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FACULDADE UNYLEYA

ROSIANE RODRIGUES BERNARDO

QUAL A POSSÍVEL RELAÇÃO ENTRE A DECADÊNCIA DA


FUNÇÃO PATERNA NA INFÂNCIA COM O DESRESPEITO
DO INDIVÍDUO ÀS LEIS DE TRÂNSITO QUANDO ADULTO?

Brasília
2018
ROSIANE RODRIGUES BERNARDO

QUAL A POSSÍVEL RELAÇÃO ENTRE A DECADÊNCIA DA


FUNÇÃO PATERNA NA INFÂNCIA COM O DESRESPEITO
DO INDIVÍDUO ÀS LEIS DE TRÂNSITO QUANDO ADULTO?

Monografia apresentada à Faculdade UnYLeYa como


exigência parcial à obtenção do título de Especialista
em Psicologia do Trânsito.

Nome do Orientador: Naira Milene Silva Vosmirko

Brasília
2018
ROSIANE RODRIGUES BERNARDO

QUAL A POSSÍVEL RELAÇÃO ENTRE A DECADÊNCIA DA


FUNÇÃO PATERNA NA INFÂNCIA COM O DESRESPEITO
DO INDIVÍDUO ÀS LEIS DE TRÂNSITO QUANDO ADULTO?

Monografia apresentada à Faculdade UnYLeYa como


exigência parcial à obtenção do título de Especialista
em Psicologia do Trânsito.

Nome do Orientador: Naira Milene Silva Vosmirko

Aprovado pelos membros da banca examinadora em (___/___/___), com menção


___ ( __________________)

Banca Examinadora

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

Brasília
2018
RESUMO

A função paterna, de acordo com a Psicanálise, é de suma importância para a


formação moral do indivíduo, e quando não é presente de forma eficaz na infância,
traz consequências para o indivíduo na vida adulta. Principalmente por impossibilitá-
lo a viver em sociedade, no que diz respeito ao cumprimento das leis. E este
comportamento de desrespeito às leis, está muito presente no trânsito brasileiro, o
qual será tema principal deste presente estudo. Esta pesquisa será baseada no
modelo de pesquisa bibliográfica. Primeiramente será proposto um breve estudo
sobre os temas: função paterna, formação moral do indivíduo, comportamento do
condutor brasileiro. Todo o estudo será feito com base psicanalítica.

Palavras-Chave: Função paterna, moral, trânsito.


ABSTRACT

The paternal function, according to Psychoanalysis, is of great importance for the


moral formation of the individual, and when it is not present effectively in childhood, it
has consequences for the individual in adult life. Mainly by making it impossible for
you to live in society, as far as law enforcement is concerned. And this behavior of
disrespect to the laws, is very present in the Brazilian traffic, which will be the main
theme of this present study. This research will be based on the bibliographic
research model. First, a brief study will be proposed on the themes: paternal function,
moral formation of the individual, behavior of the Brazilian driver. All study will be
done on a psychoanalytic basis.

Keywords: Parental function, moral, transit.


Sumário

INTRODUÇÃO ---------------------------------------------------------------------------------------------------7

CAPÍTULO 1 – CATEGORIZANDO, EM PSICANÁLISE, A IMPORTÂNCIA DA FUNÇÃO


PATERNA NA FORMAÇÃO MORAL DO INDIVÍDUO------------------------------------------------ 10

CAPÍTULO 2 – ELUCIDANDO AS TRANSFORMAÇÕES DO SER CONTEMPORÂNEO,


DEFININDO CONCEITOS E EXPONDO ESTATÍSTICAS ------------------------------------------ 16

2.1 – DEFINIÇÕES DOS CONCEITOS DE TRÂNSITO, COMPORTAMENTO, MORAL E


LEIS----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 18

2.2 – UMA BREVE AVALIAÇÃO DAS ATUAIS ESTATÍSTICAS DO TRÂNSITO


BRASILEIRO
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
20

2.3 – ESTATÍSTICAS ------------------------------------------------------------------------------------------


21

CAPÍTULO 3 – RELACIONANDO A FUNÇÃO PATERNA E A POSSÍVEL INTERFERÊNCIA


DA MESMA, NA FORMAÇÃO MORAL DO CONDUTOR DE TRÂNSITO QUANDO ADULTO
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
23

CONSIDERAÇÕES FINAIS ------------------------------------------------------------------------


28

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS --------------------------------------------------------------


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8

Introdução

1. Delimitação do Tema: O desrespeito do indivíduo às leis de trânsito quando


adulto e a possível relação com a decadência da função paterna na
infância.

2. Problema de pesquisa: Qual a possível relação entre a decadência da


função paterna na infância com o desrespeito do indivíduo às leis de
trânsito quando adulto?

3. Justificativa: Na atualidade, o trânsito tem sido um dos maiores problemas


da sociedade, principalmente nos centros urbanos. Está havendo uma
cultura de desrespeito às leis de trânsito, pois falta valores e conduta moral
por parte dos motoristas. De acordo com a Organização Mundial de Saúde
(OMS), o Brasil é o quinto país com vítimas fatais no trânsito.

O respeito por leis em geral, e a moral, são conceitos que deveriam ser
aprendidos e introduzidos à consciência do indivíduo durante a infância.
De acordo com a abordagem psicanalítica, entende-se que a função paterna
tem como principal papel, introduzir tais conceitos na infância, principalmente o
respeito às leis da sociedade.
É importante ressaltar que, de acordo com as discussões psicanalíticas
atuais, o papel deste “pai”, conceito bastante citado acima, hoje é compreendido
como uma “função paterna”, podendo ser feita na vida da criança por outra pessoa
que não seja efetivamente o pai biológico. O importante é que esta função seja
exercida por alguém, pois é através dela que o indivíduo é preparado para viver em
sociedade.
É somente por meio de uma função paterna presente e bem exercida na
infância do indivíduo, que ele quando adulto, poderá se lançar ao mundo e enfrentá-
lo com segurança e responsabilidade.
Mas o que se percebe nos dias atuais, é um declínio desta função. A
interdição não tem prevalecido na educação e no desenvolvimento psicológico e
emocional das crianças. Tem prevalecido a cultura do “tudo é permitido”.
A criança acaba crescendo num ambiente de insegurança e instabilidade,
fazendo com que a mesma se sinta “solta” no mundo, sem amparo e referencial
9

moral. Crescem adultos que não aceitam limites e imposições da sociedade. Há uma
generalizada crise de autoridade, o pai que interdita, que dá limites, não prevalece.
A discussão realizada acima, permite e ressalta a importância de uma
reflexão entre este possível declínio da função paterna na infância do indivíduo,
permitindo que o mesmo, quando adulto, não respeite as leis da sociedade.
Leis estas, como as de trânsito, as quais são o alvo deste presente estudo.

4. Objetivo geral: Analisar se há algum tipo de relação existente entre a


decadência da função paterna na infância, com o desrespeito do indivíduo
às leis de trânsito, quando adulto.

5. Objetivos Específicos:

a) Categorizar o conceito de função paterna, em psicanálise;


b) Definir como ocorre a formação moral do indivíduo, em psicanálise;
c) Avaliar a atual conduta moral dos condutores de trânsito e as
consequências de tais comportamentos;
d) Analisar e relacionar se a ausência da função paterna durante a infância,
interfere na formação moral do futuro condutor de trânsito.

6. Metodologia: Para realizar o presente estudo, fez-se uma pesquisa com


vários livros específicos ligados ao tema proposto, leitura de artigos
científicos e de algumas reportagens sobre estatísticas de acidentes e
infrações de trânsito na atualidade.

Utilizou-se o método descritivo que tem como objetivo principal, “descrever as


características de uma população, de um fenômeno ou de uma experiência. Esse
tipo de pesquisa estabelece relação entre as variáveis no objeto de estudo
analisado”, segundo (Vânia MARIA/ 2015).
A pesquisa da bibliografia utilizada teve como o objetivo principal levantar os
assuntos pertinentes ao tema: função paterna, leis, moral e infrações de trânsito na
atualidade. Todos os estudos foram feitos com material de base psicanalítica.
Pesquisou-se assuntos e estudos que pudessem enriquecer o estudo
proposto.
10

Este estudo teve como base a pesquisa qualitativa que é “um estudo não
estatístico, que identifica e analisa em profundidade dados de difícil mensuração de
um determinado grupo de indivíduos em relação a um problema específico. Entre
eles estão sentimentos, sensações e motivações que podem explicar determinados
comportamentos, apreendidos com o foco no significado que adquirem para os
indivíduos”, conforme a Pólis Pesquisa (2015).
11

Capítulo 1. Categorizando, em psicanálise, a importância da função


paterna na formação moral do indivíduo:

De acordo com a Psicanálise, deve-se analisar o indivíduo por quatro


vertentes para uma melhor compreensão do mesmo: família, biologia, seus vínculos
sociais e as mudanças culturais.
Para o desenvolvimento deste estudo, será feito um breve estudo do âmbito
familiar, com suas atuais transformações e influências no comportamento do
indivíduo.
Na atualidade a família nuclear está sofrendo muitas mudanças,
principalmente no que diz respeito a posição e a função que cada membro deste
núcleo ocupa.
Os papéis que antigamente e de forma tradicional eram exercidos pelos pais,
agora estão passando por alterações. Mais estas mudanças devem ser encaradas
de forma natural para que não gere uma confusão para o psiquismo dos filhos.
Vale ressaltar que, o aspecto mais importante é que estas funções sejam
exercidas, pois são funções essenciais para o desenvolvimento emocional e
psicológico da criança.
É a família que exerce a função de continente que as crianças tanto
necessitam, pois sem este suporte na infância, as consequências podem ser
severas. Continente no sentido de “conter” as angústias e necessidades das
mesmas, sendo um suporte para o seu desenvolvimento. E a criança é
absolutamente dependente dos pais.
E como neste presente estudo o foco será a função paterna, tão essencial
para este desenvolvimento psicossexual da criança, abaixo será feito uma análise
psicanalítica da mesma.
Sigmund Freud (1856 – 1939), criador da Psicanálise, uma abordagem
estruturada na ideia da sexualidade, e que não se fundamenta apenas nas
instâncias anatômicas e biológicas do indivíduo. É uma teoria que entende a
sexualidade humana como estruturante para o psiquismo.
12

Conforme Zimerman (ZIMERMAN, D. E., 2004), a função do pai, “Além do


clássico papel de: a) ser o provedor das necessidades econômicas da família (papel
este que, diante da nova posição da mulher moderna, está cada vez mais se
modificando), ainda mais cabe ao pai as importantes funções de: b) funcionar como
uma cunha interditora entre a possível díade fusional, simbiótica, que muitas vezes
certas mães estabelecem com seus filhinhos; c) ser o representante da lei (conforme
Lacan), de modo a frustrar e colocar os devidos limites impostos pela realidade
exterior; d) o pai atual também deve funcionar como um adequado continente para
as necessidades dos filhos, especialmente como uma alternativa, quando a mãe não
tiver condições para tão importante função.”
É de acordo com a abordagem psicanalítica que, entende-se que a função
paterna tem como principal papel, introduzir os conceitos de moral e principalmente
o respeito às leis da sociedade, ou seja, a formação moral do indivíduo durante a
infância.
A introdução destas leis e limites é oriunda da resolução do Complexo de
Édipo, segundo Sigmund Freud (1924). Preparando o indivíduo para que, quando
adulto, tenha o mínimo de condições necessárias para viver em sociedade.
O conceito de “Complexo de Édipo”, apareceu pela primeira vez no artigo “Um
Tipo Especial da Escolha de Objeto Feita pelos Homens” (FREUD-1910/1996),
sendo um dos conceitos fundamentais da psicanálise, atribuídos por Sigmund.
Este termo designa um período de desenvolvimento psicossexual na infância,
e foi inspirado na tragédia grega “Édipo Rei”.
O Complexo de Édipo marca a ruptura e a interdição do narcisismo na
primeira infância da criança, e é caracterizado pelo período em que ocorre a
diferenciação da criança em relação aos pais.
Sigmund Freud (FREUD-1924), salienta sobre o Complexo de Édipo como
sendo o fenômeno central do período sexual da primeira infância, durando por volta
de 3 até 6 anos de idade. É um período que não é observado pela criança, mas sim
vivido, em que cada indivíduo terá o seu próprio desfecho. É nesta fase também que
a criança começa a rivalizar com o genitor do mesmo sexo, pelo amor do genitor do
sexo oposto.
Este complexo é de extrema importância para a estrutura e formação da
personalidade e orientação dos desejos (pulsões). É ele que delimita a passagem da
sexualidade infantil para a adulta.
13

Este mito também pressupõe que a criança se desenvolve em uma base


“triangular” de relacionamento: mãe, pai e filho.
Os pais são responsáveis por transmitir à criança, sensações de segurança e
suprimento de suas necessidades, em que ela percebe que toda a atenção e afeto
dos pais é voltado a ela.
A partir deste momento, do Complexo de Édipo, a criança começa a perceber
que ela não faz parte da relação dos pais, que este amor não é somente direcionado
a ela, percebendo então que ela não é o centro do universo, e então se frustra.
Neste período, o pai intervém sob a forma da lei.
O mito edipiano atribui ao pai (função paterna), a exigência da castração,
introduzindo a frustração no emocional da criança.
Em psicanálise, o termo “castração” designa uma experiência inconsciente
vivida pela criança que é decisiva também pela sua identidade sexual quando
adulta.
A Castração também é denominada por Freud como sendo “o sentimento
inconsciente de ameaça experimentada pela criança quando ela constata a
diferença anatômica entre os sexos”, (FREUD-1914). E este complexo ocorre de
forma distinta para o menino e a menina.
Nesse contexto, o pai tem um papel essencial pois ele entra como um
terceiro, na relação da mãe com o filho, introduzindo a lei (castração) e inserindo a
criança no mundo externo (sociedade). Nesta fase a criança reconhece e vivencia o
que é a angústia.
É por meio da castração que a criança reconhece que existem limites, e
assim é introduzida no universo simbólico da sociedade, num universo que existe o
outro.
A função paterna permite que a criança perceba que tem um apoio moral,
alguém que lhe mostre o que são as leis, e a importância das mesmas.
Esta imposição de limites à criança, faz com que a mesma se sinta segura e
se organize internamente para enfrentar o mundo externo. E ao introjetar tais
cuidados, ela aprende como cuidar de si mesma quando adulta.
Mas vale ressaltar que a castração não pode ser pensada simplesmente
como um período psicossexual da infância. Pelo contrário, esta experiencia
inconsciente da castração, dos limites, da angústia e da frustração são vividos e
experienciados por toda a vida.
14

“A lei primordial”, escreveu Lacan em 1953, é a lei que superpõe o reino da


cultura (leis da sociedade e moral) sobre o reino da natureza, portanto é a lei que
interdita, proíbe, castra. No Édipo resolvido, a lei é introjetada.
O Ego se estrutura após o período da castração (FREUD-1914), e nessa
instância psíquica, que é responsável por manter o indivíduo em contato com a
realidade externa, é onde fica registrado esta barreira e imposição de limites deste
período da resolução do Complexo de Édipo.
E o mecanismo responsável por impor normas, limites, e manter o contato do
indivíduo com a realidade externa, de forma moralmente aceita, obedecendo as leis,
a cultura e os princípios éticos, é denominado de Superego/Ideal do Ego, herdeiro
direto do Complexo de Édipo, (FREUD-1914). Tem como função fazer o Ego
perceber a impossibilidade de realizar todos os seus prazeres inconscientes,
funcionando como um “freio” para as pulsões do ID.
O prazer inconsciente, que é o objetivo da descarga pulsional, é definido
como uma sensação de descarga de energia.
É importante para a compreensão da origem das pulsões uma breve definição
do que é o inconsciente. Este termo é de extrema importância para a compreensão
dos processos psíquicos baseados na Psicanálise:
Segundo Laplanche "O inconsciente é individual; para ser escandaloso, eu
diria que ele está na cabeça de cada indivíduo. O inconsciente é essa parte de sua
história subtraída não só [...] ao tecido das significações convencionais, mas
subtraída também a toda intenção de comunicação [...]. Somente a metodologia
inventada por Freud - e não uma metodologia pretensamente orientada para o
significante -, que alia indissoluvelmente livres associações e situação analítica,
permite reabrir parcialmente, de um modo precário, de um modo sempre rediscutido,
um inconsciente sempre prestes e pronto a se fechar de novo à comunicação, pois
que esse fechamento é inerente à própria essência de sua constituição."
(LAPLANCHE, 1981/1992).
As pulsões inconscientes estão diretamente ligadas ao ID. Sigmund Freud em
seu artigo Metapsicologia (1915), relata que as pulsões surgem sempre de fontes
inconscientes (ID), buscando sempre por prazer, inaugurando o que ele chama de
Princípio do Prazer (PP).
15

É em Além do Princípio de Prazer (1920) que Freud organiza as pulsões em


Pulsões de Vida e Pulsões de Morte, em que as de vida agregam valor a vida e as
de morte, retiram, segregam.
Mas é através do Ego que as pulsões são organizadas, direcionadas para a
sua descarga.
O Ego “organiza”, através do Superego estas representações e desejos
inconscientes, estes arranjos das pulsões, equilibrando o “mundo interior” (desejos
inconscientes), com o” mundo exterior” (sociedade, leis).
A pulsão é uma relação entre os desejos biológicos e inconscientes
(psíquicos). O Ego articula estas necessidades e tais excitações entre o psíquico e o
físico.
Freud definiu a pulsão em força ou pressão (motor das atividades psíquicas).
O alvo dela é apenas a sua satisfação (eliminando as excitações inconscientes). O
alvo das pulsões se torna o seu objeto de descarga. Elas são quantitativas.
É de suma importância lembrar que através então da resolução do Complexo
de Édipo, através da “castração”, por meio da função paterna, que o indivíduo
percebe simbolicamente o seu lugar de sujeito na sociedade.
De acordo com o psicanalista Winnicott (1993/1999), a importância do dizer
“não” à criança (frustrar, castrar, interditar), e protegê-la dos perigos externos,
A função paterna permite que a criança experiencie um ambiente seguro de
desenvolvimento, mostrando-a que ela está moralmente segura para encarar o
mundo.
Esta função diz “não” ao gozo das pulsões inconscientes da criança. De
forma simbólica ele proíbe o “gozo total”.
É somente por meio de uma função paterna presente e bem exercida na
infância do indivíduo, que ele quando adulto, poderá se lançar ao mundo e enfrentá-
lo com segurança e responsabilidade.
É importante ressaltar que, de acordo com as discussões psicanalíticas
atuais, o papel deste “pai”, conceito bastante citado acima, hoje é compreendido
como uma “função paterna”, podendo ser feita na vida da criança por outra pessoa
que não seja efetivamente o pai biológico.
Para a psicanálise o sujeito é uma função, ou seja, o que ele “encarna”, o
papel que o mesmo exerce.
16

O mais importante é que esta função seja exercida por alguém, pois é através
dela que o indivíduo é preparado para viver em sociedade.
Neste sentido, Freud em Totem e tabu (1913/1980b), enfatiza que a lei é
imprescindível para se viver em sociedade, pois impõe que o indivíduo faça
renúncias. Para ele, esta relação do sujeito com este pai presente em sua infância,
introduz o sentimento de culpa, possibilitando que o indivíduo respeite às leis e viva
em sociedade, enxergando “o outro.”
Mas nos dias atuais, a sociedade tem se deparado com indivíduos totalmente
intolerantes a frustrações, que desrespeitam as leis, e não percebem que vivem em
sociedade. Percebe-se uma fraqueza estrutural e generalizada da metáfora
paterna/função paterna/limites.
Há um fechamento do sujeito, uma refutação do outro, uma era em que o
Outro não existe. Havendo uma ação coletiva do princípio do prazer (PP), em que
rege o discurso do prazer, do “tudo é permitido”, do desrespeito generalizado pelas
leis.
17

Capítulo 2. Elucidando as transformações do ser contemporâneo,


definindo conceitos e expondo estatísticas:

Sabe-se que a existência humana passa por sucessivas transformações, pois


isto é uma condição da humanidade. O indivíduo sofre ininterruptas mudanças,
principalmente físicas e mentais.
Culturas são alteradas e impulsionam as pessoas para viverem sempre em
mudança, principalmente de comportamento.
E para compreender o indivíduo, deve-se ter uma visão holística do mesmo
(hollos – totalidade). Ou seja, para entende-lo, deve-se antes, avaliar tudo o que o
cerca.
E nos dias atuais está havendo uma profunda mudança nos valores do ser
humano. Antigamente os valores eram baseados em certezas, imposições
absolutas, e era fácil saber e definir o que era o errado e o certo.
Atualmente, devido os avanços da tecnologia e da globalização, os conceitos
que antes pareciam sólidos e definitivos, hoje já sofrem constantes e rápidas
alterações.
Em um mundo em que nada é tido como absoluto, tudo é relativo, conduz de
certa forma à um estado de caos na sociedade atual.
Está ocorrendo uma excessiva derrubada da moral e de valores que antes
eram tidos como básicos e clássicos para se viver de forma civilizada em sociedade.
Como não poderia ser diferente, devido a essas profundas e sérias
transformações que acontecem na humanidade, também o trânsito, por ser um dos
principais ambientes em que o ser humano está inserido, está sofrendo sérias
consequências dessas mudanças de valores morais e comportamento.
18

Na atualidade, o trânsito tem sido um dos maiores problemas da sociedade,


principalmente nos centros urbanos.
Está havendo uma cultura de desrespeito às leis de trânsito, pois faltam
valores e conduta moral por parte da maioria dos motoristas e pedestres.
Ao observar o comportamento dos condutores de trânsito no Brasil, e assistir
reportagens e jornais atuais, o que se conclui é esta generalizada falta de limites nas
infrações de trânsito e, consequentemente, um aumento do número de acidentes
com vítimas fatais.
Para prosseguir com o desenvolvimento desta pesquisa, faz-se necessário
antes de tudo, uma breve definição do que são os conceitos de trânsito,
comportamento, moral e leis.
19

2.1 Definições dos conceitos de trânsito, comportamento, moral e leis:

- Trânsito:

Segundo Reinier Rozestraten é, “o conjunto de deslocamentos de pessoas e


veículos nas vias públicas, dentro de um sistema convencional de normas, que tem
por fim assegurar a integridade de seus participantes.” (ROZESTRATEN, 1998). 
Outra definição de trânsito, conforme Schmitz (2010): “uma trama, uma rede
de relações em constante movimento, como um tecer e destecer ininterrupto das
ligações, compondo uma forma que não existia antes dele, mas que, com sua
participação, ajuda a formar”. (SCHMITZ E SILVA 2010)

- Comportamento:

De acordo com Lopes (LOPES, C. E., 2008), “o comportamento pode ser


entendido como uma relação organismo-ambiente, cuja dinâmica é uma
coordenação sensório-motora. Como resultado dessa dinâmica, temos um fluxo
comportamental que pode ser analisado em termos de uma relação de
interdependência entre eventos ambientais, eventos comportamentais, estados
comportamentais e processos comportamentais.”
Conforme Skinner (1987), a palavra Comportamento descreve a relação entre
as atividades do organismo, que são denominadas por ele de respostas, com os
eventos ambientais (estímulos).

- Moral:
20

 “A moral, é eminentemente prática, voltada para a ação concreta e real, para
um certo saber fazer prático-moral e para a aplicação de normas morais
consideradas válidas por todos os membros de um determinado grupo social”,
afirma Pedro (PEDRO, A. P., 2013).
Já Goldim (2003), define que, “A moral estabelece regras que são assumidas
pela pessoa, como uma forma de garantir o seu bem-viver. A Moral independe das
fronteiras geográficas e garante uma identidade entre pessoas que sequer se
conhecem, mas utilizam este mesmo referencial moral comum”. (GOLDIM, J. R.,
2000-2003)

- Leis:

No site Âmbito Jurídico, a professora de Direito da Universidade Federal do


Rio Grande, Maria de Fátima, cita a definição de Lei como sendo a, “ordem ou
prescrição da razão para o bem comum, promulgado por quem tem a seu cargo o
cuidado da comunidade”. (GAUTÉRIO, M. F. P., 2009)
21

2.2 Uma breve avaliação das atuais estatísticas do trânsito brasileiro:

Ao analisar os conceitos citados acima, percebe-se antes de tudo que, por o


trânsito ser um sistema e um espaço em que o indivíduo está em permanente
relação com o outro, e avaliar as outras definições do que são efetivamente,
comportamento, moral e lei, conclui-se que, o que está havendo na sociedade atual
é uma discrepância, falta de cumprimento e de vivência destes tais conceitos.
É importante ressaltar que o trânsito, por ser um espaço de relações sociais,
é um sistema, que é constituído e regido por leis e normas a serem seguidas e
respeitadas por todos os indivíduos que o compõem, mas na realidade sabe-se que
isto não ocorre.
Para prosseguir com este estudo, serão expostas algumas estatísticas atuais
demonstrando a realidade do trânsito brasileiro, enfatizando o elevado número de
infrações e acidentes que tem ocorrido.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil é o quinto
país com vítimas fatais no trânsito.
Segundo a professora da Universidade Federal de Roraima, Karla Ingrid Pinto
Cuellar (2014), “O aumento das estatísticas de mortes e acidentes no trânsito estão
muito relacionadas à falta de consciência do motorista’’.
O crescente número de vítimas fatais em acidentes no trânsito, é na maioria
das vezes, causados por motoristas infratores, indicando falta de consciência por
parte de condutores e pedestres e um total desrespeito às leis de trânsito.
Cuellar (2014) segue relatando que, “há uma cultura arraigada de desrespeito
às leis de trânsito e falta de civilidade por parte dos motoristas, e até mesmo dos
pedestres, principalmente nos locais onde não há fiscalização intensificada.”
22

Ao realizar esta pesquisa, vários pesquisadores desta área enfatizam que, é


uma mínima parcela de acidentes que são causados por “falhas” que não sejam
humanas.

2.3 Estatísticas:

- Ministério da Saúde:

Foram registradas no ano de 2015, 37.306 óbitos e 204.000 feridos


hospitalizados no ano de 2016, e o Seguro DPVAT registrou em 2017, 37.345
mortes e 41.150 indenizações por morte e 284.190 por invalidez, dados publicados
pelo site Vias Seguras (2018).

- Portal do Trânsito:

“Cerca de 95% dos acidentes são causados por falha humana ou falha
mecânica por falta de manutenção, o que também não deixa de ser uma falha
humana do condutor. É preciso mudar, de fato, a cultura no trânsito”, afirma
Campestrini, do Observatório de Segurança Viária. Segundo o especialista, além de
reforçar a fiscalização no trânsito, com a realização de um maior número de
fiscalizações, o país precisa avançar na formação dos seus condutores.”
O Portal do Trânsito (2018) alerta que, “esse número de 37 mil vidas perdidas
em acidentes por ano é superior à população de muitas cidades brasileiras.
Infelizmente, quando boa parte da população pensa em trânsito, o que vem à mente
são os congestionamentos e chamada indústria da multa, mas o que temos é uma
indústria da dor e da morte”, afirma Renato Campestrini, advogado, especialista em
trânsito e gerente técnico do Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV).
Além das mortes, 600 mil pessoas ficam com sequelas permanentes todos os anos
em decorrência de acidentes de trânsito”.
23

Ainda segue ressaltando que, “no Brasil, mais de 60% dos leitos hospitalares
do Sistema Único de Saúde (SUS) são ocupados por vítimas por acidente de
trânsito. Nos centros cirúrgicos do país, 50% da ocupação também são por vítimas
de acidentes rodoviários. Segundo o Observatório de Segurança Viária, os acidentes
no trânsito resultam em custos anuais de R$ 52 bilhões,” Portal do Trânsito (2018).

- Portal Brasil:

Informa que, “somente este ano, já foram registradas mais de 13 milhões de


infrações por excesso de velocidade nas vias e estradas do Brasil. Em todo o ano de
2016, foram 14,9 milhões de multas aplicadas por esse mesmo motivo. Entre 2010 e
2017, as infrações relacionadas ao excesso de velocidade lideraram o ranking das
mais cometidas por motoristas brasileiros.”
Em outra reportagem, no ano de 2018, O Portal Brasil informa que, “Apenas
1,2% dos acidentes fatais entre 2007 e 2016 foi motivado por defeitos nas vias,
aponta levantamento. Mais de 30% das mortes em rodovias federais brasileiras nos
últimos anos estão relacionadas ao desrespeito às normas de trânsito. É o que
revela a Avaliação das Políticas Públicas de Transporte, estudo realizado pelo
Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil com base em dados da Polícia
Rodoviária Federal (PRF). O levantamento mostra que, entre 2007 e 2016, do total
de mais de 76 mil óbitos registrados nas estradas, mais de 23 mil deles foram
motivados pelo não cumprimento de leis de trânsito.”
Nesta mesma publicação, o portal segue, “o estudo divide as causas das
ocorrências envolvendo a falta de respeito às regras de trânsito em: dirigir em
velocidade incompatível (responsável por 11,6% dos óbitos no período), realizar
ultrapassagem indevida (8,4%), conduzir o veículo após a ingestão de álcool (4,8%),
desobedecer a sinalização (4,4%) e não manter distância de segurança (1,1%)”,
Portal Brasil (2018).

- Fundação Getúlio Vargas - FGV DAPP:

Segundo o site da FGV, “o estado que contabilizou a maior taxa de


vítimas fatais no trânsito, em 2015, foi o Piauí com 36,62 mortes por 100
24

mil habitantes, seguido pelo estado do Tocantins, com uma taxa de 36,10,
e o de Roraima, com uma taxa de 32,83 por 100 mil habitantes.”
Relatam que, “os gastos com óbitos e feridos por acidentes de
trânsito no Brasil, em 2015, foi de R$ 19 bilhões, o que representa um
valor superior à arrecadação do estado do Mato Grosso em 2016 (R$ 16
bilhões), por exemplo. De acordo com relatório do Ipea, publicado em
2015, o impacto econômico causado pelos acidentes de trânsito, apenas
em rodovias federais, no Sistema Único de Saúde foi perto de R$ 1 bilhão
para o ano de 2014.”
Capítulo 3. Relacionando a função paterna e a possível
interferência da mesma, na formação moral do condutor de trânsito
quando adulto:

Como já exposto no primeiro capítulo, o respeito por leis em geral, e a moral,


são conceitos que deveriam ser aprendidos e introduzidos à consciência e à
estrutura de personalidade do indivíduo durante a infância.
Como a presente pesquisa é referente ao aumento exacerbado de cidadãos
que desrespeitam às leis de trânsito, será feito abaixo um possível paralelo entre
declínio da função paterna na contemporaneidade, e o comportamento infrator do
indivíduo no trânsito, quando adulto.
Após os estudos levantados no capítulo anterior, concluiu-se que, o
desrespeito às normas vigentes de trânsito e o consequente aumento das infrações
estão sendo a principal causa de acidentes com vítimas fatais.
São números tão alarmantes que já foram comparados ao número de vítimas
de guerras em outros países.
Depois de analisar as principais estatísticas levantadas nos últimos anos,
chegou-se à conclusão de que, a maioria destes acidentes são causados pelo não
cumprimento das leis do Código de Trânsito Brasileiro.
O número de acidentes que ocorrem devido à outras causas, que não sejam
“falhas” humanas, são pouquíssimas, como visto no capítulo anterior.
A violência dos condutores de trânsito nas estradas e ruas brasileiras hoje,
mostram através dos seus comportamentos que, a satisfação pulsional não
encontram uma barreira, um limite.
25

Ao optar por comportamentos tão desafiadores da lei, percebe-se que estes


indivíduos têm dificuldade com algo que lhe imponha limites, que barre suas
satisfações pulsionais (desejos inconscientes).
Predomina o “gozo” (pulsões inconscientes), sobre o Nome-do-Pai
(Superego/leis). Já não são mais os limites que prevalecem, nem as figuras de
autoridade, mas sim os comportamentos infantilizados e pulsionais.
Está havendo uma queda significativa da submissão às figuras de autoridade,
ou seja, do respeito às leis da sociedade.
Há um comportamento imperativo das pulsões inconscientes sobre o
Superego (instância psíquica responsável pelas normas e moral).
E é de acordo com a abordagem psicanalítica que se entende que, a função
paterna tem como principal papel, introduzir os conceitos de leis e moral, na infância,
principalmente o respeito às leis da sociedade.
Esta introdução das leis, como estudado no primeiro capítulo, são oriundas da
resolução do Complexo de Édipo, segundo Freud (1924). Preparando o indivíduo
para que, quando adulto, tenha o mínimo de condições necessárias para viver em
sociedade.
No período da infância, as pulsões inconscientes/gozo, através do Complexo
de Édipo, recebem uma barreira e imposição de limites por meio da função paterna,
inaugurando de forma simbólica na criança, um lugar de sujeito.
A ausência ou falha desta função na estrutura de desenvolvimento da
personalidade deste sujeito, futuramente vão demonstrar uma necessidade de que
esta metáfora paterna/limites, seja imposto de outra forma pela sociedade (leis).
É muito importante destacar que a presença da função paterna, no período do
Complexo de Édipo/primeira infância é estrutural para a personalidade e
desenvolvimento emocional e psicológico da criança, para que, quando adulto,
esteja capacitado a ser um cidadão de fato.
Neste sentido, Freud em Totem e tabu (1913/1980b), enfatiza que a lei é
imprescindível para se viver em sociedade, pois impõe que o indivíduo faça
renúncias. Para ele, esta relação do sujeito com este pai presente em sua infância,
introduz o sentimento de culpa, possibilitando que o indivíduo respeite às leis e viva
em sociedade, enxergando “o outro.”
26

Na contemporaneidade o que se percebe é que há uma necessidade de


regular no psiquismo do sujeito a realização destes “gozos pulsionais”, com a
ausência deste Nome do Pai/função paterna.
Através das instâncias normativas da sociedade, como as leis em geral,
deveriam trabalhar no sujeito a dimensão desta ausência de autoridade e limites no
psiquismo de tais sujeitos, objetivando gerar nos mesmos a ética e o sentimento de
culpa.
A introdução da função paterna/Nome do Pai seria o meio de regular este
gozo pulsional desde a infância do sujeito. Pois a demanda do indivíduo na
atualidade tem sido deste Nome do Pai, para regular o seu próprio gozo.
São pessoas marcadas por comportamentos de degradação do caráter, em
que há o retorno do gozo no real. Indivíduos totalmente intolerantes a frustrações,
sem limites, que desrespeitam as leis, e não percebem que vivem em sociedade.
Há uma fraqueza estrutural e generalizada da metáfora paterna/função
paterna.
Há um fechamento do sujeito, uma refutação do outro, uma era em que o
Outro não existe. Havendo uma ação coletiva do princípio do prazer (PP), em que
rege o discurso do prazer, do “tudo é permitido”, do desrespeito generalizado pelas
leis.
É uma ruptura do sujeito com os laços sociais, uma ideologia narcisista e um
fechamento sobre si mesmo e seus gozos pulsionais. São comportamentos com
práticas puramente pulsionais (inconscientes), sem limites.
São comportamentos que demonstram a não inclusão do Nome do Pai
(castração), durante sua infância. Não houve a castração edípica sobre o gozo e as
pulsões do inconsciente.
E esta ausência de castração neste importante período do desenvolvimento
psicossexual da criança, faz com que esse indivíduo quando adulto, tenha
dificuldade em se submeter a qualquer figura de autoridade, ou a algo que lhe
imponha limites.
Infelizmente o que se percebe nos dias atuais, é um declínio da função
paterna/Nome do Pai.
A interdição não tem prevalecido na educação e no desenvolvimento
psicológico e emocional das crianças. Tem prevalecido a cultura do “tudo é
permitido”. A criança acaba crescendo num ambiente de insegurança e instabilidade,
27

fazendo com que a mesma se sinta “solta” no mundo, sem amparo e referencial
moral. Crescem adultos que não aceitam limites e imposições da sociedade.
Há uma generalizada crise de autoridade, o pai que interdita, que dá limites,
não prevalece.
Na atualidade está prevalecendo as satisfações pulsionais e inconscientes do
sujeito, sobre o Superego. Pois o Superego, que impõe ao indivíduo o que é ou não
moralmente aceito, e que advém de uma função paterna presente e eficaz, está
“falhando”. Como se estivesse havendo um “afrouxamento generalizado de
Superego” na sociedade.
Tentar reintroduzir no sujeito contemporâneo a possibilidade do diálogo, a
existência de um Outro, que lhe impõe barreiras.
Este Outro (função paterna) que lhe faltou durante a infância (período do
Complexo de Édipo).
Seria dizer então, quando adulto, o sujeito dizer “sim” ao Pacto Civilizatório,
proposto por Freud em seu artigo Mal-Estar na Civilização (1930).
Sobre este tema, o escritor Hélio Pellegrino (2010), cita que, “para Freud, este
processo implica, necessariamente, uma renúncia pulsional tanto erótica quanto
agressiva. Civilizar é, portanto - e por um lado -, reprimir ou suprimir.
Tal conceito fica expresso, com clareza, no livro O Mal-estar da Civilização e,
através dele é possível compreender a presença, em cada ser humano, de um certo
- e inevitável - rancor contra a cultura.”
E para concluir este raciocínio, o escritor Pellegrino (2010), prossegue:

Mas, voltemos ao Édipo, pedra angular, segundo Freud, dá estrutura


intrapsíquica e do processo civilizatório. A criança, na vicissitude edípica,
tem que renunciar às suas pulsões incestuosas e parricidas. Tem que
renunciar, portanto, à onipotência do seu desejo e ao princípio do prazer,
adequando-se ao princípio de realidade. Essa renúncia se faz em nome do
temor, subordinado ao amor. A solução do complexo de Édipo implica um
pacto – uma aliança - com o pai e com a função paterna. Ora, num pacto,
sob a égide da concórdia, ganham os dois lados: No Édipo, com o acordo,
ganha a sociedade, representada pelo pai e pela família, e tem que ganhar
a criança. O pacto edipiano implica mão dupla, um toma lá, dá cá. A criança
perde, mas ganha. Em troca da renúncia que lhe é exigida, tem o direito de
receber nome, filiação, lugar na estrutura de parentesco, acesso à ordem do
simbólico, além de tudo o mais que lhe permita desenvolver-se e sobreviver
28

- vivendo. A criança tem que receber do Édipo, as ferramentas essenciais


que lhe permitam construir-se como sujeito humano. Com isto, ela ama e
respeita o pacto que fez e, nesta medida, fica preparada para identificar-se
com os ideais e valores da cultura à qual pertence.

É necessário que a sociedade, opere no sentido de retificar, encarnar o Outro.


Principalmente quando há como nos dias atuais, o declínio desta presença tão
essencial para a construção do sujeito, como é a função paterna.
Que se perceba então, que há um Outro diverso de si mesmo, que lhe impõe
barreiras e limites. Trata-se de incorporar um Outro que não exclua, não anule, não
silencie, e que reconheça, antes de tudo, a necessidade de reafirmar laços possíveis
para se viver em sociedade.
29

Etapa 6 – Considerações Finais

Nesta pesquisa foram abordados os seguintes temas: a importância da


função paterna no desenvolvimento moral e social da criança e o impacto desta
quando adulto, o atual comportamento dos condutores de trânsito brasileiros e suas
consequências. Em que se fez necessário uma pesquisa bibliográfica.
A pesquisa e análise dos conceitos e temas contidos neste trabalho, foram
feitos com base na abordagem psicanalítica.
A escolha deste tema, no qual se baseou este trabalho, deu-se por meio de
reportagens e estatísticas analisadas do grande aumento no número de acidentes
que tem ocorrido no trânsito brasileiro nos últimos anos, em que, deve-se a maioria
destes às infrações do Código de Trânsito Brasileiro.
E notou-se ao longo destas pesquisas, a extrema importância e relevância da
abordagem e questionamentos que emergem sobre assuntos referentes ao trânsito
brasileiro.
Concluiu-se através deste trabalho que, a função paterna, de acordo com a
abordagem psicanalítica, tem como principal papel introduzir os conceitos de moral e
principalmente o respeito às leis da sociedade, ou seja, a formação moral do
indivíduo durante a infância.
A função paterna permite e possibilita então, que a criança perceba que tem
um apoio moral, alguém que lhe mostre o que são as leis, e a importância das
mesmas.
30

Esta imposição de limites feita através da função paterna, faz com que a
criança se sinta segura e se organize internamente para enfrentar o mundo externo.
E ao internalizar tais cuidados, ela aprende como cuidar de si mesma quando adulta.
Então de acordo com a psicanálise, é somente por meio de uma função
paterna presente e bem exercida na infância do indivíduo, que ele quando adulto,
poderá se lançar ao mundo e enfrentá-lo com segurança e responsabilidade.
Mas nos dias atuais, a sociedade tem se deparado com indivíduos totalmente
intolerantes a frustrações, que desrespeitam as leis, e não percebem que vivem em
sociedade.
E como foi o assunto central desta presente pesquisa, no trânsito houve um
significativo aumento do desrespeito às leis, faltando uma conduta moral por grande
parte dos condutores e pedestres. O que rege é o discurso do “tudo é permitido”, do
desrespeito generalizado pelas leis.
É importante ressaltar que o trânsito, por ser um espaço de relações sociais,
é um sistema, que é constituído e regido por leis e normas a serem seguidas e
respeitadas por todos os indivíduos que o compõem, mas na realidade sabe-se que
isto não ocorre.
Como consequência destes comportamentos de indivíduos infratores,
atualmente o Brasil é o quinto país com vítimas fatais no trânsito.
Através desta pesquisa, concluiu-se que, a maioria dos acidentes são
causados por desrespeito às leis de trânsito, por “falha” humana.
Há um elevado número de vítimas fatais e de pessoas que ficam “inválidas”
decorrentes destes acidentes nas vias brasileiras.
Ao optar por comportamentos tão desafiadores da lei, com consequências tão
preocupantes, percebeu-se através desta pesquisa que, estes indivíduos têm uma
grande dificuldade com algo que lhe imponha limites, que barre suas satisfações
pulsionais (desejos inconscientes).
Na contemporaneidade o que se percebe é que há uma necessidade de
regular no psiquismo do sujeito a realização destes “gozos pulsionais”, com a
ausência ou o declínio desta função paterna.
É uma ruptura do sujeito com os laços sociais, uma ideologia narcisista e um
fechamento sobre si mesmo e seus gozos pulsionais. São comportamentos com
práticas puramente pulsionais (inconscientes), sem limites.
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Categorizou-se então, o conceito de função paterna, em psicanálise, e


definiu-se o processo da formação moral do indivíduo desde a sua infância, até as
consequências deste desenvolvimento na vida adulta.
Avaliou-se a atual conduta moral e o comportamento dos motoristas do
trânsito brasileiro, e quais são as consequências destas infrações na sociedade.
Relacionou-se a ausência e o declínio da função paterna durante a infância, e
a interferência desta, na formação moral do condutor de trânsito quando adulto.
Analisou-se então se há algum tipo de relação existente entre a decadência
da função paterna na infância, com o desrespeito do indivíduo às leis de trânsito,
quando adulto.
Infelizmente o que se percebeu através das pesquisas feitas neste trabalho é
que, nos dias atuais, há sim um declínio da função paterna. A interdição não tem
prevalecido na educação e no desenvolvimento psicológico e emocional das
crianças. Tem prevalecido a cultura do “tudo é permitido”. Crescem adultos que não
aceitam limites e imposições da sociedade. Há uma generalizada crise de
autoridade, o pai que interdita, que dá limites, não prevalece.
E como estes indivíduos são os mesmos que compõem o trânsito quando
adultos, a consequência são o aumento no número dos comportamentos infratores e
o aumento no número de acidentes e de vítimas.
O que se pode concluir através deste tema abordado é que, há sim uma
necessidade extrema e urgente de se reafirmar laços possíveis para se viver em
sociedade, um novo “Pacto Civilizatório”.
32

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