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Ágio ou prémio de emissão

1) Noção:
Definição:

Quanto à subscrição de participações sociais (quotas, ações ou


partes) fundadas em entradas em dinheiro e/ou em espécie, o ágio,
prémio de emissão ou prémio de subscrição é:
i) a diferença entre o valor da entrada em dinheiro e/ou em espécie
que o sócio ou acionista realizou ou a cuja realização se obrigou
perante a sociedade e o valor nominal da quota, ações ou
parte que subscreveu como contrapartida por essa entrada (ou, no
caso das ações sem valor nominal, o montante do capital
social correspondentemente emitido),
ii) que está sujeito ao regime da reserva legal, e
iii) que, por isso, deve ser inscrito na rubrica contabilística do capital
próprio, concretamente a) na sub-rubrica da reserva legal, b) na sub-
rubrica das “outras reservas” (reservas estatutárias) ou c) numa sub-
rubrica própria, designada precisamente “prémios de emissão” (sobre
este aspeto ver em baixo ponto 11).

Ou seja, o ágio, prémio de emissão ou prémio de subscrição (em


inglês “additional paid-in capital” [APIC]) é a parcela do valor da
entrada suportada pelo sócio que não é computada no capital social.

Definição legal:

O ágio, prémio de emissão ou prémio de subscrição consiste:

– quanto à emissão de ações fundadas em entradas em dinheiro, “na


diferença para mais entre o valor nominal e a quantia que os
acionistas tiverem desembolsado para as adquirir ou, no caso de
ações sem valor nominal, o montante do capital correspondentemente
emitido”;
– “quanto às entradas em espécie, na diferença para mais entre o
valor atribuído aos bens em que a entrada consiste e o valor nominal
das ações correspondentes ou, no caso de ações sem valor nominal,
o montante do capital correspondentemente emitido”;

– “quanto à emissão de obrigações com direito de subscrição de


ações ou de obrigações convertíveis, na diferença para mais entre o
valor de emissão e o valor por que tiverem sido reembolsadas; e
– “quanto à troca de obrigações com direito de subscrição de ações ou
de obrigações convertíveis em ações, na diferença para mais entre o
valor da emissão daquelas e o valor nominal destas ou, no caso de
ações sem valor nominal, o montante do capital correspondentemente
emitido” (art. 295.º, n.º 3 do Código das Sociedades Comerciais
[CSC] [1]).

Definição do ágio decorrente de entradas em dinheiro e ignorando


o regime das ações sem valor nominal (situação mais frequente na
prática):

O ágio corresponde à diferença para mais (sobrepreço ou


sobrevalor) entre o valor nominal da quota, ações ou parte
subscrita(s) pelo sócio ou acionista e o valor que este desembolsou ou
se obrigou a desembolsar à sociedade para adquiri-la(s).

Índice
 1) Noção:
 2) Equação ou fórmula:
 3) Razão de existir o ágio:
 4) S.A., SPQ  e SUPQ:
 5) Aumento do capital social e constituição da sociedade:
 6) Exemplo do caso mais frequente – ágio num aumento de capital social de uma
sociedade anónima (S.A.):
 7) Exemplo – ágio na constituição de uma sociedade por quotas:
 8) Fatores a ter em conta na fixação dos montantes a levar a capital social ou a
ágio:
 9) O ágio não pode ser diferido:
 10) O ágio ou prémio de emissão não é computado no capital social:
 11) Inscrição contabilística no balanço:

Notas – doravante:
– para facilitar a exposição, vamos ignorar o regime das ações sem valor nominal;
– todas as disposições legais referidas sem indicação expressa da respetiva fonte
reportam-se ao Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86,
de 2 de setembro, com as alterações subsequentes [2].
– ver bibliografia sobre o ágio ou prémio de emissão na presente nota de rodapé [3].
2) Equação ou fórmula:
Ágio = valor da entrada em dinheiro e/ou em espécie (isto é, o valor
que o sócio ou acionista pagou ou se obrigou a pagar para subscrever
a quota, ações ou parte) – valor nominal da quota, ações ou parte
subscrita(s).

Valor da entrada em dinheiro e/ou em espécie = valor nominal da


quota, ações ou parte subscrita(s) + ágio, se houver.
3) Razão de existir o ágio:
Na maioria das vezes, o ágio existe porque o valor real (valor
contabilístico ou valor de mercado) das quotas ou ações é superior ao
respetivo valor nominal. Ver exemplos em baixo nos pontos 6 e 7.
4) S.A., SPQ  e SUPQ:
Pode haver ágio tanto:
– nas sociedades anónimas (S.A.), como
– nas sociedades por quotas, e
– nas sociedades unipessoais por quotas (ver exemplos em baixo
no ponto 7) (cfr., por exemplo, o art. 87.º, n.º 1 al. e), que está inserido
na parte geral do Código das Sociedades Comerciais, aplicável,
portanto, a todos os tipos de sociedades comerciais) [4].

Assinale-se que a Diretiva 2013/34/UE do Parlamento Europeu e do


Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa às demonstrações
financeiras anuais e a outros aspetos relativos à prestação de contas,
atualmente em vigor, refere expressamente “Prémios de emissão de
ações (quotas)” no respetivo subponto II do ponto L do anexo IV [5].

Quando há um ágio numa sociedade anónima (S.A.), diz-se que as


ações foram emitidas acima do par (par value, no mind value [6]). Por
sua vez, quando não há ágio, ou seja, quando o valor da entrada dos
acionistas coincide com o valor nominal das ações subscritas, diz-se
que as ações foram emitidas ao par.

5) Aumento do capital social e constituição da sociedade:


O ágio é muito mais frequente nos aumentos de capital social,
especialmente nas sociedades anónimas (S.A.). Porém, nada obsta a
que haja ágio também aquando da constituição da sociedade
comercial [7].
6) Exemplo do caso mais frequente – ágio num aumento
de capital social de uma sociedade anónima (S.A.):
Por exemplo, uma sociedade anónima (este exemplo também pode
ser aplicado, com as necessárias adaptações, a uma sociedade por
quotas) tem um capital social de 50 000€, mas tem um capital
próprio (património líquido ou situação líquida) de 400 000€ (oito
vezes superior).

Apesar disso, os atuais acionistas pretendem fazer um aumento de


capital social com o objetivo de abrir o capital social a um novo
acionista e de obter financiamento adicional para adquirir um
novo estabelecimento comercial. Porém, os atuais acionistas não
querem realizar novas entradas e apenas pretendem prescindir de
20% do capital social da sociedade.

Assim, aumenta-se o capital social de 50 000€ para 62 500€,


emitindo-se novas ações representativas de 12 500€ de capital
social a ser subscritas integralmente pelo novo acionista. Com esta
subscrição o novo acionista passa a ter uma posição relativa
de 20% no capital social da sociedade (proporção do valor nominal
das ações do acionista no capital social da sociedade).

Ora, o valor contabilístico das ações dos atuais acionistas é oito vezes
superior ao respetivo valor nominal. Pelo que, o novo acionista deverá
pagar um valor, pelo menos, oito vezes superior ao capital que (ele)
subscrever (os atuais acionistas poderão exigir um valor ainda mais
elevado se e na medida em que o valor pelo qual estão dispostos a
ceder 20% do capital social da sociedade for superior ao valor
contabilístico dessa participação).

As ações a emitir no aumento de capital representam 12 500€


de capital social correspondentes a 20% do capital social após
aumento (62 500€); logo, o respetivo valor contabilístico será de 100
000€ (12 500€ x 8 = 100 000€). Assim, para subscrever essas ações,
o novo acionista terá de pagar ou que se obrigar a pagar, pelo menos,
100 000€. As ações serão, portanto, emitidas acima do par.

Desse valor (100 000€):


– 12 500€, serão computados no capital social (70% desse valor
pode ser diferido; 30% tem de ser imediatamente realizado cfr. art.
277.º, n.º 2 1ª parte, aplicável por força do art. 89.º, n.º 1);
– os restantes 87 500€, serão levados a ágio (devem ser
imediatamente realizados cfr. art. 277.º, n.º 2 2ª parte aplicável por
força do art. 89.º, n.º 1).

7) Exemplo – ágio na constituição de uma sociedade por


quotas:
Outro exemplo: dois sujeitos de Direito, pessoas singulares ou
coletivas, pretendem constituir uma sociedade por quotas. Para tal,
pretendem mobilizar 500 000€ (quinhentos mil euros). Ora, esses
sujeitos podem realizar a entrada de 500 000€ perante a sociedade
por quotas:

a) computando-se a totalidade dessa entrada no capital social desta


última, ficando, portanto, a sociedade por quotas com um capital
social de 500 000€; ou, em alternativa,
b) podem, por exemplo, desses 500 000€,
           i) computar apenas 10 000€ (o capital social
mínimo das sociedades por quotas é hoje de 2€ cfr. arts. 201.º e
219.º, n.º 3) no capital social da sociedade por quotas, destinados,
portanto, à subscrição de quotas representativas desse montante de
capital, e
           ii) levar os restantes 490 000€ a ágio.

8) Fatores a ter em conta na fixação dos montantes a


levar a capital social ou a ágio:
8.1) Quanto maior for a cifra do capital social maior será a cifra da reserva
legal:

A reserva legal está indexada ao capital social:

O valor da reserva legal que a sociedade deve constituir ou reintegrar


está indexado ao valor do respetivo capital social. Logo, quanto maior
for o montante da(s) entrada(s) a computar no capital social e,
consequentemente, menor for o montante a levar a ágio, maior será a
cifra da reserva legal que a sociedade deve constituir ou, se for caso
disso, reintegrar.

Regime da reserva legal:

Com efeito, a sociedade deve afetar uma percentagem não inferior


a 5% dos respetivos lucros para a constituição da reserva legal e, se
for caso disso, para a sua reintegração, até que a reserva legal
represente 20% do capital social. No pacto social da sociedade
podem fixar-se percentagem e montante mínimo mais elevados para a
reserva legal (art. 295.º, n.º 1).

Esta regra é aplicável:


– às sociedades anónimas (S.A.), diretamente (art. 295.º, n.º 1); e
– às sociedades por quotas, por força do art. 218.º, n.º 2 (cfr. também
art. 218.º, n.º 1) com uma nuance: o limite mínimo da reserva legal
não poderá, em qualquer caso, ser inferior a 2500 Euros.

Por exemplo:

Assim, no exemplo que se indicou em cima no ponto 7:

a) se a sociedade por quotas for constituída com um capital social de


500 000€, terá de constituir, em princípio, ao longo do tempo, uma
reserva legal que alcance, pelo, menos, o valor de 100 000€;
b) se, ao invés, a sociedade por quotas for constituída com um capital
social de 10 000€, terá de constituir, em princípio, ao longo do tempo,
uma reserva legal que alcance, pelo, menos, o valor de 2500€. Na
verdade, 20% de 10 000€ corresponde a 2000€. Contudo,
nas sociedades por quotas o limite mínimo da reserva legal é 2500€
(art. 218.º, n.º 2 parte final).

8.2) “Despachar” a constituição integral da reserva legal (no seu


montante máximo):

Por outro lado, caso, no exemplo que se indicou em cima no ponto 7,


os dois sujeitos optem pela hipótese constante da alínea b), como o
ágio fica sujeito ao regime da reserva legal (art. 295.º, n.º 2 al. a)),
consegue-se, desde logo, “despachar” a constituição integral da
reserva legal da sociedade.

Pelo que, nesse caso, deixará de ser necessário afetar todos os


anos uma parte dos lucros de exercício que eventualmente se
verifiquem à respetiva constituição ou reintegração; a reserva legal
fica, desde logo, constituída no seu montante máximo, nesse caso, no
valor de 2500€ (arts. 218.º, n.º 2 e 295.º, n.º 1).

8.3) Distribuição ou atribuição de lucros e outros bens aos sócios /


acionistas:

Por outro lado, quanto maior for o montante a computar no capital


social e, consequentemente, menor for o montante a levar a ágio,
maior será o montante que o capital próprio (património líquido ou
situação líquida) da sociedade precisa de atingir para que esta possa
distribuir ou atribuir bens aos sócios, incluindo lucros de balanço ou
lucros de exercício que eventualmente se verifiquem.

Os lucros de exercício, porém, só podem ser distribuídos ou atribuídos


se a sociedade registar lucros de balanço (ou lucros distribuíveis).

Lucros de balanço:

Ora, a sociedade regista lucros de balanço se e na medida em que o


seu capital próprio (património líquido ou situação líquida) for superior
ao valor conjunto do capital social e das reservas legais e estatutárias
(cfr. art. 32.º, n.º 1 do CSC) (o que pressupõe, naturalmente, que a
sociedade tenha um ativo de valor suficiente para cobrir eventuais
prejuízos transitados e que as respetivas reservas legais e estatutárias
estejam devidamente constituídas ou reintegradas).
Lucros / perdas de balanço = capital próprio – (capital social +
reservas legais + reservas estatutárias).

Por exemplo:

Assim, no exemplo que se indicou em cima no ponto 7:

Hipótese a):

Se a sociedade por quotas for constituída com um capital social de


500 000€, apresentar no primeiro ano um lucro de 100 000€ e não
tiver, nos termos do respetivo pacto social, que constituir reservas
estatutárias:
– terá que afetar, para a constituição da respetiva reserva legal, o
valor de 5000€ (5% de 100 000 = 5000€),
– ficará com um capital próprio de 600 000€, e
– registará, consequentemente, um lucro de balanço e de exercício de
95 000€ (LB / LE = 600k – [500k + 5k]).

Conclusão – a sociedade só poderá distribuir ou atribuir aos sócios


(enquanto tais), a título de lucros de balanço ou a qualquer outro título
(contrapartida de amortização de quotas ou ações, etc), no máximo,
95 000€.

Hipótese b):

Se, ao invés, a sociedade por quotas for constituída com um capital


social de 10 000€ (tendo levado a ágio 490 000€), apresentar no
primeiro ano um lucro de 100 000€ e não tiver, nos termos do
respetivo pacto social, que constituir reservas estatutárias:
– ficará com a respetiva reserva legal integralmente constituída no
valor de 2 500€,
– ficará com um capital próprio de 600 000€, e
– registará, consequentemente, um lucro de balanço e de exercício no
valor de 587 500€ (LB / LE = 600k – [10k + 2.5k]).

Conclusão – a sociedade poderá distribuir ou atribuir aos sócios


(enquanto tais), a título de lucros de balanço ou a qualquer outro título
(por ex., contrapartida de amortização de quotas ou ações, etc), no
máximo, 587 000€.

9) O ágio não pode ser diferido:


O ágio não pode ser diferido: deve ser imediatamente realizado (art.
277.º, nº 2, parte final; esta regra aplica-se, por analogia,
às sociedades por quotas [8]).
10) O ágio ou prémio de emissão não é computado no
capital social:
Como vimos em cima, nem todo o valor correspondente à entrada do
sócio é necessariamente computado no capital social. Com efeito, se
houver lugar a ágio, prémio de emissão ou prémio de subscrição, este
não é computado no capital social.

O ágio fica sujeito ao regime da reserva legal, até ao respetivo limite


(art. 295.º, n.º 2 al.a)). Ver ponto seguinte.

a) Capital próprio = ativo – passivo; (ativo = passivo +/- capital próprio).

b) Noutra perspetiva: capital próprio = (capital subscrito [capital subscrito e realizado + capital subscrito e não realizado] –

quotas/ações próprias) + outros instrumentos de capital próprio + prémios de emissão + reservas legais + outras reservas
+/- resultados transitados + excedentes de revalorização +/- ajustamentos/outras variações no capital próprio +/- resultado

líquido do período +/- interesses que não controlam.

Recorte do modelo oficial


[9]
de balanço constante do Anexo I da Portaria n.º 220/2015, de 24 de julho   , retificada pela declaração de retificação n.º

41-B/2015, de 2015-09-21, relativa aos modelos de demonstrações financeiras para as diferentes entidades que aplicam

o Sistema de Normalização Contabilística (SNC).

11) Inscrição contabilística no balanço:


O valor do ágio, prémio de emissão ou prémio de subscrição deve ser
inscrito no balanço da empresa dentro da rubrica do capital próprio,
concretamente:

a) em primeiro lugar, na sub-rubrica das “reservas legais”, se estas


ainda não estiverem totalmente constituídas ou reintegradas, isto é, se
ainda não tiverem atingido o seu montante máximo (no último exemplo
indicado no ponto 7: 2500€ – ver imagem em cima) (só nesta parte é
que o ágio constitui uma reserva legal especial);

b) depois, na sub-rubrica das “outras reservas”, relativa às reservas


estatutárias, se cumulativamente: i) estas eventualmente existirem, ii)
se, caso existam, ainda não estiverem totalmente constituídas ou
reintegradas, e iii) se, pelo modo como estiverem concretamente
configuradas, não excluírem os valores das reservas de ágio (0€); e
c) só por último (nomeadamente no caso frequente de a reserva legal
já estar totalmente constituída ou reintegrada e de não haver reservas
estatutárias), numa sub-rubrica própria, designada
precisamente “prémios de emissão”.

Assim, as reservas indisponíveis – legais e estatutárias – podem ser


constituídas não só:
– pelo valor de lucros não distribuídos (reservas de lucros), como
também,
– pelo valor de ágios, prémios de emissão ou prémios de subscrição
que eventualmente existam (reservas de ágios ou prémios de
emissão).

Cfr. modelo de balanço constante do Anexo I da Portaria n.º 220/2015,


de 24 de julho [10] retificada pela Declaração de Retificação n.º
41-A/2015, relativa aos modelos de demonstrações financeiras para
as diferentes entidades que aplicam o Sistema de Normalização
Contabilística (SNC).

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