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Teoria de Deteção Remota

Mário Caetano

Janeiro 2018
Este livro deve ser citado da seguinte maneira:

Caetano, M., 2018. Teoria de Deteção Remota, [e-book]. NOVA Information Management School
(NOVA IMS), Universidade Nova de Lisboa.
Índice
Índice ...................................................................................................................................................... 1
Acrónimos e abreviaturas ........................................................................................................................ 2
1. Introdução ........................................................................................................................................... 9
1.1. Definições ................................................................................................................................................... 9
1.2. Os benefícios socioeconómicos da deteção remota ...................................................................................... 9
1.3. Objectivos e estrutura do livro .................................................................................................................... 14
1.4. Bibliografia em deteção remota e recursos na Internet ................................................................................ 16
2. Fundamentos de deteção remota....................................................................................................... 21
2.1. Componentes de um sistema de deteção remota ....................................................................................... 21
2.2. Fontes de energia e princípios da radiação................................................................................................. 22
2.4. Interações da radiação solar com elementos da superfície terrestre ............................................................ 29
2.5. Gravação da energia pelo sensor ............................................................................................................... 35

3. Satélites e sensores de observação da Terra .........................................................................................


39
3.1. Tipos de sensores e modos de aquisição de imagens .................................................................................... 40
3.2. Tipos de órbitas ............................................................................................................ ................................... 46
3.3. Quatro tipos de resoluções .................................................................................................. ............................ 52
3.4. Os principais programas de observação da Terra ........................................................................................... 58
3.4.1. O Programa Landsat ................................................................................................................................ 74
3.4.2. O Programa SPOT
................................................................................................................................... 76
3.4.3. O Programa IRS ...................................................................................................................................... 78
3.4.4. IKONOS e GeoEye ............................................................................................................... ................... 80
3.4.5. QuickBird e WorldView
............................................................................................................................ 81
3.4.6. ENVISAT ..................................................................................................................... .............................
82
3.4.7. Terra e Aqua ............................................................................................................................................
86
3.4.8. Disaster Monotoring Constellation (DMC) ...............................................................................................
88
3.4.9. RapidEye .................................................................................................................... .............................
89
3.4.10. Sentinels ................................................................................................................................................ 90
3.4.11. Earth Explorers ............................................................................................................. ......................... 92
3.4.12. Os satélites/sensores radar
................................................................................................................... 95 3.4.13. Constelações
virtuais de satélites de observação da Terra ................................................................... 97
3.4.14. Outros programas de observação da Terra ......................................................................................... 100
3.5. Política de dados e acesso a imagens de satélite ......................................................................................... 102
3.6. Considerações finais ........................................................................................................ .............................. 104
3.6.1. Satélites de observação da Terra em órbita e perspectivas futuras ...................................................... 104
3.6.2. A evolução da observação da Terra por satélite .................................................................................... 108
4. Análise exploratória de imagens de satélite ..........................................................................................
116
4.1. Análise estatística .......................................................................................................................................... 116
4.2. Visualização de imagens ............................................................................................................................... 117
5. Pré-processamento de imagens de satélite ..........................................................................................
131
5.1. Distorções existentes nas imagens................................................................................................................. 131
5.1.1. Distorções geométricas .............................................................................................................. ............ 131
5.1.2. Distorções radiométricas ........................................................................................................................ 132
5.2. Correção Geométrica ..................................................................................................................................... 137

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5.2.1. Correcção das distorções geométricas sistemáticas ............................................................................. 137
5.2.2. Correcção das distorções geométricas não sistemáticas ...................................................................... 137
5.3. Correcção radiométrica .................................................................................................................................. 142
6. Transformação de bandas.....................................................................................................................
149
6.1. Índices de vegetação ..................................................................................................................................... 149
6.2. Análise de componentes principais................................................................................................................ 159
6.3. Filtragem espacial .......................................................................................................................................... 163
7. Extracção de informação de imagens de satélite .................................................................................
169
7.1. Nomenclatura ................................................................................................................................................ 170
7.2. Interpretação visual................................................................................................................... ..................... 171
7.3. Classificação automática ............................................................................................................................... 175
7.3.1. Selecção da unidade espacial de análise (UEA) ................................................................................... 176
7.3.2. Segmentação de imagens ..................................................................................................................... 179
7.3.3. Construção da base de características a utilizar na classificação ......................................................... 181
7.3.4. Selecção das características a utilizar na classificação de imagens ..................................................... 182
7.3.5. Algoritmos de classificação .................................................................................................................... 185
7.3.6. Integração de informação auxiliar .......................................................................................................... 206
7.3.7. Tratamento pós-classificação ................................................................................................................ 207
7.4. Processo semi-automático ............................................................................................................................. 210
7.5. Avaliação da qualidade dos mapas ............................................................................................................... 211
7.6. Tecnologias e métodos de deteção remota para cartografia de ocupação do solo: perspetiva história e
desafios futuros ............................................................................................................ ........................................ 214
7.6.1. Tecnologia ............................................................................................................................................. 214
7.6.2. Produtos .................................................................................................................... ............................. 217
7.6.3. Métodos ..................................................................................................................... ............................ 218
7.6.4. Considerações finais .............................................................................................................................. 222

Acrónimos e abreviaturas
3MI Multi-viewing Multi-channel Multi-polarization Imager

AATSR Advanced Along Track Scanning Radiometer

ADM Atmospheric Dynamics Mission

AIRS Atmospheric Infrared Sounder

ALOS Advanced Land Observing Satellite

AMSR-E Advanced Microwave Scanning Radiometer-EOS

AMSU Advanced Microwave Sounding Unit

ASAR Advanced Synthetic Aperture Radar

ASTER Advanced Thermal Emission and Reflection Radiometer

AVHRR Advanced very high resolution radiometer

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AWiFS Advanced Wide-Field Sensor

BGIS2000 Ball Global Imaging System 2000

CBERS China Brazil Earth Resources Satellite

CERES Clouds and the Earth's Radiant Energy System

CEOS Committee on Earth Observation Satellites

CGMS Coordination Group for Meteorological Satellites

COSMO COnstellation of small Satellites for Mediterranean basin Observation

CHRIS Compact High Resolution Imaging Spectrometer

CIA Central Intelligence Agency

CNES Centre National d’Études Spatiales

DLR German Aerospace Center

DMC Disaster Monitoring Constellation

DORIS Doppler Orbitography and Radiopositioning Integrated by Satellite

EADS European Aeronautic Defence and Space Company

EarthCARE Earth Clouds Aerosols and Radiation Explorer

EOC Electro Optical Camera

ESA European Space Agency

ETM Enhanced Thematic Mapper

ETM+ Enhanced Thematic Mapper Plus

EUA Estados Unidos da América

EROS Earth Remote Sensing Satellites

ERTS Earth Resources Technology Satellite

EUMETSAT Europe's Meteorological Satellite Organisation

FCI Flexible Combined Imager

FORMOSAT Formosa Satellite

GFOV Ground Field of View

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GIS GeoEye Imaging System

GMES Global Monitoring for Environment and Security

GMS Geostationary Meteorological Satellite

GOCE Gravity Field and Steady-State Ocean Circulation Explorer

GOES Geostationary Operational Environmental Satellite

GOME Global Ozone Mapping Experiment

GOMOS Global Ozone Monitoring by Occultation of Stars

GOMS Geosynchronous Operational Meteorological Satellite

HiRAIS High Resolution Advanced Imaging System

HiRI High-Resolution Imager

HRV High Resolution Visible

HRVIR High Resolution Visible Infrared

HRS High Resolution Stereoscope

HS Hyperspectral

HSB Humidity Sounder for Brazil

IFOV Instantaneous Field of View

INSAT Indian National Satellite

IRS Indian Remote Satellites

IRS Thermal Infrared Sounder

ISRO Indian Space Research Organization

IVC Infravermelho de Onda Curta

IVM Infravermelho de Onda Média

IVP Infravermelho Próximo

IVT Infravermelho Térmico

JAXA Japan Aerospace Exploration Agency (anteriormente designada por NASDA)

JERS Japanese Earth Resources Satellite

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KOMPSAT Korea Multipurpose Satellite

Landsat Land Satellite

LDCM Landsat Data Continuity Mission

LISS Linear Self Scanning Sensor

LRR Laser Retro Reflector

LSI Land Surface Imaging

MERIS Medium Resolution Imaging Spectrometer

METEOSAT Meteorological satellite

MIPAS Michelson Interferometer for Passive Atmospheric Sounding

MISR Multi-angle Imaging Spectroradiometer

MODIS Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer

MONO Monochromatic

MOPITT Measurements Of Pollution In The Troposphere

MOS Modular Optoelectronic Scanner

MR Microwave Radiometer

MIRAS Microwave Imaging Radiometer using Aperture Synthesis

MRTVK Multispectral Television Systems

MSC Multi-Spectral Camera

MSG METEOSAT Second Generation

MSI Multi Spectral Imager

MSS Multispectral Scanner

MWR Microwave Radiometer

NAOMI New AstroSat Optical Modular Instrument

NASA National Aeronautics and Space Administration


NASDA
National Space Development Agency of Japan (actualmente designada por
JAXA)

ND Número Digital

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NOAA National Oceanic and Atmospheric Administration

NPOES National Polar-orbiting Operational Environmental Satellite System

OLCI Ocean and Land Colour Imager

OLI Operational Land Imager

OSA Optical Sensor Assembly

OSMI Ocean Scanning Multi-spectral Imager

P Panchromatic

PAN Panchromatic

POES Polar Operational Environmental Satellite

PROBA Project for On-Board Autonomy

RA Radar Altimeter

RA-2 Radar Altimeter 2

RBV Return-Beam Vidicon

RE RedEdge
SAR Synthetic Aperture Radar

SCIAMACHY Scanning Imaging Absorption Spectrometer for Atmospheric ChartographY


SIRAL SAR Interferometer Radar Altimeter

SLIM Surrey Linear Imager

SLSTR Sea and Land Surface Temperature Radiometer

SMOS Soil Moisture and Ocean Salinity Satellite

SP110 SpaceView 110

SPOT Satellite Pour l’Observation de la Terre

SRAL SAR Radar Altimeter

TanDEM-X TerraSAR-X Add-on for Digital Elevation Measurements

TIROS Television and Infrared Observation Satellite

TIRS Thermal Infrared Sensor

TM Thematic Mapper

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TVC Television Camera

URSS União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

USGS United States Geologic Survey

UVNS Ultraviolet-visible-near infrared imaging spectrometer

VGT-P Vegetation Instrument - PROBA

VII Visible Infrared Imager

XS Multiespectral

XI Multiespectral (inclui infravermelho médio)

WMO World Meteorological Organisation

WiFS Wide-Field Sensor

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1. Introdução
1.1. Definições
Deteção remota pode ser definida como o processo de obter informação sobre um objecto sem
estar em contacto direto com ele, e inclui medições de energia eléctrica, magnética,
electromagnética e vibracional (acústica) (Horler e Barber, 1981).

Deteção remota é, por definição, um termo muito geral e pode incluir processos como a visão
humana, fotografia, radar e sismologia. Contudo, o termo deteção remota é normalmente
associado a sistemas baseados em energia electromagnética, e que registam informação sobre
a Terra com sensores montados em aviões ou satélites. Nesse sentido, deteção remota já foi
definida como “a ciência de aquisição, processamento e interpretação de imagens adquiridas por
aviões ou satélites que gravam a interação entre a matéria e a energia electromagnética” (Sabins,
1987).

O termo deteção remota tem vindo a ser progressivamente substituído por observação da Terra
e para muitos autores e instituições têm o mesmo significado. Também a observação da Terra
pode incluir sistemas montados em satélites (e aí há quem prefira utilizar uma designação mais
explicita, i.e. observação da Terra por satélite) ou sistemas in situ, que incluem observações
montadas em plataformas aerotransportadas mas também oceânicas e terrestres (e.g., estações
meteorológicas, sensores de monitorização da qualidade do ar). Muitas autores e instituições
(e.g., Agência Espacial Europeia) utilizam o termo observação da Terra para se referiram
exclusivamente à aquisição de informação por sensores montados em satélites que orbitam a
Terra.

Este livro assenta essencialmente na deteção remota por satélite, excluindo-se assim outras
formas de deteção remota para caracterização da superfície terrestre como por exemplo a
fotografia aérea (câmaras fotográficas montadas em aviões) ou sensores digitais instalados em
aviões. Por uma questão de simplificação, neste curso os termos deteção remota e observação
da Terra são utilizados exclusivamente para observações por satélite (i.e., imagens de satélite).

1.2. Os benefícios socioeconómicos da deteção remota


A deteção remota é atualmente uma fonte incontornável de dados para monitorização ambiental,
gestão de recursos naturais, segurança do cidadão e defesa e tem sido alvo de um forte
investimento de diferentes governos, agências internacionais como a Agência Espacial Europeia
(ESA) e empresas privadas.

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De acordo com o estudo Euroconsult (2010), entre 2000 e 2009 foram lançados 107 satélites de
observação da Terra (excluindo os satélites meteorológicos) e espera-se que entre 2010 e 2019
sejam lançados 230, o que corresponde a mais do dobro da década anterior. Segundo este
mesmo estudo, só no ano de 2010 as vendas comerciais de imagens de satélite atingiram 1.3 mil
milhões USD.

A expansão das missões de satélites de observação da Terra têm um impacto em toda a cadeia
de valor, desde o fabrico dos satélites até ao fornecimento de dados e serviços de valor
acrescentado para um número crescente de utilizadores. Por isso mesmo, a observação da Terra
tem contribuído significativamente para o impacto do sector espacial na sociedade moderna, não
só pela sua importância na resposta a desafios societais como a monitorização ambiental, gestão
de recursos naturais ou alterações climáticas, mas também pelo seu forte contributo para o
crescimento económico e criação de emprego (OECD, 2011).

As principais razões que justificam o grande interesse pela observação da Terra são as seguintes:
• baixo custo das imagens, quando comparado com trabalho de campo ou fotografia aérea;
• aquisição de dados em áreas mais inacessíveis ou inóspitas;
• disponibilidade em formato digital;
As imagens de satélite já são adquiridas em formato digital, podendo por isso ser
processadas por computador. A fotografia aérea tradicional não é adquirida em formato
digital e a sua incorporação num computador requer conversão de formatos, o que é bastante
dispendioso.
• velocidade do processamento dos dados;
Esta vantagem está relacionada com o formato digital das imagens. O automatismo
associado com muitas técnicas de processamento digital de imagens permite uma análise e
uma resposta rápidas.
• periodicidade de aquisição de dados;
Os satélites são concebidos para aquisição periódica de imagens de uma mesma área com
condições semelhantes de observação. Por exemplo, o satélite Landsat-7 ETM+ adquire
imagens de uma mesma área de 16 em 16 dias. Esta vantagem tem, por exemplo, sido
utilizada na monitorização de áreas sujeitas a secas ou cheias, já que permite a comparação
de imagens antes e depois do evento. Por outro lado, esta periodicidade conhecida permite,
ao contrário do trabalho de campo e da fotografia aérea, aquisição de dados sem um
planeamento prévio. Por exemplo, podemos comprar uma imagem de satélite de 1980 da
área de Lisboa para fazer a cartografia do uso de solo nesse ano, sem que tenha sido

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necessário planear em 1980 a aquisição de uma imagem. Refira-se no entanto que existem
atualmente sensores montados em satélites que não estão constantemente a adquirir
imagens, mas que pelo contrário só o fazem quando são ativados pelos seus operadores
porque receberam um pedido explícito de um cliente. Isto é verdade para os sensores que
adquirem imagens de muito grande resolução espacial (e.g., GeoEye-1).

Desde o lançamento do primeiro satélite de observação da Terra na década de 70, vários grupos
de investigação têm vindo a desenvolver metodologias para extração de informação a partir de
imagens de satélite em várias áreas de aplicação, como as apresentadas na Tabela 1.

A aposta da União Europeia e de muitos países em programas de financiamento de investigação


e desenvolvimento (I&D) relacionados com observação da Terra têm conduzido ao
desenvolvimento de metodologias cada fez mais eficazes para extração de informação fiável a
partir de dados obtidos por satélites. Por outro lado, os desenvolvimentos tecnológicos têm
permitido o lançamento de satélites e sensores que permitem a obtenção de dados de maior
resolução e com maior periodicidade. Tem-se assim assistido a uma transição progressiva de
projetos de I&D para programas operacionais de monitorização ambiental, gestão de recursos
naturais e segurança do cidadão que utilizam imagens de satélite como a principal fronte de
informação. A nível da União Europeia, estes programas alicerçam-se numa vontade crescente
para se evoluir para uma sociedade baseada em conhecimento, tal como explicitamente referido
no Tratado de Lisboa da União Europeia de 13 de Dezembro de 2007. A observação da Terra
pode assim dar um contributo significativo para uma União Europeia mais competitiva, que
assuma a sua responsabilidade social e que promova o desenvolvimento sustentável

Com a consolidação de metodologias fiáveis para extração de informação de imagens de satélite


começou-se a falar nos benefícios socioeconómicos da deteção remota, o que assume particular
importância para a atração de financiamento público para o desenvolvimento de novas missões
de observação da Terra e de programas governamentais que utilizam já a observação da Terra
de uma forma operacional para obtenção de informação. O Group on Earth Observations (GEO)
(www.earthobservations.org) agrupou os benefícios socioeconómicos da deteção remota da
seguinte maneira (GEO, 2004):
• redução da perda de vida e propriedade causada por desastres naturais ou associados à
atividade humana;
• compreensão dos factores ambientais que afectam a saúde humana e o bem-estar;
• melhoramento da gestão dos recursos energéticos;
• compreensão, avaliação, previsão, mitigação e adaptação às alterações climáticas;

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• melhoramento da gestão dos recursos hídricos através de uma melhor compreensão do ciclo
da água;
• aquisição de dados meteorológicos para previsão do tempo e avisos;
• apoio da gestão e da proteção dos ecossistemas terrestres, costeiros e marinhos;
• apoio à agricultura sustentável e combate à desertificação;
• monitorização e conservação da biodiversidade.

O melhor exemplo de um programa operacional baseado em imagens de satélite é o Programa


Copernicus, antes designado por GMES (Global Monitoring for Environment and Security). O
Copernicus é uma iniciativa liderada pela União Europeia (UE) e implementada em parceria com
a Agência Espacial Europeia (ESA) e com os seus Estados-Membros (EM). O Copernicus é, tal
como o Galileo, uma iniciativa emblemática da Política Espacial Europeia cujo desenvolvimento
e implementação estão inscritos no art.º 189 do Tratado sobre o Funcionamento da União
Europeia (UE, 2008). O Copernicus começou a ser desenvolvido em 2000 e entrou na sua fase
operacional em 2011 através do Regulamento 911/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho
de 20 de Outubro de 2010 (UE, 2010).

O Copernicus tem como principal objetivo a disponibilização de serviços que permitam o acesso
atempado a dados e informação fiáveis relativos ao ambiente e segurança. O programa inclui
duas componentes relacionadas com a aquisição de dados (i.e. componentes in situ e espaço)
que alimentam a terceira componente (i.e. os serviços) para produção de informação nas
seguintes áreas: terra, emergências, meio marinho, atmosfera, segurança e alterações climáticas
(Caetano, 2011). O Copernicus tem um conjunto de satélites dedicados, i.e. Sentinels, que serão
descritos no capítulo sobre satélites e sensores de observação da Terra deste manual.

Tabela 1. Exemplos de aplicações de deteção remota por satélite.


Área de Aplicação Aplicação

Meteorologia
Modelação climática a diferentes escalas
Análise de massas nebulosas e sua evolução
Previsão de desastres naturais de origem meteorológica

Agricultura e Florestas
Cartografia de espécies vegetais
Avaliação do estado da vegetação
Determinação da biomassa
Estatísticas agrícolas
Caracterização biométrica de povoamentos florestais
Cartografia de risco de incêndio

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Cartografia e Planeamento Urbanístico
Classificação do uso do solo
Cartografia e atualização de mapas
Separação de áreas urbanas e rurais
Cartografia das redes de transporte

Geologia
Cartografia de unidades geológicas principais
Revisão de mapas geológicos
Guia de reconhecimento de superfícies minerais

Recursos Hídricos
Determinação do limite, área e volume de superfícies aquáticas
Cartografia de inundações
Determinação da área e limite de zonas geladas
Avaliação de rupturas glaciares
Avaliação de modelos de sedimentação
Determinação da profundidade da água
Delimitação de campos irrigados
Inventário de lagos
Determinação de zonas com alterações hidrológicas

Oceanografia e Recursos Marítimos Avaliação de modelos de turbidez e circulação da água


Cartografia temática da superfície do mar
Cartografia de superfícies geladas para a navegação
Estudo das marés e ondas

Meio Ambiente
Cartografia e controle da poluição da água
Determinação da poluição do ar e seus efeitos
Caracterização dos efeitos dos desastres naturais
Controle ambiental das atividades humanas (e.g., eutrofização da água)
Monitorização de incêndios florestais e dos seus efeitos
Avaliação de modelos de escorrimento superficial e erosão

O Copernicus inclui os seguintes serviços:


• monitorização da Terra – inclui vigilância ambiental da biodiversidade, dos solos, da água, da
floresta, e dos recursos naturais à escala local, regional e global. Este serviço apoiará também
a aplicação de políticas relacionadas com ambiente, recolha de informação geográfica,
agricultura, energia, planeamento urbano, infraestruturas e transportes.

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gestão de emergências – orientado para diferentes cenários de catástrofes meteorológicas,


geofísicas, provocadas pelo Homem e outras catástrofes humanitárias. Este serviço produzirá
informação para a prevenção, preparação e resposta a emergências.
• monitorização do meio marinho – inclui segurança marítima (e.g. apoio à política dos
transportes) e caracterização do estado do mar e dos ecossistemas marinhos. Este serviço
inclui também previsões meteorológicas sazonais e a monitorização do clima.
• monitorização atmosférica – orientado para controlo da qualidade do ar à escala local,
nacional e europeia e da composição química à escala mundial.
• segurança – inclui controlo de fronteiras, vigilância marítima e apoio às ações externas da UE
(e.g., resposta a crises humanitárias) e será implementado a diferentes níveis: nacional,
regional, europeu e global.
• monitorização das alterações climáticas – fornecimento de variáveis essenciais do clima,
análise e projeções climáticas para o apoio às políticas de adaptação e atenuação.

O Copernicus permite então apoiar a definição, a implementação e a monitorização de: (1)


políticas comunitárias, regulamentações nacionais e convenções internacionais na área do
ambiente; (2) políticas comunitárias e nacionais em áreas como agricultura, desenvolvimento
regional, pescas, transportes, relações externas e ajuda humanitária; (3) políticas relacionadas
com a segurança dos cidadãos, a nível nacional e comunitário. O Copernicus tem também um
papel muito importante na gestão de emergências (i.e. prevenção, preparação e resposta a
emergências) e nas alterações climáticas (i.e. caracterização, atenuação e adaptação) (Caetano,
2011).

O Copernicus não é o primeiro programa operacional com base em imagens de satélite na União
Europeia ou nos seus Estados Membros, mas é o primeiro sistema integrado de resposta a
desafios societais e traz grandes vantagens em termos de benefícios de investimento realizado.
Com efeito, de acordo com um estudo do Instituto Europeu para a Política do Espaço e divulgado
no início de 2011, estima-se que os benefícios socioeconómicos do Copernicus sejam cerca de
dez vezes superiores ao investimento (Giannopapa, 2011).

1.3. Objectivos e estrutura do livro


Este livro foca-se na deteção remota por satélite dedicada à monitorização da terra (land),
excluindo-se assim a monitorização dos oceanos e da atmosfera. Por essa razão, o curso é
dedicado às regiões do visível e do infravermelho refectivo, excluindo-se assim a deteção remota
do infravermelho térmico e das micro-ondas. A razão desta opção prende-se sobretudo com o

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facto de a maioria das aplicações operacionais da deteção remota por satélite para monitorização
da terra se basear no visível e no infravermelho refletivo, apesar de uma utilização cada vez mais
crescente de micro-ondas. Segundo um estudo da Euroconsult as imagens ópticas (i.e. visível e
infravermelho) representam 83% das vendas globais de imagens (Euroconsult, 2011).

A maior parte das técnicas de aquisição e de processamento digital de imagens transmitidos


neste curso não pode ser extrapolada para o domínio das micro-ondas e do infravermelho
térmico. Por um lado, a aquisição de imagens de micro-ondas é feita por processos bastante
diferentes da aquisição de imagens do visível e do infravermelho refectivo. Com efeito, as micro-
ondas são obtidas por sensores ativos (i.e., sensores radar), cuja designação se deve ao facto
de serem os próprios sensores a emitirem radiação electromagnética em direção à superfície e
de receberem depois a parte reflectida por esta. A aquisição de imagens do visível e do
infravermelho refectivo é feita por sensores passivos, pois captam radiação naturalmente
disponível (i.e. radiação solar reflectida pela superfície da Terra). Por outro lado, o infravermelho
térmico é uma radiação emitida e não reflectida o que lhe dá características muito particulares.
Também as técnicas de processamento de dados do infravermelho térmico e das micro-ondas
são muito distintas das utilizadas para a radiação do visível e do infravermelho térmico. A inclusão
de secções dedicadas à aquisição por sensores remotos do infravermelho térmico e das micro-
ondas e respectivo processamento tornariam o conteúdo deste livro muito extenso para poder ser
lecionado num semestre.

Este livro tem três partes principais:


• fundamentos de deteção remota por satélite;
• principais satélites e sensores de observação da Terra;
• extração de informação de imagens de satélite.

A componente dos fundamentos de deteção remota incide nas principais características da


radiação electromagnética e na interação da radiação com a atmosfera e com a superfície.

Na segunda componente, descrevem-se os principais satélites e sensores de observação da


Terra e explica-se como é que num determinado projeto se escolhe o satélite e sensor mais
adequado para obter a informação necessária.

Na componente sobre extração de informação serão abordados os passos fundamentais no


processamento digital de imagens de satélite, e que são:

pré-processamento;

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• transformação de bandas;
• extração de informação das imagens;
• tratamento pós-classificação;
• avaliação da qualidade dos mapas produzidos.

O pré-processamento tem como principal objectivo a redução de distorções geométricas e


radiométricas introduzidas durante a aquisição das imagens pelos satélites/sensores. Em muitos
estudos, o analista faz uma transformação de bandas para melhorar a extração de informação.
Exemplos de transformações de bandas são a análise de componentes principais e os índices de
vegetação. A extração de informação das imagens é, sem dúvida, o passo mais importante. Na
deteção remota temática, cujo principal objectivo é a produção de cartografia temática, a maior
parte das metodologias baseia-se em análise visual ou classificação espectral. Na deteção
remota quantitativa, cujo principal objectivo é a inferência de propriedades físicas, químicas ou
biológicas dos componentes de superfície, a extração de informação recorre a métodos empíricos
ou métodos teóricos. O tratamento pós-classificação é uma etapa que não é necessária em todos
os estudos e pode envolver, por exemplo, generalização dos mapas obtidos na extração de
informação para garantir uma unidade espacial mínima superior à área de um pixel. A avaliação
da qualidade dos mapas permite criar uma série de índices que traduzirão a fidelidade do mapa
à realidade.

Este livro poderia designar-se por Deteção Remota e Processamento Digital de Imagem. Com
efeito, numa perspectiva mais purista a designação de deteção remota inclui apenas as
componentes mais dedicadas à aquisição de imagens (i.e. fundamentos de deteção remota e
satélites e sensores de observação da Terra), excluindo assim a componente dedicada a
metodologias e algoritmos para converter os dados recolhidos pelos sensores em informação (i.e.
extração de informação por processamento digital de imagem). No entanto, seguiu-se a tendência
internacional de utilizar apenas, ainda que de uma forma abusiva e generalista, a designação de
deteção remota.

1.4. Bibliografia em deteção remota e recursos na Internet


Livros
Aconselham-se os seguintes livros generalistas sobre deteção remota e processamento digital de
imagens de satélite:

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Jensen, J.R., 2015. Introductory Digital Image Processing: a Remote Sensing Perspective,
4ª Edição. New Jersey: Prentice-Hall.
• Richard J., 2013. Remote Sensing Digital Image Analysis: An Introduction, 5ª Edição.
Berlim: Springer Verlag.

O seguinte livro é uma boa referência do ponto de vista teórico, tendo também uma parte dedicada
às principais aplicações de deteção remota:
• Warner, T., M. Nellis e G. Foody (Eds.), 2009. The SAGE Handbook of Remote Sensing.
London: SAGE Publications Ltd.

Existem também muitos livros que se dedicam a aplicações específicas de deteção remota, como
por exemplo:
• Giri, C. (Ed.), 2012. Remote Sensing of Land Use and Land Cover: Principles and
Applications. CRC Press.
• Weng, Q. (Ed.), 2011. Advances in Environmental Remote Sensing: Sensors, Algorithms, and
Applications.CRC Press.
• Rashed, T. and C. Jürgens (Eds), 2010. Remote Sensing of Urban and Suburban Areas.
New York: Springer.
• Nayak, S. and S. Zlatanova (Eds.), 2008. Remote Sensing and GIS Technologies for
Monitoring and Prediction of Disasters, New York: Springer.
• Chuvieco, E. (Ed.), 2008. Earth observation of global change. New York: Springer.
• Jensen, J., 2006. Remote sensing of the environment: an earth resource perspective, 2ª
Edição. New Jersey: Prentice Hall.

Tutoriais de deteção remota


Os principais tutoriais de deteção remota e processamento digital de imagens de satélite
existentes na internet são:
• Remote Sensing Tutorials do Canada Centre for Remote Sensing (e.g., Fundamentals of
Remote Sensing, Digital Images and Digital Analysis Techniques, Radar remote Sensing)
(http://www.nrcan.gc.ca/earth-sciences/geography-
boundary/remotesensing/fundamentals/1430)

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 17


• The Remote Sensing Tutorial da National Aeronautics and Space Administration (NASA)
http://noaasis.noaa.gov/NOAASIS/ml/education.html

Principles of Remote Sensing do Centre for Remote Imaging, Sensing and Processing,
National University of Singapore
(http://www.crisp.nus.edu.sg/~research/tutorial/rsmain.htm)
• Aerial Photography and Remote Sensing da University of
Colorado
(http://www.colorado.edu/geography/gcraft/notes/remote/remote_f.html)
• Basics of Remote Sensing from Satellite da National Oceanic and Atmospheric
Administration (NOAA)
(http://www.orbit.nesdis.noaa.gov/smcd/opdb/tutorial/intro.html)
• Remote Sensing: an online tutorial da University of Ohio
(http://dynamo.phy.ohiou.edu/tutorial/tutorial_files/frame.htm)
• ESA Tutorials da European Space Agency (ESA)
(http://www.esa.int/SPECIALS/Eduspace_EN/)

Revistas
As principais revistas sobre deteção remota e processamento digital de imagens de satélite são:
• Canadian Journal of Remote Sensing
• Earth Observation Magazine (EOM)
• Earth Observations Quarterly (EOQ)
• International Journal of Remote Sensing
• ISPRS Journal of Photogrammetry and Remote Sensing
• Photogrammetric Engineering and Remote Sensing (PE&RS)
• Remote Sensing of Environment

Recursos
Existe atualmente uma série de recursos disponíveis na Internet relacionados com informação
geográfica e com imagens de satélite, de onde se destacam os seguintes:
• Earth Resources Observation and Science (EROS)
• ESA: observing the Earth
• Eurimage - Earth Observation Products and Services in Europe
• Copernicus program – Europe’s eys on Earth
• GeoGratis
• ImageNet: Spatial Data Search Engine

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 18


• Maps at National Geographic
• Microsoft TerraServer
NASA Observatorium
• NASA Spacelink - An Aeronautics & Space Resource for Educators
• NASA Ames Research Center's Landsat Pages • National Snow and Ice Data Center
• Satellite Imagery Available through the Internet
• The Geography Network
• USGS Global Land Information System - Earth Science Data Search Engine

No final do capítulo dedicado aos satélites e sensores de observação da Terra listam-se os


principais sites para obtenção de imagens de satélite na internet.

Por último, refiram-se as principais associações profissionais relacionadas com deteção remota
e processamento digital de imagens de satélite:
• American Society for Photogrammetry and Remote Sensing (ASPRS)
• Canadian Remote Sensing Society
• Geoscience and Remote Sensing Society
• Institute of Electrical and Electronic Engineers (IEEE)
• International Society for Photogrammetry and Remote Sensing (ISPRS)
• The Remote Sensing and Photogrammetry Society

Bibliografia

Caetano, M., 2011. O Sistema de Monitorização Global do Ambiente e Segurança (GMES): ponto
de situação, desafios e oportunidades. Cartografia e Geodesia 2011, em publicação.

Giannopapa, C., 2011. The Socio-Economic benefits of GMES. A Synthesis Derived from a
Comprehensive Analysis of Previous Results, Focusing on Disaster Management.
European Space Policy Institute (ESPI) Report 39. Disponível
em http://www.espi.or.at/images/stories/dokumente/studies/ESP_Report_39.pdf. Data
de acesso: 15.12.2011.

Euroconsult. 2010. Satellite-based Earth observation: market prospects to 2019. 3rd ed.,
Brochure, [Online]. França: Euroconsult. Disponível em

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 19


http://www.euroconsultec.com/research-reports/space-industry-reports/satellite-based-
earth-observation-3842.html. Data de acesso: 27.08.2011.

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 20


GEO, 2004. From Observation to Action—
Achieving Comprehensive, Coordinated, and
Sustained Earth Observations for the Benefit of Humankind. Framework document adopted
on the Earth Observation Summit II, 25 April 2004, of the Group for Earth Observations (GEO)

Horler, D., e J. Barber. 1981. Plants and the daylight spectrum. Principles of remote sensing of
plants, Ed. H. Smith, 43-63. London: Academic press.

Sabins, F..Jr. 1987. Remote Sensing Principles and Interpretation, 2nd ed. New York: Remote
Sensing Enterprises, Inc.

OECD, 2011. The space economy at a glance 2011. Disponível em


http://www.oecd.org/dataoecd/63/5/48301203.pdf. Organisation for Economic Co-operation
and Development (OECD). Data de acesso: 17.09.2011

UE, 2010. Regulamento (UE) n.º 911/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao
Programa Europeu de Monitorização da Terra (GMES) e suas Operações Iniciais
(20112013), Jornal Oficial da União Europeia, JO L 276 de 20.10.2010, p. 1.

UE, 2008. Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, Jornal Oficial da União Europeia,
JO C 115 de 09.05.2008, p. 47.

2. Fundamentos de deteção remota


Neste módulo explicam-se os principais conceitos necessários para compreender o processo de
deteção remota, nomeadamente: fonte de energia, interação da energia com a atmosfera e
interação da energia com a superfície.

2.1. Componentes de um sistema de deteção remota


Um sistema de deteção remota incluí as seguintes componentes (Fig. 2.1):
• fonte de energia ou iluminação (A) – o primeiro requisito para um sistema de deteção remota
é a existência de uma fonte de energia, a qual ilumina ou disponibiliza energia aos objetos de
interesse;
• radiação e atmosfera (B) – a energia, depois de sair da sua fonte e antes de atingir os objectos
na superfície da Terra, atravessa a atmosfera interagindo com ela. Esta interação pode ocorrer
novamente quando a energia “viaja” do objecto para o sensor;
• interação da radiação com os objectos (C) – a interação da radiação com o objecto depende
do comprimento de onda da radiação e das características do objecto;
• gravação da energia pelo sensor (D) – o sensor (que não está em contacto com o objecto)
recolhe e grava a radiação reflectida (e/ou emitida) pelo objecto;
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 21
• transmissão, recepção e processamento (E) – a energia gravada pelo sensor é transmitida
para uma estação receptora onde os dados são processados e compilados numa imagem;
• interpretação e análise (F) - extração de informação da imagem;
• aplicação (G) – a informação extraída da imagem é utilizada na resolução dos problemas que
motivaram a sua aquisição.

Figura 2.1 Componentes de um sistema de deteção remota. Fonte: CCRS (2007).

2.2. Fontes de energia e princípios da radiação


A energia que ilumina, ou que é emitida por um determinado elemento está na forma de radiação
electromagnética, a qual tem uma natureza dupla. Por um lado, segundo a teoria corpuscular, a
radiação é constituída por unidades discretas de energia, os fotões ou quanta (quantum, no
singular). Por outro lado, a teoria ondulatória defende que a radiação electromagnética é uma
forma de energia derivada dos campos eléctricos e magnéticos, capaz de se propagar no vazio
à velocidade da luz. Atualmente, aceitam-se as duas teorias, podendose dizer que a radiação
electromagnética é constituída por fotões que se deslocam à velocidade da luz num movimento
ondulatório. O campo eléctrico varia em magnitude numa direção perpendicular à direção de
deslocação da onda, e o campo magnético desenvolve-se num plano perpendicular ao do campo
magnético (Fig. 2.2).

A distância entre dois picos sucessivos de uma onda electromagnética designa-se por
comprimento de onda, o qual é quantificado em unidades de comprimento, e.g. metro (m),
centímetro (cm, 10-2 m), micrómetro ( m, 10-6 m), namómetro (nm, 10-9 m). O número de picos
que passam num determinado ponto por unidade de tempo designa-se por frequência. A
frequência é normalmente medida em Hertz (Hz). Um Hz equivale a um ciclo por segundo.

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 22


v = Frequency
(number of cycles per second
passing a fixed point)

Figura 2.2 Uma onda electromagnética. Fonte: Lillesand e Kiefer (1994).

As ondas de radiação electromagnética obedecem ao princípio:

c (2.1)

onde:
c é a velocidade da luz (3 x 108 m.s-1);

é o comprimento de onda;
é a frequência.

Uma vez que a velocidade da luz (c) é constante (3 x 10 8 m.s-1), a frequência e o comprimento de
onda para uma determinada onda estão inversamente relacionados. Apesar de tanto o
comprimento de onda como a frequência poderem ser utilizados para caracterizar a radiação
electromagnética, em deteção remota normalmente utiliza-se o comprimento de onda e as
unidades mais utilizadas para o quantificar são os micrómetros ( m) ou namómetros (nm). No
caso da radiação micro-ondas é mais frequente utilizar a frequência (em Hz) para distinguir as
diferentes zonas do espectro electromagnético.

A composição da radiação designa-se por espectro electromagnético. Na Fig. 2.3 apresenta-se


uma ilustração do espectro electromagnético, com indicação do comprimento de onda,
frequência, energia e designação para as regiões mais importantes do espectro. Apresentam-se
ainda aplicações da radiação de algumas regiões, como por exemplo os fornos de micro-ondas,
as radiografias e as ondas de rádio e televisão. Na Tabela 2.1 apresentam-se as principais
divisões do espectro electromagnético.
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 23
Figura 2.3 Espectro electromagnético. Fonte: LBL (2002).

Tabela 2.1 Principais divisões do espectro electromagnético.


Divisão Limites (comprimento de onda)

Raios gama < 0.03 nm

Raios X 0.03 nm– 0.03 m


Radiação ultravioleta 0.03 – 0.38 m
Visível 0.38 – 0.72 m
Infravermelho próximo 0.72 – 1.30 m
Infravermelho médio 1.30 – 7.00 m
Infravermelho longo 7.00 – 1000 m
Micro-ondas 1 mm – 30 cm

Rádio > 30 cm

A principal fonte de energia natural em deteção remota é o sol. O sol emite radiação praticamente
em todos os comprimentos de onda da energia electromagnética, mas 99% da radiação emitida
pertence às regiões do ultravioleta, visível e infravermelho.

Refira-se que qualquer matéria com uma temperatura superior ao zero absoluto (0 K ou –273
C) emite continuamente radiação electromagnética. Assim, também a Terra é uma fonte de
energia natural que pode ser detectada por sensores. A quantidade de energia emitida por um
determinado objecto depende, entre outras coisas, da sua temperatura, tal como expresso pela
Lei de Stefan-Boltzman. A temperatura ambiente da Terra tem um valor aproximado de 300 K

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 24


(27 C). Segundo a Lei de Wien, que estabelece relações entre a composição espectral da
radiação emitida por um elemento e a sua temperatura, a radiação emitida pelo Terra terá um valor
máximo para o comprimento de onda de 9.7 m, o qual se situa no infravermelho térmico. Refira-
se, desde já, que existem sensores em satélites especialmente concebidos para captar a radiação
nesta região do espectro electromagnético emitida pela superfície da Terra.

Os sensores que captam a radiação naturalmente disponível (radiação solar reflectida pela
superfície da Terra e/ou atmosfera e radiação emitida pela Terra) são designados por sensores
passivos. Por outro lado, os sensores ativos têm a sua própria fonte de energia que é enviada
para o alvo e que, depois de interagir com este, é captada pelo sensor. Um exemplo de sensor
ativo é o SAR (Synthetic Aperture Radar) que opera na região das micro-ondas.

Repare-se que, de todo o espectro electromagnético, os nossos olhos só detectam a zona do


visível, o qual cobre uma parte muito pequena de todo o espectro. O visível compreende três
zonas principais (i.e., azul, verde e vermelho) e é a única região do espectro que se pode associar
com o conceito de cor. Azul, verde e vermelho são designadas por cores (ou comprimentos de
onda) primárias do espectro visível, uma vez que nenhuma delas pode ser criada a partir das
outras duas, mas todas as outras cores podem ser produzidas com combinações de azul, verde
e vermelho em diferentes proporções.

Na Tabela 2.1, a zona do infravermelho foi dividida em três zonas: infravermelho próximo, médio
e longo. No entanto, também pode ser dividido em infravermelho refectivo (0.7 – 3 m) e
infravermelho térmico (ou emitido) (3 – 100 m). A zona do infravermelho refectivo é usada em
deteção remota de uma forma semelhante à da zona do visível. A zona do infravermelho térmico
corresponde essencialmente à radiação que é emitida pela Terra. As regiões do infravermelho
térmico mais utilizadas são as seguintes: de 3 a 5 m e de 8 a 14 m. Alguns autores preferem
utilizar a designação de infravermelho de onda curta para a região 1.3 a 3 m e de infravermelho
de onda média para a região de 3 a 5 (ou 6) m, que pertencem ambos à região do infravermelho
médio como apresentado na Tabela 2.1.

As principais zonas do espectro electromagnético utilizadas em deteção remota são: (1) visível
(400-700 nm), que inclui o azul, verde e vermelho, (2) infravermelho próximo (700-1300 nm) , e
(3) infravermelho médio (1300-2600 nm). A região das micro-ondas é a região do espectro
electromagnético que mais recentemente começou a ser explorada em deteção remota. Os
comprimentos de onda mais curtos desta região tem propriedades semelhantes ao infravermelho

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 25


térmico, enquanto que os comprimentos de onda mais longos são mais parecidos aos
comprimentos de onda radio.

A compreensão da interação da radiação electromagnética com a matéria torna-se mais fácil se


se recorrer à teoria corpuscular da radiação. A energia de um quantum é dada por:

Q h (2.2)

onde
Q é a energia de um quantum, Joules (J); H é
a constante de Plank (6.626 x 10 -34 J. s-1); é
a frequência.

A teoria ondulatória e a teoria corpuscular estão obviamente relacionadas, e se resolvermos a


Equação 2.1 em ordem à frequência e se utilizarmos essa expressão na equação 2.2, obtemos:

hc
Q (2.3)

A energia de um quantum é inversamente proporcional ao comprimento de onda. Esta relação é


particularmente importante em deteção remota, nomeadamente na seleção dos comprimentos de
onda que se podem utilizar e na dimensão mínima das áreas que podem ser amostradas.

A quantidade de energia que chega ao sensor tem que ser suficientemente grande para permitir
identificar o elemento ou caracterizar o seu estado. A quantidade de energia depende da área da
superfície da Terra que a está a reflectir ou emitir. Assim, e por exemplo, um sensor que capte
infravermelho térmico tem que receber energia de uma área maior do que um que capte radiação
da zona do infravermelho médio, pois este último tem um comprimento de onda menor e portanto
tem mais energia do que o infravermelho térmico.

2.3. Interação da radiação electromagnética com a atmosfera


A atmosfera tem um grande efeito na intensidade e na composição espectral da radiação captada
pelos sensores. O efeito da atmosfera na radiação varia sobretudo com:
• o caminho percorrido pela radiação reflectida;
• comprimento de onda da radiação;
• condições atmosféricas (i.e., abundância de gases e partículas).

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 26


Este tipo de interação é bastante importante pois toda a radiação detectada por sensores remotos
passa, independentemente da fonte de radiação, pela atmosfera. Na passagem da radiação
electromagnética através da atmosfera, podem ocorrer dois grandes tipos de interações com
partículas de matéria suspensas na atmosfera e com moléculas dos gases que a constituem:
dispersão e a absorção. Os efeitos dos processos de dispersão e absorção diminuem a nitidez
das imagens, i.e. reduzem o contraste.

A dispersão atmosférica ocorre quando gases e partículas existentes na atmosfera interagem


com a radiação e fazem com que esta seja dispersa na atmosfera. Os principais tipos de
dispersão são: dispersão de Rayleigh, dispersão de Mie e a dispersão não seletiva.

A dispersão de Rayleigh ocorre quando a radiação interage com partículas cujo diâmetro é muito
menor que seu o comprimento de onda, sendo provocada, por exemplo, por moléculas de azoto
e oxigénio, assim como por pequenas partículas de pó. A dispersão de Rayleigh é inversamente
proporcional à quarta potência do comprimento de onda. Assim, radiações com pequenos
comprimentos de onda são muito mais afectadas por este tipo de dispersão do que as com
grandes comprimentos de onda. Este tipo de dispersão, sendo o principal tipo de dispersão
existente na atmosfera superior, é o grande responsável pela “neblina” existente nas imagens, a
qual diminui o seu contraste.

A dispersão de Mie ocorre quando a radiação interage com partículas cujo diâmetro é semelhante
seu ao comprimento de onda, sendo provocada sobretudo por vapor de água, partículas de poeira
e pólen. A dispersão de Mie tende a afectar radiação com comprimentos de onda maiores do que
a afectada pela dispersão de Rayleigh. Ocorre sobretudo na parte inferior da atmosfera onde
partículas maiores são mais abundantes. É menos importante que a dispersão de Rayleigh, mas
pode ser importante em céus com alguma neblina e nuvens.

A dispersão não seletiva ocorre quando a radiação interage com partículas cujo diâmetro é
bastante superior ao comprimento de onda da radiação, como por exemplo gotas de água e
grandes partículas de pó. Assim, este tipo de dispersão afecta de forma semelhante vários tipos
de comprimento de onda.

A absorção atmosférica resulta numa perda efetiva de energia para os constituintes atmosféricos
(absorção de energia). Os principais absorventes são: vapor de água, dióxido de carbono e
ozono. O ozono absorve a radiação ultravioleta do sol que é nociva para a maior parte dos seres
vivos. Sem a proteção da camada de ozono, a nossa pele queimar-se-ia quando exposta à
radiação solar. O dióxido de carbono é um dos principais gases de efeito de estufa, uma vez que
tende a absorver o infravermelho associado ao aquecimento térmico, fazendo com que este calor
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 27
fique retido na atmosfera. O vapor de água da atmosfera absorve uma grande parte da radiação
na zona do infravermelho de grande comprimento de onda e na zona dos micro-ondas de menor
comprimento de onda (entre 1 mm e 22mm). A presença de vapor de água na atmosfera inferior
varia muito de local para local e com a altura do ano. Por exemplo, as massas de ar sobre o
deserto têm pouco vapor de água para absorver energia, enquanto que massas de ar sobre o
trópicos têm grandes concentrações de vapor de água (i.e., humidade elevada).

A absorção é seletiva, ou seja, existem comprimentos de onda da radiação electromagnética que


são mais absorvidos do que outros. As regiões do espectro que estão relativamente livres de
absorção são chamadas de janelas atmosféricas. A radiação electromagnética nestas regiões
passa através da atmosfera sem sofrer tantas modificações quanto as que ocorreriam noutros
comprimentos de onda.

Na Fig. 2.4 ilustra-se o conceito de janela atmosférica. No gráfico superior representa-se a


transmitância da atmosfera para os vários comprimentos de onda. No gráfico inferior quantificase
a energia da radiação solar e da radiação emitida pela Terra para vários comprimentos de onda.
No gráfico da transmitância as zonas a cinzento representam os comprimentos de onda para os
quais a transmitância atmosférica não é 100%.

O conhecimento das janelas atmosféricas é de extrema importância em deteção remota, pois esta
é impossível em zonas do espectro que sejam seriamente afectadas pela dispersão e/ou
absorção. Por outro lado a deteção remota também deve ser feita em comprimentos de onda
onde a radiação solar tenha uma elevada energia. Uma análise da Fig. 2.4 revela que a região
do visível e parte do infravermelho são boas regiões para a deteção remota.

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 28


Figura 2.4 Janelas atmosféricas. Fonte: Lillesand e Kiefer (2008)

Na Tabela 2.2 apresentam-se as principais regiões utilizadas em deteção remota da Terra.


Estas regiões são necessariamente janelas atmosféricas.

Tabela 2.2 Principais regiões do espectro electromagnético utilizadas em deteção remota. Fonte: Jensen (2004) e
Jensen (2006)
Região Gama de Fonte de radiação Propriedade da superfície
comprimentos de onda

Visível 0.4 – 0.7 m Solar Refletância

Infravermelho próximo 0.7 – 1.1 m Solar Refletância

Infravermelho de onda curta 1.1. – 1.35 m Solar Refletância

1.4 – 1.8 m

2 – 2.5 m

Infravermelho de onda média 3–4 m Solar e térmica


Refletância e
4.5 – 5 m temperatura

Infravermelho térmico 8 – 9.5 m Térmica Temperatura

10 – 14 m

Micro-ondas 1 mm – 1m Térmica (passivo) Temperatura (passivo)

Artificial (ativo) Rugosidade (ativo)

2.4. Interações da radiação solar com elementos da superfície terrestre


A hipótese central em deteção remota é que a radiação reflectida pela superfície transporta
informação sobre o seu tipo, propriedades e estado. Com efeito, a razão pela qual as imagens de
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 29
satélite podem ser utilizadas para produção de mapas de ocupação do solo, está relacionada
com a forma diferenciada com que as várias ocupações do solo refletem a energia solar. É esta
quantidade de energia reflectida pela área coberta por cada pixel e captada pelo sensor, que é
convertida em números digitais (ND) por modelos de calibração internos do sensor. Estes NDs,
podem depois ser submetidos a interpretação visual ou a análises estatísticas, mais ou menos
sofisticadas, para identificação da classe de ocupação do solo ou para quantificação de uma
característica da superfície.

A radiação solar ao incidir sobre os objetos e fenómenos existentes à superfície da Terra pode
ser absorvida, reflectida, ou transmitida, em função das propriedades dos materiais que os
compõem e das características da radiação incidente (Fig. 2.5). Aplicando o Princípio de
Conservação de Energia, pode-se escrever:

E(λ) Er (λ) Ea(λ) Et (λ) (2.4)

onde, para um dado comprimento de onda ( ):


E é a radiação incidente;
Er é a radiação reflectida (ou seja, a que retorna da superfície depois de interagir com esta);
Ea é a radiação absorvida (ou seja, a que penetra num corpo e é absorvida por ele); E t
é a radiação transmitida (ou seja, a que passa através de uma dada substância).

Figura 2.5 Interações entre energia electromagnética e um elemento de superfície da Terra. Fonte: NOAA (2002).

As proporções de energia reflectida, absorvida e transmitida para um determinado comprimento


de onda variam para diferentes tipos de elementos, variando ainda com o tipo e condição do
material. São estas diferenças que nos permitem não só distinguir diferentes tipos de elementos
numa imagem, como também caracterizar o estado de determinado material. Por outro lado, as
diferentes proporções de energia reflectida, absorvida e transmitida variam com o comprimento
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 30
de onda. Quer isto dizer que dois elementos podem não ser distinguíveis numa determinada
gama espectral, mas serem muito diferentes noutra zona do espectro. Na gama do visível, estas
variações espectrais resultam num efeito visual denominado cor. Quer isto dizer que o olho
humano utiliza estas variações espectrais na magnitude da energia reflectida para discriminar
diferentes tipos de objetos.

Em deteção remota, estamos sobretudo interessados na radiação reflectida pelos elementos, pois
é esta que chega ao sensor e que é convertida em números digitais. Os objetos também podem
ser classificados tendo como base a geometria da energia reflectida. Nos extremos, podemos
classificar os objetos como refletores especulares e refletores difusos (Fig. 2.6).

Figura 2.6 Os principais tipos de reflectores. Adaptado de Lillesand e Kiefer (1994).

O refletor especular apresenta reflexão semelhante à de um espelho, onde o ângulo de refletância


e o de incidência são iguais. Os refletores difusos, também designados por Lambertianos,
refletem uniformemente em todas as direções. A maior parte dos elementos de superfície situa-
se entre o refletor especular perfeito e o refletor difuso perfeito. De uma maneira geral, os
refletores difusos tem superfícies rugosas, enquanto que os especulares tem superfícies mais
lisas. No entanto, refira-se que o tipo de reflexão depende da relação entre a rugosidade da
superfície do elemento e o comprimento de onda da radiação incidente. Se o comprimento de
onda for muito inferior às variações da superfície ou ao tamanho das partículas que constituem a
superfície, a reflexão difusa é a predominante.

As reflexões difusas tem informação espectral na “cor” da superfície refletiva, enquanto que os
refletores especulares não. Assim, em deteção remota estamos sobretudo interessados na
quantificação da reflexão difusa dos diferentes elementos

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 31


As características da refletância dos diferentes tipos de superfície terrestre podem ser
quantificados através da medição da quantidade de radiação incidente que é reflectida, i.e., a
refletância espectral ( ):

)
( ) Er ( (2.5)
E( )

Designa-se por Curva de Refletância Espectral, a variação da refletância de um determinado


objecto com o comprimento de onda.

Refletância dos principais elementos da superfície terrestre


A Fig. 2.7 mostra as curvas de refletância espectral dos principais elementos da superfície
terrestre, i.e., água, vegetação e solo, para as zonas do espectro electromagnético mais utilizadas
em deteção remota (i.e., visível, infravermelho próximo e infravermelho médio).

Reflectância (%)
60 Solo
50

40

30

20 Vegetação

10
Água

0.4 0.6 0.8 1.0 1.2 1.4 1.6 1.8 2.0 2.2 2.4 2.6

Comprimento de onda ( m)

Figura 2.7 Refletância dos principais elementos da superfície terrestre, i.e., água, vegetação e solo. Adaptado de
Richards (1986).

A água caracteriza-se por refletir muito pouco da radiação da energia electromagnética, sobretudo
na parte do infravermelho. Quer isto dizer que a identificação de corpos de água numa imagem
de satélite é feita mais facilmente em zonas do infravermelho do que no visível. Contudo a
caracterização de corpos de água deve ser feita sobretudo na parte do visível. A refletância de
um corpo de água é bastante afectada pelos materiais nela existentes. Por exemplo, um aumento
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 32
de concentração de clorofila é acompanhado por um aumento de refletância no verde e uma
diminuição no azul. Esta relação pode ser utilizada para monitorizar a presença de algas em
corpos de água. Por outro lado, para uma determinada região geográfica, água com elevada
concentração de sedimentos resultantes da erosão dos solos, tem uma maior refletância no
visível do que água sem sedimentos.

A curva da refletância espectral da vegetação apresenta valores baixos nas regiões do vermelho
e do azul do espectro visível e um pico na região do verde. Este comportamento deve-se à
absorção de radiação azul e vermelha pela clorofila e outros pigmentos (Fig. 2.8). Plantas em
stress podem ter uma menor produção de clorofila, conduzindo a uma menor absorção de azul e
vermelho. Muitas vezes, a refletância na zona do vermelho aumenta tanto que fica ao nível do
verde, fazendo com que as plantas se tornem amareladas (combinação de verde e vermelho).

A refletância da vegetação aumenta drasticamente na região dos 0.75 m (a qual é chamada de


red edge), e mantém-se elevada na região do infravermelho próximo entre os 0.75 e 1.35 m.
Nesta zona do espectro electromagnético, a refletância da vegetação resulta sobretudo da
estrutura interna das folhas. Uma vez que diferentes espécies de plantas se podem distinguir pela
estrutura interna das folhas, esta zona do espectro electromagnético pode ser utilizada para
distinguir diferentes espécies. Por outro lado, muitos tipos de stress afectam a refletância nesta
zona do espectro, pelo que a podemos utilizar para identificar comunidades vegetais em stress.
Acrescente-se que nesta gama de comprimento de onda, a absorção de radiação pelas folhas é
praticamente nula. Quer isto dizer que a energia que não é reflectida é transmitida.

Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 33


Figura 2.8 Reflectância da vegetação e características que a definem. Adaptado de Jensen (1983).

A partir dos 1.35 m, a transmitância das folhas diminui drasticamente e a radiação é sobretudo
reflectida e absorvida. A refletância passa então a ser essencialmente controlada pelo teor de
água no interior dos tecidos vegetais. Observam-se depressões na curva de refletância nos 1.4,
1.9 e 2.7 m, as quais se devem ao facto de a água existente nas folhas absorver fortemente a
radiação nestes comprimentos de onda.

A curva da refletância espectral do solo apresenta menos variações do que a da vegetação e


caracteriza-se por um aumento da refletância com o comprimento de onda. Alguns dos factores
que controlam a refletância dos solos são: humidade, textura, rugosidade, conteúdo em matéria
orgânica e presença de óxido de ferro. Por exemplo, a refletância do solo diminui com o aumento
de humidade. Este efeito torna-se maior nos comprimentos de onda onde existe absorção de
água, i.e. 1.4, 1.9 e 2.7 m. A rugosidade da superfície e o teor em matéria orgânica provocam
também a diminuição da refletância do solo.

Padrões espectrais
Na secção anterior fez-se a caracterização dos principais elementos da superfície terrestre,
tendo-se chegado à conclusão que eles são espectralmente separáveis. No entanto, também se
concluiu que a separabilidade pode ser possível numa determinada zona do espectro e não
noutra. Por exemplo, água e vegetação podem ter características espectrais semelhantes na
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 34
zona do visível, e bastante diferentes no infravermelho próximo. Assim, para separar estes tipos
de elementos numa imagem é melhor usar o infravermelho do que qualquer zona do visível.

Como as características espectrais dos elementos podem permitir identificar o tipo de elemento
e/ou a sua condição, estas características têm sido designadas na literatura por assinatura
espectral. O termo assinatura pressupõe um padrão que é absoluto e único. Contudo, não é isto
que se passa no mundo real já que a resposta espectral de um determinado elemento pode variar
bastante, dependendo quer de condições intrínsecas quer extrínsecas ao próprio elemento. Esta
variabilidade espectral pode conduzir a problemas na identificação de elementos, mas também é
a razão pela qual podemos usar características espectrais para distinguir a condição de um
determinado elemento. Por exemplo, pode-se utilizar imagens de satélite para identificar
vegetação sujeita a um determinado stress. Assim, é mais correto utilizar o termo padrão
espectral em vez de assinatura espectral.

O padrão espectral de um determinado tipo de elemento pode ser afectado por:


• Ângulo de iluminação;
• Topografia;
• Atmosfera;
• Contaminação por outros elementos dentro do mesmo pixel;
• Contaminação por outros elementos não pertencentes ao mesmo pixel;
• Variações ambientais no próprio elemento: associação com outras superfícies,
homogeneidade, estado fenológico, etc.;
• Substrato edáfico ou litológico

2.5. Gravação da energia pelo sensor


A energia electromagnética pode ser detectada fotograficamente ou electronicamente. O
processo fotográfico utiliza reações químicas na superfície de um filme sensível à luz, para
detectar e gravar variações de energia. Na deteção electromagnética, os sensores registam a
energia reflectida pelos objetos em várias zonas do espectro electromagnético. As zonas do
espectro electromagnético recebem normalmente a designação de bandas ou canais. Por
exemplo, um determinado sensor pode captar o azul, verde, vermelho em três bandas separadas.
Para cada banda é produzida uma imagem estruturada em pixels1.

Cada pixel corresponde a uma área do terreno, e os pixels de uma determinada imagem tem
sempre a mesma dimensão. O valor de um pixel numa determinada banda é designado por

1
O termo pixel resulta da junção com um x, das duas primeiras letras das palavras picture element.
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 35
número digital (ND) (Fig. 2.9). O ND é a conversão da radiância que chega ao sensor numa gama
de valores positivos, e.g., 0 a 255.

Figura 2.9 Uma imagem é composta por pixels. Em cada pixel é retido um número digital (ND) que traduz a radiação
reflectida pela área do terreno correspondente. Fonte CCRS (2007)

As imagens de satélite são, na maioria das vezes, adquiridas em formato digital. O termo imagem
refere-se, na verdade, a um conjunto de imagens, uma por cada banda do sensor.

De uma forma geral, o termo imagem utiliza-se para qualquer representação pictórica,
independentemente do comprimento de onda e do instrumento utilizado para detectar e gravar a
energia electromagnética. Uma fotografia refere-se especificamente a imagens que foram
detectadas e gravadas por um filme fotográfico. As fotografias são normalmente gravadas no
comprimento de onda de 0.3 a 0.9 m, ou seja visível e infravermelho próximo. Assim, todas as
fotografias são imagens, mas nem todas as imagens são fotografias. Refira-se que as fotografias
aéreas a preto e branco quando obtidas por uma máquina fotográfica tradicional podem depois
ser digitalizadas num scanner, onde se opta por um pixel com uma determinada dimensão. Em
cada pixel será registado um número digital que traduz o nível do cinzento da fotografia original.
A digitalização das fotografias permite, por exemplo, uma fotointerpretação em ecrã de
computador.

Os sensores para deteção electrónica da energia electromagnética reflectida ou emitida pela


superfície terrestre podem estar montados em satélites ou em aviões. Nesta disciplina
estudaremos apenas a deteção remota por satélite, excluindo-se assim a deteção remota por
avião, quer os dados sejam detectados fotograficamente ou electronicamente. No entanto, toda
a parte dedicada à análise é válida para qualquer tipo de deteção electrónica, independentemente
Teoria de Deteção Remota; Mário Caetano; 2018 36
dos sensores estarem em aviões ou em satélites. Por outro lado, nesta disciplina estudaremos
sobretudo a deteção remota de energia reflectida, excluindo-se assim a deteção remota de
energia emitida (i.e., infravermelho térmico)

Bibliografia
CCRS, 2007. Remote Sensing Tutorials. Canadian Centre for Remote Sensing. Disponível em:
http://www.nrcan.gc.ca/earth-sciences/geography-
boundary/remotesensing/fundamentals/1430. Data de consulta: 08.12.2002

LBL, 2002. Ernest Orlando Lawrence Berkeley National Laboratory. Disponível em:
http://www.lbl.gov. Data de consulta: 10.09.2002.

Jensen, J., 2006. Remote sensing of the environment: an earth resource perspective, 2ª Edição.
New Jersey: Prentice Hall.

Jensen, J.R., 2004. Introductory Digital Image Processing: a Remote Sensing Perspective, 3ª
Edição. New Jersey: Prentice-Hall.

Jensen, J.R., 1983. Biophysical remote sensing. Annals of the Association of American
Geographers 73: 111-132.

Lillesand, T. M., e R. W. Kiefer, 1994. Remote Sensing and Image Interpretation, 3ª Edição.
New york: John Wiley & Sons.

Lillesand, T.M., Kiefer, R.W. and Chipman, J.W., 2008. Remote Sensing and Image
Interpretation, 6ª Edição. New York: John Wiley & Sons.

NOAA, 2012. Remote Sensing Tutorial. National Oceanic and Atmospheric Administration, Coastal
Services Center. Disponível em: http://www.csc.noaa.gov. Data de consulta:
08.12.2012

Richards, J. A, 1986. Remote sensing digital image analysis. Berlin, Germany: Springer-Verlag

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