Revista Brasileira de Meteorologia, v.19, n.

1, 1-4, 2004

ERROS NA RADIAÇÃO REFLETIDA PELA SUPERFÍCIE MEDIDA

EM PIRANÔMETROS INVERTIDOS

ANICE GARCIA1 e ROMISIO G.B. ANDRÉ2

Faculdade de Agronomia Dr. Francisco Maeda - FAFRAM
1

Rodovia Jerônimo Nunes Macedo, Km 01 Ituverava - SP

2
Laboratório de Engenharia e Exploração de Petróleo - UENF
Rodovia Amaral Peixoto, km 164 - Imboassica - 27.973 - 070 - Macaé - RJ
E-mail: anice@onmail.com, brromisio@lenep.uenf.br

RESUMO
O objetivo deste trabalho foi avaliar medições de radiação refletida, obtidas de piranômetros, com e sem
proteção e, conseqüentemente, sua influência sobre o albedo. O ensaio foi conduzido durante o inverno
de 2000, na Estação Agroclimatológica da FCAV/ UNESP - Campus de Jaboticabal. Foram instalados
piranômetros, lado a lado, um deles, modelo Engespaço (Eng) e outro modelo Kipp & Zonen (Kipp) utilizado
como referência, todos faceados para baixo, sobre extensa área coberta com grama batatais. O cone protetor foi
construído a partir de um balde plástico, cortado abaixo do meio em relação à sua altura, pintado internamente
de tinta preta fosca e externamente de tinta branca brilhante, com a finalidade de minimizar reflexões internas.
Foram comparados dados obtidos nas seguintes situações: a) os 2 piranômetros sem o cone protetor; b) os
2 piranômetros com o cone protetor e c) um piranômetro sem o cone protetor e outro com o cone protetor.
O piranômetro da Engespaço mostrou resultados semelhantes aos do piranômetro da Kipp & Zonen, quando
na mesma situação (ambos protegidos ou ambos sem proteção). Os valores do albedo variaram de 0,19 para
o caso sem proteção para 0,12 para instrumentos protegidos. Os resultados indicam que medidas de radiação
refletida, feitas sem proteção nos instrumentos superestimam os valores do albedo. Sugere-se a aplicação da
metodologia em outras superfícies nesta área de estudo, para apoiar sua validação.
Palavras-chave: albedo, piranômetro, cone protetor.

ABSTRACT: ERRORS IN THE SURFACE REFLECTED SOLAR RADIATION MEASURED BY

INVERTED PYRANOMETER
This work was carried out during July 2000, in Jaboticabal, SãoPaulo State, Brazil. Measurements of reflected
radiation were made near the center of a grass field by using two pyranometer models: (Engespaço and Kipp-
Zonen). One pyranometer was eqquipped with a cylindrical shade that prevented light form entering the bulb
above the plane of the sensing surface. The other inverted pyranometer was unshaded. Comparisons were
made in three situations: a)both pyranometers without protection; b) both pyranometers with protection; and
c) one pyranometer without protection and the other one with protection. The two pyranometers showed similar
results when used in the same condiction. The albedo values ranged from 0.19 for the unshaded instruments to
0.12 for the shaded instruments. The results showed that unshaded instruments overestimate the albedo.
Key-words: albedo, pyranometer, cylindrical protector.

1. INTRODUCÃO devido a 2 principais fatores: aos diferentes ângulos a que

O albedo (α) é uma medida adimensional
correspondente à percentagem da radiação solar incidente que é
refletida pela superfície, calculado a partir de dados de radiação
solar refletida e global (incidente), obtidos simultaneamente
com piranômetros. O albedo de uma superfície varia com as
características da mesma e é de fundamental importância para a
quantificação do balanço de radiação à superfície.
Segundo Robinson (1966), os piranômetros quando
utilizados na posição invertida para obtenção da radiação
refletida, inserem nas medidas algumas fontes de erros
estão submetidas as radiações global e refletida durante as
medições e à diferente composição espectral dessas radiações
(enquanto a refletida é quase que totalmente difusa, a global
é parcialmente direta e parcialmente difusa). O mesmo autor
sugere que para evitar complicadas correções, os instrumentos
deveriam ser acoplados com uma cobertura que fosse o menos
espectralmente seletiva possível. A necessidade de utilização
de proteção em piranômetros invertidos foi observada também
por Brown et al. (1970), os quais concluíram que instrumentos
não protegidos registraram valores de radiação refletida
superestimadas. Rosenberg et al. (1983), ao apresentar a
2
Erros na radiação refletida pela superfície medida em piranômetros invertidos
instrumentação para medir radiação refletida, observam que o
sensor deve ser protegido para limitar o campo de visão somente
para a superfície de interesse, de outro modo o instrumento terá
uma visada muito ampla.
Contudo, a utilização de piranômetros instalados
invertidos, sem a utilização de uma proteção, é frequente
em pesquisas onde se pretende medir a radiação refletida e,
portanto, o albedo da superfície.
O fato de se utilizar um cone protetor para ajudar na
captação da radiação solar refletida tem sido discutido mais
recentemente, pois o instrumento sem proteção recebe além da
radiação refletida diretamente, as difusões inerentes ao mastro
e à superfície lateral do próprio instrumento. Com a utilização
do cone protetor o feixe refletido nas formas direta e difusa é
direcionado ao sensor e as radiações que, por ventura, estejam
fora do “ ângulo de visão” do instrumento são absorvidas na
superfície negra interna do cone.
Quanto à altura do cone, não há na literatura uma
especificação para tal. Entretanto, este não sendo muito
profundo não haverá problemas de minimização da radiação
absorvida. No caso a altura do cone foi de 12 cm, que
corresponde a 5 vezes a altura do instrumento.
Este trabalho teve por objetivo a avaliação de medidas
de radiação refletida, obtidas em piranômetros, com e sem
proteção e, consequentemente, sua influência sobre o albedo
da superfície considerada.
2. MATERIAL E MÉTODOS
O ensaio foi conduzido durante o inverno de 2000,
na Estação Agroclimatológica da FCAV/ UNESP - Câmpus
de Jaboticabal (Lat. 21o15’22”; Long. 48o18’58” W; Alt. 595
m). O clima, segundo a classificação de Köppen, é do tipo
subtropical com inverno seco (Cwa), com precipitação média
anual de 1400 mm.
Antes da instalação dos piranômetros no campo,
todos os instrumentos foram comparados tomando-se como
referencia um piranômetro da Kipp & Zonen.
Foram instalados dois piranômetros, lado a lado, um
deles, modelo Engespaço (Eng) e outro modelo Kipp & Zonen
(Kipp). Os piranômetros foram instalados com o elemento
sensor voltado para a superfície, a qual era coberta sobre
extensa área com grama batatais em pleno desenvolvimento
vegetativo. Durante o período de condução do experimento não
ocorreram precipitações e a área não foi irrigada.
O cone protetor foi construído a partir de um balde
plástico, cortado abaixo do meio em relação à sua altura,
pintado internamente com tinta preta fosca com a finalidade
de minimizar reflexões internas e externamente com tinta
branca brilhante (Figura 1). O modelo do protetor foi adaptado
levando-se em conta a forma cônica das descrições e figuras
do protetor sugerido por Brown et al. (1970) e Rosenberg et
al. (1983).
Foram comparados dados obtidos nas seguintes
situações: a) os 2 piranômetros sem o cone protetor; b) os 2
piranômetros com o cone protetor e c) um piranômetro sem o
cone protetor (Eng) e outro com o cone protetor (Kipp).
O albedo (α) foi calculado pela razão entre a radiação
solar refletida (Rr) e a radiação global incidente (Rs), sendo
que esta última foi obtida de um piranômetro LICOR da
estação automática do Campus.
Para as medições foi utilizado um sistema automático
de aquisição de dados (Campbell Sci.) modelo 21X,
programado para coletar dados a cada segundo e armazenar
médias a cada 10 minutos.
Para a análise dos dados, foram escolhidos dias
típicos, com o mínimo possível de nebulosidade, ou seja, dias
considerados de céu-claro.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Figura 2 mostra a variação diária da radiação solar
refletida, obtida com os dois piranômetros sem proteção, para
dias com céu claro.
Na Figura 2a é apresentada a variação durante o dia
da radiação global e, na Figura 2b, a regressão linear entre os
dados obtidos nos dois piranômetros. Nota-se que a correlação
é ótima entre os dados, com um coeficiente de determinação
alto ( R2 = 0,99), o que indica que os instrumentos estão
em consonância, mas, os valores da radiação refletida são
elevados. Neste dia, nos dois piranômetros, a radiação
refletida ( Rr ) às 13 h (horário de maior radiação solar global)
representou 16% da radiação solar global (Rs) (Fig. 2c) e os
valores médios diários do albedo foram semelhantes (Fig. 2d),
sendo 0,19 (Kipp) e 0,18 (Eng).
Valores de albedo comumente associados à grama
estão em torno de 0,19, porém, foi salientado anteriormente,
esses valores normalmente são obtidos com a utilização de
piranômetros instalados invertidos, sem a utilização de um
cone protetor.
A Figura 3a mostra a variação diária da radiação
refletida, obtida com os dois piranômetros com proteção,
para um dia com céu claro. A correlação entre os dados
obtidos pelos dois piranômetros (Fig. 3b) é muito boa, com
coeficiente de determinação elevado (R2= 0,93). Às 13 h em
um deles (Engespaço) ( Rr ) representava cerca de 8,5% de
(Rs) e o outro (Kipp) ( Rr ) representava cerca de 10% de
(Rs) (Fig. 3c). Com relação ao albedo praticamente não há
discrepância entre os resultados, sendo as médias diárias de
0,10 utilizando-se o (Kipp) e 0,09 utilizando-se o (Eng).
Nas figuras 2 e 3 pode-se constatar que o piranômetro
da Engespaço mostrou resultados semelhantes aos do
piranômetro da Kipp & Zonen, quando na mesma situação
(ambos protegidos ou ambos sem proteção). Baseados nessa
premissa, o cone protetor foi retirado de um dos instrumentos
(Eng) e mantido no outro (Kipp), realizando-se as mesmas
medições em um dia claro.
Na Figura 4a é apresentada a variação diária da
radiação refletida, em que um dos piranômetros foi mantido
com o cone protetor (Kipp) e o outro sem proteção (Eng.). A

Anice Garcia e Romisio G. B. André
sensor
mastro
cone
vista de frente
vista lateral
Figura 1: Representação esquemática de piranômetro invertido,
instalado com cone protetor.
Figura 2: Variação diurna da radiação refletida (Rr), com os
dois instrumentos sem proteção (a); regressão obtida entre
os dados dos dois instrumentos nessas condições (b); valores
médios horários da radiação refletida e da radiação solar global,
Rs (c); valores médios horários do albedo,α (d).
Figura 3: Variação diurna da radiação refletida ( Rr ), com
ambos instrumentos com cone protetor (a); regressão obtida
entre os dois instrumentos nessas condições (b); valores
médios horários da adiação refletida e da radiação solar global,
Rs (c); valores médios horários do albedo, α (d).
3
correlação ainda é muito boa (r2=0,93) mas, nota-se que
a radiação refletida no instrumento sem proteção atinge
valores bem mais elevados que naquele com proteção (Fig.
4b), cerca de 40% maior, o que sugere que as medidas feitas
sem proteção aproveitam não somente a radiação refletida
mas, também, a difusão no espectro da radiação direta e
difusa, superestimando os valores de radiação refletida,
como sugerido por Robinson (1966) e Brown et al. (1970).
Nota-se que às 13 h, horário de maior radiação solar global
(Rs), a radiação refletida (Rr), medida pelo instrumento sem
o cone protetor, chega a representar 16% da Rs, enquanto
que Rr medida pelo instrumento com o cone representa
apenas 9% da Rs (Fig. 4c). Com relação aos valores de albedo
(Fig. 4d), quando comparados os valores obtidos de um
instrumento com proteção (Kipp) com outro sem (Eng) nota-
se uma evidente discrepância entre os resultados, com valores
médios diários de 0,12 obtidos com os dados do piranômetro
protegido (Kipp) e 0,19 obtidos com os dados do piranômetro
sem proteção (Eng).
Garcia et al. (2000) também observaram valores de
albedo menores do que o normalmente citado em literaturas,
ao utilizar o cone protetor num piranômetro instalado sobre
cultura de feijão.
Para dar suporte aos resultados mostrados anterior-
mente, na Tabela 1 são apresentados os valores médios diários
da radiação refletida e da radiação solar global, para os dias
estudados.
Pelos valores da Tabela 1 nota-se que enquanto
os piranômetros estão na mesma situação com relação ao
cone, ambos com o cone ou ambos sem o cone, a diferença
de medição entre eles é pequena. Porém, quando um deles
está com o cone protetor e o outro sem, a radiação refletida
por aquele que está sem o cone é cerca de 40% maior que o
outro.
Figura 4. Variação diurna da radiação refletida ( Rr ), com
um instrumento com o cone protetor e outro sem o cone (a);
regressão obtida entre os dois instrumentos nessas condições
(b); valores médios horários da radiação refletida e da radiação
solar global, Rs (c); valores médios diários do albedo, α (d).
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Erros na radiação refletida pela superfície medida em piranômetros invertidos

(KIPP)
( RR) ( RR) (ENG.) (RS)
DIA JULIANO -----------------------------------------------------(MJ/M .DIA) --------
2

------------------------------------------
178(1) 1,6 1,4 14,5
188(2) 1,7 2,7 15,1
190(3) 2,8 2,7 15,2
(1)
Ambos instrumentos com cone protetor
(2)
Kipp com cone protetor e Engespaço sem cone
(3)
Ambos instrumentos sem cone protetor

Tabela 1: Valores médios diários da radiação refletida ( Rr ) e da radiação solar global (Rs)

4. CONCLUSÕES 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

O piranômetro da Engespaço mostrou resultados BROWN, K. W.; NORMAN, N. J.; DORAISWAMY, P.

semelhantes aos do piranômetro da Kipp & Zonen, quando na
mesma situação (ambos protegidos ou ambos sem proteção).
O uso de um cone protetor reduz a radiação refletida em cerca
de 40%.
Os valores do albedo variaram de 0,19 para o caso sem
proteção para 0,12 para piranômetros protegidos.
Os resultados indicam que medidas de radiação
refletida, feitas sem proteção nos instrumentos superestimam
os valores do albedo. Sugere-se a aplicação da metodologia em
outras superfícies nesta área de estudo, e possíveis variações
na arquitetura e/ou profundidade do cone para estudar o
comportamento da radiação refletida.
C. Shading inverted pyranometers and measurements of
radiation reflected from an alfalfa crop. Water Resources
Research, v. 6, n. 6, p. 1782-6, 1970.
GARCIA, A.; ANDRÉ, R. G. B.; SANTA CÁPITA, C.
A.; IGNÁCIO, N. Comportamento do albedo do feijoeiro,
submetido a duas condições de disponibilidade hídrica. In:
Congresso Brasileiro de Meteorologia, 11., 2000, Rio de
Janeiro. Anais: a meteorologia brasileira além do ano 2000.
Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Meteorologia, 2000.
1 CD-ROM.
ROBINSON, N. The radiation reaching the earth. In: Solar
Radiation. Amsterdam: Elsevier, 1966. p. 111-160.

ROSENBERG, N.J.; BLAD, B.L.; VERMA, S.B.

Microclimate: the biological environment. Lincoln: John
Willey & Sons, 1983. 481 p.