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Harmonia Funcional

A Harmonia Funcional não pensa a harmonia a partir da escala e sim dos graus de
proximidade e afastamento da tônica, a partir da premissa de que os acordes
representam funções em virtude do contexto harmônico do qual participam. Além
disto, por ser uma teoria mais recente, a harmonia funcional não parte do pressuposto
de que a tríade é o elemento fundamental da linguagem harmônica e incorpora em
sua cifragem notas que normalmente seriam consideradas como notas estranhas à
harmonia. Na harmonia funcional existem apenas acordes perfeitos. A ocorrência de
acordes diminutos ou aumentados indica que estes acordes estão representando, de
maneira alterada, acordes maiores ou menores. Cabe ao analista descobrir o que se
encontra por detrás destes momentos.

Primeira Lei Tonal: Funções principais

De acordo com Hugo Riemann, existem três funções: tônica, subdominante e


dominante, que representam, respectivamente, repouso, afastamento e tensão. Todos
os acordes da estrutura harmônica se relacionam direta ou indiretamente com uma
destas funções (embora existam acordes ambíguos em alguns casos mais raros).
Em uma tonalidade qualquer, existem acordes que representam as três funções
principais idealmente. Como se trata de um conceito relacional, a tônica será um
acorde qualquer escolhido pelo compositor para representar a função de tônica
(obviamente ele deverá criar o contexto adequado para tal como discutido em
Schoenberg (p. 17). As duas funções restantes são, agora, pré-determinadas pela
tônica. A dominante será o acorde que se situa uma quinta justa acima da tônica,
enquanto a subdominante, será o acorde que se situa quinta abaixo da tônica:

Fig. 1: funções principais e relações de quinta justa


Sabemos agora que a dominante representa tensão e que esta tensão se situa uma
quinta justa acima da tônica. O mesmo pensamento poderia ser ampliado para
imaginarmos que, assim como a dominante é uma tensão que “quer” resolver quinta
abaixo, a própria tônica teria a propensão de querer resolver no acorde que está
quinta abaixo dela, ou seja, na subdominante. Desta maneira, compreende-se por que
a função de subdominante representa um afastamento harmônico, já que a ideia de a
tônica resolver em outro acorde oferece um perigo à ideia supremacia da tônica sobre
os demais acordes.
Em outras palavras, trata-se de um paradoxo: como o acorde de tônica poderia
resolver para fora dele mesmo quando ele representa o ideal máximo de conclusão, de
relaxamento? A realidade é algo um pouco mais dialética: se, por um lado, qualquer
acorde que se siga à tônica põe em risco sua prevalência sobre os demais acordes, por
outro, a sequência típica da cadência – T-S-D-T – indica também a trajetória típica do
discurso tonal em que “a tônica sempre vence no final”. Ou seja, no sistema tonal, a
dificuldade imposta à tônica em função do aparecimento de outros acordes serve
unicamente para reforçar seu caráter absoluto, já que, mesmo em meio a estes, é ela
quem triunfa no final.

Cifragem das funções principais em modo maior e menor

Em modo maior as funções principais de tônica, subdominante e dominante são


acordes maiores. Eles são cifrados, respectivamente, com as letras maiúsculas T, S e D:

Fig. 2: cifragem das funções principais

Em modo menor, a situação é um pouco diferente. Embora os acordes simétricos em


relação à tônica menor sejam eles também acordes menores, a dominante não pode
ser representada por um acorde menor, já que este não seria capaz de exprimir a
função de tensão harmônica. Assim, as funções de tônica e de subdominante, acordes
menores, são representados por letras minúsculas, enquanto a dominante, que
continua sendo um acorde maior, é representada por uma letra maiúscula:

Fig. 3: funções principais em modo menor

Segunda Lei Tonal: acordes relativos e anti-relativos.

A segunda lei tonal diz que “os acordes têm o significado harmônico daquela função da
qual são vizinhos de terça”. Em outras palavras, os três acordes que representam as
funções principais no tonalismo possuem acordes que se relacionam com eles de
forma secundária, com potencial de substituí-los no planejamento harmônico. Seriam
eles, os relativos e os anti-relativos. Tanto no modo maior quanto no menor, os
acordes relativos e anti-relativos são aqueles vizinhos de terça das funções principais
que possuem duas notas em comum com elas. Por exemplo, se o acorde de Dó Maior
for tomado como referência, seu relativo e anti-relativo serão os acordes de lá menor
e de mi menor, que são seus vizinhos de terça que compartilham duas notas em
comum com ele:

Fig. 4: relativos e anti-relativos (duas notas em comum com a função principal)

Por outro lado, os acordes de Lá maior ou de Mib maior não serão relativos dele, já
que possuem apenas uma nota em comum com o acorde de referência:
Fig. 5: acordes situados a uma terça de distância, mas que não são relativos e anti-relativos das
funções principais

Cifragem das funções relativas em modo maior e menor

Em modo maior, as funções relativas se situam uma terça abaixo da função principal e
as anti-relativas uma terça acima. A imagem abaixo exemplifica estas relações em
modo maior (Dó):

Fig. 6: campo harmônico maior utilizando harmonia funcional

Note que as funções principais utilizam uma letra maiúscula para representar um
acorde maior, como discutido acima. Já as funções secundárias, todas acordes
menores, possuem duas letras sendo a primeira maiúscula, a que se refere à função
principal, e a outra minúscula, que representa o fato de os acordes em questão serem
acordes menores. O r minúsculo é representativo da qualidade do acorde (um acorde
menor) e o S maiúsculo da função à qual ele se refere (a subdominante maior). Sr se lê,
portanto, relativa menor da subdominante maior. No dia a dia é comum nos
referirmos a este acorde como Subdominante relativa ou Sr.
Em modo menor ocorre o contrário do modo maior: as funções relativas estão acima
da função principal e as funções anti-relativas uma terça abaixo. Carece notar que, na
figura abaixo, as funções relativas e anti-relativas da dominante levam em conta o
acorde menor, ainda que ele não exista na teoria de Riemann:
Fig. 7: campo harmônico menor utilizando harmonia funcional

No modo menor vemos que a cifra se inverte. Por exemplo, sA significa anti-relativa
maior da subdominante menor. O único contrassenso aqui é que, a rigor, não existe
“dominante menor” e, deste modo, é difícil justificar as funções dA e dR como relativas
da “dominante menor”.

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