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David W. JEFFERY
School of Agriculture, Food and Wine, Waite Campus, The University of Adelaide, PMB 1, Glen
Osmond, SA 5064.
david.jeffery@adelaide.edu.au
Foi publicada uma primeira versão deste artigo na revista Australian & New Zealand Grapegrower, Fevereiro
2013, Edição 589.
Dimitra Capone, um investigador do The Australian Wine Research Institute (AWRI), concluiu
recentemente o doutoramento na Universidade de Adelaide, onde foi coorientado pelo professor
Dennis Taylor, Dr. Mark Sefton e Dr. David Jeffery. Os resultados da tese do Dr. Dimitra foram
prodigiosos e a sua tese rendeu-lhe a congratulação do Reitor e o prémio «Dean’s Commendation
for Doctoral Thesis Excellence ».. Este artigo representa uma visão geral do seu trabalho relativo
aos precursores dos tióis nas uvas e no vinho. Para simplificar, não existe discussão da
estereoquímica destas moléculas que serão referidas na sua maioria como se se tratassem de
compostos individuais, quando, na realidade, 3-MH e os seus precursores existem como pares de
enantiómeros e diastereómeros, respetivamente.
Tióis Varietais
O vinho contém uma grande quantidade de compostos voláteis que contribuem para o seu aroma.
A origem de determinados compostos pode estar relacionada com moléculas presentes nas uvas
de determinadas castas, conferindo aromas característicos ao vinho. O Sauvignon Blanc, com os
seus aromas característicos de citrinos, maracujá e buxo, é um bom exemplo para o conceito de
aromas varietais. Estas características agradáveis resultam da presença de tióis "varietais"
polifuncionais, que estão entre os mais conhecidos compostos odorantes da indústria alimentar
(percepcionados a baixas concentrações da ordem dos ng / L, Tabela 1). Os tióis chave
responsáveis pelos aromas de Sauvignon Blanc são 4-mercapto-4-metil-2-pentanona (4MMP), 3-
mercaptohexanol (3-MH) e o acetato de 3- mercaptohexanol (A3-MH) (Coetzee e du Toit, 2012).
Estes tióis também foram encontrados em diversos outros vinhos como Gewurztraminer, Riesling,
Colombard, Merlot, Grenache e Cabernet Sauvignon, embora normalmente não estejam
presentes com a mesma importância que no Sauvignon Blanc.
Limiar de
Descrição do Concentração no
perceção
aroma vinho
aromática
Cassis
Baixo ng/L
4-MMP 3 ng/L Buxo
Maracujá
Maracujá
Baixo ng/L a
3-MHA 4 ng/L Buxo
baixo μg/L
Apesar de alguns compostos aromáticos varietais existirem nas suas formas ativas nas uvas e
serem subsequentemente extraídos durante a vinificação (por exemplo metoxipirazinas),
demonstrou-se recentemente que apenas pequenas quantidades de 3-MH estão presentes nos
mostos provenientes de uma seleção de clones de Sauvignon Blanc, em diferentes estádios de
maturação (Capone et al., 2011a).
Precursores de 3-MH foram identificados na sua forma conjugada com a glutationa (GLUT-3-MH)
e cisteína (Cis-3-MH) há cerca de uma década atrás. Entre os vários grupos de trabalho sobre o
assunto, o AWRI realizou recentemente estudos de investigação sobre as leveduras que
permitiram um melhor conhecimento e rendimentos mais elevados de tióis ligados à cisteína.
Contudo, pouco se conhecia sobre a relevância da forma conjugada com a glutationa até um
trabalho de colaboração ter revelado pela primeira vez, utilizando soluções modelo, que Glut-3-
MH também poderia ser um precursor do 3-MH (conversão de aproximadamente 3%), enquanto
que a forma conjugada de cisteína parecia ser mais facilmente metabolizada pelas leveduras
(conversão de aproximadamente 14%) (Grant-Preece et al, 2010).
A par deste novo estudo de fermentação, foi desenvolvido o primeiro método para analisar os
precursores de 3-MH conhecidos nos mostos e nos vinhos, utilizando cromatografia líquida de alta
eficiência acoplada à espectrometria de massa (HPLC -MS) (Capone et al., 2010). As
concentrações dos precursores foram determinadas utilizando este método para a Pinot Gris,
Riesling e Chardonnay, bem como Sauvignon Blanc, sabendo que a última variedade contém
geralmente os níveis mais elevadas. As concentrações encontradas para Cis-3-MH no Sauvignon
Blanc foram consistentes com as da bibliografia, enquanto os resultados de GLUT-3-MH foram
muito superiores aos relatados num outro estudo da mesma variedade de uva (Tabela 2). Outros
trabalhos de investigação se seguirão para determinar as razões de tal diferença, estudando os
efeitos das práticas vitícolas e enológicas.
Cys-3-MH 21 – 55 8 – 40 1 – 35
Este composto foi preparado em laboratório a partir de Glut-3-MH, utilizando o mesmo tipo de
enzima encontrada nas plantas (embora o extrato comercialmente disponível, seja derivado de rim
de equino). Os testes por HPLC-MS identificaram pela primeira vez uma presença natural de
Cysgly-3-MH no mosto de Sauvignon Blanc, que mostra a relação entre a degradação de Glut-3-
MH e a formação de Cis-3-MH (Capone et al., 2011b). Este composto suplementar foi incluído no
método analítico do precursor para que o Cysgly-e Cis-3-MH possam agora ser analisados por
uma única técnica.
Uma outra parte do enigma foi resolvida através de testes conduzidos para determinar o grau de
formação de Glut-3-MH após o esmagamento das uvas. Anteriormente, foi mais ou menos
assumido que os precursores do 3-MH estão presentes na uva e são extraídos durante a
vinificação. Este princípio foi fascinante, considerando-se s elevados níveis de GLUT-3-MH em
outras experiências (por exemplo, uvas congeladas em oposição a mostos congelados) e a taxa
de GLUT-3-MH apresenta resultados mais elevados em amostras comerciais do que nas de
Roland et al. (2010) (Tabela 2).
Importante, a par deste tipo de precursor conhecido, foi também identificar o aldeído intermediário
(que contem átomos de deutério), que resulta da condensação direta da glutationa com (E) - 2-
hexenal, - é este composto (denominado Glut-3-MHAl) que deve ser enzimaticamente reduzido
para conduzir ao Glut-3-MH geralmente encontrado. Até ao momento, não considerámos este
novo composto como um potencial precursor do 3-MH, no entanto, se este existir quantidades
significativas (que são até agoradesconhecidas) poderá representar outra fonte do 3-MH durante
vinificação.
Figura 1. Formação do composto aromático 3-MH a partir dos compostos de glutationa da uva e (E) -2 -
hexenal. As enzimas potencialmente envolvidas são - GST, glutationa S-transferase; ADH álcool
desidrogenase, AKR, aldo-ceto-redutase, GGT, γ-glutamiltranspeptidase, outras carboxipeptidases; CSL
carbono-enxofre liase. A libertação final, do 3-MH é assegurada pelas enzimas das leveduras mas as
etapas que as precedem envolvem enzimas das uvas ou enzimas microbianas.
Trabalhos anteriores realizados em clones de Sauvignon Blanc na região de Adelaide Hills no Sul
da Austrália mostraram um crescimento na concentração de precursores durante a maturação das
uvas, especialmente na aproximação da data de vindima (Capone et ai. 2011a). Outro estudo foi
levado a cabo com uma colheitamais frequente de amostras, nos diversos pontos,para verificar a
importância da escolha da data de vindima otima no que concerne à concentração dos
precursores, com o objetivo de maximizar as concentrações potenciaisa de 3-MH no vinho
(Capone et al., 2012a). As amostras foram recolhidas e analisadas a partir da fase de pintor até
várias semanas após a data da vindima – os cachos foram deixados na videira mais tempo que o
habitual, com o objetivo de estudar o efeito da sobrematuração (Figura 2). Embora o Cysgly-3-MH
tenha sido pouco detetavel em todas as fases, as concentrações dos outros precursores
geralmente aumentaram durante a maturação (especialmente Glut-3-MH) a 24°Brix.
Este aumento foi seguido por uma ligeira diminuição das concentrações de precursores, mas os
resultados foram consistentes com trabalhos anteriores e salientaram a necessidade de vindimar,
no momento certo. Este aumento foi explicado pela perda da integridade das membranas
celulares relacionadas com um aumento em compostos precursores (isto é, a glutationa e (E)-2-
hexenal) quando é atingida a maturação da uva . A flutuação de precursores durante a maturação
não foi aprofundada, mas parece estar inversamente relacionada com a acumulação de açúcares.
Estudos futuros poderiam examinar as trocas metabólicas associadas à maturação das uvas e a
sua influência na acumulação de precursores. Finalmente, um indicador útil da "maturação
aromática" poderia resultar de um tal trabalho.
350 30
Glut-3-MH
Cys-3-MH
Precursor Concentration (nmol/kg)
300
25
Brix
250
20
200
Brix
15
150
10
100
5
50
0 0
15/02 18/02 21/02 23/02 25/02 28/02 2/03 4/03 7/03 9/03 11/03 16/03 18/03 6/04
Sampling Date
Figura 2. Evolução das concentrações de Cis-e GLUT-3-MH diastereómeros (nmol/kg) e de (°Brix), durante
a maturação de Sauvignon Blanc cultivado na Vinha Coombe em Waite Campus.
Outra investigação foi realizada numa escala comercial para avaliar os efeitos da vindima
mecânica, do transporte das uvas, dos antioxidantes e do armazenamento das uvas antes do
esmagamento e prensagem. Os precursores revelaram-se sensíveis à vinificação, está claro que
é importante avaliar as operações comercialmente relevantes que possam ter um impacto na
concentração dos precursores. Tal compromisso envolveu a aplicação de SO2 e/ou ácido
ascórbico a 2,5 toneladas de uvas Sauvignon Blanc colhidas mecanicamente (Capone e Jeffery,
2011). Os diferentes tratamentos (Figura 3) foram distribuídos pela primeira vez na vinha e, em
seguida, novamente após transporte rodoviário de 800 km. As uvas foram também colhidas
manualmente, dois dias antes da colheita comercial para comparação.
Figura 3. Caixas prontas a serem transportadas com uma apresentação da quantidade de antioxidantes
(em mg/kg) adicionados no momento da vindima.
A concentração dos precursores nas amostras obtidas antes e após o transporte foram
perspicazes (Figura 4). Houve um claro efeito do SO2, que inibiu particularmente a formação do
Glut-3-MH. Ainda mais surpreendente foi o aumento do radical de Cis-3-MH (e de Glut-3-MH, em
menor escala) depois do transporte, com taxas não encontradas anteriormente. Os resultados
reforçaram o conceito de que o Glut-3-MH pode acumular-se após a colheita o pode ser
explicadopela formação de Glut-3-MH e a degradação em Cis-3-MH na presença de enzimas da
uva (e provavelmente da microflora).
1400 Cysgly-3MH
Cys-3-MH
Precursor Concentration (nmol/L)
1200
Glut-3-MH
1000
800
600
400
200
0
50SO2_noasc
50SO2_500asc
50SO2_noasc
50SO2_500asc
50SO2_100asc
500SO2_500asc
50SO2_100asc
500SO2_500asc
noSO2_100asc
500SO2_noasc
noSO2_noasc
noSO2_100asc
noSO2_noasc
500SO2_noasc
Prior to Transportation After Transportation
Quanto aos outros compostos, estes foram afetados pelas reações de formação e transformação
associadas a processos enzimáticos e oxidativos. Com efeito, o (E)-2-hexenal diminuiu durante o
armazenamento, devido ao seu papel na formação de precursores e foi reduzido noutros
compostos em C6 por via enzimática, enquanto que o GRP aumentou devido à oxidação do ácido
caftárico, consumindo assim glutationa. Estes dois aspetos têm um claro efeito no desvio para a
formação necessária de Glut-3-MH compostos durante o armazenamento. Isto realça a
necessidade de (E)- 2-hexenal (o que requer um pouco de oxigénio para se formar) disponível no
início do tratamento de pós-colheita, na presença de glutationa, e qualquer operação que interfere
com este aspeto (por exemplo, tratamento reduzido, excesso de SO2) durante do processo
conduzirá provavelmente a concentrações mais baixas de precursores dos tióis no mosto. Em
contraste, um tratamento altamente oxidativo numa fase inicial irá permitir uma melhor
combinação de glutationa com o ácido caftárico, impedindo potencialmente a formação de
precursores. No entanto, uma vez que o Glut-3-MH é formado, a sua degradação enzimática em
Cis-3-MH seria facilitada por um período prolongado de armazenamento.
1200 Cysgly-3-MH
Cys-3-MH
Glut-3-MH
1000
Precursor Concentration (nmol/L)
800
600
400
200
0
Harvest
14 h 24 h2h 8h
30 h Press
Time Point
Figura 5. Evolução da concentração dos precursores do 3-MH (nmol/L) durante o armazenamento a
temperaturas controladas de Sauvignon Blanc colhido mecanicamente.
Conclusão
Esta série de estudos permitiu aprofundar a compreensão dos aspetos bioquímicos relacionados
com a formação de precursores do 3-MH. O trabalho ajudou a compreender a natureza dinâmica
dos precursores dos tióis durante o desenvolvimento do bago e durante as operações que se
seguem à vindima. Isto permite aos enólogos controlar de uma forma mais eficaz os perfis dos
precursores no mosto, a fim de melhorar a qualidade, através da gestão da concentração de tióis
varietais no vinho. Este é apenas o começo de uma longa série de boas descobertas, com novos
desafios no campo de investigação dos precursores dos tióis varietais.
Biografia
David W. Jeffery leciona Enologia na Universidade de Adelaide “the School of Agriculture, Food
and Wine, Waite Campus”.
Bibliografia
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