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O PALHAÇO E O PSICANALISTA

Os conflitos surgem a partir da interação entre as pessoas, ou seja,


a partir dos relacionamentos. As habilidades, a instrução, os interesses
são de logo reconhecidos quando do início da relação amorosa, de lazer
ou laboral. Mas quando se estabelece o relacionamento, há um encontro
de formações pessoais, de expectativas e de maneiras de se expressar.
Entretanto, o nosso processo de aprendizagem interrelacional se
baseia em comandos de força, de autoridade, de fala, em que o escutar
se vincula a noção de fraqueza, de ausência de conteúdo, ao caráter de
subalterno. Dessa construção de convívio em que há a desvaloriação da
escuta resulta o fomento de relações individualistas e competitivas, em
que se prioriza a posição ou o status de ser aquele que fala, ou seja, a
intolerância à expressão do outro .
Para se robustecer o relacionamento cooperativo e harmônico e,
assim, afastar os conflitos que permeam as instituições que formam o
social, e até os conflitos intrasubjetivos que promovem a incompreensão
e a intolerância interacional, o fundamento da vida em comum deve ser a
valorização do ponto de vista alheio por meio de uma comunicação
dialética. Escutar o que o outro diz e se debruçar em compreender
porque o outro está a dizer assim. A escuta é um tratamento profilático e
terapêutico para os conflitos.
A agressividade que marca a relação em que há o fracasso da
escuta começa pela imposição de posicionamentos próprios, de valores
pessoais e de uma construção subjetiva de mundo, que invade a área de
expressão do outro, instigando-o a uma ação correlata. Instala-se uma
comunicação violenta, com críticas, ataques e menosprezo recíprocos.
São perdidas, sequencialmente, as bases de uma comunicação
dialética, em que os interlocutores se preocupam com a nobreza e a
sutileza do tratamento entre si – perde-se a polidez, a etiqueta, o
cuidado e o respeito com o outro. É o fenômeno da desescutação mútua.
Os sujeitos passam a se ver como antagonistas, e cada lado se percebe
como reagindo a uma agressão do outro lado. A relação não é vista como
um caminhar lado a lado buscando o bem-estar comum, mas uma luta, um
embate, em que alguém tem que vencer e outro ser vencido.
Como não há uma preocupação em ouvir o outro, compreender o
que movimenta a ação do outro, não se consegue ser ouvido, porque o
conteúdo da comunicação sequer é delimitado. Os questionamentos, os
entraves e pontos de divergências, que naturalmente surgem diante do
circuito relacional entre subjetividades, não são identificados. Disputa-
se, portanto, uma posição narcísica, em que apenas a própria voz deve
imperar, inviabiliando a comunicação e instingando uma relação de
conflito.

O insight vem da reflexão que a escuta promove.

Escutar – cuidar do outro, escutar e deixar que a sua voz também faça
parte do processo de construção do ambiente comum.
Postura colaborativa – circulação de pontos de vista, do conhecimento
agregado a cada subjetividade para se formar uma identidade coletiva a
partir da conjugação da voz de todos – pertencimento.

Cultura ou memória coletiva é absorvida e circula a partir da escuta que


passa a ser testemunho e patrimonio de qualquer um que se debruce em
escutar.

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