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ESCUTA E APRENDIZADO: PSICANÁLISE INFANTIL NA PRÁTICA

Kelly Tainara Silva Veloso

Nos primeiros anos de vida vivenciamos experiências que nos marcam para sempre.
Por essa perspectiva, a infância precisa de especial atenção. Assim, Freud e diversos
outros autores abriram caminhos para a prática psicanalítica infantil.

As crianças chegam para análise devido a demanda de um outro, na maioria das


vezes pais, responsáveis legais ou indicação da escola. Logo, o analista deve
propiciar que a criança construa sua própria demanda e que a escuta seja de uma
forma múltipla e diversa.

Nesse contexto, é necessário que o psicanalista de criança não tenha somente


conhecimento da técnica e da teoria, mas, sobretudo, possua a disposição para
brincar e habilidade para compreender o mundo simbólico infantil, que é de
fundamental importância para que a criança alcance sua cura.

Principais autores da Clínica Psicanalítica de Crianças

Importantes autores contribuíram para a Psicanálise com crianças, dentre eles


destacam-se: Sigmund Freud, Hermine Von Hug-Hellmuth, Sophie Morgenstern,
Eugénie Sokonicka, Anna Freud, Melaine Klein, Sabrina Spilrein, Donald Woods
Winnicott, Françoise Dolto e Arminda Aberastury.

Sigmund Freud (1856-1939) foi quem construiu o primeiro alicerce para a psicanálise
com crianças, em 1909, com a análise de uma fobia de um menino de 5 anos – O
pequeno Hans. A análise do pequeno Hans ocorreu por mediação de seu pai que
observava e registrava os fatos, e posteriormente seguia as instruções de Freud.
Os primeiros relatórios a respeito de Hans datam de um período em que ele
estava para completar três anos de idade. Naquela época, por intermédio de
várias observações e perguntas, ele demostrava um interesse
particularmente vivo por aquela parte do seu corpo que ele costumava
chamar se seu “pipi” (...) Essas primeiras observações já começam a
despertar a expectativa de que muita coisa, se não a maior parte, de tudo que
o pequeno Hans nos revela, terminará por tornar-se típica do
desenvolvimento sexual das crianças em geral (Freud, 1909, p.16-17).

Freud confirmava através do caso do pequeno Hans seus descobrimentos sobre a


sexualidade infantil. Sendo assim, permitiu alentar a esperança de aplicar o método
analítico aos transtornos e enfermidades de crianças de pouca idade, como afirma
Aberastury (1982).

Hermine Von Hug-Hellmuth (1871-1924) era discipula de Freud e foi a primeira


psicanalista de criança. Para Camarotti (2010), Hug-Hellmuth discordava da ideia da
confluência pai-analista, pois acreditava que a criança não revelava seus desejos e
pensamentos íntimos aos pais e que o analista de criança deveria ser terapeuta e
educador que cura. Ressaltava ainda que não precisava apontar os impulsos
inconscientes, bastando que esses se expressassem em atos simbólicos, sem
necessidade de passar pela linguagem falada.

Apesar de sua grande contribuição para o estudo da análise com crianças, Hug-
Hellmuth morre muito jovem e de forma trágica, assassinada pelo seu sobrinho em
1924 a quem dedicou concepções da psicanálise e pedagogia.

Sophie Morgenstern (1875-1940) era conhecida na França como a pioneira na


psicanálise infantil, estudou os contos, sonhos, sonhos diurnos, jogos e desenhos
infantis, buscando compreensão do imaginário simbólico infantil. O seu método de
análise mais importante foi utilizado na clínica de um menino de dez anos que padecia
de mutismo total e uma ansiedade aguda a qual foi demonstrada nos desenhos
solicitados pela psicanalista. De acordo com Aberastury (1982), a criança analisada
por Morgenstern representava seus sintomas desenhando objetos, animais e pessoas
enormes, andando sempre em direção a ele para atacá-lo.

Os temas repetiam-se de modo obsessivo, especialmente certos desenhos


como do homem-lobo, de animais de língua de fora, de uma língua com
cadeado, etc. Como o lobo simbolizava o pai e suas angústias na relação
com ele. Por um deslocamento de abaixo-acima, seus genitais estavam
representados pelas línguas. Suas angústias de castração haviam-se
intensificado por situações muito traumáticas, e o sintoma, expressão dessa
angústia, desapareceu ao ser interpretado (ABERASTURY, 1982, p.35).
O método de desenhos utilizado por Sophie Morgenstern contribui de forma relevante
para a análise infantil, e até hoje é utilizado por muitos psicanalistas durante os
tratamentos de crianças.

Eugénie Sokonicka (1884-1934) foi membro fundadora da Sociedade Psicanalítica de


Paris. Além disso, foi considerada uma pioneira da psicanálise de crianças. Segundo
Blinder, knobel e Siquer (2011), Freud impulsiona Sokonicka no campo de análise de
crianças, e em 1920, publica um dos seus primeiros trabalhos que foi Análise de um
caso de Neurose Obsessiva Infantil, tendo repercussões de sua técnica sobre a clínica
de crianças.

Anna Freud (1895-1982) filha de Sigmund Freud evidenciou seus estudos no


tratamento de crianças. Anna se formou em pedagogia e se tornou professora
primária, profissão que exerceu de 1914 a 1920. Em 1922, Anna Freud publicou seu
primeiro trabalho com o título de Fantasias e Sonos Diurnos de uma Criança
Excessivamente Dependente, em 1925, cria o “Seminário de Crianças” que aconteceu
no apartamento de seu pai, já em 1927, publica sua principal obra: O Tratamento
Psicanalítico de Crianças, como relatam Blinder, knobel e Siquer (2011).

Anna Freud recebeu orientações de Hermine Von Hug-Hellmuth, e aconselhava aos


analistas de crianças que fizessem um papel ativamente pedagógico, em que deveria
analisar e educar. Acreditava ainda que a criança não tinha consciência da sua doença
e que necessitava de ter noção de seu sofrimento e da necessidade de se livrar da
sua enfermidade. Sendo assim, na tentativa de conquistar a criança, trabalhava com
a transferência positiva, a fim de tentar convencê-la a criar um vínculo forte para
garantir a continuidade do tratamento, conforme afirma Costa (2010).

Para Anna Freud a criança não conseguia associar livremente como o adulto, como
acrescenta Aberastury (1982).

A maior dificuldade na análise de crianças continua sendo para ela o fato de


não haver associação livre. Apesar disso, diz que “...os sonhos e os sonhos
diurnos das crianças, juntamente com a fantasia manifestada no jogo,
desenhos, etc., revelam os impulsos do id sem disfarces e de uma maneira
mais acessível que nos adultos.... Aceita, por outro lado, que o conhecimento
do ego infantil é sumamente escasso (ABERASTURY, 1982, p.65).

Segundo Anna Freud, a criança não conseguia estabelecer uma neurose de


transferência devido a ligação com seus pais. Nesse sentido, Costa (2010, p. 25)
acrescenta que “se não houver uma colaboração dos pais com o analista, melhor será
afastá-la dos pais temporariamente e colocá-la numa instituição onde possa ser
analisada”. A autora acrescenta ainda que o fato da criança estar ligada aos pais é
um impedimento para o deslocamento de suas relações afetivas para o analista.

Diante de tal contexto, conclui-se que Anna acreditava que o analista deveria ter
conhecimentos pedagógicos e ocupar o lugar do ideal do ego infantil, e que somente
com a transferência positiva poderia realizar um trabalho eficaz com as crianças.

Melaine Klein (1882-1960) se interessou pela psicanálise após ler A Interpretação dos
Sonhos de Freud, reconhecendo assim suas contribuições. A vida de Klein foi
marcada por muitas perdas e momentos difíceis, necessitando assim de tratamento
em decorrências de depressões. Ela teve três filhos e sendo todos analisados pela
psicanalista.

Em 1914, Klein iniciou uma análise com Sándor Ferenczi que a incentivou a dedicar
à psicanálise de criança. Em 1919, Klein se tornou membra da Sociedade
Psicanalítica de Budapeste onde apresentou o caso Fritz: “A novela familiar em seu
estado nascente”, que na verdade era Erick o seu filho de cinco anos. Em 1921, se
instalou em Berlim, e em 1924, continuou sua formação e análise com Karl Abraham
para quem relatou seus primeiros tratamentos com crianças pequenas, seu método e
a técnica psicanalítica do brincar, conforme descreve Nasio (1995).

Nesse sentindo, Costa (2010) relata que Klein criou a técnica de análise pela atividade
lúdica, o brincar.

Brincar — atividade natural das crianças — foi considerado por ela a


expressão simbólica da fantasia inconsciente. Ela afirmou que pelas
brincadeiras a criança traduz de modo simbólico suas fantasias, seus desejos
e suas experiências vividas. O elemento organizador essencial do
pensamento de Melanie Klein é a prevalência da fantasia e dos “objetos
internos” sobre as experiências desenvolvidas no contato com a realidade
externa (COSTA, 2010, p. 30).

A autora relata ainda que, para Klein, o brincar é capaz de substituir as associações
livres como dos adultos, e que Klein interpretava a transferência negativa sem o
habitual cultivo dos afetos positivos da criança.

Em 1926, Klein foi convidada para apresentar seu trabalho em Londres, onde recebeu
o apoio de Ernest Jones. Nesse período, realizou diversas contribuições teóricas,
como: “o descobrimento do Superego Arcaico, do Édipo precoce, a demonstração da
importância do símbolo do desenvolvimento do ego, a relação de objeto, o objeto bom
e o objeto mau, a inveja e a identificação projetiva”, e contribuições técnicas que
concentram na “análise da transferência, da transferência negativa e do manejo da
angústia na sessão da análise”, conforme citam Blinder, Knobel e Siquier (2011, p.
17):

Diante do exposto, Anna Freud e Melaine Klein tinham grandes controvérsias, Klein
focava em torno da vida de fantasia inconsciente da criança, resgatando o lugar infantil
no discurso analítico onde os pais não ocupam um lugar de precursor, e acreditava
que não é possível conciliar o tratamento analítico com o educativo, diferente do
posicionamento de Anna Freud.

Sabrina Spilrein (1885-1942) realiza sua primeira análise com Jung com quem teve
uma relação passional, o que pode também ter contribuído para ruptura de Freud e
Jung anos posteriores. Spilrein ingressa na Sociedade de Psicanálise de Viena em
1911, mas Freud intervém aconselhado a se afastar de Jung, abandona Viena e se
instala na Suíça.

Na Suíça, Spilrein inicia seu trabalho sobre linguagem infantil, afasia e os problemas
de simbolização. Nessa época o paciente em análise era Jean Piaget, podemos
perceber a influência de ideais psicanalíticas nos pensamentos piagetiano anos mais
tarde, como relatam Blinder, knobel e Siquier (2011). Em 1924, Spilrein regressa a
sua cidade natal, Rostov, e mesmo com a profissão de médica cuida de crianças
difíceis e adolescentes delinquentes utilizando as técnicas da psicanálise.

Donald Woods Winnicott (1896-1971) é considerado o pai fundador da psicanálise


com crianças. Por volta de 1935, tornou-se psicanalista membro da Sociedade
Britânica de Psicanálise, e em um período de aproximadamente cinco anos foi
supervisionado por Melaine Klein.

Devido as controvérsias entre os discípulos de Anna Freud e Melaine Klein, Winnicott


optou por seguir seu próprio caminho, elaborando seus principais conceitos teóricos
baseado em sua experiência clínica, apesar de ter recebido influência de Klein,
conforme registra Costa (2010).

As contribuições teóricas e clínicas de Winnicott são de fundamental importância, pois


destaca o meio ambiente e os cuidados maternos no desenvolvimento psíquico
infantil. A criança pequena tem uma dependência absoluta em relação ao meio e a
mãe, na medida que esses irão favorecer ou dificultar na saúde psíquica. Nesse
contexto, Winnicott utilizava alguns conceitos importantes, como:

(...) holding (apoio) e handling (manejo), a mãe suficientemente boa, o


processo da dependência para a independência, o verdadeiro e falso self, o
medo do desmoronamento, o uso do analista, o ódio na contratransferência,
a psique-soma e toda teoria sobre o brincar e o espaço transicional
(BLINDER, KNOBEL E SIQUIER, 2011, p. 21).

Os autores acrescentam ainda que elementos técnicos e práticos como a técnica do


brincar, do jogo do rabisco e entrevista breves entre mãe e filhos são introduzidos na
clínica com crianças. Winnicott tinha uma verdadeira paixão com crianças e fazia
inúmeras entrevistas para pais, professores, assistentes sociais e médicos.

Françoise Dolto (1908-1988) inicia seus estudos em medicina em 1932, após ter
estudado enfermagem. Ela desejava ser pediatra, mas Sophie Morgenstern foi uma
de suas incentivadoras na psicanálise infantil. Dolto era conhecida na França como
inovadora em psicanálise infantil. Em 1938, conhece Lacan e se tornam amigos, em
1939, se ingressa na Sociedade Psicanalítica de Paris, e em 1953, com Lacan e
outros, cria a Sociedade Francesa de Psicanálise e posteriormente se filia a Escola
Freudiana de Paris fundada por Lacan.

Dolto focou sua abordagem na escuta do inconsciente e nos traumas genealógicos.


A psicanalista atendia bebês e crianças muito pequenas e afirmava que não tinha
idade para iniciar uma análise. Acreditava que “criança é fruto de três desejos: o do
pai, o da mãe e o do próprio sujeito. A partir desta posição teórica, ela redefine o
sintoma da criança como sendo também o sintoma da estrutura familiar”, conforme
relata Costa (2010, p. 70).

Dolto realiza vária publicações, em 1971 O Caso Dominique, um garoto psicótico de


14 anos; em 1981 A Dificuldade de Viver e No Jogo do Desejo; em 1982 seus
seminários de análise com crianças e, em 1984 A Imagem Inconsciente do Corpo.

Diante do exposto, Blinder, knobel e Siquier (2011, p. 24) afirmam que ideia central
da teoria doltoniana “encontra vínculos entre as neuroses dos pais e de seus filhos,
que serão portadores de dívidas transgeracionais não paga”. Desse modo, a técnica
utilizada por Dolto era o desenho, modelagem e a fala.
Arminda Aberastury (1910-1972), pioneira da psicanálise de crianças na América
Latina, estudou magistério e foi a primeira tradutora para o espanhol da obra de
Melaine Klein. Aberastury era admiradora de Klein, mas junto com seus colaboradores
desenvolve suas próprias teorias sobre a psicanálise de crianças e a metapsicologia
infantil, conforme relatam Blinder, knobel e Siquer (2011, p. 25).

No ano de 1948, Aberastury inaugurou na Asociación Psicoanalítica Argentina (APA)


o primeiro curso de psicanálise infantil, no qual seus alunos eram supervisionados,
observavam as horas de jogo, e aprendiam sobre a técnica de entrevista com os pais.

Aberastury postula a existência de uma fase genital prévia à fase anal durante o
primeiro ano de vida. Acredita que muitos dos sintomas frequentes do lactente na
segunda metade do primeiro ano, conhecidos durante anos pelo rótulo transtornos de
dentição, e as zoofobias, frequentes nesse período, encontram esclarecimento na
existência da fase genital prévia.

O aparecimento dos dentes na fase oral sádica, instrumento que lhe


possibilita a realização das fantasias de destruição que dominam essa fase,
determina o abandono do vínculo oral e a necessidade de refazê-lo através
de outra zona do corpo. Nesse período da vida, com o descobrimento da
vagina na menina e a necessidade de penetração do menino inicia a etapa
genital que descrevemos, quando a união pênis-vagina substituiria a da boca
com o peito (ABERASTURY, 1982, p.75).

Diante do contexto, Aberastury baseia-se suas contribuições em torno da criança e


seu brincar, destaca a importância da primeira hora do jogo e a forma de conduzir as
entrevistas com os pais. Relata ainda que toda criança tem consciência de sua
enfermidade e o desejo de curar-se.

Esses importantes autores e colaboradores para a psicanálise de crianças tinham


vertentes e concepções diferentes, mas acreditaram em um método para escutá-las
e ajudá-las em seus transtornos e enfermidades.

Entrevista preliminar com os pais

A realização de uma entrevista com os pais é o primeiro passo para se iniciar uma
análise. Nesta entrevista, a criança não deverá estar presente, mas poderá ser
informada desse contato com o analista. Segundo Aberastury (1982), essa entrevista
não deve ser um interrogatório, pois os pais não podem se sentir julgados. A maioria
dos pais chegam no consultório angustiados e se sentindo culpados pela enfermidade
do filho. Sendo assim, muitos esquecem parte do que sabem, daí a importância de
perguntas direcionadas e não metódicas, para que não se sintam pressionados.

Para a psicanalista Françoise Dolto, as entrevistas preliminares tinham como


proposito estudar a dinâmica familiar, verificar de onde vem a demanda, quem
efetivamente está sofrendo e o lugar da criança no narcisismo dos pais, como relata
Costa (2010, p.72). Nesse sentido, Aberastury (1982) acrescenta que na entrevista
inicial é primordial perguntar sobre o motivo da consulta, a história da criança, o dia
de vida e sobre as relações familiares. Diante disso, segue um roteiro que pode
colaborar no primeiro encontro com os pais:

Dados de identificação da criança – nome, data de nascimento, escolaridade,


endereço, número de irmãos, posição no meio familiar, filho biológico ou adotivo,
religião e se é praticante ou não, uso de medicamentos, diagnóstico de alergia e outras
doenças.

Dados de identificação dos pais – nome, idade, profissão, grau de instrução, estado
civil, religião, uso de medicamentos e saúde.

Motivo da consulta - a queixa principal, início e características dos sintomas, fatores


desencadeantes e motivadores de piora e/ou melhora.

História da criança - gravidez, como foi o parto e pós-parto, primeira amamentação,


reflexo de sucção, ambiente de amamentação diário, atitude da mãe e criança na
amamentação, se teve cólicas, passagem da amamentação do peito para mamadeira,
momento do desmame, se houve troca de cuidador, introdução da papinha, processo
da dentição, se chupou bico, como era o sono, quando pronunciou a primeira palavra
e como foi a reação dos pais, quando começou a engatinhar e caminhar, processo de
desfralde, reação dos pais quando a criança ficava enferma, se teve outra gravidez
no período e se houve mudança de comportamento da criança, que idade foi para o
jardim de infância, se teve dificuldade de interagir com outras crianças e como foi o
processo de desenvolvimento e aprendizagem.
O dia de vida – rotina diária, se veste sozinho ou é auxiliado, relação com a
alimentação, funcionamento do intestino, se utiliza o banheiro sozinho ou precisa de
auxilio, com quem fica no dia-a-dia, qual hobby, brincadeiras e jogos favoritos,
interação com os brinquedos e com quem brinca, meios de convívio social, se tem
animal de estimação, tipo de filme/desenho e plataformas que assiste, se acessa à
internet, como apresenta o humor no dia-a-dia (nervoso ou tranquilo), hábitos antes
de dormir e como é a noite de sono.
Em relação ao comportamento: se reconhece a autoridade dos pais, segue regras e
combinados, comportamento da escola ou em outros lugares de convívio, vínculos
com outras crianças, relação com objetos pessoais e dos outros, atividades que geram
prazer e tem algum medo/fobia de algo.

Relações familiares – relação com os avós e parentes, uso tecnologia entre os


membros familiares, se presenciou atritos e brigas entre os familiares, como é a
participação no dia-a-dia familiar, sabe lidar com as frustações e proibições, forma de
interversão disciplinar dos pais, como são os tempos livres (domingo/feriado),
descrever o dia de aniversário, alguma perda familiar ou separação após o
nascimento, acontecimento traumático, como são as tomadas de decisões no núcleo
familiar e o que a criança significa para os pais.

Aberastury (1982) destaca que os dados relatados pelos pais podem não ser exatos,
mas o acolhimento e o vínculo inicial são fundamentais para que a análise possa
ocorrer. Finalizada essa primeira entrevista, caso os pais e o analista decidam pelo
acompanhamento, comunica-se o dia, hora e duração do primeiro encontro com a
criança.

Primeira hora do jogo com a criança

A primeira hora do jogo é um período determinante, pois a criança mesmo com pouca
idade, apresenta na primeira sessão compreensão de sua enfermidade e desejo de
curar-se. Na primeira hora, a criança comunica sua fantasia inconsciente e confere ao
terapeuta os atributos necessários para curá-lo, conforme relata Aberastury (1982).
Dessa forma, a autora acrescenta que é essencial que desde o primeiro momento
adotemos o papel de terapeuta, assim a criança se posiciona como paciente e irá
fazer consciente o que demostrou como fantasia inconsciente.

Para auxiliar o terapeuta no diagnóstico, a utilização da caixa da primeira hora do jogo


é de grande relevância. Nessa caixa poderá conter brinquedos e objetos, como:
massa de modelar, lápis, cola, apontador, tesoura, papéis brancos e coloridos,
pratinhos, talheres, bonecos, carinhos, aviões, pinos mágicos, entre outros. A caixa
da primeira hora do jogo poderá ser única para todos os clientes, após aceitar a
criança como paciente faz-se necessário a montagem de uma caixa individual, na qual
somente o paciente e o terapeuta terão acesso.

Dessa forma, na caixa individual poderá conter materiais idênticos aos que foram
utilizados na primeira hora do jogo, itens parecidos com que a criança costuma brincar
em casa, entre outros que podem ser adequados a sua idade. Essa caixa deverá ficar
no consultório e evitar que o paciente leve algum objeto para casa. É importante
também, não dispor do material de uma criança para outra, ambas criam afetividade
pelos seus itens e podem se sentir enganadas.

As crianças no período de latência - declínio do complexo de Édipo entre 5 e 6 anos


e o início da puberdade - não brincam como as crianças menores e na maior parte
das vezes não fornecem associações verbais como os adultos, então os recursos a
serem utilizados devem ser diferenciados. O desenho, os testes e jogos são técnicas
que contribuem na condução do diagnóstico.
REFERÊNCIAS

ABERASTURY, A. Psicanálise da criança – teoria e técnica. Tradução Ana Lúcia


Leite de Campos. 8.ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1982.

BLINDER, C., KNOBEL, J., & SIQUIER, M. L. (2011). Clínica psicanalítica com
crianças (L. Scaboro, S. Wassal, & V. Monegato, trads.). Aparecida, SP: Ideias e
Letras.

CAMAROTTI, Maria do Carmo. O nascimento da psicanálise de criança - uma


história para contar. Reverso vol.32 no.60 Belo Horizonte set. 2010. Disponível em:
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-7395201000030
0007. Acesso em: 06 jan. de 2021.

COSTA, Teresinha. Psicanálise com crianças. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.

FREUD, S. Análise de uma fobia em um menino de cinco anos. In Edição


Standard Brasileira. Rio de Janeiro: Imago, v.X, 1996, p.15-158. (Trabalho original
publicado em 1909).

LEITÃO, Iagor Brum e CACCIARI, Marcella Bastos. A demanda clínica da criança:


uma psicanálise possível. Estilos da Clínica. vol.22 no.1 São Paulo abr. 2017.
Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-
71282017000100004. Acesso em: 06 jan. 2021.

NASIO, J. D. Introdução às obras de Freud, Ferenczi, Groddeck, Klein, Winnicott,


Dolto, Lacan. Tradução, Vera Ribeiro; revisão, Marcos Comaru. – Rio de Janeiro:
Zahar, 1995

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