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Alice Amaro

Bárbara Nunes
Gabriela de Oliveira

Análise crítica da teoria de Jürgen Habermas

A Escola de Frankfurt teve um papel crucial no desenvolvimento dos estudos da


comunicação. A fim de melhorar o entendimento sobre a sociedade, foi
desenvolvida na Escola a Teoria Crítica, que visa a emancipação e auto realização
do ser humano, mas que também revela como a sociedade moderna é dominada,
manipulada e coisificada.

A Teoria Crítica busca entender as várias formas que a sociedade ou grupos sociais
são oprimidos e então é feito um estudo sobre as condições sociais, para revelar as
estruturas opressoras ou que auxiliam na opressão. Com isso, fica entendido que a
comunicação está diretamente aliada à esta dominação. Os adeptos desta teoria
acreditam na dominação das massas, que tudo o que as grandes organizações
comunicam será aceito pela sociedade, como se todas as pessoas fossem iguais,
não tivessem capacidade de questionar e respondessem da mesma forma à esses
estímulos.

Os principais pensadores da Teoria Crítica e que marcaram a primeira geração da


Escola de Frankfurt - Theodor W. Adorno, Max Horkheimer e Hebert Marcuse -
trabalharam com o conceito de indústria da cultura; a qual manipula o seu público,
criando uma homogeneização dos comportamentos através dos meios de
comunicação em massa. A indústria cultural também está ligada ao capitalismo, que
transforma os processos de cultura em mercadoria. Ou seja, para eles ao invés da
comunicação cumprir o seu papel crítico e vinculado à sua própria desconstrução,
ela na verdade representa a circulação de todo o processo de industrialização
cultural.

Ao passo que estes pensadores acreditam que a comunicação separa cada vez
mais as pessoas entre elas e entre as coisas, Jürgen Habermas rompe com esta
perspectiva. ​Ele reconstrói a Teoria Crítica a partir dos conceitos de razão
comunicativa e comunidade ideal de comunicação. Para ele, a comunicação pode
servir de base para a reconstrução racional dos fundamentos da vida social, ou seja,
a sociedade não vive apenas pela razão instrumental, mas também pela razão
comunicativa, constituída através da interação social entre as pessoas.

Como exemplo, temos ​Hollywood,​ uma série de 7 episódios dirigida por Ryan
Murphy e que pode ser encontrada na plataforma de streaming Netflix. Esta
produção traz uma crítica à sociedade dos anos 40, em que atores negros,
homossexuais e asiáticos buscam ter visibilidade na “terra dos sonhos” de Los
Angeles, Hollywood, e traz uma reflexão de como seria se eles realmente tivessem
conseguido. Ao decorrer da trama aparecem personagens que realmente existiram
naquela época e tiveram suas vidas distorcidas pelos padrões de Hollywood.

Baseado nos conceitos de razão instrumental e razão comunicativa ​de ​Habermas,


podemos observar logo no início da série pessoas que faziam filas em frente ao
ACE studios todas as segundas-feiras para ter a oportunidade de serem escolhidos
como figurantes por um pequena quantia em dinheiro, para terem os seus 5 minutos
de fama. O personagem principal, Jack Castello, era uma dessas dezenas de
pessoas, mas nunca foi escolhido. Ele sonhava em “ser alguém” na vida e
conquistar a “terra dos sonhos”. Sendo assim, deu um jeitinho não muito íntegro
para conseguir isso. E por quê? Por que isso era tão importante para ele? Por causa
da influência do cinema na sociedade da época, a denominada Indústria Cultural.

Com a reflexão sobre como os meios de comunicação controlam e influenciam a


população, durante a trama são apresentadas diversas cenas que podem ser
associadas à essa temática, muitas com a idéia de que quem não é conhecido, não
é ninguém, mas para ser conhecido é preciso pagar um preço alto pela fama. Esta
crítica é vista também na abertura da série, onde os personagens principais tentam
escalar o famoso letreiro de Hollywood. É possível perceber que a escalada não é
fácil, alguns quase caem e outros se ajudam, para que no fim todos cheguem ao
topo fazendo uma alusão ao topo da terra dos sonhos. Confira a abertura no link:
Hollywood | Netflix | Title Sequence.

O conceito de agir comunicativo, para Habermas, é buscar, através de uma ação


em conjunto, o entendimento entre os indivíduos que se relacionam. Isso se dá por
meio de um diálogo não agressivo, partindo do pressuposto da argumentação como
foco central. Tal conceito pode ser observado no momento em que a esposa do
dono do estúdio toma o controle das produções e decide dar visibilidade às
minorias. De início, ela aceita um roteirista “de cor” e homosexual, aceita também a
primeira protagonista negra e uma atriz asiática em um papel sem estereótipos. A
mulher tenta quebrar paradigmas da época em um tempo pós influência de Hitler.
Uma frase muito interessante dita foi “eu achava que um bom governo poderia
mudar o mundo, mas o que vocês três estão fazendo pode mudar o mundo”.

A série mostra o uso da comunicação para mudar uma sociedade, apresentando


uma nova realidade de que negros poderiam protagonizar e escrever filmes, algo
que não era permitido e nem feito por outros estúdios. Foi algo inovador e
revolucionário na época.

O conceito de sistemas tem por característica uma visão externa da sociedade onde
está localizada o indivíduo e pode ser observado quando o estúdio sofre represália
e censura dos detentores do poder. O rolos de filmes chegaram a ser queimados
para que não saíssem e assim “desvirtuassem” a sociedade. A visão dos
telespectadores também era negativa, pois fizeram protestos e atearam fogo na
casa dos atores e também protestaram em frente ao estúdio.

O conceito de sistemas também nos permite observar que há dois grupos que
permitem o regimento da sociedade, o político e o econômico. O grupo político
nesse contexto está relacionado à administração e controle da sociedade e o grupo
econômico, relacionado aos bens e a relação de compra e venda. Tal fato é
observado na série através da existência de uma “lista negra de Hollywood”, em que
atores que tinham afinidade com a esquerda ou movimentos que iam contra a linha
de pensamento da época fossem censurados. Esses atores nunca recebiam bons
papéis a serem interpretados. Também é possível fazer esta associação com o
personagem Ernie, dono de um posto de gasolina, que na verdade era a fachada de
um ponto de prostituição masculina. As pessoas da elite iam até o posto para se
satisfazer sexualmente e muitas pessoas influentes pediam sigilo. Foi desta forma
que o personagem principal conseguiu o tão sonhado papel em produções
cinematográficas, ao atender a esposa de um famoso produtor.

O Mundo da vida, segundo Habermas, é o ambiente onde determinada situação ou


interação é realizada, o plano de fundo onde as ações acontecem, é a vida social
onde os indivíduos interagem a todo momento. Esse conceito se relaciona tanto
com a própria linguagem quanto ao contexto, pois é pela linguagem que as
tradições culturais de um determinado povo, por exemplo, são repassadas e
permanecem ao longo de gerações, por se tratar de algo simbólico da sociedade em
questão. A cultura, por sua vez adquire um papel importante uma vez que o
entendimento da linguística está atrelado aos conteúdos culturais, do contexto,
entendimento e interpretação, e precisa deles para que a comunicação se dê de
forma efetiva para as partes que se relacionam. Fazemos a conexão deste conceito
com a série no momento em que o roteirista gay e negro, a atriz negra e a asiática
ganham estatuetas do Oscar e seus discursos inspiram pessoas a não desistirem
de seus sonhos, que todos podem conseguir, mesmo que isso signifique quebrar as
“tradições” de racismo e a estereotipação.

A série ​Hollywood mostra que os detentores do poder queriam que a sociedade


apenas aceitasse o que lhes estava sendo imposto, e por esta razão o diretor traz a
reflexão de “e se negros, asiáticos e homossexuais não tivessem sido censurados e
silenciados? O que teria acontecido?”.
Referências bibliográficas:

FREITAG, Bárbara. ​Habermas e a Filosofia da Modernidade​. Disponível em:


https://periodicos.fclar.unesp.br/perspectivas/article/view/769/630. Acesso em: 01
set. 2020

GALLELI, Giovanna Migotto da Fonseca; MARCHIORI, Marlene. ​Reflexões sobre a


Comunicação Organizacional e a Racionalidade Habermasiana. In: Congresso
Brasileiro Científico de Comunicação Organizacional e de Relações Públicas -
Abrapcorp, 11, 2017, Belo Horizonte, MG. Anais (on-line). São Paulo: Abrapcorp,
2017. Disponível em:
https://ebooks.pucrs.br/acessolivre/anais/abrapcorp/assets/edicoes/2017/arquivos/5
2.pdf. Acesso em: 01 set. 2020

LUBENOW, Jorge Adriano. ​Esfera pública e democracia deliberativa em


Habermas. ​Modelo teórico e discursos críticos. Disponível em:
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-512X2010000100012
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PEREZ, Miriam Azevedo Hernandez. ​Teoria do agir comunicativo e estado


democrático de direito. ​Âmbito Jurídico, 2012. Disponível em:
https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-103/teoria-do-agir-comunicativo-e-estad
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RIVEIRA, Francisco Javier Uribe. ​Agir comunicativo e planejamento social: uma


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Disponível em: http://books.scielo.org/id/4ghgb/pdf/rivera-9788575412480-03.pdf.
Acesso em: 01 set. 2020

RÜDIGER, Francisco. ​As teorias da comunicação​. Penso Editora, 2009.

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