver algo bom na situação”. Visões e perspectivas
unilaterais também poderiam visar à unidade. Muitas vezes,
as crianças olham apenas para os anjos e seu reino, por
exemplo, quando seus olhos se orientam para o ponto do
sexto chakra (Ajna), do terceiro olho, aquele centro etéreo
de energia que, segundo a concepção hinduísta, reside na
raiz do nariz. Na Baviera, os mais sensitivos dizem: “Eles
olharam para os anjos”; e os mais grosseiros falam de
“castelos de loucos”. Em todo caso, esta seria uma
“perspectiva bem-vinda” em outra dimensão.
Para as crianças, o estrabismo poderia indicar que elas
devem reaprender justamente o seguinte: a olhar nessas
esferas e desfrutar de sua respectiva visão interior. Nesse
sentido, é conveniente que, do ponto de vista (fisio)lógico,
elas tenham estrabismo nos primeiros meses – afinal, elas
ainda são elementares e, à sua maneira, perceptivas.
Quem atrela sua felicidade a este mundo sempre corre o
risco de permanecer unilateral. No entanto, quem desde o
princípio consegue perscrutar o mundo como Maya, ou seja,
como reflexo plano da verdadeira realidade, sempre vendo a
unidade por trás do mundo da dualidade polar e permitindo
que a verdadeira visão cresça a partir da visão unilateral,
poderia desenvolver a experiência da unidade através de
certa simplicidade. Esta seria a grande missão por trás do
estrabismo.
7.4.2 Tipos de estrabismo

Dois tipos de estrabismo são distinguíveis a partir da posição


dos olhos. No chamado estrabismo convergente, o olho
desviante volta-se para dentro. Dele resulta uma tendência a
permanecer em casa e continuar sendo criança, com uma
nítida e elevada necessidade de segurança. A situação
psíquica de base é, antes, introvertida.
A tarefa especial desse tipo de estrabismo está em ocupar-
se de si mesmo até conhecer-se profundamente e encontrar
tudo em si próprio, pois seu interior é o espelho perfeito do
exterior. Portanto, quando no mundo interior estiver tudo
claro, no exterior também haverá clareza, e a visão será
possível.
No estrabismo divergente, o olho desviante volta-se
respectivamente para fora. Aqui se revela uma tendência a
escapar da família e do lar, bem como da pátria, a fugir de
situações difíceis e a não encontrar o próprio centro com
muita facilidade. Também se revela a preferência para evitar
os problemas em vez de resolvê-los, a bordejar, a evadir-se
em vez de ir ao ponto. A palavra grega para “pecar”,
hamartanein, também significa “errar o ponto”, isolar-se. A
situação psíquica de base é extrovertida.
A tarefa também consiste em encontrar a si mesmo pela
experiência que se tem com o mundo exterior. Quem
observar o mundo desenvolverá uma visão clara dele. Dessa
visão pode resultar o autoconhecimento.
Existem também formas leves de estrabismo. Nas
mulheres, antigamente esse tipo de estrabismo era visto
como atraente e, portanto, “valioso”; entretanto, parecia
revelar certa fraqueza na percepção do mundo e, com isso,
necessidade de ajuda, que os homens costumavam sentir
como um atrativo. Contudo, as mulheres modernas
dificilmente querem ser amadas por suas fraquezas.
No estrabismo, a tarefa geral consiste em se conscientizar
das tendências divergentes e ambivalentes do próprio ser e
reconhecer as dificuldades para encontrar a direção certa.
Quem aprende a reconhecer que precisa de ajuda e mostra
abertamente o que e quanto falta para a perfeição causa um
efeito de simpatia. Mesmo quem aprende conscientemente a
se limitar à metade da realidade, sem deixar de
compreendê-la como um todo, em algum momento
amadurecerá para o outro polo que ainda falta. Aquele que,
voltado para uma parte do mundo, e não para o mundo
como um todo, conseguir reconhecer a totalidade da vida
em cada aspecto isolado estará no caminho do
discernimento e da unidade.
 
Perguntas para os pais:

Como ajudar nosso filho na sua necessidade de
enxergar o todo?

Como podemos ajudá-lo a aprender a avaliar o
que vê?

Em que pontos lhe faltam visão geral e
discernimento?

Como poderíamos libertar nosso filho da pressão
pela perspectiva e simplesmente estarmos
presentes?

Como ele adquire acesso à profundidade da
vida?

Até que ponto ele pode lidar com a polaridade e
como podemos ajudá-lo a aprender o máximo
possível com ela?

Que fatos ele não consegue/quer encarar?

Onde reside um trauma (talvez familiar) que a
alma da criança (ainda) não ousa enxergar,
desviando seu olhar? Sob estresse psíquico, o
olho estrábico desvia-se com mais frequência.

Quais são os temas que causam mais estresse
ao nosso filho?

Por que ele não nos permite ver seu interior?
 
Medidas de apoio:

Tampar o olho: ao se tampar temporariamente
um olho da criança, ela sentirá a necessidade de
orientar seu foco para o lado negligenciado. Isso
força uma ocupação intensa e consciente “com a
outra visão”, possibilitando, assim, um
tratamento eficaz.
8 Doenças relativas à garganta, ao nariz e
ao ouvido

8.1 Predisposição a infecções – baixa imunidade


“Não consigo me defender.”
 
No nível físico, o sistema de defesa serve para proteger o
corpo de todos os possíveis agentes patogênicos e germes
que fazem do organismo sua colônia e, por conseguinte, o
ameaçam constantemente. Nesse sentido, as temperaturas
de 36°C na superfície do corpo e de 37°C dentro dos tecidos
são ideais para a proliferação de inúmeros micro-
organismos. Acrescente-se a isso que o ambiente e o mundo
são repletos de diversas formas de vida. Só com um normal
aperto de mão chegam a ser trocados 35 milhões de
germes; quando o cumprimento é feito com um beijo em
cada face, esse número pode alcançar 50 milhões. Isso não é
razão para se temer um ambiente em que vivam esses
micro-organismos; ao contrário, é razão para se querer ter
força e capacidade para resistir neste mundo.
Uma defesa intacta do corpo é importante para a
(sobre)vivência e pressupõe uma abertura psicoespiritual e
uma disposição saudável para se defender. Os
epidemiologistas do passado podiam permitir-se encontrar e
entrar em contato direto com os pacientes terminais sem
adoecerem quando o faziam por convicção íntima e vocação.
Quanto mais aberta e forte for a consciência, tanto mais
eficiente e produtiva é a defesa. Algo semelhante é vivido
por muitas mães quando todos ao redor delas adoecem e
apenas elas permanecem de pé para que possam cuidar de
todos. Muitas vezes, elas só adoecem depois que os outros
já estão curados.
Quem já não se deixa estimular no nível da consciência
porque se fechou de modo excessivo deverá contar com o
fato de que seu não para a vida e a incapacidade de se abrir
internamente favorecerá uma abertura para todos os
possíveis agentes patogênicos.
Como sempre, a tarefa seria excluir esse tema do corpo,
ou seja, em vez de abri-lo para todos os possíveis germes,
abri-lo conscientemente para todos os possíveis temas, as
ideias e os impulsos a esse respeito e permitir que eles
germinassem, crescessem e vivessem. Ou, em outras
palavras: quem se permite uma vida (anímica) interior e
ativa não precisa admitir que entrem em si tantos germes
ativos. Onde já há e brota muita vida, os agentes
patogênicos externos não têm muita chance de
sobrevivência. Por outro lado, o vazio interno no sentido de
tédio e falta de vivacidade, mas também de sobrecarga,
falta de sono e de esperança são um convite para que os
agentes patogênicos entrem no corpo e nele se espalhem.
Por conseguinte, uma abertura exagerada a (diversos)
agentes patogênicos no nível da defesa imunológica deve
ser entendida como um desafio de se abrir mais para a vida
no nível da consciência. Portanto, seria preciso enriquecer a
vida anímica dessas crianças ajudando-as a se tornarem
mais abertas e receptivas, aumentando seu prazer com a
vida e com as respectivas experiências e estimulando sua
coragem de se abrir para a vida com seus desafios e seus
temas estimulantes. Quando a vida interior é atiçada e
floresce, o organismo fica claramente menos aberto a
agentes patogênicos. Uma vida animada, corajosa e incisiva,
repleta de surpresas e pronta para adaptar-se também é
uma boa proteção contra ameaças externas vindas do reino
dos micro-organismos.
Ainda mais eficaz é o amor. Como demonstra Erich Fromm,
o verdadeiro amor é um “ato criativo da alma”, o que indica
uma relação saudável com o eu. A partir disso, o amor
também é sempre um ato de abrir-se e permitir a entrada do
outro. Quem estiver habituado a abrir suas fronteiras para o
“você”, partindo de uma atitude básica de amor, e estiver
pronto para se unir com o outro não precisará temer tanto os
ataques dos agentes patogênicos inimigos. Nesse sentido, o
amor que tudo abrange e que até pressupõe a
espontaneidade da alma seria a base ideal para um sistema
imunológico forte e maduro para enfrentar todas as
ameaças. O máximo possível de espontaneidade no nível da
consciência produz a máxima defesa necessária no corpo.
Entretanto, é óbvio que, mais uma vez, se trata de
encontrar a medida correta para a criança como indivíduo.
Tanto o excesso quanto a falta de exigências enfraquecem as
defesas. Assim como os adultos podem se prejudicar com o
burn-out e o bore-out, o mesmo pode acontecer com as
crianças. Ser constantemente coberto de impulsos e
estímulos pode levar a uma predisposição a infecções devido
a esse excesso. Contudo, também as crianças que se
entediam demais no sentido do bore-out (do inglês bore,
“aborrecer-se”) estão predispostas. Desse modo, nenhuma
diretriz geral pode ser tomada como universal. O que é
demais para uma criança pode ser suficiente para outra.
No nível do corpo, medidas fortalecedoras, como os
exercícios de Kneipp ou dormir com a janela aberta, também
têm efeitos que aumentam as defesas do organismo.
Portanto, expor as crianças ao vento e ao clima pode ser um
ato muito consciente e responsável. Para que consiga
defender-se dos adversários da vida, o corpo precisa receber
a oportunidade de aprender a lidar com as adversidades.
Segundo Friedrich Graf, é necessário transmitir coragem e
confiança em vez de medo; atividade em vez de
passividade; autonomia em vez de dependência.
Perguntas para os pais:

Como podemos ajudar nosso filho a se defender
de modo saudável e a reconquistar o mundo com
a coragem adquirida?

Em que circunstâncias nosso filho não é aberto
para o mundo circunstante?

Como podemos despertar sua curiosidade?

Como estimular seu prazer com a vida?

Como podemos dar mais confiança ao nosso filho
para que ele consiga viver com mais coragem?

Quando estamos dando proteção demais?
Quando a criança está sendo “superprotegida”?
O que ele consegue controlar sozinho e o que
podemos exigir dele?
 
Medidas (preventivas) de apoio:

Amamentação: com o leite materno, a criança
recebe nos primeiros seis meses todos os
nutrientes importantes e necessários para a sua
vida, bem como calor, proteção e anticorpos que
a protegerão de doenças. Por isso, a
amamentação é necessária.

Manter o equilíbrio térmico da criança nas
estações frias: roupas de lã, gorros, meias ou
pantufas grossas. À noite, massagens para
aquecer os braços e as pernas com óleo de
malva. O óleo e a massagem aquecem o corpo; o
toque e a proximidade aquecem a alma.

Escalda-pés: descrito no tema “Enurese” (seção
15.2).

Sauna: conforme a idade, frequentar a sauna.
Não se deve forçar, e sim deixar ao critério da
criança por quanto tempo ela quer ficar na
sauna.

Caminhar na água: esta é uma boa brincadeira
para as crianças. Com “passo de cegonha” e a
água na altura da panturrilha, caminhar na água
fria, a uma temperatura de 10 a 18 graus. De
preferência, ao ar livre.

Ducha alternada: molhar várias vezes os braços
e as pernas no chuveiro, alternando a
temperatura entre quente e frio. As próprias
crianças podem pôr esse “enrijecimento” em
prática ao tomarem banho de manhã.

Caminhar no orvalho: no campo, no inverno e na
neve e realizando outros exercícios segundo
Kneipp.

Sesta: mesmo no que se refere aos adultos, há
provas científicas detalhadas que comprovam a
eficácia desse “exercício” primitivo. Com a sesta
se ganha, por assim dizer, a segunda metade do
dia, uma vez que o nível de energia volta a se
elevar. Para muitos, melhor ainda é a eficácia do
relaxamento profundo, uma vez que, com ele,
depois de algumas semanas é possível alcançar
estados de relaxamento mais profundos e até de
transe. O ideal seria que nunca se perdesse o
hábito de fazer a sesta e que, com o tempo,
fosse substituída pelo relaxamento profundo.
Alimentação adequada: mais a respeito na seção
“2.3.1 Alimentação”.

Beber muita água: a água é nosso alimento mais
valioso. Conseguimos resistir um bom tempo
sem comida; contudo, a partir do terceiro dia
sem água a situação fica difícil. Toda vida
começa na água, e nosso corpo consiste de 70%
dela. A água se ocupa do metabolismo, regula a
temperatura corporal e a digestão, estimula a
circulação e ajuda na desintoxicação. Desde
cedo, as crianças deveriam aprender a tomar
quantidades suficientes de água, enquanto
outras bebidas, como refrigerantes, Coca-Cola e
sucos não diluídos, devem ficar
excepcionalmente reservadas a situações
especiais (aniversários, festas, etc.). Isso soa
mais rigoroso do que na realidade é se os pais
derem um bom exemplo. A quantidade correta
de líquido varia de acordo com o peso corporal, a
atividade física e a estação do ano. As seguintes
indicações valem para o consumo diário médio
de água:
Crianças a partir de 2 anos – cerca de 400 a 600
mililitros.
Crianças de 3 a 6 anos – cerca de 500 a 800
mililitros.
Crianças de 7 a 10 anos – cerca de 600 a 1.000
mililitros.
Crianças de 11 a 14 anos – cerca de 600 a 1.300
mililitros.
Copos coloridos ou com estampas, copinhos de
aguardente, canudos, pequenos guarda-chuvas de
papel ou objetos semelhantes podem deixar a
bebida mais interessante.
Para melhorar o gosto, podem-se acrescentar à água
o suco de dois limões, um pouco de mel, sumo de
pera ou estévia.
Não beber durante as refeições, pois isso perturba a
digestão e, muitas vezes, leva à sensação
antecipada de saciedade.
Em geral, bebidas geladas não são bem toleradas. O
corpo precisa gastar muita energia para aquecê-las,
o que enfraquece o organismo. Ofereça bebidas em
temperatura ambiente ou quentes. Nunca adoce as
bebidas com adoçante; no máximo, com estévia.
Sucos de fruta consistem quase exclusivamente de
água açucarada, enquanto néctares de fruta contêm
apenas metade do suco da fruta. Prefira sucos 100%
concentrados ou diretamente o sumo da fruta e o
dissolva em água.
Diluir apenas sucos de boa qualidade em uma
proporção de 1:3 de água. Dilua igualmente sucos
recém-espremidos, uma vez que a criança nunca
poderia comer a mesma quantidade de frutas ou
verduras presentes em um copo de suco.

Exercícios físicos: ao ar livre,
independentemente do clima. (“Não existe
tempo ruim, apenas roupa ruim.”)

Extrato de espinheiro-marítimo, da Weleda:
diariamente, de uma a duas colheres de chá em
um copo de suco ajudam e fortalecem as
defesas do organismo.

Eleutherococcus sentinosus (ginseng siberiano):
crianças que já frequentam o jardim de infância
ou a escola e que se contaminam com
frequência podem ser prevenidas com o extrato
Eleu-Kokk M (de uma a duas colheres de chá
diárias).

Auto-hematoterapia potencializada segundo
Imhäuser: produção e aplicação, ver a seção
“11.2 Dermatite atópica e crosta láctea”.

Limpeza individual do cólon ou controle
simbiótico de acordo com a coproscopia anterior.
 
Suporte homeopático ou vegetal durante uma infecção:

Echinacea (flor-de-cone): três glóbulos (D3/D6) a
cada uma ou duas horas.

Umckaloabo (Pelargonium reniforme) ou Kaloba
(Pelargonium sidoides): bom medicamento para
infecções, especialmente quando há
envolvimento dos brônquios. Não serve para
prevenção, uma vez que seu uso progressivo
pode fazer mal ao fígado!

Angocin anti-infeccioso: folha de capuchinha,
raiz de rábano; aplicação de acordo com a idade
(ver informação na embalagem).

Sambucus nigra, da Ceres (tintura-mãe de
sabugueiro): de duas a quatro gotas três vezes
ao dia têm efeito diaforético, aumentam a
secreção dos brônquios e estimulam o sistema
imunológico.

Chá de tília: estimula a formação de suor, age
como desintoxicante e alivia.

8.2 Graus de escalada da agressividade


No exemplo do princípio primário da agressividade, fica
evidente uma concatenação substancial de sintomas em
casos de suscetibilidade a infecções, concatenação essa que
se produz quando o indivíduo abre o próprio pensamento aos
arquétipos ou princípios primários, mas que se fecha para o
pensamento científico. Se juntarmos os dois modos de
observação, tornam-se claras as possibilidades terapêuticas
que melhoram consideravelmente as chances do paciente.
O ato de roer as unhas, típico em crianças, é uma
demonstração direta de um problema de agressividade. A
criança mostra os dentes e, com essa arma presente na
boca, rói as unhas, o resto de suas garras (do ponto de vista
da história do desenvolvimento). Isso é tão evidente que os
pais logo se irritam e estabelecem punições em vez de
alterar as condições básicas do campo familiar no que se
refere a uma vida menos hostil à agressividade ou à
vitalidade. Quem impede com punições draconianas que as
unhas sejam roídas apenas impele a energia contida no
sintoma a um nível mais profundo do corpo.
Inflamações frequentes das vias respiratórias superiores,
como tosse, resfriado e rouquidão, conduzem a um grau
superior de escalada. A criança passa a lutar em várias
frentes, que regulam sua comunicação com o mundo. Ela
trava uma guerra que mantém a energia da agressividade
em fogo baixo. Se nesse momento se fizer uma intervenção
“auxiliar” com medicamentos antipiréticos e, na pior das
hipóteses, se recorrer desnecessariamente a antibióticos,
haverá a chance de que todo o evento se aprofunde em mais
um grau.
Na bronquite, por exemplo, o caminho rumo ao fundo fica
um pouco mais evidente. Como em todos os casos
terminados em “-ite”, aqui também o caráter inflamatório de
uma batalha torna-se evidente. O sistema imunológico do
corpo luta contra agentes patogênicos externos,
potencialmente perigosos. Se a criança for impedida
repetidas vezes de ganhar essa batalha com as próprias
forças, na medida em que se aposta na alopatia e em seu
arsenal “antiarmas”, o próximo grau de escalada poderá dar-
se na direção da chamada bronquite asmática. Quando se
ataca a inflamação com anti-inflamatórios e a febre, que é
uma defesa da criança, com antipiréticos, sempre se obterá
uma breve vitória de Pirro; porém, a longo prazo, o sistema
imunológico irá enfraquecer e se afundará cada vez mais, ou
seja, o evento descerá cada vez mais, nível por nível, e, por
fim, será classificado como asma infecciosa ou até como
asma alérgica.
Obviamente, também se podem produzir outras vias de
escalada, e da repressão ao ato de roer as unhas pode
surgir, através de uma predisposição geral a infecções, outro
evento alérgico, tal como um problema de pele, por
exemplo, no sentido de uma dermatite atópica.
Posteriormente, se a repressão continuar, essa predisposição
a infecções também pode, como ocorre com frequência, se
transformar em asma. Os graus de escalada dependem da
respectiva ressonância da criança adoentada. Médicos
acadêmicos falam de “Locus minoris resistentiae”, ou seja,
do local em que a resistência é menor. Segundo a sabedoria
popular, a corrente seria tão forte quanto seu elo mais fraco,
e o bom senso sabe que somos mais suscetíveis em nossos
pontos fracos pessoais.
O mencionado estudo deixou claro de que maneira
chegamos a criar alergias reprimindo inflamações. Segundo
esse estudo, todo tratamento com antibiótico nos dois
primeiros anos de vida aumentam a tendência a alergias em
mais de 50%.
Se na infecção já se falava de germes potencialmente mais
perigosos, que se transformam em inimigos do sistema
imunológico, no caso das alergias se trata, objetivamente,
de substâncias na maioria das vezes inofensivas, como
pólen, poeira doméstica e todo o arsenal dos alérgenos, que,
devido à sua simbologia, de certo modo podem ser
combatidos de modo representativo. Em contrapartida, se a
alergia for abatida com “antiarmas”, como os anti-
histamínicos e a cortisona, todo o evento tende a escalar
cada vez mais na direção de doenças autoagressivas, como
o reumatismo ou a tireoidite de Hashimoto (que leva à
destruição da tiroide). Sobretudo esta última teve um
aumento dramático nos últimos anos.
Nessa visão relacionada aos princípios primários, não faz
muito sentido reprimir os sintomas, pois, no fundo, as
respectivas energias encontram outros caminhos para
expressar o mesmo tema. Só que, nesse caso, o evento é
cada vez mais iminente ou, como dizem os homeopatas,
desce cada vez mais fundo.
Por conseguinte, em seu tratamento, as vias de escalada
devem ser percorridas em sequência inversa. Assim, na fase
de tratamento, a asma brônquica infantil pode manifestar-se
na pele, caso anteriormente tenha havido uma repressão.
Inversamente, como o evento é deslocado pela medicina
acadêmica de fora para dentro e de cima para baixo, em
uma terapia que realmente vise a cura, ele terá de regredir
de dentro para fora ou na sequência contrária ao modo como
se manifestou. É recomendável que homeopatas e
psicoterapeutas chamem a atenção dos pais para esse fato
antecipadamente.

8.3 Otite
“Não quero ouvir!”
 
A otite é uma das doenças agudas mais comuns em crianças
pequenas, e sua difusão continua a crescer. Isso certamente
se deve a problemas ligados ao nosso tempo e que não são
resolvidos.
Em geral, essa doença vem acompanhada de dores
extremas no ouvido e febre alta, o que, por um lado, indica o
conflito interno em relação ao tema “ouvir”, “escutar” e
“obedecer” e, por outro, aponta para a mobilização geral do
organismo.
O principal período das otites é, de fato, aquela fase da
infância em que se trata dos temas “escutar” e “obedecer”.
O ouvido pertence ao princípio saturnino da redução ao
essencial, às regras e proibições, bem como aos limites e à
imposição de limites. Assim, é evidente que as dores de
ouvido reflitam problemas de educação e reproduzam a
revolta contra o excesso de “Você tem de!”, “Você não
pode!”. Na linguagem do livro A Doença como Símbolo, as
dores são gritos de ajuda, e as inflamações são conflitos.
Muitas vezes, as otites também coincidem com os
períodos de dentição, que, de certo modo, são marcados por
problemas que detonam agressividade. A criança, por assim
dizer, põe pra quebrar, à medida que seu médico interno
encena uma guerra na cavidade timpânica como se fosse
uma ação desesperada, pois o tema, no sentido figurado, foi
ignorado. Uma criança, cujas necessidades foram ignoradas,
com frequência as grita, incitada pela dor, talvez no sentido
de “Não aguento mais ouvir isso” – por exemplo, brigas
contínuas. Esse é o difícil período em que a criança aprende
a ouvir para fora e para dentro. Ela precisa aprender a
obedecer aos outros, mas também à própria voz interior.
Desse modo, o respeito tanto em relação às necessidades do
mundo exterior quanto em relação a si mesma é anunciado.
A este último cabe aprender a se delimitar de maneira
sensata (por exemplo, em relação aos pais e educadores).
Se os conflitos dos pais desencadeiam uma otite ou outra
doença na criança, a tentativa de ter esse tipo de discussão
na ausência do filho ajuda menos do que os pais imaginam,
pois, com sua sensibilidade e sua capacidade de
ressonância, a criança não deixa de perceber a desarmonia e
de se sentir ainda mais excluída. Mais importante do que
isso é dar ao filho o exemplo de um domínio construtivo dos
conflitos. Problemas são parte deste mundo e pertencem à
nossa vida. No entanto, podemos evitar ficarmos entregues
a eles, sem nenhum amparo, e deixar a criança sozinha com
seus temores. Conversas adequadas à idade são
importantes nesse caso para que a criança sinta que
continua ligada aos pais e que não precisa atribuir-se
nenhuma culpa. Quando ela percebe que os pais voltam a
fazer as pazes depois de uma briga, é de esperar que ela
perca o medo das discussões e se torne mais preparada para
os conflitos. No entanto, obviamente, o domínio construtivo
dos conflitos não significa estressar as crianças com temas
adultos e envolvê-las em toda sorte de situações.
Em todo caso, quando a criança está com otite, ela não
pode ser ignorada; é preciso ouvi-la. Nesses períodos,
quando os dentes irrompem ameaçando os tímpanos, as
defesas estão enfraquecidas. O represamento da linfa, bem
como inchaços e inflamações na região da boca, favorece a
propagação da inflamação e do conflito no ouvido médio,
comprometendo, assim, a audição.
8.3.1 O que acontece na otite?

O espaço realmente reservado ao elemento ar e que une o


tímpano, aonde chegam as ondas sonoras, ao ouvido
interno, onde se realiza a audição, funciona repleto de
líquido, o que forma a base física para a inflamação. Na
verdade, esse espaço – preenchido com ar – deveria servir
ao tema da mediação de oscilações e, com ele, da produção
de informação. Os três ossículos auditivos presentes nesse
espaço conseguem cumprir melhor sua tarefa na atmosfera
arejada do vazio, tarefa essa que é retransmitir
mecanicamente as ondas sonoras e as oscilações. Quando
esse espaço é invadido por líquido, a atividade é refreada, e
as consequências são uma transmissão menos eficiente das
ondas sonoras e a redução da capacidade de audição. A
partir disso, pode-se concluir que o campo da audição, da
atenção e da obediência exige mais do aspecto anímico (por
conseguinte, do elemento água).
Na prática, para os pais isso poderia significar que devem
observar com mais sensibilidade o que seu filho consegue
ouvir. Talvez durante muito tempo ele tenha ouvido o
suficiente, recebendo o que lhe era ou não destinado. Se os
pais se colocarem no lugar da criança, poderão sentir melhor
o que é proveitoso para ela e o que a estressa. Questões
sobre o que a criança pode ouvir e sobre o que já é capaz de
assimilar também ajudam a fazer com que a alma, e não o
líquido que causa inflamação no ouvido médio, influa nesse
campo sensível.
Preocupar-se com o que e quando pode ser compreendido
também produz, quase automaticamente, uma sensação
melhor no campo da obediência. Se estiver claro o que a
criança já pode compreender nesse período precoce e,
sobretudo, o que não pode, as primeiras tentativas, que de
todo modo acabam conduzindo a um treinamento, cessam
como que por si sós. Em compensação, ganhamos tempo
para formular perguntas e esclarecimentos de maneira
afetuosa e adequada à idade, fazendo com que as coisas
percam sua dimensão ameaçadora.
Para a criança, a audição reduzida chama a atenção para o
fato de que ela deseja estar mais por conta própria e de que
precisa de mais tranquilidade para conseguir obedecer aos
impulsos internos e estimular o desenvolvimento de sua voz
interior. Na ocorrência de doenças agudas, a voz alta e
exterior fala pela interior, que (ainda) se sente muito fraca.
Trata-se aqui de encontrar uma concordância. Por isso, os
pais devem dar apoio aos filhos pequenos e permanecer ao
lado deles. Não se trata de ficar cantarolando, por exemplo,
nas brincadeiras ou antes de dormir, para acompanhar
canções ou histórias via CDs ou vídeos e DVDs. Mais
necessária seria a voz dos pais chegando individualmente à
criança e estimulando suas próprias fantasias e ideias.
Crianças modernas dificilmente ouvem canções originais ou
sons autênticos, nem de pessoas de referência nem de
instrumentos musicais, que estimulem a vibração e a
integração anímicas enquanto ouvem. Sons “enlatados”
funcionam como a comida enlatada em relação ao alimento
integral, oferecendo apenas um substituto fraco.
Contudo, não é suficiente proibir o acesso aos meios de
comunicação de massa. De fato, às vezes eles também
representam uma possibilidade de fuga para as crianças que
buscam escapar das discórdias domésticas, entre outras
coisas. Uma proibição que não ofereça alternativas melhores
costuma levar justamente à escalada.
De modo geral, na otite aguda a criança é seriamente
afetada, o que requer auxílio rápido. A doença também afeta
todo o seu ambiente, quando ela luta aos berros por atenção
e quer ser ouvida a todo custo e em sua necessidade
interna. Ela já não quer ouvir e ser “toda ouvidos”, mas
expressar sua opinião, por exemplo segundo o lema:
“Ouçam-me! E parem (de brigar?); expliquem-me!” Mesmo
que esse evento se dirija dramaticamente para fora e tenha
um caráter nitidamente apelativo, muitas vezes por trás dele
está o desejo de silêncio e de poder estar presente sem a
obrigação de ouvir.
Ambas as tendências – apelo ao mundo exterior, de um
lado, e necessidade de sossego, de outro – são apenas
aparentemente contraditórias e podem muito bem ser
harmonizadas. Quando grita, uma criança deixa claro que
está farta e a ponto de explodir por causa de tudo aquilo que
é obrigada a ouvir. Como reação, seu conflito se inflama no
ouvido, que é o órgão que recebe o mundo de oscilações.
Tal como a criança, os ouvidos ficam à mercê das
oscilações externas; não são como os olhos, que podem ser
fechados. Nesse sentido, a ordem “abra os ouvidos!” é
bastante superficial, pois eles estão sempre abertos.
Obviamente, essa instrução se refere à audição interna. Por
conseguinte, é muito difícil ter disposição e controle sobre os
ouvidos. Primeiro é preciso aprender, muitas vezes com a
dor, a emprestar conscientemente “seu ouvido” a alguém ou
a torná-lo inacessível aos outros.
Quando uma criança já ouviu demais, sobretudo daquilo
que não lhe faz bem, quando foi sobrecarregada com
estímulos que exigem muito dela, tal como o mundo
moderno os oferece em profusão, e quando desde muito
cedo tem ocupações em demasia, ela pode já não querer
ouvir nem prestar atenção e muito menos obedecer. Às
vezes, as crianças afetadas chegam a tampar os ouvidos,
quase de modo demonstrativo. Elas se fazem de surdas e se
fecham aparentemente a um mundo exterior, com o qual (já)
não querem lidar e, por conseguinte, tampouco se
comunicar. O termo “desarmônico” em latim é absurdus, e,
de fato, a situação se torna um pouco absurda. A criança
passa a fazer barulho porque precisa de sossego.
Obviamente, o todo também pode se dar de maneira mais
branda, quando, por exemplo, ela se faz de surda apenas
com um ouvido. Seria o caso de perguntar, então, em qual e
para qual tema. As razões para o bloqueio podem ser
múltiplas; no gesto inequívoco de tampar os ouvidos, a
situação fundamental é clara: a criança se fecha
agressivamente para o mundo exterior. Se estivesse livre,
ela teria coragem e determinação para ouvir seu interior e
tomar consciência de si mesma – o que, naturalmente,
apenas os adolescentes e os adultos conseguem realizar de
modo ativo e consciente.
Os bebês são um espelho ainda mais nítido de seus pais.
Já conseguem ouvir, mas não obedecer, e os pais muitas
vezes já não aguentam ouvir seus gritos. Devido à pressão
social crescente, eles próprios quase já não ouvem sua voz
interior em relação aos temas pendentes e, não raro,
sobrecarregam seus filhos e a si mesmos, por exemplo,
colocando-os cedo demais no jardim de infância, onde aos 3
anos já aprendem a obedecer e recebem programas de
adaptação, o que, para muitas crianças, é cedo demais e,
para outras, uma boa forma de sair aos poucos do ambiente
familiar para que possam experimentar um pouco de
liberdade e aprender a ter autonomia. Possivelmente, os pais
também são vítimas de um excesso impiedoso de estímulos,
dos quais eles mal tomam conhecimento, pois, no mundo
moderno, eles são automáticos com o cantarolar constante
de músicas superficiais e a falta igualmente notável de
profundidade.
Atualmente, tanto para crianças quanto para adultos, a
exigência budista de colocar guardiões junto aos portões dos
sentidos para não deixar que tudo entre é mais importante
do que nunca. E os “portões” dos ouvidos representam aqui
um desafio especial. O que para as crianças é otite, para os
pais é zumbido. Essa discrepância também informa que eles
tinham muitas preocupações e, devido ao sintoma, foram
obrigados a ouvir sua voz interior para obedecer-lhe em
algum momento. Infelizmente, já tivemos de tratar duas
crianças com zumbido. Também nesse caso há que se temer
no futuro um aparecimento cada vez mais precoce desse
sintoma.
No isolamento doloroso da otite aguda e da efusão do
tímpano, o mundo exterior é bloqueado. Resta direcionar a
atenção para dentro e voltar-se à voz interior depois que as
exteriores se calam. Para tanto, a criança precisaria ter a
ocasião e o respectivo espaço. Os pais que compreendem
essa mensagem poderiam preparar o caminho para que a
criança não fosse obrigada a se refugiar por muito tempo no
sossego e no silêncio internos da efusão do tímpano. É o que
acontece quando os médicos falam de “otites recidivas” –
uma expressão sofisticada para uma recusa terapêutica.
As crianças já não ouvem nem “pertencem ao ambiente”.
Em vez disso, entregam-se a um isolamento forçado pelo
corpo. Não estariam elas se fechando e recusando-se a ouvir
e pertencer a um ambiente que as deixa tão doentes a ponto
de fazê-las estourar? Não teriam absorvido coisas demais e
extravasado muito pouco no que diz respeito às
manifestações de vida, que agora descarregam gritando?
8.3.2 Pressão de dentro e de fora

O tema “obedecer” é vivido e trabalhado sob a máxima dor.


Muitas vezes, ele é aprendido em períodos em que a criança
pequena ainda não consegue entender as coisas no sentido
dos adultos. A consequência é o treinamento comum.
Segundo o lema “quem não quer ouvir tem de sentir”,
muitas crianças aprendem a obedecer por necessidade e à
força. A linguagem não deixa dúvidas quanto ao dilema.
Quando se obedece à força, no máximo desespero da dor, se
aprende no sentido do reflexo condicionado, e não por
compreensão.
Os que têm mais vitalidade poderiam expressar o conflito
na resistência vivida; os que têm menos, em sua
representação como otite. Com isso, sempre sinalizam que a
mediação entre as exigências externas e a compreensão
interna não funciona. Os mais fracos simplesmente se
deixam treinar e, junto com a resistência, também desistem
de muita confiança e esperança.
No ápice das queixas, quando a pressão sobre o tímpano
sensível se torna muito grande, pode ocorrer uma ruptura
espontânea no sentido da chamada perfuração do tímpano.
Esta não é tão ruim quanto muitas vezes interpretam os
médicos acadêmicos; ao contrário, a perfuração do tímpano
alivia momentaneamente a dor, desativando o sintoma
agudo.
Quem sente que vai estourar deveria, como sempre, tentar
resolver o problema no nível figurado. Quem não consegue
extravasar suas necessidades, na melhor das hipóteses terá
o tímpano perfurado e sentirá, pela primeira vez, um alívio
imediato. Outros tipos de “estouro” no corpo logo se tornam
ameaçadores para a vida.
Uma criança que se sente pressionada e talvez de fato
esteja sob pressão em seu ambiente porque, por exemplo,
desde cedo os pais enfatizaram a questão da obediência,
acaba por se libertar dessa pressão, ainda que,
momentaneamente, apenas no nível físico do ouvido. Em
última instância, trata-se, naturalmente, de alcançar esse
alívio e a redução da pressão em sentido figurado. O ideal é
que os pais ajudem seu filho nesse processo, colocando-se
em seu lugar e compreendendo seus desejos e suas
necessidades.
A otorreia que, por fim, geralmente acaba se
estabelecendo não deve ser reprimida de modo algum. Ela
alivia o organismo e, do ponto de vista homeopático,
também é uma excreção desejável. A sucata de guerra que
se produziu no ouvido médio durante o conflito tem de ser
desviada. Mesmo no sentido figurado, aquilo que é velho,
ultrapassado e gasto deve ficar para trás. Simbolicamente, a
otorreia mostra com muita clareza a que ponto uma pessoa
pode “ficar farta” de alguma coisa. Quando isso acontece, a
criança quer se ver definitivamente livre do que a estorva.
Em geral, o tímpano se fecha sozinho depois de algumas
semanas, sem causar problemas. Por meio de seus
procedimentos, os médicos acadêmicos também deveriam
constatar que o todo é pouco afetado. Em otites de
reincidência crônica, eles até utilizam uma técnica para
romper o tímpano, cortando-o em um ponto específico para
a inserção do chamado tubo de ventilação na membrana do
tímpano. Na maioria das vezes, porém, os recursos naturais
são melhores; pelo menos, é a natureza ou o médico interno
a escolher o momento mais favorável.
Logo após a otite, a audição pode sofrer uma redução
considerável devido à efusão do tímpano. Essa redução na
audição revela que o problema (ainda) não está resolvido e
que a criança sente a necessidade de continuar a isolar-se
no nível corporal, pois, no sentido figurado, ainda não
consegue preservar suficientemente seu espaço interno em
relação às exigências externas.
Além do trabalho psíquico, no sentido de compreender
que, em seu íntimo, a criança se volta para si mesma ao
mesmo tempo em que se fecha (através dos ouvidos) para o
mundo exterior, que ela tenta penetrar novos espaços da
consciência e que se esforça para ouvir vozes interiores e
exteriores e aprender a obedecer-lhes, nessas situações
deveriam ser empregados medicamentos homeopáticos
específicos e escolhidos individualmente. Desse modo, é
mais fácil garantir que a audição ruim não prejudicará a
longo prazo o desenvolvimento da linguagem nem o contato
social.
Muitas inflamações começam parcialmente, sendo que o
ouvido esquerdo indica o estresse mais emocional enquanto
o direito indica aquele mais racional. Contudo, elas também
podem passar de um lado para outro ou atingir os dois
ouvidos ao mesmo tempo, o que impede a criança de ouvir e
participar de tudo aquilo que lhe interessa. Obviamente,
nessa situação, ela tampouco irá obedecer.
No consultório pediátrico, as mães quase sempre relatam
uma evolução típica em relação a seu filho, o que simplifica
a escolha dos medicamentos homeopáticos. Assim, muitas
mães aprendem a encontrar sozinhas, logo no início da otite
reincidente, o medicamento adequado. Se isso já é bom, ter
sensibilidade para compreender a situação subjacente é
ainda melhor.
Segundo as descobertas mais recentes da medicina
acadêmica, ministrar antibióticos é um erro, sobretudo
porque, em geral, é totalmente desnecessário e quase
sempre acarreta efeitos colaterais no trato digestório, sem
contar o aumento terrível da predisposição a alergias.
Mesmo pediatras de orientação alopática conseguem bons
resultados com analgésicos e descongestionantes; porém,
de modo geral e comparativamente à homeopatia clássica,
esses medicamentos não são suficientes.
Como agentes desencadeadores externos da escalada do
conflito que implica a audição, a atenção e a obediência, são
considerados banhos de piscina, ficar com a roupa molhada,
vento frio, excesso de esforço físico, irritação, conflitos na
educação. Vacinações precoces também favorecem o
inchaço dos órgãos internos de defesa, como as tonsilas
palatinas faríngeas e as mucosas em geral, o que, por sua
vez, favorece a obstrução do nariz, bem como congestões,
que acabam se propagando no órgão da audição.
Acrescente-se a isso uma intolerância latente ou manifesta à
proteína do leite ou uma alergia. O consumo habitual e
elevado de produtos lácteos em países industrializados
também contribui para a escalada.
Como possível complicação, deve-se considerar a
mastoidite ou inflamação da apófise mastoide, que provoca
um abaulamento do pavilhão auditivo das crianças. Com o
tratamento homeopático adequado, ela quase sempre pode
ser evitada, o que é absolutamente necessário devido ao
perigo da propagação da inflamação para as estruturas
sensíveis da região, como o cérebro. Em quase todos os
casos, isso pode ser evitado com uma interpretação sensível
e um acompanhamento homeopático adequado.
Obviamente, também aqui seria melhor agir
preventivamente, fazendo com que as crianças possam
encontrar outras válvulas de escape que não o tímpano, que
pode estourar, e outras expressões corporais.
 
Perguntas para os pais:

O que nosso filho já não aguenta ou não quer
ouvir (brigas, discussões, excesso constante de
estímulos através do rádio ou da televisão)?

Como ele pode se defender ou deixar claro o que
quer?

Como podemos ouvi-lo melhor?

Em que circunstâncias lhe impusemos situações
para as quais ele ainda não está maduro e que o
sobrecarregaram, e como podemos mudar isso?

Como podemos criar para ele as possibilidades
necessárias para que ele se “liberte”?

No que se refere à obediência, nossas exigências
são adequadas ou excessivas e restritivas?

Como podemos permitir-lhe liberdades novas e
adequadas?

Será que ele precisa de mais tranquilidade? O
que ele já não consegue deixar que se aproxime
dele ou tenha acesso a ele?

Em que situações ele se encontra sob pressão?

Como podemos ajudá-lo a lidar de modo
construtivo com os problemas (a partir dos 2
anos)?

Nosso filho consegue ouvir sons autênticos, por
exemplo, através de instrumentos musicais ou
do canto?

Quando não prestamos atenção na vida?
 
Medidas de apoio:

O “saquinho de cebolas”: pique uma cebola
fresca e coloque-a num lenço de pano, de
maneira que este absorva todo o seu sumo.
Feche o lenço com fita adesiva, para que os
pedacinhos de cebola não caiam. Também é
possível encher uma pequena meia de algodão
com cubinhos de cebola, o que corresponde mais
a um saquinho. Em seguida, coloque o lado
umedecido sobre a orelha afetada e fixe-o com
uma faixa, para que a criança possa mover-se
livremente ou para que o saquinho não
escorregue enquanto ela estiver dormindo.
Muitas crianças também gostam de manter uma
bolsa de água não muito quente na orelha, o que
auxilia na saída dos óleos etéreos. Algumas
crianças, porém, rejeitam totalmente o
tratamento com bolsa de água.
As substâncias ativas da cebola atuam detendo a
inflamação e aliviando a dor. Deixe o saquinho com a
cebola na orelha durante a noite ou troque-o durante
o dia a cada uma ou duas horas por um novo. Esse
procedimento pode ser realizado durante todo o dia,
até as dores melhorarem. Em minha prática diária,
observei verdadeiros milagres quando esse
tratamento era aplicado ao primeiro sinal de dor. Em
algumas crianças, a situação já se atenua depois de
poucas horas. Desde que comecei a trabalhar no
consultório, nunca foi necessário prescrever
antibióticos para esse caso!

Exposição à luz vermelha: a uma distância
segura de cerca de cinquenta centímetros, pode-
se expor a criança à luz vermelha por até vinte
minutos. Esse procedimento pode contribuir
aliviando a dor, mas precisa ser aceito pela
criança. No caso de crianças pequenas, é útil
contar histórias que envolvam a luz vermelha. É
aconselhável distrair a criança lendo para ela em
voz alta.

Gotas para o ouvido só são adequadas se houver
a certeza de que o tímpano não está rompido,
pois, do contrário, o líquido pode chegar ao
ouvido médio. Para tanto, é necessário fazer um
exame com o otoscópio. Soluções caseiras para
pingar nos ouvidos, feitas de óleo de oliva e
sumo de cebola, mas também as gotas de
levístico ou acônito (ambas da Wala) podem
auxiliar. Aqueça o frasco da solução na mão ou
no bolso da calça e pingue apenas de uma a
duas gotas no ouvido da criança. Faça com que
ela permaneça deitada e imóvel por alguns
minutos, para que as gotas não saiam do ouvido.

Gotas para o nariz: é necessário manter o nariz
desobstruído para que o ouvido médio possa ser
mais bem arejado. Nesse sentido, preparados
prontos a partir de uma solução fisiológica de sal
de cozinha, mas também de gotas de eufórbio
para o nariz, da empresa Heel, mostraram-se
eficazes. Mantenha os pés aquecidos com uma
bolsa de água quente.

Perfuração do tímpano: não raro, o tímpano
estoura, produzindo secreções aquosas, com pus
ou sangue. Não há razão para preocupar-se. Não
se deve interromper nem impedir o escorrimento
da otorreia. Ela pode acontecer durante algumas
semanas com intensidade variável e é uma
indicação importante para a escolha de um
medicamento homeopático de apoio, a ser
prescrito pelo homeopata.

Febre: ver o Capítulo 3 “Febre”.

Dificuldade de audição após a otite: nesse caso,
recomenda-se um tratamento homeopático
constitucional. Como medida de apoio,
empregam-se as velas Hopi sempre nos dois
ouvidos, três vezes por semana. As velas acesas
devem ser colocadas na criança deitada (de
preferência, à noite, antes de dormir). Por meio
delas, o tímpano é suavemente massageado e
aquecido, o que pode aliviar a retenção de
secreção e trazer “movimento” para a situação
crônica de congestão. O tratamento com velas
nos ouvidos deve ser realizado durante, no
mínimo, de quatro a seis semanas e não
representa nenhum problema quando se
esclarece com carinho à criança sobretudo para
que serve o procedimento com a pequena
chama. Na maioria das vezes, a criança fica tão
relaxada que acaba adormecendo durante o
tratamento, o que o facilita ainda mais. De
maneira alguma retire os restos da vela com
cotonete! Ao longo de todo o tratamento, é
recomendável que o procedimento seja
acompanhado de escalda-pés (descrito no tema
“enurese” [seção 15.2]), a fim de estimular o
sistema imunológico.

Auto-hematoterapia potencializada: ver a seção
“11.2 Dermatite atópica e crosta láctea”.

8.4 Medicamentos homeopáticos para dor de ouvido

Aconitum C30 Belladonna C30


Tipo de dor Repentina, noturna, provocada Repentina, intensa, contrativa,
por vento frio e seco, intensa latejante, pulsante, geralmente
à direita
Aspecto Rosto vermelho, Cabeça vermelha, pupilas
eventualmente apenas uma dilatadas, pele úmida e
bochecha vermelha, pavilhão quente, mãos e pés frios
auditivo vermelho
Melhora com Repouso Cabeça levantada, repouso
Piora com Deitar do lado dolorido Cabeça abaixada; frio; à tarde;
à noite; estímulos como
barulho, toque, corrente de ar
Disposição Ansioso, inquieto, com Sensível, irritado
palpitações, sensível ao
barulho, assustadiço
Sintomas Febre alta, muita sede, Estiramento devido à dor,
colaterais sem suor dor de garganta frequente,
geralmente sem sede
 
Ferrum phosphoricum C30 Chamomilla C30
Tipo de dor Início lento, poucos sintomas, Intenso, insuportável
à direita
Aspecto Geralmente pálido Uma bochecha vermelha;
a outra, pálida; pele quente
e úmida
Melhora com Aplicações frias, ar fresco, Ser carregado no colo
gotas frias para o ouvido, ao
longo do dia
Piora com À noite Toque, à noite, calor
Disposição Quase não é afetada Histeria, não se contenta
com nada, rejeita tudo, irado,
furioso, de mau humor
Sintomas Em algumas fases, bochechas A criança não se deixa
colaterais com manchas vermelhas, examinar; durante a dentição
apenas febre moderada
 
Apis C30 Pulsatilla C30
Tipo de dor Pungente, ardente, gritos Pungente, em ondas, não tão
estridentes intensa, à esquerda
Aspecto Inchaços edematosos no Nada que chame a atenção
rosto, junto às pálpebras, ou
no pescoço, junto à úvula
Melhora com Compressas frias, ar frio, Consolo, ar fresco
bebidas frias
Piora com Calor, à noite Quarto quente, calor da cama
Disposição A criança parece A criança fica chorosa, precisa
visivelmente doente da atenção da mãe
Sintomas Totalmente sem sede, urina Sem sede, sensação de
colaterais pouco, o tímpano está estirado ouvido congestionado, dores
em alto grau e disposição variáveis
 
Lachesis C30
Tipo de dor Inicialmente, intensa do lado  
esquerdo; depois, também do
lado direito
Aspecto Nada que chame a atenção  
Melhora com Ar fresco, ficar deitado sobre a  
orelha afetada, bebidas frias
Piora com À noite, ao acordar, calor,  
toque na barriga
Disposição Sequências de ciúme e  
rivalidade com os irmãos,
emoções intensas, fala muito
Sintomas Não tolera roupas apertadas  
colaterais na barriga e no pescoço; põe
o dedo no ouvido

8.5 Dor de garganta


“Engoli o suficiente.”
 
A garganta é o local por onde o ar e o alimento são
assimilados e onde ocorrem a ligação e a comunicação com
o mundo exterior através da linguagem. Quando há dor de
garganta, a passagem estreita é palco de uma árdua
batalha. Um caso agudo de amigdalite pode provocar dores
consideráveis e bloquear amplamente a deglutição. Em
casos crônicos, com as tonsilas palatinas muito inchadas, a
qualidade de vida é constantemente prejudicada. A vida
torna-se estreita na região da garganta. Com o inchaço e o
fechamento do espaço, surge naturalmente um
estreitamento que produz medo.
As tonsilas palatinas são como fortes que protegem um
vau. Quando nelas ocorre uma rebelião, elas incham e
tornam a deglutição dolorosa. Essa dor pode ser tão intensa
que a criança, por fim, se recusa a deglutir. Em sentido
figurado, ela não aceita mais nada, ou melhor, já não quer
engolir como até então. A pobre criança, a quem até agora
nada mais resta, começa a lutar agressivamente. Nesse
período precoce, é natural que se tenha de deglutir em
muitos níveis e que as repreensões dos pais sejam
determinantes. Mas os tempos mudam para as crianças mais
rápido do que para seus grandes protetores, que às vezes só
percebem isso tarde demais.
Para os pais, trata-se de descobrir o que seu filho luta para
recusar e o que “fica entalado em sua garganta”. Eles
verificariam as poucas possibilidades de que a criança
dispõe para se servir de sua opinião ou manifestar sua falta
de vontade. Com o tempo, ela precisa aprender a expressar
sua agressividade não apenas fisicamente, por meio da
febre, mas também a defender-se de outro modo e aceitar
novos desafios e provocações, isolando-se e fechando-se
declaradamente quando sentir necessidade. O objetivo a
longo prazo precisa ser o de aprender a dizer logo cedo, de
modo incisivo e corajoso, “não” ou “sim, eu quero”. (Outras
interpretações encontram-se na seção “4.9 Escarlatina”.)
 
Perguntas para os pais

O que nosso filho já não consegue deglutir ou
aceitar?

Por que ele se fecha?

Como podemos ajudá-lo a decidir sozinho o que
ele quer “engolir” e contra o que tem de se
defender?

O que está entalado na garganta do nosso filho?

Por que ele não consegue se defender de outra
forma?

Do que ele precisa se isolar?
 
Medidas de apoio:

Renunciar ao leite e ao iogurte.

Dar para a criança chupar sorvete de fruta feito
em casa, com suco de frutas diluído.

Fazer gargarejo com chá de sálvia (impede o
crescimento de bactérias, vírus e fungos). Dar
três gotas de Symbioflor 1. Deixar que a criança
chupe balas de sálvia sem açúcar.

Tintura de própolis: dez gotas em um copo
d’água para fazer gargarejo.

Tintura-mãe de tormentilha: dez gotas em um
copo d’água para fazer gargarejo.

Chá de tília: para fazer suar.

Umckaloabo: dosagem de acordo com a idade
(ver instrução na embalagem).

Bandagens: com queijo quark, cebola ou sal,
compressas com a solução pronta “Retterspitz”.
Bandagens com batatas: amassar batatas muito
quentes ou quentes e com elas fazer uma
compressa (para estimular o escoamento da linfa
e obter um bom efeito em dores de garganta que
reagem ao calor).

8.6 Resfriado
“Estou com o nariz muito entupido.”
 
Quem tem o nariz congestionado fica indiferente à vida e
não encontra gosto em mais nada, pois está “constipado”. A
ansiada fuga da situação de crise ocorre com a “vedação” de
todas as entradas, para “nada mais ouvir nem ver”. Nos
bebês, acrescenta-se o agravante de que, com o resfriado e
o nariz constipado, eles não conseguem mamar direito no
seio materno. Com a mamadeira é um pouco mais fácil.
Antigamente, as crianças emagreciam visivelmente por
causa disso; hoje, as gotas para o nariz costumam impedir
seu emagrecimento.
Identificar um conflito no lactente não é tão fácil. Às vezes,
ocorre uma perturbação da simbiose com a mãe. O mais
provável é que o bebê esteja farto da mãe, pois ainda nada é
muito importante para ele. Possivelmente, ele já não
consegue sentir o cheiro nem o gosto da mãe (do seu leite).
Ao contrário do que acontece com os adultos, ele só
consegue expressar essa repugnância ou até aversão
através do corpo. Só que isso aumenta a dramaticidade
daquela que talvez seja a primeira doença em sua vida.
Quando o bebê não se desenvolve, geralmente a relação
com a mãe tampouco é bem desenvolvida, e ele só
consegue expressar isso se fechando, uma vez que não
consegue articular-se de outra forma.
A limitação da comunicação é evidente. O nariz está
tampado, os brônquios também tendem a se fechar, a
garganta está cheia. Igualmente nesse caso, a recusa é
clara. Quando um bebê, cujas principais ocupações na vida
são dormir e mamar, “já não quer engolir”, a profundidade
do distúrbio não deixa dúvidas.
Quando essa situação vem acompanhada de tosse, a
resistência agressiva é ainda mais clara. O bebê “tosse”
alguma coisa para seu ambiente, ou seja, para a mãe. O
resfriado obstrui o olfato; a amigdalite obstrui a deglutição; o
catarro auricular, ao fechar a tuba auditiva, bloqueia a
audição. Quando a criança ainda é acometida pelo calor da
febre, tudo volta a fluir mais rapidamente, e o nariz que
estava constipado passa a escorrer continuamente. Assim, a
vida da criança também pode voltar a fluir.
Os bebês encontram-se em elevada ressonância com a
mãe e, muitas vezes, por meio dessa proximidade,
vivenciam coisas de que mães exaustas não conseguem dar
conta – por exemplo, quando se retraem devido ao excesso
de exigência e às poucas horas de sono. Esse “isolamento
espontâneo” logo preenche dois critérios: ele reflete a
problemática da mãe e garante sua preocupação e sua
atenção redobradas, que, nessa idade, são uma questão de
sobrevivência. Nesse caso, é importante não confundir trocar
a quantidade de tempo com a qualidade emocional, ou seja,
por um lado, a mãe deve dedicar-se de fato, mas, por outro,
não deve sentir a consciência pesada ao deixá-lo com
alguém para cuidar de si própria por um tempo.
A tarefa dos pais consiste em fazer a vida da criança e sua
própria fluir novamente e perceber os conflitos que a criança
só consegue expressar por meio de sua linguagem de
sintomas. O nariz escorrendo e a expectoração devem ser
entendidas e estimuladas como formas de limpeza, e não
impedidas. Os bebês normalmente espirram muito, a fim de
liberar o nariz, o que deve ser entendido como um reflexo
fisiológico, uma vez que ainda não conseguem assoar. As
gotículas saem do nariz com a velocidade de projéteis, o que
enfatiza o efeito de alívio do espirro. Uma indicação tão
banal quanto importante é a de aquecer os pés da criança.
Outra dica ainda mais importante é pingar leite materno
(ou Symbioflor) no nariz do bebê para normalizar a situação
no que diz respeito aos vírus envolvidos ou restabelecer a
simbiose em nível microbiológico. Obviamente, é decisivo
que essa simbiose seja restaurada do ponto de vista
psíquico.
 
Perguntas para os pais e medidas de apoio:

Ver a seção “8.7 Sinusite”.

8.7 Sinusite
“Continuo com o nariz entupido!”
 
Os seios paranasais são câmaras de ar que fazem parte do
crânio e que, ao permitirem a entrada do ar, tornam-no mais
leve e o arejam. Se não existisse e seu lugar fosse ocupado
por ossos maciços, a cabeça seria insuportavelmente
pesada. Com os seios nasais livres e arejados, a percepção
da vida também fica mais leve. A boa circulação de ar traz
vitalidade e leveza para a vida. Se, ao contrário, estiverem
cheios de secreção e permanecerem muito tempo
constipados, a vida fica pesada e nos “puxa para baixo”.
Friedrich Graf descreve os seios paranasais como os
porões da alma para as lágrimas contidas. Quando a criança
chora, é natural que seu nariz fique constipado. Quando seu
nariz se mantém constipado no sentido de uma sinusite
crônica, ele também se fecha para um represamento de
lágrimas, especialmente na fase em que nada flui ainda. A
sensação é de estar “tampado”. Quando o nariz volta a
funcionar, ou seja, quando as secreções voltam a fluir, a
pressão nos seios paranasais também cede. Nesse
momento, o represamento psíquico também deve escoar.
Naturalmente, é muito mais difícil descobrir na criança
pequena por que o nariz fica sempre constipado. A esse
respeito, remetemos ao capítulo sobre a predisposição a
infecções. Também trato esse tema com mais detalhes no
livro A Agressão como Oportunidade.
O importante é ter claro em mente que o resfriado em
bebês ainda pode não ser uma sinusite, pois, geralmente,
neles os seios paranasais não são arejados. Como esses
seios se desenvolvem apenas no decorrer da infância, uma
sinusite maxilar, por exemplo, só é possível a partir do
quarto ano de vida. As células do etmoide já existem no
nascimento e, a partir do segundo ano de vida, podem ser
acometidas por agentes patogênicos. No entanto, uma
sinusite frontal só é possível a partir do sexto ano de vida, e
uma infecção do seio esfenoide, dos 8 aos 10 anos. Por
conseguinte, uma criança com menos de 2 anos ainda não
pode ter uma verdadeira sinusite. Portanto, nariz constipado
em recém-nascidos e bebês corresponde a um resfriado
“banal”.
 
Perguntas para os pais, especialmente para a mãe (de
crianças acima de 1 ano):

O que meu filho (ou eu mesma) já não aguenta?

O que faz com que ele se feche em tantos
níveis?

Por que ele demonstra essa agressividade
(contra mim)?

Quando reprimo minha agressividade?

Para o que ele quer ser fechar? Para o que eu
quero me fechar?

O que perturba nossa ligação?
 
Medidas de apoio:

São eficazes as mesmas medidas mencionadas
nos temas “predisposição a infecções” (8.1),
“tosse e bronquite” (9.1), “otite” (8.3) e “dor de
garganta” (8.5).

8.8 Anel de Waldeyer, pólipos


“Deixem-me em paz!” – “Não me olhe com essa cara de
bobo!”
 
A natureza protegeu bem os portões superiores de entrada
do organismo com o chamado anel de Waldeyer, cuja função
é impedir que um corpo estranho e nocivo à saúde possa
entrar. Essa fortaleza em forma de anel, que protege o
espaço interno e tem a característica de também consistir
essencialmente em tecidos linfáticos, pertencentes ao
sistema imunológico, conta com adenoides e tonsilas
palatinas, responsáveis pela clássica amigdalite. Com
frequência, ambas causam problemas, e, ao extraírem as
primeiras, os cirurgiões aproveitam para extrair as outras
também. Quando saudáveis, passam despercebidas na
cavidade faríngea; porém, quando incham e se proliferam,
podem causar irritação em forma de pólipos. Estes podem
aparecer em diversos pontos, mas nada mais são do que as
adenoides cronicamente ampliadas.
Por ocuparem certo espaço em um local sensível, as
adenoides podem favorecer a otite (Otitis media). De fato,
elas obstruem as chamadas trompas de Eustáquio (tubas
auditivas), que são responsáveis pelo arejamento do ouvido
médio até a faringe. Como essa obstrução pode estender-se
à abertura dos seios paranasais, muitas vezes as adenoides
também são responsáveis pela sinusite crônica. Na prática, é
comum que os pólipos venham acompanhados por um
aumento crônico das tonsilas palatinas, o que bloqueia em
grande medida os acessos superiores do corpo e torna
bastante evidente o problema já existente de defesa.
Por trás do acréscimo desses problemas pode estar, em
grande parte, a política excessiva de vacinação. As
vacinações devem proteger as crianças, mas, na prática,
acabam conduzindo a reações excessivas do tecido
imunológico dessa região, que podem chegar a uma
proliferação descontrolada. Por outro lado, a vacinação tira o
trabalho das defesas do corpo e, nesse sentido, tem a
desvantagem de impedir que elas sejam treinadas. Nesse
fato poderia residir uma das causas que contribuem para o
aumento das alergias, que, por sua vez, também se baseiam
em respostas imunológicas excessivas. A autodefesa do
corpo, na qual a medicina acadêmica confia tão pouco,
mostra, por assim dizer, todo o seu repertório. Visualmente,
ela se forma de maneira grandiosa, mas, funcionalmente,
pouco eficaz em alguns pontos, que, embora importantes do
ponto de vista simbólico, logo se tornam problemáticos para
o corpo.
Pediatras antroposóficos partem do princípio de que, nas
crianças afetadas, ocorre uma discrepância entre o
crescimento psíquico e aquele físico. Por conseguinte, elas
permanecem atrasadas no que se refere à alma. Quando
interpretamos o quadro sintomático, vemos que o corpo
mostra um crescimento que deve ser substituído pelo
desenvolvimento psíquico ausente, tal como ele sempre se
torna palco para aqueles temas que são desfavorecidos na
consciência. Portanto, a tarefa seria aprender a defender-se
animicamente, ou melhor, a defender seus acessos. Além
disso, a criança tem de conseguir observar por si própria o
que ela permite entrar e sair em termos de energia mental,
mesmo que, muitas vezes, isso seja difícil para muitos
adultos. Mundos mentais são simbolizados pelo elemento ar,
e aqui nos referimos aos pólipos, que obstruem as vias de
arejamento tanto do nariz quanto do ouvido médio. Mais
abaixo, na região das tonsilas palatinas, que, quando
dilatadas, dificultam a deglutição, trata-se mais da entrada
de coisas materiais, ou seja, de alimento e outros
fragmentos sólidos.
Outras expressões para o sintoma dos pólipos são “a
proliferação das adenoides”, “hiperplasia adenoideana” ou
simplesmente “adenoides dilatadas”. Trata-se de uma
ocorrência crônica típica para a idade. Tudo se desenvolve
devagar, assim como as crianças. Nesse caso, dar-se tempo
é uma das grandes tarefas de aprendizado que custam
tanto, especialmente aos pais em nossa sociedade moderna.
Nessas situações, geralmente a mucosa nasal encontra-se
cronicamente inchada, ou seja, nessa base, as crianças
estão sempre com o nariz congestionado. Os pólipos podem
ser em forma de gotas, mas também estruturas planas ou
até mesmo pedunculadas, feitas de mucosa, tecido
conjuntivo ou linfático, que obstruem os seios nasais e
paranasais.
Até agora, o tema foi atual principalmente entre o quarto e
o sexto ano de vida; porém, nesse meio-tempo, aparece
cada vez mais já a partir dos 2 anos; ou seja, a situação de
defesa das nossas crianças torna-se problemática cada vez
mais cedo, e os mundos das ideias são bloqueados já no
início da vida.
Como as crianças afetadas precisam respirar de boca
aberta, as vias respiratórias se ressecam, sobretudo à noite,
aumentando a predisposição a infecções. Nada resseca mais
do que o vento e, naturalmente, o ar da respiração. Durante
o dia, o ar frio e seco, que não é pré-aquecido nem
umedecido pelo nariz, agrava ainda mais a situação. De
modo geral, por um lado, o sono se torna menos reparador
e, por outro, com a respiração, a principal fonte de energia
tende a perder força. Desse modo, entram em ação aqueles
círculos viciosos de que sofrem tantas crianças e tantos pais
de nosso tempo.
Um dos principais problemas subjetivos para os pais em
questão é a expressão facial, que, devido à boca sempre
aberta, sugere poucas capacidades intelectuais nos filhos e
quase um retardo mental. Essa expressão um pouco apática
e estupidificada magoa muitos pais. Desse modo, seria
importante compreender que essas crianças que têm um
desenvolvimento atrasado podem ser muito inteligentes e
recuperar-se em grande medida quando tratadas
corretamente.
Elas não apenas causam essa impressão, mas são de fato
atrasadas e têm dificuldade de compreensão; no entanto,
não são bobas. Esse efeito está relacionado sobretudo ao
fato de que ainda vivem muito mais da intuição do que do
intelecto. A tarefa prioritária, resultante dessa situação, é
dar-lhes tempo para que cresçam no nível mental, talvez
estimulando-o, mas sem forçar a criança a nada. Nesses
casos, é de grande auxílio aceitar as repetições das crianças
e aprender a avaliar seu modo ingênuo e manifestamente
infantil. Quando os pais admitem a lentidão com consciência,
geralmente, em um ambiente cercado de amor, essas
crianças com desenvolvimento tardio conseguem recuperar
muito melhor os passos atrasados do desenvolvimento
mental do que com auxílio profissional. Os pequenos
príncipes e as pequenas princesas precisam do seu tempo,
tal como Antoine de Saint-Exupéry descreveu de modo
inimitável; só precisamos conceder-lhes esse tempo.
Pela aparência, muitas vezes se trata de típicas “crianças
lunares”, um pouco gordinhas e apáticas, que gostam de
ficar agarradas à barra da saia da mãe. Extremamente
afeiçoadas, costumam se apegar à situação em que se
encontram (aos primeiros estágios). Quando o problema
persiste no período escolar, naturalmente também tendem a
não avançar, ou seja, não passam de ano e, portanto, não
são promovidas nem estimuladas. Em vez disso, ficam à toa,
tal como expressa metaforicamente sua mandíbula
hipotônica (flácida e distendida). Quem tem a mandíbula
caída e “já não consegue fechar a boca” causa uma
impressão de surpresa e extremo cansaço, e ambos
acontecem com essas crianças.
Antes de tudo, elas precisam de tempo, como o pequeno
príncipe, que também encara o mundo adulto,
singularmente hiperativo, sobretudo com surpresa e
perplexidade, mas também com pouco dinamismo. Com seu
desamparo evidente e sua tendência a apegar-se, elas
reclamam ajuda e apoio, atraindo os pais a fazer muito
nesse sentido. Fracas e carentes de apoio, o que se abate
até mesmo em seu tecido hipotônico, sua primeira tarefa,
com o auxílio dos pais, seria deixar que sua criança interior
vivesse e crescesse, a fim de reaproximar seu corpo e sua
alma.
Além disso, seus órgãos de defesa ampliados
(hipertrofiados) indicam outras tarefas: aprender a defender-
se mais do ponto de vista psíquico e desenvolver a
autonomia. Quando a criança toma consciência de si mesma,
ela também precisa estar em condições de se isolar do que é
estranho e de reconhecer “o que é bom e o que é ruim”.
Esse tema, bem como um ou outro aspecto adicional,
também pode ser bem identificado no nariz e em seu
significado simbólico. Enquanto nos adultos o nariz incorpora
o poder, o orgulho e a sexualidade, o nariz pequeno e
arrebitado das crianças em geral é considerado gracioso,
mas quase não é percebido individualmente como
pertencente ao esquema de aspectos infantis. Na criança, o
nariz ainda é pouco característico, ou seja, ainda não é
exatamente algo próprio a ela, mas reflete, antes, a tarefa
da criança de crescer a partir do coletivo e soltar-se da mãe,
a fim de desenvolver sua própria autonomia. Quando muito,
um nariz arrebitado, que aponta de modo impertinente para
a vida, poderia representar uma criança especialmente
atenta. Mas este não é o caso quando há problemas com
pólipos.
Essas crianças não chegam sequer a desenvolver o
paladar, pois, estando sempre com o nariz congestionado,
não percebem os aromas. A mãe segue sentindo o gosto da
comida por elas, que não conhecem o sabor da vida. Em
outros termos, a mãe continua a determinar, e a criança
recebe poucos impulsos de crescimento. Ela ainda não
descobriu o próprio gosto e confunde o apego à barra da
saia da mãe com a vida.
Estar com o nariz congestionado, não sentir o cheiro nem o
gosto de nada e ouvir mal é uma estratégia (infantil) de
recusa. A razão poderia estar em diversos estímulos
estressantes, que a vida moderna oferece em profusão.
Contudo essas crianças não precisam de uma multiplicidade
de tarefas modernas; ao contrário, têm de aprender uma
após a outra. Conforme demonstrado não apenas por
pesquisas recentes, esta seria, de resto, uma estratégia mais
bem-sucedida também para os adultos.
Quem não consegue sentir o cheiro da vida e (desde cedo)
já tem o nariz congestionado, também acaba revelando uma
aversão a determinadas pessoas, a circunstâncias atuais de
vida ou a todo um ambiente. Isso mostra que as pessoas
afetadas já se sentem fartas e sobrecarregadas desde cedo.
O perigo reside no boicote inconsciente à própria vida, o que
se exprime na estagnação ou na hesitação do
desenvolvimento e, caso não seja notado, pode levar a uma
obstinação considerável. As crianças fazem greve, por assim
dizer, contra um mundo que as sobrecarrega e
superestimula com sua pressa e sua pressão.
Nesse ponto, é interessante notar que, embora os
sintomas aumentem, as crianças que frequentam jardins de
infância Waldorf são amplamente poupadas desse efeito. Em
vez de sobrecarga e agitação, essas escolas oferecem
exercícios leves de ritmo, dedicação e atenção com
sensibilidade em relação à velocidade individual de
desenvolvimento, seguindo a doutrina de Rudolf Steiner, que
partia do princípio de que toda vida é ritmo.
O elemento crônico desse quadro clínico aponta para um
conflito duradouro com a respectiva falta de energia, que sai
da imobilidade e, na prática, do obstáculo à respiração, para
seguir por caminhos errôneos. A comunicação bloqueada
indica a necessidade de se limitar ao essencial.
De certo modo, as pessoas afetadas permitem que seu
nariz se feche. Já não ficam fungando como um coelho
curioso e intrometido, mas estão bloqueadas. Já não
recebem ar fresco o suficiente e, com ele, intercâmbio e
comunicação. Quem não respira pelo nariz tampouco
consegue cheirar, fungar ou farejar. Não desenvolve um
“bom nariz” para as coisas importantes da vida. Por
conseguinte, tampouco sente seu gosto. Escapam-lhe o
“bom faro”, a intuição e a percepção. Como lhe falta a
capacidade de sentir os aromas, todo alimento lhe parece
igualmente insosso. Quem tem dificuldade para sentir o
cheiro e o gosto das coisas porque está sempre com o nariz
congestionado tende a uma vida monótona, pois lhe falta o
“sal”.
Os ouvidos podem ser comprometidos, devido à má
ventilação e, portanto, à tendência ao bloqueio da cavidade
timpânica. Com um ouvido médio prejudicado, entra em
questão a temática da audição, da atenção e da obediência,
e o contato com o ambiente torna-se indistinto e
problemático. Não raro, a expressão lânguida e
desconcentrada de quem “tem dificuldade para
compreender” tem sua origem em certa dificuldade de
audição, provocada pela situação. Quando este é o caso, a
criança fica apartada das vibrações e, em última análise, de
todas as percepções sensoriais originais e vive uma vida
manifestamente insensível aos sentidos que, portanto, logo
se torna absurda.
 
Perguntas para os pais:

Ver a seção “8.9 Complementação homeopática
a partir da concha”.
 
Medidas de apoio:

Possibilitar o amadurecimento interno e
disponibilizar o tempo necessário para isso como
tarefa prioritária dos pais.

Nessa fase, poupar a criança de exigências
excessivas e frustrações ou, eventualmente, de
limitações muito grandes e superproteção, que
também poderiam contribuir para a boca aberta
e a expressão perplexa; em vez disso,
disponibilizar um lar ideal.

Descobrir os conflitos crônicos na comunicação
com o ambiente e, quando possível, eliminá-los.
No lugar deles, tentar limitar com sabedoria os
estímulos e a comunicação.

No jardim de infância, com a consciência
adequada, o crescimento psíquico poderia ser
incentivado para que as crianças conseguissem
se defender sozinhas. Além disso, esse é o local
em que provavelmente elas perceberão pela
primeira vez que nem sempre podem contar com
a mãe e que sua vida sai ganhando e torna-se
mais bonita quando elas próprias desenvolvem
sua curiosidade em relação ao novo – como
convém a crianças interessadas e que tudo
querem saber. Para tanto, porém, o mundo
anímico precisa primeiro se tornar acessível no
verdadeiro sentido do termo, ou seja, aberto,
para que a criança o perceba e o conquiste com
todos os sentidos.
Muitas vezes, essas crianças não têm vontade de ir
ao jardim de infância, não querem ficar por conta
própria nem sem a mãe; gostam de ser
dependentes, demoram-se em qualquer atividade e,
pelo que demonstram, ficam intencionalmente para
trás. Isso vale, pelo menos, enquanto a primeira fase
da proteção e do calor do ninho para os pequenos
príncipes e princesas ainda tiver de ser mantida.
Nesse caso, seria ideal buscar auxílio na homeopatia
para o desenvolvimento, a fim de harmonizar o
crescimento psíquico e o físico.

Deve-se protelar o máximo possível a extração
dos pólipos através de cirurgia, pois, na maioria
das vezes, eles voltam a crescer dentro de um
ano e, a partir do sétimo ano de vida, se
reduzem por si sós. Contudo, é preciso seguir um
tratamento de apoio no sentido da interpretação
e da homeopatia. Por certo, deixar que uma
criança passe um ano inteiro com uma
expressão facial estupidificada e abobalhada não
é uma solução e, a longo prazo, só prejudica o
desenvolvimento.
Em vez disso, seria importante estimular a
capacidade de surpreender-se, permitir a obstinação,
cuidar para que haja tranquilidade e silêncio em
meio ao fluxo da vida familiar, compensar o
crescimento exagerado no nível do corpo com
estímulos no nível da alma e ajudar a criança a
entrar em contato e aproveitar o mundo com todos
os sentidos. Desse modo, ela também conseguirá se
abrir, em sentido figurado, com as próprias forças –
afinal, a boca cronicamente aberta já revela que é
isso o que ela quer – para absorver novas
impressões e ter as próprias experiências,
desenvolver um bom “faro” e encontrar gosto pela
vida. Quando voltar a ouvir bem, também obedecerá
espontaneamente e conseguirá desenvolver sua
intuição.

8.9 Complementação homeopática a partir da concha


De acordo com a ideia de Paracelso, que muito antes de
Hahnemann formulou o princípio da homeopatia “Similia
similibus curentur” (“o semelhante se cura pelo
semelhante”), para tudo e todos é possível encontrar uma
erva que cresce em sua proximidade ou um meio para o
respectivo quadro sintomático. De Paracelso também
provém o conhecimento de que a melhor farmácia do
médico são os campos e prados do ambiente. Nesse sentido,
o medicamento homeopático Calcium carbonicum, que se
encontra por toda parte em nosso ambiente como calcário
comum, é um medicamento ideal. Em sua representação, as
crianças descritas anteriormente tornam-se ainda mais
evidentes. Hahnemann obtinha o calcário a partir das
conchas, e as crianças de cálcio precisam de sua concha, da
casca dura, para que seu núcleo macio possa amadurecer
lentamente. Elas querem permanecer em casa e desfrutar
de seu ritmo familiar; adoram repetir os mesmos rituais. As
histórias antes de dormir e a comida igual criam aquela
confiança de que precisam para crescer. Sua necessidade de
proteção é proverbial, a mãe que as alimenta deve estar
sempre por perto, e sempre no momento certo. Com seus
sintomas, as crianças freiam os pais, que devem examinar a
própria rapidez e, sobretudo, a ambição em relação ao filho.
Ainda que as crianças tenham uma aparência
estupidificada, geralmente elas não o são; ao contrário,
costumam ser muito inteligentes, mesmo com um
desenvolvimento tardio. Com seu simples modo de ser, elas
questionam as pretensões dos pais e a pressão da
sociedade. Atualmente, todos querem coisas demais e com
demasiada rapidez. As crianças de cálcio não são assim.
Mark Twain expressou isso com precisão em uma frase das
Aventuras de Huckleberry Finn: “Mal tínhamos perdido o
objetivo de vista, dobramos a velocidade”. As crianças de
cálcio precisam exatamente do contrário, ou seja, de um
objetivo e de tempo para alcançá-lo.
Desse modo, em muitos aspectos, o período inicial da vida
para todas as crianças é um período de cálcio. Se nessa fase
do ninho ou da concha houve pouco ritmo e ritual, mais
tarde será preciso recuperá-los e obtê-los por meio da
hesitação da criança. A criança de cálcio pode ser muito
obstinada. Precisa do seu tempo e do seu espaço e,
paulatinamente, também de estímulos leves para seu
crescimento. No momento certo, é preciso cortar o cordão
umbilical com cuidado, para que, aos poucos, ela aprenda a
andar sozinha e a traçar seu próprio caminho (na vida).
Seus passos têm de conduzi-la para longe da mãe, que,
nesse momento, também precisa aprender a se soltar da
criança. Se a criança permanecer agarrada à barra da saia
da mãe, continuará tola por toda a vida, pois sempre contará
com ela. Se não aprender a caminhar sozinha, irá se fechar
ainda mais para a amplidão do mundo, e este lhe fechará as
portas.
Tal como a ostra amorfa, no início, a criança precisa da
concha como suporte, lar, pátria e casulo. Nesse período, as
crianças sentem muita falta do lar, ainda vivem totalmente
do ventre (amorfo), e não das circunvoluções cerebrais
diferenciadas, que se formarão posteriormente e, de todo
modo, podem predominar. A tarefa torna-se clara na imagem
da casca e reside na separação da mãe, a fim de adquirir
sua própria forma e sua própria firmeza.
Outros sintomas se adaptam irrestritamente a esse
modelo. As crianças são fleumáticas e até lentas, têm uma
aversão pronunciada a toda alteração e, por isso, temem
conflitos. Tendem em grande medida a resfriar-se, mas será
que sofrem realmente com isso? Ter o nariz congestionado
corresponde à sua natureza, assim como a constipação
frequente tampouco lhes causa dor. Ser segurado no colo é
sentido como algo agradável, e ficar agarrado à mãe dá
prazer. É interessante notar que essas crianças tendem a
gostar de ovos pouco cozidos, nos quais a gema mole se
encontra dentro da casca dura. Assim, naturalmente
também adoram leite (materno), que, na verdade, deveria
ser deixado de lado com a infância, e, por conseguinte,
tampouco querem deixar de mamar no peito. Como crianças
que se desenvolvem tardiamente, sua fontanela, a junção
para cima, costuma permanecer muito tempo aberta. No
nível figurado, elas se ocupam cedo de anjos e outras
entidades, bem como da morte. Todo o restante tem de
esperar, como o nascimento dos dentes, mas também
aprender a andar e falar. Elas têm e muitas vezes mantêm
uma forte ligação com a Lua, e geralmente a Lua cheia piora
sua situação, assim como o aspecto materno piora tudo
quando seu período já foi ultrapassado.
Quando recebem os tempos necessários e flexíveis, o
consolo de que precisam, o cuidado harmonioso e proteção
em sintonia com suas exigências, nelas pode se desenvolver
uma pérola, e seu esforço e sua capacidade se mostrarão
mais tarde na vida, quando o intelecto predominar sobre o
ventre. Talvez permaneçam lentas, mas se tornarão
inteligentes e persistentes e poderão brilhar à sua maneira
especial. Assim como se deve colocar a pérola sob a luz
certa para se poder desfrutar de seu brilho, as crianças de
cálcio também querem ser olhadas do modo adequado. Mas
isso elas compartilham com todas as crianças do mundo.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho está com a boca sempre
aberta e o nariz sempre congestionado? Como
podemos ensinar nosso filho a se surpreender?

Do que ele se defende?

Reconhecemos seu estágio de desenvolvimento
de maneira realista? Até que ponto somos
dependentes de normas?

Como podemos ajudá-lo a usar as vantagens de
sua velocidade individual? Por que ele é mais
devagar do que esperamos?

Quais outras formas de defesa ele pode
aprender?

O que ele quer nos dizer com tudo isso? Como
ele se comporta com os temas “paciência” e
“impaciência” em nossa família?
 
Medidas de apoio:

Lavar o nariz com sal: colocar uma colher de chá
cheia de sal em meio litro de água morna
(temperatura do corpo) em um pote para
lavagem nasal. Inclinar a cabeça para o lado e
introduzir o bico do pote em uma das narinas,
levantando-o o suficiente para que a solução
passe pelo nariz, lave a extremidade posterior do
septo nasal e saia pela narina oposta. Enquanto
se realiza a lavagem, deve-se respirar pela boca.
Caso a água caia na garganta, deve-se cuspi-la.
Por fim, assoar bem o nariz e, em seguida,
repetir o procedimento do lado oposto. Essa
medida é muito eficaz, embora no início seja
sentida como incômoda por todos que a
empregam.

Aplicações de Kneipp: ver a seção “8.1
Predisposição a infecções – baixa imunidade”.

Beber com canudo e deixar fazer bolhas de
sabão: para que a boca seja fechada.

Reforçar o sistema imunológico: ver a seção “8.1
Predisposição a infecções – baixa imunidade”.

Escalda-pés: descrito no tema “enurese” (seção
15.2).

Evitar leite e produtos lácteos.

Mastigar intensamente: alimentação à base de
vegetais crus, produtos integrais e gomas de
mascar adequados, a fim de reagir contra a
hipotonia muscular.

Limpeza do cólon: para reforçar a imunidade.

Fricção com pomada de bérberis (fruto) da
Weleda na região sobre a bexiga.

Brincadeiras adequadas à idade: com os olhos
fechados, ouvir ruídos, cheirar e provar objetos
ou alimentos para aguçar a percepção.
 
De resto, valem aqui todas as dicas descritas nos capítulos
sobre predisposição a infecções, otite e resfriado.

8.10 Hemorragia nasal


“Meu nariz está pingando (e minha vitalidade está indo
embora).” – “Estou transbordando.” – “Estou sob pressão!
Para onde vai minha energia agora?”
 
A energia de vida simbolizada no sangue, essa linfa especial,
escorre literalmente do nariz das crianças. No que se refere
a uma ameaça à vida, esse escorrimento é tão inofensivo
quanto impressionante para os pais e para a criança. Uma
pequena quantidade já é suficiente para dar a impressão de
ser um verdadeiro banho de sangue, quando derramada no
travesseiro da criança amada.
O nariz é uma região carregada de simbolismo e que
representa poder e orgulho, mas também sexualidade. A
criança sinaliza inconscientemente, porém de forma
bastante dramática, sua ameaça e o risco que corre. O
sacrifício demonstrativo da própria linfa vital mostra que ela
parece não estar nada bem. Normalmente, a criança fica
muito perturbada ao ver o próprio banho de sangue, mas
essa má impressão logo diminui quando os pais tomam
como primeira medida lavar ou limpar os sinais de sangue.
Do ponto de vista fisiológico, por trás desse sangramento
pode estar um aumento brusco de pressão na rede de vasos
dentro do nariz. No sentido figurado, isso ocorre quando o
sangue sobe para a cabeça e a pressão (em excesso) que
surge tem de ser descarregada.
De todo modo, a explicação que remete a uma fraqueza
física no âmbito de um crescimento acelerado poderia
esclarecer por que o sangramento nasal geralmente termina
na adolescência. Quando persiste em idade mais avançada,
na maioria das vezes está relacionado a oportunidades
perdidas de crescimento. Em regra, os adultos têm outras
possibilidades de dirigir o interesse para si próprios e para
seus desejos. Quando isso não funciona, resta a
possibilidade, como entre as crianças, de fazer o sangue
escorrer do nariz, o que quase sempre provoca compaixão, e
as pessoas acometidas voltam a ser o centro das atenções.
Contudo, isso fica tão evidente que, na maioria das vezes,
com o tempo elas passam a escolher estratégias
diferenciadas.
Em todo caso, o sintoma aumenta com esforço físico,
estresse e febre – e, obviamente, quando a criança apanha
ou quando simplesmente as coisas não acontecem conforme
ela esperava, o que faz com que o tema da agressividade se
torne evidente. Esse caso mostra, de modo inofensivo, que a
criança tem um problema de vitalidade.
Do ponto de vista alopático, o sangramento nasal requer
repouso com uma toalha fria e úmida na nuca. Em geral,
também ajuda tamponar ou simplesmente tampar o nariz,
fazendo com que surja uma espécie de curativo de
compressão para os vasos rompidos.
Do ponto de vista homeopático, as crianças devem deixar
fluir sua vitalidade e sua alegria de viver e se exaurir. Se na
puberdade a energia vital continuar a pingar do nariz, que é
um símbolo de força fálica, o caráter de desafio do sintoma
já não pode ser ignorado. Quando o órgão fálico, bem no
meio do rosto e à vista de todos, começa a sangrar, algumas
pessoas familiarizadas com a simbologia reconhecem nisso
um significado. O tema é controverso, envolve um órgão
carregado de simbolismo, que sofre uma pressão e se
descarrega, mostrando com isso, de forma apelativa, que
tudo é muito perigoso e que a pessoa em questão se sente
mal. O incitamento a descarregar sua raiva torna-se
evidente.
Quando o sangramento nasal ocorre à noite, durante o
sono, deve-se partir do princípio de que os sonhos oprimiram
a criança em sua tentativa de assimilar o que não foi
assimilado durante o dia. Junto com o alívio da pressão, que
libera o que é irrelevante para o corpo, esse tipo de sangria
também é uma dissipação de linfa e de energia vital.
Contudo, os pais reagem espontaneamente mais no
sentido alopático, cuidando para que o sangue da criança
não suba com muita frequência à cabeça, em vez de animá-
la, em sentido figurado, para deixar sua força vital sair por
todas as válvulas. No entanto, seria natural estimular
atividades físicas e incentivar o desenvolvimento de certa
resistência por meio do esporte e das brincadeiras, em vez
de apostar exclusivamente em atividades intelectuais.
Sobretudo quando a criança é de constituição delicada,
como é frequente entre aquelas que têm sangramento nasal,
esse incentivo lhes seria favorável. Chama a atenção o fato
de que muitas crianças sensíveis, do tipo fosfórico, tendem a
ter sangramento nasal e a se sobrecarregarem
(intelectualmente), esquecendo-se de cuidar do corpo.
Qualquer pequeno ferimento faz com que sangrem em
profusão. Rapidamente também ficam cobertas de
hematomas (hemorragias subcutâneas), o que evidencia a
que ponto são “impressionáveis”. Para os pais, um sintoma
tão inofensivo como o sangramento nasal, que causa medo,
seria uma boa ocasião para que se reconciliassem com as
ameaças da vida (que lhes é confiada).
 
Perguntas para os pais:

Quando nosso filho está sob pressão? Como ele
pode aprender a lidar melhor com a pressão?

Por que ele quer chamar atenção dessa forma,
tentando se colocar no centro?

Como nosso filho pode exaurir-se de modo
pertinente?

Por que ele dissipa tanto sua energia e sua
força?
 
Medidas de apoio:

Com a criança sentada, manter seu nariz
fechado por até cinco minutos (apertar as asas
do nariz contra o septo nasal) e colocar
compressas frias em forma de bolsa fria, saco de
gelo ou toalhas frias e molhadas na nuca. Em
seguida, não se deve assoar logo o nariz; manter
a respiração por um breve período pela boca,
para que o coágulo formado não se solte
novamente.

Colocar um papel embaixo da língua: colocar um
pedaço de papel toalha ou lenço de papel, até o
sangramento parar.

Segundo a medicina popular, uma corrente de
prata ajuda quando usada permanentemente.

Tratamento homeopático: em caso de
sangramento nasal frequente, deve-se realizar
um tratamento constitucional.
Arnica C30: quando o sangramento nasal ocorrer
após esforço físico intenso ou golpe no nariz.
Ferrum Phosphoricum C30: crianças pálidas com
bochechas avermelhadas, eventualmente no início
de uma infecção ou em caso de febre.
Phosphorus C30: crianças esguias, de cabelos claros
e pele clara e que são altas para sua idade. São
radiantes, abertas, compassivas e têm inúmeros
medos (de escuridão, trovoada, de ficarem
sozinhas).
9 Problemas nos órgãos respiratórios

9.1 Tosse e bronquite


“Estou com tosse. Vão às favas!” – “Estou com muco. Preciso
bajulá-los!”
 
Quando há tosse e bronquite, trata-se de um conflito típico
na área de comunicação das vias respiratórias. Além dos
brônquios, os canais de ligação entre o mundo interior e o
exterior são afetados. A diferença em relação à pneumonia
reside no fato de que, na bronquite, são acometidas as vias
de transporte do ar, enquanto na primeira são acometidos os
alvéolos, ou seja, as pequenas cavidades pulmonares como
locais em que ocorre a verdadeira troca de ar. Já não é
possível desviar do problema, e o perigo de falta de ar na
pneumonia é muito maior. Contudo, há transições, como as
broncopneumonias, que naturalmente têm suas
características inerentes e indicam que a comunicação está
bloqueada em várias vias. A criança pode, de fato, sentir-se
sufocada por falta de comunicação.
Por conseguinte, na bronquite, conflitos reprimidos se
estabelecem simbolicamente nos locais adequados para
eles. A criança tosse em vez de mandar alguém às favas.
Nas crianças pequenas, a chamada bronquite obstrutiva
produz muco em demasia devido aos processos metabólicos
excessivos. Esse muco preenche as vias respiratórias e
provoca como reações os respectivos acessos de tosse e
falta de ar. Portanto, as vias de comunicação são obstruídas
com temas psíquicos em forma de muco. Na bronquite
espástica, trata-se de agressividade contraída, que ficou por
muito tempo represada. Devido ao esforço, as vias
respiratórias são comprimidas, e a criança tenta respirar de
maneira patética. Em crianças pequenas, não raro por trás
disso se encontram conflitos crônicos dos pais, que não
conseguiram resolvê-los e os transferiram para os filhos. Isso
se torna evidente especialmente entre pais fumantes, que,
sem exceção, também sofrem de bronquite e já
sobrecarregam os filhos no ventre materno.
Já vimos mães que se deixam prender pelos filhos quando
estes sofrem um acesso de tosse. Isso acontece, sobretudo,
quando a criança, diante da problemática da mãe, percebe
que, com a tosse e a secreção de muco, recebe mais da mãe
do que em razão do trabalho que lhe dá ou da concorrência
com os irmãos. Nesse sentido, a bronquite pode, de fato, ser
aprendida como uma fonte mais segura de tosse e muco.
Infelizmente, o mesmo também se pode dizer de todas as
transições da bronquite asmática até a asma brônquica.
Para os pais, o desafio está em submeter as próprias
estruturas de comunicação a uma revisão e em avaliar se
não estão buscando a discussão de modo mais ofensivo, se
estão travando seus conflitos em nível verbal e se não
deveriam ousar contrariar um ao outro. Além disso,
poderiam tentar melhorar a ligação anímica interna com seu
filho, para que a troca entre eles fosse mais fácil e a
comunicação fluísse melhor. Com a disposição para o conflito
e a coragem para aceitar desafios, seria possível ajudar
muito mais cedo a criança que, no que diz respeito à
comunicação, ainda está totalmente abandonada. (Outras
interpretações podem ser encontradas nas seções “9.3
Pneumonia” e “4.6 Coqueluche”.)
 
Perguntas para os pais:

Ver a seção “9.3 Pneumonia”.
 
Medidas de apoio:

Podem-se escolher diversas bandagens
torácicas, de acordo com as necessidades de
cada criança:
Compressa com queijo quark: espalhar o queijo
quark magro em um pano de prato, na proporção da
espessura do cabo da faca, e colocar o pano sobre o
tórax. Cobrir todo o tronco com uma toalha de rosto
e, eventualmente, manter a temperatura moderada
com uma bolsa de água, pois a criança não deve
sentir frio em hipótese alguma. As bandagens
podem ser trocadas de três a quatro vezes por hora
ou aplicadas por mais tempo durante a noite.
Bandagem de suco de limão diluído: aquecer o suco
de meio limão em três quartos de litro de água
quente, mergulhar uma toalha no líquido, torcê-la e
enrolá-la no tronco da criança. Cobri-la com outra
toalha e, eventualmente, reforçar o aquecimento
com uma bolsa de água quente ou travesseiro de
caroço de cereja.
Bandagem de tomilho: fazer chá de tomilho e
proceder conforme descrito na bandagem de suco de
limão.
Bandagem de folhas de repolho: cozinhar folhas
grandes de repolho por um a dois minutos em água
fervente, até amolecerem. Em seguida, colocá-las se
possível quentes no tronco da criança, cobri-la com
uma toalha e, conforme descrito acima, reforçar o
aquecimento.
Bandagem de óleo de lavanda: pingar óleo de
lavanda (10%) em uma toalha e com ela cobrir o
tronco da criança. Conforme descrito anteriormente,
reforçar o aquecimento. A toalha embebida em óleo
pode ser reutilizada por cerca de uma semana; deve-
se apenas pingar mais algumas gotas do óleo de vez
em quando.
Bandagem de cera de abelha, adquirida em
farmácia.
Bandagem de manteiga: friccionar o tórax da criança
com manteiga derretida, colocar um pano atoalhado
seco e quente ou uma toalha de rosto por cima,
vestir o pijama e pôr a criança para dormir.

Oferecer bastante líquido.

Chás para a tosse: duas colheres de chá de ervas
para um quarto de litro de água; deixar pousar
por dez minutos e coar. Para crianças acima de
um ano, dar uma xícara três vezes ao dia.
Crianças menores de 1 ano ainda não suportam
grandes quantidades de chá para a tosse. É
melhor recorrer a chá de funcho.
Anticonvulsivos: tomilho, anis, cavalinha.
Expectorantes em caso de tosse seca: tanchagem,
raiz de prímula.
Caloríficos: flores de sabugueiro, raiz de gengibre.
Calmante para a mucosa: malva.
Para aquecer bem e relaxar: flores de tília.

Inalação: apropriada para crianças maiores, a
partir da idade escolar, e para crianças menores
quando a mãe também se colocar embaixo da
toalha de rosto. Possíveis suplementos são o
tomilho (duas colheres de chá), sal (quatro
colheres de sopa) ou óleo de raiz de angélica
(três gotas). Aplicação: colocar em uma tigela o
suplemento escolhido e dois litros de água
quente, mas não fervente. Cobrir a cabeça com
uma toalha de rosto e mantê-la inclinada sobre a
tigela. Por dez minutos, inspirar alternadamente
pelo nariz e pela boca o vapor benéfico. Atenção:
devido ao risco de queimaduras, crianças não
devem ser deixadas sozinhas durante a inalação.

Fitoterapia: a Hedera helix, da Ceres (tintura-
mãe de hera), age como anticonvulsivo.
Thymus vulgaris, da Ceres (tintura-mãe de tomilho),
age como expectorante e anticonvulsivo.
Xarope Bronchicum para a tosse (raiz de prímula,
tomilho) age como expectorante e anticonvulsivo.
Extrato de plantago, da Wala (tanchagem), detém o
crescimento das bactérias e acalma a tosse.
Mel de funcho: calorífico e expectorante.
Chá de raiz de gengibre: aquece e fortalece.

Escalda-pés: descrito no tema “enurese” (seção
15.2).

9.2 Medicamentos homeopáticos para tosse e


bronquite

Bryonia C30 Phosphorus C30


Agentes Preocupação, irritação Resfriado, esforço excessivo,
desencadeadores agitação, falar demais
Tipo Aguda, seca, muito dolorida, Seca, incômoda, ardente,
mantém a mão sobre o tórax opressora, com coceira
quando tosse na garganta
Melhora com Repouso, pressão, ficar Pratos e bebidas frias,
deitado sobre o lado afetuosidade, sono breve
dolorido
Piora com Movimento, toque, a Ar frio, ficar deitado do
cada respiração lado esquerdo, pratos e
bebidas quentes
Peculiaridades Muita sede, mucosas secas Rouquidão, bochechas
vermelhas, tremor em todo
o corpo
Disposição Irritável Temeroso
 
Rumex C30 Drosera C30
Agentes Ar frio, coceira na laringe Nada específico
desencadeadores
Tipo Tosse com coceira na Acessos de tosse que se
garganta, tosse seca e sucedem rapidamente, com
incessante sensação de falta de ar;
seca, incômoda
Melhora com Fechando ou cobrindo a Ao longo do dia, ao ar livre
boca, calor
Piora com Inspirar ar frio, inverno, ficar Após a meia-noite, cantar,
deitado do lado esquerdo, falar, deitar, aquecer-se
às 23 h
Peculiaridades Sensação de aspereza e Principal medicamento em
queimação sob o esterno caso de coqueluche;
acessos aumentam até
causar ânsia e vômito
Disposição Abatido, sério, indiferente Ligeiramente irritado, fica
fora de si por pequenas
coisas
 
Pulsatilla C30 Cuprum metallicum C30
Agentes Tempo instável, falta de Frio, decepções amorosas
desencadeadores afeto por parte das pessoas
de referência
Tipo Tosse incômoda, seca Convulsiva, sufocante,
ou com catarro, com repentina, expectoração
respiração curta com gosto metálico
Melhora com Ar frio e fresco, sentar-se na Bebidas frias, suor, colocar
cama, movimento leve a mão no tórax
Piora com Calor, espaços abafados, à Respirar fundo, às
tarde ou à noite na cama 3 h, toque
Peculiaridades Não consegue ficar longe da Lábios e dedos roxos,
mãe, falta de sede punhos com o polegar
para dentro, convulsões,
vômito convulsivo
Disposição Afetuoso, choroso, instável Nervoso, inquieto, fechado,
acessos repentinos de raiva
 
Spongia C30 Causticum C30
Agentes Costuma aparecer na Preocupação, resfriamento
desencadeadores primavera e no outono
Tipo Cavernosa, rouca, dolorida, Ferida, dolorida,
seca, ao modo de crupe, incômoda, exaustiva
sensação de sufocamento
Melhora com Deitado, pratos e Calor úmido, engolir
bebidas quentes água fria
Piora com Frio seco À tarde, de manhã cedo,
vento frio, deitado, calor
da cama
Peculiaridades Importante medicamento Exaustão, incontinência
para pseudocrupe, urinária quando há tosse
necessidade constante de
pigarrear, rouquidão
Disposição Medo e temor, toda agitação Dor no corpo todo
aumenta a tosse

9.3 Pneumonia
“Minhas asas estão doendo muito.”
 
Nas dez luas da gestação, os pulmões do feto ainda não
estão desenvolvidos. Ainda não precisam participar dos
eventos do metabolismo, uma vez que a mãe assume a
respiração e transmite oxigênio à criança através da troca de
sangue na placenta. Com o nascimento e a primeira
respiração por conta própria, os pulmões são inflados, e o
elemento ar entra na vida jovem. Este é o passo dado pelo
ser na passagem da vida na água para a vida no ar,
superado ao longo da história evolutiva e novamente exigido
de toda criança ao final da gestação. Os “anjinhos” precisam
desdobrar suas asas por iniciativa própria. Nesse sentido, o
auxílio vindo “de cima” não deve ser subestimado. Até
mesmo a Adão, o primeiro ser humano, Deus enviou seu
sopro. A partir de então, a criança torna-se, ainda mais, um
ser anímico. É significativo que o termo grego psyché para
“alma” também seja “sopro (de vento)”.
Na pneumonia, há uma inversão no sentido do
desenvolvimento. As asas internas que, desde a primeira
respiração por conta própria, ficam comprometidas com o
elemento ar, voltam a se encher parcialmente com água e
matéria, sofrendo uma recaída, uma regressão ao período
anterior ao nascimento, quando toda a responsabilidade
ainda era da mãe e o feto podia permanecer em uma
situação de unicidade paradisíaca. Tudo de que precisasse
recebia em abundância sem ter de fazer nada. Unido à mãe,
podia abastecer-se de confiança primária e assegurar-se de
si mesmo e do mundo.
Portanto, a tarefa da pneumonia seria garantir à criança
um período de retrocesso, para que ela novamente atinja
sua força primordial, volte-se para dentro e (na unidade)
experimente a confiança primária. A ocorrência da doença
impõe isso de maneira muito evidente por meio de sua
gravidade.
Segundo o livro A Doença como Símbolo, trata-se de tirar o
encargo da doença física no nível psíquico para que o corpo
seja aliviado desse trabalho de representação. Na
pneumonia – ocasião em que, na região dos alvéolos,
preenchida por ar, penetram fluidos e células –, isso
significaria, em sentido figurado, arraigar-se mais no campo
da comunicação e lançar raízes na matéria, isto é, vivenciar
uma comunicação mais substancial. Na prática, isso poderia
significar, por exemplo, apostar mais em intercâmbios
autênticos do que assistir à televisão e a DVDs. Os meios
modernos de comunicação de massa já são, em grande
medida, vias de mão única, mas a verdadeira comunicação
também sempre precisa do tráfego oposto, ou seja, do
intercâmbio com as outras pessoas.
O que há por trás da recaída física da pneumonia? Como
os pulmões são um local de intercâmbio entre o mundo
exterior e o interior e, por conseguinte, junto com a pele,
nosso segundo órgão de contato, possivelmente há um
conflito insolúvel no plano da comunicação e que passou
para o corpo. Na pneumonia, a troca sofre um distúrbio não
apenas no nível dos gases oxigênio e carbono. Na batalha
realizada pelos agentes patogênicos contra as células de
defesa, os alvéolos, que podem ser imaginados como
pequenos balões de ar, enchem-se de líquido e se inflamam.
Além disso, na pior das hipóteses, podem ficar tão
preenchidos com a sucata de guerra que a troca de gases é
bloqueada por mais tempo.
A mobilização geral da febre mostra que a guerra nos
alvéolos ameaça todo o organismo, e todo o restante que
não for decisivo deve ser adiado. Naturalmente, isso
também vale no sentido figurado. Nesse momento, no
ambiente da criança, tudo deve ser colocado a serviço da
solução desse problema.
Pouco importa qual agente patogênico é o causador. A luta
impiedosa com as defesas do corpo revela que, para ambos
os lados, o todo é que está em jogo. Quando as defesas e,
portanto, a criança, vencem pelas próprias forças, conquista-
se uma grande vitória e dá-se um claro passo na direção do
desenvolvimento, enquanto os agentes patogênicos são
derrotados e aniquilados. Se a batalha for vencida com o
auxílio de antibióticos, como hoje é tão comum, a vitória é
reduzida, e o passo rumo ao desenvolvimento, menos
impressionante. Muitas vezes, ele terá de ser repetido. No
consultório pediátrico isso se mostra nas chamadas
recidivas. É assim que os médicos nomeiam o
reaparecimento de sintomas que acreditavam superados e,
com ele, seus fracassos. É lamentável que, na maioria das
vezes, os pais não tenham como mensurar o quanto eles
poupam a si mesmos e a seus filhos com lutas autênticas e
honestas de longo prazo, que podem ser amparadas pela
homeopatia ou, no melhor dos casos, pela naturopatia.
A longo prazo, o resultado é uma determinação do
caminho a ser trilhado. Crianças que aprenderam a confiar
em sua própria força (de defesa) se comportarão de um
modo totalmente diferente na vida e disporão de reservas
seguras. Por outro lado, se forem constantemente
amparadas por antibióticos, suas defesas se adaptarão a
eles e permanecerão dependentes de auxílio externo –
infelizmente, os “donos” desses sistemas de defesa
também. Ao mesmo tempo, já são maioria as pessoas que
pedem formulários em caso de problemas e necessidade de
ajuda. Todavia, também as sociedades modernas vivem
daqueles que sabem se ajudar e tomar as rédeas da situação
e, assim, enfrentar a vida.
Dores no peito indicam que algo no centro (energético) – o
local para onde o ser humano aponta quando diz “eu” – grita
por socorro. Nesse centro da condição humana encontra-se a
atenção, e é para ele que as dores se dirigem.
Às vezes, depois de superada a pneumonia, as crianças
dizem “eu” pela primeira vez, o que, obviamente, também
depende da idade. De modo geral, uma pneumonia superada
com êxito traz consigo um reforço do eu, como ocorre com
toda doença superada com sucesso e pelas próprias forças.
O centro do tórax também poderia ser chamado de “centro
da comunicação”. Em vez de despejar sua agressividade no
ambiente, a criança a vivencia com a pneumonia em
ataques incisivos de tosse e em seus respectivos acessos.
No nível físico, a tosse faz com que o material que obstrui os
alvéolos seja transportado para fora; no nível figurado, trata-
se de uma expressão vital. As crianças precisam aprender a
lutar para se libertar e a fazer alguma coisa para conseguir
expandir novamente suas asas (seus pulmões).
A respiração curta revela quão ameaçadora é essa
situação de bloqueio no âmbito da comunicação para todo o
organismo e para a vida. A dilatação das narinas, devido ao
esforço para respirar, mostra que aqui é preciso chegar ao
limite das próprias possibilidades. Quando se chega a uma
cianose, ou seja, quando a criança começa a ficar roxa, a
todos fica claro que se trata de uma luta pela vida.
O conflito subjacente de comunicação pode ter muitas
razões. Possivelmente, também é um problema de
comunicação entre os pais, que, em sua situação de ameaça
e em sua sinceridade ainda presente, a criança percebe
como um problema seu e o reflete do ponto de vista físico.
Todavia, também se pode tratar da sensação de estar
isolada e de já não ter contato com os pais, os amigos,
consigo mesma ou com a vida.
A linguagem é uma válvula que ainda não está à
disposição das crianças pequenas, mas que muitas vezes
também não é suficiente para crianças mais velhas,
adolescentes nem para adultos, pois o conflito de base é
inconsciente. Nesse caso, os sintomas, entendidos como
linguagem da alma da criança, poderiam exprimir o
seguinte: “Estou quase sufocando porque não consigo me
comunicar!”, “... porque não consigo dizer o que está
acontecendo comigo e me atormentando!” Antroposofistas
partem do princípio de que à pneumonia sempre precede
uma friagem. Contudo, não se deve interpretar isso na
prática, e a criança não precisa estar fisicamente com frio ou
molhada para pegar pneumonia. Ela pode perfeitamente
sentir-se “abandonada” ou sentir a frieza ou ainda uma falta
de calor anímico. Na febre, como em uma resposta ao nível
físico de substituição, ela mobiliza o próprio calor interno
contra o frio que sente.
Tanto entre crianças quanto entre adultos, o frio “interno”
também pode ser o problema. Quando uma pessoa, em
razão de sobrecargas, frustrações, solidão ou tristeza,
constrói uma distância interna em relação a si mesma e ao
ambiente e, por isso, mobiliza pouca energia interior de vida,
ou seja, calor físico e emocional, deve-se oferecer-lhe a
oportunidade terapêutica de refletir sobre si mesma e de
buscar força, energia e calor em seu próprio interior. A febre
também cumpre esse sentido, pois, ao aumentar a força de
defesa, faz com que, no âmbito de uma mobilização geral,
um novo nascimento, ou melhor, um renascimento possa ser
realizado na recente batalha pela vida. Os nascimentos
também sempre precisam do calor da energia do fogo, para
que a irrupção no novo mundo seja bem-sucedida. Assim
como a água dos primórdios, que nas clínicas modernas de
obstetrícia é aspirada, o exsudato também precisa ser
retirado dos pulmões. Para tanto, eles precisam da tosse e
do calor da febre.
Obviamente, não é por acaso que o fósforo, medicamento
homeopático mais usado para a pneumonia infantil, encobre
muitos desses sintomas. Muitas vezes, o tipo fosfórico já não
consegue se comunicar com o mundo porque não teve calor,
dedicação e carinho suficientes. Ele tem de ser obrigado a
retirar-se em si mesmo, tal como faz quando tem
pneumonia. Pois, de fato, é muito voltado para fora e muito
extrovertido para satisfazer as necessidades da própria
alma. Do ponto de vista psíquico, como passa muito tempo
com os outros, é muito compassivo, gosta de estar em
contato com as outras pessoas, é entusiasmado e atento
apenas ao que ocorre do lado de fora, ele busca amor.
Quando decepcionados, não raro os tipos fosfóricos
refugiam-se em regressões que, como na recaída dos
pulmões, podem exprimir-se em um estágio anterior ao
nascimento. Na pneumonia, o tipo fosfórico faz entrar o
elemento anímico água no nível físico, e não no figurado. A
adoção do medicamento pode ajudá-lo a recriar esse
elemento também no sentido anímico.
O quadro orgânico da pneumonia evidencia com clareza e
honestidade a situação do tipo fosfórico. Antes de
adoecerem, os afetados se extenuam exteriormente;
sentem-se muito pouco inspirados e assimilam poucas
coisas. Isso chega a ser audível através do rumor que
produzem ao inspirar.
Como asas internas, os pulmões realmente nos tornam
seres inspiradores, semelhantes a anjos. Crianças com
pneumonia perdem esse aspecto de leveza (como pluma),
bem como a possibilidade de uma inspiração leve e livre.
Outro medicamento homeopático típico para casos de
pneumonia, a Bryonia ou norça, pode contribuir para
entendermos a situação psíquica. Nesse quadro, as causas
são o frio (de isolamento ou sensação) ou a irritação. Ambos
podem deixar a pessoa insegura ou fazê-la adoecer. Nesse
caso, o problema de comunicação é tão evidente que os
tipos Bryonia não suportam a menor pressão em sua pele,
nosso primeiro órgão de comunicação. Por outro lado,
sentem muita sede e bebem muita água, o elemento
anímico que lhes falta. Depois da ingestão do medicamento
– contanto, é claro, que tenha sido apropriado –, não raro se
observa que as crianças voltam a se comunicar, a se
movimentar e até a entrar espontaneamente em contato
com o ambiente.
Por fim, na pneumonia, como dizem os indianos, trata-se
de desenvolver asas e raízes de maneira corajosa e
batalhadora nos momentos de desafio da crise. O tipo
fosfórico ainda não está enraizado o suficiente em seu
próprio território (anímico) e, com a pneumonia, recebe essa
oportunidade de trabalhar novamente nessas raízes. Se isso
não der certo de imediato, sabe-se que esse quadro
sintomático pode ressurgir. Contudo, se a criança já dominou
essa tarefa uma vez, ela não precisa que o destino lhe envie
novamente a salvação. Uma criança que, desde o início,
pode formar raízes confiáveis poderá mais tarde ousar
expandir suas asas e, com coragem, sair voando pela vida.
Ela sempre pousará com segurança e encontrará terra firme.
Ou, para citar os indianos mais uma vez: “Somente quem se
encontra profundamente enraizado na mãe Terra pode ousar
erguer a cabeça para o pai Céu”. Isso não quer dizer, porém,
que as crianças que atravessam a vida de cabeça erguida se
tornarão arrogantes e presunçosas. Estas são, antes,
tentativas de compensação de crianças modernas, às quais
muitas vezes falta a confiança primária. Quem se sente
considerado pela vida e nela entra com segurança se sentirá
honrado pela criação e, evidentemente, também a honrará –
de cabeça erguida, essa criança se comunicará com a vida
com muito amor. Os casos de pneumonia poderão prepará-la
para isso se forem compreendidos e tiverem suas exigências
levadas em conta.
 
Perguntas para os pais:

Como transmitir ao nosso filho mais daquela
confiança primordial que, aparentemente, lhe
faltou na gestação?

Como podemos ajudá-lo a encontrar a si mesmo
e a desenvolver a autoconfiança?

Onde falta comunicação? O que não é
manifestado (entre nós)? Como fazer com que
nosso filho diga abertamente o que o atormenta?
Estamos ouvindo o suficiente o que ele tem a
dizer?

Em que nível não conseguimos nos comunicar e
nos entender corretamente?

Pelo que luta nosso filho?

Em que situações temos um tema semelhante e
como podemos acompanhá-lo?

Em que circunstância ele está travando, talvez
em nosso lugar, uma batalha que não vivemos?
Como podemos encorajá-lo a reconhecer seus
desejos com mais liberdade?
 
Medidas de apoio:

Ver seção “4.6 Coqueluche”.

9.4 Pseudocrupe
“Estou sem ar e sem voz.”
 
O palco dessa doença angustiante é a laringe, órgão de
expressão da voz e do estado de espírito (da vida) na região
do pescoço e local de ligação, comunicação e incorporação.
Na infância, a voz aguda demonstra falta de ligação com a
terra, bem como sonhos e ideias que voam alto, típicos da
idade, mas também uma disposição de vida que é tudo,
menos firme; por isso, a criança parece muito frágil.
Somente na puberdade é que, com a laringe, se desenvolve
o sentido da realidade e de ligação com a terra; depois de
algumas escapadas, a voz desce e encontra sua
profundidade – nos meninos, isso fica bastante claro com a
mudança de voz.
Se a voz falha por completo, como em casos extremos de
rouquidão no (pseudo)crupe, quando nem o mais ínfimo som
sai da boca, isso significa um esgotamento do estado de
espírito. A criança já não pede para falar e, por assim dizer,
não tem voz em seu ambiente nem encontra quem lhe dê
atenção, correndo o risco de não ser notada.
Porém, mais do que a falta de voz da rouquidão, o medo
de sufocamento, que se desenvolve com a falta de ar,
mostra-se em primeiro plano. Na prática, ele só ocorre à
noite, no ápice da inconsciência, da sombra. Durante o sono,
vigiado pelo deus Hipnos da Antiguidade, seu irmão,
Tânatos, a morte, também entra em jogo, pois, de fato,
crianças que sofrem de crupe podem morrer sufocadas.
Contudo, o verdadeiro crupe tornou-se tão raro quanto a
difteria, quadro sintomático correspondente. Hoje, quase
sempre o tratamento é voltado para o chamado
pseudocrupe, que, embora imite o crupe autêntico,
normalmente não decorre de modo tão explosivo e
ameaçador.
Em geral, são acometidas crianças entre 2 e 6 anos,
quando também ganham irmãos; um período em que a
expressão verbal ainda é difícil, em que as necessidades
psíquicas podem ser vivenciadas, mas ainda não formuladas.
Uma tosse rouca, seca e dolorida revela a agressividade que,
normalmente, não chega a se manifestar e nada tem a
liberar. Durante o dia, as crianças mal conseguem falar e não
encontram quem lhes dê atenção; à noite, porém, pode-se
ver que querem expressar alguma coisa, que estão em
dificuldade e correm o risco de sufocar por causa de sua
situação.
A respiração convulsiva que ocorre à noite é desencadeada
por um inchaço na mucosa sob as cordas vocais. Esse
inchaço conflituoso na mucosa da laringe, que na difteria é
chamado de “crupe” e, em outras inflamações, de
“pseudocrupe”, representa a batalha pela vida que as
crianças acometidas travam na garganta.
Todo conflito agressivo no campo da voz e da deglutição
pode ameaçar a vida em razão de sua localização,
provocando o risco de sufocamento. Nesse caso, a garganta
se fecha a ponto de as crianças já não conseguirem gritar
por causa do inchaço e da rouquidão. Queixar-se “em alto e
bom som” não é possível, mas engolir também se torna
difícil devido às dores na região inchada. A única coisa que
conseguem pôr para fora são as descargas agressivas na
tosse tipicamente rouca do crupe. A garganta da criança
estreita-se demais para que ela consiga respirar, o que, do
ponto de vista da linguagem, soa como a problemática
psíquica correspondente. A ligação entre a cabeça e o
pescoço corre o risco de ser interrompida – uma verdadeira
ameaça de morte. As crianças realmente estão “fartas até o
pescoço”.
O inchaço, que se intensifica durante o sono e as acorda
com a sensação de falta de ar, ocorre de modo tão abrupto
e, muitas vezes, tão agudo e perigoso, que as crianças nem
sequer conseguem gritar por socorro. Os sinais de alarme
provêm, sem exceção, do campo psíquico e social e, com
muita frequência, são ignorados.
Especialmente traiçoeira é a maneira como o ataque
extremamente agudo e ameaçador surge sem nenhum aviso
prévio, fazendo com que os pais sejam confrontados
inesperadamente com o medo da morte. A pergunta “E se
nosso filho deixar de viver?” invoca o maior medo dos pais
que é o de perder seu filho.
Nesse caso, tornam-se evidentes, com toda dramaticidade,
as tendências infantis à fuga. As crianças poderiam fugir
clandestinamente. Assim, o acesso de crupe deve ser
entendido como um tiro de advertência, que à noite
surpreende os pais, de modo inesperado e brutal, em uma
fase sensível. À noite, também os pais modernos têm tempo
para observar como seu filho é ameaçado pela falta de ar –
e, felizmente, nada de ruim acontece. É o momento em que
já não têm tantos afazeres e podem cuidar dele.
Entre as causas, devem-se mencionar coisas concretas,
como a poluição nas grandes cidades, mas também a
dificuldade de expressar a agressividade e de dizer de uma
vez por todas a própria opinião aos pais. Em geral, mudar
para o campo resolve de imediato os problemas do
pseudocrupe. Desse modo, com o sintoma, as crianças
afetadas também transmitem aos pais o sentimento de
culpa, pois, com um ar e uma atmosfera apropriados a elas e
aos adultos, o problema logo desapareceria. Mas poucos pais
podem recorrer a essa solução de mudar para o campo, caso
de fato o queiram.
Seja como for, em diversos aspectos as crianças se sentem
no lugar errado, onde não conseguem respirar, e recebem
pouquíssima energia boa. Correm o risco de sufocar em uma
atmosfera abafada, apertada e seca do ponto de vista
psíquico. Na rouquidão, elas se sentem como se tivessem
gritado por horas, quando, na verdade, não emitiram
nenhum som. Isso mostra que a medida de emergência
precisa ser aplicada urgentemente ao corpo. Na maioria das
vezes, os interesses da alma são ignorados por muito tempo.
Possivelmente, as crianças também receberam cedo demais
muitas responsabilidades e se fecham de maneira
impressionante.
Ar poluído e, em sentido figurado, pensamentos sujos
pioram sua condição; ar fresco e pensamentos limpos a
melhoram. Ar úmido também a alivia rapidamente. Em
sentido figurado, a isso corresponderiam os pensamentos
ligados à energia da alma, que fazem “o coração da criança
bater na garganta”.
Um esclarecimento antroposófico da doença parte do
princípio de que, à noite, a atividade dos rins diminui e a do
fígado aumenta. A primeira lava, e a segunda promove a
retenção de líquido. Durante o dia, o escoamento da alma
pode fluir perfeitamente; à noite, ao contrário, não. De fato,
à noite passamos um longo tempo sem eliminar nada. Nesse
represamento, o problema se torna evidente. Sensações de
sufocamento, medo, aperto e o respectivo pavor se
expandem.
Essa teoria é asseverada pelo fato de que um
fortalecimento na função dos rins realmente melhora o
quadro clínico da criança. No sentido de uma “medicina
arquetípica”, isso aponta para um problema de Vênus já
existente e, portanto, a uma temática de relacionamento ou
parceria, muito provavelmente com a mãe.
Quem nunca está satisfeito nesse caso? Será que a criança
não está querendo comunicar à mãe que esta não deve
importuná-la nem sufocá-la (mãe superprotetora)? Por
conseguinte, o despertar noturno seria uma medida de
legítima defesa da criança, pois, assim, seus rins podem
funcionar melhor e, no nível psíquico, a relação com a mãe
poderia melhorar: a mãe poderia saber dos problemas do
filho e compreender seu próprio comportamento
problemático.
Uma medida bastante simples, porém insuficiente, seria
arejar bem o quarto em que a criança dorme, permitindo a
entrada de ar fresco e usando umidificadores e ionizadores
de ar. Contudo, essa é apenas uma primeira medida
emergencial, que reage superficialmente à necessidade da
criança. Auxílios mais substanciais, cujos efeitos cheguem ao
nível psíquico, são necessários e urgentes.
Com frequência, há situações em que as crianças
pequenas têm medo à noite porque se sentem entregues a
poderes obscuros, que, porém, elas não conseguem
expressar. Nesse caso, às vezes ajuda deixar que durmam
em um ambiente em que elas possam estar “presentes”.
Mesmo a sala, com sua atmosfera menos tranquila, pode ser
um “quarto” melhor para elas, pois nela se sentem parte da
família, em vez de serem empurradas para a escuridão.
O fator decisivo é que (a longo prazo) as pessoas afetadas
aprendem a lidar de maneira aberta com os conflitos, a se
defender conscientemente e a lutar pela sobrevivência. As
lutas iminentes poderiam ser resolvidas com mais eficácia
através da linguagem no campo da voz e da deglutição,
assim que as crianças começassem a expressar sua opinião
e a se impor. De preferência, a criança deveria liberar-se da
agressividade, colocando-a para fora, o que, no entanto,
pode ser uma iniciativa “ousada”. Entretanto, a longo prazo,
ela estaria arriscando a própria vida se não reunisse a mente
e o corpo em suas necessidades e só continuasse
ameaçando com sua interrupção duradoura. Como tanto os
órgãos respiratórios quanto os rins estão envolvidos, em
ambos os órgãos, que em essência têm a ver com o tema
“eu – você”, trata-se, em última instância, do equilíbrio entre
“O que quero e como digo isso?” e “O que o outro quer e
como lido com isso?”
 
Perguntas para os pais:

O que nosso filho está querendo expressar e
talvez ainda não consiga? Estaríamos dando-lhe
pouca oportunidade para tomar a palavra?
Estaríamos prestando pouca atenção a seus
sinais?

Em que circunstâncias o restringimos demais,
talvez porque nos preocupemos em demasia?

Que perguntas podemos fazer para que nosso
filho aprenda a refletir sobre si mesmo e a se
expressar (a partir dos 5 anos)?

Do que ele tem medo?

Do que quer fugir?

Como podemos ajudar nosso filho a se impor e a
se aproximar dos outros?
 
Medidas de apoio:

Acalmar a criança.

Respirar junto com a criança, tranquilamente e
devagar.

Providenciar ar úmido (abrindo a torneira ou
ligando o chuveiro no banheiro) ou fresco.

Florais de Bach: pingar diretamente na língua da
criança e dos pais algumas gotas do Rescue
Remedy do doutor Bach.

Tratamento homeopático: em casos agudos, a
seguinte mistura mostrou-se eficaz: Aconitum
D6, Hepar sulfuris D6, Spongia D6. Quebrar as
ampolas, inserir seu conteúdo em uma seringa e
espirrá-lo de duas a três vezes diretamente na
boca da criança.
Aconitum C30, dois glóbulos: se as dores
aparecerem repentinamente durante o sono, sem
pré-aviso. A criança fica ansiosa e inquieta. A tosse
torna-se rouca, seca, como um latido, e violenta.

9.5 Asma brônquica


“Cuspo aos seus pés.”
 
Na asma, trata-se predominantemente de uma ocorrência
alérgica. Tossir, cuspir e expectorar em abundância apontam
para o tema “agressividade”. No verdadeiro sentido da
expressão, o asmático “cospe aos pés” dos outros.
As crianças são extremamente sensíveis; na verdade, um
conceito puramente psíquico, que aqui se incorpora nas vias
respiratórias. Elas reagem a substâncias que entram no
corpo com o fluxo respiratório. Metaforicamente, o elemento
ar também é responsável pelo mundo intelectual; por isso,
não é de admirar que as crianças asmáticas já possam reagir
alergicamente a determinados símbolos. Essa
hipersensibilidade pode transformar-se repentinamente em
impermeabilidade tanto emocional quanto física se a criança
buscar se defender da sua hipersensibilidade através de
muros de proteção. Portanto, a impermeabilidade e a política
de se fechar com um anteparo representam aqui não
necessariamente a falta de sensibilidade, mas descrevem,
ao contrário, um estado para a sensibilidade mais elevada e
entregue ao desamparo.
Quanto aos outros aspectos, a vida das crianças asmáticas
é realmente de “tirar o fôlego”, no verdadeiro sentido da
expressão, pois elas estão sempre “sem ar” ou, em todo
caso, “sem fôlego”. Entretanto, no uso corrente da
linguagem, o que remete para aspectos positivos da vida
aparece aqui em sentido concreto e negativo. “Tira-lhes o
fôlego” em um sentido mais profundo e agressivo. Durante a
crise, chegam a sentir-se compelidas a “prender a
respiração”, para, em seguida, voltarem a lutar por ela.
Assim, sua vida torna-se uma longa batalha pelo ar
necessário. Quando “perdemos a respiração”, isso ocorre
depois de um susto ou por medo. Será que as crianças
asmáticas passam a vida sentindo medo e se assustando?
De fato, apenas raramente podem “inspirar e respirar
aliviadas” e participar plenamente da troca com a vida. Na
maioria das vezes, sua respiração é pesada e ofegante e
ilustra a dura luta pela vida. Com chiados, assobios e ruídos
no peito, querem ser ouvidas e protestar contra a resistência
da respiração, ou melhor, contra aquilo que as impede de
chamar a atenção.
Nem por um instante conseguem esquecer sua falta de ar,
e isso, de certo modo, faz com que se sintam em suspensão.
Com frequência, constroem castelos de vento, que
geralmente se desfazem no ar; sonham com mundos
distantes além das nuvens ou perto do céu, que as libertam
de seu problema com a polaridade e com o tomar e o dar.
Normalmente, nesses casos o ar não é suficiente nem
mesmo para um pequeno pulo de alegria, de tão ocupadas
que estão em recuperar o fôlego com dificuldade, e grande
parte de sua vida é gasta em pausas necessárias para
respirar.
O psicanalista Arthur Jores parte do princípio de que 50%
dos “asmáticos” sofrem de uma sensibilidade extrema do
olfato, que poderia desencadear crises de asma. Além dessa
hipersensibilidade, seu colega Thure von Uexküll também vê
a falta de sociabilidade, a coerção e uma grande exigência
de respeitabilidade. Os asmáticos fazem algumas coisas
conscientemente para não chamarem a atenção e
permanecerem em meio à sociedade sem serem
descobertos; por outro lado, ao inflarem os pulmões,
demonstram claramente uma elevada aspiração de seu ego.
A análise psicossomática caracteriza os pacientes de asma
como agressivos a briguentos e, por outro lado, como
pessoas que rejeitam conflitos. Com a autoestima em baixa,
eles seriam ambiciosos e enfatizariam o desempenho,
provavelmente para compensar sua agressividade.
O pulmão remete a temas como “contato”, “comunicação”
e “liberdade”. Ao respirar, a criança asmática faz de tudo
para tomar mais (ar) do que está pronta para dar. Nesse
sentido, trata-se de um distúrbio típico, que se encontra
justamente no espírito da época, ou seja, o distúrbio da
polaridade do tomar e do dar. Com a grande quantidade de
ar inspirado, que faz com que os pulmões se inflem, os
asmáticos correm o risco de se sufocarem em duplo sentido.
De fato, com essa inspiração, correm risco no nível psíquico,
e objetivamente o estado do asmático também pode levar à
morte.
Ao mesmo tempo, o asmático sente, ao contrário, uma
sensível falta de ar na inspiração, mas, do ponto de vista
objetivo, tem uma limitação fisiológica na expiração. Os
esforços para dar algo de si e se conectar deliberadamente
com o mundo são impedidos e perturbados, sem que ele
perceba de maneira consciente. De fato, ele tomou demais
e, portanto, se esforçou ou inflou em demasia, mas isso foge
à sua percepção, que, ao contrário, se fixou em receber
muito pouco. Com isso, as crianças asmáticas estão em
ampla sintonia com a sociedade moderna, que está repleta
de pessoas que sempre requerem mais, porém ainda ficam
com a sensação de receberem muito pouco.
No que se refere ao elemento ar, ao qual correspondem os
mundos intelectual e espiritual, as crianças asmáticas
deveriam aprender a dar muito mais para, em seguida,
poderem tomar de volta. Sem perceberem, elas estão
repletas do elemento ar e, no entanto, sentem falta dele.
Assim, de fato elas não recebem nem têm ar para respirar,
tampouco a oportunidade de mudar essa situação enquanto
desconhecerem completamente a realidade e se tornarem
vítimas clássicas da polaridade.
9.5.1 Polaridades

Do ponto de vista oriental, os problemas do pulmão estão


relacionados à sensação de estar separado da dimensão
sensorial ou daquela divina. Isso se reflete no Gênese,
segundo o qual Deus inspira os homens com seu sopro,
despertando-os, assim, para a vida. Muitas vezes, os
asmáticos sofrem de um desarraigamento interno e de um
desamparo, o que fica claro no tema da separação e
também pode exprimir-se como sensação de profunda
nostalgia. De fato, o retorno à unidade através da
proximidade da morte está no tema que desencadeia um
medo constante e enorme através da sensação de que, a
qualquer momento, poderia ocorrer a última respiração.
Todos nós vivemos na polaridade, mas carregamos a
profunda nostalgia da unidade e de sua respectiva sensação
de felicidade. Nas crianças asmáticas, supõe-se que essa
nostalgia mire retrospectivamente a unidade do ventre
materno, onde predominava uma sensação de completa e
incondicionada proteção e toda exigência era satisfeita pela
mãe – uma condição que nunca está disponível na
polaridade.
Durante uma crise, os asmáticos quase já não expiram e,
portanto, não conseguem expressar suas emoções, pois a
linguagem só pode ser ouvida quando modulamos
adequadamente o fluxo expiratório. Quando queremos fazer
alguém se calar, dizemos de modo agressivo: “Nem mais um
pio!” Os asmáticos fazem isso espontaneamente, ficando
mudos.
Evidentemente, não dominam a polaridade (da
respiração), levam dramaticamente ao extremo um dos
polos (do tomar e, portanto, o Yin) sem perceber e
negligenciam o outro (o do dar e, portanto, o Yang).
Assim, em crises que, muitas vezes, são “extorsivas” e, ao
mesmo tempo, uma ameaça à vida, ocorre claramente uma
combinação entre o exercício inconsciente do poder e o
sacrifício de si mesmo. A tensão entre a aspiração ao poder
e a impotência real no confronto com as intenções de
dominar os outros pode chegar a níveis dramáticos, e “o ar
pode faltar por completo”.
Com frequência, a aversão a tudo que é sujo, escuro e à
pretensão alheia de dominação torna-se clara no anseio dos
asmáticos por ar puro na praia ou na montanha. Nesses
lugares, eles podem estar acima das coisas e das outras
pessoas e conceder-se uma melhora.
Na maioria das crianças cerebrais, a simbologia dos
sintomas da asma revela ainda um choro para dentro, que
indica uma tristeza não vivida, colocada em primeiro plano
pela medicina chinesa: “Estou totalmente sozinho e, depois
de mim, o dilúvio”. Chorar para dentro também revela uma
falta de confiança para se mostrar externamente.
Assim, produz-se uma espécie de choro dos pulmões, com
lágrimas e secreção da mucosa. A criança grita e chora
internamente por medo de perder a proteção e, por outro
lado, fecha-se em seu muco. Os processos conscientes e
inconscientes de luto também se confrontam com o domínio
da perda e da despedida. Soltar-se e respeitar o fluxo da
vida, sem se prender ao que passou, torna-se infinitamente
difícil.
Uma criança asmática, que quer ficar com tudo, acaba por
se excluir da plenitude. Por um lado, ela não consegue
satisfazer-se, pois está sempre ansiando por ar e lutando por
amor; contudo, por outro, não pode dar ar nem amor. Essa
situação faz com que surja a necessidade de ser cuidado e
de receber carinho de mãe – sem nenhuma troca. No sentido
cristão, dar chega a ser mais bem-aventurado do que tomar.
A criança asmática precisaria, no mínimo, da aproximação
de ambos os polos. Clemens Brentano formulou do seguinte
modo a solução para o tema: “Só o amor compreende o
segredo de presentear os outros e, ao mesmo tempo, ficar
rico”.
9.5.2 Medo como tema central

Como a independência é sentida, ao mesmo tempo, como


perda dos cuidados recebidos e ameaça, nos asmáticos
muitas vezes existe justamente o medo de caminhar rumo à
liberdade e à autonomia, o que pode produzir uma aversão a
todo tipo de contato, a ponto de “perderem a fala”.
Intimamente, predomina a sensação do medo e da limitação.
Quem não consegue respirar livremente tampouco
conseguirá viver sua própria natureza. Às vezes, as mães
também não dão espaço suficiente para o desenvolvimento,
e a exigência de autonomia acaba sendo sacrificada muito
cedo, fazendo com que a liberdade e o espaço (vital) se
tornem problemas.
O desencadeamento de acessos de asma se dá através de
situações e vivências de transição, como na maioria dos
traumas de separação da mãe, dos pais e das pessoas de
referência, bem como através da mudança de residência ou
localidade, etc. Toda situação de separação é um momento
de tristeza e despedida a ser dominado. Mas também o
ingresso na escola, as provas ou o início da vida profissional
são vivências incisivas de transição, que podem induzir à
asma ou produzir uma nova crise. Por um lado, esses
acontecimentos são carregados de medo; por outro,
implicam uma alteração tal como a separação do ambiente
habitual e das pessoas de referência. Nesse caso, fica claro
que, depois da puberdade, é mais difícil tratar e, sobretudo,
curar a asma se nesse período o jovem não aprender a se
desprender da mãe ou dos pais. O conflito ativo com os pais,
o “ser do contra” por princípio, seria uma oportunidade para
arejar a agressividade reprimida.
Portanto, o medo é um tema central na asma. Por um lado,
a personalidade já pode conter o medo em sua estrutura
fundamental e, por outro, pode ser acrescida de um medo
específico da asma. Os pacientes são vistos como
desconfiados e inibidos. Sua situação comum de respiração,
com os ombros levantados devido à sobrecarga da
musculatura que ajuda na respiração, ilustra a situação de
medo de forma bastante impressionante. Os pequenos
pacientes lembram tartarugas, que encolhem a cabeça, ou
caramujos, que se recolhem dentro da própria casa, pois do
lado de fora sentem medo ou, pelo menos, não se sentem
nem um pouco confortáveis.
Entre as mães de crianças asmáticas, encontram-se
muitas vezes personalidades dominantes, em relação às
quais a criança reprime sua agressividade e se adapta de
modo extremo. Muitas vezes, essas mães também só são
capazes de transmitir pouca proteção. A criança reage então
com uma discrepância entre atração e rejeição. Ela busca
aproximar-se o máximo possível da mãe e satisfazer suas
necessidades com ela, mas, de certo modo, a evita e se
defende dela por medo da frustração e da decepção. Em
seguida, sofre ao mesmo tempo do desejo de fusão –
crianças asmáticas também necessitam muito de harmonia –
e de impulsos agressivos de destruição. Como resultado,
sentem-se culpadas, mas também sentem medo de serem
rejeitadas.
No âmbito da alergia, geralmente o que é vivaz e escuro
acaba sendo repelido. Não raro, desse ato de fechar-se e
encapsular-se resulta a fuga para o idealismo e o
formalismo, o que pode sobressair como precocidade e
maturidade, causando desagrado.
Por fim, nos pulmões excessivamente inflados, a exigência
de domínio e poder torna-se evidente, podendo continuar a
se desenvolver na idade adulta em um tórax que,
externamente, tem a impressionante forma de um barril e
mais tarde pode progredir para um enfisema pulmonar.
Nesse desejo de “inflar o peito” e “encontrar uma válvula
de escape”, a energia da agressividade torna-se visível,
porém permanece presa aos pulmões. A criança “tosse”
alguma coisa para o mundo e, “de raiva, tenta apanhar o
ar”; se não procedesse assim, ficaria totalmente presa à sua
agressividade.
Geralmente, a resistência a ambientes escuros de vida
torna-se evidente logo cedo. Na produção excessiva de muco
pelos pulmões, os psicanalistas também veem uma
transferência da sexualidade de baixo para cima, ou melhor,
da área dos genitais para o tórax e, portanto, para um plano
problemático.
9.5.3 O aprendizado a partir de modelos e um ambiente natural

Em resumo, trata-se, sobretudo, do círculo de problemas que


comporta “agressividade”, “tomar e dar”, “isolar-se do
mundo”, “necessidade de domínio versus sensação de
inferioridade”, “sujeira ou sexualidade” e “liberdade e
espaço de vida”. Portanto, as crianças devem ser instruídas –
de preferência através de modelos e exemplos – a expressar
e viver sua agressividade e suas exigências de modo
saudável. Elas precisam aprender a encontrar respostas, a
se “desafogar” com palavras e atos e a encarar a vida como
um todo de maneira mais incisiva. Esse processo também
inclui os pais, que nas fases de cura de todas as alergias,
mas especialmente da asma brônquica, têm de suportar
algumas coisas.
A terapia da respiração integrada pode ajudar crianças
mais velhas a experimentar a compensação das tensões
entre dar e tomar e não apenas receber, mas até a desfrutar
plenamente (da respiração). Assim como a respiração
asmática pode, de fato, ser aprendida, também é possível
aprender a realizar uma troca saudável por intermédio de
um exercício cuidadoso.
Aproximar-se abertamente do mundo e pôr a honestidade
em primeiro lugar nos relacionamentos são coisas que as
crianças aprendem o mais cedo possível com o exemplo dos
pais, cujas discussões, quando travadas com coragem e
sinceridade, conduzindo a progressos efetivos, produzem a
lição prática ideal.
Quando as crianças aprendem a confrontar o que até
então era evitado e rejeitado como sendo a própria “sujeira”,
estão no caminho certo. No sentido concreto, considera-se
aqui o êxito frequente da urinoterapia, que, no entanto, para
as crianças, deve ser “vendida” com refinamento. Pura,
obviamente não será ingerida, mas pode ser misturada a um
suco depois de colhida, talvez com a desculpa de algum
exame clínico a ser feito.
A vida em uma fazenda, com todas as suas manifestações
tão naturais quanto primitivas de alimento até o polo oposto,
tal como aparecem no mundo animal de modo ainda
inalterado, pode ter um efeito nitidamente salutar. As
pessoas sempre suspeitaram disso. Por exemplo, na estância
termal suíça de Heiden, fazia-se com que o ar dos estábulos
chegasse aos sanatórios. Atualmente, tenta-se desenvolver
medicamentos antialérgicos a partir do pó dos estábulos. No
entanto, talvez tudo isso seja pensado de forma muito
materialista; os benefícios estariam simplesmente ligados à
proximidade saudável com a natureza. Assim se explicaria o
fato de que a febre do feno e todas as alergias ao pólen, que
não raro terminam em asma, são muito mais comuns no
ambiente urbano do que no rural.
Pais que dão e tomam espaço e liberdade para a
autorrealização, que levam uma vida amplamente natural e
que concedem e transmitem ambas as coisas aos filhos
seriam a resposta ideal para a asma brônquica infantil.
Nessa disposição também residiria a excelente oportunidade
de melhorar o relacionamento muitas vezes sobrecarregado
entre as mães e seus filhos asmáticos.
A meta deveria ser a ampliação da consciência para
campos até agora rejeitados e excessivamente combatidos.
Quando um espaço novo torna-se acessível também no
aspecto metafórico, surgem amplidão e abertura. Algo
semelhante acontece quando castelos no ar são articulados
e realizados com consciência. Assim, seria bom trazer esses
castelos para o chão ou começar a articulá-los em vez de
fugir para o topo das montanhas.
 
Perguntas para os pais:

Que impulsos agressivos nosso filho está
reprimindo?

Por que se mostra tão conformado?

Somos dominantes?

Damos e tomamos com equilíbrio de maneira
equilibrada?

Como devemos lidar com temas como
“sexualidade”, “raiva” e “medo”?
 
Medidas de apoio:

Ver as seções sobre a tosse (9.1), a
predisposição a infecções (8.1) e alergias (11.1).
10 Problemas no trato digestório,
doenças gastrointestinais

10.1 Dor abdominal


“Estou fora do centro.”
 
As dores abdominais são o sintoma por excelência na
infância, pois, nesse período precoce, é sempre o abdômen a
indicar problemas. Ele é o centro do corpo, e a criança ainda
é totalmente um ser corporal e, portanto, ventral. Quando
tem dor abdominal, ela se sente fora do seu centro, que é
sensivelmente perturbado. De fato, mesmo quando estão
com dor de ouvido, crianças pequenas apontam para o
abdômen. Elas sentem todo mal-estar como um distúrbio de
seu centro. Quanto aos adultos, o zen-budismo fala de
“hara”, o centro do corpo, localizado pouco abaixo do
umbigo, mas geralmente considerado “centro mental”. Na
criança, esse centro domina a vida por completo. Ela ainda
não pensa com a cabeça, vive menos das emoções do
coração; ao contrário, é no ventre (em sua sensação), ou
seja, no reino dos instintos que ela se sente à vontade e,
portanto, na região primariamente subordinada à Lua.
Nesse período precoce encontra-se, de fato, o umbigo do
mundo, e a criança também se sente como tal. Tudo gira em
torno dela. O umbigo, por sua vez, é a ligação com a mãe, o
local onde até pouco antes o cordão umbilical estava
acoplado e providenciava tudo que era necessário para a
vida. Portanto, nesse período, quase todos os problemas
também estão relacionados à mãe. Quando o pai, por
exemplo, perde o emprego, a criança só sente se a mãe
reagir e for atraída pela “compaixão”. Em tudo isso, a
criança também é totalmente “egoísta” e voltada apenas
para si mesma e para a mãe. O próprio ventre e, em sentido
mais amplo, a mãe representam seu pequeno mundo; ou
seja, por trás das dores abdominais pode se esconder de
tudo, não apenas complexos temáticos diretamente
relacionados ao ventre, como apendicite aguda, vólvulo ou
até obstrução intestinal, parasitas ou hérnias, como a
inguinal ou a umbilical. Poderia tratar-se de intolerância a
certos tipos de alimentos, como aquela à lactose, mas
também de otite ou amigdalite. Já por essa razão, as
crianças devem sempre passar por um exame completo. Por
isso, não há nada menos adequado do que a medicina
acadêmica, cuja consulta costuma durar cinco minutos. Todo
pediatra sabe disso e, em regra, não se limita a examinar
apenas o abdômen.
Mesmo que os quadros sintomáticos por trás das dores
abdominais se alterem, externamente sempre permanece o
elemento visível e determinante. Por exemplo, Friedrich Graf
parte do princípio de que, desde a supressão da vacinação
contra a varíola, a apendicite (inflamação do apêndice)
regride em favor das disfunções adenoides e linfáticas, como
a formação de pólipos, e de amigdalites mais intensas. O
último exemplo também mostra como foi importante
reinstaurar a vacinação contra a varíola, pois ela facilitou o
tratamento dos problemas linfáticos no início da vida ao
aproximá-los da superfície do corpo. É melhor tratar as
tonsilas palatinas, que são de acesso relativamente mais
fácil e reproduzem os conflitos infantis não superados no
corpo, do que o apêndice vermiforme, que é mais profundo e
só é acessível por meio da cirurgia. Esta foi uma das razões
que, durante décadas, animou a medicina acadêmica a
suprimir o apêndice vermiforme em larga escala. Na geração
dos que hoje têm 50 anos, quem ainda tem o apêndice é um
caso raro. Nesse meio-tempo, as pessoas se tornaram muito
mais cuidadosas a esse respeito e, o que é muito louvável, já
não usam automaticamente o apêndice como ocasião para
cirurgias. Esse novo procedimento, que, de resto, durante
muito tempo foi comum na medicina russa, mostra o quanto
essas cirurgias eram desnecessárias.
10.1.1 Cólica dos três meses

“É tão difícil para mim digerir o novo mundo!”


 
Um recém-nascido tem pouquíssimas necessidades, que, no
entanto, são importantes. Para ele, seria melhor que tudo
continuasse como na gestação, com a tranquilidade, a
escuridão e o calor do ventre materno. A proximidade com a
mãe era máxima e, portanto, também sua proteção. O
contato físico era constante e disponível em toda parte
graças ao líquido amniótico e aos batimentos cardíacos, que
eram ouvidos e, sobretudo, sentidos. Eis por que se mostrou
eficaz dar à luz em água quente e colocar o recém-nascido
sobre o ventre nu da mãe. Aqui também reside o segredo do
sucesso do já mencionado “método canguru”, no qual a mãe
continua a transmitir à criança presa ao seu abdômen o
contato ideal pela pele. O recém-nascido precisa o tempo
todo de calor, amor e afeto; por isso, o carinho e o toque que
recebe nunca são suficientes, conforme mostram estudos
mais recentes e como toda mãe sabe por instinto. Crianças
que dormem à noite com a mãe ou entre os pais também
sofrem nitidamente menos de cólicas.
Os sintomas da cólica são espasmos, que mostram que a
criança tem uma necessidade intensa e obstinada de
segurar – não importa se a razão é o leite mal digerido, o
amor ou outros sentimentos. A necessidade é tão grande
que a criança não consegue deixar fluir aquilo que absorveu.
Querer manter as coisas consigo mesma opõe-se aqui a
deixá-las fluir e causa o conflito, ou melhor, o espasmo, a
luta. Isso aponta para uma necessidade de proximidade,
calor e amor que geralmente não é satisfeita. Para essas
crianças, o “método canguru” pode ampliar um pouco a
gestação, mas, em última instância, trata-se de ousar esse
salto do nascimento para a autonomia. A mãe tem a
possibilidade de aliviar essa transição para a criança;
portanto, não é de admirar que afeto e calor de sua parte
melhoram tudo de imediato e são as únicas coisas que
certamente ajudam.
Quando a mãe – por exemplo, por estresse – já não
consegue aceitar nem amar seu filho, a necessidade da
criança torna-se tão grande e urgente que acaba produzindo
sintomas. A criança lança, por assim dizer, um grito visceral
pedindo ajuda. Seu ventre, atormentado por dores
espasmódicas, reproduz sua luta interior.
Os recém-nascidos modernos, que, como seus
antecessores através de milhões de anos de evolução, nos
primeiros três meses quase só querem beber, digerir e
dormir, hoje passam por um excesso de estímulos muitas
vezes impiedoso. Contra esse excesso de tudo – do alimento
à música –, as crianças se defendem de diversas maneiras e
com variados sintomas, mas a maioria luta contra eles e
grita, mostrando que, desse modo, não consegue digerir a
própria vida.
Quando o excesso de estímulos não pode ser evitado, a
mãe pode atenuá-lo e aumentar a tolerância de seu filho à
frustração, transmitindo segurança com sua presença e
dando-lhe força emocional. O caos produzido por irmãos
mais velhos e a conversa normal entre os pais nunca são
sentidos como perturbação; ao contrário, transmitem o
importante sentimento de comunhão e proteção familiar.
Quanto aos sintomas, o que a cólica dos três meses revela
com mais clareza é que a criança ainda não consegue
absorver o mundo que lhe é oferecido e o considera
indigerível. Isso não é motivo para grande preocupação, pois
algumas crianças têm mais dificuldade para aprender a
andar, outras, para aprender a falar, e outras ainda, para
aprender a digerir. Nesse sentido, a melhor precaução a ser
tomada pela mãe seria, por natureza, ingerir muito ferro
durante a gestação, para que a alma da criança consiga se
ancorar melhor ao corpo. O etnobotânico Wolf-Dieter Storl
parte do princípio de que as moléculas de ferro também são
importantes como minúsculas agulhas magnéticas para que
o organismo possa se orientar no sentido norte-sul.
Ao final da gestação, a concentração de cobre no sangue
da mãe aumenta fisiologicamente, enquanto a concentração
de ferro cai de modo natural. A ancoragem no ventre
materno deve ser dissolvida aos poucos, e a taxa de ferro
regride. Em compensação, com o aumento da taxa de cobre,
sobe também o metal de Vênus-Afrodite. Simbolicamente,
isso significa que a mãe e a criança devem entrar mais no
campo do amor e do desprendimento, o que é
extremamente importante para o nascimento, que, do ponto
de vista primário, não deixa de ser um desprendimento. O
cobre simboliza o princípio primário de Vênus e, portanto, do
amor e da paz, e inclui no princípio da Lua outro princípio
arquetipicamente feminino (da vida). Em contrapartida, o
ferro representa o princípio masculino da agressividade ou
de Marte, que tem a ver com a luta e a guerra, a
agressividade e a imposição. Portanto, a mãe deixaria em
ampla medida o campo da luta e da autoafirmação e
passaria a se dedicar ao campo sensível de Vênus. Não é por
acaso que Vênus e Marte representam o aspecto feminino e
o masculino, respectivamente, por exemplo quando se trata
de ilustrar hoje de modo simbólico os movimentos das
mulheres e dos homens.
Infelizmente, a medicina acadêmica é totalmente contra
essa importante transposição natural e prescreve às mães
preparados de ferro durante toda a gestação, tornando-a
mais lutadora e resistente do que o necessário, em vez de
torná-la macia e receptiva perto do final da gestação,
conforme planejado pela natureza. Desse modo, geramos a
necessidade de cesarianas, bem como intervenções por
fórceps e ventosa obstétrica. Seria mais inteligente alterar
os padrões para a gravidez e adequá-los às circunstâncias
naturais e individuais. Não é nada sensato tratar toda mulher
como um homem de 1,80 metro de altura e 80 quilos.
Entretanto, antes do parto, essa normatização que não leva
em conta a natureza nem a individualidade torna-se
totalmente inadequada. Infelizmente, a medicina moderna
faz ambas as coisas – como sempre, não por maldade, mas
por desconhecimento.
Contudo, no início de uma gestação, a situação é outra,
pois a mãe tem de manter fechado o óstio uterino,
precisando para tanto de força e resistência. Eis por que a
concentração de ferro se reduz com a evolução da gravidez,
quando a mãe em formação se encontra cada vez mais
nessa esfera do feminino primitivo e tem de se preparar para
o grande desprendimento que é o parto.
A criança herda essa situação, como todo o restante, e,
nos primeiros três meses após o nascimento, também
apresenta uma concentração fisiologicamente muito alta de
cobre, que evidencia, de modo concreto e simbólico, sua
necessidade de calor físico, de colo, de proximidade e de ser
cercado de amor. Quando então é lançada de maneira muito
abrupta – para sua constituição individual – em outro mundo,
ela pode reagir com protestos e com resistência a digerir
esse novo ambiente. Os gases que surgem com frequência
nesses casos mostram como ela está confusa e
“desgostosa”. Quando reage com verdadeira irritação e
raiva, os homeopatas pensam na camomila, medicamento
que se comprovou muito eficaz nessas situações.
As contrações das cólicas são como ondas de ataques que
sempre se renovam. Com elas, a criança luta contra esse
mundo que lhe é estranho e hostil e que penetrou em seu
abdômen. O ambiente é sentido como perturbador e até
como um obstáculo, que ela tenta afastar e eliminar com
esforços rítmicos que correspondem a tentativas de expulsão
semelhantes às dores do parto. As dores do nascimento
semelhantes ao parto expressam o quanto se trata aqui de
sua luta pela vida. Ao mesmo tempo, essa espécie de
peristaltismo extremo torna-se quase uma caricatura do ato
de digestão, que normalmente só começa a funcionar de
fato nesse período.
O cérebro, que elaboraria as impressões imateriais em
suas circunvoluções, ainda dispõe de certa tranquilidade,
enquanto as circunvoluções do intestino delgado, bastante
semelhantes por seu formato, só despertariam lentamente
para a vida, em vista de seu trabalho de diferenciação.
Quando elas realizam esse trabalho de maneira excessiva,
causando cólicas, o estresse se torna evidente. “Muita coisa
cedo demais” seria uma descrição para a situação.
Tudo na vida tem seu tempo, e toda criança também
precisa do seu. Inicialmente, ela não consegue nem quer
conquistar o mundo através dos olhos, dos ouvidos ou do
cérebro, mas deseja e deveria vivenciá-lo através da boca e
do intestino. Por isso, durante muito tempo as crianças
colocam tudo que é novo na boca para poder experimentá-
lo, o que pode levar as mães ao desespero. Mas como a
criança ainda não dispõe de experiências de abstração,
nessa fase precoce, esta é sua única possibilidade de
aproximação. Assim como precisam de tempo para tudo,
também precisam encontrar seu ritmo na vida.
No que se refere à cólica dos três meses, é importante não
alimentar ou amamentar as crianças quando elas estão
irrequietas, exaustas ou apresentam dificuldade para dormir.
No início da vida, as crianças dormem dois terços do tempo,
período que aos poucos vai se reduzindo a um terço. Nos
primeiros meses, o ritmo sono-vigília tem de se equilibrar.
Isso pode causar problemas, sobretudo quando as crianças
são obrigadas a dormir porque os pais precisam de
descanso, e não porque estão cansadas. A situação se torna
mais difícil porque esses valores são apenas medianos, e a
necessidade de sono varia muito de um indivíduo para outro.
O reflexo de sempre dar o peito a uma criança que grita é
tão compreensível quanto inadequado. Mesmo as dores ou a
necessidade de afeto e proximidade são respondidas
erroneamente com a oferta sempre automática de alimento.
Essa espécie de amamentação por demanda perturba a
digestão do bebê e faz com que o leite se acumule no
intestino a cada estágio da digestão, provocando um
verdadeiro pandemônio. Embora a amamentação estimule
muito a proximidade e a relação entre a mãe e a criança,
pois nela é liberada a oxitocina, o hormônio da ligação,
quando a mãe amamenta por muito tempo prevalece o
efeito negativo dos diversos estágios do leite.
René Spitz, psicanalista austro-americano, observa que
filhos de mães na prisão têm nitidamente menos problemas
de cólicas. Segundo ele, a razão disso seria o fato de que
essas crianças são amamentadas apenas a cada quatro
horas, dispondo, assim, de um ritmo razoável para a
digestão. Para esse efeito pode ter contribuído o fato de que
as presas, no breve tempo que passavam com os filhos,
transbordavam de amor por eles, uma vez que, enquanto
pagavam por sua pena na prisão, dispunham de poucos bons
momentos em que pudessem dedicar-lhes sua atenção.
Isso mostra como é importante dar estruturas para a
criança e não responder a toda queixa sua com alimento.
Outras necessidades da criança devem ser apaziguadas de
modo diferente. Além disso, responder a tudo com comida
pode predispor à obesidade no futuro. Pois, de fato, muitos
obesos, que se tornam cada vez mais numerosos, ainda na
idade adulta respondem a todo estímulo com comida, o que
acaba intensificando seu problema de sobrepeso, mesmo
que este não tenha esse fator como causa.
Além disso, essa resposta automática com alimento pode
fazer com que as crianças queiram sempre ter alguma coisa.
Desse modo, elas aprendem a ser menos tolerantes com as
frustrações e se tornam “cansativas”.
A tarefa dos pequenos mimados, que, na realidade, são os
que mais sofrem, seria atrair atenção para si, lutar pelo
contato que lhes é negado em outros níveis, por exemplo
fazendo com que sejam carregados de um canto para outro
ao longo do dia. Com o método canguru, isso seria mais fácil
desde o princípio. Como já foi dito, é interessante notar que
em Bali, onde as crianças são sempre carregadas desde o
primeiro ano, não se observam o problema da cólica dos três
meses nem crianças pequenas gritando.
Todavia, as ações inconscientes de luta, sentidas na região
intestinal e até visíveis no abdômen enrijecido, também
mostram que a criança quer e deve conquistar seu mundo e
até lutar por ele. Por sua vez, a criança consegue fazer isso
melhor quando recebe mais liberdade de movimento no
canguru. No âmbito da digestão, ela quer se livrar do que a
bloqueia, daquilo que deve tê-la atravessado, mesmo que
para tanto tenha de ser enfática e de sentir dores. Porém,
mesmo se esforçando, não sente nenhum alívio. O pequeno
abdômen tenso torna-se evidente em seus esforços sofridos.
Alguma coisa tem de entrar em movimento. O movimento
rítmico de contração e distensão mostra como os bloqueios
ocorreram com esforços e exercícios de desprendimento
sempre reincidentes. Em última instância, trata-se de livrar-
se, de modo mais ou menos doloroso, daquilo que estorva a
vida. Obstáculos pelo caminho devem ser superados. A
criança faz o seu melhor para consegui-lo no único nível que
se encontra tão precocemente à sua disposição: o corpo.
Com o auxílio dos pais, ela quer, antes, adquirir outros
níveis.
Pais e filhos têm de aprender juntos a lidar com a nova
situação. As crianças devem e precisam expressar sua
inquietação a respeito e mostrar sua agressividade e seu
desamparo. Precisam aprender a dominar esse ambiente
totalmente novo, assim como os pais precisam aprender a
controlar essa situação, que também é nova para eles.
Nunca a discrepância entre o período intra e extrauterino foi
tão grande como em nossa época, quando a importância da
vida da alma e da vida interior foi quase totalmente
reprimida por uma atenção exagerada ao que vem de fora.
Uma contribuição maravilhosa, embora também técnica,
nessa situação que ameaça a paz doméstica é oferecida pelo
já mencionado sistema de balanço “Sleepy”, que confere um
ritmo excelente não apenas à cama infantil, mas também
àquela de adulto. Quando as crianças se embalam em seu
próprio ritmo, são ajudadas com mais rapidez e eficácia. Em
todos os casos, essa é uma medida de apoio que não
prejudica, mas pode ajudar muito.
Os homeopatas enfrentam essa difícil situação com uma
ampla oferta de medicamentos, dos quais cinco se
sobressaem. A já mencionada Chamomilla (camomila) é
adequada quando a irritação e a raiva predominam na
criança e os pais desesperados já não sabem o que fazer
para acalmá-la. Não raro, essas crianças-camomila também
refletem em sua raiva seu ambiente, que é repleto de
inquietação, agitação e agressividade. Nessas crianças, os
pais poderiam enxergar melhor seu próprio problema.
O Cuprum (cobre) pode ser designado como o
“medicamento para os espasmos de amor”. A mãe tenta,
desesperadamente, fazer tudo certo e com perfeição; teme
ataques e críticas do ambiente e tem medo de dizer não. A
criança mostra-se carente, precisa de calor e quer ser
amada. Dorme mal e tem de certificar-se de que a mãe
ainda está presente, de preferência em contato físico
constante.
O Magnesium carbonicum (magnésio carbônico) é o
medicamento a ser escolhido quando as crianças se sentem
abandonadas pela mãe que tem de trabalhar muito cedo ou,
em todo caso, tem de sair, mas também para crianças que
permanecem sem a mãe em unidades de terapia intensiva,
como até hoje acontece em clínicas pouco adequadas a
crianças. Sentem falta da mãe, que naturalmente representa
para elas o centro da vida, tal como o Sol para o sistema
solar. Essas crianças reagem com irritação, desde o campo
psíquico até aquele físico, o que, por sua vez, se mostra na
acidez de seu suor azedo, de seu vômito e até de suas fezes.
A Colocynthis (coloquíntida) é o medicamento clássico
para cólica. A lactante adoece devido a algum
acontecimento e reage com raiva, indignação e irritação.
Esse estado de espírito é transmitido à criança, que
responde com fortes cólicas. Estas melhoram quando a
criança é deitada de bruços sobre o antebraço ou os ombros,
sentindo uma pressão firme no abdômen.
Na maioria das vezes, bebês-Lycopodium (licopódio)
nascem delicados e frágeis. Dão a impressão de serem mais
velhos e, não raro, franzem a testa. Tipicamente, sofrem de
icterícia prolongada. Muitas vezes, os pais têm a sensação
de que seu filho, que emite gritos de raiva entre as 16 e as
20 horas, quer controlá-los.
 
Perguntas para os pais:

O que poderia perturbar nossa ligação com
nosso filho?

Como podemos transmitir-lhe proximidade,
proteção e contato físico com mais eficácia ou de
outra forma?

Como podemos ajudá-lo a digerir o que está por
vir?

O que ele não consegue absorver nem digerir
(por exemplo, em relação aos alimentos que a
mãe consome)?

Em que situações me sinto estressada como mãe
e como eu também posso me desprender de vez
em quando, nem que seja por cinco minutos?

Que ritmo é adequado para nosso filho e para
nós?
 
Medidas de apoio:

Aplicações de calor: mostraram-se eficazes
compressas quentes no abdômen. Prepare um
chá forte de cominho, milefólio e/ou melissa e
nele embeba uma fina toalha de algodão. Torça a
toalha e a coloque se possível quente sobre o
abdômen nu da criança. Cubra-o com outra
toalha, envolvendo-o firmemente com uma
coberta de lã. Segure a criança por cerca de
meia hora no colo ou deite-a na cama para
dormir. Se necessário, também é possível colocar
uma bolsa de água quente não muito cheia
sobre o abdômen. Assim, o calor da compressa
dura mais tempo, podendo chegar a uma hora.
Advertência: não utilize cobertas nem travesseiros
elétricos, pois eles podem facilmente represar o
calor. Além disso, utensílios que dependem de
corrente elétrica não devem ser usados em camas
de criança, não apenas por motivos de segurança,
mas também devido à carga de radiação
eletromagnética.

As massagens devem ser sempre feitas de modo
circular, no sentido horário ao redor do umbigo.
Nela pode ser utilizado óleo de cominho, hipérico
ou melissa, aquecido com as mãos. Caso não
esteja disponível, também se pode empregar um
óleo suave para bebês ou azeite de oliva. Cuide
para que o ambiente esteja aquecido e para que
os pés da criança estejam quentes durante a
massagem.

Chá: recomenda-se uma mistura de cominho,
funcho, anis e coriandro. Dê à criança o chá
sempre sem açúcar, com uma colher ou na
mamadeira com um furo pequeno no bico, para
que ela se esforce e não se acostume mal. Do
contrário, a amamentação pode se ameaçada.

Um clister, como descrito no capítulo 3 “Febre”,
também pode proporcionar relaxamento e alívio
em casos de gases ou evacuação dolorida.

Amamentação tranquila: enquanto amamenta,
evite ser incomodada. Nesse período, o telefone
e outras fontes de ruído, como rádio e televisão,
devem permanecer desligados. Permita-se uma
pausa antes, na qual possa evitar a pressa, o
estresse ou qualquer distração. Beba uma xícara
de chá quente e encontre uma posição
confortável para amamentar. Esse importante
período em que você não apenas alimenta seu
filho, mas também lhe dá o calor, o afeto e o
amor de que ele precisa deve pertencer a você e
a ele. Desfrute dessas horas de intimidade. Tente
reagir de maneira relaxada e converse com seu
parceiro sobre as prioridades. As crianças
crescem rápido demais e talvez já não queiram
ser abraçadas nem receber carinhos de forma
tão intensa. Com frequência, as mães dizem:
“Ah, se eu tivesse aproveitado melhor essa fase!
Ela passa tão rápido, e agora meu filho já está
grande”. As fases de gritos entre os períodos de
amamentação devem ser contornadas sem
alimentos. Procure consolar ou distrair seu filho
de outra maneira.

“Andar de bicicleta”: a cada troca de fralda ou
fase de dor, recomenda-se executar movimentos
suaves com as pernas da criança, como se ela
estivesse pedalando. Durante esses
movimentos, muitas vezes ela solta gases, que,
naturalmente, trazem alívio.
10.1.2 Medicamentos homeopáticos em casos de dores abdominais

Chamomilla C30 Cuprum C30


Disposição Irritada, mal-humorada, irada, Inquietação; a criança sofre
hipersensível; gritos altos; com a proximidade insuficiente
desenfreada, insatisfeita; atira da mãe; é extremamente
os brinquedos preferidos carente
Dor Convulsiva, irregular Repentina, intensa, pungente;
espasmos; abdômen duro
e tenso
Melhora com Ser carregada no colo a Pressão, bebidas frias, calor
acalma
apenas por um breve período;
aplicações de calor
Piora com Ficar deitada, ficar coberta, Frio, levantar os braços, susto
estímulos externos
Período À noite, até as 24h De 0h a 1h, 3h
Peculiaridades A criança puxa as pernas; Cerra os punhos com os
sente polegares para dentro; ruídos
dores logo após a refeição e no intestino; náusea
durante a dentição; fezes com
cheiro de ovo podre
Agentes Raiva, ira, dentição, mãe Decepção afetiva, irritação,
desencadeadores hipersensível na falta
amamentação de sono
Aparência Cabeça quente, vermelha; Pálida, braços e pernas
uma bochecha vermelha e a azulados, fria, rosto
outra pálida pontiagudo
 
Magnesium Colocynthis C30 Lycopodium C30
Carbonicum C30
Disposição Mal-humorada e Irada, irritada, Com raiva, irada,
irritada; quer ficar impaciente chorosa
com a mãe sem ser
perturbada; mãe e
filho não dormiram
o suficiente
Dor Fulgurante Como uma onda, Espasmódica, com
cólica, intermitente, eructação
intensa
Melhora com Movimento, ao ar Forte pressão; Breve melhora com
livre, à luz do sol encolhendo-se; a eliminação dos
puxando os joelhos; gases ou com
ficar deitada por eructação;
cima dos ombros; afrouxando
eructando; soltando as roupas
os gases
Piora com Frio, silêncio, na Após a Roupa apertada no
cama, no escuro amamentação; ficar abdômen; após a
deitada de costas; amamentação
calor excessivo
Período A partir das 3h À tarde Das 16h às 20h
Peculiaridades Fezes como ovas Frio, irritação e Vontade de comer
de rã, duras, raiva da mãe algo específico;
gelatinosas, do satisfação rápida;
tamanho de icterícia
lentilhas a ervilhas,
espumosa,
secreção ácida
Agentes A mãe tem muito Ira, indignação, Ambição frustrada,
desencadeadores pouco tempo e decepção, ofensa humilhação
está estressada
Aparência Palidez Contorce-se de dor, Fraqueza; parece
sente medo mais velha; testa
franzida; pele seca;
criança delicada com
cabeça grande

10.2 Gases
“Estou fedendo!”
 
A criança que sente seu próprio mau cheiro libera sua
agressividade indiretamente. Ela se opõe a alguém,
descarrega sua raiva (por trás) e, “empesteando o ar”,
procura manter afastadas pessoas desagradáveis, o que não
raro ofende a própria mãe. Quem afugenta os outros com
bombas caseiras de mau cheiro recorre a uma retórica
fétida, bastante repugnante e desrespeitosa no verdadeiro
sentido do termo. A causa física superficial reside com
frequência em um meteorismo bem desenvolvido, que
desafoga a tensão e a pressão sofrida pelo abdômen. Por
trás desse sintoma estão um intestino grosso
sobrecarregado e um inconsciente que lhe corresponde,
sendo que o intestino grosso representa o inferno, o Hades
ou o reino dos mortos no corpo. Muitas vezes, uma flora
intestinal danificada é a base física mais profunda do
sofrimento, cuja causa nos tempos modernos não raro são os
tratamentos à base de antibióticos. Só o termo já revela que
são voltados contra (anti) a vida (bios) – do ponto de vista da
medicina acadêmica, é claro que se destinam a combater a
vida de bactérias; porém, na prática, muitas vezes
combatem a vida do indivíduo, que sai prejudicado com o
enfraquecimento das próprias defesas.
Por meio dos gases, a criança se expressa por trás, porque,
pela frente, (ainda) não consegue ou não é ouvida. Com os
gases, a energia desaparece pela saída dos fundos. Isso é
sinal de uma força de integração anímica insuficiente e de
que a criança incorpora coisas que não lhe são salutares e
que, ao contrário, cheiram mal. Nesse caso, o alimento não é
digerido, e sim gaseificado, o que o torna menos proveitoso
e extremamente problemático.
A tarefa estaria em encontrar caminhos mais produtivos
para que a criança possa se expressar. Ela precisa e deve
mostrar quando sente que alguma coisa está cheirando mal,
pois isso melhora toda a situação. Na prática, embora a
saída dos gases seja desagradável para o indivíduo em seu
ambiente mais imediato, para a criança é um alívio. Desse
modo, ela deixa escapar o excesso de pressão do centro do
seu mundo e, com o consequente alívio, passa a sentir-se
melhor. Em contrapartida, quem segura os gases sempre
acaba sofrendo mais pressão e corre o risco de explodir
como uma panela de pressão com a válvula entupida.
As dores sentidas por causa dos gases devem ser
interpretadas como um grito de socorro da criança que
perdeu seu centro. A inquietação que acompanha o
meteorismo na criança demonstra sua vontade de tornar-se
mais ativa e, em última instância, de conhecer a vida. Os
distúrbios do sono, também frequentes, representam o
desejo de acordar para este mundo, mesmo que ela exprima
isso de modo ainda muito contido.
Em geral, em todas as idades, os gases pressupõem o
aprendizado de soltar oportunamente a pressão que surge e
também de se exprimir de maneira agressiva, direta e
frontal, a fim de não apenas empestear o ar e ser obrigado a
agir apenas por trás. Quem desenvolve a coragem para um
confronto direto pode poupar-se dos desvios e transmitir, de
maneira igualmente direta, até mesmo os conteúdos mais
sombrios de seu inferno. Em última instância, como dizem os
budistas, trata-se de exercer o bhoga, ou seja, de aprender a
“comer o mundo”, o que nada mais significa além de digerir,
ou melhor, elaborar a vida que cabe a cada um – tudo a seu
tempo e em seu lugar. Portanto, as crianças que sofrem de
excesso de gases e de agressividade represada precisam
entrar em contato com a vida e com o mundo. Assim, é
aconselhável oferecer-lhes estímulos de acordo com a idade,
torná-las curiosas e sempre proporcionar espaço para que
possam espernear e dar chutes, sem com isso provocar uma
avalanche de agressividade contra os pais.
Para a maioria dos pais, os gases dos filhos não são
nenhum problema. Na amamentação, chegam a ser vistos
como muito agradáveis. É uma questão de empatia de
quanto a criança é amada ou, ao contrário, desperta
repugnância. De acordo com o caráter deste livro, temos
aqui de nos ocupar mais dos “problemas”, mas também
queremos dar espaço às oportunidades. Assim, até mesmo
os gases fortes das crianças, sobretudo quando elas os
seguram por muito tempo, podem transformar-se na máxima
forma de amor.
No entanto, para muitos pais, a situação também pode
significar um desafio, submetendo seu amor a uma dura
prova, pois, nesses casos de excesso de gases, eles se veem
muitas vezes sob pressão. Desse modo, são desafiados a
despertar para seu filho e seu papel como pais, justamente
em uma situação em que ele causa repugnância a eles
próprios e a todos, talvez de modo constrangedor. O amor da
mãe ou dos pais (livre de expectativas e exigências) é a
forma mais desenvolvida de amor na Terra e o campo de
treinamento ideal para o amor celestial (a Deus), que
também é incondicional. Assim, os próprios filhos se tornam
uma grande prova, um desafio e uma oportunidade, pois
justamente nas dificuldades embaraçosas que os pais têm
com eles é que se poderia desenvolver a forma especial e
incondicional do amor. Nesse caso, a criança tornaria
fecundo o amor dos pais e, com ele, a união de que é fruto,
em vez de colocar esse amor à prova.
No entanto, com muito mais frequência, a gravidez
sobrecarrega e prejudica o relacionamento, e crianças que
sofrem de flatulência crônica mais ainda, pois essa
oportunidade de crescer dentro de um amor abnegado é
desperdiçada, e os nervos dos pais, sobretudo os da mãe,
sofrem muita pressão e são expostos a verdadeiras provas
de resistência. Porém, quando ela consome todos os seus
nervos com seu filho que sofre de flatulência, que incha e
empesteia o ar, eles lhe faltam no relacionamento com seu
parceiro. Ela chega a se irritar com ele e também consegue
mostrar-lhe o que reprime com a criança, tal como os
adultos reprimem seus próprios gases, em geral em
detrimento próprio e por consideração ao ambiente.
Todavia, não raro o parceiro se irrita com a situação de
viver com uma criança que cheira mal em vez de sorrir e que
absorve a mãe por completo, fazendo com que ela cumpra
apenas secundariamente seu papel de esposa, para não
falar naquele de amante. Assim, muitas vezes ele foge para
outro quarto, para o esporte ou para o trabalho, em vez de
estar presente como pai. Essa função exigiria dele
amadurecer emocionalmente como pai, em vez de
permanecer dependente da mãe nesse campo, queixando-se
de ser deixado de lado e afastando-se.
Muitas vezes, apenas a mãe se familiariza com essa forma
elevada de amor, apesar ou justamente por causa de todos
os desafios, que não apenas podem ser exigidos, mas
também estimulados do ponto de vista da alma. Depois,
pode acontecer de seus desejos mais profanos de amor a
irritarem porque, cansada e esgotada, já não lhe resta
energia. Para o parceiro, que, aparentemente, nada recebe
porque nada tem e não está pronto para receber esse vazio
como aprendizado, esse amor de mãe, que lhe dá a
impressão de ser provocador e justamente atua como uma
demonstração, pode lhe dar literalmente o que sobra. Assim,
para ele, não apenas a criança cheira mal, mas também toda
a situação, a tal ponto que, não raro, ele a questiona.
Nesse caso, caberia aos pais a tarefa de deixar ao critério
da criança a necessidade e a expectativa, sem dirigir
cobranças um ao outro, e sim, se possível, desenvolver
juntos uma autonomia no amor: uma tarefa que muitas
vezes supera as forças dos pais modernos, que também são
sobrecarregados, embora de maneira diferente.
 
Perguntas para os pais:

Como reagimos ao cheiro dos gases do nosso
filho?

Como podemos possibilitar ao nosso filho
experiências adequadas à sua idade?

De que outro modo ele pode descarregar sua
raiva?

O que ele está reprimindo? Como pode
conquistar o mundo?

Contra quem ele está se opondo? O que eleva
sua alegria de viver?

O que ele não consegue digerir no sentido
concreto e naquele figurado?

Como podemos ajudá-lo, para que ele aprenda a
enfrentar esse conflito com coragem?

O que nos revolta? O que nosso filho demonstra
por trás porque ainda não consegue demonstrar
pela frente?

Sentimos seus odores como sinais ou
perturbação?

Esses odores alteram a atmosfera de modo
agradável ou sentimos esses gases como
“bombas pérfidas de mau cheiro”?

Que tipo de ar fresco gostaríamos de ter em vez
de seus gases? O que esperamos das crianças
como contribuição para o “clima” familiar?
 
Medidas de apoio:

Exame de fezes: em casos de gases recorrentes
ou duradouros, é aconselhável fazer um exame
de fezes, a fim de se obter um quadro da flora
intestinal e dos resíduos da digestão.
Dependendo do diagnóstico, deve-se realizar
uma limpeza do cólon.

Todas as medidas apresentadas nas seções
sobre dores abdominais (10.1) e cólica dos três
meses (10.1.1) também devem ser consideradas
aqui.

10.3 Vômito
“Estou enojado.”
 
Há que se distinguir aqui entre o vômito ocasional e o
frequente, bem como aquele causado pelo leite materno,
que acaba por perturbar a simbiose entre a mãe e o filho.
Em si, o vômito é uma reação saudável e, como evento
isolado, não necessita de tratamento. Com ele, o organismo
expulsa aquilo que não suporta e que deixou penetrá-lo
erroneamente devido a uma falha da visão e do olfato. O
vômito chegava a ser um método da medicina antiga, com o
qual não raro se visava ao alívio. De fato, depois de vomitar,
sentimo-nos nitidamente bem melhor do que antes. Nesse
sentido, não se trata aqui de uma doença nem de um
sintoma, mas de uma reação natural e importante de
autodefesa. Melhor ainda seria não ingerir algo que não
poderemos suportar, pois uma sensação oportuna de
repugnância já seria um aviso suficiente. Por isso, o vômito
precoce é a segunda melhor reação e deve ser preferida à
possibilidade posterior da diarreia.
Vomitar também significa “entregar-se”, “deixar
acontecer” e “confiar em um acontecimento mais poderoso”.
Em um navio, o indivíduo pode entregar-se à situação do
mar com suas ondas e seus altos e baixos, ou então tentar
resistir e vomitar por cima da balaustrada. Quando o
estômago está revirado, o indivíduo vomita porque não se
sente livre. O estômago revira-se porque quer livrar-se a
tempo de um conteúdo inadequado, antes de causar danos
maiores. Também é possível querer devolver desse modo
alguma coisa que se tomou e com a qual não se consegue
ficar, como no caso da bulimia, que antigamente era
chamada de “mania de ingerir e vomitar”.
Vomitar significa expulsar uma matéria de dentro de si,
esvaziar-se, talvez para conseguir entregar-se melhor à vida.
A experiência mostra que pessoas que praticam o jejum – ou
seja, que estão acostumadas com esse vazio – familiarizam-
se melhor com novas situações, encontram muito mais
facilmente seu próprio ritmo e entram em sintonia.
Muitas vezes, o vômito infantil também tem como
fundamento o excesso de agitação. Quando uma criança não
está absolutamente preparada para a digestão, mas, apesar
disso, é alimentada, ela acaba caindo em um vínculo duplo,
pois pode apresentar uma reação nervosa. Ela se encontra
em uma situação dominada pelo sistema nervoso simpático,
que é o pedal do acelerador do organismo, em vez de estar
naquele do sistema nervoso parassimpático, necessário para
a digestão e que atua como um freio no organismo. Ou, em
outras palavras, a atmosfera não é propícia para a criança,
pois a mãe está agitada, inquieta e não consegue se dedicar
a ela. Há muita agitação em torno da refeição, o que,
obviamente, é problemático no momento da amamentação.
Nesse caso, o vômito resulta da excitação que se reflete no
estômago.
O enjoo também denota que o processo do vômito em si é
algo saudável. Quem sente náusea traz algo ruim dentro de
si, e quando isso é posto para fora, o indivíduo sente alívio e,
geralmente, bem melhor do que mantendo o conteúdo em
seu organismo. Por certo, seria mais habilidoso livrar-se do
mal-estar em sentido figurado, por exemplo, “vangloriando-
se” ou até “estragando os planos de alguém” do que cuspir
verdadeiramente no mundo. Mesmo quando se expele pela
boca alguma coisa com dificuldade, ela sempre é revelada.
Quem se encheu de coisas inapropriadas e indigeríveis
tem de contar com o fato de que as colocará para fora
novamente. Porém, o indivíduo também sente repugnância
quando absorve muitas impressões errôneas e experiências
indigeríveis. Em seguida, tudo vem à tona e evidencia a
revolta: “A situação é insuportável”. Quando um problema
vai parar no estômago como se fosse uma pedra, arruinando
o apetite, é melhor para a saúde que tudo seja posto para
fora – em caso de necessidade, também no nível físico. Do
contrário, é possível que ocorra uma irrupção em outros
níveis. Quem sente muita raiva e destila seu fel também
consegue ter alívio, uma vez que libera o que o oprime.
Outra possibilidade, que não é melhor, é quebrar a cabeça
até sentir dor.
Obviamente, melhor seria perceber em tempo a
incapacidade de assimilar o que está por vir e, assim,
poupar-se do vômito. A tarefa consistiria em reconhecer
conscientemente a resistência e a aversão ao que é sentido
como indigerível. Portanto, é preferível aprender a revoltar-
se no campo social e não aceitar tudo que lhe oferecem, ou
seja, é melhor interromper alguém a tempo, a fazer o corpo
vir em seu auxílio através do vômito. Quem reconhece a
própria raiva e a própria maldade consegue liberar com mais
facilidade a agressividade represada e reprimida. É
importante aprender, desde criança, que não faz sentido
engolir e digerir tudo que lhe apresentam sob todas as
condições. Quando a pessoa se engana e permite que temas
e objetos a penetrem mais profundamente, como se fossem
lhe fazer bem, vomitar no sentido concreto e figurado é a
melhor alternativa.
10.3.1 Vomitando o leite materno

“Não gosto do seu gosto.”


 
Por longos períodos, o bebê é um espelho perfeito da mãe.
Porém, o que na maioria das vezes é sentido como a maior
felicidade do mundo também pode virar do avesso, quando a
criança põe constantemente para fora o leite (da própria
mãe). Muitas vezes, de acordo com a lei do espelhamento e
da ressonância, naturalmente isso afeta a mãe, que talvez
seja mesmo repugnante, não consegue lidar com a (nova)
situação e, não raro, conduz uma luta desesperada. Quando
a criança vomita seu único alimento, a mãe precisa dar de
mamar ainda mais vezes e enfrentar mais ainda a rejeição
evidente. Contudo, esse círculo vicioso tem um lado bom,
pois, com o aumento da amamentação, a criança irá sugar
com mais frequência e, dependendo da fome, mais
intensidade, o que estimula o organismo da mãe a liberar
mais oxitocina. Portanto, esse hormônio da ligação, que
desde a primeira infância até a idade adulta desempenha
um papel decisivo na estabilidade de toda união entre os
seres humanos, pode trazer um componente de autocura
para a situação precária.
A situação normal de amamentação, na qual o bebê,
depois de um longo e cansativo esforço, suga feliz, gota a
gota, o leite do peito, pode ser tão bela quanto deprimente,
se a mãe, nessa fase por si só tão feliz, recebe de volta, em
forma de vômito, aquilo que de mais precioso tem a
oferecer. Normalmente, além do seu leite, ela também sente
que seu amor e ela própria estão sendo rejeitados e
repelidos. Nos adultos, a quantidade de oxitocina e endorfina
liberada durante a amamentação corresponde àquela
produzida pelo orgasmo. Nesse sentido, as mães em questão
experimentam uma ducha de água fria emocional.
Do ponto de vista médico, provavelmente o jato de vômito
do leite materno se deve a uma contração do piloro. O bebê
trava uma luta nesse importante local e, de certo modo,
estreita a tal ponto essa abertura que o leite nem chega a
passar do estômago para o intestino e é logo golfado para
fora. Portanto, também se poderia falar em uma espécie de
greve de fome inconsciente, que implica uma rejeição
manifesta e dramática da mãe, o que, na prática, quase
sempre leva a um estresse psíquico e físico da mãe, que
logo é obrigada a amamentar de novo, muitas vezes apenas
para ver todo o seu leite devolvido novamente. Seu bebê
exprime uma espécie de mensagem de duplo vínculo, no
seguinte sentido: “Odeio você, cuide de mim”.
Por parte da criança, que regurgita o leite não digerido, o
drama significa que, mesmo correndo risco de vida, ela não
consegue ou não quer aceitar nada da mãe. Sobretudo o fato
de que a mamadeira, usada como expediente, quase não é
rejeitada como o leite materno torna toda a situação ainda
mais evidente e extrema para a mãe.
Nesse caso também podem ser incluídas situações em que
as crianças aparentemente vomitam de raiva, depois
cospem o que a mãe lhes oferece. Elas acham o alimento,
por assim dizer, explicitamente insuportável. Além disso,
esse fato pode vir acompanhado de um gesto histérico,
segundo o lema: “Nada disso é bom o suficiente para mim!
Tudo isso está errado demais para o meu gosto!” Essas
crianças são muito programadas contra tudo que vem de
fora, não querem deixar nada entrar dentro delas, não
participam da digestão nem permitem que nada tenha
acesso a elas; imediatamente, devolvem e exteriorizam
tudo. Nesse “Não quero deixar nada entrar” também ressoa
um “Não quero me envolver”.
Contudo, se a criança rejeita a vida (em forma de peito e
mamadeira), a mãe pode oferecer o que quiser que nada irá
satisfazê-la. Seria uma espécie de “greve de fome”, uma
recusa ao mundo e à vida na “mãe Terra”. Naturalmente,
isso também tem algo a ver com a mãe biológica e a deixa
muito desamparada. Há situações em que é aconselhável
submeter-se a uma psicoterapia. Como o ideal é que esta
seja realizada em sessões diárias durante três semanas, a
criança deve ser levada junto com a mãe e cuidada por uma
pessoa de confiança durante a sessão.
Por outro lado, o problema poderia estar no fato de que a
criança sente muita fome e, por conseguinte, mama com
muita avidez e rapidez. Nesse caso, também se deveria
pensar que talvez queira outra coisa – nesse estágio
precoce, basicamente, afeto. Talvez também engula ar ao
mamar. No primeiro arroto, o ar sai e provoca uma reação
em cadeia.
Por outro lado, a sabedoria popular tem uma conclusão
mais tranquilizadora ao afirmar que “crianças que
regurgitam são crianças que prosperam”. No entanto, o
ditado provavelmente se refere a uma regurgitação
insignificante do leite quando se coloca a criança para
arrotar, e não ao vômito regular, que chega a pôr em risco o
equilíbrio eletrolítico. Com o vômito, essas crianças perdem
muitos sais. Porém, o sal da vida, tal como o sal da Terra e
aquele da sopa, é importante não apenas do ponto de vista
simbólico, mas também possui um significado concreto e
decisivo para a saúde. No caso emergencial do vômito
crônico, os sais minerais presentes no sangue precisam ser
controlados e, eventualmente, reintegrados.
10.3.2 Indicações para as mães

A mãe deveria se perguntar: “O que meu filho não quer nem


consegue aceitar do meu leite?”, “O que estou transferindo –
também em sentido figurado – para o meu filho?” “Quero
transferir isso para ele?”, “Quanto de estresse, tensão e
medo estou transmitindo pelo meu leite?”, “Das minhas
preferências, o que não é assimilável por uma criança ou,
em todo caso, pelo meu filho?” e “Quando preciso me
adaptar à nova situação?”
Obviamente, o leite traz em si tudo aquilo que a mãe viveu
enquanto ele era formado. Porém, de modo bastante
concreto, nele também está representado tudo aquilo que
ela comeu e, sobretudo, ingeriu. Nesse caso, deve-se pensar
igualmente nos hormônios do estresse e do medo presentes
na carne dos animais de abate. No abate em massa nos
grandes matadouros, os animais costumam vivenciar, antes
de seu próprio fim, a morte de dúzias de outros animais da
mesma espécie, o que neles desencadeia medo e pânico em
máximo grau. Em seguida, seu organismo libera hormônios
relativos ao medo e ao estresse. Esses hormônios se
acumulam em sua carne que, quando consumida pela mãe,
os transfere para o leite materno. As síndromes de pânico
que hoje são sentidas também na idade adulta devem ter
suas raízes não apenas nas limitações cada vez maiores da
sociedade moderna, mas também na questão do abate de
animais.
Sem dúvida, todas as outras substâncias consumidas
também deixam seu rastro no leite – dos venenos do prazer,
como o café, o álcool e a nicotina, até outras drogas, como
as medicinais. A ingestão de determinados temperos ou
apenas de frutas cítricas pode alterar o leite materno de tal
forma que as crianças passam a ter problemas com ele, que
vão desde ferimentos nas nádegas até o vômito. Tudo isso
deve ser esclarecido e regulado com experiências e as
respectivas tentativas de abstinência. Hoje também
sabemos que, através do leite, a mãe transmite ao primeiro
filho uma dose considerável de mercúrio, caso ela tenha
restaurações dentárias feitas com o amálgama desse metal.
A natureza coloca, de maneira bastante evidente, o bem-
estar da mãe acima do da criança e utiliza o leite para
processos de desintoxicação.
Como o leite materno é produto da alimentação e das
experiências da mãe, ao se alimentar e viver, ela deveria
pensar sempre na criança. Nesse sentido, a situação é a
mesma do período de gravidez. Mesmo durante a
amamentação, ela deve continuar a pensar, comer e viver
por dois.
Depois que as crianças vomitam o leite materno, as mães
ficam muito preocupadas. Aparentemente, o bebê precisa e
quer ser tratado como um ovo cru. Por conseguinte, a mãe
tem de pegá-lo com muito cuidado e não pode fazer
movimentos bruscos; do contrário, o leite é regurgitado. Isso
significa que ela tem de ser manifestamente atenta,
cuidadosa e amorosa. Talvez o problema esteja justamente
nisto: as crianças querem amor e leite, e este apenas em
conexão com aquele. Com sua rejeição, elas tentam, por
assim dizer, obter obstinadamente essa conexão entre
ambos.
Por outro lado, no fenômeno do leite materno logo
rejeitado em detrimento da mamadeira, muito menos
saudável, poderia estar o pretexto de interromper
precocemente a amamentação. O medo por parte da mãe
quanto à sua silhueta e ao relacionamento com o parceiro
poderia ser claramente percebido pelo bebê e ter tal
prioridade que ele rejeita o leite de maneira espontânea e
manifesta. A sobrecarga da mãe também poderia ser uma
razão para a “interrupção inconsciente da amamentação”,
pois somente depois dela é que a mãe consegue se liberar
parcialmente do bebê e reconquistar a própria vida com
mais independência. Quando a mãe está sobrecarregada e
tem de fazer tudo sozinha, ela vê no vômito do filho uma
solução quase ideal para sair da situação em que se sente
presa.
Normalmente, a mãe não vê o vômito do próprio filho com
nojo. Porém, quando ela recebe esse vômito com constância
e não pode contar com uma autoconfiança sólida nem com
uma segurança de base como mãe, talvez comece a sentir
repugnância. Trata-se mais de uma relutância contra a
situação que a deixa desamparada do que propriamente
com nojo. Ela já não consegue nem quer ver o vômito
porque este lhe apresenta a difícil situação com toda a
evidência.
Nesse momento, naturalmente fica mais fácil para a mãe
distanciar-se da amamentação. Ao vomitar o bolo alimentar
já azedado, a criança mostra o quanto está aborrecida e o
quanto a situação lhe é penosa. Assim, algumas poucas
mães punidas com desprezo e aviltamento também sentem
repugnância e vontade de guardar para si seu tesouro
constituído de energia vital. Afinal, amamentar é muito
cansativo. Segundo uma parteira, o dispêndio de energia na
amamentação pode ser comparado à jornada de oito horas
de um operário. No entanto, quem é punido por seu esforço
e seu sacrifício com uma linguagem corporal tão evidente
também se afasta com mais facilidade. Nesse sentido,
muitas vezes as crianças que estão sempre vomitando
obtêm exatamente o contrário daquilo que de fato precisam.
Em vez do amor incondicional de mãe, são afastadas com
repugnância por ela, que, intimamente magoada, também
fica muito aborrecida. Entretanto, na realidade, como todos
os outros bebês, aqueles que regurgitam pedem afeto, ainda
que da maneira mais despropositada que se pode imaginar.
Por mais difícil que seja essa situação para a mãe, é
extremamente importante manter a calma, proteger-se das
recriminações e qualificações próprias e alheias e não se
fechar para o desamparo emocional. Talvez seja melhor dar
a mamadeira com carinho em vez de forçar a amamentação,
a fim de evitar sentimentos de culpa e avaliações das
pessoas circunstantes, que acham que sabem mais.
Justamente em uma situação como essa, a criança é
receptível a uma mensagem muito valiosa: “Não importa
como você é; amo você, e o importante é que você esteja
bem”. Mesmo quando o comportamento da criança dá muito
trabalho à mãe, o amor profundo por ela pode permanecer
intacto.
10.3.3 Homeopatia: Silicea, lágrimas de anjo em cristal de rocha ou a parede de
vidro entre a mãe e a criança

A homeopatia clássica dispõe de um medicamento


maravilhoso em forma de Silicea, que resume os traços
característicos de muitas crianças intolerantes ao leite
materno e de suas mães. Quem deve tomar esse
medicamento em caso de problemas com os lactentes é
quase sempre a mãe, que, na simbiose ainda existente com
o filho através do leite, transmite-lhe o medicamento.
Somente quando estiver bem claro que o lactente não se
adapta ao leite nem à situação é que se pode dar o
medicamento diretamente a ele.
A típica mãe-Silicea é fria em quase todos os aspectos e
tende a ter mãos e pés frios. Do ponto de vista emocional, às
vezes seu caráter parece, de certo modo, gélido e, em todo
caso, áspero. A ele pode acrescentar-se certa rigidez, bem
como, não raro, a intolerância ao leite (ou à proteína do
leite) e uma aversão a tudo que é físico. Na criança, essa
rejeição pode voltar-se contra a mãe como ser humano.
Muitas vezes, o típico indivíduo-Silicea não consegue dizer
diretamente o que pensa; em vez disso, limita-se a
mensagens indiretas. Na criança, a mensagem indireta na
rejeição da mãe através de seu leite ainda pode ser
compreendida com relativa facilidade e, do ponto de vista
simbólico, chega a ser claramente devastadora. Em
contrapartida, as mães podem codificar muito melhor suas
mensagens, mostrando-se externamente como vítimas
dedicadas ao sacrifício, injustamente rejeitadas junto com
seu leite, enquanto, na verdade – embora de modo quase
imperceptível aos outros –, relacionam-se com seu filho com
surpreendente frieza e distância, ou até mesmo nem se
relacionam com ele.
A tarefa da mãe, que é facilitada com o medicamento,
seria quebrar o gelo, sair de sua situação de frieza e
aprender a se aquecer para a vida. Do ponto de vista
químico, a Silicea é um cristal de rocha que, por sua vez,
pode ser comparado às lágrimas de anjos congeladas da
mitologia suíça. As pessoas afetadas deveriam libertar o anjo
que, congelado, dorme no gelo da sua alma e derreter o gelo
que bloqueia suas emoções e seus sentimentos. Pelo menos
no que diz respeito à onomatopeia, no cristal de rocha está
oculto Cristo, que em nossa cultura simboliza o coração e o
amor.
Portanto, em vez de cercar-se de uma parede de vidro que
isola da vida e de continuar a cultivar o medo de quebrar o
próprio gelo, as mães em questão deveriam aquecer-se com
alguém. Obviamente, o próprio filho seria a oportunidade
ideal para dar um grande passo adiante no próprio modelo
de vida, no que diz respeito a si mesma e à criança. Em
nenhuma outra situação o calor do coração e o amor
compassivo podem ser tão bem aprendidos quanto na
relação afetiva com o próprio filho.
Contudo, nesse caso, não raro tem-se como oposição uma
exigência de elevado perfeccionismo, que culmina na
imagem de um lar exemplar, no qual tudo está em seu
devido lugar (exceto o próprio coração) e a vida tem pouco
espaço. Sobretudo na comunicação com a criança, fazer
tudo certo significa partilhar os sentimentos com
sinceridade, calor e brandura.
Por sua natureza, a típica criança-Silicea é delicada e
esguia, mas tem o abdômen distendido, que destaca o
centro do corpo, transmitindo a ideia de que a vida começa
no corpo e gira ao redor dele. A mãe-Silicea, que pretende
fazer tudo certo e é totalmente centrada em seu intelecto,
tem um filho que, como reação contrária, enfatiza
excessivamente o ventre. De fato, seu abdômen tem uma
aparência bastante distendida.
Na prática da homeopatia, chama a atenção o fato de que,
na maioria das vezes, essas crianças reagem muito mal a
vacinações. Não raro, também têm muito medo de agulhas e
se recusam com veemência a tomar injeções. Infelizmente, a
moderna medicina acadêmica não valoriza muito esses
sinais tão importantes, e, na maioria das vezes, as crianças
acabam sendo dominadas.
 
Perguntas para os pais:

O que nosso filho recebe melhor?

Do que ele quer se livrar?

O que ele não consegue engolir nem digerir?

O que ele gostaria de ingerir e do que precisa?

Com o que não consegue se envolver?

Como conseguimos ter acesso ao “olfato” do
nosso filho?

Quão prontamente aceitamos nosso filho como
indivíduo, como ser único?

O que me sobrecarrega como mãe e acaba
sendo transmitido ao meu filho pelo leite?

Quais emoções não exteriorizo como mãe e meu
filho exprime em meu lugar?
 
Medidas de apoio:

Chá de gengibre: descascar três centímetros de
raiz de gengibre, cortar em pedaços pequenos,
ferver em um litro de água e deixar repousar por
dez minutos. Esse chá é bom contra náusea;
porém, é mais apropriado para a mãe, pois é
muito picante para bebês e crianças pequenas,
que preferem chá de melissa para acalmar o
estômago.

Antes de amamentar, ingerir gengibre
cristalizado!

Uma bandagem de camomila quente acalma o
estômago. Deve-se proceder do seguinte modo:
mergulhar uma toalha de rosto pequena no chá
quente de camomila, torcê-la e aplicá-la sobre o
abdômen da criança. Cobri-la com uma toalha
seca. Para aumentar o efeito, pode-se colocar
também uma bolsa de água quente. Deixar a
bandagem agir por cerca de 15 minutos e,
eventualmente, refazê-la.

A decocção de sementes de funcho é eficaz
contra o enjoo e o vômito. Deve-se proceder do
seguinte modo: verter 250 mililitros de água
fervente em uma colher de chá de funcho e
deixar repousar por dez minutos. Coar em
seguida e fazer com que a criança beba aos
poucos.

Bolus alba, da Wala: uma colher de chá para cem
mililitros de água por dia. Dar uma colher de chá
a cada 30-60 minutos.

Glóbulos de genciana para o estômago, da Wala.

Alimentos leves: se a criança vomitar uma vez
(por exemplo, depois de comer demais ou de
comer doces em excesso), trata-se de uma
reação razoável e saudável do organismo, a fim
de aliviar-se e liberar-se daquilo que o intoxica
ou ao qual ele é intolerante. Se, em seguida, a
criança voltar a sentir-se bem, não há
necessidade de tratamento. Basta dar-lhe nesse
dia alimentos leves (chá, torradas, arroz,
legumes no vapor).

Outras medidas: valem aqui as mesmas dicas
descritas na seção seguinte sobre a diarreia.

10.4 Diarreia
“Estou me borrando todo.”
 
Na diarreia, o problema é alguma coisa inadequada ou até
perigosa ter entrado no organismo e passado para um nível
mais profundo do corpo do que no caso do vômito. Aqui
também se trata de uma reação importante do organismo,
que, por assim dizer, prescreve a si mesmo um clister. Como
no jejum, este serve para limpar o intestino. O corpo se
defende da absorção de alimentos inadequados recusando-
os e expulsando-os.
No nível imunológico – ou seja, no que diz respeito ao
sistema de defesa – o intestino é nosso maior órgão. Oitenta
por cento do sistema imunológico se encontra nos infernos
do corpo. Na diarreia também está envolvida uma
problemática da defesa. Talvez o corpo esteja precisando do
seu sistema imunológico para outra tarefa, não possa
ocupar-se da digestão (da vida) e, por isso, faz com que tudo
simplesmente saia de dentro dele. Nesse processo, ele pode
perder muito do sal da vida em forma de eletrólitos e do
elemento anímico água, o que, para as crianças, pode se
tornar perigoso – quanto mais novas, tanto mais rápida é a
perda.
Um organismo sobrecarregado em defender-se das
infecções pode depois não dar conta do trabalho dispendioso
da digestão, que também sempre conduz à chamada
leucocitose. Na ingestão de alimentos, esse aumento dos
glóbulos brancos, especializados em medidas de defesa não
específicas, revela o quanto o organismo é requisitado do
ponto de vista imunológico. Digerir significa integrar o que é
estranho, e isso sempre requer um aumento dos esforços de
defesa.
Em situações de estresse que usam toda a energia do
organismo, como ocorre no caso de exames em contexto
social ou de ataques por bactérias ou vírus em âmbito
imunológico, a diarreia pode ocorrer devido à não ingestão
de alimentos. Do ponto de vista físico, o problema se instala
no intestino delgado, causando evacuação em quantidade,
pois nenhuma matéria é absorvida. Nessas situações, o
organismo não pode permitir sua própria reconstrução e seu
próprio crescimento, pois precisa defender-se.
O segundo e mais frequente tipo de diarreia surge devido
à não reabsorção da água nos infernos do intestino grosso.
Quando o elemento anímico água não é recuperado pelo
organismo, os infernos são esvaziados, e o intestino,
totalmente limpo – exatamente como quando se usa um
clister.
O outro grande tema no caso da diarreia é o medo, que
muitas vezes chega a antecedê-la e impede a absorção do
alimento ingerido. Quem sente muito medo revela ter medo
de viver. Quem “se borra de medo” poderia sofrer de medo
existencial. Medo de expectativas, de exames, de
competições ou de viagens importantes transforma as
crianças em “cagonas”. O chamado “cagão” é um medroso.
Além disso, a grande perda de líquido revela uma falta de
flexibilidade autoconsciente, uma vez que, no estado de
desidratação, tudo que se encontra rígido e solidificado
perde toda capacidade de adaptação.
Diarreia crônica, “borrar-se” todo e “morrer de medo” são
sinônimos para medo crônico e incessante. O resultado é
uma fraqueza crescente, pois, por um lado, a criança não
consegue retirar dos alimentos a energia necessária e, por
outro, ainda perde o sal da vida e muito líquido da alma em
forma de água. Além disso, a simbiose é prejudicada por
muitos bilhões de bactérias intestinais. Resta saber até que
ponto a convivência com a mãe é atingida por isso e reflete
esse problema no nível do intestino. Todo passo fora da
simbiose com a mãe pode evocar medo, que se mostra na
diarreia. O importante é simplesmente aceitar o medo e
reforçar a autoconsciência da criança até ela conseguir
entregar-se com confiança ao novo trecho da vida a ser
percorrido.
A diarreia faz sentido como possibilidade de livrar-se do
lastro, para que o indivíduo consiga escapar melhor. A
condição da inervação simpática antes de um exame ou
teste sugere uma evacuação, pois, assim, tanto um eventual
comportamento agressivo quanto um comportamento de
fuga são aliviados. Nesse caso, a ligação com o medo é
evidente; ela também se faz sentir nos chamados tenesmos
espasmódicos, que põem o intestino em movimentos
peristálticos excessivos, causando cólicas. No estreitamento
do intestino, que surge durante esse processo, também se
torna evidente a vontade, em vão, de querer conter a
diarreia.
Quando estão com medo, quase todas as pessoas se
contraem e querem fugir; obviamente, com as crianças não
é diferente. Quem não consegue escapar tem diarreia. As
crianças estão sempre à mercê dela. Sozinhas, não
conseguem escapar, e precisam encontrar outros caminhos
para evitá-la, o que elas não querem ou sentem medo de
fazer. A diarreia é um desses caminhos. Por certo, seria
melhor não comer inicialmente, e sim recusar desde o
princípio o que não se recebe. O vômito é a segunda melhor
resposta, e a diarreia, a terceira. Embora as pessoas
afetadas deixem entrar o que é duvidoso, dele nada aceitam
na realidade. A percepção das crianças em relação aos
alimentos corretos também precisa ser inicialmente
sensibilizada. Elas têm de aprender a perceber e a levar a
sério o que é verdadeiro, a distingui-lo e, eventualmente, a
recusá-lo, não abrindo a boca, vomitando ou desenvolvendo
a diarreia. Esta última é uma solução por meio da qual elas
fazem sair – muitas vezes de modo turbulento – o que lhes é
adverso.
Geralmente, a primeira diarreia costuma ocorrer com a
dentição; a agressividade irrompe (“bronca”) e causa medo.
Mais tarde, pode-se perder o controle – até aquele do
esfíncter. Assim, volta-se à situação anterior ao treinamento;
a criança regride ao nível natural e original, no qual podia
dar livre curso às coisas. O bebê volta a ser amplo e
permeável. Desse modo, no período da diarreia, a situação
de medo, junto com a evacuação que provoca, estimula o
colapso da educação e do treinamento.
Os pediatras antroposóficos Georg Soldner e Hermann
Michael Stellmann partem do princípio de que uma infecção
intestinal ou uma colite sempre é precedida por uma
experiência de perda. Na dentição, seria a perda da infância
inocente. Com os dentes, as crianças devem superar as
dificuldades sozinhas, e outro corte do cordão umbilical se
faz necessário. Nesse momento, delineia-se o final da
amamentação, pois, por um lado, a criança pode começar a
receber outro tipo de alimento e, por outro, a mãe corre o
risco de ser mordida.
A diarreia mostra uma exigência excessiva. A criança se
defende e “passa uma descompostura em todo mundo”.
Agora, ela quer e precisa aprender a selecionar as ofertas da
vida e a aproveitar as ocasiões e as oportunidades. Talvez
não queira aceitar nada, pois nada lhe convém do ponto de
vista psíquico. Muitas vezes, entre as crianças mais velhas
se percebe um excesso de análise (detalhada) e de crítica,
que as transforma em pequenos ranzinzas que de nada
gostam. Assim, já não aceitam nada, e a assimilação não
tem vez, conforme mostra o intestino. Quem encontra
defeito em tudo e já não quer aceitar nada não digere as
impressões da vida. Talvez não reconheça seu medo
subjacente, e só volta a ser honesto no lugarzinho tranquilo,
onde é obrigado a “dar livre curso às coisas”, onde quase se
borra de medo. Seria uma oportunidade reconhecer a
extensão das possibilidades, desde “estou com medo” até
“não estou nem aí” e já não tenho medo. Antes de
conseguirem chegar a tanta honestidade, muitos preferem
sacrificar o sal da vida e muito líquido da alma.
Na diarreia, a tarefa reside claramente em fazer com que o
corpo se livre da matéria, não absorva mais ou muito mais
alimento e dê livre curso às coisas. Do ponto de vista
psíquico, a criança deveria dispor-se a deixar passar o que
vier, sem intervir muito e deixando a vida fluir.
O corpo mostra enfaticamente que, nesse momento, dar é
mais ditoso do que tomar. As pessoas dão generosamente o
sal e a água da vida. É claro que seria melhor fazer essa
contribuição para a vida em sentido figurado.
Outra tarefa é confrontar-se com tudo, sem por isso abrir-
se logo a tudo. Dar uma trégua, deixar a vida transcorrer e
não intervir não são atividades difíceis nessa situação, pois o
corpo quase obriga a essa postura.
Uma boa reação no caso da diarreia seria o jejum, que
aprofunda ainda mais o processo de depuração e apresenta
uma espécie de resposta homeopática para o evento. Quem
segue o jejum e, de maneira espontânea e consciente, já não
ingere nada material aprende a observar o mundo e seus
fenômenos com imparcialidade e a deixar passar muita coisa
sem verificação. Nesse caso, a própria mania de criticar
poderia ser submetida a um exame e, assim, ser
relativizada. A disposição consciente para fazer sacrifícios
poderia se desenvolver. Quem aprende espontaneamente a
dar e presentear não precisa ser obrigado a fazê-lo. Contudo,
o jejum mais prolongado no sentido de um tratamento para
crianças não é ideal, a não ser que, por razões de doença,
elas o façam espontaneamente, como no caso de infecções
com febre.
Um jejum espontâneo que se desenvolva a partir da
diarreia também seria uma boa oportunidade para a criança
se colocar na profundidade psíquica do seu medo e, assim,
convertê-lo em amplidão e abertura. Quem dá espaço
suficiente à sua criança interior no nível da consciência e
evita exigências e provas de coragem exageradas poupa a si
mesmo e à sua criança não apenas diarreias de viagem, que
costumam atormentar aqueles que dão a volta ao mundo,
mas também lhe permite crescer e expandir-se, tornar-se
flexível e deixar que aconteça o que a vida traz consigo.
Desse modo, é possível tornar-se honesto sem ter de
“abaixar as calças”.
 
Perguntas para os pais:

Do que nosso filho tem medo? Como podemos
encorajá-lo a envolver-se com o novo/o
diferente?

Do que ele se defende? Como podemos ajudá-lo
a se defender de maneira mais simples e
saudável?

Como podemos ajudá-lo a desenvolver uma
autoconsciência saudável?

De que lastro ele quer se liberar?

Como ele pode ficar mais sereno?
 
Medidas de acompanhamento:

Para lactentes e bebês, sempre consultar um
terapeuta experiente.

Evacuação do leite: geralmente, a evacuação de
lactentes é de fina a líquida. Isso não é diarreia,
mas a consistência normal da evacuação do leite
ou da amamentação.

Ingestão de líquido: devido à grande perda de
líquido, a criança precisa beber muita água e/ou
chá. Podem ser oferecidos chás que contenham
muito tanino, que acalma a mucosa intestinal.
Chá de mirtilo, feito a partir de mirtilos secos,
chá de folhas de amora silvestre ou de pé-de-
lebre. Suco quente de abrunho também é
adequado. De uma a três xícaras por dia,
eventualmente adoçado com um pouco de mel
ou suco concentrado de pera.
Com frequência, os lactentes bebem muito pouco e
correm o risco de se desidratarem rapidamente. Isso
é claramente visível quando a moleira está
afundada. A pele nessa região, que costuma ser
tesa, passa a ficar seca e enrugada; a criança torna-
se descorada e muito pálida, seus olhos ficam
fundos, com olheiras. Em pouco tempo, esse estado
pode ameaçar a vida, ou seja, é preciso remediar de
imediato a situação e, caso necessário, realizar as
infusões adequadas também no hospital. O clister,
conforme descrito no Capítulo 3 “Febre”, pode ser
usado como prevenção. Com ele, a criança absorve
líquido pelo intestino (de três a quatro vezes por
dia).

Raspar uma maçã e deixar que escureça durante
uma hora. Dar às crianças às colheradas em
caso de diarreia.

Jejum: não forçar a criança a comer caso ela não
queira. Nesse caso, frases do tipo “filho, você
precisa comer alguma coisa...” são
absolutamente contraproducentes. O intestino
precisa acalmar-se, e nenhuma criança morre de
fome tão rapidamente. Depois de superada a
doença, o apetite costuma voltar sozinho, e a
criança passa a consumir o que necessita. A não
ser que ela peça expressamente para comer.
Nesse caso, evite dar produtos lácteos, açúcar,
doces e alimentos gordurosos. São permitidos
alimentos leves, como batata, arroz, legumes no
vapor, sopa ou caldo de cenoura, maçã raspada
(ver acima), torradas ou palitinhos de pretzel.
Para o caldo de cenoura, descasque quatro cenouras
grandes e cozinhe-as por cerca de uma hora em
meio litro de água. Bebês e crianças pequenas
também podem tomá-lo com a colher. Uma
alternativa a esse caldo é a papinha de cenoura da
marca Hipp, diluída em água, em uma proporção de
1:1.

Não interromper a amamentação: de acordo com
a necessidade, continuar amamentando os
lactentes!

Solução eletrolítica: para compensar a perda de
líquido e de sal, pode-se recorrer a preparados
prontos ou produzir uma solução própria: para
um litro de água mineral, três quartos de colher
de chá de sal, uma colher de chá de cremor de
tártaro, uma xícara de suco de laranja e quatro
colheres de sopa de açúcar.

Terra medicamentosa (Luvos ultra): apropriada
para crianças mais velhas, em colheres de chá
ou dissolvida na água.

Glóbulos de genciana para o estômago, da Wala.

Calor: uma bolsa de água quente ou um
travesseiro quente de sementes de cereja
podem trazer alívio e são aceitos pela maioria
das crianças.

10.5 Medicamentos homeopáticos para vômito e


diarreia
Se a diarreia foi claramente desencadeada por determinados
alimentos, os seguintes medicamentos homeopáticos podem
ajudar:
 

Desencadeada por ovos: Carbo vegetabilis.

Sorvete: Arsenicum album.

Comida gordurosa: Pulsatilla.

Gordura, alimento rançoso: Arsenicum album, Carbo
vegetabilis.

Peixe: Carbo vegetabilis.

Carne: Arsenicum album.

Queijo: Arsenicum album, Carbo vegetabilis.

Batata: Nux vomica.

Conservas: Arsenicum album.

Frutos do mar: Arsenicum album, Carbo vegetabilis.

Leite: Arsenicum album.

Frutas: Pulsatilla.

Cogumelos: Pulsatila.

Chocolate: Arsenicum album.

Tabaco: Arsenicum album.

Salsicha: Arsenicum album.
 
Argentum nitricum C30 Arsenicum album C30
Agentes Ansiedade antes de ocasiões Ingestão de frutas
desencadeadores especiais, por exemplo: suculentas, sorvete e
aniversário, provas carne estragada
Disposição Agitada, medrosa, Inquieta, medrosa, medo
apressada de morrer, exausta
Evacuação Aquosa, viscosa, em jatos, Aquosa como água de arroz,
com muitos gases, esverde ardente, escura, dolorida,
ada como espinafre picado, com cheiro de podre
com muco fibroso
Estômago Barulhento, eructação Vômito logo após a ingestão
explosiva, vontade de comer de alimentos ou bebidas,
doces, abdômen distendido queimação
Melhora com Eructação, ar fresco, Calor, aplicações quentes
afrouxando a roupa
Piora com Doces, logo após a refeição, Frio; da meia-noite às 3
calor, agitação da manhã; ver, cheirar ou
pensar em alimentos
Sintomas colaterais Medo, inquietação Sede de beber em pequenos
goles; quase sempre sente
frio; suor frio; não consegue
ficar sozinha
 
Chamomilla C30 Ipecacuanha C30
Agentes Dentição, irritação, raiva, Alimentos de difícil
desencadeadores resfriado digestão, irritação,
aborrecimento
Disposição Mal-humorada, quer Muitos desejos e exigências
sempre outra coisa, irritada, vagas; chora, grita, mas
briguenta, irada, quer ser não se contenta com
carregada nada (não tão intenso como
a camomila)
Evacuação Com cólicas, esverdeada, Dores ao redor do umbigo
como ovo picado com
espinafre, cheiro de ovo
podre, viscosa, dolorida
Estômago Eructação com cheiro de Náusea constante que não
podre; vômito amargo, com melhora com o vômito;
gosto de fel; rejeição a toda repugnância a todo tipo de
bebida quente alimento
Melhora com Ser carregada no colo; Nada
movimento passivo
(por exemplo, balanço)
Piora com À noite, dentição, ser vista Calor, calor úmido
Sintomas colaterais Hipersensibilidade a qual Falta de sede; salivação
quer estímulo externo; sen intensificada; língua sem
sibilidade extrema à dor; saburra; olheiras azuladas;
grito estridente suor frio no rosto
 
Phosphoricum Podophyllum C30
acidum C30
Agentes Preocupação, saudade de Verão, calor, banho,
desencadeadores casa, esforço mental alimentos azedos, dentição
Disposição Quieta, não fala, responde Queixa-se, faz birra, fala
de má vontade, fraca, muito, inquieta
indiferente em relação
aos outros
Evacuação Sangrenta, aquosa, branca Evacuações explosivas,
acinzentada, sem cheiro, barulhentas, sem dor, que
sem dor diminuem em seguida,
ficam amareladas e têm
cheiro de podre
Estômago Desejo de alimentos Desejo de alimentos azedos,
suculentos; sede de que, no entanto, não são
leite frio tolerados; sede de grande
quantidade de água fria;
eructação; prolapso retal
Melhora com Cochilo, refeições quentes Ficar de bruços
Piora com Esforço, sol, corrente de Curvar-se, pressão,
ar, frio, falar calor local
Sintomas colaterais Palidez, cansaço; quer ficar Alternância entre
deitada e dormir constipação e dor de cabeça
 
Pulsatilla C30 Sulfur C30
Agentes Sorvete, gordura, creme, Antibióticos, dentição,
desencadeadores manteiga, frutas erupções cutâneas
reprimidas, vacinações
Disposição Serena, afetuosa, apegada Caótica, preguiçosa,
à mãe, emotiva, chorosa, desordeira, sonhadora
tímida
Evacuação Nenhuma evacuação é Instável, com cheiro de ovo
igual a outra podre, dolorida, ocorre de
manhã cedo, provoca coceira
e ardência
Estômago Rejeita ingestão de líquido, Desejo de doces, sede,
apesar da boca seca; o acessos de apetite voraz
alimento cai como pedra
no estômago
Melhora com Ar fresco, consolo, frio Ar fresco, suor, ficar deitada
do lado direito
Piora com Calor, refeições quentes, Banho, calor, leite, das 10
ambientes quentes e às 11 horas, repressão de
abafados erupções cutâneas ou
de secreções
Sintomas colaterais Falta de sede, hálito ruim Pés quentes, lábios
vermelhos

10.6 Diarreia e vômito


“Estou vomitando e fazendo nas calças.”
 
Quando o vômito e a diarreia ocorrem ao mesmo tempo é
porque a primeira instância de controle sensorial, operada
pela visão, pelo gosto e pelo olfato, está falhando. O
organismo toma a decisão drástica de reverter o mais rápido
possível o erro cometido através de todas as suas
comportas. Da perspectiva infantil, trata-se de uma recusa
em todos os aspectos. Nada mais pode entrar. A criança
cospe e evacua tudo ao mesmo tempo – tanto por cima
quanto por baixo. Assim, por um lado, o alimento engata a
marcha a ré com o vômito e, por outro, segue apressado
adiante com a diarreia. Ambos são estratégias para que o
organismo não tenha de assimilar o alimento.
Evidentemente, os efeitos sobre o equilíbrio do sal e da água
são duas vezes mais dramáticos.
O organismo é veemente ao sinalizar que não está
conseguindo digerir a situação aguda de vida. Para que ele
não seja obrigado a deixar nada entrar, todas as vias são
abertas para que ele se libere do que não consegue digerir.
A tarefa também está em liberar, em sentido abrangente,
o que não se consegue ou não se quer assimilar. No que se
refere à tarefa essencial de não se envolver de modo algum,
pouco importa se deixamos o alimento passar por nosso
organismo ou se o expelimos ativamente. O importante é
ficar livre de todas as ofertas e não se deixar envolver. Os
budistas falam em girar a roda do mundo sem ficar preso a
ela. Poderíamos até pensar novamente na arte do bhoga,
aquele princípio oriental de “comer o mundo” sem nele se
perder. Naturalmente, isso ainda está longe de ser aplicável
às crianças, mas poderia ajudar os pais como pensamento
secundário. O vômito e a diarreia obrigam a criança a
regredir, uma vez que, devido à fraqueza e, em crianças
mais velhas, à necessidade de permanecer sempre próxima
do banheiro, ela se vê limitada em seu espaço de
movimentação. Ao comer e beber, a criança precisa
encontrar uma nova medida, pois a quantidade “normal”
ressuscita forçosamente o tumulto no trato do estômago e
do intestino.
 
Perguntas para os pais e medidas de apoio:

Ver as seções precedentes sobre os temas
“Vômito” (10.3) e “Diarreia” (10.4).

10.7 Constipação
“Não dou mais nada!”
 
No intestino grosso, que representa o inconsciente e os
infernos, ocorre uma greve. As pessoas afetadas não querem
dar mais nada; querem ficar com tudo para si. As fezes
simbolizam o dinheiro, já lembrando o tema principal
“economia até a avareza”. Devido ao perfeccionismo que
costuma ser encontrado nesse caso, a criança não consegue
assimilar nem digerir os alimentos até o fim. A expressão
“não faça merda” é levada ao pé da letra.
Quanto aos aspectos especificamente infantis da
constipação, há que se pensar inicialmente sobretudo na
conversão do leite materno em alimento normal. Os
lactentes podem ficar até 14 dias sem evacuar, sem que isso
caracterize uma doença. Portanto, mantenha a calma
durante o período de conversão e aguarde. Depois de duas
semanas, as dicas mencionadas a seguir poderão ajudá-lo.
Somente se elas não surtirem nenhum efeito – o que, na
verdade, é extremamente raro – é que se deve pensar em
recorrer aos esclarecimentos da medicina acadêmica, por
exemplo em relação a distúrbios muito raros, como a doença
de Hirschsprung, que afeta o intestino grosso.
A maior parte dos problemas provavelmente tem suas
causas nos esforços precoces de limpeza. Tanto um estilo
autoritário quanto um estilo extremamente cuidadoso de
educação, no sentido de uma síndrome de superproteção,
são prejudiciais e, nesse caso, acabam levando ao beco sem
saída da constipação. No entanto, rituais bem-intencionados
podem “sair pela culatra” – nesse caso, não de modo
concreto nas crianças, mas metaforicamente contra os
próprios pais. Quando a criança é treinada cedo demais a
ficar limpa, são programadas irritações também no sentido
de constipações maciças. Quando toda a família se agacha
ao redor do penico e espera pelo “grande desejo”, a
pequena princesa ou o pequeno príncipe pode refletir se o
grupo realmente merece receber tão rico presente todos os
dias. De acordo com a compreensão simbólica dos princípios
primários, mas também segundo a concepção psicanalítica,
a evacuação é o primeiro presente da criança ao mundo.
Sabemos disso graças aos contos de fadas do asno de ouro,
do homem que evacuava ducados, etc.
Uma razão ainda mais dramática para não presentear mais
nada a este mundo pode ser o abuso sexual, que
infelizmente é mais frequente do que a sociedade que o
produz consegue admitir. Por certo, nesse caso é necessário
mais do que nossas dicas ao final do capítulo para, de certo
modo, recolocar a criança “na linha” e “na pista (de sua
vida)”.
Mesmo a chegada de um irmão ou irmã, ou a volta da mãe
ao trabalho, pode ser sentida pela criança como uma
rejeição. Como consequência, ela pode ficar mais econômica
com seus presentes e preferir guardar para si o que já tem.
Por assim dizer, como acontece com os adultos quando
viajam, ela “estranha” o ambiente e passa a sofrer de
constipação. Quase nada muda no ritual, a não ser o trono
habitual, que é substituído por um buraco no chão, mas isso
já é suficiente para se reter, como que por ofensa, o que se
tinha para dar. Com as crianças ocorre algo muito
semelhante, só que as razões são diferentes, como as
alterações na rotina, mas também no ambiente comum. A
transição do penico para o vaso sanitário já pode ser um
agente desencadeador. Nesse caso, um novo ritual
sofisticado poderia ajudar. Se os pais fizerem desse passo,
que para eles representa um grande alívio, um ato maior,
que recebe muita atenção e reconhecimento, esse tipo de
transição se tornará mais fácil e será realizada sem
problemas. Entretanto, nunca se deve iniciar uma luta pelo
poder, pois nela os pais só teriam a perder, o que agravaria
o problema.
Muitas vezes, a constipação também é uma compensação
da insegurança, segundo o lema “seguro morreu de velho; é
melhor ficar com o que tenho”. Assim, o início na escola, a
mudança de residência ou de escola podem se transformar
em agentes desencadeadores da retenção das fezes. Em
toda situação nova, é perfeitamente natural que haja certa
retenção. A das fezes é corrente em certas pessoas quando
sua alma se sente rejeitada, ofendida ou até enganada.
Nesse sentido, seria ideal se os pais percebessem essas
transições com antecedência e se preparassem com rituais
ou, pelo menos, muita consciência, sem permitir que as
crianças resvalem nesse sentimento de não serem aceitas.
No entanto, também a posteriori é possível melhorar. Às
vezes, torna-se necessário revogar a inovação e, em
seguida, introduzi-la de novo, com mais cuidado.
Jirina Prekop observou em primogênitos a tendência
espasmódica, muitas vezes dolorosa, de reter as fezes
quando já não ousam ter um acesso de fúria depois de
concluído o período em que receberam as instruções de
higiene pessoal. De fato, temem perder ainda mais o amor
dos pais do que sentem que já perderam com a chegada dos
irmãos. Acabam expressando sua raiva inconscientemente,
reagindo por meio da defecação. Não por acaso, a
agressividade expressa pela saída do intestino é chamada de
agressividade anal. Nesses casos, a terapia do abraço
(segundo Prekop) mostrou-se muito libertadora para a
criança, permitindo-lhe a agressividade canalizada através
da boca com toda a força e, ao mesmo tempo, dando-lhe a
prova do amor incondicional dos pais. Além disso, ao ser
carregada no colo, a criança volta a sentir-se novamente
como filha única – pelo menos como a única primogênita. E
isso lhe faz bem.
Por fim, como nos adultos, naturalmente uma alimentação
errada, ou seja, inadequada e pobre em fibras, e pouco
exercício físico também podem estimular a constipação. A
variante Aminas de vegetais crus, que, no entanto, como
toda alimentação à base de vegetais crus, só deve ser
levada em conta a partir do segundo ano de vida, pode não
apenas levantar o ânimo ao fornecer reservas de serotonina,
mas também melhorar o sono e a pele. Além disso, como
alimento à base de vegetais crus e graças às suas fibras,
pode influir positivamente na constipação, sobretudo quando
ingerida de manhã, em jejum. Todas as crianças deveriam
alimentar-se sempre de produtos integrais e ser encorajadas
a fazer exercícios físicos de acordo com sua idade. Crianças
“sapecas” são sinal de um desenvolvimento saudável e vital.
Por outro lado, se as crianças ficam desanimadas diante de
uma mesa “saudável”, não se obtém nenhuma vantagem e
tampouco haverá algo saudável na comida ou na atmosfera,
para não falar do convívio em família. Segundo a lei da
polaridade, a vida saudável cobrada pelos pais transforma-se
no contrário, e especialmente crianças independentes e
rebeldes se contrapõem a ela. A história de Adão e Eva no
paraíso já nos mostra o quanto as proibições nos “atraem”...
 
Perguntas para os pais:

O que nosso filho retém?

O que ele não consegue digerir?

Em que circunstâncias lhe falta segurança? Onde
e como ele pode encontrar a segurança interior?

Por que nosso filho não consegue dar nada de si
mesmo?

Ao que ele poderia se apegar em vez disso?

Em que circunstâncias ele se exprime muito
pouco?

Do que ele tem mais necessidade ou quando
sente medo da perda?

Teríamos também algum problema para nos
desprendermos do que é material ou do nosso
filho?

Como nosso filho pode encontrar um novo
equilíbrio entre reter e liberar?

Quão segura é a situação familiar?
 
Medidas de apoio:

De manhã, logo depois de se levantar, tomar um
copo de água morna para estimular natural e
suavemente a digestão.

Adições de lactose ou de papa de aveia: para
crianças que já tomam mamadeira.

Dar tempo: permitir conscientemente que a
criança tenha tempo para usar o banheiro.

Ingestão de líquido: oferecer líquido suficiente.

Torrar o pão: antes de ser consumido, o pão deve
ser torrado, para facilitar a digestão.

Evitar gases: além disso, é aconselhável evitar o
máximo possível alimentos que provocam gases,
como alho-poró e cebola, a fim de não
sobrecarregar desnecessariamente o trato
digestório.

Exercício: dependendo da sensação causada
pela doença, seria aconselhável o máximo
possível de exercício, a fim de estimular a
digestão por essa via mecânica. Também seria
uma boa ideia prestar atenção na respiração,
uma vez que, como músculo respiratório, o
diafragma também massageia os intestinos.

Massagem: em sentido horário, massagear
suavemente o abdômen com óleo específico.

A bolsa de água quente relaxa a musculatura em
caso de contrações.

Clister: conforme descrito no Capítulo 3 “Febre”.

Em lactentes e crianças pequenas, a evacuação
só pode ser desencadeada pela introdução de
um termômetro.

Fazer a postura da vela: crianças maiores podem
fazer a “postura da vela”. Quando o trato
digestório fica invertido por um instante,
geralmente entra em movimento e libera os
gases.

Medidas gerais de alimentação: alimentos ricos
em fibras, com líquido suficiente; ameixa seca
amolecida, semente de linhaça, farelo; evitar
leite de vaca.

10.8 Fungos
“Quem está morando em mim?”
 
As micoses, que geralmente aparecem na forma de
candidíase, também chamada de “sapinho”, acometem
sobretudo a epiderme, o órgão limítrofe, mas também de
contato e, de certo modo, “campo” de defesa e de recepção
de carinho. Também podem afetar as mucosas, que reforçam
nossas fronteiras internas e, portanto, atuam sobretudo
como barreiras.
Os fungos são saprófitos, ou seja, seres que vivem de
matéria orgânica morta. Nesse sentido, tudo que não tem
vida corre o risco de ser atacado por fungos. Estes são
favorecidos em locais escuros e úmidos, ou seja, em locais
pouco iluminados. Para prosperarem, dependem, sobretudo,
do ambiente. Louis Pasteur, em cujo nome até hoje
estragamos o leite de vaca, descobriu no leito de morte que
decisivos não são os germes nem os agentes patogênicos, e
sim o solo fértil em que se encontram. Nos lactentes e nas
crianças pequenas, por trás dessa patologia geralmente há
um distúrbio na simbiose com a mãe, do ponto de vista
psíquico, e, no nível físico, com frequência terapias
anteriores à base de antibióticos, que prejudicam o ambiente
interno por um longo tempo.
Entre os fungos intestinais, o conflito começa tarde e já
bem no interior do corpo. Quando a pele é afetada, as
próprias fortificações de fronteira são ocupadas por tropas
estranhas que se espalham impunemente, como
excrescências fúngicas que se ramificam, apesar do escudo
de proteção feito de invólucro ácido e da defesa realizada
pelas células. Isso significa que a criança está muito fraca
para se defender ou – no caso dos fungos intestinais – digerir
com vitalidade as impressões vindas de fora. Trata-se,
portanto, de uma espécie de fragilidade de defesa. Eis por
que é compreensível que os fungos se espalhem com
especial êxito e agressividade em situações em que órgãos
inteiros se enfraquecem tanto que já não são capazes de se
defender dos seus ataques. É o que acontece, por exemplo,
com a Aids ou em terapias que usam antibióticos por muito
tempo.
Além disso, quando as crianças são muito pequenas, os
pais podem se questionar quanto de morte em forma de
rotina e dogmas sem vida eles arrastam consigo para dentro
da família. E se não seria melhor abrir as fronteiras dos
pontos de vista espiritual e psíquico, e não no nível físico,
que é mais difícil de defender quando existem temas
psíquicos que requerem manifestação. Há que se descobrir
campos inanimados e mortos da vida e preenchê-los com
novos impulsos.
Sobretudo, seria necessário ingerir alimentos vitais, que o
corpo possa converter em estruturas vitais, não atacáveis
pelos fungos. Quando amamenta, a mãe produz grande
parte do seu leite com o alimento que consome; por
conseguinte, deveria ingerir para si mesma e para seu filho
alimentos integrais e vitais. Quer as crianças sejam
alimentadas, quer já comam sozinhas, também é importante
que consumam alimentos integrais. Caso se opte por
refeições prontas, recomendam-se os produtos da empresa
Hipp, que, muito antes desse tipo de refeição se tornar
moderno, por princípio e de acordo com uma filosofia
compatível já as preparava com produtos orgânicos em que
a alimentação sempre esteve relacionada à filosofia
antroposófica.
Por fim, tudo conflui para que, antes da compra, nos
perguntemos: “Quero alimentar meu filho e a mim ou nossos
fungos?” No primeiro caso, tudo se mostra favorável à
alimentação orgânica e integral; no segundo, bastam as
seções de descontos dos supermercados ou os mercados
mais baratos. Neles, de forma bem semelhante à lei da
polaridade, encontram-se os alimentos mais caros e de
maior duração, o que se torna claro não no caixa, mas
apenas ao longo da vida.
Obviamente, uma alimentação e um modo de vida que não
dão chance aos fungos desde o começo são muito melhores
do que as problemáticas orgias de medicamentos
antimicóticos, para os quais valem as mesmas
considerações reservadas aos antibióticos, seus parentes
espirituais. Por exemplo, a prescrição de nistatina é mais
uma declaração de impotência do que uma receita segura,
mesmo que os médicos acadêmicos, por falta de alternativa,
pratiquem esse reflexo incondicionado sem más intenções.
Novamente, vale aqui o lema de Bertolt Brecht, ou seja, o de
que o contrário do “bom” não é o “ruim”, e sim a “boa
intenção”.
 
Perguntas para os pais:

Como podemos ajudar nosso filho a defender-se
de maneira mais eficaz quando sua pele é
acometida por alguma micose?

Como a vida atual e suas impressões podem ser
mais bem digeridas (no caso de fungos
intestinais)?

Por que ele permite que intrusos se alimentem
de sua comida?

Como podemos encorajar nosso filho a
desvencilhar-se do que é velho e dedicar-se ao
que é novo e vivaz?

Como ele próprio pode se tornar mais vivaz?

Quais lastros de longa data precisam ser
descartados (pela família)?
 
Medidas de apoio:

Limpeza individual do cólon.

Tropaeolum majus (folha de capuchinha), da
Ceres: tomar de duas a cinco gotas de duas a
quatro vezes ao dia em um pouco de suco ou no
chá.

Alimentação integral: tanto para a criança
afetada quanto para a mãe que está
amamentando.

Renunciar ao açúcar refinado (mudar para
estévia).

Em caso de micose cutânea e assaduras:
aplicações externas de calêndula (dez gotas da
tintura-mãe em meio copo d’água). Aplicar
levemente na pele.
Envolver várias vezes o local com materiais de
algodão que deixem a pele respirar. Nessa fase, não
utilizar fraldas descartáveis.
Deixar o bebê nu o máximo de tempo possível e,
sobretudo, deixar suas nádegas livres para que ele
mova as perninhas.
Evitar pomadas muito gordurosas.
Dar banhos regulares em soro de leite. Aplicar
compressas de soro de leite.
O óleo da árvore-do-chá também é muito eficaz
contra doenças fúngicas externas.

Em caso de sapinho: Borax C6, três glóbulos três
vezes ao dia.
Dar um copo d’água com uma pitada de bicarbonato
de sódio, a fim de limpar a boca.
Mandar preparar na farmácia um composto à base
de tintura de ratânia e mirra em iguais proporções.
Pingar dez gotas do preparado em um copo de água,
embeber um cotonete no líquido e passá-lo na boca
da criança.
(Na maioria das vezes, o sapinho é inofensivo e dura
até três semanas, uma vez que percorre todo o trato
digestório de cima para baixo.)

10.9 Vermes
“Tem alguma coisa errada dentro de mim.”
 
Para os vermes, a situação em nossos dias não é nada
favorável. Em épocas de condições piores de higiene, eles
eram muito mais numerosos – mas, em compensação, havia
muito menos alergias, razão pela qual hoje já existem
terapias com ovos de vermes... Obviamente, trata-se de uma
questão de ambiente. Os vermes precisam de condições de
sujeira e de certa falta de higiene como base.
Ainda não se sabe se o argumento em contrário, ou seja,
tratar alergias com ovos de vermes, é consistente. Dizem os
inventores dos tratamentos que as respectivas medidas,
pelas quais se devem pagar até 3 mil euros, são eficazes e,
pelo menos, apresentam algumas provas de seu sucesso.
Porém, talvez a superação psíquica de dar espaço a algo tão
imundo quanto os vermes já seja um passo decisivo. Se as
alergias têm sua origem no medo psíquico da sujeira,
poderiam ser encontradas terapias muito mais elegantes
para tratar dos vermes.
Em todo caso, esse fato mostra que hoje permitimos que
nossas crianças “comam” sujeira cara em forma de ovos de
vermes; eis até onde a mania de higiene nos levou.
Especialmente para as crianças, ela cria uma atmosfera
hostil à vida e portadora de alergias – entretanto, nenhum
verme se arrisca nesse terreno.
Muito do que é “bom” também poderia ser ruim. Crianças
com vermes não se desenvolvem direito, permanecem
pálidas, inquietas e perdem toda concentração. A razão para
tanto estaria no fato de que os vermes consomem e, por
conseguinte, despendem a energia vital, de certo modo
como passageiros clandestinos. Eles as acompanham em
sua viagem pela vida e não contribuem com o êxito do todo;
ao contrário. Não se chega a uma simbiose como aquela
com as bactérias intestinais, e sim a uma recepção das
vantagens apenas por uma das partes. Por outro lado, a
presença de vermes no organismo mostra que há algo
errado dentro dele.
Em crianças mais velhas, a repugnância e o medo de ter o
corpo vivo devorado por vermes, e com eles a lembrança do
fim inexorável do corpo, podem desempenhar determinado
papel, assim como a sensação de serem contaminadas por
dentro. Quando a contaminação ocorre no intestino, a
sensação de uma espécie repugnante de coabitação ou até
mesmo de “possessão” no nível dos infernos pode dar
calafrios. Quem alimenta hóspedes que não foram
convidados, logo se sentirá vítima de exploração. Nesse
caso, seria útil ter claro em mente que esses hóspedes
sentiram-se totalmente convidados pelas condições ruins
para os portadores, mas favoráveis para eles.
Alguns candidatos, como os oxiúros, também provocam
coceira no ânus, pois ali depositam seus ovos, o que poderia
estimular a higiene anal. Ao que parece, crianças com
vermes também enfiam mais o dedo no nariz, talvez porque,
representativamente, queiram limpar a entrada, pois à saída
não têm acesso fácil – ou simplesmente porque, de outra
forma, não encontram prazer sensorial na vida.
Como no caso de todas as infecções, existe uma
problemática da defesa no campo da agressividade. O
organismo oferece um lar aos parasitas, pois está muito
fraco para proteger seu reino dos invasores. Ele não domina
seu mundo.
A tarefa consiste em aprender conscientemente a dividir e
a ceder espaço (de vida) a outros seres. “Viver e deixar
viver” poderia ser o mote. Nesse sentido, há que se
considerar a possibilidade de permitir às pessoas afetadas
que escolham seus animais de estimação e impor uma
higiene moderada no espaço doméstico, enquanto passar
um período fora de casa, em um ambiente “selvagem”, em
meio à natureza, pode ser vantajoso.
Quem permite conscientemente que outros (seres)
convivam consigo mesmo acaba cultivando o amor pelo
próximo. Quem exprime conscientemente esse convite está
mais protegido de ataques e, ao mesmo tempo, desenvolve
a sensibilidade para as necessidades próprias e as alheias.
Por sua vez, a longo prazo, isso pode conduzir à
reconciliação com os próprios infernos e o próprio ambiente.
Mesmo para crianças pequenas, essas possibilidades já
existem nos aniversários e em ocasiões semelhantes.
Com crianças mais velhas, também pode valer a pena, do
ponto de vista espiritual e psíquico, discutir a respeito de
temas relacionados ao reino das sombras e fazer da morte o
objeto da conversa, talvez até chamando a atenção para o
fato de que a alma é imortal e nunca poderá ser atacada de
forma concreta por vermes, mas que, após a morte, o corpo
torna-se seu alimento. Durante a vida, é a vitalidade da alma
que protege o corpo dos vermes. Para as crianças mais
velhas, este poderia ser um forte estímulo para preencher
todos os campos (da vida) e ousar viver. Quando há alguma
coisa errada dentro do ser humano, falta justamente a
vitalidade!
Também se deveria falar, sobretudo, de como a vida deve
ser digerida e onde o verme ou os outros “hóspedes” e
convivas suspeitos poderiam se esconder. O tema
“exploração” ou “ser explorado” também pode ser
trabalhado desde cedo com proveito, o que transmite à
criança as primeiras impressões das leis da vida.
 
Perguntas para os pais:

Como nosso filho pode avivar melhor o que não
tem vida ou se ver livre dele?

Por que ele se deixa explorar?

Como ele pode se proteger melhor?

Em que circunstâncias ele explora os outros?

Como ele pode aprender a dividir?

O que isso reflete para nós dois?

Que sentimentos os vermes desencadeiam em
nós?
 
Medidas de apoio:

Medidas oportunas de higiene: trocar
frequentemente a roupa de cama, as toalhas e
as roupas e, se possível, lavá-las com água
quente.

Procurar manter as unhas curtas: quando a
criança coça as nádegas e depois leva a mão à
boca, ela pode contaminar-se.

Alimentação: evitar produtos com farinha branca
e açúcar. Devem-se preferir alimentos com muito
tanino: alho, alho de urso (para crianças
menores, pois é mais suave que o alho normal),
cebola, cenoura crua, repolho.

Chá de folha de nogueira: ferver duas colheres
de chá das folhas em um quarto de litro de água;
deixar repousar por dez minutos. Dar em
pequenas quantidades ao longo do dia.

Tratamento homeopático: o tratamento ocorre
com vermífugos especiais ou com medicamentos
homeopáticos individuais. Em casos
reincidentes, a criança precisa passar por um
acompanhamento homeopático constitucional.
11 Doenças alergênicas

11.1 Alergias
“Estou recebendo muita coisa, não estou bem regulado e
reajo com hipersensibilidade.”
11.1.1 Guerras de fronteiras

Os locais em que a doença se manifesta revelam, como


sempre, os níveis em que o problema se desenvolve. Por um
lado, as alergias se mostram na epiderme, que é fronteira e
área de contato e cujo espectro temático vai da
“agressividade” ao “carinho”. O que se aproxima demais de
nós, chegando muito cedo, com muitas exigências e
“pegando em nosso pé”, o que nos perturba contra nossa
vontade é combatido através da alergia. Por outro lado, as
mucosas, nossas fronteiras internas, também são palco de
alergias, especialmente no nariz, que representa o poder e o
orgulho e que, para as pessoas afetadas, evidenciam temas
“suspeitos”. Depois da pele, o pulmão é nosso segundo
órgão de contato. Nele se trata menos de comunicação
direta, e o tema “liberdade” transparece em sua forma de
asa. Se a respiração é impedida através do nariz e/ou dos
pulmões, a liberdade e o contato com a vida são
comprometidos. Temas que ameaçam sufocar as crianças
refletem-se no pulmão, enquanto as alergias do sistema
digestório mostram temas indigeríveis e apontam problemas
com a comida e a digestão não apenas do alimento, mas
também do mundo e do ambiente circunstante.
A linguagem dos sintomas nessas áreas de fronteira revela
o quanto as pessoas afetadas se opõem a algo externo e
estranho. Quem reage com alergia a alguém ou a alguma
coisa revela certa intolerância e certo medo além da
irritação e da reação exagerada. Devido à sua simbologia,
essa parte concreta do mundo é rejeitada e, eventualmente,
combatida maciçamente com o emprego da própria defesa.
Portanto, a alergia é uma possibilidade que o corpo recebe
de dizer “não” e delimitar-se, traçando uma fronteira que, no
sentido figurado, ainda não foi traçada, pois teria faltado, por
exemplo, coragem ou força. Em vez de guardar para si a
força e a energia e investi-las em metas importantes de vida,
as pessoas afetadas as orientam a tudo que está
simbolicamente ligado aos temas problemáticos. Tudo que é
estranho e que, de certo modo, do lado de fora, aponta para
o problema, é combatido ao extremo.
Nesse sentido, é compreensível que crianças de cidades
grandes tenham muito mais alergias do que aquelas que
vivem no campo. Crianças que já no primeiro ano de vida
são regularmente levadas ao curral e também entram em
contato com os animais sofrem menos de alergias mais
tarde, o que teria conduzido à tentativa já mencionada de
fazer do pó dos currais um medicamento antialergênico.
Supõe-se que gestantes que frequentam um curral possam
evitar alergias em seus filhos. Por si sós, cidades grandes
são locais hostis às crianças. Quando então nelas se
recusam às crianças os animais (totens), ou quando estes
são substituídos por animais fáceis de cuidar ou até mesmo
por animais de pelúcia (inanimados), é possível que uma
criança com vitalidade se defenda. A princípio, isso ocorrerá
externamente; porém, devido à relativa debilidade, passará
para níveis internos – como no caso da alergia. Evitar
precocemente a delimitação necessária faz com que a
energia da agressividade seja deslocada para os níveis do
corpo em que os relativos conflitos se enfurecem nas
mencionadas fronteiras externas e internas.
11.1.2 Jogos de poder

À sombra das alergias, muitas vezes, já em crianças


pequenas se veem claramente os jogos de poder. Pela
necessidade de se evitar os alérgenos, a criança pode impor-
se quase arbitrariamente, tiranizar o ambiente,
extravasando uma agressividade que estava oculta e
pedindo atenção. A partir desses jogos, sentimentos de
culpa que foram nutridos podem fazer com que uma
agressividade ulterior seja reprimida. Desse modo, crianças
com febre do feno ou asma acabam com a primavera de
suas mães; aquelas com alergias a alimentos tornam todo
ato de cozinhar um ato forçado e limitado. Com alergias
graves, a presença das mães é requerida quase
arbitrariamente, o que nelas costuma desencadear
agressividade e, quase sempre, desamparo. Sobretudo
quando se observa a maioria das relações carregadas de
agressividade entre as crianças afetadas e as mães,
compreendem-se os círculos viciosos que se desenvolvem
nesses casos. Mães de filhos alérgicos costumam ter, quase
forçosamente, concepções próprias de higiene e, não raro,
são superprotetoras e, por preocupação, não permitem que
seus filhos tenham vitalidade.
11.1.3 O estranho e o próprio

Em geral, as alergias são reações de hipersensibilidade a


substâncias proteicas que se distinguem da proteína do
próprio corpo. Desse modo, essa outra vida que se aproxima
é combatida como corpo estranho.
A ocorrência dessa luta evidencia o problema da
agressividade. A coragem e o espírito combativo que faltam
em outros níveis são deslocados para o corpo e nele vividos
de maneira representativa.
Outros seres – quer eles sejam vegetais, quer animais –,
dos quais provém a substância combatida, apropriaram-se
dela tanto no nível material quanto no imaterial,
caracterizando-a e integrando-se a seu campo. Mesmo
quando aparentemente se trata de uma substância
inanimada, como um solvente, ela pertenceu a um sistema e
nele estava integrada a um campo que é estranho ao corpo
do paciente.
Entretanto, o ser humano precisa absorver e apropriar-se
do que lhe é estranho para poder viver. Isso vale tanto no
nível material da alimentação (mas também na absorção do
sêmen durante a reprodução) quanto no imaterial, em
relação a informações, que também têm de ser integradas e
assimiladas.
Portanto, a tarefa da digestão ocorre em três etapas:
absorver, elaborar e eliminar. Na prática, isso significa que o
elemento estranho deve ser eliminado de imediato ou
transformado pelo fígado, ou ainda integrado para que sua
estrutura material, mas também seu campo estranho e
imaterial, sejam dissolvidos. Somente então a substância
estranha pode ser adaptada, inserida e aproveitada pelo
próprio campo. Nesse processo, podem ocorrer alguns
problemas, como bem mostra o exemplo do surgimento de
uma alergia ao leite de vaca.
Quando um lactente recebe precocemente na mamadeira
o leite de vaca, para o qual ele não está preparado, na
verdade, ele está sendo enganado. Sua digestão, ainda
imatura, não é capaz de decompor a proteína estranha e
absorvê-la adequadamente através da parede do intestino.
Desse modo, essa proteína penetra no organismo sem ter
sido decomposta nem alterada e, por assim dizer, com o
campo original do reino da vaca. Por conseguinte, ela entra
no local errado como fator de distúrbio. O termo “a-topia”
para “alergia” (do grego tópos para “lugar, região” e,
respectivamente, átopos para “que não está em seu devido
lugar”) torna esse fato bastante evidente, pois “atopia”
significa simplesmente que alguma coisa não está onde
deveria.
Atualmente, os médicos entendem por atopia uma síntese
de IgE (imunoglobulina E), ou seja, a produção de anticorpos
específicos da superfície como reação a uma substância
estranha. Portanto, uma atopia surge quando, do seu campo
característico, substâncias indigeríveis penetram no
organismo, que aprende a rejeitá-las com a ajuda do seu
sistema de defesa. O corpo, ou melhor, seu sistema
imunológico memoriza o perfil específico dessa substância
com o objetivo de impedir que ela invada o organismo
novamente. Uma substância é indigerível porque o
organismo ainda se encontra fisicamente imaturo para
realizar esse processo ou porque ele é incapaz de lidar com
a respectiva simbologia dessa substância. Esta última razão
está em primeiro plano entre os alérgicos.
Quando uma substância como essa, originariamente
conhecida como inadequada e ingerida à revelia no sentido
de uma demanda excessiva, mais tarde volta a entrar em
contato com as próprias fronteiras, ocorre o problema que
chamamos de “alergia”. Na verdade, trata-se de uma reação
saudável do sistema imunológico, que é incumbido de
“atacar” substâncias e agentes patogênicos estranhos que
fazem o organismo adoecer, mas não a reagir de maneira
exagerada a substâncias inofensivas. Em todo caso, a defesa
entra em ação e encena uma luta que pode chegar à
dissolução das próprias fronteiras, permitindo que a
substância penetre inteira. Trata-se aqui de um paradoxo ou
de um efeito típico da lei da polaridade, pois, enquanto o
organismo quer se fechar para o que lhe é estranho, ele abre
suas fronteiras, dissolvendo-as literalmente.
O corpo do lactente, que mais tarde voltará a receber leite
de vaca, armazenou e não esqueceu o antigo encontro
ameaçador em seu sistema imunológico. Ele se defende (por
meio da alergia), embora agora – do ponto de vista
fisiológico – esteja totalmente em condição de digeri-lo.
Todavia, a memória imunológica lhe impede essa digestão
com base no antigo e (demasiado) precoce domínio de sua
integridade, quando ele foi forçado a permitir a entrada de
algo como um todo que ele ainda não era capaz de
fragmentar e do qual não podia se apropriar. Quando se
consegue incorporar algo de maneira consciente, facilmente
se faz dele um hábito, tornando-o parte do próprio corpo. No
entanto, se a razão da assimilação foi uma demanda
excessiva, aquilo que entrou no organismo não foi
exatamente incorporado.
A memória da alergia representa, por assim dizer, um
desvio em relação ao esquecimento saudável. O organismo
só consegue esquecer o que conseguiu perceber, classificar
e digerir por completo no momento da assimilação. Com a
demanda excessiva e precoce, surge um erro de
programação, que permanecerá como tal quando nenhuma
terapia ajudar.
De modo semelhante, muitas vezes uma relação sexual
forçada muito precocemente, no sentido de um abuso, leva a
uma programação (falha). Algo que em si causa prazer,
como fazer entrar em si um corpo “estranho” (de um ser
humano), passa a ter – às vezes durante a vida inteira – uma
carga tão negativa que, do ponto de vista psíquico, esse
tema já não pode ser integrado, e toda tentativa de relação
sexual inspira horror em vez de experiências de união. Nesse
caso, confrontar a violação original por meio da psicoterapia
ajuda a separar e, por fim, apagar esse programa precoce
das experiências posteriores. Portanto, a consciência se
torna a solução.[23]
A digestão saudável surge a partir da combinação entre
percepção da verdade, assimilação e eliminação, portanto, a
partir do aprendizado e do esquecimento. O aprendizado
pressupõe a percepção e o interesse ativo. Aprende melhor
quem desenvolve uma atividade própria a partir da matéria
aprendida. Esquecido poderá ser aquilo que é superado.
Portanto, as capacidades se desenvolvem por intermédio do
aprendizado e do esquecimento.
A alergia surge quando uma criança, no momento da
confrontação com a respectiva matéria (ou tema) ainda não
amadureceu ou amadureceu muito pouco em sua
capacidade de perceber e assimilar. Não é à toa que o termo
“matéria” tem vários significados e pressupõe tanto o que é
material quanto o que é espiritual, no sentido de matéria a
ser aprendida ou lida. Em outras palavras, a criança não
estava madura nem crescera o suficiente para a solicitação
recebida. Devido à sua imaturidade, ela só conseguiu
realizar uma digestão insatisfatória, permitindo que o
elemento estranho penetre em seu interior (corpo e/ou
consciência) sem ter sido digerido. Disso resulta um
processo de digestão no lugar errado (atopia), que, mais
tarde, repercute como um distúrbio nas fronteiras do
organismo. No futuro, em vez de resolver o problema, esse
processo dissolve suas próprias fronteiras. De modo típico,
uma problemática sem solução na consciência acaba se
manifestando no corpo. No lugar da solução do problema
surge a dissolução da fronteira. Nela, a consciência tem
como tarefa abrir suas fronteiras, mas não o corpo. Quando
ele é obrigado a entrar em ação, ocorrem os típicos
problemas de alergia em suas fronteiras.
Nesse sentido, a alergia é um problema da imaturidade,
ligado, tanto no nível físico quanto naquele espiritual e
psíquico, a uma problemática da energia ou da
agressividade. As pessoas afetadas ainda não têm condições
de lidar com determinada temática, digeri-la, metabolizá-la e
absorvê-la em seu campo. Para tanto, além da força, falta-
lhes a maturidade.
Quando uma criança é colocada em um ambiente
inadequado, que ela não consegue “digerir”, pode exprimi-lo
com uma alergia. Se essa alergia for, por exemplo, ao pólen,
fica evidente uma referência sexual; se for ao leite, a alergia
indica uma problemática com a mãe; se for ao trigo, diz
respeito a um alimento essencial e com isso exprime um
pedido de ajuda, no sentido de “corro o risco de morrer de
fome, pois já não consigo absorver o alimento mais
importante”. Nesse caso, a ambiguidade volta a ficar
bastante evidente. A criança luta em duplo sentido com a
fome – objetivamente, no nível da digestão, mas também
naquele da agressividade. Por certo, imaturidade e
problemática da agressividade podem complementar-se.
Pode faltar tanto a maturidade quanto a energia para a
assimilação, mas muitas vezes também ambas.
As pessoas saudáveis têm condições de eliminar as
substâncias não digeridas, que foram absorvidas nas
refeições, decompondo de tal maneira o que lhes é estranho
que se apropriam dele e integram a substância dissolvida
tanto no aspecto físico quanto naquele relativo ao seu
campo. Com sua percepção sensorial, o organismo é capaz
de reconhecer o que lhe é estranho como tal e, por meio da
digestão, desintegrá-lo em pequenos componentes,
diferenciá-los e, ao mesmo tempo, abrir-se para eles.
Consegue apropriar-se da matéria e de seu tema e, mais
tarde, construir sua própria corporeidade a partir deles. Nas
alergias a alimentos, o que se torna mais evidente é que não
é possível construir um material próprio a partir do que é
combatido. Ao contrário, as pessoas afetadas emagrecem
enquanto a alergia não é reconhecida nem eliminada, ou
seja, enquanto o alimento que a provoca não for evitado.
Nessas pessoas, o encontro com o estranho desencadeia
um drama, uma vez que não conseguem assimilar o
estranho como um todo e tentam eliminá-lo, ou melhor,
querem mantê-lo do lado de fora, fazendo com que as
próprias fronteiras sejam dissolvidas de forma inflamada e
belicosa. Portanto, enquanto as pessoas saudáveis dissolvem
o que lhes é estranho (tanto mental quanto
fisiologicamente), a fim de se preservarem integralmente, os
alérgicos dissolvem a si próprios, ou melhor, suas fronteiras,
a fim de manter o estranho do lado de fora. Todavia, isso não
dá certo justamente devido à dissolução da fronteira.
No macrocosmo, assistimos a algo análogo com a antiga
República Democrática Alemã, que, ao tentar manter do lado
de fora tudo que lhe era estranho, acabou dissolvendo suas
próprias fronteiras. Quis defender tudo com a força das
armas e, assim, viu suas fronteiras desabarem. O
armamento excessivo das fronteiras levou à autodissolução
em todos os níveis. A maioria das fortalezas foi tomada ou
perdeu relevância em algum momento devido à
autodissolução dos respectivos campos de domínio.
11.1.4 A alergia e a reconciliação com a mãe (natureza)

O alérgico se afasta da natureza, sem, no fundo, escapar


dela. A mãe natureza torna-se uma inimiga, sem a qual,
porém, não é possível viver, assim como uma criança
pequena que, mesmo rejeitando e combatendo a própria
mãe, sem ela não consegue viver.
Não raro, vemos crianças que preferem, acima de tudo,
brincar e viver na natureza e com os animais; porém, devido
à sua alergia, não toleram a natureza, com todas as suas
sementes, nem os animais, com todos os seus pelos. Como
todos os alérgicos, elas precisariam, inicialmente, reconciliar-
se com a própria natureza e compreender sua situação no
mundo, para então voltar a ficar em paz com a mãe
natureza.
Muitas vezes, a própria mãe coloca-se como barreira entre
os filhos e sua própria natureza, de um lado, e a natureza
externa, de outro. Sua tarefa seria voltar a se transformar
em intermediária, tal como no início da vida com a
amamentação.
Com isso, a luta contra a natureza é também sempre uma
luta contra a própria mãe (natureza) e esclarece as difíceis
relações com a mãe concreta em muitos alérgicos, por
exemplo, em quase todos os asmáticos. Uma criança
pequena ou grande que tenha problemas com o leite
combate simbolicamente o aspecto materno que o afeta.
Mais importante do que representar essa luta no nível do
corpo seria ocupar-se da problemática materna de maneira
corajosa no plano metafórico.
Contudo, para as crianças, dificilmente isso é concebível.
Sua chance estaria em excluir, por meio do gosto e do olfato,
aquilo que lhes oferece perigo. Nesse sentido, os pais fazem
bem em levar a sério as preferências de gosto dos filhos. O
doce é inofensivo, e quase sempre é preferido pelas
crianças. O salgado é importante para o organismo e, por
isso, é apreciado em doses pequenas. O azedo muitas vezes
indica comida estragada e é espontaneamente rejeitado. O
amargo costuma ser venenoso e também é recusado.
Na luta da alergia contra os símbolos, é “natural” passar
da longa ocupação com os inimigos naturais para uma
aproximação da natureza. A solução estaria em lutar para
integrar-se a ela com coragem e em reconciliar-se
conscientemente com ela, realizando até mesmo um ritual
de união. Seria útil reviver a situação original e digeri-la
adequadamente. A mesma ideia determina o conflito de
gêneros, em que um luta com o outro, mas, no final, ambos
se unem.
Situações típicas de alergia podem elucidar o tema. Na
primavera, quando as plantas florescem, nos que sofrem da
febre do feno também floresce alguma coisa. Sua pele
desabrocha e, ao contato com o pólen e as sementes, expõe-
se à luta descrita e nela irrompe o eritema. Ao tentar manter
distância das sementes masculinas das plantas, que, como
símbolo da polaridade, são consideradas perigosas, a
fronteira (da pele) se rompe. A tentativa de fechar-se para
esse florescimento e para a temática da primavera conduz a
pele ao outro extremo – a abertura –, revelando, assim, a
tarefa subentendida. As pessoas afetadas deveriam abrir-se
às energias nascentes da vida, expor-se com impulso e
entusiasmo ao recomeço e tomar as rédeas da própria vida.
(Uma indicação eficaz para o início da febre do feno com
sintomas nos olhos e no nariz é a Galphimia glauca, em D4.
Devem-se dar cinco gotas, de três a cinco vezes por dia.
Esse medicamento pode aliviar os sintomas, mas não
substitui a terapia constitucional.)
Crianças que reagem com alergia já não conseguem se
conectar livremente com o mundo. O próprio corpo transmite
à alma a experiência da estranheza, da antipatia. Ao
combater o estranho, ele também combate a si mesmo,
prejudicando-se. Por fim, a alergia deve ser entendida como
um problema de incorporação e de defesa, que reflete uma
falta de maturidade e de energia.
11.1.5 Prevenindo-se contra as alergias

A profilaxia da alergia significa encorajar a criança a


enfrentar a vida com coragem, evitar submetê-la demais ou
de menos ao contato sensorial com o que lhe é estranho,
oferecer-lhe no início da vida apenas o leite materno e, em
seguida, apenas alimentos sazonais e adequados, bem como
um ninho se possível intacto e, mais tarde, um apartamento
ou uma casa com a qual ela possa se familiarizar facilmente.
Para estimular o desenvolvimento (cerebral), devem-se
oferecer a ela muitas coisas que lhe são familiares. Por
conseguinte, muito contato físico com poucas pessoas é
melhor do que pouco contato intelectual com muitas. Nesse
caso, menos (impressões) também significa mais! Por fim, no
contato afetivo, trata-se de oferecer, de acordo com o tipo e
a idade da criança, um bom equilíbrio entre o estímulo já
conhecido e aquele que é novo, vital e intelectual.
“Coisas demais cedo demais” é uma alternativa que leva a
imagens hostis (no sistema de defesa), mesmo quando a
intenção é boa. É o que causam os antibióticos quando
dados precocemente, pois, como já foi descrito, elevam a
níveis dramáticos o risco de alergias. A experiência de que a
vacinação precoce aumenta a probabilidade de alergias
também pertence a esse complexo de temas. Ainda não se
sabe se o problema nas vacinas está no agente patogênico,
nas substâncias que o veiculam ou em outros componentes.
Em todo caso, o estranho entra no corpo, ou melhor, em seu
sistema imunológico, no momento errado. Sobretudo quando
consideramos que as vacinações são, de certo modo, inúteis
no primeiro ano de vida, em razão da imaturidade do
sistema imunológico, podemos entender claramente quantos
danos são causados nessa fase sem nenhuma necessidade.
Segundo um estudo de Johan S. Alm e Jackie Swartz, de
1999, uma mudança no estilo de vida, no sentido de aceitar
as doenças infantis clássicas e a diminuição no uso dos
medicamentos antipiréticos e antibióticos já dentro de uma
geração reduziria em 40% a 50% o surgimento de alergias.
No mesmo ano, utilizando exames comparativos de 675
alunos, os autores do renomado instituto sueco Karolinska
provaram que os alunos das escolas Waldorf, submetidos a
um estilo de vida antroposófico, têm apenas metade das
alergias dos outros estudantes.
A menor difusão de alergias como a febre do feno em
regiões rurais e países em desenvolvimento pode ser
explicada com as mesmas razões pelas quais são mais
afetados os filhos únicos ou de pais mais abastados. Quanto
mais a criança cresce próxima da natureza e quanto mais for
confrontada com estímulos naturais, mais estabilidade terá
no conflito com seu ambiente. De modo geral, as crianças
são confrontadas com fatores menos difíceis de superar e
que podem se transformar em um quadro hostil e
problemático (do ponto de vista imunológico). Filhos únicos
de pais com uma boa situação financeira costumam ser
expostos a ambientes diferenciados e variados. Nesse
sentido, o excesso de estímulos, que no mundo moderno é
quase natural, também poderia ter sua parte de
responsabilidade no número crescente de alergias.
Entretanto, o fato de que tantas crianças saiam de tudo
isso sem alergia revela que não são as situações em si que
se mostram boas ou ruins; ao contrário, a questão é se são
adequadas a nós e se a medida é correta.
As alergias surgem apenas onde as pessoas criam
ambientes civilizados e emancipados da natureza, inibindo-a
a fim de afirmar seu modo de vida e seu desenvolvimento
psíquico e espiritual de forma cada vez mais livre e
independente da natureza. Torna-se evidente nesse caso a
sombra do livre-arbítrio do homem moderno. Há cem anos
não havia o problema da alergia.
Aos poucos e em seu tempo, mas com coragem, a criança
tem de lidar com seu ambiente natural, aprendendo a
“digeri-lo”. Para tanto, também no início da vida, ela leva
tudo que é possível à boca. Os estímulos naturais poderiam
ser relativamente intensos, desde que adequados ao
desenvolvimento.
Também é compreensível que pais alérgicos tenham, com
mais frequência, filhos alérgicos. Eles próprios sofreram
muitas exigências e, por isso, também tendem a exigir
demais. Além disso, em geral transmitem o medo de seus
alérgenos aos filhos.
Crianças alérgicas exigem muita dedicação, que mais
tarde as compromete e as impede de se tornarem
autônomas. Uma precaução eficaz seria, por conseguinte, a
dedicação intensa e, sobretudo, autêntica por parte da mãe,
que obviamente não deve ser forçada. Igualmente
compreensível nesse caso é a razão pela qual uma
puberdade normal é um bom medicamento para crianças
alérgicas. Ela conduz a uma emancipação psíquica e, muitas
vezes, a uma delimitação combativa em relação aos pais.
Quando essa dissociação dos pais fracassa, eleva-se
claramente a probabilidade, por outro lado, de que as
alergias ocorram. Segundo a experiência, alergias que só se
instalam após a puberdade são mais difíceis de serem
tratadas.
De acordo com tudo que já foi descoberto até agora, o
estilo de vida moderno nas nações abastadas do primeiro
mundo estimularia as alergias. Cada vez mais pessoas já não
se sentem satisfeitas nesses lugares, perdem a paciência,
estão sempre com o nariz constipado na primavera, que é o
tempo do recomeço, e, por isso, não querem recomeçar –
por medo das irrupções de vivacidade incisiva, tal como se
mostram claramente nos brotos e germes, nas árvores que
começam a mostrar seus frutos e nos vegetais da primavera,
que crescem rapidamente.
Como em muitos quadros de doenças, nas alergias
também observamos um avanço crescente na infância. Nos
países abastados, as exigências são cada vez maiores e
ocorrem cada vez mais cedo, ao passo que se levam cada
vez menos em consideração as necessidades infantis para o
desenvolvimento, uma vez que o crescimento econômico é o
único e principal objetivo.
A isso se acrescentam problemas evidentes, como o
ressecamento das mucosas devido ao moderno estilo de
construção com aquecimento central e isolamento térmico
excessivo, muitas vezes sem o respectivo e necessário
arejamento controlado. O ressecamento enfraquece as
mucosas, tornando-as mais vulneráveis. No entanto, a
situação vegetativa predominante, com um estímulo
excessivo do sistema nervoso simpático, conduz ao
ressecamento em todos os níveis. A boca seca do falante
mostra seu estresse, assim como o ressecamento dos órgãos
sexuais durante o sexo mostra o estresse daqueles que
supostamente se amam. A vida moderna está próxima
demais do polo arquetipicamente masculino, e isso também
já afeta cada vez mais as crianças. Muitas pessoas pisam
demais e com muita frequência no acelerador (sistema
nervoso simpático), e o freio, ou seja, o sistema nervoso
parassimpático ou nervo vago, a ser atribuído
arquetipicamente ao aspecto feminino, cai cada vez mais no
esquecimento. Essa política leva para o mau caminho tanto
no microcosmo corpo quanto no macrocosmo Terra. O
ressecamento é um fenômeno masculino, que tem como
consequência paisagens desérticas no mundo e na alma. O
feminino arquetípico, ao contrário, é úmido, pantanoso e, por
fim, revigorante.
Fatores como a alimentação desnaturada, a falta de
exercício físico, longos períodos diante da televisão, típicos
da vida moderna, enfraquecem ainda mais o sistema
imunológico e fomentam o desenvolvimento de alergias.
Nesse sentido, as crianças de hoje são objetivamente mais
vulneráveis.
A vida moderna se torna especialmente trágica e
portadora de alergias quando a moda contra tudo que é
natural termina na chamada sociedade Sagrotan,[24] que
coloca a higiene muito além da vitalidade e declara guerra a
todo grão de pó e a todo germe. Depois que tudo foi
desinfetado e nada mais pode germinar, geralmente a vida
ou, pelo menos, sua vitalidade também é aniquilada e,
muitas vezes, acaba numa luta frustrante contra todos os
possíveis inimigos imaginados. Imaginados porque as
imagens sentidas como inimigas da vida (“sujas e
perigosas”) são armazenadas na alma.
Nesse contexto, um retorno aos espaços naturais da vida
poderia melhorar muita coisa. A vida é o que é, inclusive
suja, e é “transmitida” através do ato sexual, para o qual a
mucosidade é importante. Tudo é cheio de germes e,
portanto, de vitalidade – como já foi dito, em cada aperto de
mão trocamos 35 milhões de germes. Quem quiser mudar
isso acabará por se destruir com as mudanças.
Em todo caso, isso nos levaria a pensar que, nos filhos
únicos mal-acostumados e mimados no mundo burguês das
cidades grandes, as alergias se acumulam em grande
medida. Não raro, a essas crianças falta uma autêntica
dedicação, embora sejam cronicamente tratadas em excesso
pela medicina acadêmica.
Todavia, este é o mundo em que vivemos, e muitos
precisam morar nas cidades. Além disso, o retorno ao campo
e à natureza fracassou já na época de Jean-Jacques
Rousseau, que fazia esse apelo, e hoje, por razões de
espaço, não seria realista. Não obstante, podemos tentar
lidar com a vida de maneira mais natural, sobretudo aquela
com as crianças. Estas deveriam ser como são. E os pais
deveriam impor-lhes limites e dizer não quando necessário
(para ambas as partes). A agressividade poderia ser
libertada de seu tabu e reconhecida e aceita como um
princípio primitivo da vida. Só isso já traria uma melhora
considerável. Pois a agressividade é o ponto decisivo, ainda
que, nessa situação, ela apareça pouco em primeiro plano
(uma exposição mais detalhada sobre esse tema pode ser
encontrada no livro A Agressão como Oportunidade).
11.1.6 Possibilidades e oportunidades terapêuticas

A experiência mostra que a febre, como mobilização geral do


corpo, é um tipo de remédio universal do nosso organismo.
Até mesmo casos de câncer já desapareceram após
episódios de febre alta. Isso também é observado nas
alergias. Porém, se a possibilidade de ter febre pode curar
até mesmo as alergias, novamente fica claro como é
necessário manter essa capacidade.
Semelhante à febre do corpo é o conflito que ocorre em
nível espiritual e psíquico. Quando as crianças afetadas
aprendem a conduzir o conflito primitivo com o símbolo de
sua guerra interiorizada, essa luta pode tornar o conflito
substituto superficial no plano imunológico e encerrá-lo.
Portanto, as crianças alérgicas precisam aprender a
expressar abertamente a rejeição, a treinar a dizer não e a
aceitar a luta pela vida novamente no plano alternativo ao
sistema imunológico. Modalidades esportivas ativas e,
eventualmente, de luta, além de exercícios de confronto e
trabalho corporal são muito úteis e auxiliam nesse
tratamento. “Energia em vez de alergia!” seria um bom
lema. Exercícios para educar a sensibilidade, a fim de
aprender a distinguir amigos de inimigos, também são
recomendáveis. Trata-se de tirar do sistema imunológico e
do corpo o exercício de agressividade praticado pela alergia
e de pensar e agir novamente de maneira incisiva, agressiva
e corajosa. Quem arrisca a vida e aceita seus desafios de
modo consciente, quem se mostra mais pronto para a reação
e age com determinação em vez de cultivar o
comportamento que tende a evitar essas instâncias está no
caminho certo.
Obviamente, a primeira reação às alergias é tentar evitar o
que as provoca. No entanto, como solução a longo prazo,
esse método não deveria ser aceito. Infelizmente, os
médicos acadêmicos mal informados sempre reforçam o
preconceito de que não é possível livrar-se de uma alergia. O
que acontece é justamente o contrário, conforme muitas
vezes testemunhamos. Com essa mentalidade, eles
estabelecem profecias para si próprios, que devem ser
cumpridas na vida das crianças e as tornam pacientes
crônicas. Mais uma vez, não o fazem por mal, mas é o que
acaba acontecendo.
As terapias de dessensibilização que costumam ser
oferecidas pela medicina alopática raramente são eficazes;
além disso, podem constituir a razão para o pessimismo
sentido pelo paciente. Como já foi dito, elas poderiam
produzir um resultado melhor no nível psíquico, lidando
consciente e corajosamente com as áreas evitadas e
rejeitadas (como na dessensibilização psicoterapêutica e
psicocinética) e com a simbologia[25] escondida por trás
delas, que é o que interessa desde o início. Esse processo
deveria ser recuperado lentamente, passo a passo na
consciência, para nela ser assimilado. A psicoterapia no
sentido do trabalho de sombra é um recurso adequado.
Chega-se a um resgate, que vai muito além do tratamento,
quando a frase cristã “amai vossos inimigos” é realizada e
reconhecida, uma vez que o inimigo também se esconde no
próprio indivíduo; portanto, quando novamente e de maneira
consciente se deixam entrar os símbolos classificados como
hostis e quando se consegue aceitá-los em todo o seu
significado. Quando se abordam os temas espinhosos da
vida, quando se enfrenta a vida com a cara e a coragem,
confrontando-a em seus aspectos difíceis, as chances da
alergia desaparecem, e uma vida corajosa e “animadora” se
expande.
11.1.7 A simbologia dos alérgenos na infância ou uma interpretação dos
objetivos da guerra

Para a infância, vale, por fim, a mesma simbologia que para


os adultos, ainda que também haja outros pontos
importantes. De modo geral, os alérgenos são símbolos de
vitalidade ou sujeira, ambos inconscientemente classificados
como perigosos. Não raro, também são relacionados, de
maneira simbólica, a acontecimentos ou pessoas, contra os
quais existe uma forte aversão ou raiva. Podem ser
separados em dois grandes círculos diferentes, sendo que o
menor se encontra dentro do maior. O círculo maior abrange
temas como “sujeira”, “futilidade” e “aspecto feminino”,
enquanto o menor trata especialmente de temas relativos à
polaridade, que nas crianças pequenas também está ligado,
de diversos modos, a conteúdos eróticos e sexuais, se a
sexualidade e o erotismo forem inconscientemente sentidos
como “sujos” e “fúteis” (no ambiente da criança).
Muitas vezes, ambos os aspectos também se confundem
em um alérgeno. Nesse caso, as pessoas afetadas não
precisam, necessariamente, ter consciência da relação
simbólica. Basta que essa relação esteja ancorada no
inconsciente coletivo. Não há alergia sem consciência. Por
exemplo, geralmente os alérgicos a penicilina a toleram sem
nenhum problema quando estão sedados. Contudo, é
necessário que o conhecimento esteja ancorado no campo
consciente da pessoa afetada, ou seja, na família ou na
sociedade. Por exemplo, crianças pequenas nunca sabem, e
os adultos sabem apenas raras vezes, que a penicilina
consiste no fungo penicilo. Não obstante, fortes alergias à
penicilina ou ao penicilo podem ocorrer devido a temas
ocultos por trás delas.
11.1.7.1 Alérgenos do grande círculo (a simbologia da sujeira)
A poeira doméstica é o excremento dos ácaros que vivem
nessa poeira. Isso mostra quão “diligentes” são esses
pequenos seres em todo o mundo. Em geral, o pó representa
a sujeira e a impureza, mas também tudo que é banal,
habitual e, precisamente, a sujeira do dia a dia. Não raro,
trata-se aqui de um alérgeno em crianças que pretendem
alcançar uma posição mais elevada ou que se sentem
destinadas a uma posição mais elevada. Todavia, falta-lhes
coragem para tirar conclusões dessa convicção.
Na alergia a produtos para lavar roupas, é nítida a aversão
ao que é artificial, cultivado e químico e que bloqueia a
relação com o que é natural. Além disso, esses produtos são
o polo oposto ao que é sujo, manchado e impuro e, como
tais, também podem ser combatidos através da alergia, uma
vez que no imaginário da alma os polos opostos estão
sempre próximos.
Nas alergias a alimentos, pode exprimir-se, por um lado, a
aversão ao que é de matéria grosseira, necessária apenas ao
corpo, enquanto a alma dela prescinde. Por outro lado, por
meio dessas alergias pode-se combater o que é sujo,
contaminado e perigoso na alimentação. Com exceção da
doença celíaca, essas alergias passaram a existir somente
depois que a contaminação dos alimentos chegou à
consciência da sociedade.
Nos cereais, trata-se do que é pastoso, viscoso e doce, que
fica evidente quando se mastiga o pão por muito tempo,
mas também do mingau de cereais, do aspecto pegajoso da
massa, que se mostra sobretudo na doença celíaca, que é a
alergia ao glúten presente na maioria dos tipos de cereais.
No leite, combate-se o aspecto materno e feminino em
proteínas como a caseína, embora este seja um caso
diferente da intolerância ao leite, que afeta metade da
humanidade em razão da falta de lactase. Quando se evita a
proteína do leite como uma necessidade, também se evita
claramente um pedaço da vida, pois a proteína é o primeiro
nutriente básico da vida. Quem combate o glúten e a
lactose, que é o açúcar do leite, nega amplamente a vida a
si próprio. Na verdade, insiste em um grau de alimentação
que é o dos caçadores e coletores que não dispunham do
glúten nem da lactose, uma vez que a agricultura e a
pecuária só começaram com os sumérios, em cerca de
10.000 a.C. Portanto, trata-se aqui de um grave retrocesso à
postura “não quero ter nada a ver com essa nova vida; não
permito que nada dela entre em mim”.
Na intolerância ao leite, além da referência ao aspecto
materno, chama a atenção o fato de que, nesse meio-tempo,
evidentemente já há nas lojas prateleiras com produtos sem
lactose, o que, de modo geral, indica um sintoma de toda a
sociedade. Talvez nisso também se reflita um problema que
temos coletivamente com a mãe Terra.
Quando surge um conjunto de sintomas como esses,
sobretudo nessa forma dupla, a alma da criança exprime
algo como: “Não estou absolutamente de acordo com um
novo desenvolvimento e me recuso a aceitá-lo”. Se apenas a
intolerância à lactose ou ao glúten se manifestam, a queixa
deslocada para o corpo poderia ser a seguinte: “Não consigo
suportar partes do novo desenvolvimento. As tentativas de
integração quase me matam; não consigo digerir tudo isso.”
Uma paciente de 9 anos, que desde o nascimento sofre de
doença celíaca, ilustra essa situação à sua maneira infantil e,
ao mesmo tempo, mostra o quanto as crianças se tornam
um espelho dos pais. Desde o nascimento da menina, a mãe
rejeitou toda relação sexual com o pai. A criança nada sabia
a respeito, mas sentiu que o pai estava sofrendo. Entretanto,
ele se manteve em silêncio, e o assunto foi abafado. Aos 9
anos, diante do pai horrorizado, a menina expressou o
quanto o sexo pode ser repugnante e asqueroso. Ela pode
ter adotado, ou melhor, ingerido essa opinião com o leite
materno e tê-la interiorizado mais profundamente em sua
intolerância ao glúten do que podemos imaginar.
Independentemente de como herdou o tema, no futuro, a
criança tem por tarefa libertar em si mesma o polo feminino
e obter para o pântano pastoso e viscoso, do qual toda vida
se origina e que o glúten simboliza como aglutinador do
cereal, um lado positivo, que é pré-condição para uma
sexualidade madura. Portanto, ela tem de se reconciliar com
a própria corporeidade e desenvolver o prazer por seu corpo
e seu prazer.
Cada vez mais, os medicamentos também passaram a ser
considerados perigosos, contaminados e prejudiciais e,
desde então, são vistos como alérgenos. Tintas e solventes
também só passaram a desempenhar a função de alérgenos
depois de constatado que são perigosos e tóxicos. As
alergias a metais referem-se, exclusivamente, a metais não
nobres e, portanto, menos valiosos e a suas ligas; refletem
uma rejeição – naturalmente inconsciente – ao que não tem
valor, ao que não é nobre e, muitas vezes, ao medo de sujar
os dedos com ele.
11.1.7.2 Alérgenos do pequeno círculo (da simbologia da fertilidade e da
sensualidade)
Nesse caso, tudo que é “sujo” do ponto de vista erótico e
sensual é um inimigo potencial, como o pólen ou o pelo dos
animais. Todo pelo transmite algo que, para o animal, é
aconchegante, macio, quente e, portanto, sensual e erótico,
podendo, como tal, ser combatido. Nos cães (em seu pelo), o
(latido) agressivo e a mordida agressiva estão em primeiro
plano; nos cavalos (em seu pelo), é o aspecto instintivo. É
comum que as meninas tenham antes da puberdade a “fase
dos cavalos”, na qual praticam a “equitação” e a “nobreza”
para se familiarizarem com o aspecto instintivo.
Naturalmente, nessa prática, a amizade pelo cavalo e o
prazer com a liberdade também têm o seu papel. Nos gatos
(em seu pelo), a sensualidade já se reflete em uma
expressão como “gatinha”; a essa sensualidade se
acrescenta um impulso de agressividade através das garras
do predador felino, que não se contenta facilmente e para o
qual a liberdade é importante. O “falso gato” pode ser
dissimulado e passar despercebido, aproximar-se
sorrateiramente e, como um “assassino sexual”, logo depois
de torturar um rato até a morte, pula no colo do dono para
lhe fazer festa. O gato preto (nos ombros da bruxa) também
manifesta magia e bruxaria. Desse modo, os gatos
incorporam com especial evidência ambos os lados da
polaridade. A alergia a gatos também ocorre com frequência
em pessoas de Vênus ou naquelas que manifestam harmonia
e não conseguem deixar de sonhar com a salvação do
mundo.
O pólen das flores e as sementes das plantas herbáceas
são as sementes masculinas das plantas e indicam temas
como “fertilidade”, “amor”, “sexualidade” e “instintividade”.
De modo semelhante, o inconsciente reconhece os bagos
como símbolos da fertilidade, e algumas vezes a linguagem
popular se refere a eles como sendo os testículos. De nozes
são chamados os “testículos de Zeus”, esse deus
particularmente fértil. Na Alemanha, muitas nozes indicam
proverbialmente um ano fecundo. Um problema insolúvel ou,
em todo caso, muito difícil, também é designado como “uma
noz dura de quebrar”,[26] podendo suscitar uma reação
alérgica.
Os frutos são o resultado da união sexual do feminino com
o masculino e simbolizam o fruto proibido e tentador do
outro lado da cerca. As maçãs são o símbolo da tentação do
jardim do Éden. O morango é claramente contextualizado
por François Villon como um fruto vermelho, pleno, maduro e
sedutor: “Sou louco por sua boca de morango”. O pêssego
representa a pele atraente e as nádegas eróticas. As
“cerejas do jardim do vizinho” sempre pendem aos pares
com sua assinatura traiçoeira na árvore. A banana, por sua
forma, é manifestamente fálica. Amassada para ser
consumida com müsli ou mingau, tem uma consistência
pegajosa e pastosa que se aproxima bastante daquela da
mucosa. Muitas vezes, porém, as crianças apenas refletem a
rejeição que esses símbolos sofrem em cada ambiente.
Quanto às picadas de insetos, o elemento desencadeador
é a penetração do ferrão fálico, que inocula uma substância
(tóxica), podendo causar inchaço na pele da pessoa picada e
recordando picadas ou estocadas emocionais.
11.2 Dermatite atópica e crosta láctea
“Estou com comichão.” – “Não posso esperar.”
 
Na dermatite atópica, a erupção cutânea aparece em
primeiro plano na epiderme, muitas vezes já se anunciando
previamente através da crosta láctea, que pode cobrir toda a
cabeça como uma capa de proteção para o sétimo chakra, o
mais elevado dos centros de energia de matéria sutil. Em um
“caso” como esse, em que a crosta láctea é a primeira
manifestação visível e quase a precursora da dermatite
atópica, a mãe lactante deveria substituir temporariamente
o consumo de leite de vaca por aquele de soja, amêndoa,
arroz ou, se necessário, até mesmo pelo leite de égua.
As crianças acometidas deveriam aprender a se romper,
em sentido figurado, bem como a se colocar no centro de
modo mais livre para receber afeto. Isso é muito difícil para
os lactentes e as crianças pequenas, e, nesse ponto, os pais
poderiam se perguntar se não deveriam liberar seus filhos
dessa tarefa, pois, quanto menores, tanto mais as crianças
são seu espelho.
A pele das crianças realmente requer um rompimento e
uma abertura. Ela coça e mostra quão grande é a
necessidade de abrir as próprias fronteiras e deixar sair o
que se impele do mundo interior para o exterior. As pessoas
afetadas sentem comichão de arrancar e romper, abrindo
suas fronteiras com as próprias unhas, que são o que sobrou
das garras e, assim, aliviar a coceira – o que, no nível
microscópico do tecido, corresponde à alergia.
Outro aspecto da dermatite atópica poderia residir no fato
de que a criança não quer aceitar nenhuma barreira entre si
mesma e a mãe e, por conseguinte, se arranha para sentir a
falta de fronteira do início e voltar a ficar bem perto da mãe,
exatamente como na barriga. Esse sintoma levaria a um
afeto e a uma proximidade incrivelmente maiores por parte
da mãe.
Especialmente frequentes são as crianças preparadas ou
vacinadas para a vida toda com vacinas múltiplas. Essas
crianças se defendem do que é estranho, hostil e do que lhes
é imposto com agressividade.
Várias vezes, os pais e, sobretudo, as mães de crianças
marcadas desse modo sofrem uma dura derrota, e alguns,
justamente para compensar, chegam a odiar seus filhos que
se arranham e se desenvolvem em um nível inadequado e,
por fim, a odiar si mesmos. Em vez de desabrocharem sob os
cuidados dos pais, as crianças acabam por se desenvolver
de maneira traiçoeira e sinalizam externamente que algo
fundamental não está ocorrendo da forma correta. Chama a
atenção o fato de que especialmente os pais que, por meio
das vacinas, quiseram se poupar de todas as dificuldades
possíveis com os filhos, sejam vencidos por um quadro de
erupção cutânea. Justamente eles costumam reagir de modo
agressivo a essa problemática visível para todos e que deixa
tantas marcas em seus belos filhos.
Assim poderiam ser explicadas as torturas noturnas, nas
quais crianças pequenas – às vezes com aprovação “médica”
– são amarradas em suas camas ou enfiadas em tubos
plásticos para que não se cocem, pois a coceira deixa
marcas nelas e fere as pretensões paternas de ter um filho
exemplar, sem máculas. Nesse caso, é preciso se colocar no
lugar das crianças apenas uma vez: passar a noite amarrado
à cama enquanto a pele sofre uma coceira enlouquecedora.
É um milagre que essas crianças não enlouqueçam de fato.
Em todo caso, não deixam de sofrer graves danos. É claro
que, em uma situação como essa, com os bracinhos enfiados
em tubos e, muitas vezes ainda, os pulsos “presos” à cama,
elas ficam furiosas. Qualquer pessoa nessas condições
gritaria como louca. Normalmente, isso só acontece quando
os pais já estão com os nervos à flor da pele e quando
médicos acadêmicos, que não sabem o que fazer, excluem o
mundo da alma de sua consciência.
Uma variante mais branda seriam luvas de tecido macio,
que permitam que a criança se coce, mas não se arranhe.
Pois arranhões profundos também podem deixar cicatrizes
que, mais tarde, na puberdade, prejudicarão a autoestima e
levarão ao isolamento e ao sentimento de inferioridade.
Normalmente, é mais o desamparo que conduz os pais à
beira do desespero, pois ter de observar uma criança
sofrendo sem, de fato, conseguir fazer alguma coisa é mais
do que conseguem suportar.
 
Perguntas para os pais:

Em que situações nosso filho tem dificuldade
para impor limites e dizer “não”?

Do que ele se defende?

Que agressividade é reprimida em seu
ambiente?

Como ele pode se tornar mais corajoso e
combativo? Como nós mesmos podemos
conseguir isso?

Como utilizar as energias excedentes de maneira
mais construtiva?

Como nosso filho pode aprender a lidar com o
excesso de estímulos externos?

De que maneira podemos poupá-lo do excesso
de estímulos?

Será que uma mudança “estimulante” poderia
eventualmente ser útil para afrouxar as
fronteiras internas (em crianças maiores)?
 
Medidas de apoio:

A auto-hematoterapia potencializada (segundo
Imhäuser) passa por vários recipientes de vidro
em seu processo, tal como ocorre com a
potencialização homeopática, e tem como efeito
a regulação do sistema imunológico. Em caso de
imunidade baixa (por exemplo, suscetibilidade a
infecções), ela estimula o sistema imunológico;
caso a imunidade esteja alta (por exemplo,
alergias), ela a estabiliza.
Em um frasco marrom de dez mililitros, deve-se
misturar uma gota de sangue capilar ou venoso a
cem gotas de uma solução de água e álcool a 30%.
Em seguida, deve-se bater dez vezes a mistura em
um livro ou na outra mão. Misturar uma gota da C1
resultante a cem gotas da solução alcoólica e agitá-
la novamente. O resultado obtido será a C2. E assim
por diante.
Normalmente, os pacientes de alergia devem
receber três gotas de C5 uma vez por semana,
durante quatro semanas. Em seguida, quatro gotas
de C7 uma vez por semana, por mais quatro
semanas. Por fim, deve-se repetir o mesmo
procedimento com C9.
Esse processo pode ser aplicado tanto
profilaticamente, antes da estação do pólen, quanto
em casos agudos.

Limpeza do cólon: com frequência, no exame de
fezes de crianças alérgicas encontra-se um
desequilíbrio no intestino, que, se tratado com
preparados microbiológicos e auxiliado
individualmente por terapeutas especializados,
pode ter efeitos positivos na pele.

Quando aplicado à pele, o leite materno alivia a
coceira. Pingar o leite materno nas narinas é a
maneira mais branda de desobstruir o nariz em
crianças pequenas. Para tanto, a mãe lactante
deve colocar seu leite em um frasco com conta-
gotas (disponível em farmácias) e, caso
necessário, utilizá-lo para pingar o leite no nariz.

Pomada de calêndula da Weleda ou lanolina/óleo
de oliva (mistura 1:1) alivia e trata
externamente.

Pomada Halicar: para coceira intensa.

Urina: depois de ir ao banheiro, crianças maiores
podem aplicar a própria urina fresca nos pontos
afetados da pele. A urina tem efeito anti-
inflamatório e alivia a coceira. Entretanto, seu
cheiro só é relativamente suportável quando se
leva uma vida vegetariana.

Pomada Rescue do doutor Bach (uso externo):
pode aliviar a coceira sem reprimir os sintomas.

O chá de lapacho estabiliza o sistema
imunológico e alivia as inflamações na pele.
Durante duas semanas, beber uma xícara de chá
ao dia. Caso o efeito seja positivo, o tratamento
pode ser continuado. Para uso externo,
compressas embebidas em chá de lapacho ou de
violeta-do-campo e aplicadas no local aliviam a
coceira e o ardor.

Banhos com palha de aveia ou cavalinha podem
ser empregados em todo tipo de escoriação.
Coloque uma mão cheia da erva em dois litros
de água fervente e deixe a fervura repousar por
15 minutos. Em seguida, coe e dê o banho a uma
temperatura de 36°C a 37°C. A criança pode
banhar-se por até trinta minutos nessa água.

Eufrásia: as compressas de chá de eufrásia ou o
colírio dessa planta, da marca Wala, podem
aliviar os sintomas nos olhos, como coceira,
ardor e inflamações.

Tratamento homeopático: o tratamento
homeopático é feito individualmente, levando-se
em conta os sintomas gerais. A pele é designada
como “o espelho da alma”; por isso, é
importante tratar distúrbios internos ou um
desequilíbrio psíquico. Por conseguinte, as
erupções cutâneas se amenizam sem a
necessidade de aplicar medicamentos externos.
A terapia pode ser demorada e requer dos pais, dos
pacientes e dos terapeutas uma boa dose de
paciência e intercâmbio regular. Se possível, doenças
agudas que venham a surgir nesse período também
devem ser tratadas homeopaticamente, uma vez
que, nesse caso, as medidas repressoras da alopatia
favoreceriam as alergias.

Iniciar logo o tratamento: assim que surgirem
sintomas como a crosta láctea, o tratamento
deve ser iniciado.

Se possível, as erupções cutâneas não devem
ser reprimidas (com pomadas à base de zinco e
cortisona). Fitoterapias ricas em tanino, como
aquelas que utilizam casca de carvalho ou chá
preto, também podem ter um efeito repressor,
causando eventualmente uma “mudança de
estágio alérgico”, que pode, por exemplo, chegar
à asma.

Amamente pelo máximo de tempo possível (pelo
menos seis meses, mas é melhor que seja até
por mais tempo!), a fim de reforçar as defesas
da criança.

Evitar antibióticos, pois eles perturbam o
equilíbrio sensível do intestino e preparam o
terreno para as alergias.

Alimentação: alimentação pobre em proteína,
alimentos provenientes de cultivos biodinâmicos,
que correspondam às estações do ano e que
sejam integrais e adequados ao tipo
constitucional.

A criança precisa beber água pura, para que o
corpo possa eliminar possíveis toxinas também
através da urina e das fezes.

Rejeitar amálgamas dentários compostos de
ligas de mercúrio. Porém, quando for trocá-lo, ter
o máximo de cuidado e só realizar o
procedimento com um dentista de confiança.

Higiene: não usar de medidas exageradas de
higiene.

Tolerar a febre, uma vez que ela leva a uma
mobilização geral das defesas e, assim, abre
espaço para o tema “agressividade e luta”.
Depois de superada a febre, muitas vezes as
doenças alérgicas melhoram ou se atenuam.

Deixar que as doenças infantis se desenvolvam
do começo ao fim, pois, com elas, uma possível
predisposição congênita a alergias pode ser
diminuída ou até totalmente eliminada.

Se possível, não dar vacinas (ver também o
Capítulo 5 “Vacinas”).

Ambiente: proporcionar um ambiente social e
familiar estável. Educar as crianças para serem
adultos autoconscientes, prontos para enfrentar
os conflitos, independentes e capazes de se
relacionar com seu ambiente de maneira
corajosa e aberta.

“Praia e montanha”: transferir as férias para a
praia ou a montanha, uma vez que o ar nesses
lugares é pobre em poeira e em pólen, o que
permite uma regeneração efetiva e, por assim
dizer, umas férias dos sintomas.

Evitar testes epidérmicos para definir os fatores
que desencadeiam as alergias, pois geralmente
eles contêm substâncias à base de mercúrio,
como o Thiomersal, que, por sua vez, podem
desencadear alergias.
12 Problemas do aparelho locomotor

12.1 Postura e desenvolvimento


“Não consigo ficar reto.”
 
Junto com o arco plantar, talvez nossa coluna vertebral seja
o órgão especificamente mais característico do ser humano,
com sua forma única em duplo S, que nos permite andar
eretos e que toda criança tem de conquistar por si própria.
Essa etapa que nos levou a caminhar sobre as patas
traseiras é o momento em que começamos a nos posicionar
em relação à vida. Os golfinhos também têm um cérebro
como o nosso, e até mais diferenciado. No entanto, esse tipo
de coluna vertebral em duplo S só é encontrado em
humanos. Ela serve de intermediária entre nossa parte
terrena e física, em forma de pelve, e as possibilidades
angelicais e celestiais, que se oferecem acima da nossa
cabeça, que é nosso objeto principal. Ao nos colocarmos
sobre as patas traseiras também demos vida ao tema
“equilíbrio”. É importante equilibrar aquilo que é mais
importante no topo do eixo do mundo preservando a justa
medida, ou seja, sem “pender a cabeça para baixo” – o que
sinaliza desânimo e, a longo prazo, conduz à “obstinação” –
nem “incliná-la para trás”, causando a desagradável
impressão de “arrogância”. O caminho intermediário exige
que “não nos deixemos abater” como os animais, e sim que
permaneçamos seres humanos, contudo sem exagerarmos
nem nos tornarmos, no outro extremo, arrogantes e
presunçosos, confundindo-nos com Deus. A tarefa está em
encontrarmos nosso caminho num limbo entre os animais e
Deus, sem afundarmos na natureza nem sobressairmos na
cultura. Nesse sentido, é na infância que são lançados os
alicerces decisivos.
Além da mediação entre a porção superior e a inferior, a
posterior e a anterior, é importante considerar aquela entre
a esquerda e a direita, ou seja, entre as partes femininas e
as masculinas. As crianças não podem, de modo algum, ser
treinadas a usar a esquerda em vez da direita. Isso só lhes
traz insegurança e danos a longo prazo. No que diz respeito
à coluna vertebral, temos de aprender a encontrar nosso
centro e a conservá-lo.
Ao longo da coluna vertebral corre o desenvolvimento dos
centros de energia, constituídos de matéria sutil: do chakra
mais primário, o Muladhara, ao que está no topo, acima do
crânio. Em sete níveis, chakras ou degraus da escada de
Jacó, da cultura cristã, percorremos o eixo do nosso mundo
de baixo para cima e – na situação ideal – até a perfeição.
Com sua curvatura dupla, a coluna vertebral também
exprime a polaridade como na transição entre as vértebras
rígidas e os discos flexíveis entre elas.
Um órgão tão fortemente ligado ao nosso desenvolvimento
também pode esclarecer até que ponto esgotamos nossas
possibilidades. A postura das costas revela não apenas quão
eretos, mas também quão honestos nós somos e até onde
chegamos. Uma expressão como “não dar as costas para a
verdade” nos mostra claramente como as costas estão
relacionadas à nossa verdade. Justamente, “falar dos outros
pelas costas” não é nada honesto nem correto, tal como
“apunhalar alguém pelas costas”.
Pela coluna também se pode interpretar “quantos anos
temos nas costas” e quão grande é o peso que carregamos
ao longo da vida. A coluna e sua posição podem dar uma
ideia de como estão e vão as coisas em nossa vida.
Obviamente, por meio da coluna vertebral também se
mostra o peso da nossa existência, embora seja no sentido
físico que ela carrega a maior parte dele. Portanto, quando
nos deixamos reprimir ou reprimimos os outros, isso também
pode ser notado nas costas. No primeiro caso, “carregamos
o mundo nas costas”; no último, apunhalamos quem
reprimimos pelas costas. Seria mais correto “tirar o peso das
costas de alguém e encorajá-lo” dando-lhe apoio.
Talvez as crianças com problemas no eixo de seu mundo
estejam suportando e carregando um excesso de
responsabilidade muito precocemente. A solução para isso
seria assumir naturalmente a responsabilidade de maneira
adequada, no sentido de “ter responsabilidade”.
 
Perguntas para os pais:

Ver a seção “12.4 Doença de Scheuermann”.

12.2 Cifose e lordose


“Sou desonesto.”
 
Quando uma criança passa a vida curvada, essa postura
incorreta logo se faz notar. Os pais não conseguem suportar
essa imagem, que muitas vezes está relacionada à sua
educação, à sua situação doméstica e a uma autoestima
baixa, e, como compensação, encorajam a criança a
esforçar-se. Esse esforço encobriria a verdadeira
representação de uma cifose ou até da corcunda por meio de
uma postura aparentemente ereta e, portanto, não
verdadeira.
A coluna curva exprime falta de sinceridade e fraqueza,
além de mostrar o quanto a criança “trabalha duro” e é
compelida a talvez também se submeter a pressões
externas. No entanto, para os adultos, essa espécie de
honestidade física direta vai longe demais e constantemente
lhes reflete uma imagem difícil de suportar. Nesse sentido, o
excesso de advertências revela a tentativa de fazer com que
as crianças treinem uma postura externamente mais
simpática, ainda que não sincera, como a lordose.
Na cifose, a musculatura das costas é excessivamente
distendida para proteger a parte anterior lesionada. Ao
mesmo tempo, o ventre e o tórax são ocultados. Nesse
sentido, essa postura também é o contrário daquela de
“vangloriar-se” e revela pouca autoconfiança.
Simultaneamente, o corpo adquire uma expressão submissa,
indicando uma submissão não vivida na consciência. Com
frequência, uma criança curvada ou prejudicada em sua
autoconsciência tenderá a curvar-se perante seus
superiores, mas, ao mesmo tempo, pisar em seus
subordinados, assumindo uma postura que, no mundo dos
adultos, é vista como típica de quem se comporta como
“capacho” ou até mesmo como “puxa-saco”.
“Com o rabinho entre as pernas”, essas crianças abaixam
a cabeça e curvam as costas para se protegerem de outros
danos; desse modo, em vez de percorrerem seu caminho de
cabeça erguida, passam a vida se sujeitando.
Nessa postura “submissa” se reflete certa instabilidade,
além da falta de sinceridade e de uma força autoconsciente.
A criança aprendeu a se curvar para não desagradar em
lugar nenhum. Ela parece curvada e, muitas vezes, também
humilhada. Toda a sua aparência é marcada pela falta de
apoio – seja na família, seja no ambiente social.
A tarefa de aprendizado consiste em desenvolver a
verdadeira humildade, curvar-se de maneira adequada,
quando um poder superior o torna necessário ou também
quando o indivíduo se submete conscientemente em
ocasiões de importância central. A tarefa dos pais é criar
para o filho um campo em que ele possa crescer
conscientemente na direção que lhe cabe como indivíduo e
em que ele não apenas aprenda a verdadeira humildade,
mas também encontra dentro de si a motivação para se
esforçar por seus interesses e desejos mais íntimos.
Sobretudo quando as crianças já estão muito grandes, não
raro tentam recuperar a “altura normal” arqueando a coluna,
para, assim, não se sobressaírem. Elas se assumem (muito)
pouco, o que, naturalmente, também é como enganar, nesse
caso, a própria pessoa. Quando a criança não assume a
própria força, ela revela problemas com sua posição e sua
postura interna – certamente com uma razão que justifica
por que esses problemas de postura são tão frequentes na
puberdade.
Somente quando a tarefa expressa no sintoma é colocada
em prática é que se trata de mudar para o polo oposto, inflar
o peito e abrir o campo do coração e da comunicação ligado
aos pulmões, para finalmente aprender a andar com a
postura ereta e tornar-se reto e honesto.
A interpretação e, sobretudo, o tratamento da lordose
como compensação da cifose deveria incluir toda a história
de como esta surgiu, ou seja, por exemplo, a “criança
oprimida” que há por trás dela. A concavidade na lordose
evidencia a postura de compensação, que é demonstrada,
mas nem um pouco agradável. Mais do que uma retidão
aparente, que quer agradar a todos, nada pode provir dela.
Para os pais ou responsáveis, a lordose pode ser mais
suportável do que a cifose; para a criança, é apenas outro
degrau na direção errada.
A tarefa consistiria em se endireitar de dentro para fora, a
fim de cumprir as exigências feitas pela própria vida.
Responder por si mesmo e pelas próprias ideias seria o
desafio compensador, em vez de sempre aceitar uma
posição como um soldado treinado. Vale para este o mesmo
que para as crianças treinadas. Quem tem uma postura
interna (em relação à vida), não precisa aceitar outra
(externa). No entanto, é claro que uma correção externa da
postura pode influenciar a postura interna, como
demonstram a eurritmia curativa dos antroposofistas, o
trabalho de Feldenkrais, mas também o yoga, o tai chi e o qi
gong.
Em geral, durante sua formação básica, os soldados são
controlados como marionetes. Praticamente não podem
desenvolver a própria opinião; em todo caso, seu
posicionamento não pode ter nenhum efeito sobre a rígida
obediência que governa seu estatuto de soldado. Os
soldados aprendem, essencialmente, a obedecer, em vez de
discutir ou até contradizer. Em um treinamento como esse,
que custa a própria postura e o próprio posicionamento, eles
precisam assumir a postura ordenada. Os soldados de
guerrilha não precisam disso, pois têm uma postura interna.
Por essa razão, em última instância, os exércitos de soldados
regulares nunca conseguem vencer os soldados de guerrilha.
Em primeiro lugar, é necessário redescobrir a criança
oprimida sob a impressionante pseudorretidão da lordose;
talvez também uma criança que, de tanta preocupação,
“enverga os ombros” – em todo caso, uma criança que
primeiro precisa aprender de novo a se endireitar, a ficar
ereta (na forma do eixo do seu mundo) e a “se aprumar”.
 
Perguntas para os pais e medidas de apoio:

Ver a seção “12.4 Doença de Scheuermann”.

12.3 Escoliose
“Estou em uma posição crítica.”
 
Com essa deformação da coluna vertebral, o eixo do mundo,
cuja tarefa seria, por um lado, dar-nos apoio e dinâmica e,
por outro, representar nossa retidão, não consegue
desempenhar sua função. Em vez disso, ele expõe
abertamente como a criança se encontra em uma posição
complicada na vida e como ela se desvia da linha reta do
desenvolvimento. Essa posição desviante faz com que o
desenvolvimento se dê no caminho errado e a criança
afetada “perca o rumo”. (O adjetivo grego skoliós significa
“torto, desviado”.)
Em um âmbito central de sua vida, ela acaba se desviando
justamente do centro. Trata-se de um desvio rumo ao polo
feminino (esquerdo) ou masculino (direito). Por sua vez,
nesse desvio pode ocorrer um recuo em relação ao polo da
realidade, como um decrescimento de um lado ou uma
extrema atração para o outro.
Em uma terapia para tratar um caso grave de escoliose em
uma menina, concluiu-se que, ao sentar-se à mesa entre a
mãe e o pai, ela se sentia terrivelmente rejeitada por ele,
mas não podia demonstrá-lo em família. Durante anos, ela
cresceu tentando afastar-se dele e aproximar-se da mãe, e
sua coluna vertebral reproduziu esse drama. Em vez de
crescer fisicamente na direção da mãe, obviamente seria
mais saudável mostrar sua entrega com outros meios, como
o afeto, mas também expressar a rejeição em relação ao pai.
Às vezes, um leve desvio na postura também tem a ver
com a puberdade, ou melhor, com o desenvolvimento, na
medida em que se trata de testar inteiramente ambos os
polos, debruçando-se ora para um lado, ora para o outro,
não ser uma coisa nem outra, nem criança nem adulto e,
sobretudo, nem mulher nem homem. Isso pode evoluir até
consolidar-se em problemas de orientação sexual.
Ao que parece, é muito mais fácil para alguns
ziguezaguear pela vida, evitando obstáculos, para escapar
de uma retidão cansativa em vez de reconhecer e expressar,
tanto positiva quanto negativamente, seus próprios
sentimentos.
Nos casos extremos, os percursos sinuosos da psique
tornam-se não apenas evidentes, mas também relevantes
para a medicina, pois um desvio para a esquerda prejudica o
coração, limitando seu espaço vital, enquanto um desvio
para a direita comprime o respectivo lado do pulmão.
Graças à coluna vertebral, todos nós podemos girar e nos
voltar como bem entendermos, e isso, naturalmente,
também em sentido figurado. Essas ações só se tornam um
problema quando, ao mesmo tempo, a honestidade e a
retidão psíquica ficam pelo caminho, sobretudo em relação
às expectativas da alma dessas crianças. Como a escoliose
ocorre com muito mais frequência entre as meninas, elas
acabam sendo desviadas da linha reta do desenvolvimento.
Em contrapartida, geralmente o “vira-casaca” não parece
ter problemas visíveis, uma vez que se trata de um
oportunista consciente, que sabe muito bem que penderá
para o lado que lhe trouxer mais vantagens. Deformações de
caráter só se tornam visíveis nas costas quando são
inconscientes para a criança.
A tarefa psíquica consistiria em adaptar-se de maneira
flexível às necessidades da vida. Quando as crianças
aprendem logo cedo a se sentir conscientemente à vontade
tanto nos caminhos retos quanto naqueles sinuosos e a
manter seu equilíbrio interior, não há por que se preocupar
com seu eixo vital. No entanto, quando a vida perde o
equilíbrio, também é bom que isso possa ser visto e
corrigido.
Quando o desvio do próprio centro já ocorreu, trata-se de
posicionar-se conscientemente no lado preferido e liberar
esse polo. Mesmo as tendências familiares (transmitidas pelo
patrimônio genético) a realizar “desvios sinuosos” podem ser
identificadas conscientemente. Nesse caso, é sempre melhor
fazer desvios (físicos) conscientes e serpear pela vida como
uma espécie de “homem-cobra” ou um espeleólogo do que
fazer com que a coluna vertebral sofra as consequências
desse tema. Mesmo quem aprende a evitar os obstáculos
com atenção e consciência e mantém em vista o caminho
rumo ao centro ameaça menos sua coluna.
Nos desvios para a esquerda, trata-se, sobretudo, de
dedicar-se com mais intensidade ou abertura às próprias
questões do coração e da anima, que constituem a porção
feminina da alma. Por outro lado, desvios para a direita
requerem que o indivíduo se preocupe mais com o lado
arquetipicamente masculino e com o animus, a porção
masculina da alma que inclui temas como a “capacidade de
impor-se”, a “coragem”, a “facilidade para tomar decisões”,
etc.
Terapeutas infantis que seguem o antroposofismo chegam
a partir do pressuposto de que, pela situação dos maxilares
superior e inferior, é possível interpretar claramente a
relação entre a “pessoa superior” e a “inferior”, o que, por
sua vez, pode indicar um distúrbio no equilíbrio, na
mediação entre a parte superior e a inferior, entre a anterior
e a posterior e entre a esquerda e a direita. Tudo isso é
realizado, sobretudo, pela coluna vertebral, nosso “órgão
rítmico”.
Nesse contexto, parece interessante observar que hoje
muitas crianças usam aparelho dentário e que, em muitas
delas, os dentes voltam para a posição inicial quando a
“postura interna” não acompanha seu crescimento. Nesse
sentido, a coluna vertebral realmente é uma espécie de
régua de nível que nos permite ler se o desenvolvimento da
criança está em ordem.
 
Perguntas para os pais e medidas de apoio:

Ver a seção “12.4 Doença de Scheuermann”.

12.4 Doença de Scheuermann


“Eu me arredondo o máximo que posso para vocês!”
 
Assim como a escoliose costuma ocorrer nas meninas, essa
doença, que recebeu o nome do radiologista dinamarquês
Holger Werfel Scheuermann, ocorre mais nos meninos. Na
doença de Scheuermann, o tecido dos discos intervertebrais
invade as placas terminais da coluna vertebral, deformando-
as e provocando uma cifose rígida em toda a linha, com o
resultado de uma postura curvada, sem flexibilidade. Os
meninos acometidos por essa doença ficam enrijecidos em
uma posição de humilhação. Sua cabeça pendente aponta
na direção da obstinação, e a posição curvada denuncia
déficits de honestidade. Por conseguinte, para o médico
antroposófico Georg Soldner, essa doença sempre se baseia
em uma disposição depressiva ou situação de sofrimento, no
sentido de um “sofrimento silencioso”. O aspecto ereto da
coluna vertebral é reduzido e garante menos firmeza e
menos dinâmica devido à rigidez óssea. Em geral, os
sintomas se desenvolvem na puberdade, quando as pulsões
já se fazem sentir internamente, mas externamente ainda
não há válvulas de escape à disposição.
Do ponto de vista da interpretação, trata-se de um
envelhecimento precoce, no sentido de um enrijecimento e
um endurecimento com a respectiva perda de flexibilidade e
dinâmica, que a coluna vertebral deveria garantir (sobretudo
na puberdade). Assim, o aspecto arquetipicamente feminino
no próprio eixo do mundo e, com ele, também na vida é
reprimido de maneira precoce.
Um paciente jovem sofre intensamente com sua mãe
dominadora, cujo comportamento já afugentara seu pai.
Com a doença de Scheuermann ele tentou, literalmente,
afastar, ao menos do centro da sua vida, o odioso aspecto
feminino, ao qual se sentia entregue, sem poder se
defender, na forma da sua mãe.
A tarefa seria conduzir a interpenetração dos elementos
femininos e masculinos no plano figurado, e não naquele
concreto, permitir conscientemente que a energia feminina
avance nos campos masculinos e os fecunde. Em vez de
rigidez, deve-se cultivar a firmeza, em vez da dureza, a
estrutura, e em vez da postura externa de humilhação, deve-
se apostar conscientemente na humildade psíquica em
relação à vida.
 
Perguntas para os pais:

Em que situações estamos sendo pouco sinceros
ou desonestos conosco e, portanto, também com
nosso filho?

Quando nos falta a flexibilidade necessária?
Quando fazemos do nosso filho nosso espelho?

Como nossa autoafirmação pode ser reforçada?

Sou/somos humilde(s) em relação ao mundo
exterior?

Conseguimos nos posicionar corretamente em
relação a nossos interesses e desejos?

Em que situações se oculta o sofrimento
silencioso?

Em que situações nosso filho não está em seu
centro, em seu eixo, em equilíbrio, e o que ele
reflete com isso para nossa família? De que
maneira nosso filho pode aproximar-se de seu
centro?
 
Medidas de apoio:

Atividade física e esporte (“ginástica infantil”)
são a principal profilaxia para todas as formas de
problemas posturais.

Reeducação postural da coluna, com introdução
teórica e prática.

Redução do sobrepeso.

Prestar atenção na ergonomia do “local de
trabalho” na escola e em casa.

Terapias: levar em consideração a osteopatia
e/ou terapia craniossacral.

12.5 A síndrome KISS


“Onde estou com a cabeça?”
 
O acrônimo “KISS”[27] representa o distúrbio de simetria
induzido na articulação da cabeça, uma doença que acomete
recém-nascidos e nada tem a ver com o torcicolo (Torticollis
spasticus),[28] embora também deixe o pescoço torto,
acarretando, por fim, um desequilíbrio na vida. As duas
vértebras superiores, atlas e áxis, estão mal assentadas e,
como consequência, provocam uma utilização assimétrica
dos braços e das pernas. Sobretudo a cabeça não se assenta
corretamente sobre os ombros e tem de ser colocada no
lugar; do contrário, fica sem uma orientação segura e sem
base. Assim como Atlas, o titã que tem de carregar a
abóbada celeste nos ombros, a vértebra de mesmo nome
tem de cumprir a mesma missão – de preferência, sem
hesitação e sem dor –, contando com áxis, a segunda
vértebra cervical, como eixo e orientação. Ao redor desse
eixo, atlas e a cabeça deveriam girar sem nenhum problema,
com flexibilidade e, sobretudo, sem dor.
É provável que a síndrome KISS seja desencadeada por
partos difíceis, como aqueles por extração a vácuo (ventosa
obstétrica), fórceps e de gêmeos, cesariana de emergência,
posição podálica, prolongamento anômalo da gravidez com o
respectivo estreitamento no útero e outras complicações
raras.
Na maior parte do tempo, as crianças acometidas
mostram-se inquietas e dormem mal. Como também sentem
dor para engolir, não conseguem mamar direito e, muitas
vezes, só o conseguem em um peito, pois no outro sua
coluna cervical lhes causa muita dor. Quando são deitadas
do lado “errado”, gritam, o que já poderia ser um primeiro
indício para o diagnóstico, tal como a observação de que a
criança só dorme de um lado. Deitá-la com cuidado alivia a
dor momentaneamente. Por outro lado, adotar desde o
princípio determinada postura para aliviar a dor, quando
esta não é tratada, mas tolerada e apenas aliviada em seus
efeitos, pode torná-la uma cautela a ser seguida na vida
futura, o que seria duplamente fatal. Tal pessoa não
conseguirá se afirmar nem impor sua vontade, ou só
conseguirá fazer isso por intermédio dos sintomas – no
sentido de um ganho secundário, agravando seriamente
todos os problemas.
Por fim, crianças com a síndrome KISS vêm ao mundo de
maneira unilateral, e, por certo, é importante saber de que
lado elas apresentam deficiência, se no direito,
arquetipicamente masculino, ou no esquerdo, feminino. A
postura adotada para aliviar a dor pode revelar qual dos
lados foi afetado, pois, obviamente, essas crianças procuram
manter a cabeça do lado que não dói ou que dói menos.
Outro indício da síndrome KISS seria o grito abrupto
quando recebem carinho ou se movimentam. Se a cabeça
não estiver no eixo, com frequência essas crianças também
terão dificuldades de equilíbrio. Porém, quando não
encontram um equilíbrio real, tampouco podem esperar
harmonia na vida.
Nos primeiros meses de vida, as crianças aprendem a
manter a cabeça estável em posição central. Na síndrome
KISS, só conseguem fazer isso sentindo dor, ou seja, a
cabeça só se torna autônoma quando elas sente dor; para
essas crianças, a autoafirmação é um exercício doloroso,
difícil e, não raro, fracassa quando o problema não é
resolvido.
Muitas vezes, as crianças são trazidas ao mundo cedo
demais ou, em todo caso, contra sua vontade. Talvez elas
nem desejassem essa forma de auxílio que vem de fora e,
mais tarde, nascessem espontaneamente e mais maduras.
Quando são trazidas antes ao mundo, ainda estão imaturas,
incompletas e têm muitas dificuldades para sustentar a
própria cabeça. Talvez ainda nem queiram levantar a cabeça
tão cedo.
Portanto, como geralmente são trazidas à força e com
dores, sua vida também segue de maneira dolorosa – tudo
reside no início. As dores as animam a sempre gritar por
socorro. Ao gritar, uma criança com dor quer claramente
pedir socorro, e não atormentar seu ambiente. O primeiro
gesto de ajuda que ela recebe assim que nasce e entra na
vida deve ser seguido pelo segundo. Essas crianças precisam
de ajuda – para viver e sobreviver. Pois, com a comida e o
sono, duas necessidades básicas e decisivas são ameaçadas.
Do mesmo modo como no início elas foram puxadas pela
cabeça, agora a cabeça deslocada tem de ser “colocada no
lugar” o mais rápido possível.
A medicina acadêmica pouco sabe sobre as causas desse
problema crescente nos tempos modernos e, em parte,
simplesmente continua a ignorá-lo. Isso pode estar
relacionado ao fato de que ela própria os causou.
Pois, provavelmente, as causas residem nas intervenções
médicas, que também são crescentes. Com isso, o número
cada vez maior de cesarianas é menos discutido do que
outras manipulações, como o fórceps e o vácuo. Na
cesariana, geralmente a cabeça da criança é até poupada.
Porém, talvez justamente pelo fato de a cabeça não poder
irromper, como no parto normal, ou seja, de não haver a
necessária luta pela vida, é que, também na cesariana, a
cabeça e o pescoço não encontram a relação correta entre
si. Em todo caso, do ponto de vista terapêutico, é preciso
que se preste novamente ajuda para “reparar” o problema, o
que, literalmente, significa “(voltar a) endireitar a cabeça”.
Como já foi dito, a cabeça da criança precisa ser realinhada
e, por fim, colocada no lugar certo. Assim, apenas
manualmente a coisa mais importante é colocada na posição
certa.
Quando uma criança luta pela vida com essa posição
(inicial) desfavorável, ela pode facilmente passar a adotar
uma posição instável ou mesmo seguir pelo caminho errado
(na vida). Mais tarde, no decorrer da vida do filho, aos pais
também cabe observar se ele está seguindo pelo caminho
correto. Se o navio da vida ameaçar pender para um lado,
ele deve ser reajustado. Nesse caso, sobretudo a osteopatia
ou a terapia craniossacral são intervenções manuais que
corrigem o problema de maneira branda. Posteriormente,
com a compreensão crescente da criança, esses reajustes
em sentido figurado precisam ser realizados.
Na síndrome KISS, o método geralmente útil de esperar
que as coisas se resolvam sozinhas, segundo o lema “com o
crescimento a postura se endireita”, não se mostra muito
eficaz. Um início tão difícil e doloroso – pois tudo reside no
início – é uma carga pesada demais, e o sofrimento
resultante não deveria ser absolutamente tolerado nem
prolongado. Quando necessidades fundamentais da criança,
como comer, dormir e receber carinho só são possíveis por
meio da dor, a vida se torna um fardo tormentoso, que curva
quem o carrega e causa muito sofrimento.
Se já desde o início a criança chora pela vida e grita de
dor, ela precisa receber ajuda o mais rápido possível. O
endireitamento da cabeça por meio da osteopatia e da
terapia craniossacral é brando e, nesse caso, até mais
eficiente do que a homeopatia clássica, que nesse caso só
seria útil como medida de apoio, para favorecer
oportunamente todo o desenvolvimento desde o início.
A síndrome KISS pode ser um indício precoce de que
futuramente também venham a ser necessários auxílios, no
sentido figurado, para que a criança encontre o próprio
centro. Mais tarde, pode se tornar importante estimular a
coragem para um desenvolvimento unilateral e extremo,
mas, de vez em quando, também corrigir as tendências
adquiridas de desequilíbrio. Quando a cabeça é endireitada e
colocada em uma posição de equilíbrio, o centro também
pode ser mantido com mais facilidade, de modo que tudo
volta a entrar nos eixos.
 
Perguntas para os pais:

Em que situações assumimos uma posição
instável?

O que (ainda) não está em perfeita harmonia?

Somos flexíveis e ágeis?

Como reagimos aos temas “imposição” e
“afirmação”?

Como podemos produzir um equilíbrio entre o
polo masculino e o feminino?
 
Medidas de apoio:

Especialistas para estabilizar a posição da
cabeça, uma espécie de osteopatia infantil
precoce, podem realizar verdadeiros milagres
nesse caso. Muitas vezes, o problema já é
resolvido após um único tratamento; em geral,
quase sempre após o segundo.

12.6 Dores do crescimento


“Crescer dói!”
 
Crescer dói, também em sentido figurado. Isso é sabido de
todos que são obrigados a crescer, “entrando” em uma nova
fase da vida, ou “esticar-se” para alcançar um objetivo
elevado. Tornar-se adulto pode doer, quanto a isso não
restam dúvidas, e o foco dessa dor é a coluna vertebral,
nosso eixo de mundo, e os longos ossos tubulares.
Inicialmente, o crescimento é físico e ocorre apenas à
noite, quando é produzido o HGH (Human Growth
Hormone/Hormônio do Crescimento Humano) ou, antes
ainda, o STH (Somatotropes Hormon/Hormônio
Somatotrópico). A produção de hormônios é o fundamento
do crescimento e deve ser auxiliada para que os processos
físicos e psíquicos recebam uma base saudável de
crescimento. Para tanto, é importante que o quarto da
criança esteja escuro à noite e livre de radiação
eletromagnética. Portanto, feche as cortinas, desligue todos
os aparelhos eletrônicos ou, melhor ainda, tire-os da tomada
e instale um disjuntor de rede; depois, desligue tudo!
O ideal é que os processos psíquicos de crescimento
mantenham o mesmo ritmo do desenvolvimento físico.
Porém, isso também significa que a criança precisa superar
as etapas de sua vida em uma sequência bastante rápida e
deixar o nível atingido assim que o alcançar. Por fim, precisa
até mesmo deixar toda a infância para trás e abrir mão do
aspecto infantil, de preferência sem prejudicar a criança
interior. No nível físico, vemos esse desenvolvimento quando
o esquema de aspectos infantis do rosto desaparece, ou
melhor, “cresce de maneira adequada”. O termo
“desaparecer” tem dois lados. Pode ser bom ou ruim. Muito
antes de o último caso ocorrer fisicamente, delineiam-se na
alma os problemas correspondentes, que também se tornam
perceptíveis, por exemplo, por meio das dores.
Expressões como “dar uma espichada” já chamam a
atenção para a problemática. Quando a criança cresce muito
rápido ou rápido demais e seu interior não acompanha seu
crescimento, ela pode sentir dores. Em todo caso, quando o
desenvolvimento psíquico fica para trás, as dores são
sentidas.
O chefe de uma tribo indígena foi buscado às pressas em
sua reserva por um motorista que deveria levá-lo a um
congresso. Entretanto, o chefe deixou o motorista
desesperado, pois fazia com que parasse toda hora no
caminho, embora o tempo estivesse correndo. Ele se
sentava no chão e não fazia nada. O motorista perguntou
irritado: “Mas o que o senhor está fazendo? Não temos
tempo a perder”. O chefe respondeu estoicamente: “Estou
esperando minha alma chegar”. Essa anedota ilustra como
nós, modernos, fazemos tudo com pressa e sem a devida
atenção, geralmente sem perceber quando nossa alma fica
para trás. Depois, surpreendemo-nos quando lemos no
relatório da Comissão da União Europeia que pelo menos um
quarto da população precisa de tratamento psiquiátrico. Do
ponto de vista psicoterapêutico, seriam quase 100%.
Nem todos os pais modernos podem ser chamados de
adultos em sentido psicológico, e muitos são extremamente
rápidos e, portanto, também ambiciosos em relação à sua
prole. Assumem a pressão da sociedade e se curvam a ela,
pressionando, por sua vez, seus filhos quando eles não
crescem até chegarem aonde todos hoje querem chegar: ao
topo. Essa pressão pode se manifestar como dores ao longo
da coluna vertebral, que, desse modo, evidencia quão pouco
seu portador está crescendo no ritmo certo e do ponto de
vista orgânico. Sua alma não consegue acompanhar seu
desenvolvimento. Isso significa que ela fica pelo caminho. Na
vida moderna, a alma está sempre pelo caminho. As crianças
vivenciam esse atraso com dores físicas e, quando têm
confiança suficiente, também manifestam essa dor.
Como já foi dito, as dores se localizam principalmente na
coluna vertebral e nos longos ossos tubulares, sobretudo nos
das pernas, em cujas placas do crescimento se realiza o
tema “crescimento longitudinal”. Mesmo quando a criança
ultrapassa em pouco tempo os limites, o que sempre
acontece em sentido figurado, e o restante não acompanha
com tanta rapidez, podem surgir dores sobretudo nas costas
e nas pernas. Essas dores costumam ocorrer durante a noite,
quando o hormônio do crescimento é liberado. Além de
atrapalharem o sono das crianças afetadas, talvez as dores
impeçam, ao mesmo tempo, outro crescimento, para o qual
as crianças ainda não estão preparadas do ponto de vista
psíquico.
No entanto, obviamente que auxiliar os filhos em seu
crescimento é uma das tarefas decisivas de toda educação.
Tal como na história do chefe da tribo indígena, nessas fases
dolorosas, eles precisariam de tempo suficiente para fazer
uma pausa e abrir sua alma para o corpo. Nesse momento,
seria primordial prover “a alma de alimento” e,
naturalmente, adequar-se à respectiva fase de
desenvolvimento, desde os contos de fadas até os dramas
da puberdade.
Por conseguinte, nesse período, a maioria das crianças
também aprecia histórias fantásticas e romances futuristas.
A altura é extremamente importante – hoje mais do que
nunca. É o que mostra o fato de que, até hoje, em eleições
presidenciais nos Estados Unidos, geralmente venceu o
candidato mais alto. Sobre o significado desta e de outras
simbologias corporais, o livro Der Körper als Spiegel der
Seele [O Corpo como Espelho da Alma] também fornece
informações.
Portanto, temos de nos esforçar para permitir que nossos
filhos cresçam possivelmente de forma harmoniosa, ou seja,
sem dores, a fim de que consigam alcançar sua altura ideal.
Por outro lado, obviamente também podemos nos questionar
se ainda é normal ver crianças que ultrapassam a altura dos
pais, como tem ocorrido nas duas últimas gerações.
Enquanto suportarem bem a situação, não há problema, mas
quando crescem rapidamente, tornando-se altas e magras
como varas, além de desajeitadas, inseguras e dotadas de
pouca estabilidade, sendo ridicularizadas como
“desengonçadas”, o desenvolvimento deve ser vivenciado
com cautela. Primeiro elas têm de “ganhar carne” ao longo
de toda a altura – tanto no nível físico quanto naquele
psíquico. Para tanto, precisam de tempo, que tem de ser-lhes
concedido. Nessas fases, é necessário garantir-lhes uma
espécie de defeso, ainda que isso seja difícil, uma vez que se
trata de uma fase de grandes desafios, por exemplo, na
escola.
Soldner e Stellmann formulam uma suspeita desagradável:
“... por outro lado, uma ‘alimentação excessiva’ do
metabolismo em forma de alimentos prontos, ricos em
calorias e industrializados, como batatas chips, doces e
outros semelhantes, atuam como adubo artificial no
crescimento da criança.” Analogamente, o regime de
engorda com proteína, que se tornou comum e que, por
certo, estimula bastante o crescimento, também é
problemático. Obviamente, o outro extremo, ou seja, a baixa
estatura devido à alimentação insuficiente no que se refere à
proteína é ainda pior. Na Coreia do Norte isso teria se
tornado dramático em razão da inefável incompetência do
regime comunista, que se apoia em um exército de anões.
A cada momento, a tarefa em caso de dores do
crescimento consiste em não poupar esforços para
acompanhar, em todos os níveis, o ritmo do
desenvolvimento que está para ocorrer. Para as crianças
afetadas, trata-se de aprender a aceitar a própria estatura, o
que naturalmente pressupõe a aceitação de si mesmas. A
altura natural é bonita, cai bem, proporciona uma visão
panorâmica – é um presente da natureza e dos pais que
deve ser aceito. Porém, ainda mais importante do que a
estatura física seria a estatura da alma, como diz a
expressão em sânscrito maha-atman (como em Mahatma
Gandhi), que, traduzida, significa tanto “com grande alma”
quanto “de grande fôlego”.
 
Perguntas para os pais:

Será que nosso filho prefere continuar criança?

Por que crescer dói?

Estamos prontos para mudanças?

Podemos soltar nosso filho?

Damos tempo suficiente a ele para seu
crescimento psíquico e físico?
 
Medidas de apoio:

Sal de Schüβler: Calcium phosphoricum D6. Em
casos agudos, dissolver dez comprimidos em
água quente e, se possível, beber quente.

12.7 Sinovite do quadril


“Não ouso dar os primeiros passos!”
 
As articulações do quadril, que, de maneira geral, são nossos
maiores órgãos articulatórios, atuam como mediadoras tanto
dos primeiros passos quanto, mais tarde, de todos os nossos
passos largos e, portanto, do progresso no nível físico, que
reflete nosso avanço interno.
Na maioria das vezes, a inflamação de um dos lados do
quadril ocorre como consequência de uma infecção das vias
respiratórias superiores ou do intestino. O resfriado indica
que a criança está com o nariz constipado e, por isso, já
perdeu a paciência. As amigdalites denunciam que ela está
com dificuldade para engolir e que sente dores sempre que
precisa engolir alguma coisa. Inflamações no trato intestinal
revelam que, em um passado recente, ela teve dificuldade
para digerir ou simplesmente não conseguiu digerir alguma
coisa, o que acarretou um estado de guerra em seu ventre.
Por fim, no âmbito das articulações do quadril, fica claro do
que se trata. Em um pico de frequência entre os 3 e os 10
anos de idade, seria um conflito doloroso dar os primeiros
passos ou arriscar dar um passo rumo à própria vida.
Do ponto de vista terapêutico, seria bom ajudar a criança a
se levantar e a ter coragem para dar os primeiros passos,
aprendendo a se afastar ativamente dos pais e a ampliar o
próprio raio de ação. Especialmente necessário seria
encorajá-la quando ela reconhecer que cada um desses
passos pode ser doloroso e exigir dela uma superação.
De modo geral, a doença indica que a criança precisa de
mais estímulos, impulsos e desafios do mundo exterior para
conseguir avançar em seu desenvolvimento. Seria ideal se
os pais tivessem consciência disso e não apenas
permitissem que a criança recebesse esses estímulos, mas
também a encorajassem em seu avanço.
Se o lado afetado do quadril for o esquerdo,
metaforicamente se trata de dar os primeiros passos
desenvolvendo também a própria empatia e a própria
intuição. Se o lado afetado for o direito, o desenvolvimento
da compreensão e da razão está em primeiro plano.
 
Perguntas para os pais:

Quais passos do desenvolvimento são atuais e
difíceis para nosso filho?

Que passos ele precisa dar para ter autonomia?

Que situações requerem toda a sua coragem no
momento?

Em que situações podemos estender-lhe a mão?

Como família, em que situações não
apresentamos mobilidade? Em que
circunstâncias precisamos de uma flexibilidade
maior e nova?
 
Medidas de apoio:

Tratamento homeopático: de acordo com os
sintomas individuais.
13 Doenças de pele

13.1 Piolho
“Que péssima surpresa!”
 
Nesse caso, a mãe, que nos dias de hoje já cuida de quase
tudo, tem de fazer alguma coisa. Entre os macacos, por
exemplo, os piolhos exercem uma função realmente social,
entre as crianças eles levam ao isolamento. Contudo, o
aspecto social entre mãe e filho não deve, absolutamente,
ser ignorado. A mãe é até obrigada a prestar esse serviço
social ao filho. Quando se trata então de uma menina com
irrenunciáveis cabelos longos e cacheados, a mãe precisará
de mais tempo para tratá-los com alguma técnica. Entre as
meninas, o que muitas vezes espalha os piolhos é a troca de
gorros elegantes, o que, naturalmente, indica um
componente social.
Em nossa época tão limpa e organizada, os piolhos são
considerados uma catástrofe. São importunos e repugnantes
para as crianças, mas não perigosos. Entretanto, crianças
com piolhos representam uma exigência terrível e um
desafio para os pais, e sobretudo as mães ficam
profundamente abaladas em sua autoconsciência. Desde
sempre, “com piolho” significa “sujo”, “malcuidado” e
“imundo”. De fato, os vizinhos evitam a criança tão logo a
notícia de infestação por piolhos se espalha, a fim de
escaparem do contágio, tanto físico quanto psíquico e social.
“Não brinque com crianças porcalhonas”, eis o bordão
imediato das mães da vizinhança, e um espantoso programa
de boicote ganha fôlego. Crianças com piolhos são quase
uma possibilidade perfeita do isolamento social e da
marginalização. Cria-se uma espécie de apartheid que se
alastra. A criança é exposta com todo o seu clã, como
ocorria antigamente com os leprosos.
As crianças infestadas já não podem ir ao jardim de
infância nem à escola, que são os locais onde normalmente
se pegam lêndeas de outras crianças, e as mães acabam
tendo mais trabalho do que de costume. Não apenas a
guerra aos piolhos, em todos os níveis, está declarada, mas
também o programa de compensação das horas perdidas na
escola e no jardim de infância. Além disso, os pequenos
parasitas na cabeça dos rebentos criam para as mães um
memorável programa especial, que elas são obrigadas a
dominar quase sozinhas devido ao isolamento social.
Só as atribuições relativas à desinfestação de piolhos
exigem enormes esforços. Os cabelos devem ser penteados,
madeixa por madeixa, com pentes finos em busca das
horríveis lêndeas; além disso, devem ser constantemente
lavados com xampus especiais, e, por fim, a busca por
lêndeas sobreviventes deve ser refeita.
Os xampus-inseticidas são caros e podem ser substituídos
por cerveja normal (com álcool), que, obviamente, embriaga
os filhotes dos piolhos, mas, por outro lado, poupa o couro
cabeludo e a carteira. Lavar os cabelos das crianças duas
vezes por dia com cerveja lhes deixa um odor levemente
primitivo, mas acaba com as lêndeas.
Mas o trabalho extra não para aí: é preciso lavar todos os
possíveis focos de piolhos, como lençóis, toalhas, roupas,
bem como, obviamente, os bichos de pelúcia – e isso deve
ser feito por um bom tempo, pois o ciclo das lêndeas é
bastante longo. Infelizmente, muitas vezes alguns bichos de
pelúcia não podem ser lavados, pois acabam perdendo seu
“cheiro característico”. Nesse caso, a saída é envolvê-los em
um saco plástico e colocá-los no congelador, onde terão de
permanecer por 48 horas, para desespero das lêndeas. Por
sua vez, isso poderá dificultar o ritual do sono, causando
ainda mais irritação às mães.
Justamente nessa situação tensa, as meninas costumam
não querer renunciar aos longos e lindos cabelos e, sem
dúvida, ficam muito tristes só de pensar em cortá-los. Quem
se atreveria a roubar-lhes o símbolo de liberdade e beleza?
Por isso, não raro, são as mães que saem perdendo, não a
garotada com piolhos.
Quando o pai volta para casa à noite, basta ele querer
saber das causas da epidemia doméstica para causar mais
aborrecimento. O dia foi tenso, e, dependendo das
circunstâncias, a mãe ainda terá de se ocupar de outra
criança, o que já era esperado, mas não justamente em meio
a essa difícil situação. Para poupar os filhos, que foram todos
infestados, da perda de seu símbolo de liberdade, ela
prescreve uma rigorosa quarentena e faz tudo que pode, às
vezes até mais. Seja como for, nesse momento ela não
poderia se expor em ambiente social, pois dificilmente
suportaria os olhares dos outros, que a veem como “mãe dos
piolhentos”.
Quando finalmente, depois de longa luta contra os
inúmeros, pequenos e quase invisíveis inimigos, pode sair da
quarentena, ela nem sequer pode esperar algum
reconhecimento por seu martírio; ao contrário, pode se dar
por feliz por ser novamente aceita no círculo das pessoas
limpas, com a esperança de, no futuro, manter a si mesma e
seu lar em ordem e de não voltar a confrontar a vizinhança
com esse tipo de ameaça. Se de fato acontecer uma recaída
ou se o exército de piolhos voltar a atacar, para muitas mães
isso significará um problema psicoterapêutico.
Os próprios piolhos, como causadores primários de todo o
sofrimento, provêm da mesma família dos percevejos, dos
mosquitos e das moscas. Como parasitas hematófagos,
estabelecem-se nos pelos de outros seres e, no caso dos
seres humanos, na falta de pelos no corpo, instalam-se na
cabeça, em busca de sua seiva. Com sua picada, provocam
uma coceira horrível.
Essa coceira não apenas é infernal, mas também estimula
as crianças a arranhar os próprios limites, ou seja, a pele,
muitas vezes deixando marcas, o que é mais um motivo de
preocupação para a mãe, que vê os filhos tão pouco
apresentáveis. A coceira quase enlouquece quem está
infestado. As razões disso são mais de ordem psíquica do
que de ordem objetivamente médica.
Até mesmo a inofensiva mosca doméstica pode evocar
esse item do programa, uma vez que, com intenções ainda
mais inofensivas, passeia por um rosto estranho. Sobretudo
pessoas com grandes problemas de ego e outros a eles
relacionados estão sujeitas a isso. Enquanto os negros
costumam ter poucos problemas com “flanadores de asas”,
mesmo quando estes entram em suas narinas ou,
eventualmente, se aproximam de seus olhos, em situações
semelhantes os brancos quase sempre se irritam e não
hesitam em dar tapas em si próprios, na esperança irreal de
matá-los.
De maneira geral, para as pessoas brancas, com seu ego
representativo, as doenças causadas por parasitas são
inconcebíveis em comparação com os negros, cujo ego é
menos estruturado. Desse modo, parasitas e insetos em
geral oferecem um teste de ego bastante confiável. Esta
também é a razão pela qual normalmente mães de crianças
com piolhos sofrem mais do que os próprios filhos.
A sensação de que diretamente sobre meu couro cabeludo
ou, pior ainda, embaixo dele se aninha alguma coisa que se
prolifera costuma desencadear uma repugnância
considerável, que, em termos dramáticos, supera em muito
a coceira. Especialmente as meninas podem sofrer muito
com ambas.
Sobretudo nos meses de inverno em que a resistência cai,
a invasão dos piolhos ameaça os rebentos do mundo
burguês, em geral extremamente limpo. As crianças
oferecem aos parasitas um lar e vitalidade, à medida que
lhes abastecem de sangue em vários locais ao mesmo
tempo.
Obviamente, as crianças com piolhos não têm como
proteger sua pele nem defender seu território com sucesso.
Permitem que a colonização ocorra justamente em sua
cabeça – por um lado, em razão de uma mistura de
desamparo e fraqueza e, por outro, pela vontade de se
aproximar de outras crianças ou também pela disposição
para brigar, pois, de alguma maneira, os companheiros com
piolhos devem ter se pegado pelos cabelos.
Assim, na maioria das vezes, as crianças – que são
isoladas e constantemente atormentadas pela coceira e pelo
pente fino – não ficam muito satisfeitas com a grande e
inabitual dedicação das mães, que estão sempre querendo
vasculhar seus cabelos em busca de piolhos.
A tarefa para as crianças afetadas é investir mais energia,
esforçar-se até o fim de suas forças, cuidar melhor da própria
cabeça e dos cabelos, que são símbolo de liberdade, carisma
e poder. E, sobretudo, seria importante cuidar da própria
higiene, penteando-se realmente com a intenção de
vasculhar e arrumar os cabelos. “Pentear os cabelos”
significa arrumá-los, e quem está bem penteado parece bem
cuidado. Portanto, no âmbito da liberdade simbólica, do
poder, da beleza e do carisma, a obrigação constante de ter
os cabelos penteados significa cuidar, com ênfase e
precisão, de relações limpas e ordenadas. Tudo que for
estranho a elas deve ser excluído e eliminado.
A solução mais simples seria, obviamente, renunciar
radicalmente aos cabelos, o que geralmente, em razão de
sua clara simbologia, nem sequer chega a ser cogitado.
Uma suspeita em relação à infestação por piolhos também
segue na direção de que a invasão de parasitas estranhos
acomete principalmente crianças que desenvolveram
bastante sua cabeça e, por isso, precisam aprender a
permitir e a suportar a influência ordenadora da mãe,
mesmo quando ela machucar e incomodar. Em sua busca
pelo inimigo em comum, a mamãe precisa sempre passar o
pente por todo o cabelo e verificar se novas lêndeas ou
ideias absurdas se aninharam na cabeça.
Se as crianças oferecem um lar aos parasitas e
disponibilizam para eles sua vitalidade e seu sangue, seria o
caso de perguntarmos em que condições estão sua energia e
sua liberdade. Teriam elas de se tornar mais abertas e
generosas com sua energia vital e colocar sua liberdade à
disposição de outras pessoas?
Em todo caso, elas têm de aprender a permitir a
aproximação de energias estranhas, mesmo que sejam
excessivas; precisam aprender a dividir e a dar sem
renunciarem a si próprias.
A longo prazo, também precisam aprender a lutar em seus
limites, responder por seus atos e defender a própria pele.
Ou então, aprender a fazer sacrifícios no que se refere aos
símbolos de liberdade e beleza. Como já foi dito, raspar os
cabelos seria, de longe, a solução mais simples e o fim dos
piolhos e lêndeas. Por fim, não se deve delegar a
preocupação com a própria cabeleira: segundo o lema
“quem quer ser bem servido que sirva a si mesmo”, as
crianças precisam virar-se por conta própria.
Elas pegam fora de casa essas desgraças vampirescas,
depois são obrigadas a ficar fechadas em casa. Passam por
um regresso, e a mãe tem de cuidar delas novamente,
penteando sua cabeleira que se tornou palco de suas futuras
lutas pela liberdade, bem como da encenação do carisma e
da beleza.
Por outro lado, algumas crianças chegam a tirar vantagem
da situação. Quem não se sente tão motivado a ir para a
escola acha cômodo poder ficar em casa, e até é obrigado a
ficar, senão é expulso. Muitas crianças, especialmente os
meninos, também sentem claramente menos repugnância
do que as mães, que não possuem a mesma disposição das
crianças para lutar. Elas sentem uma repugnância muito
forte e se empenham em exterminar o que as enoja.
Outras crianças até gostam e aproveitam quando as mães
passam a cuidar mais delas. Para alguns meninos não há
problema nenhum em ter os cabelos raspados, ganhar uma
careca que pode parecer da moda e livrar-se do incômodo. O
sofrimento das meninas é mais demorado e se resolve com
um corte mais curto dos cabelos e com uma ação profunda
de lavagem, que, obviamente, não vem nem um pouco a
calhar para os piolhos e sua prole.
A terapia é feita pela necessidade de se livrar, o mais
rápido possível, dos parasitas e de toda a sua ninhada, o que
supõe o uso dos já mencionados xampus-inseticidas.
A partir da naturopatia, há que se considerar o óleo de
nim, há séculos usado na Ásia contra os parasitas, pois inibe
a síntese de quitina. Desse modo, é um “pesticida” biológico
e totalmente natural, pois não mata os insetos, mas apenas
impede que se multipliquem, agindo, portanto, como um
anticoncepcional.
 
Perguntas para os pais:

Como nosso filho pode aprender a se defender
melhor?

Contra o que ele não consegue se defender?

O que fazer para que ele assuma sua vida de
maneira mais corajosa e engajada?

Em que situações devemos cuidar da limpeza e
da ordem?

Nosso filho está autorizado a pensar com a
própria cabeça e a afirmar-se?

Como lidamos com o tema “liberdade”?

Como lidamos com nossa energia vital?
 
Medidas de apoio:

As lêndeas precisam ser diariamente eliminadas
com um pente apropriado.

Bichos de pelúcia, gorros, roupas de cama, etc.,
devem ser regularmente lavados.

Utensílios não laváveis também podem ser
desimpiolhados, desde que permaneçam 48
horas no congelador.

Sauna: crianças maiores podem frequentar a
sauna duas vezes por semana, uma vez que os
piolhos não sobrevivem a temperaturas
superiores a 50 graus. Caso se disponha de uma
touca térmica elétrica em casa, seria uma boa
alternativa.

Gel Aesculo (extrato de óleo de coco): aplicar na
cabeça seguindo as instruções do fabricante.

Xampu de nim: para uso diário.

Óleo de árvore-do-chá: misturar no xampu.

Vinagre de frutas ou cerveja: para enxaguar os
cabelos.

Óleo de lavanda: para enxaguar os cabelos.

Tratamento homeopático: em caso de
infestações frequentes por piolhos, a criança
apresenta uma fraqueza constitucional que deve
ser tratada individualmente.
13.2 Verrugas
“Sou um diabrete.”
 
Verrugas são excrescências disformes da pele, o órgão
limítrofe e de contato, mas também o órgão do carinho. Elas
simplesmente são consideradas o símbolo da feiura. Algo
escuro irrompe à luz e escurece a bela pele branca,
tornando-se uma mancha e incomodando como uma mácula.
Entretanto, como grande mácula as verrugas são associadas
às bruxas. Simbolicamente, representam as mensagens do
reino das sombras e pertencem às bruxas, tal como a falta
de dentes, o gato preto e o corvo sobre os ombros. Trata-se,
portanto de um confronto – inofensivo do ponto de vista
médico, mas horrível do ponto de vista psicológico – com o
próprio lado sombrio. Geralmente, os pais o sentem como
um ataque ao caráter imaculado das crianças. Os pequenos,
que parecem anjos inocentes, são “maculados”, e as
verrugas incomodam quando se quer apresentar os filhos a
alguém. Por isso, na maioria das vezes os pais e, sobretudo,
as mães se irritam mais com isso do que as próprias
crianças.
As verrugas expõem o polo oposto aos anjos. O que seria
dos contos de fadas sem as bruxas? E do paraíso sem a
serpente? As verrugas permitem que se entreveja a fera –
especialmente nas crianças, que são divinizadas em seu
caráter angelical. Desse modo, os pais acabam pensando
apenas no próprio lado sombrio, o que não é nada
agradável. Ao mesmo tempo, porém, as verrugas também
são uma lembrança das raízes mágicas da própria infância.
Causadas por vírus, as verrugas são totalmente
inofensivas do ponto de vista médico, e somente as
associações mencionadas com o reino das sombras as
tornam tão desagradáveis e difíceis de suportar. É
interessante notar que, às vezes, a relação mágico-simbólica
em casos extremos é levada em conta até mesmo por
médicos acadêmicos e explorada por terapeutas.
Normalmente, porém, são cauterizadas ou extirpadas, ou
ainda arrancadas. Não se quer saber de nenhum reino das
sombras, só de bani-lo deste mundo.
Essa maneira violenta de lidar com as sombras é tão típica
quanto inábil e, se nada mais acontecer, geralmente leva ao
reaparecimento do que causa inquietação e perturba a paz.
O princípio de Plutão por trás delas é manifestamente
persistente. Na maioria das vezes, os adultos vivenciam
sozinhos seu lado sombrio, ainda que de modo inconsciente,
e, por isso, não precisam da franqueza de tantas verrugas –
embora a solução mais elegante consista em lidar
conscientemente com o próprio reino das sombras. Quanto
às crianças, seria muito útil familiarizá-las com as raízes
mágicas da própria vida e com as forças encantadas da
imaginação, conforme ilustrado em contos de fadas e
histórias ao estilo “Harry Potter”.
Na seção sobre a sugestão (2.6), descrevi como
“desencantei” centenas de verrugas, seguindo a instrução
de um médico-chefe do departamento de dermatologia,
utilizando um truque (mágico-psicológico). Levei algum
tempo até me conscientizar do efeito duradouro dessa
mágica. O médico-chefe sorriu ao perceber que, a partir
daquele dia, seríamos muito mais reconhecidos como
médicos. Ele me aconselhou a não falar daquelas
experiências na clínica. E foram essas experiências que
mudaram para sempre minha maneira de ver a medicina.
Conforme descrito na mesma seção, nesse plano também
é possível “comprar” as verrugas das crianças quando elas
já têm uma noção das relações com o dinheiro e de sua força
mágica.
As excrescências das verrugas mostram que a criança
precisa ousar mais e confiar mais em si mesma, além de ter
a chance de crescer mais interna e externamente. O que
brotou na pele tinha apenas um caráter representativo. Se
as próprias fantasias em desenvolvimento recebessem mais
espaço e pudessem viver, a pele seria desonerada dessa
tarefa de representação. Também desse modo, algumas
manchas pretas e certas “mágicas” duvidosas não se
manifestariam fisicamente na pele.
O fato de que sobretudo as crianças e as pessoas de idade
são afetadas por essas excrescências pode indicar que o
início e o fim da vida para o homem moderno são fases
difíceis, nas quais nem sempre dá certo expressar
adequadamente todas as fantasias, as ideias e todos os
desejos. Assim, a pele entraria como representante e
mostraria o que, geralmente, fica à sombra: as
excrescências do princípio de Plutão (“morrer e se
transformar”, metamorfose e todas as mudanças radicais).
Do ponto de vista médico, fala-se em “verruga d’água” ou
“molusco contagioso”. Por trás dela escondem-se os
patógenos humanos papiloma-vírus (HPV), que com
frequência são “pegos” em piscinas, mas somente quando
as tarefas de representação correspondentes não podem ser
dominadas de outra maneira.
Um caso especial é o das verrugas plantares. Nelas se
trata de um verdadeiro espinho na (própria) carne, que
pressionam e doem, além de fazerem com que as crianças
não consigam caminhar e, metaforicamente, a avançar.
Quem é impedido de caminhar mal consegue sair daquele
período de culto da própria imagem. Com uma estaca como
essa fincada na própria carne, a escuridão requer atenção.
As crianças afetadas são obrigadas a pisar com cuidado e a
ser menos impositivas. Além disso, o sintoma as impede de,
inconscientemente, bater o pé ao longo da vida. A tarefa
seria aprender a resistir mesmo em situações dolorosas e
difíceis e perguntar-se onde “o sapato aperta”.
Conscientemente e de maneira espontânea, elas teriam de
se deixar impressionar também por efeitos dolorosos.
Na homeopatia, o quadro medicamentoso da tuia está
estreitamente ligado ao tema “verrugas”. É adequada para
pessoas que tendem a esconder de si mesmas o que é
essencial e a ter dificuldade para revelar a verdade sobre si
próprias; ao contrário, preocupam-se em calar e encobrir seu
lado sombrio. Nelas existe algo misterioso como as verrugas,
que aparecem de repente e, de modo igualmente
surpreendente, voltam a desaparecer. A mudança e a
metamorfose, no sentido mais profundo dos termos, são o
ponto central nesse caso. Verrugas plantares também
desaparecem com o medicamento Antimonium crudum.
Seria o caso de perguntar às crianças afetadas em que as
verrugas as incomodam, o que elas as impedem de fazer, o
que foi escondido quando as verrugas apareceram. Às vezes,
também é útil examinar em que zonas de reflexo e
meridianos encontram-se as verrugas em questão. A
pergunta resultante seria: “Que temas a verruga quer
levantar?”
Para os pais, nessa temática trata-se de desenvolver um
olhar mais realista em relação aos próprios filhos, cujos lados
obscuros devem ser levados em conta; trata-se também de
reconhecer que a alma das crianças não é uma folha em
branco, e sim uma história geralmente muito particular e
longa. Do ponto de vista genético, as crianças também
herdam alguma coisa dos avós, que não necessariamente
desempenha uma função nos pais. Em constelações
familiares e, sobretudo, na terapia da reencarnação, todas
essas relações se destacam claramente.
As verrugas são, fundamentalmente, uma questão de
relaxamento, pois, do ponto de vista médico, trata-se de um
problema de natureza estética. Como terapia para as
crianças, além dos rituais mágicos já descritos, considera-se
a homeopatia clássica no âmbito de uma terapia
constitucional. Para pais intensamente afetados do ponto de
vista subjetivo, pode-se pensar em algum CD, como
“Schattenarbeit” [Trabalhando as Sombras].[29] Utilizado
diariamente durante um ciclo lunar, as respectivas
digressões no próprio reino das sombras trarão luz própria
para o inconsciente do mundo das sombras.
Também seria útil o reconhecimento das próprias raízes
mágicas no passado. Quase toda criança teve fantasias
mágicas e as afastou com maior ou menor sucesso. Contudo,
não são poucos os adultos que ainda sonham com uma terra
encantada sem o lado sombrio da moderna sociedade
repressora. Nesse caso, as verrugas seriam o convite ideal
para se reconciliar com os próprios lados sombrios, que
sempre podem se refletir externamente, bem como nos
próprios filhos.
A partir disso, já não estaria tão distante a possibilidade de
tratar esse tipo de excrescência do mundo interior sombrio
com métodos sombrios (e ocultos), ou seja, com
homeopatia. É o que os homeopatas clássicos podem pensar
ao analisarem a anamnese, que, naturalmente, também
precisa penetrar nos cantos escuros da alma. Mas isso
poderia até significar que as verrugas podem ser
“desencantadas” de maneira fisicamente indolor por um
feiticeiro ou outras bruxas, contudo, sem deixar de atentar
para a mudança de mentalidade, no sentido da metanoia, do
arrependimento e de conversão interior.
Obviamente, também seria necessário transmitir
compreensão à criança no que se refere a essa outra
realidade. Isso pode ser difícil para pais modernos, mas para
as crianças de hoje é muito importante e significativo como,
por exemplo, sucessos como a história de “Harry Potter”
repercutem nelas. Em uma época em que a crença na
ciência absorveu em grande medida o caráter religioso, a
alma das crianças necessita justamente dos vastos mundos
míticos e místicos à beira da imagem racional de mundo.
 
Perguntas para os pais:

Por que as aparências são tão importantes para
nós?

Que dinâmica interna está tentando se
manifestar? Podemos ajudar nesse processo ou
simplesmente não impedi-lo?

Nosso filho está diante de um recomeço?

Que lados obscuros querem tornar-se
conscientes no momento?

Em que situações nosso filho poderia sair mais
de si mesmo?

Como nos relacionamos com a visão mágica do
mundo e em que medida a transmitimos?

Somos capazes de reconhecer esse lado sombrio
da realidade ou nosso filho precisa nos estimular
a fazê-lo?
 
Outros problemas de pele também são descritos no
Capítulo 4 “Doenças infecciosas”, nas seções “Sarampo”,
“Rubéola”, “Catapora” e “Escarlatina”, na seção “11.2
Dermatite atópica e crosta láctea”, bem como em “19.1.17
Queimadura de sol”.
14 Problemas do metabolismo: Diabetes
mellitus

“Quero ser seu docinho.”


 
O diabete (ou diabetes), antigamente conhecido como
“glicosúria”, pode ser dividido em dois grupos: o diabete tipo
I, outrora também chamado de “infantil” ou “juvenil” e que
provavelmente tem causa genética, ou seja, entra na vida
como um encargo e está ligado à total falta de insulina no
organismo; e o diabete tipo II, geralmente adquirido em
razão de um estilo de vida nada saudável, sobretudo por
alimentação inadequada ou sedentarismo. Neste último tipo
de diabete, o pâncreas continua a funcionar, mas sua
capacidade é limitada e já não atende às exigências
excessivas. De acordo com a Organização Mundial da Saúde
(OMS), o diabete se tornará, junto com a obesidade, que
geralmente o acompanha, a epidemia do futuro. Até o
momento, existem crianças com diabete tipo II, sobretudo
nos Estados Unidos; na Alemanha, felizmente, são raros os
casos. Portanto, embora esse quadro sintomático de fácil
distinção tenha considerável importância para a humanidade
como um todo, em nosso livro sobre crianças ele vem em
segunda ordem.

14.1 O doce e a energia da vida


No nível físico encontram-se as ilhotas de Langerhans, parte
do pâncreas que é responsável pela produção de insulina e
que nos possibilita desfrutar do lado doce da vida. Logo
cedo, o doce é associado ao amor e ao afeto. Em
comparação com outros leites (maternos), o humano é
extremamente doce. Os pais tentam ajudar os filhos a
superar as dificuldades da vida dando-lhes doces – por
exemplo, enchendo as lancheiras de coisas gostosas, para
adoçar os obstáculos do primeiro dia de aula. Mas sua
verdadeira tarefa seria preparar os filhos para aprender a
lidar com as dificuldades da vida ao mesmo tempo em que
são mimados com o doce do amor. Do contrário, o açúcar se
tornará apenas um substituto do amor, que pode facilmente
viciar. Portanto, todo doce é substituto do amor!
Entretanto, o açúcar está relacionado não apenas ao amor.
Do ponto de vista biológico, ele é, sobretudo, um fornecedor
de energia (que atua rapidamente). Em princípio, um
diabético (sem insulina) morreria de fome diante de um
prato cheio de comida, pois suas células não conseguem
absorver energia. Para tanto, falta-lhe a chave, ou seja, a
insulina, capaz de abrir as células.
O fato de o consumo de glicose deixar o indivíduo mais
produtivo é uma experiência que vem dos tempos primitivos.
Nesse sentido, o açúcar é símbolo não apenas da energia,
mas também da produtividade. Após um bom desempenho
em alguma atividade, as crianças recebem doces como sinal
de reconhecimento e como elogio. Antes das tarefas de
classe, consomem algo doce (“Supernescau – energia que dá
gosto!”) para produzirem algo especial e, como recompensa,
receberem novamente reconhecimento e elogios. Assim, o
açúcar também se torna um símbolo de reconhecimento.
Desse modo, a criança diabética não consegue absorver
energia nem, por conseguinte, ser produtiva e elogiada. Do
ponto de vista homeopático, trata-se, portanto, de temas
como “não conceder a si mesmo muita energia de vida”,
“não conseguir ser ajudado com energia” e “não conseguir
absorver nada”. A questão é se, por trás disso, existe uma
recusa em ser produtivo, ou seja, “não aceitar nada para
também não ter de dar nem produzir nada”. Partindo dessa
conclusão, trata-se, então, de aprender a não esperar por
elogios. Se a criança pudesse aprender a recusar doces em
um nível metafórico, seu organismo não seria obrigado a
seguir esse programa.
Em vez de querer ser “doce” e agradar, a criança diabética
deveria conhecer a si mesma, valorizar-se e atribuir-se o
devido reconhecimento, que, desse modo, será alcançado e
aceito com mais facilidade também fora dela. Na prática,
muitas vezes a criança pequena irá cobrar do ambiente
circunstante um doce que ela não está autorizada a receber.
O doce do açúcar eleva o nível de serotonina, que, por sua
vez, causa uma sensação de bem-estar e proteção. À sua
maneira, a natureza provê a vida de doce e amor, contanto
que não a impeçamos de fazê-lo. Desse modo, a
amamentação tem uma função múltipla. Por um lado,
fornece o doce leite materno, que eleva o nível de
serotonina, e, por outro, libera oxitocina, hormônio
responsável por uma profunda ligação entre a mãe e o bebê.
Além disso, também são liberadas endorfinas, que na mãe
podem representar uma sensação de felicidade.
Posteriormente, o doce também está vinculado à lembrança
do período de amamentação, repleto de amor e de bons
sentimentos de união e bem-estar.

14.2 A falta de insulina e suas consequências


A tarefa do hormônio insulina é abrir as células para a
glicose, ou seja, para o açúcar, símbolo do amor e da
energia. Quando falta insulina, o açúcar e o amor não podem
ser absorvidos e acabam se perdendo. Do ponto de vista
biológico, porém, isso é menos problemático e perigoso do
que aquilo que se acumula em certos pontos do corpo e que
causam, sobretudo, consequências tardias do diabete para
os olhos, os rins, o sistema nervoso, a pele e os próprios
vasos sanguíneos, onde o açúcar se deposita em minúsculos
capilares, bloqueando-os.
Por conseguinte, a energia e o amor não absorvidos
obstruem e bloqueiam através dos vasos os caminhos da
energia vital e, através dos nervos, a transmissão de
informações, de maneira que, ao final, “pouca coisa
funciona”, pois os olhos já não enxergam o mundo, os rins já
não mantêm o equilíbrio entre ácidos e bases, e os nervos já
não passam adiante a informação com regularidade. Em
sentido figurado, isso significa que a energia e o amor
malconduzidos – também se poderia pensar na ligação de
ambos na energia do amor – impedem o que é mais
essencial em nós, ou seja, o fluxo da força vital.
Se o mundo exterior não pode ser visto, tudo ao redor da
pessoa afetada torna-se escuro, e boa parte do mundo
desaparece da vida. Não apenas nesse momento, a tarefa é
aprender a ver a vida interior (da alma) com os olhos
interiores.
Quando a pele reage com a coceira típica, isso significa
que as próprias fronteiras querem ser abertas. As pessoas
afetadas sentem que “vão sair de si”. A energia e o doce da
vida estão presos dentro das fronteiras da pele, que quer
estourar. A tarefa de abertura das próprias fronteiras para
fora torna-se bastante evidente.
Uma pele permeada de açúcar também quer se fazer
atraente, porém em um nível inapropriado do corpo; a
boneca de açúcar quer parecer mais vistosa e preciosa, no
duplo sentido do termo. Com o amor, ela torna sua pele
atraente, evidentemente expondo-se ao perigo.
Quando o equilíbrio entre ácidos e base e, portanto, entre
Yin e Yang, feminino e masculino é rompido, as pessoas
afetadas entram em coma. Desse equilíbrio depende todo o
metabolismo do corpo e, na vida exterior, entre outras
coisas, a relação de companheirismo. Portanto, a tarefa é
desistir espontaneamente do poder e prestar mais atenção
nos processos de equilíbrio que ocorrem no nível psíquico e
espiritual e que poderiam refletir na necessidade de
harmonia de muitas pessoas afetadas.
Quando o fluxo de informações, ao qual tudo está ligado, é
paralisado, a vida já não pode fluir, pois a coordenação é
interrompida. Mas a vida é aquele panta rhei (“tudo flui”), do
qual já falavam os gregos. Os aspectos do fluxo e, com eles,
a vida são ameaçados pelo diabete tipo I ou, em todo caso,
já o foram antes da descoberta da insulina.
Antigamente, media-se a queda de açúcar ou de amor e
energia pela urina; hoje ela é medida pelo sangue, o que é
mais seguro, pois está mais próximo do problema. O açúcar
só pode ser verificado na urina quando já estiver tão alto no
sangue que ultrapassa o chamado limiar renal.
O sangue como símbolo da força vital que une todos os
elementos e órgãos, além de manter e distribuir o fluxo da
glicose, do amor e da energia, é sobrecarregado. Quando a
medida normal é ultrapassada, o açúcar e, com ele, a
energia e o amor, transbordam e acabam na urina.

14.3 Tarefas
Outra tarefa seria sobrecarregar o fluxo vital com a energia
do amor, em sentido figurado, e deixar o amor e a energia
fluir, expelindo o excesso. O grande tema do amor na vida
de pequenos e grandes diabéticos de tipo I não poderia ser
expresso de modo simbolicamente mais belo.
A urina é o símbolo de todo o eflúvio da alma que é
liberado e, assim, permite que o amor continue a fluir. Por
sua vez, a tarefa consiste em passar do nível do corpo para
aquele da alma e fazer com que o excesso de amor
absorvido escoe.
Em sentido figurado, essa espécie de “diarreia do amor”
também fala pelo medo relacionado a ele. As pessoas
afetadas são pouco abertas nas questões amorosas e, como
suas células, são pouco receptivas e não se abrem ao doce
da vida, pois, para tanto, falta a poção mágica necessária. É
evidente a suspeita de que, quem não permite a entrada do
doce, o símbolo do amor, na própria vida, também não se
entrega ao amor.
As crianças que são “produto” e dádiva do amor devem
trazê-lo ao mundo; um amor incondicional, celestial e até
divino, que elas conseguem na forma do amor materno. O
ideal é que desencadeiem essa máxima forma de amor em
seus pais e o vivenciem através de ambos e de si mesma. O
amor materno corresponde ao amor divino, pois nada espera
nem exige, tampouco impõe condições, ou seja, é
incondicional e aberto para tudo. Ele aceita a criança tal
como ela é e, em sua amplidão e abertura de coração,
sente-se profundamente feliz com ela.
Como dádivas do amor, as crianças deveriam passá-lo
adiante. Falamos de nossos “anjinhos inocentes”, nossos
“docinhos”, “a pupila de nossos olhos”, que, no caso ideal,
semeiam o amor entre si próprios e os pais. Assim, o ágape
seria difundido por elas como a máxima forma de amor, o
aspecto inocente, o sincero desejo de união. Essa máxima
forma de amor também dispõe do amor erótico entre os pais
e aquele entre os amigos – na Antiguidade, o amor chamado
de philia.
Os avós e os pais retribuem, às vezes de maneira
exagerada, essa dádiva do amor que as crianças neles
desencadeiam. Contudo, no nível físico, que corresponde em
grande medida ao psíquico, as crianças diabéticas não
conseguem aceitar e absorver, de maneira suficiente, todo
esse amor, em razão de sua exigência e de sua extensão. A
difícil questão resultante desse fato seria: “Elas não
mereceriam receber todo esse amor em vez de logo passá-lo
todo adiante?” Para os pais, há uma pergunta ainda mais
extrema: “Elas não mereceriam receber dos pais o suficiente
desse amor, ou seja, a enorme quantidade que requerem,
em vez de se fecharem para ele ao pressenti-lo?”
As crianças diabéticas de tipo I trazem consigo uma
expectativa muito grande. Provavelmente, o tema de sua
vida é a energia mais importante de todas ou, como diz
Novalis: “O amor é o amém do universo”. Crianças
diabéticas vivem essa expectativa em relação ao amor
(naturalmente, também mais tarde, quando adultas) de
forma especialmente marcada e são muito carentes. Ao que
parece, cobra-se delas uma evolução bastante consciente
desse tema, e talvez também talento. Muitas vezes, elas
precisam ir muito cedo para a “escola especial da vida”.
Nela, espera-se que recebam o apoio e a experiência do
amor incondicional da mãe como capital de saída para a
exigente incumbência de viver.
Se o amor pode satisfazer essa expectativa, é uma
questão que permanece em aberto. Em todo caso, ainda não
se encontrou nenhuma cura para o diabete tipo I, que é
rotineiro em relação ao de tipo II: esse dado já indica a
diferença qualitativa entre os dois quadros clínicos.
Além do que já foi ilustrado, trata-se de ancorar o próprio
eu na vida, construir uma relação saudável consigo mesmo e
aprender a abrir os limites no sentido de uma educação para
o amor sem medo. Do contrário, justamente a grande
expectativa do amor poderia conduzir a uma abertura
indiscriminada dos limites e, com isso, também desencadear
pânico.
Nessas crianças, a acentuada vulnerabilidade para
infecções permite supor que os limites do corpo são muito
permeáveis, porque os da alma são mantidos muito
fechados. Desse modo, fica claro que a abertura insuficiente
no plano psíquico obriga o corpo a se abrir. Porém, se o
corpo vive a abertura no lugar da alma, acaba se expondo
ao contágio dos agentes patogênicos. Melhor e mais
saudável seria fazer a alma deixar-se “contagiar” pelo amor
e outros temas.
O comportamento muitas vezes dominante nas crianças
diabéticas de tipo I, caracterizado pela alternância entre a
intensa necessidade de amor e pela disponibilidade para
expressar afeto, mostra como elas se debatem entre os
extremos da máxima abertura, de um lado, e do limite
estável do eu, de outro, para usar as palavras com que Erich
Fromm descreve essa ambivalência.
As crianças diabéticas de tipo I requerem dos pais uma
atenção bastante concreta, dia e noite. O nível de açúcar no
sangue deve ser monitorado mesmo à noite, e o alimento
adequado deve estar sempre pontualmente à disposição.
Nesse cotidiano rigidamente regulado com o constante
monitoramento do açúcar e a alimentação também
constante talvez se reflita uma concepção pedagógica antiga
e sedimentada dos nossos antepassados, cujo polo oposto
seria “simplesmente viver e amar”. Em tempos remotos,
alguns diabéticos também conseguiram sobreviver
justamente desse modo. É conhecido o caso de um professor
de diabetologia que também sofria da doença desde criança
e, não podendo se tratar com insulina, viveu e até atingiu
idade avançada ao escolher instintivamente alimentos
simples e adequados. Portanto, é provável que, no passado,
nem todos os diabéticos tenham morrido, mas, ao contrário,
tenham encontrado o próprio caminho através de um estilo
de vida extremamente simples.
A partir disso, pode-se concluir o desafio de aprender a
viver e a alimentar-se com grande simplicidade e a ficar feliz
e satisfeito com pouco. O que seria uma saída possível para
o diabético de tipo I, para o de tipo II é uma certeza
comprovada.

14.4 “Diabete senil” em crianças


No diabete tipo II, a origem do drama é muito mais fácil de
compreender. Como já foi dito, esse quadro clínico, outrora
também denominado “diabete senil”, tem se difundido
rapidamente entre as crianças norte-americanas e indica
uma tendência de alcance mundial. Como sempre ocorreu
até hoje, provavelmente importaremos dos Estados Unidos
também essa distorção e continuaremos a evitar com
coerência as maravilhosas oportunidades – como a
mobilidade social, a valorização do mérito, e assim por
diante – que essa grande e extraordinária nação também
teria para nos oferecer.
No caso desse tipo de diabete – que realmente podemos
prevenir com eficácia desde o início, com uma alimentação
apropriada –, a capacidade do organismo de absorver e
metabolizar a glicose mostra-se exaurida. Geralmente, essas
crianças foram “cobertas” com uma oferta tão grande de
açúcar – ou o substituto físico do amor – que suas células se
colaram umas às outras, de modo que a insulina já não pode
abri-las e a glicose não consegue penetrá-las
(insulinorresistência). Para compensar, as ilhotas de
Langerhans produzem cada vez mais insulina, que induz a
um aumento da sensação de fome, o que, por sua vez, leva
a consumir mais açúcares e produz um círculo vicioso tão
eficaz quanto fatal. Em algum momento, as células B,
sobrecarregadas na produção de insulina, também se
exaurem e acabam cedendo.
Na quase totalidade dos casos, o substituto físico do amor
chega a uma carência do verdadeiro amor psíquico. Não
fosse assim, por que deveria então buscar um substituto se
recebesse o suficiente do autêntico? Naturalmente, a
alimentação moderna, desprovida de substância mesmo no
excesso de calorias vazias, favorece em muito essa
tendência. Entretanto, não faz sentido responsabilizar a
indústria do fast-food, pois também existem outras
possibilidades de alimentação.
Nas crianças diabéticas, nota-se com frequência um desejo
intenso de provar alimentos doces e o lado doce da vida, e,
ao mesmo tempo, uma incapacidade para digeri-los,
assimilá-los e deixá-los entrar completamente em seu corpo.
Essas crianças sentem muita fome; com ela, buscam
compensar a queda de produtividade e a exaustão que dela
deriva, ou então perdem o apetite. Portanto, ainda sentem
muita fome de vida ou não a sentem mais. A sede intensa é
sinal do desejo por mais água (da alma).
Quem não consegue absorver ou deixar entrar no próprio
íntimo (coração e células) a energia e o doce da vida – seja
em sentido concreto, seja em sentido metafórico – sempre
ficará insatisfeito e pedirá mais do substituto. Existem até
pais cujo “amor” pelo filho é tão exagerado que não
conseguem negar-lhes os doces tão ansiados, evocando,
assim, sua sombra e favorecendo ainda mais a doença.
A esfera do corpo revela ainda outras coisas a respeito do
tema “amor” em relação às crianças e à sua educação.
Açúcar de mais ou de menos no sangue conduz, em igual
medida, ao coma e, com ele, a uma morte lenta. A vida não
resiste à completa falta de amor nem a seu excesso
irracional sob a forma de açúcar! Os terríveis experimentos
para descobrir a linguagem primitiva, em que as crianças
eram atendidas em todas as suas necessidades materiais,
porém sem que se lhes fosse dirigida uma palavra sequer,
conduziram à sua morte. As crianças de hoje, que também
recebem todo tipo de coisa material em abundância, mas
das quais se subtrai toda dificuldade da vida (síndrome de
superproteção), também vão a pique ou, pelo menos,
perdem a capacidade de viver.

14.5 Desafios para os pais e para o ambiente


Conseguir manter em equilíbrio não apenas as taxas de
glicemia, mas também o amor e a liberdade, a
superproteção e a negligência certamente representa um
enorme desafio pedagógico para os pais. Sem dúvida, sua
tarefa consiste em transmitir ao filho a capacidade de
encontrar sozinho o equilíbrio correto e mantê-lo, seja em
nível físico – entre a hiper e a hipoglicemia –, seja em nível
psíquico.
Além disso, as condições metabólicas dos indivíduos
diabéticos mostram como o amor, se vivido no plano errado,
onde se transforma em um substituto, com o tempo os
tornam ácidos e incapazes de viver. Quem não sabe digerir
torna-se, notoriamente, uma pessoa indigesta. Essa
incapacidade pode ocultar, em nível psíquico, um desejo
inconfessado de satisfazer-se no amor ou uma incapacidade
de amar, ou ainda o reconhecimento de não ter aprendido a
dar e a receber amor, como também a falta de confiança ao
enfrentar ativamente o tema do amor.
Mais uma vez, impõe-se a questão já formulada: “Esses
indivíduos não valeriam o suficiente por si mesmos para
acolherem o amor dentro de si?” Será que não se sentem
suficientemente valiosos para aceitarem algo tão doce como
o amor? Ou será que é o amor que, para eles, não vale o
suficiente? Não lhes é permitido aceitar o amor? O que os
impede? Em todo caso, não sabem o que fazer com ele e o
deixam escapar, talvez porque também tenham medo dele.
Quando não passo em uma prova, esta não é superada.
Portanto, quando o amor malogra, será que é porque ele ou
essa forma de amor não consegue superar a prova crítica
das crianças diabéticas?
Essas crianças o reprovam porque não é o amor autêntico
e incondicional? Seria, então, a doença do açúcar ou da
energia do amor uma exortação aos pais para que deem o
amor correto e incondicional que os filhos teriam condições
de aceitar e assimilar? Naturalmente, essas são as perguntas
mais difíceis que os pais podem fazer a si mesmos; no
entanto, devem ser feitas. Como em todas as interpretações
simbólicas dos quadros clínicos, é bom esclarecer mais uma
vez que em nenhum caso se trata de atribuição de culpa, e
sim de indicações de responsabilidade, no sentido da
capacidade para encontrar respostas.
As ilhotas de Langerhans do pâncreas, ou seja, as células
que produzem insulina – a substância necessária para
metabolizar o amor – são exauridas por excesso de trabalho,
como no caso do diabete tipo II, ou até mesmo destruídas,
como naquele de tipo I. Como foi comprovada a presença de
anticorpos específicos no organismo, pode-se deduzir que se
trata de um processo de autoagressão. Isso e o fato de que a
insulina tem de ser injetada através da pele revela o conflito
entre o tema “do amor que se abre” e o da “agressividade”.
Esse conflito estende-se por todo o processo e está entre as
mais difíceis ações de equilíbrio. Mais tarde, quando as
próprias crianças aplicam as injeções em si mesmas, o ato
de autoagressão – nesse caso, necessário – também será
visível em nível terapêutico.
Portanto, as crianças diabéticas matam por si próprias
parte de sua vida (a possibilidade de absorver o açúcar
normalmente, ou seja, o amor material). Antes que a
medicina descobrisse esse quadro clínico e aprendesse a
produzir a insulina, provavelmente muitos de fato acabaram
se matando; a dureza da expressão torna ainda mais
evidente a ambiguidade dessa doença.
Hoje, esse problema requer “apenas” uma enorme
dedicação, a outra forma do amor ansioso. Originariamente,
também nesse caso a mãe tinha de se dedicar por completo.
A medicina moderna consegue, cada vez mais, tirar os
espinhos dessa doença e tornar a vida dos pais mais fácil.
Todavia, eles ainda são submetidos a uma dura prova em
seu amor pelo filho diabético, que precisa de mais cuidados
do que os outros filhos. Em outras palavras: os filhos
diabéticos pedem para si mais atenção do que os outros.
Para as crianças diabéticas, a emancipação em relação aos
pais também ocorre mais tarde, e, com a terapia normal de
injeções, eles precisam, por exemplo, de uma regularidade
absoluta nas refeições e na vida para usar corretamente a
insulina. Graças à moderna técnica da microinfusão, isso já
não é necessário. Ela indica um relaxamento da antiga
obrigação de regularidade em favor de uma maior liberdade
individual porque, em última análise, quase tudo pode influir
na taxa glicêmica no sangue.
Já em virtude dessas condições de vida, as crianças
diabéticas são obrigadas a assumir precocemente a
responsabilidade por si mesmas, e a maior parte delas
aprende a fazer isso de boa vontade. Essas crianças nunca
podem permitir-se abrir a geladeira e servir-se sozinhas nem
beliscar escondido um pedaço de chocolate. A vida ou a
doença exige delas uma alta dose de autocontrole.
Aprendem cedo a observar-se, pois devem reconhecer em
tempo os sintomas subjetivos da hipoglicemia, a fim de
evitarem o coma. Para algumas crianças, esse procedimento
se ativa até mesmo durante o sono. Assim, em geral, elas
conquistam uma autonomia precoce, aliviando também as
obrigações da mãe. Muitas vezes já estão prontas a cuidar
sozinhas de si mesmas e a garantir para si certa segurança
em idade pré-escolar.
Quando recebem a dedicação total da mãe e, portanto,
experimentam o amor incondicional, bastante necessário
nesse caso específico, sua autonomia pode se iniciar
surpreendentemente cedo. Uma menina de 5 anos, diabética
desde os 2, aprendeu a responder à pergunta da mãe sobre
a dimensão da própria fome em quantidade de pães. A
tendência era bem evidente: quero e posso fazer sozinha!
O amor materno, como imagem daquele divino, transmite
à criança a dedicação absoluta e a noção de união com o
ritmo do ser vivo. Esse amor incondicional exige muito da
mãe; em primeiro lugar, que ela confie na segurança interna
da própria vida, cuja melhor base é a religiosidade, no
sentido da verdadeira religio, capaz de garantir sua
reconexão com as origens da própria alma.
Em tempos remotos, quando a religiosidade era mais
profunda e difundida, provavelmente essa segurança era
mais garantida. No caso das crianças diabéticas, a
reconexão parece assegurada apenas por horários, dias,
projetos de vida e ritmos a serem rigorosamente
respeitados, mas também pelos controles contínuos de uma
mãe moderna que, muitas vezes, encontra pouco refúgio e
segurança na religião. Toda liberdade e toda ocasião em que
se sai da linha devem ser conscientemente avaliadas pela
mãe e, em seguida, pela responsabilidade individual, pois
todo excesso pode constituir uma ameaça. A falta de
percepção de ser parte da Criação, hoje cada vez mais
frequente, e a diminuição da religiosidade, no sentido de
“sentir-se amado individualmente por Deus”, poderiam ser
fatores coerentes com o aumento dos casos de diabete.
Já vimos como faz falta um anjo ou espírito da guarda às
crianças de hoje. Quando não há religio e, com ela, a
reconexão com a origem e sua sustentação, até mesmo o
amor pode facilmente se perder. Por conseguinte, os pais
modernos deveriam substituir o amor de Deus pelo seu.
Trata-se de um objetivo impossível de realizar na prática,
mas que revela, mais uma vez, as excessivas expectativas a
que estão submetidos. É um desafio que supera de longe as
forças humanas. Se os pais vivem sem religião, como
poderão transmitir o amor de Deus aos filhos? Já quando
mantêm e fortalecem em seus filhos diabéticos o acesso ao
mundo místico e religioso, estes, como provavelmente todas
as crianças, o acolhem com gratidão. Talvez, guiados por
uma profunda e íntima aspiração, intuam que, por esse
caminho, alguma coisa pode ajudá-los a estar à altura de sua
missão existencial, que é fazer fluir a energia e o amor vivo.
Além disso, para as crianças e os adolescentes, é mais fácil
aceitar a própria diversidade quando dispõem não apenas da
força criativa dos pais como modelo, mas também da
percepção de que também há um sentido no todo e,
portanto, um desafio construtivo.
Nesse fato poderiam ser encontradas as raízes de muitos
problemas ligados ao diabete. No caso dos adultos, muito
mais sujeitos ao de tipo II, o significado é evidente: quem
aposta na fartura (externa) em vez de apostar na satisfação
(interna) torna-se vítima desse comportamento, que se
refletirá na obesidade e no diabete.
Os choques, as vacinas e as doenças virais são
considerados fatores que desencadeiam o diabete juvenil.
Entretanto, como é possível que esse tipo de acontecimento
possa destruir o amor em termos tão radicais?
Mesmo em uma criança desejada e com sólida confiança
primária, uma experiência traumatizante durante os
primeiros seis meses de gestação pode causar uma
desilusão ainda mais profunda, uma vez que,
repentinamente, ela terá de constatar que o mundo não é
tão celestial como havia sentido até então. No entanto,
justamente sua confiança primária lhe permitirá desenvolver
com mais facilidade uma relação mais criativa, baseada na
responsabilidade pessoal.
Por outro lado, se o trauma afetar uma criança insegura
ou, em todo caso, com menos confiança primária, toda a
estrutura de sua vida poderá se desestabilizar até gerar um
grande desespero e fazer com que ela, em um ato
inconsciente de autodestruição, extraia à força de suas
células produtoras de insulina ao menos aquele amor
conquistável com a coerção. Nesse sentido, os acidentes
precoces, desde a queda de um balanço até traumas
causados por doenças virais ou vacinações, podem ter
muitos efeitos que introduzem em sua vida, também
intencionalmente, um estresse considerável, não
compreensível para uma criança. Os bebês experimentam
tudo de uma perspectiva unilateral, marcadamente
sentimental e não elaborada pelo componente intelectual. A
irrupção de vírus e a consequente guerra desencadeada no
corpo ou uma vacinação são vividas como uma ameaça, em
uma situação em que a criança se sente desprotegida e sem
amor, e podem levar a reações consideráveis.
Todavia, mesmo os abalos da alma poderiam ter o mesmo
efeito, fazendo com que se revivesse o choque da própria
origem; por exemplo, a insegurança causada por tentativas
fracassadas de aborto, das quais deriva o reconhecimento
de não ter sido desejado ou amado, até todas as
experiências familiares, que levam à consciência a falta de
uma aceitação originária.
O medo primário da criança é o de ser abandonado pela
própria mãe. Por meio do diabete, a criança a liga a si
própria muito mais intensamente e a longo prazo, afastando,
assim, seu maior temor. Nessas situações, a mãe é chamada
a trabalhar, com mais consciência, a construção da
autoconfiança do filho, para que ele possa amadurecer o
amor independente e criativo, necessário à própria missão
de vida.
A possível hereditariedade desse quadro clínico (tipo I)
mostra que a temática do amor, trazida para dentro da
família, pode se tornar uma tarefa que se estende até por
gerações.
No caso das crianças afetadas pelo diabete tipo II, cuja
maioria sofre manifestamente de obesidade ou está acima
do peso ideal, vários fatores estão em jogo. Crianças acima
do peso certamente recebem dos pais menos amor e mais
de seu substituto. Dominados pelo medo de perder o afeto
dos filhos, os pais se veem na difícil situação em que dizer
não e ser coerente muitas vezes são considerados falta de
amor. Na verdade, desse modo não estão demonstrando
amor, ou então o estão fazendo com um substituto, através
de uma recompensa. Às vezes, como os pais trabalham,
trata-se de uma simples compensação. No tempo restante, a
criança é coberta de brinquedos, programas de televisão e
jogos de computador em vez de amor. O alimento também é
escolhido exclusivamente conforme seu gosto, e ela logo
expressa sua rejeição, geralmente de maneira clara. Para
não desiludi-los ou por temor de ouvir: “Você não me ama,
prefiro ir com o papai (ou com a vovó, a titia, etc.)”, muitos
pais se submetem à vontade dos filhos. Quase todas as
crianças dominam perfeitamente esse repertório e sabem
usá-lo quando seus interesses estão em jogo e percebem
quando os pais estão com a consciência pesada. Tudo isso
dura até a capacidade de funcionamento das ilhotas de
Langerhans não se exaurir e surgir a chamada
insulinorresistência, ou seja, até as células não se tornarem
insensíveis à insulina e, por reflexo, passarem a produzi-la
em maior quantidade, gerando, consequentemente, uma
sensação de fome ainda mais intensa. Caso o organismo, já
bastante maltratado, tenha de aumentar ainda mais a
produção de insulina, o esgotamento completo dessa função
é apenas uma questão de tempo.
No caso de uma alimentação sem amor ou composta
apenas de seu substituto, as células se exaurem com tanta
rapidez que o diabete, originariamente senil, também
alcança aos poucos a infância. Esse fenômeno mostra com
clareza a que ponto chegamos no que diz respeito ao amor e
à alimentação.
Além desse dilema, em que não apenas a situação do
amor mas também a alimentação desempenham um papel
central, cabe naturalmente a seguinte pergunta: “O que veio
antes: o ovo ou a galinha?” Será que essas crianças, desde o
início alimentadas em excesso com as calorias vazias do
supermercado e, por conseguinte, acima do peso desde
cedo, pareciam menos amáveis? Ou será que se sentiam tão
pouco amadas desde o início que tendiam, como forma de
compensação, a comer em excesso, tendo ainda à
disposição apenas os alimentos pouco nutritivos das seções
de ofertas desses mercados?
 
Perguntas para os pais:

Nosso “filhotinho” foi realmente desejado?

Por que nosso filho não consegue receber nosso
amor?

Por que não se sente digno?

Somos capazes, ambos, de amar nosso filho
incondicionalmente?

Ele recebe dedicação suficiente?

Como a religio, a reconexão com as origens, no
sentido mais profundo, é vivida em nossa
família?

Nosso filho tem alguma razão para temer ser
abandonado por nós?
 
Medidas de apoio:

Em relação ao diabete tipo II, existe um grande
número de possibilidades no âmbito dos Pilares
da saúde[30] quanto à alimentação, ao
movimento e ao relaxamento.

Já no caso do diabete tipo I, trata-se de uma
missão de vida que requer, sobretudo, paciência
e humildade. O importante é ter em mente que
as missões existenciais não podem ser resolvidas
em pouco tempo. Todo ser humano
razoavelmente realista sabe que não é simples
desenvolver o amor incondicional. Nesse caso,
só se consegue uma familiarização com ele
através da consciência, da maturidade, do senso
de responsabilidade e da empatia. Também
devemos permitir aos nossos filhos que eles
utilizem o próprio tempo na vida para essas
tarefas. São poucos os outros objetivos que
contêm um desafio tão grande.

Dar e receber: a tarefa consistiria em encontrar o
meio-termo entre dar e receber. Obviamente, a
experiência da dependência de insulina também
pode ajudar a compreender as dependências
emocionais. Em qualquer idade, aquele que
consegue reconhecer e viver o dar e o receber
como os dois lados do amor e da realidade
também conseguirá desfrutar do doce da vida
em sentido figurado.
15 Problemas espirituais e emocionais

15.1 Medo
“Tudo é muito apertado para mim.”
 
Muitas vezes, o fenômeno psíquico do medo determina
alterações também no nível físico. A tensão dos músculos
aumenta, e o tônus elevado provoca outras consequências,
que modificam todo o ritmo do corpo; isso significa que a
respiração, a pulsação, a pressão sanguínea e, em última
análise, toda a fisiologia são influenciados. As secreções
corpóreas também se alteram: desde a tendência a suar (de
medo), passando pela diarreia (“fazer nas calças”, “borrar-se
todo”), até chegar à necessidade de urinar. Muitas vezes, a
tudo isso se acrescentam distúrbios de concentração e
inquietação, certa vigilância ou tensão, bem como distúrbios
do sono, apesar do cansaço.
Em geral, os medos infantis nem chegam a se manifestar
tão diretamente, e sim, por exemplo, por meio do
retraimento, do emudecimento, de um aumento da
agressividade ou das mudanças de comportamento. Nesse
caso, é particularmente importante entender o problema
observando as alterações físicas. Infelizmente, sobretudo os
meninos aprendem e tendem a não demonstrar seus medos.
Comentários tolos, como “homem não sente dor”, “seja
valente!” ou, pior, “homem não chora”, intensificam ainda
mais o dilema, embora, felizmente, essas pretensões de não
experimentar certos sentimentos e menos ainda mostrá-los
vão se reduzindo com o tempo.
Os medos se manifestam sobretudo na garganta,
apertando-a, na nuca, onde residem, e na respiração, que
podem bloquear. Muitas vezes, o medo está ligado à
sensação de sufocamento em um espaço apertado, de estar
preso, de ter caído em uma armadilha, de estar impedido de
se movimentar ou de encontrar limitações nas necessidades
essenciais da vida.
Os antroposofistas partem do princípio de que o medo é
percebido como “ser lançado de volta à estreiteza do corpo”.
O aspecto psíquico permaneceria represado no corpo. A
maior parte de seus pediatras considera que, até os 3 anos,
as crianças reflitam apenas o medo de suas mães. Até
então, elas seriam interessadas, despreocupadas e curiosas.
Desse modo, o medo materno pelo filho durante a gestação
corre o risco de se tornar o medo da criança. Um campo de
medo precoce imprime-se de maneira particularmente
intensa; de modo geral, podemos afirmar que, quanto mais
precoce, tanto mais indelével é sua marca. Na realidade,
tudo isso é contradito pelas experiências de terapia de
reencarnação, durante as quais constatamos que as crianças
sofrem plenamente o medo da morte já durante as
tentativas de aborto. O medo é um tema primordial, um
arquétipo que se aproxima muito do princípio saturnino. E,
como todos os arquétipos, tem dois lados, evocados por
André Heller em sua canção sobre o medo: “Existe um medo
que nos torna pequenos, doentes e sozinhos. E existe outro
que nos torna sábios, mais corajosos e mais livres da
desilusão por nós mesmos”.
Essa desilusão é a principal estratégia da nossa
“sociedade de seguros” contra o medo. Por esse caminho,
produzimos constantemente uma segurança aparente em
vez de reconhecermos que a vida é muito perigosa. A única
coisa segura é a mudança. Mesmo a exclusão da morte e
seu “remanejamento” por meio de tentativas ridículas como
os seguros de vida ilustram claramente nosso dilema. O
medo é maior do que pensamos; e, como bem mostra a
terapia de reencarnação, a criança já o traz para a vida. Isso
é facilmente compreensível se pensarmos que, em geral,
trata-se de uma alma antiga, que já passou por muitas
experiências, das quais conserva muitas lembranças,
embora estas, com o passar do tempo durante a gestação,
se desvaneçam progressivamente. São apagadas para
deixar espaço para novas experiências. Contudo, não são
poucas as crianças que conservam essas experiências
também por mais tempo, algumas delas até bem depois do
nascimento.
Essas experiências, bem como os medos provenientes da
cadeia das vidas, passam para segundo plano à medida que
a alma se apropria do corpo. No estágio inicial, quando as
estruturas do corpo ainda são transparentes, a respectiva
percepção é transcendente e próxima da unidade; ela ainda
abrange as existências anteriores. Aos poucos, porém, as
experiências transcendentais regridem na mesma proporção
da transparência.
Portanto, o modelo fundamental do medo já existe e pode
ser revivido muito facilmente. Nesse sentido, dever-se-ia
chegar a um acordo entre as duas concepções. Geralmente,
a criança não é um “anjo inocente”, como gostamos tanto de
considerá-la, mas também é tão novo neste mundo que,
como uma esponja, absorve os condicionamentos
preexistentes e rapidamente se torna o espelho dos pais,
especialmente da mãe. Como a criança assimila suas
percepções essencialmente através da mãe e dela recebe
sua energia, ela também absorve os medos maternos sem
nenhum filtro.
Contudo, evitar o medo seria, basicamente, o caminho
errado, pois as crianças precisam ampliar seu horizonte de
experiências e, ao fazer isso, viver quase obrigatoriamente
situações difíceis e medos. Em sua obra clássica
Grundformen der Angst [Formas Básicas do Medo], Fritz
Riemann escreve como os medos assumem nas pessoas um
caráter bem mais fundamental do que nos animais. O animal
cresce dentro do seu hábitat, que se torna cada vez mais
familiar para ele. Ao mesmo tempo, ele se torna cada vez
mais parecido com seus pais. A criança, ao contrário, teria
de sair ativamente do seu hábitat originário. Nas bases do
desenvolvimento humano estaria o questionamento dos
vínculos naturais e das relações transmitidas, inclusive os
dos pais e dos parentes de sangue. A dinâmica decisiva
nesse processo é representada pelo desenvolvimento da
consciência, do horizonte espiritual e do pensamento
individual. Inicialmente, ela conduz à individuação autêntica
do ser humano e, assim, à sua capacidade de pensar, decidir
e agir de modo diferente de seus antepassados e de seus
pais, bem como à faculdade de romper velhas pontes para o
mundo e de percorrer novos caminhos. No entanto, ao agir
dessa maneira, o próprio eu do ser humano em formação
enfrenta a experiência psíquica do medo. Durante seu
desenvolvimento, toda criança mostra esse processo.
Nesse sentido, provas de coragem como os rituais da
puberdade pertencem, enquanto provas da alma, ao
desenvolvimento cultural do homem; portanto, é necessário
que as crianças e os adolescentes o vivam conscientemente
e, assim, aprendam desde o início a dominar as situações de
medo. Portanto, a ausência de medo, por exemplo no caso
das crianças que sofrem de TDAH, não é uma vantagem; ao
contrário, é um aspecto patológico. Essas crianças “não
entendem alguma coisa”, falta-lhes a completa percepção
psíquica de determinadas situações.
Por conseguinte, o medo é natural e pertence à vida. Com
efeito, uma criança na cidade, sem medo de automóveis,
estaria perdida. Todavia, é surpreendente que a maioria das
crianças sinta pouco medo de ameaças reais, como
automóveis, mas sofra de muitos outros medos à primeira
vista irracionais.
Normalmente, os pais desejam poupar os filhos de todo
tipo de medo. Contudo, a longo prazo, essa estratégia
enfraquece os pequenos, colocando-os na defensiva e
reduzindo seu êxito na batalha da vida. Muito melhor seria
se os acompanhassem em seus medos. Pais sábios não
acendem a luz, mas avançam no escuro com o filho.
Tampouco vão para o outro lado da rua quando um cão se
aproxima; em vez disso, pegam a mão do filho para que
enfrentem o perigo juntos e até o olhem nos olhos. Acender
a luz e atravessar a rua seriam o caminho alopático; o
homeopático consiste no acompanhamento solidário pela
escuridão e em lidar com o suposto perigo.
Portanto, as crianças trazem dentro de si certa
predisposição ao medo, que se atualiza novamente no
momento do nascimento. E refletem de modo surpreendente
os medos dos pais. A vida moderna, que, especialmente nas
cidades, procede com uma estreiteza crescente e, como se
não bastasse, traz consigo separações frequentes e muito
precoces entre mãe e filho, dá sua contribuição à avalanche
de medo que hoje encontramos na prática clínica.
15.1.1 A nova epidemia do medo: os ataques de pânico

Há trinta anos, o conceito de “ataques de pân-ico” nem


chegava a constituir um tema na medicina. O que fez com
que esse quadro clínico, muitas vezes acompanhado de
sintomas vegetativos graves, crescesse como uma
avalanche certamente foi uma combinação de fatores. Além
das condições alimentares alteradas, um elemento
ulteriormente determinante poderia ser o fato de que a
moderna sociedade do bem-estar “poupa” seus filhos – com
boa intenção ou até inconscientemente – de todos os rituais
que poderiam reconciliá-los com Pã, o antigo deus da
natureza. Da cintura para cima, ele é um deus maravilhoso
que toca flauta (de pã) e encanta ninfas com seu som
celestial; porém, da cintura para baixo, é um indivíduo
diabólico e brutal, em contínua ereção, que violenta as
ninfas por ele encantadas.
Também por causa desse aspecto duplo, a natureza é cada
vez mais evitada. Já não confiamos nela, pois não podemos
controlá-la nem dominá-la até o fim e a tememos quando ela
se manifesta em forma de pequenos carrapatos,
tempestades violentas e memoráveis catástrofes naturais.
Por isso, como tudo que é reprimido e desprezado, ela
retorna para a vida pela porta dos fundos, através das
sombras, ou seja, do pânico.
Crianças e jovens têm uma necessidade natural de sair de
casa, de “experimentar o terror”, fazer viagens de
descoberta na natureza. Nisso residiria a extraordinária
possibilidade de poupá-los de ataques posteriores de pânico.
Por meio do conhecimento direto e consciente do velho deus
da natureza, bem como das criaturas, do espírito, mas
também dos seus demônios, elas poderiam ganhar outra
grande mãe: não apenas sua mãe física e sua avó, mas
também a mãe natureza. Quem já passou noites na floresta
ou na selva, na montanha ou na praia; quem conhece o
deserto e, sob o céu aberto, sente-se unido aos rumores, aos
sons e aos timbres do mundo natural, mais tarde não terá
problemas de pân(ico).
Naturalmente, também seria oportuno não reforçar esses
medos de modo artificial, fazendo com que as crianças
“comam” o medo em forma de carne proveniente de
grandes abatedouros. Devido ao terror de morrer, sentido
pelos animais ao serem abatidos, a carne é repleta de medo
e de hormônios do estresse. Consumir esse tipo de carne
significa, de fato, ingerir medo. Ao peixe certamente
tampouco é reservada uma morte “mais humana”; contudo,
seus neurotransmissores parecem não agir em nós do
mesmo modo, uma vez que, no plano da evolução, estão
muito mais distantes de nós. Por este e por outros aspectos,
o peixe constituiria, de longe, a fonte mais favorável de
proteína animal.
Outro medo é estimulado quando tentamos fazer com que
as crianças evitem todos os riscos e a vida. A contínua
vigilância, cuja intenção é impedir que a criança caia, que se
queime com uma vela ou morda uma casca de queijo dura,
cria medo e obstáculos ao desenvolvimento de uma
autoestima saudável e da capacidade de, no futuro,
aprender a avaliar com autonomia as situações da vida. Os
pequenos acidentes e as feridas impedem com muito mais
eficácia os grandes perigos e medos do que a vigilância
contínua. Por meio dos acidentes inofensivos, a criança
aprende a decidir sozinha e a adquirir a capacidade, de
acordo com sua idade, de administrar e superar as
dificuldades. A responsabilidade por si mesma em relação à
sua idade e, mais tarde, também pelos outros, é o modo
mais eficaz de sentir-se adulto na vida e, ao mesmo tempo,
de não desenvolver medos excessivos. Geralmente, os
ataques de pânico se desencadeiam por meio de uma
experiência avassaladora de desamparo e sujeição; já a
experiência do “eu posso” libera grandes e pequenos dos
seus papéis de vítima.
15.1.2 O nascimento como chave para o medo

Durante todo o processo do nascimento, a criança já vive


uma dupla iniciação ao reino do medo. Depois de atravessar
e sofrer, com medo, o estreito canal do parto, o recém-
nascido vive, imediatamente após o nascimento, a
experiência da amplitude. Ele terá de conquistar essa
amplitude e crescer nela, mas ela também pode lhe causar
medo. É o que se observa com especial clareza nos casos de
cesariana, em que a estreiteza é seguida, quase sem
passagem, pela enorme amplitude do espaço, com seu frio e
sua luminosidade ofuscante.
A própria situação anatômica já deixa claro que a
estreiteza do começo é aterrorizadora. No início da gestação,
a criança sente a extática ausência de peso ao boiar
livremente e a leveza flutuante do ser. Ela ainda não
consegue perceber os próprios limites físicos devido à
temperatura idêntica entre si própria e o líquido amniótico;
portanto, vive a percepção sem limites do infinito. Mais
tarde, durante o próprio crescimento, sua cavidade celestial
torna-se cada vez mais estreita, até transformar-se em uma
espécie de inferno terreno, uma prisão da qual tem de fugir.
A única saída é para baixo, indicada pelas dores do parto.
Mas ela significa que a criança terá de enfiar a cabeça na
pequena pelve da mãe, onde se vê como em uma morsa,
comprimida e apertada de todos os lados. A partir desse
momento, as dores de compressão a empurram
ritmicamente para a frente, embora a saída ainda esteja
fechada. A natureza usa a cabeça do feto como bate-estaca
para abrir a boca do útero. Nessa situação, sem verdadeiro
progresso, o medo da criança é existencial e máximo. A esse
respeito, as experiências da nossa terapia de reencarnação,
cujo componente fundamental é reviver o nascimento,
concordam inteiramente com as pesquisas do psiquiatra
Stanislav Grof sobre os estágios do nascimento, por ele
denominado “matrizes”.
Como naturalmente toda criança deve percorrer esse
caminho na vida, somos obrigados a deduzir que ela precisa
da iniciação ao medo e da estreiteza do nascimento. Se
superar o nascimento, conquistando livremente e com sua
cabeça relativamente grande o caminho para a vida, a
criança terá realizado seu primeiro e decisivo trabalho na
luta pela existência. Portanto, o medo pertence claramente à
vida.
Ao contrário do que ocorre com muitos animais, para nós,
com esse mergulho de cabeça no mundo, nada está feito
ainda. Sozinhos, os recém-nascidos não têm condições de
sobreviver, pois nasceram imaturos. Não podendo caminhar,
não são capazes de fugir; assim, ficam inteiramente
entregues ao ambiente que os circunda ou aos pais. Esse
fato também é fonte de medo, pois toda separação da mãe
poderia ser definitiva e, por conseguinte, ter o medo como
reação. Porém, no cotidiano moderno, é quase impossível
para a maioria das mães permanecer sempre ao lado dos
filhos. Essa é outra grande fonte de medo em nossos
tempos. Por outro lado, também existe claramente a
oportunidade, demonstrada pelo já mencionado “método
canguru” e por outras soluções semelhantes, de manter a
criança bem junto do corpo da mãe por um longo período. A
prevenção ao medo deveria iniciar já nesse momento.
 
Perguntas para os pais:

Do que temos medo e como lidamos com ele?

Nosso filho reflete nossos medos?

Qual é a situação em relação à nossa confiança
primária?

Como nos relacionamos com o tema da morte?

Deixamos espaço suficiente para nosso filho ter
suas próprias experiências e lhe damos apoio em
relação a elas?

Em que momentos nos sentimos desamparados
e abandonados?
 
Medidas de apoio:

Seria muito importante transformar o
nascimento em uma festa, no sentido das
descobertas feitas pelos obstetras franceses
Frédérick Leboyer e Michel Odent, a fim de evitar
a criação do modelo do medo ou revivê-lo.

Serotonina: outro passo para minimizar o medo e
estimular a sensação de bem-estar na criança
consistiria em provê-la de uma quantidade
suficiente do “hormônio do bem-estar”, a
serotonina. A mãe pode providenciá-lo durante a
gestação e no primeiro ano de vida,
assegurando-lhe as matérias-primas necessárias
e facilmente disponíveis nas Aminas, alimento
cru liofilizado. A partir do segundo ano de vida,
as crianças já podem beber sozinhas as Aminas
no suco de frutas. A única coisa a que se deve
prestar atenção é que a colher de alimento cru
triturado seja tomada em desjejum e seguida por
muito líquido, de preferência água, para que o pó
seja absorvido pelo estômago. Por meia hora, a
criança não deve ingerir mais nada. O bem-estar
e a abertura, que se tornam possíveis com uma
quantidade suficiente de serotonina, são o
melhor equilíbrio contra os medos.
 
15.1.3 Medos típicos das crianças nos vários estágios do desenvolvimento
15.1.3.1 Medo do escuro
O medo do escuro e, portanto, também da noite,
denominado pela medicina de pavor nocturnus (ver a seção
15.3.2.2), é o medo da sombra, do desconhecido, que muitas
vezes também se exprime no medo do “homem do saco
preto”. As crianças ficam fascinadas e, ao mesmo tempo,
com medo desse lado da sua alma. O encontro com o reino
das sombras é uma experiência primária do ser humano,
assim como o próprio medo, que ele não precisa aprender,
pois já o carrega consigo. Nas crianças também se
reconhece certa abertura, proporcional à sua confiança
primária, em relação aos âmbitos obscuros da própria
existência; já os adultos modernos, ao contrário, geralmente
recuam assustados diante desses aspectos. Entretanto, a
abertura das crianças se presta de maneira ideal para
acabar com o medo, uma vez que nada expulsa mais
rapidamente a angústia do que a abertura e a amplitude.
Assim como a luz desfaz as trevas, a amplitude dissolve o
medo. Mesmo que nesse caso o princípio alopático esteja em
primeiro plano, não deixa de fazer sentido. Além disso, é
importante dedicar-se “homeopaticamente” ao escuro e à
angústia através dos contos de fadas e das viagens da
imaginação. Esse procedimento é muito melhor do que os
procedimentos de pseudossegurança, como as estratégias
para evitar possíveis perigos e o controle constante embaixo
da cama para se assegurar de que ali não há nenhuma
criatura obscura. Como os contos de fadas sempre indicam à
criança o melhor caminho para lidar com o lado obscuro da
vida, elas oferecem uma saída confiável, pois sempre
terminam com a vitória sobre a escuridão e, portanto, com
uma experiência de sucesso.
15.1.3.2 Medo de fantasmas
O medo de fantasmas ou de espíritos tem uma origem
semelhante àquela do medo do escuro e se refere ao outro
mundo, ao reino da transcendência, do sobrenatural, dos
poderes obscuros do além, muitas vezes associados ao mal.
Esse fenômeno requer considerações semelhantes às já
mencionadas e, em vez de evitar esse mundo e criar tabus,
faria mais sentido fornecer à criança, talvez por meio de
histórias e contos de fadas, um acesso a essa dimensão e
certa segurança ao lidar com ela. A moda do “Harry Potter”
atende justamente ao desejo do oculto e das trevas,
ressaltando, desse modo, a necessidade de confronto com
os lados obscuros da vida.
Se os pais pegarem pacientemente seus filhos pela mão e
com eles viverem o que causa medo, as crianças se sentirão
compreendidas da melhor forma e, ao mesmo tempo,
protegidas e fortalecidas, uma vez que, em todas as
ocasiões semelhantes, estarão em condições de absorver
parte da coragem dos pais. Mesmo quando olham junto com
a criança embaixo da cama ou lhe dão uma lanterna de
presente, para que ela olhe sozinha, ajudam-na a construir
mais segurança e autonomia. A exortação “olhe o que te
assusta” também é o melhor conselho para as situações
posteriores em que a criança enfrentará medos abstratos ou
reais.
Cartazes com os dizeres “Proibida a entrada de
fantasmas!” também podem se revelar úteis em algumas
fases da vida. As crianças que acabaram de aprender a
respeitar as proibições atribuem o mesmo comportamento a
outros seres vivos, incluídos os espíritos. Além disso, é
natural que estes também obedeçam aos cartazes de
interdição, uma vez que provêm do mesmo mundo psíquico
e interno das crianças.
Com as crianças maiores, obtém-se uma dupla vantagem
ao se perguntar a elas: “O que faz com que você fique bem
forte para espantar os espíritos?” Por um lado, a criança
buscará a solução em si mesma (com o apoio e o
reconhecimento dos pais); por outro, terá a sensação do “eu
sei o que é bom para mim”, fortalecendo, assim, sua
autoconsciência.
15.1.3.3 Medo de ficar sozinho
O medo de ficar sozinho, bem como aquele do abandono, da
separação da mãe ou de perdê-la, equivale ao medo do
próprio desamparo. Esse medo pode manifestar-se
especialmente no ventre, onde a criança estava unida à mãe
pelo umbigo e pelo cordão umbilical. Depois de separadas do
corpo protetor da mãe, as crianças aprendem a se tocar, a
se acalmar e a ter confiança. Nessa fase, são muito
importantes as experiências táteis individuais na troca com o
ambiente mais próximo.
Os animais aliados e os anjos da guarda são muito úteis
nessa situação. Quem os tem ao seu lado nunca está
sozinho.
Com crianças mais velhas, também é importante fazer
com que se sintam bem sozinhas. A primeira experiência,
talvez enquanto a mãe vai rapidamente às compras, pode
indicar a direção a ser tomada no futuro. Adequadamente
preparada, antes e depois da temporária separação da mãe,
a criança pode perceber que, nesse breve período, consegue
administrar as próprias necessidades, podendo e devendo
decidir tudo sozinha.
É importante que a mãe seja confiável e retorne após um
tempo preestabelecido; igualmente importante será, mais
tarde, que ela possa ser encontrada por telefone, quando a
confiança não for suficiente. Depois de uma primeira
experiência positiva, normalmente o caminho é aplainado
para as posteriores, que também poderão ser feitas
conscientemente pela criança.
15.1.3.4 Medo de trovões
O medo de trovões reflete o temor da força primordial, do
poder insuperável, da natureza, de estar entregue, sem
proteção nem auxílio, e da perda total de controle em
relação ao divino, que se mostra em Zeus – deus grego, pai
dos deuses, lançador de raios – e em Thor, deus do trovão
para os povos germânicos.
Dependendo da idade, essas personificações podem
atenuar o medo. Nas crianças maiores, muitas vezes é útil
transmitir-lhes o espanto, em sentido positivo, com a
natureza, bem como o respeito ou a reverência para com seu
poder.
15.1.3.5 Medo de cães, insetos, aranhas e cobras
O medo de cães, especialmente daqueles que latem alto,
reflete o medo da agressividade, inclusive daquela do lobo
que reside na alma. Este simboliza os aspectos obscuros e
espirituais da violência e atua como guardião do reino dos
infernos, destruidor como o lobo Fenris dos germanos e
ameaçador como o cão Cérbero dos gregos. Para as
crianças, o reino dos infernos é, ao mesmo tempo,
repugnante e fascinante, e nisso reside uma grande
possibilidade. Se aprenderem a reconciliar-se com os cães e
com a agressividade, também conquistarão um acesso
natural à energia vital, que falta a muitos adultos e, mais
tarde, é mais difícil de ser trabalhada.
Por outro lado, quando falamos de “medo animal”,
estamos nos referindo a uma ameaça para a vida, que tem a
ver, sobretudo, com o fato de se estar à mercê dos
acontecimentos, como ocorre com os animais em relação
aos seres humanos, quando, por exemplo, são abatidos ou
torturados.
Obviamente, a humanidade internalizou experiências
ancestrais suficientes para nos transmitir a percepção da
absoluta periculosidade dos animais para a nossa vida. Nas
nossas cidades, onde a vida animal geralmente se reduz a
alguns insetos inócuos e a animais domésticos mansos, o
medo em relação a eles parece “anormal”; porém, do ponto
de vista da história da humanidade, é bem compreensível. A
interação com os animais, por exemplo na área do zoológico
em que as crianças podem tocá-los, ou com os domésticos
vai de encontro a esse medo, que normalmente é bastante
real. Nesse caso, a solução ideal seria substituir o medo pelo
respeito e por um cuidado razoável para com a criatura viva.
A melhor proteção contra o medo é uma confiança
primária sólida e a autoconfiança que dela deriva. Esses
elementos se formam nos primeiros meses de uma gestação
tranquila.
Durante a infância, a prioridade é oferecer à criança um
ninho possivelmente bem protegido, sem, contudo, incorrer
na síndrome da superproteção.
Os insetos causam medo porque perturbam nosso ego. Por
conseguinte, crianças muito pequenas não sentem medo
deles. O mesmo se pode dizer das pessoas que vivem em
contato com a natureza e que não se incomodam nem um
pouco, por exemplo, se moscas passeiam em seu rosto. Com
a expansão do ego e, consequentemente, da pretensão de
controlar o ambiente circunstante, de ser senhor na própria
casa e, de todo modo, do próprio rosto, os insetos são vistos
como incômodos e, no caso de grandes aspirações, como
assustadores.
A isso se acrescenta o medo de ser picado e lesado por
sua picada. Também poderia haver o medo de ser invadido
por aquilo que é estranho, uma vez que a própria película
protetora é ferida. Por meio da picada do inseto, a criança
torna-se consciente da própria vulnerabilidade fundamental.
Nesse caso, o medo é proporcional à dor sentida.
Quando há medo e dor, a pessoa se retrai por instinto,
alimentando naturalmente a sensação de estreiteza. Como
terceiro aliado acrescenta-se o frio. Esses três elementos
preparam mutuamente o terreno para si próprios e
fortalecem um ao outro. A esse respeito, é sempre
importante, em situações de dor, reduzir ao máximo o medo
da criança e proporcionar-lhe um aquecimento confortável.
Em situações de medo, é útil tentar recuperar pelo menos o
calor protetor e reduzir a dor. Analogamente, nas situações
de frio, também é importante reduzir a dor e o medo.
No caso de aranhas e cobras, trata-se do medo do
princípio arquetípico de Plutão e da própria perfídia
inconsciente, bem como do desejo de seduzir. Nossa
interpretação ocidental atribui, quase sem exceção, apenas
qualidades negativas a esses animais, ao contrário do que
fazem as tradições orientais ou indianas. Com o auxílio de
contos de fadas e mitos, elas também oferecem a
possibilidade de estimular o respeito, tão importante, por
esses animais.
15.1.3.6 Medo do novo
No caso dos dentes, que representam uma irrupção
frequente do medo na vida jovem, misturam-se o temor da
dor e o medo de tudo que é novo. O medo estreita e
aumenta a sensação de dor. Portanto, quando ele a provoca,
é necessário primeiramente eliminá-lo ou atenuá-lo, quando
possível, como meios sustentáveis. A dentição é a irrupção
do novo na vida, nesse caso, da agressão. Tudo que é novo
causa medo pela primeira vez. Depois de feita a experiência,
o medo se perde. Nesse sentido, o melhor a se fazer nesse
caso também seria acompanhar a criança em seu medo, por
exemplo carregando-a no colo durante a dentição. Mais uma
vez, como nos primórdios da vida, a criança precisa se abrir,
ampliando-se para um novo tema, e essa amplitude em
favor do novo, na abundância de possibilidades, pode
obviamente provocar medo e angústia.
Contemporaneamente à irrupção dos dentes, que se dá
por volta dos seis meses de vida, as crianças também
começam a interagir com o mundo que as circunda,
reagindo com medo a pessoas estranhas que até então não
as assustavam. A partir desse momento, podem aprender a
“separar-se” da mãe.
Nessa fase, provavelmente se torna mais difícil amamentá-
los, o que poderia levar ao desmame. Mas se a criança
continuar a mamar com vontade, não há razão para
considerar o desmame; a criança pode continuar a ser
amamentada, como ocorre nos povos primitivos. Os céticos
do campo da medicina acadêmica ou da moda, bem como os
consultores profissionais e os parceiros estão totalmente
errados a esse respeito.
O medo dos estudantes antes de uma excursão da escola,
devido à expectativa de sentir saudade de casa, denota falta
de coragem ao ir de encontro ao novo, ao diferente e a tudo
que não é habitual. Nesse caso, com pequenos passos no
sentido da dessensibilização, podem ser alcançados
verdadeiros progressos. Se a primeira viagem for para a casa
da avó, situada nas redondezas, e a mãe puder voltar a
qualquer momento, logo o medo é afastado. A partir desse
momento, podem-se empreender passos cada vez mais
corajosos.
15.1.3.7 Medo de repetir o ano ou de não conseguir progredir
O medo de repetir o ano na escola aviva aquele ainda mais
remoto de ser deixado para trás ou abandonado pela mãe.
Como originariamente isso significa a morte certa, esse
medo pode ser muito forte e ameaçador. O temor de não
conseguir progredir e ser deixado para trás é muito próximo
e semelhante àquele de não passar nas provas, de não ser
suficiente e de fracassar em caso de necessidade.
Normalmente, por trás disso se esconde uma falta de
confiança em si mesmo e, portanto, de confiança primária,
às vezes também uma espécie de perfeccionismo,
hereditário ou adquirido. A criança tem a sensação de não
ser suficiente, conforme já exprimem os conceitos
“deficiente” ou “insuficiente”, usados na escola. Nesse caso,
o medo de decepcionar e o de passar vergonha andam
juntos. A esse quadro também pertence a preocupação da
criança de ser amada somente se obtiver bons resultados
(na escola).
Portanto, é decisivo o temor da reação dos pais e dos
professores. Na ausência de quem julga os resultados, esse
medo logo se extinguiria. Pelo menos os adultos deveriam
ter esse mecanismo bem claro em mente. Isso não significa
renunciar ao resultado, mas poderia conduzir a buscar
métodos para exigir das crianças e estimulá-las sem inserir o
medo no jogo da vida. Até hoje, as sugestões do pedagogo
progressista inglês Alexander S. Neill, fundador da escola
Summerhill, baseada no antiautoritarismo, são
espetaculares, embora o próprio Neill nunca tenha utilizado
esse termo. Para ele, valia o princípio da “educação livre”
em vez daquele de “livre da educação”. Ele não era contra a
autoridade; ao contrário, dispunha dela de maneira
considerável. Falava de uma “educação autorreguladora”.
Ainda mais atuais e difundidos são os princípios da
pedagogia Waldorf, de Rudolf Steiner, e o método de Maria
Montessori.
Já se conseguiria muito transmitindo continuamente às
crianças a percepção de que, embora seu comportamento
possa causar raiva, tristeza ou decepção nos pais, estes as
amarão de qualquer maneira. Assim, elas aprenderão que a
tristeza, a alegria e a raiva são sentimentos que vão e vêm,
mas o amor fica. Se as crianças entenderem essa diferença,
que geralmente é mais compreensível para os adultos,
ficarão felizes junto com seus pais quando tiverem sucesso e
sofrerão com eles os fracassos, mas saberão que o amor
nunca é influenciado por isso. Essa confiança os
acompanhará de modo determinante na vida, sobretudo
durante as fases difíceis, como a puberdade.
O medo das provas e do consequente fracasso tem
aumentado cada vez mais na sociedade moderna, que mede
o valor das pessoas com base em seu desempenho. O medo
de errar dificulta especialmente o desenvolvimento, pois
somente através dos próprios erros a criança aprende a
integrar em sua vida o que lhe falta. Entretanto, seria bom
ajudá-la com sensibilidade para que não repita os mesmos
erros. Na idade adulta, vale o mesmo princípio: entre seus
melhores colaboradores, os chefes apreciam aqueles que
cometem erros, mas que cometem os mesmos erros apenas
uma vez.
Por outro lado, hoje também existem muitas crianças que
desenvolvem tão pouco o “supereu” – aquela instância
descoberta por Sigmund Freud que representa em nós a
sociedade e sua tradição –, que parecem indiferentes a todo
tipo de erro e a experiências como repetir o ano na escola.
Naturalmente, como extremo oposto, esta não é a intenção
dos referidos pedagogos. Embora não haja medo nesse caso,
o desenvolvimento fica comprometido.
Até certo grau, o medo de desafios, representados pela
escola, pelos professores e pelos colegas, é natural. Porém,
se de uma tensão compreensível e inócua derivar um medo
paralisante, é aconselhável pensar em um tratamento
homeopático. Alguns exercícios para potencializar a
confiança poderiam atenuar a alma. Também em casos de
medos mais extremos, podem ser úteis alguns exercícios
lúdicos em outros âmbitos análogos, como excursões de
exploração em cavernas. As crianças precisam encontrar aos
poucos sua própria posição e seu papel no novo ambiente
social. Pais presentes podem oferecer-lhes apoio e, aos
poucos, reduzir sua presença.
15.1.3.8 Medo de ladrões, sequestradores e de estranhos de modo geral
O medo de ladrões é inerente à sensação de estar à mercê
de si mesmo, de já não ser senhor do próprio terreno e de
perder o controle. Se o ladrão for particularmente temido na
figura de um assaltante, o aspecto do medo da perda é
acrescido. Nesse caso, é oportuno tomar consciência de
como esses medos são incentivados pelos pais e pelo
ambiente social, através das respectivas admoestações ou
experiências e, obviamente, através da grande quantidade
de filmes policiais.
No caso do medo de sequestro, coloca-se em primeiro
plano o horror de estar exposto a um poder estranho, mas
também o medo de perder o ninho familiar, que garante a
sobrevivência.
O medo de estranhos pode ser enfrentado com cautela já
no período em que as crianças começam a ter contato com o
mundo circunstante, mais ou menos a partir do sexto mês. A
mãe pode iniciar, muito lentamente, a afastar-se do filho por
breves períodos, confiando-o a outros membros da família e
a parentes, de maneira que ele possa habituar-se
gradualmente também a pessoas menos conhecidas.
Na maioria das vezes, os estranhos são amigos, cuja
existência a criança ainda não conhece. Quando se
consegue transmitir-lhe essa postura, o medo se dissipa.
Obviamente, o problema nesse caso refere-se ao polo
oposto, ou seja, ao medo, quase indispensável nos tempos
modernos, dos homens estranhos e que é inculcado às
meninas. Embora esse medo possa ser motivado por
experiências negativas a esse respeito ou por relatos
assustadores por parte de terceiros, muitas vezes ele
esconde a distância e a desconfiança em relação ao próprio
componente arquetípico masculino. Seria importante, por
parte dos educadores, explicar essa ambivalência. Se o
medo for levado a sério, ele pode ajudar as crianças a
transformar o temor e a desconfiança destruidora em
cautela e boa capacidade de observação, pois a ingenuidade
não é uma meta a ser ambicionada. Por conseguinte,
também é útil transmitir outro tipo de experiência, ou seja,
de que muitos homens são muito gentis.
Nas adolescentes, também podem ser úteis cursos de
autodefesa, que logo criam um contato e uma reconciliação
com a própria parte masculina.
Portanto, é possível ensinar às crianças a nunca irem com
uma pessoa estranha sem a permissão expressa dos pais –
quando se trata, por exemplo, de ir ao radiologista – e, ao
mesmo tempo, tirar-lhes o medo fundamental em relação a
pessoas estranhas e ao que é desconhecido.
Do ponto de vista psíquico, por trás disso se esconde o
medo do grande componente espiritual interior, ainda
totalmente desconhecido e, por isso, ameaçador.
15.1.3.9 Medo de guerras e catástrofes ambientais
Por certo, o medo de guerras e da destruição é estimulado e
desencadeado pela transmissão de informações, mas não é
causado por ela. Também aqui, caso se torne real, esse
problema esconde uma profunda participação da alma da
criança. Como em todos os outros medos, há que se prestar
atenção em quanto os próprios pais e, no início da vida,
sobretudo a mãe, contribuem para isso. As crianças
realmente são o espelho dos medos internos de seus pais.
Para aliviá-las, seria determinante se os pais enfrentassem
sozinhos seus problemas. Para os casos mais simples,
existem meditações conduzidas; para medos maiores, vale a
pena recorrer à terapia da sombra.
Obviamente, o medo de catástrofes ambientais também é
estimulado pelas respectivas notícias; no entanto, ele
permite pressupor uma considerável ressonância entre o
tema da insegurança e a criança, bem como sua
incapacidade de sentir-se segura em seu pequeno ambiente.
É importante não sobrecarregar a criança cedo demais
com medos mais ou menos justificados, pertencentes ao
ambiente dos adultos. Ao contrário, à medida que crescem e
participam das preocupações e discussões críticas dos pais
em relação à sociedade, ela poderá enriquecer seu
desenvolvimento em relação a esses temas existenciais.
15.1.3.10 Medo de doenças e da morte
O medo de doenças e da morte, até o limite extremo da
hipocondria, praticamente já faz parte da nossa cultura e se
fortalece cada vez mais à medida que esta renuncia a um
verdadeiro culto (da morte) e, com ele, à aspiração a ser
uma verdadeira cultura, para reduzir-se a uma pura
sociedade meritocrática. O medo da dor, do mal-estar e da
doença é um mecanismo natural de proteção. Porém, se os
pais, por medo de doenças, tornam-se fanáticos
extremamente preocupados com a segurança e vivem, por
princípio, de maneira rigorosamente saudável, evitando todo
tipo de intoxicações, bactérias, vírus, entre outros, ou
tomando uma grande quantidade de medicamentos,
vitaminas e sais minerais, as crianças perceberão
instintivamente o quanto seus pais consideram a vida
perigosa. O mesmo resultado se obtém quando vacinam os
filhos contra tudo, por puro medo da vida, transmitindo-lhes,
desse modo, a percepção da periculosidade do mundo.
Por outro lado, se se transmite de maneira convincente às
crianças, através do exemplo dos pais, que a rouquidão e a
tosse, o resfriado e a febre são “totalmente normais”, pois o
corpo sabe reagir e se defender, o medo desses problemas
desaparece.
O quanto esse tipo de atitude pode ser eficaz é o que
mostra a seguinte anedota: depois que a filha começou a
fazer aulas de equitação, sua mãe lhe contou que só poderia
considerar-se uma boa amazona aquela que caísse do cavalo
ao menos uma vez. Depois de algum tempo, a menina, de
fato, caiu, ficando com algumas contusões doloridas. Todos
ficaram surpresos ao constatar que, em vez de chorar e
sentir medo, ela se mostrou feliz por finalmente ter se
tornado uma verdadeira amazona! Avaliou suas dores como
parte da sua iniciação...
O medo de sentir dor, de se machucar, de perder a
incolumidade e a inocência aproxima-se ainda mais da
própria vida e é uma forma de autoproteção necessária e
natural. Porém, se for exagerado, é porque provavelmente
na base subsistem experiências dolorosas, pessoais ou
familiares, falta de confiança em relação a si mesmo e ao
próprio corpo. A confiança poderia ser reforçada com a
coragem para enfrentar doenças agudas, atividades
esportivas e de entretenimento, que atingem o limite da dor,
mas também com tudo que traz alegria para a própria
integridade e mostra como esta pode ser sempre
reconquistada caso seja perdida.
O medo da morte, que trazemos para a vida e que é
origem de todos os medos, é atualizado já durante o
nascimento na estreiteza do canal do parto. A melhor
maneira de trabalhá-lo é narrando contos de fadas e mitos e
alimentando a alma. Normalmente, as crianças tentam
superar o terrível trauma vivido no nascimento construindo
cavernas e as respectivas brincadeiras dentro delas
(exercícios para desenvolver a confiança, deixar-se cair para
trás, brincadeiras na água, mergulhos).
Uma nova fonte de medo é o pânico dos pais modernos
em relação à morte súbita. Obviamente, esse medo também
é transmitido à criança. A medicina, com suas tentativas
funcionais para impedir que essa desgraça aconteça,
alcançou uma nítida redução dos casos, mas também criou
uma nova e eficaz fonte de medo.
Uma boa possibilidade de reduzir o problema e superar o
medo que ele provoca seria utilizar o já mencionado
aparelho “Sleepy”, cujo sistema faz o berço oscilar e impede
que o bebê perca o próprio ritmo.
15.1.3.11 Medo da água e do fogo
O medo da água reflete o temor do aspecto feminino da
alma, daquilo que devora. Contudo, também pode ser
desencadeado por exercícios inadequados de natação, por
exemplo quando as crianças são lançadas, mergulhadas ou
obrigadas a se jogar prematuramente na água. Com esses
métodos brutais, alguns pais, que talvez sofram de algum
distúrbio emocional, mostram seus problemas, mas
certamente não resolvem os medos dos filhos. Aprender a
nadar desse modo é pior do que não sabê-lo. Dessa
experiência, não raro resulta um medo atávico em relação à
água, o elemento feminino da alma, e uma profunda aversão
ao “monstro” que o causou.
Com o tempo, e se não se prestar atenção, dessa situação
pode derivar uma mistura fatal, em que se é cada vez mais
rejeitado pelo elemento feminino e, por fim, também pelo
masculino, pois o pai é o “protótipo” da parte arquetípica
masculina para todo filho, assim como a mãe o é para a
parte arquetípica feminina. Só esses elementos já são
suficientes para se entender que função exemplar e decisiva
os pais representam para a futura vida dos filhos.
Nesse caso, a solução estaria em transmitir com brandura
o reconhecimento, na água e na temperatura do corpo, que
quase todo ser humano pode boiar se mantiver os braços
abertos acima da cabeça e confiar-se à água, se possível
sem medo. Além disso, os bebês e os recém-nascidos têm
uma vontade inata, derivada ainda do líquido amniótico, de
brincar na água no verão. Graças a esse aspecto e a uma
série de brincadeiras modernas na água para crianças,
deveria ser fácil reativar nelas o contato com essa alegria.
O medo do fogo e de se queimar, ao contrário, envolve o
clássico elemento masculino. Estamos sempre exortando as
crianças a não queimarem os dedos, tanto em sentido
concreto quanto em sentido abstrato. Como elemento
masculino, o fogo também é associado à energia, à força, à
coragem e à imposição, e se tudo isso é temido, vive-se de
maneira problemática toda a vida. Por isso, seria necessário
reconciliar a criança com esses aspectos e familiarizá-la com
a beleza do fogo, por exemplo na luz das velas e do sol, nos
fogos de artifício e nas velas mágicas, bem como através do
respeito por sua natural força primordial.
Uma criança que pode segurar a própria vela mágica,
ainda que suas faíscas a “belisquem” um pouco, mais tarde
poderá acendê-la sozinha e aproximar parcialmente o dedo
da chama, para constatar o que significa “quente”, e
desenvolverá a percepção da realidade e dos próprios
reflexos. Entenderá com mais facilidade por que não deve
brincar com fogo e o quanto as chamas podem machucar. A
tarefa construtiva dos pais consistiria em permitir que a
criança se confronte, de acordo com a idade, com a alegria
de “atiçar” alguma coisa e em estimular nela uma
disponibilidade razoável ao risco.
15.1.3.12 Medo pela família, medo da família
O medo pela própria família revela que a criança não
consegue sentir-se segura em relação às próprias pessoas de
referência nem em relação ao próprio ambiente. Não se trata
de um sinal de amor particular, e sim de falta de confiança.
Uma criança que está sempre presa à saia da mãe denota,
antes de tudo, medo de perder a mãe, pois, evidentemente,
não tem confiança nela. O amor deveria mostrar-se de outra
forma.
Inversamente, certa vez consegui tranquilizar uma mãe
que levou um tapa do próprio filho. Isso não é sinal de ódio
nem de rejeição à mãe – se acontece uma única vez –, e sim
um sinal de confiança excepcional. O pequeno malcriado
tinha certeza de que, mesmo batendo nela, continuaria a
seu lado.
Portanto, em caso de medo da própria família, a criança
deveria, antes de tudo, aprender a ter confiança e confiar no
próprio ninho, o que ela conseguiria mais facilmente se o
ninho fosse moldado para inspirar confiança. Abusos físicos
ou emocionais podem constituir razões para um medo
legítimo em relação a determinados membros da família,
que naturalmente devem ser revelados e elaborados.
15.1.4 O medo e o reflexo de Moro (da doutora Wibke Bein-Wierzbinski)

O reflexo de Moro (de Ernst Moro, pediatra de Heidelbeg) é


uma reação precoce de susto, por meio da qual o recém-
nascido, em suas primeiras semanas de vida (de quatro a
seis), reage a barulhos muito fortes e, às vezes, também a
impressões visuais inesperadas com mudanças bruscas de
posição e a consequente perda do equilíbrio. O recém-
nascido estende instantaneamente os braços para o alto,
que, em geral, ficam dobrados nas articulações dos ombros
e dos cotovelos. As mãos são abertas para cima, e os dedos,
esticados; as pernas se estendem ligeiramente. Por fim, a
criança “desaba” novamente em si: os braços se dobram,
recolhendo-se em um movimento de abraço, e as mãos se
fecham em punho. Essa reação de susto, em um recém-
nascido bem desenvolvido, é causada exclusivamente por
um “movimento” muito brutal ou por estímulos sensoriais
muito fortes; nunca ocorre durante o cotidiano normal. Assim
que a musculatura que sustenta a cabecinha se torna forte o
suficiente e o bebê já não a vira para trás de maneira
descontrolada, o reflexo de Moro deixa de ser desencadeado.
Diferente, porém, é o caso em que os lactentes são
comprimidos nas vértebras cervicais superiores ou quando
as duas vértebras superiores (atlas e áxis), que formam a
articulação da cabeça, não estão perfeitamente alinhadas.
Os recém-nascidos com essas disfunções na articulação da
cabeça chamam a atenção porque não conseguem sustentar
sozinhos a própria cabeça nem girá-la e apoiá-la do mesmo
modo dos dois lados, o que uma criança em
desenvolvimento normal está pronta para fazer desde o
nascimento. As causas das disfunções na articulação da
cabeça são múltiplas. As mais frequentes derivam de
compressões sofridas durante o nascimento ou depois de um
transporte errado e demorado do recém-nascido em
posições eretas.
Caso tenha ocorrido o deslocamento da vértebra cervical
superior, a pesada cabecinha do bebê já não conseguirá
manter-se ereta, e ele não conseguirá controlar sua posição.
Isso acarreta muitas irritações e atrasos no processo de
amadurecimento, que também se exprimem na ativação de
um reflexo de Moro muito rápido, forte e prolongado. Com
efeito, o desencadeamento dessa reação só pode ser evitado
com o amadurecimento da articulação do crânio e a
obtenção do controle da cabeça. Justamente na passagem
entre cabeça e pescoço, a chamada passagem cérvico-
occipital, os músculos e o tecido conectivo são
particularmente ricos em nervos. Estes estão em contato
direto com o órgão do equilíbrio e com determinados centros
cerebrais, nos quais se controla a coordenação motora
grossa e a fina. Por conseguinte, as disfunções no atlas
geram uma mudança na capacidade sensorial na região da
cabeça e da nuca, o que, por sua vez, pode provocar uma
hipersensibilidade contínua aos estímulos motores e às
outras solicitações sensoriais. Não há paz interior nem
satisfação.
Nesse caso, a confiança primária, que geralmente se
mostra já durante o período da amamentação, seja nas
mamadas, seja na percepção do próprio corpo, bem como na
exploração do mundo circunstante, em que o bebê
experimenta movimentos e posições de apoio, mostra-se
limitada. Com ela se altera o fundamento que lhe possibilita
ter confiança em si mesmo e no ambiente, confiança essa
que pode ser obtida através de experiências idênticas e
repetidas. As consequências são lacunas sensório-motoras e
a memorização de informações erradas em relação à posição
do corpo no espaço, que determinam contínuas avaliações
errôneas, insegurança e, por fim, medo e perda das
capacidades cognitivas.
A insegurança física e psíquica adquirida durante o período
da amamentação pode perdurar até a idade adulta.
Uma possível terapia para superar os medos que podem
ser atribuídos a uma disfunção da articulação craniana, com
subsequente e persistente ativação do reflexo de Moro,
consiste em fortalecer a musculatura da nuca e do pescoço.
Na maior parte dos casos, a musculatura do ventre, que se
fixa diretamente na coluna vertebral, é muito pouco
desenvolvida, de modo que acaba criando um desequilíbrio
entre a musculatura do pescoço e aquela da nuca; por
conseguinte, nas mudanças de posição, a articulação da
cabeça não é suficientemente protegida.[31]
15.1.5 Princípios gerais sobre a terapia do medo

Para que não surjam medos irracionais e neuróticos, seria


muito importante arranjar uma boa dose de confiança
primária. Como já foi dito, o período mais importante para
que isso aconteça é o início da gestação – que não deveria
sofrer nenhum tipo de distúrbio –, quando o feto flutua no
líquido amniótico na temperatura do corpo, pode ter a
experiência da união e se sente unido ao todo.
Evitar o trauma do nascimento também seria uma
contribuição fundamental para se ficar livre do medo.
Todavia, quando já é tarde demais para ambas as coisas, os
exercícios de flutuação, saltos e quedas livres podem ajudar,
embora a situação de base exija mais dos pais e das
crianças.
Estas podem adquirir e aprender a ter confiança mesmo
mais tarde na vida, tranquilizando-se, contanto que recebam
os cuidados suficientes e uma proteção eficaz no ninho. Isso
é possível até mesmo no tumulto das grandes cidades
modernas, que costumam ser hostis às crianças.
Outro modo para desenvolver a confiança nos pequenos é
deixá-los superar com autonomia doenças e sintomas, como
as típicas doenças da infância e a própria febre. Eles
também adquirem confiança quando, ao brincarem, caem e
se levantam sozinhos. Esse é um passo simbólico e
igualmente importante e extraordinário. A confiança cresce
com a experiência e a capacidade.
Um conselho geral para a elaboração dos medos consiste
em revê-los conscientemente e, dependendo do caso, com
um acompanhamento protetor. As condições ideais preveem
que as crianças sejam seguradas pela mão, tanto em sentido
concreto quanto em sentido abstrato.
Também é útil dar à vida um ritmo certo, cuja repetição
confiável já sirva para atenuar os medos.
Além disso, os rituais ajudam a reduzi-los, especialmente
quando são repetidos com ritmo. A criança aprende a confiar
neles e não se sente abandonada nem entregue sem
nenhum amparo ao desconhecido e ao novo.
Em geral, o medo surge quando a criança é exigida muito
precocemente e acaba sendo sobrecarregada, por exemplo,
quando é separada à força e muito cedo da mãe. Essa
separação desencadeia medo, que ela sentirá sempre que
essa situação se repetir. Quando exigimos alguma coisa das
crianças antes do tempo, criamos o medo. Portanto, a
melhor coisa a fazer é esperar delas apenas aquilo de que
são capazes e para o qual têm coragem. Obviamente, é
normal propor alguma coisa, assim como exigir, mas sem
sobrecarregar, pode estimulá-las. Quando hesitam, seria
importante estender-lhes a mão, como fazia Maria
Montessori.
Os antroposofistas dão muita importância à familiarização
das crianças com o ritmo o mais cedo possível, por exemplo
por meio de exercícios de eurritmia. É o que demonstram
experiências em sociedades arcaicas, nas quais, desde o
início, o ritmo faz parte da vida, como se percebe mais tarde,
de maneira positiva, em muitos aspectos.
Os exemplos tangíveis também transmitem confiança:
ouvir as crianças com paciência e levá-las a sério, deixar que
elas digam tudo o que têm para dizer e ser um bom modelo
para elas são medidas que ajudam a reduzir o medo. A
imitação e a frequente repetição promovem a confiança e
criam um campo energético de coragem e contato
consciente consigo mesmo. A melhor solução seria conseguir
motivar as crianças a abrir-se ao medo, até o susto passar,
poder ser nomeado e transformar-se em amplidão. Quem
(voluntariamente) dá espaço ao medo e busca confronto
com a estreiteza, aceitando-a, colherá a amplidão. Nesse
sentido, diálogos, pintura, movimentos ou música podem ser
uma extraordinária complementação.
Outro auxílio essencial está em tornar conscientes temas
primordiais, como ocorre com a leitura de contos de fadas.
“O conto de fadas de alguém que saiu de casa para aprender
o que é o medo”, por exemplo, mostra o quanto as crianças
querem viver e superar o medo. Até mesmo brincadeiras e
filmes de terror podem servir para esse fim se empregados
com consciência e o acompanhamento adequado. A esse
respeito, a influência da televisão, de vídeos e jogos no
computador é facilmente superestimada. Eles só podem tirar
da criança aquilo que está dentro dela e para o qual ela tem
alguma ressonância. Por outro lado, não é necessário dar
espaço a toda ressonância; pode-se, ao contrário, intervir
orientando e regulando a situação. Quem não tem medo não
o desenvolve por meio das brincadeiras.
A terapia do abraço também oferece um maravilhoso
arsenal para auxiliar as crianças em situações difíceis de
medo. Contudo, este deve ser bem compreendido em sua
essência, pois, embora a estreiteza desencadeada por essa
terapia tenha um efeito homeopático, ela pode gerar mais
medo se não for administrada com grande competência.
Nesse sentido, a própria Jirina Prekop, que criou essa terapia,
forneceu indicações e contraindicações precisas, para que
esse precioso método não seja mal empregado para reprimir
ou “pressionar” a criança. Ela desenvolveu a terapia do
abraço em uma base ética, cujo objetivo é renovar o amor
por si mesmo e pelo próximo, garantindo, assim, o
pressuposto mais importante para o desenvolvimento do
livre-arbítrio. Uma contraindicação seria, por exemplo, a
intenção de utilizar essa terapia como método educativo ou
para obter obediência. Outra contraindicação, resultante da
sua associação com a abordagem sistêmica de Bert Hellinger
e de suas constelações familiares, diz respeito àqueles pais
que recusam a ordem do sistema familiar. Essa abordagem
nem chega a ser considerada se, por exemplo, a mãe
despreza o pai da criança ou vice-versa.
O tema da terapia do abraço é um profundo conflito
emocional entre dois membros da família, impossível de ser
superado em nível verbal. A ausência de verbalidade diz
respeito não apenas a crianças pequenas ou aos mudos, mas
também a adultos inteligentes com profundo sofrimento
psíquico. No abraço apertado, tanto a mãe quanto o filho
recebem a possibilidade de confrontar sentimentos feridos e
de renovar o amor recíproco. A agressividade é admitida,
mas apenas na forma refinada do confronto por meio de
frases expressas em primeira pessoa e da atenção ativa,
sem a violência física e destrutiva. O objetivo de fundo desse
método é que o processo não termine com o consolo ou a
resignação, e sim na alegria do amor renovado. “Eu te
abraço até o amor voltar a fluir!”, diz uma das frases
decisivas de Jirina Prekop, e, desse modo, o abraço se torna
uma forma primordial de se tornar gente.
Entretanto, ele se torna uma terapia quando o ser humano
já se distanciou dessa forma primordial e o amor se perdeu.
Como muitos erros de comportamento e muitos medos dos
pais são transmitidos aos filhos, o abraço não se inicia com
estes, e sim com os pais. E como estes também já foram
filhos que precisaram igualmente de uma reconciliação com
seus pais, os avós também são envolvidos. Esse método se
apoia na verdade arcaica, expressa no quarto mandamento,
segundo o qual o ser humano pode viver bem e por muito
tempo na Terra se honrar seus pais.
Segundo Jirina Prekop, essa reconciliação é a expressão
mais frequente do trabalho com o abraço, que também pode
se estender a visualizações com aqueles que, por causa da
morte ou da idade, não podem ser “derrubados”.
Obviamente, os pais também entram no jogo como casal. A
eles se pede que, através de seu próprio modelo, envolvam
as crianças na compreensão do abraço, fazendo dele uma
forma de vida para a família.
A maioria dos medos tratados neste livro e muitos dos
quadros clínicos poderiam ser curados se enfrentados com
essa forma de amor, expresso ativamente; uma árvore deve
ser analisada e tratada não a partir de seus frutos, mas a
partir de suas raízes. Portanto, também nesse caso, o amor
se apresenta como o melhor remédio.
Não se trata de culpar os pais, e sim de equilibrar as
condições desfavoráveis de vida. Como a experiência da
gestação e do nascimento, com a consequente maternidade,
são de central importância para a vida que virá, tanto a
terapia da reencarnação quanto a do abraço dedicam-se
com métodos especiais a esse primeiro período. Jirina Prekop
desenvolveu o abraço do nascimento; no centro de cura
holística de Johanniskirchen foi criada uma terapia especial
mais curta, de uma semana, para tratar o medo e superar,
em sentido literal, a estreiteza primordial e todos os medos
que dela derivam. É surpreendente observar como as
pessoas se revigoram depois dessa experiência e tendo
reconquistado a confiança (primária) em relação à mãe
(natureza).
A ajuda determinante, comum a todas as tentativas de
ajudar as crianças em seus medos, consiste em concentrar-
se no essencial, em viver o momento e agir com base no
aqui e agora. Quando se consegue entusiasmá-las no
momento presente, elas saem do medo, pois este vive do
passado ou do futuro. O objetivo final para a solução dos
medos está no polo oposto, à medida que se trata de
ampliar-se, abrir-se e libertar-se na estreiteza.
 
Perguntas para os pais:

Que medos transmitimos ao nosso filho?

Que medos ajudam nosso filho a desenvolver
sua própria competência e uma autoconsciência
saudável? Como podemos ajudá-lo nesse
processo?

Em que medida nosso ambiente pessoal
promove o medo: condições de habitação menos
estreitas do que as existentes em nível espiritual
e dogmático?

Como nosso filho se comporta quanto à nossa
relação com a natureza? É possível pensar em
um encontro com a mãe natureza e o antigo
deus Pã? Como podemos promovê-lo?

E como é a relação com a confiança primária e
com a autoconfiança?

Em que circunstâncias falta ritmo vital?

Estamos em condições de nos entregar?

Como lidamos com nossos medos? Somos
capazes de confessá-los mutuamente?

Como mãe ou pai, já passei por alguma situação
real de medo?

Em que medida a necessidade de segurança
excessiva predomina em nossa família?
 
Medidas de apoio:

Cotidiano regular: o ritmo vital cria segurança.

Lidar cautelosamente com todas as impressões:
os pais devem prestar assistência na elaboração
de estímulos, por exemplo, provenientes de
vídeos, filmes, televisão e jogos no computador.

Eliminar a sobrecarga e, por exemplo, a pressão
por expectativas na escola.

Rituais noturnos, que preparam para a noite
(rezar, ler histórias, cantar com a criança, dançar
etc.). Conversar à noite sobre as atividades do
dia seguinte, para criar segurança. Conscientizar
a criança dos êxitos obtidos e, nos momentos em
que lhe falta coragem, despertar sua recordação
emocional.

Estimular o tato por meio de massagens; deixar
a criança brincar com lama, cremes e espuma.
Escolher roupas feitas de tecidos naturais e
deixar a criança brincar com objetos de madeira,
modelar a argila e trabalhar no jardim.

Cartazes de “Proibida a entrada de fantasmas!”:
construir com a criança um cartaz de proibição
aos fantasmas, ladrões e ao que mais lhe causar
medo. É preciso transmitir verossimilmente à
criança a convicção de que os fantasmas vão
obedecer aos cartazes tal como os adultos ou as
crianças na rua obedecem a uma placa de
“pare”. Se o cartaz for pendurado na porta ou na
janela do quarto da criança, o fantasma não terá
vez.

Movimentos oculares migratórios: uma técnica
muito simples e que dá ótimos resultados com as
crianças é a elaboração do medo e de um
trauma através dos movimentos oculares
migratórios. Junto com toda uma série de
exercícios, essa elaboração é descrita em meu
livro Notfallapotheke für die Seele [Farmácia de
Emergência para a Alma].

Sugestão de livro para os pais: o livro infantil
Lukas und die Monster unterm Bett [Lukas e o
Monstro Embaixo da Cama], cujo texto é de fácil
compreensão e vem acompanhado por
ilustrações sobre os métodos para atenuar o
medo, bem como pelos pontos de acupuntura a
serem estimulados.

Florais de Bach e de arbustos: algumas misturas
mostraram-se muito eficazes nos casos de medo,
mas devem ser escolhidas individualmente, de
acordo com o medo de cada um, como na
homeopatia, que dispõe de inúmeros remédios
para o tratamento dos medos infantis.

15.2 Enurese
“Estou com vontade de chorar.”
15.2.1 Enurese noturna
15.2.1.1 Base evolutiva do “quadro clínico”

Os terapeutas antroposóficos partem do pressuposto de que,


muitas vezes, a enurese não é um verdadeiro quadro clínico,
mas apenas um momento de hesitação no processo de
amadurecimento. Parte das crianças nunca consegue ficar
limpa; outra parte é reincidente. Geralmente, o problema se
resolve sozinho na puberdade; na maior parte das vezes
quando surgem os primeiros pelos pubianos. Por outro lado,
são claras as indicações de que a problemática de deixar
passar, ligada a esse sintoma, continuará em outros
problemas semelhantes na vida futura.
Segundo Friedrich Graf, as crianças superam fisiológica e
conscientemente a enurese apenas entre o quarto e o quinto
ano de vida, pois somente então as vias nervosas, por meio
das quais é possível o controle voluntário, estão
amadurecidas. Por conseguinte, tudo que ocorrer antes
desse período é por puro treino. Isso equivale a dizer que
grande parte das nossas crianças seria apenas treinada com
êxito. Por outro lado, entre os povos primitivos que não
conhecem as fraldas, a consciência do processo de excreção
se forma muito precocemente, geralmente até os 2 anos, o
que dificilmente poderia ser atribuído a um treinamento.
Em todo caso, a aspiração à higiene pessoal, que entre nós
costuma ser precoce, deve ser atribuída a uma espécie de
treinamento e, por conseguinte, é prejudicial. O ingresso no
jardim de infância, no quarto ou quinto ano de vida, é o
tempo em que as crianças se limpam naturalmente. O
quarto ano é o último em que as crianças ainda estão se
familiarizando com o que lhes é estranho, antes de
aprenderem a se soltar temporariamente dos pais. Nesse
período, a maior parte das crianças afetadas pela enurese é
submetida a tratamento. Antes dessa idade, as mães
geralmente compensam o problema com mais trabalho, mas
se torna impossível escondê-lo, pois as crianças devem e
querem alçar voo, e toda noite passada fora de casa se
transforma em um penoso drama.
As crianças que fazem xixi na cama até os 4 anos também
são as mais vitais, que não se deixam ensinar e dão livre
curso às suas necessidades naturais, no verdadeiro sentido
da expressão. Esta poderia ser uma das razões pelas quais
as meninas são apenas parcialmente afetadas pela enurese.
Em geral, elas são visivelmente mais adaptáveis e “mais
fáceis” de serem treinadas. Para elas, o treino costuma
iniciar-se ainda antes e, por conseguinte, tem um efeito mais
profundo.
O amadurecimento relativamente tardio das vias nervosas
necessárias explica-se pelo fato de que os seres humanos
são totalmente diferentes dos animais nidífugos. Na verdade,
viemos ao mundo muito cedo e levamos muito tempo para
amadurecer. A natureza dotou os cangurus e os outros
marsupiais australianos da cômoda bolsa em que transcorre
o período de amadurecimento, na qual não é necessária
nenhuma fralda, pois a reduzida quantidade de líquido é
reabsorvida pela mãe. Os cães e gatos lambem
constantemente seus filhotes para que o “ninho” permaneça
limpo. Por outro lado, através do contato com a língua,
desenvolve-se uma elevada sensibilidade dos genitais e dos
orifícios, que são úteis em ambos os aspectos. Nesse meio-
tempo, sabemos que todo contato físico nessa idade precoce
solicita a formação de novas sinapses. Desse modo, os
órgãos de excreção ou suas portas de saída são preparados
antecipadamente para suas tarefas futuras. De maneira
semelhante, para o “filhote” da espécie humana, o contato
físico com essas regiões, já muito sensíveis porque dotadas
de muitas terminações nervosas, seria um bom estímulo
para o crescimento. As massagens em torno dos genitais
aumentam sua sensibilidade e são recomendadas
justamente pelos antroposofistas que, no que se refere a
essas regiões, costumam aconselhar grande reserva.
15.2.1.2 Choro no nível mais inferior
A principal razão pela qual os meninos são duplamente mais
afetados pela sintomática da enurese do que as meninas
poderia residir no fato de que estas, como já mencionado,
são educadas de maneira diferente. Os meninos, por
exemplo, não devem chorar. Com frases incrivelmente
estúpidas como “homem não chora”, toda expressão de
emoção, mas sobretudo o choro, em seu caso é conotado de
maneira negativa desde cedo. Tipicamente, a “chorona” é
uma menina, e o “espoleta”, um menino.
Se partirmos do princípio de que a enurese nada mais é do
que uma forma alternativa de choro, um choro inferior, por
assim dizer, quando em cima não é consentido, explica-se a
grande diferença entre ambos os sexos. As meninas podem
deixar escorrer as lágrimas pelos olhos, pois, em seu caso,
chorar é considerado normal e, de todo modo, não se torna
tabu. Já os meninos, que aprendem a fechar todas as
comportas para poderem se tornar “homens de verdade”, e
aos quais não resta nenhuma outra válvula de escape, a
repressão em cima estimula a soltura embaixo. Nesse
sentido, a perda de controle durante a noite é tão forte que o
esfíncter da bexiga, com o extravasamento inferior, ou seja,
com a enurese, substitui a função das lágrimas retidas em
cima.
Isso pode acontecer apenas nos momentos em que eles já
não têm um controle consciente, a saber, quando estão
dormindo. Porém, como o cochilo da tarde raramente causa
enurese, somos levados a concluir que a criança também
precisa dos sonhos noturnos. Eles têm início somente depois
da primeira hora e meia de sono, durante a fase REM (Rapid
Eye Movement = movimento rápido dos olhos), e criam a
ligação com as imagens interiores da alma, uma válvula de
escape para permitir que as coisas tenham seu curso. Os
adultos conhecem a situação, ainda que felizmente rara, de
sonharem já ter ido ao banheiro e serem despertados pela
primeira gota, que, com essa técnica sutil, escapa-lhes na
cama.
Em primeiro lugar, entre as causas do reaparecimento do
sintoma estão três preocupações: por exemplo, no caso em
que um recém-nascido toma o lugar do irmão. Isso significa
que as crianças tendem à regressão e querem voltar a ser
pequenas. Analogamente, a separação dos pais – no caso de
crianças que durante o dia parecem enfrentá-la com muita
coragem e ser fortes para amparar a mãe já triste – levará a
expressar a dor da perda à noite por meio da enurese. Um
novo namorado da mãe também pode fazer o sintoma
reaparecer, nesse caso significando: “Cuide primeiro de
mim”. Ou, ainda pior: “Se você deixou o papai ou o mandou
embora, agora chegou minha vez”. Em suas percepções, as
crianças costumam ser injustas a esse respeito. Até mesmo
um pai que tenha saído de casa de espontânea vontade
passa a ser valorizado em sua imaginação e, às vezes, até
idealizado.
Muitas vezes, as crianças mais velhas também podem
apresentar esses sintomas. Outro possível elemento
desencadeador, além do nascimento de um irmãozinho, é a
atividade profissional da mãe. Nesse caso, as lágrimas
noturnas exprimem, além da saudade da mãe, um protesto
contra ela. Por fim, mesmo quando os pais não exercem
nenhum tipo de pressão, pode acontecer de especialmente
os primogênitos a exercerem por si próprios. Por exemplo,
quando o irmão mais novo os ultrapassa em algum aspecto
evolutivo, como receber notas mais altas na escola, ser o
mais bonito ou ter mais amigos.
15.2.1.3 Compensação noturna da pressão
Com frequência, também são afetadas famílias em aparente
harmonia. A criança percebe exatamente o que acontece,
mas ninguém fala a respeito, ou então as sensações são
liquidadas com frases do tipo: “Seja o que for que você
tenha...” E, à noite, a emoção (aquosa) finalmente pode
escorrer.
Por fim, por trás desse sintoma, podem estar escondidas
inteiras dinâmicas familiares inconscientes, como muitas
vezes emerge das constelações familiares; ocorre, por
exemplo, quando um membro da família é marginalizado ou
morreu sem que se tenha vivido o luto. A criança assume,
então, uma função de representante e, à noite, “chora”
através da bexiga pela pessoa em questão. Se esse contexto
for trazido à luz durante uma constelação familiar, o sintoma
melhora e, às vezes, até desaparece.
Além do que já foi dito, existe um tipo de “enurese por
excitação”, que se apresenta apenas em episódios isolados,
por exemplo, antes de importantes trabalhos escolares ou de
uma grande viagem. Também nesse caso, evidentemente, as
crianças realizam durante o dia um esforço tão grande,
apesar da enorme excitação, que somente à noite
conseguem liberar nos sonhos a tensão acumulada.
Isso nos conduz àquele amplo grupo de crianças que
fazem xixi na cama porque sofrem a pressão do
desempenho, vivem para seguir compromissos, não têm
tempo livre, e sua consequente e contínua tensão já não
deixa espaço para a regeneração. Se entre as solicitações
precoces e os cursos intensivos na escola já não restar
tempo para brincar e relaxar, em algum momento e em
algum lugar essa pressão extrema deverá fluir e,
possivelmente, com mais facilidade à noite. Em um caso de
enurese noturna, após o esclarecimento terapêutico de suas
motivações, a mãe de um pequeno paciente acrescentou:
“Meu filho realmente não tem tempo de ir ao banheiro
durante o dia”.
Contudo, essa pressão também pode provir da própria
criança. Um menino com inteligência e talento acima da
média, que passava intencionalmente de cursos para
crianças superdotadas a testes para inteligência de elite e
cuja mãe se opunha criticamente a essa tendência,
comentou com habilidade sua frequente enurese noturna:
“Mãe, esta noite suei de novo!”
Os medos podem desempenhar outro papel, embora uma
expressão como “estou me borrando de medo” se refira,
antes, ao esfíncter posterior. Algumas crianças realmente
sentem tanto medo à noite que não conseguem criar
coragem para se levantar e preferem fazer xixi na cama a
expor-se ao escuro e a seus fantasmas.
Muitas vezes, também pode tratar-se de medos bastante
prosaicos. Um pequeno paciente sentia constantemente um
medo tão grande de que seu severo pai bioecologista
pudesse descobrir o walkman escondido embaixo do
colchão, que essa pressão o levou a urinar na cama. Durante
o dia todo o menino ficava tão tenso e sentia-se tão
ameaçado por todo tipo de descoberta que, durante o sono
profundo, perdia totalmente o controle, sendo ajudado pelo
esfíncter da bexiga.
Mesmo em relação à enurese existem diversos subgrupos.
As crianças que urinam já durante a primeira fase do sono
provavelmente sofrem de uma grande pressão ou são
fortemente reprimidas. No primeiro e mais profundo ciclo do
sono, ou seja, na hora dos espíritos antes da meia-noite, o
relaxamento também é mais profundo. Por outro lado, as
crianças que urinam na cama nas primeiras horas da manhã
poderiam produzir uma grande quantidade de urina – ou
água de descarga da alma – para conseguirem segurá-la até
despertar e, por assim dizer, acabam transbordando.
Com a bexiga, é convocado o órgão com cujo auxílio a
pressão é suportada ou exercida, como ocorre na escola,
quando as crianças querem fugir do professor. Na
psicoterapia, os próprios adultos às vezes também recorrem
a esse caminho, refugiando-se no banheiro para não
enfrentarem situações e temas desagradáveis. Portanto,
inconscientemente, as crianças que fazem xixi na cama
restituem aos pais a pressão que recebem durante o dia. De
fato, os “anjinhos inocentes” fazem com que suas mães
lavem suas roupas sujas todos os dias. Quando o fenômeno
não ocorre ou ocorre apenas muito raramente fora de casa,
a problemática se amplia até a punição inconsciente da mãe.
Outra razão seria que a criança simplesmente relaxa apenas
com a mãe, sem cair no descrédito. Em todo caso, a mãe é
envolvida e, por isso, poderia entender uma ocasião como
um desafio para lavar as próprias roupas sujas. Seja como
for, a criança afetada pela enurese lhe mostra o tema, que
tem algo de escandaloso, sobretudo se a criança aqueceu
por horas, com o calor do corpo, a água da própria alma.
Além da já desagradável situação externa, acrescenta-se o
componente interno, não menos opressor, com o pedido
indireto à mãe: “Lave minha sujeira e se ocupe (ainda) mais
de mim, embora eu seja difícil”. Em outras palavras: “Ame-
me independentemente de como eu me comporto”. Em
última instância, implora-se aqui pela experiência do amor
incondicional.
Com o “calor úmido” produzido por ela mesma, a criança
poderia até tentar substituir a sensação nostálgica de calor
do ninho. Na regressão de toda noite, ela sempre recria uma
atmosfera de líquido amniótico, como era no ventre
materno. Se a mãe, a seus olhos, já não possibilita um ninho
suficiente, as crianças que sofrem de enurese o criam quase
sozinhas, regredindo profundamente durante a noite e
liberando-se por completo, ou melhor, liberando sua água.
Assim como durante a dentição, quando as crianças
evocam com a irrupção dos dentes ou da agressividade toda
a possível agressividade dos pais, pelas noites em branco
que estes passaram, as que urinam na cama apresentam
todas as manhãs uma montanha de roupa suja a ser lavada
pela mãe. No início, ela aguenta, mas, com o tempo, até a
mãe mais calma e bem-intencionada perde a paciência.
Quando as crianças produzem um cheiro ruim que se eleva
até o céu é porque estão enviando um claro sinal: alguma
coisa não está absolutamente em ordem; ao contrário, está
extremamente obscura! E todos sentem o cheiro, mas quase
não falam a respeito. Mas os pais deveriam discutir o
assunto e perguntar ao filho o que o deixa tão triste e o que
o faz sentir-se pressionado ou até chantageado. Eles
poderiam tentar descobrir em que âmbito o filho precisa de
mais espaço para expressar-se e oferecer-lhe a consequente
disponibilidade. Em uma situação como essa, é tão difícil
quanto necessário demonstrar amor incondicional e total
abertura sem as consequências negativas.
Em vez disso, muitas mães acabam sofrendo uma
considerável pressão interna e externa, vivendo a enurese
como uma espécie de guerra de poder com o filho. Não raro,
o choro inferior é percebido como um ato extremamente
agressivo e enfrentado com as medidas (ameaçadoras)
equivalentes. Estas, porém, nunca poderão ajudar de fato,
gerando, ao contrário, uma sensação inconsciente de
impotência na criança e, em alguns casos raros, também
evocarão um desejo de vingança.
15.2.1.4 Ajuda em vez de vingança
Talvez se devesse mencionar aqui a “coberta de alarme” e
“cueca/calcinha campainha”, que, ao entrarem em contato
com a umidade, soam um alarme, despertando a criança de
seu sono mais profundo, quando já é tarde demais e tudo já
está molhado. Em todo caso, o calor da atmosfera que
lembra o líquido amniótico é arruinado de modo
traumatizante. De efeito ainda mais brutal é o método da
sede, com base no qual as crianças já não recebem nenhum
líquido para beber a partir da tarde. Entretanto, a maioria
das crianças continua a urinar na cama, mesmo em
condições penosas, que podem chegar à exsicose, estágio
que antecede a desidratação. Uma medida muito mais
atenuada em seus efeitos, mas igualmente inútil, é o
“truque” de acordar a criança, antes de os pais irem dormir,
para levá-la ao banheiro. Esse excesso de idas ao banheiro
enquanto a criança está dormindo não traz nenhum
resultado e só prejudica a regeneração.
Faria mais sentido tomar consciência da pressão cotidiana
que pesa sobre a criança, descobrir o medo, a dor e a
tristeza que se escondem por trás dela e que a fazem sofrer.
Em última análise, seria oportuno motivá-la a encarar as
exortações e a pressão como um desafio. Uma combinação
útil poderia ser feita criando-se momentos de relaxamento
durante o dia e reagindo à pressão excessiva e ao estresse
com brincadeiras agradáveis, que permitam que a criança se
solte. Também é necessário criar válvulas de escape
alternativas, que substituam o transbordamento da bexiga.
Os pais deveriam estimular o choro natural em vez de
desvalorizá-lo: tanto as lágrimas de alegria quanto aquelas
de tristeza produzem um efeito relaxante, mesmo quando a
criança chora de rir. Normalmente, a bexiga é aliviada
quando as crianças têm a oportunidade, em outras
situações, de se soltarem completamente e regredir até os
primeiros estágios da evolução.
Desse modo, as pessoas afetadas deveriam encontrar
espaço suficiente durante o dia para as lágrimas e os
sentimentos arquetipicamente femininos, como o sofrimento
e a tristeza, mas também para outras emoções, como a
alegria e a raiva, aliviando, assim, o período noturno. Por
outro lado, porém, também deveriam aprender a suportar e
enfrentar a pressão vivida durante o dia. O ideal seria
colocar as crianças em condições de comunicar aos pais, de
maneiras diversas e conscientes, suas necessidades. Assim,
os pequenos comportados, habituados a dizer sempre sim e
que não dão trabalho durante o dia, mas requerem um
cuidado excessivo à noite, se tornariam crianças exigentes e
pretensiosas, capazes de se defender cara a cara, durante o
dia, inclusive no que se refere às aspirações dos pais.
Do ponto de vista da medicina acadêmica, essa
argumentação obviamente exclui as patologias do órgão,
como pregas na uretra ou ataques epiléticos noturnos. Um
tratamento hormonal à base de Minirin, que contém
desmopressina, substância semelhante à vasopressina, que
também pode ser administrada através de spray nasal ou
sob forma de comprimido, realmente pode ajudar. Em todo
caso, seria uma medida melhor do que as tentativas já feitas
com antidepressivos, que, por certo, eram eficazes apenas
em casos de grave sofrimento. Se o problema se reduz a
uma produção insuficiente de ADH (hormônio antidiurético),
pode ser útil em casos extremos, por exemplo, nas
excursões com a escola, um tratamento à base de
hormônios semelhantes. Contudo, o percentual de
reincidência em seguida é de 100%.
A experiência médica e a naturopatia oferecem muito
pouco em relação à enurese. Os pés frios, que são sempre
um sinal de medo, obviamente devem ser aquecidos antes
do sono com escalda-pés, como treino para a bexiga, ou com
uma bolsa de água quente, com exercícios Kneipp ou
massagens nos pés. Um bom apoio para esses períodos
difíceis pode ser proporcionado pelo sistema “Sleepy”, que
com seu ritmo produz um nítido alívio.
A mistura dos florais de Bach Aspen (medos
desconhecidos), Mimulus (ansiedade conhecida) e Cherry
Plum (a bomba-relógio interna) mostrou-se eficaz. Contudo,
também nesse caso, o melhor caminho é a homeopatia
clássica, pois ela considera a criança do ponto de vista
holístico e não se concentra apenas em sua bexiga, que
geralmente é saudável.
15.2.2 O reflexo de Galant: déficit de endireitamento como causa da enurese (da
doutora Wibke Bein-Wierzbinski)

Se a criança continua a sofrer de enurese noturna ou diurna


depois dos 6 anos, sem viver um período suficientemente
longo de latência, é provável que a causa seja algum
distúrbio de amadurecimento dos centros superiores, que
não se desenvolveram de maneira regular ou o fizeram de
maneira desacelerada.
Também é possível que o esfíncter esteja muito fraco.
Nesse caso, além das influências psíquicas, deve-se prestar
atenção nos distúrbios físicos e neuromotores. Estes devem
ser levados em consideração nas crianças que, em seu
desenvolvimento motor na primeira infância, o chamado
processo de endireitamento, demonstrem peculiaridades. Por
exemplo, disfunções na articulação do crânio podem
manifestar-se com posturas encurvadas, assimétricas e
movimentos monolaterais. Todavia, é igualmente possível
que fases inteiras do desenvolvimento sejam puladas e
suprimidas, como apoiar-se nas mãos na posição de bruços,
ou chupar os pés na posição de costas por volta do sétimo
mês de vida. Outras crianças pulam a fase de engatinhar ou
não conseguem girar, passando da posição supina para a
prona.
Todas essas particularidades, às quais não se costuma dar
muita importância durante o período de amamentação,
poderiam conduzir, ao longo do crescimento, a formas
permanentes de imaturidade. A esse respeito, no caso das
crianças que sofrem de enurese, é necessário observar a
pelve não ereta e a coluna vertebral instável, às vezes com
protuberâncias nos corpos vertebrais. Além disso, com
frequência nessas crianças desencadeia-se o chamado
reflexo espinhal de Galant (segundo o médico suíço S.
Galant). Trata-se de um reflexo exteroceptivo, com base no
qual, ao se acariciar a pele ao lado da coluna vertebral, se
provoca imediatamente uma contração da musculatura ao
redor da coluna. Normalmente, essa relação entre o estímulo
externo e o enrijecimento da musculatura posterior de
sustentação pode ser observada entre o quarto e o terceiro
mês de vida. A partir desse momento, essa musculatura de
sustentação é fortalecida e consolidada com tecido
conjuntivo.
O desencadeamento do reflexo de Galant não está
diretamente ligado ao esvaziamento da bexiga; porém, sua
ativação persistente nas crianças maiores – às vezes até a
idade escolar – denota um processo de amadurecimento não
concluído: a posição da pelve em relação à coluna vertebral
não é a ideal, e a criança ainda se encontra em pleno
processo neuromotor de endireitamento. A persistente
instabilidade da coluna vertebral, bem como a postura
errada da pelve, provoca uma contínua solicitação dos
nervos espinhais que surgem entre os corpos vertebrais.
Especialmente na região do osso sacro, ocorre a irritação dos
respectivos nervos espinhais, responsáveis pelo controle
funcional da bexiga. O processo de amadurecimento é
sempre perturbado. Na medicina antroposófica, recomenda-
se a massagem no osso sacro, que é considerada um recurso
comprovado contra a enurese.
Outros exercícios para treinar os movimentos da criança
na primeira infância também são importantes e,
posteriormente, recuperam as fases do amadurecimento.
[32] Vale a pena prestar atenção nos seguintes pontos:
 

posição da pelve;

rotação externa das pernas;

fortalecimento da musculatura da coluna;

capacidade de torcer os corpos vertebrais um para o
outro (cintura escapular contra a cintura pélvica);

fortalecimento da base pélvica;

fortalecimento da musculatura do baixo-ventre.
15.2.3 Enurese diurna

As razões desse sofrimento cotidiano variam da vontade de


provocar os pais, passando por aquela de pressionar a mãe,
até chegar à tensão ou ao grande entusiasmo durante uma
brincadeira ou a um programa na televisão que as crianças
não querem interromper e, por isso, não chegam a tempo ao
banheiro. Elas têm, por assim dizer, algo mais importante
em mente do que ir ao banheiro, e isso acaba se tornando
uma espécie de “gestão errônea do tempo” na primeira
infância.
Se urinar na cama serve como um instrumento
inconsciente ou semiconsciente para pressionar a mãe, toda
a questão pode atingir o nível de uma verdadeira
chantagem. Desse modo, as crianças querem obter a
atenção da mãe e forçar sua consideração. Muitas vezes, as
mães são totalmente receptivas a essas formas de
chantagem, pois não raro têm medo da inflamação
reincidente da bexiga ou porque sentem vergonha dos filhos
que já são “grandes” mas ainda fazem xixi na cama; elas
consideram esse fato um fracasso pessoal, pois não
conseguiram educar os filhos para terem asseio.
A tarefa das crianças consiste em aprender a dar curso às
coisas em um nível mais oportuno, exprimindo no tempo
oportuno suas legítimas emoções e liberando a pressão em
um nível mais adequado.
Do mesmo modo, a tarefa dos pais também seria permitir
que as coisas tivessem seu próprio curso e que os filhos
lidassem, se possível, sozinhos com o problema. Além disso,
seria útil individuar válvulas de escape, com as quais as
crianças possam aliviar a tensão em outros níveis. Se o
problema se repetir com frequência, os pais devem se
perguntar por que seus “pequenos” tentam
(necessariamente) obter atenção por esses meios. Certa
gestão precoce do tempo, marcadamente infantil, com a
qual as crianças aprendem que tudo tem seu tempo traria
algum alívio: brincar e comer, beber líquido e fazer xixi.
Porém, mesmo nesse contexto é muito eficaz construir os
respectivos rituais, que, se bem inseridos na vida cotidiana,
garantem não apenas segurança, mas também, nesse caso,
o asseio.
Entretanto, é decisivo tirar a pressão desse problema
opressor. Por exemplo, se nos trajetos de automóvel as
crianças precisam sempre “fazer xixi”, seria útil programar
pausas desde o início, para não precisar parar toda hora.
Assim, ao se tirar a pressão do problema, já se obtém uma
redução de toda a problemática.
Certo controle, sob forma de teste, para verificar se se
trata de um jogo (de poder) ou de uma real pressão da
bexiga, pode ser feito com arenque salgado de alcaçuz ou
outros tipos de salgadinho, sabendo que se trata de um
teste, e não de uma terapia de longa duração. Se a criança
comer os salgados mencionados durante o trajeto de
automóvel, por exemplo, evidentemente sua bexiga deverá
sofrer menos pressão, e, por conseguinte, ela conseguirá
segurar por mais tempo a vontade de urinar, pois o sal
retém o líquido no corpo e, portanto, alivia temporariamente
a bexiga.
A enurese também pode ocorrer como sintoma de uma
regressão. Isso ocorre com crianças já relativamente
orgulhosas por irem sozinhas ao banheiro, bem como por já
saberem comer com a própria colher ou caminhar sozinhas,
sem serem conduzidas pela mão. De repente, interrompem
todas essas habilidades e regridem a um nível infantil
inferior. Voltam a fazer xixi nas calças, querem que lhes
deem comida na boca e as carreguem no colo. Ao se
analisarem as causas desses comportamentos, constata-se
de várias maneiras que a criança inveja seu irmão mais novo
e também quer voltar a ser pequena, para usufruir
igualmente dos cuidados maternos.
Jirina Prekop aconselha os pais a não forçar o filho a ter
autonomia nem puni-lo em nenhuma hipótese, e sim a levar
seu desejo a sério e a exaurir seus pedidos com abundância,
ao invés de insuficiência. Segurá-lo, transportá-lo no colo e
dar-lhe a comida prestam-se como um jogo amoroso de
papéis. “Você ainda pode ser pequeno...” Na verdade, a
criança ainda não estava suficientemente madura em
relação à identidade do seu Eu e, por isso, caiu em
regressão.
 
Perguntas para os pais:

Como podemos oferecer mais espaço ao nosso
filho para que ele viva seus sentimentos?

Por que ele se sente sob pressão? Sua pressão
vem de fora ou é produzida por ele mesmo?

Qual sofrimento não notamos nele? Como
podemos ajudá-lo a vivê-lo?

Sob que aspecto ele precisa de mais atenção e
calor do ninho?

Estamos exercendo sobre ele expectativas muito
elevadas?

Estaria ele sofrendo por sua ou por nossa
ambição?

Existem situações de pressão no jardim da
infância, na creche ou na escola?
 
Medidas de apoio:

O relacionamento com a criança: não ralhar com
ela. Deve-se elogiá-la (sempre se encontra
alguma razão), ter paciência. Recompensá-la,
ajudá-la a perder a vergonha e o medo de
fracassar. Também se deve reduzir a pressão
pelo seu desempenho, ouvi-la, introduzir um
cotidiano regular, planejar tempo livre e dedicar-
se a ela.

Escalda-pés em temperatura crescente: cuidar
para que ela se aqueça, pois nenhuma criança
deve ir para a cama com os pés frios. Nesse
caso, são úteis a bolsa de água quente ou os
escalda-pés noturnos. Sente a criança na borda
da banheira e coloque os pés dela num balde
dentro da banheira. Deixe a água morna escorrer
no balde, até ficar cada vez mais quente e
chegar aos joelhos. A temperatura ascendente
não apenas aquece o corpo inteiro, mas também
estimula o sistema imunológico. Para que o todo
se torne um agradável e relaxante ritual noturno,
aconselha-se a leitura ou a narração de uma
história. Depois, deite a criança na cama e, se
necessário, ponha meias de lã quentes.
Uma variante técnica muito mais simples é o
aparelho para circulação do doutor Schiele, uma
espécie de banheira para os pés, semiautomática.

Fricções: à noite, antes de ir para a cama,
massagear e friccionar com óleo de hipérico o
lado interno das coxas e a região do cóccix.
Desse modo, a atenção é canalizada para a
“região problemática”; além disso, o óleo
promove um aquecimento.

15.3 Distúrbios do sono


“Não consigo pregar o olho.”
 
O sono é uma necessidade fundamental. Quando não
funciona, o indivíduo fica perturbado e, com o passar do
tempo, é seriamente ameaçado. Se a noite deixa de ser o
período de regeneração, toda a vida para de funcionar. A lei
da polaridade o exprime com clareza: “Se a noite não for
boa, o dia tampouco será bom”. Mas também: “Se o dia não
for bom, a noite tampouco será boa”. Crianças e adultos
precisam, em igual medida, da tranquilidade e da
regeneração noturna para darem conta das atividades do
dia. Somente quando o sono melhora é que o homem pode,
aos poucos, tornar-se ser humano.
Como para os adultos, entre as crianças a necessidade de
sono é muito individual. Crianças pequenas dormem o dobro
do tempo de vigília. Não fosse assim, terminariam muito
cedo e com demasiada frequência no mundo desperto da
polaridade. Um mundo exterior que promove um contínuo
estado de vigília corresponde ao espírito da nossa época,
mas certamente não é saudável nem desejável para o
desenvolvimento. Contudo, se o estado de vigília
corresponde ao ritmo espontâneo da criança, a tentativa de
forçá-la a uma “quantidade saudável de sono” não produz
nenhum benefício. Ao contrário, quando o sono se degenera
em uma luta de poder, acaba-se determinando uma situação
quase insolúvel para o presente e, no futuro, adormecer
passa a ser um ato programado como problema.
O sono traz os lactentes para o mundo primordial da
unidade. Também durante o dia, quando voltam o olhar para
o “terceiro olho” e sonham de olhos abertos, muitas vezes
olham para o reino dos anjos. O sono do corpo permite à
alma uma viagem de volta à sua casa, o reino do além, o
mundo sem espaço nem tempo.
O sono é sempre regeneração e retirada; por isso, é ainda
mais importante no início da vida do que mais tarde. A cama
é como uma reprodução do útero. Quanto mais semelhante e
familiar, tanto melhor. Se, além disso, a criança puder se
aninhar na mãe, sentindo seu calor, ela se aproximará ainda
mais de sua origem, o útero. Os homens primitivos,
habitantes das cavernas da mãe terra, aninhavam-se uns
contra os outros para se aquecerem durante a noite,
imitando essa situação. Eram seres humanos mais jovens em
comparação a nós, modernos, que eventualmente podemos
nos permitir uma cama de design no meio do quarto
espaçoso. Quanto mais jovem ou arcaico é o ser humano,
tanto mais ele criará uma cavidade para dormir, empurrará a
cama para um canto e se encolherá em plumas macias, que
lembram a mucosa materna. Não são poucas as crianças
que gostam de sentir embaixo e em cima de si um leito de
plumas, no qual podem afundar e ficar completamente
cobertas. Mas também se observa o contrário entre elas,
quando retiram tudo de cima de si. O único perigo é a
tentativa de agir assim com tudo.
Os antroposofistas são da opinião de que o ritmo do sono
deve ser aprendido aos poucos. Obviamente, isso está entre
as tarefas dos pais e, no mundo moderno, muitas vezes é
difícil. Se os próprios pais não seguem um ritmo, certamente
não poderão transmitir nenhum. O sono das crianças é
sensível, e seu ritmo pode ser facilmente comprometido. Em
viagens, vê-se com clareza como um campo ainda não
estabilizado pode ser perturbado com facilidade, enquanto
um campo já estável dificilmente sai dos eixos. Esse é o
motivo pelo qual as viagens são muito mais difíceis para as
crianças do que para os adultos.
Nos primeiros anos de vida, o ritmo do sono é
continuamente perturbado por influências externas, novas
experiências, impressões, mas também por desafios, e é
sempre colocado à prova. Há sempre uma razão para a
inquietação interna e para a ameaça ao ritmo do sono, ainda
muito sensível nessa fase da vida: desde as cólicas dos três
meses, da passagem da amamentação para a papinha e da
mudança para a própria cama, mas, naturalmente, também
da dentição até as primeiras doenças da infância. Mesmo
mais tarde, a entrada no jardim de infância e o início na
escola, com a respectiva troca de contatos sociais,
representam grandes desafios para quem está crescendo e,
às vezes, marcam a vida inteira. Seja como for, as crianças
precisam sempre reencontrar o próprio ritmo, aprendendo a
se adaptar; desse modo, sempre requerem dos pais uma boa
dose de flexibilidade e capacidade de adaptação.
15.3.1 Ritmos e rituais confiáveis

Pessoas de todas as idades, mas especialmente as crianças


pequenas, aprendem “imitando”. Isso significa que os pais
deveriam viver, como exemplo, em um ritmo sustentável e
permitir que o filho possa se inserir em um campo de ritmos
vitais, no qual o ritmo seja não apenas aquele fixo, de sono e
vigília, mas também aquele regular das refeições. Os
lactentes que sofrem das cólicas dos três meses ainda não
encontraram seu ritmo para mamar e, por conseguinte,
também sofrem os efeitos desse dilema. Quando a dentição
se inicia, não raro o ritmo já encontrado volta a se perder.
As psicoses da amamentação também surgem a partir de
problemas de ritmo, quando a mãe, devido a uma
amamentação muito frequente, precisa acordar várias vezes
e já não consegue atingir a fase REM, ou seja, aquela dos
sonhos, deslocando, assim, as imagens oníricas interiores
para a realidade externa.
Os distúrbios infantis do sono são apelativos, ou seja, por
meio deles, a criança busca mais dedicação. Alguma coisa
não está funcionando direito, a criança não encontra seu
próprio ritmo e, por isso, não consegue crescer. O hormônio
do crescimento (HGH), que só é produzido durante o sono,
não entra em ação, e a criança não consegue se regenerar.
Desse modo, pode ocorrer a situação ambivalente de ela se
sentir cansada demais para dormir e não encontrar a curva
para o outro mundo.
No primeiro ano de vida, trata-se de distúrbios que
ocorrem no adormecimento e na continuidade do sono.
Praticamente não há criança que, nesse período, durma sem
interrupção. A maior parte delas também mama durante a
noite. Quando os problemas para dormir se iniciam mais
tarde, as crianças acordam assustadas, refugiam-se na cama
dos pais ou da mãe. Os medos mais frequentes se referem a
estar sozinho ou ser abandonado, ao escuro, ao “homem do
saco preto” (que geralmente se encontra embaixo da cama),
a fantasmas, ladrões e à morte. Predomina, portanto, o
medo do mundo da sombra.
A tarefa dos pais seria estimular seus filhos a se
confrontarem desde cedo com os temas da sombra, por
exemplo narrando-lhes contos de fadas, que quase sempre
se movem no reino da sombra e consolidam esse percurso
clássico na alma. O rico mundo arquetípico dos contos de
fadas é nitidamente superior ao da televisão e dos filmes;
suas possibilidades de elaboração estão muito mais
próximas da alma, e o perigo da superexposição aos
estímulos é bem menor.
Como acontece com os adultos, em caso de distúrbios na
fase de adormecimento, trata-se do medo de perder o
controle. Com esse distúrbio, a criança revela falta de
confiança (primária). A atmosfera não predispõe a se deixar
o dia para confiar no mundo feminino da noite. Outras
causas podem estar nas expectativas causadas pela escola
ou por grandes desafios, como viagens e mudanças de
residência. Algumas crianças também tendem a se
preocupar (demais) e a espantar o sono com seus
pensamentos.
Nos dias de hoje, muitas vezes elas simplesmente não
estão cansadas o suficiente, pois o dia não as exauriu. É o
que ocorre quando praticam muito pouco exercício ao ar
livre e, ao mesmo tempo, recebem muito estímulo da
televisão ou do computador.
Adormecer é se entregar e é necessário confiança para
que se consiga ficar sozinho e se abandonar. Não são poucas
as crianças que adoram adormecer junto com o pai ou a
mãe, confiando inconscientemente no antigo sistema tribal,
em que todos dormiam juntos para se aquecerem e se
protegerem.
No início da vida, os pais têm uma grande participação nos
distúrbios do sono de seus filhos, que os refletem também a
esse respeito. Depois do nascimento, os pais também
precisam encontrar novos ritmos, mudar e reorganizar
completamente sua vida. Especialmente no primeiro ano de
vida da criança, não raro os pais desenvolvem problemas um
em relação ao outro. Se o pai estava presente no parto e se
deu conta de que sua “garota” tornou-se não apenas mãe,
mas também mulher, enquanto ele, ao contrário, chegou à
paternidade apenas do ponto de vista jurídico, mas ainda
continua um garoto, os problemas (psíquicos) já estão
programados – por exemplo, ele sente dificuldade em estar à
altura, do ponto de vista sexual, de uma mulher adulta ou,
em outros casos, não consegue superar o trauma do cenário
ensanguentado do parto. Outro aspecto conflituoso ocorre
quando a criança se torna a causa do esgotamento da mãe
já muito requisitada e acaba comprometendo a sua
sensualidade.
Esses conflitos dos pais costumam refletir-se nos distúrbio
do sono dos filhos. Pais ostensivamente furiosos, com
déficits sexuais, emocionais e de tranquilidade deparam com
mães que sofrem com a falta de sono, de compreensão e de
apoio e que não encontram paz, pois seu filho também não
tem nenhuma e, portanto, ela não tem como existir.
As soluções deveriam incluir o que foi dito anteriormente.
Os bebês se aninham facilmente nos braços ou até nos
ombros dos pais. Assim, nos movimentos oscilantes da mãe,
mesmo quando ela está só caminhando, sentem seu ritmo.
Cantar canções de ninar ou mantras amplifica ainda mais
esse efeito. Igualmente eficaz é o ritmo oscilante do berço,
sobretudo os que contêm o sistema “Sleepy”, e dos
carrinhos de bebê. Às vezes, pais desesperados põem os
filhos no carro e ficam dando voltas no quarteirão até a
princesinha ou o principezinho pegar no sono. Mas quando
os tiram do carro, com todo o cuidado, ele/ela voltam a
acordar. Obviamente, seria melhor manter o ritmo e
continuar a embalar o bebê também ao tirá-lo do automóvel.
O filhote do ser humano, que nasce prematuramente,
ainda precisa de muitos cuidados e, na verdade, de um
marsúpio como o do canguru; por isso, o método canguru,
tantas vezes já mencionado, é tão eficaz. Tudo que se
assemelha a ele é útil.
Em primeiro lugar, valeria lembrar o ritual do sono, que, na
melhor das hipóteses, deveria constituir o fim do ritual
noturno, cujo decurso claro e sempre repetido é um auxílio
confiável. Depois do jantar, deve-se tirar a roupa usada
durante o dia e lavar os traços deixados por ele. Essas duas
ações concluem ritualmente o dia. Acompanhar essas ações
com explicações podem ajudar as crianças a compreender a
importância dos rituais e a se predisporem a eles com
consciência.
Ao vestirem o pijama, a roupa da noite, dão outro passo
importante. A escolha de um bichinho de pelúcia como
companheiro noturno também pode assumir uma
importância central no ritual do boa-noite. Às vezes, porém,
também será determinante um fetiche noturno, sempre
igual, para acompanhar e facilitar todo adormecimento
através da sua presença e de sua carga positiva, que, com o
tempo, se tornará cada vez maior.
A passagem consciente da posição vertical, em pé, para a
horizontal, deitada, constitui outro passo importante na
regressão noturna. Se a criança quiser continuar sentada,
isso é sinal de que ainda não está totalmente pronta para
abandonar o controle da consciência e, portanto, não
adormecerá. Mas quando vai escorregando aos poucos da
posição sentada para a deitada, esse sinal fala por si.
Como já mencionado, contar ou ler histórias antes de
dormir pode abrir o caminho para os braços de Morfeu
através do ritmo da palavra ou da canção de ninar. Quando
os pais dispõem do instrumento da meditação induzida,
encontrarão possibilidades ainda mais elegantes para fazer
com que seus filhos adormeçam da maneira correta. O
capítulo “Meditar com as crianças”, no livro Reisen nach
Innen [A Viagem Interior] pode ajudar nesse caso. Mas
também uma oração, de preferência como conversa direta
com Deus ou com a Mãe de Deus, pode ter efeitos
milagrosos. Quem conversa com Deus e conclui o dia em
Seu nome, obviamente consegue entregar-se mais
facilmente a Seu reino.
Determinados sons associados ao sono, e que são
familiares por serem sempre repetidos, também se mostram
eficazes. A caixinha de música, que sempre toca a mesma
melodia e apenas antes do adormecimento, ou, de
preferência, a canção de ninar pode conduzir ao reflexo
condicionado que introduz o sono de maneira quase
automática.
Com as crianças maiores, a conversa à noite, junto da
cama, pode ser importante, especialmente no caso dos
meninos, que durante o dia respondem apenas
laconicamente a perguntas como: “Como foi a escola/o
esporte/a excursão?” No período noturno da tranquilidade,
permitem que seus problemas cheguem à superfície, e,
assim, os pais conseguem ficar sabendo e esclarecer o que
durante o dia se agitava inconscientemente na alma.
Um capturador indiano de sonhos pode despertar em
algumas crianças a vontade de sonhar, fazendo com que o
sono pareça indiretamente fascinante.
Naturalmente, é importante nunca forçar essas conversas
noturnas, mas apenas colocar-se à disposição. Quanto maior
a criança, tanto mais liberdade terá para decidir o que quer
contar e o que prefere manter em segredo.
Entre as condições externas para um bom sono, é
prioritário manter os pés aquecidos em ambiente frio. Pés
frios significam medo, e criança com medo não consegue
dormir ou dorme mal. O calor no local onde se dorme é uma
analogia importante com o ventre materno e sinônimo de
confiança. Em contrapartida, o mundo exterior, como na
realidade, deve ser fresco. Comparado ao ventre materno,
tudo é frio, e é correto que seja assim. Já durante o sono, as
crianças não devem receber cuidados extremos nem ser
mimadas, e sim aprender a suportar algumas coisas
fisicamente. Para tanto, precisam de um lugar seguro, para
onde possam se retirar, como no ventre materno, junto da
mãe, na cama desta e, por fim, em sua própria.
Na passagem da cama da mãe para a própria, pode ser útil
deixar uma fresta da porta aberta, de modo que um pouco
de luz e dos rumores dos pais possam chegar até a criança.
A mensagem é a seguinte: “Estamos aqui, e você não está
sozinho!” Contudo, aos poucos se deve providenciar um
quarto totalmente escuro, para que o hormônio do
crescimento (HGH), que é tão importante, possa se produzir
em quantidade suficiente.
Pela mesma razão, a ausência de radiação
eletromagnética também está entre as condições externas
ideais para um bom sono. A melhor coisa seria poder
investir, sem precisar gastar muito, em um disjuntor de rede.
A segunda melhor solução seria desligar, todas as noites,
todas as fontes de corrente. Não é recomendável ter babá
eletrônica junto à cabeceira do berço. Esse tipo de aparelho
é quase um golpe na saúde do bebê, embora, para os pais,
noites livres de preocupações sejam de extrema
importância. Um meio-termo alternativo é oferecido pelas
babás eletrônicas modernas, com um bom microfone, que,
na maioria das vezes, também sai caro, mas que envia sinais
confiáveis a alguns metros de distância da criança.
Nesse campo também se encontram os modernos acessos
à internet através de sistemas wireless-LAN, que já
proporcionam um sono ruim a cerca de 20% dos adultos –
especialmente às mulheres mais sensíveis, que
correspondem ao tipo homeopático fósforo. Nas crianças, a
sensibilidade é ainda mais elevada. Nesse sentido, pelo
menos a rede doméstica deveria ser desligada à noite em
favor dos membros mais sensíveis da família.
Mais do que uma questão de ponto de vista são as zonas
de interferência geopatogênicas, denominadas “veios
d’água”, não apenas entre as crianças. Quem perceber que
seu filho se refugia sempre no mesmo canto da cama ou tem
pesadelos particularmente persistentes, deveria pensar em
uma zona de interferência e, por conseguinte, deslocar a
cama. Se a criança amanhece no mesmo lugar onde
adormeceu à noite, este é um bom sinal. Informações
relativamente seguras sobre essas zonas são fornecidas pela
comparação dos resultados de diferentes rabdomantes.
Outro indício é a constatação de que a criança dorme sem
problemas na casa dos avós ou nas férias, ao contrário do
que acontece em casa. Biólogos ambientais, como o prof. dr.
Anton Schneider, aconselham deslocar a cama até se
observar uma mudança.
Truques idênticos ou semelhantes também se mostram
eficazes com crianças que já superaram a fase da
amamentação ou da primeira infância e até mesmo com
adultos: imaginar um céu cheio de nuvens em forma de
ovelhinhas e contá-las até o intelecto se desligar pela
monotonia e permitir que a criança mergulhe no sono;
contar até cem e, depois, ao contrário; escalda-pés com
temperatura crescente ou os exercícios Kneipp têm como
objetivo fazer o sangue circular da cabeça para o corpo ou
para as pernas e os pés.
Fundamentalmente, há que se dizer que todos os
conceitos sobre como e quando a criança deve dormir são
inimigos naturais do princípio do sono. Este pertence ao
arquétipo de Netuno, ao qual, por sua natureza, nada é tão
estranho quanto os princípios e os conceitos fixos.
15.3.2 Problemas específicos do sono da criança
15.3.2.1 Sonambulismo ou lunatismo
“A Lua me atrai.”
 
No sonambulismo, trata-se quase sempre de atividades
noturnas inofensivas. Tanto o sonambulismo (do latim
somnus = sono e ambulare = deambular) quanto a
sensibilidade à Lua ou o lunatismo (do latim luna) mostram
aspectos da mesma sintomatologia. Em sua forma mais
atenuada, trata-se de um sono inquieto em noites de Lua
cheia, e torna-se mais grave se, nessas fases lunares, as
crianças são acometidas por sonhos violentos, provenientes
do reino das sombras, ou se, sob a influência da Lua cheia, já
não conseguem fechar os olhos. Com uma vigília noturna,
elas como que veneram na Lua o princípio feminino. Quando
realmente caminham dormindo, transformam o tempo
arquetipicamente feminino da tranquilidade noturna em um
tempo marcadamente masculino, de atividade externa. Por
trás disso, é evidente a tarefa adiada, ou seja, a de crescer
ativamente no polo feminino. Guiadas por suas imagens
anímicas, elas se levantam sem acordar conscientemente e
iniciam, com a proverbial “segurança do sonâmbulo”, ações
singulares, incompreensíveis à consciência em vigília e que
parecem problemáticas ou até mesmo perigosas.
A Lua cheia, símbolo redondo e completo do feminino,
atrai as crianças, as conquista e as faz sair de si mesmas. O
todo acontece em um estado de absoluta inconsciência e
deixa para trás uma completa perda de memória (amnésia)
no dia seguinte. O inconsciente, provavelmente muito pouco
ativo durante o dia, toma posição e surge à noite, durante a
Lua cheia, quando os sinais são mais favoráveis a esse outro
aspecto da realidade.
Por trás desse fenômeno há uma repressão, durante o dia,
dos impulsos vitais, provenientes da metade feminina da
alma, que, por essa razão, emergem à noite. O que é
irracional e não é razoável só pode ser vivido à noite. Ao
mundo patriarcal, tudo que está ligado à energia lunar,
arquetipicamente feminina, logo parece loucura. Quando as
loucuras se tornam ainda mais evidentes do que em relação
àquelas do lunatismo, os anglo-saxões recorrem ao termo
lunatics para indicar todos os “loucos” de que se ocupa a
psiquiatria. Obviamente, os sonâmbulos dependentes da Lua
estão muito longe disso.
Neste caso, trata-se de restituir à noite e às forças lunares
seu direito de existir, conceder-lhes o tempo certo e levar a
sério o mundo das imagens internas, que se exprime por
meio dos sonhos e das fantasias. Seria útil prestar atenção
na Lua e na sua energia, aprender a apreciá-la e a conceder-
lhe o reconhecimento e o valor que convêm a todo
arquétipo. Quem se coloca voluntariamente sob a influência
da energia lunar e leva a sério o mundo noturno e de sombra
dos sonhos tanto quanto o lado de sombra do dia aprende e
cresce com eles, tornando supérfluas as excursões concretas
na sombra da noite. A segurança do sonâmbulo durante suas
excursões noturnas pode ser tomada como exemplo para
uma relação equivalente com os símbolos do mundo das
sombras. Assim, a sensibilidade lunar e o sonambulismo são
ocasiões para encontrar o contato com o outro lado (da
própria essência) e para deixar-se guiar e conduzir pelas
forças da alma. Isso corresponde à tarefa de deixar mais
espaço ao inconsciente, aproximar-se mais dele, aprender a
mover-se no mundo das sombras, perceber os impulsos do
inconsciente e deixar-se guiar por ele. Ou então, na prática,
mover-se mais com a segurança do sonâmbulo, mas
também seguir, durante o dia, o próprio faro e a própria
intuição.
Durante as excursões noturnas, a segurança do sonâmbulo
poderia tornar-se um exemplo da atitude geral de deixar-se
conduzir, a condução interior ao longo da vida. Assim, o
desejo de exploração entre os dois mundos poderia ser
entendido como um sinal de distinção.
 
Perguntas para os pais:

De que modo podemos criar um equilíbrio entre
o polo masculino e o feminino (razão e
sentimento)?

Nosso filho tem oportunidade suficiente de
sonhar e abandonar-se às próprias fantasias?

Nosso cotidiano tem deveres demais em sua
programação?

Seguimos as nossas intuições e ouvimos os
nossos sentimentos?
 
Medidas de apoio:

Normalmente, não é necessário nenhum
tratamento.
15.3.2.2 Pavor nocturnus
“Estou com medo do homem do saco preto.” – “Perco a
cabeça de tanto medo.”
 
No caso do pavor nocturnus, também descrito na seção
sobre o medo (15.1.3.1), as crianças acordam de repente no
meio da noite, gritando; nada é capaz de acalmá-las, não
reconhecem os pais e estão claramente em outro mundo.
Prova disso é também o fato de que, no dia seguinte, já não
se lembram de nada. Trata-se, nesse caso, de um sintoma
semelhante ao sonambulismo, com o agravante do medo.
Embora as crianças nesse estado não reconheçam os pais,
pois as imagens internas são fortes demais, sua presença
geralmente é útil para transmitir à criança a segurança de
que ela necessita em sua luta ativa contra as figuras
oníricas. É importante encorajar a criança a sentar-se, pois a
posição sentada transmite mais autoridade em relação
àquela deitada. O ideal seria o pai ou a mãe sentar-se atrás
da criança para reforçar, mas também proteger, em sentido
metafórico, as suas costas. Desse modo, a criança encontra
“sozinha” a força para libertar-se das suas figuras oníricas.
Entre os remédios homeopáticos típicos para esses
sintomas estão aqueles que têm uma relação com o outro
mundo, os “remédios das bruxas”, como o estramônio
(Datura stramonium).
 
Perguntas para os pais:

Como podemos criar uma atmosfera do sono
para o nosso filho, na qual ele se sinta bem e
consiga dormir?

Como podemos reforçar sua força interior e sua
autoconfiança?

Como ele pode aprender a soltar-se com
confiança?

Como podemos demonstrar-lhe que confiamos
nele? Somos capazes de soltá-lo?

Qual a medida de nossa confiança nas forças
interiores de sua alma e como podemos
transmiti-la a ele?
 
Medidas de apoio:

Criar uma atmosfera especial para um sono
saudável.

Proporcionar tranquilidade e não permitir
distúrbios vindos de fora.

Evitar atividades excitantes uma hora antes de ir
dormir; por exemplo, brincadeiras muito
agitadas, filmes de suspense, jogos no
computador e histórias agitadas.

A partir do final da tarde, renunciar a bebidas
energéticas, como Coca-Cola, chá verde ou
preto, Red Bull, etc. (sem levar em conta o
problema específico, essas bebidas não são
adequadas a crianças).

Temperatura: evitar extremos.

Luz: escurecer o quarto.

O quarto da criança deve estar livre de radiação
eletromagnética.

Renunciar a alimentos de difícil digestão e a
grande quantidade de líquido no jantar e depois
dele.

Adotar rituais seguros, bem como hora certa
para ir dormir e para levantar; manter um olhar
retrospectivo positivo em relação ao dia.

A cama não deve ser associada a pensamentos
negativos nem a punições.

Respeito pela duração individual da sesta e pela
hora de ir para a cama.

Rumores de fundo: tenha em mente que
algumas crianças que sentem medo dormem
melhor se percebem a vida familiar ao seu redor,
mesmo quando ela faz barulho.

Como deve ser o quarto: instalar um disjuntor de
rede, eventualmente para a escuridão; bom
arejamento; silêncio e colchão adequado
(termoelástico); cama no lugar apropriado
(estabelecê-lo com o auxílio de um rabdomante);
purificação dos campos energéticos de distúrbio;
purificação do ar (ionizadores contra íons
negativos).
15.3.2.3 Falar durante o sono
“Só ouso dizer à noite o que está acontecendo comigo.”
 
O que não se expressa, ou melhor, o que não se pode dizer
durante o dia descarrega-se à noite, possivelmente
elaborado pela mesma “instância” interna que censura os
sonhos, para que eles permaneçam incompreensíveis ou de
difícil interpretação. À noite, as crianças poderiam liberar
verdadeiros segredos que não ousam revelar durante o dia.
Entretanto, geralmente a censura é tão eficiente e submete
a linguagem a tal estranhamento que, na realidade, não é
confiado nada de compreensível ao ouvinte. Mesmo assim,
elas poderiam sentir-se exortadas a se esforçar nesse
sentido.
Se os sonhos “ganham voz” desse modo, é sinal de que,
durante o dia, a criança não tem oportunidade suficiente de
falar. Possivelmente ouviu muitas restrições, como “boca
fechada”, “fique quieto”, “não queira ter sempre a última
palavra”, mas talvez também tenha recebido apenas
mensagens subliminares que o desencorajaram de
expressar-se durante o dia e dar espaço e atenção
suficientes às suas exigências.
A tarefa dos pais seria oferecer ao filho válvulas de escape
e habituar-se a deixá-lo expressar-se sem cortar-lhe a
palavra ou tapar-lhe a boca. O maior perigo é deixá-lo
completamente mudo. Tirar a palavra de alguém é uma
forma sutil de assassinato. Talvez fosse mais vantajoso criar
horários regulares de diálogo, nos quais a mãe ou o pai se
interessam exclusivamente pelo que arde na alma do filho.
Certas situações cotidianas podem facilitar o diálogo. Com
as crianças menores, obtêm-se muitas informações por meio
das brincadeiras com bonecas e animais. Como já foi dito, o
silêncio noturno é particularmente adequado ao diálogo,
sobretudo com as crianças maiores, mas também os
momentos após atividades em comum e, muitas vezes,
também naqueles em que se cozinha com os filhos. A
cozinha, que é um local de transformação e que com
frequência irradia uma atmosfera muito confortável, tem a
vantagem de ocupar a mãe ou o pai por certo tempo,
fazendo com que a criança não se sinta observada nem o
centro das atenções. Nesse contexto, desenvolve-se mais
facilmente a liberdade de falar não apenas dos assuntos
secundários, mas também dos temas que pesam na alma da
criança. Às vezes, pedir ajuda na cozinha pode trazer à luz
coisas incríveis.
Quando isso não acontece, algumas crianças podem ser
consumidas internamente por suas próprias chamas e, em
vez de arder pela vida, queimar por dentro. Outras fazem
com que a fumaça, que surge a todo sinal de fogo, se
manifeste em forma de sintomas. Em algum momento, as
mais vitais explodirão, no mais tardar na puberdade, e
voltarão sua energia reprimida contra os pais e seus ideais.
 
Perguntas para os pais:

O que nosso filho não ousa dizer durante o dia?

Devemos deixá-lo falar com mais frequência?
 
Medidas de apoio:

Ofereça a seu filho mais oportunidades para se
exprimir.
15.3.2.4 Pesadelos
“Sinto medo à noite.”
 
Os pesadelos são manifestações da sombra, uma espécie de
terapia noturna da sombra conduzida por quem sonha. O
que durante o dia é escondido debaixo do tapete, à noite se
torna visível nos pesadelos. Os elfos – criaturas imaginárias
da mitologia germânica, “responsáveis” pelos pesadelos –
tornam-se ativos e ameaçam o dispendioso, saudável e
burguês mundo infantil diurno com medos inconfessados e,
de modo geral, com toda a sombra não vivida.
Essas irrupções da sombra aludem sempre a uma fase do
desenvolvimento que está para ser cumprida e questiona
temporariamente os limites da personalidade que
transmitem segurança.
 
Perguntas para os pais:

Como podemos descobrir os medos do nosso
filho?

Como trazemos à luz/ao dia seus lados de
sombra?

Quais medos, preocupações e temores tem
nosso filho? (Ver a seção “15.1 Medo”.)

A atmosfera de seu quarto é amigável e pacífica?
 
Medidas de apoio:

Ver as seções sobre o medo (15.1) e sobre os
distúrbios do sono (15.3).

15.4 Sobrepeso
“Quero mais.” – “Estou farto de mim mesmo.” – “Não estou
recebendo o suficiente.”
15.4.1 A epidemia do futuro

Em quase toda parte, crianças gordas já fazem parte da


paisagem urbana e ilustram de maneira deplorável um
importante problema do espírito da época. Já não recebemos
o suficiente e engordamos cada vez mais. As crianças só
refletem esse problema de modo particularmente flagrante.
No caso do sobrepeso, na maioria das vezes todo o corpo é
afetado, o que demonstra que uma satisfação interna tem de
substituir a abundância externa. Isso pode aludir ao fato de
que o alimento estaria desempenhando um papel de
substituto do afeto (dos pais). O amor inicia-se muito
naturalmente entrando no estômago por meio da
amamentação. Mais tarde, ele pode sempre regredir a esse
nível.
Portanto, a satisfação interna aliviaria o corpo. Se a criança
pudesse expandir-se, em sentido figurado, e ampliar o
próprio campo de influência, os limites do corpo não teriam
de se forçar para fora. Trata-se de tornar-se importante em
vez de imponente. As crianças precisam ser consideradas
importantes por seus pais para poderem considerar a si
próprias importantes e não adquirirem sobrepeso. Elas
pretendem ficar satisfeitas em diversos níveis. Nesse
sentido, seria prioritário estimular sua fome de vida em vez
de deixar crescer excessivamente sua fome concreta por
comida, que é vivida como um substituto. O alimento
psicoespiritual em vez daquele físico poderia ser a resposta
ao sobrepeso. “Educação em vez de hambúrguer!” poderia
ser o slogan.
15.4.2 O corpo como espelho da alma[33]

Ainda que o sobrepeso seja um problema de todo o corpo e


da criança em sua totalidade, sempre chama a atenção o
fato de que algumas regiões do corpo se distinguem de
modo particular e permitem uma interpretação específica.
Durante a infância, o ventre é o ponto central de todo
acontecimento, pois, pelo menos no início da vida, tudo é
vivido através dele. Um ventre redondo simboliza um
sentimento equivalente pela vida. Contudo, se ele é
superdimensionado, a vida denota, antes, uma falta de
perfeição interna e de centralidade. Também poderia faltar o
“prazer redondo da vida”, bem como a intuição como um
todo. Nesse sentido, uma criança com ventre muito
arredondado deveria ser auxiliada a aprender a confiar na
própria intuição e a viver de acordo com ela. Ela é chamada
a tornar a vida redonda, e não o ventre, bem como a não
viver exclusivamente de seu ventre.
Um traseiro desproporcionalmente grande enfatiza os
temas da “imposição” e da “expectativa”, no sentido de
“persistir”, e testemunha que eles estão em falta. Se as
crianças afetadas por esse problema aprendem a se impor e
a desenvolver sua capacidade de persistência, até atingirem
a condição de saber esperar e resistir nas situações
importantes, liberam o traseiro dessas tarefas de
representação.
Coxas fortes e vistosas demonstram o desejo e a aspiração
inconfessáveis de maior estabilidade e progresso. Se ambas
as instâncias fossem realizadas em sentido metafórico, as
coxas seriam liberadas dessa temática.
Um pescoço excessivamente gordo, incluindo queixo
duplo, acentua o tema da “posse”. Normalmente, essa
temática é sempre um aspecto da nossa cultura, que, com o
passar dos anos, assume importância cada vez maior. Não
obstante, pode ser significativa já na infância. Assim que a
criança for capaz de dizer e pensar “eu”, a diferença entre
“meu” e “teu” também ganhará significado. Por exemplo, se
houver uma carência no nível emocional ou sentimental, o
tema da “posse” também poderá adquirir uma importância
despropositada. Muitas vezes, são os pais a enfatizarem esse
aspecto, enchendo os filhos de presentes materiais ou
comida devido a seu sentimento de culpa. Os próprios
adultos, quando sofrem de carências emocionais ou
sentimentais, tendem a se recompensar com bens materiais.
O pescoço simboliza a incorporação física do mundo.
Por meio dessas regiões específicas, os pais podem
interpretar os problemas de seus filhos de maneira
diferenciada e adaptá-los ao próprio contexto de vida
familiar.
15.4.3 A armadilha moderna da gordura

Atualmente, muitas crianças são mimadas pelas modernas


condições de vida e mal acostumadas no nível errado.
Recebem matéria demais em diversos pontos de vista e
amor de menos. Os pais intuem isso e se sentem culpados, o
que piora ainda mais a situação como um todo e, não raro,
acabam sendo explorados pelas crianças mais espertas.
Muitas delas, quando se trata de afirmar os próprios
interesses, são inteligentes e obstinadas. Tocam
impiedosamente o teclado da chantagem nas modernas
famílias “patchwork”. O que não recebem em termos de
doces ou fast-food de um lado familiar vão buscar no outro
nos finais de semana, não raro subvertendo, assim,
conceitos importantes de alimentação. Crianças mimadas
gritam até mesmo junto ao caixa do supermercado para
ganhar um Kinder® Ovo. Em hipótese alguma devem obtê-
lo; do contrário, a chantagem como meio para se atingir o
objetivo terá sido aprendida e passará a ser adotada. Da
parte dos pais, é necessário prestar atenção no sistema da
comida como recompensa, no sentido da token economy
(Economia de Fichas), e renunciar a ele mesmo em situações
de estresse e tensão: “Se você comer tudo vai ganhar este
ou aquele...” Mesmo o truque tão comum de “vender” cada
colher para aumentar a velocidade da refeição, segundo o
lema: “Mais uma colher para a vovó... e outra para a
mamãe... para o papai”, tornam-se modelos alimentares
fatais, que mais tarde se vingarão mais com a gordura do
que com a amargura.
Na vida atual, que decorre de maneira cada vez menos
regular e cada vez mais impregnada de ambição, essas
tendências podem até ser compreensíveis e não ter má
intenção, mas conduzem a uma direção perigosa. A vida se
move, reta como uma flecha, na direção do progresso de um
futuro incerto. A quantidade derruba a qualidade. O primeiro
objetivo é ganhar bem, e não o que alimenta a alma e
proporciona satisfação. Muitas crianças reagem a essa
tendência com a contrarreação passiva da geração
desmotivada. Enquanto ao seu redor predominam o frenesi e
o excesso de atividades, elas se recusam e permanecem
sentadas no sofá como um verdadeiro saco de batatas. A
mistura resultante da falta de exercício externo e recusa
interna de movimento, acrescida do fato de que se
alimentam por frustração, conduz rapidamente à armadilha
da gordura.
Outra razão para o sobrepeso reside no fato de que as
crianças de hoje também precisam de uma “pele dura” para
suportar todos os desafios e o estresse de uma vida infantil
“normal”. As exigências aumentam não apenas para os
adultos da sociedade meritocrática globalizada, mas
também para os mais novos. Desse modo, fortalezas
externas podem aludir a uma falta de segurança interna.
Assim, a pele dura substitui, de maneira mais ineficiente do
que correta, a confiança primária e a segurança em si
próprio.
A ambição frustrada dos pais também acaba se abatendo
cada vez mais sobre a vida das crianças modernas. Mesmo
as menores já são obrigadas a demonstrar grande
desempenho para corresponderem a todas as exigências.
Alguém formado em psicologia que se misturar às mães em
um playground assistirá espantado a verdadeiros programas
ambiciosos de iniciação à neurose predominando nesses
campos de brincadeiras. “Como assim? O seu ainda não faz
isso? O meu já fazia com ... meses.” – “Imagine! O meu nem
chegou a engatinhar; já foi logo andando, sem dificuldade
nenhuma.” As mães não imaginam que, com essas frases,
não raro acompanharão seus filhos de 10 anos ao grupo de
brincadeiras para legastênicos [disléxicos].
Apesar dos diversos estímulos, paradoxalmente as
crianças modernas também costumam ser atormentadas
pelo tédio. Sobrecarregadas, por um lado, e sem
envolvimento nenhum, de outro, empanturram-se de doces e
batatas fritas assistindo à televisão ou jogando no
computador como seus pais, cuja silhueta geralmente não
está menos fora de forma do que a deles. Se os pais comem
continuamente, sentados diante da televisão, as crianças os
imitarão. Polarizados com a imitação e a ressonância, os
neurônios-espelho do cérebro certamente cuidarão para que
isso aconteça. As crianças são mestres da imitação.
Outro agravante se dá pela falta de movimento. Muitas
crianças modernas quase já não brincam por si mesmas,
mas buscam suas brincadeiras na tela do computador. Por
assim dizer, o movimento é delegado aos heróis dos jogos de
ação, que predominam sem rivais na televisão. Quanto
menor a criança, mais facilmente ela é manipulada pela
propaganda televisiva. Não é por acaso nem um ato
desinteressado a construção de playgrounds no McDonald’s,
onde, aliás, mal dá para se mexer, pois as crianças
modernas escorregam pelos mais diferentes e coloridos
sistemas de tubos, que habilmente fazem lembrar o canal do
parto. A publicidade é mais eficaz quando ouvida com
frequência; para as crianças de hoje, não faltam ocasiões
para ouvi-la. Uma vez influenciadas pelo alimento industrial,
que tem pouco valor nutritivo no lugar daquele integral, não
raro passam a vida dependentes dele, com a perspectiva de
uma vida curta, gorda e sem gosto. Infelizmente, a evolução
precisa de muito tempo para seus processos de adaptação.
Nos poucos séculos de existência do alimento refinado, o
intestino ainda não conseguiu se adaptar a ele; menos ainda
ao alimento de pouco valor nutritivo como o oferecido nos
fast-foods, que, com sua gordura saturada, equivale a um
ataque direto aos vasos sanguíneos (da criança).
A isso se acrescenta o fato de que as crianças modernas
costumam ser deixadas sozinhas, por sua própria conta.
Passam a hora do almoço e a tarde sem os pais e, muitas
vezes, procuram nos doces o afeto que lhes falta. A
comodidade faz com que vão à escola de ônibus ou no carro
dos pais, em vez de usarem a bicicleta. Sentindo-se
culpados, os pais lhes oporão pouca resistência. Quase
extenuados pela tentativa de se manterem na sociedade
meritocrática, os próprios pais sempre acabam renunciando
a uma programação ativa em seu tempo livre, pois não têm
vontade, nem tempo nem energia para fazerem exercício
suficiente. A estagnação resultante transfere-se para vários
aspectos da vida.
Como a ressonância é um dos elementos determinantes da
vida, a função dos pais como modelos acaba sendo decisiva
e ainda mais importante do que a dos professores. Contudo,
nas crianças mais velhas e nos adolescentes, a influência do
ambiente (de vida), do chamado peergroup ou o grupo dos
coetâneos, tem um efeito ainda mais marcante.
No entanto, para a criança pequena, a situação familiar é
decisiva. Uma eventual frustração dos pais acarreta amplas
repercussões em sua vida. Se eles não fazem as compras
direito, as crianças tampouco comerão direito. A pressa do
nosso tempo favorece naturalmente que se recorra ao fast-
food e às comidas prontas, enquanto a arte de cozinhar aos
poucos entra em decadência, não obstante ou até mesmo
devido a todos os programas culinários na televisão.
Um dos principais problemas também é a perda de rituais
fixos, como as refeições em família, que poderiam oferecer
uma espécie de moldura ao dia e, desse modo, transmitir
segurança. Nas famílias modernas, a tendência é de cada
um comer quando quiser ou dever. Sem o ritual de fazer as
refeições todos juntos, geralmente ficam faltando a
tranquilidade durante a ingestão dos alimentos e a atenção
quanto àquilo que se come. Se as crianças se servem
sozinhas na geladeira, existe o perigo de engolirem, em vez
de mastigarem, o alimento errado no momento errado. Isso
não significa que algumas crianças não consigam se virar
sozinhas com a necessidade moderna de alimento.
Entretanto, quando a família se reúne algumas vezes à
mesa e o pai – de quem, não raro, se exige em excesso –
está presente, com frequência são discutidos vários
problemas. A frase “Como vai a escola?” representa para
muitas crianças o fim de toda tranquilidade, bem como de
todo prazer. Por conseguinte, em vez de sustentar a vida
familiar em comum e seu respectivo ritual de refeição, essas
circunstâncias acabam contribuindo para seu fim. Do mesmo
modo, se a mãe está passando por um estresse devido à
sobrecarga, muitas vezes a refeição também perde
qualidade. Não raro, tudo vai parar no forno de micro-ondas,
onde, embora seja destruído, pelo menos se torna
rapidamente disponível. Com esse péssimo hábito moderno,
é indiferente a qualidade originária do alimento. Mesmo
aquele integral não sobrevive à tortura do forno de micro-
ondas. Dei-me conta de quão pouca consciência se tem hoje
em relação a esses temas em um centro cardiológico de
Munique, onde o leite materno extraído com uma bomba é
primeiro congelado e, depois, reaquecido no forno de micro-
ondas.
Além disso, se o alimento é de produção industrial e já não
possui nenhuma qualidade, não será capaz de saciar devido
à falta de nutrientes essenciais. Assim, abre-se o caminho
para o drama do sobrepeso precoce, sobretudo porque o
alimento pronto geralmente tem uma parte considerável de
gordura. Nesse caso, também se trata, como sempre, de
gorduras saturadas, que são especialmente perigosas e
representam um atentado à saúde comparável ao do cigarro.
A evolução nos ensinou a comer tudo até obtermos tudo
de que necessitamos. Para tanto, ela utiliza o reflexo de
saciedade. Porém, quando se leva ao organismo um
alimento ruim, de baixo valor nutricional, com excesso de
calorias, mas poucos nutrientes essenciais e vitaminas, logo
a sensação de saciedade perde o efeito, e a fome ressurge,
na esperança, por parte do organismo, de conseguir aqueles
nutrientes essenciais que estão faltando. Por isso, o alimento
industrial não consegue saciar, apenas encher. Porém, as
crianças, que já não conseguem sentir-se satisfeitas, pois
não recebem o que realmente precisam, tendem a comer
sem parar e a engordar impiedosamente. À falta de
qualidade, não raro se acrescenta a falta de saciedade em
sentido metafórico, agravando o problema.
Em comparação com esses cenários, as verdadeiras
disfunções da tireoide nas crianças, como causas de um
metabolismo basal lento e, portanto, do sobrepeso, são uma
raridade. O metabolismo basal lento, que já se tornou uma
epidemia popular, aumenta o sobrepeso devido à falta de
exercício.
Ao perceberem os primeiros sinais dessa predisposição,
geralmente os pais tendem a submeter seus filhos à dieta,
como, de resto, fazem consigo próprios. Assim, em muitas
famílias modernas, já na infância se desencadeia a loucura
das dietas, que só produz mais sofrimento. As crianças
gostam de tudo que é proibido; assim, as transgressões ao
regime já são programadas, embora ater-se rigorosamente
às prescrições não represente nenhuma solução. Em
qualquer idade, as limitações drásticas acabam com o
prazer, e crianças insuportáveis, que mais sofrem do que
vivem a própria infância, são uma punição para si mesmas e
para os pais. Estes também tendem, naturalmente, aos
quadros clínicos correlacionados. Segundo a Organização
Mundial da Saúde, obesidade e diabete tipo II são a epidemia
do nosso futuro. Sua base se encontra na infância, em
decorrência de uma alimentação errônea e carente, bem
como da falta de exercício físico, combinadas com o excesso
de calorias e com a adoção de um estilo de vida
contraproducente.
O problema se agrava quando as mães, sobretudo as
modernas, tendem a realizar seu ideal de beleza através dos
filhos. As tentativas de transformar meninas pré-púberes em
pequenas modelos estão na ordem do dia nos Estados
Unidos, país que representa nosso grande e trágico modelo
em relação à problemática do sobrepeso. O que a mãe não
conseguiu realizar por si própria é tentado com maior
pressão por meio da filha. Mães doentes por dietas se
refletem nesses filhos, que são obrigados a crescer em seu
corpo com a loucura da insatisfação. Muitas vezes, isso
conduz à anorexia e à bulimia, mas também ao movimento
oposto e sem salvação, quando a resignação entra em ação
e a luta contra a balança é dada por perdida.
Essas mães modernas, que usam os filhos para seus
objetivos inconscientes e para seu próprio ego, vão ao
encontro das tendências e invenções modernas, como o
sistema de cadeirinhas compactas (do tipo Maxi-Cosi). O
ninho todo de plástico torna as crianças mais manejáveis.
Desse modo, não saem do lugar, sujam-se menos e podem
ser transportadas para toda parte. Obviamente, a vantagem
de poder transportá-las com tanta facilidade também tem
aspectos negativos. Se a criança passasse mais tempo no
colo, sentiria mais proximidade e intimidade, o que seria
melhor para o seu desenvolvimento como um todo. Isso
corresponderia muito mais a seu caminho arcaico na vida: de
dentro do ventre para cima dele, no marsúpio, como no
método canguru e, depois, para o colo. Hoje, a criança sai do
ventre para o berço, para a cadeirinha e para o cadeirão. Os
três, quando usados muito precocemente, exigem demais do
bebê e mantêm as mães a uma distância desfavorável. De
modo geral, esses sistemas prontos e compactos estimulam
o repouso da criança e, com ela, a falta de movimento. Isso
torna todos os sistemas de tipo “contêiner” tão práticos
quanto hostis à vida das crianças. Se as colocamos em
repouso externamente ou com medicamentos, há sempre
que se pensar nos “danos colaterais”, que geralmente são
preocupantes.
Muitas vezes, as mães modernas já não têm vontade de se
conter e postergar as próprias vantagens em favor do
desenvolvimento da criança. No colo, as crianças sujam e
mancham a roupa. A mãe não consegue se mover como
gostaria, e, assim, as crianças costumam ser deixadas
precocemente por conta própria, postas de lado e, não raro,
repelidas pela vida quando são maiores.
15.4.4 Soluções

As crianças alimentadas no colo e com amor estão unidas à


mãe, já a partir de sua posição, e ambas olham a vida na
mesma direção. No cadeirão, ao contrário, a posição é,
antes, de confrontação, pois uma está sentada na frente da
outra ou, pior ainda, transversalmente à outra, sem
nenhuma possibilidade de união. Por outro lado, é possível
um contato visual mais intenso.
Quanto mais as crianças são envolvidas, tanto melhor.
Mais tarde, pode-se planejar a refeição com elas, para que
cada uma receba seu prato preferido, etc. Quando elas
ajudam na preparação da comida, esta passará a ser algo
delas, e é sempre mais difícil boicotar algo próprio.
Atividades como preparar brotos, mas também deixar que
cozinhem, assem ou decorem sozinhas pequenas coisas e
ponham a mesa reforçam a motivação, a identificação e a
iniciativa própria das crianças. O mesmo efeito acontece
com a decoração da árvore de Natal, que causa até mais
alegria e dedicação. As crianças mais velhas podem se
divertir atribuindo a cada prato determinado slogan,
conotando especialmente cada dia. Se a qualidade de cada
dia se aproximar daquela do dia de aniversário, a refeição
sempre será uma festa, com a respectiva consciência e o
devido respeito. Em famílias com várias crianças, cada uma
pode, por exemplo, pedir em determinado dia o seu prato
preferido e ajudar no preparo. Os outros irmãos são então
convidados a experimentar o prato predileto do irmão ou da
irmã.
Tão contraproducente quanto a desvalorização da comida
é o extremo oposto, ou seja, quando os pais – na pior das
hipóteses, por sentimento de culpa ou de fracasso em outros
aspectos – enfatizam excessivamente a importância do
alimento saudável e, assim, estressam a si próprios e aos
filhos. A estes também deveria ser permitido, por exemplo,
tomar sorvete, do contrário, acabam atribuindo a este uma
importância excessiva, e tudo que não é saudável passa a
conquistar um enorme fascínio. No mundo moderno, não há
como excluir os doces do mundo (infantil). Eles estão por
toda parte, não apenas junto aos caixas dos supermercados.
A única chance de escapar deles estaria em viver uma vida
tão doce que esse aspecto material perderia importância e
atração.
Por fim, tanto as crianças quanto os adultos podem ser
facilmente orientados para terem hábitos alimentares mais
simples e saudáveis. Em primeiro lugar, a alimentação
deveria ser de acordo com a nossa espécie, já que somos
seres humanos com uma dentadura específica e um
intestino correspondente. Ambos indicam que somos
onívoros, com uma propensão muito forte para a
alimentação vegetariana. Portanto, ingerir carne ou, melhor
ainda, peixe uma vez por semana deveria ser suficiente, até
para minimizar o medo já mencionado.
Em segundo lugar, a alimentação deveria consistir em
alimentos que contenham o que precisamos. Eis a razão
para a necessidade de alimentos integrais. Nos milhões de
anos de evolução, não aprendemos outra coisa; por isso, não
podemos prescindir deles. Vale lembrar que foram
necessários 12 mil anos para que a metade da humanidade
aprendesse a digerir o leite; será necessário pelo menos o
mesmo período para que ela consiga metabolizar o alimento
industrial sem problemas.
Durante o crescimento, as crianças precisam
especialmente de alimentos integrais, nutrientes e
vitaminas. Se ingerirem alimentos sem valor nutricional,
precisarão dele em grande quantidade e sofrerão de excesso
de calorias e falta de conteúdo. A falta no excesso tornou-se
uma espécie de marca registrada da moderna sociedade de
consumo.
Como terceiro aspecto, seria necessário prestar atenção no
biótipo e na alimentação adequada a cada estação do ano.
No livro Vom Essen, Trinken und Leben [Sobre Comer, Beber
e Viver], há um teste que ajuda a identificar o próprio
biótipo. O princípio é simples: o que cresce em nós também
é adequado na respectiva estação do ano. O alimento
exótico deve ser ingerido com cautela e somente pelo
biótipo correspondente.
No Oriente, sabe-se desde os tempos antigos que a
comida feita com amor tem um sabor melhor, é mais
saudável e mais digerível, pois a energia com que é
preparada entra no produto final: “O amor passa pelo
estômago”, e, durante o cozimento, entra no alimento. Seria
ideal fazer com que as crianças participassem das compras e
do preparo dos alimentos. No entanto, pesquisas
relacionadas ao tema informam que a atual geração está
desaprendendo a cozinhar, pois o faz cada vez menos. Como
já mencionado, uma saída seria envolver as crianças e fazer
com que participem o máximo possível, por exemplo, dando-
lhes vegetais para cortar enquanto se conversa com elas. Se
depois ainda se cozinha e se come junto com elas, seu
desenvolvimento ocorrerá na direção certa.
Do contrário, as crianças acreditarão – como algumas
vezes já acontece hoje – que as vacas são lilases e que as
cenouras crescem em árvores. Deixam de aprender o
essencial; não obstante, na escola são sobrecarregadas com
planos de estudos e programas didáticos. Algumas até já
possuem agenda, como os pais. A essas tendências
modernas naturalmente corresponde o fast-food.
Recentemente, quando Jamie Oliver, genial e divertido
cozinheiro inglês, quis introduzir nas escolas, com uma
surpreendente iniciativa apoiada pelo governo, uma
alimentação saudável, deparou com a resistência das
modernas mães inglesas, que contrabandeavam fast-food
dentro das escolas para seus filhos já estragados quanto a
esse aspecto. Obviamente, a comida rápida industrial é
atraente e colorida, pode ser ingerida com rapidez e com as
mãos ou sorvida, uma vez que, por não possuir estrutura,
corresponde, antes, à papinha de bebê. Mesmo a carne ou o
peixe são amalgamados desse modo. Particularmente
encantador nos restaurantes desse tipo é justamente a
atmosfera de quarto infantil, com cores vivas e alimentos
simples para crianças. Barrinhas de peixe e cubinhos de
frango, carne ou peixe desestruturados entre fatias brancas
e altamente elásticas de pão industrializado, com molho
vermelho por cima e água marrom, açucarada, além de tiras
de batatas. O coração da criança ri, enquanto a saúde se
afunda. Somente uma vida conscientemente adequada à
criança poderia evitar esse fascínio natural.
Soluções razoáveis e bem-sucedidas para tais becos sem
saída da vida moderna podem ser obtidas quando a essência
dos erros é reconhecida e substituída dentro do mesmo
arquétipo. Portanto, se as crianças gostam da atmosfera de
quarto infantil do McDonald’s, seria necessário oferecer-lhes
mais coisas próprias de crianças em outros níveis. Reprimir
necessidades básicas nunca é a solução, conforme mostra a
prática moderna, segundo a qual mais da metade das
crianças deixa a escola com problemas de postura, sintomas
por falta de movimento e distúrbios no metabolismo, e 63%
das meninas entre 12 e 18 anos na Alemanha sofrem de
distúrbios alimentares.
Alguns truques podem atenuar o tema da comida e
simplificar a vida das crianças e dos pais. Se uma criança
não quer comer, é sempre razoável evitar insistir ou, pior
ainda, obrigar; ao contrário, é preferível praticar a própria
confiança segundo o lema: “Nunca ninguém morreu de fome
diante de uma mesa farta”. Nem mesmo em casos em que
se percebem traços de anorexia, obrigar a criança a comer
não constitui uma solução real. Contudo, é importante não
permitir lanches entre as refeições. Se as crianças não têm
vontade de tomar o café da manhã ou de jantar, pode-se até
mesmo encarar isso como um ganho saudável. Não é à toa
que se fala em “dinner-cancelling”. Como apenas durante o
jejum noturno é secretado o hormônio do crescimento, seria
até indispensável abster-se de comer pelo menos 12 horas
por dia. Nesse sentido, é importante para toda a família não
comer mais nada após o jantar, para que o café da manhã se
torne uma verdadeira “interrupção do jejum”.
Um sono de boa qualidade, durante o qual se produz
melatonina suficiente, é sempre insubstituível, uma vez que
toda forma de crescimento, mas também a passagem de
tudo que é aprendido para a memória de longa duração,
requer um bom sono, sem o qual não pode acontecer.
Dormir bem requer escuridão e ausência de radiação
eletromagnética, o que pode ser facilmente conseguido com
um disjuntor de rede. Caso as crianças não aceitem a
escuridão por medo, este teria de ser necessariamente
tratado por meio de terapia, pois, do contrário, impedirá
todos os possíveis processos de crescimento a longo prazo.
Se as crianças já sofrem de medo, seria urgente cuidar
para que não o comam (em forma de carne). A estreiteza
crescente na sociedade moderna já cria medo suficiente.
Sobretudo nas cidades modernas, as crianças pequenas são
transportadas em estreitos desfiladeiros com paredes de
metal, que lhes tiram a visão, uma vez que elas mal
conseguem superar a altura do para-lama. Ainda pior é o
fato de que o contínuo aumento do consumo de carne
acompanha a queda de qualidade dos produtos. Enquanto
na Suíça uma comunidade como a dos Migros encoraja os
criadores de gado da Confederação a retomar os matadouros
individuais em suas propriedades, por preocupação com a
saúde da população, a Comunidade Europeia os proibiu há
anos. Com a pressão crescente da concorrência, à qual são
submetidos os açougues, e a consequente concentração,
atualmente a maior parte da carne provém de grandes
matadouros, nos quais o abatimento dos animais é feito em
massa. E, como já mencionamos no capítulo sobre o medo,
se todo vitelo ou porco tiver de assistir à morte de seus
semelhantes antes de ser morto, quando chegar sua vez, ele
secretará todos os hormônios do estresse e do medo,
sobrecarregando sua carne com uma pesada hipoteca.
Desse modo, as crianças de hoje “comem” o medo no
sentido mais concreto do termo. Uma analogia torna esse
enunciado mais claro: quem fosse obrigado a assistir à
execução de outras dez pessoas antes de ser executado
sentiria, no momento de sua morte, taquicardia, suor
excessivo e um medo insuperável no mais alto grau de
estresse. A mesma coisa acontece com os animais nos
matadouros modernos: seu sangue e, portanto, também sua
carne ficam saturados de hormônios do medo e do estresse.
Esta já seria uma razão válida para poupar as crianças do
consumo desse tipo de carne. Apenas animais de caça, como
a corça e o veado, não são afetados por essa tragédia.
Conforme já amplamente discorrido anteriormente, o peixe é
melhor por diversas razões. Além disso, sobretudo se
provém de águas frias, contém os óleos utilizados pelo nosso
organismo.
Quem se abstém do jantar ou do café da manhã
obviamente dispõe de um período maior de jejum para que
sejam produzidas a melatonina e o hormônio do
crescimento. Este é particularmente importante para as
crianças, pois estimula não apenas o crescimento, mas
também os processos de desenvolvimento e a criatividade.
Outro hormônio igualmente importante é a serotonina,
produzida a partir do aminoácido L-triptofano e precursora
da melatonina, que é o hormônio do sono. Os pais que
querem viver relaxados com seus filhos devem dispor de
uma quantidade suficiente desse hormônio, conhecido como
hormônio do bem-estar. Por um lado, ele reduz a sensação
de fome e, por outro, proporciona uma agradável sensação
de bem-estar, facilitando o controle do estresse. A
serotonina não pode ser absorvida diretamente, mas apenas
através de seu precursor, o L-triptofano. Devido a processos
metabólicos complexos, essa absorção é mais bem-sucedida
por intermédio da ingestão em jejum de alimentos crus bem
mastigados, o que dificilmente é realizado pelas crianças,
menos ainda de manhã. A solução são as já apresentadas
Aminas, mistura de alimentos integrais crus, moídos em
grãos finos e prontos para consumir, constituída por vegetais
ricos em L-triptofano, como amaranto, quinoa, tupinambor,
brócolis e banana. Os diversos sabores oferecidos têm a
mesma eficácia. O importante é ingerir uma colher de sopa
da mistura no desjejum, ou seja, cerca de meia hora antes
da refeição, por exemplo junto com um suco de fruta. Como
a vontade de chocolate e doces também pode ser atribuída à
falta de L-triptofano, essa mistura oferece uma oportunidade
adicional para reduzir o consumo desses alimentos, bem
como a possibilidade de ter um bom sono, através de uma
produção suficiente de melatonina.
Depois de todas essas considerações importantes, que
podem ajudar a reduzir o sobrepeso, há que se pensar que
as razões psíquicas têm uma importância de ordem superior.
Aconselha-se aos pais que também sejam afetados por
problemas de peso a resolvê-los por amor de seus filhos, a
fim de que estes possam seguir seu exemplo sem sofrer
danos.
Mesmo no nível dos campos, seria possível melhorar ou
aliviar muitas coisas com a respectiva compreensão. Quando
são introduzidos e tornados habituais alguns rituais
relacionados à refeição, que conferem certa moldura ao dia,
os horários fixos das refeições – desde a amamentação até a
idade escolar – podem conferir não apenas a consciência do
que é um bom alimento, mas também segurança e proteção.
[34]
Um estratagema geral, que não deve ser subestimado, é a
mudança do chamado peergroup com a mudança de
residência. Trata-se de um recurso de emergência, cada vez
mais considerado por pais conscientes. Assim como deixam
a cidade grande devido aos constantes acessos de
(pseudo)crupe, também podem – sobretudo na puberdade –
fugir de situações difíceis, nas quais o perigo das drogas ou
o risco de uma recaída tornam-se elevados. Em um novo
contexto, será mais fácil modificar a temática da comida e
levá-la para outro nível. Em um ambiente arejado pelos
princípios da antroposofia, certamente é muito mais fácil
inserir-se com os outros em um campo novo e mais
saudável. No entanto, a esse respeito, as próprias mães
também podem tomar boas iniciativas. Pelos filhos, é
possível realizar, da maneira mais simples, aquilo que se
considera bom e correto, ainda que possa parecer meio
antiquado.
Um ponto a não ser subestimado é o ato de beber
corretamente. Todo ser humano deveria beber, pelo menos,
dois litros de água boa por dia, de preferência já na infância.
Parte dessa quantidade é absorvida também na alimentação,
na forma de frutas e verduras. Quem aprende a substituir os
refrigerantes pela água também se poupa de uma
quantidade não subestimável de calorias. Contudo, é mais
fácil dizer ou escrever do que fazer, pois essas bebidas são
muito doces, e sua publicidade é muito hábil. As bebidas
para crianças pouco diferem daquelas voltadas a atrair os
adultos. Se beber água fosse considerado mais legal,
milhões de pais seguiriam essas indicações com mais
facilidade. Os índices a respeito são realmente positivos. A
empresa Coca-Cola, por exemplo, entrou no comércio da
água, quando teve de dar por perdida a longa batalha contra
esta bebida.
No entanto, a melhor água, em absoluto, não é a mineral,
que fica parada dentro de garrafas, e sim a corrente e viva,
que sai da torneira. Quando dela se faz bom uso, por provir
naturalmente do solo, como nos países e nas regiões dos
Alpes (Áustria, Suíça e Baviera), a água mais saudável e
completamente livre de substâncias nocivas, bem como de
calorias, é aquela da torneira e que não custa quase nada.
De fato, a maior parte da água encanada nessas regiões
ainda oferece uma qualidade há tempos perdida na
Califórnia.
Mas como convencer as crianças em relação à sua
predileção pelos doces? Uma variante seria oferecer-lhes
refrescos naturais, por exemplo, feitos com suco de limão. A
estévia, adoçante vegetal e natural, é inócua e praticamente
livre de calorias. Poderia ser adequada para esse fim.
 
Perguntas para os pais:

Nosso filho consegue sentir suficientemente o
amor que recebe?

Como podemos estimulá-lo interna e
externamente a sentir prazer com o movimento?

Nosso filho tem confiança em si mesmo?
Consegue levar-se a sério?

Como podemos fazer com que ele tenha
curiosidade/fome de vida?

Nosso filho possui confiança primária? Como
podemos reforçar sua alegria natural de viver?

Somos um bom modelo no que diz respeito à
nossa relação com o alimento?
15.5 Distúrbios da fala
15.5.1 Gagueira
 
“Eu também gostaria de ter a palavra, mas ela não sai.”
 
Normalmente, a gagueira se manifesta entre o terceiro e o
quinto ano de vida, e apenas raras vezes após o sétimo.
Excepcionalmente, pode ser desencadeada por choques ou
experiências traumáticas, até mesmo em idade adulta.
É provável que, entre as pessoas que sofrem de gagueira,
o número de homens seja cinco vezes maior do que o de
mulheres, o que indica que o problema estaria relacionado a
um distúrbio no hemisfério esquerdo, região cerebral
arquetipicamente masculina. Os gagos conseguem cantar
quase sempre sem nenhuma dificuldade. Mesmo em estados
de profundo relaxamento ou em transe, sua fala flui sem
impedimentos. Enquanto a linguagem se encontra sob a
influência do lado direito e feminino do cérebro, o problema
desaparece sozinho.
Segundo alguns estudos, de 40% a 60% dos gagos
encontram o mesmo problema no pai ou na mãe, o que nos
leva a pensar em imitação social. Com frequência existe uma
história prévia, na qual o pai ou a mãe não deixava o filho
ter a palavra. Não raro trata-se de um pai bem-sucedido,
mas autoritário, que, em virtude da própria vitalidade e
impulsividade, não concedia ao filho seguir seu próprio
ritmo, mais lento, e sempre lhe tomava a palavra ou o
interrompia por pura impaciência. Quando a velocidade
normal de uma criança é desaprovada como lentidão e um
dos pais a critica e a influencia com tentativas de
abreviação, a criança tenta, necessariamente, falar mais
rápido e, em última instância, até como uma metralhadora e
acaba se sentindo sob pressão. Desse modo, o pai ou a mãe
com semelhante pretensão mostra alopaticamente ao filho a
tarefa que lhe cabe, ou seja, exprimir-se mais devagar em
vez de se comunicar como uma metralhadora. Em relação ao
outro cônjuge, que em cerca de metade dos casos também
era “atravancado” na infância, a criança reflete, em sentido
homeopático, a sua temática de articular-se de maneira mais
incisiva.
Segundo as experiências dos pediatras antroposóficos
Soldner e Stellmann, em grande parte dos afetados existe
um conflito inconsciente e correspondente, que acaba se
evidenciando como gagueira. Entretanto, um choque ou
trauma também são considerados causas possíveis. Em
cerca de 30% dos casos restantes, trata-se de um atraso no
desenvolvimento linguístico, provavelmente no centro da
linguagem, que pode ser visto até mesmo em uma alteração
no eletroencefalograma (EEG).
O que acontece quando se gagueja? As palavras ficam
literalmente bloqueadas na garganta e não saem com
fluência da boca, que, nesse caso, representa uma espécie
de megafone ambivalente. Como símbolo da expressão e da
maioridade, a boca faz ressoar os temas problemáticos.
Formular um enunciado torna-se extremamente difícil, e a
maioridade é colocada em discussão. As crianças também
podem exprimir seus pensamentos e sentimentos ou se
libertarem de maneira fragmentada. Frases como “não
consigo falar” ou “me deixe terminar!” podem contribuir
para compreender outros aspectos da situação psíquica.
15.5.1.1 Subcategorias da gagueira
Grosso modo, podem-se distinguir, sobretudo, três tipos de
gagueira:
 

Repetições involuntárias de sons e sílabas: nesse
caso, é clara a insistência em querer enfatizar
alguma coisa, mas também o medo de não ser
ouvido dizendo-a apenas uma vez. Esse tipo de
gagueira causa um efeito particularmente irônico
nos ouvintes e desperta pouca compaixão quando a
criança não consegue exprimir as palavras.

Extensão dos sons: é provável que a criança não
queira repetir-se constantemente; por isso, alonga as
sílabas, o que pode causar um efeito de extrema
“irritação” no ambiente. Em uma época de tanta
impaciência, alguém brinca manifestamente com o
tempo. Sabemos que, no futebol, esse
comportamento não é nada apreciado. Quando os
jogadores querem ganhar tempo, os espectadores
têm a sensação de que são feitos de bobos. O
mesmo efeito se dá com os insólitos alongamentos
das palavras pronunciadas pelos gagos, que
“brincam com o tempo” e com seu “público”.

Bloqueios durante a pronúncia de uma palavra ou
antes dela: por trás da incapacidade (quase)
completa da criança de formular uma palavra, é
possível que se esconda o fato de ela não ousar
esclarecer e expressar alguma coisa. Esta é a
variante mais frequente da gagueira e também
aquela que gera mais compaixão, desamparo e
disponibilidade para ajudar. Tem-se vontade de
abraçar a criança que não consegue se expressar, e
algumas pessoas antecipam as palavras para elas.
Quando todo mundo conhece a palavra que está por
vir e alguém, inconscientemente, faz disso um
drama, é natural que a situação acabe adquirindo
uma atenção toda teatral, que, no entanto, ocorre no
nível do inconsciente – e isso deveria ser ressaltado
em todos os sintomas – e não pode ser modificado
pela pessoa afetada. Um paciente que de gago
tenha passado a animador resolveu de maneira
impressionante o tema “estar no centro das
atenções e querer chamar a atenção”.
 
O pescoço representa a conexão e a comunicação, e
ambas são comprometidas na gagueira. Como o intercâmbio
verbal é muito difícil e vivido como efeito de nervosismo
tanto pelo mundo exterior como pela pessoa afetada,
somente a muito custo a comunicação consegue alcançar
seu objetivo, que é produzir comunhão (do latim
communicare, que significa “fazer junto, comunicar”). A
língua completa o quadro do problema, pois tem seu papel, é
responsável pela formulação da linguagem, mas também
pode ser usada como arma. Expressões como “está na ponta
da língua” (mas não sai), “frear a língua” (para não falar
demais), “morder a língua” (para não deixar escapar algo
perigoso) revelam quanta energia agressiva pode circular em
torno desse órgão. Para os gagos, as palavras simples
também se tornam trava-línguas. Eles chegam àquele
staccato típico da língua que, quando ouvido com mais
atenção, também revela um caráter agressivo.
Ao crescerem, as crianças procedem cada vez mais do
sentir para o pensar e, naturalmente, também querem
transmitir esse processo verbalmente. Quando isso não
ocorre, não conseguem se expressar e veem-se
automaticamente sob pressão, que pode aumentar a níveis
consideráveis. No terreno de um respectivo
congestionamento, a boca se torna uma passagem estreita.
O conduto é estreitado, e o resultado, um típico
atravancamento. Expressões como “as crianças são a boca
da verdade” e “a boca fala do que está cheio o coração”
revelam as maravilhosas possibilidades que não podem ser
aplicadas pelos gagos. Eles têm “papas na língua” e não
conseguem “ter coragem de abrir a boca”; todavia, por outro
lado, são preservados de “falar demais”, “cortar a palavra de
alguém” ou até de “tirar as palavras da boca de alguém”.
O desejo crescente de se expressar, embora nem tudo
esteja bloqueado de uma vez, leva os gagos a uma estranha
e impressionante inibição. Já não conseguem expressar o
que os pressiona e os oprime; por outro lado, também
submetem seus torturados ouvintes à pressão.
Podemos nos perguntar por que quase todas as pessoas
ficam tão irritadas com a gagueira. A resposta certamente
está relacionada à situação de frustração criada por ela. Não
se consegue ir adiante. O progresso é interrompido; a
imagem verbal do bloqueio torna-se ultraevidente. Alguém
sofre, sem ser ouvido, do congestionamento de impulsos que
não são expressos. Uma imensa aspiração contrasta com um
resultado mínimo, uma situação que muitos conhecem,
ainda que a experimentem e a elaborem de outra forma.
Com seu staccato verbal, os gagos forçam os outros a uma
atenção considerável. Todos se concentram neles, querem
ajudar a abrir caminho para as palavras e vivem
dolorosamente seu bloqueio. O que sai, no verdadeiro
sentido do termo, é apenas uma obra fragmentária. As
palavras não passam pelos lábios, ou seja, ao gaguejarem,
essas crianças se colocam no centro das atenções e exercem
um poder que, dependendo das circunstâncias, agrada aos
outros. Por fim, os presentes disponibilizam todo o tempo
necessário para suas exigências e ouvem ansiosos, embora
não totalmente atentos. Veem no bloqueio verbal da criança
todos os próprios bloqueios e, assim, embora em um nível
irremissível, unem-se a ela.
No constrangimento da atenção evidencia-se uma
pretensão ao domínio semelhante àquela presente na asma
brônquica, em que tomar ou inspirar o ar torna-se um
problema, pois, anteriormente, nada foi dado. Na gagueira,
também se bloqueia e se suspende o ato de dar, uma vez
que o fluxo da expiração, no qual a língua deveria se
modular, é constantemente interrompido, saindo aos
tropeços e solavancos em vez de fluir. Muitas vezes, em sua
base reside um acúmulo de agressividade reprimida. Não
raro, trata-se de coisas que não podem ser ditas nem
expressas, como situações de abuso sexual, que impedem o
fluxo tranquilo dos pensamentos, demonstrando, assim, a
que tipo de pressão a pessoa está submetida. Na gagueira
manifesta-se o rigor com que a pessoa afetada foi proibida
de falar. Às vezes, as próprias vítimas se proíbem e se
impedem de colocar para fora os horrores vividos, pois,
dependendo das circunstâncias, associam-nos a um
sentimento de culpa. Por outro lado, porém, o sintoma
mostra o quanto esses conteúdos reprimidos insistem para
sair; eis por que coloca todos os presentes sob pressão.
Justamente os aspectos obscuros, que foram empurrados
para o reino das sombras, precisam de expressão e voz a
longo prazo, a fim de recolocar a vida em seu fluxo. A
interrupção do fluxo vital da psique tem sua representação
mais eficaz na gagueira.
Algumas crianças, porém, não querem absolutamente ser
o centro das atenções; ao contrário, retiram-se ao máximo
para não serem um peso para ninguém. Falam tão pouco
que correm o risco de acabar em total isolamento. Isso
mostra claramente quão destrutiva pode ser a repressão.
Além disso, a gagueira é uma forma atormentada de
repetição constante. Por um lado, essas crianças não
conseguem dizer o necessário; por outro, tornam-no
particularmente importante – com a repetição constante –,
colocando a si próprias e os outros sob uma cansativa
pressão. Esta é uma das razões pelas quais os gagos
costumam ser evitados e excluídos. Não raro, as outras
crianças riem deles, o que, por sua vez, aumenta a pressão.
Nesses casos, bem como após choques, traumas ou
punições severas (sobretudo injustas), a língua é
literalmente bloqueada pelo medo. As palavras faltam no
verdadeiro sentido do termo. Nessas situações extremas, as
crianças podem “perder a língua” e, com ela, a capacidade
de “dar voz” a seus desejos. Já não conseguem exigir o
“direito à palavra”, mas tampouco dizer alguma coisa “da
boca pra fora”.
Houve um caso em que uma menina reagiu à separação
abrupta dos pais com a gagueira. Assim que o pai retornou,
a gagueira desapareceu com a mesma rapidez com que
havia surgido.
Tentativas posteriores – embora bem-intencionadas – de
reparar os erros cometidos com exortações do tipo “fale de
uma vez!” ou “diga o que o está incomodando!” costumam
ocorrer tarde demais, sobretudo quando o sintoma já está
consolidado.
As sugestões terapêuticas resultam da interpretação do
fenômeno. O problema localiza-se no hemisfério esquerdo e,
por isso, afeta apenas o polo arquetipicamente masculino. A
gagueira surge com a pretensão de (co)determinar a vida da
criança. Tudo o que flui, que tem ritmo e que provém do polo
feminino permanece inalterado; em contrapartida, o
intelecto e o que é influenciado pela razão é bloqueado. De
um lado (arquetipicamente feminino), tudo flui sem
impedimentos; as crianças cantam, dançam e conseguem
converter em palavras, sem nenhuma dificuldade, qualquer
cantilena, desde que esta provenha do hemisfério direito e
feminino do cérebro. Já o lado arquetipicamente masculino,
baseado no intelecto e na razão, no desempenho e na
eficiência, recusa-se a fazer isso de um modo que requer e
impõe atenção.
15.5.1.2 Soluções
O fato de o polo masculino ser impedido de exprimir-se
revela o dever de colocá-lo, antes de tudo, em segundo
plano. Antes que as crianças aprendam a falar, elas
expressam suas necessidades fisicamente, sorrindo ou
choramingando, gritando ou agarrando-se, chorando ou
abrindo um largo sorriso. Essa expressão corporal é a
primeira faculdade que dominam. Com a integração da
linguagem intelectual, própria do polo masculino,
evidentemente precisam dispor de mais tempo. Na imagem
verbal da gagueira, manifesta-se a hesitação necessária.
Depois de um choque, um trauma ou uma severa
repreensão, pode ocorrer uma regressão, de maneira que o
terreno masculino, originariamente já conquistado, é perdido
e deixa de funcionar com fluidez.
Antes de tudo, as crianças devem recuperar o polo
feminino como base e, a partir dele, reconquistar a
segurança. Se os pais cantarem, fizerem carinho, brincarem
e pintarem, estarão fazendo maior justiça a essa exigência.
Após uma situação de abuso, torna-se particularmente
evidente que não se pode tratar de dar explicações
intelectuais à criança; ao contrário, além de um tratamento
terapêutico eventualmente necessário, é preciso abraçá-la e
transmitir-lhe amor, para fazer com que ela volte a ter
esperança e confiança no mundo. Através de uma nova
conexão com a confiança primária, a criança poderá,
posteriormente, voltar-se com certa abertura também ao
polo masculino.
Um complemento útil é oferecido por meio da linguagem
das meditações conduzidas, que, governadas pelo polo
feminino, têm o objetivo de alcançar o relaxamento e o
transe. Trata-se de um tipo de linguagem sentimental e
emocional. Os pais poderiam aprender essa linguagem – sem
nenhuma dificuldade, através dos respectivos CDs – e
ensiná-la aos filhos. Na maioria dos casos, ela também pode
ser falada com fluência mesmo por crianças que sofrem de
forte gagueira. Uma linguagem que se baseia nos jogos de
palavras e na compreensão destas, bem como no prazer de
utilizá-las, conseguindo exprimir o próprio ritmo e o próprio
significado, mas, ao mesmo tempo, se dissolve na boca,
certamente é a que está menos predisposta aos sintomas da
gagueira. Em seu conjunto, é mais feminina, está mais
próxima dos sentimentos e das emoções e é mais apropriada
para veicular imagens de contos de fadas e fantasias. Por
natureza, uma vez que é intrinsecamente melódica, também
é uma linguagem que pode ser adaptada à música; pode-se
dizer que introduz a música na linguagem. Igualmente útil é
conectar a linguagem ao corpo e a seus movimentos. Nesse
sentido, dançar e brincar enquanto se canta também são
exercícios que se prestam ao mesmo fim.
Quando há o predomínio de um campo arquetipicamente
feminino, é natural que mais tarde se consiga conquistar
também o polo oposto masculino. O sintoma requer das
pessoas afetadas que elas dediquem uma atenção explícita
a esse polo. Elas devem controlar e analisar
manifestamente, subdividindo suas frases e palavras em
porções menores. “Uma coisa por vez” é a mensagem que
se pode reconhecer na gagueira.
Além disso, do ponto de vista homeopático, trata-se de
conquistar o próprio espaço, encontrar o próprio lugar, exigir
e tornar o centro de si mesmo e dos outros. Geralmente, a
gagueira se manifesta no jardim de infância, onde as
crianças têm de aprender a se impor, a expressar suas
próprias necessidades e a ser ouvidas. A partir de então,
seus desejos já não serão lidos em seus lábios nem em seus
olhos, mas terão de ser expressos por meio do intelecto e da
razão. Precisarão conquistar a atenção dos outros de outra
forma e aprender a interessá-los com outras estratégias. É
normal querer cativar as outras pessoas, mas, obviamente,
não por intermédio de uma gagueira torturante. Com ela se
transmite ao ambiente um contínuo estado de expectativa,
no sentido de que todos aguardam a palavra decisiva sair de
sua boca. Isso poderia ser alcançado de outra maneira. Em
vez de submeter os ouvintes e a si mesmo à pressão e à
tensão, por não conseguirem se expressar, as crianças com
gagueira deveriam conquistar com vigor esse novo mundo
emocionante e transformar-se em pessoas cativantes e
interessantes.
Além disso, o sintoma requer que elas aprendam a filtrar
seus pensamentos, a não deixar sair sempre tudo e em
qualquer ocasião, mas que adaptem a velocidade às
circunstâncias, que escolham o ritmo linguístico certo e
encontrem a melodia verbal. Os gagos estão fora do ritmo
consigo mesmos e com o ambiente. Como querem dizer
muitas coisas rápido demais, saem do ritmo e chegam a dar
a impressão de serem um tanto mal-educados quando, com
seu sintoma torturante, exigem demais de si e do ambiente.
O lema adicional no percurso terapêutico poderia ser: “Não
tudo de uma vez, mas uma coisa depois da outra”.
Uma boa possibilidade consiste em aprender outros
caminhos para controlar o pensamento e a linguagem, não
apenas detendo-se com mais frequência, mas também
repetindo internamente e refletindo sobre os pensamentos
antes de manifestá-los. Desse modo, a cabeça poderia
subtrair o controle do instrumento linguístico que está sob
estresse. O caminho do “querer ser compreendido” para o
“encontrar compreensão” poderia ser aprendido desse
modo.
O arco ainda pode ser mais esticado. Sob as vestes de um
gago, muitas vezes se esconde uma natureza muito
espirituosa, razão pela qual eles suscitam hilaridade. Por
isso, poderiam muito bem divertir os outros de maneira
agradável e, assim, passar da tensão negativa para a alegria
positiva. As piadas surgem de uma descarga inesperada da
tensão, que ocorre de maneira insólita e original. Desse
modo, o gago poderia liberar toda a tensão depositada em
sua maneira de se expressar através de curtos-circuitos
espirituosos e equivalentes, que lhe permitirão, por assim
dizer, como efeito colateral, encontrar seu fluxo verbal
rítmico. Assim como ele se rende ao fluxo dos sentimentos e
das imagens verbais, ele poderia fazê-lo até mesmo em
relação ao fluxo da vida, confiando nele em sentido amplo.
Em última instância, trata-se de fazer justiça, em um nível
mais liberto, ao arquétipo Urano, que se manifesta nesse
quadro clínico. Como ocorre nas brincadeiras modernas das
crianças irrequietas, trata-se de “sair da linha”, “passar dos
limites”, infringir as normas e levar uma vida divertida e
“louca”, de maneira mais original do que por meio da
inquietação dos difusos quadros sintomáticos da agitação ou
da gagueira.
Ao mesmo tempo, é oportuno ocupar-se e reconciliar-se
com conteúdos impositivos e inconscientes, a fim de vencer
aos poucos o medo que eles geram. Para tanto, seria
necessário encorajar mais as crianças no que se refere a
pensamentos que surgem ocasionalmente, para que elas
aprendam a resistir e, sobretudo, a confiar nas imagens
mentais, provenientes do hemisfério feminino direito.
Para reconhecer os próprios lados obscuros, também é
necessário confessar a si mesmo os desejos de poder e
controle sobre os outros, bem como encontrar caminhos
mais livres e percorrê-los. Justamente por ser um ponto tão
delicado, as crianças podem precisar da ajuda dos pais
nesse processo.
É natural que as crianças queiram ter a palavra. Por isso,
seria bom conceder-lhes conscientemente “horas de
diálogo”, nas quais elas tenham tempo para exprimir os
próprios interesses. Elas precisariam, por assim dizer, de
espaço para sua autorrepresentação. A palavra “exprimir” é
bela e deve ser levada ao pé da letra. Exprimir-se em vez de
espremer-se ou até mesmo ser espremido!
Segundo Soldner e Stellmann, o trabalho logopédico
também deveria envolver os pais. As crianças teriam de ser
cada vez mais integradas às conversas, encorajadas
verbalmente e, em nenhum caso, poupadas. É necessário
possibilitar a discussão e a expressão, para que as
impressões possam ser elaboradas, o que acontece de
maneira decisiva por meio da expressão.
Se as crianças comprimirem a linguagem, possivelmente
se sentirão pressionadas pelos pais ou por seu ambiente
social, para não dizer totalmente chantageadas, a fim de que
não digam tudo o que sabem, de maneira que a instância do
controle é sobrecarregada (por exemplo, nos casos de
abuso). Por outro lado, podem sentir-se exploradas quando
se quer tirar delas muita coisa com muita rapidez (em
termos de desempenho). Nesse caso, haveria que se pensar
na impaciência e na ambição excessiva, ou seja, em
expectativas muito elevadas por parte dos pais. Somente
eles podem interromper os círculos viciosos que se
desenvolvem. Seria vantajoso adotar uma dupla estratégia
entre as horas de diálogo já mencionadas e os
questionamentos dos pais, especialmente em relação às
expectativas pessoais e a todos os projetos ambiciosos.
O objetivo é tornar a criança segura de si, deixando-a viver
como em transe, sem refletir e, sobretudo, livre do medo,
para que a vida possa fluir e transcorrer como as palavras no
canto.
 
Perguntas para os pais:

Em que situações não deixamos nosso filho
terminar de falar?

Como podemos transmitir-lhe a alegria de falar?

Em que circunstâncias somos impacientes?

Por que nosso filho não ousa abrir a boca?

Que perguntas o colocam sob pressão e quais o
encorajam?

Em que situações nosso intercâmbio fica
paralisado? Quando não conseguimos seguir em
frente?

Dedicamos tempo suficiente ao nosso filho?

O que reprimimos? Qual assunto deveríamos
trazer para a conversa?

Houve alguma experiência traumática?
 
Medidas de apoio:

Terapia craniossacral: pode ser útil quando o
possível fator desencadeador ou uma
circunstância concomitante da gagueira for um
acidente, um parto difícil ou um retardo geral do
desenvolvimento.

Exercícios que estimulam o senso de ritmo, como
dançar, tocar bateria, andar com bastões de
caminhada ou aprender eurritmia.

Artes: cantar, rimar, decorar e recitar textos.

Horas de diálogo: dar a palavra à criança e
deixá-la terminar de falar; conceder-lhe tempo;
ouvi-la com calma e relaxamento.

Fazer poucas advertências e não nutrir
expectativas. Evitar situações de estresse.

Negar à criança o poder de colocar-se no centro
das atenções através da gagueira. Não dispensar
uma atenção especial ao processo linguístico.

Meios de comunicação de massa: evitar o
excesso de estímulos por computador, televisão,
etc.

Providenciar uma regeneração e um sono
suficientes.

Treino de conversação: com o auxílio de um
metrônomo e escandindo as sílabas, de
preferência com o acompanhamento de um
especialista.
15.5.2 Ceceio

“Chamo a atenção porque sou inconveniente.”


 
No caso do ceceio, é como se a língua fosse comprida
demais e batesse nos dentes anteriores. De certo modo, ela
se escandaliza e passa a suspeitar de que o enunciado
também poderia ser ligeiramente inconveniente.
Normalmente, trata-se de um pequeno defeito de pronúncia,
muitas vezes relacionado a um período de transição, por
exemplo em relação à perda e troca de dentes. Com
frequência, as crianças passam intencionalmente por uma
fase de ceceio, na qual, geralmente em seu peergroup,
chegam a se esforçar para cecear. Nesse período, esse
inócuo defeito de pronúncia lhes confere certo ar de tolice,
que às vezes elas enfatizam deliberadamente. Crianças que
ceceiam de propósito relacionam essa característica a um
comportamento infantil que muitas vezes pretende exprimir
algo como: “Ainda não sei falar direito; seja amável comigo”.
Entretanto, quando essa anomalia da fala não se perde,
ela merece uma interpretação séria, uma vez que pode
permanecer relevante por toda a vida. À medida que o
ceceio é acompanhado por um sibilar contínuo, ou seja, a
língua se desloca para a frente dos dentes, ele lembra uma
serpente. De fato, os sons também adquirem um aspecto
levemente sibilante. Eis por que poderia se tornar
preocupante: a serpente Kaa, em O Livro da Selva, ceceia e,
embora tenha um ar simplório, é perigosa e traiçoeira,
aspectos que só consegue esconder por trás de seu jeito
aparentemente ingênuo.
A tarefa consistiria em prestar atenção nessa característica
e tomar consciência do próprio sibilar de uma língua
possivelmente afiada, escondendo-a quando ela sibilar
ativamente. Quando a conotação negativa expressa for
intencional, ela poderia ser cultivada em nível consciente,
pois, dependendo da situação, pode fazer sentido defender
os próprios interesses de maneira sibilante e alerta.
Do ponto de vista alopático, os pais poderiam recorrer no
correspondente treino logopédico de pronúncia, em que as
crianças aprendem a recuar um pouco e a fazer o mesmo
com a língua, ou seja, a ter certa reserva no âmbito verbal.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho quer dar a impressão de
estupidez e ingenuidade?

Será que ele tem mesmo uma língua afiada?

O que ele não quer exprimir?

Para que temas escandalosos ele quer
inconscientemente chamar a atenção?
 
Medidas de apoio:

Homeopatia e logopedia.

15.6 Tiques
“Ajo de maneira diferente.”
15.6.1 Redimindo o princípio uraniano

Os tiques pertencem ao princípio arquetípico de Urano e, ao


mesmo tempo, o representam muito bem. Chamam a
atenção e tiram seus portadores da sua função (normal). A
criança suscita uma impressão diferente, que vai da
singularidade à estultice. Uma criança com um tique curioso
acaba por se excluir do grupo e, não raro, é ridicularizada.
Melhor seria, nesses casos, trazer espontaneamente mais
loucura para a vida, sair da linha e passar dos limites, dar
uma de louco, percorrer caminhos novos, próprios e originais
– ou então dançar e, assim, fazer justiça ao princípio
uraniano em um nível de maior redenção.
A respeito desse tema, vale a pena assistir ao filme da
Disney Duas Vidas, com Bruce Willis. Nele, o pequeno tique –
a contração compulsiva de uma das pálpebras – indica ao
protagonista o caminho para resolver um problema da vida:
o bem-sucedido consultor de imagem perdeu a tal ponto o
acesso à sua criança interior que esta se insinua em sua vida
– em termos psiquiátricos se diria “de maneira psicótica” – e
a tumultua até ele voltar a falar e, sobretudo, brincar com
ela. A contração da pálpebra, vivida diariamente pelo
protagonista, é a única lembrança, embora inconsciente, que
restou do terrível episódio em que seu pai lhe atribui a culpa
pela morte da mãe. Por isso, mesmo não se lembrando do
evento, ele passa metade da vida punindo o pai com
desprezo. Ao reviver conscientemente a situação da injusta e
injustificada atribuição da culpa, a recordação retorna, e o
tique desaparece no mesmo instante.
Quando visto repetidas vezes, esse filme pode constituir,
também para as crianças, uma espécie de terapia para os
tiques. Pode-se, inicialmente, assistir a ele com a criança
que sofre de tiques, como simples diversão, e depois discuti-
lo em detalhes, no sentido especificado acima. Em uma
segunda ocasião, vale a pena vê-lo novamente para atingir
esse nível de compreensão. Ao final, como acontece no
filme, é recomendável proceder a uma meditação conduzida
sobre o tique da criança. O ideal é que o pai ou a mãe realize
essa meditação, fornecendo sustentação ao filho.
Os tiques revelam e lembram problemas e temas
reprimidos, antigos, mas ainda importantes. Tal como os
famosos atos falhos de Freud, eles conduzem às pistas de
feridas do passado, delitos, desentendimentos, traumas
insuportáveis, até crimes não expiados.
Quando nos concentramos em um tique, ele se reforça. A
tentativa de evitá-lo torna seu “proprietário” nervoso ou até
agressivo, não mais senhor da casa que é seu próprio corpo.
Visto por esse ângulo, dar livre curso aos tiques comporta
certo alívio. Pelo menos assim, as pessoas afetadas
permanecem em contato com a problemática reprimida. Os
tiques obrigam a isso, e não se pode fazer nada para impedi-
los. Quando recebem atenção, conduzem, por assim dizer,
toda a energia para o tema a eles vinculado, na esperança
de trazer novamente à consciência a relação com o
problema real.
Nesse sentido, caberia aos pais acessar, junto com seus
filhos, o segredo do tique, interpretá-lo até ele revelar esse
segredo e, por fim, reviver a situação originária. Somente
então o tique irá desaparecer, pois sua tarefa, ou melhor,
seu dever terá sido cumprido. Toda a tensão e todo o
acúmulo de energia, que até então se descarregaram de
maneira incontrolável no tique, podem finalmente estar
disponíveis para outros objetivos mais importantes.
Com efeito e, de resto, como sempre, a linguagem corporal
já diz tudo: Se “ajo de maneira diferente”, é porque tenho
algo a esconder. Como uma bomba-relógio, o tique também
deve ser desativado, ou melhor, interpretado. Se “um
parafuso estiver solto”, tem de ser encontrado e apertado.
Os tiques sempre têm algo a comunicar e, com essa
finalidade, provocam para despertar a atenção. Querem nos
conduzir à pista certa. Por isso, são chamativos e incômodos.
Com seus tiques, as pessoas afetadas estão sempre no
centro das atenções e causam um efeito bastante
penetrante. Com frequência, em relação a seus tiques,
suscitam reações como: “Pare com isso, está me deixando
nervoso!” No entanto, é óbvio que elas não têm como parar,
pelo menos não enquanto o segredo não for revelado.
Por essa razão, o melhor a fazer é incorporar o espírito da
Miss Marple e do Sherlock Holmes e colocar-se no encalço
dos tiques, a fim de descobrir sua origem e reviver a
situação “submersa”. Tendo-se encontrado o episódio
“enfeitiçado”, o ideal seria resgatá-lo através de movimentos
oculares migratórios, descritos no livro Notfallapotheke für
die Seele [Farmácia de Emergência para a Alma].
A partir do que foi dito anteriormente, conclui-se que os
tiques costumam ser a consequência de uma repressão
emocional ativa. No caso de pais com expectativas muito
elevadas, cujos filhos estão sob pressão e já cederam a
respeito de si mesmos e de uma vida própria, com
frequência um tique representa o último sinal, o último
impulso vital capaz de conduzir às pistas da salvação e com
condições de fazê-lo.
Em todos esses aspectos, não podemos esquecer que,
muitas vezes, as crianças adquirem hábitos de curta
duração, a fim de se tornarem interessantes ou
impressionarem um bom amigo que talvez tenha o mesmo
tique. Portanto, por trás desses distúrbios comportamentais,
nem sempre existe um problema psíquico mais profundo.
Como costuma ser o caso, vale aqui observar a situação com
cautela.
15.6.2 Diversos tipos de tiques e seu pano de fundo

As seguintes interpretações esquemáticas devem ser


entendidas apenas como indicações iniciais; as soluções
reais são muito individuais e residem no próprio íntimo, no
qual podem ser descobertas e resolvidas da melhor forma
com meditações conduzidas nos mundos das próprias
imagens anímicas. Quanto ao tratamento homeopático,
essas peculiaridades comportamentais tão evidentes
representam indícios muito importantes e, com frequência,
indicam o caminho direto para o medicamento adequado:
 

Contrações (“nervosas”) da(s) pálpebra(s) costumam
aludir a algo que a criança viu ou viveu, mas não
conseguiu elaborar (na época). A esse caso pertence
a já mencionada história do filme Duas Vidas.

O fechamento (compulsivo) dos olhos remete muitas
vezes a um acontecimento que a criança preferia
não ter visto ou que não tivesse ocorrido; por isso,
ela “fecha um olho” ou até os dois, preferindo
proceder conforme o ditado: “Longe dos olhos, longe
do coração”. Quando ambos os olhos são fechados,
certamente existe alguma coisa chocante escondida
na sombra, que está esperando por ser descoberta.

Piscar quer exprimir uma confissão secreta: “Ouça o
que quero lhe dizer, e que fique entre nós!” Talvez
também seja uma alusão “... o que tenho a lhe
oferecer”. Esse tique poderia se referir a uma grande
possibilidade perdida no âmbito de uma amizade ou
de uma relação de casal, mas também simplesmente
a ambições e desejos irrealizados nesse contexto.

Arregalar os olhos exprime espanto, consternação ou
admiração, mas às vezes também medo e susto.
Quando se torna um tique, provavelmente tem a ver
com um segredo que estaria ligado a um desses
comportamentos.

Torcer o nariz exprime repulsa, talvez uma
repugnância que não foi expressa no momento
oportuno e que pretende recordar a ferida causada
na época à criança.

Tocar (continuamente) o nariz indica que, em uma
situação importante, a pessoa afetada está
preocupada com seus próprios atos e em assumir a
responsabilidade, em vez de se reprimir. Esse gesto
evoca uma falha, vivida como humilhação ou
vergonha.
Nos rapazes, também poderia exprimir uma
referência sexual, no sentido do dito popular:
“Quanto maior o nariz do homem, maior seu
atributo”. Por trás disso pode estar oculta uma falha
sexual, vivida como culpa. Talvez o jovem tenha
“culpa no cartório”, envergonhe-se de sua
masturbação excessiva ou atos semelhantes.
Contudo, também pode ser simplesmente um sinal
de reflexão.

O chamado fungar frequente é, antes, um mau
hábito que pode se tornar um tique, deixando os pais
com os nervos à flor da pele, especialmente, é claro,
quando têm certa aspiração às boas maneiras. Do
ponto de vista médico, o ato é totalmente inócuo; os
“fungadores” criam certa pressão negativa e, em vez
de expirarem o muco nasal, inspiram-no e mandam-
no, através do esôfago, para o estômago, onde é
digerido.
Geralmente, tudo começa porque a criança tem
preguiça de limpar regularmente o nariz;
simplesmente não tem vontade de assoá-lo ou não
dispõe de nenhum lenço à mão. Mais tarde, quando
o ato desencadeia uma forte e inesperada reação
dos pais, as crianças que sofrem de falta geral de
afeto podem sentir vontade de manter esse mau
hábito, até para levar alguns tapas – que sempre são
uma reação e, portanto, melhores do que nada... É o
que fazem alguns artistas que fazem provocações a
todo custo, a fim de, pelo menos, desencadear
alguma reação no público.
O ruído produzido não é muito diferente do grunhido
de um porco e é considerado extremamente
indecoroso. Nesse sentido, se o segredo se
transformar em tique, poderá estar relacionado a
algo inconveniente que, por esse caminho, bate às
portas da consciência.

Fazer caretas poderia aludir a experiências de horror
e de sombra, com as quais o indivíduo se confrontou,
mas que não elaborou. Em seu polo oposto, também
poderia revelar um palhaço oculto, que quer levar
alguém ao riso, por exemplo porque, em uma
situação decisiva, não conseguiu fazê-lo, talvez no
momento em que a mãe, abandonada pelo pai,
tivesse precisado tanto de uma distração. Quando a
circunstância é vivida como um fracasso pessoal,
todo o sofrimento da situação pode armazenar-se
energeticamente nesse tique.

O ato (constante) de escarrar exprime desprezo e
avilta um pouco o ambiente circunstante. Pode
evocar uma repulsa não expressa, uma situação que
merecia o escarro ou até mesmo o vômito e à qual
faltou a reação adequada. No entanto, muitas vezes
também pode se tratar apenas de uma provocação
em relação aos pais ou, mais raramente, de uma
sinusite crônica. Com frequência, esses hábitos
encontram entre os jovens uma base de massa de
curto prazo graças a algum esportista da moda. Os
jovens tendem a imitar não apenas seus ídolos, mas
também seus maus hábitos.
Escarrar pode igualmente simbolizar uma espécie de
ejaculação para cima; nesses casos, em geral é
seguido por atitudes tipicamente masculinas, tão
evidentes quanto embaraçosas.

O ato (frequente) de grunhir como um porco pode
aludir a sentimentos e sensações “próprios de um
porco”, que nunca foram expressos e evocam certa
situação obscena, que demanda ser descoberta.
Uma menina desenvolveu esse tique após uma
situação de abuso. Inconscientemente, ela imitava a
respiração ruidosa de seu algoz, que, apesar de ser
um notável cidadão, nesse caso se comportou
sordidamente.
Portanto, o grunhido poderia indicar um segredo
ligado à repugnância e à sujeira, mas raras vezes
também poderia estar associado àquela felicidade
representada pelo “porco”. Além disso, pode ser uma
provocação semiconsciente, sobretudo em relação a
pais fanáticos por limpeza, conforme observei certa
vez em um menino que não apenas cuspia e
grunhia, mas também fungava continuamente. Ele
aprendera que, pelo menos desse modo, forçava a
dedicação negativa de sua mãe pedante. Em casos
de alergia ou resfriados crônicos, que deixam a
sensação de se ter um sapo na garganta, esses
ruídos também podem surgir e se transformar em
hábito.

Ato (compulsivo e frequente) de colocar o dedo na
boca: chupar o polegar, que pode ser entendido
como uma regressão à fase oral, é diferente de
chupar o indicador, que se vincula, antes, à
perplexidade e ao espanto. Cada dedo corresponde a
um princípio primário e, como tal, pode ter uma
interpretação correlacionada. Esse tique também
poderia aludir a uma regressão àquela fase remota
em que tudo é explorado pela boca.
Portanto, o segredo oculto por trás desse tique
estaria ligado a esses temas. Possivelmente, a
criança enfiou o dedo em outras aberturas proibidas
e relacionadas a tabus, que simbolicamente estão
ligadas à analogia “o que vale para a parte de cima,
vale para a de baixo”.

Abertura involuntária da boca: esse tique pode
evocar as últimas respirações de um peixe, mas
também lembra o quadro “O Grito”, de Edvard
Munch. Portanto, simbolicamente pode se tratar de
um grito sem som e, por conseguinte, de um tique
que queira reclamar algo que merecia um grito. Por
outro lado, pode referir-se a uma situação em que a
criança abriu muito a boca e, provavelmente,
manifestou algo muito estúpido ou inadequado. Por
fim, também pode tratar-se de um segredo que a
está devorando.
Se não houver distúrbios físicos, como uma oclusão
nasal ou algum problema na mandíbula, esse tique
pode indicar um espanto incessante e,
eventualmente, um susto crônico.

Afastar continuamente alguma coisa do rosto: esse
gesto lembra o de tirar um véu, tentar enxergar e
ganhar perspectivas. Talvez por trás dele também
haja algo repugnante, que precisa ser removido. O
segredo poderia estar relacionado ao fato de que a
criança se sente manchada e suja e tenha de afastar
alguma coisa para conseguir continuar a viver.

Afastar os cabelos do rosto: nesse caso, talvez esteja
em jogo toda uma simbologia dos cabelos, que,
como expressão de liberdade e poder, parecem ser
um obstáculo à beleza e à elegância. Nesse gesto
estereotipado, trata-se de uma espécie de
arrumação. Talvez, no fundo da alma, devam-se
colocar esses temas em ordem. Ou então a pessoa
afetada quer abrir uma cortina para exprimir uma
ambivalência entre esconder-se e querer enxergar
alguma coisa.
Esse gesto, que aparece com frequência nos
adolescentes, pode simplesmente desaparecer ao
final dessa fase do desenvolvimento. Alguns cortes
de cabelo até requerem esse movimento. Na maioria
das vezes, ele exprime que a pessoa está lutando
por autoconsciência e soberania.

Passar continuamente a mão pelos cabelos: por trás
desse gesto poderia esconder-se um problema ligado
à ordem, ao controle e à adaptação às circunstâncias
do momento. Porém, também poderia evocar um
gesto de carinho, talvez realizado no lugar errado ou
que subentende uma coisa diferente daquilo que
aparentemente exprime e termina em algo que
nunca foi manifestado.
Todavia, também pode ser a lembrança da falta de
gestos de carinho, que ocorreram em determinada
situação e depois não se repetiram. Com esse
movimento, uma menina se lembrava do amor que
seu pai lhe demonstrara ao se despedir dela, quando
foi expulso de casa pela mãe na sua frente. Essa
imagem correspondia à sua realidade, embora não
adulta. Em todo caso, o tique recordava a falta de
amor do pai.

Girar (continuamente) a cabeça: com esse gesto,
podem surgir associações com o ato de demonstrar
interesse por alguém e de querer virar a cabeça de
alguém (no sentido de “fazê-lo apaixonar-se”).
Contudo, é mais provável que também seja um
gesto de desvio, quando se gira a cabeça porque se
viu alguma coisa muito feia.

Empurrar (continuamente) os óculos sobre o nariz: é
bastante evidente que, nesse caso, a pessoa quer
enxergar melhor e com mais precisão ou ajustar sua
visão. Seu segredo poderia referir-se a uma
circunstância em que, em algum lugar e em algum
momento muito importante, ela não conseguiu
enxergar o suficiente.

Estalar a mandíbula: quem costuma estalar a
mandíbula exprime, ao abrir a boca e com sua
mordida e vontade, uma ameaça de engolir. Talvez,
no passado, o indivíduo realmente tenha tido de dar
uma mordida alguma vez, mas não teve coragem –
ou então foi mordido.

Encolher os ombros denota indiferença, insegurança
ou ignorância. Mas também pode representar uma
pergunta sem resposta. Possivelmente, um tique
como esse lembra uma pergunta importante e nunca
feita, que permaneceu como um grande ponto de
interrogação na vida do indivíduo em questão.

Levantar os ombros: esse tique é muito semelhante
ao anterior, mas poderia estar relacionado ao medo
e à correspondente atitude da tartaruga de se retirar.
Talvez, em um momento decisivo, a pessoa afetada
por esse tique também tenha sido severamente
repreendida e, por isso, se retraiu.

Puxar a roupa: com esse gesto, dedica-se atenção à
própria roupa. Possivelmente as pessoas afetadas
por esse tique não se sentem bem em sua segunda
pele; talvez a sintam como inadequada. Ou então é
um sinal de que alguma coisa não está correta –
talvez uma coisa insignificante, mas que esconde
muitas outras.

Puxar continuamente a saia para baixo: trata-se mais
de um hábito, com o qual a menina mostra que
realmente não se sente bem com a liberdade que
escolheu (em termos de roupa) e não consegue nem
mesmo se sentar. Na verdade, envergonha-se
inconscientemente do próprio fascínio.

Colocar (frequente e compulsivamente) a mão entre
as pernas, como Michael Jackson costumava fazer no
palco, tem uma nítida referência sexual. Por trás
desse gesto pode ocultar-se a vergonha por alguma
falta cometida em relação ao tema fálico ou, em
todo caso, sexual. Esse tique esconde e enfatiza, ao
mesmo tempo, o órgão sexual e pode apresentar-se
tanto nos meninos quanto, mais raramente, nas
meninas.

Tique das extremidades: com esse gesto
espasmódico se descarregam claramente energias e
impulsos não vividos, que aludem ao fato de que
alguém quer ou queria pôr-se em movimento ou
mover alguma coisa, talvez até para livrar-se dela,
mas não o fez no momento oportuno.

Estalar os dedos dos pés: esse tique, geralmente
raro, refere-se à tentativa de colocar um pé no chão
ou firmar-se, descarregando a tensão. O segredo
poderia consistir no fato de que, em determinado
momento, a pessoa afetada perdeu o contato com o
solo e já não tem, por assim dizer, os pés no chão e
a vida “sob controle”.

Síndrome de Tourette: essa síndrome consiste em
um conjunto de tiques que se reúnem em um quadro
clínico complexo e particular. Trata-se de uma
doença motora, com espasmos repentinos,
sobretudo no rosto (como piscar, estalar a língua e
torcer a boca), mas também na região do pescoço
(movimentos bruscos da cabeça) e dos ombros (girar
os ombros). Ocasionalmente, pode chegar a um
movimento violento, que sacode todo o corpo.
Também se podem produzir sons involuntários, que
incluem imprecações da pior espécie (mais
informações a respeito no livro A Doença como
Símbolo).

Atos compulsivos: atos compulsivos, como lavar-se
continuamente, abrem caminho para os tiques.
Através de sua interpretação simbólica, eles também
se vinculam a temas reprimidos que, no fundo da
alma, esperam por compreensão e elaboração.

15.7 Maus hábitos


15.7.1 Estalar os dedos
 
“Prestem atenção em mim; tenho mais de um defeito.”
 
Nesse caso, a pessoa quer mostrar que deseja pôr logo mãos
à obra e agir. Muitas vezes, os esportistas exibem em público
alguns hábitos que, com o tempo, podem assumir o caráter
de verdadeiros tiques. Frequentemente, esses hábitos
surgem como superstição. Quando determinado
comportamento se associa a um sucesso muito desejado, ele
pode levar a uma repetição sem sentido. São gestos
simbólicos, que vão desde arrumar os cabelos, passando por
se coçar até modelos sempre repetidos de movimentos, por
exemplo com a raquete de tênis ou de volante, que
supostamente prometem sucesso, mas também pigarrear
repetidas vezes, o que aludiria ao fato de que alguém, ainda
que apenas uma vez, queria dizer alguma coisa.
Tanto quanto os tiques, esses “hábitos tolos” podem ser
abandonados quando o indivíduo se conscientiza de seu
verdadeiro desejo.
 
Perguntas para os pais:

O que nosso filho quer fazer?

Com o que quer começar?
 
Medidas de apoio:

No caso de estalar os dedos, geralmente se trata
apenas de um hábito “tolo”. Ao que parece, as
pessoas afetadas querem “se mexer” e fazer
alguma coisa, descobrir o “ponto crucial” e, em
seguida, entrar em ação. Portanto, pode-se
aceitar esse sintoma sem preocupação.
15.7.2 Enfiar o dedo no nariz

“Estou com vontade de enfiar o dedo lá no fundo.”


 
Enfiar o dedo no nariz também constitui, sobretudo, um mau
hábito, cuja referência simbólica, porém, não pode ser
ignorada. Pode acabar se tornando um tique compulsivo.
Na maioria das vezes, a pessoa em questão massageia
delicadamente com os indicadores a mucosa do nariz,
embora o relativo muco já forneça o lubrificante desejado.
Com esse muco, os “especialistas” formam bolinhas que, tão
logo se ressecam depois de extraídas, são lançadas por eles
no ambiente em que se encontram, deixando bastante
furiosos os “cidadãos decentes”. Na verdade, deveríamos
perguntar: por quê?
No vagão de um trem, testemunhei certa vez o deleite de
um menino ao enfiar o dedo no nariz, para irritação de um
viajante mais velho. Por fim, o homem não aguentou e
dirigiu-se à mãe do garoto: “Será que a senhora não poderia
proibir seu filho de fazer esse tipo de porcaria?!”
A mãe bem que tentou, mas o menino sempre
recomeçava. O homem mal conseguia se conter. Contudo,
nem mesmo o cobrador, chamado para ajudar, conseguiu
explicar por que nos trens alemães é proibido enfiar o dedo
no nariz.
A solução é simples e reside na relação simbólica do nariz
com a sexualidade. De fato, através das zonas de reflexo, as
mucosas nasais correspondem àquelas em âmbito
ginecológico e na região sexual masculina. Portanto, é
inevitável que a pessoa que se refere à sexualidade em
público – justamente como fazem as crianças quando enfiam
o dedo no nariz – tornará presente reações irracionais de
defesa por parte do ambiente circunstante. Por outro lado,
também se haveria de perguntar por que alguém tem a
necessidade constante de enfiar o dedo no nariz.
A resposta é simples: trata-se de inofensivas, mas
voluptuosas brincadeiras com o muco da região fálica, tal
como se espera que ele se produza na verdadeira relação
sexual. As mucosas nasais, em que na verdade se realiza
essa brincadeira, corresponderiam simbolicamente àquelas
da parte inferior do corpo. É um pouco como fazer carícias
sensuais em si mesmo, satisfazendo, ao mesmo tempo, as
necessidades orais e fálicas. De maneira igualmente
simbólica e mais inocente, as crianças também gostam de
brincar com o dedo na boca, o que também provoca
admoestações por parte dos pais, como: “Tire os dedos da
boca; eles estão sujos”. Quando os pais reagem tão
negativamente a essas atitudes dos filhos, que na verdade
constituem medidas gerais de fortalecimento e até
prevenções reais contra alergias, muitas vezes estão em
jogo referências simbólicas inconscientes.
A evidente tarefa relativa ao mau hábito de enfiar o dedo
no nariz consistiria em permitir à criança que o pratica viver
uma sensualidade maior, por exemplo na forma de
massagens para crianças, segundo o método de Frédérick
Leboyer, ou então encorajando-as a se lambuzarem, a
pintar, a espalhar as tintas com os dedos, a modelar massa
de bolo, plastilina e argila. Permitir que passem creme no
corpo e se divirtam com brincadeiras sensuais, que tenham
prazer com o próprio corpo, por exemplo em água termal à
temperatura corporal, que façam cócegas e riam
voluptuosamente seriam bons auxílios. Os estímulos orais,
bem como a curiosidade infantil, podem ajudar. Por que as
crianças enfiam bolinhas no nariz? Certamente não para
assustar nem enfurecer os pais, mas simplesmente para
explorar as próprias cavidades obscuras. Fazem no
microcosmo do próprio corpo o que repetem do lado de fora,
no macrocosmo, com as cavidades da natureza.
Na realidade, observado desse ponto de vista, enfiar o
dedo no nariz é um bom sinal. Significa que as crianças
ainda não têm medo do muco como os adultos, que reagem
tão negativamente a um prazer sensual obtido com o nariz.
Se esse sintoma realmente os irrita e incomoda, os pais
dessas crianças poderiam se perguntar se neles próprios a
sensualidade não foi posta de lado e se não deveria ser
transferida a níveis mais prazerosos. Existem locais ideais
para a secreção do muco e outros menos ideais. Se alguém
irrita os outros por tirar o muco do nariz em local
inadequado, a primeira suspeita é evidente. Todavia, enfiar o
dedo no nariz também poderia acabar com uma suspeita
menos concreta e agradável, pois pode ser o primeiro sinal
de vermes.
 
Perguntas para os pais:

Como lidamos com nossa sensualidade?

Damos a nosso filho contato físico e sensorial
suficiente?

Damos-lhe a permissão para se sujar?
 
Medidas de apoio:

Deixar que a criança brinque com lama, tintas,
massa de modelar e espuma de barbear.

Massagem com óleo em todo o corpo.

15.8 Distúrbios comportamentais


Vivemos em uma época caracterizada pela tendência ao
surgimento cada vez mais precoce ao longo da vida de
quadros clínicos psíquicos e distúrbios de comportamento.
Se até pouco tempo atrás não se observavam casos de
depressão antes da puberdade, hoje temos muitos
contraexemplos de jovens que chegam até a cometer
suicídio. Uma tendência análoga ocorre com as psicoses, que
no tempo de minha graduação eram um tema da pós-
adolescência, enquanto atualmente também aparecem nos
mais jovens. Por essa razão, já não é tão fácil realizar uma
subdivisão por grupos etários, embora ela ainda seja
importante. Essencialmente, na primeira infância, as
anomalias comportamentais estão mais relacionadas aos
pais do que na adolescência; os jovens nesta fase sofrem a
influência de seu peergroup e vivem dentro de grupos
sociais que atuam amplamente como substitutos da família.
15.8.1 Distúrbios comportamentais na infância
15.8.1.1 Ciúme
“Quero você inteiramente só para mim.”
 
Dentre os três vícios dominantes em nossa sociedade –
avidez, desejo de domínio e ciúme –, o último é responsável
pela destruição da maioria dos relacionamentos. Nesse
sentido, não é de admirar que se manifeste logo cedo, por
exemplo na forma do desejo de ter a mãe inteiramente só
para si.
Para um primogênito que, no início da segunda gravidez
da mãe, tenha recebido pouca confiança primária, a chegada
de um novo irmãozinho agravará seu maior medo, que é ser
deixado pela pessoa de que mais necessita em favor de um
novo “intruso”. Como ainda não é suficiente para si mesmo e
é totalmente dependente da mãe, ele luta com todas as
armas quando julga que está sendo prejudicado. E não se
devem absolutamente subestimar as armas infantis. Uma
jovem mãe que descuidara por um instante de seu recém-
nascido encontrou-o intacto na lata de lixo. Fora colocado ali
por sua filhinha de 3 anos, que, depois da reação horrorizada
da mãe, lhe confiou: “Mamãe, não precisamos do bebê;
antes tudo era muito melhor”.
Embora o agente desencadeador mais frequente dos
dramas de ciúme seja o nascimento de um irmãozinho,
também pode se tornar vítima dele uma mãe que, aos olhos
do filho, esteja muito concentrada em seu parceiro. Mesmo
sua profissão pode ser objeto do ciúme e, de modo geral,
tudo que absorva o tempo da mãe além da criança. E isso
tem menos a ver com uma negligência objetiva em relação à
criança do que com a falta de confiança primária por parte
do filho.
Por trás do ciúme, há sempre o medo de não conseguir
fazer as coisas sozinho, sem a mãe, que é amada acima de
tudo, bem como o desejo de ter somente para si o objeto do
amor. Justamente essa exclusividade pode tornar muito
difícil, para as mães que gostam de liberdade, a total
dedicação ao filho, tal como seria necessário na primeira
fase de sua vida.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho tem medo de não receber
atenção suficiente?

Não reservamos tempo suficiente para nós?
Como podemos melhorar a qualidade de nossa
convivência?

Dedicamo-nos o suficiente a ele?

Por que ele tem tanta dificuldade em nos dividir
com os outros? Como podemos lhe mostrar que
o amor não deve ser dividido?

Por que tem medo de ser deixado? Como
podemos ajudá-lo a fortalecer sua confiança em
nosso amor de pais?

Por que ele tem tão pouca confiança primária?
Como podemos fortalecer a consciência de nosso
filho de que ele é digno de amor?

Somos, nós mesmos, ciumentos?
 
Medidas de apoio:

Desenvolver a consciência de si mesmo: a tarefa
para a criança consiste em aprender a defender
o que lhe é próprio e a desenvolver a consciência
de si mesma enquanto continua a receber tudo
de que necessita.

Afeto e limites: esse drama só pode ser resolvido
por uma mãe capaz de dar afeto suficiente, mas
também de impor limites onde se inicia sua
própria vida e termina o campo de influência do
filho. A criança tem de reconhecer que, embora a
mãe tenha e preserve uma esfera íntima, o amor
materno é ilimitado.
15.8.1.2 Competição
“Sou o melhor de todos!”
 
Simultaneamente ao ciúme costuma ocorrer também a
competição, por exemplo em relação aos irmãos que
recebem mais da mãe. Essa situação pode conduzir à
regressão em aspectos essenciais do desenvolvimento. Na
fase dessas regressões, algumas crianças querem voltar a
mamar no peito e recusam obstinadamente toda forma
diferente de alimentação. Outras voltam a fazer as
necessidades nas calças e querem usar fraldas ou passar
pelo ritual do penico novamente. Outras ainda voltam a usar
a chupeta, chupam o polegar ou querem tomar mamadeira.
Por trás da competição com os irmãos, mas também com o
pai ou a mãe, esconde-se a falta de consciência, e,
obviamente, o ciúme contribui com sua participação. Na
variante mais difícil, as crianças não querem progredir por
desempenho próprio, mas pela depreciação dos outros.
Querem desbancá-los para, finalmente, obterem o
reconhecimento dos pais.
Enquanto o comportamento competitivo se exprimir
através da depreciação dos outros, ele deverá sempre
fracassar e ser desmascarado diante das outras crianças
envolvidas; do contrário, acaba-se por recompensar e
estimular um modelo que permanecerá desagradável por
toda a vida e que mais tarde favorecerá a tendência ao
mobbing.
Quando o comportamento competitivo servir-se do próprio
desempenho, ele poderá ser tolerado com moderação, uma
vez que vivemos em uma sociedade competitiva, em que a
concorrência se inicia cada vez mais cedo. Nesse caso, as
frases típicas seriam: “Veja só o que já consigo fazer...! O
bebê ainda não consegue fazer isso!”
 
Perguntas para os pais:

Quando bebê, nosso filho recebeu contato físico
e afeto suficientes? Quanto tem de receber
agora?

Ele teve a possibilidade de ser bebê pelo tempo
suficiente? Em que medida ele está pronto agora
para assumir responsabilidades?

Ele precisa estar presente quando depreciamos
ou falamos mal de alguém?

Em determinados momentos, estaria ele
recebendo atenção exclusiva? Como eu poderia
proporcionar-lhe isso no futuro?

Nosso filho fala mal dos outros? Como podemos
torná-lo mais consciente de sua força?

Como estimular sua disponibilidade a empenhar-
se?
 
Medidas de apoio:

Nenhuma recompensa pelo comportamento
indesejado: um dos principais pontos quando
lidamos com todas essas formas
comportamentais de conotação negativa seria
não recompensá-las de modo algum. A criança
tem de descobrir que, além de não ajudá-la, esse
comportamento ainda a prejudica.

Assumindo a responsabilidade: os pais poderiam
dedicar ao filho mais velho períodos de atenção
exclusiva com programações que correspondam
à sua idade e integrar as crianças “mais velhas”
– com a devida atenção – no cuidado das
menores. Se isso ocorrer de maneira amorosa,
por exemplo no sentido da ideia: “Oba! Temos
um irmãozinho!”, também se poderá incentivar a
criança mais velha a ter orgulho (exteriorizado,
por exemplo, entre seus amigos) e amor por
quem nasceu depois dela. Com o tempo,
também se poderá confiar-lhe a responsabilidade
pelo mais novo, garantindo, assim, uma melhor
união na família e, aos poucos, até aliviando
sensivelmente as incumbências da mãe.

Nenhum “abuso” como babá: deixar muito
precocemente aos filhos mais velhos a tarefa de
cuidarem dos menores tem um efeito
desastroso, que logo se transforma em peso e,
mais tarde, com frequência pode constituir uma
razão para que não queiram ter filhos.

Dedicar-se inteiramente à criança: seria muito
importante para o desenvolvimento do filho mais
velho programar atividades específicas, nas
quais ele, por determinado período, volta para o
primeiro lugar, por exemplo segundo a ideia:
“Vamos juntos à piscina, e seu irmãozinho vai
ficar com a vovó”.
15.8.1.3 Rompantes de agressividade
“Vou bancar o vulcão.”
 
Raiva e ira podem liberar uma energia não canalizada da
agressividade em proporções consideráveis. Às vezes,
porém, essa energia pode ter um objetivo bastante preciso e
cruel. Explosões desse tipo são manifestações do Eu infantil
em desenvolvimento e de sua vontade. A criança começa a
ter chiliques quando sua vontade não é respeitada.
Nesses casos, ceder sempre ou nunca ceder é tão difícil
quanto perigoso. Nesse momento começa justamente o
período em que ela precisa de limites razoáveis e os requer.
Caso se queira transmitir-lhe a experiência da falta de limites
e da liberdade ilimitada, seria melhor colocá-la para boiar
em água termal, à temperatura do corpo. Desse modo, ela
poderia até mesmo aproximar-se da experiência da unidade
e, posteriormente, conquistar a confiança primária. No
mundo polar, porém, as crianças precisam de limites, que se
tornam tão importantes quanto o amor que ajuda a confortá-
las e muito mais importantes do que aquele amor
equivocado, que às vezes deixa de fazê-lo. Evidentemente, a
criança precisa desenvolver seu ego e dizer: “Eu quero!” No
entanto, também precisa aprender a aceitar limites e ter o
respeito necessário.
Nessa fase, pode-se deixar bem claro – com vantagem
para ambas as partes – onde começam os direitos da mãe,
do pai, dos irmãos e dos eventuais animais domésticos. O
maior problema nesse caso é a incoerência, ou seja, primeiro
dizer não e, depois de muita insistência, choro, manipulação
ou ataques de fúria, acabar cedendo só para restaurar a paz.
As crianças não têm muito a perder quando tentam se impor
por um longo tempo. E não seriam crianças normais se não o
tentassem. O importante é que os pais reflitam bem sobre o
que permitir ou não e que realmente permaneçam firmes e,
principalmente, unidos em sua decisão. Permitir alguma
coisa que o outro proibiu traz para o responsável em questão
– “mais generoso” com o filho, mas nada solidário com o
cônjuge – alguns agrados momentâneos; no entanto, em
última análise, faz a criança sofrer. Pois essa tática transmite
a experiência de que vale a pena manipular, o que poderá se
voltar contra ela e lhe custar muitas amizades em sua futura
vida social. Os avós e outros familiares também deveriam se
curvar a essas máximas, a fim de não sobrecarregar
desnecessariamente a estrutura pais-filho.
 
Perguntas para os pais:

Somos indulgentes em demasia? Não teríamos
de trabalhar nossa coerência e combinar melhor
o que deve ser permitido e o que deve ser
proibido?

Os limites que mostramos a nosso filho são
suficientes ou insatisfatórios?

Discutimos o suficiente?

Nosso filho consegue exprimir livremente sua
opinião?

Ele se movimenta o suficiente?
 
Medidas de apoio:

Exercícios para aprender uma agressividade
ritualizada: oferecer alternativas mais
construtivas para expressar a agressividade,
como movimento, esportes e discussões com
conteúdo a respeito de ocasiões atuais. Assim,
você também estará estimulando até mesmo a
disponibilidade para o conflito, à medida que
leva seu filho a sério, reconhece e elogia a
beleza de sua energia vital, ao mesmo tempo
que o orienta para aspectos que estimulam a
vida e o desenvolvimento. Para crianças
menores, jogos como o ludo são ideais para
aprender a lidar com a agressividade, que
pertence ao princípio arquetípico de Marte. Para
as maiores, pode-se usar o xadrez como “jogo de
combate”.

Terapia do abraço segundo Jirina Prekop,
utilizada como instrumento para o intercâmbio
de agressividade. Para que a criança possa
exprimir a própria raiva, dirigida aos pais, e para
a qual, porém, não encontra palavras suficientes
nem adequadas, deve-se permitir que ela
desabafe no colo da mãe ou do pai. Obviamente,
a contraparte tem o mesmo direito. Contudo,
para ambos os lados são pertinentes regras fixas
de comportamento. A criança apoia as mãos na
barriga, para permanecer em contato com seus
sentimentos e manter os punhos sob controle.
No lugar dos xingamentos, podem ser utilizadas
apenas comunicações breves, em primeira
pessoa, sobre o que ela está sentindo, como:
“Estou com raiva de você!” Só se pode soltar o
abraço após a reconciliação.
15.8.1.4 Prazer com a desgraça alheia
“Bem feito pra você!”
 
Poucas coisas revelam tão claramente a sombra como esse
lado maldoso da alegria. Nele se manifesta o lado escuro da
alma, e o tema da competição também entra no jogo da
vida. Além disso, evidencia-se uma falta de consciência, pois
certamente há poucas coisas na vida da criança das quais
ela pode se alegrar e aproveitar.
O ego também toma parte no prazer com a desgraça
alheia, à medida que a criança quer ser e parecer superior e
melhor do que as outras, normalmente sem contribuir com o
desempenho próprio.
Por outro lado, quando a sombra emerge e se mostra
abertamente, esta também é uma boa oportunidade – de
acordo com a idade da criança – para as devidas
explicações, que associam, por exemplo, o prazer com a
desgraça alheia aos personagens obscuros dos contos de
fadas. Assim, a criança poderá aprender, desde cedo e no
momento oportuno, que nela se escondem não apenas a
maravilhosa princesa e o radiante herói, mas também os
arquétipos da bruxa velha, corcunda e invejosa e do
feiticeiro “malvado”.
 
Perguntas para os pais:

Sobre o que nosso filho pode mostrar verdadeira
alegria?

Como podemos reforçar o tema “alegria
comum”?

Como podemos transmitir mais alegria
verdadeira?

Como podemos fazê-lo rir com gosto?

Entre nós, adultos, existem modelos de prazer
com a desgraça alheia?

Como podemos aproximá-lo mais de seu lado
obscuro?
 
Medidas de apoio:

A melhor resposta para o prazer com a desgraça
alheia consistiria em proporcionar oportunidades
suficientes de alegria verdadeira, criando
situações nas quais a criança possa perceber
que é muito melhor alegrar-se junto com os
outros.

Nunca recompensar o prazer com a desgraça
alheia, mas sempre ressaltar que esse tipo de
alegria deixa os pais tristes.
15.8.1.5 Pedantismo
“Já sei tudo.” – “Sou tão esperto quanto vocês.”
 
O pedantismo pode “irritar” sobremaneira os pais, embora
geralmente seja desencadeado por eles próprios e, em todo
caso, se refira a eles. As crianças, que aprendem através da
imitação, querem ser iguais aos pais também do ponto de
vista intelectual e, por isso, os imitam. Quando o resultado
dessa imitação se apresenta como “pedantismo”, os pais
devem refletir sobre os próprios erros.
Quando as crianças se transformam em caricaturas dos
pais, tornam-se particularmente irritantes para os adultos,
mas, ao mesmo tempo, contribuem para o amadurecimento
dos próprios pais. Correspondem a eles apenas pela metade,
e somente por isso são tão incômodas. Eis a origem de seu
talento inato para colocar o dedo nas feridas mais sensíveis
– e de modo até mais eficaz do que o de psicoterapeutas
especializados.
A presunção de saber mais e a maturidade precoce
produzem uma desarmonia interior nas crianças. Quando a
cabeça está muito à frente do corpo, determina-se uma
condição inadequada para o desenvolvimento. No entanto,
este é justamente o modelo de muitos adultos e, portanto,
dos próprios pais: estar com a cabeça quilômetros à frente e
com suas ideias no futuro. O efeito espelho é evidente.
Esse problema se desenvolve de maneira particularmente
frequente em crianças que logo cedo tiveram de assumir
muitas responsabilidades, por exemplo cuidando dos irmãos
mais novos ou porque precisaram ou quiseram tomar o lugar
de um parceiro ausente. Essas crianças costumam ser
(muito) inteligentes, mas não parecem nada infantis e são o
oposto da doçura. O pedantismo também pode ocorrer em
filhos únicos que passam seu tempo quase exclusivamente
com os adultos, pois lhes falta a ressonância de pessoas da
mesma idade.
Tão logo o problema é identificado, deve-se,
evidentemente, aliviar as crianças de tarefas muito pesadas
e permitir que se dediquem a brincadeiras e situações
infantis, por exemplo no jardim de infância, na escola e em
associações que tenham crianças da sua idade. Nesses
locais, elas podem e devem voltar a ser crianças:
espontâneas, curiosas, irracionais e felizes por
experimentarem coisas novas.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho parece estar à frente em
relação a seu desenvolvimento? Como podemos
fortalecer a experiência infantil do mundo?

Estaria ele refletindo nossa ambição?

Por que ele quer ser adulto cedo demais?

Por que damos tanta importância ao intelecto? A
quais atividades espontâneas podemos encorajá-
lo?

Nosso filho teve de assumir muita
responsabilidade cedo demais?

Quando exigimos demais dele?

Como podemos tornar a busca, o
questionamento e o aprendizado mais
estimulantes?
 
Medidas de apoio:

Liberar as crianças que tiveram de assumir
responsabilidades cedo demais dessa exigência.

Contato com outras crianças da mesma idade:
eventualmente, fazer com que seu filho tenha
mais contato com outras crianças da mesma
idade.
15.8.1.6 Tortura de animais
“Sou forte e brutal – um homem de verdade.”
 
À primeira vista, a tortura de animais tem um efeito tão
repugnante que provoca severas medidas e pesadas
punições. No entanto, seria importante que pais
compreendessem que com ela também costumam estar em
jogo curiosidade e desejo de experimentação; limites são
testados e, muitas vezes, ainda não existe uma noção clara
da dor e, sobretudo, da morte.
Com frequência, da profunda insegurança e da falta de
autoestima surgem também, como compensação,
sentimentos de poder, arrogância e presunção. Manifestados
em relação a seres mais fracos, esses aspectos nada bonitos
da sombra deveriam não apenas ser punidos, mas também
transformados em ocasiões para esclarecimentos e diálogos
reais. Os pais que, nessas situações, puderem recorrer a
experiências pessoais estarão em vantagem. O que eles
próprios viveram como “tortura” e tormento – inclusive o
que trouxeram consigo de vidas passadas, caso as tenham
vivido em terapias de reencarnação ou em outra terapia
semelhante – certamente terá um impacto mais eficaz sobre
seus filhos.
Além disso, seria útil para as crianças compreender logo
cedo que, segundo a lei do karma e do Antigo Testamento,
tudo repercute sobre elas. Um ensinamento parcialmente
religioso a esse respeito seria a Regra de Ouro: “Não faça
aos outros o que você não gostaria que fizessem a você”.
Também pode ajudar a referência a uma dor que a criança
tenha sentido e sua ligação com a tortura praticada contra
os animais, bem como as correspondentes sensações que
eles podem ter tido: “Nunca brinque de torturar um animal,
pois ele sente dor como você!”
Por certo, também é necessário esclarecer o quanto antes
– porém, de preferência, se for o pai a fazer o discurso – que
um “homem de verdade” defende os mais fracos e, só por
essa razão, jamais torturaria um animal. Se os meninos, que
estão mais sujeitos a esse problema, aprenderem
precocemente que é preciso ser muito covarde e vil para
buscar a superioridade praticando maldades contra seres
mais fracos, logo esse tipo de mau comportamento torna-se
cada vez mais improvável.
Se os meninos realmente não conseguem parar de praticar
ações sádicas, como encher sapos de ar para depois
estourá-los, talvez o mal menor consista em fazê-los
experimentar a verdadeira dor, em vez de permitir que esse
sadismo continue e aumente. Eles devem sentir com toda
clareza o sincero desprezo que esse tipo de comportamento
suscita em outros seres sensíveis, até as consequências, que
lhes mostrarão que esses atos não apenas não valem a
pena, como também conduzem a uma piora dramática da
própria qualidade de vida. Como muitas vezes as motivações
que geram esses comportamentos são graves, aconselha-se
nesses casos que se procure com urgência um apoio
terapêutico para a criança.
Pais assustados, que dissimulam ou escusam esses
eventos, só fazem com que os meninos com essa
predisposição ampliem ainda mais seus limites e sondem o
poder dos pais. O sadismo, o mobbing e as ações violentas
que hoje presenciamos nas escolas sempre têm raízes
remotas, que pais fracos ignoraram intencionalmente ou às
quais não deram a devida atenção.
Quanto antes os esclarecimentos adequados
estabelecerem um limite, tanto melhor será para a criança.
Obviamente, seria muito mais bonito explicar-lhe o mundo
desde cedo no sentido franciscano ou budista, em que o
respeito por outros seres sencientes e a atenção com a vida
estão em lugar de destaque.
Pais familiarizados com imagens orientais do mundo
também poderiam explicar a seus filhos como funciona a
corrente das vidas e que eles também já estiveram um dia
na Terra em formas evolutivas inferiores; por isso, têm uma
responsabilidade em relação a nossos irmãos e irmãs mais
fracos, que nesta vida vieram em forma de animais e que
estão à nossa mercê. Geralmente, as crianças conseguem
aceitar com facilidade a ideia de também terem sido
animais. Nesse caso, são muito úteis os contos de fadas e as
histórias de animais contadas por Manfred Kyber, ou seu
romance Die drei Lichter der kleinen Veronika [As Três Luzes
da Pequena Veronika].
Pais modernos, mais comprometidos com o espírito da
época, poderiam ilustrar o círculo da vida, que é o tema
central do filme da Disney O Rei Leão. Naturalmente, seria
ideal que assistissem ao filme juntos e depois discutissem a
respeito. Assim, as explicações adequadas entrariam na
conversa, enquanto a música ainda as acompanha por
algum tempo, inclusive a canção “Circle of Life”, que
mantém viva a ideia de união com os outros seres
sencientes.
Episódios de tortura de animais, que, devido à sombra
onipresente, infelizmente não são raros, poderiam servir de
ocasião para diálogos enriquecedores, que despertem na
criança o sentido da criação e de seus aspectos dignos de
proteção, incluindo todas as suas criaturas. De acordo com
sua predisposição e em correspondência com a influência do
princípio da Lua, que é bastante forte no início da vida, a
maioria das crianças é amiga dos animais e aberta a outras
criaturas, como fadas, espíritos e gnomos. Provavelmente,
há milhões de anos, os animais eram ajudantes, amigos e
companheiros dos homens, e respeitados até quando eram
fontes de alimento. Por conseguinte, criou-se um campo
estável que até hoje percebemos, em uma época de tortura
de animais, no desejo infantil pelos bichinhos de pelúcia ou
pelo amigo animal. Talvez as crianças queiram mais animais
do que irmãos. Procurar precocemente um animal aliado
pode ser uma boa ajuda; ele fará o papel de bom
companheiro animal do anjo da guarda pessoal ou atuará
sozinho.
No romance esotérico para crianças, Habakuck und
Hibbelig [Habakuck e Hibbelig], tentei evocar esses
conceitos e transmitir a compreensão por outros seres e
mundos, além de introduzir o leitor na riqueza dos elementos
e na imagem espiritual do mundo. Para ler à noite, a história
é muito longa, mas é bem verdade há muitas noites à
disposição para que se desenvolva esse tipo de programa.
Com a leitura em voz alta surge uma compreensão ainda
mais duradoura a respeito de outros seres vivos do que com
os filmes.
Às vezes, porém, os filmes também podem ajudar mais
tarde, por exemplo, quando se quer compreender o segredo
do tempo. Nada pode ser mais adequado para transmitir
essa ideia do que o romance Momo, de Michael Ende –
todavia, quando lido em voz alta, ele é ainda mais eficaz do
que em sua excelente versão cinematográfica.
Quando se consegue, por esse caminho e passo a passo,
desenvolver uma compreensão mais profunda do mundo e
de seus seres, estimulando as próprias fantasias e imagens
internas, torna-se possível alcançar metas elevadas, por
exemplo no sentido de São Francisco de Assis, patrono
cristão dos animais.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho sente necessidade dessa
forma de poder?

Como podemos ajudá-lo a empregar
corretamente esse poder, em vez de fazer mau
uso dele?

Quem nosso filho reflete com sua arrogância e
presunção? Como podemos lhe dar a
oportunidade de ajudar e proteger?

De que modo podemos fazê-lo entender que os
fracos, na realidade, são fortes?

Como podemos transmitir ao nosso filho respeito
e atenção em relação a todos os seres vivos?

Como ele pode aprender a ter respeito pelos
mais fracos?

Que exemplo de vida lhe damos? E o que não
queremos reconhecer posteriormente?

De que maneira podemos introduzir
conscientemente em nosso cotidiano respeito e
amor pelos seres humanos, pelos animais, pelas
plantas e pela Terra?
 
Medidas de apoio:

Conversando, lendo histórias em voz alta e
assistindo com seu filho a filmes relacionados ao
tema, tente fazer com que ele desenvolva logo
cedo a compreensão e a compaixão por todas as
criaturas.

Ajuda terapêutica: se as tendências sádicas
persistirem apesar de todos os esforços, devem-
se levar medidas mais drásticas em
consideração e, de preferência, buscar ajuda
terapêutica.
15.8.1.7 Agarramento
“Não posso ficar sem você!”
 
Agarrar-se à barra da saia revela menos amor do que falta
de confiança (primária). As crianças não conseguem se
soltar porque não encontram sustentação própria. Por trás
disso esconde-se, sobretudo, o medo de ser abandonado.
Nesse sentido, esse sintoma deveria levar principalmente a
mãe a se perguntar: “Por qual crise meu filho está passando
no momento? O que está acontecendo com ele? Como posso
transmitir-lhe de maneira mais clara, evidente e eficaz que
estarei sempre ao seu lado quando ele precisar de ajuda,
mas que é importante saber contar consigo mesmo e com a
própria força, bem como estar pronto para experimentar e
conquistar o novo? Aparentemente, ele acredita que vou
sumir se ele se soltar de mim”.
Se não se fizer nada para frear a tendência para ficar
pendurado na barra da saia, pode acontecer de a criança
nunca se tornar realmente autônoma e encontrar a si
mesma; ao contrário, logo buscará uma simbiose com a
professora do jardim da infância, em seguida, com a
professora da escola, depois com a alma mater e se
refugiará, por fim, na mãe pátria. Por um lado, essas
crianças permanecem presas ao aspecto feminino, no
elemento da Lua e, por outro, à falta de autonomia. A isso se
pode acrescentar o medo de crescer e tornar-se adulto, uma
vez que ambos poderiam destruir ou incomodar o estreito
vínculo com a mãe, que representa a supersimbiose.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho tem medo de ser
abandonado?

Como podemos transmitir-lhe a experiência de
que sempre estaremos ao seu lado?

De que modo ele pode se tornar autônomo?

O que poderia encorajá-lo a dar os próprios
passos?

Como poderíamos estimular sua curiosidade?
 
Medidas de apoio:

Construir confiança: nesse caso, são importantes
todas as ações que transmitam segurança e
confiança à criança, sobretudo em relação à
confiança primária. Ao perceber que a mãe ou os
pais estão sempre ao seu lado, a criança
apresentará melhora com o tempo.

Autonomia e outras relações sólidas:
naturalmente, devem-se incentivar todos os
passos rumo à autonomia, bem como a
construção de relações sólidas, por exemplo com
uma das avós ou outros parentes.
15.8.1.8 Fugas
“Sei me virar sozinho e já não preciso de vocês.”
 
No polo oposto das crianças que ficam agarradas à barra da
saia da mãe estão aquelas que fogem de casa.
Normalmente, trata-se, sobretudo, de crianças maiores e
pré-púberes. Mesmo que, à primeira vista, essa atitude
pareça mais grave, na maioria das vezes não o é. Trata-se de
uma tentativa da criança de cortar definitivamente o cordão
umbilical e de compreender mais uma vez o nascimento
para elaborá-lo de fato. Quem se mostra em condições de
fugir da segurança familiar, da proteção e, de modo geral, de
tudo que lhe é habitual deve sentir-se seguro no mundo e
poder contar com uma boa confiança primária. Ou então –
como muitas vezes aparece representado nos contos de
fadas – deve ser tão ruim conviver com os pais que a
situação só pode melhorar no mundo desconhecido.
Outro aspecto relacionado a esse fenômeno é a
curiosidade. As crianças estão, por assim dizer, seguindo os
passos daquele que “saiu de casa para conhecer o medo”. O
odor do grande e vasto mundo as atrai como ocorria
antigamente com os aprendizes de artesão, dos quais se
esperava que saíssem de casa e se pusessem a caminho
para conhecerem a si mesmos e a vida. Quando as primeiras
palavras de uma criança são “eu consigo sozinha”, como
certa vez ouvi, este é um bom sinal de um desenvolvimento
autoconsciente. Essas palavras acabaram se tornando o
apelido apropriado da mocinha autoconsciente que as
pronunciou.
 
Perguntas para os pais:

Estamos dando a nosso filho razões para ele
querer fugir no sentido “dos contos de fadas”?

Como podemos transmitir-lhe que o mundo está
à sua disposição, mas não a todo momento?

Ele tem se distraído o suficiente, por exemplo
participando de excursões e viagens?

Em que situações ele pode fazer mais coisas
“sozinho” e, ao mesmo tempo, assumir a
responsabilidade das relativas consequências?

Como podemos introduzir atividades suficientes
em nossa vida comum?
 
Medidas de apoio:

Quando esses impulsos aparecem muito cedo, é
útil dar às crianças explicações sobre todas as
consequências de semelhante ato.

Não punir: de modo geral, é importante não
questionar o sentido dessas escapadas ou infligir
punições draconianas às crianças, caso voltem a
fugir.

Muito melhor seria a “fuga para a frente” e, por
exemplo, a ideia de permitir que os pequenos
“emigrantes” passem as férias em
acampamentos. Mais tarde, pode-se também
realizar seu desejo de passar um tempo ou fazer
intercâmbio no exterior. Uma criança com
vontade de se divertir é sempre melhor do que
um “bicho do mato” que não sai do quarto ou de
seus sucessores modernos, os chamados “sacos
de batatas”, que nem mesmo durante a
puberdade se levantam do sofá.
15.8.1.9 Balançar-se com a cadeira
“Sou seu azarão.”
 
O hábito quase compulsivo de balançar-se com a cadeira –
cujo representante mais famoso é Felipe, o inquieto,
personagem do livro João Felpudo, conhecido no mundo
inteiro – é realmente frequente entre os traquinas modernos,
as crianças com TDAH, mas também fora desse grupo. Nesse
caso, pode-se falar de um exercício para encontrar o próprio
equilíbrio e que leva muitos pais, professores e outros
adultos a um ataque de nervos, quando, na verdade,
também deveriam praticá-lo para também encontrar seu
equilíbrio. A imagem linguística indica com clareza que, com
essa mania, só perdem a cabeça aqueles pais que, por sua
vez, lutam em vão para encontrar seu equilíbrio interior.
Além disso, esse exercício pode provocar mães
extremamente cuidadosas, sempre prontas a gritar para o
filho: “Cuidado para não cair!”, expressando, assim, o
próprio medo de viver.
Com esse hábito, as crianças testam seus limites e
também, naturalmente, até que ponto podem provocar os
pais. Normalmente não acontece nada grave. Em todo caso,
segundo nossa experiência, as crianças caem muito menos
do que os adultos perdem a cabeça. Mesmo os danos
causados frequentemente à pintura da parede pelas
cadeiras oscilantes são bastante aceitáveis.
Nesse sentido, poderíamos considerar o balanço com a
cadeira como uma terapia para os pais, realizada por
intermédio dos filhos. Os adultos insistem em ter silêncio e
segurança à mesa; as crianças ainda querem saber e
experimentar o que pode acontecer se se debruçarem um
pouco mais na vida. Querem movimento em seu dia a dia e
renunciam de bom grado a toda segurança.
Por conseguinte, os pais que, em relação às suas
aspirações pessoais, não têm coragem de se expor com um
pouco mais de audácia na vida, sentem-se especialmente
provocados pelas relativas caricaturas oferecidas pelos
filhos. Quem vacila de algum ponto de vista ou se encontra
no fio da navalha em relação a questões importantes
perderá a cabeça diante de sua representação infantil, pois
não quer ser lembrado das próprias dificuldades durante as
refeições. Para algumas crianças, balançar com a cadeira
representa simplesmente uma possibilidade ideal de testar
na prática os limites e a coerência dos pais.
 
Perguntas para os pais:

De que maneira nosso filho pode encontrar um
equilíbrio interior sempre novo?

Estaria ele autorizado a testar continuamente os
seus limites e os nossos?

Como podemos dar-lhe espaço para que ele
aceite os desafios e experimente os limites?

Como podemos desafiá-lo?

Como podemos transmitir-lhe equilíbrio exterior
e interior?
 
Medidas de apoio:

Do ponto de vista homeopático, seria evidente
tornar supérfluo o balanço da cadeira, evitando
um comportamento autoritário, que pode ser
substituído por uma vida emocionante,
desafiadora e voltada à luta pela manutenção do
próprio equilíbrio; desse modo, as crianças terão
de voltar a ficar em silêncio à mesa e ficarem
sentadas com as quatro pernas da cadeira no
chão.

Menos pretensioso, mas igualmente eficaz, seria
passar os exercícios de equilíbrio à mesa para
outro momento oportuno. A maioria das crianças
gosta de praticá-los junto de muretas e em todos
os tipos possíveis e impossíveis de balaustrada e
trave. Seguros pela mão do papai ou da mamãe,
poderão exercitar o equilíbrio interior,
encontrando, desse modo, uma substituição
construtiva para o movimento praticado à mesa
de jantar, em prol da manutenção da paz
externa.

Mostrar coerência e delegar responsabilidades:
pais que ainda sentem muita dificuldade com
esse tipo de situação tendem a refugiar-se em
ameaças autoritárias ou, além disso, a recusar a
responsabilidade e a despejar na criança que
caiu todas as consequências, desde a arrumação
até os consertos necessários. Colocamos esta
solução somente em terceiro lugar porque,
durante a refeição, ela requer nervos de aço com
o pequeno equilibrista e uma considerável
coerência caso ele realmente se machuque.
15.8.1.10 Mascar chiclete
“Demoro para mastigar tudo.”
 
Trata-se de um hábito pertencente ao sentimento nacional
norte-americano, que, por um lado, é comprovadamente
eficaz para aumentar a concentração e, por outro,
provavelmente ajuda a desfazer a tensão na região da
mandíbula. Além disso, seria um bom exercício quando se
trata de aprender a vencer as dificuldades ou persistir por
um longo tempo. Com ele, a criança treina continuamente os
músculos da mastigação e, por conseguinte, também a
mordida.
Pergunta-se por que muitos pais o condenam. Nesse caso,
certamente entra uma boa dose de defesa ou até mesmo de
rejeição ao estilo de vida americano. Quando a esse hábito
se acrescentam os conhecidos ruídos da mastigação e
quando sobretudo os meninos mascam o chiclete com a
boca aberta, no melhor estilo oeste selvagem, é mais fácil
compreender as objeções estéticas que os pais exprimem
com admoestações do tipo: “Coma de boca fechada!” Entre
uma coisa e outra, é interessante observar que até os
dentistas aconselham mascar chiclete. No entanto, não
recomendamos as elogiadas gomas de mascar com
adoçante no lugar de açúcar, justamente por causa dessa
substituição.
 
Perguntas para os pais:

Em que situações nosso filho sofre tensão?

Suas necessidades orais são satisfeitas?

Como nos relacionamos na vida com nossa
capacidade de morder?

Damos o exemplo de lutar para superar as
dificuldades?

Como podemos ajudar nosso filho a tratar
exaustivamente os problemas consigo mesmo,
conosco ou com os outros?

De onde ele tomou o exemplo de uma
mastigação antiestética, se não foi de um pasto
vizinho para vacas ou do oeste selvagem?
 
Medidas de apoio:

Não levar as coisas muito a sério: pela maneira
de mastigar dos filhos, os pais podem
reconhecer sem dificuldade se se trata de uma
provocação ou se eles simplesmente gostam de
mascar chiclete. Se esse hábito coloca os pais
em contato com a própria agressividade em
relação à sua capacidade de morder e de
conseguir superar as próprias dificuldades, eles
simplesmente têm de ser gratos aos filhos e
talvez mascar chiclete com eles de vez em
quando para relaxar.

Relativizar a problemática: caso se trate de
provocação, os pais poderiam refletir sobre o que
realmente se trata e se, com esse tipo de
desafio, eles não tenham tirado a sorte grande,
pois, a esse respeito, existem variantes muito
piores. De resto, ignorar com indiferença as
provocações logo as torna desinteressantes.
15.8.1.11 Arroto contínuo
“Minha digestão é barulhenta.”
 
Em primeiro lugar, esse fenômeno requer um esclarecimento
sobre eventuais causas médicas que determinem uma
digestão em sentido contrário. Se não for esse o caso e a
criança soltar seus gases contra a corrente, emitindo ar,
esse sintoma poderia esconder o hábito de engolir muito ar
(por exemplo, enquanto se come), de comer rápido demais
ou engolir ar com o estômago vazio. O “arroto” é tão
importante no início da vida quanto mais tarde se torna
desagradável.
O fato de ter havido tempos melhores, mesmo entre os
adultos, é algo que revela uma sentença de Martinho Lutero:
“Por que não arrotar e peidar? Por acaso isso não é
prazeroso?” Atualmente, o segundo sintoma mencionado
pelo reformador é considerado um sinal de má educação e
de maus hábitos; nesse sentido, também poderia ser usado
pelas crianças como forma de ataque às rigorosas regras e
aos bons costumes domésticos: uma pequena rebelião
praticada, por assim dizer, pelo próprio corpo.
 
Perguntas para os pais:

Como podemos transmitir ao nosso filho outras
válvulas de escape para a liberação de ar?

O que ele não está conseguindo digerir?

O que está querendo nos dizer com seus arrotos
constantes?
 
Medidas de apoio:

Proporcionar para a criança outras possibilidades
para que ela seja ouvida: a tarefa da criança
seria aprender a liberar o ar através de outras
vias mais sensatas e criar a possibilidade de ser
ouvida ou de formular seus protestos
verbalmente.

Descarregar a agressividade: se algo subir, é
porque não foi bem digerido, e talvez chegue até
a exercer resistência. Para descarregar a
agressividade, é preciso ventilar o próprio
coração e exprimir de forma diferente tudo o que
está atravessado no estômago da criança ou que
pesa em seu coração.

“Digerir” a vida e encontrar outros caminhos
para facilitar a digestão da vida.
15.8.1.12 Fugir da mesa
“Tenho coisas mais importantes para fazer do que ficar
olhando para vocês enquanto como.”
 
A fuga da mesa durante as refeições em família, antes de os
pais terminarem de comer, é uma necessidade de quase
todas as crianças. Antigamente, tínhamos até de pedir
permissão para dizer alguma coisa, e era proibido
interromper um adulto. Os cotovelos, símbolos da
capacidade de impor-se e da falta de respeito, não podiam
nem sequer ser apoiados na mesa. Não era uma questão de
cansaço, e sim de profilaxia para a agressividade e um sinal
de boa educação ou treinamento, pois quase nunca os pais
eram capazes de explicar essa medida.
Esses tempos autoritários, com suas rígidas regras e
rigorosas normas, já estão amplamente superados.
Entretanto, a pergunta sobre quando uma refeição comum
realmente chegou ao fim permanece sem solução; e as boas
maneiras à mesa continuam sendo mais importantes do que
costumamos admitir.
Por um lado, a refeição em família ainda é um dos últimos
rituais em comum. Ele vive de suas regras e, de preferência,
começa e termina com todos juntos. Contudo, as crianças
têm dificuldade para compreender isso. Naturalmente,
também nesse caso haveria uma variante muito mais
branda. Se as conversas durante as refeições fossem
interessantes para as crianças a ponto de fazê-las
permanecer à mesa, o problema estaria resolvido. Por outro
lado, quem se dirige aos filhos com perguntas “irritantes”,
do tipo: “Como foi na escola?”, naturalmente estimula sua
aversão e, em todo caso, os exorta a uma resposta
estereotipada: “Como sempre, mãe!”
Se as conversas não forem adequadas às crianças, talvez
fosse melhor que as famílias modernas de hoje as deixassem
sair da mesa quando terminassem de comer e os assuntos
as aborrecessem.
 
Perguntas para os pais:

De que modo podemos trazer à mesa assuntos
que agradem a todos?

Será que nossas regras à mesa são antiquadas e
precisam ser superadas?

O que podemos fazer para que nosso filho não
associe à refeição apenas obrigações irritantes?
 
Medidas de apoio:

Estratégia dupla: um acordo para deixar que
simplesmente saiam da mesa poderia prever
dois tipos de refeição: a informal, em que as
crianças podem se levantar assim que
terminarem de comer; e aquela acompanhada
de conversas importantes, em que se levantar
não vem ao caso.
Os resorts da rede Robinson-Club, por exemplo,
introduziram uma dupla estratégia muito bem aceita
pelas crianças: às 18 horas inicia-se uma refeição
voltada para as crianças e, a partir das 20 horas,
outra para os pais, sem os filhos. As famílias que
adotaram essa estratégia ficaram satisfeitas com os
dois horários. Naquele infantil, os pais ficam
sentados ao lado das crianças e respondem a todas
as suas perguntas, que geralmente não duram
muito. Os pais comem mais tarde e podem
conversar com calma.

Ritual coletivo: obviamente, o ideal seria a
terceira variante, hoje quase utópica, em que
comer lentamente bons alimentos se torna um
ritual coletivo, que precisa do seu tempo e certa
reflexão, começando com antigas orações antes
da refeição e terminando com outro ritual
semelhante.
Porém, se isso não encontrar aprovação interior por
parte de todos, com o tempo, pela lei da polaridade,
se obterá justamente o oposto. As obrigações
entediantes e a família associam-se em um triste
conjunto, que, no futuro, não permitirá esperar dos
filhos nada de bom no aspecto familiar e nunca trará
aos pais o que eles impõem com medidas severas e
esperam com ingenuidade.
15.8.1.13 Roer as unhas
“Estou acabando com as minhas garras.”
 
Roer as unhas denota um domínio realmente não evoluído
da própria agressividade, com a qual os pequenos medrosos
e/ou muito responsáveis ou sensíveis usam seus dentes –
suas armas dentro da boca – para morder o restante de suas
garras e, assim, “amputar-se” voluntariamente. Algumas
crianças chegam a roer as unhas “até a carne”. Nesse gesto,
percebe-se um alto grau de frustração e o desamparo de não
saber impor-se, mas também a inibição de ferir os outros.
Esse hábito requer dos pais muita paciência e
compreensão, bem como a busca de meios mais atrativos
para reduzir a agressividade. Recorrer apenas à repreensão
por causa das unhas reforça a frustração e o desamparo nas
crianças e, por conseguinte, também sua dependência de
roê-las.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho tem medo da própria
agressividade?

Como ele pode aprender a lidar melhor com sua
vida?

Em que circunstâncias ele se sente muito
limitado? O que ou quem o faz sentir-se assim?

Como pode tornar-se mais corajoso?

Por que ele fere a si mesmo? Como pode
aprender a lidar de maneira responsável com
sua agressividade?
 
Medidas de apoio:

Tomar consciência de toda a problemática da
agressividade desde o princípio (ver o livro A
Agressão como Oportunidade).

Faça com que seu filho pratique esportes, para
que ele possa se desafogar fisicamente.

Permitir que ele masque chiclete.

Redução da agressividade: pendure um saco de
boxe e faça com que seu filho pratique golpes de
cinco a dez minutos diariamente.

Oferecer a ele uma bolinha antiestresse ou um
Hacky Sack (saco de couro cheio de bolinhas de
plástico), sobretudo em situações em que a
criança rói as unhas.

Instrumentos de percussão: em contextos
apropriados, permitir que a criança toque tambor
e/ou bateria.
15.8.1.14 Morder o lápis
“Fico roendo os dias que me roem.”
 
Morder o lápis também é uma temática que envolve a
agressividade. A criança treina, por assim dizer, a própria
mordida na extremidade do lápis, em vez de direcionar sua
ponta (agressiva) contra o papel e nele realizar algo
corajoso. De maneira geral, morder o lápis é um modo para
reduzir a tensão em casos de dificuldade de concentração ou
tédio. A criança prefere morder a se concentrar em alguma
coisa que não a entusiasma. Os problemas relacionados à
mordida podem ser múltiplos. Assim, muitas vezes os lápis
se tornam mordedores para a criança mais velha e alguns
adolescentes, que os mordem com firmeza, em vez de se
empenharem com afinco na tarefa que lhes é apresentada.
Trata-se, portanto, de uma obstinação em um nível inócuo,
mas, obviamente, haveria alternativas mais evoluídas e mais
sensatas de canalizar a própria agressividade.
Lápis mordidos não são nenhuma catástrofe, mas
satisfazem tão pouco quanto os galhos novos mordiscados
por cervos famintos ou arranhados pelos chifres de bodes.
Se os “jovens selvagens” afiassem e exercitassem seus
dentes em projetos maiores e mais impressionantes, todos
os envolvidos seriam ajudados. A tarefa para os pais seria
introduzir essa atitude no jogo da vida.
 
Perguntas para os pais:

Em que circunstâncias nosso filho deveria afiar
melhor seus dentes?

Que situações constituem um desafio para ele?

O que poderia despertar sua curiosidade e torná-
lo adequadamente agressivo?

Como se pode deslocar a concentração do lápis
para o que se escreve?

Como se pode focar a tensão em outras
situações?
 
Medidas de apoio:

Estimular a capacidade de resistência: a
verdadeira tarefa consistiria em aprender a
superar as dificuldades que surgem a cada
atividade.

Deslocar a mordida: a criança deveria ter a
possibilidade de mostrar seus “dentes
intelectuais” e desenvolver a mordida em outros
níveis.
15.8.1.15 Dependência da televisão
“Não vejo outra coisa que não seja a televisão.” –
“Quadrada, prática, boa.”
 
Essa dependência moderna não se limita absolutamente às
crianças. Na maioria das vezes, os pais chegam a ser seu
modelo. Como meio de comunicação de massa, a televisão
conquistou há muito tempo todos os aspectos da sociedade
moderna. A “sociedade da televisão” é deplorada pela
maioria dos pais, mas exclusivamente no que se refere a
seus filhos, pois eles próprios cresceram sem a existência
desse substituto onipresente e, assim, conseguiram
administrar sua vida, ao menos em parte. Para as crianças
que iniciam a vida já sobrecarregadas e acalentadas por
tantos estímulos, o mundo e suas possibilidades parecem
piores. As telas tornam-se cada vez maiores, mais
dispendiosas, brilhantes e planas; a perspectiva das crianças
também se torna mais plana, estreita, limitada, sem
imaginação e até sombria.
Nesse meio-tempo, está em voga o lema “assistir à
televisão em vez de viajar” ou “vídeo, ergo sum” (vejo, logo
sou). O antigo original cartesiano “Cogito, ergo sum” (penso,
logo existo) está extinto faz tempo, conforme
lamentavelmente comprovaram os recentes estudos do
PISA.[35] Na modalidade utilizada pela maioria, a televisão
não contribui em nada para a formação; ao contrário, por um
lado, engorda os pequenos “sacos de batatas” que passam
horas no sofá e, por outro, os estupidifica. Este último
aspecto não depende, de modo geral, das emissoras nem de
suas programações, e sim da escolha dos programas para os
“kids”, como há tempos são definidas as crianças, não
apenas no mundo televisivo. Tampouco as viagens são
realmente eliminadas, mas os objetivos tornam-se cada vez
mais unilaterais, e os programas escolhidos, cada vez menos
exigentes do ponto de vista intelectual.
Portanto, em vez de aspirarem ao emocionante mundo
exterior, as crianças preferem, com frequência cada vez
maior, ficar enfurnadas em casa, preenchendo a alma com
decalques da realidade. Se ler em vez de viver já constituía
certo perigo para nossa geração, assistir à televisão em vez
de viver representa uma exacerbação. Quem assiste às
séries, nas quais tudo é abertamente edulcorado – do
contrário, não seria aproveitável nem teria valor –, quem se
deixa contagiar pelas novelas totalmente sem conteúdo ou
passa o tempo vendo shows de talentos, terá menos tempo
para coisas mais importantes.
Quando a própria vida vai parando de funcionar
progressivamente, quando a comunicação já não é realizada
e a vida passa a se desenvolver de maneira totalmente
unilateral, a televisão obviamente ameaça se tornar um beco
sem saída para a existência. No entanto, isso não é culpa
dos que atuam na televisão nem de seus programas, e sim
das pessoas que a usam erroneamente como um substituto
da vida.
Entre as crianças, muitas vezes a televisão já é uma
necessidade para que ainda consigam participar da “vida”.
Tudo gira em torno das séries e das pseudoestrelas. Nos dias
de hoje, para se tornar uma, já não é necessário saber
cantar ou dançar; é suficiente saber falar a própria língua de
maneira rudimentar e ser atrevido, indiscreto e arrogante.
Essas novas estrelas, procuradas e encontradas em série e
em massa na televisão, podem suscitar pena e ser aceitas
por aquilo que são, mas se essa qualidade inferior – através
do meio de comunicação da maioria – se torna a medida de
todas as coisas, então a dependência da televisão se torna
uma das mais perigosas.
Considerando o poder extremo da mídia, a tarefa dos pais
modernos parece ser quase sobre-humana. As séries, que
são pseudoemocionantes e mal interpretadas, são seguidas
apenas por quem já não vive histórias interessantes nem as
tem para contar. Por isso, quando os pais proporcionam aos
filhos uma vida igualmente emocionante, os kids saem de
bom grado da frente da televisão.
Contudo, o problema hoje é que, à medida que os filhos
crescem, fica cada vez mais difícil para os pais dar-lhes uma
vida mais emocionante. O peergroup domina, e as crianças
são chamadas a assumir o controle da própria vida.
Atualmente, isso pode ser mais difícil do que há cinquenta
anos, mas os pais jamais puderam fazer isso no lugar dos
filhos.
Quando os pais ajudam o filho a fazer sua estrela brilhar
na vida, a não esconder sua luz, e sim colocá-la no lugar
certo, fazendo-a brilhar, e, portanto, o ajudam a colocar-se
sob a luz correta, a tornar-se o foco central de uma história
de vida animadora, que se passa no próprio palco (da vida),
os shows de talentos da televisão e suas perspectivas de
substituir a vida se tornam menos atraentes.
Contudo, obviamente, a televisão não deixa de ser a babá
mais cômoda, barata e confiável – sobretudo quando
conectada a vídeos e DVDs. Compram-se noventa minutos
de liberdade e, quando se tem sorte e filhos pouco
exigentes, o mesmo disco pode ser visto várias vezes. Em
nenhum outro lugar as crianças modernas parecem tão
tranquilas, seguras e satisfeitas. A única insegurança desse
método diz respeito apenas a seu futuro.
Diante da televisão reúnem-se pessoas de todos os grupos
etários, que acabam em um consequente isolamento,
escolhido de maneira autônoma, mas, mesmo assim,
inconsciente. Não encontram o que dizer; simplesmente não
lhes ocorre nenhum assunto. Assim se desenvolve o típico
isolamento moderno, em uma estrada espiritual de mão
única, na qual nada vem ao nosso encontro. Tal como a
nicotina, que ao mesmo tempo estimula e tranquiliza, a
televisão tem um duplo potencial de dependência: torna o
indivíduo solitário, mas, ao mesmo tempo, o protege da
solidão. Quem possui um aparelho de televisão nunca mais
terá de ficar sozinho consigo mesmo.
É enorme a tarefa dos pais que se empenham
pessoalmente em tentar animar a garotada barulhenta, que
quase já não faz barulho, pois se acomodou tranquila e
confortavelmente na frente da televisão. Hoje eles têm de
concorrer com os melhores animadores e com as mais
fascinantes estrelas do mundo; por isso, muitos acabam logo
desistindo. Estimular a imaginação de crianças em muitos
aspectos ultrassaciadas e ultraestimuladas, tornar sua vida
no trabalho doméstico ainda mais colorida, para que
resistam à inflação de imagens coloridas da tela, não é para
qualquer um e supera a capacidade da maioria.
 
Perguntas para os pais:

Como podemos tornar a vida cotidiana mais
emocionante do que uma série diária de
televisão?

Como podemos fazer com que nosso filho se
conscientize do escasso valor de determinadas
transmissões?

Como torná-los curiosos em relação ao mundo
real?

A nossa vida ou aquela de nosso filho é
monótona?

De que maneira ele pode ocupar-se
adequadamente dos próprios temas?

Que programas de televisão podemos ver e
discutir juntos?
 
Medidas de apoio:

Os pais deveriam oferecer aos filhos um mundo
de primeira mão, permitir que eles tenham
experiências em primeira pessoa, em vez de
deixá-los viver as experiências alheias. A
televisão fornece apenas imagens e “mundo” de
segunda mão. As crianças deveriam tomar
consciência disso e aprendê-lo com os pais.

A televisão fornece soluções prontas, e as
crianças precisam da percepção sensorial para
poder compreender e encontrar as próprias
soluções e os próprios caminhos.

Talvez tivéssemos de passar novamente do lema
“quanto mais cedo, melhor” para a pedagogia do
“tudo a seu tempo”, como já requer a Bíblia:
tudo tem seu tempo. Obviamente, a televisão
também!
15.8.1.16 Dependência do computador
“Online is in – the rest is out.”
 
A continuação, ou melhor, a variante moderna da
dependência relativamente já antiquada da televisão é
aquela do computador; na realidade, nada além de um
desenvolvimento da dependência da tela. Ambos tornam a
vida plana e insignificante, no verdadeiro sentido do termo,
pois, obviamente, diante da tela do PC, a
tridimensionalidade da vida real torna-se uma
bidimensionalidade plana, o ângulo de visão se restringe dos
normais 180° para 70° a 80°. Portanto, as crianças perdem a
visão ampla e se tornam, necessariamente, limitadas. É uma
sorte que ainda não tenham desenvolvido olhos quadrados,
uma vez que passam boa parte do tempo vendo o mundo
redondo apenas através de um pequeno quadrado, ao qual,
como se não bastasse, falta toda profundidade.
Lila, o jogo cósmico, como os indianos chamam a vida,
consome-se diante da tela na mais absurda variedade de
games – da caça ao tetraz aos jogos futuristas de guerra em
outros mundos. O elemento comum é que eles pouco têm a
ver com a vida normal. Crianças relativamente pequenas já
se tornam habilidosos serial killers com gíria norte-
americana. Muitos jogos de guerra são variações de
programas de treinamento do exército dos Estados Unidos.
Ao ser perguntado por que os atuais autores de homicídios
em escolas são atiradores tão bons, um especialista
respondeu que era por causa das centenas de unidades
voluntárias de treinamento, realizadas nas telas presentes
nos quartos infantis. Nesse sentido, há que se reconhecer
que as modernas computer kids [crianças do computador]
são dotadas de certa persistência e de um empenho
correspondente. Torna-se mestre quem muito se exercita –
em todos os âmbitos.
Há muito tempo, a luta pela vida ocorre substitutivamente
na frente da televisão. O fato de que a tela individual do
computador pode oferecer programas ainda piores do que
aqueles oferecidos pela tela coletiva da televisão deve-se,
mais uma vez, ao tipo de escolha.
Ainda mais do que a televisão, o computador pode simular
toda a vida. Em vez de encontrar amigos da mesma idade, a
criança entra em chatrooms com o mundo inteiro e nunca
sabe com quem realmente está falando. Se considerarmos
as versões de menor formato de jogos como o Nintendo, fica
claro que as crianças já estão há tempos acostumadas com
as telas.
Com o PC ou o laptop, que entra cada vez mais cedo na
vida, as crianças também assumem cada vez mais cedo as
maneiras e as formas de vida dos adultos. Obviamente, um
programa de compromissos vem instalado na versão básica.
Assim, muitos adolescentes já dispõem de agenda. Porém,
quem possui uma agenda também sofre a pressão ligada a
ela. A criança fica conectada com o mundo inteiro e já não
precisa dar um passo fora de casa para isso. O tédio também
deixou de existir: com a ajuda do computador e dos seus
respectivos jogos, pode-se matar o tempo a qualquer hora.
Caso ainda se tenha mantido a capacidade discriminativa,
que faça perceber a própria vida como decepcionante, o PC
está pronto para oferecer o acesso à chamada second life,
uma espécie de vida substituta virtual, na qual as cartas são
novamente embaralhadas. Quem ainda não teve uma
chance na primeira vida pode tentá-la na segunda, naquele
portal da internet para o qual fogem cada vez mais pessoas
de todas as faixas etárias. Trata-se de pessoas que já não
conseguem dar conta da vida verdadeira, pois ela não lhes
oferece o suficiente. Por isso, refugiam-se em um mundo
virtual supostamente mais bonito, para nele imergirem e, às
vezes, desaparecerem. Com algum dinheiro, novos amigos e
os mesmos modelos, conseguem recomeçar. Até perceberem
que só escolheram um novo nível para as antigas misérias,
muito tempo pode ter transcorrido em sua vida antiga e
normal e algumas pessoas podem até já ter se destruído.
Porém, essas lições – como justamente esta que estamos
mostrando – são a última coisa que as crianças de hoje
ouvem dos pais. Por outro lado, quando se refugiam desde
cedo no mundo virtual, sem ter podido conhecer
verdadeiramente o mundo real, os efeitos são bastante
graves.
De resto, os pais são os mais importantes exemplos, pois
eles próprios assistem constantemente à televisão e
desperdiçam seu tempo de vida diante dela.
Alternativamente, na maioria das vezes as crianças de hoje
buscam seus modelos e ídolos na tela da televisão e os
descarregam, por assim dizer, como todo o restante – assim,
pelo menos, adaptam-se aos respectivos mundos da tela,
que os protegem daquele real. Desse modo, os pais
deixaram amplamente de fazer seu serviço a partir do
momento em que a televisão e o computador introduziram
seu domínio sobre o mundo.
Contudo, geralmente essa responsabilidade deve ser
atribuída a eles próprios. Mal se termina de amamentar uma
criança e ela já é colocada no berço. Esta só sente que foi
agradada quando suas necessidades são satisfeitas de outra
maneira – e as telas, que hoje para muitos representam o
mundo – em todo caso transmitem justamente essa ilusão.
Por certo, depois de falarmos tanto de seu lado sombrio, as
telas também têm aspectos positivos. Elas nos permitem
utilizar todas as conexões possíveis no grande mundo. A
internet nos presenteia, quase sempre de graça e sem
nenhuma discriminação, todas as informações possíveis em
questão de segundos, transmite possibilidades culturais, e o
computador pessoal muitas vezes substitui a secretária
particular. Não só a procura por um parceiro, mas também
qualquer outra organização da vida pode ser conseguida
através da rede. Quase todo estudo foi enormemente
facilitado, e posso sentar-me com meu laptop em qualquer
gramado ou no topo de qualquer montanha e escrever o que
me der vontade. As modernas computer kids podem usufruir
de possibilidades com as quais só podíamos sonhar. Hoje,
elas dispõem com muita naturalidade de capacidades
informáticas das quais, na nossa época, o centro de viagens
espaciais em Houston ou o Pentágono não podiam nem
sequer se aproximar.
Nesse sentido, é necessário que os pais se empenhem
bastante em garantir a seus filhos as chances do mundo da
informação tecnológica ou IT (information technology) e, não
obstante, reajam ao aplanamento da vida. As chances
oferecidas por esse verdadeiro novo mundo são tão grandes
que sua respectiva sombra deixa de existir.
 
Perguntas para os pais:

Em que circunstâncias faltam estímulos ao nosso
filho fora do mundo do PC?

Por que ele se refugia nesse mundo irreal?

Como podemos desviar sua atenção e seu
interesse dos acontecimentos virtuais para os
reais?

O que poderíamos aprender com nosso filho no
computador, e o que ele poderia aprender
conosco fora dele, para que nossa vida em
comum se enriqueça?
 
Medidas de apoio:

Lidar conscientemente com o meio: como em
todas as outras dependências, o mais importante
é ter claro em mente que o problema não é o
computador, e sim a maneira como a criança lida
com ele.

Oferecer alternativas: tal como no caso da
dependência da televisão, aqui também se trata
de proporcionar à criança experiências “de
primeira mão”.
15.8.1.17 A dependência do telefone celular
“Estou sempre disponível para todo mundo.”
 
A ânsia por comunicação e por fazer parte de alguma coisa;
o desejo de, a qualquer momento, poder entrar em contato
com qualquer pessoa, de ter o mundo exterior sempre por
perto e de estar sempre disponível: essas são as palavras
mágicas na era do celular. Acrescente-se a elas o fato de o
celular estar se integrando gradualmente ao laptop e à
televisão. O telefone celular é o denominador comum desse
moderno triunvirato. “Coloque no seu celular” é um slogan
publicitário, ao qual as crianças também já estão
submetidas; em todo caso, aquelas que se preocupam com a
própria imagem.
De fato, em breve receberemos no celular coisas que hoje
nem imaginamos. Já é possível pensar que o chip de
laboratório implantado no corpo, ou seja, carregado sob a
pele, enviará ao celular informações relativas à falta de uma
vitamina, e que determinado trajeto para se chegar à loja ou
ao restaurante onde tal vitamina está disponível será
mostrado via GPS no display. Talvez então já não
precisaremos de cardápio; bastará ligar o celular, que, em
contato com o chip integrado ao nosso organismo, enviará à
cozinha do restaurante o pedido do cardápio, disponível on-
line. Talvez, em algum momento, todo o cardápio seja
combinado dessa forma, de maneira que receberemos tudo
de que um ser humano precisa do ponto de vista químico.
Mas o que receberá nossa alma? A ilha, uma espécie de
filme de terror, descreve essa situação e desenvolve
ulteriormente o cenário de horror.
Ainda que essas perspectivas continuem sendo, por algum
tempo, meras promessas para o futuro, para muitos
contemporâneos o celular já é absolutamente irrenunciável.
Uma menina com séria dependência do celular, cujo pai
confiscara o aparelho após uma conta muito cara, logo
reagiu com acessos de suor e distúrbios no ritmo cardíaco.
Infelizmente, o efeito se reproduzia a todo instante. O celular
já havia se tornado para ela uma espécie de cordão
umbilical, que a ligava a tudo que ela considerasse
importante. Muitos jovens devem ter os mesmos sintomas
quando não estão continuamente on-line.
A geração do celular quase já não marca de se encontrar.
Tudo ocorre espontaneamente através do celular; já não é
necessário programar nada, pois o cordão umbilical do
celular está sempre ligado. Uma mãe que não estava
compreendendo muito bem a situação da filha em relação ao
celular e queria lhe alertar sobre a periculosidade da
radiação emitida por ele teve de ouvir da filha, com
perplexidade, que, de todo modo, sem celular, ela já não
gostaria de viver. Obviamente, isso obriga toda uma geração
a um macabro “aqui e agora”. Tampouco se deve subestimar
a função de controle exercida pelo celular. As crianças
podem ser sempre encontradas, mas também são mais
livres e autônomas, o que só pode agradar a ambos, pais e
filhos.
Originariamente pensado como instrumento para o
intercâmbio de notícias, hoje, passar horas ao telefone é
parte de um novo sentimento da vida dos adolescentes. Com
seu sistema de abreviações e diversos códigos secretos por
SMS, eles permanecem completamente sozinhos, porém
presentes em toda parte. Com isso, podem ganhar muito
tempo, embora, sem perceber, na realidade estejam
perdendo um enorme tempo de vida.
Todas as novas mídias ajudaram a acelerar drasticamente
o decorrer de nossa vida e, assim, a ganhar muito tempo. No
entanto, é claro que também se comunica toda sorte de
bobagens, pois na internet e em todos os sistemas a ela
associados, as barreiras caem mais rapidamente do que os
professores de ética podem lamentar.
Os celulares já salvaram muitas vidas, mas também já
custaram muitas vidas (em termos de tempo). Este é seu
lado sombrio: destruímos o tempo em uma medida que
nunca existiu antes, diante das telas mais diferentes, quer se
trate daquelas cada vez maiores das televisões e dos
computadores, quer das cada vez menores dos celulares.
Depois dos adolescentes norte-americanos, que há muito
tempo passam a vida ao telefone, as crianças seguem seu
exemplo e fazem o mesmo com a infância. Embora não
sejamos obrigados a adotar tudo que vem dos Estados
Unidos, até agora, quase sempre o fizemos.
 
Perguntas para os pais:

Como podemos enfatizar e colocar em primeiro
plano o valor útil do celular?

Nosso filho tem medo de perder alguma coisa se
não estiver sempre disponível?

Estaria ele indisponível em outros níveis
importantes e, por isso, sente a necessidade de
compensá-lo com o celular?

Como podemos mostrar-lhe a importância das
conversas e da vida cara a cara?

Nosso filho já teve a oportunidade de viver a
vantagem de shows ao vivo em relação àqueles
gravados em CDs? Deveríamos ir a um show
para perceber a diferença?

Como podemos praticar juntos e olharmo-nos
nos olhos quando conversamos e, de maneira
geral, a nos olharmos mais?
 
Medidas de apoio:

Oferecer alternativas: a solução para a
dependência do telefone celular estaria, por
exemplo, em uma comunicação estimulante, que
recuperasse os velhos caminhos das conversas,
das discussões, das brincadeiras e das risadas
em comum, para que as crianças voltassem a ter
vontade de viver a vida “ao vivo”, e não em sua
versão degenerada, plana e quadrangular.

Como no caso da dependência do computador e
da televisão, o mais importante é esclarecer que
o problema não está no telefone celular, e sim
no modo de lidar com ele.
15.8.1.18 Inapetência
“Já não tenho vontade de nada.”
 
Por trás da falta de apetite esconde-se, eventualmente, a
falta de fome de viver, o que, por sua vez, muitas vezes está
relacionado à saturação ou a uma recusa. Quem não quer
comer revela já não ter vontade de “ingerir” e “digerir” a
vida. Portanto, trata-se de uma espécie de recusa a tomar
parte na existência.
Obviamente, isso coloca os pais contra os filhos. De fato,
na mensagem da inapetência inclui-se um sonoro safanão.
Afinal, depois de terem se empenhado tanto pela criança,
agora são obrigados a constatar que todos os seus esforços
terminam em um boicote geral à vida. Na inapetência
também está incluída uma recusa ao alimento oferecido, que
evidentemente não supre as expectativas. As crianças
comunicam de maneira bastante direta aos pais que seu
presente não tem valor. E os pais realmente ficam com medo
de que a criança possa adoecer e possa partir lentamente.
Normalmente, porém, a inapetência não é uma recusa
geral à vida, e sim uma fase; na maioria das vezes, é
suficiente esperar até a criança voltar a sentir fome.
Contudo, seria importante prestar atenção para que ela não
se empanturrasse de doces ou outros substitutos
alimentares e, assim, perdesse o apetite na hora das
refeições.
Não é nada incomum o fato de as crianças comerem
menos em determinadas fases da vida e, em outras,
comerem mais. Obviamente, a fome também está
relacionada ao gasto de energia e se desenvolve com mais
facilidade depois de um passeio de bicicleta do que se a
criança fica sentada no sofá, assistindo à televisão, ou
jogando no computador.
 
Perguntas para os pais:

Como podemos estimular no nosso filho a fome
pela vida?

Do que ele está saturado?

Do que ele gosta e do que gosta menos?

Como podemos estimular nosso apetite juntos?

Se o apetite aparece na refeição, por onde
poderíamos começar?
 
Medidas de apoio:

Estimular a vontade de viver: a ambiciosa tarefa
dos pais em caso de uma inapetência que dure
muito tempo consiste em despertar na criança
que recusa comida a vontade do bhoga budista
de “comer o mundo” e de superar seu
desinteresse pelo mundo físico através de
formas equivalentes e estimulantes de alimento
e de vida. Quem desenvolve apetite pela vida,
em sentido figurado, logo reencontrará o gosto
também em sentido concreto.

Transferir oportunamente a recusa: fazer com
que as crianças compreendam que uma recusa
pode ter seu significado e que na vida moderna
já existem situações suficientes, capazes de tirar
o apetite de alguém. Essas situações poderiam
ser objeto de uma recusa compartilhada e
consciente, como o alimento de baixa qualidade,
os jogos de guerra ou os vídeos de violência. Por
fim, pais e filhos poderiam se divertir tentando
desenvolver juntos o “gosto certo” e aprendendo
como faz bem e como é bom comer sem
necessidade.

Dar e receber: do ponto de vista da homeopatia,
as crianças poderiam aprender com sua recusa e
contentar-se com muito pouco; além disso, a dar
mais do que receber.
15.8.1.19 Pequenas personalidades que atraem acidentes
“Comigo dá sempre tudo errado.”
 
Ter um filho que “atrai acidentes” é um grande desafio e
requer muita calma interior, atenção, confiança e, sobretudo,
paciência. Não faz muito tempo que cientistas reconheceram
esses tipos de personalidade. A sabedoria popular já sabe há
muito tempo de sua existência e fala de “azarados” e
“infortunados”. Também sabe que “a desgraça nunca vem
sozinha” e que existe a “lei da série”, que sempre acomete
“quem não tem sorte”. Por outro lado, a sabedoria popular
conhece igualmente o polo contrário, ou seja, os “sortudos”,
que parecem ter nascido “voltados para a Lua” e que nunca
saem perdendo.
Diante desses fenômenos e de suas vítimas, que nesse
meio-tempo foram classificados pela ciência de
“personalidades que atraem acidentes”, a medicina
acadêmica se vê totalmente desamparada. Pois, para as
pessoas afetadas, qual a utilidade de conhecer o resultado
comprovado pela estatística, segundo o qual 80% de todos
os acidentes recaem sobre 20% de todas as pessoas,
independentemente de serem considerados acidentes de
trânsito, de trabalho, domésticos ou de esporte? E a carreira
de tal azarado pode começar cedo, já na infância.
A ajuda vem exclusivamente do reconhecimento do
princípio primordial ou do arquétipo que se encontra na base
desse fenômeno. Assim como tudo que é feminino e infantil
pertence ao princípio da Lua, também há um princípio ao
qual corresponde tudo que é original, incomum, louco,
excêntrico, que infringe as normas e a que também estão
submetidos os acidentes: o princípio de Urano.
Os indivíduos que, como as personalidades que atraem
acidentes, se encontram em pé de guerra com esse princípio
deveriam viver de maneira mais corajosa e louca (do ponto
de vista homeopático), em vez de concentrar-se ainda mais
e ser cada vez mais atento (do ponto de vista alopático). Se
passarem dos limites, saírem da linha e abandonarem os
caminhos percorridos pela maioria, escaparão da armadilha
dos acidentes. Tudo que torna sua vida original e chamativa,
insólita e desafiadora corresponde ao princípio de Urano e
lhe faz justiça.
Os acidentes pertencem a esse princípio. Com eles, a
criança finalmente se afasta das normas e, muitas vezes,
dos caminhos preestabelecidos. Os acidentes pertencem aos
aspectos irremissíveis desse arquétipo. Todo princípio tem
dois lados. Quem vive seu nível remissível lhe faz justiça e se
liberta, ao mesmo tempo, do seu lado sombrio irremissível.
 
Perguntas para os pais:

Como nosso filho pode se tornar mais corajoso?

Ele tem permissão para, de vez em quando,
fazer loucuras e ultrapassar os limites?

Quando, onde e como poderíamos viver juntos
momentos de loucura e excentricidade?

O que poderíamos inventar para tornar nossa
vida mais emocionante e desafiadora?

O que há de insólito e especial, de original e
peculiar em nosso filho, e como poderíamos
estimulá-lo e dar-lhe espaço?
 
Medidas de apoio:

Para as crianças afetadas, trata-se de retornar ao
original com que nasceram e de deixar para trás
os “decalques” que os outros ou a sociedade
querem fazer dele.

Princípios primordiais: para os pais, cujas tarefas
individuais do ponto de vista dos princípios
primordiais costumam ser outras, o princípio de
Urano representa um desafio bastante particular.
Em tal situação, o melhor conselho seria confiar
nas leis da vida e nos arquétipos e confrontar-se
com eles para melhor compreendê-los e, por
meio deles, melhor compreender as crianças,
escapando, assim, das avaliações.

Disponibilidade para o risco: a coisa mais difícil
para os pais em questão é encontrar o equilíbrio
entre o cuidado e a disponibilidade para o risco.
Se essas crianças crescerem muito protegidas,
com frequência se lançarão precipitadamente e
quase às cegas ao risco, e sua vida realmente
correrá perigo. Porém, se forem superprotegidas,
poderão se tornar medrosas.
O desafio consiste em deixá-las experimentar
sempre as novidades que para elas realmente
parecerem arriscadas, mas que, para os pais, ainda
sejam aceitáveis. Para que as situações não se
agravem de fato, é necessário que as experiências
tenham um propósito e sejam supervisionadas pelos
pais. Quanto mais responsavelmente a criança
aprender a colocar-se diante de novas situações,
tanto melhor. Para os pais, trata-se sempre de uma
questão de equilíbrio e, não raro, também de
paciência.
Obviamente, não podemos estar sempre prestando
atenção em nossos filhos; em algum momento, eles
próprios terão de fazê-lo. Porém, se crescerem
lentamente com essa responsabilidade, o resultado
será bem melhor do que (super)protegê-los e, mais
tarde, lançá-los às cegas ao primeiro desafio que se
apresentar.
15.8.1.20 Dislexia
“Não consigo ler o mundo!”
 
Antigamente, o déficit de leitura e escrita não era nem
sequer (re)conhecido como sintoma, menos ainda como
quadro clínico. Até os testes de inteligência revelarem mais
informações, do ponto de vista pedagógico partia-se do
princípio de que as crianças eram burras demais para
aprenderem a ler e escrever, o que as marcava para o resto
da vida. Hoje, em relação a esse assunto, há mais abertura.
As pessoas afetadas conseguem até mesmo terminar a
escola e seguir carreiras brilhantes. Assim como existem
talentos parciais, existem também déficits parciais.
Desde que quase todo computador conta com programas
que facilitam a ortografia, mesmo o aspecto prático da
escrita ficou muito mais leve. De fato, a ortografia chega a
melhorar quando a criança depara continuamente com os
erros e pode tentar por mais tempo escrever a palavra certa
sem sofrer pressão.
De resto, lidar com o problema determina em muito o
quanto ele limitará a vida. A dislexia nunca deveria tê-la
limitado, e hoje menos ainda. Não obstante, como em todos
os sintomas, também neste caso deve-se aprender alguma
coisa sobre sua simbologia.
Os disléxicos são chamados a aprender a ler e a
reconhecer na criação de Deus, como em um livro aberto,
quão pouco o mundo escrito lhes é pertinente. Esse mundo
se dissimula para eles de maneira ainda não conhecida pela
ciência. Portanto, a tarefa dos disléxicos não está,
evidentemente, em descrever literalmente o mundo, decifrá-
lo ou garantir um lugar nele por meio da escrita. Outras
formas de expressão voltam para o primeiro plano. Somente
a forma da linguagem que passa para a escrita se subtrai a
eles, mas não a língua em suas possibilidades de expressão
emocional e sentimental.
Se não consigo me comunicar por escrito e, portanto,
formalmente, preciso tentar fazer isso de modo informal e
por outros caminhos. Quem não consegue descrever seu
mundo pela escrita deve tentar fazer isso de outro modo,
recorrendo a palavras móveis.
A forma fixa e estabelecida segundo as regras da
ortografia é misturada pelos disléxicos e termina em uma
salada de palavras que já não faz sentido. Evidentemente,
eles precisam encontrar seu sentido de outra maneira e
comunicá-lo como se fosse por meio da forma escrita. Além
disso, é preciso refletir sobre o fato de que existia uma vida
antes de Gutenberg e da impressão de livros e até mesmo
antes de existir a escrita... Com ela, os disléxicos recusam
inconscientemente grande parte da nossa cultura, a cuja
ordem escrita eles não conseguem adaptar-se nem inserir-
se.
Somente os médicos erram mais ao escrever do que os
disléxicos. Será que ambos os grupos não conseguem ou não
querem reconhecer aquilo que escrevem (errado)?
Obviamente, quem não domina a forma escrita torna-se
muito menos comprometido, pois é justamente a forma
escrita que de fato conta entre nós e com a qual fixamos e
estabelecemos tudo.
Quem comete falhas constantes ao escrever pode não
entender o que escreve. Do ponto de vista homeopático, o
disléxico deveria misturar e turbinar mais o lado formal de
sua vida, desfazer-se das obrigações e transformar a
coragem em caos. Do ponto de vista alopático, trata-se de
corrigir as letras e as coisas que têm importância na vida.
Para a homeopatia, ao contrário, trata-se de lidar com os
aspectos formais da vida de modo mais criativo e original,
sob a condução do princípio de Urano, já mencionado a
respeito dos acidentes. Deve-se proceder um pouco como
Johnny Depp no filme Benny e Joon – Corações em conflito,
em que ele, que não sabe ler nem escrever, lida de maneira
tão encantadora com a vida que todos se entregam a seu
charme. Este seria um filme obrigatório para disléxicos e
pessoas inábeis com cálculos, um estímulo maravilhoso para
descobrir dentro de si o verdadeiro artista seguindo a esteira
do princípio de Urano.
Letras são sinais dos primórdios da nossa cultura.
Originariamente, derivam das hastes de faia,[36] nas quais
os povos germânicos inscreviam sinais cheios de
significados, aquelas runas que, segundo Odin, deveriam
sussurrar o conselho correto. No ritual, as hastes eram
lançadas desordenadamente e, conforme a posição em que
caíssem, indagava-se a vontade dos deuses.
Entre os disléxicos, o oráculo das palavras, com o qual
talvez queiram encontrar um sentido totalmente diferente
em sua vida, está sempre na ordem do dia. Todo erro de
escrita tem realmente de ser interpretado em sentido
freudiano como ato falho. Por conseguinte, uma torrente de
atos falhos poderia ser vista como uma tentativa de chegar a
um sentido diferente, totalmente pessoal.
Uma tarefa evidente dos disléxicos é certamente fundar,
de modo original e individual, o sentido da Criação. Quando
pensam por imagens, não apresentam nenhum tipo de
problema; portanto, poderiam enfatizar em sua vida essa
parte essencial da realidade (talvez ideogramas como o
chinês antigo fossem mais vantajosos para eles). Se a
energia e, com ela, a atenção fossem retiradas do aspecto
masculino e ordenador da vida, restaria mais espaço para
aquele feminino e pictórico; além disso, com a nova língua, a
vida ganharia outro sentido.
É o que pode ilustrar o seguinte exemplo: em vez de
decifrar histórias em sinais gráficos e escrevê-las, os
disléxicos poderiam vivê-las por imagens, recitá-las, cantá-
las e dançá-las, transmitindo-as aos outros de maneiras
completamente diferentes e tornando-as vivas diante de
seus olhos interiores e em seu coração.
O autor Ronald D. Davis, que é disléxico, acrescenta em
seu livro O Dom da Dislexia: “A dislexia é um talento no
verdadeiro sentido da palavra. É uma dádiva e um dom, uma
capacidade natural. Se a criança for autorizada a ser
disléxica, tal como ocorre com os canhotos, ela aprenderá a
utilizar plenamente suas capacidades especiais. Como ela
dispõe de uma forte percepção tridimensional, as letras não
permanecem fixas em sua superfície bidimensional, mas se
movem no espaço, fenômeno que, supostamente, dificulta
muito a leitura e a escrita; por outro lado, porém, possibilita
um tipo de percepção bastante diferente. Com base nessa
percepção móvel e profunda, essas crianças têm uma
imaginação ativa, uma percepção multissensorial, uma
criatividade elevada e uma boa intuição, quando não vivem
seu talento pessoal como uma falha”.
 
Perguntas para os pais:

De que outro modo nosso filho pode exprimir-se
além da escrita?

Em que situações ele não quer sentir-se obrigado
nem comprometido?

Quando ele está autorizado a ser criativo e
caótico?

Como seus talentos (artísticos) podem ser
estimulados?

De que modo podemos juntos entender melhor o
mundo e aprender a ler na Criação divina como
em um livro aberto?
 
Medidas de apoio:

Comunicação: criar mais espaço para os diálogos
e para contar histórias.

Tornar a leitura atraente: reflita como você
poderia tornar a leitura atraente, emocionante e
positivamente desafiadora para seu filho.
15.8.1.21 Discalculia
“A vida é incalculável para mim.”
 
A dificuldade para calcular é mais rara do que aquela para
ler e escrever e, em um mundo que lê cada vez menos e
calcula cada vez mais, torna-se um grande problema. Em
seu conjunto, o mundo moderno é quase uma espécie de
grande calculadora; tudo passa pelo cálculo. Os
controladores dominam e determinam nossa vida; trata-se
sempre de pagar, calcular e de dinheiro contável. “A conta
está certa?” é a pergunta que não deixa ninguém em paz.
Mesmo em uma unidade de terapia intensiva o resultado é
calculado antecipadamente: vale a pena toda a despesa, do
ponto de vista do simples cálculo? Os médicos, que não
querem parecer tão calculistas, se esforçam para assegurar
que essa modalidade é apenas um procedimento possível,
sem repercussão sobre a terapia. Os últimos verdadeiros
médicos já deixaram há tempos essa avaliação econômica
da doença. Seria o caso de nos perguntarmos por que,
então, se fazem cálculos se estes não têm nenhuma
consequência. Bem, porque é possível! Isso também
corresponde totalmente à tendência moderna. Fazemos
muitas coisas porque podemos, e não porque precisamos. E,
atualmente, pode-se calcular quase tudo.
Quando não é possível averiguar nenhuma relação entre o
preço e a prestação do serviço, podem-se elaborar
maravilhosos cálculos estatísticos sobre o consumo de
combustível e a expectativa de vida, que, em geral, é a
expectativa de morte. E, naturalmente, qualquer pessoa é
capaz de calcular quando irá se aposentar. E quanto, ou
melhor, quão pouco receberá, também é algo que se pode
calcular nos dias de hoje. As estimativas praticamente nos
poupam de ir às urnas; há muito tempo que a democracia se
tornou calculável e, com isso, também bastante corrupta.
Nesse meio-tempo, podemos calcular se combinamos com
nosso parceiro; de fato, surgem cada vez mais
relacionamentos através de portais na internet, que, por sua
vez, apoiam-se em computadores, ou seja, calculadoras. Se
depois esses relacionamentos vão perdurar, é outra questão,
incalculável e de cunho emocional. Por outro lado, as
chances não parecem piores do que aquelas de relações
iniciadas por outros caminhos. Todo o universo do
computador é calculado e, portanto, também calculador. Em
nenhum outro mundo se mentiu tanto como neste moderno
do computador, mas tudo sobre uma base exatamente
calculada. Será que essa conta fecha?
Diante desse pano de fundo, realmente não se pode
permitir a chamada discalculia. Não obstante, algumas
pessoas, particularmente corajosas, são obrigadas a fazê-lo.
Simplesmente não conseguem calcular. Alguma coisa em
seu “computador biológico pessoal” se recusa a colaborar.
Obviamente, a ideia de que nosso cérebro também seja
um computador – e o mais importante de que dispomos –
não é muito divertida nem muito popular, porém, em parte,
é verdadeira. Talvez também por isso as pequenas células
cinzentas sejam tão pouco utilizadas e de modo tão
incompetente. Para muitos, a antiga ideia de refletir
primeiro, por si mesmo, antes de recorrer ao Google, já
pertence ao passado.
Embora nosso cérebro seja, entre outras coisas, um
“computador pessoal” incrivelmente evoluído, ele é tão
avançado que supera nossa capacidade de compreender seu
funcionamento – mesmo com a ajuda das melhores
calculadoras. Nesse gigantesco “computador”, até o
momento inimitável, também há uma “central de cálculo”
que se ocupa especificamente de números e operações
matemáticas. Nas crianças com discalculia, essa área
especial do cérebro concentra um problema até agora
incalculável e insolúvel, com o qual, nesse nível, ainda não
estamos em condições de lidar.
Não que hoje seja mais importante calcular mentalmente,
pois qualquer PC já é capaz de fazer isso, bem como
qualquer celular, e, em todo caso, as próprias calculadoras já
se transformaram em brindes.
Portanto, assim como a dislexia, a discalculia foi englobada
por uma modernidade que calcula com rapidez cada vez
maior e, no dia a dia, foi levada ao absurdo. Esse distúrbio
tem relevância quase exclusivamente na escola. De fato,
hoje ninguém mais pode se permitir fazer cálculos de
cabeça, pois os computadores o fazem com muito mais
eficácia, não apenas com mais rapidez, mas também de
maneira mais confiável. Com eles, pode-se calcular a
qualquer momento, enquanto com as pessoas, infelizmente,
nem sempre é o caso. Um instrumento de navegação
fornece a rota com muito mais rapidez e segurança do que
qualquer motorista. Hoje, há quase que se temer se é o
próprio piloto quem conduz o avião, pois o grande
computador instalado no cockpit simplesmente comete
menos erros.
Não obstante, do ponto de vista simbólico, a discalculia
tem grande importância. Quem não consegue corrigir coisas
que contam não pode contar em um mundo de números. O
que contará alguém que não é capaz de contar? Será levado
em conta? Pode-se levar em conta quem não consegue
calcular? É capaz de entender alguma coisa? Não se pode
avaliá-lo, e ele, por sua vez, não poderá ajustar as contas
com as outras pessoas nem com a vida. Provavelmente,
tampouco quererá fazê-lo.
Em todo caso, talvez esse indivíduo não seja muito
calculista – o que seria uma exceção nos dias de hoje! Ele
também não é capaz de calcular direito as consequências de
suas ações. Talvez ele as realize sob outros pontos de vista,
observando, por exemplo, que tipo de sentimentos elas
suscitam nele e nos outros.
Quem costuma cometer erros de cálculo provavelmente
deixará de calcular. Ele não participa do jogo de sociedade
mais difundido em nosso tempo. Quem é sempre submetido
a falsas avaliações talvez também deixe de fazê-las e já não
avalie as outras pessoas. Talvez seja uma boa coisa ele não
conseguir prever aonde isso o conduz, pois certamente não
vale a pena. Mas que problema irrisório não se deixar
monopolizar pelos números!
“Ai de quem errar as contas!”, pensamos, mas a criança
com discalculia as erra constantemente, comete erros e,
assim, tem sempre consciência de tudo que lhe falta. Não
consegue adaptar-se a este mundo ou consegue apenas de
modo insuficiente; portanto, não é fácil para ela encontrar
uma posição estável. Porém, isso significa que ela tem de
permanecer no fluxo, como a vida... justamente panta rei
[tudo flui].
Aqui já se vislumbram os lados redimidos desse déficit. De
fato, nem tudo deve ser contado e calculado. Quem entra no
mundo com muito cálculo, obtém pouco dele e causa uma
impressão desagradável. Hoje, sob a influência da
globalização, do turbocapitalismo e do estilo de vida norte-
americano, coletivamente talvez estejamos calculando
demais e fazendo apenas o que nos dá um retorno, mas
cada vez menos o que nos proporciona prazer e alegria.
Portanto, poderíamos aprender com as crianças que se
recusam a fazer contas. Elas poderiam nos lembrar que
também há outras coisas mais importantes na vida.
A tarefa se orienta em uma direção semelhante à da
dislexia, só que de forma mais dramática. Evidentemente,
essas crianças não devem se preocupar tanto com números
e dinheiro, devem calcular menos, não visar à eficiência nem
ao resultado de cada ação. Devem afastar-se do polo
arquetipicamente masculino e voltar-se para aquele
arquetipicamente feminino, artístico, jovial, criativo, fluido.
De acordo com a frase de Peter Altenberg, poderiam se
tornar poetas: “Deus pensa nos gênios, sonha nos poetas e
dorme no restante dos homens”. Portanto, se não se pode
ser um gênio, o poeta não deixa de ser bem melhor do que a
maioria dos que dormem.
 
Perguntas para os pais:

Em que situações calculamos, em que outras
somos imprevisíveis?

Em que âmbito ainda nos deixamos conduzir por
nosso sentimento, e não pelos fatos?

A acrobacia dos números ocupa uma parte
preponderante da nossa vida? Números e
dinheiro têm um papel supervalorizado?

Será que toda conta tem, necessariamente, de
dar certo?
 
Medidas de apoio:

Reflita sobre como estimular o lado artístico e
criativo do seu filho.

Leveza: reflita se seu filho quer ensinar-lhe a
lidar com números e dinheiro com mais leveza e
até ensinar-lhe a brincar com eles.
15.8.1.22 Masturbação
“Autonomia sensual ou criança independente.”
 
Ereções ocorrem nas crianças já no primeiro mês de vida,
durante a troca de fraldas. Sigmund Freud ressaltava que as
crianças já sentem prazer e sensualidade. Tão logo
descobrem a possibilidade de sentir prazer através do
estímulo ou da fricção de seus órgãos sexuais, recorrem a
ela. Esses atos nunca prejudicaram nenhuma criança; no
máximo lhe acarretaram reações totalmente exageradas por
parte dos pais e outros adultos preocupados. O melhor seria
simplesmente deixá-las à vontade, sem tecer comentários,
enfim, sem reprimir sua sensação de prazer – sabendo que a
autossatisfação é a coisa mais normal do mundo.
Quando a masturbação é punida ou sancionada, existe o
perigo de a vida sexual, a longo prazo, ser afetada. Portanto,
em vez de reprimi-la, seria necessário tolerá-la com
benevolência. Como já foi dito, é natural e até mesmo ideal
quando as crianças aprendem precocemente a sentir prazer
com o próprio corpo.
Poderíamos liberar a masturbação do sentido de sujeira e
classificá-la como uma descoberta de autoamor e de amor
por si. Um dos princípios centrais do cristianismo, “ama o
próximo como a ti mesmo”, também poderia ser aplicado
neste caso. As crianças exercitam no próprio corpo o que,
mais tarde, deverão poder fazer com seu parceiro.
Por conseguinte, a tarefa seria encontrar satisfação
suficiente em si próprio, desenvolver a alegria no próprio
corpo e reconhecer a masturbação como uma boa
possibilidade para descobrir o amor por si mesmo, entendido
como forma de passagem para conseguir satisfazer e amar
os outros da mesma forma.
Os pais que insistem na convicção de que a masturbação é
algo ruim deveriam lembrar o que nos trouxe esse tipo de
demonização por parte dos representantes eclesiásticos e de
outros moralistas. Os padres que nos amedrontaram quando
éramos crianças com o fantasma da tabes dorsal e de outras
bobagens do gênero apenas perderam credibilidade para si
mesmos e para sua igreja, porém, não impediram nem
reduziram de modo algum a masturbação com seu
alarmismo, tão tolo quanto infundado. Simplesmente
carregaram de medo toda a temática da sexualidade.
Por que então os pais desenvolveram tanta preocupação
em relação a uma atividade tão inofensiva? Às vezes, eles
temem seriamente perder o amor dos filhos por causa disso.
Pela situação, já é possível pressentir que, naturalmente, em
algum momento, os filhos dedicarão seu amor a outras
pessoas. Seria uma boa oportunidade para os pais se
habituarem em tempo com essa ideia. Contudo, é claro que
se deve ensinar às crianças que a masturbação pertence à
esfera privada e íntima e que, a longo prazo, é apenas uma
substituição do amor sexual entre parceiros, ao qual
normalmente dará acesso.
Por outro lado, se os pais perdem a cabeça diante da
masturbação dos filhos, embora naturalmente também a
tenham praticado e, não raro, ainda a pratiquem, isso
denota uma conexão com seus próprios problemas sexuais.
E destes já existe mais do que o suficiente. As crianças não
podem simplesmente aceitar o que seus pais proíbem a si
mesmos ou se permitem apenas com a consciência pesada
e, por assim dizer, ilegalmente. Quando as crianças
assumem a função de espelho e expressão das necessidades
reprimidas dos pais, naturalmente se tornam motivo de
preocupação para eles. No entanto, combater seu espelho
corresponde a lutar contra moinhos de vento.
 
Perguntas para os pais:

Qual é a nossa relação com a sensualidade e a
sexualidade?

Somos capazes de viver plenamente e manter
nossa sensualidade e nossa sexualidade?

O que nos incomoda nas necessidades do nosso
filho?

Em que situações somos mais pudicos e inibidos
do que nosso filho?

Seria o fruto do nosso amor um libidinoso a
nossos olhos? Qual de nós dois se sente mais
incomodado com isso e o que esse incômodo nos
sugere?

Quanto prazer vivemos e quanto prazer nosso
filho está autorizado a viver? Ou não queremos
saber desse assunto?
 
Medidas de apoio:

Se os pais notarem que seu filho está se
masturbando, eles devem, sobretudo, ficar
calmos e pensar em quanto é normal a
autossatisfação durante o desenvolvimento e em
quanto isso é útil para que as crianças possam
conhecer e explorar o próprio corpo.

Crie um espaço protegido para as necessidades
do seu filho.
15.8.1.23 Brincar de médico
“Tenho uma coisa que você não tem.”
 
As inocentes brincadeiras de médico entram na mesma
rubrica da autossatisfação. Por esse caminho, as crianças
procuram explorar o próprio corpo, e isso não deve, de
maneira alguma, desencadear reações paranoicas, muito
mais atribuíveis ao passado não superado dos pais do que a
uma real preocupação com os filhos. São especialmente os
pais, e menos as mães, a se manifestar com comentários
peculiares, típicos de indivíduos sexualmente inibidos ou
perturbados.
Hoje, as crianças têm tantas possibilidades de ver o que
quiserem através do computador e da internet, que chega a
ser ridículo perder a cabeça por causa de inocentes
brincadeiras em que elas começam a conhecer a própria
corporeidade sensual. Se os pais se mostram tão inibidos,
acabam lançando uma sombra sobre toda a temática da
“sensualidade” e fazendo com que os filhos corram o risco
de adotar sua posição deturpada.
Pais que não apresentam esse tipo de problema se
lembram de suas próprias brincadeiras de médico e de que a
única coisa desagradável a respeito talvez fosse a reação
perturbada ou perturbadora dos seus pais.
Seria muito mais surpreendente, preocupante e até
problemático se as crianças não demonstrassem nenhum
interesse pelo seu próprio corpo, pelo dos outros e pelos
órgãos sexuais que neles se desenvolvem.
 
Perguntas para os pais e medidas de apoio:

Ver a seção “15.8.1.22 Masturbação”.
15.8.1.24 Timidez
“Não tenho coragem (de viver).”
 
Antigamente, a timidez era considerada normal e até
interpretada como sinal de boa educação. Trata-se, nesse
caso, de crianças amáveis que (ainda) não têm coragem de
expressar sua vitalidade, não ousam fazer nada, não têm
autoconfiança e nas quais tampouco se pode confiar, pois a
qualquer momento seu outro eu, reprimido, poderia irromper
das sombras. São crianças que ainda não conseguem ficar
sozinhas (consigo mesmas), que continuam agarradas à
barra da saia da mãe, pois são instáveis, que gostam de se
esconder porque não querem ser vistas – talvez porque
ainda sejam muito imaturas e tenham consciência disso,
mas talvez também porque sentem vergonha de si mesmas,
como é comum nas crianças, dos pais ou da repressão
vivida. Possivelmente se comparam de maneira significativa
com a força que percebem nos outros e, subjetivamente,
acabam tendo a sensação de que se saem cada vez pior.
Por certo, existem crianças introvertidas e extrovertidas, e
isso é absolutamente normal. Muitas vezes, porém, a timidez
se confunde com a introversão, minimizando-a. Crianças
tímidas e intimidadas dispõem de muito pouca autoestima e
autoconfiança, ou seja, ainda não conseguem confiar em si
mesmas e conhecem muito pouco a própria pessoa e o
mundo com o qual se medem. Por conseguinte, também
preocupam-se muito pouco consigo próprias. A timidez
revela falta de confiança em si mesmo e nas possibilidades
da autorrealização.
Crianças tímidas geralmente também são medrosas.
Reagem de maneira particularmente temerosa quando se
sentem sozinhas diante dos outros. Em alguns casos, trata-
se de crianças que foram obrigadas a retirar-se e colocar-se
no último lugar. Talvez, também em sentido metafórico,
tiveram a espinha dorsal, ou melhor, a vontade quebrada;
foram transformadas em indivíduos obedientes e sem
vontade própria. Depois dessas experiências, o perigo de
irrupção da sombra é particularmente grande.
Chama atenção a timidez peculiar de “crianças
vacinadas”, que têm um verdadeiro histórico de inúmeras
possibilidades da medicina acadêmica a respeito.
Aparentemente, esses programas de repressão, que agem
através do sistema imunológico, são “bem-sucedidos”.
Se as crianças tímidas não receberem nenhuma ajuda que
as liberte dessa posição contida, mais tarde tenderão a
buscar uma proteção segura ou até mesmo agir de tocaia,
pois não ousam dar um passo à frente para confrontar a
vida.
Contudo, pode ser simplesmente que ainda se sintam
inseguras e não saibam que caminho tomar. O consequente
desamparo as torna ligeiramente dependentes. Seu olhar
pede: “Não me deixe sozinha, ainda não consigo (ficar) sem
você”. Por trás desse sintoma também pode haver falta de
confiança primária.
Os pais que nada confiam a seus filhos e sempre os
advertem com frases como: “Não vá cair!”, “Preste
atenção!” ou “Deixa que eu faço isso para você”, só pioram
a situação. Mães muito agarradas aos filhos atraem filhos
muito agarrados a elas. Porém, agarrar-se um ao outro não
dá sustentação a nenhum dos dois. Alguns pais comparam a
criança tímida aos irmãos mais corajosos, considerando que
estes é que estão “certos” e reforçando ainda mais a falta de
autoestima do filho tímido.
No entanto, muitas vezes se trata de crianças sensíveis,
que já desviaram seu foco para o mundo exterior, em vez de
permanecerem nas estruturas infantis que constroem o eu.
Apesar de sua insegurança em relação ao mundo exterior,
geralmente são muito imaginativas e criativas quando estão
sozinhas ou em um ambiente que lhes transmita segurança.
A tarefa das crianças, no sentido de uma redenção positiva,
consistiria em retirar-se, ouvir-se interiormente, buscar as
soluções criativas dentro de si, ter consideração por si
próprias, admitir sua dependência, aprender a se virar
sozinhas e encontrar a paz interior.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho não sente confiança?

Do que ele tem medo?

Em nossa opinião, do que ele não é capaz?

O que poderia tê-lo intimidado?

De que modo podemos ajudá-lo a sair do casulo
em que ele se retirou?
 
Medidas de apoio:

Reflita sobre o modo como seu filho poderia
desenvolver mais confiança primária.

A tarefa dos pais seria transmitir aos filhos
segurança (de si), o que, naturalmente, só é
conseguido quando os próprios pais já dispõem
dessa segurança.
15.8.1.25 Hipersensibilidade à dor
“Tudo é demais para mim e, ainda por cima, dói.”
 
Crianças que não desenvolveram nenhum escudo de
proteção e são “abertas” a tudo, indiscriminadamente,
mostram-se muito permeáveis e, com frequência, logo se
tornam também hipersensíveis. “Cheia de não me toques”,
ela sente tudo, e tudo a perturba. Do ponto de vista
alopático, ela precisa de um filtro que lhe permita fazer uma
seleção dos estímulos e volte a constituir, por um período de
transição, uma espécie de ninho protetor, graças ao qual a
escolha possa ser feita por outras pessoas, geralmente pelos
pais.
Nesse caso, o modelo educativo antroposófico poderia
ajudar a proteger em ampla medida as crianças dos
estímulos do mundo moderno. Sem televisão, DVDs,
aparelho de som e, sobretudo, computadores, tudo se torna
claramente mais tranquilo ao redor das crianças. Contudo,
essa proteção precisa ser atenuada no momento oportuno e
completamente abandonada quando a criança se mostrar
suficientemente forte. No mundo moderno, não é possível
progredir sem computador, e, por certo, o PC “em si não é
ruim”; a criança só precisa ser orientada a adotá-lo de
maneira coerente e produtiva para seu desenvolvimento.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho não consegue se proteger de
modo suficiente em relação às próprias
necessidades?

Como ele pode aprender a se delimitar melhor?

Como pode perceber melhor sua sensibilidade e
transferi-la para níveis mais adequados?

Qual é a situação em relação à sua e à nossa
compaixão?
 
Medidas de apoio:

A tarefa das crianças hipersensíveis consiste em
perceber as coisas mais nos níveis interiores, a
entrar nos estímulos e a transformá-los. Seria
bom tornar-se mais perceptivo em vez de
hipersensível, reagir com mais sensibilidade à
alma em vez de se mostrar hipersuscetível a
tudo que é externo, desenvolver mais empatia
em vez de reações exageradas e, em vez de
sofrer com o mundo, ter mais compaixão por ele.

Muitas pessoas até vivem bem com o fato de
terem mais sensibilidade do que outras, como os
rabdomantes e os terapeutas sensitivos.
Obviamente, essas capacidades podem revelar-
se muito cedo e deveriam, logo no início, ser
conduzidas aos canais corretos. Quem sente
mais do que os outros recebeu um dom. Todavia,
se esse dom não for aceito, ele pode se tornar
um problema, como todos os dons recusados.
Por que então não descobrir e estimular esse
talento já desde criança?
15.8.1.26 Insensibilidade à dor
“Não sinto nada.”
 
Trata-se de um sintoma muito perigoso, pois precisamos da
dor para sobreviver. Ela nos avisa dos perigos ameaçadores.
Quem se senta em cima de uma boca acesa do fogão e não
percebe porque não sente dor tem um problema enorme. No
entanto, felizmente a total insensibilidade física à dor é
bastante rara. Muitas das crianças afetadas por ela não
chegam a envelhecer, pois, sem perceber, causam graves
danos a si próprias muito cedo.
Muito mais frequente é o caso de crianças que se tornam
progressivamente insensíveis em razão de inundação de
estímulos, até já não sentirem nem se preocuparem com
quase nada. Devido ao excesso de estímulos, elas “se
fecham” e não permitem que mais nada as penetre. Por trás
de seus muros, tornam-se amargas e quase já não percebem
o mundo. O sintoma das pálpebras pesadas pode ser uma
manifestação externa relacionada a isso. As crianças tornam-
se apáticas, e as pálpebras pesam como na Pantera, de
Rilke, sobre um mundo impossível de ser alcançado.
Outra causa da insensibilidade à dor reside em
experiências de choque, até mesmo durante o nascimento. A
experiência traumática faz com que a criança se “feche
hermeticamente” para um mundo que pode machucá-la
tanto. O abuso sexual muito precoce também pode levar a
esse fechamento em relação ao “mundo do mal”. Por outro
lado, o sintoma pode ser igualmente um dom da natureza
em relação a dores contínuas e incontroláveis.
Do ponto de vista homeopático, a tarefa em casos de
insensibilidade consiste em não levar as coisas muito a sério,
deixar que elas passem, permanecer concentrado em si
mesmo, evitar que o que vem de fora chegue a si, encontrar
a paz interior, desatrelar-se do mundo exterior e ouvir mais
as vozes interiores do que as exteriores. Do ponto de vista
alopático, a tarefa consiste em despertar para a vida, reabrir
os olhos não apenas para deixar o mundo entrar dentro de
si, mas também para ir ao seu encontro. Os pais deveriam
fornecer estímulo e apoio, embora, obviamente, seus filhos
já não lhes perguntem nada nem os requisitem há muito
tempo. No pior dos casos, os pais levam essa situação para o
lado pessoal e reagem ofendidos.
Nesses casos, os pais, inevitavelmente, se perguntam: a
que ponto chegamos? Quem é o filho, quem é a mãe e quem
é o pai aqui? A pessoa mais inteligente sempre acabaria por
ceder; somente o mais forte e o mais sábio pode interromper
o círculo vicioso.
 
Perguntas para os pais:

O que tornou nosso filho insensível aos estímulos
do mundo?

O que o terá estimulado em excesso, a ponto de
ele ter se desligado?

Por que e para que nosso filho se fecha?

Como podemos ajudá-lo a abrir-se novamente
para o mundo, suas alegrias e dores?

Como podemos fazer para que ele sinta os
estímulos?

Em que âmbito nosso filho e nós próprios somos
autênticos?
 
Medidas de apoio:

Tratamento homeopático: o ópio potencializado é
um dos medicamentos de choque que tem a
insensibilidade à dor em seu quadro
medicamentoso; às vezes, opera milagres e é
capaz de abrir o olhar para o mundo.

Florais de Bach: neste caso, são úteis os florais
de Bach como Star of Bethlehem e Wild Rose.
15.8.1.27 Colocar os cabelos na boca
“Estou pincelando os lábios.”
 
Juntar os cabelos em um feixe e passá-los nos lábios é,
certamente, uma iniciativa sensual, que deve ser avaliada
de maneira muito mais tênue do que o quadro clínico da
tricotilomania, em que a pessoa arranca os próprios cabelos.
Com estes, entram em jogo as próprias penas, o símbolo da
liberdade, da beleza e do poder. Com os cabelos, a criança
cria uma espécie de cobra de pelos, um espanador para
acariciar os próprios lábios, que são seus órgãos de
comunicação sensual.
O aspecto problemático desse hábito se mostra, no
máximo, quando a criança o utiliza como substituto. A
primeira e autêntica escolha é sempre melhor. No entanto,
provavelmente trata-se apenas de uma breve fase, em que a
criança se compraz em ser um simplório sonhador.
 
Perguntas para os pais:

Em que âmbito falta sensualidade a nosso filho?

Ele está recebendo afeto suficiente?

Como lidamos com a proximidade e o contato
físico?

Como imaginamos nosso futuro? Vemos nosso
futuro mais segundo a nossa perspectiva ou
segundo a dele? De modo mais sensato ou
preponderantemente sensual?
 
Medidas de apoio:

Às crianças com essa mania inofensiva
certamente falta o afeto sensual, que elas
arranjam por esse caminho. Se elas pudessem
acariciar o pelo de animais domésticos ou
preferidos, isso seria um alívio para a satisfação
substitutiva, que, em si, não é problemática.
Aproximar-se mais seria ainda melhor.
15.8.1.28 Enrolar os cabelos
“Estou fazendo um cacho.”
 
Embora inócuo, esse hábito de caráter nervoso e semelhante
a um tique já alude a gestos conscientes, que se
manifestarão no futuro, e, assim, revela a temática que lhe é
própria. Quem faz cachos nos cabelos quer atrair e seduzir
antes de sair. Quando são as crianças pequenas a enrolá-los
como um hábito nervoso, também querem atrair e seduzir
alguém, geralmente os pais; querem que estes as achem
mais bonitas e cuidem (ainda) mais delas. No que se refere
ao afeto, as crianças certamente são “insaciáveis”.
Cabelos cacheados também são sinal de emocionalidade;
por isso, esse “sintoma” pode sinalizar sentimentos e evocar
emoções. Em outras crianças, enrolar os cabelos é sinal de
reflexividade sonhadora – nesse sentido, os cabelos são
usados como símbolo da liberdade de pensar e imergir nos
próprios mundos interiores.
 
Perguntas para os pais:

Achamos nosso filho atraente?

Por que ele quer nos “seduzir”?

Quando nos deixamos nos envolver (de bom
grado) por ele?
 
Medidas de apoio:

Emoções e desejo de liberdade: os pais poderiam
acolher essas pequenas indicações e ajudar os
filhos nesse sentido.

“Envolver e desenvolver”: os pais poderiam
elogiar o filho ou até estimular que enrolem os
cabelos, tornando-o, assim, uma divertida ação
de embelezamento.
15.8.2 Distúrbios comportamentais na adolescência
“Sou o máximo.”
 
É significativo o fato de que em uma tábua babilônica, com
pelo menos três mil anos, seja possível ler: “A juventude de
hoje é podre desde sua base, é má, sem Deus e preguiçosa.
Nunca será como a juventude anterior, e nunca será possível
preservar nossa cultura!” Há cerca de dois mil anos, um
sacerdote egípcio lamentava: “Nosso tempo encontra-se em
uma fase crítica. As crianças já não ouvem os pais. O fim do
mundo não está distante”. Lamentos semelhantes foram
deixados por quase todos os homens sábios de todas as
épocas, desde Hesíodo, passando por Sócrates, até chegar a
Goethe. Portanto, não é novo o problema de muitas vezes
não entendermos nossos filhos quando eles atingem certa
idade.
Os temas relativos ao início da puberdade, que se anuncia
com grande antecedência, serão tratados apenas
brevemente nesta seção, à medida que já afetam as
crianças (embora muito raramente) e lançam suas sombras
na infância. Os agrupamentos “políticos”, como o dos
espancadores de direita, não serão mencionados.
O cenário é amplo, subdivide-se em inúmeros grupos com
regras próprias, além de “ins e outs”, e não será considerado
aqui. Além dos grupos que mencionaremos nas páginas
seguintes, existem, por exemplo, tipos peculiares, como os
“metaleiros”, que não são sindicalistas nem metalúrgicos, e
sim um grupo que compartilha uma visão de mundo ou da
música dura como ferro. Ou ainda os hardcores, que também
têm pouco a ver com a core energy dos especialistas em
bioenergia, mas cujos membros, ainda que por pouco tempo,
recebem uma singular importância em sua busca pela
identidade.
Chama a atenção o fato de que a cultura jovem de hoje
pouco tem a ver com a cultura em sentido tradicional. Na
maioria das vezes, nem chega a ter uma identidade musical
própria, como os technos e os rappers têm a sua. Por toda
parte, títulos obsoletos são reinterpretados por cantores
cover – tal é a expressão para essa espécie de plágio – e os
velhos hits voltam a fazer sucesso com seus encanecidos
intérpretes. Como se não bastasse, também se veem
novamente tendências ultraconservadoras, cujos seguidores
querem chegar virgens ao matrimônio e se vestem como
seus avós.
Atualmente, os movimentos juvenis influenciam as
crianças cada vez mais cedo. Trata-se, sobretudo, de
distinguir-se dos pais, da família e, de modo geral, de tudo
que é tradicional para iniciar a busca da própria identidade,
que se mostra em uma roupa original ou no pertencimento a
determinados grupos. É chegado o momento de conhecer o
próprio corpo e a sexualidade e de aprender a sentir e a
esclarecer que tipo de mulher ou de homem se quer ser. Por
sua vez, isso traz os ídolos de volta à cena, hoje em dia
oferecidos em uma quantidade como nunca se viu. E quase
sempre são popstars ou atores. Ao serem perguntadas sobre
quais são seus ídolos, raras são as vezes em que as crianças
dão a mãe ou o pai como resposta. Obviamente, uma
criança não pode simplesmente escolher como ídolo uma
pessoa de quem quer e deve se desvincular. Quando as
crianças saem dessa fase de libertação, a situação pode,
então, mudar novamente.
Nesse momento, é preciso assumir as consequências e a
responsabilidade pelas próprias ações. Também é necessário
reconhecer os limites, pessoais e alheios, o que quase
obrigatoriamente leva a discussões e conflitos, pois, até
então, os pais pensavam que fossem os donos da casa. Este
é também o momento de sair dos mundos da fantasia e, por
conseguinte, entrar na realidade de um mundo moderno,
cheio de possibilidades e horrores. Trata-se, então, de
desenvolver e afirmar o próprio jeito de ser, mas também de
mergulhar em um mundo de sentimentos novos, como o do
primeiro amor, com todo o sofrimento que a ele pertence,
até chegar à dor universal e à descoberta de que a vida
também pode significar sofrimento. Os pais e diferentes
instituições passam a exigir mais a adaptação a condições
de vida preestabelecidas e um comportamento orientado
pela razão. O mundo da polaridade se abre com todos os
seus lados doces e amargos. Enquanto a nova liberdade
espera pelas “crianças”, ela só pode ser obtida pelo preço da
proteção. Por fim, o ingresso na sociedade meritocrática está
vinculado a regras bem precisas, tais como “quanto mais o
indivíduo se empenha, mais ele vive” ou “tempo é dinheiro”,
bem como a um pressentimento – assim se espera – de que
algo não está certo nesse estilo de vida. Mas são poucas as
chances de se descobrir o que e o porquê.
A mãe ou o pai que quiser compreender os problemas e os
distúrbios comportamentais dessa fase terá de inteirar-se da
respectiva cultura juvenil, pois muita coisa só poderá ser
entendida a partir dessa perspectiva. O pertencimento a
movimentos específicos determina em ampla medida se um
adolescente corre o risco de viciar-se em alguma droga ou
tem alguma tendência à violência. Obviamente, as crianças
chegam ao respectivo ambiente de acordo com sua
ressonância. Também a esse respeito valem as leis da
regularidade, e não o acaso – ou, como formulou certa vez
Anatole France: “Talvez o acaso seja o pseudônimo de Deus
quando Ele não quer assinar”.
Assim como os hippies escreveram paz e amor livre em
suas bandeiras e sonhavam colocar uma flor no cano de uma
arma, o que nunca foi consentido à maioria deles, hoje,
grupos muito diferenciados têm suas regras próprias.
Em todo caso, é preciso ser legal, de preferência,
superlegal, o que não é fácil diante de temas tão
importantes como a premente puberdade. Embalar o amor
ardente de modo frio é uma arte com a qual os pais ou os
avós de hoje normalmente não têm nenhuma experiência.
Porém, esse é o principal problema de seus “kids” em
crescimento.
O que é legal em determinado momento depende do
ambiente e é mensalmente “atualizado” nas
correspondentes revistas juvenis, com base em uma lista do
que é “in” e “out”. Embora esse fenômeno se adapte muito
bem à nossa época acelerada, quase não deixa tempo para
as crianças recuperarem o fôlego na tentativa de
permanecerem “legais”, uma vez que a opinião de um dia
torna-se um erro no dia seguinte. Se em seguida forem
dadas algumas indicações sobre tendências atuais, há que
se pensar em quão rapidamente elas poderão voltar a
mudar. Os pais que estiverem um pouco informados a
respeito têm mais chances de reconhecer se uma anomalia
comportamental é um problema individual de seu filho ou
fruto da coerção de um grupo. Assim, às vezes pode ser
mais fácil afastar o filho desse cenário – na pior das
hipóteses, até mesmo mudando de casa – do que tratar seu
distúrbio comportamental.
15.8.2.1 Ravers ou techno-kids
“Todos os dias uma love-parade.”
 
As techno-kids são conhecidas sobretudo por suas festas, as
raves, e normalmente abandonam o gênero já no final da
adolescência ou pouco depois dela. Como se tivessem
recebido a carga de uma bateria, adoram dançar um tipo de
música que por horas a fio toca sempre na mesma batida. O
ritmo da vida é estranho àquele tecnicamente responsável,
criado por computador.
Os frequentadores das raves intensificam essa carga de
bateria com ecstasy ou MDMA, a clássica droga das festas,
que também alimenta quimicamente as chamadas love-
parades com centenas de milhares de participantes. Devido
ao ecstasy, suas pupilas se dilatam e o quarto chakra
(anahata), centro do coração, responsável pelo amor, se
abre amplamente.
Os ravers são muito pacíficos e até amáveis,
especialmente quando se encontram nesse estado. Por
causa de sua droga, são criminalizados por uma sociedade
que ministra ritalina – uma anfetamina como a MDMA, já
comercializada nos pátios das escolas em substituição ao
ecstasy –, três vezes ao dia, a meninos ainda pequenos,
diagnosticados com TDAH. Os próprios pais, que engolem
antidepressivos de última geração, a fim de aumentar sua
taxa de serotonina – que também se eleva com a ingestão
de MDMA – têm tão pouca credibilidade quanto os pais fãs
de chocolate, que pretendem alcançar objetivo semelhante.
O ideal seria que todos, incluindo os adolescentes,
passassem a usar Aminas para abastecer seus reservatórios
de serotonina e melhorarem o humor tanto quanto a gestão
da vida lhes permitir. A busca pelo bem-estar e pelo amor é
comum a todos, e nela também reside a seguinte
possibilidade: em vez de julgar as manifestações a favor do
amor, talvez devêssemos nos esforçar mais, junto com elas,
para cultivar esse sentimento.
15.8.2.2 Os tecktoniks
“Sempre prontos, mesmo que sem velocidade.”
 
Esse movimento é o mais recente no grupo e acaba de sair
da França para inundar os locais de culto dessa festa. O
elemento comum é a dança de mesmo nome, a última moda
entre os adeptos, que lembram muito os technos, pois usam
roupas modernas e, como robôs, dançam no mesmo estilo,
girando os braços e balançando os joelhos flexíveis como
borracha, uma música eletrônica que dificilmente pode ser
compartilhada por quem não é adepto.
Ao contrário dos frequentadores das raves, recusam
rigorosamente todo tipo de droga e até mesmo o álcool;
apenas o Red Bull austríaco é permitido. Para eles, a vida é
uma festa, ainda que tenham apenas um tipo de dança. Não
se interessam pela formação de grupos nem de
comunidades. Têm todas as chances de se tornarem o
programa preferido da geração de pais, mas justamente isso
poderia acabar com seu movimento.
15.8.2.3 Os punks
“No future.”
 
Os punks são um fenômeno antigo, mas de modo algum
relegado ao passado. Surgiram já nos anos 1970 e, com sua
aparência chocante, estão sempre perambulando por praças
e ruas modernas e continuam sendo contra tudo.
Seu principal objetivo é chocar, razão pela qual
antigamente adotavam ratos como animais domésticos e se
estilizavam como eles. Com penteados pontiagudos ou
moicanos, casacos de couro preto com toda sorte de rebites
prateados, cintos também com rebites e, se possível,
algumas estrelas arrancadas de Mercedes-Benz, estão
sempre protestando contra todo tipo de regra.
São os clássicos outsiders, que também poderiam ser
descritos como anarquistas, se por tal não se entenderem os
anarquistas políticos à la Bakunin. Rejeitam tudo que reflete
a mentalidade pequeno-burguesa e, por isso, adoram chocar
as pessoas que pertencem a essa categoria, e estas são
todas aquelas que deles diferem. Para tanto, usam piercings
exagerados – muitas vezes com alfinetes de segurança – e
amplas tatuagens com escritas mordazes.
Com seu slogan “no future”, teriam boas chances de viver
o instante do aqui e agora. E, diga-se de passagem, já tive
punks muito simpáticos em meus seminários...
15.8.2.4 Os emos
“Delicados e tristes sonhadores.”
 
Os emos se afastaram das cenas punk e hardrock, trazendo
delas certa melancolia. De resto, gostam de se divertir
juntos, com delicadeza e enfatizando o lado emotivo, e de
celebrar em suas festas. Sem levar em conta seus cabelos
pretos e alisados, muitas vezes com mechas violeta, que
pendem de um lado do rosto, fazendo-os parecer seres de
um olho só, e suas roupas ultracoloridas, poderíamos ver
neles quase os herdeiros dos hippies. Também gostam de se
autonomear “filhos do amor”, defendendo abertamente seus
sentimentos. Para eles, que são sonhadores e emotivos, até
mesmo as diferenças entre os sexos se confundem. Sua
música é sentimental quase excessiva, e eles se dirigem uns
aos outros de maneira suave e muito sentimental.
Para esses jovens, os perigos vêm da postura melancólica
em relação à vida, que pode chegar à depressão e a
tendências autoagressivas, como a escarificação. Por trás
disso pode estar o desejo de se sentir mais ou simplesmente
sentir alguma coisa.
15.8.2.5 Góticos
“Dark is beautiful.”
 
Entre os góticos, que se originaram na Inglaterra, também se
reúnem os gruftis, que se interessam prematuramente pela
cultura dos túmulos, e os darks. Todos têm predileção pelo
que é escuro, preto e místico. Tristes e introvertidos, com
rostos pintados de cinza-pálido a branco, crânios muitas
vezes tosados assimetricamente, com algumas mechas
pretas, buscam a verdadeira identidade.
Outsiders como os punks, não querem de modo algum
participar dessa sociedade e preferem ocupar-se de temas
que, certamente, seguem sua ressonância, como a morte e o
medo, as visões de horror e os pesadelos, buscando esses
temas também em sua música.
15.8.2.6 Os hip-hoppers
“Underdogs entre si.”
 
Ouvem rap, dançam breakdance, usam roupas esportivas da
moda e compartilham uma linguagem extremamente dura e
brutal, que os conota como underdogs e gheto-kids. De fato,
o movimento é originário dos guetos norte-americanos e,
para muitos negros da época, representou uma possibilidade
de ascensão.
No cenário sobressai o comportamento empolado e de
macho, no caso dos rapazes, e o bitch-look, no caso das
moças. Já gostariam de ser alguém, andam de pernas
abertas ou como bruxas. Entre eles predomina a atmosfera
de gangue, que conhece e persegue os inimigos,
empregando desde o mobbing até coisas piores, e que
também é uma atmosfera de gangue de gângsteres,
caracterizada por uma solidariedade de macho. Embora
estejam totalmente distantes de toda forma de consciência,
a maioria deles é muito boa nos esportes.
15.8.2.7 Piercing
“Eu me embelezo (me enfeio) para vocês.”
 
Esse ato demonstrativo de autolesão, que supostamente é
considerado um embelezamento e, de fato, assim é sentido
nos respectivos círculos juvenis e em outras culturas, é
quase tão antigo quanto a humanidade. Conhecemos o
piercing desde os povos arcaicos, alguns dos quais o usam
até hoje. No mundo moderno, a influência determinante é
novamente exercida pelo peergroup, dentro do qual o
indivíduo quer se sobressair e mostrar autolesões, se
possível, heroicas. Portanto, se muito antes da adolescência
as crianças já querem impressionar usando piercings, isso
seria um sinal de que desejam mais atenção, que querem
exprimir justamente desse modo. Além disso, trata-se,
sobretudo, de provocar os pais na pré-puberdade.
Do ponto de vista médico, tudo depõe contra essa forma
de autorrepresentação e automutilação marcial, que reduz
claramente as forças imunitárias; por outro lado, na maioria
das vezes os jovens ainda contam com um sistema
imunológico surpreendentemente bom e têm outras
preocupações. Estas são atributo, sobretudo, de
contemporâneos mais velhos, cuja situação imunitária
normalmente deixa muito a desejar, devido a uma vida, na
melhor das hipóteses, mal-humorada e, na pior, postergada.
Como “provocação típica da puberdade”, realmente existem
coisas piores do que o piercing; afinal, um pouco de metal no
lugar inadequado é certamente menos inofensivo do que
uma agulha contínua na veia...
Nesse sentido, para nós era relativamente fácil. Quando
entramos na puberdade, acabava de iniciar-se a época
hippie, e nossos penteados ridiculamente inofensivos,
quando vistos em retrospectiva, já eram suficientes para
desencadear uma tempestade em âmbito doméstico. Os
jovens de hoje, que sentem necessidade de provocar os pais,
têm uma dificuldade incomparavelmente maior pela frente.
É claro que, com o chamado “penteado estilo Beatles” de
antigamente, já não se consegue nada, mas mesmo a
cabeça toda raspada ou o corte moicano tingido de verde-
veneno também já não causam horror há muito tempo.
No entanto, a adaptação e um comportamento “pequeno-
burguês”, de acordo com uma visão pós-1968, podem servir
aos jovens como mecanismo de distinção. A esse respeito,
certa vez minha sobrinha, em plena adolescência, gritou ao
pai, que toca guitarra elétrica, é um artista informático
extraordinário, usa roupas da moda, cabelos longos e
brilhante na orelha: “Você não podia se comportar como um
pai normal?”
Na adolescência, os jovens sentem a necessidade de se
distinguir e, para tanto, também provocar. Pais
compreensivos não se esquecem disso e vão ao encontro
dos filhos. Já se irritam com muita antecipação,
transformando um tema menos importante em uma espécie
de drama, assim os filhos não precisam ir muito longe. Quem
já se exasperou por causa de cabelos tingidos pode
facilmente ceder sobre esse tema, a fim de permanecer
coerente no que se refere ao piercing.
15.8.2.8 Escarificações
“Eu me machuco para machucar vocês.” – “Quero me
sentir.”
 
Muitas crianças (em idade escolar) causam a si mesmas
feridas doloridas, escoriando profundamente a pele até ela
sangrar. Às vezes, servem-se de pequenas feridas já
existentes, de espinhas ou picadas de mosquito e as
ampliam até transformá-las em crateras dramáticas.
Quem se fere excessivamente quer obter alguma coisa
com isso. Trata-se, sem dúvida, de um ato de autoagressão,
e é evidente a suspeita de que são predispostas as crianças
que têm pouca percepção de si mesmas em sua vida normal
e que querem provocar os pais, exortando-os a cuidar mais
delas. Muitas vezes, esse pedido de socorro é motivado por
uma responsabilidade que elas sentem subjetivamente como
muito elevada dentro da família, ou então pelo sofrimento
causado por uma distância interior em relação a si próprias
ou aos pais.
Provavelmente, pais excessivamente preocupados dão
todo apoio ao filho e tentam abrir-lhe todas as portas. Porém,
a criança constata que não é capaz de cumprir todas as altas
expectativas e, por isso, se pune com a intenção de causar,
elas próprias no lugar dos pais, a dor por seu fracasso.
Obviamente, por um lado, os pais vão querer fazer
curativos; por outro, vão querer evitar as escarificações.
Todavia, o primeiro gesto é recusado pelos “pestinhas” e,
quanto ao segundo, eles terão de se esforçar
adequadamente. Um curativo externo para a mão é pouco
demais; as crianças precisam, antes, de um curativo muito
afetuoso para a alma.
Normalmente, os pais reagem aterrorizados a esses
sintomas, e as cicatrizes resultantes são penosas e até
insuportáveis para eles. Um exemplo representativo é
oferecido pelo filme cult Ensina-me a Viver, em que o
personagem Harold simula constantemente o suicídio para
chamar a atenção, pois certa vez obteve uma reação
emotiva de sua mãe, geralmente neurótica, pois ela achou
que seu filho houvesse realmente morrido em um acidente
químico na escola. Todavia, o efeito dos suicídios simulados
por Harold logo se esgota, provocando na mãe apenas
reações de aversão e irritação.
 
Perguntas para os pais:

Por que nosso filho não consegue perceber a si
mesmo?

Em que circunstâncias não recebe atenção
suficiente? E de que tipo de atenção precisa no
momento: reconhecimento, emoções, desafio
intelectual, etc.?

De que modo recebe provavelmente atenção em
demasia e vive expectativa muito elevada que
não é capaz de cumprir?

Como podemos encorajá-lo a perceber a si
mesmo e a manifestar-se?

Por que ele provoca de maneira tão intensa?

Que desafio seria oportuno?

Que desafios existiriam para nós, a fim de livrar
nosso filho dessa tarefa?
 
Medidas de apoio:

Desviar a agressividade de maneira pertinente:
as escarificações deveriam ser interpretadas
como uma solicitação direta para mostrar ao
próprio filho alternativas mais construtivas e
menos perigosas de extravasar sua
agressividade e, de modo geral, sua energia;
para ocupar-se dele com mais coragem e
estímulo, a fim de que ele se sinta compreendido
e consiga perceber a si mesmo.

Levar o problema a sério: em caso de
escarificações no sentido de provocações típicas
da puberdade ou do período anterior a ela, seria
importante, pelo menos, dissimular a relativa
reação de horror, pois, do contrário, os jovens se
sentirão encorajados a praticá-las cada vez mais.

“Estimular em vez de escarificar”: provoque seu
filho com desafios reais. Quem enfrenta os
próprios limites em viagens emocionantes,
precisa dos músculos e da pele intactos. Quem
precisa defender a própria pele em situações
exaustivamente competitivas, como no esporte,
e vez por outra leva um chute no futebol, um
soco no handebol ou no boxe ou um golpe no
hóquei no gelo estará menos predisposto a se
ferir voluntariamente. Quando as feridas são
causadas pelos outros, a criança fará de tudo
para evitá-las e responderá na mesma moeda à
menor tentativa de ferimento. As crianças
esportistas conseguem entrever com muito mais
facilidade o erro que se esconde por trás dos
atos autoagressivos. De resto, a frase “você se
cortou” já é um sinônimo para “você se
enganou”.
16 Temas especiais

16.1 Autismo
“Estou pouco me lixando para vocês...” – “Não quero ter
nada a ver com nada nem com ninguém.”
 
Do ponto de vista da medicina acadêmica, as causas do
número crescente de casos de autismo permanecem no
escuro. Entretanto, existem grupos de especialistas – por
exemplo, os epidemiologistas – indicam uma conexão
temporal entre o aparecimento maciço de autismo e a
vacinação extensa contra a coqueluche nos Estados Unidos.
Todavia, ninguém ainda ousou estabelecer uma conclusão
sobre essa relação causal, embora a correlação seja
ostensiva – razão suficiente para sermos mais cautelosos
com esta e, de preferência, com todas as vacinas.
Provavelmente, é correta a opinião de muitos homeopatas,
que partem do princípio de que as vacinas tornam a vida das
crianças desnecessariamente difícil. Talvez o organismo em
crescimento perceba as vacinas como um ataque à sua
incolumidade e às suas possibilidades de desenvolvimento,
como se lhe estivéssemos impondo uma hipoteca mais
pesada do que no momento podemos imaginar.
Em todo caso, Edward Jenner, descobridor da vacina
contra a varíola, reconheceu em seu leito de morte que
havia criado um monstro com sua descoberta. À sua própria
mulher, a vacina causara o nascimento de um filho morto,
coberto pelas cicatrizes da doença, e seu outro filho, após a
vacina, passou a vida no estágio mental de uma criança de 1
ano e morreu aos 21.
Como poucos outros quadros clínicos, o autismo é
adequado para nos ensinar o temor e o estupor ao mesmo
tempo. O total fechamento em relação ao mundo exterior,
tal como apresentado no impressionante filme O Enigma das
Cartas ou em Rainman, sucesso mundial de Hollywood, nos
deixa sem palavras. As pessoas afetadas vivem quase
inteiramente em seu próprio mundo interior. De certo modo,
buscam asilo no interior, enquanto o asilo externo para sua
proteção é apenas a resposta de uma sociedade incapaz de
ajudá-las e que, no fundo, mal suporta quando alguém lhe
vira as costas.
Por outro lado, os autistas nos espantam quando, com
extrema facilidade, fazem malabarismos dignos de virtuoses
no jardim do mundo dos números pitagóricos. O filme
Rainman nos mostra de maneira surpreendente um autista
quebrando a banca de um cassino com toda a tranquilidade,
pois conseguiu memorizar todas as cartas do jogo. Uma
caixa de fósforos, caída por acaso no chão, permite que ele
calcule na hora o número de palitos nela contida. Assim são
os autistas – do ponto de vista da sociedade – fracassados
no geral, mas, não raro, gênios nos pequenos nichos de seus
próprios mundos de números, formas ou também música.
Nesse sentido, não é de admirar quando as modernas
abordagens terapêuticas às vezes conseguem, por meio do
computador, restabelecer um nível de comunicação com
eles. Ainda não sabemos se é o mundo digital da magia
numérica nos PCs a instaurar uma ponte entre os autistas e
o nosso mundo ou a possibilidade de decompor regras e
palavras em letras individuais, para depois, ao contrário,
recompô-las.
Do ponto de vista da medicina acadêmica, nem chegam a
existir hipóteses de trabalho convincentes em relação ao
autismo. As poucas abordagens acadêmicas,
desconsiderando-se a que usa o computador, percorrem as
vias de comunicação alternativas, seguidas pelos pais ou por
terapeutas. Um exemplo bastante comovente a esse
respeito é dado pelo já mencionado filme O Enigma das
Cartas, em que a mãe consegue encontrar e abrir a porta
que dá acesso ao seu filho através de brincadeiras
fantasiosas concretas e insolitamente simbólicas.
Uma forma mais branda do mutismo pode indicar um
possível acesso. Nesse caso, trata-se, por assim dizer, de um
autismo reelaborado, que se refere, por exemplo, a uma
pessoa específica. A criança emudece em razão de
problemas psicológicos em relação a uma única pessoa ou a
um grupo. Essa recusa em falar pode ser facilmente
confundida com o autismo. Nesse caso, talvez ocorra o
mesmo que se dá com a depressão endógena, que por muito
tempo não recebeu explicação, até que alguns
pesquisadores sensíveis conseguiram encontrá-la.
16.1.1 Conhecendo outros mundos

Há alguns anos, tratei do caso de uma menina que recebera


do psiquiatra da escola o diagnóstico de autismo.
Extraordinariamente delicada e sensível, no passado a
menina já havia falado, mas aos poucos foi emudecendo
cada vez mais. No momento da terapia, fazia mais de um
ano que já não falava e se fechara em completo isolamento.
Desde o início, ficou evidente que ela, ao contrário de outras
crianças autistas, era atenta e participativa.
Começamos a psicoterapia com uma introdução normal no
mundo das imagens da alma, em que eu simplesmente
ignorava sua ausência de respostas. Com o auxílio de um
medidor de resistência cutânea, que, na época, já fazia parte
da rotina entre nós, consegui ver claramente que ela reagia
às histórias que eu lhe contava, embora não participasse
com nenhuma palavra. Depois de algumas sessões
terapêuticas unilaterais, fiquei cada vez mais convencido de
que ela se comunicava comigo através da sua pele; assim,
comecei a levar em conta suas reações. Por meio da
medição de resistência cutânea, elas revelavam
manifestamente que a menina respondia melhor a histórias
sobre a natureza e a contos de fadas e, melhor ainda, a uma
mistura de ambos. Era evidente que ela gostava do mundo
dos elfos e fadas e adorava gnomos e anões.
Por fim, chegamos a um ponto em que foi possível verificar
que a menina se manifestava como se viesse de outro
mundo. Hesitante e um pouco descrente, deixou-se levar
pelas viagens de descoberta no mundo das imagens da alma
e confirmou sua presença, inicialmente com um gesto de
cabeça e depois com um primeiro “sim”. Aparentemente, ela
acreditava que eu pudesse perceber todos os seres dos
contos de fadas e da natureza animada. Ela própria, ao que
parecia, conseguia ver realmente todas as figuras e as
diferentes energias sutis.
Este era exatamente o ponto em que a menina havia
deixado o mundo da comunicação. Ela tinha um acesso tão
natural aos seres do outro mundo que não conseguia
distinguir entre eles e aquilo que as outras pessoas
percebiam, sobretudo os adultos. Como pessoas menos
sensíveis sempre riram de suas percepções, ela se tornou
insegura e preferiu interromper todo tipo de comunicação
para não se expor constantemente ao escárnio e às
respectivas lições. Mesmo pessoas amáveis, como seus pais,
reagiram gradualmente com rejeição às suas percepções a
anjos e seres da natureza.
A tarefa terapêutica consistiu essencialmente em ensinar-
lhe o que as outras pessoas eram capazes de ver e o que era
visível apenas para ela. O reconhecimento de que eu mesmo
não era capaz de enxergar todos os seres que lhe narrava,
pois os conhecia apenas de ter ouvido falar, significou para
ela uma profunda crise. A habilidade consistia em esclarecer-
lhe que ela tinha uma percepção maior e melhor do que a
maioria das outras pessoas e que essa capacidade era bela e
preciosa. Para poder viver pacificamente e sem ser
incomodada, ela precisava aprender a distinguir o que podia
esperar do ambiente circunstante e o que era melhor que
guardasse para si.
Ela se tornou uma menina totalmente normal com um
pequeno segredo. Voltamos a nos ver mais tarde, no início
de sua puberdade, quando a irrupção em sua vida do mundo
das energias sutis provocou nela uma espécie de recaída,
que a perturbou consideravelmente.
Não se sabe quantas dessas crianças tão particularmente
dotadas acabam às margens da sociedade após diagnósticos
psiquiátricos. Não saltaria de imediato aos olhos de todos o
fato de o autismo ser uma forma de o indivíduo retirar-se de
nosso mundo? Haveria por trás dele razões que pudessem
ser compreendidas com a devida sensibilidade? Minha
experiência com a pequena e hipersensível paciente ou a
história do filme O Enigma das Cartas falam a favor dessa
hipótese.
Em todo caso, enquanto não soubermos o que se esconde
por trás do autismo, devemos levar todas as possibilidades
em consideração. Provavelmente, o número crescente de
casos de autismo, bem como o fenômeno da morte súbita
em crianças, representa um desvio da humanidade atual,
que simplesmente não satisfaz as necessidades das crianças
afetadas. Em favor da tese de que o mundo moderno já não
é adequado às crianças, haveria mais de um argumento. O
mundo está se tornando cada vez menos adequado até
mesmo para os seres humanos em geral e cada vez mais
apropriado para a indústria ou para grandes grupos
industriais. Não estariam as crianças que se retiram
radicalmente dele querendo sinalizar e indicar que tudo isso
está ocorrendo da maneira errada, a ponto de preferirem se
abstrair e retirar-se para seu mundo interior?
No caso do autismo, a linguagem da alma infantil não pode
ser ignorada. Por certo, trata-se não de um grito, mas de um
retraimento extremamente silencioso ou de uma recusa de
entrar no mundo e na miséria que (lhes) preparamos.
As agressões consideráveis surgem, sobretudo, quando se
tenta penetrar no cosmos dessas crianças ou arrancá-las de
seu modo de percepção. Evidentemente, disso se defendem
com todos os meios disponíveis. Não querem ter (quase)
nenhuma relação conosco nem com nosso mundo.
Deveríamos nos perguntar qual a razão para isso. Assim,
constataríamos, mais uma vez, que tipo de ambiente
oferecemos, ou melhor, impomos a elas e a nós mesmos.
Essa conclusão pode ser dura, mas, no mundo da alma,
durante três décadas de psicoterapia dos quadros clínicos,
tivemos de viver muitos mistérios e aspectos dificilmente
explicáveis. Uma criança que, tal como o tocador de tambor
da obra de Günter Grass, para de crescer porque não quer se
tornar adulta é totalmente concebível. Quem consegue até
mesmo deter o próprio crescimento físico terá ainda menos
problemas para fazer o mesmo em relação à comunicação.
O mundo da alma não é absolutamente lógico, e sim
bastante psico-lógico e, portanto, em última análise, ana-
lógico.
E é óbvio que existem pessoas e, por conseguinte,
crianças que encontram muita dificuldade com a missão da
encarnação. Ao que parece, trazem consigo essa hipoteca
para a Terra. Por fim, “o mundo” nunca é culpado, mas
apenas uma superfície refletora, e as projeções que nela
incidem nunca ajudam a crescer.
16.1.2 Possibilidades e limites da terapia do abraço para autistas

Durante décadas, Jirina Prekop estudou bebês, crianças e


jovens autistas e desenvolveu programas terapêuticos para
eles. Por muito tempo, ela também presenciou a divergência
entre cientistas no mundo todo a respeito das causas desse
misterioso distúrbio no desenvolvimento da personalidade e
a consequente dificuldade para adotar terapias adequadas.
Entre as muitas causas possíveis deste quadro clínico devem
ser nomeadas aqui pelo menos duas. Muitos antroposofistas
estão convencidos de que se trata de uma reencarnação
malsucedida, e, após a descoberta dos já mencionados
neurônios-espelho, Joachim Bauer, pesquisador do cérebro,
pressupõe que o distúrbio autista teria como fundamento
uma limitação funcional dos diversos sistemas de neurônios-
espelho. Contudo, não estaria claro se se trata de uma
disfunção primária no âmbito da configuração biológica de
base ou se as crianças autistas teriam menos ocasiões para
realizarem uma comunicação mútua e reflexiva. Talvez
ambas as coisas desempenhem um papel. Jirina Prekop parte
do princípio de que há grande probabilidade de ambas as
teses mencionadas – da reencarnação malsucedida e da
disfunção dos neurônios-espelho – estarem relacionadas.
Também é provável que o autismo seja provocado por
outros distúrbios de percepção. Em todo caso, há um
denominador comum no mesmo sintoma cardinal: os
autistas têm pelas coisas inanimadas uma ligação quase
viciosa, com uma veemência geralmente estimulada por eles
próprios, enquanto limitam sua ligação com a mãe e outras
pessoas a um mínimo ou até mesmo totalmente. Com base
nessa constatação, Martha Welch desenvolveu nos Estados
Unidos a holding therapy (terapia do abraço). Do ponto de
vista científico, essa terapia foi criada por Niko Tinbergen,
que recebeu o prêmio Nobel por sua teoria dos instintos. Ele
reconheceu o holding (segurar) como a terapia mais
instintiva para os distúrbios na ligação entre mãe e filho e
encorajou Jirina Prekop a adotar essa forma de terapia criada
por Welch e a desenvolvê-la ulteriormente também para
outras indicações em combinação com seu conceito
terapêutico.
Inicialmente, porém, ela reuniu inúmeras experiências
junto aos autistas. Atualmente, sustenta que não é possível
prever o prognóstico no início da terapia do abraço, quando
praticada por um longo período e em combinação com
outras terapias. Por isso, não se devem dar aos pais falsas
esperanças de uma cura completa. Entretanto, pode-se
garantir a eles, com a consciência tranquila, que, com a
terapia do abraço, a criança experimenta uma ligação
sustentável com seus semelhantes e conhece, assim, a
alegria do amor trocado entre os seres humanos, tornando-
se curiosa e aberta para aprender modelos e formas de
comunicação. No entanto, em que medida sua inteligência
pode se modificar depende do envolvimento ou do não
envolvimento do cérebro. Crianças com diagnóstico de
“autismo segundo Asperger” (médico vienense Hans
Asperger), ou seja, com claras indicações de boa
inteligência, em geral de tipo masculino, com uma forma
linear de pensar e capacidade linguística, costumam voltar
ao estado normal (quanto menor for a criança, maior é a
chance). Contudo, distúrbios cerebrais como a anomalia
linguística denominada “afasia” ou a apraxia, que é a
incapacidade de execução prática, não são melhorados com
a terapia do abraço.
 
Perguntas para os pais:

Durante a gravidez, houve alguma situação (de
susto ou choque), em que a alma poderia ter
decidido deixar de se envolver com esta vida?
Podemos esclarecer essa situação no lugar do
nosso filho?

Como podemos lidar com a sensibilidade
introvertida do nosso filho e ajudá-lo a sentir-se
seguro?

Como podemos nos comunicar com nosso filho?

Como podemos entrar em contato com seu
mundo?

Quais necessidades do nosso filho não
reconhecemos?

Como é nossa capacidade de nos retirarmos?
 
Medidas de apoio:

A mencionada terapia do abraço segundo Jirina
Prekop (ver também “19.2.1 Bibliografia”).

16.2 Síndrome de Down ou deficiência mental como


oportunidade?
“Sou tão diferente – vocês me amam mesmo assim?”
 
“Acontece o que você quer ou coisa melhor”, diz um ditado
oriental. As crianças são um presente de Deus, dizemos nós
no Ocidente. A trissomia 21 ou Síndrome de Down é um
teste para esta e outras sabedorias da vida. Quem recebe
um presente sabe que não pode recusá-lo, modificá-lo ou
vinculá-lo a determinadas condições, pois “a cavalo dado
não se olham os dentes”. Segundo a opinião comum, os
presentes devem simplesmente ser aceitos, mesmo que não
correspondam ao gosto do presenteado. No caso das
crianças deficientes, é evidente a particular dificuldade em
aceitá-las, tal como são, como presentes de Deus, embora
elas se tornem verdadeiras dádivas quando são aceitas.
Será que justamente com um presente de Deus a
aceitação deveria ser diferente do que com os presentes
profanos da vida cotidiana? Como membros de uma
sociedade que, de modo geral, se encontra em pé de guerra
com todo tipo de deficiência, tentamos melhorar e modificar
as crianças deficientes com o objetivo de torná-las o mais
“normal” possível. Em nenhum outro caso, a tentativa de
“melhorar” sua condição é tão marcada e a insatisfação com
o destino é tão grande, especialmente nos tempos
modernos, em que a deficiência já pode ser detectada no
ventre materno.
Até mesmo pessoas que defendem uma filosofia que
confere elevada importância ao ato de aceitar e de deixar
que as coisas aconteçam, no sentido cristão do “seja feita a
Vossa vontade”, reagem quase automaticamente com
rejeição diante da chegada de uma criança deficiente.
Mesmo quem, por razões religiosas, é contra o aborto e
levam a gravidez até o fim, geralmente procede segundo o
lema: “Se é para ter um filho com Down, então tentaremos
de tudo para dar a ele (e a nós mesmos) a vida mais normal
possível”.
Esse desejo é compreensível se pensarmos como as
crianças com Síndrome de Down são dependentes dos pais
do ponto de vista emocional, financeiro e quase em todos os
outros aspectos durante toda a vida. Portanto, os pais se
veem em uma situação anômala e contraditória de não
quererem morrer antes do filho, a fim de não expô-lo à
arbitrariedade alheia, mas, obviamente, também não
querem perdê-lo antes – o pesadelo de todos os pais. Por um
lado, motivar a criança a ter uma vida “normal” significa a
esperança de dar-lhe uma vida, se possível, amplamente
determinada por ela própria e, por outro, eventualmente
também representa um modo de enfrentar o desamparo e
tirar força desse medo. Algumas crianças reagem de bom
grado a essa iniciativa; outras opõem resistência. Em todo
caso, existe o perigo de exprimirem incompreensão e
resistência a essa tarefa especial de vida.
16.2.1 Naomi

Quando começamos a tratar Naomi – que teve a Síndrome


de Down diagnosticada antes do nascimento – com as
tentativas de estímulo precoce, logo percebemos que ela
não participava dessa linha de tratamento. Ao contrário,
recusou desde o início e com decisão quase toda medida de
estímulo precoce. Ao boicotar nossos esforços, aos poucos
ela nos levou de volta para aquele estágio que, de todo
modo, correspondia à nossa visão de mundo e, assim, nos
ensinou uma dimensão completamente diferente da tarefa
que essa deficiência representa.
Embora fosse um ser extremamente pacífico, que quase
nunca chorava nem gritava, ela não deixou dúvidas quanto à
sua rejeição à maioria dos terapeutas (homens e mulheres)
e, de maneira geral, a todos aqueles que se aproximassem
dela com intenções pedagógicas. Já quando bebê, ao entrar
na casa da fisioterapeuta ela fez um escândalo tão grande,
nada típico dela, que fomos obrigados a adiar o tratamento,
até que renunciamos definitivamente a ele. No início,
achamos que pudesse depender da fisioterapeuta ou de seu
método, até que Naomi nos indicou muito claramente que se
tratava de uma questão fundamental, que incluía todos os
terapeutas e todos os métodos. Até hoje, a única exceção
são pessoas que lhe parecem extremamente simpáticas.
Nesses casos, ela tolera, por assim dizer, sua condição de
terapeutas e participa do jogo, mas somente até o momento
em que isso não possa ser entendido como uma aceitação
da terapia e seu início. Durante anos, Naomi prestou atenção
para que, na presença do logopedista de que ela gosta
tanto, não deixasse de pronunciar, nem mesmo
casualmente, as poucas palavras que consegue dizer. Por
outro lado, porém, gostava de tomar chá com ele e
participava com ele “do jogo”, no sentido de contribuir com
benevolência aos seus pedidos.
Havia anos, nutríamos a ideia de uma musicoterapia ou
ritmoterapia, pois desde cedo Naomi mostrou uma
predileção pela dança e pelo canto. Convidamos uma
terapeuta do ritmo a viajar conosco para a África, a terra dos
tambores, a um lugar que Naomi adora, para começarmos a
“trabalhar” com ela. Isso aconteceu em uma fase ingênua,
em que ainda não sabíamos que ela não pensava em
“trabalhar” e menos ainda em sua normalização. Ela não
deu a menor atenção à simpática professora de tambor
durante as horas a ela dedicadas, mas achou muito divertido
cantar e tocar tambor conosco à noite. Quando era
pessoalmente envolvida nas intenções terapêuticas – a
terapeuta era bastante flexível para ensinar-lhe também à
noite – tudo terminava de repente. Por fim, acabamos
desistindo para não tirar dela o prazer pela música, e
passamos as férias todos juntos. A partir desse momento,
Naomi já não rejeitava a terapeuta de música. Tampouco se
recusou a ser o centro das atenções; muito pelo contrário. Só
não queria aceitar nenhuma forma terapêutica e
pedagógica.
Sua sinceridade sem compromisso e, às vezes, sua
franqueza comprometedora são sua “marca registrada”.
Desse modo, certa vez, ao diretor de uma grande editora
que se havia acomodado em nosso sofá depois de uma
longa viagem, Naomi lhe entregou seu casaco, com
inequívoca atitude provocatória. Ela sabe muito bem quem
ou o que não quer.
Como nós, seus pais, somos ambos terapeutas e estamos
familiarizados com muitas possibilidades também em
campos alternativos, muitas teriam sido as ocasiões em que
gostaríamos de ter melhorado, aliviado e desenvolvido sua
situação, ou seja qual for o nome que os terapeutas dão a
isso. Entretanto, nada dava certo com ela. Os melhores
especialistas em terapia craniossacral, reflexologia plantar e
corifeus universitários da Síndrome de Down não faziam
nenhum progresso com Naomi.
A situação chegou a tal ponto que também afetou sua
visão: Naomi mostrou interesse por seus óculos, feitos com a
mais leve armação de titânio e as melhores lentes, apenas
algumas poucas vezes, embora, na minha opinião de
médico, com seus menos quatro graus de dioptria, ela não
pudesse ficar sem eles. Ao tomar conhecimento, com
surpresa, de um mundo maior e repentinamente mais nítido,
ela preferiu voltar, decididamente, a seu mundo menor,
suave e, com certeza, ligeiramente nebuloso. Portanto, até
para usar os óculos, Naomi precisava, por assim dizer, ser
“violentada”. Não obstante, nem tudo que é novo ela rejeita.
Permite que lhe escovem os dentes, o que ela nem percebe,
mas não despende energia para impedir que o façam.
Por um período, e já muito precocemente, ela frequentou o
jardim de infância normal, depois de ter boicotado com rigor
todas as tentativas anteriores de inseri-la em grupos de
crianças com Down. Chegamos a hospedar um grupo delas
em nossa casa, supondo que talvez fosse o ambiente
estranho a perturbá-la. Isso fez com que Naomi fugisse
imediatamente para o andar de cima da casa e se
escondesse embaixo de um tapete. Quando as outras
crianças foram embora com seus pais, ela se mostrou
claramente aliviada e feliz. Em pouco tempo, conseguimos
que ela respondesse às nossas perguntas. Quando concorda
com alguma coisa, sussurra “sim”; quando discorda, põe a
mão na frente dos olhos. Ao lhe perguntarmos se as outras
crianças deveriam voltar, ela manteve os olhos fechados por
um longo tempo.
O período no jardim de infância terminou repentinamente,
depois de um ano. Com a chegada de um menino malcriado
e barulhento, que zombava dela e era rude com ela, Naomi
nos fez entender claramente que já não queria ir à escola.
Nem nós nem a gentil e esforçada professora conseguimos
mudar a situação. Quando toma uma decisão, Naomi é
persistente. Obviamente, uma questão pedagógica tão
fundamental poderia ter exigido firmeza e a insistência em
arrastá-la para a escola todos os dias, contra a sua vontade.
Foi o que fizemos por um breve período, e até hoje nos
arrependemos por isso. Naomi sofreu, não cedeu em sua
rejeição e ficou visivelmente aliviada quando
compreendemos a situação e lhe poupamos mais angústia.
Nesse meio-tempo, vivemos há 16 anos com Naomi e, a
seu modo, ela nos ensinou muita coisa. Inversamente, a vida
conosco também não passou sem deixar rastros. Aos 4 anos,
contrariamente a nossas expectativas, ela deixou
repentinamente de tomar leite materno. Como nasceu muito
fraca, devido a um grave problema cardíaco, só conseguiu
começar a mamar após os primeiros três meses de vida. Ao
longo dos primeiros 4 anos, minha esposa recebeu todos os
tipos de conselhos bem-intencionados, que chegaram a
deixá-la com sentimento de culpa em relação à longa
duração do aleitamento. Se não soubéssemos que para
muitos povos arcaicos o aleitamento longo é considerado
natural e bom, certamente ela teria perdido a coragem. O
resultado foi que Naomi, graças à longa e empenhada
sucção do leite, bem como à brincadeira de soprar bolhas de
sabão, que ela praticou em excesso, nunca teve o problema
típico das crianças com Down, que é ficar com a boca
sempre aberta. Especialistas médicos, que rejeitam
rigorosamente o aleitamento por muito tempo, haviam nos
aconselhado placas palatinas e outras bugigangas
semelhantes para obtermos o mesmo resultado. Além disso,
Naomi sempre se resfriou muito menos do que as outras
crianças, inclusive as normais – certamente devido à boa
imunização garantida pelo aleitamento longo. Sabemos que
a medicina acadêmica tem opiniões diferentes a respeito,
mas pudemos fazer nossas experiências, que
compartilhamos com milhões de pessoas de povos
supostamente primitivos.
Talvez a experiência e o ensinamento mais importantes
que tivemos com Naomi tenham sido o seguinte: muitas
coisas acontecem quando o tempo está maduro para que
elas aconteçam, o que frequentemente pode significar mais
tarde ou muito tarde. A segunda lição é que não faz sentido
compará-la com crianças normais ou com outras crianças
portadoras de Down. A ambição que se difunde entre muitas
mães nos bancos dos parquinhos poderia, a longo prazo,
prejudicar consideravelmente seus filhos; no que se refere a
crianças com Down e a seus pais isso chega a parecer
terrível a posteriori.
Pouco antes de seu oitavo aniversário, Naomi, que era
observada com desconfiança por nossos amigos pedagogos,
deixou quase repentinamente de usar fraldas – para a
consequente e leve emoção de uma mãe amiga. Mesmo já
tendo produzido uma montanha de fraldas, esse sucesso e
esse progresso obtidos por ela foram para nós muito mais
valiosos do que qualquer resultado obtido à custa de intenso
e insistente treinamento.
Especialmente importante nos pareceu o fato de que
Naomi – segundo a observação feita pela única terapeuta
que lhe restara – não tem nenhum distúrbio comportamental
como muitas daquelas crianças com Down que são
submetidas a um treinamento que visa inseri-las na
normalidade (como falar e livrar-se logo das fraldas). A Bíblia
ensina que tudo tem seu tempo, e Naomi nos mostra isso
enfaticamente. Ela tem seu próprio tempo para realizar cada
coisa e o toma quando o concedemos a ela.
Segundo a típica mentalidade alemã, ela deveria há
tempos frequentar uma escola especial. No entanto, para
ela, encontrar-se em um ambiente com outras crianças com
Down é um horror, conforme demonstraram algumas
tentativas. Graças a Deus, encontramos compreensão junto
a um conselheiro escolar menos rígido, que, depois de ter
ouvido toda a sua história, chegou à conclusão de que Naomi
não era obrigada a frequentar a escola, mas tinha o direito
de fazer isso. Inicialmente, para seu grande prazer, Naomi
não quis usufruir desse direito.
Se não existem duas crianças iguais, por que então todas
as crianças portadoras da Síndrome de Down devem ser
igualadas? Elas têm em comum uma alteração no
cromossomo 21, no sentido de uma parte adicional; os
outros seres humanos – supostamente normais – têm todos
os 46 cromossomos em comum e não se assemelham
particularmente. Por que as crianças deveriam ser
semelhantes? Ao longo da minha experiência, conheci um
estudante com trissomia 21 e que estava no último ano da
universidade e uma criança que não pronuncia nenhuma
palavra. Aos 16 anos, Naomi dispõe de um repertório de
cerca de 20 vocábulos, com os quais se vira muito bem.
Discursos eruditos e esportes cansativos, ela deixa para os
outros.
Evidentemente, não queremos generalizar nossa
experiência com ela, apenas estimular outros modos de
pensar. Para lembrar a questão do presente de Deus, faria
algum sentido treinar crianças com Down, à custa de
grandes esforços para ambos os lados, para se alcançar algo
tão relativo como a normalidade?
Também nesse caso, é a criança quem estabelece a
norma. Deve-se levar em conta que as crianças com Down
se expressam “de maneira diferente” e, em geral, não
dispõem da possibilidade de discutir. Como em todas as
outras questões, o amor, a atenção e o respeito pelo ser
individual são o único critério realista. Desse modo, os pais e
as pessoas que pertencem ao ambiente da criança também
têm a possibilidade e a obrigação de reavaliar
continuamente se é o caso de pretender ou esperar alguma
coisa, se ela precisa de mais tempo ou até mesmo se é
adequado esperar alguma coisa dela.
Seja como for, muitas crianças “totalmente normais”
também opõem resistência a medidas de estímulo,
sobretudo na escola. Praticamente todas gostam da
regressão e evitam de bom grado os desafios, refugiando-se
no colo da mãe. Algumas tentam até esconder-se nela. No
entanto, por outro lado, também dão sinais inequívocos de
que desejam crescer e se desenvolver. Sentem-se
orgulhosos a cada centímetro que ganham em sua altura e,
nas brincadeiras em que a família é representada, esforçam-
se para desempenhar o papel dos pais e, não raro, na falta
de outros voluntários para assumir o papel das crianças, este
é dado ao cachorro. A esse respeito, as crianças com Down
quase não desenvolvem a ambição do desenvolvimento;
pelo menos, nesses nossos 16 anos, não vimos nenhum sinal
disso em nossa filha.
16.2.2 Tornem-se como as crianças

As crianças afetadas pela trissomia 21 permanecem infantis


por muito tempo em sua fisionomia e em seu modo de ser e
depois envelhecem quase sem nenhuma fase de passagem.
Seu ciclo de vida parece claramente ter desviado do ciclo
normal. Por passarem muito tempo sem se tornarem
“adultas”, após a metade da vida voltam manifestamente a
ser crianças, no sentido da missão cristã.
Por essa razão, não poderia sua tarefa nesta vida ser viver
mais a fundo o tema da “infância”? Mesmo quando se
considera o aumento de casos da doença de Alzheimer –
igualmente ligada ao cromossomo 21 – entre pessoas com
Down, o tema “voltar a ser como as crianças” torna-se
evidente, ainda que em sua versão de sombra. Se fosse
realmente assim, seria insensato sobrecarregar a infância
com tentativas cansativas e, muitas vezes, frustrantes, que
visam alcançar a maturidade. De todo modo, esta nunca
entrará realmente em sua vida nem parece desempenhar
um papel essencial para ela. Do ponto de vista da filosofia
espiritual, seria até possível pensar que a tentativa de tirar o
aspecto infantil das crianças com Down tão cedo e o máximo
possível deve ser pago em sua velhice com a versão não
redimida da infância, ou seja, como mal de Alzheimer. A
experiência de trinta anos de psicoterapia no centro médico
mostra que não se pode poupar nada, mas se pode adiar
muita coisa. No entanto, nem tudo que é adiado torna-se
mais fácil; ao contrário, muitas vezes torna-se mais difícil e,
não raro, insólito. O ditado “se você não se dobrar para a
vida, será ela a dobrá-lo” mostra outro aspecto dessa
experiência. Por exemplo, muitas vezes uma sexualidade
postergada produzirá um problema sob forma neurótica.
Segundo a concepção da filosofia espiritual, todo ser
humano tem a missão de encontrar seu caminho realizando
suas capacidades específicas. Há pessoas que, dotadas de
muita inteligência, evidentemente contribuiriam para a
compreensão de nosso mundo. E há pessoas cujo principal
talento se encontra no campo do sentimento e da
sensibilidade emocional. A esta categoria pertencem quase
todas as pessoas que classificamos como intelectualmente
deficientes. Em nossa superestima unilateral das
capacidades intelectuais, muitas vezes deixamos de ver que
essas pessoas, com os sentimentos e as emoções,
receberam muito mais do destino do que as chamadas
saudáveis. Os pontos fortes na vida das crianças com
trissomia 21 estão, evidentemente, em sentir e perceber. Se
observadas a partir do plano dos arquétipos, elas se
aproximam do princípio da Lua e nele permanecem por
muito tempo.
Do ponto de vista médico, na verdade, nada lhes falta,
como se poderia pensar à primeira vista; ao contrário,
receberam mais no que se refere à distribuição do
patrimônio genético. Além dos habituais 46 cromossomos,
receberam meio a mais, responsável por toda a diferença
que pode ser vista externamente, mas que se percebe,
sobretudo, na convivência com elas.
Como não podem confiar no intelecto e na compreensão
do mundo, dispõem, por exemplo, de um modo totalmente
diferente de aproximar-se emocionalmente do mundo. Por
fim, mantêm por mais tempo muitas das boas qualidades
das crianças. Desse modo, com frequência se aproximam
simplesmente de pessoas de que gostam, mesmo sem
conhecê-las, e as abraçam. Nos países de língua alemã,
muitas vezes reservados em relação às crianças, essa
característica representa um problema para os pais; já na
Itália não o é, gerando, ao contrário, contatos agradáveis.
Uma vez aceita a diversidade da criança, os pais e os
parentes receberão a demonstração de como ela vive o
amor e o afeto abertamente e sem nenhum obstáculo. De
maneira geral, as crianças com Down parecem ter muito
menos barreiras no âmbito interpessoal; elas têm coragem
de viver o que sentem. A psiquiatria acadêmica cunhou para
isso a expressão pouco sensível de “sem distância”, como se
a reserva fosse uma característica humana positiva. Ao
contrário, a excessiva distância é a responsável por
determinar a atual pobreza emocional, sobretudo nas
metrópoles que crescem rapidamente em meio a uma
pobreza de sentimentos. Há sempre casos de pessoas
modernas que morrem em blocos de apartamentos e os
vizinhos só percebem dias depois, mas apenas pelo cheiro.
Nosso problema é, antes, a distância nada saudável entre as
pessoas modernas, não a proximidade determinada pelos
sentimentos e o intercâmbio de emoções, que geralmente
podemos observar nos deficientes.
No entanto, eles nos ensinam ainda mais: crianças com
Down indicam claramente aos adultos distantes o que
significa sentir prazer e alegria de viver. De fato, só fazem o
que lhes dá felicidade. Crianças normais também fariam o
mesmo, mas precocemente as forçamos com sucesso a
caminharem na direção contrária. Nas crianças com Down,
são impostos limites “naturais” que, segundo nossa
experiência, deveríamos respeitar mais. Elas vivem
inteiramente no momento, não se preocupam
absolutamente com o dia seguinte e pouco com o dia
anterior. Desse modo, fazem exatamente o que nos sugerem
muitas escrituras sagradas: viver o momento do aqui e
agora. A Bíblia nos diz que devemos seguir o exemplo das
aves no céu, que não semeiam, não colhem, não têm
preocupações e, no entanto, têm o suficiente para viver.
Poderíamos pensar que a Criação sempre se concede alguns
desses seres, que permanecem crianças e nos mostram o
que se entende por essa parábola ou o que significa a
exortação para que voltemos a ser crianças depois da
primeira metade da vida.
Embora as pesquisas sobre a hereditariedade sejam cada
vez melhores, pouco sabemos das tarefas das pessoas
dentro dessa Criação e em sua vida individual. Em pessoas
especiais com tarefas de vida especiais, podemos enxergar
com mais facilidade ainda o que a Criação podia querer
delas.
Atualmente, observamos as pessoas apenas para avaliar o
que elas conseguem produzir e quanto ganham. Pouco
depois de conhecerem alguém, norte-americanos já
perguntam diretamente quantos dólares a pessoa ganha. No
entanto, as religiões e os ensinamentos de sabedoria de
todos os países e de todas as épocas nos revelam como é
absurda essa observação unilateral. Nosso pressuposto
fundamental de que tempo é dinheiro é totalmente errôneo,
já pelo fato de que o contrário não é verdadeiro. No final,
com dinheiro não se pode comprar o tempo do destino. A
peça teatral Jedermann trata justamente dessa tentativa
inútil. Também na prática médica podemos nos lamentar da
mesma situação. Hoje, muitas pessoas só reconhecem isso
quando já é tarde demais.
As crianças portadoras da Síndrome de Down são capazes
de nos ensinar, de maneira extraordinária, que os valores
importantes para a vida são outros. No âmbito interpessoal,
elas são mestras. Precisam de mais tempo para tudo. Mas
quem disse que nossa correria coletiva é boa para nós ou
para o nosso mundo? Cada vez mais médicos reconhecem
que a pressa exagerada leva ao aumento da pressão arterial
e ao infarto. Se adotássemos o ritmo das crianças com
Down, viveríamos automaticamente mais devagar, e isso
faria muito bem à maioria de nós.
Raramente vemos crianças portadoras de deficiência nas
ruas, mesmo quando temos uma afinidade com elas. No
entanto, elas não são poucas. Só que muitas ainda são
escondidas, pois alguns pais se envergonham de ter um filho
diferente. Outra razão é o fato de que elas próprias não
gostam muito de sair. Contudo, quem as esconde deixa de
ver a grande oportunidade que elas nos oferecem.
Em algumas culturas, cuja salvação coletiva não era tão
ligada ao crescimento econômico e cujas almas, por
conseguinte, não dependiam tanto do dinheiro, as pessoas
com trissomia eram consideradas muito especiais no sentido
positivo. Entre os astecas, chegavam a ser vistas como
santas, pois estariam mais próximas do céu.
Nós também sempre queremos ser especiais, mas no
sentido da realização do ego. A esse respeito, as crianças
com Down não têm nenhuma ambição. Interessam-se mais
pela união de sua família e, de modo geral, aproximam-se
mais da coletividade. Nesse sentido, assemelham-se um
pouco aos homens primitivos antes do desenvolvimento de
nosso impressionante cérebro. De fato, elas são como uma
grande família universal. Não se parecem muito com seus
pais, o que pode ferir consideravelmente o ego destes. Suas
semelhanças e seus grupos familiares ultrapassam qualquer
fronteira.
Em resumo, há muitas razões favoráveis para permitirmos
que elas e outros deficientes vivam sua infância, sem que
sejam submetidos à pressão do aprendizado e do sucesso
como o “restante do mundo”. Atualmente, também existem
voluntários que compreenderam a importância de deixar em
paz as últimas culturas arcaicas, em vez de cobri-las
constantemente com medidas de ajuda e incentivo e destruir
suas formas interpessoais de vida, na tentativa de torná-las
mais semelhantes a nós.
16.2.3 Dúvidas a respeito da sociedade meritocrática

A interpretação dos diferentes sintomas da trissomia 21, tal


como apresentada no livro A Doença como Símbolo, mostra
uma tarefa bastante clara, mas totalmente diferente daquela
que a sociedade meritocrática admite como óbvia. Os
frequentes problemas cardíacos nos revelam o quanto essas
crianças permanecem próximas da unidade mesmo depois
do nascimento. Muitas vezes, seu coração (a unidade) não
tem o septo fechado e, portanto, não se subdivide em dois
ventrículos, ou em coração direito e esquerdo. Por
conseguinte, essas crianças não são bem equipadas para o
mundo dos opostos e permanecem mais próximas da
unidade de maneira diferente e ameaçadora.
A debilidade de seu tecido conjuntivo as torna fisicamente
muito maleáveis e flexíveis. Naomi consegue, sem nenhuma
dificuldade, enfiar os dedos dos pés na boca. Nesse caso, o
corpo é, por assim dizer, uma compensação para um
impressionante déficit de capacidade de adaptação na
consciência. Crianças com trissomia 21 são extremamente
conservadoras e céticas em relação a todo tipo de inovação.
Sua mobilidade limita-se ao corpo. Querem deixar tudo como
está e, sobretudo, como estava – também a esse respeito se
assemelham muito aos homens primitivos, para os quais o
caminho hereditário dos antepassados superava todas as
coisas.
As extremidades relativamente frágeis as impedem de ter
um relacionamento mais intenso com o mundo. Seus braços
fracos dificilmente permitem que elas tragam o mundo para
perto de si; avançar nele com pernas fracas é outro
obstáculo. Quando Naomi corre, parece mais estar
dançando. Mas o avanço também não é algo que lhe importa
e, certamente, não é sua missão. Nós a aproximamos de
bom grado do pequeno mundo, o único que realmente lhe
interessa e de que ela precisa.
Por certo, seria concebível incentivá-la, mais para a frente,
a dedicar-se a algum trabalho fácil, cujas funções, no
entanto, seriam sempre bem simples. Por outro lado, ao
mesmo tempo nos perguntamos em que medida isso faria
sentido para alguém que, por seu físico e seu intelecto, não
parece ter sido criado para o trabalho. Um amigo formulou
com poucas palavras que a maior parte das pessoas compra,
com dinheiro que não lhe pertence, coisas de que não
precisa só para se vangloriar para pessoas de que não gosta.
É uma realidade o fato de muitas pessoas executarem um
trabalho de que não gostam, vivendo-o não como uma
vocação, mas como uma obrigação, apenas para produzir ou
transportar coisas de que elas próprias não precisam e de
que talvez mais ninguém precise.
Talvez devêssemos poupar nossas crianças especiais de
um destino normal como esse, principalmente porque, no
que diz respeito a seu trabalho, tal como entendido pela
sociedade atual, elas pouco podem produzir. O fato de que
todo homem honesto deve trabalhar, pois, do contrário, não
é um homem justo pode ser uma verdade para quem segue
uma base puritana; para todas as outras pessoas, bem como
para o homem arcaico, isso certamente não é verdade.
Também chamamos esse homem arcaico de primitivo; no
entanto, temos de reconhecer que, ao lidar com as coisas
essenciais da vida, como a concepção e o nascimento, a
puberdade e a adolescência, o casamento e a vocação, a
meia-idade e a velhice e, sobretudo, com a morte, ele era
muito menos primitivo do que nós. Nesse sentido, temos
muito que aprender com ele. Não é por acaso que as
crianças com Down se assemelhem a esses simples homens
arcaicos em alguns aspectos, e também com elas
poderíamos aprender muitas coisas importantes.
De todo modo, a formação em uma escola especial não é o
máximo que se pode alcançar, mas é acessível; a questão é
sempre a que preço. Porém, muitas vezes as crianças com
trissomia 21 têm uma relação natural com o amor, que é o
mais elevado dos sentimentos. Reconhecer isso e desfrutá-lo
parece ser muito mais importante para nós do que aprender
a ser pontual e a realizar tarefas simples, que as máquinas
de hoje executam com maior precisão. Com frequência, as
crianças com Down também são muito bem-humoradas e
encantadoras. Na minha opinião, este mundo carece muito
mais de pessoas que, como Naomi, o preenchem de
inúmeras bolhas de sabão coloridas e nele difundem seu
bom humor, que se interessam preferencialmente pelo
prazer e pela alegria de viver, que não fazem mal a ninguém
e proporcionam muita felicidade. De trabalhadores
obstinados, que produzem coisas ainda mais supérfluas, já
temos o suficiente.
As próprias pessoas afetadas pela Síndrome de Down
parecem aceitar seu destino de limitação intelectual, e nós
poderíamos ajudá-las a encontrar outros pontos
fundamentais para a vida. A grande profundidade de seu
sentimento e sua rica afetividade representam uma
maravilhosa compensação e permitem uma vida que, fora da
esfera dos sentimentos, pode dar a muitos pais modernos
muito mais do que uma criança extremamente inteligente.
De fato, sempre acontece o que se deseja ou algo melhor.
Uma criança muito inteligente deixa os pais orgulhosos, mas,
muitas vezes, o orgulho não é o que falta à sua vida. As
crianças com Down são capazes de estimular em nós uma
dimensão totalmente diferente de sentimentos, que, com
frequência, falta muito mais do que estamos habituados a
admitir.
Mas justamente por isso existe o destino com suas sábias
deliberações. As crianças com Down também trazem
infantilidade e ingenuidade para nossa vida, outros
elementos que costumam faltar sem nos darmos conta. A
maioria das pessoas acredita que é feliz quando recebe tudo
que quer do modo como quer. Em contrapartida, o destino
nos ensina a ser felizes desejando o que recebemos.
Podemos muito bem estender isso às crianças e a todas as
outras pessoas. Quem deseja o que recebe sempre tem uma
passagem para a felicidade.
Portanto, os pais envolvidos teriam uma boa oportunidade
de reconhecer que seus filhos com Down – tanto quanto
aqueles saudáveis – trazem uma compensação para a vida,
justamente aquilo que falta, com a tendência de reequilibrar
a estrutura familiar. Muitas vezes, um excesso intelectual é
compensado com um contrapeso que enfatiza os
sentimentos. As crianças com Down conseguem corrigir
melhor do que as outras as próprias opiniões e ideias
preconcebidas. Podem ajudar a redimensionar o círculo de
amigos a um nível mais sincero, a relativizar as exigências
em relação ao próprio rendimento, para que se reconheça o
que é essencial. São capazes de verificar nossa confiança no
destino e nos mostrar que, no fundo, a vida não pode ser
planejada; ao contrário, permanece sempre um mistério.
As crianças com Down representam uma tarefa muito
maior, à qual não estamos habituados. Aceitá-la pode nos
levar muito além do que a tarefa esperada nos levaria. Para
não falar no fato de que a imagem de mundo de uma criança
com Down pode encantar qualquer família e comunidade.
Portanto, toda deficiência mental pode transformar-se em
oportunidade de crescimento para além dos jogos
intelectuais e, por exemplo, permitir que se entre em
âmbitos mais antigos e primordiais da humanidade. Todavia,
às vezes os deficientes também podem nos revelar como
nós próprios somos limitados e não o percebemos. Esta
também pode ser a razão pela qual pessoas fracas de
caráter as rejeitam e outras com distúrbios mentais, como os
nazistas e os fascistas, chegam a combatê-las. Em
contrapartida, pessoas dispostas a evoluir muitas vezes
sentem intuitivamente a oportunidade que essas crianças
nos oferecem. Os cristãos deveriam até mesmo conhecer
sua diversidade positiva, uma vez que seu mestre diz: “Bem-
aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino
dos céus”. Teriam os cristãos e os astecas uma similaridade
inesperada? Os portadores de deficiência intelectual podem
nos ensinar a fazer coisas simples e essenciais com amor, e
não com a compreensão. Eles redimem o tema da
simplicidade graças à sua proximidade da unidade, o que
nós temos muita dificuldade de fazer, mesmo depois de
intenso exercício.
Se descrevêssemos nossos filhos portadores da Síndrome
de Down sem explicar sua condição particular, o resultado
seria a imagem de pessoas maravilhosas. Eles não possuem
nenhum senso de competição, no sentido de “quem
consegue ser mais rápido, mais alto, mais longe?” em
relação a outras crianças; não têm nenhuma ambição em
sobressair-se em relação aos outros ou se tornarem
melhores do que eles. Dividem de bom grado o que
possuem, se é que pensam em categorias como “o meu” e
“o seu”. Tendem a dar o que têm sem pensar duas vezes e a
pegar livremente aquilo de que estão precisando. Mostram
abertamente e sem temor seus sentimentos e suas emoções
e gostam de compartilhá-los com os outros. Dificilmente se
constata neles algum indício de alegria com a infelicidade
alheia. Raramente são agressivos, quase não se defendem
de agressões; preferem retirar-se decididamente em si
mesmos. Não destroem nada de propósito; são doces e
amam a família acima de tudo, na qual também incluem
facilmente babás, gatos, coelhos e bonecas. Gostam de
animais e brincam incessantemente com eles. E não há
dúvida de que os animais também gostam deles e são
capazes de interagir com eles. É impressionante o modo
como nos demonstram sua pureza e sua autenticidade, sem
partirem para um exibicionismo antissocial.
Não fosse pelas preocupações com aquilo que não
conseguem fazer, irradiariam ainda mais luz. A questão é:
devemos realmente começar a lançar sobre eles sombras
pedagógicas, a fim de obter, a todo custo, um êxito
questionável e discutível em termos de capacidade e
eficiência?
 
Perguntas para os pais:

Como lidamos com a diversidade?

Como podemos aprender a proximidade, o amor
e a emoção com nosso filho?

Em que circunstância o intelecto é tão
dominante em nós que agora precisamos
intensamente do polo oposto?

O que nosso filho quer nos dizer quando
consegue dizer tão pouco ou nada, mas exprime
tanto?

Quanta disponibilidade temos para aprender sua
linguagem dos sentimentos e das emoções?

Até que ponto tentamos treiná-lo para ser
“normal”, como ele lida com isso e quão
importante isso realmente é para ele?

Como lidamos com o fato de que ele não se
parece ou se parece pouco conosco?

Que papel sua diversidade desempenha em
relação a terceiros, ao restante da família, aos
vizinhos, etc.?

De quanto tempo (ainda) precisamos para
reconhecê-lo como um presente muito especial
dos céus?
 
Medidas de apoio:

Tratamento homeopático: a Síndrome de Down
não tem cura, mas a qualidade de vida das
crianças pode melhorar consideravelmente com
um tratamento individual de homeopatia
clássica.

Tratar os pais paralelamente: segundo minha
experiência pessoal, é útil tratar os pais
paralelamente, para que, em seu caminho de
aceitação do filho, não caiam na atribuição de
culpa, negações e projeções.
17 Epílogo

Tendo chegado ao final do livro, podemos refletir sobre que


tipo de dote queremos deixar para nossos filhos. O material,
em forma de herança, muitas vezes se transforma em
veneno. Muito melhor e mais importante seria transmitir-
lhes, em nível físico, boa saúde, por exemplo, habituando-os
aos “pilares da saúde”.
Entretanto, além da saúde física, há também a psíquica e
a capacidade de lidar com a vida. Para mim, em primeiro
lugar, vêm as leis da vida.[37] Na hierarquia das prioridades,
logo abaixo se posicionam os princípios primários ou
arquétipos, mencionados nas entrelinhas e, às vezes,
também diretamente, pois, sem eles, uma compreensão
mais profunda da existência em todos os seus campos e com
todos os seus significados é praticamente impossível.
Para compreender todo o espectro das tarefas humanas no
percurso da vida, cada um de nós precisa redimir todos os
arquétipos e princípios primários. Quanto mais cedo isso
acontecer, tanto melhor. Transmiti-lo a nossos filhos seria
uma das tarefas mais nobres que poderíamos cumprir. Por
isso, resumiremos essas tarefas em seguida, em forma de
ficção:
“Quando Deus viu os homens errar desorientados por seu
mundo, decidiu plantar em sua alma doze instrumentos para
que pudessem orientar-se melhor. Os homens receberam a
incumbência de transmitir esses instrumentos a seus filhos,
de geração em geração, para que, ao final, Sua Criação fosse
perfeita. Seguem os doze instrumentos em detalhes:[38]
1.
Tenham coragem de recomeçar a cada dia e
aprendam a impor sua essência no local e no
momento certos.
2.
Parem sempre que precisarem encontrar clareza
sobre seu lugar e seu ponto de vista na vida.
Tomem tempo para lançar raízes, ancorar-se e
desfrutar a vida com todos os sentidos.
3.
Nunca deixem de aprender, de investigar o
mundo, de adquirir conhecimento sobre ele e
trocar opiniões com outras pessoas a respeito.
4.
Entreguem-se a todos os sentimentos e
sensações que a vida lhes presenteia. Mas
deixem-nos ir embora, não os detenham. A alma
é como a água, que sempre precisa correr.
Compartilhem seus sentimentos com todos.
Assim, vocês terão compaixão.
5.
Tenham coragem de ser vocês mesmos. E aonde
quer que vão, façam-no com todo o coração, a
fim de levar ao mundo alegria e amor com as
criações de seu ser.
6.
Levem ordem aos lugares do mundo onde for
necessário. Tratem-no com grande respeito e
atenção, insiram-se na grande ordem da Criação
e sejam gratos por ela os nutrir e carregar.
Aprendam a ver o que existe, o que lhes foi
dado, e não cobicem o que acham que ainda
precisam.
7.
Dirijam-se a todos os seres humanos com
compreensão afetuosa. Deixem-se encantar pela
beleza do mundo e aumentem-na com a beleza
interior de seu ser.
8.
Tenham sempre consciência da efemeridade da
vida neste mundo. O fluxo incessante da morte e
do devir deve tornar cada momento precioso.
9.
Busquem metas e objetivos elevados, a fim de
experimentar o verdadeiro sentido da escola da
vida. Mas tenham sempre em mente a justa
medida e o respeito pelo espaço vital dos outros
seres.
10.
Aprendam a reconhecer o essencial na plenitude
e a limitar-se cada vez mais a ele. Assumam toda
a responsabilidade por sua própria vida e
cumpram seu dever com alegria.
11.
Sigam o desejo de liberdade, independência e
verdade. Sejam corajosos e fortes o suficiente
para percorrer seu próprio caminho sem se
esquecer de que sempre permanecerão parte de
uma comunidade.
12.
Tenham confiança no fluxo de sua vida, seja qual
for a direção para onde ele possa conduzi-los.
Através do mundo das imagens, de seus sonhos
e de suas fantasias, aprendam a reconhecer que,
por trás dessa realidade, existe outra ainda
maior e infinita.
 
Com esses conhecimentos em sua bagagem de vida, vocês
certamente encontraram o caminho de volta para casa, que
conduz até Mim. Até lá, crescerão e prosperarão. Rirão e
chorarão. Seguirão por muitos caminhos e desvios. Eu lhes
dou um tempo infinito e a liberdade de escolher por si
próprios até encontrarem a sabedoria da vida, que os
reconduzirá até Mim.
18 Agradecimentos

Agradecemos a nossos pais, sobretudo a nossas mães Gisela


Krakow e Anne Smialowski.
Nosso agradecimento especial vai para Margit Dahlke, por
suas muitas contribuições e ideias a temas e Capítulos
inteiros, pelo Epílogo, bem como pela colaboração
temporária no centro médico de Johanniskirche; a Freda
Jeske, cujo incentivo e cujas correções ampliaram e
aprofundaram o livro. Quanto às correções, agradecemos
também a outras colaboradoras do centro médico, como
Anja Schönfuss e Gundi Kirkovics, bem como à minha
“editora sênior” particular, a terapeuta e pedagoga Christa
Maleri, mas também à nossa organizadora suíça, a pedagoga
Lis Lusternberger.
Ao homeopata e clínico geral, doutor Friedrich Graf, nosso
especial agradecimento por seu incentivo, suas correções e
seu acompanhamento amigável.
A estimulante discussão sobre nosso manuscrito deve-se à
psicoterapeuta e homeopata, doutora em medicina
veterinária, Elvira Kunsch.
Agradecemos também a nossas antigas colegas do centro
de naturopatia da criança e da família, Sylvia Drerup,
estudante de medicina e homeopata, e Maike Neubert-
Eichner, homeopata, seu apoio e suas correções técnicas no
campo da homeopatia. A Susanne Jeβ, psicóloga, e a Martin
Grassinger, homeopata e professor de human design,
agradecemos as estimulantes discussões.
Ao doutor Ingo Hobert agradecemos a contribuição sobre
as flores australianas; à doutora Wibke Bein-Wierzbinski, as
seções sobre o reflexo de Moro e de Galant; à iridóloga Rita
Fasel, suas contribuições sobre o estrabismo e a visão
infantil, bem como sua paciência.
À doutora em filosofia, Jirina Prekop, agradecemos a
revisão do manuscrito e suas contribuições sobre a terapia
do abraço; a Elisabeth Mitteregger, naturopata e
colaboradora nos seminários sobre jejum, nosso
agradecimento pela revisão, pelo incentivo e, sobretudo,
pelos inúmeros conselhos fitoterápicos. À naturopata Rita
Engelstädter, agradecemos sua contribuição a respeito das
constelações familiares.
À pediatra e alergista, doutora Doris Stalp-Kotulla,
endereçamos nosso agradecimento pela revisão do
manuscrito, pelo incentivo e pelas experiências de prática
clínica com crianças e pais. Ao pediatra, doutor Wilfried
Hüsing, de Hannover, agradecemos a revisão do ponto de
vista pediátrico e o incentivo. Agradecemos igualmente aos
doutores em pediatria Martin Hirte, de Munique, a revisão e
as correções, e Siegfried Simmet, e a ambos especialmente
também a crítica (quanto ao tema da vacinação). Ao
pediatra, doutor Mathias Senner, agradecemos a revisão da
parte teórica; ao ginecologista, doutor Volker Zahn, a revisão
e o incentivo.
À doutora Anette Ch. Stein, de Dresden, especialista em
anestesia e medicina intensiva, nosso agradecimento por
sua revisão quanto aos interesses da medicina acadêmica.
A Ruela Hummel, agradecemos o capítulo sobre o diabete,
e às mães Petra Bruhn, Audrey Zellner e Vanessa Jebens, seu
ponto de vista materno.
A todos os pequenos pacientes e suas mães, agradecemos
todas as experiências ao longo dos anos.
19 Anexos

19.1 Farmácia homeopática de emergência


Nesta seção, trataremos das emergências típicas que
ocorrem na infância e de como interpretá-las. Serão
indicadas as tarefas nelas ocultas, que poderão ser
aprofundadas com as seguintes questões: por que isso está
acontecendo justamente conosco, ou melhor, com nosso
filho, justamente nessa fase da vida, justamente nessa
região do corpo, justamente dessa maneira? O que essa
doença nos impede de fazer e o que nos obriga a fazer?
Quando parecer importante, será oferecido um socorro
naturopático e homeopático imediato. Porém, isso não
significa absolutamente que nos casos graves também não
sejam necessárias medidas da medicina acadêmica:
 

Se a situação ameaçar visivelmente a vida, dirija-se
imediatamente para um pronto-socorro ou ao médico de
emergência e não perca tempo!

Se a situação for grave e exigir, sem dúvida, intervenção
médica, chame primeiro um médico antes de fazer
qualquer coisa.

Se a situação for menos grave, tente obter um alívio
inicial com a presente instrução e, eventualmente,
depois entre em contato com um médico.
 
Medicamentos homeopáticos e o Rescue Remedy dos florais
de Bach devem ser tomados, de preferência, como segue:
 

Dar dois glóbulos de C30, a menos que tenha sido
especificada outra potência, e deixá-los dissolver na
língua. Em seguida, dissolver bem outros dois glóbulos
em um copo d’água. Ministrar um gole cinco vezes, em
intervalos de dez minutos. Antes de cada gole, o líquido
deve ser intensamente mexido com uma colher de
plástico ou uma espátula de madeira. Não use colheres
de metal.

Rescue Remedy: deixar dois glóbulos se dissolverem na
língua; dissolver outros dois em um copo d’água e dar de
beber em goles.
19.1.1 Eritema alérgico

Homeopatia:
Urtica urens

Dores e aspecto físico como de contato com urtiga.

Melhora com o frio.
Arsenicum album

Após excesso de proteína animal.

Melhora com o calor.
Cantharis

Vermelhidão intensa, forte queimação.

Com formação de bolhas.
Apis

Com inchaço aquoso, vermelho e quente.

Melhora com o frio.
Simbologia: perder a cabeça, ataque repentino de fúria ou
explosão agressiva na pele.
Tarefa: desabafar em vez de descontar na pele!
Primeiros socorros: em casos extremos de choque alérgico,
ministrar cortisona. Em hipótese alguma dar cálcio em casos
de alergia!
19.1.2 Feridas por mordidas

Homeopatia:
Ledum

Remédio principal.

Ferida profunda, com pouco ou nenhum sangramento.
Arnica

Com sangramento.
Hypericum

Em caso de dores fortes.
Simbologia: a agressão acomete a criança a partir de fora; a
criança deveria se tornar mais agressiva! O predador não
vivido vem de fora e ataca.
Tarefa: tirar o cacete do saco, desenvolver a mordida, para
não se tornar mordaz nem feroz.
Primeiros socorros: deixar sangrar, não fechar artificialmente
a ferida (perigo de tétano!). Desinfetar com água de
calêndula ou com a própria urina.
19.1.3 Hematoma

Homeopatia:
Arnica

Remédio principal.
Ledum

Se a arnica não for suficiente e em caso de um
hematoma grande, especialmente quando assumir uma
coloração preto-esverdeada.
Simbologia: receber uma pancada, um chute ou um golpe na
coxa. “Quem não quer ouvir deve sentir!” – “Quem não quer
ver será golpeado, ou melhor, se machucará no mundo.”
Tarefa: abrir-se mais para os impulsos e indicações
importantes, antes de chegar a sangrar; reconhecer os
obstáculos e utilizá-los em proveito do próprio fluxo da vida
em vez de combatê-los.
Primeiros socorros: não são necessários.
19.1.4 Hemorragias

Homeopatia:
Arnica

Remédio principal.
Hypericum

Em caso de dor.
Calendula

Para limpar externamente a ferida.

Dez gotas de tintura-mãe em um copo d’água para lavar
a ferida.
Simbologia: símbolo da vida, por isso, do ponto de vista da
pessoa afetada, toda hemorragia deve ser imediatamente
interrompida. Na verdade, feridas sujas deveriam sangrar
por mais tempo, para que assim ocorra uma limpeza de
dentro para fora.
Tarefa: deixar fluir voluntariamente a energia vital;
internamente, entrar no fluxo e no próprio ritmo.
Primeiros socorros: limpar a ferida e, em seguida, cobri-la ou
aplicar um curativo sobre ela.
19.1.5 Intoxicação sanguínea

Homeopatia:
Gunpowder

Remédio principal.

Cinco glóbulos D12, três vezes ao dia.
Pyrogenium

Especialmente em caso de picadas de insetos.
Simbologia: os agentes patogênicos penetraram no sangue,
ou melhor, na corrente linfática; o corpo não consegue se
liberar do ataque; a inflamação insinua-se ulteriormente na
direção do centro.
Tarefa: permitir que temas explosivos venham à tona;
conduzir a luta pela vida de maneira mais incisiva; colocar-se
de maneira mais ofensiva diante dos desafios; opor-se e
resistir.
Primeiros socorros: procurar um médico.
19.1.6 Concussão cerebral

Homeopatia:
Arnica

Remédio principal.
Hypericum

Posteriormente, em caso de dor.
Simbologia: receber um tiro na proa, uma pancada na
cabeça; ser sacudido; agir sem pensar.
Tarefa: perceber e levar a sério, oportunamente, os impulsos
mentais; permitir-se pensamentos inconvenientes. Estimular
novos pensamentos. Deixar a cabeça repousar fisicamente.
Primeiros socorros: Rescue Remedy.
19.1.7 Picadas de insetos

Homeopatia:
Apis

Inchaço quente, vermelho e aquoso.

Melhora com o frio.
Ledum

Picadas que custam a sarar, que adquirem coloração
escura ou de várias cores.

Inchaço frio e duro.
Staphisagria

Em caso de várias picadas de mosquito.
Vespa

Em caso de reação intensa, com distúrbios circulatórios.
Simbologia: pequenas picadas que “irritam”; o estranho
busca acesso sem ser notado e causa irritação (às vezes, até
sangrar). Alguma coisa provoca prurido e faz a pessoa se
coçar, ou melhor, a romper com violência as próprias
fronteiras.
Tarefa: deixar-se tocar pela vida; permitir voluntariamente
influências externas; praticar a abertura; permitir que os
outros compartilhem da própria energia; deixar-se estimular;
abrir voluntariamente as próprias fronteiras.
Primeiros socorros: creme Rescue Remedy.
19.1.8 Fraturas

Homeopatia:
Arnica

Para aliviar a dor.
Hypericum

Em casos de dor que percorre todo o nervo.
Simbologia: as próprias estruturas são questionadas; a
continuidade é interrompida.
Tarefa: abandonar a continuidade; sair dos trilhos habituais;
deixar a velha estabilidade em favor da nova mobilidade.
Tornar-se mais flexível; desenvolver maior mobilidade
psíquica e intelectual.
Primeiros socorros: Rescue Remedy e, obviamente, cuidados
médicos imediatos.
19.1.9 Distúrbios circulatórios

Homeopatia:
Veratrum album

Palidez, sensação de desmaio, suor frio e náusea.

Desejo de calor.
Simbologia: insuficiência de abastecimento de sangue no
cérebro; a energia vital não é suficiente para abastecer a
central.
Tarefa: observar os próprios enganos; reconhecer em que
circunstâncias se é enganado a respeito da honestidade;
retificar as informações. Confiar conscientemente no ritmo e
nas condições da vida em vez de vacilar; encontrar a própria
linha (de vida) em vez de se tornar inconstante; entregar-se
à situação em vez de se entregar.
Primeiros socorros: pôr as pernas para o alto, a cabeça para
baixo; Rescue Remedy. Com o dedo, bater no ponto situado
entre o nariz e o lábio superior.
19.1.10 Intoxicação alimentar

Homeopatia:
Okoubaka
 
Em caso de agentes desencadeadores específicos:

Ovos: Carbo vegetabilis.

Sorvete: Arsenicum album.

Comida gordurosa: Pulsatilla.

Gordura, ranço: Arsenicum album, Carbo vegetabilis.

Peixe: Carbo vegetabilis.

Carne: Arsenicum album.

Queijo: Arsenicum album, Carbo vegetabilis.

Batata: Nux vomica.

Conservas: Arsenicum album.

Frutos do mar: Arsenicum album, Carbo vegetabilis.

Leite: Arsenicum album.

Frutas: Pulsatilla.

Cogumelos: Pulsatilla.

Chocolate: Arsenicum album.

Fumaça de tabaco: Arsenicum album.

Salsicha: Arsenicum album.
 
Agentes desencadeadores não específicos:
Arsenicum album

Vômito, diarreia, queimação no estômago.

Medo; inquietação; fraqueza crescente; sede intensa de
água fria, tomada a pequenos goles.
Carbo vegetabilis

Ventre distendido, colapso, muita palidez.

Sensação de aperto no pescoço, estenocardia, desejo de
ar fresco.
Nux vomica

Tenesmo, dor ao evacuar, prolapso anal.

Humor irritável.
Pulsatilla

Náusea com dores abdominais, vômito, diarreia,
eructação ácida.

Ausência de sede, suscetível ao choro, muito apegado.
Simbologia: ingestão errônea de alimento indigerível por
falta de atenção, porque não se teve o olfato correto, não se
distinguiu o sabor nem se reconheceu em tempo que havia
alguma coisa “suspeita” naquela comida.
Tarefa: pôr para fora em sentido concreto (e figurado), deixar
que saia o que está errado.
Primeiros socorros: causar vômito estimulando a úvula. Em
caso de dúvida, consultar um médico.
19.1.11 Desmaio

Homeopatia:
Aconitum

Em caso de desmaio devido a susto.
China

Perda de sangue, diarreia acompanhada de vômito.
Coffea

Excesso de alegria.
Nux vomica

Dores, especialmente durante a evacuação, devido a
odores fortes ou a excessos.
Pulsatilla

Muito tempo em pé, calor, aperto e espaços lotados.
Simbologia: pouco sangue na “central”.
Tarefa: às vezes, é preciso renunciar voluntariamente ao
“poder”. As tarefas também variam de acordo com as
seguintes causas do desmaio:

Desmaio por susto: entregar-se espontaneamente.

Desmaiar de alegria: deixar-se envolver totalmente pela
alegria e renunciar a todo “poder”.

Por problemas circulatórios: entregar-se inteiramente ao
momento.

Por incenso: confiar no segredo da religião em vez de
fechar-se. Consagrar-se conscientemente ao mistério e
fraquejar perante Deus em vez de tremer de medo.

Devido a intenso perfume de flores: entregar-se aos
milagres da Criação.
Primeiros socorros: colocar as pernas para cima e a cabeça
para baixo; bater o dedo entre o nariz e o lábio superior.
19.1.12 Lacerações (na cabeça)
Homeopatia:
Arnica

Remédio principal.
Simbologia: sob tensão, o tecido estacionário se dilacera – a
impressão que se tem é que se está explodindo.
Tarefa: deixar sair das tensões internas; não permitir que
chegue à prova extrema da laceração e do estouro, mas
descarregar antes a pressão. É melhor provar a capacidade
de se afirmar do que querer impor uma coisa a qualquer
preço.
Primeiros socorros: interromper a hemorragia, (mandar)
costurar a ferida. Rescue Remedy, curativo em spray.
19.1.13 Contusões

Homeopatia:
Arnica

Remédio principal.
Simbologia: “Passaram a perna em você”, no sentido de
deixar-se enganar. Quem passa a perna em alguém o
engana.
Tarefa: levar a vida a sério, deixar que ela se aproxime,
sentir e perceber mais. Tornar-se um “para-choque”,
aproximar-se da vida com mais dureza, bater e chocar-se
mais contra si mesmo.
Primeiros socorros: creme Rescue Remedy.
19.1.14 Enjoo em viagens

Homeopatia:
Cocculus

Náusea e tontura em viagens de automóvel, ônibus e
trem.

Sensibilidade a odores (por exemplo, de comida, fumaça
de tabaco).
Ipecacuanha

Forte náusea, salivação abundante, quase sempre
ausência de sede.

Não melhora com o vômito.

Língua limpa, sem saburra.
Nux vomica

Irritabilidade em caso de forte ânsia de vômito.

Hiperestesia sensorial e suscetibilidade.
Petroleum

Diarreia, náusea com vômito de bile.

Jet lag.

Vontade de comer. Melhora comendo.
Tabacum

Frio gélido, prostração, tontura.

Remédio principal em caso de enjoo.

Melhora ao vomitar.
Simbologia: não consegue adaptar-se à viagem nem ao
elemento que a ela pertence. Deixar-se enganar por alguma
coisa.
Tarefa: renunciar ao controle e se entregar.
Primeiros socorros: não é necessário.
19.1.15 Cortes
Homeopatia:
Arnica

Como primeiro remédio (principal).
Staphisagria

Depois da arnica, caso haja o risco de problemas de
cicatrização.

Após cortes (por faca) e operações, bem como
lacerações.
Simbologia: “cortar-se” no sentido de “enganar-se”. No
sentido figurado, “dar um tiro no próprio pé”.
Tarefa: desenvolver mais coragem. Seria preferível ter uma
língua afiada no plano verbal ou mental, julgar-se
severamente, questionar com ênfase e vigor os próprios
limites.
Primeiros socorros: interromper a hemorragia.
19.1.16 Escoriações

Homeopatia:
Calendula

Remédio principal.
Simbologia: escoriar-se, excesso de desgaste; sofrer um
desgaste por atrito; exigir demais de si mesmo (no plano
errado).
Tarefa: deixar que as coisas penetrem sob a pele,
desenvolver mais profundidade. Exigir mais de si mesmo no
nível decisivo. Arranjar mais atrito na vida, sentir e perceber
as coisas com mais vivacidade.
Primeiros socorros: compressas com a própria urina.
19.1.17 Queimadura de sol

Homeopatia:
Belladonna

Remédio principal.

Vermelhidão intensa; reage com sensibilidade ao
contato.

Agitação, febre geral.
Arsenicum album

Acne estival.

Eritema ardente, pruriginoso e pungente.
Simbologia: tomou-se muito “sol externo” em vez de sol
interno. Não ter consciência suficiente do poder de fogo do
sol. Subestimar o sol. Desejo excessivo de parecer
bronzeado e vital.
Tarefa: relacionar-se conscientemente com a irradiação
masculina. Deixar que o sol interior brilhe. “Arder” por
alguma coisa em vez de deixar-se arder. Tornar-se “fogo e
chama” e inflamar-se por temas essenciais.
Primeiros socorros: compressas com a própria urina,
bandagem com queijo quark ou iogurte.
19.1.18 Insolação

Homeopatia:
Glonoinum

Calor, vermelhidão, pele ardente, dor de cabeça forte,
agitação, náusea, eventual vômito.
Veratrum album

Colapso acompanhado de vômito, frio no corpo, suor frio,
palidez.
Simbologia: a criança tomou muito “sol externo”. Sua
“central” (a cabeça) ficou sobrecarregada e quente.
Sobreaquecimento, funcionamento sob calor.
Tarefa: deixar-se inspirar mais pela energia e pela irradiação
masculina; abrir-se voluntariamente para o fogo interior;
entusiasmar-se mais com a vida. Viver mais no “sol interior”.
Colocar-se sob a luz correta.
Primeiros socorros: beber muita água a temperatura
ambiente.
19.1.19 Lascas, farpas, estilhaços

Homeopatia:
Silicea

Remédio principal.
Simbologia: “Você está com uma farpa” (você se enganou).
Estar com um “espinho na carne”, como a famosa “trave no
olho”. Algo estranho e perigoso se insinua sob a própria pele
e faz pressão, desencadeia conflitos.
Tarefa: deixar o que é importante “penetrar sob a pele”, em
sentido figurado. Permitir a entrada do que é estranho e
perigosamente provocatório e deixar-se tocar por ele;
estimular-se com o confronto.
Primeiros socorros: extrair a farpa; em seguida, manter a
ferida aberta. Aplicar a própria urina (externamente).
19.1.20 Choque elétrico

Homeopatia:
Nux vomica

Remédio principal.
Simbologia: golpe no sistema, perigo de distúrbios no ritmo
cardíaco.
Tarefa: unir-se à “corrente da vida”; sair um pouco da linha.
É melhor ultrapassar os limites do que tomar um choque
elétrico. Viver o que é inabitual e original.
Primeiros socorros: Rescue Remedy. Eventualmente, buscar
auxílio médico.
19.1.21 Torções em geral, torção do pé
Homeopatia:
Arnica

Remédio principal.

Quando o movimento causa dor intensa.

Medo do toque e da aproximação.
Rhus toxicodendron

Dores, desejo de movimento leve.

Agitação.
Simbologia: “caminhar de maneira errada”, não encontrar
apoio seguro, perder o ponto de vista certo.
Tarefa: viver com mais mobilidade, mais flexibilidade;
adaptar-se mais às circunstâncias.
É melhor dançar e pular, em sentido metafórico. Repensar os
próprios pontos de vista.
Primeiros socorros: Rescue Remedy, compressas de arnica,
compressas de acetato de alumínio. Se possível, continuar a
movimentar-se.
19.1.22 Choque traumático

Homeopatia:
Aconitum

Muito medo. O susto está evidente no rosto. Olhos
arregalados e pupilas dilatadas.

Agitação.
Simbologia: choca ser arrancado do próprio trilho (ver
também a seção “19.1.11 Desmaio”).
Tarefa: renunciar a “todo poder”; viver de forma mais
original e criativa.
Primeiros socorros: Rescue Remedy.
19.1.23 Queimaduras

Homeopatia
Apis

Vermelhidão, inchaço e ardência.
Cantharis

Bolhas e ardência.
Simbologia: “Você tinha que queimar [pagar].” Queimar os
dedos.
Tarefa: arder por alguma coisa, no sentido de “entusiasmar-
se”. Depositar toda a sua energia de vida em um projeto. Ser
fogo e chama para alguma coisa. Inflamar-se em relação à
vida.
Primeiros socorros: compressas com a própria urina. Misturar
vinagre e água quente na mesma proporção e aplicar como
compressa.
19.1.24 Luxação

Homeopatia:
Arnica

Qualquer movimento provoca dor intensa.

Medo do toque e da aproximação.
Rhus toxicodendron

Dores dilacerantes. Desejo de leve movimento.

Agitação.
Simbologia: ter aterrissado em local (muito) duro. Ser
comprimido (pela vida).
Tarefa: aterrissar com rapidez e eficácia no terreno (dos
fatos). É preferível ir voluntariamente e com mais dureza de
encontro à realidade. Aceitar a pressão da vida em vez de se
deixar comprimir por ela.
Primeiros socorros: Rescue Remedy; compressas de arnica;
compressas de acetato de alumínio; continuar a mover
delicadamente, se possível.
19.1.25 Constipação em viagens

Homeopatia:
Nux vomica

Evacuação dolorosa sem resultado ou incompleta.
Simbologia: restringir-se na insegurança do estranhamento
em vez de abrir-se a ela. Manter o que já se tem em
segurança. Não querer correr nenhum risco.
Tarefa: melhor ficar em casa, junto ao que é habitual, em vez
de simular coragem. Manter para si, conscientemente, aquilo
de que ainda se precisa.
Primeiros socorros: beber muita água ou suco de maçã,
comer frutas e vegetais crus. Beber Aminas e muita água.
Melhorar a evacuação e o humor!

19.2 Bibliografia
Bein-Wierzbinski, Wibke: Eine kleine Raupe geht auf
Wanderschaft... Und macht viele Bekanntschaften. Ein
neuromotorisches Übungsprogramm für Kinder im
Vorschulbereich und in der Grundschule, Modernes Lernen,
Dortmund, 2008.
Davis, Ronald D.: Legasthenie als Talentsignal. Lernchance
durch kreatives Lesen, Droemer Knaur, Munique, 2001.
Dethlefsen, Thorwald e Dahlke, Rüdiger: Krankheit als Weg.
Deutung und Be-Deutung der Krankheitsbilder, Goldmann,
Munique, 1983. [A Doença como Caminho, publicado pela
Editora Cultrix, São Paulo, 1992.]
Ende, Michael: Momo, Thienemann, Stuttgart, 1973.
Fromm, Erich: Die Furcht vor der Freiheit, dtv, Munique,
1993.
Graf, Friedrich P.: Homöopathie und die Gesunderhaltung von
Kindern und Jugendlichen, Spangsrade, Ascheberg, 2003.
Herscu, Paul: Die homöopathische Behandlung der Kinder,
Kai Kröger, Groβ Wittensee, 1997.
Imhäuser, Hedwig: Homöopathie in der Kinderheilkunde,
Haug/MVS, Stuttgart, 2003.
Johnson, Robert: Bilder der Seele. Traumarbeit und Aktive
Imagination, Irisiana, Munique, 1995.
Kieser, Christiana: Lukas und die Monster unterm Bett. Klopf,
klopf, klopf, ich helfe Dir, Param, Ahlerstedt, 2006.
Kyber, Manfred: Märchen und Tiergeschichten, Komet, Köln,
2006.
____, Die drei Lichter der kleinen Veronika. Roman einer
Kindheit in dieser und jener Welt, Heyne, Munique, 2007.
Liedloff, Jean: Auf der Suche nach dem verlorenen Glück.
Gegen die Zerstörung unserer Glücksfähigkeit in der
frühen Kindheit, C. H. Beck, Munique, 2006.
Miller, William A.: Der Goldene Schatten. Vom Umgang mit
den dunklen Seiten unseer Seele, Irisiana, Munique, 1994.
Mitscherlich, Alexander: Krankheit als Konflikt, Suhrkamp,
Frankfurt, 1966.
Morrison, Roger: Handbuch der Pathologie zur
homöopathischen Differentialdiagnose, Kai Kröger, Groβ
Wittensee, 1997.
Pfeiffer, Herbert, Michael Drescher e Martin Hirte (orgs.):
Homöopathie in der Kinder- und Jugendmedizin, Urban und
Fischer, Munique, 2004.
Phatak, S. R.: Homöopathische Arzneimittelbilder, Urban und
Fischer, Munique, 2005.
Prekop, Jirina: Der kleine Tyrann, Kösel, Munique, 1997.
____, Einfühlung oder Die Intelligenz des Herzens, dtv,
Munique, 2005.
____, Hättest du mich festgehalten... Grundlagen und
Anwendung der Festhalte-Therapie , Goldmann, Munique,
2006.
____, Ich halte dich fest, damit du frei wirst, Kösel, Munique,
2008.
____, Erstgeborene. Über eine besondere
Geschwisterposition, Kösel, Munique, 2008.
Prekop, Jirina e Schweizer, Christel: Kinder sind Gäste, die
nach dem Weg fragen, Kösel, Munique, 2008.
Riemann, Fritz: Lebenshilfe Astrologie, Klett-Cotta, Stuttgart,
2005.
____, Grundformen der Angst. Eine tiefenpsychologische
Studie, Reinhardt, Munique, 2006.
Saint-Exupéry, Antoine de: Der Kleine Prinz, Rauch,
Düsseldorf, 1958.
Sheldrake, Rupert: Der siebte Sinn der Tiere, Fischer,
Frankfurt, 2007.
____, Das schöpferische Universum, Nymphenburger,
Munique, 2008.
Soldner, Georg e Stellmann, Hermann M.: Individuelle
Pädiatrie. Leibliche, seelische und geistige Aspekte in
Diagnostik und Beratung. Anthroposophisch-
homöopathische Therapie, Wissenschaftliche
Verlagsgesellschaft, Stuttgart, 2002.
Tinbergen, Niko e Lis: Autismus bei Kindern, Parey/Blackwell,
Berlim, 2002.

19.3 Publicações de Rüdiger Dahlke


Schwebend die Leichtigkeit des Seins erleben, Schirner,
2009.
Schicksalsgesetze, Goldmann Arkana, 2009.
Die Psychologie des Geldes. Nymphenburger, 2008.
Meine 50 besten Gesundheitstipps. Heyne, 2008. [Minhas
Melhores Dicas de Saúde, publicado pela Editora Cultrix,
São Paulo, 2012.]
Das groβe Buch vom Fasten. Goldmann, 2008.
Der Körper als Spiegel der Seele. Gräfe und Unzer, 2007.
Vom Essen, Trinken und Leben. Com Dorothea Neumayr.
Haug, 2007.
Notfallapotheke für die Seele. Nymphenburger, 2007.
Das groβe Buch der ganzheitlichen Therapien. Integral,
2007.
Depression. Goldmann, 2006. [Depressão, publicado pela
Editora Cultrix, São Paulo, 2009.]
Richtig essen. Knaur, 2006.
Schlaf – die bessere Hälfte des Lebens. Integral, 2005. [O
Sono como Caminho, publicado pela Editora Cultrix, São
Paulo, 2008.]
Worte der Heilung. Schirner, 2005.
Das Gesundheitsprogramm. Hugendubel, 2004. [O Programa
de Saúde de Rüdiger Dahlke, publicado pela Editora Cultrix,
São Paulo, 2007.]
Fasten Sie sich gesund. Hugendubel, 2004. [O Jejum como
Oportunidade de Recuperar a Saúde, publicado pela
Editora Cultrix, São Paulo, 2006.]
Von der Weisheit des Körpers. Knaur, 2004.
Aggression als Chance. C. Bertelsmann, 2003. [A Agressão
como Oportunidade, publicado pela Editora Cultrix, São
Paulo, 2005.]
Krankheit als Symbol. C. Bertelsmann, 2000. [A Doença
como Símbolo, publicado pela Editora Cultrix, São Paulo,
2000.]
Krankheit als Sprache der Seele. Goldmann, 1999. [A Doença
como Linguagem da Alma, publicado pela Editora Cultrix,
São Paulo, 1999.]
Lebenskrisen als Entwicklungschancen. Goldmann, 1999. [As
Crises da Vida como Oportunidades de Desenvolvimento,
publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 2005.]
Mandalas der Welt. Hugendubel, 1985. [Mandalas: Formas
que Representam a Harmonia do Cosmos e a Energia
Divina, publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 1991.]
Das Arbeitsbuch zur Mandala-Therapie . Hugendubel, 1999.
Entschlacken – Entgiften – Entspannen. Hugendubel, 2003.
[Desintoxicar e Relaxar, publicado pela Editora Cultrix, São
Paulo, 2006.]
Frauen-Heil-Kunde. Com Margit Dahlke e o prof. dr. Volker
Zahn. C. Bertelsmann, 1999 (brochura), e Goldmann (livro
de bolso). [A Saúde da Mulher, publicado pela Editora
Cultrix, São Paulo, 2005.]
Gewichtsprobleme. Knaur, 1989.
Der Weg ins Leben. Com Margit Dahlke e o prof. dr. Volker
Zahn. C. Bertelsmann, 2001 (brochura), e Goldmann (livro
de bolso). [O Caminho para a Vida, publicado pela Editora
Cultrix, São Paulo, 2005.]
Verdauungsprobleme. Com o dr. Robert Höβl. Knaur, 1990.
Herz(ens)probleme. Knaur, 1990.
Die Psychologie des blauen Dunstes. Com Margit Dahlke.
Knaur, 1989.
Reisen nach Innen. Hugendubel, 1994. [Meditação Orientada,
publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 2007.]
Das senkrechte Weltbild. Com Nicolaus Klein. Hugendubel,
1990.
Krankheit als Weg. C. Bertelsmann, 1983. [A Doença como
Caminho, publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 1992.]
Habakuck und Hibbelig. Heyne, 1994.
Woran krankt die Welt? Riemann, 2001. [Qual a Doença do
Mundo?, publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 2004.]
Meditationsführer. Com Margit Dahlke. Schirner, 1999.
Mandala-Malblöcke zum Arbeitsbuch. 3 volumes.
Hugendubel, 1999.
Mandala-Malblock. Edition Neptun, 1984.
Die Säulen der Gesundheit. Com Baldur Preiml e Franz
Mühlbauer. Goldmann (livro de bolso).
 
Meditações
 
“Heil-Meditationen”, pela editora Goldmann-Arkana-Audio
(CD/MC): Allergien, Angstfrei leben (também em CD com
guia), Ärger und Wut, Bewusst Fasten, Bewusstseinsfeld,
Den Tag beginnen, Depression, Elemente-Rituale, Die 4
Elemente, Energiearbeit, Entgiften – Entschlacken –
Loslassen (também em CD com guia), Frauenprobleme,
Ganz entspannt, Gesetz der Anziehung, Gesetz der
Polarität, Hautprobleme, Heilungsrituale, Herzensprobleme
(hoher Blutdruck und Infarkt), Innerer Arzt, Kopfschmerzen,
Krebs, Lebenskrisen als Entwicklungschance,
Leberprobleme, Mandalas – Wege zur eigenen Mitte, Mein
Idealgewicht (também em CD com guia), Naturmeditation,
Niedriger Blutdruck, Partnerbeziehungen, Rauchen
(também em CD com guia), Rückenprobleme,
Schattenarbeit, Schlafprobleme, Schwangerschaft und
Geburt, Selbstheilung, Selbstliebe, Vom Stress zur
Lebensfreude, Sucht und Suche, Tiefenentspannung,
Tinnitus und Gehörschäden (também em CD com guia),
Traumreisen, Verdauungsprobleme, Visionen.
 
“Kindermeditationen”, pela editora Schirner (CD):
Märchenland, Ich bin mein Lieblingstier.
 
Meditações pela editora Integral (CD): Erquickendes
Abschalten mittags und abends, Schlaf – die bessere Hälfte
des Lebens, Leichtigkeit des Schwebens, Schutzengel-
Meditationen, 7 Morgenmeditationen, Die Heilkraft des
Verzeihens.
 
Outros CDs: Die Psychologie des Geldes (Nymphenburger),
Notfallapotheke für die Seele (Langen/Müller), Eine Reise
nach Innen (Ariston).
 
Palestras e workshops (MC, CD, vídeo, DVD)
 
Aggression als Aufgabe und Chance, Anfang und Ende,
Angst, Bedeutung der Rituale in Vergangenheit und
Gegenwart, Depressionen, Der verbundene Atem, Deutung
und Bedeutung von Krankheitsbildern, Die archetypische
Bedeutung von Wasser und Kristallsalz, Die Leichtigkeit des
Schwebens, Die Medizin der Zukunft, Die Psychosomatik
von Krebs, Die Reifungskrisen des Lebens, Entgiften –
Entschlacken – Loslassen, Fasten, Geführte
Phantasiereisen, Geleitete Meditationen, Gesund sein –
ganzheitlich leben, Gesunder Egoismus – gesunde
Aggression, Gesundheitliche Krisen, Gewichtsprobleme,
Heilung und Meditation, Homöopathie, Kopfschmerzen,
Krankheit als Sprache der Seele, Krankheit als Symbol,
Krankheitsdeutung, Lebenskrisen als Entwicklungschance,
Mandalas als Ausdruck des göttlichen Selbst, Moderne
Reinkarnationstherapie, Partnerschaft als Chance und
Aufgabe, Psychotherapie und Reinkarnationstherapie, Reise
nach Innen, Säulen der Gesundheit, Sucht und Suche,
Übergänge im Leben, Wege der Heilung, Woran krankt die
Welt?, Wunden des Weiblichen (zu beziehen über
Auditorium-Netzwerk, Habspergstraβe 9a, D-79379
Müllheim-Baden, Tel.: +49 7631 170743, Fax: +49 7631
170745, info@auditorium-netzwerk.de).
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[1]. Os dados bibliográficos de todas as publicações mencionadas neste livro
encontram-se na Bibliografia (19.2) e na lista com as publicações de Rüdiger
Dahlke (19.3). [O Caminho para a Vida, publicado pela Editora Cultrix, São Paulo,
2005] [N.T.]
[2]. A Doença como Caminho, de Thorwald Dethlefsen e Rüdiger Dahlke,
publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 1992.] [N.T.]
[3]. Publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 2005. [N.T.]
[4]. Publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 2000. [N.T.]
[5]. Em alemão: “Leider Ohne Geld Geboren”. [N.T.]
[6]. Por exemplo, junto à empresa Colostral.
[7]7. Os sabores “frutas silvestres”, “biobanana” e “chocolate com nozes”
mostraram-se eficazes para crianças.
[8]. Outras informações e uma descrição detalhada das relações bioquímicas
podem ser encontradas em Dahlke-Info, que você pode solicitar gratuitamente e
cancelar a qualquer momento em www.dahlke.at. Além disso, nesse site estão
disponíveis todos os artigos anteriores, bem como o texto “Essen für gute
Stimmung” [Alimento para o Bom Humor], de 2007, sobre o fenômeno Aminas.
[9]. O Programa de Saúde de Rüdiger Dahlke, publicado pela Editora Cultrix, São
Paulo, 2007. [N.T.]
[10]. Fabricante de cadeirinhas e carrinhos para bebês. [N.T.]
[11]. Obviamente, não se trata aqui daquelas estratégias para escapar às
determinações do destino, que se infiltraram de várias formas na astrologia; ao
contrário, trata-se daquele método representado, por exemplo, no centro médico
de Johanniskirchen, que destaca as possibilidades de desenvolvimento e
demonstra as possibilidades de apoio que se baseiam no conhecimento dos
princípios primitivos.
[12]. As Crises da Vida como Oportunidades de Desenvolvimento e Qual é a
Doença do Mundo?, publicados respectivamente em 2005 e 2004 pela Editora
Cultrix, São Paulo. (N.T.)
[13]. Program for International Student Assessment: Programa Internacional de
Avaliação de Alunos. [N.T.]
[14]. Por exemplo, “Märchenland” [País dos Contos de Fadas] (Goldmann-Arkana-
Audio) e “Ich bin mein Lieblingstier” [Sou Meu Animal Preferido] (Schirner).
[15]. Na Alemanha, comemora-se o dia de São Nicolau (6 de dezembro) no
Advento (período de quatro semanas que antecedem o Natal). [N.T.]
[16]. Cf. Friedrich P. Graf: Homöopathie und die Gesunderhaltung von Kindern und
Jugendlichen [Homeopatia e manutenção da saúde em crianças e adolescentes],
capítulos 5-13.
[17]. Referência ao personagem da saga Os Nibelungos. [N.T.]
[18]. Cf. Pfeiffer/Drescher/Hirte (orgs.): Homöopathie in der Kinder- und
Jugendmedizin [Homeopatia na Pediatria].
[19]. “O nome é um presságio.” Em alemão, o termo para catapora é
Windpocken, que literalmente significa “varíola levada pelo vento”. [N.T.]
[20]. Em caso de interesse maior pelo tema “vacinação”, remete-se ao detalhado
capítulo no livro A Agressão como Oportunidade (Editora Cultrix, São Paulo, 2005)
e, em relação ao pânico causado pela gripe aviária, remete-se à circular Dahlke-
Info (www.dahlke.at). Nas edições mais antigas, a gripe aviária já havia sido
revelada em seu “início” como comédia-farsa.
[21]. Cf. “Nutzen von Vorsorgeuntersuchungen zunehmend fraglich!”, in:
Deutsches Ärzteblatt 2007 [“O uso de exames profiláticos é cada vez mais
questionável!”, in: Revista alemã de medicina] 104 (25): A 1804-7.
[22]. A Doença como Símbolo, publicado pela Editora Cultrix, São Paulo, 2000.
(N.T.)
[23]. Isso se refere à terapia da sombra, com a qual existem, a esse respeito,
muitas experiências positivas.
[24]. Marca de desinfetante germicida. [N.T.]
[25]. Uma lista detalhada de cada alérgeno e seu significado pode ser
encontrada em A Doença como Símbolo [Editora Cultrix, São Paulo, 2000], obra
de consulta dos significados e das interpretações das doenças da alma.
[26]. Em alemão, “eine harte Nuss”, que equivale à expressão “osso duro de
roer” em português. [N.T.]
[27]. Em alemão: Kopfgelenk-induzierte Symmetrie-Störung. [N.T.]
[28]. Essa doença rara encontra-se na obra de consulta A Doença como Símbolo.
[29]. “Schattenarbeit” (Goldmann-Arkana-Audio).
[30]. Dahlke/Preiml/Mühlbar: Die Säulen der Gesundheit [Os Pilares da Saúde].
[31]. A esse respeito, exercícios adequados para crianças podem ser consultados
no livro Eine kleine Raupe geht auf Wanderschaft... [Uma Pequena Lagarta sai
para Caminhar], da doutora Wibke Bein-Wierzbinski.
[32]. No livro Eine kleine Raupe geht auf Wanderschaft... [Uma Pequena Lagarta
sai para Caminhar], da doutora Wibke Bein-Wierzbinski, são descritos exercícios
adequados às crianças para recuperar o processo de endireitamento.
[33]. Mais a respeito no livro Der Körper als Spiegel der Seele [O Corpo como
Espelho da Alma].
[34]. Mais informações no CD “Das Bewusstseinsfeld” [O Campo da Consciência]
(Goldmann-Arkana-Audio) e no livro Die Schicksalsgesetzte [As Leis do Destino].
[35]. Programa Internacional de Avaliação de Estudantes. [N.T.]
[36]. Em alemão, a palavra Buchstabe, que significa “letra”, deriva do termo
Buchenstab, que literalmente pode ser traduzido como “haste de faia”. [N.T.]
[37]. A esse respeito, ver o livro Die Schicksalsgesetze [As Leis do Destino].
[38]. Por Margit Dahlke, segundo uma ideia de Martin Schulman.

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