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Água quase tudo...e cloreto de sódio: purificação do cloreto de sódio

Article · September 2007


DOI: 10.52590/M3.P631.A30001381

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6 authors, including:

Clementina Teixeira Vania Andre


University of Lisbon University of Lisbon; University of Aveiro
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Silvia Chaves Hermínio Diogo


Technical University of Lisbon Technical University of Lisbon
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QUÍMICA E ENSINO
ÁGUA QUASE TUDO...E CLORETO DE SÓDIO: PURIFICAÇÃO
DO CLORETO DE SÓDIO
CLEMENTINA TEIXEIRA*, VÂNIA ANDRÉ, SÍLVIA CHAVES,
HERMÍNIO DIOGO, NUNO LOURENÇO, FILIPE MENESES

Palavras chave: cloreto de sódio, crescimento de cristais, cristais “On the Rocks”, microscopia química, fotografia científica,
fotomicrografia, ciência e arte.
Key words: sodium chloride, crystal growth “on the rocks”, chemical crystals, photomicrographs, micrographs, chemical micros-
copy, science and art.

PREÂMBULO Brancos que percorrem a Ciência2 [1] amava como se fossem seus filhos:
saltarem fora das tocas e lançarem aqueles que biologicamente nunca
A Química é como a música: pode tudo quanto têm na gaveta, neste mo- teve, mas que foram seus durante a
ser tocada de muitas maneiras, com mento de uma forma um tanto caótica, sua presença no Técnico e que con-
notas que neste caso são as molécu- à laia do velho ditado, “Em tempo de tinuarão a sê-lo, durante as suas
las, os átomos, os iões, os electrões guerra não se limpam armas” . vidas. Em tempo de expressões, as-
e respectivas associações. Pode ir de sim foram as impressões que neles
“pimba” a erudita. Pode ir de chata a Este artigo é dedicado ao Chefe, ao deixou. Deixou-nos também a Lq [2]
muito criativa. Pode ter muito de inspi- Professor Alberto Romão Dias. En- e outras obras, deixou-nos a semente
ração e menos de transpiração, ou ao quanto lutava pela vida, lutávamos do seu trabalho como pedagogo e in-
contrário. Pode-se oferecer, pode-se nós, num espaço virtual no “Overworld vestigador, numa imensa rede trans-
esconder e com certeza vender. Quer da Web”, em defesa do trabalho dos versal de pessoas, de ciência, de con-
queiramos, quer não, ela é omnipre- últimos anos, o qual tivemos o prazer ceitos, sem preconceitos, de filosofia
sente nas nossas vidas, nas nossas de lhe mostrar, há algumas semanas, de vida. Uma rede de cooperação, re-
mortes, em tudo quanto nos rodeia. num período de falsas melhoras en- forçando as nossas mútuas atracções
Mesmo que se esconda atrás do mo- tre cirurgias: a química apresentada e vencendo as nossas repulsões,cada
lecular. nas suas mais vivas cores, patentes um no seu lugar, mais acima ou mais
nas reacções observadas, filmadas abaixo, mas sempre estrategicamente
e fotografadas ao microscópio, sem colocado, num esforço conjunto como
Foi assim que se escondeu Michael
a cosmética da luz polarizada, sem que numa imensa rede, a nossa rede
Davidson da Universidade da Flórida
efeitos especiais. Ao dar-nos o privilé- como que cristalina. Assim a saiba-
e as suas “Molecular Expressions”1
gio de nos inserirmos no seu grupo de mos manter.
um autêntico tsunami de divulgação
investigação, fez-nos despertar para
científica que está a revolucionar
a Química Inorgânica, nas suas ver- Romão Dias, com certeza perdurarás
a web, e que faz todos os Coelhos tentes de Química de Coordenação, nas expressões da nossa cultura.
* Organometálica, Química dos Elemen-
Centro de Química Estrutural e Departamento
Depa de En-
genharia Química e Biológica tos, sempre valorizando a divulgação
Instituto Superior Técnico - Av. Rovisco Pais, 1049-001
Lisboa
científica como forma de chegar aos
clementina@ist.utl.pt alunos a quem protegia, respeitava e Para Alberto Romão Dias

QUÍMICA 106
Figura 1 Da reacção à abstração: a Química nas mais vivas cores!

QUÍMICA 106 - JUL/SET 07


INTRODUÇÃO No Quadro 2 propõem-se outros te- influência marcante da civilização ro-
mas de estudo que poderão tornar mana na nossa cultura e maneira de
O cloreto de sódio daria um compên- o projecto do sal mais envolvente e ser. Como muita gente sabe, a palavra
dio, ou vários, se alguém se dedicasse interdisciplinar: literatura nacional e salário deriva do latim Salarium e a es-
a escrever exaustivamente sobre as estrangeira, temas de poesia, música, trada através da qual se transportava
suas propriedades e aplicações. São romance histórico, história, religião, o sal utilizado na antiguidade para o
aos milhares e crescem de forma educação visual, fotografia, cinema, pagamento de ordenados era a Via
vertiginosa os portais da Web que arte, artes gráficas e suas aplicações Salária - uma espécie de autoestrada
lhe fazem referência, principalmente industriais. da época que cortava transversal-
durante o corrente ano, reflectindo a mente a “península da bota”, partin-
vaga gigante de divulgação científica já do do centro de Roma (vide plantas
A primeira pesquisa que lhe suge-
da cidade na mesma obra) ligando-a
referida1 [3, 4]. Será com certeza uma rimos é literária e liga-se à obra de
aos portos do Piceno, na costa leste.
árdua tarefa depurar toda a informação Colleen McCullough,3 “Os Favoritos
aí apresentada, posto que carece de da Fortuna” (Quadro 2). Embora seja A nossa pesquisa leva-nos depois para
revisão cuidada e é muito repetitiva. preciso fôlego para a ler, pois que é a Idade Média e para o tempo das cru-
muito volumosa, está bem traduzida, zadas, das ordens militares religiosas,
O primeiro ponto que gostaríamos documentada e remonta à época con- os Hospitalários, Cavaleiros de Malta
de realçar diz respeito aos principais turbada de Caio Júlio César com a e Os Templários, nas lutas com Sala-
motivos que levaram a esta pesquisa, descrição das assembleias da plebe e dino em Jerusalém, tema abordado
resumidos no Quadro 1. toda uma epopeia que mostra bem a nas obras de Juliette Benzoni (série
Os Cavaleiros)4 e muitas outras obras:
citem-se, por exemplo, as de Walter
Quadro 1 Razões pelas quais se deve estudar o cloreto de sódio Scott e a série os Reis Malditos de
Maurice Druon. Todo este enquadra-
mento que se propõe relaciona-se com
a designação de cristais malteses que
aparece frequentemente nas publica-
ções versando sobre cristalização e
crescimento de cristais e também em
tratados de medicina, associados a
certas doenças detectadas pela aná-
lise da urina ao microscópio: a cruz
de malta foi a designação que alguém
remotamente escolheu para um de-
feito cristalino resultante da inclusão
de moléculas de solvente em cristais,
como se pode observar nas fotomicro-
grafias da Figura 2 e no Quadro 2. De
facto essa cruz assemelha-se mais à
cruz de Pátea, e, como o leitor poderá
constatar, as cruzes de Malta, de Pátea
e de Cristo (introduzida por D. Dinis no
século XIV e usada nas nossas carave-
las) estão completamente misturadas
na Web, o que mostra bem a confusão
que aí grassa. Voltando ao tema do sal:
será que os cristais de NaCl com a cruz
inspiraram o design da cruz de Pátea?
O sal era muito utilizado como medi-
camento e desinfectante e os monges
da Idade Média eram bem conhecidos
como curandeiros. Deixamos-lhe este
tema para pesquisar e para obser-
var as cruzes dos monumentos que
abundam no nosso País, como, por
exemplo, a verdadeira cruz de Malta
no Convento das Maltezas, sede do
Centro Ciência Viva de Estremoz; o
Convento de Cristo em Tomar da Or-
dem dos Templários. São apenas dois
casos e muitos mais irá com certeza
descobrir, fazendo turismo cá dentro.

QUÍMICA 106
Quadro 2 Temas de pesquisa histórica e literária As fotomicrografias da Figura 2 foram
obtidas com ampliação de 10X em
lupa estereoscópica. Alguns cristais
apresentam as faces arredondadas
já com sinais de envelhecimento por
terem permanecido no frigorífico du-
rante três meses. Outros foram es-
quecidos e deixados a evaporar até à
secura numa sala com ventilação de
extracção muito forte, daí o trocadilho
com a designação LEFT (Licenciatura
em Engenharia Física Tecnológica)
[3,5].

A primeira imagem mostra os cristais “Descobre a letra A no desenho ou, a partir


tabulares “malteses” de cloreto de sódio, da letra, faz o desenho. Podes tentar fa-
fotografados com lupa binocular estereos- zer desenhos a partir de todas as letras e ALGUNS TÓPICOS SOBRE O CLORETO DE
cópica, exibindo uma cruz erradamente números e construir um alfabeto diferente. SÓDIO
designada de cruz de malta, designação O sal é o símbolo da hospitalidade e da ami-
essa que, apesar de incorrecta, se tornou zade, porque o seu sabor é indestrutível”
comum5. O mesmo símbolo aparece na Homero. O cloreto de sódio encontra-se na Na-
cruz das Farmácias e na fotografia central, tureza bastante puro e cristalino, cons-
“O sal é o símbolo da incorruptibilidade
numa jóia de ouro branco com aparas de tituindo o mineral halite, mais vulgar-
uma vez que o termo “aliança de sal” tra-
diamantes e safiras azuis, fotografada com mente designado por sal-gema. Este
duz uma relação com Deus que não pode
uma lupa estereoscópica. Ambas se pare-
ser destruída”, citação da Bíblia. pode ser transparente, translúcido e
cem mais com a cruz de Pátea. À direita,
a porta do castelo de Belmonte, exibindo As designações “Beco (e Padrão) do Chão
ainda apresentar diferentes tonali-
a Cruz de Cristo. A História de Portugal, os Salgado”, em Belém, Lisboa, correspondem dades devido à presença de inclusões:
Descobrimentos (1500-1815), as cruzadas, ao local onde se erigia o palácio do Duque branco, acinzentado, rosa, averme-
os Castelos, os Conventos, os Pelourinhos de Aveiro, D. José de Mascarenhas, executa- lhado, laranja, violeta, azul, verde1[4].
todos contêm muitos destes motivos. Suge- do em 1759 juntamente com os Távoras, A sua exploração mineira é então feita
re-se também a procura da presença do acusados de conspirarem contra D. José I. O
sal nas obras de Fernando Pessoa, David seu palácio foi destruído e o solo foi salgado
a partir destes depósitos subterrâneos
Mourão Ferreira, António Gedeão (Lágrima para que nada aí crescesse. Também as cin- de origem sedimentar, antigos lagos
de Preta), na Canção do Mar interpretada zas dos executados foram lançadas ao Tejo, ou veios de água salgada (por exem-
por Dulce Pontes, numa canção interpretada no local onde começa o mar salgado. plo, nas minas do Salir e outras, no
por Amália Rodrigues e Vinicius de Morais:
Uma outra referência histórica é o mo- Algarve, na Polónia, etc.). Porém, a
o sal das minhas lágrimas de amor encheu o
mar, que existe entre nós dois pr’a nos unir e vimento de protesto desencadeado por sua principal proveniência é da água
separar. Esta leva-nos ao Brasil e daí a todos Ghandi, na Índia, em 1930 (Marcha do Sal, do mar, da qual é um dos constituintes
os Países de expressão Portuguesa. contra o imposto colonial sobre o sal), bem maioritários (Tabela 1): cerca de 35g
documentado no filme “Ghandi”.
de NaCl/Kg de água [4]. (Esse teor
No título do filme “Sangue, Suor e Lágri- pode atingir valores muito elevados,
mas”, o sal é a substância comum aos três por exemplo, cerca de 300 g/l no Mar
fluidos do organismo.
Morto). Nestes casos, a exploração é
feita a céu aberto e em grande escala
No infantário da APIST, cruzes da nas salinas, por evaporação natural
cruz de Pátea, inspiradas nos cristais ao sol e ao vento (Aveiro, Figueira
tabulares malteses da Foz, reserva do Sapal no Algarve,
reserva do Samouco no Montijo, Salt
Lake no Utah (EUA), etc.).

Em 2002 a produção mundial atingiu


219 milhões de toneladas, sendo os
principais produtores os Estados Uni-
dos (40,3), a China (32,9), a Alema-
nha (17,7), a Índia (14,5) e o Canadá
(12,3) [4] .

O vulgar sal das cozinhas ou sal de


mesa é constituído em cerca de 99%
(em massa) por cloreto de sódio, NaCl,
e diversos componentes, alguns dos
quais em quantidades vestigiárias.
Entre estes encontram-se algumas im-
purezas associadas ao seu processo
de extracção e substâncias proposita-
Figura 2 Fotomicrografias de cristais iónicos de NaCl quase todos malteses [3] damente incluídas na sua constituição,

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designadas por aditivos, que lhe me- quescente, e o cloreto de cálcio, muito de um ingrediente. Por exemplo, ali-
lhoram as propriedades nutricionais, de higroscópico. mentos dietéticos prescrevem-se aos
processamento industrial e armazena- diabéticos, suprimindo ou reduzindo o
gem. Actualmente o mercado oferece As soluções aquosas de cloreto de açúcar, enquanto que a restrição para
uma vastíssima gama de produtos para sódio puro são transparentes. To- hipertensos incide sobre o sal. Existem
fins culinários, com imensos suple- davia, quando dissolvido em água, contudo produtos que pelas suas ca-
mentos alimentares e diferindo ligeira- o sal de cozinha forma uma solução racterísticas são incluídos em ambas
mente na sua composição e granulo- as designações (“light” e dietético),
ligeiramente turva devido à pre-
metria. No nosso País, destaca-se a como é o caso da Coca-Cola “light”,
sença dos agentes retardadores da
flor de sal, que tem sido bastante divul- uma vez que não contém açúcares.
humidade à base de alumino-silica-
gada, fazendo concorrência nos merca- A diminuição calórica num produto de
tos, os quais formam uma suspen-
dos de gastronomia gourmet. consumo implica a redução de um in-
são, dada a sua baixa solubilidade. grediente com apreciável valor calóri-
Entre os aditivos mais frequentes en- co tal como hidratos de carbono, gor-
O sal comercializado contém ainda
contra-se o iodo, na forma de iodeto duras ou proteínas. Neste contexto, a
uma pequena percentagem de car-
de potássio (KI), iodeto de sódio (NaI) designação de sal “light” não se refere
bonato e sulfato de magnésio, tam-
ou iodato de potássio (KIO3), como a uma redução no valor calórico do
bém presentes na água do mar. A
produto, mas sim ao diferente efeito
fonte de iodo para a prevenção de legislação impõe que para fins ali-
metabólico no organismo humano do
Distúbios de Deficiência de Iodo (DDI) mentares o teor de MgCO3 seja infe-
KCl em relação ao NaCl. Logo, a sua
que se encontram associados, por rior a 1%, recorrendo-se, para esta designação deveria ser dietético, dado
exemplo, a problemas de bócio, abor- finalidade, a sucessivas lavagens. que se suprime NaCl, em favor de KCl.
tos prematuros e deficiências mentais
no ser humano. A dose recomendada Do ponto de vista de constituição O cloreto de sódio é responsável pela
de iodo para um adulto é de 0,15 mg/ química, não existe diferença entre troca de água das células com o meio
dia. O teor de iodo presente no sal de sal grosso e sal refinado, variando que as circunda, por intermédio de
mesa comercializado varia entre 20 e apenas a granulometria, sendo este
fenómenos de osmose, ajudando-
60 mg por kg de produto final. último obtido por trituração seguida
-as a absorver nutrientes e a eliminar
resíduos. Esta propriedade justifica
Tabela 1 Composição aproximada da água do mar [6] o seu emprego na composição dos
Espécie Concentração/mol.l-1 Espécie Concentração/mol.l-1 sais de banho e de outras soluções
terapêuticas que se destinam a ate-
Cl− 0,55 Na+ 0,47
nuar processos inflamatórios associa-
SO42− 0,028 Mg2+ 0,054 dos à retenção de água nos tecidos
− 2− -3 2+ celulares (soluções salinas relaxantes
HCO /CO 3 3
2,3x10 Ca 0,010
Br −
8,3x10 -3
K+
0,010 para os pés e outras usadas em fi-
sioterapia para combater dores nos
F− 7x10-5 Sr2+ 9,1x10−5
ossos e articulações). A utilização an-
-4
H3BO3 4,3x10 cestral das salmouras para preservar
alimentos (o bacalhau! os presuntos!),
Diversos aditivos têm sido utilizados de peneiração do primeiro. Como é
baseia-se no mesmo princípio. O sal
como anti-aglomerantes ou agentes óbvio, a granulometria mais reduzida
também tem um papel importante na
anti-caking: o carbonato de magnésio do sal refinado torna-o mais fácil de
contracção muscular. Todavia, está
foi o primeiro composto a ser utilizado dissolver.
associado a problemas de hiperten-
para esse fim (1911) e mais recente- são e do foro cardiovascular, daí que o
Mais recentemente surgiu a comer-
mente são usados os complexos seu consumo deva ser moderado. Por
cialização de sal “light” que consiste
ferrocianeto de sódio Na4[Fe(CN)6] numa mistura 1:1 de cloreto de só- outro lado, a redução de NaCl também
(menos de 100 ppm), ferricianeto de dio e cloreto de potássio. O efeito do não pode ser excessiva, podendo pro-
potássio K3[Fe(CN)6], alumino-silicato KCl caracteriza-se por ter um menor vocar baixa de sódio no organismo,
de sódio, silicato de magnésio, fosfato tempo de retenção no organismo hu- provocando alterações no sistema
de cálcio e outros. Estas substâncias mano em comparação com o NaCl. nervoso central, com alucinações,
permitem reduzir o teor em humidade, Assim sendo, contribui para a diminui- delírio, perda de consciência e outros
evitando a colmatação e melhorando ção da quantidade de água retida e sintomas.
as propriedades de fluxo de transporte para a melhoria do aspecto físico do
no processamento industrial. Com consumidor. As designações “light” e Do total de sal actualmente extraído
efeito, sendo o NaCl uma substância “dietético” têm significados diferentes só cerca de 5% é utilizado no con-
já de si levemente higroscópica, esta e a sua aplicação torna-se, por vezes, sumo humano. As restantes uti-
afinidade pela humidade vem reforça- muito confusa. A primeira implica uma lizações são das mais diversas: no
da no sal pela presença de contami- redução de 25% de calorias, no míni- fabrico de rações, na síntese de
nantes com propriedades similares: o mo, em comparação com a versão con- produtos químicos como fonte de
cloreto de magnésio, substância deli- vencional. Na segunda, há eliminação sódio e cloro (produção de sódio,

QUÍMICA 106
cloro, NaOH, carbonato de sódio, bi- ambiguidades, cá está o nosso amigo identidade química da substância.
carbonato de sódio, cloreto de cálcio, francês.) A designação é por demais Pode ocorrer devido a uma diminuição
sulfato de sódio, cloratos, ácido clo- abrangente, embora se aplique com de solubilidade provocada por abaixa-
rídrico, etc.), nas indústrias do papel, mais frequência a processos físicos. O mento de temperatura, adição de um
cerâmica, cosméticos, estando ainda termo recristalização implica que num agente precipitante que induza a alte-
associado à utilização de corantes dado processo se vai cristalizar de ração da sua solubilidade, alteração
em têxteis, no fabrico de sabões, em novo uma substância que já antes se da constante dieléctrica, etc..
metalurgia, etc.. Nas misturas frigorí- apresentava cristalina e que, portanto,
ficas gelo-sal, a formação de um eu- mantém a sua identidade química du-
téctico permite baixar a temperatura Na precipitação química acontece
rante toda a operação: ao recristalizar
a -21ºC em aplicações laboratoriais mais do que isso e o processo vem
sal de cozinha, cloreto de sódio, vol-
controladas [4]. Em termos práticos dar origem a uma nova espécie
tamos a obter de novo o cloreto de
e sem controlo do isolamento térmico química. Tal é o caso da formação de
sódio, só que separado de impurezas,
do sistema e mistura das fases em um sal duplo ou da vulgar reacção de
aditivos e com cristais de tamanho e
equilíbrio o ponto de fusão baixa ape-
hábitos diferentes [1]. A recristalização dupla permuta iónica ou reacção de
nas a -9ºC, permitindo derreter a neve:
é assim entendida como um processo metátese, reacções exemplificadas
cerca de 51% da produção mundial de
de purificação: no Quadro 3.
NaCl é usada para a remoção da neve
na limpeza de estradas em países NaCl (c)(impuro) NaCl(aq) NaCl(c)(puro)+ impurezas(c/aq) (1)
de clima frio. É ainda utilizado na de-
sinfecção de piscinas, através de um O termo precipitação também se pode Aliás é exactamente com este último
processo electrolítico para a produção tornar ambíguo, pois que também sentido que, em geral, se classificam as
de cloro. Monocristais de NaCl de ele- ele, fazendo parte do nosso léxico reacções em solução como reacções
vada pureza são usados no fabrico comum, é frequentemente utilizado: de precipitação. A formação de cristais
de janelas ópticas para espectrofo- uma pessoa precipita-se quando toma e respectivo crescimento dependem de
tómetros UV-VIS e infravermelhos. decisões demasiado rápidas, quando factores termodinâmicos (solubilidade)
anda demasiado depressa, quando e cinéticos (nucleação e crescimento
Enfim, como poderíamos nós viver “cai” no abismo. Quando se mede o propriamente dito). Define-se solu-
sem um composto tão simples, que grau de pluviosidade também se usa bilidade molar S como a quantidade
nem molécula tem para nos chatear, máxima de soluto expressa em moles
a designação de “precipitação”: a
enfim, sem uma pitada de sal nas nos- que se consegue dissolver numa dada
fase líquida constituída por pequenas
sas vidas? quantidade de solvente, até perfazer
gotículas de água dispersas no seio
um litro de solução a uma dada tem-
de uma fase gasosa, o ar, atinge uma
peratura. Nestas condições a solução
dimensão crítica superior a cerca de
diz-se saturada, e corresponde à situa-
A CRISTALIZAÇÃO COMO TÉCNICA 10 micrómetros e começa a cair, pela ção de equilíbrio heterogéneo entre a
DE PURIFICAÇÃO E DE CRESCIMENTO acção da gravidade, “precipitando” na fase sólida e a fase líquida. A constante
DE CRISTAIS [1] forma de gotas de chuva. termodinâmica deste equilíbrio de-
signa-se por produto de solubilidade,
A precipitação, no caso restrito das Kps, e para efeitos do seu cálculo S
Monsieur de La Palice est mort tem que vir expressa em mol.l-1. Fora
soluções líquidas, implica que haja
Mort devant Pavie
formação de uma fase sólida no seio isso, pode ser expressa em quaisquer
Un quart d’heure avant sa mort
da fase líquida, ou seja, há formação outras unidades, por exemplo, g/l ou
Il était encore en vie!
de uma substância insolúvel, ou muito outras equivalentes. Abaixo desta con-
Canção popular francesa, sec. XVI, conforme
centração limite as soluções dizem-se
citação [7] pouco solúvel. Nas soluções aquosas
os precipitados são frequentemente insaturadas e acima, sobressaturadas.
O Grau de Sobressaturação (GS)
mais densos e obedecem às leis da
...E como partindo de cloreto de sódio permite medir o afastamento em rela-
gravidade, caindo. Porém, haverá ca-
se chega a cloreto de sódio... ção ao equilíbrio [1,8].
sos em que este processo se torna
muito moroso, dando origem a suspen- Ao iniciar uma cristalização é essen-
Os termos cristalização, recristaliza- sões que deverão ser centrifugadas. cial ter uma ideia da solubilidade da
ção, precipitação física e química, Poderá ainda ocorrer a formação de substância com que se vai trabalhar
confundem-se frequentemente na lite- um precipitado menos denso que ficará e da sua variação com a tempera-
ratura. eventualmente suspenso na superfície tura. Consideram-se solúveis todas
livre do líquido. Existem ainda casos as substâncias de solubilidade supe-
Na linguagem corrente, quando se diz anómalos como a precipitação de rior a 10-2 M. Para substâncias pouco
solúveis ou insolúveis, como é, por
que algo está cristalizado, pretende-se hidróxidos e silicatos nos “jardins de sí-
exemplo, o caso dos sais de chumbo,
afirmar que está “parado”, preso numa lica” que, embora mais densos, sobem, o equilíbrio atinge-se a concentrações
forte “rede” que tolhe os movimentos, desafiando as leis da gravidade, pois muito baixas e, em geral, existem ta-
qual unidade constituinte dum cristal! estão ligados a fenómenos de osmose belados os valores de Kps a 25ºC, que
Numa cristalização há essencialmente bem mais complicados de interpretar. podem atingir valores tão baixos quan-
formação de cristais. (E pronto, sem Na precipitação física mantém-se a to 10-49 (sulfureto de prata), ou menos.

QUÍMICA 106 - JUL/SET 07


Quadro 3 Exemplos de reacções de precipitação

Formação de um sal duplo pela adição estequiométrica dos sais componentes:


Formação de schönite de magnésio e amónio

MgSO4.7H2O (aq) + (NH4)2SO4 (aq) (NH4)2Mg(SO4)2.6H2O(s) +H2O (l) (2)


A - Grau de sobressaturação da solu-
Reacção de metátese ou dupla permuta iónica:
ção GS=(S’-S)/S em função do tempo
Soluções de iodeto de potássio reagem com soluções de nitrato t
de chumbo para formar nitrato de potássio em solução e iodeto S’- concentração do soluto em cada
de chumbo muito pouco solúvel, que precipita (precipitado amarelo instante;
canário). S- concentração da solução saturada,
em equilíbrio, a cada temperatura.
Quanto maior é o GS, menor é o tem-
2KI (aq) + Pb (NO3 )2(aq) 2KNO3 (aq) + PbI2 (s) (3) po necessário para serem observados
Vc = k.(GS) (4) os primeiros cristais.
Quando as substâncias são muito
solúveis, normalmente não é indicado
Para valores baixos do GS, a veloci-
o seu Kps, mas sim a variação da dade de crescimento é superior à ve-
solubilidade com a temperatura. Para locidade de nucleação: a tendência
a grande maioria dos sais comuns, a para o crescimento dos núcleos já
solubilidade aumenta com a tempera- formados é superior à de formação
tura. Porém, existem casos em que di- de novos núcleos. Para valores mais
minui (são exemplos sais com hidratos elevados de GS, a tendência para a
de diferentes estequiometrias como formação de novos núcleos predomi-
é o caso do sulfato de sódio deca- na sobre a de crescimento dos nú-
-hidratado) e outros em que se man- cleos já formados. Em suma, baixos
valores de GS conduzem a poucos B - Funções hipotéticas de variação da
tém praticamente constante, como é o
cristais mas bem desenvolvidos, en- velocidade de nucleação Vn e da veloci-
caso do cloreto de sódio: em 100g de quanto que valores de GS elevados dade de crescimento Vc com GS.
água dissolvem-se 34,2g a 0ºC, 35,9g conduzem a um número superior de Figura 3 Alguns dos parâmetros que condicio-
a 25ºC e 38,1g a 80oC. A solubilidade cristais mas de dimensões reduzidas. nam o crescimento de cristais [1, 8]
é, como já se disse, uma propriedade
Quadro 4 As fases do crescimento de cristais (adaptado de [1])
termodinâmica que nos indica qual
a quantidade máxima de soluto que I - Nucleação homogénea: Num ponto da solução homogénea (ou líquido), gera-se uma situa-
ção de instabilidade termodinâmica: GS>0, subarrefecimento, abaixamento de pressão, etc..
uma solução comporta, a cada tem- Esta condição de instabilidade constitui uma maneira de vencer a barreira de activação do
peratura. Nada nos diz, porém, como sistema, à semelhança do que se passa numa reacção química. Formam-se então pares iónicos
essa substância se agrega: essa (no caso do NaCl ou substâncias iónicas) ou pequenos agregados de 3-4 unidades estruturais e
quantidade máxima distribui-se por em seguida cachos (clusters) que se dissolvem e refazem a cada instante, podendo coalescer,
juntando-se a unidades estruturais semelhantes e na sua vizinhança.
grandes ou pequenos cristais? Por
poucos ou muitos cristais? É a cinética Ao mesmo tempo estes agregados vão mudando de estrutura até minimizarem a sua energia
de superfície. Quando atingem um tamanho mínimo crítico (1-10 nm, correspondente a cerca
da formação de cristais que nos dá de 1000 unidades estruturais) passam a persistir na solução. A partir daí estes núcleos submi-
essa resposta ou seja, a nucleação, croscópicos crescem, e começam a formar a rede cristalina.
o crescimento e as respectivas veloci- II - Crescimento: é favorecido pela presença de defeitos na rede cristalina em construção. Os
dades (Figura 3 e Quadro 4). Mesmo deslocamentos (A) podem levar à formação de pontos estratégicos para “abrigar” o núcleo,
que a solubilidade varie pouco com a impedindo a sua remoção e melhorando o seu desenvolvimento quando assenta em patama-
temperatura, esta afecta os parâme- res, na intersecção de duas e de três faces, etc.. É controlado por fenómenos de transferência:
de massa (soluto através da solução e para dentro da rede; solvente para fora desta); de calor,
tros cinéticos, os quais são favoreci- resultante da passagem para o estado sólido, etc.. Em solução estagnada a velocidade destes
dos pela sua diminuição. processos de difusão pode ser o factor limitativo da cinética de crescimento dos cristais.

As concentrações elevadas, ou seja,


elevados GS, também afectam a ci-
nética como se vê na Figura 3: o
número e o tamanho dos cristais for-
mados dependem muito da sobres-
saturação atingida. Segundo Pom-
À direita: Instantâneo de vídeo mostrando a dissolução do NaCl observada numa lupa estereos-
beiro [8], a velocidade de nucleação
cópica.
Vn (formação de núcleos cristalinos)
começa por aumentar muito ligeira- III - Interrupção do crescimento: pode ser motivado por se ter atingido o equilíbrio correspon-
dente à solução saturada: estas condições correspondem ao esgotamento dos nutrientes
mente com o GS, passando depois (GS=0) - na solução deixa de haver excesso de soluto que possa passar à fase sólida. O cresci-
a aumentar num regime exponen- mento também pode parar pela criação de gradientes de concentração persistentes, quando a
cial. Por outro lado, a velocidade de difusão é muito lenta. Daí fazer-se frequentemente o crescimento de cristais não em repouso,
crescimento dos núcleos cristalinos mas com fluxo de nutrientes em torno de uma semente colocando-a, por exemplo, numa mesa
rotativa. Técnicas mais recentes de crescimento de cristais a bordo de naves espaciais, em
Vc, segundo o mesmo autor, é propor-
condições de microgravidade, permitem obter cristais mais perfeitos, pois são eliminadas as
cional ao GS, o que é evidenciado correntes de convecção associadas à formação de defeitos e o acesso aos nutrientes é igual em
pela equação de Von Weimarn [8]: todas as direcções, o que evita o desenvolvimento de hábitos distorcidos.

QUÍMICA 106
CRESCIMENTO DE CRISTAIS DE CLORETO provável pois apenas podem crescer feitas no Inverno, a temperaturas de
DE SÓDIO para os lados e não para cima. Pode- cerca de 7ºC. No Verão pode ser usa-
mos ainda observar cristais acicu- do o frigorífico, mas o abrir e fechar
lares (whiskers) de NaCl obtidos pela da porta cria perturbações que levam
A preparação de cristais depende do
fim em vista e das características que adição de álcool polivinílico6; cristais à formação de mais núcleos e cristais
se pretendem obter no produto final. octaédricos obtidos na presença de em maior número e mais pequenos.
formamida; tabulares hexagonais Quando o valor do produto iónico
Podemos purificar o sal por recris- na presença de ureia; tornados den- [Na+] [Cl–] exceder o produto de solu-
talização, sem nos interessar o seu dríticos e brancos na presença de bilidade Kps, isto é, quando a solução
tamanho e hábito cristalino - é o que ferricianeto de potássio, e até mais estiver sobressaturada, inicia-se então
acontece na produção industrial de eficazmente modificados com uma pi- a precipitação e crescimento. A forma-
granulado: obtêm-se cristais anédri- tada de sal refinado. Embora se tenha ção e o crescimento dos cristais são
cos (sem forma geométrica definida) tentado o crescimento de cristais por interrompidos pelo operador quando
de baixo teor em água para melhorar nucleação heterogénea, com rochas estes atingirem um tamanho conve-
as propriedades de fluxo. Mas tam- vulcânicas (Figura 6) e com a mesma niente e evitando ir até à secura, posto
bém podemos desejar grandes cristais composição da solução, em copo de que isso levará à precipitação de todas
muito puros, para aplicações em es- precipitação alto, o facto é que o NaCl as impurezas que se querem separar.
pectroscopia, em que o hábito cúbico é um dos casos raros em que o supor- Aliás, esse foi o “erro” cometido nos
é privilegiado, para facilitar o corte na te rugoso não tem qualquer influência. famosos cristais “LEFT!” na Figura
preparação de janelas ópticas. Neste O estudo dos modificadores será pu- 2. No final, os cristais são separados
projecto a nossa opção foi associar blicado num outro trabalho [1 e refs. aí das águas-mães por nova filtração à
a purificação ao crescimento com citadas, 9-11]. trompa ou apenas com papel de filtro
defeitos cristalinos, i.e., a produção num funil de filtração e lavados com
de malteses. Na Figura 4 podem-se Nos casos analisados o método mais pequenas quantidades de água gela-
observar cristais de NaCl de hábitos expedito para o crescimento de cris- da, deixando-se a seguir a secar ao ar.
diferentes, todos desenvolvidos pela tais de cloreto de sódio é sempre a Industrialmente o tamanho dos cristais
mesma técnica de evaporação lenta, evaporação do solvente, uma vez que do sal de mesa não deve ser muito
na presença de modificadores de a solubilidade varia muito pouco com grande, para reduzir a quantidade de
hábito, adicionados em quantidades a temperatura. Dissolve-se a amostra água neles retida por aprisionamento
muito pequenas - apenas uma pitada a quente, para a sua dissolução ser mecânico [8] (água retida nos limites
no sal em solução, neste caso, a pon- mais rápida, até condições próximas dos grãos cristalinos) e para facilitar
ta de uma micro-espátula. Em alguns da saturação (15g de soluto/45g de o seu processamento industrial (en-
casos, apenas alguns ppm são sufi- água). A moagem prévia em almofariz sacamento). Do mesmo modo, a for-
cientes para que o sal mostre as suas também facilita a dissolução. Após fil- mação dos malteses por retenção da
faces escondidas. A forma do reci- tração para separação das impurezas água na rede cristalina é também evi-
piente também é importante: quando o insolúveis, deixa-se evaporar lenta- tada, posto que pode libertar-se mais
crescimento é feito em copo de forma mente e em repouso. Quanto mais tarde, por fenómenos de crepitação,
alta, com uma altura de líquido con- lenta for a evaporação da água mais devido à elevada tensão de vapor da
siderável, há tendência para formar lento será o aumento do GS, pelo água, dando origem à colmatação. Na
cubos; em recipientes de forma baixa, que se formarão menos núcleos e literatura confundem-se muito os ter-
como os cristalizadores, ou num sim- os cristais serão maiores (velocidade mos utilizados para a formação deste
ples tabuleiro pyrex de ir ao forno, de nucleação inferior à velocidade de tipo de defeito cristalino, podendo ser
com uma altura pequena de líquido, a crescimento). Os resultados são muito referido como oclusão molecular e
formação de cristais tabulares é mais melhores quando as preparações são também inclusão [8].

Figura 4 Observação ao microscópio (lupa


estereoscópica) de cristais de cloreto de só-
dio recristalizado a partir de amostras de
sal de cozinha impuro e sais de banho
1 - Cristais tabulares malteses e cristais
anédricos de cloreto de sódio com tartrazi-
na (corante amarelo) e roxo, não identifica-
do;
2 - Efeito do aumento do GS, com formação
de cristais mais pequenos;
3 - Cristais cúbicos formados em copos de
precipitação de forma alta;
4 - Cristais recristalizados;
5 a 7 - Formação de cristais dendríticos pela
adição de sal refinado ou de ferricianeto de
potássio;
8 - Cristais aciculares obtidos pela adição
de ácool polivinílico;
9 - Cristalização com corante adicionado;
10 - Adição de ureia;
11 - Cristais octaédricos obtidos por adição
de formamida.

QUÍMICA 106 - JUL/SET 07


Nas utilizações espectroscópicas já
referidas, privilegiam-se os mono-
cristais de grandes dimensões, mas a
sua pureza deve ser muito elevada e
o teor em água muito reduzido, posto
que a sua presença na rede diminui
a transparência das amostras, dimi-
nuindo a qualidade dos cristais e a
sua transmitância.

PURIFICAÇÃO E CRESCIMENTO DE CRIS-


TAIS NO INFANTÁRIO DA APIST

O trabalho de purificação de amostras


de sais de banho e sal de cozinha im-
puro por recristalização permitiu in-
troduzir conceitos relativos aos esta-
dos físicos da matéria, à noção de
cristal, de ligação química, tendo sido
feita também a viagem ao interior da
matéria, e a observação ao microscó-
pio (Figuras 5 e 6). Foi também ex-
plorada a construção de um alfabeto,
fazendo desenhos a partir de letras e
de números (Quadros 1 e 2) e tam-
bém apresentado a crianças do 1º
ciclo do ensino básico. Ao contrário
do que se possa à partida imaginar, a
grande preocupação das crianças
entre os cinco e sete anos é aprender
a ler e escrever, sendo que qualquer
proposta de actividade nesta área só
poderá ser benéfica, aumentando o
seu carácter interdisciplinar. A adapta-
ção destas fichas está a ser realizada
no primeiro ano do 1º ciclo do ensino
básico, orientada pelos respectivos
professores.

Figura 5 Purificação do cloreto de sódio (sais de banho e sal de cozinha). Na gravura 4 do slide do
centro pode-se observar o efeito de “creeping” mencionado no texto

QUÍMICA 106
Podemos observar o mundo à nossa volta tal como ele se nos apresenta. Isso não custa muito a fazer, basta manter os olhos
bem abertos. Podemos depois passar a utilizar lupas, como fazem os ourives, os antiquários, os relojoeiros e todos aqueles que
vêem mal, ou precisam de ver um pouco mais de perto - facilmente obteremos imagens ampliadas para o dobro, para o triplo...
Porém, graças ao desenvolvimento científico e tecnológico, podemos fazer muito mais ...

Basta utilizar um simples microscópio comum e a nossa visão dos objectos é ampliada até cem vezes o seu tamanho e por aí
fora, 400, 500 vezes, até que perdemos as nossas referências e quase caímos na abstracção, se não soubermos o que estamos
a observar.

Se formos mais ambiciosos a nossa curiosidade levar-nos-á muito mais longe! Podemos penetrar nos puzzles das redes cristali-
nas dos cristais, ampliando-as 105 vezes, cem milhões de vezes, passando do angström ao centímetro. Estes modelos de redes
cristalinas são construídos a partir das estruturas obtidas pelos métodos de difracção de raios X. Nelas podemos localizar os iões
sódio e cloreto na rede cristalina rigorosa do cloreto de sódio.

Rede cristalina rigorosa do cloreto de


sódio, sistema cúbico
Cl - rede cúbica de faces centradas,
CFC; seis iões Na + rodeiam cada
anião (NC=6)

Na +- CFC, preenchendo os interstí-


cios octaédricos da rede dos aniões
cloreto. NC=6
Modelo miniatura Beevers.

Figura 6 Viagem ao interior da matéria: o estudo do cloreto de sódio. 1-Experiência de purificação do sal no Infantário da APIST;
2,3-Crescimento de cristais de NaCl em rocha vulcânica; 4-Observando cristais com uma lente de Fresnel – Agrupamento Ribeiro Sanches, Penamacor;
5,7-Cristais de NaCl de hábito octaédrico ampliados 63X; 6-Observação de cristais de sais de banho coloridos com a lupa estereoscópica Nikon,
acoplada a uma câmara digital Sony; 8-Rede cristalina do NaCl; 9-Sal amorfo, obtido por
fusão/solidificação a 801 oC.

QUÍMICA 106 - JUL/SET 07


NOTAS Quando foi pedida ao Prof. Romão Dias a teach with these crystals? Seminários
revisão do texto, perguntaram-lhe se de- do Departamento de Engenharia
Química e Biológica, DEQB, 29 de
1 veria retirar o Coelho Branco. Deixem lá
Michael Davidson, Molecular Expres- Junho de 2007.
sions: Images from the Microscope, ficar o Coelho Branco. No fundo, sempre
achou graça à irreverência na escrita. [4] Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/
http://micro.magnet.fsu.edu.Outros portais Sodium_chloride e portais associados.
associados. Galerias de fotomicrografia, 3
Escritora muito conhecida pela autoria Como a submissão de artigos na wiki-
Ciência e Arte, tutoriais sobre óptica, dos “Pássaros Feridos”, obra que deu ori- pedia não é sujeita a revisão, é
história da microscopia e utilizações do Mi- gem à famosa série protagonizada por necessário e conveniente confirmar a
croscópio com luz polarizada para fotogra- informação aí inserida.
Richard Chamberlain, o padre de Bricas-
far e filmar tudo quanto se possa imaginar, sart, na Austrália. [5] V. André, H. Diogo, N. Lourenço, C.
sempre com efeitos especiais: cerveja, Teixeira, “Água, quase tudo… e cloreto
4
cocktails, hamburgers, sementes de sésa- Infelizmente a obra de Juliette Benzoni de sódio”, 2004, Laboratórios de
tem muitos erros de tradução em Portu- Química Geral, LEFT, IST, 2004-2007.
mo, vinhos, medicamentos, fármacos, Blue
Trabalho prático da cadeira de Quími-
jeans, chips, meteoritos, metais, ligas e guês, pelo que se alertam os professores e
ca Geral de Licenciatura em Engenha-
também alguns cristais, etc. Todas as fo- educadores para a sua correcção. ria Física Tecnológica.
tografias ficam lindíssimas, fortemente co- 5
Durante o seminário citado na ref. 3, o Pro- [6] A. Amaral, C. Correia, “Química”, 12º
loridas mas indistintas, caindo no domínio fessor Bernardo Herold alertou-nos para o ano de escolaridade, Porto Editora,
da abstracção. Estabelecem links com to- facto da cruz de Malta ser diferente e com 1998.
dos quantos pedem autorização para a uti- oito pontas. Sugere-se ao leitor a pesquisa [7] M. F. Camões, “A pureza química e o
lização de imagens, aumentando ainda na Web para encontrar a verdadeira cruz de Senhor de La Palice”, Química, Boletim
mais a visibilidade do site. Também inclui Malta. da Sociedade Portuguesa de Química,
pequenos vídeos de cristalização e tuto- 96 (2005) 69-71.
6
riais sobre cristais até à data ainda pouco Durante o seminário da ref. 3, fui alertada
[8] A.J.L. Pombeiro, “Técnicas e Operações
desenvolvidas, mas preparam-se para para a incorrecção desta designação – a Unitárias em Química Laboratorial”,
uma grande ofensiva nesse campo. São designação correcta é poli(álcool vinílico). No Fundação Calouste Gulbenkian 2ª Ed.,
sites de pendor fortemente comercial, que entanto, como ela é usada na literatura, re- Lisboa, 1991.
mostram como a ligação Universidade e solvi mantê-la. [9] C. Teixeira, “O Livro das Pedras”, Insti-
Empreendorismo pode ser frutuosa, renta- tuto Superior Técnico, 1996.
bilizando trabalhos de investigação, com [10] C. Teixeira, “Módulos de Experiências
reflexos positivos na Economia. Depois do REFERÊNCIAS de Química”, Instituto Superior Técni-
“Power of Ten”, Potências de Dez, deve ser co, 2004.
dos trabalhos de maior relevância que se [11] C. Teixeira, “Atlas de Crescimento de
fizeram nos últimos anos. Em Julho de [1] C. Teixeira, “Os Cristais no Ensino e Di- Cristais”, Sais anidros, Instituto Supe-
vulgação da Química”, Colóquio Ciên- rior Técnico, 2004.
2007, eram mencionadas 220 000 entra-
cias (Fundação Calouste Gulbenkian)
das na Web, crescendo exponencialmente 25 (2000) 20-36, disponibilizado na
de dia para dia. Web,http://zircon.dcsa.fct.unl.pt/dspace.
2
O Coelho Branco da obra “Alice no País [2] Alberto Romão Dias e colaboradores, AGRADECIMENTOS
das Maravilhas” aparece neste artigo como “Lq, Ligação Química”, Instituto Supe-
uma primeira citação. Foi por convite do rior Técnico, IST Press, 2006. Projecto Ciência Viva-A Química Desco-
bre a Criança - CV/VI/ID976
Professor Romão Dias e do Professor [3] C. Teixeira, “Ionic Expressions of Sodi-
Jorge Calado que este artigo foi escrito. um Chloride”: LEFT! What can we

ACTIVIDADE DE LABORATÓRIO

PURIFICAÇÃO E CRESCIMENTO DE CRIS- OBJECTIVOS DO TRABALHO: com variação da constante dieléctrica


TAIS. e da solubilidade; iii) precipitação por
- Ilustrar os conceitos envolvidos na evaporação lenta do solvente, à tem-
cristalização como técnica de purifica- peratura ambiente e iv) precipitação
Esta secção foi adaptada de um an-
ção e de crescimento de cristais. por evaporação lenta do solvente e a
tigo trabalho de Introdução às Técni-
- Purificação do cloreto de sódio por
cas Laboratoriais de Química. O in- baixa temperatura, no frigorífico.
recristalização: dissolução, filtração e
teresse deste trabalho resulta da precipitação.
importância que o crescimento de - Observação do hábito e tamanho TÉCNICA EXPERIMENTAL
cristais está a ter na área de Enge- dos cristais obtidos por quatro técni- Reagentes e suas funções:
nharia de cristais, com os estudos de cas de cristalização diferentes: i) pre-
co-cristalização, formação de poli- cipitação por efeito do ião comum NaCl impuro (impurezas de origem cu-
morfos, formação de hidratos, alte- (Cl–); ii) precipitação por utilização de linária: pretende-se reciclar sal de mesa
ração do hábito cristalino, etc.. mistura de solventes (água-etanol) que tenha sido usado para fins culiná-

QUÍMICA 106
rios; impurezas químicas adicionadas, Procedimentos ção de CO2.
CaCl2; também pode ser adicionado
* Divida em três partes a solução que
MgCl2, mas a separação é mais lenta; * Pese, numa balança técnica, cerca
acabou de filtrar.
areia; as demais impurezas e aditivos de 15 g de cloreto de sódio impuro.
mencionados na introdução teórica) * Numa das partes, num tubo de en-
* Adicione a esta amostra cerca de 50
saio, faça borbulhar cloreto de hidro-
HCl (1 M) (para a produção de HCl(g)) ml de água destilada e aqueça até
génio gasoso, preparado pela adição
dissolver a maior quantidade possí-
NH4Cl (para a produção de HCl(g)) de ácido sulfúrico concentrado sobre
vel, deixando as impurezas insolúveis
cloreto de sódio ou cloreto de amónio
Etanol a 95% (agente precipitante por em suspensão.
(esta segunda versão é mais efi-
alteração da constante dieléctrica) * Deixe a solução arrefecer ligeira- ciente). Esta operação deve ser feita
mente e filtre-a à trompa em cadinho numa hotte.
Solução de Na2CO3 a 10% (m/v)
G4: deste modo eliminará impurezas
(agente de precipitação do cálcio) * A outra das partes, também em tubo
que sejam insolúveis a quente.
de ensaio, adicione lentamente
Material de vidro e equipamento * Para eliminar o catião Ca2+, preci- etanol até observar o aparecimento
pite-o sob a forma de carbonato de de um precipitado. Para induzir o
- Balança técnica cálcio (CaCO3). Para isso adicione aparecimento do precipitado esfre-
- Placa de aquecimento gota a gota (com agitação) ao filtrado gue com uma vareta de vidro as
- Frigorífico obtido no ponto anterior, solução de paredes do tubo de ensaio.
- Hotte Na2CO3 a 10% (m/v). Pare a adição * A última das partes deve ser dividida
- Lupa estereoscópica NIKON® com de solução de carbonato de sódio por dois cristalizadores: um, coberto
câmara digital SONY® quando deixar de observar turvação com um papel de filtro, identificado, e
- Secador de cabelo da solução: isto significa que todo o posto num local onde possa perma-
- Copo de precipitação de 100 ml ião Ca2+ existente estará precipitado. necer em repouso e de preferência
- Proveta de 100 ml ou 50 ml Para confirmar o fim da precipitação, onde não ocorram grandes variações
filtre um pouco da solução de NaCl à de temperatura; o segundo deve ser
- Esguicho com água destilada
qual adicionou Na2CO3, e junte mais colocado destapado no frigorífico,
- Vareta de vidro
umas gotas da solução de carbonato identificado e deixado em repouso. A
- 2 Kitasatos
de sódio. A não formação de precipi- temperatura do frigorífico deve ser
- 2 Cadinhos filtrantes G4
tado garante a inexistência de ião regulada de forma a evitar a congela-
- Borracha de suporte de filtração
Ca2+. Separe o precipitado por filtra- ção das soluções (≈5ºC). Logo que
- Trompa de vácuo
ção à trompa utilizando um cadinho observe cristais desenvolvidos nes-
- Pipetas descartáveis ou pipetas de
G4. tes dois últimos cristalizadores, re-
Pasteur
colha-os por filtração, lave-os com
- 2 Tubos de ensaio * O excesso de ião carbonato introdu-
pequenas quantidades de água ge-
- 2 Cristalizadores zido no passo anterior é agora elimi-
lada e etanol, seque-os a frio e
- 2 Papeis de filtro e elásticos nado por adição à solução de HCl
guarde-os em caixinhas rotuladas
- Caixinhas de plástico concentrado, até pH bastante ácido,
após observação ao microscópio.
- Etiquetas com aquecimento. Observe a liberta-

PURIFICAÇÃO DE UM COMPOSTO IÓNICO - FOLHA DE RESULTADOS E OBSERVAÇÕES

Equação química do passo em que tração do ião cloreto, e ao desloca- Há sempre a ocorrência de “cree-
juntou o HCl: _____________ mento do equilíbrio pelo efeito do ião ping”, formação de cristais pequenos
comum) que “trepam” pelas paredes do cris-
Equação química do passo em que
talizador).
juntou carbonato de sódio:
_____________ b) Quando adicionou etanol.
_____________ d) Quando colocou no frigorífico.
Equação química do passo em que _____________
(Pretende-se demonstrar o efeito da
preparou cloreto de hidrogénio gaso-
alteração da constante dieléctrica do (Obtêm-se cristais tabulares malteses,
so: _____________
solvente; friccionar o tubo de ensaio maiores e em menor número, mas de-
Anotação da forma e tamanho dos com uma vareta de vidro permite des- moram muito mais tempo a cristalizar;
cristais: poletar a nucleação) também se observa a redução do
“creeping”).
a) Quando borbulhou HCl gasoso c) Quando deixou a evaporar lenta-
_____________ mente. _____________ e) Qual o processo que considera
(obtém-se um precipitado microcris- (Obtêm-se cristais tabulares malte- mais eficaz para a obtenção de cris-
talino, devido ao aumento da concen- ses. tais de NaCl ? _____________

QUÍMICA 106 - JUL/SET 07


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