Você está na página 1de 6

A ENTREVISTA INICIAL COM OS PAIS

Quando os pais procuram consulta a respeito de um filho, é solicitado pelo analista


que o filho não esteja presente, mas que seja informado. É sugerido que compareça o pai
e mãe, mas é frequente a presença só da mãe, excepcionalmente o pai e poucas vezes o
pai e a mãe.

Em alguns casos, alguém que represente o pai e a mãe. Qualquer uma dessas
possíveis situações revela o funcionamento do grupo familiar na relação com o filho.
Para que formemos um juízo aproximado sobre as relações do grupo familiar e em
especial o casal, apoiaremos na impressão deixada pela entrevista ao considerar todos os
dados recolhidos.

A entrevista não deve parecer um interrogatório, com os pais sentindo julgados,


deve aliviar as angústias e as culpas que o conflito do filho despertar. E quando a
entrevista é com os pais, é necessário ter cuidado para não ter preferências, embora
inevitavelmente se produza um melhor entendimento com um deles, esse entendimento
deve servir para uma melhor compreensão do problema e não para criar um novo
conflito.

Os dados que os pais nos colocam não são tão exatos, podem ser deformados e
superficiais, pois não costumam ter um conhecimento global da situação e durante a
entrevista esquecem parte do que sabiam, devido à angústia que esse conhecimento
provoca, e o tempo limitado com o terapeuta, até então uma pessoa desconhecida.

A entrevista deve ser dirigida e limitada de acordo com um plano previamente


estabelecido, pois embora os pais venham falar dos filhos, tem a tendência de escapar do
tema falando de suas próprias vidas. A entrevista tem o objetivo de que nos falem sobre
a criança e da relação com ela.

Não é conveniente finalizar essa entrevista sem ter conseguido os seguintes dados
básicos necessários antes de ver a criança: a) motivo da consulta; b) história da criança;
c) como transcorre um dia da sua vida atual; d) como é a relação dos pais entre si, com
os filhos e com o meio familiar imediato.

A) MOTIVO DA CONSULTA
O motivo da consulta para os pais é o mais difícil, sobre o que não está bem com o
filho. Essa resistência não é consciente, visto que já foi vencida quando decidiram pela
consulta. É importante diminuirmos a angústia inicial. Devem sentir que tudo que
recordam é importante para nós, na medida das possibilidades, registraremos os dados
do início, para depois confrontarmos com os que conseguirmos no transcurso da
entrevista.

Ao sentirem aliviados, recordam mais corretamente os acontecimentos, mesmo assim


devemos aceitar que ocorram esquecimentos totais ou parciais de fatos importantes, dos
quais podemos tomar conhecimento meses depois, pela criança, estando ela já em
tratamento.

Apesar dessa inevitável limitação, o material obtido é valioso, pois a comparação dos
dados obtidos durante a análise da criança com os apresentados pelos pais na entrevista
inicial é de suma importância para avaliar em profundidade as relações com o filho.

B HISTÓRIA DA CRIANÇA

Interessam saber sobre a resposta emocional especialmente da mãe a respeito do


anuncio da gravidez, e consequentemente como evoluíram seus sentimentos, analisando
se aceitaram, se sentiram felizes ou iludiram porque tudo o que acontece desde a
concepção é importante para a evolução posterior.

Todos os estudos atuais enfatizam a relação da mãe com o filho e é um fato


comprovado que o rechaço emocional da mãe, seja ao sexo como à ideia de tê-lo, deixa
marcas profundas no psiquismo da criança.

A resposta nos da à mãe sobre a gravidez indica qual foi o inicio da vida do
filho. Embora a resposta não seja um fiel reflexo da verdade, mas o que os pais nos
dizem, confrontado com o material oferecido pela criança será de grande utilidade na
investigação.

Embora na verdade muitas crianças não sejam desejadas por seus pais, pelo menos no
momento da concepção, a resposta que obtemos, na maioria dos casos, é de que foram
desejadas, no caso de concordarem com alguma rejeição, a atribuírem ao outro
conjugue.
Dificilmente os pais recordam e avalia conscientemente a importância dos fatos
relacionados com a gravidez e o parto, porem em seu inconsciente tudo esta gravado.
Convêm perguntas que abrem muitos caminhos à memória.

Quando tivermos suficiente informação sobre o parto, perguntamos se a latência foi


materna. É importância perguntar sobre o ritmo de alimentação, não só a frequência
entre as mamadas, mas também quanto tempo succionava em cada seio.

A forma como se estabelece a relação com o filho nos proporcionar um dado


importante, não só da historia do paciente, mas também da relação com a mãe e a ideia
sobre a maternidade. É importante para o desenvolvimento posterior da criança a forma
como se estabeleceu a primeira relação pós-natal.

Uma mãe sadia não necessita de conselhos para cuidar de seu filho e a compreensão de
suas necessidades a leva instintivamente a dar-lhe carinho, contato e alimento. Detalhes
da relação com o filho que com frequência não conseguimos da mãe vão surgindo
pouco a pouco do material da criança quando a analisamos.

A criança, ao reviver sua lactancia no tratamento, nos mostra em seu jogos detalhes
significativos. A passagem do peito a outras fontes de gratificação oral exige um
trabalho de elaboração psicológica, a forma como a criança aceita esta perda nos
mostrará como em sua vida futura, enfrentara as perdas sucessivas que lhe exigira à
adaptação a realidade.

É possível que os pais não se lembrem da idade na qual a criança pronunciou a primeira
palavra ou o momento em que iniciaram os transtornos. Durante esse período da vida, a
figura do pai ganha grande importância e sua ausência real ou psicológica pode frear o
desenvolvimento da criança, ainda que a mãe a compreenda bem.

O caminhar da criança tem o significado entre muitos outros da separação da mãe,


desde já no nascimento. Na segunda metade do primeiro ano intensificam se na criança
tendências expulsivas, que se manifestam no seu corpo e em sua mente. A projeção e a
expulsão são forma de aliviar as tensões e se estes mecanismos se travam, as cargas
emocionais se acumulam, produzindo sintomas.

Quando interrogamos sobre enfermidades, operações ou traumas, consigamos na


história não só a gravidade, senão também a reação emocional dos pais. É frequente o
esquecimento das datas e das circunstancias da vida familiar que acompanham estes
acontecimentos.
Freud também causou assombro e rejeição quando descobriu que a criança ao
mamar não só se alimenta como também goza. Afirmar hoje que uma criança de um ano
se masturba e tem ereções e que a menina conhece sua vagina e que ambos têm desejos
de união genital opõe a tudo que até hoje se aceitava sobre vida de um bebe e também
desperta rechaço.

Quando se pergunta para as crianças se elas realizam suas atividades sexuais


abertamente e quais são, elas costumam responder que descobriram ou que espiaram;
menos frequente, as relatam como fatores normais da vida da criança.

Assim há pais que não obtém muito conhecimento do que liberdade sexual, e acabam
lavando seus filhos as atividades, ou comentam abertamente com graça ou provas de
precocidade.

Há também pais que acham que se exibirem-se nus na frente dos filhos, favorecer
atividades como banho junto com eles ou irmãos vai favorecer no desenvolvimento.
Sendo assim estes tipos de pais acabam por antecipar o esclarecimento sexual, e acaba
por não esperar o momento que a criança o requer saber. O desejo de união genital do
bebê ao satisfazer - só em forma precária com a masturbação, é um motor que
impulsiona e põe em movimento a atividade de jogo. Para M. Klein pode-se descobrir
que através de toda atividade lúdica há fantasias de masturbação.

Os pais ficam receosos quando lhes perguntamos como as crianças brincam, ou quais
são os jogos preferidos. Portanto a descrição detalhada das atividades que realiza a
criança nos serve para ter uma visão de sua neurose ou de sua normalidade.

Conforme Freud o jogo é a repetição de situações traumáticas com fim de elaborá-las e


que ao fazer ativamente o que sofreu passivamente, a criança consegue adaptar-se a
realidade, por isso, avaliamos como índice grave de neurose a inibição para jogar.
Assim uma criança que não joga não elabora situações difíceis da vida diária e as
canaliza patologicamente em forma de sintomas ou inibições.

Conforme as condições atuais de vida favorece o costume de que as crianças desde


muito cedo devera ir para o jardim de infância. Assim em casos em que o ambiente da
casa for muito pequeno, ou a mãe trabalha fora, podendo ser uma medida favorável para
o desenvolvimento da criança, mas não quando se pode desejar permanecer na sua casa,
pois as crianças sente-se que as enviam para o jardim de infância para se livrar delas.
É muito frequente que a entrada do jardim de infância coincida com o nascimento de
irmão, neste caso, longe de favorecer a elaboração deste acontecimento constitui um
novo elemento de perturbação; de fato a criança nesta circunstância vive mais
penosamente o fato que lhe tiraram o lugar que ocupava no seu lar.

Assim observou que as crianças que vão muito cedo ao jardim de infância iniciam a
escolaridade em piores condições do que as crianças que vão aos quatro ou cinco anos.

Assim a permanência em casa, com a participação diária de atividade e dispor de um


espaço adequado para brincar livremente são condições que favorecem o
desenvolvimento da criança ate os quatro ou cinco anos. Com atividades na praça, na
casa de amigos, satisfazem suficientemente a necessidade de contato com outras
crianças.

A entrada na escola significa para elas não só desprender-se da mãe, como enfrentar a
aprendizagem que no começo lhes despertam ansiedade sendo similares as que
observam nos adultos com angustias de exame. No decorrer de análise de crianças
comprovou que as inibições de aprendizagem escolar e as dificuldades para ir à escola
têm raízes nos primeiros anos e que uma criança que não brincou tampouco aprende
bem.

Assim é importante interrogar sobre a idade que a criança ingressou na escola e a


facilidade ou dificuldade na aprendizagem da leitura e da escrita, assim como se lhe
causa prazer, rejeição ou se mostra ansiedade ou preocupação exagerada para cumprir
com seus deveres.

C) O DIA DE VIDA.

A reconstrução de um dia de vida da criança devera ser feita mediante as perguntas


concretas, que nos orientam sobre experiências básicas de dependência e independência,
liberdade ou coação externa, instabilidade das normas educativas, do dar e do receber.

Assim para saber se as exigências são adequadas a idade da criança ou não, se há


precocidade ou atraso no desenvolvimento, as formas de castigo, e premio, e quais são
as capacidades e fontes de gozo e suas reações frente as proibições.

O que nos permitira uma visão inesperadamente completa da vida familiar e o que
registramos será uma valiosa ajuda ao ser comparado com a história da criança. È
frequente que na história não nos tenha dito que, por exemplo, que existia um transtorno
no sono e no relato do dia de vida se faça evidente a descrição e um complicado
cerimonial noturno que os pais não avaliaram como tal.

Quando os interrogamos sobre o dia de vida, deve-se perguntar quem o desperta a


criança e a que horas. Ao se tratar de crianças maiores de cinco anos, é importante saber
se vestem sozinhos e desde quando, ou quem os veste e o por que.

É útil conhecer este momento para saber da dependência ou independência adquirida de


acordo com a idade cronológica, e qual é a atitude dos pais frente à precocidade ou ao
atraso na sua aprendizagem.

D) RELAÇÕES FAMILIARES.

Ao chegar ao final da entrevista, costumam sentirem-se já pouco dispostos a fazer


confidencias sobre si mesmo, e de troca, inclinados e dar-nos uma ideia de sua relação
afetiva com criança e do ela significa para eles.

Assim compreende-se que muito pouco poderemos saber sobre as verdadeiras relações
entre eles e nos limitarmos por isso a conseguir a idade, a localização dentro da
constelação familiar, saber se os pais vivem juntos ou não, profissão ou trabalho que
realizam horas que estão fora de casa, condições gerais de vida, sociabilidades deles e
seus filhos. O terapeuta tem que e esforça o máximo para conhecer os sintomas,
desenvolvimento, melhora e agravamento.

REFERENCIAS

ABERASTURY, A. Psicanálise da criança. “Cap. 5. A Entrevista Inicial com os Pais,


p. 81 a 96”. Porto Alegre: Artes Médicas, 1982.

Você também pode gostar