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IMPACTOS DO ENSINO DE PROGRAMAÇÃO DE COMPUTADORES

NA EDUCAÇÃO BÁSICA

Abel Eduardo Parpaioli Cheque - abelepc@gmail.com.br - Centro Regional Universitário de Espírito Santo do Pinhal,
UNIPINHAL

José Tarcísio Franco de Camargo - prof.jose.tarcisio@unipinhal.edu.br - Centro Regional Universitário de Espírito Santo do
Pinhal, UNIPINHAL; Universidade Federal de São Carlos, UFSCar

Luciana Maria Estevam Marques - marquesluciana@estudante.ufscar.br - Universidade Federal de São Carlos, Programa de
Pós-graduação em Educação em Ciências e Matemática, UFSCar

Isabella Maria Buoro da Cruz - isabuoro@gmail.com - Universidade Federal de São Carlos, Programa de Pós-graduação em
Educação em Ciências e Matemática, UFSCar

INTRODUÇÃO
De muitas formas, dizer que a tecnologia está ganhando espaço no dia a dia das pessoas tem se
tornado uma frase ultrapassada. É visível que ela já conquistou seu espaço, sendo por vezes inimaginável
uma vida longe de quaisquer tecnologias da informação e comunicação. Com a chegada da covid-19 e um
extenso período de pandemia, iniciado em 2020, os recursos tecnológicos foram indispensáveis para a
manutenção da produtividade em meio ao período do “fique em casa”.
Segundo Oro et al. (2015), “as tecnologias contemporâneas contribuem ativamente para a
transformação do mundo”. A pandemia impôs uma necessidade de transformação em vários setores, e a
necessidade do distanciamento social e a eliminação de aglomerações foi amparada com o auxílio das
tecnologias de informação e comunicação. Com destaque ao ambiente educacional, salas de aula antes
presenciais foram substituídas por salas de reunião virtuais, lousas por apresentações de slides. Muitas
foram as formas que os profissionais da educação e escolas buscaram para continuar a educar seus alunos
– sendo a grande maioria das soluções, tecnológicas.
Tal envolvimento, embora provocado por circunstâncias adversas e de maneira súbita, talvez resulte
em um aspecto positivo, pois, ainda de acordo com Oro et al. (2015), “o uso das tecnologias digitais pode
ser um recurso potencializador para o processo de ensino e aprendizagem”, dando destaque ao seu potencial
dinâmico e participativo. A necessidade levou muitos diretores, professores e alunos a abraçarem de vez os
recursos tecnológicos no ambiente educacional, e mesmo os alunos sendo de uma geração que já está imersa
na tecnologia, principalmente para fins de comunicação e entretenimento, ainda é necessário “definir uma
relação entre tecnologia e ensino, no qual o objetivo seja o aluno dispor do mesmo desejo utilizado para
entretenimento, com conteúdos encontrados em sala de aula.” (DUARTE; SILVEIRA; BORGES, 2017).
É pensando nisso que esse projeto se propõe a avaliar o impacto de um envolvimento maior dos
alunos com uma das bases da computação: a programação, por meio da preparação e disponibilização de
um curso da plataforma Scratch, a ser aplicado para alunos do 6º ano do Ensino Fundamental.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Programação para o Ensino Básico
Segundo Teixeira et al. (2015) o início da informática educativa se deu com a linguagem LOGO,
desenvolvida por Seymour Papert na década de 60. Alguns anos mais tarde, também se desenvolveria no
Brasil:

No Brasil, a informática educativa teve seu início ainda na década de 70 e a primeira ação ed vulto
foi tomada em 1981, quando um grupo criado por representantes do MEC, da Secretaria Especial de
Informática, do CNPq e da Finep, construíram e divulgaram o documento “Subsídios para a
Implantação do Programa Nacional Informática na Educação”, que apresentou o primeiro modelo
de funcionamento de um futuro sistema de informática na educação brasileira. (TEIXIERA, et al.,
2015)

A Base Nacional Comum Curricular, documento responsável por definir as aprendizagens


essenciais que devem ser desenvolvidas na educação básica, aponta como uma de suas competências gerais
o exercício da curiosidade intelectual na criação de soluções tecnológicas e, ainda, a capacidade de
“compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica,
significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais.” (Brasil, 2018). Assim, é importante que o
aluno seja incentivado a muito mais do que apenas operar computadores para realizar pesquisas, mas a
conhecer a variedade de ferramentas que possui a sua disposição e se interessar pelo seu uso e aplicação.
Oro et al. (2015) diz que:

[...] o ensino de programação de computadores representa uma alternativa poderosa na qualificação


da formação básica de crianças”, contribuindo, potencialmente, para o processo de ensino e
aprendizagem em todas as áreas do conhecimento, uma vez que possibilita o desenvolvimento do
raciocínio lógico.

Como apresentado, a programação, pela sua multidisciplinaridade, ainda possibilita que os alunos
se desenvolvam nas múltiplas áreas do conhecimento que lhe são apresentadas, podendo aplicar as
ferramentas e recursos do pensamento computacional nas outras matérias do currículo escolar. É visível
então a importância e a relevância de projetos que apresentam e aproximam alunos da lógica da
programação, ao mesmo tempo que demonstram o potencial de uma ainda maior integração da programação
no ambiente escolar.

Scratch
A plataforma Scratch foi criada pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), sendo um ótimo
recurso interdisciplinar para crianças e jovens aprenderem conceitos lógicos, matemáticos e
computacionais, apresentando para isso uma interface visual intuitiva (ORO, et al., 2015). Com uma
interface interativa e convidativa, a plataforma pode ser utilizada online, por meio de um navegador de
internet, ou mediante a instalação do seu aplicativo. Assim, o Scratch se torna uma ferramenta poderosa
para os primeiros passos de um aluno na lógica de programação, sendo ainda acessível para implementação.
Na Figura 1 podemos visualizar uma tela do Scratch online.

Figura 1: Tela inicial do Scratch.

Fonte: elaborado pelos autores.

Parte da intuitividade do uso do Scratch se dá pelo uso da programação em blocos, onde o código
de programação é escrito “através da combinação de blocos que efetuam determinadas ações, sejam elas de
movimento, controle, sensores, operações, entre outros.” (DUARTE; SILVEIRA; BORGES, 2017). Tais
diferentes tipos de ações são claramente apresentados não apenas pela descrição contida em cada bloco de
comando, como também pela sua classificação em oito guias de ações diferentes, cada uma contando com
uma cor e formato. Os blocos amarelos da guia “eventos”, por exemplo, são utilizados para iniciar os
códigos de programação, e, portanto, recebem um formato que permite apenas o encaixe de outros blocos
abaixo de si mesmos. Já os blocos azuis, da guia “movimento”, podem receber comandos tanto acima
quanto abaixo de si. A Figura 2 mostra uma tela do Scratch com um exemplo da programação em blocos.

Figura 2: Exemplo da programação em blocos no Scratch.

Fonte: elaborado pelos autores.


O Scratch então se mostra uma ferramenta ideal para um projeto educacional da programação, tendo
a estrutura necessária para não só direcionar a atenção dos alunos ao conteúdo apresentado, mas também
desafiá-los à busca de soluções para problemas e a criarem seus próprios projetos. “Usando o Scratch, os
estudantes deixam de ser somente usuários de computador, passam a ser seus programadores, dessa forma
tornam-se cidadãos mais livres para criar e expressar suas ideias e convicções.” (ORO, et al., 2015).

DESENVOLVIMENTO
O Curso de Programação em Scratch, como foi apresentado, recebeu para sua aplicação o apoio da
Escola Estadual Cardeal Leme, em Espírito Santo do Pinhal, SP, que possibilitou o convite aos seus alunos
para participação no projeto e forneceu o ambiente para as aulas.

Planejamento
Para a aplicação do curso aos alunos, foram necessárias etapas de preparação e planejamento das
aulas e dos conteúdos que seriam abordados. Durante os primeiros meses do ano letivo, foi realizado um
acompanhamento das aulas correntes junto aos alunos da escola, principalmente as de matemática,
disciplina que seria referenciada durante o curso para a aplicação multidisciplinar da programação, de tal
forma que os conteúdos abordados no correr do curso fossem condizentes com o aprendizado em sala de
aula. Também, como um trabalho de assistência para a escola, foi feita a organização da sala de informática
que seria utilizada para o curso, o que resultou na disponibilização de doze computadores para uso dos
alunos.
Durante os meses de maio e junho, o curso foi estruturado, definindo-se a ministração de 15 aulas
de 90 minutos de duração. Seriam oferecidas doze vagas para a participação no curso, conforme o número
de computadores disponibilizados. Os alunos puderam se candidatar às vagas por meio da resposta a um
formulário online, que foi disponibilizado a duas turmas do sexto ano do ensino fundamental na primeira
semana de julho e recebeu inscrições até se completarem as vagas. A primeira aula foi então ministrada no
dia 08 de julho, seguindo com duas aulas semanais nas próximas semanas, às quintas e sextas-feiras, se
encerrando no dia 27 de agosto. Dos doze alunos inscritos, cinco abandonaram o curso após as primeiras
semanas, tendo os demais sete completado o curso.

Conteúdos abordados
O conteúdo abordado durante as aulas foi proposto de maneira a oferecer tanto a fundamentação
teórica básica quanto a prática da programação. Como objetivos gerais do curso foi proposta a realização
de três principais atividades: o desenvolvimento de uma animação, um jogo e uma calculadora. Cada projeto
objetivou trabalhar com diferentes recursos do Scratch e ainda, servir como parâmetro para avaliação das
habilidades adquiridas e do desenvolvimento de um pensamento computacional. Assim, de acordo com os
projetos propostos, foram divididos os conteúdos a serem apresentados em cada aula.
Animação
As seis primeiras aulas do curso foram dedicadas ao aprendizado dos conceitos iniciais sobre
computação e programação, do funcionamento da plataforma Scratch e dos primeiros comandos que seriam
aplicados no desenvolvimento de uma animação. Foram ensinados os conceitos de computação, hardware,
software, programação e algoritmo, seguidos da apresentação da plataforma, suas funcionalidades e o
conceito da programação em blocos. Os comandos ensinados e trabalhados por meio de atividades foram
os pertencentes as guias “movimento”, “aparência”, “som”, “eventos” e “controle”. Tais comandos foram
utilizados pelos alunos para o posicionamento e movimentação dos seus personagens na tela, a reprodução
de falas e efeitos sonoros e a mudança de cenários. O principal conteúdo interdisciplinar apresentado foi o
sistema de coordenadas cartesiano, utilizado para o posicionamento de objetos, como mostra a Figura 3.

Figura 3: Sistema de coordenadas Cartesiano no Scratch.

Fonte: elaborado pelos autores.

Após a instrução dos conteúdos, os alunos foram orientados a, utilizando os conceitos e comandos
ensinados, produzirem suas próprias animações, com o tema e personagens a livre escolha. A animação
deveria contar com pelo menos dez segundos de duração, um diálogo entre dois personagens, pelo menos
dois cenários e pelo menos um efeito sonoro.

Jogo
Com o êxito no primeiro projeto, as seis aulas seguintes foram utilizadas para o desenvolvimento de
um jogo simples. Para tal, os alunos foram ensinados a utilizar novos comandos da guia “eventos” que
permitiam o controle do personagem por meio do teclado e mouse para agora, diferente da animação onde
todos os movimentos eram previamente programados, personagens pudessem ter suas ações definidas por
comandos do usuário. Além disso, aprenderam a utilizar os comandos condicionais da guia “controle” em
conjunto aos comandos “sensores”. Juntos, tais comandos podem ser utilizados para, por exemplo, parar o
código se o jogador estiver tocando em um “inimigo”. Por fim, foram introduzidos ao conceito de variáveis,
que também conversa com a disciplina da matemática e os prepara para utilizarem os comandos da guia de
mesmo nome.
A tarefa de produzir o jogo então foi dada aos alunos, que receberam total liberdade para utilizar os
conceitos apresentados na execução da atividade. Também foram orientados a, caso tivessem o interesse,
pesquisarem na internet e no próprio site do Scratch por jogos já desenvolvidos na plataforma para servirem
de base para suas ideias.
A Figura 4 mostra a tela de um jogo desenvolvido por duas alunas, cujo objetivo é controlar os pulos
da raposa para evitar obstáculos.

Figura 4: Tela de jogo desenvolvido por duas alunas.

Fonte: elaborado pelos autores.

Calculadora
As três aulas finais foram utilizadas para ensinar aos alunos o uso dos comandos “operadores”,
capazes de realizar operações matemáticas, o que resultou em novas opções de manipulação de variáveis.
Os alunos também aprenderam como utilizar o comando “pergunte” para receber informações digitadas
pelo usuário e armazená-las em variáveis. Com esses conhecimentos, foi proposto o desenvolvimento de
uma calculadora simples no Scratch, capaz de realizar as operações de adição, subtração, multiplicação e
divisão após receber dois números do usuário. Após a conclusão do projeto, os alunos foram orientados a
testar suas calculadoras, utilizando uma lista de operações com números inteiros.
A Figura 5 mostra a tela de uma calculadora desenvolvida por uma das alunas do curso.

Figura 5: Calculadora programada por uma aluna no Scratch.

Fonte: elaborado pelos autores.

RESULTADOS
Além dos três projetos principais, o progresso dos alunos foi também avaliado por meio de
atividades menores durante as aulas, utilizados na orientação do uso de novos blocos de comando e para
fixação dos conhecimentos adquiridos.
Ao final do curso, também foram apresentados a um questionário, onde puderam de forma anônima
realizar uma avaliação do curso e de seu próprio desempenho. Todos os alunos foram capazes de realizar
as tarefas propostas, demonstrando o uso do pensamento computacional no planejamento e na execução
das mesmas. Tal observação corresponde com o questionário avaliativo, no qual todos os alunos
responderam que foram capazes de encontrar soluções lógicas criativas para a resolução das atividades
propostas.
Vale ressaltar que também foram capazes de aprender e aplicar algumas funções da plataforma
Scratch por conta própria.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A integração da computação no ensino básico, seja pelo trabalho interdisciplinar do pensamento
computacional ou com a integração de uma disciplina de programação, não é apenas uma realidade possível
e capaz de trazer inúmeros benefícios ao aprendizado, mas também uma necessidade.
Se desejamos um avanço tecnológico que alcance múltiplas áreas do conhecimento e seja capaz de
trazer melhorias aos mais diferentes campos de atuação profissional, precisamos de todo tipo de pessoas
capacitadas a compreender tecnologia. De nada adiantará todo o avanço tecnológico se não houver pessoas
capazes de as utilizarem. Para construir as tecnologias do futuro, se faz necessário construir os usuários do
futuro.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018. Disponível em:
<http://basenacionalcomum.mec.gov.br/a-base>. Acesso em: 03 nov. 2021.
DUARTE, Kauê; SILVEIRA, Tatiane; BORGES, Marcos. Abordagem para o Ensino da Lógica de
Programação em Escolas do Ensino Fundamental II através da Ferramenta Scratch 2.0. In: WORKSHOP
DE INFORMÁTICA NA ESCOLA. Anais... [S.l.], p. 175-184, out. 2017. Disponível em: <http://br-
ie.org/pub/index.php/wie/article/view/7235>. Acesso em: 22 maio 2021.
ORO, Neuza et al. Olimpíada de Programação de Computadores para Estudantes do Ensino Fundamental:
A interdisciplinaridade por meio do Software Scratch. In: WORKSHOP DE INFORMÁTICA NA
ESCOLA. Anais... [S.l.], p. 102-111, out. 2015. Disponível em: <http://www.br-
ie.org/pub/index.php/wie/article/view/5000>. Acesso em: 22 maio 2021.
TEIXEIRA, Adriano et al. Programação de computadores para alunos do ensino fundamental: A Escola de
Hackers. In: WORKSHOP DE INFORMÁTICA NA ESCOLA. Anais... [S.I.], p. 112-121, out. 2015.
Disponível em: <http://br-ie.org/pub/index.php/wie/article/view/5002>. Acesso em: 22 maio 2021.

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