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Plano de Aula – Brasil III

1) IDENTIFICAÇÃO
Colégio [...]
Disciplina: História
Carga Horária – 50 min
Série – 3ª Série EM
Responsável Daniel da Silva Santos Rosa

2) TEMA
História do Brasil: a Primeira República (1889-1930)

3) TÍTULO DA AULA
Para além do voto: o povo e as outras formas de participação política na Primeira República.

4) OBJETIVOS
I. GERAL
Reconhecer que a participação política atravessava o cotidiano das classes populares,
não se restringindo apenas aos momentos de eleições.
II. ESPECÍFICOS
i. Distinguir, a partir das reflexões de Ângela Alonso e Mharta Abreu, as
diferentes implicações de se usar os termos Primeira República ou República
Velha para referir-se ao período de 1889-1930.
ii. Diferenciar o povo das estatísticas, das eleições e das ruas através da
exposição do texto “Os três povos” de José Murilo de Carvalho.
iii. Analisar, por meio do texto de Sidney Chalhoub, como classes pobres e
“classes perigosas”, nesse período da História, foram termos aproximados
pelos discursos.
iv. Identificar, a partir da exposição feita em sala, as diferentes formas de
participação política do povo.
v. Refletir, através de um texto sintético, produzido individualmente, a
importância de serem reconhecidas as diferentes formas de manifestação
política na Primeira República e a sua relação com a atualidade.
5) JUSTIFICATIVA
Esta aula tem o interesse de expor formas de participação política que extrapolam os canais
institucionais. Uma visão que reduz a participação popular ao voto parece bastante corrente na
sociedade brasileira. Entretanto, essa sociedade se mobiliza por canais não convencionais e é papel
da História resgatar essas ações para que uma visão do brasileiro apolítico, que não se organiza, não
participa efetivamente da política ou não tem interesse por ela, seja desmistificado a partir do
reconhecimento das diversas formas que essa intervenção política pode acontecer.

6) METODOLOGIA
I. O tema e os subtópicos serão esquematizados no quadro e a explicação decorrerá na
forma de uma aula expositiva.

7) SEQUÊNCIA DIDÁTICA
I. O CONTEXTO
A aula deve ser iniciada com a explicação do contexto da Primeira República. Os
acontecimentos precisam ser situados no tempo e no espaço para que, assim, os estudantes
percebam melhor as relações possíveis entre os eventos a serem explicados e o que se passava nesse
período da História. Para isso, podemos nos apropriar do texto “O prelúdio republicano, astúcias da
ordem e ilusões do progresso” de Nicolau Sevcenko (1999).

i. Internacional
Do contexto internacional, podemos destacar os eventos que acarretam o que Sevcenko
(1999) chama de um “processo dramático de transformação” dos hábitos cotidianos. Nesse sentido,
ganha espaço na aula o processo de expansão capitalista e a Segunda Revolução Industrial – a
Revolução Científico-Tecnológica. Assim, surgem novas formas de energia – podem ser elencadas
a importância da eletricidade e dos derivados do petróleo - a produção industrial avança junto à
metalurgia e à indústria química; e, chegando à questão da saúde, tão proeminente nesse período,
pode-se falar da preocupação “sobre o controle das moléstias, a natalidade e o prolongamento da
vida” (SEVCENKO, 1999, p. 9). A questão da higiene e dos novos hábitos não são apenas uma
questão nacional e os avanços tecnológicos buscam suprir os novos mercados e as novas
necessidades – nesse ponto podemos falar, como indica o autor citado, o avanço capitalista sobre
áreas já descolonizadas, gerando o fenômeno do neocolonialismo ou imperialismo – equivalentes na
linguagem do autor.

ii. Nacional
Seguindo o caminho das ideias de Sevcenko (1999), podemos, assim, inserir a América
Latina nessa nova lógica internacional através da ação do império britânico junto ao brasileiro
contra “a resistência dos líderes tradicionalistas” do Uruguai, Argentina e Paraguai na segunda
metade do século XIX (p. 13). Logo depois, pode-se transicionar para o contexto republicano
atraindo a atenção para o impacto da Guerra do Paraguai para a desestabilização institucional do
Império Brasileiro, que, entrando numa crise de endividamento, vê as bases do sistema ruírem. Os
cafeicultores, classe enriquecida nesse período, juntam-se a militares e políticos republicanos para
decretar o fim do Império e o alvorecer da República. Entretanto, se essas mudanças institucionais
sugeriam a modernização do país, Sevcenko deixa claro como a força tem de ser utilizada para
assegurar que a modernidade das elites capitalistas alcance o interior do país, nisso se inclui o
desastre da Guerra de Canudos (1893-1897), evidenciando que o que não se alcança pelas ideias se
destrói pelas armas, que o processo de modernização não é pacífico e as ideias de avanço podem ser
relativizadas. O ambiente internacional e nacional interage para que o tradicionalismo seja visto
como atraso e as novas tecnologias, ironicamente, interpretadas como a salvação dessa humanidade
ocidental.

II. CATEGORIAS E CONCEITOS


i. República Velha e Primeira República
Auxiliam-nos na tarefa de entender e explicar esses conceitos, as autoras Ângela de Castro
Gomes e Martha Abreu (2009). Neste momento serão reveladas as características atreladas à antiga
concepção de República Velha. Primeiro, deve-se notar que esse termo foi forjado pelos “ideólogos
autoritários das décadas de 1920/30” (p. 1). Criava-se o Novo determinando-se o que era Velho e,
para esses ideólogos, a República que existia entre 1889 e 1930 era definitivamente Velha. Segundo
as autoras, nesse momento a República Velha “passa a ser avaliada como um grande fracasso e
equívoco”, (ABREU; GOMES, 2009, p. 2) o lugar do atraso e, se temos em mente o contexto já
avaliado e explicado dos supostos avanços da tecnologia e da civilização, podemos compreender o
teor pejorativo que carrega o adjetivo Velho e, logo, o termo República Velha. Assim, podemos
indicar Primeira República como termo mais apropriado para esse período que se inicia em 1889 e
sofre uma ruptura nos anos 30 do século XX.
ii. Os Três Povos da Primeira República
Aproximando-se do tema da participação política, podemos destacar a categoria de análise
de José Murilo de Carvalho (2003) para compreender os possíveis “povos” da Primeira República.
Assim, teríamos o primeiro povo, o Povo das Estatísticas. Este, o autor considera aquele que era
“revelado pelos números censitários, o povo civil, a população em todas as dimensões de sua
existência” (p. 98). O segundo é o Povo das Eleições, sendo este o povo “que aparecia nos
momentos legalmente determinados para a manifestação política, [ou seja] as eleições” (p. 98). O
terceiro e último era o Povo da Rua. É sobre este que recai o enfoque da aula. Se a primeira
categoria, determinando características relacionadas ao sexo, cor e níveis de alfabetização, não
bastava para determinar o povo político, a segunda categoria nos dá a falsa impressão de um povo
alienado, participante apenas pelo voto e alienado pelas condições impostas a esta participação. O
Povo da Rua, pelo contrário, era o “povo ativo, que agia por conta própria, direta ou indiretamente
motivado pela política” (p.98), relativizando as afirmações sobre uma República Velha onde não
havia espaço para uma verdadeira participação popular.
iii. Classes perigosas
Este termo de época, adotado no artigo de Sidney Chalhoub (1990), indica a aproximação
semântica que faziam os contemporâneos entre os termos “classes pobres” e “classes perigosas”,
denotando aos populares o sentido de desordem, perigo e fonte de mazelas sociais. O uso do termo
remonta ao que o autor chama de “guerra santa contra os vadios” (p. 6). Para a classe política e as
elites, o vício e o ócio – aspectos concebidos como barreiras ao avanço da civilização, pois danosos
ao recrutamento da mão de obra - degeneram a condição do pobre e, sem que houvesse uma
delimitação restrita de “classes perigosas”, os pobres parecem em geral caber nessa ampla
categoria.

III. TEMA
i. As diferentes formas de participação política na Primeira República.
A partir da exposição do contexto nacional e internacional da Primeira República, da
explicação dos conceitos que se relacionam a esse contexto, neste momento da aula podemos
avançar para o ponto central deste plano: as formas de participação popular na primeira república.
Para Gomes e Abreu (2009), os ideólogos da Era Vagas buscaram “abarcar e esgotar a
experiência política, social e cultural da Primeira República” (p. 4). Para isso, tiveram de dar
enfoque ao momento das eleições e “ignorar uma série de experiências de mobilização e
organização de atores coletivos” (p. 4). Aqui podemos lembrar de Carvalho (2003) e assumir que
esses ideólogos priorizaram em suas narrativas o espaço do Povo das Eleições, ignorando as ações
do Povo das Ruas.
Mas, se também adotássemos essa perspectiva, priorizando o palco das eleições e resumindo
toda a participação política das classes pobres ao chamado voto de cabresto, como poderíamos
abordar, por exemplo, as lutas populares que ocorreram nesse período e demonstravam
descontentamento político? Teríamos de desconsiderar levantes e manifestações públicas de
insatisfação como meios de interferir no jogo político da sociedade.
Assim, os autores que escolhemos para esse plano delineiam um panorama favorável a uma
outra perspectiva da História, mais sensível às mobilizações populares como formas de participação
política. Chalhoub (1990), por exemplo, pode auxiliar-nos nesse trabalho examinando a ação das
chamadas “classes perigosas” e avaliando os cortiços como palco de luta. Esses estabelecimentos
se espalhavam pelo Rio de Janeiro desde a segunda metade do século XIX, ligados ao aumento de
libertos na cidade e de escravos que viviam fora das dependências de seu proprietário legal. O autor
sugere que a intervenção do governo contra essas habitações era mais que uma ação técnica de
urbanização, “ao demolir cortiços e modificar traçados urbanos - ou seja, ao procurar mudar o
sentido do desenvolvimento urbano -, os administradores da cidade atacavam também a memória
histórica do movimento pela liberdade" (CHALHOUB, 1990, p. 10). Os cortiços eram lugares de
resistência e símbolos da luta dos escravos pela liberdade. Entretanto, essas intervenções que se
estenderam até a Primeira República e, então, vinham munidos de uma narrativa cientificista de
intervenção técnica do perímetro urbano para melhores condições de higiene e avanço da
civilização, não vieram sem resistência e, ainda que possivelmente desorganizada, a população agia
e resistia. Até porquê se não resistissem por que o Estado preocupar-se-ia de montar um cerco
policial para destruir um cortiço?
Outros exemplos interessantes da existência e importância da mobilização popular nesse
período podem ser trazidos através do texto de José Murilo de Carvalho (2009). Para esse autor a
atuação do povo das ruas “nem sempre tinha consequência imediata para o sistema político, mas no
mínimo denunciava suas fissuras e limitações (CARVALHO, 2009, p. 107). Assim, em um
momento de racionalização e secularização da vida, o povo resistia na manutenção dos estilos
tradicionais de vida ou ao menos para evitar a superexploração da força de trabalho que
acompanhava o progresso da industrialização e urbanização. Como exemplo dessas ações
populares, José Murilo de Carvalho elenca a Revolta da Vacina, em 1904, a Revolta da Chibata, em
1910, as greves de 1917-19, o movimento do Contestado (1911-15) e o do Juazeiro, iniciado no
Império e findado na Primeira República.
Todos esses exemplos podem ser trabalhados em uma sequência de aulas posteriores. Nesta,
o interesse é apenas o apanhado geral do contexto histórico em que se passou a Primeira República
e os movimentos políticos com participação popular nesse período. Assim, demonstrando que,
muito distante da concepção de uma República Velha e de um povo apolítico, o que temos é um
povo que se mobiliza contra os avanços científicos desenfreados que ignoravam as questões sociais
do povo, a suas vivências, as suas tradições e sua dimensão humana, esta que parece ser ignorada
em diversos momentos em que se relatam os confrontos com o Estado.

8) RECURSOS DIDÁTICOS
I. Quadro e pincel para quadro branco

9) AVALIAÇÃO
I. Elaboração de um texto sintético que responda à questão: o povo brasileiro na
Primeira República exercia formas de participação política? E hoje, esse povo age
politicamente?
10) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARVALHO, José Murilo de. Os Três Povos da República. In. Revista USP, São Paulo,
n.59, p. 96-115, setembro/novembro, 2003.
CHALHOUB, Sidney. “Classe perigosas”. In. Trabalhadores, São Paulo, n. 6, p. 2-22,
1990.
GOMES, Ângela de Castro; ABREU; Martha. A nova “velha” República: um pouco de
história da historiografia. Revista Tempo, Rio de Janeiro, n. 26, jan. de 2009. Disponível em
https://www.scielo.br/j/tem/a/j6CdLTMjjjVhZz7SBTNXQqJ/?format=pdf&lang=pt, acesso
em 17 mai. 2022.
SEVCENKO, Nicolau. O prelúdio republicano, astúcias da ordem e ilusões do progresso. In.
________. História da Vida Privada no Brasil República: da Belle Époque à Era do rádio.
São Paulo: Companhia das letras, 1999, vol. 3, p. 7-48.

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