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Queridos pais,

Recebemos constantemente perguntas sobre o melhor momento para


fazer o desfralde das crianças. Como para este assunto não existe receita,
escrevemos esse pequeno texto para ajudar a entender os sinais.
Ainda mais importante que todas as informações, é observar cada
criança amplamente, percebendo em que fase ela se encontra e o que ela já
conquistou, tentando separar nossas expectativas e ansiedades de suas
necessidades reais.

Boa leitura!
Com carinho,
Ana Thereza – Psicóloga e Coordenadora do Aurora Espaço Bebês e
Educação Infantil

O controle dos esfíncteres, tradicionalmente, é tratado como um


condicionamento que parte da vontade do adulto. Quando a criança completa
2 anos, em muitos casos antes disso, o adulto toma a decisão de coloca-la no
vaso sanitário e determina um tempo de espera em que, eventualmente, a
criança fará ou não xixi ou cocô. Em algumas situações, a criança realmente
faz e, então, o adulto mostra toda sua alegria e aprovação. Se a criança não o
faz, o adulto mostra seu desapontamento. Existem muitos psicólogos,
pedagogos e médicos que acreditam em condicionamento e treinamento:
nesse sentido, nossa abordagem é completamente diferente da tradicional.
Não é nosso objetivo que a criança tenha o controle dos esfíncteres o
mais cedo possível, mas sim que este processo aconteça naturalmente, com
calma e respeitando o tempo de cada criança. Não deve ser o adulto a querer
que a criança tenha o controle dos esfíncteres, deve partir da criança a
vontade, deve ser própria iniciativa. Para querer isso, ela precisa ter
maturidade motora, emocional, dos músculos esfíncteres, do sistema nervoso,
entre outras. O processo de retirada da fralda começa com a criança ainda
usando fraldas. Isso inclui a criança ver o pai e a mãe indo ao banheiro, ter
contato com outras crianças que utilizam o vaso sanitário e, principalmente, ter
autonomia ao fazer seus cuidados. Ao trocar a fralda das crianças, devemos,
ao invés de distraí-las, incentivar para que participem ativamente, pedindo a
sua ajuda em todos os momentos (para tirar a roupa, para se limpar, passar a
pomada, colocar a fralda, etc.). Também é válido dizer frases como: - Vejo que
você fez cocô / xixi / que sua fralda está seca. Aos poucos, a criança começa
a perceber o que acontece em seu próprio corpo e dá sinais disso: ela mesma
nos avisará que precisa ser trocada.
Segundo a Abordagem Pikler, existem dois caminhos para o desfralde.
O C.E. (controle dos esfíncteres) Ativo e o C.E. Passivo. No primeiro, é dado
à criança o tempo que ela precisa para amadurecer fisicamente e
emocionalmente. Quando esperamos o tempo da criança, ela rapidamente
seguirá os passos abaixo, sem dificuldades e com alegria. No segundo, o
adulto decide para a criança que ela está pronta e, assim, a criança assume
uma postura passiva em relação ao processo. Quando feito dessa forma,
tiramos dela a grande oportunidade de ter autonomia, vontade e o real
sentimento de conquista.

C.E. ATIVO
- A criança reconhece a necessidade
- Consegue parar a brincadeira
- Vai ao banheiro
- Tira a roupa
- Faz o xixi ou cocô
- Veste-se
- Dá a descarga
- Lava as mãos
- Sai do banheiro

O adulto deve/pode estar ao lado para ajudar, mas é a criança que avisa
ao adulto que quer ir ao banheiro.

C. E. PASSIVO

- A criança passa o dia sem fralda, mas é o adulto que precisa lembra-la
do xixi/cocô, leva-la ao banheiro e senta-la no vaso. O adulto passa o dia
lembrando e perguntando à criança se ela quer ir ao banheiro.

INDÍCIOS DE QUE A CRIANÇA ESTÁ PRONTA:

- Verbaliza a vontade de tirar a fralda, de usar calcinha/cueca


- A criança consegue vestir-se sozinha
- Refere-se a si mesma na primeira pessoa “eu”
- Dá sinais de que vai fazer cocô ou xixi, por vezes mostra-se
incomodada, pede para ser trocada mesmo quando a fralda está limpa
- Mostra autonomia em tarefas diversas ligadas a sua rotina diária (item
mais significativo)

Por volta dos 3 anos, a criança começa a referir a si mesma usando a


palavra “eu”, o que mostra uma primeira percepção de que há uma parte do
mundo que sou “eu” e outra que não faz parte de mim, está fora, separada.
Começamos a verificar uma primeira separação entre a criança e o mundo.
Agora, a fralda suja passa a incomodá-la e ela solicita ao adulto que troque
suas fraldas, mostrando que tomou consciência do que acontece em seu
corpo. Aos poucos, começará a sentir o momento em que fará cocô e xixi. Após
algum tempo desenvolvendo esta sensação, percebendo suas necessidades,
estará pronta para o desfralde.
Acreditamos que, quando uma criança é forçada a sentar no vaso antes de
estar pronta, exigimos dela que exerça controle sobre um corpo ainda
desconhecido, não completamente habitado. Por isso, é comum ver as
crianças começarem a dizer “não” para outras situações, criando uma espécie
de guerra em que passa a não colaborar com o adulto nas tarefas mais
corriqueiras. Embora muitas crianças demonstrem êxito ao serem submetidas
a treinamentos, preferimos partir do pressuposto de que, quando oferecemos
um desafio em seu momento adequado, ou seja, sem acelerarmos os
processos, temos a possibilidade de atuar em conjunto com a criança, a partir
dela, das necessidades que se apresentam e de sua prontidão. Só com essa
parceria podemos então substituir "treinamento" por "educação".
Respeitando as conquistas que já fez e as conquistas que não fez,
acreditando que as fará a seu modo e a seu tempo, garantimos que a criança
se resolva. Quer dizer: não tomamos a decisão de que está na hora dela se
sentar no vaso sanitário, deixamos que ela sinta seu corpo, perceba o que faz
parte dele e o que não faz, deixamos que, naturalmente, surja a consciência
do corpo e a vontade de estar no controle dele. Com paciência e confiança, a
criança vence sozinha o desafio, guardando inconscientemente o sentimento
de que é capaz.
O processo do C.E. demora, em média, 9 meses desde o primeiro
momento em que a criança mostrou interesse até o momento em que ela
apresenta total controle. O desfralde começa com a criança mostrando algum
interesse ou dando alguns sinais, mas isso não quer dizer que está na hora de
tirar a fralda. Isso quer dizer que o processo começou. O adulto deve
observar e esperar até que a criança determine, por iniciativa própria, que não
precisa mais usar a fralda para suas necessidades. Quanto mais a criança está
pronta para começar o desfralde no seu tempo, mais rápido e mais tranquilo
será o processo, tanto para ela, quanto para seus pais.
O processo do C.E. não é LINEAR e pode haver momentos de retrocesso.
(recaídas). Devemos, então, dar um passo atrás e CONFIAR. Quando
observamos que a criança não está pronta, está no processo passivo do C.E.,
devemos parar e dar um passo atrás (voltar a colocar a fralda). Porém, tal
atitude não é recomendada, pois mostra à criança, através da decepção
(mesmo que inconsciente) dos pais, que ela não foi capaz de concluir esta
etapa. Isso faz com que ela fique com uma baixa autoestima neste quesito e
pode ser que ela demore para confiar em si mesma novamente. Não devemos
exigir mais da criança do que ela pode nos dar. Diversos problemas
emocionais e físicos podem surgir na fase adolescente ou adulta de uma
criança que não teve seu tempo respeitado durante esse processo.
Quando fazemos “tentativas” de desfralde, não é natural. Quando
precisamos levar a criança no banheiro a cada 5 minutos, não é natural.
Quando os pais resolvem tirar a fralda, não é natural. Quando este processo
ocorre naturalmente, a criança dá todos os sinais e ela, por conta própria, faz
o desfralde, sem esforço de nenhum adulto. Vamos ter paciência e esperar
nossas crianças, que são capazes e competentes!

Espero que a leitura deste texto tenha ajudado!

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