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Doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Docente
Permanente do Curso de Mestrado Acadêmico em Filosofia (CMAF-UECE) e Professor de Filosofia do
Instituto Federal do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE).
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Graduado em Humanidades pela Universidade de Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
(UNILAB)
Introdução
É para nós bastante claro que o misticismo enquanto o âmbito das imagens
obscuras, profundas como as raízes de uma grande árvore aérea, assim como os
vocábulos e as palavras que despreendem-se até dos sentidos para transbordar ao
imaginário. Pode, então, desta maneira, pensar na produção de imagens na mística
poética, se assim podemos nos referir ao horizonte bachelardiano?
O mistério possui pilares onde Deus não habita? Boehem é um dos primeiros
grandes místicos da era romântica, época em que o absoluto e a infinitude eram idéias
provavelmente conseqüentes da filosofia grega. E como já ficou aparentemente evidente
os mistérios das imagens ainda pouco conhecidos eram mais concentrados na matéria.
A tarefa que nos caberá neste artigo é esboçar as estratégias de alcance poético
da mística religiosa de personalidades como Saint Martin, oriundo da maçonaria
francesa e fundador do martinismo, ordem mística que hoje é afiliada ao
rosacrucionsimo, mas que a época tinha como seus expoentes um sapateiro chamado
Jacob Boehme. Desejamos também fazer um cotejo das referências de Bachelard à
Boehme e Saint-Martin e tentar extrair uma conclusão de seu posicionamento acerca de
sua posição acerca da mística.
Boehme
A principal obra de Boehme é O três princípios da essência divina, nessa obra
logo no primeiro capitulo o filósofo descreve a essência divina, no segundo princípio a
natureza de deus e no terceiro princípio o nascimento e a verdade eterna da sua natureza
e essência. Após essa breve introdução Boehme continua no conceito de cosmos cristão
de céu, paraíso e até juízo final.
Estamos na fonte dessa luz imaginaria, dessa luz nascida em nós mesmos, na
meditação do nosso ser, quando ele se liberta de suas misérias. No lugar do
espírito nasce uma alma iluminante. As metáforas se aglomeram para dar
realidades espirituais. Vivendo plenamente no reino das imagens,
compreendem-se então páginas como as de Jacob Boehme. (BACHELARD,
2001, p. 119)
Nota-se primeiramente o interesse acerca da luz e da imaginação e do
desdobramento destas não no espírito da ciência, mas no ânima da imaginação da alma
humana e a origem de sua luz na aurora das cores como origem subjetiva das metáforas
antes das palavras objetivas. Ao mesmo tempo em que não podemos falar no panteísmo
de Boehme, a maneira como Bachelard o descreve, nos parece muito próxima ao
pancalismo bachelardiano, demonstrando na verdade um amor à natureza e a sua beleza
divina. Tal qual quando diz a relação entre a imagem literária e a escuta da natureza:
A tríplice vida em Jacob Boehme indica que toda a lei está resumida no
triângulo, herança rosacruciana cujo sinal é composto de dois triângulos, um invertido
em relação ao outro formando um ponto central. A expressão latina para tal sinal é:
punctis Trianguli. O Martinismo trouxe estes ensinamentos para a senda do judaísmo
místico ou esotérico, já que este era o maior interesse de Saint Martin, discípulo de
Boehme, a ordem martinista é formada com base em conventículos que são espaços de
leitura e debate da torah e da Cabala, entre outros estudos filosóficos. Possuem três
graus e só pode ter acesso quem tem pelo menos o primeiro grau de templo rosacruz.
Saint-Martin
Para ser fiel ao pensamento de Boehme, cumpre aliás não colocar sistema-
ticamente o tempo da adstringência antes do tempo da doçura. Isto seria
aceitar muito ingenuamente, como diz Claude de SaintMartin, uma
linguagem criatural. Adstringência e doçura estão ligadas materialmente, é
pela adstringência que a doçura une-se à substância, é no mordente do mal
que se impregna o bem. (BACHELARD, 1990, p. 34)
Totalmente absorvido pelo seu trabalho, vivendo uma época muito fértil do
ponto de vista espiritual, Saint-Martin experimenta uma verdadeira felicidade que não
hesita em expressar. Observa, tratando exclusivamente do pensamento de Boehme, que
é fundamental dedicar-se fecundamente ao "grande objeto da obra do homem",
Saint-Martin insistirá com todos os seus amigos próximos na exigência da
lentidão que o "caminho" espiritual exige e, sobretudo, no caráter "experimental" da
ascensão espiritual.
Conclusões
é a época em que Boehhme perdeu a faculdade de 'ler' nos dois 'livros' do eu
da natureza, busca essa luz apagada nos escritos. de suas leituras, ele não nos
conta muito; ele não nomeia seus 'mestres'. e, no entanto, nenhuma dúvida é
possível: aquele que escreveu a Signaturarerum, o Weg zu christo e o
Mysterium magnun conhece Paracelso, Franck, Schwenfeld, Weigel, leu
alquimistas, astrólogos e místicos. (KOYRE, 1929, p. 39)
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“A idéia do germe é, com efeito, um mistério” (KOYRÉ apud BACHELARD, 2007, p. 65).
Essa dupla participação num único ato corresponde a um verdadeiro
maniqueísmo do movimento. A flor e seu perfume aéreo, o grão e seu peso
terrestre se formam em sentido contrário, juntos. Toda evolução é marcada
por um duplo destino. Forças coléricas e forças pacificadoras trabalham tanto
o mineral quanto o coração humano, Toda a obra de Jacob Boehme é feita de
devaneios tensionados entre as forças aéreas e as forças terrestres. Jacob
Boehme é assim um moralista do metal. (BACHELARD, 2001, p. 272)
O que nos parece claro é que o tipo de mística que Boehme e Saint-Martin
revelaram, foi talvez um dos últimos movimentos esotéricos de profundo impacto entre
as ordens maçônicas e rosacruzes, para Bachelard, curiosamente, essa seria uma mística
materialista, ligada a alquimia e a imaginação espiritual e isso foi justamente o
diferencial desses movimentos em relação a outras religiosidades que perderam o
encantamento, ou melhor, a mística.
Bibliografia
_____. A intuição do instante. Trad. Antonio Danesi. Campinas: Verus Editora, 2007.