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ISTO NÃO É UMA REVISTA

40 anos da revista Artéria


Amir Brito Cadôr Arnaldo Antunes
Diniz Gonçalves Junior Fernando Aguiar
Gastão Debreix Gil Jorge
Kenneth David Jackson L. C. Vinholes
Lucio Agra Luiz Roberto Guedes
Omar Khouri Sonia Fontanezi Tadeu Jungle
Villari Herrmann Walter Silveira Zhô Bertholini
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Geraldo Alckmin | Governador
Marcelo Mattos Araujo | Secretário de Estado da Cultura
Renata Vieira da Motta | Coordenadora da Unidade de Preservação
do Patrimônio Museológico

POIESIS
INSTITUTO DE APOIO À CULTURA, À LÍNGUA E À LITERATURA
Clovis Carvalho | Diretor Executivo
Plinio Corrêa | Diretor Administrativo
Maria Izabel Casanovas | Assessora da Direção Executiva
Ivanei da Silva | Museólogo
Angela Kina, Carlos Santana | Design

CASA DAS ROSAS


ESPAÇO HAROLDO DE CAMPOS DE POESIA E LITERATURA
Frederico Barbosa | Diretor
Carmem Beatriz de Paula Henrique | Coordenadora
Márcia Kina | Supervisora Administrativa
Fabiano da Anunciação | Assistente Administrativo
Caio Nunes | Aprendiz Administrativo
Neide Silva | Copeira
Reynaldo Damazio | Coordenador do CAE
ISTO NÃO É UMA REVISTA
Maria José Coelho, Dayane Teixeira | CAE
40 anos da revista Artéria
Ivanei da Silva | Museólogo
Daniel Moreira | Supervisor Cultural
Thaís Feitosa, Mariana Manfredini | Cultural
Julio Mendonça | Coordenador do CRHC
Rahile Escaleira | Bibliotecária
Leonice Alves | Assistente de Biblioteca
Irana Magalhães | Assistente de Organização e Pesquisa
Anelise Csapo | Supervisora Educativa
Rafael Gatuzzo, Mitchiko Nakamura | Educativo
Gonçalo Junior, Débora Nazari | Comunicação
Jackson Oliveira, Alan Zanatta, Valdecir Souza | Produção
Francisco Silva | Zeladoria
sumário
8
DOSSIÊ: ISTO NÃO É UMA REVISTA
(40 ANOS DA REVISTA ARTÉRIA)
8 • UMA PUBLICAÇÃO MUTANTE – Omar Khouri
16 • MÍNIMO DIVISOR COMUM: ARTÉRIA – Lucio Agra
20 • UMA REVISTA QUE É UMA EXPOSIÇÃO PORTÁTIL – Amir Brito Cadôr

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INVENÇÃO
Poemas
28 • Arnaldo Antunes
35 • Diniz Gonçalves Junior
37 • Fernando Aguiar
41 • Gastão Debreix
44 • Gil Jorge
CIRCULADÔ 47 • Lucio Agra
Revista de Estética e Literatura do Centro de Referência 50 • Luiz Roberto Guedes
Haroldo de Campos 53 • Omar Khouri
ISSN - 2446-6255 55 • Sonia Fontanezi
Diretor | Frederico Barbosa 59 • Tadeu Jungle
Editor | Julio Mendonça 61 • Villari Herrmann
Assistente | Irana Magalhães 65 • Walter Silveira
Design gráfico e diagramação | Angela Kina e Carlos Santana 70 • Zhô Bertholini
Revisão | Centro de Referência Haroldo de Campos

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Revista CIRCULADÔ – Ano IV – Nº 4 – março 2016 ARTIGOS/ENSAIOS
Risco Editorial 75 • ESCRITOS DE LISBOA: A PASSAGEM DE DÉCIO PIGNATARI POR
Edição anterior: Revista CIRCULADÔ. Ano III – Nº 3 – Agosto 2015 LISBOA, ANOS 1950 - Omar Khouri
São Paulo – Poiesis / Casa das Rosas 79 • PEDRO XISTO – 8 HAIKAIS – L. C. Vinholes

A revista CIRCULADÔ é publicada em frequência semestral.


A revista CIRCULADÔ aceita, para publicação, apenas artigos ainda inéditos em língua
portuguesa e inglesa.
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GALÁXIA HAROLDO
• H.O.N.Y. – HELIOTAPES – Kenneth David Jackson

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A extensão dos artigos pode variar de acordo com o tema abordado, sendo que a
Redação se reserva o direito de propor cortes ou sugerir ampliações. 96 SOBRE OS AUTORES
As notas devem ser reduzidas ao mínimo e colocadas no final do texto. Os autores
devem fornecer informações biobibliográficas, até 400 caracteres (com espaços).
“concentração
editorial
Em 1975, Omar Khouri e Paulo Miranda organizaram e publicaram o

monádica e caos
primeiro número da revista Artéria. De lá para cá, foram dez edições
em intervalos diversos, em formatos e suportes sempre imprevistos
e surpreendentes, apresentando uma produção poética experimental
que explora diferentes caminhos. É, sem dúvida, a mais radical e a mais
longeva publicação de poesia experimental (ou de invenção) do país.

proliferante”
Esta edição da Circuladô se associa às comemorações dos 40 anos
de Artéria, que tiveram início com uma exposição na Caixa Cultural,
no Rio de Janeiro, de outubro a dezembro de 2015. Nos artigos de
Omar Khouri, Amir Brito Cadôr e Lucio Agra essa publicação inclassi-
ficável é referida como “mutante”, “exposição portátil” e “incursão na
contracultura pela perspectiva da invenção”. Importante a observa-
ção de Agra de que essa revista não pode ser caracterizada apenas

Haroldo de Campos
pela ortogonalidade construtiva, própria da poesia concreta, porque
há outros elementos que desbordam esse limite. Acrescento, ainda,
que a poesia que ali encontramos não pode ser reduzida ao rótulo
de poesia visual; basta observar as diferentes incursões sonoras e
verbivocovisuais em algumas de suas edições.
Na seção Invenção, apresentamos uma pequena antologia de poe-
mas recentes de alguns dos colaboradores mais frequentes da revis-
ta, além de poemas de outros autores convidados. No espírito contra-
cultural e intermídia de Artéria, publicamos na seção Galáxia Haroldo
o texto de Kenneth David Jackson, baseado na gravação de um diálo-
go entre Haroldo de Campos e Hélio Oiticica ocorrido em Nova York,
no início dos anos 70. Esse texto foi adaptado por Rafael Vogt Maia
Rosa para uma videoinstalação que foi exibida na Casa das Rosas na
programação do Hora H, em agosto de 2015.

Julio Mendonça

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ARTÉRIA:
UMA PUBLICAÇÃO MUTANTE – 40 ANOS
Omar Khouri
DOSSIÊ:

ISTO NÃO
É UMA
Artéria nasceu num momento em veis. Raramente houve algum esboço de
que começam a proliferar publicações à censura sobre as revistas experimentais,
margem do sistema editorial brasileiro e provavelmente dado o seu alto repertório
em que se observa um grande fechamen- e aparência de artefato lúdico. Das mui-
to na sociedade, provocado pelos órgãos tas publicações que tiveram lugar a partir
repressores da ditadura militar dos quais da primeira metade dos anos 1970, e daí
fez parte a censura, exercida sobre as em diante, umas eram, de fato, experi-

REVISTA
várias mídias, principalmente jornal, te- mentais, como Navilouca, Polem, Código,
levisão e rádio, e também teatro, cinema Artéria, Poesiaemgreve, Qorpo Estranho,
e letras de canções populares. Por outro Muda, Viva Há Poesia, Balalaica, Almana-
lado, a necessidade de expressão, tanto que 80, Zero à Esquerda, Kataloki, Atlas.
enquanto crítica sócio-político-econômi- Outras, apesar da importância que chega-
ca, como de criação artística, em geral, e ram a ter, no que diz respeito à veiculação,
poética, em particular, faziam-se urgen- mormente de teoria, não podem ser con-
tes. Algumas facilidades se configuraram sideradas propriamente ‘experimentais’,
em termos de indústria gráfica, tornando como Escrita, José e Através, mesmo que
viáveis projetos de publicações (impres- esta última tenha tido um projeto mais
sos, em geral), antes dificilmente realizá- arrojado, congregando poetas e teóricos

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do primeiro time. Artéria surge, portan- se alastrava. Paulo Leminski, num texto pondo de infraestrutura empresarial, só liberdade plena para tudo e não há o peri-
to, num momento difícil, em que o medo dos inícios dos anos 1980, ressaltou a im- poderia mesmo funcionar assim, às vezes go de ficar-se insolvente ou mesmo o de ir
rondava e acometia a todos, inclusive os portância das revistas, chamando-as, em acontecendo de uma publicação ser lança- à falência, já que, legalmente, não existe.
gráficos, que examinavam e, antecipando- seu conjunto, de ‘o maior poeta dos anos da dez anos após o início de sua impressão Por outro, os custos acabam por onerar os
-se, até censuravam aquilo que iriam im- 1970’. Dessas revistas, houve as que não que, por sinal, em muitas ocasiões, foi fei- poucos que se dispõem a reservar parte
primir. Artéria foi a primeira revista expe- passaram do nº 1, algumas chegaram ao 3 ta por seus editores que, além de poetas, de seu salário para os gastos da editora e,
rimental a aparecer em São Paulo, depois e raras atingiram o 10. Código-Bahia che- são técnicos em serigrafia, programadores o mais grave: o crônico problema da dis-
do fenômeno Invenção, que se extinguiu gou ao 12. Artéria está no 10 e planeja, visuais, etc (os poucos que se dispuse- tribuição do pouco material que é editado
em inícios de 1967, encerrando um ciclo pelo menos, o 11. ram e se dispõem a este tipo de traba- e que, fatalmente, fica, em parte, enca-
do Concretismo paulista que, no entanto, Artéria: “revista” ou “antologia”? lho artesanal). Se bem que, atualmente, lhado na casa de alguém, que se oferece
levou adiante o rigor e a radicalidade que o Esta é a primeira questão que surge quan- o trabalho artesanal tem sido deixado de para guardá-lo.
caracterizam enquanto movimento. Essas do examinada a referida publicação, em lado, cedendo espaço ao offset. Portanto, Artéria começou a ser pensada em
revistas que, em boa parte, trouxeram co- seu conjunto – do 1º número ao 10º - já mais que editora, a Nomuque é gráfica e, 1974, em Pirajuí, a partir do momento em
laborações dos concretistas históricos, são que não houve uma periodicidade regu- além da serigrafia, utilizou, ao longo de que sentimos a necessidade de uma pu-
herdeiras das conquistas do Concretismo, lar, tampouco uma forma fixa, um forma- seus mais de 40 anos de existência, ou- blicação coletiva (pode-se ter muito mais
porém, já trazem outras características, to regular, a conservação de seu nome ou tros processos artesanais de impressão e, prazer em veicular trabalhos em publica-
numa época em que manifestos e críti- uma única mídia utilizada. Embora mais também, processos industriais. A Nomu- ções coletivas, que em separado: poemas
ca militante – pertencentes à política das adequado fosse chamá-la “antologia”, Ar- que Edições (nomuque, edições, em sua reunidos em livro ou veiculados autono-
artes – já não mais faziam sentido e em téria e tantas outras publicações similares origem) nasceu em Pirajuí, interior de São mamente). Tendo, naquele ano, visto Po-
que o espírito algo anárquico de Oswald de que circularam a partir da primeira meta- Paulo, transferindo-se, a seguir, para a ca- lem e Código, percebi que o projeto se-
Andrade, que revivescera com reedições e de dos anos de 1970, sempre foram cha- pital, onde ainda opera. Há vantagens e ria viável. Daí, conversando com Paulo
estudos críticos de sua obra, com a ence- madas “revistas” por seus idealizadores e desvantagens nessa estrutura de funcio- Miranda (amigo, da pré-adolescência, até
nação de O rei da vela, com a Tropicália, colaboradores, porém, escapam da noção namento da editora: por um lado tem-se hoje) e travando contato com os irmãos
tradicional de revista. No caso específico
de Artéria, mais ainda, pois o ser mutante
foi uma de suas principais características:
configurou-se caderno com encarte, saco-
la, caixa, fita cassete, site na rede, de novo
caderno e até chegou a trocar de nome no
percurso, passando a ser Balalaica e Zero
à Esquerda. Então, teríamos 12 Artérias!
Numa tentativa de historiar a ‘re-
vista’ Artéria, teria de vinculá-la à Nomu-
que Edições, editora fundada por mim e
Paulo Miranda, há 41 anos (1974), e que
sempre funcionou à margem do sistema
editorial brasileiro. Nomuque = no muque
(no braço, na força muscular) existe à
medida que existam trabalhos que ela
venha a editar e graças aos recursos
provindos dos próprios editores-colabo-
radores (a editora nunca contou com pa-
trocínios de fora). Essa atividade editorial
ocorreu e ocorre esporadicamente, bem
Artéria 2, 1976-7.
Digitalização: Rafael Buosi e Pedro Loes / Espaço Líquido. porque, não visando a lucros e não dis- Zero à esquerda, 1981.

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Figueiredo, de cidade vizinha, Presiden- tas reuniões que fazíamos para conver- os de Artéria 1: a abertura do texto me- lhavam, faziam-no por prazer e/ou alguma
te Alves: Luiz Antônio, Carlos e Zéluiz, o sar principalmente sobre Arte em geral e talinguístico sobre Oswald de Andrade, em crença. A distribuição era feita mormente
projeto se tornou viável e o número 1, já Poesia em particular. (Costumo dizer que que foi feita uma releitura gráfica do Amor/ de mão-em-mão, parte era vendida em
com colaboração dos poetas concretos, quando nos reuníamos para conversar, humor oswaldiano e, em Artéria 6: colabo- lançamentos e uma pequena parte era
que prontamente se dispuseram a nos em Presidente Alves, Pirajuí ou São Pau- rações/soluções dadas por Zéluiz Valero aos deixada nas livrarias, em consignação.
enviar trabalhos inéditos, saiu em 1975, lo, essas cidades se tornavam as capitais poemas de Paulo Miranda e de Calos Valero. Talvez apenas a de nº 1 tenha conseguido
com lançamento em 15-07, em São Pau- culturais do mundo!) Sabíamos o que que- Nós mesmos financiávamos, do se pagar com as vendas, e a médio pra-
lo, capital. Além dos poetas, então jo- ríamos: uma publicação arrojada e que jeito que podíamos, as edições de Artéria e zo. Mas a nossa preocupação, desde mui-
vens, colaboraram desde o início Augusto desse uma ideia do quanto a Poesia expe- o dinheiro era sempre pouco, subtraído de to cedo, deixou de ser com relação a um
de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de rimentava no Brasil, muito embora Artéria nossos salários, quando não emprestado possível retorno que cobriria os gastos de
Campos e, a partir da de nº 2, os artistas congregasse criadores principalmente do de alguma tia ou irmão. Houve viabilidade uma próxima edição. As livrarias, no ge-
plásticos Regina Silveira e Julio Plaza, as- Estado de São Paulo. E a revista se propôs de alguns números, porque não se compu- ral, nenhuma importância davam a essas
sim como o poeta-obstetra Edgard Braga, mutante, sendo que, desde o início, apre- tou o capital trabalho – todos que traba- publicações, exceção feita à Duas Cidades
e os colaboradores se foram avolumando, sentou-se como um órgão da Poesia que que, em 1977, fez distribuição nacional de
até ultrapassar 60 na de nº 10 (2011). valorizava sobremaneira a visualidade. publicações independentes, Artéria, entre
Aos editores do início, foram-se juntando Naqueles primórdios, não se es- elas e, o que é mais importante, prestou
outros colaboradores contumazes: Walter tava interessado em firmar autorias de contas das vendas com uma correção pou-
Silveira, Tadeu Jungle, Sonia Fontanezi, projetos gráficos e afins, tanto, que alguns co vista. Em época mais recente, Artéria
Julio Mendonça. arranjos acabaram por ficar anônimos ou e outras publicações da Nomuque Edições
A pauta relativa a cada número mesmo diluídos em meio ao todo da pu- têm sido vendidas em feiras de publica-
era assistemática e ficava diluída nas mui- blicação, porém os mais flagrantes foram ções marginais/independentes.
Façamos, agora, um passeio
pelas várias edições de Artéria, incluindo
Balalaica e Zero à Esquerda, que foram
revistas que não levaram o nome “artéria”,
Artéria 5 (Fantasma), 1991.
Digitalização: Rafael Buosi e Pedro Loes / Espaço Líquido. revelando algumas curiosidades:
ARTÉRIA 1 - 1975. Tiragem: 1232
exemplares. O encarte reviravolta, de
Paulo Miranda teve uma 1ª tiragem em
plast plate, feita numa tipografia de Bau-
ru; considerada insatisfatória pelos edito-
res, foi utilizada para o lançamento, donde
alguns dos primeiros exemplares a porta-
rem. Logo em seguida, foi feita a tiragem
na gráfica Souza Reis-Bauru, em offset. O
Ai!cai, de Décio Pignatari, não foi assumi-
do por ele em sua obra completa. Tendo
saído um dos textos de Galáxias em Có-
digo 2, o mesmo que Haroldo de Campos
tinha cedido a nós, o poeta enviou outro
e a Nomuque publicou os dois. A página
de Waldeyr de Oliveira deveria estar em
negativo, mas, por engano, a seguinte,
com poema de Haroldo de Campos, é que
Artéria 6/ 31x31 / Quadradão, 1992.
La vie en, de Paulo Miranda, 1977. Publicado na revista Zero à esquerda, 1981. Digitalização: Rafael Buosi e Pedro Loes / Espaço Líquido. acabou ficando. O texto de Décio Pigna-

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tari ditado a Luiz Antônio de Figueiredo, ARTÉRIA 4 - 1980. Tiragem: ini- ARTÉRIA 9 - 2007. Tiragem: 1000
pelo autor, por telefone: o título deveria cialmente, 100 exemplares. Artéria 4, as- exemplares. O excesso de cuidado, por
ser Franquisténs II. sim como Balalaica, trouxe uma espécie parte dos editores, para evitar transparên-
ARTÉRIA 2 - 1976-7. Tiragem: de radionovela tétrico-erótica. cia tornou a revista – também caderno em
1000 exemplares. Composta de envelope ZERO À ESQUERDA – 1981. Tira- offset - difícil de ser manuseada.
com poemas soltos e um caderno - tudo gem: 500 exemplares. Foi quase toda im- ARTÉRIA 10 - 2011. Tiragem: 500
dentro de uma sacola plástica. Dados er- pressa no Aster (1978-1981), um centro exemplares. Quadricromias em offset:
ros gráficos de responsabilidade dos exe- de estudos de Arte, nas Perdizes-SP, nos capa com 8 faces. Contou com mais de 60
cutores da Souza Reis, os 1000 exempla- anos de 1980 e 81 (parte do 1º semes- colaboradores, tendo sido grande o núme-
res do caderno tiveram de ser refeitos e tre). Houve trabalhos em offset feitos fora. ro de colaboradoras.
a edição refugada foi destruída. A capa – O de Villari Herrmann (∞) foi o último a Artéria se insere na tradição de
frente do envelope – não encontrou gráfi- chegar: produzido pelo autor, não coube revistas que primaram por veicular uma
ca que imprimisse o trabalho Alechinsky- na caixa-invólucro, que já estava pronta produção poética mais experimental, mais
-Lichtenstein, de Julio Plaza, por achar – como a margem em branco excedia, foi construtivo-formalista (e aí não vai nenhu-
que poderia ter problema com a censura, aparada e, daí, tudo se ajustou. Penso ter ma intenção depreciativa), tais como, en-
pois havia, ali, uma conotação erótica ou sido esse o único trabalho inédito envia- tre nós, Noigandres, Invenção, Navilouca,
mesmo pornográfica, alegou-se. O refe- do a uma revista por Villari Herrmann. A Polem, Código, Qorpo Estranho, Kataloki,
rido trabalho acabou sendo publicado em montagem da revista se deu em casa de Zero À Esquerda, Agráfica, Atlas etc. Des-
Zero À Esquerda. Nisso, os envelopes, que Paulo Miranda. Recentemente, foi recupe- sas, algumas tiveram apenas um número.
conteriam os trabalhos soltos, viajaram rado vídeo da ultimação de Zero no Aster, Artéria prossegue e penso ser a única re-
várias vezes São Paulo-Pirajuí-Bauru. feito por Walter Silveira e Tadeu Jungle. vista atualmente no Brasil a se preocupar
ARTÉRIA 3 – 1977. Tiragem: tal- ARTÉRIA 5 / FANTASMA – 1991. com a questão da visualidade e da experi-
vez 100 exemplares. Uma simples caixa Tiragem: 160 exemplares. Foi pensada em mentação em Poesia.
de fósforos, com o logo ART3RIA. A ideia função de Artéria 6, sendo que o que não Com relação ao fim da 1ª revis-
de Carlos Valero surgiu frente a um cer- entrasse numa (as colaborações), entraria ta de nosso Modernismo, Klaxon, expli-
to impasse que se observou com relação na outra. E assim foi, com um longo perío- ca Mário da Silva Brito que uma revista
à continuidade ou não de Artéria, cujo do de gestação. desse tipo, depende da boa-vontade, do
nome seria retomado com Artéria 4, uma ARTÉRIA 6 / 31 X 31 / QUADRA- entusiasmo daqueles que a fazem e que
fita cassette C60, pela Nomuque Edições e DÃO – 1992. Tiragem: 180 exemplares. esvaindo-se esse afã, a publicação se
Estúdio OM, totalmente editada por Vale- Em verdade, começou a ser pensada em extingue, e que isto explicaria o fim da
ro, que reuniu colaboradores contumazes 1981 e foi lançada em 1993. Pode ser con- publicação dos anos 1920. Eu diria que
e novos. Um ano antes: Balalaica. Tinha siderada a revista de mais longa gestação esse entusiasmo, em certos casos termi-
havido um mal-estar com relação a Artéria na história da cultura brasileira. Assim nou muito rapidamente e que as pessoas
2 e as adaptações que teve de sofrer para como outras publicações artesanais da (poetas etc) foram cuidar de seus projetos
poder ser viabilizada. Nomuque, Artéria 6 tem sido muito procu- individuais. Artéria comemora os seus 40
BALALAICA – 1979. Tiragem: ig- rada nos últimos anos, principalmente por anos, planejando uma de nº 11 – os edito-
norada (cerca de 100 exemplares, talvez). colecionadores. res ainda se animam com esta possibilida-
Fita cassette C60, idealizada e executada ARTÉRIA 7 – 2004. Tiragem: 1000 de. Auguri!
por Carlos Valero, que montou um estú- exemplares. A gestação de ARTÉRIA 7 foi,
dio caseiro, tendo assistido a gravação da também, longa: quase 1 década. Caderno
maior parte dos trabalhos. Balalaica já é em offset.
uma espécie de Artéria sonora. De qualquer ARTÉRIA 8 – 2003. Disponível na
modo, mostrou que uma revista sonora (ou rede. Revista digital, que entrou no ar antes
seja, uma publicação coletiva sonora, fun- que fosse concluída e lançada Artéria 7. Teve
damentalmente de Poesia) era viável. como web-designer Fábio Oliveira Nunes.

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na proximidade daquela posição chamada, economia e desprezo ao desperdício era de
às vezes, com certa ingenuidade, de mi- rigueur. Completamente diferente do que
nimalista. se vê hoje no ambiente da poesia, cada vez
Com o passar dos anos, os valores de uma mais “literário” até mesmo no sentido da
sociedade acelerada e intensamente com- quantidade apresentada como qualidade.
petitiva deixariam no esquecimento gente Nenhum poeta aspirante soltava seu pri-
que, a exemplo de Marcel Duchamp ou Ro- meiro livro antes de muito meditar e mais
MÍNIMO DIVISOR COMUM: naldo Azeredo, produziam um trabalho a
cada muitos anos.
ainda burilar. Os radicais, como alguns da
Artéria, jamais fizeram “livros” mas sim

ARTÉRIA
Trata-se não tanto de ter muito a dizer do poemas-coisa que circularam em revistas
que dizer com muito pouco. Cada elabora- não convencionais ou pequenas edições.
ção de um volume de Artéria levava anos Na Artéria – como acontece em Código –
a fio. Os intervalos entre os números são não se evita o poema com palavras mas é
surpreendentes1. Seria possível dizer, du- nítido o influxo de uma poesia visual e sô-
rante cada época, que aquele seria o últi- nica (vide Balalaica). Há claro interesse por
mo, mas outro logo assomava. uma proposta de leiaute, uma atenção a
A relativa aceleração perceptível a partir cada detalhe do formato. São lendárias as
Lucio Agra do século XXI é, em grande parte, devida histórias de perdas de exemplares inteiros
à “editoração eletrônica”, às facilidades por conta de pequenos erros nos números
trazidas pelo mundo digital. Esse último serigrafados (como o Quadradão, Artéria
permanece como área de processo e não 6, relíquia que guardo cuidadosamente no
de resultados, exceto pelo singular número meu acervo e a cujo lançamento no MASP,
8, saído em ordem trocada (antes do 7), nos anos 90, compareci quando ainda nem
A expressão de um certo modo singular de sitado, são o exercício das artes marciais e lançado na web em nome da noção era amigo de Omar e Paulo).
criação em poesia que ao mesmo tempo na poesia. Com uma disciplina monástica, de infinito. Uma jóia única, autorada Artéria também revela, além de seus
que flerta com todas as dimensões do peri- Omar Khouri e Paulo forjaram, no tempo, admiravelmente por Fabio Fon, a Artéria editores, Omar Khouri e Paulo Miranda, toda
go, do heroísmo underground, dos sentidos edifícios raros. 8, com seu desenho de pérolas em círculo uma geração de sofisticados poetas não
reversores da contracultura, mesmo sendo Non multa sed multum. Ou, na frase pro- sobre um fundo vermelho, fez saltar para verbais, ainda hoje muito pouco “lidos”:
a afirmação do que possa haver de melhor posta pelo próprio duo Nomuque: “não a rede mundial de computadores poemas Villari Herrmann, Gastão Debreix, Aldo
no do it yourself, é uma atitude de recusa muito mas muito”. A fórmula latina dita a que talvez devessem desde sempre ter Fortes, Julio Mendonça, Sonia Fontanezi,
terminante a tudo que ele possa ter de pior. procura por “essências e medulas” ao invés sido pensados para o meio digital. Me Zéluiz Valero, André Vallias. Tem a ver
Essa é, a meu ver, a sofisticada e difícil via da obra proliferante. Sob o signo de uma lembro do caso específico de Koito, de com o “pulsar quase mudo” de Ronaldo
da revista Artéria. economia estética rigorosa, a prática de Villari Herrmann, que publicamos em 2003 Azeredo e, além dos irmãos Campos, Décio
Nesta perspectiva é uma corajosa criação e produção de Artéria é descenden- na Córtex, outra dessas revistas de número Pignatari, Arnaldo Antunes, ou seja, nomes
incursão na contracultura pela perspectiva de direta de uma das vertentes que a Po- único que gravitaram em torno da Artéria. conhecidos que comparecem em outras
da invenção, cujos traços de um discurso esia Concreta legou, sobretudo a partir de Eu, Thiago Soares e Guilherme Ranoya inúmeras publicações, ainda fez cruzar, em
“maldito” não se forjam pela semântica, sua autotransformação nos anos 60, quan- buscamos, de certo modo, tecer uma seus caminhos Lenora de Barros, Julio Plaza,
por um anti-conformismo meramente com- do abandona a ortodoxia do movimento homenagem ao que outras como Qorpo Edgard Braga, Erthos A. de Souza, ou seja,
portamental. vanguardista e passa a abrir-se como um Estranho, Código, Muda, Pólem, Navilouca, gerações diversas que se constelam, com
As noites infinitas de suor sobre as pran- olhar de referência para a poesia no Brasil Bahia Invenção fizeram Brasil afora, às os mais jovens, em torno desse núcleo
chas de serigrafia e o árduo trabalho que e no mundo. Outras vertentes que puxa- vezes com um único evento editorial – de singularidades, tendo à frente os
resultou em objetos tão singulares e ex- ram a presença do corpo, a pop art, o bar- como foram os casos de Zero à Esquerda incansáveis Walter Silveira e Tadeu Jungle,
traordinários que, em si mesmos, susten- roco e muitos outros desdobramentos da (dentro da própria Nomuque edições), ou colaboradores desde sempre.
tam-se como obras, cada um deles, uma arte contemporânea se espraiaram ao lon- Atlas, ou ainda Kataloki. No Quadradão (1992) está um fotograma
dobradura, um volume, um recorte inu- go das décadas seguintes. Artéria seguiu Houve um tempo em que essa atitude de de Ivan Cardoso, um poema visual perfeito,

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a síntese de boa parte de seu trabalho. Um
cinema em si mesma, a revista-álbum ain-
da carrega um “Rio” de Julio Bressane, jus-
to na época em que lançava o seu “Tabu”,
filme-ícone do seu homônimo alemão e da
figura de Lamartine Babo, tudo interco-
nectado pela vertigem das analogias.
Do Soneto Fita Métrica à Artéria “inferno
portátil”, uma caixa de fósforos ou uma fita,
uma pasta-portfólio, uma etiqueta (como a
de Julio Plaza Arte=Verba, Artéria 2), atra-
vessam-se anos de absoluta pertinácia, de
obstinação permanente. Artéria é um dia-
mante sem jaça, polido ao longo de dé-
cadas, arestas cuidadosamente alinhadas.
Para concluir lembro os grafitos de Walt B.
Blackberry, presentes em vários números,
em meio a rigorosos exercícios de ortogo-
nalidade, sugerindo uma síntese, aquela
mesma que já estava em vários escritos
de Haroldo de Campos: “concentração mo-
nádica e caos proliferante”. Ou ainda: ade-
são total à independência de produção e
recusa total ao desmantelo, ao desleixo,
à frouxidão autocomplacente. Medula e
osso, sem dúvida.

Notas
1 Os números 1, 2 e 3 sucedem-se
anualmente: 1975, 76 e 77, respectiva-
mente. Balalaica e Artéria4 (ARTERIV) são
de 1979 e 80. Zero à esquerda é de 81. Se-
gue-se um longo intervalo e, em 91 aparece
o número 5 (Fantasma) e o número 6 (Qua-
dradão) no ano seguinte, 92. Mais outro
longo intervalo vai ver surgir o número 8 em
2003, o número 7 em 2004, o 9 em 2007
e o 10 em 2011. Os editores já anunciaram
que prosseguirão nessa irregularidade.

Capas das Artérias nº7, 1, 4 e 10


Digitalização: Rafael Buosi e Pedro Loes / Espaço Líquido.

18 19
ARTÉRIA
UMA REVISTA QUE É
,

UMA EXPOSIÇÃO PORTÁTIL


Amir Brito Cadôr
Balalaica, 1979
Digitalização: Rafael Buosi e Pedro Loes / Espaço Líquido.

Uma revista de literatura é por definição Qorpo Estranho, Kataloki, Atlas. Em 1975 rar e voltar. O poema passa o máximo de de qualquer irregularidade, seja de falta,
um espaço para a experimentação. É o surgiu a revista brasileira mais original e informação, com um mínimo de elemen- quebra ou mau acondicionamento, queira
que justifica fazer um periódico ao invés comprometida com a visualidade, Artéria, tos: duas setas, duas palavras e o espaço enviar-nos esta etiqueta junto à sua recla-
de simplesmente publicar um livro. A re- editada por Omar Khouri e Paulo Miranda. em branco (...)”2. O poema apresenta um mação”). A metalinguagem é um aspecto
vista é mais imediata, pode responder aos Ser mutante “foi uma de suas principais paradoxo significativo para o contexto da importante da produção artística brasileira
desejos e necessidades de um grupo em características: configurou-se caderno época, a ditatura militar: a frase é uma nos anos 1970 e aparece com frequência
um determinado momento, pode continuar com encarte, sacola, caixa, fita cassete, ordem para o leitor virar a folha, mas con- na revista Artéria, o que evidencia o seu
por muitos anos ou desaparecer depois do site na rede, de novo caderno e até che- tem dentro de si a palavra “revolta”. caráter experimental.
primeiro número. Os principais manifestos gou a trocar de nome no percurso, passan- O encarte de certa forma anuncia o que vi- Esta edição foi impressa em offset, mas
de vanguarda foram publicados em revis- do a ser Balalaica e Zero à esquerda”1. ria a seguir: Artéria 2, que saiu em 1977, possui alguns poemas impressos em se-
tas, e o poema “Um lance de dados” de Em seu primeiro número, contou com a co- era um envelope com folhas avulsas de rigrafia e até mesmo um poema de uma
Mallarmé também teve sua primeira apa- laboração dos concretos Augusto de Cam- formatos diversos, utilizando papeis de di- única palavra (Kitschick!, de Omar Khouri)
rição nas páginas de uma revista. Se os pos, Haroldo de Campos e Décio Pignatari, ferentes tipos, cores e gramaturas (papel impresso em tipografia, um processo de
poetas concretos tiveram a Noigandres e a que enviaram trabalhos inéditos. A revis- vegetal, cartão, papel jornal), tudo em- impressão artesanal que tem como uma
Invenção como plataforma para seus poe- ta era grampeada, de pequeno formato balado em uma sacola plástica com um de suas características deixar um pequeno
mas e ensaios, o poema-processo teve a e aparência modesta, mas com cuidado- poema-etiqueta de papel cartão preso por relevo na superfície do papel, provocado
revista-envelope Ponto. sa apresentação gráfica. Um encarte de uma linha na alça da sacola. pela pressão dos tipos de metal. A revista
Nas décadas de 1960 e 1970 surgiram no Paulo Miranda, “Reviravolta”, foi impresso A etiqueta com a frase “arte=verba” é uma foi publicada pela Nomuque, uma editora
Brasil numerosas revistas experimentais, frente e verso, de modo a criar um “moto obra de Julio Plaza, e dentro do envelope “que sempre funcionou à margem do sis-
tanto em sua forma quanto em seu con- contínuo: vê, revê, vira, volta, o leitor é existe uma etiqueta de garantia que é um tema editorial brasileiro. Nomuque = no
teúdo, como Navilouca, Polem, Código, colocado num interminável ciclo de revi- poema ready-made de Zéluiz (“Em caso muque (no braço, na força muscular) exis-

20 21
te à medida que existam trabalhos que O número 4 era uma revista sonora, vinha Lenora de Barros fez uma performance, em uma distância tal que “... se você en-
ela venha a editar e graças aos recursos em um estojo que continha um “caderno que ela chamou de Poema, que consiste xerga uma coisa não enxerga a outra”. O
provindos dos próprios editores-colabora- com especificações técnicas para a audi- em uma série de fotografias impressas em trabalho retoma uma ideia que estava na
dores (a editora nunca contou com patro- ção de uma fita cassete C60 – o tal cader- uma folha dobrada formando uma sanfo- etiqueta da edição nº2, associando arte e
cínios de fora)”3. no poderia ter existência autônoma como na, em que a artista coloca a língua sobre dinheiro, uma questão importante quan-
O Soneto de Paulo Miranda foi o primeiro revista, tão primoroso graficamente era”5. as teclas de uma máquina de escrever. do se trata de publicações independentes,
poema impresso em serigrafia da revista. A edição foi de apenas 100 exemplares. Esta edição introduz uma novidade: além custeadas pelos próprios artistas. Em ou-
Nele, “a métrica do soneto foi substituí- ARTÉRIV foi projetada e executada por dos poemas em versos e dos poemas vi- tra publicação que circulou dois anos an-
da pelas medidas em centímetros, assim Carlos Valero, que também fez um ano an- suais, apresenta obras puramente visuais, tes, o Encarte Lei Seca, Plaza apresentou
como as rimas dos versos foram substi- tes Balalaica, outra fita cassete C60, com sem nenhuma palavra ou letra. As folhas um palito de fósforo queimado colado com
tuídas pelas cores”4. É uma fita métrica lançamento em 1979-80. avulsas permitem mostrar a maioria das fita crepe na folha de sulfite, transforman-
medindo 1m40cm e impressa com as co- Em 1981 foi lançada uma grande caixa, peças gráficas da revista na parede, o que do o espaço impresso, tradicionalmente
res da bandeira nacional, na escala 1:1. O com poemas soltos e utilizando vários reforça o seu vínculo com as artes visuais ocupado pela representação gráfica, em
tamanho deste poema, que se parece com processos de impressão: Zero à Esquer- e com a ideia de exposição portátil. um espaço de apresentação da obra, um
um cartaz, faz pensar na revista como um da. Os colaboradores tiveram liberdade A próxima edição da revista demoraria dez espaço expositivo à margem do sistema.
espaço expositivo adequado para veicular total para trabalhar, o que contribuiu para anos para ser publicada. Artéria 5 (conhe- Em cada edição da Artéria, chama a aten-
obras intersemióticas, como eram chama- a grande diversidade dos trabalhos: poe- cida pelo apelido Fantasma) saiu em 1991, ção o logotipo, mutante como a revista.
dos os poemas visuais na época. mas caligráficos de Edgard Braga e Walt mas começou a ser produzida em 1983. Em alguns casos, o logotipo ocupa toda
A edição seguinte é a mais radical de to- B. Blackberry, caligramas, apropriações da Era uma pasta de papel kraft com folhas a capa e até mesmo se apresenta como
das, pois nem sequer existiu. Explico: era Pop Art, das histórias em quadrinhos e do avulsas em diversos formatos, uma expo- única informação textual na terceira edi-
uma caixa de fósforos, do tipo que era dis- cinema; Tadeu Jungle participou com um sição portátil, assim como Artéria 2 e Zero ção da revista. Então chega a Artéria 6 e
tribuída como brinde, que trazia impresso poema chamado Adesivo, que podia ser à Esquerda. Diferente de outras revistas surpreende pela ausência do nome da re-
em dourado o nome ART3RIA, assim mes- colado em qualquer lugar e assim ultra- de poesia, em que as imagens aparecem vista na capa, que apresenta um labirinto
mo, com o número substituindo a letra. passar os limites de circulação da revista; como ilustração ou reprodução de uma geométrico com o número 31 em diversas
obra de arte, os artistas que colaboraram posições, lembrando um caligrama árabe.
com Artéria apresentaram trabalhos origi- Assim como a edição anterior, esta possui
nais. Em artes gráficas, um original é um um apelido, Artéria 6 - 31 x 31 - (Quadra-
desenho que foi feito para ser reproduzi- dão), que remete ao formato da revista,
do, o que significa que a obra é o trabalho 31 x 31 cm. Encadernado em espiral, o
que foi impresso. Como a revista foi total- volume é um display que fica em pé apoia-
mente produzida em serigrafia, de modo do em sua base, como os calendários de
artesanal (apenas 160 exemplares), fica mesa, configurando outra forma de expo-
mais evidente o caráter de obra de arte de sição. A edição de 180 exemplares, toda
cada peça gráfica. Colaboraram com ima- em serigrafia, demorou quase 10 anos
gens nesta edição Aldo Fortes, Erthos Al- desde a concepção inicial até a realização
bino de Souza, Julio Plaza, Regina Silveira (maio de 1983 a junho de 1992).
e Regina Vater. A metalinguagem é um tema que aparece
A presença de objetos é outro diferencial com frequência na revista: Carlos Valero
desta edição. Sônia Fontanezi fez um poe- criou uma peça que faz alusão ao formato
ma-objeto, uma pequena caixa com um desta edição, com nove quadrados azuis e
pedaço de papel furta-cor dentro e o títu- a frase “Square is square is square” (Al-
lo impresso na parte externa, Era Briluz. bers/Stein). Julio Mendonça participa com
Julio Plaza participa com uma peça intri- o poema visual Zero à Esquerda, baseado
gante, uma moeda de um cruzeiro colada na camisa 10 da seleção brasileira de fute-
Artéria 3, 1977.
Digitalização: Rafael Buosi e Pedro Loes / Espaço Líquido. em um cartão e a palavra ARTE impressa bol e que foi feito para a edição de mesmo

22 23
nome; Sonia Fontanezi fez um trabalho terior, contou com a presença de artistas
que retoma tematicamente um poema pu- conhecidos ao lado de novos colaborado-
blicado na edição Fantasma, e conceitual- res, reforçando uma característica da re-
mente, se aproxima do trabalho de Plaza vista, a experimentação. A capa em preto
daquela mesma edição. Ao invés do “pon- possui apenas o título escrito com contor-
to cego”, utiliza um efeito visual conhecido no branco, um logotipo que combina le-
como pós-imagem, em que o leitor deve tras e número, assim como em ART3RIA
olhar fixamente para um ponto da imagem e ARTERIV.
e depois, ao fixar uma área em branco, Uma diferença marcante em relação às
consegue visualizar a imagem com as co- outras edições é a presença da fotogra-
res complementares. fia em diversos trabalhos, ocupando qua-
Dessa vez, o poema-objeto é um poema se um terço da revista. As fotos registram
para montar de Ronaldo Azeredo, noite poemas-objeto (um dado com sete pontos
noite noite, com instruções para recortar e em uma das faces, trabalho de Walter Sil-
montar. Outro destaque da edição é o tra- veira e Fernando Laszlo), palavras em um
balho de Paulo Miranda, em que a inclina- outdoor (Arnaldo Antunes), performances
ção da Torre de Pisa foi corrigida pelo ân- e até uma paródia das imagens publicitá-
gulo do papel no momento de encadernar. rias (Tadeu Jungle). A revista é grampea-
O trabalho que está na página seguinte, da, e a página dupla central foi reservada
de André Vallias, é um diagrama (malha para um trabalho de Lenora de Barros em
topográfica) com linhas de contorno ama- que a forma de apresentação, duas ima-
relo sobre fundo impresso em preto. A pa- gens lado a lado, reforça o significado.
ginação foi ordenada de modo a tornar os Por uma questão prática, a revista 8, em
dois trabalhos complementares – a área versão eletrônica, saiu um ano antes da
em preto do poema de Vallias parece fazer nº 7. A proposta era a inclusão de traba-
parte do trabalho de Miranda. lhos no site, privilegiando a poesia eletrô-
Participaram desta edição artistas e poetas nica, entendida como poesia concebida
que também foram editores de revistas de utilizando os recursos específicos do meio.
poesia, todas de caráter experimental (ou Além dos trabalhos especialmente pensa-
revistas pós-verso, de acordo com Omar dos para esta edição, foram selecionados
Khouri), assim como Artéria. Figuras como trabalhos que já foram apresentados em
Omar Guedes e Gil José Jorge, editores de outro formato. No segundo caso, o editor
Agráfica, Erthos Albino de Souza (Código), convidado Fabio Oliveira Nunes fez a tra-
Arnaldo Antunes (Almanak 88) e Julio Pla- dução dos poemas impressos para a web,
za (Qorpo Estranho) mostram a existência incluindo movimento, sons e outros recur-
de uma rede de colaboradores: Artéria foi sos. Foi criado um site especificamente
influenciada pela Código e provavelmente para esta edição, de modo que os traba-
influenciou a produção de Agráfica (1987), lhos ficam em exposição permanente.
uma revista dedicada aos poemas caligrá- De volta ao impresso, a Artéria 9 traz a
ficos, todos impressos em serigrafia e em maior quantidade de colaboradores até o
grande formato (45 x 30 cm). momento. Capa e contracapa é uma obra
Doze anos depois do Quadradão, saiu de Inês Raphaelian, The Art, formada por
AR7ERIA em 2004. Dessa vez impressa uma seleção de capas de livros com a pa-
em offset, apenas em preto, em contraste lavra “art” no título. Novamente, grande
Artéria 9, 2007
com a exuberância de cores da edição an- quantidade de trabalhos que utilizam a fo- Digitalização: Rafael Buosi e Pedro Loes / Espaço Líquido.

24 25
tografia, mostrando desde cenas de uma também era uma forma de reunir artistas
performance a fotografias de placas que e poetas por afinidade, encontrar pessoas
são poemas ready-made. Peter de Bri- novas interessadas em ver e produzir coi-
to, que também colaborou na revista 7, sas. Zero à Esquerda foi lançada na dis-
apresenta uma série de autorretratos, um coteca Paulicéia Desvairada, e o Encarte
personagem que aparece na capa de 24 Lei Seca mencionado acima foi lançado em
revistas diferentes, e que ocupa uma pá- um bar, o mesmo João Sebastião Bar onde
gina dupla. aconteceu o primeiro happening no Brasil.
Em uma espécie de jogo, se torna comum O espaço da publicação funcionava como
em cada edição a presença de uma obra um local de encontros, o que incluía tam-
que remete a outra obra publicada pre- bém o leitor.
viamente em Artéria. O poema 1,5 m de
poesia, de Gastão Debreix, evoca o Sone-
to de Paulo Miranda publicado em Artéria
2; Abaixo do Equador, de Regina Vater,
remete a outro trabalho da artista publi-
cado em Artéria 7; a artista Regina Silvei-

INVENÇÃO
ra participou de quase todas as edições
da revista, e se na edição 7 havia o Latin
American Puzzle, um quebra-cabeça com
personagens e fatos importantes do con- Notas
tinente sul-americano, desta vez o puzzle 1 Omar Khouri em depoimento pu-
foi composto apenas de retratos de Car- blicado na revista Refil em 2012. Disponí-
mem Miranda. vel em http://issuu.com/amir_brito/docs/
Contrariando expectativas, Artéria 10 não refil_4_2012
apresenta mudança substancial na forma
e, assim como as anteriores, foi impres- 2 FREITAS, Eloah Franco de. A re-
sa em offset. O encarte, ausente nas úl- vista Artéria: uma amostragem das poé-
timas edições, retornou, um santinho de ticas intersemióticas dos anos ‘70 aos ’90
Fabiana de Barros. A revista mantém sua (dissertação de mestrado). São Paulo,
proposta de valorizar a produção gráfica, Instituto de Artes, Universidade Estadual
e tem como característica dessa edição o Paulista, 2003, p. 66.
aumento significativo do número de tra-
balhos que ocupam uma página dupla, o 3 Omar Khouri em depoimento pu-
que evidencia que foram pensados para a blicado na revista Refil em 2012. Disponí-
página impressa. vel em http://issuu.com/amir_brito/docs/
A possibilidade de publicar em uma revista refil_4_2012
nos anos 1970 e 1980 era uma maneira
eficiente de exibir os trabalhos sem preci- 4 FREITAS, Eloah Franco de. Op.
sar do apoio de museus ou galerias. Des- cit., p. 84.
se modo, a revista Artéria consolidou-se
como uma forma de exposição portátil, 5 Omar Khouri em depoimento pu-
com poemas visuais, desenhos e fotogra- blicado na revista Refil em 2012. Disponí-
fias pensados para o espaço da publica- vel em http://issuu.com/amir_brito/docs/
ção, a página impressa. Fazer uma revista refil_4_2012

26 27
Arnaldo
Antunes
'zero no meio'

28 29
30 31
32 33
Diniz
Gonçalves
Junior

34 35
não me tenho em alta conta

palavra é a cadela

que mais berra

perdi o sono, fechei questão

sambei na linha sublinhada


Fernando
escaramuça, pica a mula Aguiar
'diálogos'
'eclipse'
faz ruído, tenta o eco, esvazia, 'homeóstato visual #4'

espantalho, tinta presa,

depois o nada

36 37
38 39
Gastão
Debreix 
'antena'
'complexo ver'

40 41
42 43
Gil Jorge
'ponto de fuga'
'filosofia (p/ augusto de campos)'

44 45
Lucio
Agra
'ar de artéria'

46 47
48 49
quase

quase sempre
nunca e quase

quase nunca um

Luiz Roberto quando onde um

Guedes resiste — se tanto


um enquanto

'quase'
'li tai po para os caiapós'
(de um livro inédito, de título mutante)

50 51
Li Tai Po para os Caiapós

a chinesice
é o ópio do
poeta zen

estilo de marfim
entalha lua ming
céu de pergaminho
jardim de nanquim

grafa garça em pé

Omar
de sakura em brejo
de paca e saracura

planta monte fuji

Khouri
onde anta trota
e onça ruge

tanto faz que


nenpuku sato 'boceta entre bocetinhas'

[poeta-lavrador
no burajiru]

já tenha enfiado
tatu no haikku

e o samisen
no saco

52 53
Safo  e  as  Meninas  
 
 
 
 

ν ν ν ν ν ν ν
ν ν ν ν ν ν ν

ν ν ν ν ν
ν ν ν ν ν ν ν
ν ν ν ν ν ν ν
Sonia
Fontanezi
Boceta  entre  Bocetinhas  ou  Safo  e  as  Meninas   é   o   título   registrado   em   pé-­‐de-­‐página   por  
Dr.  Ângelo  Monaqueu  o  que  dá,  ao  mesmo  tempo,  ideia  de  um  bailado  de  vulvas  e  do  que   'caiu na rede é pixel'
celebrizou   a   biografia   da   Poeta   de   Lesbos   (Mitilene,   para   ser   mais   exato).   Isto   tudo,   sem   'impressões e afeições digitais'
esquecer  o  V  de  Virgília  do  machadiano  Brás  Cubas.  A  tal  de  Safo  foi  demais:  amada  na   'ciano'
Antiguidade,   chegou   a   nós   aos   pedaços,   porém   com   a   glória   intacta!   Um   único   poema  
inteiro,   em   que   implora   por   um   amor   a   Afrodite,   o   amor   de   uma   zinha.   Um   outro,  
incompleto,   em   que   inveja   um   homem   por   ele   desfrutar   do   doce   falar   de   uma   jovem  
bela,  e  se  esvai  em  tesão.  Noutro,  deplora  a  solidão.  E  noutro,  ainda,  confessa:  ‘Eros  deu  
de   m’infernar   de   novo;   doceamara   fera   má   que   aferra’…   Ah!   Esse   Amor   que   deixa  
bambos   braços   e   pernas…   Esse   interesse   que   ainda   despertam   os   versos   de   Safo,   em  
poemas   truncados,   deixou   encafifados   vários   críticos-­‐poetas.   Muito   se   falou   da  
atemporalidade  da  Lírica.  Safo,  no  que  dela  sobrou,  traz-­‐nos  o  melhor  do  que  a  Lírica  já  
foi  capaz.  E  Dr.  Ângelo  Monaqueu  sabia  disto.  Sabia  e  muito  bem,  assim  como  T.S.  Eliot  e  
Ezra   Pound.   Dr.   Ângelo   chegou   a   compor   uma   peça   em   que   dialoga   com   a   grega   célebre:  
‘não   seja   eu/como   a   pobre   Safo:/vem   povoar   meu   leito/nas   noites   de   sábado’.   Salve   o  
Amor!  Salve  Safo!  XAIPE!  

Dr.  Ângelo  Monaqueu,  anos  1980,  mais  comentários  do  Prof.  Omar  Khouri,  anos  1990.  

54 55
56 57
Tadeu
Jungle
'três tristes morcegos'

58 59
Villari
Herrmann

60 61
Quando Pignatari

chegou ao inferno,

Lúcifer dixit:

62 63
Walter
Silveira
‘gota a gota’
(Foto de Fernando Laszlo - original: 4
fotos em metacrilato de 30x40cm cada)

fotos de Décio Pignatari realizadas por Omar Khouri na casa do poeta em janeiro de 1980

64 65
66 67
68 69
assim...

“o infinito nada poderá contra mim

porque de mim quer tudo”

vinícius de moraes

o muito de mim
sobra em quase tudo

desdobra-se no vazio
onde vivo incluso

Zhô por fora me evito


por dentro me abuso

Bertholini além das sombras, existo


onde me escondo, acuso
‘assim’
‘dimensão’
‘entrelinhas’

quando não creio, insisto


desapego do uso e agito

simples, salvo o engano,


poesia em qualquer plano

70 71
entrelinhas
dimensão
“porque cantar a rosa

oh, poetas!

faça-a florescer no poema.” a bic corre solta


vicente huidobro no branco da página
a mão não imagina
vem de o que a mente apronta
outro
quilate inspiração nem sempre vem
o ouro tempo ao tempo entre pausas
que assim as ideias criam asas
doura vão chegando com o que tem
sua
aura em lampejos brilha a poesia
nascente em voz de vento
lume ritmo e pulsação de cada dia
de face
etérea penso, tento, invento e arrisco
nenhum verso nasce pronto
às vezes não passa de rabisco

72 73
ESCRITOS
ARTIGOS/ DE LISBOA
Omar Khouri

ENSAIOS
1.
A passagem de Décio Pignatari por páginas!, manuscritas e dactiloscritas).
Lisboa, anos 1950 Décio Pignatari travou alguns poucos con-
tactos em Lisboa, sem ter uma ideia preci-
Em meados de 1956, Décio Pignatari fez sa das coisas das Artes na Capital Lusa,
uma rápida passagem por Portugal, num Portugal que ainda vivia o período
Lisboa, em sua volta ao Brasil, depois de ditatorial salazarista, mas não deixou em
dois anos na Europa, com estadas branco a sua passagem pela cidade. Aca-
principais na França, na Alemanha e na bou por dar uma entrevista, que se tornou
Itália. Em mais de uma ocasião, o poeta e um depoimento escrito e, penso que, para
teórico Ernesto Manuel de Melo e Castro a publicação, orientou boa parte do texto
(E. M. de Melo e Castro, como assina os introdutório e, certamente, redigiu as no-
seus textos) chamou a atenção para o fato tas complementares, com raros momen-
destacando, outrossim, a não-repercussão tos de imprecisão. Pois é: eu tive a opor-
dessa passagem, apesar de se tratar de tunidade de consultar, na Biblioteca
um Décio Pignatari em adiantado estado Nacional de Portugal (Lisboa), a revista na
de criação da Poesia Concreta, com os ir- qual o Depoimento foi publicado e que é
mãos Haroldo e Augusto de Campos, que referida na “Sinopse” do Teoria da Poesia
permaneciam em São Paulo, mas manti- Concreta (edição da Duas Cidades, 1975,
nham, com o autor do Eupoema, uma cor- p. 194), no ano de 1956. Trata-se da re-
respondência epistolar contumaz e volu- vista Graal, número 2 (Graal: Poesia. Tea-
mosa (chegou-se a falar em cartas de 16 tro. Ficção. Ensaio. Crítica. Publicação bi-

74 75
mestral, nº 2. Lisboa: Empresa Nacional introdução em duas colunas, cujas infor- tari e os demais componentes do Grupo tuguês de todos os testemunhos válidos e
de Publicidade, junho-julho de 1956.). mações - sendo algumas pontuais (ori- Noigandres e, sem disputar com Mallarmé das sérias inquietações e orientações do
Esta foi uma publicação que teve 4 gens do Grupo Noigandres, a revista de nº (que não entrou no paideuma poundiano, nosso tempo, não podia deixar de trazer
números, apenas, e todos no ano de 1956, 2 e a série “Poetamenos”, referida como já que o autor dos Cantos preferiu simbo- notícia deste movimento, tanto mais que
adentrando 57. Uma revista, a começar “O Poetamenos”, de Augusto de Campos) listas de uma outra linha), espécie de dei- se desenvolve num país da mesma língua
pela capa, cheirando a século XIX – as 4 - foram, certamente, fornecidas por Décio dade para os concretistas, o semideus e de cultura com tantos aspectos e raízes
capas se repetem, com variação da cor do Pignatari. O depoimento, que deve ter sido Pound chega a ofuscar, de quando em vez, comuns. Por isso, rogamos a Décio Pigna-
nome + número, com um mar de textos e dado por DP por escrito, comparece em o autor do Un coup de dés… Pound, de fac- tari o depoimento que arquivamos a se-
poemas em versos, muito do publicado em itens, numerados de 1 a 12, em bloco úni- to, foi um gigante enquanto poeta, teóri- guir, sobre as teses que defendem [os
corpos 12 e 10, sendo neste, inclusive o co. Já se trata de um Décio com as ideias co, promoter, tradutor e, como tradutor, componentes do Grupo Noigandres], e
depoimento de Décio Pignatari. Uma re- amadurecidas, como aquele que compare- foi o grande modelo para os transcriadores que é o primeiro texto teórico a ser publi-
vista acadêmica, com gráfica antiquada cerá com os irmãos Campos no Plano-Pilo- brasileiros. Décio Pignatari, nessa sua es- cado com carácter de manifesto ou resu-
que, apesar das ilustrações e uma rara cor, to para Poesia Concreta (1958). Nesses tada europeia, chegou a procurar, na Itá- mo das proposições fundamentais do gru-
como tantas outras, não apresenta ne- 12 itens, é utilizada a caixa baixa, com lia, um Pound que ainda estava enclausu- po.” Certamente, pela pena de redator da
nhum arejamento. Informou-me Melo e uma exceção: a palavra Alemanha - um rado nos EUA, no St. Elisabeth Hospital revista. Repercussões teriam, como esta-
Castro, em entrevista por e-mail, que se lapso, certamente. Aí, o poeta trata da (Washington). Uma vez no Brasil, pediu a vam tendo, no Brasil, as ideias que os con-
tratava de uma publicação de direita, fas- questão do verso, fala em tradição de pes- Wesley Duke Lee que o fotografasse, pois, cretistas estavam a divulgar nas mídias
cista mesmo, conservadora, por certo, quisa e rigor, pesquisa baseada na infor- já estava livre e na Itália, e o pintor partia impressas. A Poesia Concreta brasileira vai
facto do qual Décio Pignatari não deveria mação em âmbito internacional, deprecia em viagem para a Europa (as fotos foram repercutir em Portugal a partir de 1962,
ter a menor ideia. Não sendo este o meu procedimentos poéticos brasílicos (chega feitas e publicadas). Em 1959, em sua pri- com a publicação da antologia da Poesia
objeto de estudo, propriamente, não me a falar em “senilidades auriverdes”), criti- meira viagem à Europa, Haroldo de Cam- Concreta brasileira, organizada por Alber-
detive no conteúdo da revista, a não ser ca a Lírica brasileira. Enumera os grandes pos encontrou Ezra Pound (foi recebido to da Costa e Silva, à época, secretário da
no texto que me interessava, porém, não valores: Mallarmé, Cummings, Pound, por ele), com quem teve uma longa con- Embaixada Brasileira em Lisboa. O depoi-
deixei de dar uma corrida d’olhos na publi- Joyce, cita outros movimentos de outras versa (uma entrevista) a qual rendeu um mento de DP passou despercebido para
cação. O meio ao qual a revista pertencia, artes, louva Apollinaire, mas critica o figu- belíssimo texto: “I punti luminosi”, publi- aqueles que poderiam apreciá-lo. No mes-
talvez que visse aquelas duas páginas rativismo de seus caligramas, pois, para a cado mais de uma vez (Ulisseia, Hucitec). mo ano de 1956 (mais para o final), por
como mera curiosidade e, por outro lado, Poesia Concreta, a questão é a da estrutu- Os concretos Augusto e Haroldo de Cam- ideia e organização do Grupo Ruptura,
ficaram perdidas em meio àquela verbor- ra que se apresenta, que a palavra “noi- pos chegaram a se corresponder com Ezra acontece em São Paulo – Décio Pignatari
ragia sem fim. De facto, as ideias expres- gandres” é sinônimo de poesia e pesquisa Pound e a enviar-lhe publicações. Parece no Brasil, desde julho – a Exposição Nacio-
sas de DP não tiveram repercussão, e, no item 12 (p. 209): “hoje, mais do que que Pound, já cansado, não chegou a com- nal de Arte Concreta, com a participação
embora o poeta estivesse em pleno nunca, ser internacionalista é o melhor preender a poesia que os então jovens es- de artistas plásticos e de poetas, juntando
fervilhar de ideias, sendo que até o nome modo de ser nacionalista.” E assina: “décio tavam propondo – os pais (artísticos), ge- aos que atuavam em São Paulo, os que
“Poesia Concreta” já havia sido proposto pignatari lisboa, julho 1956”. Aí, vêm as ralmente, não gostam de se reconhecer operavam a partir do Rio de Janeiro. Esta
por Augusto de Campos, em artigo de notas (em 2 colunas): NOTAS SOBRE OS nos filhos, nas suas crias. Mas, retornando data de 1956 é apontada como a do lança-
1955. Passemos às duas páginas do AUTORES CITADOS (“Notas organizadas ao depoimento de Décio Pignatari publica- mento “oficial” da Poesia Concreta. No co-
Depoimento (a revista não fala em por Décio Pignatari e Goulart Nogueira”): do na Graal 2: - Como perceber a grande- meço do ano seguinte, a exposição acon-
“Entrevista”, como na referida “Sinopse”, Augusto de Campos, Haroldo de Campos, za de suas propostas naquele mar de tex- teceu no Rio de Janeiro, com estardalhaço
mas em “Depoimento”: foram dadas a Dé- Décio Pignatari, Max Bill, Escola Superior tos e em corpo diminuto? Como bradar, da imprensa. A passagem de Décio Pigna-
cio Pignatari as páginas 208 e 209 (a nu- da Forma - Ulm, Alemanha (Hochschule ali, contra a academia? Na introdução que tari por Lisboa, em meados de 1956, res-
meração das páginas da revista é contí- für Gestaltung: Gildewart, Tomás Maldo- encima os 12 pontos do Depoimento, à tou como uma simples curiosidade dentro
nua, portanto a de nº 2 continua a de nº 1 nado, Eugénio Gomringer), Cummings, página 208, temos o seguinte: “‘Graal’, das histórias dos experimentalismos poé-
etc, até o 4). No Sumário, consta em DE- Ezra Pound (a quem é reservado o maior como revista interessada em estabelecer ticos luso e brasileiro.
POIMENTOS: Poesia Ideogrâmica ou Con- espaço), Pierre Boulez entrando, aí, diálogo crítico com as várias expressões e
creta, porém, dentro, à página 208: POE- Stockhausen. Ezra Pound já aparecia como movimentos da arte e da cultura univer-
SIA CONCRETA OU IDEOGRÁMICA e uma uma figura exponencial para Décio Pigna- sais, em dar conhecimento ao público por-

76 77
Post Scriptum EUPOEMA
Cada vez mais creio que os maiores re-
volucionários das linguagens eram e são O lugar onde eu nasci nasceu-me
os que melhor conheceram e conhecem num interstício de marfim,
a tradição, daí, o poderem subvertê-la. entre a clareza do início
No caso específico da Poesia Concreta, a e a celeuma do fim.
grande empreitada foi efetivada contra o
verso, negando-o, assim como foi feito e Eu jamais soube ler: meu olhar
declarado: “dando por encerrado o ciclo de errata a penas deslinda as feias
histórico do verso…” – plano-piloto para fauces dos grifos e se refrata:
poesia concreta (in: Noigandres 4, 1958). onde se lê leia-se.
E os concretos eram, em verdade, exce-
lentes versemakers, como afirmou, em Eu não sou quem escreve,
texto dos anos 1950, o poeta e crítico Má- mas sim o que escrevo:

PEDRO XISTO
rio Faustino, nomeando Augusto e Harol- Algures Alguém
do de Campos, Décio Pignatari e Ferreira são ecos do enlevo.
Gullar (este, na época, praticando poesia
concreta). Diz, precisamente, serem os
referidos poetas os melhores versejadores Estupendo o domínio do verbal que Pigna-
do Brasil, depois da configuração do fenô- tari sempre teve, tanto quando se tratasse

8 HAIKAIS
meno João Cabral. Conhecimento, que é de poemas, em versos ou em não-versos,
bom dizer, nunca perderam, nem que fos- como na prosa metalinguística ou na prosa
se no exercício (os Campos e Pignatari) da ficcional-artística, ou numa aula ou confe-
tradução-recriação de poemas-em-versos. rência. E, interessante é notar que, poetas
O jovem Décio Pignatari foi um espanto- de gerações posteriores, aficionados da vi-
so poeta-em-versos, como reconheceram sualidade em Poesia, possuem um consi-
publicamente José Lino Grünewald e Au- derável domínio das coisas do verbo e até,

L. C. Vinholes
gusto de Campos (“Esses jovens querem especificamente, da tecnologia do verso.
fazer poemas em versos, no âmbito da lo- E, com a Poesia Experimental portugue-
gopeia, e desconhecem Décio Pignatari!”). sa ocorre algo semelhante: dos históricos,
Dominar o fazer-versos é estar em posse como E. M. de Melo e Castro e Ana Ha-
de uma tecnologia preciosa: a tecnologia therly, aos poetas de gerações posteriores,
do verso (para compreendê-la e até pra- como Fernando Aguiar, o mesmo domínio
ticá-la, o que não era o caso dos poetas do verbal e, especificamente, do verso. É
concretos, nos anos1950). E dentre as pe- importante que não se percam as antigas
ças notáveis criadas em versos por Décio tecnologias, embora estejamos abertos às
Pignatari, destaco (porque a citei no texto novas e prontos para o entendimento de
acima) Eupoema, com suas três breves todas elas.
estrofes (quadras). O poema é de 1951 e
foi publicado em Noigandres 1, de 1952.
Décio Pignatari referia-se à peça como
“o meu poema fernandopessoal”, que se
constitui num texto autobiográfico impla-
cável! Vejamo-lo:

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Em 1960 decidi criar em Tokyo uma pe- A boneca de Pedro Xisto / HAIKAIS e sur sa tombe” (Kuni Matsuo, “Haikaï du versão da boneca de 1956 figurava uma
quena editora para divulgar o que estives- os 8 haikais de pedro xisto tem como Bashô et de ses disciples” pg.20 I.I.C.I., palavra que não se pode identificar pois
se ligado à cultura brasileira. Conhecendo denominador comum as notas da última Paris, 1936). O asterisco, na versão da an- sobre ela, substituindo-a, foi escrita loto,
e admirando a beleza dos haikais de Pedro página, chamando a atenção o fato de que tologia, aparece no final da terceira linha o nome da flor ícone da cultura budista.
Xisto, inclusive os das cartas com as quais nesta as maiúsculas encontradas naque- depois do parágrafo que fecha o verso e A publicação avulsa de haikais de Pedro
fui por ele contemplado, e acreditando que la foram todas substituídas por minúscu- remete às notas da última página, provi- Xisto parece ter tido início quando, em ja-
seriam especialmente oportunos e atrati- las. Dois haikais figuram tanto da boneca dência que, visualmente, despoluiu o es- neiro de 1949, o Diário Nippaku, um dos
vos, propus que escolhesse a oito do seu quanto da pequena antologia: o segundo paço agora ocupado exclusivamente pelo jornais japoneses de São Paulo, publicou o
agrado para figurarem na edição inaugural e terceiro desta publicação são os mesmos haikai. Para o segundo haikai, registre-se Às aves do céu, que em 1959 ganha for-
da Shin Nippaku Shushu - Coleção Novo das páginas primeira e sétima da boneca apenas um reparo: na segunda linha na mato diferente:
Brasil-Japão. Assim surgiu a publicação 8 preparada em 1956 e até hoje inédita.
haikais de pedro xisto1, trabalho pri-
moroso da gráfica. Às aves do céu País das espigas.
(país das espigas cheias) O primeiro grão, as aves
o primeiro grão do céu. Teu haikai.
Vale a pena colocá-los lado a lado para que possam ser cotejadas e apreciadas suas duas
versões gráficas:
Não tenho receio em afirmar que, em bancário e poeta de quem, pelos seus
termos de qualidade, de economia de feitos, muito se lembram os japoneses do
Bananeira em leque. bananeira em leque. palavras, de sintetização, de ausência Peru, do Paraguai e de São Paulo. Dele,
Ah! Só, no jardim, BASHÔ. ah! só, no jardim, bashô. de discurso excessivo e de experiências Pedro Xisto ganhou o pseudônimo japonês
Uma sombra leve. uma sombra leve . . . gratificantes, são raros aqueles que con- de Kashimoto Hakuseki, de que muito se
seguiram alcançar o nível do trabalho de orgulhava e muito se envaidecia quando
Pedro Xisto com seus haikais. Nos haikais descobriu que o ideograma para haku
Em si, o olho oblíquo, em si, o olho oblíquo de Pedro Xisto adjetivos não tem lugar, a nele utilizado é o mesmo com o qual se
fino, arde entre o loto e a carne. fino, arde entre o loto e a carne. não ser quando não são subjetivos, são escreve Brasil.
(Vórtice do umbigo . . .) (vórtice do umbigo. . . ) complemento que adicione valor ao cor-
respondente substantivo. Por outro lado,
não são poucos os autores de haikais que
Nos dois haikais acima, na versão que re- katakana, os dois grupos de sinais gráficos não se dão conta das características espe-
cebi de Pedro Xisto para lançamento pela fonéticos usados para escrever em japo- cíficas desta forma poética, tão diferente
Coleção Shin Nippaku, as letras maiúscu- nês, nenhum dos dois tendo a dicotomia para nós quanto é o soneto para os japo-
las no início de cada verso e após o ponto de maiúsculas e minúsculas, característica neses. Mas há exceções. O poeta Antônio
e o sinal de exclamação foram substituídas do alfabeto ocidental. Do primeiro haikai à Carlos Osório, consciente desta distância
pelas minúsculas e o destaque dado ao esquerda, na versão de 1956, figura como que separa as duas culturas, modesta mas
nome do poeta do século XVII, grafado em título a frase Sobre o túmulo de BASHÔ pragmaticamente, chama aos seus peque-
maiúsculas, deixou de ser visto como ne- o que nunca foi praxe nos poemas de Pe- nos poemas de “quase haikais”.
cessário. Nas versões à direita, os versos dro Xisto e muito menos nos dos haikaís-
ficaram visualmente mais claros e homo- tas em geral. Observa-se também que, ao Em São Paulo, o convívio de Pedro Xisto
gêneos em termos de elementos gráficos, lado do nome de BASHÔ, na versão da bo- com haikaístas da comunidade japonesa Notas
sem diferenças tipográficas desnecessá- neca, um asterisco remete ao rodapé da em São Paulo, certamente foi a fonte mais 1 8 haikais de Pedro Xisto foram
rias e perturbadoras para distrair a aten- página onde lê-se: “Le corps de BASHÔ ricas à qual teve acesso. Destaca-se neste musicados pelo compositor brasileiro H. J.
ção. Grafar apenas com minúsculas apro- (1654-1694) fut enseveli dans le jardin grupo a figura extraordinária de Kunito Koellreutter em 1962 e por ele logo apre-
xima o texto em português daquele em du temple Yoshinaka-dera et un bananier, Miyasaka, como haikaísta Ikubeshun, sentados em memorável concerto no Ins-
japonês quando escrito em hiragana ou qu´il aimait particulièrement, fut plante homem de empresa e cultura, economista, tituto Goethe de Tóquio.

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H.O.N.Y. :
GALÁXIA HELIOTAPES
HAROLDO Diálogo entre Haroldo de Campos
e Hélio Oiticica em Nova York
Preparado para o Teatro em Um Ato por

Kenneth David Jackson

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CORO: (formado por pessoas no saguão
que de repente se juntam em flash mob
para recitar)
peças que o Ezra Pound traduziu para o
inglês, uma peça curta, lindíssima, e onde
justamente a coisa que é o centro da peça
é este manto de plumas que ao mesmo À esquerda à direita à esquerda
tempo tem uma cor lindíssima e tem uma à esquerda à direita sopro-suaves
© K.D. Jackson, 2014 fragrância, um perfume maravilhoso que giros da grinalda de flores
Todos os Direitos Reservados naquela altura já é um problema de sines- giros do manto cor-de-céu:
tesia, de correspondência de sons, de co- fluem refluem flutuam
Saguão do Hotel Chelsea em Nova York, res, e este manto estava largado em cima as mangas de plumas dançarinas
28 de maio de 1971, meio-dia. Obras de de uma árvore, o anjo viu que este manto
arte nas paredes, algumas obras do Hé- estava espairecendo e deixou em cima de Muitos são os jogos do Nascente
lio Oiticica visíveis, em frente poltronas, árvore descuidadamente, o pescador viu muitos são os júbilos do Nascente
duas grandes, uma de costas para a pla- o manto, sentiu o aroma, o aroma do bri-
teia onde estará sentado Hélio Oiticica, e lho, e apanhou o manto e obrigou o anjo, Quem se chama Pessoa Alva da Lua
a outra em frente, um pouco à esquer- como preço para obter o manto, sem o na décima quinta noite culmina:
da, ocupada por Haroldo de Campos. Em qual o anjo não poderia voltar ao céu, plenilúnio
cima das poltronas, sugestões de uma a dançar para ele a dança da lua, que é plenitude
tenda. Mais ao fundo, ao lado, cadeiras uma dança belíssima, que traria a felici- perfeição.
e público assistindo a um desfile de moda dade; o anjo coagido, porque ele não que-
de extrema vanguarda, com algumas ria dançar, essa dança que não era para Cumpriram-se os votos circulares.
roupas imitando obras de HO e de anjos isso, como este manto maravilhoso, e en- Espada e alabarda guardam o país.
com mantas. Ambiente didático-comer- tão o pescador com o cumprir da dança, e O tesouro das sete benesses
cial de certa intensidade. Continuação da o manto, ele é branco e vai flutuando no chove
entrevista de ontem. espaço, e se dissolve no céu do céu; jus- profuso
tamente o problema no ninho, onde você na terra.
HAROLDO DE CAMPOS (usando avental usou determinados elementos, luminosos,
de artista e boina): Pois é, Hélio, nós on- brancos, nos brancos mais brancos, você Passa-se agora o tempo:
tem deixamos de abordar dois assuntos conseguiu assim algo de jogo do visível e o celeste manto de plumas está no vento.
que são interessantes e hoje a gente pode não visível, constante, é uma espécie as-
conversar um pouco sobre eles… Eu que- sim de ninho dentro do céu do céu; então Sobre o Pinheiral de Miho
ro lhe dizer o seguinte: primeiro eu queria eu achava que havia uma relação, e por sobre as Ilhas Balouçantes
aproveitar, nós estávamos falando disso, isso é que lhe dou e vou ler pra você esta sobre o monte Ashitaka
eu estava pensando naquela coisa que nós tradução que eu fiz, que é uma tradução sobre o pico do Fuji
vimos no seu ateliê noutro dia, os ninhos, do fragmento final, que não fica traduzido flutua
eu saí de lá e comecei a pensar numa sé- de uma determinada maneira, traduzem excelso
rie de coisas que me interessavam nesse discursivamente e procuram preencher os dissolvido no céu do céu
mesmo tipo de ideia sua, “Nãonarração, buracos da língua tão reduzida linguagem,
Não fotografia ‘artística’, Não audiovisual, que é a dessa peça, com explicações dis- Esfuma-se na névoa
imagens puras, modo acidental, play-in- cursivas, porque o ocidental não resiste à e a vista o perde.
venção”, e eu estava me lembrando da, de linguagem sintética; mas eu fiz uma tra-
uma peça do teatro japonês nô, hagoromo dução hiper-poundiana, super-poundiana,
-- o manto de plumas --, que é uma das que é assim: (Hagoromo de Zeami, São Paulo: Estação Liberdade, 1993, 41-42).

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Acaba o desfile. Entra um público para as- CORO de pessoas no saguão que se jun- título com Memórias Póstumas de Brás ricana no exterior. Eu sei que ele esteve
sistir à projeção de trechos do filme sobre tam novamente em flash mob: Cubas, além da técnica de capítulos curtos, no ano retrasado em Washington e acabou
as Galáxias seguido de fotos do encontro esta parte contida no medalhão e sob ela etc.; eu acho importante é que o Machado, junto com Octavio Paz e participaram... eu
de Haroldo com escritores hispano-ame- coroa e manto o santo de ao contrário do que muitos críticos fazem, vi até uma entrevista gravada dele bem
ricanos. Passeiam entre as obras e insta- casula e cordão como um rei de baralho procurando descobrir fatos biográficos de curiosa em que ele faz um debate, mas
lações. descartado entre asas geometrizadas Machado, não veem que Machado não esse era fechado também, ou então te-
de borboletas um livro ou escrínio que é a biografia, não são fatos realistas: levisionado de modo que teve acesso ao
(HC dirigindo-se à plateia, agora com rou- abrisse para trás e este enredo Machado é um escritor atravessado pela público pela técnica do vídeotape bastante
pa de astronauta) central vale dizer o medalhão-dilúvio mais escritura ; eu tenho a impressão que no interessante falando da experiência dele
Eu quero dizer aqui uma coisa pro Hélio o santo-rei recorta-se num Dom Casmurro não é saber se Capitu traiu e fez uma conferência muito interessante
sobre o trabalho que estou fazendo há al- fundo de maravilha laranja rosa branco ou não traiu, se foi ou não uma mulher sobre o “Quixote” em que ele justamen-
guns anos, desde 1963, e cuja primeira azul em triângulos contrapostos... adúltera,: Capitu é importante, mas mais te enfatiza esse aspecto textual de que a
parte já foi publicada, na revista Invenção (“o ó a palavra ó”, Galáxias, 1.3.69, São importante que Capitu é o capítulo; o partir de um certo momento de “Quixote”
nos números 4 e 5, 64/65, que tem esse Paulo: Ex Libris, 1984). capítulo é que realmente é o importante; os personagens já sabem que acontece
título, Livro de ensaios: Galáxias, e que o fato de Capitu, não se poder dizer se ela anteriormente no livro (ri) o que era uma
é um texto que está previsto, em elabo- HAROLDO: traiu ou não traiu, está ligado à técnica coisa extremamente moderna que Dom
ração, que eu já tenho umas 50 páginas Esse é um fragmento justamente das Ga- de ‘suspense’ que vem do próprio estilo Quixote possui.
escritas, e cada página pra ser lida, numa láxias, no qual eu vejo uma certa relação, de capítulos fragmentados do Machado; É importante ler Borges porque ele é
audição que farei oportunamente, vou fa- em torno da linguagem, com um tipo de Machado é a vida escrita: isso é que é realmente um nome muito importante
zer um projeto gráfico, e você então rece- visão que eu encontro nos trabalhos do importante; Machado é um escritor do na evolução da prosa da América Latina
be aquelas páginas, como estão ligadas, Hélio; é uma busca de alguma coisa, de texto e não um escritor das interpretações e da prosa mundial, ouvi dizer que hoje
juntas, não é um livro comum, mas elas alguma coisa ‘entre’, de uma coisa que fica extratextuais. o importante da contribuição da América
estão juntas e organizadas de uma certa entre o visível e o invisível, alguma coi- Não, Hélio, eu não cheguei a ler, eu mes- Latina nas artes e nas letras é que as coi-
maneira, e o leitor pode começar a leitura sa que fica ‘entre’, não é isso nem aquilo, mo, as traduções mas as referências, de sas estão sendo feitas, as coisas realmen-
do ponto que queira, pode ler o pedaço está entre os dois, né, pelos perfis, sim, pessoas que podem opinar, de escritores, te boas que estão por dentro que são por
que quer, e cada página tem uma vértebra muito bonito, frestas, são frestas é que justamente essas traduções, várias dentro e não apenas em nível latino-ame-
semântica, que é a ideia da viagem, que delas são bastante boas, e dão uma medi- ricano mas em nível internacional estão na
no livro diriam-se viagens, e em torno dis- O público passeia no saguão da nova do Machado de Assis, sendo que frente, tendo em vista o diálogo com o que
so se constelam exemplos da vida cotidia- vários escritores latino-americanos com há de melhor na arte de hoje.
na, coisa lida, fragmentos de leitura, em HAROLDO (usando fraque de fim de século XIX): quem tive oportunidade de conversar, me
total liberdade; é um trabalho muito cons- Já na prosa eu me concentrei mais disseram do espanto que eles têm quando Pausa para tomar café
tante, muito intenso sobre o problema da sobre Mário e Oswald, porque é o livro encontram o Machado no século passa-
linguagem; cada palavra do texto é traba- que estou escrevendo sobre análise da do, que era uma espécie de precursor de No saguão, à direita, começam a passar
lhada assim, do ponto de vista sonoro, do prosa brasileira; fiz um apanhado pra Borges, no seu estilo quase que de ficções cenas do filme O Estrangulador de Louras
entrechoque de sons, da paródia, do uso frente até Guimarães Rosa, apresentei brevíssimas, é uma técnica inteiramente para um público que entra.
de vários idiomas, lentamente trabalhada, finalmente as Galáxias, e fiz uma volta nova do romance, que estava sendo fei-
de modo que cada página dessas equiva- atrás a Machado de Assis, mostrando que ta pelo Machado, e no século passado na HAROLDO DE CAMPOS (com roupa de per-
le a um verdadeiro poema; e justamente Machado de Assis precisa ser lido como um literatura de língua espanhola só se vai sonagem de filme noir, óculos escuros):
tenho aqui um fragmento que está inédi- verdadeiro escritor de vanguarda que ele encontrar isso na década de 30 com Mace- Ontem fui com você para ver dois filmes
to, meu, que escrevi em 69, e que tem a é, principalmente o Machado de Memórias donio Fernández, que foi um precursor de de Julinho Bressane, Matou a família
ver com o problema do manto de plumas Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba e Borges, e depois com Borges, né; quer di- e foi ao cinema, que já foi exibido no
do hagoromo; eu quero então ler um dos Dom Casmurro, lembrando, por exemplo, zer, realmente Machado é um caso espan- Brasil, Família do barulho que eu acho
fragmentos que eu quero inclusive dedicar que o Osvaldo tem grande admiração pelo toso de artista brasileiro de vanguarda. que também foi exibido e outro que eu vi
ao Hélio, que parece que tem uma relação Machado, e Mémorias Sentimentais de Concordo com você, Hélio, Borges abriu mas você não viu, que é O Estrangulador
com o trabalho dele: João Miramar tem até uma afinidade de muito o mercado da literatura latino-ame- de Louras, que é o primeiro filme dele na

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Inglaterra, de que eu falei no carro. O retórica verbal do cinema; na realidade tudo escuro quase que prepara uma outra influência do movimento futurista italiano
Estrangulador de Louras é um filme muito é um filme cuja motivação final é o nota visual que é a cena seguinte, bonito cujo primeiro manifesto é o de 1909? Não
interessante, na medida em que ele é uma cinema, mas não tratado de um ponto assim que é uma pausa mental dentro de há nenhum, não há nenhum movimento
espécie assim de eliminação da retórica de vista intelectual, mas de um ponto um ritmo quer dizer, não é um comentá- literário desde o vorticismo inglês, o fu-
do cinema, dentro do cinema brasileiro de vista direto, assim como se fosse rio metalinguístico mas é uma coisa in- turismo russo e o modernismo brasileiro.
é o mais radical na abolição da retórica, uma tomada de posse com as mãos: da tegrada no próprio desenvolvimento da
do verbalismo, essa coisa que a meu ver moela do cinema, estrangulando-o no ação, é uma pausa mesmo como música Novo intervalo para o café, HC passeia
prejudica muito o ‘cinema novo’ brasileiro, ato; isso ele faz desde o contraponto de e é um sentido que me parece diferen- para examinar os quadros
o excesso de retórica, na tradição da poesia cor, do laranja ao louro dos cabelos, da te, eu não vi esse filme do Godard que
de 45, que mostra que os cineastas, mas iluminação radical, é uma repetição até você falou... Do Eisenstein, todo mundo Entram trabalhadores para trocar os mó-
maioria no Brasil, tem uma boa formação a exaustão das mesmas coisas; tem um se inspirava na coisa do Eisenstein, você veis de um canto do saguão, montando
visual e uma má formação poética, e certo momento que ele focaliza durante vê a técnica da montagem... Quem é que no seu lugar um cenário tropicalista. No
então não conseguem se libertar dessas certo tempo um ralo de banheiro, um poderia dizer que em literatura que não outro, entra um coro para cantar trechos
coisas quando fazem os seus filmes. Como ralo de cobre, que ao mesmo tempo tem tenha, qual é o movimento literário que da composição “Nascemorre” de Gilberto
você diz, a coisa projetada teria que ter uma ideia assim de um sol dourado e de não chegou a certo momento a ter uma Mendes.
um caráter poético. Agora, no filme de uma garganta que deixa escorrer a água
Julinho tem essa grande vantagem, de e é sufocada; ele consegue fazer um
eliminar totalmente o discurso verbal, verdadeiro ideograma visual, facilitando
a trilha sonora do filme tem rugidos, as imagens, sem nenhuma necessidade de
colhidos em zoológico, sons, e quando explicações discursivas; isso não deveria
aparece a palavra, é escrita, uma citação nem ser traduzido, pois não é uma volta
de Ezra Pound ou a palavra escrita; o que ao cinema mudo, é uma necessidade da
é muito interessante no filme, é que é uma verbalidade, pois o visual é eloquente por
espécie de musical que não tem música, é si mesmo; é a desnecessidade mesma do
um estudo em cor do cabelo das louras, verbal; o visual tem a sua própria sintaxe;
que são sempre as mesmas, centenas de ele então não precisa de comentário,
louras que são estranguladas em ritmo de principalmente do retórico, quando a
balé por um mesmo sujeito, que é o guará, fala é integrada no cinema, sim, mas
que é um misto de Lewgoy e Aznavour, quando é um comentário retórico, que
né (risos); é uma espécie de Nosferatu não tem nada a ver então uma avançada
tropical com bigodes de barbeiro, com sensibilidade visual e uma sensibilidade
bigodes de opereta, que em vez de ser verbal retrógrada; quando acontece isso,
um Nosferatu sombrio do expressionismo é realmente mau; nesse filme o Júlio
alemão, é uma espécie de neo-vampiro consegue radicalizar esse aspecto de ter
tropical, tropicalesco, untado de cor de um mundo cinematográfico total
abóbora, laranja, com calças vermelhas, e Quando você falou que Godard mistura
ao mesmo tempo com bigodes napolitanos, Lenine e Rosa, de modo que há uma con-
né; é um personagem que poderia ter tradição entre a coisa mais ortodoxa de
saído do Serafim Ponte Grande; assim Lenine e a coisa mais espontânea de Rosa
como a Gertrude Stein em sua prosa, Luxemburgo, agora eu acho que você fa-
repetia sempre as mesmas palavras, ele lou uma coisa interessante, que se esque-
mantém a mesma cor do começo ao fim: ceu de lembrar que a vida muda de rit-
o filme mantém um extraordinário humor; mo como se fosse um ritmo musical num
no fim o que está sendo estrangulado no mundo vivido... Uma fluidez e aquele mo-
filme, pelo estrangulador de louras, é a mento que desaparece e a imagem, fica

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Depois, o programa do Chacrinha aparece num poema concreto é a concreção da lin- um dial de telefone, como fantasia dele, HAROLDO (com beca e cap chapéu de for-
na tela (mudo). guagem, a velha linguagem como mate- ele usa o gesto, não é? O gesto como matura)
rial, e a palavra concreto veio disso mes- indicador de todo um processo; por isso Olha, Hélio, hoje a gente pode conversar
HAROLDO DE CAMPOS (usando fantasia mo, uma concreção da linguagem, visual, que o Chacrinha tem uma inteligência de um pouco sobre o meu trabalho lá como
tropicalista): sonora e semântica. media; ele compreendeu a televisão, e professor visitante do Departamento de
Sobre o problema da tropicália, que tro- levou a ideia de circo, que era admirado Português e Espanhol... tive assim cam-
picália não era tropicalismo, e a realidade Agora, Hélio, na tropicália eu acho que pelo Oswaldo, pelo Maiakóvski uma coisa po livre pra fazer dois cursos tipo experi-
ficou sendo mais tropicalismo que tropi- existe inclusive, um elemento interessan- que para arte moderna tem uma enorme mental, que foi realmente os cursos que
cália, você me pergunta se deve usar tro- te, há uma coisa brasileira mas sem ser importância, a ideia do circo, não apenas eu dei, um seria análise de poesia em que
picália ainda, como meio de informação? provinciana; tropicália dá assim uma ideia com inspiração mas como momentos eu tratava de poesia brasileira do bar-
Qual o valor da tropicália no mundo de de uma coleção de coisas dos trópicos, de improvisação e impressão; pode- roco até poesia concreta e as manifes-
arte de Nova York? Eu acho que no seu mas vista de um ponto de vista, assim se ver como memórias de Maiakóvski e tações de música popular de Caetano e
trabalho inclusive, essa ideia de tropicália como um museu crítico do trópico, museu Oswaldo, o circo como adoração infantil, Gil, por exemplo, mas tratava-se de um
já vem de bastante tempo, está ligada à vivo, né; e um anti-museu também; tro- foi poderoso na arte deles: o Chacrinha ponto de vista sincrônico, como se todos
ideia de labirintos e uma série de expe- picália tem uma ideia de parafernália; tro- tem essa inteligência, pegando a media esses sistemas coexistissem no tempo,
riências suas, e essa coisa do ismo é uma picália é uma palavra que termina em ália da televisão, que é fragmentária, levar o como se Gregório de Matos e Caetano,
coisa que se passa sempre, toda vez que (risos); isso é muito interessante; o que circo para a televisão; e fazer uma arte por exemplo, fossem contemporâneos,
os críticos conservadores, os artistas que parece, dá uma impressão de que como de vanguarda assim num nível de cultura não é verdade? Como se Sousândrade e
não têm o mesmo, não tentam fazer uma tal é válido; embora o tropicalismo seja popular; uma espécie de brutalismo de os poetas concretos vivessem um mesmo
contínua invenção, eles procuram acres- uma etiqueta, uma coisa que nada tenha a vanguarda; nele não há primitivismo, que espaço crítico, digamos assim, e isso foi
centar a palavra ismo toda vez que se faz ver com a ideia de tropicália; o melhor que é ingenuidade, mas um brutalismo, uma realmente uma revelação para os alunos,
uma coisa nova dentro da arte, porque você fazia, neocanibalismo oswaldiano, utilização constante e brutal do meio, inclusive eu fiz uma coisa interessante:
essa palavra ismo é uma maneira de eti- uma verificação crítica do museu brasilei- como as coisas feitas no Brasil, com um invés de dar um desenvolvimento do
quetar e transformar a coisa em objeto de ro, isso é que é tropicália; isso não temos caráter a priori. É como você diz, esse barroco...assim cronológico, eu dei um
museu e permitir que não se fala mais do aqui em Nova York. a priori brasileiro tem um sentido de desenvolvimento inexato, comecei falan-
assunto: assim tropicalismo é uma coisa underground que se contrapõe à cultura do de certos aspectos de Sousândrade,
que já está inventada, já tem um ismo, HAROLDO: (acrescentando chapéu e ma- profissionalizada, para demolir o que depois passei a falar de certos aspectos
pertence aos dicionários dos ismos (ri), e cacão de palhaço) Hollywood era, condicionado ao gosto barrocos, então voltei à poesia concreta,
então permite um campo aberto a todas Falávamos no carro sobre o programa do consumo, que de repente foi preciso no fim terminei com música popular, de
as diluições, é uma maneira com que a de televisão do Chacrinha; quer dizer, apreciar o underground, as coisas mais modo que, pra quebrar a visão cronoló-
própria, o próprio establishment acadê- quando você compara a TV brasileira com livres. A palavra nem faz sentido no gica, e isso deu a eles uma visão bastan-
mico reage contra a invenção procurando a americana, em programas de auditório, Brasil, pois automaticamente em relação te nova do fenômeno... fugi dos currícu-
neutralizá-la através do ismo; nós, por em grandes shows, o Chacrinha é o à cultura de consumo americano-europeia los comuns...e o resultado realmente foi
exemplo, nunca aceitamos a ideia de ‘con- grande palhaço da televisão, é o sujeito a coisa já é, aqui, underground. muito bom, basta dizer que um dos meus
cretismo’; para nós era a poesia concreta; que levou a ideia do circo para a televisão, alunos está fazendo um estudo compara-
o que nos interessava não era um ismo, e isso tudo nasceu de um programa Pausa. Servem o lanche. tivo de Sousândrade e Walt Whitman. O
mas a ideia da concreção da linguagem, de rádio dele, que ele sozinho fazia: Passeiam pessoas vendo as obras de arte, poema é tão extraordinário, uma espécie
a linguagem como material concreto de a “Discoteca do Chacrinha”: ele tinha poesia concreta, abstracionismo geométrico. de anti-epopeia, mas, enfim, eu acho que
trabalho; é por isso queisso que pra mim, uma versatilidade, que a ausência de Na grande tela, fotos do jovem Joaquim inclusive o Whitman deve ter influencia-
por exemplo, Dante é um poeta concreto, meios o obrigava a inventar tudo: então Nabuco diplomata na grande sociedade do o Sousândrade, porque a obra dele é
e assim fala para muitos poetas concretos quando mudaram para a televisão, ele de Nova York. Páginas de O Novo Mundo. um pouco anterior embora o Sousândra-
internacionais que ficam estupefatos, que percebe que a televisão é uma linguagem Fotos de Maria Martins e Jean Cocteau e de me pareça estilisticamente, no Inferno
pensam que a poesia concreta é um de- de fragmentos; é o que se chama círculo em NY. Fotos de obras de HO e Ly- de Wall Street ele é muito mais radical, o
terminado momento; não é, é uma atitude tecnicamente uma linguagem metonímica, gia Clark no MOMA. Fotos de artistas e es- próprio Pound não fez coisa semelhante...
total diante da literatura; o que interessa isto é, a parte pelo todo; então ele usa critores latino-americanos em Nova York é tão moderno que parece uma visão, não

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parece um poema, parece uma coisa de sa dele: ‘Sócrates e Tarzan’ e ‘Odaliscas do usa o urso como símbolo da constelação possa ter razão.
visão e não é o cotidiano, era tão fantás- Catumbi’: são tipos de revelação que são das ursas, como símbolo de Nova York, em Junta-se o coro no saguão em flash mob,
tico que não precisava inventar nada, ele feitos num contexto que é completamente vários sentidos; tenho impressão que você recita estrofes do Inferno de Wall Street
transpôs o cotidiano em termos de poe- diferente do contexto europeu.
sia, a genialidade dele foi compreender a
sintaxe desse cotidiano de Nova York e da No fundo, no piano do saguão, entra pianis-
política norte-americana da época. Você ta e toca “New York Skyline” de Villa-Lobos
não entende o signo novo, ele é ininteligí- HAROLDO (vestido de turista em Nova York):
vel, pra você ele seria um louco. O Sousândrade vivendo em Nova York, é
Ninguém estava fazendo mesmo num con- um poeta que quase significa assim algo — Orpheu, Dante, Æneas, ao inferno
texto internacional. O poema de Mallarmé que vive; eu me lembro que quando visitei Desceram; o Inca há de subir...
é posterior... ‘Lance de Dados’, que seria o a Itália pela primeira vez, eu ia à cidade = Ogni sp’ranza lasciate,
poema que Mallarmé se inspirou na par- e via os cantos de Ezra Pound nas coisas, Che entrate ...
titura e na disposição tipográfica do jor- na vida, na Torre de Pisa; justamente — Swedenborg, há mundo por vir?
nal, é escrito vinte anos depois da seção assim em Nova York sente-se a presença
de “Wall Street,” é de 1897 e Sousândrade de Sousândrade, inclusive no estilo
escreveu em 70. Sousândrade é brutal e montagem, porque Nova York é a cidade — ’Caramba ! yo soy cirurjano —
compacto-brutal-direto. Mallarmé é o ultra da montagem. Com essa montagem abriu Jesuíta ... yankee ... industrial’!
refinamento intelectual importantíssimo! espaço para o artista brasileiro em Nova — Jó ... ou pousada
Mas é como espécie e ... como... e como... York, trabalhar juntando os dois mundos. Malassombrada,
você ligar Cézanne e quer dizer é aquela Você falou que num trecho ele fala pear ‘Byron’ magnetismo-animal! ..
coisa que Debussy na música... enquanto soap, não é pera (“pér”) mas “píer,” que
que Sousândrade é parecido com a coisa é uma marca de sabão que parece phebo, — Que indefeso caia o estrangeiro,
do músico americano chamado John Cage, que Sousândrade relaciona com lavadeiras, Que a usura não paga, o pagão!
que é uma espécie de montagem brutal esse sabão vende muito no village, tem = Orelha ursos tragam,
de pedaços macro-crus da realidade... assim um floreado, como sabão antigo Se afagam,
Eu acho muito bem nesse particular uma brasileiro. Você me lembra que em Inferno Mammumma, mammumma, Mammão.
frase do Décio sobre a poesia de Oswal- de Wall Street tem um negócio que diz
do, que ele diz que a poesia do Oswaldo é assim, ‘templo de kun, 666’, que era difícil — Bear... Bear é ber’beri, Bear... Bear...
uma poesia da posse contra a proprieda- de descobrir? E você encontrou no livro = Mammumma, mammumma, Mammão!
de, uma poesia por contato direto (repete) sobre Nova York de Dore Ashton, crítica de — Bear ... Bear ... ber’... Pegàsus...
enquanto que a poesia do europeu é uma arte, que é 5a Avenida com 53, é chamado Parnasus...
poesia por decantamento de toda uma tra- top of the 60s, que é 666 5.a Avenida, = Mammumma, mammumma, Mammão.
dição, enquanto a coisa brasileira é uma chama-se agora Tishman Bldg, mas é
apropriação total da cultura por processos conhecido como 666. Os businessmen
revelativos diretos; daí a importância do ainda o chamam assim, top of the sixties,
conceito da antropofagia, em termos cul- 666, embora tenha outro nome. Esse
turais; uma devoração cultural, uma ma- número, 666, faz lembrar a besta do
neira de devorar os outros valores, mas do apocalipse, né, tem uma ligação mas
ponto de vista de uma cultura brasileira; deve ter uma referência concreta, como
isso é que é importante: modificando as ele faz constantemente, com palavras
relações: dando uma nova ordem nas coi- e tudo; ele pega o ‘urso’, que na bolsa
sas: isso é muito importante; isto é, não significa invasão da bolsa, aquele sujeito
é uma transposição, mas uma renovação que vende a série de bilhetes antes de ter
das ligações; como dizia o Oswaldo na pro- ganho, o ‘urso’, que era o especulador, ele

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HAROLDO

Tem outro nome que aparece lá, que uma tante, inclusive por inaugurar essa série uma calça rancheira a miss de pernas rasouradas a pétala gilete trança
amiga aqui em Nova York me elucidou, de tapes, tapes históricos, ‘heliotapes’ (ri- pela quinta avenida perto de macdougal alley artelhos dourados na calçada
que é mais ou menos nesse sentido: sos). O meu filho Ivan tirou fotografias, ninfa do cimento armado muslos glabros movendo a mini-saia mas quemquiser
liederkranz, que nós não sabíamos o foi a única pessoa a tirar fotografias... e poderá também ver uma velhota de coque e saiote de praia portando descalça
que era, e ela vivia passando por uma espero que saia alguma coisa, creio que sua sacola de hortaliças ou ninfetas de short brunindo as coxas na praça
mercearia e viu um queijo que tem a deve sair, que o Ivan é muito atencioso. washington enquanto um tirolês barbirruivo falso tirolês arrasta um violão
marca liederkranz que é dos mais antigos Então, que horas são? Três da tarde já? sem cordas passando-se o washington arch está-se na fifth avenue e ainda
que eles faziam, e cuja fábrica era de (Senta-se) aqui no village fica the colonnade onde o presidente tyler luademelou diz-se
uma família das mais antigas de Nova clandestino despois de ter casado na moita com uma girl trinta anos mais
York; de modo que quando ele falava em O coro se junta em flashmob para recitar moça a coisa como se vê vem de longe selvagem mastigar de bíblia e dólares
liederkranz, ele se referia àquela família, o fragmento das Galáxias sobre a Estátua espermando o hímen puritano saindo de wall street a primeira coisa é a
ou ao tipo do queijo. Eu vi a marca, toda de Liberdade, Nova York, enquanto outros trinity church fina agulha gótica entre mamuts quadriláteros um oásis de
floreada, marca de queijo. continuam a passear entre os quadros no silêncio e vitral depois da malebolge bolsa tutta di pietra di color
saguão com copos de vinho. Na tela pro- ferrigno círculos em forma de ferradura doze no saguão principal e seis
Entram os garçons para servir os jeta-se uma imagem da Estátua de algum no anexo setenta e cinco diferentes ações cabendo a cada círculo american
queijinhos, vinhos e chás. artista. As modelos entram novamente e can abbott laboratories boston edison campbell soup corn products crown
passeiam de lado a lado do palco em fren- zellerbach gimbel bros grand union polaroid united fruit canadian pacific
Bem, como você diz, aqui nós encerramos te do coro, com tocha levantada na mão continental oil general foods philips petroleum reynolds metals bethlehem
essa entrevista, que é uma coisa impor- estilo Estátua: steel corp números e letras na esteira luminosa uma constelação móvel no
grande quadro negro cambiando ordens com um tinido de chapas metálicas
este livro não tem mais de uma página mas esta milfolha em centifólios
a liberdade tem uma cor verde verdeverdoso um ectoplasma verde fluoresce (gritando)
do cobre iluminado pois falo da estátua olhos de cobre esbugalhado when this circuit learns your job what are you going to do agora agourora
da estátua que assoma agora quase para dentro do barco giganta de coroa
estelar lampadifária ai párthenos éssomai ficarei para sempre virgem FIM
cantou safo a de tranças violeta mas esta robusta amazona de cobre
parece para sempre gelada numa precoce menopausa de pátina cinzaverde
puritana de olheiras cavadas mr. assamoi ou mr. anoma retintos no terno
grafite dançavam o twist com uma platinoloura da costa do marfim para este
sim para este pique-nique sur l’eau a tocha parecia um falo emborcado
e flambava luz láctea vejam a famosa skyline de manhattan downtown manhattan
bastidores acesos revezando quadros e esquadros contra o horizonte garrafa
mondrian me fecit mr. anoma ou mr. assamoi no hully-gully agora rindo de
dentes perfeitos come-se alguma coisa como frango frio e desossado
algo macio desmanchado no palato para além deve ser battery park e aquela
linha reta ali é broadway vladímir lorca vozniessiênski mas antes de
todos sousândrade estiveram aqui uma pizza-hot-dog você comerá se quiser
flanando por washington square and environs o que vem a ser um sanduíche
de pizza com muito ketchup espécie de tomate sintético e não me diga que
estes americanos não sabem devorar antropófagos de mandíbula de aço
trouxeram paris para greenwich village e puseram ketchup por cima
e agora no molho pomidourado torrefazem seu verão made in usa cosmopolindo-
se em hábitos de lutécia admire este volcano em celofane miscigenado com

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SOBRE OS Gastão Debreix dedica-se à poesia, às artes visuais, ao

design e ao ensino das artes. Como artista plástico e poeta


Lucio Agra vive e trabalha em SP. Performer, poeta, pro-
fessor do curso de Comunicação das Artes do Corpo, da
ce, com uma carreira estabelecida como roteirista e diretor

de cinema e TV. Graduado em Rádio e TV pela Escola de Co-

AUTORES
visual, tem participado nos últimos 25 anos de inúmeras PUC-SP, atua artisticamente no Brasil e no exterior. Publi- municações e Artes da USP (1980), ganhou uma bolsa para

exposições em Bauru, São Paulo (SESC-Pompéia, FAAP, cou História da Arte do Século XX - Idéias e Movimentos estudar Televisão na San Francisco State University, EUA.

Galeria Virgílio, IA-UNESP), Austin (Texas-EUA), etc. Além (Editora Anhembi-Morumbi, 2004), Monstrutivismo – reta Foi um dos pioneiros na disseminação, no Brasil, do vídeo

de publicações autônomas, tem veiculado seus trabalhos e curva das vanguardas (Ed. Perspectiva, 2010), e prepara enquanto arte. Apresentou e dirigiu programas de TV, entre

em revistas independentes, como ARTÉRIA e outras. Vive novo livro sobre a performance no contemporâneo. (www. eles o emblemático Fábrica do Som, nos anos 80. Em 2011,

Amir Brito Cadôr é artista gráfico e professor da Habilitação e trabalha em Bauru. myspace.com/lucioagra – http://contemporaryperforman- dirigiu o longa-metragem de ficção “Amanhã Nunca Mais”, e

em Artes Gráficas da Escola de Belas Artes da UFMG e realiza ce.org/profile/LucioAgra) em 2014 lançou o livro Tadeu Jungle – VIDEOFOTOPOESIA.

pesquisas sobre livros de artista. Participou de mostras co- Gil Jorge (Gilberto José Jorge) é poeta, editor e promotor

letivas de gravura e de poesia visual. Em 2011, realizou ex- de eventos culturais. Boa parte dos poemas que realizou Poeta, escritor e tradutor, Luiz Roberto Guedes publicou, Villari Herrmann é poeta e editor. Formado em Direito,

posição individual em Belo Horizonte. Traduziu “A nova arte desde os anos 80 se situa na vertente de uma caligrafia entre outros, o poemário Calendário Lunático (2000), a no- chegou a exercer, por pouco tempo, a função de Promo-

de fazer livros”, de Ulises Carrión. Publicou os livros “A Night gestual e tipográfica. Foi co-organizador da mostra Poesia vela histórica O mamaluco voador (2006), e os contos de tor Público. Poeta extremamente rigoroso, sua produção é

Visit to the Library”, “Specimen Book”, “Historia Natural” e Evidência, em 1984, na PUCSP; co-editor da revista de Alguém para amar no fim de semana (2010). Suas obras bastante reduzida. È autor de 4 Poemas e Oxigênesis (li-

“Elogio da Mão” pelas edições Andante, em 2011. caligrafias impressa em serigrafia pela Entretempo, AGR- juvenis Treze Noites de Terror e O Livro das Mákinas Malu- vro-objeto). Colaborou com algumas revistas-antologias,

RAFICA, em 1987; co-editor do álbum Atlas, com mais de kas foram adotados pelo MEC dentro do PNBE — Programa do papel à rede, como Qorpo Estranho 1, Viva Há Poesia

Arnaldo Antunes é poeta, compositor, músico e artista 80 participantes, entre cineastas, artistas plásticos, poe- Nacional Biblioteca na Escola. (da qual foi editor), Artéria 8 e Córtex. Alguns de seus poe-

visual. Lançou inúmeros livros, CDs e DVDs. Foi um dos tas, músicos etc. Participou com vários poemas ao longo mas – como Koito, Sombras e Oxigênesis – se tornaram

criadores e membro do grupo musical Titãs, banda de im- das edições da revista Artéria, editada por Omar Khouri e Omar Khouri fez Mestrado e doutorou-se em Comunica- referência da poesia intersemiótica.

portância histórica no rock e na música popular brasilei- Paulo Miranda. ção e Semiótica na PUCSP e ingressou no Ensino Superior,
ra. Recebeu o Jabuti de poesia por As Coisas (1992) e o passando pela PUCSP, FIAM, FAAP, mas optando em defini- Walter Silveira é um videoartista, poeta visual, artista

Grammy com o grupo Tribalistas, entre tantos outros prê- Kenneth David Jackson é professor de literatura luso- tivo pelo IA-UNESP, campus de São Paulo. Artista plástico gráfico e profissional de televisão. Formado em Rádio e

mios. Entre seus livros de poemas, destacam-se, além de -brasileira na Universidade de Yale (EUA). O livro mais desde a infância, dirigiu-se, mesmo, para as Artes Gráficas TV pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade

As Coisas, Tudos, n.d.a., Palavra Desordem, Nome (que recente, “Machado de Assis: A Literary Life,” deverá sair e para a Poesia, donde brotaram inúmeros livros. Partici- de São Paulo. Em 1979, foi assistente de direção de An-

inclui DVD com poemas em animação digital) e Dois ou pela Yale UP em 2015. Entre os seus títulos publicados, pou com poemas visuais em inúmeras exposições no Brasil tonio Abujamra no Núcleo de Dramaturgia da TV Tupi. Foi

mais corpos no mesmo espaço. Adverse Genres in Fernando Pessoa (2010), Oxford Antho- e fora. Praticou Jornalismo Cultural não-remunerado por co-criador da TVDO, produtora que marcou o vídeo inde-

logy of the Brazilian Short Story (2006), e A Vanguarda quase 10 anos. É fundamentalmente professor, além de pendente no Brasil nos anos de 1980. Foi diretor de pro-

Diniz Gonçalves Junior. Formado em Comunicação Social Literária no Brasil (1998). É co-tradutor de dois romances editor (é um dos editores da revista Artéria), promotor de gramação da TV Gazeta, entre 1987 e 1996, e atualmente

(FAAP),  paulistano, autor de Decalques ( 2008) e Concha brasileiros para o ingles, Industrial Park (1993), de Patrí- eventos e crítico (ocasional) de linguagens. é superintendente de programação da TV Brasil. Em 2003,

Acústica ( 2012 ) em parceria com o ilustrador Marcelo Ram- cia Galvão, e Seraphim Grosse Pointe (1979), de Oswald desenvolveu o espetáculo intermídia Poesia é Risco, com o

pazzo. Publicou poemas nos seguintes veículos: Suplemento de Andrade. Foi professor da Comissão Fulbright no Brasil. Sonia Fontanezi é artista gráfica e pesquisadora da lin- poeta Augusto de Campos e o músico Cid Campos, apre-

Literário de Minas Gerais, Artéria 7, Artéria 8 (www.arteria8. guagem visual e intertextual, novas técnicas e tecnologias. sentado em diversos países.

net) e Artéria 9, além diversas outras revistas, jornais e si- L. C. Vinholes teve formação musical em composição e Fêz licenciatura em Educação Artística na Fundação Ar-
tes.. Criador do personagem virtual Rabuja Rubirosa.  instrumento. Trabalhou como crítico de música nos jornais mando Álvares Penteado (FAAP). Nos anos 80, foi pesqui- Zhô Bertholini é poeta e artista gráfico. Participou

Diário Popular, Opinião Pública de Pelotas e Diário de São sadora no IDART/Centro de Informação e Documentação do   Projeto Mutirão (1976). Editou Sem ensaio, 1994,

Fernando Aguiar nasceu em Lisboa em 1956. Publicou Paulo. No final dos anos 50, foi contemplado com uma Artísticas sobre Arte Brasileira Contemporânea e, mais Artentativa (livro objeto, 1996),  Poética urbana (1996), 

13 livros de poesia, infantis e antologias de poesia expe- bolsa de estudos do Ministério da Educação do Japão. Foi tarde, foi supervisora da Equipe Técnica de Pesquisas de Céu sem dono (2006), Vagamundo (2010), Propostal –

rimental. Entre os livros de poesia, destacam-se “Poemas encarregado do Setor Cultural da Embaixada Brasileira e Artes Gráficas e Desenho Industrial da Divisão de Pesqui- Via Poética (pela A Cigarra edições). É editor da revista

+ ou – histó(é)ricos”, “Minimal poems” e “Os olhos que Adido Cultural em Tóquio, onde desenvolveu intenso tra- sas do CCSP (ex-IDART). Em 1987, foi uma das curadoras A Cigarra (que em 2007 lançou sua edição comemorativa

o nosso olhar não vê”. Apresentou intervenções poéticas balho de divulgação da música brasileira, a partir de 1961. da exposição coletiva A Trama do Gosto. Cria e desenvolve de 25 anos de existência e resistência  poética e cultu-

em Portugal, Hungria, Japão, Eslováquia, Brasil, México e Foi figura determinante no contato entre poetas brasileiros imagens experimentais em midia impressa e digital. ral) e ZINE ZERO (plaquete poética), atualmente na 5º

Canadá. Organizou, entre outros, o “1º Festival Internacio- e japoneses e ajudou a deflagrar o movimento de poesia edição, Frenezine na 2ºedição. Realizou, em Santo André

nal de Poesia Viva” e a exposição “Concreta. Experimental. concreta no Japão. Trabalhou, pelo Ministério das Relações Tadeu Jungle é artista multimídia com atuação nas áreas (SP), o projeto “INTERVENÇÃO POETA NA RUA – ZHÔ E A

Visual. Poesia Portuguesa 1959-1989”. Exteriores, em diversos outros países. de fotografia, vídeo, instalações, poesia visual e performan- CIDADE” (2015). 

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realização

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