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MICHAEL LÕWV

Dados Internacionais de Catalogação na publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) As Aventuras
U)wy, Michael
As aventuras de Karl Marx contra o Barão de MUnchhausen :
muu.ismo c positivismú na sociologia do conhecimento I Michael
de Karl Marx
contra oBarão
Lôwy ; ltradução Juare2 Guimarães e Suzanne Felicic Léwy]. - 7. ed. -
SDo Paulo, Cortez, 2000.

de Münchhausen
Bibliografia
ISBN 85·249.0518-2

I, Comunismo. 2. Política - Filosofia. 3. Positivismo


4. Sociologia do conhecimento l. Título. II. Título: Marxismo e MARXISMO E POSITIVISMO
vi smo na sociologia do conhecimento.
NA SOCIOLOGIA DO CONHECIMENTO
CDD·306.42

rndlces para catálogo sistemático:


I. Conhecimento: Sociologia 306.42
7!!edição
2, Sociologia do conhecimento 306.42
TilU[(} Iltigmal" !';o.y!.:1gt:s de 1:1. Verité. !ntrOOuetíon à \lue 5QÇ(ologic triliqu.: de la
connaissance,

CilP«' C;',I'los Cl:fmen


Tradu('4c' Juarez. ("limams e Suzannc f"clicie Uwy Sumário
Rf!visdt!' An"- Pauu T;l:leu MasulI'1J
nany TIdltóTl Lida,
C,Xlrdi:rulç&t EdflOria1: Danilo A. Q, Morates
Infrodução,' Visões sociais de mundo. ideologias. e
utopias no conhecimento científicoMsocial 7

o pMitivismo ou o princípio de Barão de lrlünchhausen 15


A utopia positivista: Condorcet e Saint-Simon 19
A ideologia positivista: de Comte até nossos dias 22
Max Weber: a ciência livre de julgamentos de valor 33
Karl Popper e a objetividâdc institucional 49

() histlJridsmu ou a luz. prismada. 63


o histericismo conservador 66
O historkismo relati-vim 70
A sociología do conhecimento de Karl Mannheim 78

o ou o desafio do <lpríncípio da c(ufuugem" 97

Ideol@gia e ciência segundo Marx ." 100


NCI\buMíl f>.1rtC obro pode SCl" reproduzida OD dup',lcadl S\llIl
n\lmtl/;i\Çlill c:tJlrnsa do autor ii do t:dltQr. e positivismo no pensamento da Segunda
Internacional "s
O marxismo hlstorkista (Lukács. Korsch. Gramscl.
n;flJhn. fU1I1l CMrt Goldmann) 127
í1!ll'!'O!{Á () marxismo racionalista da Escola de Frankfurt 145
Ililm hurll<ii, :H1 1\:u.!II-1:1>
Ü51iCW 000 .. ,IIl!11 Plmlo - SI' fl1l:l1:,lngin estatinista e déncia ,67
((b@]1) KM,ilJ I \ I7n: (0...._11) ílG4-4290
tl'flInl!i ;;ol'l'l,br
Conclusão: As paisagens da verdade e a alegoria do
mirante (para uma sociologia crítica do
conhecimento) 195
O modelo científico-natural de objetividade e
as ciências sociais 197
O momento relativista da sociologia do conhecimento 204
Paisagens da verdade e autonomia relativa da ciência 212

INTRODUÇÃO

Visões sociais de mundo, ideologias


e utopias no conhecimento
científico-social

7
Quais são as condlções para tornar possível a objetividade
nas ciênciai sociais? O IJl(ldelo científico-natural de objetivídade
é operacional para as ciências histórícas? É concebível uma ciência
da sodedade livre de jolgamentos de valor e pressupostos poií-
ticó-sociais? t possível eliminar as ideologias do processo de
conhecimento científico-sOCial? Não é, a ciência social, necesSá-
riamente "engajada", isto é, ligada ao ponto de vista de uma
classe ou grupo social'] E, neste caso. seria possível conciliar
Clise caráter partidário c6m (I conhecimento objetívo da verdade?
Essas questões estão no çentro do debate metodológico e
epistemológico. no conjunto das ciências socials modernas, de
nua origem até os nossos dias, As tentativas de lhes apresentar
IJIUtt resposta coerente de uma maneira ou de outra a
tlt.q grandes correntes de pensamento: o positívismo. o historicismo
U \l marxismo, O objeto deste livro é o exame dos dilemas. das
i&.mtrudiçóes. dos limites., mas também das fecundas contribuiçõe.s
dê Iil'tldll uma destas perspectivas metodológicas para a construção
Uln modelo de objetividade próprio das ciências humanas e
yma sociologia crítica do conhecimento.
() çomplexo clpoal de questões envolvidas nessa busca é,
!!H!lttm apresentado nos termos de uma oposição elou
éntre dois universos distintos e heterogêneos: ideologia
ÊI ['lbllt'ílJ, Ora. exístem poucos conceitos na história da ciêncía

9
social moderna tão enigmáticos e polissêmicos quanto o de em oposição ao conceito de utopia, que define as repre-sentações.
"ideología"; este tomoll·se, no decorrer dos últimos dois séculos, aspirações e imagens-de-desejo (Wunschbilder) que se orientam
objeto de uma inacreditável ácum1l1ação. fabulosa mesmo, de na direção da ruptura da ordem estabelecida e que exercem uma
ambigüidades, paradoxos, arbitrariedades, çontra·sensos e e,quívo· junção subversiva (umwalzende Ftlnktion). Por outro lado.
COSo Para demonstrá· 1o, basta um breve histórico: nheirn reuniu ideologia (neste sentido) e utopia sob a categoria
L Bm sua origem. o termo foi (literalmente) inventado por comum de formas da falya consciência, isto é. de "representações
Destut de Tracy, que vai publicar, em 1801, um tratado, Elementos que transcendem a realidade", em oposição às representações
de ideologia, apresentando esta nOlla "ciência das idéias" corno adequadas e (Seinskongruenten),
uma parte da zoologia... Logo, inscreve-se em uma perspectiva ou seja. formas "ideológicas" no sentido marxista do termo, que
metodológica de tipo empirista e isto é, Mannheim havia criticado como sendo muito parcial e estrito ...
positivista. Ora. alguns anos mais tarde, em polêmica contra que a confusão e II ambivalência são quase completas,
Destut de Tracy e seus amigos Napoleão irá não apenas entre pensadores de diferentes correntes, mas no seio
por "ideólogos", termo que concebe como equivalenté a de uma só e mesma tradição teórica e no interior de uma só e
metafísicas abstrati)$, fora <la realidade. Este novo significado mesma obra, considerada como um grande clássico de sociologia
parece ter entrado no vocabulário corrente da primeira metade do conhecimento moderno, A mesma palavra é encontrada, não
do século XIX, quando Karl Marx vai retomar, a seu modo, o apenas como as mais diferentes significações, mas, algumas vezes,
termo, com significações diretamente contraditórias, sem uma única
2. Para Marx, a idéOlogia é uma forma de falsa consciência, justificativa para estes habituais processos semânticos.
CQtTe.-<;pondendo a interesses de classe: mais precisamente, ela Não é surpreendente, nestas condições. que a porta esteja
designa o conjunto das idéias especúlativas e ilusórias (socíalmente totalmente aberta ao arbitrário; vê--se, assim, aparecerem sociólogos
determinadas) que os homens formam sobre fi realidade, através que se arrogam o direito de dar outra definição, a.d libirttm,
da moral, da religião, da metafísica, dos sistema.(, filosóficos, das segundo seus próprios gostos ou inspiração. Por exemplo: "eu
doutrinas políticas e económicas etc. Ora, para muitos marxistas decido entender por ideologia os estados de consciência ligados
do sérulo XX, a começar por Lenin, a ideologia designa o n açâa política. Isto é uma decisão arbitrária .. ,''1 portanto,
conjunto das concepções de mundo lígadas às classes sociais, Sllprimida dQ domínio do ideológico a malotia dos sistemas
incluindo o marxismo. É com esta significação que o termo entrou nios6f1eos, metafísico[" religiosos e éticos (em sua dimensão
na língua corrente dos militantes marxistas ("luta ideológica", uno-políríca) que constituíam. exatamente, para Marx, as formas
"ideologia revolucionária", "formação ideol6gica" etc,), típicas da ideologia. Logo, "decidir'"' que a ideologia
3. Com a obra de Karl Mannheim, o semido "leninista" do ti HnlU coisa ou o seu contrário a seu bel-prazer. ..
termo ganhou legitimidade na soclOlogia universitária através do Na tentativa de fiOS reencontrarmos neste magma semântico,
conceito de "ideologia total", definida como a estrutura catego- ser preciso tomar como ponto de partida a obrá de
rizada, a perspectiva global, o c-stUo do pensamento ligado a uma Mt!flflhcim, que, apesar de suas contradições, constitui (depois de
posição social (Stmuiortsverbundenheii). Entretanto, no mesmo MurK) u tentativa mais séria de abordar de forma slstemática os
livro (Ideologia e utopia, 1929), Mannheim atnbui uma outra prl,1hlcln!\S envolvidos pelo conceito de ideologia. A definição da
significação, bem mais restrita, ao mesmo tenno-: ideologia deBigna, {cm oposição à utopia} como uma forma de pensamento
nesta acepção, os s\stemas de representação que se orientam na t!flEll1hlÚn pura a reprodução da ordem estabelecida nns parece a
direção da estabilização e da reprodução da ordem vigente Ill!!!S ilj')l\lpriada porque ela conserva a dimensão critica que o

10 11
J
termo tinha em sua origem (Marx), Como salienta,. com razão, tome uma 00 outra destas formas), nem conservador nem revo-
Claude Lefórt, na definição vaga e amorfa: "o conceito não lucionário. Ele circunscreve um conjunto orgânico, articulado e
guarda vestígio da primeira acepção, de onde recebia sua força de valores. representações, idéias e orientações cúg-
crítica; fi ideologia é reconduzida às idéias 'defendidas' para nttlVas, tnternamente unificado por uma perspectiva determinada.
assegurar o triunfo de uma dass<'L .•"2 Quanto ao conceito de por um certo ponto de vista socialmente condicionado.
utopia. este é tomado aqui - como em Mannheim - no seu Acrescentando o termo social - visão social de mundo -
sentido mais amplo e mais "neutro", conforme a etimologia grega queremos insistir em dois aspectos: a) trata-sç da
visão de
da palavra: ou topos (em parte alguma). O pensamento utópico social. isto é. de um conjunto relativamente coerente de idéias
é o que aspira a um estado não-e-xistente das relações sociais, o sobre o homem, fi sociedade. a história, e sua retação com a
que lhe dá.. ao menos potencialmente. um caráter crítico, subversivo, natureza (e não sobre o cosmos ou a natureza enquanto tais);
ou mesmo explosivo, O sentido estreito e pejorativo do termo b) esta visão de mundo está ligada a certa.; posições sodais
(utopia: sonho imaginário irrealizável) nos parece inoperante, uma (Standortgebundenheit) - (I termo é de !ltiannheim - , ísto é,
vez que apenas o futuro permite que se saiba qual aspiração era aos interesses e à situação de certos grupos e classes sociais.
ou não "irrealizável". Resta definir um conceito que possa As visões de mundo podem ser ideologias (um exemplo
sificar ao mesmo tempo, as ideologias e as utopias. Utilizar, clássico: I) liberalismo burguês no século XIX) ou utOpias (o
como O faz Mannheim, o termo "ideologia total" para esta função
quiliasmo de Thomas Münzer) Elas podem combinar elementos
conceituai s6 faz gerar confusão, na medida. em que se Yê atribuir
ideológicos e utópicos; por exemplo, a filosofia do Iluminismo.
à mesma palavra dois sentidos em nada idênticO's. Quanto ao
Além do mais, uma mesma visâo de mundo pode ser concebida
conceito de "falsa consciência", este nos parece inadequado porque
de modo ídeo16gico ou utópico: basta comparar o romantismo
as ideologias e as utopias contêm, não apenas as orientações
de Adam Müller com o de Novalis, Enfim, a mesma visão de
eognitivas, mas também um conjunto articulado de valores culturais,
mundo pode ter um çaráter utópico num dado momento histórico,
éticos e estéticos que não substituem categorias do falso e do
para tomar-se, em seguida, numa etapa ulterior, uma ideologia
verdadeiro, (é o caso do positivismo e de certas formas dó marxisruo, como
Parece-nos que o melhor conceito para designar o que veremos mais adiante).
Mannheim chama de "a ideologia total", quer dizer, a perspectiva
A questão que este livro examina é, portanto, .li da relação
de conjuntO', a estrutura categorial, o estilo de pensamento
cialmente condicionado - que pode ser ideológíco ou utópico entre visões sociais de mundo (ideológicas ou utópicas) e- conhe-
_, é o de visão social de mundo, É permitido considerar ar<:a1co. cimento, no domínio das ciências sociais, a partir de uma discussão
em desuso, "historicista", "humanista", maculado de idealismo critica das prindpais tentativas de elaboração de um modelo de
hegeliano, de fIlosofia do sujeito ou de, outras heresias maiores, tlbjetividade científica que surgiram no seio do positivismo, do
o conceito de Weltanschauung. Em nossa opinião, ele constitui, historidsmo e do marxismo. Tentaremos mostrar, apoiandO'-nos
em sua formulação "clássica", através do historicismo alemão ém uma certa tradição historicista e na.1! idéias fundamentais do
(DHthey), o instrumento conceitua.I mais apto a dar conta da marxismo (mais precisamente: da interpretação historicista do
riqueza e da amplitude do fenômeno sócio-cultúral em questão. marXISmo), ao mesmo tempo, que a objetividade nas ciências da
Contrariamente ao tenuo "ideologia total", este não contém !le-< f.uciedade não p<Jde consistír 110 estreito molde do modelo cien-
úhuma implicação pejorativa e neAhuma ambigüidade conceituai: Htko-natural e que, ao contrário do que pretende o positivismo
o que ele designa não é, por si SÓ, nem "verdadeiro" nem "falso", r,Ul múltiplas variantes, lodo conhecimento e interpr-etação
nem "ide.a1ista" nem "materialista" (mesmo sendo possível que illl realidade social estão ligados, direta ou indiretamente, a uma

12 13
das grandes visões sociais de mundo, a uma perspectiva global
socialmente condicionada, isto é, o que Pierre Bourdieu denomina,
numa expressão feliz, "as categorias de pensamento' impensadas
que delimitam o pensável e predeterminam o pensamento".3 E
que, por conseguinte, a verdade objetiva sobre a sociedade é
antes concebida como uma paisagem pintada por uma artista e
não como uma imagem de espelho independente do sujeito; e
que, finalmente. tanto mais verdadeira será a paisagem. quanto
mais elevado o observatório ou belvedere onde estará situado o
pintor, permitindo-lhe uma vista mais ampla e de maior alcance
do panorama irregular e acidentado da realidade social.4
A perspectiva deste ensaio é, pois, a de uma introdução à
o positivismo
sociologia do conhecimento, isto é. ao estudo das relações entre ou
classes ou categorias sociais e conhecimento científico da socie- o princípio do Barão de Münchhausen
dade.

NOTAS
L Jelln Baech!er. Qu'es!·ce que l'/déologie? Idées Ga!limard, 1976, p. 21 (sublinhado
ooorigioal).
2. C. Lefort. Le.lfarmes de [·hi.ltoire, Gallimard, 1975, p. 1.1\3.
3. P. Bourdieu. Leçon .lUr la leçon, Miouit, Paris. p. 10.
4. Esta obra retoma, aprofunda e, vezes, supera as idéias que esboçamos em um
ensaio iotitu!ado "Ponto de vista de classe e objetividade nas ciências sociais", publicado
na revista Critique de ['&onomie Politique, em 1970. e, em seguida, reeditado em
nossa coletânea de artigos Dialet'lique el Révolution. Éditions Aothropos, 1973.

14 15
s

:--Ios.so objeto, neste capítulo, não é a filosofia positivista


enquanto tal, mas as concepções positívístas no domínio das
ciências sociais, e, em particular, a doutrina da neutralidade
axiológica do saber.
O positivismo - em sua figuração "ideal-típica" está
fundamentado num certo número de premissas que estruturam
um "sIstema" coerente e operacional:
L A sociedade é regida por leis naturais, isto é, leis
invariáveis, independentes da vontade e da ação humanas; na
vida s.ocial, reina uma narnwnia natural.
2. A sociedade pode, púrttlnto. ser epislemologicamente
assimilada pela natureza (o que classificaremos como "naturalismo
positivista") e ser estudada pelos mesmos métodos, dêmarches*
c processos empregado:> pelas ciências da natureza,
3. As ciências da sociedade, assim como as da natureza,
úevem à observação e à explicação causai dos fenômenos,
de forma objetiva. neutra. livre úe julgamentos de valor ou
ideologias. descartando previamente todas: as prenoçóes e precon w

ceilos.

.. OplamúS utiliZllf a palavra dlrw:m..-r4' no (ll;,ginaL francês, de lLiO relativamenw


J:Hlfrnte no O Sct\!ltlü aproxnnJtlo em que é madll :;qui é o de método, modo
I'\" e"l.llJ<;oo, trajelórirL (R do T,}

17
serão abordada::; sob o ângulo histórico e pcr mterméd:o da
A influência destas idéias - particularmente o postulado
categoria metodológica da totalidade.
de uma ciência axiologicamente neutra ultrapassa qu<:.u:-o
dQ positivismo no sentido est rito e se manifesta , pelo em ! ,\ " • r'
parte, en. autores considerave lmente afastados . do
A utopja positivista: Condorcet c Saint-Simon
clássico (como Max Weber) e até mesmo no do marxismo.
Quando um ou outro destes três axiomas está integrado em uma
A idéi a de leis nalurais da vi da social e de uma ciência da
investigação metodológica distinta do posit ivismo, pode-se falar
sociedade formada segundo o modelo das ciênc ia ' da natureza
de uma dimcllsiio positivista . é, na sua origem, illseparável do combate intelectual do Terceirc
Tentaremos examinar como o posit iv ismo surge, cm tins do Estado .s.Q.D1fJ La Tanto a dout rina do
sécu lo XVII I-princípio do século XIX, como Ullla utopia crítico- direito natural q:.:anto a de uma ciência natural da sociedade
revolucionária da burguesia antiabsolu tista, para tornar-se, no possuem uma dirr:en são utópico-revolucionári a, crítica (as duas
decorrer do :-écu lo XIX, até os nossos dias, uma ideologia estãc estreitamente, aliás, ligadas ao século XVIII ). O positivismo
con ervadora idcntificada com a ordem (ind ustria l/burguesa) es- moderno nasceu como um legítimo descendente da filosofia do
tabelecida. Essa "mudança de cor" do posi tivismo não deixa de Iluminismo. De tedos os E,-ciclopedi stas , é, sem dúvida, Condorcet
lembrar o que Marx assinalava a pro pósito da economia política : quem contribuiu da maneira mais direta e imediata na gênese da
sua passagem, sobretudo depois de 1830 - isto é, depois da nova corrente .
ascensão da burgucsia ao poder nos principais países europeus Próximo dos (especial:nente Turgot) e dos clássicos
_ , de economia à economia "vulgar" . ingleses (A . Smith), pensa que economia política
O axioma da neutra lidade valorativa das ciências sociais pode esta( submetióa à "preci são do cálculo" e ao método das
conduz, logicamente, o pO$itivismo, a negar - ou melhor, a ci ências da natureza . Mas não se limita aos fatos econômicos e
iunorar - o condic ionamento histórico-social do conhecimento. passa a generalizar esta démarc:he: o conjunto dos fe nômenos
A própria q llest{ío da relação entre conhecimento cicntífic,o. e soc iais está submetido "às leis gerai s ... e constantes"
classes sociais geralmente não é colocada: é uma problematlca parecidas com as que regem as operações de natureza. Daí, a
que escapa ao cam po conceituaI e teórico do positivi smo. Ele só idéia àe urna ciência natuq!-I da sociedade ou de uma
analisa os fundamentos sociais do pensamento pré-científico: s eial" b<'.seada no cálculo das probabilidades. O estudo dos fatos
pensamento mêígico etc .; mas a própria ciência soc ial nele aparece sociais foi, por muito t.empo, "abandonado ao acaso, à avidez
soberanamente li vre de vínculos sociais. Em outras palavras: uma dos governos , à astúcia dos charlatães, aos preconceitos ou aos
sociologia do conhecimento (c ientífico), uma análise da relação interesses de todas as classes poderosas" ; ap licando o novo método
entre o saber e as classes sociais são contraditórias COIll o quadro ; 1110ral , à pclítica e à economia pú blica, pode-se "seguir nas
metodológico fu ndamental do positi vis mo. rlências UIT'. caminho quase tão segJro quan to o das c iências
naturais". AI \ás, as ciências da sociedGde procuram incessantemente
Para com preender a significação específica e as implicações aplOximar- e des te "caminho das ciências físicas que O interesse
da doutrina positivi sta sobre a ohjetív ídade/neutralidade científi- t' as paixões não vêm perturbar".1
co-social, é prec iso exa minar, por um lado, a sua gênese histórica
e o scu desen volvi ment o e, por ou tro, a sua relação com o F.ste ideal de ciência neutra, tão imune aos "inte resses e
p.IIXÕ 's" , quanto a física ou estará no coração àa
conjunto da problemática positivista enquanto visão de mundo
l"ohk111;ítica positivista duran te dois sécul os. Mas, há ainda e m
coerente, da qual es t.a doutrina é apenas um aspecto . O mesm
'qlld<)lcet urna significação utópico-crítica: seu objetivo confesso
válido para as outras duas COITentes que iremos di scutir e qu'
19
18
é o de emancipar o conhecimento soc ial dos "interesses e não possa ser observado do ponto de vista da física dos corpos
das classes domlnante.s . O cicnticismo positivista é aqUI um brutos ou do ponto de vista da fís ica dos corpos organi zados.
insúu mento de luta contra o obscurantismo clerical, as doutrinas que é a fis iologia" . A própria política "toroar-se-á uma ciência
teológicas, os argu mentos de autoridade, os axiomas a priori da positiva quando os que culti vam este importante ramo dos co-
Igreja, os dogmas imutáveis da doutrina social e política feudal. nhecimentos humanos aprenderem a fisiologia e quando eles não
É neste sentido que é prec iso compreender o apelo ao modelo mais considerarem os problemas a resolver apenas como questões
científico-natural em Condorcet: "Galileu ... fundou, para as ciências de higiene" .4
a primeira escola onde elas eram cultivadas sem nen?U1:na Com toda essa fé ingénua do pensador do lluminismo. S.
de superstição, seja em relação aos preconceitos, seja em Simon crê que esta ciência pol ítica positiva poderá ser neutra e
à autoridade; onde se rejeitou com uma sevendade filosofica objetiva, ultrapas sando os diferentes pontos de vista, as diversas
qualquer outro meio que não fosse o ?a ou" do " formas de ver" contraditórias: "até aqui, o método da ciência
cálculo". Contudo. Condorcet censura Galileu por limItar-sé ex- da observação não foi introd uzido nas questões polílicas; cada
clusivamente às ciências físicas e matemáticas"; trata-se agora de um trouxe a sua maneira de ver. de raciocinar, de julgar, e resulta
ampliar esta atitude - apoiando-se no método de Bacon e de daí que ainda não se obteve nem precisões nas soluções, nem
Descartes - para as ciências econômicas e generalidades nos resultados. Chegou a hora de acabar esta infância
à ciência social livre de "paixões" é, portanto, aa da ciência ... "5 Veremos como esta queixa sobre "a imaturidade"
luta revolucionária dos Enc iclopedistas e de toda a d.a da ciência social, sobre o seu "atraso" para começar a ser como
Iluminismo contra os preconceitos, isto é, contra a 1deologIa as outras (isto é, as ciências da natureza), seguida de exigência
tradicionalista (principalmente c\e.rical) do Antigo Regime. de que ela se curve enfim ao método cient ífico (natural), reto:nará
Acha-se em O esboço de um quadro histórico dos progressos constantemente sob pena dos autores positivistas (século XX,
do e. piríto humano a intuição de que o desenvolvimento no incl usive).
terreno dos fatos sociais choca- se com os interesses de classe: S . Simon fal a freqüentemente do "corpo social" e define a
"quanto mais os objetos submetidos à razão tocarem os ciência da sociedade como uma "filosofia social", "constitufda
reli gio. os e políticos, tanto mais lentos os progressos do espmto relos fatos materiais que derivam da observação direta da socie-
humano"2 ; mas, trata-se. para Condorcet, de um fenômeno do tlJde". M as é importante sublinhar que esta "naturalização" da
pa ssado relacionado com os interesses clericais ou aristocráticos. sociedade e da ciência social , esta utilização abusiva da analogia
A idéia de que a nova ciência econômica e pOlít.ica, "orgânica" não tem neste autor - como terá /l'os positi-" istas
pelos fisiocratas, A. Smith e pejos próprios Enclclopedlstas, posteriores - uma significação apologética co nservadora em
ciência racional, precisa e experi mental pudesse estar.. .lambem, Iclação à ordem estabelecida; muit o pelo contrário, ela tem uma
ligada a interesses sociais. escapa ao campo de vlslblltdade de lunção emi nentemente crítica e contestadora. Apesar das repetidas
Condorcet e dos positivistas em geral. lar,lIllias de S. S imon sobre o caráter "organizador" e não-reco-
Discípulo de Condorcet, S. Simon vê no grande de seus escritos , sua dimensão subversiva é inegável
o pensador ao qual "a ciência do homem deve seu ultlmo passo , 11 ;10 deixou de chamar a atenção das autoridades. Assim, é em

importante".3 Esta ciência do homem, apresentada com.o. um ramo 1I\l111(' das lei s fisiológ icas do organismo social e de sua "higiene"

ora da física, ora da fisiologia, deve-se tornar poslfLva S. qm' l'k apela abertamen te pelo fi m do absolu tismo e por uma
Simon é o primeiro a empregar este termo - . di:er. utlhzar " Illlldallça de regi me" na França: "uma vez que a natureza inspirou
os métodos das ciências naturais, "pois não eXIste fenomeno qu 1'1', hOlllens. em cada época, a forma de governo mais convenier.te.

20 21
será exatamente de acordo com cs';e mesmo qLiC Iremos
i:.terditada pelos "seus revolucionários",'o Nota-se
insistir na necessidade de ume! muda:lça de para um2. aCjui a mudança brusca de fUiiÇão do concei:o de "preconceito",
socied ade que não mai s se encontra nas condições orgânica: C;ue que ocupava um espaço central no dispositivo crítico da Enci-
lderam J' ustificar o reino da opressão .. , por que conservaflamo S clopédia e do positivismo utópico: ele não serve mai s para designar
pl ' ' 1/ . ' ')"6
hábitos higiênicos contraditórios com o nosso estado f IStO Ogl,CO , as doutrinas cSlagnacas do Antigo Regime, mas sim o próprio
O combate, para a ciência positiva ào homem, em S, SlmOp., pensamentO utópico-crít:co 90 lluminis,!,o.-O termo "preconceitos
indissolu velmente ligado à lute::. elos "produtores' (tanto os em- revoh.:cicnários" concentra, numa fórmula suc inta, o adversário
presários quanto o operários) os parasitas, os "sangues- d2. nova expressão do positivismo instaurado por Comte, A ruptura
sugas" clericais-feudais da Restauraç2o, No momento, em que S, -com ,S, .Simon, aiém dos aspectos pessoais anedóticos, '-t.ambém
Simon abandona este ponto de vista (que se podena dcslgnar possui a mesma significação ideológica: em carta a d'Eich tal, em
como "burguês re vol uci onário") para reaproxir:,ar-se da 10 ce maio de \824 , Co:-nte se queixa da "disposição revolucionária"
que qualifica como "a pobre c· a numeros.a, e de S. Simon "com a estou e devo estar em absohaa oposição".
significativo que não mais fale cm nome da c:enClíl, :nas SI':: da Não é por acaso que neste mesmo ano ele descobre com interesse
moral e da religião: é o "Nove: Cristianismo" (1 825), q\.:e J3 se os pensadores da contra-revolução (De Bonald e De Maistrc) c,
situa no terren o do socialismo utópico , em 1825, saúda em Considerações sobre as ciências a grande
obra de De Maistre, O Papa, como "um modelo de raciocínio
de acordo com o método positivo",1I Evidentemente, a ordem a
A idculoj.!,ia positivista: de Com te até nossoS dias que aspira Comle não é de antes de 1789, QS_ d_oJ,!lS!!1ários
do absolutismo queriam restaurar: nova ordem
Não é por acaso que Augusto Comte - e nã?, uma ordem_industri ál, -;" progresso
ou Srmon - se ja considerado o fundador do pOSitivismo, De
volvimentº da ciê-ncia.s-. 12 Em urna carta a Audiffrer.t
fato, é ele que a transmutação visãc de mundo
cm 21 de outubro de 1853, Comte poderá, então, - com justa
positivista em ideologia, quer dizer, em e
razão - apresentar toda a sua vida como tendo sido "consagrada
axiclógico que tende à defesa da ordem estaoeleclda "
teórica e praticamente à defesa sistemática da ordem real",:3 0_
lller.te, discípulo de Condorcel e de S. Simon, Comte Ira romper
com um discurso cuja carga crítica e "negativa" parece método positivo visa, assi m, afastar a ameaça que
ul:rapassoda e perigosa. 7 Considerar, como o as idéias negativaJ, críticas, anárquicas , dissolventes e subversivz.s
a obra de Corrote simplesmente como a conttnuaçao da fil osofia do Ilumin ismo e do socialismo utópico. Ora, para
naturalista da fIlosofia do Iluminis mo e de S, SImon, como executar essa tarefa, Comtc irá utilizar, o mesmo
"coreamenlO sistemático" de um movimente que remonta ao \istema intelectual que servira a Condorcet e a S, Simon para
século XVlIJ,g significa passar ao da ncvidade c ?a espe- as ideologias tradicionalistas: o princípio metodológ ico de urna
cificidade do positivismo cO'l1:iano, que precIsamente ,,0ncia da sociedade, Desde 1825, err. Considerações
o r onto de vista reconhecido da escola pOSitIVIsta mOd,erna ,IIosóficas a respeito das ciências e dos sábios. Comte enunciara
ciências s0c:a!S, Conforme a feliz eXf}ressão áe George ,Llchthe1m, \I fundamento de sua busca: "entendo por física social e ciêr.cia

em Comte "o otimismo generaso do qlll' tem por objeto o estudo dos fenômeno s sociais considerados
numa inqu ietucc ansiosa para com 3. establlldaje SOCial . .I,'lItro do mesmo espírito que os fenômenos· físicos,
'IllllI1ico$ e fisiológicos, quer dizer, como sujeitos a
Ao descrever Condorcel come "meu eminente precursor",
Corr.te proclama que a descoberta das ieis soc:oI6gic2.s lhe era ,"v:!r iúvcis . cuja descoberta é o objetivo es-peC[fico de suas pes-

22 23
de lima seita de iniciacos (a "Igreja positivista") e pertencem, a economia polít ica como precursoré! da démarche
no essencial, ao Museu das Ideologias do século XIX, a semente p:1sltivista ciências sociais: "Os eco:-õomislas os
do positivismo comtiano, sua pesquis<J. metodológica, estava de;;- a proc!amar c,ue as leis são tão necessárias como as leis
tinada a tornar-se - de direta ou indireta, Llbeota ali físicas, Segundo eles, é tão impJssívcl a concorrência não nivelár
a pouco os preços .. , corr.o os COrp0S não caírem de formâ
encoberta, substancial ou dilu{õa, total ou j?arciaL ou
não - um dos pilares da ciê::cia universitária (ou institucional)
Estenda este ?rincíp:o a todos os fatos soci ais e a
socJOlegLa estará fundada" ,25
moderna, até hoje,2 1
Destas observações já se extrai o conceito central da ciência
Comte "inventot:" o termo socíoloKia, mas é a:1tes Durkheim
social positiva segundo Durkheim: a lei social natural. Ele a
quem de ve ser considerado o da sociologia pcsitivista cnquéip.to
diretamente à origem da sociologia: "Para que a nova
científica, A obra de Durkheim contém estudos sociais ClenCla pOSSê ser fundada, é necessárie , portanto , estender ê. idéia
concretos que poder{amos procurar em vão r,o auter do Curso das leis naturais aos fenômenos huma:-:os" ,26 É a aixonante observar
de filosofia positiva; entretanto, a continuidade entre c,omo o ue havia servido de re-v<7lu-e-tenário
os dois é inegável. Durkheim , aliás, não esconde nem um peuco po " ue e i!t' 0..0 cor.iID1o...d.a..d9.utrina
a sua dívida para o do positivismo: em um art!go polítJca dos lOsm:reto e--L? 89, altera o...s tido no século
de 1915 sobre a sociologia na Fra"ça, ele reconheceu que seus Xix.. ara se com o positiv is mo, uma justifi cação cien tífica
escritos (ass im como os de Bouglé, Simicnd, Halbwachs e Mauss) da ordem SOCJ aJ estabelecida. Desde os seus pn me"i'fõS" escri tos
"derivam diretamente de COIT'.le; são !1lO'TIer:tos diferentes de uma em 1867, o. de Du rkheim com precisão,
mesma evolução",n O conteúdc preciso desta dívida inte!ectuat clareza, coerencla e ngor exemplares estz. nova função social : "É
é explicitado várias vezes, exemplo, ne ensaio Mon- amda ao filosofí.a q'Je cabe despertu nos espíritos
tesquieu e Rousseau: "A ciêr,cia social FQderia real-mente que lhe sao conf,acos a icé:a de que é uma lei ; de lhes
progredir mais senão se -nõuv'esse estabelecido que as leis das <.:ompreender que os fenômer.os físicos e sociais são fates como
sociedades não são diferentes das leis que regem o -"res'tõ da outros, submetidos a !e:s que a vontade humana não podt:
natureza e que o método que serve para descobri-Jas não T ci lro a vontade. e que, por conseqüência, a.s revoluções
senão o método das outras ciências, Esta seria a /l O sentido proprto do termo sâo coisas tão impossíveis como os
Auguslo Co mte à ciência social" ,23 Não se trãfa de uma questão lIIi/(lgres":27 as leis naturais éa sociedade que seria vão,
acessória, mas do princípio metodclógico essencial da nova ciência IIIÓplCO , llusono - cm palavra: antidenlíjko - querer
aos olhos de Durkheim, que enfatiza em As regras do método Oll , trans!ormar, Durkr,eim situa co:n destaque a
sociol6gico: "A primeira regra e a mais fundamental é de rI" .\'/K/wldade SOC/Ql. A demonstração se desenvolve através de
con siderar os fatos sociais come coisas .. . IIllIa analogia orgônicista bastante clássica em La diviúor. dii
qu e s fenô\nen os sociai.s __rlãlurais Sl!.Q!J1eJidos a leis //(/wJiJ socia l: de acerdo com Durkheim, a sociedade é. da mesma
na.tu rai s, Com isso, ele implicitamente reconheceu o seu caráter Iplllla que um ser vivo, "um sistema de Órgãos ne
de coisas: pois não há senão ccisas na natureza" Y qual cada um te m um papel particular"; 2ertos órgãos sociais
Na realidade, co mo vimos, abordagem é r:gerosamente t 11\ "uma situação especial e, se se q'.:er, privilegiada"; situação
homóloga àquela desenvolvida, irr.plíci(a cu explicitamente, pela vHkn lcmente natural , funcional e inevitável: "Ela se àeve à
1)1I1111('/,a do papel que ela cumpre e não a qualquer causa estranha
'collOlllia política: é aqui que provaveimente se encontram as
II II," funções" , Este privilégio é., portanto, iJm fenômeno abso-
do naturalismo enquanto discurso ideológico
típico da Ilova ordem industr:al (burguesa) , O própric Durkheim lulllllWlltc normal que se em todo organismo: "Assim,

26 27
é, por si s6, todo um programa: ser seoão.
t::llIDHIIUCa idéia, a insistirá incansavelmente Comte.
de que a ciência da sociedade pertence ao 'sistema das ciências
naturais', um sistema que alcançou, graças à descoberta dessa
como
portanto, c
física social. 'um estado fixo e no as ciências
dc- homem e as da natureza não passam de ramos de um mesmo de sua harmonia ..com.
deamento com o estado anterior e pOlitel'lor
tronco" ,15 Este axioma da entre
as ciências sociais e as ciências naturais remete, em última análise. humano" y.l De fato, o discurso DOSltlVl:sta
à essencial do discurso comtiano: a economia de todo posicionamento ético ou
entre sociedade e natureza, a domlnaç(ao de coisas existente: "sem admirá-lo", ele se limita a constatar
que este estado é natural, necessário, inevitável, e é de
vida social por "leis naturais invariáveis". Certamente.
"leis invariáveis". Em um trecho de nota do Curso de
quem descobriu idéia: ela já ser encontrada nos
filosofia positiva, Comte - não é um mérito
economistas por exemplo, em Jean de
menor reconhece, ou melhor, abertamente, as im-
quem Comte era bem próximo - , que escreveu em seu Tratado
conservadoras e contra-revolucionárias de sua peiSQUlisa
de economia política (1803): "As leis que "Ele (o ML) tende podlerosalllenl:e,
c!encias e morais existem a das
sua natureza, a a ordem
derivam da natureza das coisas, tão seguramente quanto as leis
vimento de uma sábia só é
físicas do mundo ... "16 Aliás, os fenômenos econômicos são fre- haver uma verdadeira isto uma permanente di:sp{)sic;ãc
Q'ÜiBl1temien1te citados por Comte como destas "leis para suportar com constância e sem nenhuma esperança
lnv3!n.áveis" da sociedade: é o caso da compensação, que os males inevitáveis regem
do os diversos de fenômenos naturais, a de uma
convicção da invariabilidade das leis. B,
saltValZu.trdm "as leis vamente com a filosofia que se relaciona tal
devem determinar a tema que ela se
entre chefes industriáis". Otimista, Comte parece, por
também aos males
outro lado, convencido de que (industrial/burguesa) )
feminino, as vantagens da submissão e de uma o revestimento do Ul"r:UrJ,Cl
irr!est)onlsal:>ili,dade" graças à doutrina que
para e mesmo reforçarem, as
leis naturais da do poder e da "I? Esta tese trabalho, mas comparar a do
parece ter chamado a atenção de Marx, que lhe dedica uma nota direito, da economia política e do positivismo, do final do século
irônica no livro do "Augusto Comte e sua XVIII a meados do século XIX, analisando a trl'lnd·r...
escola procuraram demónstrar a eterna necessidade dos senhores sofre o conceito de "lei natural". à medida que a bUnnlesia
do eles teriam, tão bem quanto e com as mesmas razões, uma classe revolUCionária para tornar-se cada vez mais
demonstrar a eterna necessidade dos senhores feudais".!8 uma social associada ao exercício do
. da .. sociedade, .a. física Se os extravagantes caprichos "religiosos" e messiâníco-hu-
sociologia - não. 1lI1l11itários de Comte tiveram pouca repercussão além dos limites
mais
24
de lima seita de iniciacos (a "Igreja positivista") e pertencem, a economia polít ica como precursoré! da démarche
no essencial, ao Museu das Ideologias do século XIX, a semente p:1sltivista ciências sociais: "Os eco:-õomislas os
do positivismo comtiano, sua pesquis<J. metodológica, estava de;;- a proc!amar c,ue as leis são tão necessárias como as leis
tinada a tornar-se - de direta ou indireta, Llbeota ali físicas, Segundo eles, é tão impJssívcl a concorrência não nivelár
a pouco os preços .. , corr.o os COrp0S não caírem de formâ
encoberta, substancial ou dilu{õa, total ou j?arciaL ou
não - um dos pilares da ciê::cia universitária (ou institucional)
Estenda este ?rincíp:o a todos os fatos soci ais e a
socJOlegLa estará fundada" ,25
moderna, até hoje,2 1
Destas observações já se extrai o conceito central da ciência
Comte "inventot:" o termo socíoloKia, mas é a:1tes Durkheim
social positiva segundo Durkheim: a lei social natural. Ele a
quem de ve ser considerado o da sociologia pcsitivista cnquéip.to
diretamente à origem da sociologia: "Para que a nova
científica, A obra de Durkheim contém estudos sociais ClenCla pOSSê ser fundada, é necessárie , portanto , estender ê. idéia
concretos que poder{amos procurar em vão r,o auter do Curso das leis naturais aos fenômenos huma:-:os" ,26 É a aixonante observar
de filosofia positiva; entretanto, a continuidade entre c,omo o ue havia servido de re-v<7lu-e-tenário
os dois é inegável. Durkheim , aliás, não esconde nem um peuco po " ue e i!t' 0..0 cor.iID1o...d.a..d9.utrina
a sua dívida para o do positivismo: em um art!go polítJca dos lOsm:reto e--L? 89, altera o...s tido no século
de 1915 sobre a sociologia na Fra"ça, ele reconheceu que seus Xix.. ara se com o positiv is mo, uma justifi cação cien tífica
escritos (ass im como os de Bouglé, Simicnd, Halbwachs e Mauss) da ordem SOCJ aJ estabelecida. Desde os seus pn me"i'fõS" escri tos
"derivam diretamente de COIT'.le; são !1lO'TIer:tos diferentes de uma em 1867, o. de Du rkheim com precisão,
mesma evolução",n O conteúdc preciso desta dívida inte!ectuat clareza, coerencla e ngor exemplares estz. nova função social : "É
é explicitado várias vezes, exemplo, ne ensaio Mon- amda ao filosofí.a q'Je cabe despertu nos espíritos
tesquieu e Rousseau: "A ciêr,cia social FQderia real-mente que lhe sao conf,acos a icé:a de que é uma lei ; de lhes
progredir mais senão se -nõuv'esse estabelecido que as leis das <.:ompreender que os fenômer.os físicos e sociais são fates como
sociedades não são diferentes das leis que regem o -"res'tõ da outros, submetidos a !e:s que a vontade humana não podt:
natureza e que o método que serve para descobri-Jas não T ci lro a vontade. e que, por conseqüência, a.s revoluções
senão o método das outras ciências, Esta seria a /l O sentido proprto do termo sâo coisas tão impossíveis como os
Auguslo Co mte à ciência social" ,23 Não se trãfa de uma questão lIIi/(lgres":27 as leis naturais éa sociedade que seria vão,
acessória, mas do princípio metodclógico essencial da nova ciência IIIÓplCO , llusono - cm palavra: antidenlíjko - querer
aos olhos de Durkheim, que enfatiza em As regras do método Oll , trans!ormar, Durkr,eim situa co:n destaque a
sociol6gico: "A primeira regra e a mais fundamental é de rI" .\'/K/wldade SOC/Ql. A demonstração se desenvolve através de
con siderar os fatos sociais come coisas .. . IIllIa analogia orgônicista bastante clássica em La diviúor. dii
qu e s fenô\nen os sociai.s __rlãlurais Sl!.Q!J1eJidos a leis //(/wJiJ socia l: de acerdo com Durkheim, a sociedade é. da mesma
na.tu rai s, Com isso, ele implicitamente reconheceu o seu caráter Iplllla que um ser vivo, "um sistema de Órgãos ne
de coisas: pois não há senão ccisas na natureza" Y qual cada um te m um papel particular"; 2ertos órgãos sociais
Na realidade, co mo vimos, abordagem é r:gerosamente t 11\ "uma situação especial e, se se q'.:er, privilegiada"; situação
homóloga àquela desenvolvida, irr.plíci(a cu explicitamente, pela vHkn lcmente natural , funcional e inevitável: "Ela se àeve à
1)1I1111('/,a do papel que ela cumpre e não a qualquer causa estranha
'collOlllia política: é aqui que provaveimente se encontram as
II II," funções" , Este privilégio é., portanto, iJm fenômeno abso-
do naturalismo enquanto discurso ideológico
típico da Ilova ordem industr:al (burguesa) , O própric Durkheim lulllllWlltc normal que se em todo organismo: "Assim,

26 27
nos animais , a predominância do sistema nervoso sobre 0$ outros a pát,';a atua! por uma pátri .. superior que seria fo rmada pela
sistemas se red uz ao direito, se se pode falar assim, de receber de u,ma só classe social, pelo advento do proletariado
um alimento mais seleto e de receber sua parte antes dos outros". II1temacwnal. E fácil demonstrar que esta 2oncepção se
Estas formul ações podem parecer ingénuas , mas são nada l:"lenes numa confusão: uma classe mesr.1C <:r.ipliada é, 050 pode
do que O ponto de partida do funci onal ismo em geral e da muíio ser, uma pátria: não é !Jenão wn fragmento de uma pátria, como
moderna teori a fu ncionalisla das classes sociais (Davis e Moore). um órgão /Ião é senão um fragmento de um organismo. É porq'..!e
Às vezes, o parad igma "organic is ta" e O modelo social darw: ni sta descon!}ecc esta verdade elementar que o é
ela sobrevivênci a dos mais aptos se confundem em Durkhe:m: freqüentemente a negação pura e simples de toda sociedade
"Pois, se nada entrava ou nada favorece injustamente os concor- organizôda" 29
rentes que disputam entre si a tarefas, é inevitável que cpenas Lá onde Max Weber teria percebido o conflito irrecondiável
os que são os mais aptos a cada gênero de atividade a alcancem .. . de cuas visões de mundo, cada lima delas com seu absoluto (seu
Poder-se-ia dizer que isto não é sempre o bas tante para satisfazer "deus" e seu Durkheim não vé senão uma "confusão",
os homens; que existem aqueles cujos desejos ultrapassam sempre que seria "fácil" de esclarece; cientificamente, pela colccação em
as suas faculdades. É verdade, mas estes são casos excepcionais evidência de certas "verdades ele:nentares" .. ,
e, pode-se dizer, mórbidos. Normalmente, o homem encontra a
Como Comte, Durkheím estava consciente do caráter
felic idade ao realizar sua natureza; suas necessidades são re;a-
cionadas com seus meios. Assim, no organismo cada órgão não fundamente contra-revolucionário... de seu método positivista de
reclama senão uma quantidade de alimentos proporcional a sua seu naturalismo sociológico; ele o com um fervor
di gnidade."28 Formulada à época em que se desenvolvia r.a Fra:;ça ingênuo n'õ' -prefâcio àe R.egras do método: "Nosso métoéo não
um sindicalismo revolucionário ameaçador, esta distinção e'!tre c tem nada de revolucionário . Ele é até, em um essen-
"normal" e o "patológico" exerc ia uma função legitimadora muito cialmente conservador, já que os fatos sociais como
transparente ... No mesmo texto, D urk heim insiste também sobre coisas cuja natureza , por mais flexível e mais maleável que seja,
a "solidariedade orgânica" dos diversos grupos sociais ("funções") não é, poré:n, mcdificável pe:a vontade".30 l);versos sociólogos
e apresenta os conflitos entre as classes como "contrações dolo- anglo-saxões chamaram a atenção sobre c caráter conservador de
rosas", isto é, como uma espécie de estado mórbido do corpo certas concepções políticas e sociais de Durkheirr.; é c caso
especialmen:e de Robert Nisbet, segundo o qual o pensamentc
social.
de pertence a uma trad:ção conservac.ora fundamental-
U m e xemplo particula.nT'.ente surpreenáe::te da ut :ljzaç1!o di-
mente oposta ao racionalismo indívidualista.3' Outros cientistas
relamente político--ideológica do naturalismo positivista em Durkheim
:o.ociais, como Melvin Richler, rejeitam esta e
se encontra no debate de 1906 com O siné:calista revolucionário
\)urkhelm como um liberal do século XIX, que tinha pouca
LagardeHe sobre o Referindo-se acs operários
afin idade com o conservadorismo e autoritári.o. 32
internacionalistas, Durkheim laslirr.a que "sem dúvida é mais fácil
I debate nos parece algo superficial e irrelevanle : o co"ser-
expl icar as razões da da pátria a crianças do que a
vadorismo de Durkheim se situa r.um nível muito mais profundo:
adultos, ujo espírito já foi deformado por p:econceitcs passicnais".
1/(/ sua própria concepção do método. É sel: mé!odo positivista
O bservemos de passagem nele, cemo em Comte, o papel !deológico
111IL: permi te :egil!mar constantemen:e, através de
novo do termo "preconceito" , que designa quase sempre os pontos
de vi sta críticos ou revolucionários . Durkheim prossegue na sua l'IL'lltífico-naturz.:s, a ordem (burguesa) estabelecida. Este conser-
argumentação: "Não creio , que a seja vadorismo fundamental, inerente a toda démarche metodológica
M . Pa rodi observou que, meios operários , pretende-se substituir (Il- Durkhei m, pode ser ccnciliado tanto com o "rêcionaEsmo

28
individualista" como com o "autoritarismo", tanto com o libera- e situ2çào revolucio!1ária . Referindo-se a Condorcet, ele escreveu :
lismo como c01n o tradic ional ismo, ou ainda com uma cccnbi:.ação "As práticas co per:odo turvavam bastan te os espíritos
sui generis do doi s (que é prova velmente a característica central para lhes deixar c sangue-frio e a sere nidade , se m os q uais nào
do pensamento político de Durkheim) . Limitar o debate a este há sábios. O que é certo é (pe no dia em que a tempestade
lerreno formal e doutrinário, como o fazem Nisbet e Richter, revolucionária passou, a Ilcçãc de ciência social se con sti tuiu
sign ifica escamotear ou ignorar o essencial. co mo por

O discurso de Durkhe im, como vimos, passa sem hesitação Durkheim, pcsítivista conseqüente, acredi tava que os "pre-
das le is da seleção natural às "lei s naturais" da sociedade, e dos conceitos" e as " prenoções" podiam ser "afas:ados" , como se
organismos vivos aos "organismos" sociais. Essa surpreendente afastam as viseiras para vcr o que se passa em volta. Ele nào
versatilidade da démarche apóia-se numa pressuposição essencial: compreeoce que estts " prer.oções" (isto é, as ideol ogias o u visões
a homogeneidade epistemológica dos diferentes domínios e, por de munco) são - como o daltonismo ou como as doe nças de
conseqüência, das ciências que os tomam como objeto. Pressu- olhos que reduzem o campo visual (g iaucomas) - parte integrante
posição q ue fu ndamenta esta exigência decisiva de todas as da visão. elemento constitt.;tivo do ponto de vista. O próprio
correntes positi vistas : "Que o sociólogo se coloque 00 estado de Durkheím é. a prova mais 'lI1contestáve l de que a " boa
espírito no qual estão os físicos , químicos, fisiólogos, quando vontade" e o ardente desejo de ser objctivc. a serenidade , o
eles se debruçam sobre uma região ainda inexplorada de seu sangue-frio, ii calma e todas as " precauções sistem áticas" não
domínio científi co" .33 Como o pesquisador em ciências sociais são para "afastar os precer.ceitos" - em seu caso
pode se colocar no estado de espirito do químico, se o objeto conservaderes e contra-revoh.:cionários ... Come A. Comte, Durkheim
de seu estudo, o conhec ime nto da sociedade. é também objeto não via nenhuma co :" tradição, nenhun'.a il!compatibilidade entre
de um combate político aci rrado. onde se enfrentam as ideclogias, a tendência con servadora de seu método (que ele reconhecia) e
os "preconceitos passionais ", as conccpções de mundo , os interesses a neutralidade ou imparcialidade científica (que ele re ivi ndicava) :
sociais radical mente opostos? A resposta de Durkheim se situa é bastante sinceramente que ele acredi tava na sua sociologia livre
sobre o terreno do que se poderia designar COMe "a bca vontade de toda "paixão" cu prenoção. porque a legi timação da ordem
positivista" : " A sociologia ass im entendida não será nem indivi- estabelecida lhe pélrece decon'er da constatação es tritamente obje-
dualista, ne m comuni sta, nerr. socia;istél .. . Por princípio, ela ig- tiva de cert<!.s " verdades eJeme:-:tares". Ora, o problema das ciências
nora rá estas teorias, às quais ela não poderia valor sociais é que o que para alguns é "verdade elementar"
científico, já qu e e las te ndem diretamente não a expressar os não é para outros senão um preco nceito e vice-ve rsa ...
fatos mas a reformá-los". Em outros termos : o sociólogo deve
O pos:tivisr:1o "c:ássico" de Comte ou Ourkhei m não é um
"ig norar" os conflitos ideológicos, "fazer calar as paixões e os
anacronismo do séc:.:lo XIX; encontramos representantes dele até
preconceitos" e "afastar sistematicamente todas as prenoções" .34
cm nossos dias e ele exerce L:ma in :luência considerá vel sobre
Ele deve "cercar-se de todas as precauções possíveis contra as
a sociologia moderna, especialmente nos paí es anglo-saxões . Um
influências irracionais" e opor a eSias paixões "a serenidade e a
exemplo entre outros inurr.eráveis : George Lundberg (1895-1966) ,
imparcialidade cientíticas", o "sangue-frio" .35 O problema é assim
durante vários anos presidente du Amer:can Soc iety of Socíoiogy
si tuado sobre um terreno estritamente ps:col6gico ("a serenidade"
ele .) c SI.: r"sume a um voto de intenção ("ignorar" os preconceitos). c editor da revista Sociometry. De acord o com Lundberg, "ao
Uma das raras passagen s onde Durkheim esboça uma análise considerar a sociologia cerno uma ciência natural . vamos eSludar
Im:1 )I i<.:o-sncia l da cientificidade é aquela onde insiste. de [Nma () componamento social humano com o mesmo espírito obje tívo
\ .1l.lCl\'físliea. na incompatibilidade entre conhecimento científico que o biólogo estud2 t,;;na cclméit:, uma colônia de térmites o u

31
30
a organ ização e o funcionamento de um organismo". Para alcançar como Karl Popper mostraram, e:es própnos, o ridfcule desta
esta objetividade é "colocar de lado nossos sentimentos" doutrina trad icional da ciência social serr. preco:1ceitcs e sem
e "e li minar" , na análise das e vidênci as empíricas, "a influência prenoções. Quanto a Max Webec CO:110 se sabe, ele considerava
das crenças ou desejos pessoais". Trala-se, r.a sua opinião, de as pressuposições, os valores, os pontos de v'lsta 0:1 a visão de
um problema puramente "técnico": "eie havia desenvolvido uma mundo não somente como inevitáveis, mas também como con s-
técnica aperfeiçoada de evitar, controlar e corrigir estas influências tituindo a própria condição de toda ctiv idade cier.tífico-sociai
(exteriores) na ciência"37 sign ificativa . Voltaremcs a esta problemática. no
Na realid<!.de, a "boa vontade" pos;tivisla enaltecida por momento, ê constatar o impasse ao qual conduz a dou trina
Durkheim e seus di scípulos é uma ilu sãc ou uma mistificação. pos itivista clássica da objetividade das ciênci as sociais.
Liberar-se por um "esforço de objelividade" das pressuposições
éticas, sociais ou políticas rund2mentais de seu próprio pensamento Dito isto, há um " núc leo racional" na problemática positivista'
é uma façanha que faz pensar irresistivelmente na céleb:e história a vontade de conhecimento, a investigação obstinada da verdade,
clã 'Barão de Münchhausen, ou este herói picaresco que consegue, a intenção de verdade é uma condição necessária da prática
através-dê-um golpe genial, escapar ao pântane onde seu científic a. Se a investigz.ção é dclíber3damer.te a outros
caVa10 estavam sendo tragados, ao puxar a si próprio jJelos rins considerados mais importantes do que a vercade - imperativos
cã5-elos .. . O.;; que pretendem ser sinceramente seres objetivos são ét icos, políticos ou sim?leslT.ente pecur.:ários - , ela está condenada
-siinp1esmente aqueles nos quais as pressuposições estão mais de antemão do ponto de vista de sua validade cognitiva, de seu
profundamente enraizadas . Para se liberar destes "precnnceitos" conteúdo de conheCimento. Neste caso, ela deixa de ser ciência
é necessário, de tudo , reco:1hecê-los cemo tais : ora, a sua para se tomar outra coisa: sermão, mistificaçãc, propâganda,
principal característica é que eles não são considerado.'. como publicidade etc . Sem ter intenção de bu scar a verdade, o di scurso
tais, mas como verdades evidentes. incontestáveis, indiscutíveis. 11;\0 tem conteúdo c ientífico : ele se toma simples instrumento a

Ou melhor, em geral eles não são sequer forlTlulados , e permanecem ',rrv iço de objeti vos extracientíncos . Esta condição - ali ás quase
im plícitos, subjacer.tes à investigação científica, às vezes ocultos t.lIllológica: para ter acesso à verdade é necessário qu erer ter
ao próprio pesquisador. Eles constituem c que a sociologia do Il à verdade - é necessária mz.s de for:T1 a al guma suficiente
conhecimento designa como o campo do comprovado como evi- [1.11 a assegurar a objetividade científica . Ela elimir.a os de(ermi -
11 ,1I11('s exteriores diretos, mas não o condicionamento estrutural
dente, um con.iur.lo de convicções, atitudes ou idéias (do pesqui-
sador e de seu gnlpo de referência) que escapa à dúvida , à ( , 'io-cu ltural ) do pensamer.!o; ela permite afa.uar a mistificação
_Ir 1111111 la, mas não O ponto de vista de classe.
distâncía crítica ou ao questionamenlo .38
É suficiente examinar a obra dos posit:vistas, de Comte e
Durkheim até nossos dias, para se dar conta de que eles estão lux Weber: a ciência livre de julgamentos de valor
in teiramen te fora da condição de "privados de preconceitos" . SU2S
análises estão fundadas so!)re premissas político-sociais tenden- Max Weber não deveria ser cQr. siderado como um autê:1tico
ciosas e ligadas ao ponto de vista e à visão social de mundo I HIIIlV.() positivista; suas concepções melodológicas são bastante
de OTUpOS sociais de(erminados. Sua pretensão à neutralidade é ,II 111Ih'S do posit ivismo e, em certos aspectos, diretamente coo-
às vezes uma ilusão, às vezes um ocu:té.!.I:lento deliberado, e, I, .. lill II,IS '111 re lação a ele. Mas sobre um ponto capital - que
fn;qüent 'mente, uma mistura bastante complexa cos dois. É Ínútii 1'11 '1 1\:II Il(' nle o que nos interessa neste livro - há uma
ins i." lir, al i;ís, neste aspecto, já que es positivistas mais lúcidos II lI vt enlre sua teoria da ciência e a teoria dos positivistas:
32 33

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i,deográfica de fenômenos singulares), Esta última, que
() postulado da neutralidade axiológica das ciências sociais, Na
e adequada as cJenclas da cultura, implica necessariamente um
rea lidade, foi ele quem formulou o postulado de forma precisa
critério de seletividade: os valores, É com relação aos valores
e sistemática, mais ri gorosa que os vagos desejos dos positivistas
se escolhe talou qual acontecimento histórico singular como
do século XIX , obJeto estudo, Como, neste caso, alingir a objetlvidade científica')
A Wíssenschaftslehrc de Weber é uma noção única e singular R1Ckert, é a existência de valores wliversais (a verdade. a
no panorama metodológico da ciência social; poderia se definir hberdade etc,) aceitos por todos que funda menta a uni versalidade
provisoriamente sua estrutura como urna combinação s/ú generis e . portanto, a objetividade das ciências hi\tóricas,
de temas historici slas e positivistas, De acordo com Lucien
_Weber parte da tem<Ítlca r1ckertiana da Wertheúehllng (a
Goldmann, a posição de Max Weber se situa "a meio caminho
rclaçao com os valores) como fundamento das ciências e
entre o desconhecimento da determinação social do pensamento
históricas; mas, contrariamente a Rickerl, ele não acreditava em
sociológico pelos discípulos de Durkheim e sua integral aceitação
valores "objetivos", universais, absolutos, E le se aproxima , de\ te
pelos marxistas"; ele explica a diferença entre Weber e Durkheim
ponto, de vista, do relativismo histórico de Dilthey , apesar de
pelas condições enquanto o sociólogo francês
IllenClOnar mUlto rarame nte este autor em seus trabalh os,4o É,
expressa o otimismo de uma burguesia ainda não ameaçada pelo
portanto, somente com relação a valores específicos, os Kul-
proletariado, o pensador alemão, diante de um movimento operário
(1II'wertid:en (idéias-de-valor culturais) particulares de uma época,
poderoso que reivindicava o marxismo, perdeu este otimismo
,naçao ou uma fé religiosa , que se pode selecionar, no caos
ingénuo: é obrigado a tomar em consideração o marxismo e a
1111IIlItO d?s fenômenos sociais, o que nos parece importante ,
se ocupar dos problemas de método que Durkheim ignorava
dl p,IlO de mte resse, significativo . Em outras palavras : "Não existe
desdenhosamente,39 Esta análise nos parece discutível: não é de
1IIllllisc científica direíame nte 'objetiva' da vida cultural ou ... dos
M arx mas do historicismo neokantiano da Alemanha meridional
IC'I1 menos sociais, que seja independente de pontos de vista
(Rickert, Dilthey, Windelband) que Weber extrai sua problemática ,
, Wdficos q,ue fazem com que estas manifestações
(an tipositiv isla) sobre o papel dos valores no conhecimento - o
111111 , expliCita ou ImpliCitamente, consciente ou incQnscicnte-
que o próprio Goldmann reconhecia, aliás , Além disso, como
III' IIlc', selecionadas como objeto de pesquisa, conformadas e
veremos em seguida, os valores dos quais fala Max Weber não
III IIIIII/.allas no corpo de exposição",41
estão, no essencial , ligados às classes sociais (como na abordagem
marxista), mas a culturas, nações ou religiões distintas e/ou l ,unge de ser, aos olhos de Weber, um elemento negativo.
opostas, É verdade - e sobre este ponto Goldmann tem razão • II I Ifht'z,cihung é a condição sine qua IUJI1 de todo conhecimento
_ que se encontra em Weber " um diálogo com Marx" que se III (0111 o-social, o pressuposto indispcnsável de toda pesquisa
procuraria em vão nos escritos de Durkheim, mas este diálogo 1 lIull\ a no domíl1lo dos fenômenos culturais, Max Weber não

se situa sobre o terreno da explicação histórica causal e não IIIU1I ,1 de manei ra mais precisa a gênese social destas Werci-
II , Jlllntos de vista ou visões de mundo, Em uma passagem
sobre o terreno da teoria da ciência ,
• II r ll SlllO de 1904 sobre a objetividade do conhecimento
Aponta-se habilUalmente a obra de Rickert - especialmente
• lIlIl,. II ,m:lal , ele reconhece (com reservas) a existência de
as Grenzen der Italurwissenschaftlichen Be};riffsbildung (Limites
1I',d,It'(' J"ll'lIIuftschaft (afinidade eletiva) entre as visões de
da conceitualização científico-natural, de 1896-1902) - como
""'UI t.. I ' ',lIteresses de classe, mas esta hl pótese não é pros-
ponto de partida para a démarche de Weber. Para Rickert, face
111011 , 11(>1lllllndada ou levada em consideração em seus escritos
ao infllli lo da realidade empírica, o conhecimento deve utilizar
I, 0:--:1) Os valores e os Gesichtspunkte (pontos de vista)
seja o métod o nomotético (descoberta de leis) seja a démarch e
35
34
persistia na ciência econômica, apesar do fato de que "a crítica
são para ele cieterminantes nos vários níveis da Investigaçao
sociali sta e os trabalhos dos historiadores tinham começado a
científico-social: 1) eles orientam a esco;i1a do objelo de,
em problemas os seus pontos de vista axiológicos
cimento; 2) eles or:,cntam a direção da investigação 3)
, Observemos, de passagem, esta
eles de:erminam o que é ?3ra nós importante ou sem lmportanc/a
enlTe socwhsmo e historicismo, unidos no campo
essencial ou aces sório, significativo cu tnteressante
antlpoS lt1vlsta, no qual o próprio We be r parece se situar.
cu sem interesse; 4) eles determinam a formaçao da
conceituai utilizado; 5) e, sobretudo, e les forne;::em a problemalt:a Em que med ida se pode, e ntão, falar de uma convergência
(Fragesfellung) da pesqui sa, as questões que se coiocam (ou nao Max . Weber e a problemática positivista? Sua teoria da
43 SOCial necessariamente fu ndamentada sobre um ponto
se cOlccam) à realidade. de VIsta preltmll1ar não está no pólo oposto da ex i<Yência de
Em uma das mais belas de seus ensaios a de "afastar as prenoções" ? É na segunda de
teoria da ciência, Weber resume sua concepção com uma \ ua que anal isa as condições de possibi lidade
surpreendc:1te (q:.ie relembra irresistivelmente certas de do conhecimento cíentí:íco-social, qCle ele vai se
de DjJthey) : " A luz que estas de vaiores .suprem::>s d1fundem aprOX imar do positivismo.
ilumina a cada momento uma parte flntta, mcessantemep.te
Poderia se. resumir a démarche de Weber nos seguintes
da onda caó:ica e prodigiosa de 2.conteclmen.tos que
sua teona da Wertbeziehung das questões é de te ndência
1l'fIllO. · :.
escoa através do tempo".44 Não há dúviôa que esta. pmnelf2. ,parte
11Istonclsta; sua teoria de Werl-freiheil (neutralidade axio ló aica
(na ordem iógíca do processo de oe n;etodo
ou j ulgamentos de valor") das respostas é de orient:ção
pertence, 11.0 essencial, ao UnLverso espmtt:al
O. resultado desta dualidade é, cm nossa opinião, u;na
aiemão e se OiJõe, de forma radicai c irrcconclllavel, as teses
IOlllr,!dlçaO Irresolvível no próprio coração de sua teoria éa
clássicas do fositívísmo. a seu modelo e, em \'1l·nCla.
. particular. à idéia àe que "0 da readdaGe
Para poder discutir de forma preci.)L;. a concepção weberiaoa
cu poderia ser uma (Abbtldung) sem pressuposlçoes . ::le
. ' b' t' s' "4$ Encontra-se aliás aqei e em seus doi \cparação en tre j ulgamentos de fato e j ulgamentos de valer
f atos o Je IVO ., . . . ' - I distinguir dois aspectos que se tende gera lmente
metodológicos polêmícas ex plícitas co.ntra c pOSHl vlsmo;, elas.,
• 1) a não-dedução dos fatos a partir dos valores; 2) a
se díngem nunca a COl"1te ou
lI iln dcduçao dos valores a partir dos falOS.
ou tratados cm quantidade a,
l1uminismo e à eco:,.omia po:ítica, cup Vl sao ae munGO racloAnal.\s- (; a partir do primeiro aspecto que Weber formu la sua
ta, estreitamente v;r,culada ao dese nvoh:ime!1to das ,clenclas d,lut nn a da ciência social Wert-frei, isto é, livre de julgamentos
naturais, irepediu-os de desco!)rtr o carater .I, valor (ou " axiologicamente neutra"). Os valores dete rminaram
seu próprio pO'lto de vista, considerado em SI 1 questões da investigação. mas as respostas devem estrita-
11\1 11 11' We rt-frei; o objeto da pesquisa foi definido a paliir de
(selbstverstandlich) , Eie cr!tlca também a IOfluencta da
11 111 pOlltO de vista valorativo, ;nas a démarche CO:1creta da pesquisa
nas ci ências históricas, que havia: a) a pretensao . de
lo III sobre objeto é submetida a regras objetivas e
descobrir a realidade social por um conjunto de do tipO
a u m t1pO ôe ccnhecimento de validade absoluta' os
científico-natural e de validade geral; b) criadc a. lIusao que
.1 " 1(" forj aram nossos instrurr.entcs conce:tuais, mas a (o'rma
" o crepúsculo dos deuses de todos os pontos vIsta aXlol::>gl.:OS
\. no cien:ífico da causalidade é regida por
(Wertge sichlspur:kte)" poderia agora "se ampliar a todas as
1 11111 1\ Os pressupostos das ciências culturais são
eias" , De acordo com Weber, este im?acto da blOlcgla ne
"" I \0 nao tem por conseqüência absolutamente que os resultados
XIX (; lima das principais razões pe!as quais a ter,dência naturalIsta
37
36
da pesquisa devam ser, eJes próprios, " subjeti vos", isto é, válidos Esta confusão - vol untária ou não - tem para W eber dois
para uns e não para outros; o in teresse do objeto de resultados negativos: a) enganar o leitor (ou o auditório) ao
mudar de um cientista para outro, mas as conclusões da IIwestlgaçao apresentar julgamentos de valor como fatos objetivos que "fal am
empírico-causal deveriam ser aceitáveis e, neste sentiào, "objeti- por si próprios"; b) impedir um real conhecimento científic o do
vas" . De acordo com urna frase , que se tornou célebre, do ensaio objeto: "cada vez que um homem de ciência faz intervir seu
sobre a objetividade científico-soci al , "na esfera das ciências próprio jul gamento de valor, não há mais compreensão integral
sociais uma demonstração científi ca, metodicamente correta, que dos fatos".49 Weber reconhecia que esta separação é "d ifícil" : é,
pretende ter atingido seu objetivo , deve poder ser reconhecida confessa el e, um obstácu lo contra o qual nos chocamos constan-
como exata da mesma maneira por um chinês .. .", apesar do fato te mente . El a permanece, ent retanto, sendo um postulado válido,
de que este não tenha nen huma sensibil idade , interesse ou sobre o qual não se pode transigir. 50
por nossos valores éticos e culturais .47 E ste exemplo é carac\er.ístico O segundo aspecto da heterogeneidade entre julgamentos de
da forma através da qual Weber concebia (na sua twna da rato e de valor sobre o qual in siste Weber é, como já mencionamos,
ciência) as fontes históricas d os valores c dos pontos de vista: !l impossibilidade lógica de deduzir um imperativo prático ou
. . ' /. .
quase sempre ele os re\aclOna a cultu ras na ClOnm s ou l: tico a parti r de con statações de fato : "Não existe absolutamente
Esta é, talvez, lima das razões pela qual ele acreditava na IIl' nhum ponto que conduza da verdade puramente 'empírica ' da
possibilidade da "neutralidade axiológica" dos resultados c ientífi-
Il'a lidade dada pelos meios de explicação causal , à afirmação ou
cos. É, realmente, mais fácil conceber um chin ês contemporâneo
lllltestação da ' val idade ' de não importa qual julgamento de
de W eber que aceitasse as conclu sões de A ética e v, dor .. ."51 A ciência pode demonstrar que as condições soc iais
o espírito do capitalismo do que um alemiio que vIvesse
I' desenvolvem em uma certa direção; ela não permite respon der
em Heidelberg; é mais fácil imaginar um t;ue consIdera
ql1l' :-tão: deve-se ou não contribuir para este desenvolvimento?52
válidos os resultados de sua pesquisa sobre a exploração dos
(h dados empíricos não podem servir de "pedestal" para a
camponeses pelos junkers na Alemanha Oriental, que econc-
0], IIHJIlstração de validade deste ou daquele julgamento de valor.53
m ista Oll historiador alemão conservador, social ou ?ohtJCamer.le
identificado com a aristocracia pnlssiana. Se Weber tivesse apro- Con trariamente ao que pretendiam os seus epígonos positi-
fundado a idéia que ele menciona, de passagem, sobre a \ I t \\ , Weber não acreditava absolutamente em um "consen so"
cletiva entre visões de mundo e classes sociai s, ele tena talvez " va lores ou e m um desaparecimento das visões de mund o
percebido de outra forma os problemas da objetividade nas ciências 11(. ' Il ogias ). Em uma das pas sagens marcantes do discurso
sociais . Mas , é exatamente aí que se toca nos liíTÚes àecorrentes .1I 11,· ia co mo vocação", de 1919, ele apresenta o confli to de
de sua própria visão de mundo e de seu próprio pon:o de v!sta ... d. " ''', como um confronto e ntre deuses (ou entre deuses e
I. III III W. ). que se combate m eternament e, e que a ciênc ia não
Seoue-se a esta premissa weberiana - a de
axiologicamente neutros no conhecimenlo c:entífico-so- I. dl\o lut ame nte resolver. Por exemplo. "qual é o homem que
cial - um imperati vo categórico para os pesquisadores científiCOS : , ti \ .1 de refutar 'cientifi camente' a ética do Sermão
a separação total e ri gorosa (na pesqu isa c;entíficl::) entre fatos (",,11/ 1/1/(/ ou por exemplo a máxima 'não oponha resistência
I I d' 1111 ainda a parábola das duas faces? .. . Em cada caso
e valores, constat ações e julgamentos. Ele via na infração deste
imperati vo um mais graves perigos que ameaçam as ciências "Iltl l' a dignidade da religião .. . e a dignidade de um ser
sO"iai s: " A confusão permanente entre discussão científica dos pll'p l ullla outra coisa, a saber, 'resista ao mal , senão
fat os e ap'ume ntação axiológica é uma das parlÍcularid".des mais pU II S{IVc\ por sua vitóri a' . De acordo com as convicções
, I" --I "48 ,1(' c;ld a ser, lima destas ét icas tomará a face do d iabo.
I'rcqiicnle s c mais nefastas nos trabal hos de ,.e ssa especlâ. /GaLe .

38
a out ra, a face de Deus ... "54 A part ir desta vlsao dramát ica e prirlcipaJ da inflação pode ler um efeito paralisante sobre a
lúcida dos antagonismos axiológicos, rejeita toda ilusão ativídade reivindicativa dos operários , sua ati tude face às greves
de uma solução puramente "científi ca" parn as questões éticas etc.
ou políticas . 2. Os julgamentos de valor, os pontos de vista de classe,
Ele recusa também, de forma cortante e explíci ta, a via do as ideologias, utopias e vi sões de mu ndo dos grupos soc iais
ecletismo como caminho para a verdade: o compromisso entre influenciam de forma decisiva - direta ou indireta,
valores opostos não tem nada a ver com a objetividade c!e;1tífica ou não - o conjunto da atividade cientifica e cognitiva no
e a "síntese" política ou a "l inha média" não é de forma alguma do mínio das ciências sociais . Isto é, tanto a prohlemática como
mais objóva que as posições radicais: "A 'média exata' é a pesquisa empírica dos fatos e de sua causalidade, assim ccmo
de modo uma verdade mais científica que os ideais sua interpretação social e histórica de conjunto .
extrem2dos dos partidos cie direi ta ou de esquerda".55 Examinemos mais de perto essa segunda proposição, que é,
A Wissenschaflslehre de Weber é Ut11edifícic !mponcn:e, no momento, a mais importante para a análise crítica da Wis-
cuja uquitetura rigorosa e coerência iógica ir:1põem o respeito e senschafeslehre weberiana. Como vimos, Weber reconhecia a
a admúação. Não é por acaso que ele serve de ponto de referência influência dos valores na definição das questões, mas não das
obrigatório para tode; tentativa séria de funàamer.tar ou refutar a respostas da pesquisa científico-social. Ora, a primeira observação
tese da neutral idaGe axiológica das ciências sociais Ces pos!tivisLas que se impõe é esta: o tipo de resposta possível não é já
vulgares se conten tam em repetir fasti diosamente as velhas recei:as largamente predeterminado pela própria formula ção da questào?
de Durkheim). Esta arqui tctura não comporta nenhur.'la fissura Por exemplo, quando Durkheim coloca a questão de saber "por
lógica; é "pené!s se situandc em u;n terreno externo à lógica que certos órgãos do corpo social são privilegiados", qualquer
abstrala de demonstração que se pode cescobrir a falha r.essa que seja a resposta, o conjunto da démarche cogni tiva está
formid ável couraça metodológica. É a partir de uma viciado pela própria natureza da questão. Um crítico marxista de
de sociolog ia do conhecimento que se revela o calcanhar-de-aquiles Durkhei m não colocará em dúvida somente a resposta apresentada
da teoria weberiana da ciênCia . por A divisão do trabalho social, mas a própria questão, na
Não se pode senão est<lr de acordo com Weber sobre o medida em que sua formul ação contém já uma concepção muito
postulaGo da he:eroge neidade lóg ica entre fatos e valores, sua Ji scutível e ideologicamente carregada da estrutu ra soci al. E, per
pertinência a esferas distintas, níveis diferentes de raciocínio . É suo vez, um sociólogo não-marxista, ao ler Hi stória e consciência
verdade também que não se mais deduzir logicamente urr. de classe , di ante da questão que domina esta obra - "qua l é a
julgamento de valor a partir de um julga me nto de fato e vice-versa. classe social cuja consciência possível pode romper O véu da
Como o diz a célebre fórm'J;a de Poir:caré, premissas no indicativo rcificação" - , recusará não a resposta de Lukács ("o proletariado"),
não podem em nenhum caso conduzir a concl usões imperé!tÍvo. luas sobretudo a própria ques tão enquanto tal , como fals a ou
Entretanto, existe lima ligação deci siva entre valores e fatos, um Iluo-cient ífica, ou ideológica. Os exemplos poderiam ser mu lt i-
vínculo que não é lógico, mas sociológico; ele se manifesta em plicados.
dois sentidos: Na realidade, a problemálica de uma inves tigação científi-
I . O conheci mento (ou a ignor5.ncia) dos fatos, da verdade <,o-social não é somente um corte do objeto: ela de fine um certo
ohlcti va, pode ter uma influência poderosa sobre as opçõec; práticas, (arnpo de visibilidade Ce de não-visi bilidade), impõe uma certa
(-ticas, ou pol íticas de certos grupos ou camacas SOCiais. !orrna de conceber este objeto, e ci rc unscreve os de
1'01 'xcmplo: a crença em qu e o aumento do salárie a cau sa vanação das respostas possíveis. 56 A carga valorativa ou ideológica

40 41
da problemática repercute, portanto, necessariamente sobre o con- compreensão da estrutura total interna de um fenômeno históri co
junto da pesquisa e é norma1 que isso seja qu estionado pelos na qual se inserem os aspecto escolhidos por nossos
cientistas que não partilham estes val ores ou pressuposições: eles Ora, esta solução imaginária não resolve o problema: ela supõe
se recusam, com razão, a parti r de seu ponto de vi sta, a se situar a questão resol vida de antemão ! Como descobrir os elementos
sobre um terreno minado e aceitar um campo teórico que lhes objetivamente essenciais q ue permitem compreender a estrutura
social se a escolha entre o essencial e o acessório é, como o
parece falso de antemão.
demonstrou de for ma marcante Weber, inevitavelmente determinada
O próprio Weber reconhecia, como vimos , o papel da por nossos valores subjetivos? A passagem cntce as du as etapas
Wertheziehung na escolha dos elementos iOlportantes, na distinção da pesquisa, a "subjetiva" e a "objetiva", que parece válida em
entre O essencial e o não-essencial etc. Ora, como lembrava si mesma em von Sche lling, é precisamente. o problema que se
L ucicn Goldmann em sua crítica da tco ria weberiana da objeti- tem a resolver.
vidade : "Os elementos determinam de antemão, por
si só, o resultado do estudo. Os valores se ndo os 'nossos ' , os Parece-nos, portanto , que Pietro Rossi tinha razão ao enfatizar,
de nossa cultura ou de nos sa sociedade, sobretudo desta ou em sua interve nção no Congresso de Sociologia Alemã, em
daquela classe social , o que uma perspectiv a eli minará como Heidelberg (dedicad o em 1964 a Max Webe r) , que "a We rr-
não-essencial pode ser, ao contrário, muito importante em uma beziehung não pode se r confinada somente ao primeiro estágio
outra perspectiva" .57 Sendo a realid ade social uma totalidade do pwcedimento científico e se limitar a definir a área de pesquisa.
dialética, a escolha do essencial não pode ser neutra; um dos Ao contrário, a ligação com os pre upostos de valor é e vidente
püncipais problemas da ciência social é a determi- em todos os estágios posteriores de investigação. Eles determinam
nação dos aspectos essenciais de um fenô meno. E evidente que a dircção geral e as decisões metodológicas que daí decorrem;
uma história da Revolução Francesa para a qu al o importante, c , sob forma de hipóteses e xplicativas, eles influenciam também
significativo e essencial são o Terror e os massacres estará em o desenvolvimento da explicação . Se isto é verdade, a aceitação
total co ntradição com uma interpretação que vê, na conquista das úe certos pressupos tos de valor condiciona direta ou indiretamente
liberdades republicanas, O as pecto deci si vo dos acontecimentos os resultad os da pesquisa - mas isto é ptec isamente o que
Weber nega va".59
de 1789-1793.
Esta dificuldade havia sido pressentida pelo discípulo de Em certos momentos, o próprio Weber reconheceu que os
Max Weber e autor da obra mais autorizad a sobre sua Wissens- valores inlerferem no próprio conteúdo da pesquisa e em seu.
chaftslehre, Alexander von Sch eltin g. Ele propõe a seguinte ques- resultados : "É verdade que no campo de nossa disciplina as
tão : que garanti a temos de que os aspectos escolhidos por nossoS concepções pessoais de mu ndo intervêm habitualmente sem cessar
valores estão realmente no centro de um fenômeno histórico na argumentação científica, pertu rbam-na permanentemente, le-
determinado e não são algo periférico? Como obter a partir da ando a avali ar diversamente o peso desta argumentação, inclusive
visão subjetiva e parcial inspirada em nosSOS valores uma visão na esfera da descobe rta das relações causai . simples. segun do o
da totalidade histórica de um acontecimento? Ele reconhece não lesultado aumente ou diminua as chances dos ideais pessoai s, o
encontrar na teoria da ciência weberiana uma resposta a esta que vale dizer, a possibilidade de querer uma coisa determinada.
inquietação e sugere, a título de solu ção, a démarche seguinte: ( 'Oll1 esta afirmação, os editores c os colaboradores desta revis ta

o proce o de conhecimento passa por duas fases - inicialmente, II:tO se julgarão celtamente ' estranhos .ao qu e é humano' " .60 M as

a lVerthc::iellll/11{ de certos aspectos da real idade de dt' considera va isto simples mente como um::. "fraque za humana"
acordo com idéias de valores: em segallco lugar, a (l/wllschlich e Schwdche)61 que não colocava em questão sua

42 43
co ncepção de objeti vidade nas ciência SO CiaIS. Ora. ao designar se sabe que ele está condenado de antemão ao fracasso no seu
o problema como uma "fraqueza". ele absolutamente não a vão objetivo de um conhecimento axiológi co neutro')
resolveu... Ai nda mais que esta estranha "fraqueza" parece se Na realidade, a própria obra de Max Weber, "pesar de sun
estender ao conjunto dos cientistas sociais como sugere o próprio integridade científica ind iscutível, e seu esforço sincerc e obsti nado
Max Weber pela menção "autocrítica" aos ed itores de Archiv für no sentido de eli minar os julgamentos de Vi!:or da pesquisa,
Sozialwissenschaft (do qual ele fazia parte). O único remédio que il ustra perfeitamente este fracas so: encontramos aí exemplos abun-
Weber parece propor para es ta enfermidade é "o dever elementar dantes da "jnterferênc ia" de seus Werl-ideen no estudo empír:co
do controle cienúfico de si próprío"62 - o que nos conduz à da causalidade. Seu escrito mais notável. A ética prr,testanle e
velha prob lemática positivista "cláss ica" da "boa vontade" e ás o espírito do capitalismo, é geralmente cOrlsiderado lima tentativa
aventuras do Barão de Münchhau sen. capai. de retirar a si mesmo de refutação "espiritualista" do materialismo histÓr:co. Isso nos
do pântano apoiando-se sobre O seu próprio sistema capilar. parece uma interpretação reduc ionista da obr2 e o próprio Weber
Apesar àe seu soberbo rigor e inteligência, a démarche de Weber insiste que seria desp ropositado e doutrinário afirmar gue o
chegou, em última análise, aos mesmos impas ses que o positivismo cap italismo enquanto sistcrna econômico é uma criação ca Reforma
mai s limitado. protestante . Mas há certas passagens do !ivrc onde Weber é
condu zido por seu desejo (axiologicamente motivado) ce refutar
Alexander von Schelling parece implicit amente reconhecer
o marxismo, e perm ite a esta aspiração, valoralivarr.ente car.cgada,
a impossibilidade, no quadro da teoria weberiana da ciência, de
inte rferir na an álise emp íri ca da causalid ade. Por exemplo, exa-
resolver o problema do papel concreto dos valores na pesquisa
minando este representante típico do espírito cap:talisla, Benjamin
científico-social : "A questão" , escreveu ele, "de saber se e em
Frankli n, para quem a busca do dinheiro era um fim em si
que medida 0$ 'julgamenlos de valor' expressam (ou não podcm
mesmo , uma vocação moral, Weber enfat iza: "no sécu;o XVIII,
senão expressar) de fato no seio da atí vidade empírico-cien tífica ...
nas cond ições pequeno-burguesas, no meio das Dorestas da Pen-
assim como a questão inversa; se e em que medida a penetração
silvânia, onde os negócios ameaçavam degenerar em troca pela
dos valores pode de todo ser 'evi tada ' factualmente, não nos
sim ples falta de dinheiro, onde se encontravam apenas vestígios
interessa aqui . Esta questão não é um problema lógico" .63 Real- de gra ndes empresas industriais , onde os bancos n[;o esta van
mente , não se pode senão estar de acordo com von Schelling : o :-.enão nos seus primeiros passos, o mesmo fato (de fazer dinheiro
problema não é lógico , mas f actual, vulgarmente empírico (acres- ML) pôde ser considerado por Benjamin Franklin C0r:10 a essência
centaríamos também: sociolóJ;ico) . Mas isto não significa abso- da conduta moral , e mesmo recomendado em nome do
lutamente que se possa ignorá-lo ou fazer abstração dele na Falar aqui de 'reflexo' das condições 'materiais' sobre a 's"Upe-
co nstrução de uma teoria da ciência social! Se se confirma - n:strutura das idéias ' seria um puro absurdo", A explicz.ção de!
como pensamos e von Schel ling parece disposto a aceitar - que atitude de Benjamin Franklin deve ser buscada per conseguinte
a exclusão dos valores da própria pesquisa empírica é na prática Weber) na educação puritana que ele havia recebido
iIl1possível e irreal izâvel, para que serve O imperativo categórico dI.: seu pai e não em quai squer ci rcunstâncias econômicas M Ora,
da Wissenschafts lehre webcriana: "Você não cometerá um j ulga- \l que Max Weber parece esquecer ou negligenciar no da
mento de valor"? Se se reconhece que os valores estão, de fato, 'lia polêmica contra o materia lis mo histó,i co é que B. Franklin
sempre presen tes na ciência social , não seri a necessário abandonar lIasccu e viveu a sua juventude (até a idade dos 17 anos) em
a miragem de um conhecimento da sociedade e procurar !lns(o l1 , a primeira ci dade da América e a rnais de
outros caminhos de acesso à objcli vidade científica? Por que I(ldas; que, em segu ida , viveu menos "nas florestas da Pensilvânia"
man te r a e xigência quimérica de um "au tocontrole científico", se do que na Filadélfia, a segunda ou terceira da América,

44 45
bastante próspera no 5éculo XVIII; e que, além disso, morou tradição da ciência natural, é uma componente essencial de toda
durante vários anos em Lo ndres, sem dúvida na época o maior ciência empírica". Em outros termos : " se eu interpretei corretamente
centro da economia capitali 'ta do mundo inteiro. 65 Este exempLo o penso s:r o de vista de Weber" (sic). o grande
é particul armente impressionante, mas de fato é o conjunto da soc lologo alernao conSiderava que, no essencial. "não há ciência
ohra de Weher - e especialmente sua sociologia política - que ' natural' ou 'cultural'. mas somente ciência ou não-ciência ...'·
é tributário de um certo ponto de vista axiológico e limitado por Ev identemente, a problemática (de origem claramente historic ista)
um certo horizonte de classe; o que não significa, de forma da Wertbeziehung é um obstáculo considerável para uma tal
alguma, que sua obra não tenha, apesar destas limitações, um neopositivista de Weber; Parsons procura resolver
valo r cient ífico bastante grande . a dificuldade explicando que este conceito signiftca essencialmeme
isto: a atividade científica "deve ser integrada até um celto nível
Os positivistas modem os ma is sofisticados preferem reivin- no consenso de valor da comu nidade onde ela se desenvolve,
dicar mais Max Weber do que Comte, para apoiar seu paradigma não deve ser totalmente absorvida, deve atribuir a si o tipo de
de uma ciência social livre de julgamento de valor. Esta utilização lugar que é essencial para seu apoio em um sentido político
de um antecessor ilustre é acompanhada em geral de uma sim- Sem um tal consenso. por exemplo, qualquer coi sa como
pl ificação da Wiss enschaftslehre weberiana, pela eliminação de 11m Slstema universitário moderno seria inimaginável " . O aulor
sua démarche historicista, bastan te incômoda e inadmissível. 66 do discurso sobre a ciência corno vocação (1919), que insi stia
Alguns exemplos típicos deste procedimento podem ser no caráter radicalmente irredutível e eterno dos conflitos entre
localizados nas Alas do Congresso da Associação Alemã de estes deuses que combatem para sempre. torna-se, graças
Sociologia, realizado em 1964, dedicado à atualidade da obra de I 1l1terpretação" de Parsons, um teórico do "consenso de valor
Max Weber, onde dois representantes e minentes do neopositivismo da comunidade" .. . Ele seria até, segundo Parsons, "um precursor
contemporâneo, Ta\coU Parsons e Hans Albert. in terpretaram a do ' fim das ideologias' . para utilizar a frase recentemente tornada
sua maneira a teori a weberiana da ciência. Parsons insiste sobre IllIrcnte nos EUA por Daniel Bell. .."68 - tese bastante surpreen-
a ruptura de Weber com o historicismo e lhe atribui · a tese 1I,'lItc se se recorda que uma das críticas de Weber ao positivismo
segundo a qual o conhecimento científico-social se subordina "à (qlll' ele "monismo naturalista") era precisamente dirigida
modal idade lógica já estabelec ida nas ciências da natureza"; ele IOll tra sua Ilusão de que "o crepúsculo dos deuses de todos os
deduz daí triunfalmente que " sobre este aspecto crucial. Weber Illntos de vista axiológicos" deveria se estender a todas as
• 111(';as. 69
se alinhou com a tradição 'utili tária ' fundamental , particularmente
com a teoria econômica inglesa, contra tanto o historicismo como Hans Albert, outro eminente teórico positivi sta do Con-
o marxismo" - uma afirmação pelo menos surpreendente. se se " de 1964, que tem (do seu ponto de vista) razão, quando
recordam críticas explícitas de Weber (em seus artigos sobre ,11":1 a concepção weberiana do confronto de valores, opondo-lhe
a teoria da ciên cia) aos economistas, nos quais ele lamenta I Ir .,t' de que a ciência social pode " neutralizar" os conflitos

preci samente a persistência obsti nada do modelo científico-natural htlClric.os. porq.ue "o ab ismo intransponível en tre posições finais
(biológico), apesar das críticas con vergentes dos historiadores e "II. ,(veis devena desempenhar um papel muito mais reduzido
dos socialistas. 67 Parsons esforça-se em minimizar a distinção [I" () que parece derivar da insistência de M ax Weber". 70 Ele

entre as ciências da natureza e as ciências sociais, que ocupa, ( 11\\1111 mais próximo da verdade quando reconhece, contra-

como vimos, um lugar central na Wissenschaftslehre de Weber: I (III· 1111' aos malabarismos parsonianos, a dificuldade de integrar

in siste que para Weber " muito francamente, a concepção de teoria \ em uma problemática positiv ista coerente. "A
general izada, tal como ela tinha sido desenvolvida pela grande til 1111 wl'bcriana dos problemas de valor na ciência social,

46 47
contendo o método e o princ ip IO da neutralidade axiológica a recepção da Wi ssenschajtslehre weberiana pelo neopositivismo
(value -freedom), parece-me no essencial defensável , exceção moderno. Na realidade. este pretenso progresso com relação a
Weber não é ser.ão um retorno às pcsições do velho cientismo
de certas afirmações relat ivas ao problema da aSS lm chamada
nat uralista do século XIX, que Max já havia (ao menos
dependênci a de valores (Wertbezíe hung) que de forma
parcialmente) e superado.
supérflua a extensão da diferença com relaç ão às clenclas natu-
rais ."71
Todavia, tanto H. Albert como T. Parsons estão de acordo Karl Popper e a ohjetividade institucional
em lamentar o caráter "inacabado" ou "incompleto" da teoria da
ciência de Weber, o que os conduz a manifestar a necessIdade Karl Popper é um dos raros autores desde Weber que
de superá-la. "Eu sou da opinião", proclama H. Albert, "de que introduziram um ponte de vista novo dá problemática
hoje podemos ir mais longe , e m vários do Weber 8m vários aspectos, sua dém{/rche se di stingue dos lugares-comuns
acreditava possível, particu larmente com relaçao 3. e .ao do positivismo clássico, do qual ele procura os impasses
papel do conhecimento nomológico nas ciênc ias ... a mais evidentes .
científica se desenvolveu bastante desde a sua cpoca , e menCIOnú De inbo , ele reconhece, como Max Weber (e contrariamente
como exemplo deste desenvolvimento, entre outros, a. obra de i) trad ição de Comte e de Durkheim), o caráter necessário,
Karl Popper. 72 Em sua resposta a Albert, Parsons mamfesta seu inevitável e cientificamente indispensável dos " pressupostos" ou
acordo COm esta te se: "Weber forn eceu mais um lllfclO do que pontos de viSlé) "uma ciência n2C é si mplesmente
urna explicação acabada" , suas limitações o levaram a uma um 'conj unto de fatos'. Ela é, pelo menos, uma coleção e,
situação que não poderia conduzir um se um enquanto tal. ela depende dos interesses do colecionador e de
nível de teoria que ele próprio acredItava Imposs.Jvel ou 1.l1 adequado M'll ponto de v:sta .. . Selecionamos dé! variedade infinita dos fatos
não fosse criado" . Para alcançar este nível supenor e mais (" da variedade infinita de aspectes dos fatos, os fates e os
é necessário se apoiar em outros autores, especialmente ... Durkhelln: IlSpt:ctos que são interessantes porque estão em relação com uma
"Penso que um avanço substancial foi alcançado desde a obra h'oria científica mais menos preconcebida. .. Nãc sorr.ente é
àe Weber. Nesle campo, muitos fundi!l:lentcs foram colocados Impossível evitar um ponto de vista seletivo, mas também de
não sorr.ente pelo próprio Weber, por Penso. espe- ",do modo controlá-lo, porque, se se padesse fazê-lo.
cialmente em D\lrkheim, penso nos ps icó !ogos SOCiaiS amenca •. os, I"l st:- ia não urna descriçiio mais ' objetiva', mas um
pensc em algc;.;T'.3s de nossas disciplin as vizinhas .. ."7 3 Urr,G. " vo de afirmações inteiramente desconexas. Mas, com toda
vari ante de redt;cionismo neopositi vista se encon:ra em um artigo I vll10 ncia, um ponto de vista é inevitável; e a tentativa ingêr,ua

de René Künio ('ue insiste várias vezes na seme\har.ça entre d, ultrapassá-lo não pode senão cor.duzir ac engano de si próprio
o '"1 b " aplicação acrítica àe um ponte de vista inconscientc".75
Weber e Durkhe ;;n; eie até que Max We er, :nes:no
sem o conhecer", acompanha Durkheirr. em sua concepção, .da Fntretanto, enquanto Weber procura ao menes vincu:ar o
re:ação entre a ciência e a ação prática e na idéia de uma cr:tlca ,,'\lltl) de vista a cerlas configurações históricas e sócio-culturais
social não-ideoló gica e "fundamentada na cibcia".74 I I' Kulturwertideen - Popper permanece significativamente
Integração de Max. Weber na grar>.de corrente II. losn a este respeito. Pior, ele vai perseguir com ar.átemas
despojando-o de sua irritante d imensão hi storIcls!;!. elou su- '1 •.\'1'. Iodas as tentativas da sociologia do conhecimento (ou do
ri II 1'.1110 ) de vi ncular os pressüpostos ccgr.itivos a grupos cu
peração" pela interpretação de um retorno a Durkhelfv: e entr
estes do:s pólos - aliás complementares - que se desenvoJv' I· I sociai s. E m uma amálgama grosseiro, ele assimiia estas
I,

4R 49
às origens co POSilivis!11o: a "autodesideologização" do cientista
tentativas às teorias :'acistas do conhecimento, como expressão
individual. Em loào caso, Popper rejeil2., ccm razão, esta concepção
de uma mesma postura irracionalista: "a crença em que ' pensamos
da qual ele zcmba: "a socio:ogia do conhecimento .,. considera a
com nosso sangue' ou 'com nessa herança nacional' ou 'com
nossa classe' ". Trata-se para ele de concepções que advêm do ciência ou o conhecimento como um processo que se desenvolve
"místi:::ismo": "Os marxistas estão hab:tuados a explicar o desa- no espírito ou na cO:1sciêr.cia do cienl;5ta individual, ou talvez
cardo com um adversário por seu preconceito de classe e os como o resultado de um desta natureza. Se se examina
sociólogos do conhecimento por sua ideologia l.otal. Estes méto- desta forma, O que nós chamamos objclívidade cier!tífica deve
dos ... destrcem claramente a base da raciCnal e conduzem , com efeito se tornar incompreensível ou rr.esmo
em última análise, ao anli-ra::íonalismo e ao mislidsmo" . Mas impossível... Se a objclivídade CiCJltífica estivesse fundamentada,
ele não encontra nada de melr.or para epor a esta diabólica como a teoria socíológ :ca do conhecimento o supõe ingenuamente,
sociologia do conhecimer.to - que comete o pecado de "dividir na imparcialídade ou na objelividade do cientiSTa individu21 , er.tão
seria necessário dizer-lhe adeus",78
a humanidade entre am:gos e inimigos" - do que vagas e
devotadas deutrinas morais e religi05as·. a "crença cristã na Graças a Popper. c dogma que orientou durante rr.ais de
fraternidade de todes os homens" e a " fé r.a unidade um século - e continua ainda a predominar - o conjunto
do homem", destinôdas a servir de fundamento à "perspectIVa da abordagem positivista do da objetividade cognitiva
científica" de "nossa c!vi !i zação ocidenta!" ,76 e da relação ciênc:aJideologia se 2chz. radicalmente quest:onado,
Apesar desta incompreensão tipicamente positivista da so- por assim dizer "do interior" do própric campo positivista. O
ciolcgia do conhecimento, o de Popper uma falO de que esta contestação pers!,icaz e pertinente tome a forma
dimensão original que lhe dá uma supenondade mdlscullvel desajeitada e inadequada de "crítica da do conhecimento"
os outros positivistas: o reconhecimento lúcidc de que a não retira nada de seu valor intrínseco; os argumentos de Popper
vidade científica não poderia ser o resultado de qualquer boa locam no pr6prio coração da tradição positivista ciássica.
vontade" individ'jal do homem da ciência, de sua p:etema. Eo treté.'.nto, sobre um aspecto essencial e decisivo, Popper
cidade de se iiberar de seus próprios "preconceitos": "O pnnclpal p 'nnanece inteiramente na continuidade desta tradiçãc : a recusa
problema com os preconceitos é que não existe d.ireto dr Jistinguir (com relação à questãe da objetividade) as ciências
para se desembaraçar deles . Porque , como se (leiais das ciências naturais, Ele retoma assim com uma mão o
fizemos qualGuer progresso em nessa tentativa de nos d.e '111(' ele havia deixado com a outra e faz voltar o conjunto de
nossos oreccnceitos? Não é comum que os que estao maIs ('\I discurse os atalhos percorridos pelo logos positiv ista:
convencidos de estarem livres àe seus preccnceitos sejam oS que I (lhjctividade científica ao nível iôdividual é impossível "não

mais os têm (most prejudiceá)?" Mas, esta crítica IlIltlH;nte nas ciências sociais ou polfticas, onde os interesses de
não é dirigida, como se poderia per:sar. aos positivistas clássicos, I ou de outros motivos ocultos similares podem desempenhar
mas à ... sociologia do conhecimento que se supõe querer "refcrmar III U papel , mas no mesrr.o grau nas ciências naturais . Qualquer

as ciências sociais tornando c ci.entista s::lcial consciente das forças I II I q\le tenha conhecimentos seb:-e a história das ciências sociais
sociais ideclógicas que lhe têm inconscientemente guiado".77 I I consciente da tenac:cade apaixonada que caracte.-iza muitas

É verdaàe que esta ilusão aparece nos escritos ele f \Ias querelas. quantieade de parcialidade política
mas ela está longe de constituir o eixo central da sua SOClO'?gta 1,,,1. IlItlueneiar as teorias políticas mais fortemente do que a
do conhecimento; é pele menos paradoxal que Popper lhe atribua .. 1I11ldade que mostram cenos na:urais com relação
a cu a exclusividade de uma démarche que remonra ilw, produç ões ir.telectuaís" .79 Em sua polêmica com Adorno

50 51
noS anos 60, Popper ;nsiste de novO Cjue não há neilhuma por exemplo a posição social ou ideológica de pesquísador sfro
em termos de entre o cientista natural e o soclal. [)
8 assim delas próprias, apesar de naturalmente
a este enunciado hábil, a peça é jogada: o papel das penharem â curto pruzc seLl
ideologias e dos pontes de vista de c!asse é assimilado. ao A solução é elegar:te e coerente; ela ?ern:ite wperar as
das obsessões puramente psicológicas do pes:::;U\sador Jndlvldual li mitações mais evidentes do velho positivismo ; ela é, no cntar.to,
(sua obst;nação, sua "paixão", sua presunção relação ,a s',Jas outra coisa q:.:e não uma transposição do mesmo problema a um
teses et::.) de tal mar.e;ra que se pode enco;-.tra-las tambem nas nível superior (sem absolutamente resolvê-lo)? Ela permite, de
ciências nal'Jreza. forma melhor do que as receitas de Durkhci m, retirar da ciência
Uma vez que o problema é cclccado nestes lermos, a solução social estas "futilidades" que se chamam visito i\Oclal de mundo
parece fácil, sol Lição evidentemente Poa dos e ponto de vista de classe? O próprio Popper enfatiza que este
cientistas naturais e inspirada em seu modelo operacIOnal de modele ("institucional") de objeti vidadc é de origem cier. tíflcQ-
objetividade científica: "a objetividade está estreitamente natural; pode-se adm itir - com reservas - que o
ao aspecro social du métodu ao f2.to de que ClenCla método que ele descreve corresponde efetivamente à prática
e a objetividade científica nã::. resulram (e nãc podem resultar) concreta das ciências da natureza e que ele lhes assegura resultados
das tentativas do cientista individual em ser 'objetivo', mas àa "objetivos". Pode-se, entretanto, aplicá-lo às ciêncías scciais? Ao
cooperação de vários cientislas. A científica pode querer transportar !11ecanicamente a démarche cieniífico-natural
ser descrila CO:110 a intersubjeliv\dade ào método científico". Que i'ls ciências dc. SOCiedade - proced imento tipicamente positivista
significa isto concretame;;te? Po?pe, a sobre "dois - Popper se envolve e:n um impasse. Na realidade, quem ousará
aspectos do métcdo das ciências naturais que sa? a pretender que nas de pesq uisa científico-social "futi-
este respeito" : I) a I iberdade de crítica; 2) a eXlstencI3 de uma li lades" como as posições sociais ou ideológicas "el iminam-se a
linguagem comum: os naturais "precuram com próprias" ? Isto é claramente impossível, por duas razões que
seriedade falar uma única e língua, mesmo se eles L:ullZam I )opper prefere ignorar:
línguas natais di ferentes". Estes dois aspectos constituen:' 1) O gênero de "verdade objetiva" que resulta de urna
c "carálcr púb'ico de método c:entífico". cl!ja e depende em ampla med ida das forças econômicas,
o fundamento ccncreto são a existência "de LIlslltUlçoes (lI:iais ou políticas que a controlam ou financiam. Este controle
socia.is que foram plan ifícadas para desenvol a p(\de ser exercido de forma &rbitrária e brutal (cor:1o nos países
científica e a crítica; por os laboratónos, as pubhcaçoes hHalitários) ou "legal" e "constitucional" (C01110 o BerufI'Verbot '
e congressos científicos". R: Encontra-se assim em uma lIi l Al emanha Ocidental) ; pode ser ta:nbém indirelo e mediatizado
nova teor:a da cbjelividade científica - a objetividade lItstlfllcwnal: ("da pressão dos financiadores. por exemplo). Em toco caso, as
"Para resumir estas poderia se dizer <;ue o que III titui ções de pesquisa social, da mesma forma que os pesqui -
desi gnamos per objetivíd<!de científica não é um produto ,da 1.lolI.:S indi viduais, não escapam aos múltiplos condicionamentos
imparcialidade do sábio indiviàual, mas um produto. d? carater '" - mesmo c;ue seja possível reconhecer nelas uma
social ou público do método científico; e a do I II 11 11(' 111 de autonomia.
sábio indi é, na medida em que existe, não a fonte.
) Nas universidades, ccnferências, colóqui os, revistas e
mas antes o resultado desta objetívidade social ou insÚ'Jcional-
pll l 01 1\açücs científico -sociais nãc ocerre absolutamente um con -
mente organizada" .&2 Graças a este método, ('
II II r ntre historiadores cu ecor.omistas dê: mes ma forma que
eliminadas, de accrdo com Popper, todas as parcmildades, qUl.: f
111 1(' li consenso da instit'Jiçãc equivalente no campo da química
sejam individuais ou de classe: "Futilidades (Kleinigkeiten) C0111('
53
52
a sua incapacidade de fazer uso dos ir..slntmentos SOClaiS de
ou da físi ca. Antigos debates de um sécu:o (sobre a teoria marxista científica ... alguns c:entistas sociais são incapazes e
do valor, por exemplo) estão longe de serem .resolvidos, e c.ada mes mo mdl spostos (Wlwillig) a fa!ar uma linguagem comum. Mas
cOlTente se apega a suas posições apes ar d.? hvre a razão não é o interesse de classe e a solução não é urr.a síntese
exercício da crítica, do debate j)úblico, da confrontaçao das di alética hegeliar.a, cem a
diversas escolas etc. As divergências entre Lavoisier e os parLid2.rios
Examinemos de perto es!es três argumentos: 1) A !"eferênc;a
do flogístico* foram depois :::Ie :nuito :ernpo vele
a Aristóteles e Hegel dificilmente poce ser levada a séno; seria
desenvolvimento da ciência quím:ca, mas as poleffilCas. entre
necessário colocá-la na conta cos caprichos pessoais de Popper
historiadores de orientações di st mtas ltberalS, .ié1-
e de sua confusão diante de um problema que não conseguiu
cobinos, socialistas) sobre (.s c<!.usas d2. Revolução Francesa estão
resolver no quadro de seu sistema epistemológico. 2) A explicação
longe de serem exauridas. do fracasso do método pela nãc-util ização de se;;s instrumentos
Se a démarche da "objetividade institucio:>a;" é possível é tautológica. O sue seria necessário é precisamente explicar por
(com certas limitações) no domínio das ciênc:ias naturais, . é qu e estes ." instrumentos sociais" não foram util izados pelos cien-
precisamente porque as visões sociais do mu:.do, as IdeologiaS listas SOCIaiS . 3) O último argumento é r.1ê.:s interessante e
e os pontos de vista de não n.e\as um papel revelador: a recusa, ou a má vontade, dos cientistas sociais em
tão decisivo como nas ciências àa sociedade. Ao tem-:ar falar u ma linguagem comum . Aqui também não é suficiente
esta djferença essencial, popper, como todos e o fato: é. as causas . Ora, isso Popper
incapaz de dar conta dos problemas específiCOS da ob.!etlvldade faz: ele se ilmlLa a reJeitar, in limíne, a ex[)licação pelo
científico- lIl tcresse de classe, sem oferecer nenhuma outra . Resta, portanto ,
Ele parece reconhecer, em certe lT'-omento. que a aj)lícação apenas uma explicação : a "má vontade" dos cientistas sociais . A
do " método instit:.Jcicnal" às ciências da sociedade encontra certas solução seria, portanto, a "boa vontade"? De acordo com Popper
"dificuldi.ides": "É verdade que as sociJ.is não atmglram "a única saída aberta às ciências sociêis é esquecer todos
ainda inteirame:1te esta publicidade do métcdo". (Subi por logos de artifício verbais e enfrentar os proble;nas práticos de
IhlSSO tempo com a ajuda dos métodos teóricos que são funda-
nóS ML.) Esta fonr.a de conceber 2. parftcularidaGe das ClenClas
11 K'nta lme nte os rr.esmos em todas as ciências" 85 Volta-se assim
sociai s como um "atrase" com relação 3S ciênci2.S da
'1 velha e boa receita do positivismo do XlX : 'a
ue será em breve superado é lugar-comum do pCSIl! v;smo
OIl1ade" do cier:tista individual. sua disposição a abandonar os
Comte: um século e meio 1l'ais tarde o atraso não parece
"logos de artjfície verbais" e a dialética, a falar a mesma
próximo de ser superado .. . Mas explica os obstáculos
Illf rllagem que seus colegzs, e a utilizar o métcdo das ciências
à utilização de seu método nas ClenClas humana5? Ao
I,.,turais. Após ter construídc uma teoda sofisticada e inovadora
toda análise sociolégica do (papel das classes
.Iu llbjctividade institucional, Popper termina por recair nos 1u-
e de seus pontos de vis:.a), ele é condenado a exphcaçoes
\'I\' \ ,comuns mais usados e tradicionais do positivismo, como
tautológicas ou mesmo francamertte ridkulas: verdade q,ue as
!m:sc um gato que, apés um número de alta técniea acrobática,
ciências sociais não atingiram ainda esta ;:lUbltcldade do
,. I Il(ssc sobre suas quatro patas .. .
Isto é particularmente devido à inf!uência dcstruido:a da.intel1genc la
de Aristóteles e de Hegel (sic!), em pane deVido também I\ntretanto, seria injusto e errÔneo não reconhecer a parte
f vt' ldade que a tese de Popper conté:n : na medida em que a
I I II Iii social constitui-se numa esfera rel ativamente autênoma

* Referência a um flu ido imaginado pelos químicos para explicar a combustão. II" " " I flação aos condicionamentos sociais, o que se Cha:lla de
sécu lo XVJll. (N. do T .)
55
54
gl .
,
"método público" te m um papel crucial a dcse'"\1pe nhar. É abso- nuançada.:.:e ' oS deci si va: existe 01,; não, nas clencias sociais,
lutamente que a ciência não pode progre ir sem a Urr.2 ligação significativa entre estes deis "mundos"? O próprio

liberdade de crítica, debate, confronto entre. escolas diversas e Popper. parece reconhecer que existe, já que afirma que lodo
confrontação permanente de pontos de v;sta entre pes- conhecImento dos fatos está necessariamente articulaco por uma
/'

guis adores, tanto no interior de uma mesma_ vIsao. de teona e, portan to, por mitos e preconceitos . Como, então, atingir
mundo, como entre cientistas ligacos a opçoes aXlOlogJcas e o conhecimente objetívo? Popper propõe dois argumentos: de um
político-sociais contraditórias. A ausêr.cia de um tal debate, _o lado, ele faz referência a um misterioso processe de "autotrans-
enfraquecimento ou a interdição da critica não podem senao cendência" gr<:.ças ao qual o cientista "desafia seus próprios
conduzir de forma iné xorável, à do pensarI:lento preconce:tos e pressupostos habituais". Ele emprega a este respeito
ao do gmatismo, ao obscurantismo e/ou à unidimensio- uma metafora fortemente reve\adO(a: "nós nos livramos do pântar-.o
nalidade: poderiam se r multiplicados os exemplos! de nossa ignorância puxandO-,nos pelos cordões de nossas botas"
Mas a crítica e o debate não abolem, con:rariamef'.te ao que - formulação que corresponde quase pal avra por palavra à lenda
do Barão de Mi.ir.chhausen, cuja ;ógica se encon:ra no cerne de
pensa Popper, o caráter irredutível das classe e de
todo raciocínio positivista ... O outro a-:-gumento é que o crescioento
suas expressões axiológicas e/ou ut6plcas nas ClenCJ.as .soclals. O
d o conhecimento é um desenvo!vimento evolucicnlsta. "uma se-
que permite compreender a inexistência no sele de um
leção da;winiana" semelioante à que permite às plantas e élOS
consenso c ientífico (mesmo provisório) ào t\PO eXIstente da forma
ani mais "resolver seus problemas pe:o r.1étodo da com?etiçãa
usual nas ciências da natureza. Em o;.;tros termos: um marxista
ent re tentativas de soluções e de erro". Em nessa
que ignorasse a críti ca de Max Weber ou um que
opinião, este modelo social-d2rw inis ta é ainda mais arbitrário que
negli genciasse Marx fic ariam cientificamenle Mas
;1 da objetividade institucional: é impossível afirmar seriamente
a confrontação fértil, o conhecimento recíproco e o debate ne-
- ao menos no domínio das ciências soçiais - que a "sobre-
cessários não conduzem absolutame;l!e à abelição da distância
vi vênci a" de uma te oria é a prova de sua justeza e ainda menos
entre visões sociais de mundo distintas ou ao desaparecimento
que sua "eliminação" (por quem?) consti:ui a demonstração de
das profundas divergências axiológicas, rr.elOdológic.as, e
'eu e rro.86
mesmo empíricas entre estas duas escolas que dIVidem awda
hoje, um século depois da mcrte de Marx e. maIs de 60 anos A idéia de uma ob:etiviéade e autonomia do universQ das
após a morte de Weber, o campo científico-social. phras cu lturais e do conhecimento em particular é ce todo
Iwrt inente, mas ela rão contrari.ameme ao que pretende
Em seus escrltos recentes - em O conheCimento
Po pper, es vaziar a questão das condições de possibilidade do
ohjetivo (l972) - Popper procura reformular sea
I nllhcci rnento objetivo Lia sociedade e das ce:enninações so:::iais
introduzindo o conceito de "terceiro mundo", conjunto
Ik 1>11 <1 produção.
de conteúdos objetivos do pensamento, distinto dos físicos
("pri meiro mundo") e dos estados de consciência
mundo"). Este mU:1do" - in spirado pela esfera de t )'I'i\S
de Platão e o espirito o!:>jetivo de Hegel (dois inimigos mortaIs
da "sociedade aberta" subitamente reabilitados por Popper) - I ",,!I"rect. Esquisse d 'un rableau hislOriq/lc de... pro gres d e I'esprir Intmain. t 793,
inclui o un:verso do conhecimento e é come uma esfera 1111,,", S\lciales, 1966, p. 21 J ·1 2 . 244, 253 . 27 1. •
amplamente autônoma. Popper inslste. com razãc, que é I ''''''.''<:cl. Ofl. ci r., p, 19 9.
sível interpretar este terceiro rr.undo como uma simples express'I.(1 ',11111> 11 . sur la Sciençe de !' Homme", 18 13. Oeuvres (in s!. par EnfanlinJ,
do seg'.>nco"; mas ele se esquiva de uma questão, ' I . Ill' HI IJ Editeur. Paris. I R76. p. 284.

56 57
"L ' accomplissemcnt du positivism.e" , te" É/uda Philosophiq ue.ç, Presses Universitaircs
4. lbid., p. 29-30. de France, julho-setembro de 1973, p. 396 -397.
5. S. Simon, " De la réorganisat ion de la soci eté 1814, Oell vres de Saim 17. A. Comte. COUr.l de philosophie pOJiJive. VI. p. 357 e Appel aux conservareurs,
Simoll er d ' fll{a m in, Paris, 1865 , T . XV , p. 183. p . 90· 9 1. Acrescentemos , entrcta nto, que Co mie havia sa biamente previsio uma solução
6. S. Simon, " De la physio logi e soc iale appliquée 11 l' amélioration des inst ltutions de e mergênci a para o período tra nsitório durante o qual a d outri na positiv ista não seria
ci ales" , Oeuvre.l, E . Dentu , Paris , 1875, vol. X, p . 190. Sob re a dimensão revoluci onánil. suficientemente i nfl uente para garant.ir a '\lisciplin3 industrial": "A at iva part ici pação
de S . Simon, ver P. Ansart, S. Simon, Presses Universitaires de France, 1969 , p . 38. dos exérci tos propriame nte d itos na su stentaç ão perma ne nte da ordem pública" : uma
"O problema da revolução se ach a assim co locado, quaisquer que sej am as precauções tarefa que constitui dora vante " em todos os lugares e de forma cresce nte, sua atribu ição
°
de S. Simon a este respeito .. . novo si siema deve se edificar sobre a ru ín a total do princ ipal e cons tante" . Real mente, en fa tiz.a judíc.iosamente Com te, "cm um estado de
antigo regime .. . O esqu ema de S ai nt Si mo n rejei ta o arca ísmo da socl.eda de da qu al profu nda desordem intelectual e moral , que pode tornar sempre iminente a anarquia
ele é contemporâneo. projeta c m uma sociedade futura a das li berdad es reais m ateri al, é necessár io que os meios de repressão adquiram um a in tensi dade corres pon-
e conclama fin alme nte à destruição da socied ade política d e seu tempo ." dente àquela das tendências insurreci on ai s. para que uma o rd em indispensável protej a
7. Marcuse à nalisou de form a m arcante esta passagem em seu li vro Razão e revolução: sufi cientemente o verdadeiro progresso soci al" ... Além d isso , Comte pensa e não se
" A filosofia d o ll umi nismo af innava que a razào poderia do minar o mundo e que os pode ne.gar a modern idade impressionante desta idéia - que "a clareza e a precisão
homens poderiam transform ar as suas form as obs oleta s de vida caso agissem a parti r das espccu laçoes m il itares deve m te nder, por s ua natureza, a fa vorecer ... o avariço do
de seus co nheci me ntos e capacidades liberados . A filoso fia po si tiv ista de Comte ap resent a espíri to positivo : como O confirmou , após três século s, tantos exemplos fe li zes de uma
o quadro geral de uma i!!oria social no sentido de co ntra-restar as tendê·neias útil ali an ça entre as pesquisas çientíf icas e os estudos militares. c uja afinidade espon tânea
do raciona lismo. Ele chegou a uma defesa id eológica da SOCiedade burguesa e. ale m dete rm inou até aqui as mais importantes criações especi ais para a educação positiva".
di sso, a sua teoria contém os germes de uma justificação filosófica do auto ritaris mo" . - Co mt e. de philosop hie pC.litive, Société Posi:iv!ste. 1894, le mo V),
Herbert Marcuse, Reas(!I1 Md Revo/lIlioll , BeaCOll Press. 1960. p . 342. p. 367· 371.
18. K. Marx, te Cap irai. livro I, G arnier Flammarion, Paris, 1969, p. 631.
8. Ver G. M isch, "Zur Entsiehung des franzbs ichen Positivis mus" , Arch iv fiá Geschichrc
der Philo.\ophie , Band XIV, Berlim, 1901, p. 204-205. \9. A . Comte, Cour.\ de phi/osoph ie posilive , tomo IV, p. 214.

9. G. Lichthei m , " The coneept of ideology"; HiSlor)' (lnd Th eor)', Mouton, vol. VI , 20. A. Comte, de phi/o.<Of'hie poJitive . IV , p. 100-1 0 1.
21. Jean-Paul Enthoven critica o "positivismo vergon ho so que invad iu at ualmente as
1965, p .169.
c iências humanas" c enfatiza ql:C "o positiv ismo social é bem m ais sutil que estes qt;e
10 . A Comie, Appel aux Conse nateurs. ed . Autor, Paris, 1855. p. 4.
agi tam e o re.jvindicam : sua verdadeim é s.:a forma . SC:.J verdadei ro trabalho
11. Henri Gouhier. 1. Vri n. Paris, ]941 . vol. JlI, p. 334. 382. Como enfatiza justamente Ideológico é o trabal ho de seu mé todo" . Op. p. 5-6.
Pierre Arnaud, o papel da escola "retrógrada" é mais import ante na elaboração so- .12. E. Durkhei m . "La socio logie", 1915 , em Texles, i. f.'lem ems d'une lM orie m eia/e .
ciologia de Comie do que na soc iologia de Condorcel - como reconh ece.u o propno
hiltions de M inuit, 1975, p . 115.
A . Comte. Cf. Pierre Arn aud, Sociologie de Co m /e, Presses Un lverslialres de France,
.' 1 E. D urkhcim, M07l1e.'q/lie u CI ROL/H eaU, précurseurs de la soci% gie . Par' s, 1953,
1969. p. 60. p 113.
\2. Ver a este rcspeito O int eressa nte prefácio de Jean-Pau l Enth o ven ti reedição do /'1 E. Durkheim. Les regles de /a méthode .fO ciologique. PUF. Paris, 1956, p. 15-1 9.
Curso de filo.w fia po.d tiva : " Augu sto Comie avaliava com o de grande beati tude: os
E. Durk heim, ln "cience er "Q(.'Jion . PU F. Paris, 1970 . p . 80-8 1.
fi lósofos do Anti go Regime e os filó sofo s da Rev oluç ão nilo se adequ am. mais a e sta
no va idade de ouro qu e d ilui em um mesmo mo vi mento a agon ia dos mllltares- padrcs )(, E. Durkh ci m e Paul Fauccnne t, "Sociologie e t sciences soeia les" , eM ienes, I,
e o triunfo dos re is-banqueiros da época. O tempo não é mais de prece ou de pensamen to 1'1Ol. p. 123 .
críti co. É necessário produzir. E esta produ ção el<ige por sua vez uma le gi timaçãO J / E. Durkheim, " La philosoph ie dans les Un:versités Al1 emandes" , 18'86-67, em Textes
politica servirá de couraça contra os assaltos de todos os sofistas e de I ,","'crions socia/es el inslÍl/Ilions, EC. de M:nuit, Paris, 1975. p. 48 5 , e:lfati zado pe r
todos os icarianos desgarrados do século. A ciênc ia SOCial do pOS Iti Vismo sera. portanto, ii o', " M L.
essa boa e necessária doutrina ... É, portanto . o fim da Utopia que anunc ia a obra de " Durkheim , La division dL/ travai! IOeiQ/, PUF, Paris, 1960. p. 157-158, 369-370.
Augusto Comtc" . - Jean Paul Enthove n. "La fin de l' Utop ie". CIU A. Comte, Ph)'siq/u' IIhllllhado por nós M L.
Sociale, Hermann . Paris , 1975 , p. 2-3. "/ h. Durkhei m, La socic;/e erl 'ac/iol! . PU::-, Par:s, 1970, 299. s'Jb:inhaéo
l3. cc. Pierre Arn aud. Pr;licique d'Augu.lle Comte. A. Co li n. Paris. 1965, p . 1:2.4 I '1 ML.
\4. Em Po litique d'Augl.i.lle Comle, ;l o 7; . III I · Durkheim, Le" reg/es de la mi thr:de soô% gique. preft.cic, p. 8. sublinhado
11,1 MI ..
15. Comte, Cours de philo.wpilie po.lÍ;i \, c. I. Cl assique Garni er, t 949. p. 49.
I I I t Ni ,bet, a:ld Sociology". American J oumal of Sociology, L VIII.
16 . J. B. Say, TraÍfé d'Économie Polirique, "Discours Prélim inaire", Ed. ,
t'I')
1972, p . 15-:6. Sobre a a:;nidade enire e Say. vcr Angele !<re mer- Mancltl.

59
58
59. P " Discussion on and Obj ectivity" , em O. Stammer (ed .).
32. Mclvin Ric hter, " Durkheim's polit ics and politicai theory". em K . Wolff (ed .), Emile
Max Weber and Sociology Tnday, Hr.JjJcr and Rcw, Nova York, 1972, p. 75-76.
Durkheim 1858-1917, The Ohio State University Press. Colum bus. 1960.
60. M. Weber , Théorie de la p. ;'25.
33. E. Durkheim, Les regleJ de la millw de ... , p. 14.
61. M. Weber. Wisull schaftslehre, p . 15 1.
34. Ibid .. p. 140, 144. 31, sublinhado por nÓs ML.
62. M. Weber, Thénrie de la SL'ience, p. 193.
35. E. Durkheim , ÚJ science sociale el l'ac/ion, p. 241 . 113 .
63 . A . von Schel ting , op. Cil. , p. 62.
36 E. Dllrkhci m, ÚJ scielJ ce so ciale e l l'aclioll , p. 115.
64. M. Weber , op. cit., p. 80-8;.
37: CL George A. Lundbcrg, Clarence C. Schrag, OttO N . Larsen , Soôo!ogy. Harper
65. Para uma discussão detalhada destas ques tões. ver r.osso ensaio " Marx et
and Brot hcrs. No va York.1 958, p. 6, 16,736,744 etc. . '
notes sur un dialogue impl iciie". Dialect ique el Révolution , Ed. An ihropos, Paris, 1973.
38. Cf. Kurt Wol ff, Ver.mch lU ciner Wissen soziolo/{ie, Luchte.rh nnd , Berhm-Neuwlcd,
66. Ver a este respeito a observação irón ica de John Rex sobre a receptividade de
1968, cap . I. Weber a uma certa soci olog ia unglo-americana: " A utilização de uma li ngu agem posi-
39. L. Gotd man n, Le.' sciellces humaines el la ph ilosophie, p . 40-44. .' n tivista po r Weber na discussão das explicações causais adequadas e das relações sociqis
40. Ver a este re speito H. Stuart Hughes, COllsciou.lness ond Sooery, The Reorren/a/lO levou a que o positivismo moderno lhe atri buísse um certo reconhecimento discretc ,
O European Social TJlOugnr 1890-/930. Paladin , St. Alberts, 1974, p. Uma apesar daquilo que parece, aos olhos dos que se s ituam sob esta trad ição. uma ;>reo-
if t di fcrenl'a entre Rick ert e We ber é que este último não excluI de forma tao taxatlva cupação infeliz w;n a e com as sigr.ifícações". John Rcx, "Tij)ology 3:Jd Ob-
ou ra yi . d Ih 'b' m lu"ar subordmado
o estudo das leis nas ciências históric as, apesar e e atn ulr .u o.. M jectivity : A Commer..t on four sociological metl:ods", eo A. Max.
como simple meio auxiliar no conhecimcnto do fenômeno Ind Iv Idu ai C.untco. Ver lo Weher and Modem Sociolngy. Routledge and Kegan Paul, Lcr.dres, : 971, ;>. 2-25.
Weber, Euais .l Ur la Théo ríe de la Scíence (ir. JulIen Freund), Llbrame Plon. Par s,
67. Max Weber, Théorie de la Science, p. 173-175. Comparar com T. Parsons, "V a-
1965 . p. 162-165. . .. lue-freedom and objectivi:y". O. S:ammer Max. Weber and Sociology TotMy,
41 M ax Weber TllI!orie de la Scíence, p. 152; cf. Max Weber, Gesmnmelte Au/<atze Harpcr, Lo ndres, 1971. p. 38-39.
W;sunJehajl.rlehre . T übingcn . J. C. B. ""!ohr, 1922, p . 178·179. NB. Rev imos e 68. Parsons, 01'. dt. , p. 34,48.
às vezes a tradução de acordo com o tex to ongIna\.
69. M. Weber, Théorie de la Science, 174.
42. M. W eber. Théol'ie de la Sdence. p. 128-129, Wis.w uchaflslchre, p. 153. .
70. Hans Albert, "Discussion cr. anel Max Weber and
4 3. M. Webc r, Théorie d e la Science, p. 151-152, 163, 16 8- 169; 171-172, WI.' - Sociology Toda)' , ;>. 58.
senschaflslehre. p. 170. 17 8. 182, 184. 7 1. H. Albert, op. cil .. ;::. 55, su'o:i:Jhcdo por nós ML.
44 . [d." p . 212, Wisu nschaftslehre, p. 213-214. 72. H. Albert, op. e ii. . p. 56.
45. Id., p. 1R3 . 73. T. Parsons, op. cit., J:. 79.
46. Id.. p. 17 3-175, Wis.wHchaftsl('hre. p. 185 - 186. 74. Cf. René Konig, "Le probleme des jugemcnts de valeur cl':cz Webe", Cahiers
47 . Id., p. 131-132 ; d . tam bém p. 137- 138, 168-1 72 e Wi.r.icnJchaf/.<lehre, p. 473. fl1lema lionaux de Snci% gie, vol. XLI, Paris, 1966.
48. Id.. p . 134. .. UGE 75 . K. Popper, The Open Sociery and il.r enemies, vo1. 2 (Hegel and Marx), Róutl edge
49 . M. Weber, "La science comme vocution", 1919, Le savanl e le [l()lllIque, , and Kegan Pau l, Londr:s, 1962, p. 259-261. Nossas referênci as são ;odas feita s com
1963 , p. 82; cf. também Wis...enscltaftsleltre, p. 471·72. rela ção à ed ição porq ue a tradução frances a ("resCI:nid:;.") apresenta muitas la-
50. M. Weber. Wi.\'.\'enschaJlxlehre, p. 459. . ." " Clln as.
51. M. Weber, " Roscher und Kn ies n. Kni es und das Irrallonahtatsproblem , 1905, /6. K. Popper, op. I.'it.. p. 216,235-236, 243- 244 .
Wissen schaflslehre. p. 6 1. 77 , K. Popper, op. ci/., 222.
52. M. Weber, Wissenscltafislehre. p. 471. 'lll . K. Popper, op. cil., p. ;:: 7.
53 . M. Wcber. Théorie de la sde nce, p. 2 12. 19. K. Popper, op. ci/ .. p. 2: 7.
54. M. Weber, ÚJ savanl el le poUliqlle, p. 85. MO. "É inteiramer.:c fa:so crer Q,UC as c;ências da n,:,:urezú s::'o mais cbjetivas que as
55. M . Weber, Tltéorie de lo science. p. 130, WiHcn.,·chaflslehre, p. 154-155 e também I sociais. O cientista é :ã() ter.denc:cso como :odos os homens e
r- IIl felizmente ... em geral extremamente unilateral e (c:lderciosc no pw:onccito em
p . 460 . . 1965, to mo I. f vor de suas próprias idéias ." K. Popper, " Die Logik sozlalwissenschafter.",
56 . Ver a cste respe ito L. A1thusscr. Ure le Capítol, Maspéro, Pans,
'III Der Positivism uss/reil in der deU/unen Sozi'JIogie, Neuwied, 1975,
p . 27 -28.
II 11 2.
57 L Goldman n. LeJ sciena.< hwnaines el la ph ilosophie, p. 43.
58: A'. von Schelting, Max Weber.< Wis.\cnschaftslehre, 1. C. B. Mohr. Tübingen, 1934,
MI. K. Popper, op. ci/., p. ver Popper, The Hi.'loricism,
I ' \lll lcdgc , 1957, p. 15/5: "n qi.ie 'a de conhecimento' negligencia é preci-
p. 405 -41 2.

60 61
.<mHeM!! (l soc:iv!og;o d o wnh ec:imenlO - Q caráter social e púb lico da ciência: neglí-

ge ncla o falO de que a in1.crsubjelividadc da ciência e de suas in sti tuições para a difusão
e ti das idé ins são n garan tia da objclÍvidade c ientífica".
82. K. Popper, The Open Society. II . p. 220.
83. K. po ppcr, "Die Legik der Sozialwi ssensch af:", em po"Úv.,mu.wreit, p. 113, Slõ-

blinhado por n6s ML.


84 . .K. Popper, op. cil .. p. 22 J -222.
85. K. Popper, ibid.• p. 222.
86. Karl popper, OlljeLllve Knowledge, An /:'Y0!ulu>nW) Apr woch , At lhe
Prcss, Ox'ford. \972. p. I i2. 144-149.

o h istoricismo ou a luz prismada

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