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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE ARTES E LETRAS


DEPARTAMENTO DE ARTES VISUAIS
CURSO DE ARTES VISUAIS
ESTETICA
Profª Drª Rosa Maria Blanca

Trabalho final

María Belén Rodríguez


Santa Maria- R.S.
2018
Fotografia digital, imagem digital e ciberespaço. Abordagens da imanência,
heterotopias e teoria da deriva.

Hoje é a era do formato digital, as imagens de hoje são traduzidas em


megapixels, deixando de lado a constância patente do material. Assim, a
fotografia é por excelência um dos formatos digitais mais difundidos em todo o
mundo. Este avance tecnológico em referência da fotografia digital em si, fala da
necessidade intrínseca do ser humano, de captar instantes, lugares, de deixar
evidências de sua existência.

Para este ensaio, a fotografia digital é tomada como representante de uma


nova maneira de entender a imagem contida em megapixels, procurando o
potencial estético que as novas tecnologias digitais permitem. Essas tecnologias
digitais são o veículo para a entrada de imagens digitais no ciberespaço.

Mas o que é o ciberespaço? as definições para o termo ciberespaço são


tão variadas, para Pierre Levy, que foi um dos maiores precursores no estudo
deste lugar, refere-se a isso apenas em termos de qualidade do material, ou a
ausência disso, embora para Levy o recurso humano como tal seja indispensável
para a concepção do ciberespaço como tal.

Porque o ciberespaço “es extremadamente fluido… parece hallarse en un


estado de transición donde predomina la falta de precedentes, la lucha por
imponer estándares, y la búsqueda de una dirección”1, nesse espaço é onde as
fotografias digitais fluem, elas estão imbuídas no que poderíamos chamar de
lugar outro.

Desta forma, o ciberespaço também pode ser concebido como um lugar


habitado por seres humanos, esses seres humanos são construtores de

1Comunidades en el ciberespacio, Trad. Marc A. Smith, Peter Kollock, Editorial UOC,


Cataluña, 2003, p. 25
imagens; então, o ciberespaço é, por sua vez, tudo o que é criado dentro dele, e
para isso Jose Luis Brea argumenta que:

“estas formas fetichizadas necesitarían haberse


adelgazado hasta su anorexia inmaterial… para caber en
un espacio totalmente saturado…donde su multiplicación
habría acabado por ocupar la totalidad de «lugar» del
mundo – liquidado todo espacio liso, mudo”2

Para Brea, as imagens digitais, assim como as fotografias, tiveram que se


adaptar hoje, à nova era, onde a imagem, livre de laços corporais, filtra e perde
em um novo lugar, no novo lugar de hoje, aquele novo espaço que ocorre na
realidade, esse espaço chamado ciberespaço.

Desta forma, é impossível para perguntas; como pode-se apreciar a


estética de algo ausente, algo imaterial, perdido em um espaço intangível além
do médio? Existe estética em um meio intangível como a fotografia digital?

Levantar essas questões vem à ideia de que, no mundo dos objetos, onde
a estética é tangível, a digitalização das fotografias toma sua própria linguagem
e, assim, os sistemas de materialização implicam uma nova maneira de
conceber a morfologia estética da fotografia digital.

O que acontece com a fotografia digital é que ela pode mentir, porque a
existência de uma imagem fotográfica digital não implica necessariamente a
constância do objeto como tal. A fotografia digital tem uma capacidade que seu
antecessor desenvolveu de forma limitada, pois pode criar um espaço digital
através de vários processos de manipulação de megapixels, que levam à ideia
de que a fotografia digital, hoje, termina com a certeza da existência de o que
ele capturou.

2 José Luis Brea, Las tres eras de la imagen, AKAL, Madrid, 2010 p. 71
Para poder entender a fotografia digital, é necessário citar Michel
Foucault, para quem nosso tempo é, em si, a era do espaço. Considera que
estamos imersos em uma corrente flutuante e contínua, das distâncias próximas
e das proximidades distantes.

Ele considera que estamos imersos em corrente flutuante e contínua, com


distâncias próximas e proximidades distantes. Pode-se entender que, para
Foucault, hoje, a era do espaço é a era do ciberespaço. Hoje as preocupações
do espaço se traduzem em um dispositivo de armazenamento de informação
digital, onde a fotografia adquire um papel proeminente como usufrutuário desse
espaço particular.

Como Foucault falou do espaço, Georges Didi-Huberman e seu conceito


de imanência como «o fluxo generalizado, a dobra de cada coisa em cada coisa,
a vida em toda parte, a matéria porosa destinada às turbulências»3, é impossível
não conceber a fotografia digital como um novo fluxo generalizado, que navega
livremente pelo ciberespaço, Didi-Huberman disse que esse é o sentido radical
de uma estética da imanencia, porque tanto a estética quanto a fotografia digital,
se deseja gesto e não representação.

E como o fluxo generalizado destinado à turbulência foi mencionado, é


impossível não mencionar Francesco Careri e sua abordagem à deriva, já que a
fotografia digital, depois de assumir sua primeira função, a de converter uma
realidade em megapixels, vagueia livremente em um espaço desconhecido, a
fotografia digital permite transmitir a sensação de deriva, porque em um lugar
onde novos lugares aparecem antes de um, em um pequeno dispositivo digital,
a deriva se torna possível enquanto fotografias digitais podem expor aqueles
lugares além de talvez aqueles olhos nunca tenham visto.

3Georges Didi-Huberman, “A imanência estética”, Scielo.


http://www.SciELO.br/SciELO.php?script=sci_arttext&PID=S1517-106X2003000100009
Novembro de 2018.
Mas entender a fotografia como um nômade do ciberespaço requer
novamente a ajuda de Brea, que definiu imagens digitais, e entre elas a
fotografia, como e-sprectros, puros fantasmas, que, alheios a toda realidade, diz
Brea, eles são como “puras imágenes mentales, separando el ser de éstas del
sistema de los objetos, y permitiendo, al tiempo, que el propio ser diferencial de
las imágenes de cosas, su viajar autónomo por los mundos reales, recupere una
escenografía propia, así sea solo como fondo de contraste de este devenir
pensante de las imágenes electrónicas…”4, essas fotografias viajam entre um
espaço indefinido até chegar a lugares distantes, sempre adquirindo a forma
primária de seu conteúdo em megapixels, embora sempre se adaptando às
condições do objeto que a reproduz.

Brea também define imagens digitais e, portanto, também fotografias,


como habitantes obsessivos de todos os lugares, potencialmente. Ele os chama
com a capacidade de ubicuidad; e como a imanência citada por Didi-Huberman,
“o fluxo generalizado, a dobra de cada coisa em cada coisa”5, cuando Brea se
refiere a la imagen digital habla también de que “ellas siempre están acumuladas,
plegadas, amontonadas febrilmente… siempre rebotan y rebotan en cada lugar-
si uno pudiera tomarse el tiempo suficiente para des-plegarlas, milenios luz”6,
como Didi-Huberman diria, a vida em todos os lugares.

Mas onde a estética é limitada na era digital quando a fotografia digital


representa uma forma tridimensional em um plano bidimensional? a isso
Foucault se refere a dizer que, na atualidade, o lugar substitui a extensão; ese
lugar donde se reproducen, multiplican, viajan y desaparecen las fotografías
digitales, es el ciberespacio.

Então, quando Foucault cita que as heterotopias falam de espaços míticos


ou reais, então a questão de qual lugar a fotografia ocupa nessa heterotropia é
válida. Aqui a função da fotografia é duplamente notável, já que a fotografia age
primeiro como um espelho, como Foucault chama de uma das heterotopias.

4 José Luis Brea, Op. cit. p. 68


5 Georges Didi-Huberman, Op. cit.
6
José Luis Brea, Op. cit. p. 68
O espelho assume a função de heterotopia, então a fotografia também
assume esa misma função. Diz Foucault que no espelho o espaço é o reflexo de
uma tridimensionalidade real, projetado nele, é, ali se creia uma heterotopia.

A mesma coisa acontece com a fotografia, mas a diferença vem do fato


de a fotografia capturar um momento específico, enquanto o reflexo do espelho
é uma reflexão contínua dos instantes. “Uma espécie de experiência de união ou
mistura análoga à do espelho”7, porque o espelho é uma heterotopia ya que e
um lugar sem lugar, assim como a fotografia digital mostra um espaço irreal,
virtual.

Mas aqui o interessante é o papel da fotografia digital na heterotopia, e


não como a própria heterotopia. O ciberespaço pode ser considerado como uma
outra heterotopia, é onde a fotografia digital assume sua função de ser outro
lugar. A fotografia digital representa uma nova porção dentro de um espaço em
uma nova heterotopia, o ciberespaço é aquela heterotopia irreal criada pela
civilização, onde a fotografia toma a forma de uma presença daquele uso
corporal dentro de um espaço irreal.

Da mesma forma, a fotografia digital preenche com el terceiro princípio de


Faucault já que estas podem sobrepor diferentes lugares no mesmos espaço
real, lugares que sem a heterotopía seriam incompatíveis.

E é isso que acontece com as fotografias digitais e o ciberespaço. Nesse


lugar, no ciberespaço, as fotografias digitais, que carregam espaços ausentes
em megapixels, se misturam, se sobrepõem, separam e retornam, tudo isso
acontece no mesmo lugar, naquela heterotopia do espaço cibernético.

Também foi mencionada a capacidade da fotografia como tal, de captar


instantes, embora não os refletindo, se os capturasse inalteráveis; assim
também o quarto princípio de heterotopias fala do capacidade de união com um

7Michael Foucault,
http://ghiraldelli.pro.br/wpcontent/uploads/michelfoucaultheterot_carmela.pdf
Novembro de 2018.
tempo específico, seja pequenos momentos, pequenas porções de tempo,
ligados ao que o Foucault chama de heterocronias.

A fotografia digital no ciberespaço assume também a função de


heterocronia, pois atende aos requisitos citados pelo autor: a união com um
tempo específico, a captura da imagem como tal, aquele momento inalterável
para além de uma modificação digital; A fotografia em conjunto com o
ciberespaço funciona como heterocronias.

Alem disso, Brea também pode se referir ao ciberespaço, mas ele chama
“ese jardín leibniziano de las infinitas imágenes nómadas…en el escenario
electrónico”, para o autor, essas fotografias digitais são portadoras nômades de
lugares, de espaços infinitos em um lugar diferente.

E quando Brea cita esse espaço infinito, certamente se refere a Didi-


Huberman e a imanência, essa ondulação universal, o espaço infinito onde as
fotografias digitais se desdobram; que o ciberespaço é uma ondulação universal
que transporta esses objetos captados em megapixels, o autor o chama de uma
estética própria do universo das formas.

Mas Didid-Huberman também mencionou a imanência como um fluido,


mar ou atmosfera, certamente se refere ao ciberespaço, e é impossível não
pensar na deriva, citando Careri, quem propõe a “deriva a través de u espacio
líquido”, deixando-se levar por esse fluxo líquido, sem direção, sem orientação,
se perdendo; é isso que acontece dentro do espaço cibernético.

Fotografias digitais, no ciberespaço, viajam continuamente pelo espaço


em que podem viajar, naquele espaço líquido que promove a deriva; porque esse
espaço líquido antes da deriva é, segundo o autor, um labirinto nômade, pois “el
nomadismo y la ciudad se han convertido en un único gran corredor laberíntico
que viaja por todo el mundo”, se perder, o ir na deriva deixa de limitar os espaços
para nomeá-los um único espaço.

Assim, podemos dizer que o ciberespaço é a nova heterotopia de hoje, é


um lugar não um lugar que contém em si um espaço outro, como o reflexo de
outra heterotopia, a fotografia digital é responsável por captar esses espaços e
também perambular neles.

A fotografia digital é o nômade desse espaço cibernético, onde o primeiro


assume a função de representar a imagem da pessoa que o transporta,
delimitando espaços naquele espaço infinito.

E o espaço infinito, por sua vez, refere-se à imanência, porque a


imanência é uma ondulação universal, é aquela que subjuga, mas não exige a
constância do objeto para fazer sentir sua onipresença. O ciberespaço é uma
ondulação universal onde outros convergem, e outros espaços, representados
em megapixels, onde fluem, se perdem, se desdobram e coexistem em uma
espécie de caos de infinitas possibilidades capazes de fazer a própria vida
presente em todos os lugares, e em um lugar muito desabitado.

Afinal, o ciberespaço é o lugar ideal para a deriva, espaço que podemos


chamar de uma nova imanência, tão atual quanto vigente desde o nascimento
da era digital, daquela heterotopia em que todos estão habitando sem precisar
de uma presença corpórea, é a promessa da nova era, de poder ir além das
fronteiras materiais simples e de se perder naquele imenso espaço, encontrar
respostas do que poderíamos chamar de nova estética dos objetos incorpóreos.

http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/signum/article/view/4821/5738
Bibliografía

Comunidades en el ciberespacio, Trad. Marc A. Smith, Peter Kollock, Editorial


UOC, Cataluña, 2003
Georges Didi-Huberman, “A imanência estética”, Scielo.
http://www.SciELO.br/SciELO.php?script=sci_arttext&PID=S1517-
106X2003000100009
http://hipermedula.org/wp-
content/uploads/2013/09/michel_foucault_heterotopias_y_cuerpo_utopico.pdf
https://www.researchgate.net/publication/322943365_El_concepto_de_heteroto
pia_en_Michel_Foucault
José Luis Brea, Las tres eras de la imagen, AKAL, Madrid, 2010
Michael Foucault,
http://ghiraldelli.pro.br/wpcontent/uploads/michelfoucaultheterot_carmela.pdf
Novembro de 2018.

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