Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Isabelle Santana
UERJ
10.37885/200800951
RESUMO
Nos últimos anos o óleo de coco (OC) ressurgiu como alternativa de óleo para ingestão.
Muitas vezes é divulgado como um óleo mais saudável, ao qual são atribuídos inúmeros
benefícios. Logo, ressalta-se a importância de compreender as motivações para ingestão
de OC, avaliar a forma de utilização na alimentação e a percepção sobre as possíveis
consequências desse consumo na saúde. Tais objetivos foram avaliados por meio de
pesquisa de opinião, sobre a situação de consumo do OC por indivíduos brasileiros.
O questionário foi realizado em plataforma online por 330 participantes, dos quais 111
consumiam OC. Foi notório o desconhecimento dos participantes em relação a composição
do OC. O principal motivo de utilização foi este óleo ser considerado mais saudável que
outros óleos. Os indivíduos relataram utilizar o OC principalmente como um componente
de receitas culinárias ou como meio de cocção para o preparo de alimentos. O consumo
diário relatado variou de 1 mL a 10 mL. Mais da metade dos respondentes acreditam
que o OC não provoca malefícios. Apesar de diversos estudos apresentarem benefícios
atribuídos ao OC, não há recomendação da quantidade de ingestão capaz de conferir
benefícios à saúde e/ou de uma ingestão máxima que não promova danos. Inclusive,
algumas organizações contraindicam o consumo do OC em virtude de poder promover
doenças cardiovasculares. Logo, quando houver o consumo é importante indicar que
esse contemple as recomendações de ingestão de ácidos graxos saturados, bem como
as formas de extração e de uso culinário que preservem os compostos bioativos do OC.
O óleo de coco (OC) é o produto lipídico derivado do albúmen sólido do fruto do co-
queiro (Cocos nucifera L.). Esse produto alimentício pode ser extraído de forma artesanal
ou comercial, nas versões virgem (OCV), de copra (OCp) ou refinado, branqueado e deso-
dorizado (RBD), os quais não diferem quanto ao conteúdo de ácidos graxos, mas sim em
relação aos compostos fenólicos, presentes em maior quantidade no OCV (Narayanankutty,
Illam, Raghavamenon, 2018; Marina, Che Man, Amin, 2009).
No Brasil, existe um uso histórico do OC para fins cosméticos ou na indústria oleoquí-
mica (Wongpoowarak et al., 2009). No entanto, habitantes de regiões tropicais, como Índia,
Filipinas, Malásia e Indonésia, apresentam hábitos de consumo de OC relacionado à cultura
medicinal e alimentícia. A plantação de coco foi expandida em colônias europeias (final do
século XIX), fazendo com que esse óleo fosse amplamente usado para cocção em países
da Europa e Estados Unidos. Contudo, a Segunda Guerra Mundial ocasionou escassez do
fornecimento do OC, o que influenciou o crescimento da produção e consumo de outras
oleaginosas (Lira et al., 2017; Cassiday, 2016).
Desde a década de 1950 o consumo de gordura saturada foi considerado um fator de
risco para desenvolvimento de doenças cardiovasculares (Ganesan, Sukalingan, Xu, 2018;
Eyres et al., 2016; Hamsi et al., 2015; Keys, 1953), o que levou à preocupação do consumo
de diferentes alimentos fontes, a exemplo do OC, cuja produção e exportação foi prejudicada
por essa tendência (Cassiday, 2016).
O OC é composto por, aproximadamente, 90% de ácidos graxos saturados, principal-
mente ácidos graxos de cadeia média (C6-C12), como o ácido láurico (C12:0, 46%), cáprico
(C10:0, 7%) e caprílico (C8:0, 9%), organizados em sua maior parte como triacilgliceróis de
cadeia média (TCM), principalmente a trilaurina (Đurašević et al., 2020; Cassiday, 2016). No
entanto, o suplemento comercial denominado TCM, que pode ser obtido tanto do OC como
do óleo de palma, é composto por ácidos graxos com 6 a 10 carbonos (ácidos caproico,
caprílico e cáprico), apresentando composição e metabolismo diferenciados, que favore-
cem a saciedade e absorção quando comparados ao OC (Kinsella, Maher, Clegg, 2017).
Ambos, OC e TCM, podem ser utilizados como estratégias nutricionais onde há comprome-
timento do metabolismo lipídico, visto que possuem metabolismo diferenciado em relação
aos triacilglicerois de cadeia longa (TCL) (Guimarães et al., 2019; Narayanankutty, Illam,
Raghavamenon, 2018).
Nos últimos dez anos o OC, principalmente OCV, ressurgiu em diversos países como
uma alternativa de óleo para a ingestão. Evidencia-se sua divulgação comercial, midiática
e por alguns profissionais de saúde como um óleo mais saudável, ao qual são atribuídas
propriedades antioxidantes, cardioprotetoras, antitrombóticas, hipolipemiantes, antivirais,
MÉTODO
RESULTADOS
Trezentos e trinta indivíduos (n=330) participaram da pesquisa (Tabela 1), sendo 87%
do sexo feminino, com faixa etária entre 17 e 60 anos. Escolaridade completa até o ensino
médio (43%) assim como uma renda mensal familiar de 2 a 5 salários mínimos (48%) foram
predominantes entre os respondentes. Cerca de 49% estudam ou exercem cargo profissional
na área da saúde (nutrição, medicina, enfermagem, educação física, fisioterapia e outras
áreas da saúde). De todos os participantes da pesquisa, 51% relataram praticar algum tipo
de atividade física, cujos tipos e graus de intensidade variaram amplamente.
Entre os que já fizeram ou fazem alguma dieta específica (66%), foram listados motivos
como: emagrecimento ou estética (40%), melhorar a saúde (28,5%), controle ou tratamento
de alguma doença (9%), alergia ou intolerância alimentar (4,5%) e outras razões como ga-
nho de peso e/ou massa muscular, cirurgias ou estilo de vida (religião ou vegetarianismo).
Foi notório o desconhecimento dos participantes em relação à composição do prin-
cipal macronutriente do OC (lipídeo), onde 9% relataram ser rico em proteína e 26% não
souberam responder. Um terço (n=111) dos indivíduos indicou consumir ou usar o OC como
Tabela 1. Caracterização socioeconômica de todos os participantes da pesquisa (n= 330) e dentre estes, do grupo de
consumidores de óleo de coco (n=111)
Figura 1. Motivos de uso do óleo de coco (%) (n=111) – pergunta com possibilidade de múltiplas respostas.
Figura 2. Respostas (%) dos participantes (n=111) sobre formas de consumo do óleo de coco – pergunta com possibilidade
de múltiplas respostas
Figura 3. Quantidade (%) usual de consumo de óleo de coco pelos participantes (n=111) – pergunta com uma opção de
resposta
A maior parcela dos indivíduos (59%) relatou não ter notado mudanças significativas
com a introdução do OC na alimentação, no entanto, alguns benefícios foram percebidos
após a inclusão desse óleo. Benefícios esses que ultrapassam o âmbito da estética — com
relatos de pele e cabelos mais fortes e sedosos —, e incluem melhoras metabólicas e cor-
porais como emagrecimento, melhora da função intestinal, sistema imune e perfil lipídico.
Investigando os possíveis malefícios causados aos consumidores do OC (n=111),
através de pergunta aberta, 99% dos indivíduos, relataram não perceber efeitos negativos.
Um participante (1%) informou apresentar enjoo decorrente do consumo de OC.
Todos os participantes (n=330) foram questionados quanto ao consumo de outros pro-
dutos derivados do coqueiro (Figura 4). Produtos de fácil acesso físico e financeiro como a
água de coco, coco ralado e leite de coco foram os mais consumidos pelos participantes, 82%,
78% e 64% respectivamente. Nota-se ainda, que tais alimentos são bastante utilizados em
preparações culinárias que fazem parte da cultura alimentar brasileira. Entretanto, produtos
como farinha de coco, açúcar de coco, manteiga de coco, néctar de coco e shoyu de coco
apresentaram percentuais de consumo reduzidos, o que pode ser devido à disponibilidade
recente e restrita desses produtos no mercado brasileiro, bem como o seu preço elevado e
o desconhecimento destes pela população, visto que não são tradicionalmente consumidos.
Quando questionados (n=330) a respeito do OC causar algum dano à saúde, 66% dos
participantes acreditam que o OC não causa malefícios. Dentre algumas justificativas apre-
sentadas estão a crença de que esse óleo, por ser um produto “natural” e por ser rico em
gorduras saturadas, não causaria danos. Vinte e três porcento (23%) indicaram que o OC só
irá causar algum efeito adverso caso seja consumido em excesso, o que poderia acarretar
algum efeito hipercolesterolêmico e aumentar propensão a doenças cardiovasculares. Alguns
indivíduos desse grupo acreditam que prejuízo será causado mediante o aquecimento do
OC e seu posterior consumo. Reforça-se que nenhum participante mencionou o que seria
considerado uma quantidade excessiva ou o tipo de OC consumido (RBD, OCp, OCV, OC
artesanal). Apenas 6% acreditam que esse óleo causa malefícios, uma vez que é rico em
gordura, principalmente saturadas, as quais são capazes de aumentar o colesterol. Um (1)
indivíduo desse quantitativo, ainda acredita que o OC pode fazer tão mal quanto manteiga
ou banha. Quatro porcento (4%) não souberam opinar.
DISCUSSÃO
Ficou evidente o contraste de opiniões entre os participantes (n=330) quanto aos efeitos
na saúde advindos da ingestão do OC. Esse óleo está entre os alimentos que mais contri-
buem para a ingestão dietética de ácidos graxos saturados (AGS), assim como as carnes,
os laticínios, o óleo de palma e o chocolate (Ganesan, Sukalingam, Xu, 2018; Brasil, 2014;
Lottenberg, 2009). O fato de ser rico em gorduras saturadas foi um dos fatores citados pelos
respondentes como causa de benefícios, assim como de malefícios, refletindo a incerteza
de informações em relação ao consumo desse alimento.
Em referência ao consumo de AGS, sabe-se que essa ingestão pode causar altera-
ções no perfil lipídico, como aumento de lipoproteínas de baixa densidade (LDL-c), embora
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
Arunima, S, Rajamohan, T. Influence of virgin coconut oil-enriched diet on the transcriptional re-
gulation of fatty acid synthesis and oxidation in rats - a comparative study. Br J Nutr 2014; 111:
1782-1790.
Assunção ML, Ferreira HS, dos Santos AF, Cabral CR Jr, Florêncio TM. Effects of dietary coconut
oil on the biochemical and anthropometric profiles of women presenting abdominal obesity. Lipids.
2009; 44(7): 593–601.
Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. (ANVISA). Legislação. Vi-
saLegis. Resolução RDC n.270, de 22 de setembro de 2005: aprova regulamento técnico para
Cardoso DA, Moreira ASB, Oliveira GMM, Luiz RR, Rosa G. A coconut extra virgin oil-rich diet
increases HDL cholesterol and decreases waist circumference and body mass in coronary artery
disease patients. Nutricion Hospitalaria. 2015; 32(5): 2144–2152.
Cassiday L. Coconut oil boom. INFORM: International News on Fats, Oils, and Related Materials.
2016; 27(5): 6-13.
Castro GSF, Cardoso JFR, Vannucchi H, Zucoloto S, Jordão AA. Fructose and NAFLD: metabolic
implications and models of induction in rats. Acta Cirúrgica Brasileira. 2011; 26(2): 45-49. Conselho
Federal de Nutricionistas (CFN). Posicionamento sobre o óleo de coco. Brasília 2015.
Clegg ME. They say coconut oil can aid weight loss, but can it really? Eur J Clin Nutr.
2017;71(10):1139–43.
Cruz BCS, Chagas CGO, Moreira AVB. O tratamento térmico influencia as características físico-quí-
micas e oxidativas do óleo de coco. Semina: Ciências Biológicas e da Saúde. 2018; 39(1): 51-58.
DebMandal M, Mandal S (2011). Coconut (Cocos nucifera L.: Arecaceae): In health promotion and
disease prevention. Asian Pacific Journal of Tropical Medicine. 2011; 4: 241– 247.
Dias MM, Siqueira NP, Conceição LL, Reis SA, Valente FX, Dias MMS et al. Consumption of virgin
coconut oil in Wistar rats increases saturated fatty acids in the liver and adipose tissue, as well as
adipose tissue inflammation. Journal of Functional Foods. 2018; 48: 472– 480.
Eyres L, Eyres MF, Chisholm A, Brown RC. Coconut oil consumption and cardiovascular risk factors
in humans. Nutrition Reviews. 2016; 74(4): 267–280.
Hamsi MA, Othman F, Das S, Kamisah Y, Thent ZC, Qodriyah HMS, et al. Effect of consumption
of fresh and heated virgin coconut oil on the blood pressure and inflammatory biomarkers: An
Hann VB, Martins MS, Dias RL. Termogênicos: uma revisão sistemática sobre o uso de óleo de
coco, óleo de cártamo e CLA. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva. 2014; 8(43): 10- 19.
Khaw K-T, Sharp SJ, Finikarides L, Afzal, I.; Lentjes, M.; Luben, R.; Forouhi, N.G. Randomised
trial of coconut oil, olive oil or butter on blood lipids and other cardiovascular risk factors in healthy
men and women. BMJ Open. 2018;8:e020167. doi:10.1136/bmjopen- 2017-020167
Kinsella R, Maher T, Clegg ME. Coconut oil has less satiating properties than medium chain trigly-
ceride oil. Physiology & Behavior. 2017; 179: 422–426.
Liau, KM, Lee YY, Chen CK, Rasool AH. An open-label pilot study to assess the efficacy and safety
of virgin coconut oil in reducing visceral adiposity. ISRN Pharmacol 2011; 2011: 949686. Arunima S.
Lima RS, Block JM. Coconut oil: what do we really know about it so far? Food Quality and Safety.
2019; 3: 61–72. doi:10.1093/fqsafe/fyz004
Lipoeto NI, Agus Z, Oenzil F, Wahlqvist ML, Wattanapenpaiboon N. Dietary intake and the risk of
coronary heart disease among the coconut-consuming Minangkabau in West Sumatra, Indonesia.
Asia Pac J Clin Nutr. 2004; 13(4): 377–384.
Lira GM, Cabral CCVQ, Oliveira IBA, Figueirêdo BC, Simon SJGB, Bragagnolo N. Changes in the
lipid fraction of king mackerel pan fried in coconut oil and cooked in coconut milk. Food Research
International. 2017; 101: 198–202.
Marina AM, Che Man YB, Amin I. Virgin coconut oil: emerging functional food oil. Trends in Food
Science and Technology. 2009; 20: 481–487.
Mozaffarian D, Aro A, Willet WC. Health effects of trans-fatty acids: experimental and observational
evidence .European Journal of Clinical Nutrition. 2009; 63, S5–S21
Narayanankutty A, Illam SP, Raghavamenon AC. Health impacts of different edible oils prepared
from coconut (Cocos nucifera): A comprehensive review. Trends in Food Science & Technology.
2018; 80: 1–7.
Neelakantan N, Seah JYH, Dam RMV. The Effect of Coconut Oil Consumption on Cardiovascular Risk
Factors A Systematic Review and Meta-Analysis of Clinical Trials. Circulation. 2020;141(10):803–
814. https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.119.043052
Nitbani FO, Jumina, Siswanta D, Solikhah EN. Isolation and Antibacterial Activity Test of Lauric
Acid from Crude Coconut Oil (Cocos nucifera L.). Procedia Chemistry. 2016; 18: 132–140.
Pehowich DJ, Gomes AV, Barnes JA. Fatty acid composition and possible health effects of coconut
constituents. West Indian Med J. 2000; 49(2): 128-132.
Quitete FT, Moura EG, Atella GC, Lisboa PC, Oliveira E. Differential effects in male adult rats of
lifelong coconut oil exposure versus during early-life only. Journal of Functional Foods. 2019; 55:
17–27.
Resende NM, Félix HR, Soré MR, Neto AMM, Campos KE, Volpato GT. The effects of coconut oil
supplementation on the body composition and lipid profile of rats submitted to physical exercise.
Anais da Academia Brasileira de Ciências. 2016; 88(2): 933-940. http://dx.doi.org/10.1590/0001-
3765201620150302
Sacks FM, Lichtenstein AH, Wu JHI, Appel LJ, Creager MA, Kris-Etherton PM, Miller M, Rimm EB,
Rudel LL, Robinson JG, Stone NJ, Horn LVV. dietary fats and cardiovascular disease a presiden-
tial advisory from the American Heart Association. Circulation. 2017;136:e1–e23. DOI: 10.1161/
CIR.0000000000000510
Sankararaman S, Sferra TJ. Are We Going Nuts on Coconut Oil? Current Nutrition Reports.
2018;7(3):107-115. https://doi.org/10.1007/s13668-018-0230-5.
Santos RD, Gagliardi ACM, Xavier HT, Magnoni CD, Cassani R, Lottenberg AM et al. Sociedade
Brasileira de Cardiologia. I Diretriz sobre o consumo de Gorduras e Saúde Cardiovascular. Arq
Bras Cardiol. 2013; 100(1Supl.3): 1-40
Santos HO, Howell S, Earnest CP, Teixeira FJ. Coconut oil intake and its effects on the cardio-
metabolic profile – A structured literature review. Progress in Cardiovascular Diseases. 2019; 62:
436–443.
Toklu B, Milne V, Bella M, Underberg JA. Rise in serum lipids after dietary incorporation of ‘‘Bulle-
tproof Coffee’’. Journal of Clinical Lipidology. 2015; 9(3):462.
Varma SR, Sivaprakasam TO, Arumugam I, Dilip N, Raghuraman M, Pavan KB, Rafiq M, Para-
mesh R. In vitro anti-inflammatory and skin protective properties of Virgin coconut oil. Journal of
Traditional and Complementary Medicine. 2017; xxx: 1-10.
Vysakh A, Ratheesh M, Rajmohanan TP, Pramod C, Premlal S, Girish kumar B, Sibi PI. Polyphe-
nolics isolated from virgin coconut oil inhibits adjuvant induced arthritis in rats through antioxidant
and anti-inflammatory action. International Immunopharmacology. 2014; 20: 124–130.