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GUIA ORIENTADOR

DE BOAS PRÁTICAS

EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE
DE SUPORTE
EXTRACORPORAL
DE VIDA:
Um desafio para
a prática
especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Ficha técnica
Título
Guia Orientador de Boas Práticas – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de
suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada.

Trabalho desenvolvido por iniciativa da Mesa do Colégio da Especialidade de Enfermagem


Médico–Cirúrgica (MCEEMC) da Ordem do Enfermeiros - Mandato 2016-2019.

Grupo de trabalho
Enfermeiros Especialistas em Enfermagem Médico-Cirúrgica:
Paulo Alexandre Dinis Oliveira (Coordenador)
Ana Carina Alves Farias
Dalva Manuela Dias da Silva Pinto da Costa Gomes
Fernando José de Araújo Miranda
João Alberto Rodrigues Dantas
Michelle de Sousa Viríssimo
(Nomeados em NI BAST 2017/23 de 08/08/2017)

Colaboração
Ricardo Miguel Martins Gomes Cruz
Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Infantil e Pediátrica
Nídia Celsa Oliveira Alves (infografia ilustrativa)
Enfermeira Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica

Peritos
Mário Rui Correia Branco
Filipe Alexandre Morgado Ramos

Revisão científica e redação final da responsabilidade dos membros da Mesa do Colégio da


Especialidade de Enfermagem Médico Cirúrgica - MCEEMC (Mandato 2016-2019):
Catarina Alexandra Rodrigues Faria Lobão (Presidente)
Sílvia Manuela Pação Alminhas (Secretário)
Nuno Cristóvão Alves Ferreira (Secretário)

O Grupo de Trabalho que elaborou este GOBP esteve em atividade entre junho de 2017 e
fevereiro de 2019.

Edição: Ordem dos Enfermeiros – fevereiro 2021


Grafismo e paginação: Ordem dos Enfermeiros
ISBN: 978-989-8444-53-0

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Índice
09 14 15 16
Abreviaturas Mensagem de Mensagem Introdução
e siglas Bastonária e Presidente de Presidente do
do Conselho Colégio da
de Enfermagem Especialidade de
da Ordem Enfermagem
dos Enfermeiros Médico-Cirúrgica

22 22 24 33
1. O Desenvolvimento 1.1 Do conceito inicial 1.2 Da era moderna à 2. Conceitos e
do suporte à era moderna expansão global definições no
extracorporal de vida suporte
extracorporal

33 38 45 45
2.1 Conceitos e 2.2 Indicações e 3. Modalidades do 3.1 Modalidade
definições contra-indicações do suporte extracorporal veno-venosa
suporte extracorporal de vida

46 47 51 51
3.2 Modalidade 3.3 Modalidades 4.Componentes do 4.1 Acessos venosos
veno-arterial híbridas suporte extracorpo- e arteriais (cânulas)
ral de vida

55 56 60 62
4.2 Circuitos 4.3 Bombas 4.4 Membranas 4.5 Unidades
extracorporais de sangue permutadoras de permutadoras de
gases (membranas calor
oxigenadoras)

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63 63 68 68
4.6 Misturadores de 4.7 Sensores de 5. Princípios 5.1 Fisiologia das
gases (sweep gas) pressões/fluxos/ar fisiológicos trocas gasosas no
corpo humano

69 73 73 74
5.1.1 Quantidade 5.1.2 Distribuição de 5.1.3 Consumo 5.2 Gestão das trocas
de O2 O2 (DO2) de O2 (VO2) gasosas: O equilíbrio
hemodinâmico na
pessoa com ECMO

83 83 88 89
6. Início, manuten- 6.1 Canulação 6.2 Priming 6.3 Início, estabilização
ção e finalização do do circuito e manutenção da
suporte de vida circulação sanguínea
extracorporal extracorporal

100 105 107 116


6.4 Desmame e 6.5 Descanulação 6.6 Transporte da 7. Complicações
triall-off pessoa em situação
crítica em suporte
ECMO

116 123 127 127


7.1 Prevenção de 7.2 Prevenção de 8. Resolução de 8.1 Relacionadas
complicações associa- complicações problemas e com a pessoa em
das à pessoa em associadas ao circuito atuação suporte ECMO
situação crítica com extracorporal de emergência
suporte ECMO (complicações
(complicações clínicas) mecânicas)

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134 142 150 155


8.2 Relacionadas 9. Outcomes do 10. A dimensão 11. Um Modelo
com o equipamento suporte de vida ética no suporte assistencial da
ECMO extracorporal: ECLS pessoa em
follow-up da pessoa situação de
e família pós-ECMO ECMO/ECLS

155 156 158 162


11.1 Centros de suporte 11.2 O Processo de 11.3 A Função do Conclusões
ECMO: Realidade formação das equipas enfermeiro na
portuguesa de ECLS equipa ECLS

164 165 166 167


Anexos Fórmulas Recursos humanos Confusion
de cálculo e materiais assessment method
necessários à for the ICU
canulação (CAM-ICU)

168
Recursos humanos
e materiais
necessários na
descanulação

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Índice de quadros
33 39 73 79
Quadro 1: Quadro 2: Quadro 3: Quadro 4:
Definições no Índice de oxigenação Teor de O2 Relação
suporte DO2/VO2/SvO2
extracorporal
de vida

86 89 90 92
Quadro 5: Quadro 6: Quadro 7: Quadro 8:
Ações/orientações Ações/orientações para Ações/orientações Algoritmo da
da canulação ao o início do suporte para o início do ventilação
início do suporte ECMO VV suporte ECMO VA de repouso

97 98 103 105
Quadro 9: Quadro 10: Quadro 11: Quadro 12:
Richmond Agitation Manutenção da pessoa Orientações para o Descanulação do
Sedation Scale - em suporte ECMO desmame em trial off suporte ECMO
RASS do suporte ECMO VV
e VA

116 121 127 135


Quadro 13: Quadro 14: Quadro 15: Quadro 16:
Complicações Complicações Resolução de Resolução de
clínicas relacionadas com problemas problemas
a pessoa em ECMO relacionadas com a relacionados com o
pessoa em ECMO equipamento ECMO

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Índice de figuras
45 47 48 52
Figura 1: Figura 2: Figura 3: Figura 4:
Modalidade VV Modalidade VA Modalidade Cânulas de acesso/
híbrida VV-A venosas (azuis) e
cânulas de retorno/
arteriais (vermelhas)

54 54 55 57
Figura 5: Figura 6: Figura 7: Figura 8:
Cateter/Introdutor Cânula de Circuito Bomba de sangue
de reperfusão do duplo-lúmen extracorporal oclusiva ou de
membro inferior (conjunto de tubos) rolamentos

58 59 60 62
Figura 9: Figura 10: Figura 11: Figura 12:
Bomba centrífuga Bomba centrífuga Membrana Membranas permutadoras
com cones permutadora de gases (membranas
concêntricos de gases oxigenadoras)

63 63 64 64
Figura 13: Figura 14: Figura 15: Figura 16:
Unidades Misturador de Detetor Monitor do Cardiohelp®
permutadoras gases (Blender) de ar (informações das
de calor pressões/fluxos)

68 69 70 71
Figura 17: Figura 18: Figura 19: Figura 20:
Circulação extracorporal Trocas gasosas Quantidade de PaO2
de sangue pouco no alvéolo oxigénio fornecida
oxigenado e sangue pulmonar e a efetivamente
oxigenado consumida
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71 72 72 74
Figura 21: Figura 22: Figura 23: Figura 24:
Sat.O2 Teor, Teor de O2 (PaO2 Fisiologia Pulmonar:
distribuição e consumo e Sat.O2) Difusão
de O2

77 78 85 94
Figura 25: Figura 26: Figura 27: Figura 28:
Relação Relação DO2/VO2 Modo de suporte Reflexo da curva da
CaO2/Sat.O2/PaO2/Hb VenoArterial -Venosa linha arterial ao
(VA-V) aumentar o fluxo de
bomba de sangue
no suporte ECMO

122 122
Figura 29: Figura 30:
Hipoperfusão dos Monitorização dos
membros membros com NIRS

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Abreviaturas e siglas
ACT Activated Clotting Time
ANOR Abdominal Normothermic Oxygenated Recirculation
APT Activated Partial Thromboplastin Time
AT3 Antitrombina III
BIS Índice Bispectral
C12H22C aO14 Gluconato de Cálcio 10%
Ca++ Cálcio
CAM‐ICU Confusion Assessment Method for the ICU
CaO2 Conteúdo arterial de O2 ou Teor de O2
CC Centímetros Cúbicos
CE Concentrado Eritrocitário
Conventional Ventilation Support vs Extracorporeal Membrane
CESAR
Oxygenation for Severe Adult Respiratory Failure
Ch Charrière
ClCa2 Cloreto de Cálcio 10%
cmH2O Centímetros de água
CO 2 Dióxido de Carbono
DAV Dispositivo de Assistência Ventricular
DC Débito Cardíaco
DEHP Di-etilhexil ftalat
DGS Direcção-Geral da Saúde
DO 2 Distribuição de Oxigénio
DPCC Dadores em Paragem Cardiocirculatória
ECCO2 R Extracorporeal Carbon Dioxide Removal
ECECLS Enfermeiro Competente em Extracorporeal Life Support
ECG Eletrocardiograma
ECLS ExtraCorporeal Life Support
ECMO ExtraCorporeal Membrane Oxygenation
ECMO VA ExtraCorporeal Membrane Oxygenation ArterioVenous
ECMO VAV ExtraCorporeal Membrane Oxygenation Venous ArterioVenous

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Abreviaturas e siglas
ECMO VV ExtraCorporeal Membrane Oxygenation VenoVenous
E-CPR Reanimação Cardiopulmonar Extracorporal
EEEMC Enfermeiro Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica
Enfermeiro Especialista em Enfermagem Saúde Infantil
EEESIP
e Pediatria
EEG Eletroencefalograma
EESO European Extracorporeal Life Support Organization
EISOR ExtraCorporeal Interval Support for Organ Retrieval
ELSO Extracorporeal Life Support Organization
EPE Empresa Publica Empresarial
FiO 2 Fração inspirada de Oxigénio
Fr French .
FR Frequência Respiratória
g Grama
GOBP Guia Orientador de Boas Práticas
Hb Hemoglobina
HITT Trombocitopenia Trombótica Induzida por Heparina
HLS HeartLung Support Set
Ht Hematócrito
I:E Inspiração:Expiração
IO Índice de Oxigenação
K+ Potássio
Kg Quilograma
L Litro
L/M ou L/min Litro por Minuto
m2 Metro quadrado
MAP Pressão Média das vias Aéreas
Mesa do Colégio da Especialidade em Enfermagem
MCEEMC Médico-Cirúrgica

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Abreviaturas e siglas
mEq mil Equivalente
mEq/L mil Equivalente por Litro
mg miligrama
mg/dl Miligrama por decilitro
ml mililitro
ml/Kg mililitros por Quilograma
ml/kg/min mililitro por kilograma por minuto
ml3 mililitro cúbito
mmHg Milímetro de Mercúrio
mm3 Milímetro cubico
mmol/L milimole por litro
Na+ Sódio
NaHCO3 Bicarbonato de Sódio 8,4%
NECMO Normothermic ECMO
NIRS Near InfraRed Spectroscopy
NPT Nutrição Parenteral Total
O2 Oxigénio
OP-ECMO Organ-Preserving Extracorporeal Membrane Oxygenation
PaCO 2 Pressão Parcial de Dióxido de Carbono
PAM Pressão Arterial Média
PaO 2 Pressão Parcial de Oxigénio
PAP Pressão Arterial de Pulso
PCC Paragem Cardiocirculatória
PCR Paragem Cardiorrespiratória
PEEP Positive End-Expiratory Pressure
PFC Plasma Fresco Congelado
pH potencial de Hidrogénio
PLS Permanent Life Support
PP Prone Position

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Abreviaturas e siglas
Pplat. Pressão de Plateau
PVC Policloreto de Vinil
RASS Richmond Agitação-Sedação Score
RCR Ressuscitação Cardiorrespiratória
RMN Ressonância Magnética Nuclear
RPM Rotações por minuto
Rx Radiografia
Sat. Pós Ox. Saturação de Pós Oxigenação
Sat. Pré Ox. Saturação de Pré Oxigenação
Sat.O2 Saturação de Oxigénio no sangue
SCM Suporte Circulatório Mecânico
SDRA Síndrome de Dificuldade Respiratória Aguda
SGRQ St. George's Respiratory Questionnaire
SNG Sonda Nasogástrica
SvO 2 Saturação venosa central e mista de oxigénio
TC Tomografia Computorizada
TEG Tromboelastografia
TET Tubo EndoTraqueal
TSFR Técnicas de Substituição da Função Renal
U Unidade
U/Kg Unidade por Quilograma
U/Kg/h Unidade por Quilograma por hora
U/ml Unidade por mililitro
UCI Unidade de Cuidados Intensivos
VA VenoArterial
VA-V VenoArterial - Venosa
VE Ventrículo Esquerdo
VO 2 Consumo de O2
VV VenoVenoso

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Abreviaturas e siglas
VV-A VenoVenosa - Arterial
VV-V VenoVenosa - Venosa
µm Micrómetro
10^9 Milhar de milhão
% Percentagem
Diminuição
Aumento
+/- Mais ou Menos
< Menor
≤ Menor ou Igual
> Maior
≥ Maior ou Igual

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Mensagem de Bastonária
e Presidente do Conselho
de Enfermagem da Ordem
dos Enfermeiros

S eparam-nos mais de 40 anos


desde a primeira aplicação com
sucesso da oxigenação por
membrana extracorporal, comumente
prestados à população, bem como às
suas atribuições inerentes à valoriza-
ção científica dos seus membros e
regulação do exercício profissional,
designada por ECMO. Todavia, a sua promovemos a elaboração de Guias
utilização só se generalizou mais Orientadores de Boa Prática dos
recentemente, à medida que se desen- Cuidados de Enfermagem.
volveram os meios tecnológicos nece-
ssários à sua implementação, bem Estamos certas de que este documento
como, se incrementou a evidência contribuirá para a definição e imple-
científica e o desenvolvimento de mentação de melhores respostas
competências dos profissionais envol- visando a resolução de problemas de
vidos na mesma. saúde daqueles que são alvo de cuida-
dos enfermagem, no âmbito da imple-
Atentas ao desígnio fundamental da mentação deste suporte de vida base-
Ordem dos Enfermeiros no que concer- ado na circulação e oxigenação extra-
ne à defesa da qualidade dos cuidados corporal do fluxo sanguíneo.

Ana Rita Cavaco e Ana Fonseca


Bastonária e Presidente do Conselho
de Enfermagem da Ordem dos Enfermeiros

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Mensagem de Presidente
do Colégio da Especialidade de
Enfermagem Médico-Cirúrgica
A Ordem dos Enfermeiros tem
como desígnio fundamental
promover a qualidade dos
cuidados prestados à população. Nesta
senda, a Mesa do Colégio da Especiali-
Suporte Extracorporal de Vida: Um
novo desafio para a prática especiali-
zada. A oxigenação por membrana
extracorporal é uma modalidade
terapêutica utilizada no suporte
dade de Enfermagem Médico-Cirúrgi- temporário da função cardíaca e/ ou
ca, regulamentou em 2018 o perfil de respiratória, permitindo que o coração
competências específicas do Enfermei- e/ou o pulmão recuperem de uma
ro Especialista em Enfermagem Médi- situação reversível perante o insucesso
co-Cirúrgica de acordo com o alvo e dos tratamentos convencionais, otimi-
contexto de atuação, reformulando a zando os fluídos, o estado nutricional, o
área de enfermagem à Pessoa em equilíbrio ácido-base e normalizar o
Situação Crítica. A pessoa em situação fornecimento de oxigénio.
crítica é aquela cuja vida está ameaça-
da por falência ou eminência de falên- Este Guia Orientador de Boa Prática
cia de uma ou mais funções vitais e evidencia o cuidado à pessoa, família/
cuja sobrevivência depende de meios cuidador a vivenciar processos
avançados de vigilância, monitorização complexos de doença crítica e/ou
e terapêutica, sendo imperativo a dota- falência orgânica, nomeadamente na
ção dos enfermeiros na compreensão e pessoa submetida a oxigenação por
manuseamento dos mesmos, para que membrana extracorpórea, desde o
tenham uma resposta atempada e pré-hospitalar à unidade de cuidados
correta às suas necessidades. intensivos. Pretendemos que este
documento possa evidenciar os cuida-
O avanço no conhecimento técnico e dos especializados e contribuir para a
científico requer que o Enfermeiro uniformização da atuação dos Enfer-
Especialista desenvolva uma prática meiros Especialistas em Enfermagem
baseada nas mais recentes evidências, Médico-Cirúrgica.
orientada para resultados sensíveis
aos cuidados de enfermagem. Foi Este Manual foi desenvolvido por
neste contexto que surgiu a necessida- peritos na área a quem esta Mesa do
de de realização do presente docu- Colégio gostaria de deixar o seu mais
mento, intitulado Cuidados à Pessoa sincero agradecimento.
em Situação Crítica dependente de

Catarina Alexandra Rodrigues Faria Lobão


Presidente da Mesa do Colégio da Especialidade de Enfermagem Médico-cirúrgica

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Introdução
A Ordem dos Enfermeiros tem
como desígnio fundamental
promover a defesa da qualida-
de dos cuidados prestados à popula-
em Enfermagem Saúde Infantil e
Pediátrica (EEESIP) ou Enfermeiro
Competente em Extracorporeal Life
Support (ECECLS).
ção, bem como desenvolver, controlar
e regular o exercício profissional, A noção de competência é entendida
conforme descrito no Decreto de Lei no Parecer MCEEMC de 10/2017 (págs.
n.º 104/98, publicado em Diário da 2-3), como um “conjunto de saberes
República a 21 de abril. Neste âmbito, a indissociavelmente ligados à formação
Ordem dos Enfermeiros em Padrões de inicial de base e à experiência da ação
Qualidade dos Cuidados de Enferma- adquiridas ao longo do tempo que
gem (2001), reconhece que os Guias sobressai em situações concretas das
Orientadores de Boa Prática (GOBP) práticas clínicas. O saber profissional
de Cuidados de Enfermagem consti- de enfermagem é um saber de ação,
tuem um contributo importante para a não se constituindo somente de execu-
melhoria contínua da qualidade do ção ou de reprodução de atos, mas
exercício profissional dos enfermeiros. engloba igualmente a capacidade de
adaptar a conduta à situação comple-
As boas práticas advêm da aplicação xa, fazendo apelo aos conhecimentos”.
de linhas orientadoras baseadas na Os cuidados de enfermagem à pessoa
evidência científica disponível e na em situação crítica são, por conseguin-
opinião de peritos. O objetivo é obter te, cuidados que se revestem de uma
as melhores respostas na resolução de importância extrema e que englobam
problemas de saúde específicos das uma avaliação diagnóstica e uma
pessoas, refletindo um compromisso monitorização constante por forma a
para partilhar a excelência a nível local conhecer continuamente a situação da
e nacional. Este Guia Orientador de pessoa alvo dos cuidados, prevendo e
Boas Práticas toma como foco de detetando precocemente as complica-
atenção os cuidados à pessoa em ções e assegurando uma intervenção
situação crítica dependente de Extra- precisa, concreta, eficiente e em tempo
corporeal Life Support (ECLS1) e à sua útil2 .
família por parte do Enfermeiro Espe-
cialista em Enfermagem Médico-Cirúr- O Regulamento n.º 429/2018, publica-
gica (EEEMC), Enfermeiro Especialista do no Diário da República de 16 de

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julho, descreve que “a pessoa em situa- resposta em situações de emergência,


ção crítica é aquela cuja vida está exceção e catástrofe, da conceção à
ameaçada por falência ou eminênciade ação; c) Maximiza a prevenção, inter-
falência de uma ou mais funções vitais venção e controlo da infeção e de
e cuja sobrevivência depende de meios resistência a Antimicrobianos perante
avançados de vigilância, monitorização a pessoa em situação crítica e/ou falên-
e terapêutica”. cia orgânica, face à complexidade da
situação e à necessidade de respostas
No Regulamento n.º 122/2011, publica- em tempo útil e adequadas”.
do no Diário da República de 18 de
fevereiro, o Enfermeiro Especialista é o Assim, tendo como finalidade a melho-
profissional de saúde com um conheci- ria da qualidade de vida da pessoa, o
mento aprofundado num domínio mesmo Regulamento n.º 429/2018,
específico de enfermagem, tendo em refere que os cuidados especializados
conta as respostas humanas aos em enfermagem Médico-Cirúrgica
processos de vida e aos problemas de exigem a “conceção, implementação e
saúde, que demonstram níveis eleva- avaliação de planos de intervenção em
dos de julgamento clínico e tomada de resposta às necessidades das pessoas
decisão, traduzidos num conjunto de e famílias alvos dos seus cuidados, com
competências especializadas relativas vista à deteção precoce, estabilização,
a um campo de intervenção. manutenção e a recuperação perante
situações que carecem de meios avan-
As competências específicas do çados de vigilância, monitorização e
EEEMC, na área de Enfermagem à terapêutica, prevenindo complicaçõese
Pessoa em Situação Crítica, foram eventos adversos, tal como, na promo-
publicadas no Regulamento n.º ção da saúde e na prevenção da
429/20183 , a saber: “a) Cuida da doença em diversos contextos de
pessoa, família/cuidador a vivenciar ação”.
processos complexos de doença crítica
e/ou falência orgânica; b) Dinamiza a A Extracorporeal Membrane Oxygena-

1
Termo abrangente que engloba diversos modos de suporte de vida baseadas no uso de um circuito extracorporal e utilizados
na falência cardíaca e/ou pulmonar tendo como finalidades a oxigenação, a remoção de dióxido de carbono e/ou o suporte
cardíaco. Exclui-se desta definição a circulação extracorporal utilizada nos procedimentos cirúrgicos cardiotorácicos e/ou
vasculares realizados em contexto operatório (bypass cardiopulmonar).
2
Coimbra, N. & Amaral, T. (2016). Acompanhamento de Enfermeiro no Transporte Primário do Doente Critico. Revista Nursing,
Fevereiro, p.1
3
Regulamento n. º 429/2018, publicado no Diário da República n.º 135/2018, Série II de 2018-07-16

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tion (ECMO) constitui-se como um A Extracorporeal Membrane Oxygena-


suporte de vida baseado na circulação tion ArterioVenous (ECMO VA) tem
e oxigenação extracorporal do fluxo como objetivo principal suportar a
sangue tendo como génese o suporte falência cardíaca e circulatória poden-
circulatório efetuado em contexto do sustentar igualmente a função
cirúrgico cardíaco (bypass cardiopul- pulmonar em caso de falência respira-
monar). Este suporte possui um carác- tória. Utilizada inicialmente no suporte
ter temporário, permitindo que o pós-cirúrgico em cardiopatias congéni-
coração e/ou o pulmão recuperem de tas pediátricas9, a modalidade VenoAr-
uma situação de falência reversível terial (VA) é atualmente um suporte
perante o insucesso dos suportes tidos abrangente no que respeita à sua
como convencionais4 ou suportando as aplicação, abrangendo todas as situa-
suas funções até ao tratamento defini- ções de falência cardíaca / choque
tivo (ex. transplante). cardiogénico em qualquer faixa etária.
É frequentemente utilizada em contex-
A Extracorporeal Membrane Oxygena- to peri-operatório/peri-intervencional
tion VenoVenous (ECMO VV) é utiliza- cardiológico, suportando a falência
da na falência pulmonar sendo histori- cardíaca aguda e/ou a função cardio-
camente reconhecida como um circulatória no período pós-cirúrgico
método de eleição na população cardíaco.
neonatal5,6,7, a qual possui a melhor
taxa de sobrevivência (84%) entre A modalidade VA é também utilizada
todos os grupos etários8. Em Portugal, em contexto de reanimação cardiorres-
a modalidade VenoVenosa (VV) teve a piratória (Extracorporeal Cardiopulmo-
sua grande difusão aquando da pande- nary Ressuscitation - ECPR) nos casos
mia mundial da gripe em 2009 (deno- em que se verifique uma recuperação
minada de gripe aviária dada a trans- ineficaz ou não sustentada da circula-
missão do vírus Influenzae tipo A ção sanguínea espontânea com base
subtipo H1N1 a partir das aves) sendo nos métodos convencionais de reani-
na altura considerada como o último mação cardiopulmonar. A instituição
recurso no suporte da grave falência do ECMO VA no contexto de PCR tem
pulmonar ligada ao Síndrome de como objetivo manter a perfusão dos
Dificuldade Respiratória Aguda órgãos e tecidos até à recuperação
(SDRA), umas das indicações mais eficaz da circulação sanguínea espon-
relevantes para a utilização desta tânea podendo, secundariamente e em
modalidade na faixa etária adulta. caso de irreversibilidade, ser utilizada
na manutenção de potenciais órgãos

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para transplantação (ExtraCorporeal uma prática consistente e sólida de


Interval Support for Organ Retrieval - todos os EEEMC uma vez que agrega
EISOR). O grupo de trabalho, em um conjunto de conhecimentos esabe-
colaboração com um conjunto de res especializados, potenciando a
peritos, fez uma análise suportada visibilidade dos cuidados de enferma-
numa extensa pesquisa bibliográfica, gem à pessoa em situação critica e sua
da qual resulta o presente GOBP. As família. Evidencia igualmente o impac-
recomendações contidas neste docu- to que a prestação de cuidados espe-
mento baseiam se em estudos descriti- cializados em enfermagem Médico-
vos não experimentais, na opinião Cirúrgica possui na qualidade do
consensual de peritos nacionais e desempenho profissional através de
também de peritos internacionais uma prática orientada e sistemática
reconhecidos pela Extracorporeal Life dos cuidados de saúde.
Support Organization (ELSO). São
suportadas pelas evidências apresen-Por último, pretende ser um meio facili-
tadas em documentos nacionais e tador e de incentivo aos EEEMC para a
internacionais, publicados por diversas
criação e/ou implementação de progra-
autoridades de saúde e associações mas de ECLS nas respetivas unidades
profissionais mundiais. de cuidados intensivos e/ou centros de
referência e para o desenvolvimento
Desta forma, este guia orientador de projetos empreendedores nesta
assume uma elevada importância para área de cuidados específicos.

4
ELSO - Extracorporeal Life Support Organization. (2010). Guidelines for Training and Continuing Education of ECMO
Specialists version 1.5.
5
Firmin, R. K. et al (1996). Role of extracorporeal membrane oxygenation. In T. Brogan, L. Lequier, R. Lorusso, G. MacLaren &
G. Peek (2017). Extracorporeal Life Suport – The ELSO Red Book (5ª Edição) (pp. 151 – 158). Ann Arbor, Michigan:
Extracorporeal Life Support Organization.
6
O’Rourke P. P. et al (1989). Extracorporeal membrane oxygenation and conventional medical therapy neonates with
persistent pulmonary hypertension of the newborn: a prospective randomized study. In T. Brogan, L. Lequier, R. Lorusso, G.
MacLaren & G. Peek (2017). Extracorporeal Life Suport – The ELSO Red Book (5ª Edição) (pp. 151 – 158). Ann Arbor, Michigan:
Extracorporeal Life Support Organization.
7
Bartlett, R. H., et al (1985). Extracorporeal circulation in neonatal respiratory failure: a prospective randomized study. In T.
Brogan, L. Lequier, R. Lorusso, G. MacLaren & G. Peek (2017). Extracorporeal Life Suport – The ELSO Red Book (5ª Edição)
(pp. 151 – 158). Ann Arbor, Michigan: Extracorporeal Life Support Organization.
8
Harvey, C. (2017). Extracorporeal Life Support Organization (2016) - ELSO Registry International Summary. In T. Brogan, L.
Lequier, R. Lorusso, G. MacLaren & G. Peek (2017). Extracorporeal Life Suport – The ELSO Red Book (5ª Edição) (pp. 1 – 11).
Ann Arbor, Michigan: Extracorporeal Life Support Organization.
9
Baffes, T. G. et al (1970). Extracorporeal circulation for support of palliative cardiac surgery in infants. In T. Brogan, L.
Lequier, R. Lorusso, G. MacLaren & G. Peek (2017). Extracorporeal Life Suport – The ELSO Red Book (5ª Edição) (pp. 307 –
319). Ann Arbor, Michigan: Extracorporeal Life Support Organization.

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 19
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Este guia encontra-se estruturado em


onze capítulos os quais abordam
sequencialmente o desenvolvimento
do suporte extracorporal de vida, os
conceitos e as definições dos termos
frequentemente utilizados neste
contexto, as principais modalidades do
suporte extracorporal e os equipamen-
tos que suportam a circulação sanguí-
nea extracorporal. São também anali-
sados os princípios fisiológicos nos
quais se baseiam as trocas gasosas, os
procedimentos referentes ao início e
suspensão do suporte extracorporal de
vida bem como as complicações mais
frequentes que se podem encontrar
durante a execução deste procedimen-
to. Segue-se a resolução dos proble-
mas mais comuns que se podem verifi-
car durante o suporte extracorporal
bem como a atuação de emergência
por parte do EEEMC, EEESIP ou
ECECLS em caso de falência do supor-
te extracorporal de vida. Na parte final
deste guia é abordado o período
pós-descontinuação do suporte extra-
corporal de vida bem como a dimensão
ética deste suporte finalizando-se com
a proposta de um modelo assistencial à
pessoa em situação critica com suporte
extracorporal de vida.

20 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

1. O Desenvolvimento
do suporte
extracorporal de vida
A pesar de notável e extraordina-
riamente complexo, o desen-
volvimento do suporte de vida
extracorporal parte de uma simples
va restabelecer a corrente sanguínea1,2.
Praticamente meio século após esta
formulação, Benjamin Richardson
conduz, em 1860, experiências labora-
formulação: é possível imitar a função toriais nas quais é tentada uma circula-
cardiopulmonar do corpo humano e ção artificial num modelo animal2,
dessa forma recuperar um organismo sendo construído em 1885, por Max
cujas funções fundamentais se encon- Von Frey e Max Gruber, o primeiro
tram gravemente comprometidas? protótipo de dispositivo coração-pul-
mão, utilizada para estudar em labora-
1.1 Do conceito inicial à era moderna tório a perfusão de determinados
órgãos2.
Tendo apenas como objetivo perceber
se o líquido a que se convencionou É no século XX que o desenvolvimento
chamar sangue poderia ser transferido do suporte de vida extracorporal
entre duas espécies distintas, Jean ganha uma nova dimensão. Com efeito,
Baptiste Denis, ao tentar uma transfu- a descoberta do anticoagulante hepa-
são sanguínea entre um ser humano e rina por McLean e Howell, em 19162,
um cordeiro1,2, marcou em 1693 o início possibilita uma evolução significativa
de um conceito que se foi desenvol- quer da técnica quer dos equipamen-
vendo nos séculos seguintes, à medida tos que se viriam a desenvolver. Não
que progrediam igualmente outras obstante o contributo de Sergei
áreas do conhecimento científico. Em Brukhonenko e dos seus colaborado-
1812, Julian Jean Cesar le Gallois suge- res, em 1920, para o desenvolvimento
riu que uma parte do corpo humano do primeiro oxigenador de bolhas que
poderia eventualmente ser preservada viria a ser utilizado com sucesso em
por um qualquer mecanismo externo experiências animais3, foram John e
de perfusão, ao observar partes de Mary Gibbon, respetivamente um
animais aparentemente mortos que cirurgião cardíaco e uma perfusionista,
pareciam ganhar vida quando se tenta- os pioneiros na utilização do suporte

22 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

de vida extracorporal em seres huma aos gases que, simultaneamente, era


nos1. Efetivamente, e após o aperfeiço- capaz de suster a pressão hidrostática
amento do protótipo coração-pulmão do sangue no interior do circuito extra-
entre 1934 e 19464, ocorre em 1953 a corporal revelou-se como um passo
primeira intervenção cirúrgica cardíaca decisivo, uma vez que se conseguiu a
suportada por uma circulação sanguí- separação física entre o sangue e os
nea extracorporal durante 26 minutos1. gases, reduzindo significativamente o
Posteriormente, o cirurgião cardíaco C. processo de hemólise. A utilização e
Walton Lillehei aprimora este equipa- gestão da anticoagulação de uma
mento coração-pulmão reduzindo forma controlada contribuíram igual-
parcialmente os fenómenos de hemóli- mente para o crescente sucesso da
se e extravasamento de plasma aqui circulação extracorporal dado permitir
associados, possibilitando assim a uma exposição prolongada do sangue
realização de cirurgias cardíacas mais à superfície do circuito extracorporal,
complexas4,5. minimizando a sua interação e a conse-
quente coagulação sanguínea7,11,12.
Não obstante a utilização regular da
heparina após 1940 e do aperfeiçoa- O desenvolvimento dos circuitos e das
mento dos equipamentos2, verificado membranas permutadoras de gases
durante a década de 50, constata-se teve, ao longo dos anos, o contributo
que a utilização do suporte de vida de inúmeras disciplinas do conheci-
extracorporal por períodos mais mento científico (engenharia, biologia,
alargados de tempo era ainda proble- fisiologia, medicina) e também de
mática1. Com efeito, a exposição direta inúmeras personalidades que ficaram
do sangue aos gases nos oxigenadores indubitavelmente ligadas à história da
de bolhas da época tinha como conse- circulação extracorporal. Algumas
quência nefasta uma elevada taxa de destas figuras destacaram-se ao nível
destruição celular, comprometendo das experiências laboratoriais que
assim as primeiras tentativas de supor- levaram a cabo, com trabalhos verda-
te extracorporal por períodos prolon- deiramente pioneiros. Neste domínio,
gados6,7. A descoberta em 1957 do destaque para o trabalho de Kolobow
polímero silicone8,9 e a incorporação da no desenvolvimento da arquitetura em
borracha de silicone nos equipamentos espiral da membrana que fazia a sepa-
de circulação extracorporal10 foram ração entre os gases e o sangue13. Dada
dois marcos revolucionários no desen- a capacidade e permeabilidade às
volvimento desta técnica. De facto, a trocas gasosas desta membrana,
utilização de um material permeável amesma seria posteriormente batizada

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 23
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

de “membrana oxigenadora” estando de dois anos de idade em falência


inclusivamente na génese da sigla cardíaca após uma intervenção cirúrgi-
ECMO. Realce igualmente para o traba- ca15. Em 1975, novamente Robert
lho de Phil Drinker que em 1966, Bartlett, a quem é atribuído unanime-
conjuntamente com Robert Bartlett, mente o epiteto de “pai do ECMO
desenvolve um circuito simplificado de moderno”, utiliza novamente com
circulação e oxigenação extracorporal, sucesso a circulação e oxigenação
utilizando-o laboratorialmente numa extracorporal durante 72 horas num
experiência animal durante 4 dias recém-nascido vítima de hérnia
ininterruptos11. Esta experiência, que se diafragmática congénita, pneumonia
tornaria uma antecâmara para a por aspiração de mecónico e hiperten-
utilização prolongada em humanos, foi são pulmonar16,17,18. A esta criança,
igualmente aproveitada pela mesma abandonada após o parto, foi dado o
dupla para o desenvolvimento do ACT nome de Esperanza e o sucesso do seu
(Activated Clotting Time) como caso despertou, a nível mundial, o
medida padrão no que toca à gestão da interesse da comunidade científica na
anticoagulação, desenvolvimento esse potencialidade do suporte ECMO quer
que se mantém atual e corrente várias na população neonatal quer na popula-
décadas após a sua formulação7. ção adulta.

É em 1971 que aplicação de um meca- 1.2 Da era moderna à expansão


nismo de circulação extracorporal global
ocorre com sucesso em seres humanos
fora do contexto operatório. Com A era moderna do suporte ECMO e a
efeito e fazendo uso de um circuito e expansão global do seu uso inicia-se
de uma membrana permutadora de nas unidades de neonatologia nas
gases aperfeiçoados por Morrie Bram- décadas de 70 e 80, contrariamente ao
son e cujo tempo de priming rondava que era norma na época, uma vez que,
as 12 horas, o médico Donald Hill habitualmente, as inovações tanto
utiliza, com sucesso e durante 75 horas, terapêuticas como ao nível dos equipa-
a circulação e oxigenação extracorpo- mentos ocorriam primeiramente na
ral no suporte de uma pessoa crítica de população adulta e só depois transita-
24 anos, vítima de SDRA pós-trauma14. vam para as restantes faixas etárias1.
No ano seguinte, Robert Bartlett utiliza Os estudos e ensaios realizados na
este mesmo suporte, mas agora na década de década de 80 evidenciavam
modalidade VA, suportando durante pois melhores resultados do suporte
36 horas a recuperação de uma criança ECMO na sua modalidade VV em

24 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

pessoas neonatais e pediátricos, com dos é igualmente apontada com uma


significativa vantagem em comparação das razões para o seu fraco desempe-
com o tratamento então considerado nho1, falha também apontada ao
convencional19,20. Estes resultados21, estudo publicado24 em 1994 por Morris
publicados em 1985 por Robert Bartlett no qual não eram evidenciados quais-
e algo controversos no seio da comuni- quer benefícios do suporte ECMO no
dade científica pela metodologia do cliente adulto, apesar dos resultados
estudo1, catapultaram o suporte ECMO obtidos e publicados por Gattioni e
para a ribalta o que, a par da miniaturi- Bartlett durante o ano anterior relati-
zação dos equipamentos que já então vamente a várias pessoas adultas25.
se começava a verificar, fez com que
este suporte extracorporal se tornasse Apesar da renitência da comunidade
uma prática comum a nível mundial na científica relativamente ao uso do
falência pulmonar do cliente neonatal. suporte ECMO no cliente adulto, na
população neonatal e pediátrica suce-
Contudo, a afirmação do suporte diam-se os estudos26,27 que evidencia-
ECMO na faixa etária adulta foi mais vam os benefícios do suporte extracor-
demorada, existindo muitas reservas poral comparativamente à abordagem
quanto à sua mais-valia1. O primeiro tradicional. Com efeito, Pearl O’Rourke
estudo23, publicado por Snider Zapol em 198926 e David Field em 199526
em 1979, mostrou uma baixa taxa de publicaram estudos alargados nos
sobrevivência da pessoa adulta com quais as taxas de sobrevivência das
suporte ECMO, conclusão esta que pessoas neonatais suportados por
abrandou o interesse da comunidade ECMO eram muito superiores às das
científica na utilização deste suporte restantes pessoas que não beneficia-
na falência respiratória. À luz do vam deste suporte, assinalando defini-
conhecimento atual, argumenta-se tivamente a relevância e vantagem do
agora que a população selecionada suporte ECMO.
para este estudo possuía uma reduzida
probabilidade de recuperação e que a Após quase duas décadas de aperfei-
modalidade utilizada (VA) não era a çoamento técnico e de experiência
mais indicada para a população em acumulada relativamente aos primei-
questão (pessoas com SDRA), compro- ros estudos, surge em 2009 aquele que
metendo desta forma os resultados viria a ser considerado um dos mais
obtidos1. A ausência de experiência ao importantes estudos no que concerne
nível da gestão do suporte ECMO nos a afirmação do suporte ECMO na falên-
locais onde os estudos foram realiza- cia respiratória. O estudo CESAR28,

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 25
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

conduzido por Giles Peek, aproveitava internacional acerca da sua mais-valia


a diferenciação que alguns centros (isto é, sem qualquer reparo à metodo-
hospitalares do Reino Unido possuíam logia com que o estudo era conduzi-
já na área do suporte ECMO (essencial- do1), o suporte ECMO teve um papel
mente neonatal) e comparava-os com único no desenvolvimento e dissemi-
outras unidades que utilizavam uma nação global deste tipo de tecnologia e
abordagem convencional no suporte na evolução de determinados cuidados
da pessoa adulta em situação crítica de saúde. Com efeito, na segunda
em falência respiratória. Os resultados metade da década de 80, num mundo
foram elucidativos no que respeita à ainda sem o advento dos sistemas de
vantagem do suporte ECMO neste tipo comunicação globais e das redes
de situações, despertando em definiti- sociais digitais, o suporte ECMO
vo o interesse da comunidade científi- aglomerava já, em torno de uma
ca na sua utilização. Este interesse mesma temática, inúmeros profissio-
intensificou-se ainda durante esse nais de saúde com um objetivo comum:
mesmo ano aquando do surto global discutir e desenvolver este importante
do vírus Influenza, pandemia para a avanço no campo da saúde. As reuni-
qual os métodos convencionais de ões informais entre os três hospitais
suporte eram manifestamente insufi- norte-americanos31 que, em 1983,
cientes dada a agressividade da utilizavam regularmente o suporte
doença, caracterizada por uma rápida ECMO, transformaram-se rapidamente
deterioração da função pulmonar1. em grandes eventos, atualmente com a
Com efeito, o suporte ECMO eviden- participação de centenas de institui-
ciou-se como determinante para a ções e profissionais de saúde1.
sobrevivência e recuperação de milha-
res de pessoas nas diferentes faixas Após a constituição em 1989 da socie-
etárias afetados por esta pandemia29,30. dade ELSO (Extracorporeal Life
Support Organization), sediada nos
Apesar de tardiamente reconhecido Estados Unidos da América e dedicada
como uma ferramenta importante na ao estudo do suporte extracorporal de
população adulta com falência pulmo- vida1, é fundada em Paris dois anos
nar, desde cedo o suporte ECMO mais tarde, a congénere europeia EESO
ganhou o apoio e a admiração pelo (European Extracorporeal Life Support
papel que desempenhava nas faixas Organization) que em 2011 é designa-
etárias neonatal e pediátrica. Não da de EuroELSO de modo a promover,
obstante a ausência de um estudo de forma mais centrada no continente-
plenamente aceite pela comunidade europeu, o estudo e o desenvolvimento

26 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

do suporte ECMO, respeitando as Referências bibliográficas


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Latina e Sudeste Asiático. Apesar da 2 R.H. Bartlett (2010). The history of
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dados (conhecido como Registo32) B.L. & Williams, L. ECMO Specialist
mantém-se comum a todas elas, parti- Training Manual (3ªEdição) (pp. 1 - 5).
lhando os mesmos objetivos: reunir Ann Arbor, Michigan: Extracorporeal
informação comum relativamente ao Life Support Organization.
uso do suporte ECMO, comparar os
resultados obtidos por cada centro e 3 J. B. Zwischenberger & R.H. Bartlett
discutir os melhores métodos e estra- (2012). Extracorporeal life support: an
tégias no uso deste suporte extracor- overviewIn G. Annich, W. Lynch, G.
poral. Com efeito, a criação e desenvol- MacLaren, J. Wilson & R. Bartlett
vimento desta base de dados interna- (2012). Extracorporeal Cardiopulmo-
cional permitiu a avaliação dos resulta- nary Support in Critical Care (4ªEdição)
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ração entre centros nacionais e inter- corporeal Life Support Organization.
nacionais, possibilitando não só
aprimorar as indicações e contraindica- 4 Konstantinov I, Alexi-Meshkishvili V,
ções para este suporte, mas também as Brukhonenko (2000). The develop-
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30 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

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GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 31
GUIA ORIENTADOR
CONCEITOS E DEFINIÇÕES NO SUPORTE EXTRACORPORAL
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

2. Conceitos
e definições no suporte
extracorporal
A A expansão global do suporte
extracorporal de vida e o
desenvolvimento dos equipa-
mentos a ele associados levou ao
poderem ser utilizados de forma
consistente e consensual em qualquer
localização geográfica e em qualquer
língua, contribuindo assim para uma
surgimento de uma multiplicidade de interpretação comum entre todos os
termos e expressões cuja complexida- intervenientes.
de e ambiguidade dificultam, por
vezes, a sua compreensão. Empregues 2.1 Conceitos e definições
frequentemente quer na prática clínica
quer na investigação científica, estes O quadro 1, resume as definições
termos e expressões associados ao utilizadas no suporte extracorporal de
suporte ECMO foram alvo de uma vida, aprovadas pela ELSO.
uniformização internacional de modo a

Quadro 1: Definições no suporte extracorporal de vida

Termo abrangente que engloba


diversos modos de suporte de vida
baseadas no uso de um circuito
extracorporal e utilizados na
falência cardíaca e/ou pulmonar
tendo como finalidades a oxigena-
ExtraCorporeal Life ção, a remoção de dióxido de carbo-
Support (ECLS) no e/ou o suporte cardíaco. Exclui-
-se desta definição a circulação
extracorporal utilizada nos procedi-
mentos cirúrgicos cardiotorácicos e/
ou vasculares realizados em contex-
to operatório (bypass cardiopulmo-
nar).

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G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Mecanismo de suporte de vida


baseado num fluxo sanguíneo
extracorporal ao qual, através de
dispositivos vasculares (cânulas),
um circuito extracorporal, uma
bomba de sangue e uma membra-
ExtraCorporeal Membrane
na permutadora de gases (pulmão
Oxygenation (ECMO)
artificial), é fornecido oxigénio e
removido dióxido de carbono,
sendo posteriormente devolvido à
circulação sanguínea (venosa,
arterial ou ambas) suportando a
função pulmonar e/ou cardíaca.

Mecanismo de suporte de vida


utilizado na falência pulmonar
Modalidade VenoVenous onde o sangue é drenado a partir
(ECMO VV) da circulação venosa sendo poste-
riormente devolvido novamente à
circulação venosa. Para uma descri-
ção detalhada (ver ponto 3.1).

Mecanismo de suporte de vida


utilizado na falência cardíaca ou na
falência cardíaca e pulmonar em
Modalidade ArterioVenous simultâneo onde o sangue é drena-
(ECMO VA) do a partir da circulação venosa
sendo posteriormente devolvido à
circulação arterial. Para uma
descrição detalhada (ver ponto
3.2).

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Procedimento no qual as cânulas


de drenagem (acesso) e retorno
sanguíneo são inseridas no sistema
vascular. De modo a identificar os
locais de drenagem e retorno
sanguíneo é utilizada uma abrevia-
tura na qual a letra (maiúscula) à
esquerda diz respeito à cânula de
drenagem e a letra (maiúscula) à
direita diz respeito à cânula de
retorno sanguíneo (ex.: VA: a
cânula de acesso encontra-se no
Canulação sistema vascular venoso e a cânula
de retorno encontra-se no sistema
vascular arterial). A existência de
uma cânula secundária destinada a
uma drenagem ou retorno adicio-
nal de sangue é representada pela
adição de um hífen seguido de uma
letra. No caso de um fluxo reduzido,
a letra deverá ser minúscula ou
letra maiúscula no caso do fluxo da
cânula secundária seja similar ao
da cânula principal (ex.: VA-V ou
VV-V).

Canulação central refere-se à


colocação de uma ou mais cânulas
Canulação Central de forma direta numa ou mais
cavidades cardíacas (ex. aurícula
direita) ou num grande vaso (ex.:
artéria aorta) através de uma
incisão cirúrgica torácica,
geralmente uma esternotomia.

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G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Canulação periférica refere-se à


colocação de uma ou mais cânulas
de forma percutânea, semi-per-
Canulação Periférica
cutânea ou cirúrgica num vaso
sanguíneo (venoso ou arterial) fora
da cavidade torácica ou abdominal.

Mecanismo de suporte de vida


destinado a suportar parcialmente
a função pulmonar através da
remoção parcial de CO2 da circula-
ção sanguínea. Indicado em
situações de hipercapnia sem
Extracorporeal Carbon
hipoxia (falência pulmonar aguda
Dioxide Removal (ECCO2R)
ou exacerbação da falência pulmo-
nar crónica) é utilizado na modali-
dade VV requerendo um baixo
fluxo sanguíneo (0,2 - 1,5 l/min) não
conferindo qualquer suporte
circulatório.

Mecanismo de suporte de vida


utilizado na modalidade VA duran-
te uma paragem cardiorrespiratória
para o suporte da função circulató-
ria na ausência de uma reversão
Extracorporeal sustentada da circulação sanguí-
Cardiopulmonar nea espontânea com base nos
Ressuscitation (ECPR) métodos convencionais de
reanimação Iniciado até 20 minutos
após o início das manobras de
reanimação, é geralmente instituí-
do através da canulação de acessos
venosos e arteriais femorais.

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PMecanismo de suporte de vida utilizado


na modalidade VA com a finalidade de
manter a perfusão sanguínea de órgãos
destinados à transplantação. Requer a
ExtraCorporeal normotermia da circulação sanguínea
Interval Support extracorporal de modo a preservar a
for OrganRetrieval viabilidade dos órgãos. Também conheci-
(EISOR) do por OP-ECMO (Organ-Preserving
Extracorporeal Membrane Oxygenation).

Procedimento no qual ocorre uma redução


do fluxo sanguíneo e/ ou do aporte de
gases à membrana permutadora de gases
no circuito extracorporal com o propósito
de avaliar a tolerância a esta diminuição
Teste de Desmame do suporte, tendo como objetivo último a
(Weaning Trial) sua descontinuação definitiva.

Procedimento no qual ocorre uma suspen-


são temporária do fluxo sanguíneo e/ou do
aporte de gases no circuito extracorporal
com o propósito de avaliar a tolerância a
esta suspensão temporária do suporte
tendo como objetivo último a sua descon-
tinuação definitiva. A suspensão temporá-
Teste de ria do fluxo sanguíneo é pouco comum
Descontinuação devido ao grande risco de formar coágulos
(Trial-Off) no circuito extracorporal. A prática mais
utilizada é a suspensão do aporte de gases
no circuito, de forma a nunca suspender o
fluxo sanguíneo, quer seja na modalidade
VV ou na modalidade VA

Fonte: Adaptado pelos autores

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 37
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

2.2 indicações e contra-indicações do extracorporal de vida são as seguintes:


suporte extracorporal
Indicações na falência pulmonar em
De uma forma genérica, pode-se Neonatologia
afirmar que o suporte extracorporal de Considerando as diferentes faixas
vida encontra-se indicado para as etárias nas quais o suporte extracorpo-
situações em que se verifica uma ral de vida pode ser utilizado, é possí-
ineficácia dos tratamentos considera- vel afirmar, no que respeita ao suporte
dos como convencionais e usualmente da falência pulmonar na população
utilizados quer na falência pulmonar neonatal, esta possui a melhor taxa de
quer na falência cardíaca. Tendo como sucesso no suporte ECMO entre todos
objetivo a recuperação de uma ou de os grupos etários2. Neste grupo etário,
ambas as funções em falência, o supor- a modalidade VV está especialmente
te de vida extracorporal tem um carác- indicada nos casos em que a ventilação
ter temporário atuando como suporte mecânica invasiva (incluindo de alta
desses órgãos até ao seu restabeleci- frequência) e a terapêutica vasoativa
mento podendo igualmente servir não surtem o efeito desejado2, nomea-
como «ponte» para um tratamento damente nos casos de:
definitivo caso a recuperação dos • Hérnia diafragmática congénita
mesmos não seja viável. • Síndrome de aspiração de mecónio
• Hipertensão pulmonar persistente do
Adicionalmente, este mecanismo de recém-nascido
suporte extracorporal de vida pode ser • Pneumonia neonatal
utilizado com o intuito de preservar • Sépsis (com comprometimento respi-
determinados órgãos para transplan- ratório)
tação (EISOR), especificamente em • Doença pulmonar congénita
Dadores em Paragem Cardiocirculató- • Falência respiratória hipoxémica
ria (DPCC), nos quais a manutenção da
perfusão sanguínea é fundamental A utilização do suporte ECMO nas
para a viabilidade dos vários órgãos a situações previamente mencionadas é
transplantar. geralmente iniciada quando, apesar da
otimização das medidas convencionais
Assim, e tendo em conta a função em curso, se continua a verificar a
pulmonar e/ou cardíaca que se encon- persistência de hipóxia, de acidose
tra em falência e também a faixa etária metabólica e/ou respiratória e de uma
da pessoa em situação crítica, as hipotensão não reversível a fluídos,
indicações para a utilização do suporte com evidente hipoperfusão tecidular e

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diminuição do débito urinário4. Um O IO é calculado através da Fração


Índice de Oxigenação (IO) igual ou inspirada de Oxigénio (FiO2) X Pressão
superior a 25 é habitualmente conside- Média das vias Aéreas (MAP) X 100 a
rado como critério de análise para a dividir pela Pressão Parcial de O2
tomada de decisão acerca da utilização arterial (PaO2), como exemplificado no
do suporte extracorporal de vida Quadro 2:
sendo que um IO superior a 40 pode
determinar a rápida decisão acerca do
uso deste suporte3.

Quadro 2: Índice de Oxigenação

Índice de Oxigenação (IO) = FiO2 x MAP x 100


PaO2

Fonte: Adaptado pelos autores

A hipoplasia pulmonar que muitas para cerca de 500 crianças por ano,
vezes surge em consequência do com taxa de sobrevida global de 58%
desenvolvimento da patologia assu- com alta hospitalar ou transferência.
me-se como algo irreversível no trata- Assim, as principais indicações da
mento posterior conduzindo a situa- falência pulmonar em Pediatria são:
ções de falência respiratória crónica. • Pneumonia viral
Serão casos de mau prognóstico e que • Pneumonia bacteriana
terão de ser muito ponderados antes • Síndrome de Dificuldade Respiratória
de avançar para a técnica de suporte. Aguda (SDRA)
• Pneumonite/pneumonia por aspira-
Indicações na falência pulmonar em ção
Pediatria • Agudização de estado asmático
As indicações em Pediatria para início
de suporte ECMO VV são mais diver- Indicações na falência cardíaca em
sas e difíceis de serem definidas do que Neonatologia e Pediatria
na faixa dos neonatais. Contudo, nos Relativamente ao suporte da falência
últimos anos, o número de casos respi- cardíaca na população neonatal, a
ratórios relatados à ELSO aumentou modalidade VA encontra-se indicada,

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 39
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genericamente, para todos casos de à colocação do suporte extracorporal


falência circulatória cujo suporte de vida nesta faixa etária bem como a
convencional é manifestamente insufi- existência de encefalopatia hipóxia-
ciente. Assim, as indicações para esta -isquémica.
modalidade nesta faixa etária são as
seguintes: Comum a todas as faixas etárias, a
• Cardiomiopatias (congénitas e/ou hemorragia não controlada ou a
adquiridas) hemorragia intracraniana ou intracar-
• Arritmias severas com compromisso díaca assumem-se como duas das
hemodinâmico contraindicações absolutas para a
• Hipertensão pulmonar instituição do suporte extracorporal de
• Circulação ventricular única (ventrí- vida também em neonatologia.
culo único)
• Miocardites Indicações na falência pulmonar em
adultos
Contraindicações do suporte em As indicações para ECMO VV ou
Neonatologia e Pediatria ECCO2R de acordo com a ELSO7 são:
A utilização do suporte ECMO nesta • Insuficiência respiratória hipoxémica
faixa etária não é isenta de algumas (qualquer causa)
limitações (contraindicações). Com Risco mortalidade > 50% (considerar)
efeito, a sua utilização está restringida ou PaO2/FiO2 < 150 com FiO2 > 90%
aos primeiros 10-14 dias de vida e/ou Score Murray102-3
pós-parto, sendo necessário que o Risco mortalidade > 80% (indicado) ou
peso do recém-nascido em causa seja PaO2/FiO2 <100 com FiO2 > 90% e
igual ou superior a 2000 gramas (g) e Score Murray 3-4 apesar de tratamen-
ainda que a sua gestação tenha decor- to otimizado durante > 6h
rido, pelo menos, durante 34 semanas2. • Insuficiência respiratória hipercápni-
A existência de uma malformação ca
congénita significativa, nomeadamen- • Hipercapnia permissiva (PaCO2 > 80
te devido a uma alteração cromossómi- com pH<7,2)
ca5,6 constitui-se como uma dificuldade • Incapacidade de ventilar com segu-

10
O Score Murray tem como objetivo avaliar a gravidade da lesão pulmonar. Quatro critérios são tidos em conta: Número de
quadrantes pulmonares infiltrados na radiografia de tórax; PaO2/FiO2 expressa em milímetros de mercúrio (mmHg); Nível de
Positive End-Expiratory Pressure (PEEP), expresso em centímetros de água (cmH2O) e a Compliance do sistema respiratório,
expresso em mililitros por centímetro de água (ml/cmH2O). O valor final do score é obtido adicionando os valores de cada item
e dividindo o resultado por 4 (número de parâmetros)8
Score Final: 0 = sem lesão Pulmonar; 01-2,5 = lesão pulmonar leve ou moderada e > 2,5 = lesão pulmonar grave (SDRA).

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segurança (Pplat > 30 cmH2O) central/morte cerebral


• Fístulas bronco-pleurais graves • Falência multiorgânica avançada
• «Ponte» para transplante pulmonar • Hemorragia ativa/coagulopatia não
• Colapso cardíaco ou respiratório controlada
imediato • Doença terminal/irreversível
• Ventilação artificial agressiva (FiO2
Indicações na falência cardíaca em 100%, Pplat > 30) com duração supe-
adultos rior a 7 dias. Embora alguns centros
As indicações para ECMO VA de não consideram o tempo de ventilação
acordo com a ELSO9 são: uma contraindicação.
• Perfusão tecidual inadequada com • Idade - não existe uma idade específi-
hipotensão e baixo Débito Cardíaco ca, mas considera-se maior risco de
(DC), apesar do volume intravascular mortalidade com o aumento da idade
adequado
• Choque cardiogénico refratário (EAM,
miocardite, miocardiopatia pós-parto,
insuficiência cardíaca descompensada,
choque pós-miocardiotomia), apesar
da administração de volume, inotrópi-
cos e vasoconstritores
• Choque séptico, embora considerado
contraindicação em alguns centros
ECMO

Contraindicações do suporte extra-


corporal em adultos em ECMO VV e
VA
Não há contraindicações absolutas
para a ELSO7, apenas relativas, já que
cada pessoa é considerada individual-
mente tendo em conta os riscos versus
potenciais benefícios. Assim, existem
determinadas condições que estão
associadas a um mau prognóstico e
podem ser consideradas contraindica-
ções relativas, tais como:
• Lesão severa do sistema nervoso

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G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

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42 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

9 ELSO (Extracorporeal Life Support


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GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 43
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
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3. Modalidades do suporte
extracorporal de vida
H
Há diferentes estratégias de mecânica convencional otimizada, a
canulação e configuração do canulação VV é a configuração de
ECMO. O modo de canulação escolha1.
afeta a fisiologia cardiopulmonar neste
tipo de tratamento e é um fator deter- 3.1 Modalidade veno-venosa
minante no outcome. Visto isto, a canu-
lação caracteriza a configuração do A modalidade VV é utilizada na falên-
ECMO. Este pode ser caracterizada por cia pulmonar. Aqui o sangue é drenado
ECMO VA ou ECMO VV. a partir da circulação venosa (na
imagem a veia femoral) sendo poste-
A decisão de estabelecer a configura- riormente devolvido à circulação
ção VV ou VA no ECMO dependerá da venosa (na imagem, a veia jugular
natureza e severidade da doença de interna), oxigenado com baixo teor de
base e da rapidez de declínio funcional. CO2. Neste modo, o sangue que
Se a indicação primária para ECMO é provém do circuito extracorporal irriga
falência cardíaca com choque cardio- sequencialmente os pulmões e o
génico refratário, o ECMO VA deve ser coração (fisiologia em série), não
realizado. Se a indicação para ECMO foi conferindo qualquer suporte hemodi-
primariamente hipoxemia progressiva nâmico na falência cardíaca.
ou hipercapnia, apesar da ventilação

Figura 1: Modalidade VV

Fonte: Adaptado pelos autores

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 45
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Neste suporte, podem ser utilizadas 3.2 Modalidade veno-arterial


duas cânulas distintas (uma como
acesso e outra como retorno) ou Esta modalidade é utilizada na falência
apenas uma cânula (cânula de duplo- cardíaca ou na falência cardíaca e
-lúmen), colocada na veia jugular inter- pulmonar em simultâneo. Aqui o
na. A cânula de duplo lúmen possui sangue é drenado a partir da circulação
dois lumens internos correspondendo venosa sendo posteriormente devolvi-
um deles ao acesso e o outro ao retor- do à circulação arterial. Neste modo, a
no. No lúmen de acesso, os orifícios por ação da circulação extracorporal
onde o sangue é drenado ficam locali- ocorre em paralelo com as funções
zados ao nível da veia cava superior e pulmonar e cardíaca (fisiologia parale-
inferior estando o lúmen de retorno la) proporcionando assim o suporte de
localizado ao nível da aurícula direita. um ou ambos os órgãos.

Esta modalidade de circulação sanguí- Nesta modalidade, o sangue é drenado


nea extracorporal poderá ter uma a partir de uma veia de grande calibre
outra configuração com o objetivo de (na imagem, veia femoral) e, após
suportar parcialmente a função pulmo- percorrer o circuito extracorporal, é
nar através da remoção de parte do devolvido ao organismo através de
CO2 da circulação sanguínea, denomi- uma artéria (na imagem, a artéria
nando-se de Extracorporeal Carbon femoral). O sangue faz deste modo um
Dioxide Removal (ECCO2R). bypass ao coração e ao pulmão (fisiolo-
gia paralela), permitindo o seu descan-
Está indicada em situações de hiper- so e recuperação (de um ou ambos os
capnia sem hipóxia tanto na falência órgãos). Esta modalidade confere um
pulmonar aguda como na exacerbação suporte hemodinâmico direto.
da falência pulmonar crónica sobretu-
do na população adulta, utilizando um
fluxo sanguíneo reduzido (requer
potencialmente doses superiores de
anticoagulante) e coadjuvante da
ventilação mecânica (quer seja não
invasiva ou invasiva).

Não confere qualquer suporte circula-


tório nem concede um suporte pulmo-
nar total.

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G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Figura 2: Modalidade VA

Fonte: Adaptado pelos autores

Esta modalidade também é utilizada de modo a melhor preservar os órgãos


na Reanimação Cardiopulmonar Extra- destinados à transplantação.
corporal (E-CPR) e nos DPCC.

A E-CPR é um procedimento baseado 3.3 Modalidades híbridas


na imediata instituição do suporte
ECMO após a tentativa ineficaz de As configurações não podem ser vistas
recuperação sustentada da circulação como estáticas e imutáveis. Mudanças
sanguínea espontânea com base nos ocorridas na condição da pessoa
métodos convencionais de reanimação progressão da doença ou desenvolvi-
cardiopulmonar. mento de falência orgânica devem
alertar para uma reavaliação da estra-
Nos DPCC ou EISOR11/Abdominal tégia de canulação do ECMO para
Normothermic Oxygenated Recircula- suprir as novas condições metabólicas,
tion (ANOR)/NECMO/OP-ECMO12, a clínicas, hematológicas ou hemodinâ-
utilização desta modalidade VA tem o micas. Se tal acontecer o suporte de
intuito de manter a perfusão sanguí- vida extracorporal pode ser converti-
nea dos órgãos destinados à trans- do. Isto é, um ECMO VV pode ser
plantação e requer normotermia (37ºC) convertido para ECMO VA e vice-versa.
da circulação sanguínea extracorporal Pode também ser utilizada mais uma

11
EISOR refere-se habitualmente ao contexto de óbito por paragem cardiorrespiratória.
12
OP-ECMO é geralmente associado ao contexto de doação por morte cerebral e cardíaca

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veia [VA-V (síndrome de Harlequim13), terial (VV-A), é utilizada na falência


VV-V] para drenagem venosa adicio- pulmonar e cardíaca. O sangue é
nal. Estas configurações são designa- drenado a partir da circulação venosa
das de configurações híbridas e repre- (na imagem, a veia femoral) sendo
sentam aspetos de otimização do posteriormente devolvido em simultâ-
ECMO no sentido de melhorar o supor- neo à circulação venosa (na imagem a
te e as trocas necessárias para suprir o veia jugular) e à circulação arterial (na
metabolismo da pessoa, fazendo deste imagem a artéria femoral) através de
um sucesso1. uma bifurcação pós-membrana permu-
tadora de gases.
A modalidade híbrida. VenoVenosa-Ar-

Figura 3: Modalidade Híbrida VV-A

Fonte: Adaptado pelos autores

13
A síndrome de Harlequim é uma situação que ocorre na modalidade ECMO VA onde ocorre a incapacidade de fornecer
sangue oxigenado suficiente para as necessidades metabólicas superiores do corpo pelo que é necessário introduzir uma
cânula adicional na veia jugular interna de modo a introduzir sangue oxigenado à circulação pulmonar1

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G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Referências bibliográficas

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tion and cannulation strategies for
extracorporeal membrane oxygena-
tion: the potential dynamic process of
organ support and importance of
hybrid modes,” European Journal of
Heart Failure Supplements, vol. 19, pp.
75-83, Maio 2017.

2 Michael Ibrahim MD PhD, Christian


Bermudez MD (2017) - Universidade
da Pensilvânia - A Prospective Rando-
mised Trial of Early LV Venting Using
Impella CP for Recovery in patients
with cardiogenic shock managed with
VA ECMO.

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GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

4. Componentes do
suporte extracorporal
de vida
O s sistemas de suporte extracor-
poral de vida baseiam-se, na
sua essência, nos equipamen-
tos de bypass cardiopulmonar utiliza-
uma monitorização absolutamente
fundamental para a segurança deste
suporte extracorporal.

dos dentro do bloco operatório, em Apesar da sua dimensão cada vez mais
contexto de cirurgia cardíaca. A evolu- reduzida e do seu uso ser cada vez
ção destes equipamentos, sobretudo mais intuitivo, os sistemas de suporte
ao nível dos materiais utilizados, extracorporal de vida, produzidos em
permitiu igualmente a evolução dos materiais biocompatíveis, representam
sistemas extracorporais utilizados fora ainda um elevado nível de complexida-
do contexto operatório sendo de de sendo fundamental um conheci-
realçar a sua significativa miniaturiza-mento aprofundado acerca de cada um
ção. dos seus componentes, de modo a ser
possível resolver, de uma forma rápida
Os componentes básicos de um siste- e segura, um qualquer funcionamento
ma extracorporal de vida incluem deficiente de um ou mais destes
cânulas, tubos condutores (circuito), componentes.
uma bomba de sangue, a membrana
permutadora de gases (oxigenador) e 4.1 Acessos venosos e arteriais
uma unidade permutadora de calor, (cânulas)
responsável pela regulação da tempe-
ratura no circuito extracorporal. Os O termo cânula refere-se aos cateteres
modernos sistemas extracorporais que são colocados nos vasos sanguíne-
possuem igualmente, integrados no os e por onde o sangue é recolhido
seu circuito principal, diversos senso- (acesso) para o sistema extracorporal e
res cuja função passa pela monitoriza- posteriormente devolvido (retorno)
ção das diferentes pressões, tempera- por este. Esta nomenclatura permite
turas, saturações, parâmetros hemodi- distinguir estes cateteres dos restan-
nâmicos e fluxos bem como, pela tes utilizados em outros procedimen-
deteção de entrada acidental de ar, tos não relacionados com o suporte

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extracorporal de vida. Fabricadas em ção do fabricante), as cânulas usadas


poliuretano biocompatível com ou sem no suporte de vida extracorporal
revestimento interno de anticoagulan- compreendem as cânulas de acesso/-
te (heparina) e aprovadas para uma venosas (azuis) e as cânulas de retor-
utilização máxima de 30 dias (indica- no/arteriais (vermelho)1.

Figura 4: Cânulas de Acesso/venosas (azuis) e Cânulas de Retorno/arteriais (vermelhas)

Fonte: https://www.getinge.com3

As cânulas podem ser inseridas perife- de bypass cardiopulmonar. Apesar de


ricamente de forma percutânea permitir fluxos sanguíneos considerá-
simples (técnica de Seldinger), com veis, a canulação central implica geral-
exposição do vaso (técnica de Seldin- mente manutenção do esterno aberto
ger modificada) ou ainda através de durante o período de suporte extracor-
uma abordagem cirúrgica ao vaso em poral com o consequente risco acresci-
questão. Podem também ser inseridas do de hemorragia e infeção.
através de canulação central, sendo
esta abordagem utilizada essencial- O tamanho das cânulas e a sua locali-
mente em contexto de cirurgia cardía- zação (vaso sanguíneo onde é inseri-
ca, nomeadamente quando é necessá- da) são fatores fundamentais na eficá-
rio prolongar o suporte circulatório no cia e eficiência do suporte extracorpo-
período pós-cirúrgico. Neste tipo de ral. Uma cânula com um diâmetro
canulação, a cânula venosa (acesso) inferior ao necessário irá provocar
encontra-se localizada na aurícula necessariamente um aumento da resis-
direita estando a cânula de retorno tência ao fluxo sanguíneo, resistência
(arterial) posicionada na artéria aorta esta igualmente proporcional ao seu
ascendente. São habitualmente utiliza- cumprimento e ao número de orifícios
das as cânulas empregues durante o laterais que esta possui. A escolha de
procedimento cirúrgico, substituindo- uma cânula de retorno com um diâme-
-se apenas o circuito do equipamento tro inferior ao necessário pode poten-

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ciar os fenómenos de hemólise, de diâmetro entre os 10 Fr e os 29 Fr e o


ativação plaquetária excessiva e ainda seu comprimento entre os 11 cm e os 55
possíveis ruturas num ou mais compo- cm, sendo as de maior comprimento
nentes do circuito extracorporal sujei- geralmente utilizadas na canulação
tos a uma pressão elevada. dos vasos na região femoral2.

O tamanho de uma cânula é medido A cânula utilizada na devolução do


pelo seu diâmetro externo sendo a sua sangue ao sistema circulatório da
medida expressa segundo a escala pessoa é denominada por cânula
French (Fr). A partir desta escala, arterial (retorno) possuindo geralmen-
também conhecida por escala Char- te um orifício central principal e dois
rière (Ch), é possível determinar o seu orifícios laterais secundários, variando
diâmetro exato em milímetros já que a o seu diâmetro entre os 6 Fr e os 23 Fr.
cada 3 Fr corresponde 1 mm na tradi- A colocação desta cânula acarreta
cional escala métrica. Quer a modalida- necessariamente uma diminuição no
de quer a área de superfície corporal espaço livre do vaso onde é inserida,
da pessoa são fatores a ter em conta tendo por isso impacto no fluxo
aquando da escolha do diâmetro e sanguíneo desse local2.
comprimento das cânulas que serão
utilizadas. Apesar de possuírem o Este facto é particularmente relevante
mesmo diâmetro, as cânulas de quando, na modalidade VA, esta cânula
diferentes fabricantes apresentam de retorno é colocada na região femo-
comportamentos distintos ao nível do ral, diminuindo deste modo o fluxo
fluxo sanguíneo permitido e também neste local. Neste cenário, e de modo a
ao nível da pressão interna gerada1. evitar uma baixa perfusão do membro
inferior, a colocação de um cateter/in-
A cânula por onde o sangue é recolhido trodutor de reperfusão (6 Fr a 8 Fr),
e por onde este diverge para o circuito orientada no sentido próximo-distal,
extracorporal é denominada por surge como garantia do fluxo sanguí-
cânula venosa (cânula de acesso). As neo necessário à irrigação dessa extre-
cânulas venosas possuem geralmente midade evitando uma possível isque-
um maior calibre, possuindo um orifício mia ou síndrome compartimental
central e vários orifícios laterais de (Figura 5). A monitorização da perfu-
modo a facilitar a captação e drenagem são/oxigenação dessa extremidade é
sanguínea para o sistema extracorpo- fundamental para uma deteção preco-
ral. As cânulas venosas podem possuir ce e atempada de uma situação de
apenas um lúmen, variando o seu baixa perfusão.

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Figura 5: Cateter/Introdutor de reperfusão do membro inferior

Fonte: Adaptado pelos autores

Considerando-se a medida do diâme- A cânula de duplo lúmen (Figura 6)


tro de uma cânula o seu diâmetro possui dois lumens internos e um
externo, este fator é especialmente diâmetro que varia entre os 13 Fr e os
relevante nas cânulas de duplo lúmen. 32 Fr. Também conhecida por cânula
Nesta tipologia de cânula, e para o bicava, esta cânula é apenas utilizada
mesmo número de Fr, o diâmetro inter- na modalidade VV destinada ao supor-
no de cada lúmen é consideravelmente te da função pulmonar sendo constituí-
menor comparativamente com uma da por um lúmen destinado à drena-
cânula venosa de apenas um lúmen gem do sangue e outro orientado para
dado a coexistência, no mesmo espaço, a sua devolução.
de dois lumens.

Figura 6: Cânula de duplo-lúmen

Fonte: https://www.getinge.com3

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Inserida através da veia jugular inter-


(Figura 7) são constituídos por mate-
na, a cânula de duplo lúmen necessitariais biologicamente inertes, de eleva-
de uma colocação precisa de modo a da durabilidade e resistentes à
que as áreas de drenagem do sangue fragmentação do seu próprio material
(orifícios da cânula de acesso), fiquem
(fenómeno conhecido como spalla-
localizadas ao nível da veia cava tion). Desenvolvidos a partir dos siste-
inferior e superior (drenagem simultâ-
mas de bypass cardiopulmonar utiliza-
nea em ambas as áreas), e a área de dos em contexto de cirurgia cardíaca e
devolução (orifício distal da cânula de
elaborados anteriormente em látex e
retorno), fique localizada ao nível da
silicone, os modernos circuitos extra-
aurícula direita, minimizando deste corporais são atualmente produzidos
modo a probabilidade de recirculação em Policloreto de Vinil (PVC), isento de
sanguínea no sistema extracorporal. DEHP (di-etilhexil ftalato) apresentan-
do uma elevada flexibilidade e resis-
4.2 Circuitos extracorporais tência à sua própria deterioração,
suportando pressões que variam entre
Os circuitos utilizados nos sistemas os -500 mmHg e os +900 mmHg1.
extracorporais de suporte de vida

Figura 7: Circuito extracorporal (conjunto de tubos)

Fonte: https://www.getinge.com3

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Acompanhando a evolução verificada redução do número de pontos de


ao nível das bombas de sangue utiliza- acesso ao circuito é especialmente
das no suporte extracorporal de vida, relevante já que, cada um destes
também os circuitos extracorporais pontos representa uma provável zona
evoluíram, tanto ao nível da sua de turbulência no fluxo sanguíneo,
composição, como ao nível da sua levando à sua hemólise e à formação
arquitetura. Assim, os modernos circui- de coágulos, além de representar uma
tos extracorporais encontram-se potencial porta de entrada de ar no
disponíveis com ou sem revestimento circuito extracorporal.
interno de anticoagulante (heparina),
carregados na sua superfície interna 4.3 Bombas de sangue
com cargas elétricas negativas (desti-
nadas a repelir as plaquetas, também A bomba de sangue do sistema extra-
elas de carga elétrica negativa) e corporal é o mecanismo que controla o
encontram-se disponíveis em diferen- fluxo sanguíneo do cliente através do
tes tamanhos, adaptados às várias circuito e da membrana permutadora
faixas etárias e necessidades de supor- de gases existindo duas tipologias que
te, sendo o fluxo sanguíneo máximo de são habitualmente utilizadas: a bomba
cada um deles, expresso em litros/mi- de sangue oclusiva ou de rolamentos e
nuto conforme descrito abaixo: a bomba de sangue centrífuga.
• 3/16’’ (neonatal): 1,2 L/min
• 1/4’’ (pediátrico): 2,5 L/min Baseada no mecanismo de bypass
• 3/8’’ (pediátrico / adulto): 5 L/min cardiopulmonar usado em contexto de
• 1/2’’ (adulto): 10 L/min cirurgia cardíaca, a bomba de sangue
oclusiva ou de rolamentos, como se
Uma das evoluções mais notórias diz pode verificar na Figura 8, foi o equipa-
respeito ao seu comprimento e aos mento utilizado na transição do supor-
pontos de acesso que, ao longo dos te extracorporal entre o bloco operário
tempos, têm sido progressivamente e as unidades de cuidados intensivos.
reduzidos. De facto, os circuitos foram Apresentando-se como uma versão
sendo miniaturizados de modo a simplificada do dispositivo de bypass
aumentar a sua manobrabilidade o que cardiopulmonar, este equipamento
permite uma movimentação mais extracorporal apresenta uma bomba
segura da pessoa diminuindo simulta- de sangue com dois rolamentos princi-
neamente a resposta inflamatória do pais que comprimem uma determinada
organismo e a probabilidade de forma- secção do circuito extracorporal impul-
ção de coágulos. Neste particular, a sionando de forma circular o fluxo san-

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guíneo no seu interior.

Figura 8: Bomba de sangue oclusiva ou de rolamentos

Fonte: https://www.getinge.com3

Apesar de se apresentar com alguma tendo sido apresentada pela primeira


dependência do efeito da gravidade vez em 1978, como uma alternativa às
para garantir um constante aporte bombas de sangue oclusivas. Esta
sanguíneo ao sistema e não obstante a nova tipologia, denominada por bomba
fadiga da superfície do circuito verifi- de sangue centrífuga, faz parte do
cada na zona de compressão dos grupo de mecanismos circulatórios
rolamentos, a bomba de sangue oclusi- denominados por não oclusivos, grupo
va revelou-se fundamental na afirma- este que integra igualmente as
ção do suporte extracorporal fora do bombas de sangue de configuração
contexto cirúrgico, sendo ainda usada axial e diagonal.
em alguns centros como equipamento
na assistência de curta duração da A bomba de sangue centrífuga funcio-
pessoa neonatal e pediátrico, dada a na essencialmente através da ação
sua precisão no controlo rigoroso dos rotativa de um motor cuja rotação gera,
baixos fluxos sanguíneos requeridos no dispositivo (reservatório) do circui-
nestas faixas etárias, embora existam to extracorporal que é acoplado à
outras alternativas de maior precisão bomba, um movimento em vórtice com
com baixos fluxos. uma pressão negativa (responsável
pela sucção do sangue para o circuito)
No entanto, com intuito de prolongar o e, simultaneamente, uma pressão
período de assistência que poderia ser positiva que impulsiona o sangue para
oferecido por estes mecanismos de fora desse mesmo dispositivo (reserva-
suporte extracorporal de vida, uma tório) rumo ao restante circuito.
nova tipologia de bomba de sangue foi
desenvolvida durante a década de 70,

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Figura 9: Bomba centrífuga

Fonte: https://www.getinge.com3

Apresentando como principal vanta- também conhecidos por “cabeça da


gem um menor grau de complicações bomba”.
clínicas, dada a ausência de compre-
ssão mecânica do sangue com a sua Com efeito, estes dispositivos podem
consequente hemólise, esta tipologia ser constituídos, em alguns dos seus
de bomba permite igualmente utilizar modelos, por uma série de cones
um mesmo circuito durante um perío- concêntricos cujo movimento giratório
do prolongado dado não existir uma impulsiona o sangue numa determina-
degradação acentuada numa determi- da direção, num padrão de movimento
nada área do circuito (zona de tipo vórtice, como mostra a Figura 10.
compressão dos rolamentos), reduzin- Apesar da progressiva miniaturização
do desta forma o potencial de liberta- destes dispositivos, também conheci-
ção de partículas do circuito e mesmo a dos por bombas de vórtex, com a
rutura deste nesse segmento. consequente redução da área e tempo
de contacto entre a sua superfície e o
As bombas de sangue centrífugas sangue, estes apresentam ainda um
atuais, apesar de possuírem princípios considerável grau de hemólise dado a
de funcionamento semelhantes existência de um ponto fixo em torno
diferenciam-se pelo modo como a do qual os cones concêntricos se movi-
força magnética da bomba de sangue é mentam, gerando zonas de estagnação
aplicada no dispositivo (reservatório) sanguínea e de formação de coágulos.
que lhe está acoplado bem pelas carac-
terísticas destes mesmos dispositivos,

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Figura 10: Bomba centrífuga com cones concêntricos

Fonte: https://www.getinge.com3

As bombas centrífugas mais recentes positiva. As bombas centrífugas estão


necessitaram de mudanças na sua equipadas de uma manivela para uso
composição de forma a reduzir ou manual e uma bateria, para o caso de
eliminar áreas de estagnação, reduzin- falha de energia5.
do a hemólise mecânica que se verifi-
cava nas primeiras bombas desenha- Nas bombas de sangue com o acesso
das. Estas são constituídas por um fechado, a bomba deve exercer uma
rotor dentro de um encaixe cónico força de sucção máxima entre os -100 e
rígido que cria um vórtice constrangido os -300 mmHg. Com o retorno venoso
para drenar o sangue para a bomba e sanguíneo fechado não deve exercer
usa a força centrífuga para ejetar esse uma pressão positiva superior a +300
mesmo sangue da bomba4. O fluxo mmHg.
nestas bombas é dependente da
condição da pré e pós-carga da pessoa, Por vezes, quando a acesso venoso é
ou seja, se a volémia da pessoa é redu- subitamente interrompido, a pressão
zida, então a bomba mantém as negativa pode chegar aos -750 mmHg.
rotações programadas, mas o fluxo Nesta situação, pode ocorrer o
reduzirá automaticamente sem exercer fenómeno de cavitação. A cavitação
pressão negativa extrema na aurícula extrai os gases que se encontram
direita. Se há um aumento da pós-car- dissolvidos no sangue (oxigénio e
ga ou um aumento modesto da dióxido de carbono) do sangue,
pressão arterial, o fluxo cairá automati- causando hemólise do sangue no
camente sem alterações nas rotações e acesso sanguíneo e na cabeça da
sem gerar níveis elevados de pressão bomba de sangue.

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Os modelos mais recentes de bombas microporosa, uma superfície de


de sangue diminuem as RPM a partir polimetilpenteno comprimido, cloreto
pressões pré-definidas (positivas e de polivinilo e aço inoxidável. A área da
negativas). Devem possuir bateria superfície da membrana e o local da
suficiente, pelo menos para uma hora e mistura do sangue determina a capaci-
devem ter sempre disponível um dade máxima de oxigenação de
dispositivo manual de bombeamento qualquer oxigenador. A taxa de fluxo
do sangue (hand crank). ou entrega máxima de oxigénio (O2) é
definida pela quantidade de sangue
4.4 Membranas permutadoras de dessaturado que pode ser quase total-
gases (membranas oxigenadoras) mente saturado, por minuto. A taxa de
Esta componente tem como intuito fluxo standard para qualquer membra-
fornecer oxigénio e remover dióxido de na permutadora de gases é a taxa de
carbono. Deve ter o tamanho adequa- fluxo da qual o sangue venoso cuja
do para providenciar antecipadamente saturação de 75% com uma hemoglobi-
as necessidades metabólicas da na de 12-14mg/dl sairá da membrana
pessoa. com uma saturação de 95%6,7.

O sangue sai da bomba e entra para a Tanto a membrana permutadora de


membrana permutadora de gases ou a gases como a bomba devem ser capa-
unidade permutadora de calor, depen- zes de fornecer e remover O2 e CO2
dendo do tipo de aparelho que é respetivamente, de pelo menos na
usado. Para oxigenadores com unidade mesma proporção do metabolismo
de calor integrada, o sangue entrará normal da pessoa, o que equivale a
primeiro neste. uma taxa de fluxo sanguíneo VV de
3cc/kg/min em adultos, 4-5cc/kg/min
A membrana permutadora de gases é em crianças e 6cc/kg/min em recém-
constituída por vários biomateriais nascidos1.
como: borracha de silicone, fibra oca
Figura 11: Membrana permutadora de gases

Fonte: Adaptado pelos autores

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Na membrana oxigenadora, tal como neo comprido e um gradiente de


no pulmão, as trocas gasosas dão-se pressão elevado. As membranas
por gradiente de pressão. iniciais de circuitos de fibras ocas
(holow fiber membranes) dentro das
A vantagem que estas membranas têm quais circulava o sangue possuíam
em relação às cilíndricas é que o igualmente um gradiente de pressão
sangue circula entre as fibras desali- elevado no compartimento do sangue
nhadas que criam turbulência facilitan- circulando os gases no exterior destas
do o contacto com todas as células, fibras. As atuais membranas possuem
aumentando assim a superfície de igualmente fibras ocas, mas as mesmas
contacto. Esta superfície de contacto são utilizadas para a circulação dos
da membrana e a mistura (troca de gases, circulando o sangue no seu
gases) na via do sangue determinam a exterior, com menor gradiente de
capacidade máxima de oxigenação pressão.
(rated flow).
Membranas Holow Fiber iniciais:
Rated flow feitas de polipropileno microporoso
O Rated flow ou “entrega máxima de têm uma longevidade limitada pelo
O2” é a quantidade máxima de sangue leak de plasma que podia causar falha
venoso normal que a membrana conse- da membrana, devido à saturação da
gue aumentar desde a entrada do superfície de contacto entre o sangue e
oxigenador (Sat.O2 de 75%) até à saída os gases.
(Sat.O2 de 95%), num período. A área
superficial da membrana influência no Membranas Holow Fiber atuais:
sentido de dar o suporte total necessá- efetuadas em polimetilpenteno; mais
rio á pessoa. Com um fluxo superior ao eficientes nas transferências gasosas,
rated flow (definido pelos fabricantes) oferecem uma resistência muito baixa
a Sat.O2 arterial desce por não haver à passagem do sangue pelo seu
tempo para as trocas. interior e sem leak de plasma significa-
tivo. Apesar de uma estrutura de fibras
A entrega de oxigénio máxima é a bastante sólidas, os gases podem
quantidade de O2 por minuto que é passar para o circuito do sangue
entregue na membrana. (blood path) e se tal acontecer, pode
ocorrer uma pressão muito negativa.
As primeiras membranas (membranas
não porosas, sólidas, de borracha em As atuais membranas de polimetilpen-
silicone) possuíam um circuito sanguí- teno demonstram uma elevada durabi-

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lidade, uma atenuação da resposta de hemoderivados.


inflamatória e uma menor necessidade

Figura 12: Membranas permutadoras de gases (membranas oxigenadoras)

Fonte: https://www.getinge.com3

4.5 Unidades permutadoras de calor ECMO. Este efeito é conseguido


através da regulação da temperatura
Estes aparelhos são constituídos por da água, discretamente mais alta que a
tubos de aço inoxidável ou por paredes temperatura sanguínea normal, de
corrugados que separam o sangue que forma a manter uma temperatura
circula neles, da circulação da fonte de corporal pretendida. Para que não haja
água. A sua função é bidirecional, nenhuma fuga de calor pelo circuito,
aquecendo ou arrefecendo o sangue estas unidades são normalmente as
que vai em direção ao cliente. Conso- componentes mais distais do circuito5.
ante o tipo de aparelho, a sua eficiência No entanto, como já referido anterior-
é baseada na transferência ou troca de mente, há membranas permutadoras
calor. de gases já com sistema de aqueci-
mento/arrefecimento integrado. Estas
Sabe-se que a hipotermia pode causar unidades baseiam-se no conceito de
hemorragia e desregulação fisiológica contracorrente do fluxo para que o
bem como a hipertermia pode trazer sangue e a água circulem em direções
efeitos cerebrais devastadores5. O opostas de forma a melhorar a sua
objetivo destes aparelhos é manter a eficiência.
normotermia durante o tratamento de

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Figura 13: Unidades permutadoras de calor

Fonte: https://www.medtronic.com8 e https://www.getinge.com3

4.6 Misturadores de gases (sweep concentração de 21 a 100% de O2 e até


gas) onze litros por minuto de ar comprimi-
do. Estes misturadores poderão ser de
Os misturadores de gases (sweep gas) alto fluxo ou baixo fluxo e incorporam
fornecem uma mistura precisa de ar filtração de gases de abastecimento,
comprimido e oxigénio às membranas como se pode ver na figura abaixo.
oxigenadoras, permitindo ajustes da

Figura 14: Misturador de gases (Blender)

Fonte: https://www.getinge.com3

4.7 Sensores de pressões/fluxos/ar Monitorização das pressões do circui-


to, deteção de bolhas (Figura 15) e um
Os monitores disponibilizam uma série sistema de alarmes com automatização
de informações importantes, pois e servo-regulação da bomba de
integram um conjunto de informações sangue ou mesmo interrupção do
visando a monitorização e segurança. funcionamento da mesma, em caso de

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anomalias, são as capacidades destes pressão máxima programada de forma


monitores, como mostra a Figura 16. O a evitar pressões perigosas. Também
fluxo sanguíneo é monitorizado servo-regulam a pressão do circuito de
através de detetores ultrassónicos, drenagem do sangue para a bomba,
sendo que a pressão pré e pós mem- para prevenir uma sucção excessiva1.
brana são servo-reguladas com uma

Figura 15: Detetor de ar

Fonte: https://www.getinge.com3

Figura 16: Monitor do Cardiohelp® (informações das pressões/fluxos)

Fonte: https://www.getinge.com3

A informação disponibilizada por estes das funções de perfusão e oxigenação


monitores não é suficiente. É também do circuito. Alguns centros de suporte
necessária a monitorização da Satura- ECMO dispõem de monitores que
ção de Oxigénio no sangue (Sat.O2) das fazem esta avaliação contínua,
linhas venosa e arterial, para uma enquanto que noutros, é necessário
avaliação em tempo real da adequação colher amostra de sangue para analisar

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as trocas gasosas, para isso é necessá- Referências bibliográficas


rio colocar uma torneira pré e outra,
pós membrana, de forma a facilitar 1 ELSO General Guidelines, “ELSO Guide-
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essa colheita.
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Available: https://www.elso.org/Portals/0/
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2 ELS: Extracorporeal Life Support Organi-


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66 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

5. Princípios fisiológicos
A compreensão da fisiologia do
suporte extracorporal de vida e
da sua interação com a fisiolo-
gia do organismo pressupõe o entendi-
suporte, independentemente da sua
modalidade, como a circulação extra-
corporal de sangue pouco oxigenado e
saturado com CO2 através de uma
mento de alguns conceitos fundamen- membrana permutadora de gases
tais ao nível das trocas gasosas que onde este é hiperoxigenado e do qual é
ocorrem tanto a nível pulmonar como removido o excesso de dióxido de
na superfície da membrana permuta- carbono sendo posteriormente devol-
dora de gases. Esquematicamente com vido à circulação.
base na figura 17, podemos definir este

Figura 17: Circulação extracorporal de sangue pouco oxigenado e sangue oxigenado

Fonte: Adaptado pelos autores

A membrana permutadora de gases 5.1 Fisiologia das trocas gasosas no


tem assim como principal objetivo corpo humano
mimetizar a função pulmonar do orga-
nismo procurando, em conjugação com A difusão de gases faz-se de um nível
o aporte de gases que lhe é conferido, de pressão mais alta para um mais
um equilíbrio homeostático ao nível baixo sendo que, neste contexto, a
das trocas gasosas semelhante ao que Pressão Parcial de Oxigénio (PaO2), no
ocorre nos pulmões. ar atmosférico é de cerca de 158mmHg

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chegando ao interior da célula com As trocas gasosas ocorrem, pois, a dois


uma pressão de apenas 10mmHg, níveis, especificamente ao nível do
conforme pode ser observado na pulmão e ao nível celular. Em ambos, a
figura 18. Relativamente ao CO2, igual- troca de O2 e CO2 ocorre devido aos
mente devido aos gradientes de diferentes gradientes de difusão que
pressão, este é transportado pelo vão sendo originados pelas mudanças
sangue a partir dos vasos capilares até nas pressões parciais destes gases ao
aos alvéolos pulmonares e daí excreta- longo dos seus trajetos.
do pelos pulmões1.

Figura 18: Trocas gasosas no alvéolo pulmonar

Fonte: Adaptado pelos autores


(obtido de https://rocas+gasosas+no+alv%C3%A9olo+pulmonar&source5)

São as necessidades metabólicas que -se numa relação intrínseca entre a


determinam o consumo de O2 e o fluxo quantidade/teor de O2, a sua distribui-
sanguíneo necessário para a sua distri- ção e o seu consumo e cuja perturba-
buição pelos diferentes órgãos. O siste- ção acarreta alterações fisiológicas
ma cardiorrespiratório mantém home- importantes1.
ostaticamente uma disponibilidade de
O2 que supera as necessidades de 5.1.1 Quantidade de O2
consumo do organismo, disponibilizan-
do a todo o momento o quádruplo do Quando surge uma necessidade meta-
O2 que se encontra a ser consumido. bólica de O2 superior, de modo a
Este rácio assente na proporção de 4:1 conservar o rácio de 4:1 entre a quanti-
entre o que está disponível e o que é dade de O2 fornecida e a efetivamente
necessário, serve para, de uma forma consumida, verifica-se em primeira
imediata, acomodar uma qualquer instância, um aumento do DC. Esta
necessidade adicional de O2 e baseia- resposta do organismo tem como obje-

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G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

tivo manter a quantidade disponível de na figura 19, significa que o consumo


O2 constante relativamente ao seu de O2 pelo organismo é de apenas 25%
consumo que em condições normais, do total disponível assegurando a já
equivale a um valor de saturação referida relação homeostática entre
venosa de 75%. quantidade, distribuição e consumo.

Este valor, conforme se pode observar

Figura 19: Quantidade de oxigénio fornecida e a efetivamente consumida

Fonte: Adaptado pelos autores

Na generalidade a PaO2 é um parâme- expressam a quantidade de O2 disponí-


tro unanimemente aceite como reflexo vel sem o conhecimento do valor de
da ventilação/perfusão a nível pulmo- Hb. Valores altos de concentração de
nar, proporcionando um indicador útil Hb correlacionam-se com níveis mais
para os ajustes na terapia suplementar altos de conteúdo de O2 do que valores
com oxigénio. No entanto, a PaO2 elevados nas variáveis de Sat.O2 e de
apenas representa o oxigénio dissolvi- PaO2.
do no plasma, ou seja, cerca de 2% do
O2 da corrente sanguínea. Por outro O DC é resultado de um balanço da
lado, a Sat.O2, é outro parâmetro crucial força e volume de cada contração e
representando a saturação da hemo- frequência cardíaca e a resistência ao
globina disponível no sangue arterial. fluxo na circulação arterial. Por sua vez,
Contudo, a sua concentração não é estes fatores são regulados em parte
conhecida. Sabemos que a hemoglobi- pela pressão de enchimento do ventrí-
na (Hb) é a condição sine qua non de culo (volume sanguíneo), tónus vascu-
98% do transporte de O2. Isto para lar e viscosidade sanguínea (hemató-
dizer no que respeita ao conteúdo de crito).
O2 no sangue as gasometrias não

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A pressão arterial é o produto da PaO2


pré-carga, frequência cardíaca, força A PaO2 representa o O2 dissolvido no
contrátil do ventrículo esquerdo e plasma, o que corresponde apenas a
resistência. A pressão venosa central é 2% do teor total de O2 no sangue. Este
menor e é determinada pelo volume dado, isoladamente não nos confere
venoso sanguíneo e tónus dos vasos. nenhuma informação relevante, mas se
multiplicarmos pelo seu coeficiente de
A nível alveolar a Hb fica 100% satura- solubilidade (0,003) obtemos a quanti-
da em 0,25 segundos por isso o sangue dade de O2 no plasma.
fica saturado.

Figura 20: PaO2

Fonte: Adaptado pelos autores (obtido de


https://cas+gasosas+no+alv%C3%A9olo+pulmonar&source5

Sat.O2 na transporta a maior quantidade de


A Sat.O2 representa a comparação O2 possível, a Sat.O2 é de aproximada-
entre a quantidade real de O2 transpor- mente 100%, ou seja, cada grama de
tado pela hemoglobina com a quanti- Hb consegue transportar aproximada-
dade de O2 que a hemoglobina é capaz mente 1,34cc de O2.
de transportar. Assim, se a hemoglobi-

Figura 21: Sat.O2

Fonte: Adaptado pelos autores


(obtido de https://trocas+gasosas+no+alv%C3%A9olo+pulmonar&source5)

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 71
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Conteúdo arterial de O2/Teor de O2 aproximadamente igual à quantidade


(CaO2) de O2 consumido. A frequência e
profundidade respiratória são contro-
O conteúdo arterial de O2 é a quantida-
de total de oxigénio existente no ladas para manter uma pressão arterial
sangue arterial, sendo um parâmetro de CO2 de 40mmHg. Ao contrário da
muito relevante na gestão do suporte entrega de O2, a excreção de CO2 não
extracorporal de vida1. depende da hemoglobina ou fluxo
sanguíneo, mas sim sensível a mudan-
A quantidade de CO2 produzido a cada ças na ventilação.
minuto pelo metabolismo sistémico é

Figura 22: Teor, distribuição e consumo de O2

Fonte: Adaptado pelos autores

A Figura 23: Teor de O2 (PaO2 e Sat.O2)

Adaptado pelos autores (obtido de


https://trocas+gasosas+no+alv%C3%A9olo+pulmonar&source5)

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Fonte: Adaptado pelos autores


(obtido de https://trocas+gasosas+no+alv%C3%A9olo+pulmonar&source5)
Quadro 3: Teor de O2

Teor de O2 (CaO2) = Hb x 1,34 x Sat.O2 + (PaO2 x 0,003)


O2na Hb + O2 no plasma

5.1.2 Distribuição de O2 (DO2) sistémico, não há alteração no consu-


mo deste e por isso a quantidade de O2
A distribuição de O2 (DO2) é a quanti- retirado de cada decilitro de sangue
dade de O2 entregue aos tecidos a cada arterial é maior, o que resultará numa
minuto. É efetuada através do plasma saturação venosa mista baixa. Posto
(2%) e da hemoglobina (98%) isto, mesmo que o sangue arterial
esteja completamente saturado, se a
Para aumentar a DO2 são necessárias saturação venosa mista estiver baixa é
duas medidas: óbvio que o consumo é desproporcio-
fluxo sanguíneo nal à entrega. Se esta entrega de
Hb oxigénio é severamente baixa então
não haverá oxigénio suficiente para as
A entrega de O2 sistémico é a entrega necessidades metabólicas da pessoa e
deste gás aos tecidos periféricos, a iniciar-se-á um metabolismo anaeróbi-
cada minuto ou o produto do conteúdo co, podendo até resultar em acidose
de oxigénio arterial vezes o DC. A metabólica e choque (rácio de 2:1). A
entrega de O2 é controlada pelo DC, variável da saturação venosa mista é,
concentração e saturação de hemoglo- por isso, um marcador importante na
bina e O2 dissolvido. Como já referido, o monitorização de uma pessoa2.
valor normal da entrega de O2 é de 4 a
5 vezes mais o seu consumo. Quando o 5.1.3 Consumo de O2 (VO2)
consumo varia, consoante as variações
metabólicas, a entrega reajusta-se O VO2 é a quantidade de O2 utilizado
aumentando ou diminuindo o DC por pelas células a cada minuto e depende
forma a manter o rácio preconizado. do metabolismo aeróbio. Os valores
Por exemplo, se há uma discreta normais em repouso são de 5-8ml/Kg/-
diminuição da entrega de O2 a nível min em recém-nascidos, 4-6ml/Kg/min

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em crianças e de 3-5ml/Kg/min em difusão através dos tecidos é descrita e


adultos. calculada pela lei de Fick em que a
velocidade de transferência de um gás
Fatores que aumentam o VO2 é proporcional à área da membrana e
• Atividade muscular ao gradiente de pressão parcial entre
• Hipertermia os dois lados e inversamente propor-
• Dor cional à espessura da membrana.
• Infeção
• Altos níveis de catecolaminas e de A área da barreira sangue-gás no
hormonas tiroideias pulmão é enorme (50 a 100 m2) e a
• Convulsões espessura é mínima (0,3 µm), ideal
para difusão. Isto significa que o CO2 se
A quantidade de O2 absorvido nos difunde cerca de 20 vezes mais rapida-
pulmões aquando das trocas gasosas é mente do que o O2 através da membra-
igual ao seu consumo nos tecidos. A na ou tecido.

Figura 24: Fisiologia Pulmonar: Difusão

Fonte: https://ligadafisiointensiva.blogspot.com/2016/05/mecanismos-de-hipoxemia6

5.2 Gestão das trocas gasosas: O ssário conhecer a fisiologia e fisiopato-


equilíbrio hemodinâmico no cliente logia respiratória, cardíaca, renal,
com ECMO hematológica e metabólica das pesso-
as submetidas a esta técnica, mas
Para poder manusear o circuito de também é necessário entender a
suporte de vida extracorporal é nece- própria fisiologia e hemodinâmica do

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ECMO de modo a prevenir, antecipar, do o sangue circular através do circuito


diagnosticar e resolver problemas. de ECMO4.

O objetivo na gestão da fisiopatologia A PaO2 é elevada no sweep gas de


da falência cardiorrespiratória é a de forma a causar uma força maior de
manter a entrega de O2 pelo menos condução de O2 rapidamente pela
duas vezes mais o seu consumo e membrana. Os glóbulos vermelhos que
preferencialmente cinco vezes mais. entram em contacto com a membrana
do oxigenador ficam saturados de O2.
A membrana permutadora de gases Este difunde-se através do fluxo de
(oxigenador) que é semipermeável sangue aumentando a PaO2. A espes-
permite a remoção de CO2 e adição de sura da superfície da membrana pela
O2. A mesma quantidade de sangue qual o sangue passa é um fator impor-
que saiu da pessoa volta à circulação tante na entrega de O2. Esta superfície
da pessoa, através de uma veia ou é laminar o que diminui a exposição do
artéria, num circuito completamente sangue à membrana. Aumentar a taxa
fechado e estéril. Esta membrana de fluxo sanguíneo, aumentará o fluxo
consta de uma interface, isto é, consta de sangue através da superfície da
de duas faces em que numa fluí o membrana e melhorará a oxigenação.
sangue e noutra fluí o ar (interface de Desta forma, compreende-se que
difusão de gás), ambos em contracor- também é possível aumentar ou
rente. As pressões parciais do O2 e CO2 diminuir a quantidade de CO2 do
são as pressões mandatórias para a sangue ao aumentar a taxa de fluxo do
difusão em que a pressão da face sweep gas. Ou seja, ao aumentar o
gasosa é inferior à pressão da face sweep gas de O2 estamos a diminuir a
sanguínea. Quando estas pressões se concentração de CO2 na face gasosa da
invertem pode ocorrer embolia de ar. O membrana e automaticamente diminui
fluxo de gases para a membrana é a quantidade de CO2 no sangue1. Este
regulado por um fluxómetro e por um aumento da taxa de sweep gas não
misturador de gases (sweep gas) que afetará, como já mencionado, o conteú-
permite regular a fração de O2 e even- do de O2 no sangue visto que o conteú-
tualmente de CO2, consoante a neces- do de O2 do sweep gas é maior que o
sidade da pessoa3. do sangue.

O fluxo de sangue é regulado por uma O sangue oxigenado no circuito pode


bomba, usualmente bombas centrífu- ser aquecido ou arrefecido aquando da
gas que gera fluxo e pressão permitin- troca gasosa antes de ser devolvido á

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pessoa, através de uma unidade gasosas, concentração de hemoglobi-


permutadora de calor que está ligada à na e a saturação de entrada. Este
membrana permutadora de gases. Ao conjunto de fatores designados de
perceber as caraterísticas difusoras dataxa de fluxo ou fluxo avaliado (rated
membrana permutadora de gases mais flow) são a génese do funcionamento
facilmente se deteta potenciais falhas e
da membrana. Determina a quantidade
alterações no seu funcionamento. de sangue venoso que pode aumentar
Entender que a perfusão desta mem- de 75% para 95% de saturação de
brana pode ser comprometida por oxihemoglobina, num período. A entre-
coágulos no circuito de entrada, portasga de O2 deve ser adequado para total
de distribuição, fuga de sangue para a suporte (saturação sistémica maior
face gasosa, entre outros só não que 95% em VA ou superior a 80% em
diminui a difusão de O2 e CO2 como VV) com parâmetros ventilatórios e
aumenta a resistência do fluxo sanguí- FiO2 mínimos. A saturação venosa
neo. A monitorização da pressão pré deverá ser de 20-30% menor que a
membrana alerta-nos para as mudan- saturação arterial, indicando assim que
ças na resistência do fluxo sanguíneo a entrega de O2 sistémico é de 3 a 5
correlacionando com presença ou não vezes o consumo de O2. Mantendo o
de coágulos ou alterações no funciona- hematócrito superior a 40% fará com
mento da membrana. A elevação da que exista uma otimização da entrega
resistência arterial da pessoa ou nas de O2 permitindo um baixo fluxo
pressões pós membrana também se sanguíneo possível2. Posto isto, o fluxo
reflete nas mudanças de pressão pré sanguíneo é configurado para provi-
membrana1. denciar uma adequada troca gasosa e
a ventilação mecânica é reduzida a
Resumindo, a entrega de O2 é multifa- parâmetros fisiológicos, se possível.
torial. É controlada pela combinação
da oxigenação de sangue na membra- Durante o suporte de vida por ECMO é
na permutadora de gases, pelo fluxo ao recomendado pela ELSO e investiga-
longo do circuito, absorção de O2 no dores do estudo CESAR, manter o
pulmão nativo e pelo DC do coração hematócrito normal (40-45%) e as
nativo. A oxigenação na membrana concentrações de hemoglobina 12-14
dá-se devido à geometria desta, à g/dl9,10, respetivamente na hemodinâ-
espessura da sua face sanguínea, à mica da pessoa, embora não exista
mistura criada por diversos fluxos, consenso nas várias unidades/centros
FiO2, tempo de permanência dos de referência ECMO em Portugal. Caso
glóbulos vermelhos na área das trocas o valor de hemoglobina esteja abaixo

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do recomendado, há necessidade de ção são fundamentais quer dos


aumentar o fluxo sanguíneo para parâmetros analíticos quer da pessoa
atingir o fornecimento de oxigénio (perdas hemáticas visíveis nos locais
exigido, visto que a entrega de oxigé- de canulação, hematúria, perdas hemá-
nio é dependente do fluxo no circuito. ticas nas secreções, resíduo gástrico,
Sendo que o fluxo é limitado pela resis- retorragias, entre outros).
tência na cânula venosa, uma sucção
excessiva pode ser necessária para O O2 dissolvido no sangue e avaliado
aumentar esse mesmo fluxo ou equa- na gasometria arterial corresponde
cionar a necessidade de colocar mais apenas a uma pequena fração do CaO2,
uma cânula venosa. No entanto, esta sendo este quase inteiramente
sucção excessiva causa dano às composto pelas moléculas de O2 reple-
plaquetas e às células, para além do tas de hemoglobina. Alcançando-se
risco de avaria do equipamento. O uma Sat.O2 de 90-92% de Hb geral-
fluxo sanguíneo depende do volume: mente garante um CaO2 satisfatório e
para se atingir maior volume de sangue valores entre 60 a 70mmHg de PaO2
e aumentar o fluxo na bomba há são suficientes. A elevação da PaO2
tendência para administrar cristaloides pouco influencia a Sat.O2 tendo pouco
contribuindo para anemia e edema, efeito no transporte de O2. A figura 25
sendo que os riscos são maiores que os ilustra a importância da hemoglobina e
da transfusão sanguínea, que por sua da sua curva de dissociação do O2
vez, também terá o risco de coagulopa- sobre o CaO2 e, portanto, sobre a oferta
tia2. Assim, a vigilância e a monitoriza- tissular de O2.

Figura 25: Relação CaO2/Sat.O2/PaO2/Hb

Fonte: https://www.google.com/search?q=rela%C3%A7%C3%A3o+entre
+conte%C3%BAdo+de+oxig% C3%A9nio,+sat+de+oxig%C3%A9nio+pao2
+e+hemoglobina&rlz=1C1GCEU_pt8

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 77
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

A contagem de plaquetas deverá ser aumento na PaCO2 pode ser sinal de


superior a 80 000x109L e o tempo de degradação da função da membrana
coagulação mantida até ao máximo de permutadora de gases, o que é muito
200 segundos, no entanto não se raro acontecer2.
verifica consenso entre as várias
unidades/centros de referência ECMO A disfunção da membrana pode acon-
em Portugal. Um decréscimo acentua- tecer em qualquer momento, mesmo
do na saturação venosa sem outras em circuitos com pouco tempo de
alterações é normalmente causado por utilização. A sua vigilância contínua é
um aumento do consumo metabólico muito importante e para isso a monito-
que pode ser temporário (tremores, rização é fundamental.
dores, choro). Estes casos temporários,
podem ser resolvidos com analgesia, Num organismo saudável o aumento
sedação e/ou bloqueadores neuromus- do consumo (ex. febre) ou a diminuição
culares. Por outro lado, um aumento na da distribuição (ex. Hb baixa) é
saturação venosa sem outras altera- compensado através do aumento da
ções é normalmente causado pela frequência cardíaca, logo do DC,
diminuição do consumo metabólico ou mantendo assim a relação homeostáti-
início da função pulmonar do cliente. ca de 4:1.
Hipovolemia, cateteres dobrados ou
mal posicionados, pneumotórax ou De 4:1 até 2:1 o organismo compensa a
tamponamento cardíaco podem causar diminuição de oxigénio aumentando a
uma diminuição repentina na drena- extração. Com uma proporção inferior
gem de sangue. Uma diminuição a 2:1 o consumo de O2 começa a depen-
gradual na oxigenação sistémica ou um der de mecanismos anaeróbios.

Figura: 26 Relação DO2/VO2

Fonte: https://slideplayer.com.br/7

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A Saturação venosa central e mista de ↓ distribuição (↓fluxo, ↓Hb, ↓Sat.O2)



O2 (SvO2), é o melhor parâmetro para consumo (dor, ansiedade, febre)
avaliar a relação DO2/VO2, porque
reflete a extração total de oxigénio em No Quadro 4, podemos visualizar como
todo o corpo relativamente à quantida- varia a relação DO2/VO2/SvO2
de total de oxigénio disponível.
Quando a SvO2 baixa pode indicar:

Quadro 4: Relação DO2/VO2/SvO2

DO2 VO2 SvO2


↓ ↔ ↓

↑ ↔ ↑

↔ ↑ ↓

↔ ↓ ↑

↓ ↑ ↓↓↓

↑ ↑ ↔

Fonte: adaptado pelos autores

Apresentamos no Anexo 1, algumas neo, da espessura da coluna de sangue


fórmulas de cálculo que ajudam a circulante e da espessura da membra-
calcular o Teor de O2 (arterial, venoso), na.
Distribuição e Consumo de O2.
Sintetizando, os fatores que influen-
A troca de O2 que acontece no oxige- ciam a oxigenação:
nador é uma variável dependente do
fluxo sanguíneo e independente do Fluxo de sangue
fluxo de gás. A troca gasosa do CO2 • Concentração de Hb
através da membrana é uma variável • FiO2 na mistura de gases
dependente do fluxo de gás (sweep • Rated flow
gas) e da área de superfície da mem- • Superfície membrana
brana e independente do fluxo sanguí- Fatores que influenciam a remoção de

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G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

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CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
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UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
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6. Início, manutenção e
finalização do suporte
de vida extracorporal
A O circuito ECMO é composto
por uma bomba, um oxigena-
dor (Membrana permutadora
de gases), um permutador de calor,
da, o sangue é devolvido ao cliente,
usualmente pela veia jugular interna
com a sua ponta situada na aurícula
direita. Em pessoas obesas poderá ser
cânulas e um circuito extracorporal necessário um outro acesso venoso
(conjunto de tubos) para conectar o através da veia femoral para uma
dispositivo á pessoa. Em caso de melhor drenagem venosa1,2.
ECMO VA (suporte cardíaco) serão
necessárias, uma cânula venosa (aces- 6.1 Canulação
so) e uma cânula de arterial (retorno).
Esta canulação arterial normalmente é A escolha das cânulas é fundamental
feita pela artéria carotídea (mais para o ECMO funcionar de forma ideal
frequente nas crianças) ou na artéria com o mínimo de complicações possí-
femoral no caso de adultos, com o veis. Há uma infinidade de cânulas,
intuito de devolver o sangue á pessoa, classificadas de acordo com o seu
que, entretanto, foi submetido a trocas diâmetro interno, o comprimento e o
gasosas na membrana. Um outro seu tratamento. Elas são constituídas
acesso alternativo à artéria carotídea é em poliuretano biocompatível,
a artéria femoral. apresentam uma ponta de contornos
para facilitar a penetração nos vasos
Em caso ECMO VV (suporte respirató- (especialmente para a abordagem
rio), são utilizadas duas cânulas veno- percutânea), bobinas de metal para
sas (ou uma cânula de venosa que tem reforçar a cânula (de forma a prevenir o
uma saída e uma entrada). Convencio- risco de dobras kinking), uma porção
nalmente, o sangue venoso é drenado proximal rígida com uma ligação de
da pessoa a partir de uma veia de encaixe e visíveis ao controlo radiológi-
grande calibre, a mais comum, a veia co. O termo “cânula acesso” é usado
femoral14, por meio de uma bomba e, para cânula de drenagem venosa e
em seguida, é oxigenado e descarboxi- “cânula retorno” para a cânula que
lado através da membrana. Em segui- transporta o sangue oxigenado a partir

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da bomba para a pessoa (inserido quer • Percutânea (guiada ou não por


numa artéria ou numa veia, dependen- ecógrafo)
do do tipo da ECMO). As cânulas veno- • Por desbridamento
sas são geralmente mais largas e mais • Híbrida (abertura da pele para
compridas do que as cânulas visualização dos vasos e cânulação
arteriais1,4. por técnica de Seldinger)
• Transtorácica
Os locais de punção para a canulação
variam consoante a modalidade de As cânulas de acesso a utilizar, devem
suporte, a idade da pessoa e da sua possuir um maior lúmen e um menor
superfície corporal1. Os locais de comprimento possível, permitindo os
punção mais utilizados são4,5,11: seguintes fluxos mínimos:
VenoVenoso: • 100 – 120 ml/Kg/min – recém-nasci-
• Veia Jugular Interna Veia Femoral dos

• Veia Femoral Veia Jugular Interna • 80 – 100 ml/Kg/min – crianças


↑ ↑

• Veia Femoral Veia Femoral • 60 – 80 ml/Kg/min – adultos


• Veia Jugular Interna Veia Jugular

Interna (Cânula duplo lúmen – mais O recurso à ecocardiografia é impor-


comum em pediatria) tante para avaliar a função ventricular
VenoArterial: esquerda e direita, assim como, descar-
• Veia Jugular Interna Artéria tar contraindicações para ECMO VA,

Femoral como por exemplo, regurgitação aórti-


• Veia Femoral Artéria Femoral ca grave, entre outras. A ecografia

(unilateral ou bilateral) também é importante para avaliar o


• Veia Jugular Interna Carótida diâmetro dos vasos para selecionar o

(mais comum em pediatria) tamanho das cânulas e evitar lesões


• Aurícula direita Arco aórtico relacionadas com a canulação2,6.

(transtorácica pós-cardiotomia)
Deve-se recorrer à ecografia em tempo
A técnica de colocação é escolhida pelo real para a canulação, sobretudo para a
clínico e depende da situação da punção da artéria superficial de forma
pessoa, dos recursos existentes1,2,4,5,11 e a ser puncionada em segurança. Poste-
pode ser: riormente à canulação, é importante

14
Devido a acontecimentos de recirculação e com o desenvolvimento de cânulas maiores quer em comprimento quer em
largura com paredes estreitas e fenestradas, constatou-se um método preferencial no acesso venoso de drenagem que é a veia
femoral e infusão pela veia jugular interna, permitindo altas taxas de fluxo com recirculação mínima3.

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avaliar a localização das cânulas (pon- necessidade advém da possível disten-


tas) para despistar um posicionamento são desta câmara pela acumulação do
incorreto no ventrículo direito ou junto sangue proveniente da circulação
ao septo interauricular, assim como, nativa da pessoa (pulmão), que pode
evitar recirculação pela proximidade ser residual ou numa quantidade signi-
das cânulas de acesso e retorno na ficativa. Isto porque a canulação da
ECMO VV6. artéria femoral fornece suporte hemo-
dinâmico, mas a entrega de sangue
Na modalidade ECMO VA pode ser oxigenado para o arco aórtico e
necessária a colocação de uma terceira artérias coronárias pode ser compro-
cânula na aurícula esquerda ou numa metido na presença de insuficiência
das veias pulmonares com o objetivo respiratória com DC nativo significati-
de drenar o sangue desta aurícula. Esta vo.

Figura 27: Modo de suporte VenoArterial -Venosa (VA-V)

Fonte: https://www.getinge.com3

No entanto, devido à baixa contractili- sangue este que por sua vez provém
dade do miocárdio, o sangue fica do pulmão da pessoa e mudando
estagnado levando à formação de assim, o modo de suporte a VA-V,13.
coágulos e à distensão e disfunção da
aurícula esquerda, atrasando deste Nesta mesma modalidade (ECMO VA),
modo a recuperação da função. Neste caso a cânula de acesso seja inserida
caso a terceira cânula fica ligada em Y na femoral e se o fluxo arterial distal
à cânula venosa para onde drena o para o membro inferior é inadequado,
sangue existente na aurícula esquerda, deve ser colocada uma linha de reper-

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reperfusão (cateter/introdutor 6 - 8 Fr) dimentos técnicos, preparação da


em posição próximo-distal na artéria mesa cirúrgica, posicionamento
femoral superficial por dissecação adequado da pessoa e área envolvente
direta ou na artéria tibial posterior, livre de objetos desnecessários, livre
para perfusão retrógrada de forma a de ruído e interferências capaz de
reduzir o risco de isquemia do mem- proporcionar um ambiente facilitador
bro1,2,5,13. dos mais altos níveis de concentração9.

Toda a equipa trabalha em sintonia no No quadro abaixo, estão mencionadas


sentido de garantir uma correta avalia- as ações/observações desde a canula-
ção da pessoa, condições de segurança ção ao início do suporte ECMO1,9,11.
para a canulação, verificação de proce-

Quadro 5: Ações/orientações da canulação ao início do suporte ECMO

Ação/Orientação Justificação
Identificar o cliente Gestão risco e segurança
Explicar á pessoa todos os procedimentos
(se aplicável) Tranquilizar a pessoa

Informar/apoiar a família Tranquilizar a pessoa/família

Obter consentimento informado


(se possível)
Proceder à higiene das mãos Prevenção de IACS

Reunir os recursos humanos e materiais Gestão de tempo


necessários (ver Anexo 2)
Monitorização contínua de sinais vitais Obtenção de valores de referência

Analgesiar e sedar a pessoa (segundo Promoção do conforto do cliente


indicação médica)
Curarizar a pessoa (segundo indicação Prevenção de complicações associadas à
médica) entrada de ar no sistema vascular da
pessoa aquando da canulação (Ver
capítulo 7)

Preparar a mesa cirúrgica (ver Anexo 2) Gestão do tempo

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Ação/Orientação Justificação

Administrar um bólus de heparina 50-100


U/Kg não fracionada, dependendo do peso
da pessoa no momento anterior à Prevenção de formação de coágulos
dilatação do primeiro vaso quando já se
encontra(m) o(s) vaso(s) submetido(s)
com o(s) fio(s) guia introduzido(s)
Assistir a equipa médica no procedi-
mento de canulação Gestão de tempo

Preparar o circuito ECMO/ECLS


Alguns centros de ECMO em Portugal, os
circuitos já se encontram preparados e
preenchidos antes do procedimento ser
iniciado
Apenas nas situações pediátricas, a Gestão de tempo
preparação final do circuito é realizada
muito perto do momento de conexão com
o preenchimento de solução priming (ver
ponto 6.2)
Assistir a equipa médica na conexão das
cânulas ao circuito extracorporal.
Utilizar uma seringa de 50 ou 60ml pré-
cheia de solução salina para limpar o ar Gestão do tempo
residual das cânulas e do circuito ECLS
antes de conectar
Prevenção de deslocação/exteriorização
Fixar as cânulas e as linhas das cânulas
Prevenção de complicações/recirculação
Realizar um Rx e/ou ecocardiografia para
verificar/confirmar o posicionamento das (ECMO VV)
cânulas (Ver capítulo 7)

Executar tratamento nos locais de inserção


das cânulas (ver quadro 9 no subcapítulo
6.3) Prevenção de IACS

Vigiar e monitorizar continuamente os Avaliar estado hemodinâmico do cliente


sinais vitais.

Efetuar registo

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6.2 Priming do circuito percentagem do seu peso e nesta


situação a adição da heparina é muito
O circuito ECLS é estéril, descartável, importante2. Posteriormente é adicio-
composto por tubos de PVC e silicone, nado cálcio para substituir o cálcio
componentes atóxicos, conectores em ligado ao citrato no sangue e caso seja
Policarbonato, protetores em Vinil possível, deve-se verificar a composi-
Plastisol e com um diâmetro interno ção do eletrólito e cálcio ionizado antes
variável dependendo da pessoa8. O de iniciar o suporte ECMO1,2.
circuito tem um tratamento de superfí-
cie de forma a reduzir a coagulação Priming com sangue
sendo preparado em condições esteri- Por cada unidade de Concentrado
lizadas com uma solução de eletrólitos Eritrocitário (CE) (fresco < 5 dias)
isotónicos semelhante ao fluído extra- acrescentar:
celular normal. O objetivo do priming é • 50-100U de heparina
fazer circular a solução de eletrólitos • 50ml de Albumina 20%
isotónicos esterilizada em todo o • 50ml de Plasma Fresco Congelado
circuito fechado até que todas as • 10-15 mEq NaHCO3 (Bicarbonato de
bolhas de ar sejam removidas2. Sódio 8,4%)
• 4-5 mg ClCa2 (Cloreto de Cálcio 10%)
O circuito pode ser preparado no ou 300mg C12H22CaO14 (Gluconato
momento da sua utilização, ou dias de Cálcio 10%)
antes. Não é recomendado usar um - Com o sangue a recircular colocar a
circuito com a realização do priming há fonte de O2 com FiO2 a 100% a 2 L/m
mais de 30 dias. durante 2–3 min e retira-se de seguida
a fonte de O2. No caso de ultrapassar o
Em alguns centros de ECMO, acrescen- tempo preconizado existo o risco de
tam à solução salina, albumina (100ml) resultar uma PaCO2 baixa.
e heparina (100U). A heparina tem a - Após 20 minutos em recirculação
função de anticoagulante e a adição de colher uma amostra de sangue para
albumina serve para “revestir” a super- determinação dos gases.
fície interna do circuito e adicionar um
componente oncótico1,2. Abaixo apresentamos os parâmetros e
os valores de referência da gasometria.
Nas crianças com menos de 40 Kg • pO2: 500 mmHg
deve-se fazer priming com sangue • pCO2: 35 – 50 mmHg
porque o volume para preencher o • Na+: 136 mEq/L
circuito corresponde a uma grande • K+: 3,5 – 6 mEq/L

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• Ht: 40 – 45 % • 5,0 (adulto): 585 ml (Membrana: 250


• Ca++: 1,0 – 1,2 mmol/L ml)
- Corrigir os desequilíbrios e repetir
avaliação até atingir os valores preten- HLS Set:
didos • 2,8 (pediátrico): 247 ml
- Uma solução de priming equilibrada • 5,0 (adulto): 570 ml
vai reduzir a ocorrência de alterações • 7,0 (adulto): 600 ml
fisiológicas importantes na pessoa
aquando do contacto com o sangue. Fluxos máximos dos circuitos:
• 3/16’’ (neonatal): 1,2 L/min
No caso de substituição do circuito em • 1/4’’ (pediátrico): 2,5 L/min
pediatria, devemos reduzir o sweep • 3/8’’ (pediátrico / adulto): 5 L/min
gas para metade no momento da troca • 1/2’’ (adulto): 10 L/min
e avaliar posteriormente os gases do
sangue arterial da pessoa e reajustar 6.3 Início, estabilização e
os parâmetros. manutenção da circulação
sanguínea extracorporal
Abaixo são apresentados os volumes
do priming e fluxos máximos dos O início do suporte ECMO ocorre após
circuitos8: a canulação e conexão do circuito
Volumes de priming dos circuitos ECLS às cânulas. O quadro 6 e 7
PLS Set: descrevem as ações/orientações para o
• 2,8 (pediátrico): 350 ml (Membrana: início do suporte ECMO VV e ECMO
81 ml) VA1,2,13.

Quadro 6: Ações/orientações para o início do suporte ECMO VV

Ação/Orientação Justificação
Iniciar o suporte lentamente:

Começar com 20 ml/Kg/min Prevenção de complicações (Ver capítulo 7)

Aumentar o fluxo de sangue, a cada 10-15 Prevenção de complicações (Ver capítulo 7)


min até atingir o fluxo máximo possível
(resistência das cânulas e tolerância da
pessoa).
Registar o valor de fluxo máximo permitido Obtenção do valor de fluxo máximo que
pelas cânulas e pela pessoa (tolerância se pode atingir em caso de necessidade.
hemodinâmica).

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Ação/Orientação Justificação
Baixar o fluxo lentamente até atingir o
valor mínimo necessário à adequação do
suporte, ou seja, Sat.O2 arterial > 85% e
SvO2 > 60%
Obtenção de nível de suporte ideal.
Nota: os valores de Sat.O2 arterial e SvO2
referem-se á pessoa com parâmetros
ventilatórios de repouso.

Colocar o fluxo de O2 numa relação de 1:1


com o fluxo de sangue (1L de O2 para cada Promoção da oxigenação dos tecidos.
litro de sangue)

Fonte: Adaptado pelos autores

Quadro 7: Ações/orientações para o início do suporte ECMO VA

Ação/Orientação Justificação
Iniciar o suporte

Começar com 20 ml/Kg/min Prevenção de complicações (Ver capítulo 7)

Aumentar o fluxo de sangue, a cada 20- Prevenção de complicações (evita


30 min até atingir o fluxo máximo alterações bruscas no preload e afterload
possível (resistência das cânulas e que podem provocar myocardial stun)
tolerância da pessoa). assegurando a mistura gradual do sangue
com alto teor de oxigénio com o sangue
muito pobre em oxigénio.
Prevenção de complicações
(Ver capítulo 7)

Registar o valor de fluxo máximo permitido Obtenção do valor de fluxo máximo que
pelas cânulas e pela pessoa (tolerância se pode atingir em caso de necessidade.
hemodinâmica).

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Ação/Orientação Justificação

Baixar o fluxo lentamente até atingir o Obtenção de nível de suporte ideal.


valor mínimo necessário à adequação do
suporte, ou seja, Pressão Arterial de Pulso
(PAP) ≥ 10 mmHg (PAP = Pressão Arterial
sistólica – Pressão Arterial diastólica),
Sat.O2 arterial > 95% e SvO2 > 70%
Nota: os valores de Sat.O2 arterial e SvO2
referem-se á pessoa com parâmetros
ventilatórios de repouso.

Colocar o fluxo de O2 numa relação de 1:1


com o fluxo de sangue (1L de O2 para cada Promoção da oxigenação dos tecidos.
litro de sangue)

Fonte: Adaptado pelos autores

Ventilação e trocas gasosas Normalmente incluem2,12:


• Volume corrente (< 6 ml/Kg)
Durante a canulação das pessoas, o • Pressão de Plateau (Pplat), baixa (<
parâmetro da FiO2 do ventilador deve 30 cmH2O)
estar nos 100%. No início do suporte de • PEEP (5 – 15 cmH2O)
ECMO, é possível após alguns minutos • FiO2 baixo (< 40%, idealmente 21%)
dar início à redução de parâmetros • Aumento do tempo inspiratório (I:E =
ventilatórios, consoante a tolerância 2:1)
(ECMO VV) ou mesmo reduzir rapida- • FR baixa (< 10 respirações por
mente (ECMO VA), valores esses que minuto)
permitam o descanso e recuperação
pulmonar (parâmetros de repouso)2,12. Cada pessoa é única, mas o algoritmo
No caso de a pessoa estar consciente e na gestão da ventilação de repouso12 é
acordado em suporte ECMO VA, ou o que se pode visualizar no quadro 8.
seja, com suporte cardíaco, mas com
função pulmonar adequada, este pode
ser extubado e ficar em respiração
espontânea2.

Os parâmetros ventilatórios de repou-


so variam de serviço para serviço ou de
centro para centro de suporte ECMO.

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Quadro 8: Algoritmo da Ventilação de Repouso

Primeiras 24h 24h a 48h Após 48h


Modalidade Ventilatória Pressão controlada

Volume Corrente ≤6 ml/kg ≤ 6 ml/kg ≤ 6 ml/kg


Pressão de Plateau ≤ 25 cmH2O ≤ 25 cmH2O ≤ 25 cmH2O
10 - 20 cmH2O 0 - 20 cmH2O reduzir até 10
PEEP (Usualmente = (Usualmente = cmH2O se
15 cmH2O) 10 cmH2O) possível

FiO2 ≤ 0.40 ≤ 0.40 ≤ 0.40


Relação I:E 2:1 2:1 1:1
Frequência Respiratória 5 - 10 respirações 10 - 15 respirações 10 - 15 respirações
(FR) por minuto por minuto por minuto

Fonte: Adaptado pelos autores

Assim que a pessoa reúna condições coronárias.


(trocas gasosas adequadas e hemodi- Esta inadequação das trocas gasosas,
namicamente estável), deve ser deve-se ao facto do CO2 a nível da
colocado em parâmetros de ventilação membrana permutadora de gases ser
espontânea (CPAP 10 – 20 cm H2O) superior à troca de O2 sendo controla-
dado que estas modalidades aceleram da através do fluxo de O2 entregue à
a recuperação pulmonar até ser membrana13.
extubado.
Assim, para aumentar a PaO2 deve-se:
No caso de as trocas gasosas serem Aumentar o fluxo de sangue até ao
inadequadas [Sat.O2 arterial < 95% valor máximo permitido
(ECMO VA); Sat.O2 arterial < 85% Se mantiver hipoxemia refratária à
(ECMO VV); PaCO2 > 40%], com os medida anteriormente instituída:
parâmetros de repouso (Ventilador), • Aumentar FiO2 até atingir objetivo;
deve-se aumentar as trocas gasosas a Caso se mantenha hipoxemia:
nível do suporte ECMO e não subir os • Realizar recrutamento alveolar;
parâmetros ventilatórios, embora na • Aumentar a PEEP;
modalidade ECMO VA possa ser neces- • Prone Position;
sário proporcionar um suporte ventila- • Broncofibroscopia, entre outros.
tório para garantir a oxigenação das

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Já para diminuir a PaCO2 deve-se: diastólica, deixam de ser um parâmetro


- Aumentar o débito de O2 (L/M) no representativo do suporte circulató-
sistema, diminuindo-se este mesmo rio13.
débito de O2 caso a PaCO2 esteja baixa.
As pessoas em suporte ECMO VV não
Na presença de hipercapnia, a PaCO2 têm apoio hemodinâmico direto forne-
deve ser reduzida lentamente de modo cido pelo circuito extracorporal. A
a evitar uma possível lesão neurológi- pessoa depende da sua própria hemo-
ca. No adulto deve-se aumentar o fluxo dinâmica fisiológica. Para isso, deve-se
de O2 no máximo 1L de cada vez e nos adequar inotrópicos, vasodilatadores e
recém-nascidos nunca ultrapassar os expansores de volume de sangue para
0,1L por cada aumento de fluxo de controlar a tensão arterial, contratilida-
O21,2,12. de cardíaca e resistências vasculares. O
ecocardiograma é uma excelente ferra-
Numa emergência, em que existe menta para avaliar a função hemodinâ-
necessidade de interromper o suporte mica e de gestão durante ECMO VV. As
circulatório extracorporal, recomenda- arritmias podem ser frequentes na
-se que o ventilador se coloque imedia- primeira hora por alterações na
tamente nos seguintes parâmetros concentração de iões, como, o cálcio, o
ventilatórios: potássio, entre outros. Se ocorrer uma
• FiO2: 100% falha cardíaca da pessoa durante
• FR: 20 a 30 respirações por minuto ECMO VV pode-se converter para
• Pressão de Pico: 40 cmH2O ECMO VA, adicionando um acesso
• PEEP: 10 cmH2O arterial para a artéria femoral ou
subclávia2,12,13.
Hemodinâmica
O suporte de ECMO é um dispositivo Relativamente ás pessoas em suporte
não pulsátil e gera um fluxo laminar. ECMO VA, têm pouca qualidade ou
Um aspeto importante a considerar diz ausência de pulsatilidade do coração e
respeito à bomba centrífuga do circui- a sua gestão hemodinâmica depende
to extracorporal, componente que do fluxo sanguíneo (DC nativo e do
coloca o sangue em movimento. Uma fluxo da bomba ECLS) e das resistên-
vez que esta bomba não possui um cias vasculares (diminui o preload e
funcionamento pulsátil, o fluxo que aumenta o afterload)2. Se a pressão de
dela provém é contínuo e consequen- perfusão sistémica é inadequada (dire-
temente, a linha arterial perde amplitu- tamente afetada pelas alterações no
de e as pressões arteriais, sistólica e fluxo) a pressão pode ser aumentada

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pela administração de sangue ou de • PAM neonatal: 40 – 50 mmHg


baixas doses de vasoativos. • PAM pediátrica: 50 – 70 mmHg
• PAM adulto: 50 – 70 mmHg
Mesmo com uma Pressão Arterial
Média (PAM), baixa, a perfusão sisté- Assim, a gestão hemodinâmica da
mica pode ser completamente adequa- pessoa com suporte ECMO VA é feita
da, para isso, o SvO2 pode ser usado através do fluxo da bomba e das resis-
para esta gestão hemodinâmica2. tências vasculares. Para aumentar a
PAM pode-se proceder da seguinte
A recuperação de uma pressão arterial forma2:
pulsátil é um dos sinais de melhora da 1. Aumentar o fluxo de bomba de
função ventricular esquerda. A PAM sangue (a curva da linha arterial vai
passa assim a ser o parâmetro de ficando mais achatada, mas PAM )
referência do estado hemodinâmico 2. Administrar expansores de volume ↑ ↑↑
e da perfusão tecidular, sendo os seus 3. Administrar vasoativos/inotrópicos
valores de referência os seguintes2,13:

Figura 28: Reflexo da curva da linha arterial ao aumentar o fluxo


de bomba de sangue no suporte ECMO

Fonte: Adaptado pelos autores

Com este suporte ECMO VA pretende- Em pessoas em ECMO VA após cirurgia


-se atingir os seguintes objetivos16: cardíaca, por vezes, é complexo o
•Suporte do coração do lado direito equilíbrio entre hipovolemia e a fluido-
• Suporte do coração do lado esquerdo terapia administrada. Ocasionalmente,
• Suporte da perfusão sistémica estas pessoas apresentam hemorra-
• Suporte da oxigenação sistémica gias maciças e ao repor líquidos para
equilíbrio da hipovolemia, de forma a

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minimizar as variações de fluxo do do (ACT), método que avalia em


suporte ECMO VA, podem desenvolver segundos a formação de coágulos no
edema agudo do pulmão. Em alguns sangue em resposta a um reagente de
casos para evitar o edema agudo do ativação da fibrina5, embora com consi-
pulmão, pode ser inserido um balão derável variabilidade devido aos
intra-aórtio, neste caso, a linha arterial diferentes dispositivos comercializa-
vai recuperar a pulsatilidade devido à dos10.
presença do balão.
O doseamento da heparina deve ser
Para avaliar se a pulsatilidade é devido inicialmente a cada 15-30 minutos e
ao balão ou ao coração da pessoa, após a sua estabilização deve ser
esvaziamos o balão durante alguns avaliado de hora a hora. Posteriormen-
segundos e observamos a repercussão te, deve ser avaliado com intervalos
da linha arterial, no caso de apresentar mais alargados consoante os centros
traçado achatado ou ausência de onda de suporte ECMO. A perfusão de hepa-
é porque o coração nativo ainda não rina deve ser iniciada a uma velocidade
recuperou13. mínima entre 10 - 15 U/Kg/h ao máximo
de 40 - 60 U/Kg/h e posteriormente
Anticoagulação ajustada consoante o resultado do
Devido ao contato do sangue com uma ACT (até ao máximo de 200 segun-
superfície não-endotelial (artificial) dos)10, embora estes valores são adap-
torna-se necessário proceder a uma tados por cada centro ou serviço com
anticoagulação de modo a inibir a ação suporte ECMO, dependendo do tipo de
plaquetária e a ativação de respetiva pessoa, circuito de ECLS, entre outros.
cascata de coagulação. No entanto,
esta anticoagulação deve permitir uma Deve-se também ter em conta outros
atividade pró-coagulante suficiente de aspetos que podem alterar a necessi-
forma a prevenir hemorragias. A perfu- dade de heparina para manter o ACT
são de heparina fracionada (25000U + dentro dos valores recomendados2,10,25:
45 ml de soro fisiológico; 500U/ml) é a • Débito urinário alto, hemofiltração ou
escolha habitual, salvo situações de administração de plaquetas aumentam
incompatibilidade ou trombocitopenia a necessidade de heparina.
induzida pela heparina10. • Débito urinário baixo/oligúria diminui
a necessidade de heparina.
Depois de estabilizado o fluxo, deve-se
avaliar o Tempo de Coagulação Ativa- O Tempo de Tromboplastina Parcial

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ativado (aPTT) é o tempo (em segun- A concentração de heparina no sangue


dos) e constitui um método convencio- também poderá ser avaliada através
nal de doseamento in vitro na forma- de outros procedimentos ou através de
ção de coágulos em resposta a um outras medições, tais como, anti-fac-
reagente de ativação da fibrina combi- tor Xa, Tromboelastografia (TEG),
nado com cálcio. Nível de antitrombina (AT3), HITT10.

O aPTT é mais vantajoso do que o ACT Sedação


porque pode ser avaliado em laborató- As pessoas em suporte ECMO, são
rio. No entanto, é menos fiável do que o
cada vez mais precocemente acorda-
ACT porque é medido no plasma e dos e extubados13. Embora devam ser
plaquetas, e as células de sangue sedados para a canulação e por vezes
podem afetar a atividade da heparina. curarizados, devem manter uma perfu-
Os valores de referência são10: são contínua durante as primeiras 12 a
• 50-60 - normal 24 horas. O objetivo é evitar a respira-
• > 60 segundos - risco de hemorragia. ção espontânea do cliente durante a
canulação ou assincronia com o venti-
A perfusão de heparina deve ser dose- lador, diminuir o metabolismo até ao
ada para se obter uma razão entre nível basal, evitar o desconforto inicial
aPPT5,10 de: do cliente e ainda prevenir movimenta-
• 1,8 e 2 vezes o nível normal para ções e deslocações das cânulas2,13.
pessoas ECMO VA, dependendo da sua
condição cardíaca Posteriormente, assim que a pessoa
• 1,5 e 1,8 vezes o nível normal para apresente estabilidade hemodinâmica
pessoas ECMO VV em ECLS, todas as drogas (sedativos e
• 2 e 2,2 vezes o nível normal para curarizantes) devem ser interrompidos
circuitos de ECMO com mais de duas o mais precoce possível para permitir
cânulas como VA-V. um exame neurológico completo da
pessoa. O ideal é que se apresente
No entanto, as pessoas em ECLS são acordado o suficiente para interagir
específicos e não há nenhuma dose com a família e com os profissionais de
padrão de heparina. Se a pessoa saúde e de preferência em respiração
apresenta trombocitopenia, lesão renal espontânea. A sedação poderá ser
ou degradação da fibrina na circulação retomada, dependendo do nível de
pode não ser necessário perfusão de ansiedade e desconforto da pessoa,
heparina ou uma pequena quantidade embora a analgesia eficaz, as medidas
em perfusão5. de conforto e o controlo da ansiedade

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e desconforto do cliente, embora a como, o propofol, midazolam e opiói-


analgesia eficaz, as medidas de confor- des, entre outros2,13.
to e o controlo da ansiedade possam
dispensar o uso de sedação13. No caso de pessoas em suporte ECMO
VA, eles podem ser acordados após a
A principal razão para sedação durante canulação e estabilização do suporte
o suporte ECMO VV é permitir a ECMO. Aliás, alguns serviços ou
intubação endotraqueal e a realização centros de referência em pessoas
da traqueotomia que deve ser conside- extubados apenas administram anes-
rada no início em pessoas com mais de tésicos locais para a cânulação13,16.
5 anos de idade de forma a permitir a
redução e até mesmo a suspensão da Relativamente à monitorização da
sedação2. A sedação deve ser mínima, agitação-sedação nas pessoas em
mas é importante assegurar que não suporte ECMO, recorre-se à aplicação
ocorram episódios de remoção aciden- da Richmond Agitação-Sedação Score
tal de cânulas e dispositivos invasivos (RASS), Quadro 9, de forma a gerir a
ou oclusão da linha de perfusão. Outra sedação, em que o normal é que a
razão, para minimizar ou mesmo pessoa apresente uma pontuação
suspender a sedação, é porque as entre -1 e 0 e à Confusion Assessment
membranas do oxigenador retêm e Method for the ICU (CAM-‐ICU) para
alteram a farmacocinética e a farmaco- avaliar a agitação-delirium da
dinâmica de analgésicos e sedativos pessoa2,12,13,14.

Quadro 9: Richmond Agitation Sedation Scale - RASS

Fonte: Ely E.; Truman B; Shintani A; et al. (2003)19

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O Delirium é uma síndrome confusional ção mecânica13,14.


agudo com grande impacto na morbili-
dade e mortalidade que pode apresen- Assim, recomenda-se que após início
tar diversas causas, podendo ser de suporte ECMO, se faça a gestão da
devido a intoxicação, suspensão de analgosedação e agitação conforme
substâncias ou doença médica geral, protocolo em cada serviço e/ou centro
apresentando na maioria das vezes de referência.
uma origem multifatorial14. É uma
situação clínica que as pessoas numa Em suma, o suporte ECMO é complexo
Unidade de Cuidados Intensivos (UCI) e requer uma gestão precisa, completa
apresentam com elevada prevalência. e contínua. No quadro 10, estão descri-
tas as ações/orientações na manuten-
Desta forma, é importante prevenir o ção da pessoa em suporte ECMO.
mais precocemente esta situação
clínica, de modo a obter melhores A monitorização contínua da pessoa
cuidados de saúde. Para a sua identifi- em suporte ECMO é semelhante a
cação têm surgido várias escalas de qualquer outra pessoa em situação
avaliação, sendo a CAM‐ ICU, ver critica internado numa UCI, incluindo a
Anexo 3, a que mostra melhor evidên- vigilância continua do equipamento e
cia, sobretudo em pessoas em ventila- tudo que seja inerente à ECMO13.

Quadro 10: Manutenção da Pessoa em Suporte ECMO

Ação/Orientação Justificação

Vigiar e monitorizar continuamente os sinais


Avaliação do estado hemodinâmico
vitais.
Despiste de complicações (Ver capítulo 7)
Registar sinais vitais de 1/1h

Confirmação dos parâmetros do suporte


Avaliar e registar de 1/1 hora o fluxo de sangue,
Deteção precoce e prevenção de complicações
a velocidade da bomba, o FiO2 e o fluxo de ar da
(Ver capítulo 7)
fonte ligada ao ECMO
Construção de um mapa de tendências

Pesquisar de 2/2 horas, com uma luz (foco), a Deteção precoce e prevenção de complicações
presença de coágulos, fibrina ou ar no sistema (Ver capítulo 7)

Pesquisar de 2/2 horas uma possível perda de Deteção precoce e prevenção de complicações
líquido na membrana permutadora de gases (Ver capítulo 7)

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Ação/Orientação Justificação

Avaliar ACT de acordo com protocolo existente Prevenção de complicações (Ver capítulo 7)

Reajustar perfusão de heparina consoante


Manutenção de valores ideais de ACT
protocolo existente
Verificar 1 vez por turno a temperatura do
Deteção precoce e prevenção de complicações
permutador de calor
Monitorizar coloração das linhas de acesso e
Deteção precoce e prevenção de complicações
retorno

Verificar posicionamento das cânulas Deteção precoce e prevenção de complicações

Garantir fixação adequada das cânulas e das


Prevenção de complicações (Ver capítulo 7)
linhas
Garantir o posicionamento do equipamento
Prevenção de complicações (ex. cavitação de ar)
abaixo do nível da pessoa
Garantir a disponibilidade constante de 4 Gestão de tempo em caso de
clampes metálicos urgência/emergência
Garantir a presença e funcionamento da bomba Gestão de tempo em caso de
manual de urgência urgência/emergência
Gestão de tempo em caso de
Garantir a presença de um circuito adicional
urgência/emergência

Garantir a presença e funcionamento da fonte de Gestão de tempo em caso de


energia de reserva urgência/emergência

Garantir acesso fácil e rápido a material de Gestão de tempo em caso de


reanimação urgência/emergência

Realizar tratamento aos locais de inserção das cânulas:

Não levantar o penso antes das primeiras 48


horas, exceto se visivelmente sujo, descolado ou Prevenção de IACS
saturado

Substituir penso de 2/2 dias Prevenção de IACS

Realizar o penso com ajuda de outro profissional


(médico ou enfermeiro) de modo a que um dos Prevenção de complicações (Ver capítulo 7)
elementos mantenha a fixação das cânulas

Utilizar como solução desinfetante Clorexidina


Prevenção de IACS
2%
Não utilizar Iodopovidona ou acetona nas
Prevenção de complicações (Ver capítulo 7)
cânulas

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Ação/Orientação Justificação

Desinfetar a pele em círculos no sentido


próximo-distal até 10cm de raio. Posteriormente
desinfetar as cânulas, igualmente no sentido Prevenção de IACS
próximo-distal, até 10 cm de distância desde a
sua inserção

Proteger a pele do contacto direto com as


Prevenção de zonas / úlceras de pressão
cânulas
Aplicar penso sem compressa nos locais de
Prevenção de IACS
inserção das cânulas e vigiar

Colher amostra de sangue para gasometria pré Avaliação do estado da membrana permutadora
e pós-membrana permutadora de gases, pelo de gases
menos uma vez/dia Avaliação da adequação de suporte

Colher amostra de sangue para gasometria


Gestão do suporte
arterial e venosa pelo menos uma vez/turno

Efetuar registos

Fonte: Adaptado pelos autores

6.4 Desmame e triall-off respiratórios e ventilatórios sem


Suporte ECMO, pelo menos durante 2h.
O desmame do suporte ECMO deve ser
iniciado assim que haja resolução de Os sinais de recuperação pulmonar são
alguns dos seguintes critérios: rever- geralmente indicados pelo suporte
são da doença aguda, melhoria da ECMO, ao reduzir as trocas gasosas e o
função de órgão (lesão renal, lesão fluxo de forma a manter Sat.O2 e PaCO2
hepática, lesão do musculo cardíaco), aceitáveis, melhoria da radiografia de
valores da coagulação, parâmetros e tórax e aumento de volumes correntes,
valores da gasometria, neste caso com a pessoa apresenta critérios e condi-
PaO2 ≥ 80mmHg com FiO2 < 50% ou ções para o desmame do suporte
PaO2/FiO2 > 200; pH > 7.30 por perío- ECMO15.
dos > 12 horas15.
Com base nas orientações ELSO de
Caso se verifiquem os critérios acima 2017, quando o suporte ECMO é < 30%
referidos devemos iniciar o desmame do total (coração nativo e/ou função
do suporte ECMO, programando os pulmonar), pode ser adequada o
parâmetros do ventilador (FiO2 ≤ 50%, desmame do suporte ECMO. No caso
PEEP ≤ 10 cmH2O, FR ≤ 20 respirações do suporte ser >30% a 50%, não existe
por minuto) para atingir objetivos indicação para desmame do suporte,

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exceto em alguns casos especiais, tais na pessoa nas 24 horas seguintes, após
como, hemorragia descontrolada2. lavagem das mesmas com solução
salina e heparina. Caso seja necessário
No desmame do ECMO VV em o reinício do suporte ECMO deve-se
adultos, deve-se diminuir o fluxo da colocar novo circuito, se não existirem
bomba de sangue, 1 L/min com o FiO2 dúvidas sobre a necessidade do
de 100% ou diminuir o fluxo da bomba reinício do ECLS, é recomendado remo-
de sangue 2 L/min com diminuição do ver as cânulas após desmame do
FiO2 de forma a obter Sat.O2 > 95%. Se suporte ECMO2.
for mantido o fluxo ideal mínimo
suficiente para garantir um suporte No desmame da ECMO VV, geralmente
adequado, o desmame vai sendo o ventilador é programado com
realizado naturalmente13. Nestes casos parâmetros moderados de suporte
devemos ter cuidado com o risco de mecânico, como descritos :
15

formação de coágulos no circuito • Volume corrente 6 ml/kg,


• Pplat <30 cmH2O
devido à diminuição dos fluxos. A • PEEP 5-12 cmH2O
ausência de trocas gasosas do ECMO • FiO2 < 0.6
minimiza a sua formação15.
O suporte ECMO pode ser retirado no
Nestes casos, a função cardíaca é caso de15:
adequada, apenas a função respirató- • PaO2 > 60 mmHg
ria (trocas gasosas) é testada. Assim, • Sat.O2 > 90%
• FiO2 do ventilador <60%
deve-se ajustar os parâmetros do • Pplat < 30cmH2O
ventilador de forma a que se consiga • Ecocardiografia não revela sinais de
desligar as trocas gasosas no ECLS insuficiência cardíaca direita (1-12 h).
(este procedimento não poderá ser
realizado no suporte ECMO VA uma Relativamente ao suporte ECMO VA
vez que pode gerar um shunt venoar- não existe consenso entre os centros
terial da direita para a esquerda) de suporte ECMO em relação à forma
embora mantendo o fluxo de sangue e de gerir o seu desmame. A diminuição
anticoagulação. Se a função pulmonar das doses de infusão de vasoativos, a
é adequada numa hora ou mais é recuperação de uma pressão arterial
porque a pessoa reúne critérios para a de pulso e recuperação da função do
descanulação. miocárdio avaliada através da ecocar-
diografia são indícios que a pessoa
Em alguns casos, o circuito ECLS pode pode iniciar o desmame do suporte
ser retirado, mas mantidas as cânulas ECMO VA26.

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O algoritmo que se apresenta abaixo menor possível (> 2,5 L/min para evitar
serve para gerir o desmame ECMO VA a coagulação do circuito)
com dois critérios que são realizados
concomitantemente, são eles7,16,17,18: Esta última abordagem pode acelerar o
- função cardíaca adequada com níveis processo de desmame, no entanto, não
aceitáveis de agentes vasoativos é a mais adequada para o desmame da
(desmame do suporte circulatório). falência do ventrículo direito.
- função pulmonar adequada (desma-
me do suporte pulmonar). Desmame do suporte pulmonar
Em alguns serviços ou centros com
Desmame do suporte circulatório suporte ECMO, pode-se realizar o
Podem ser usadas duas abordagens: desmame através das seguintes
1. Redução do fluxo de sangue extra- opções:
corporal (recomenda-se ≥ 1 L/min) Opção 1: Reduzir progressivamente a
- Monitorização hemodinâmica com FiO2 do misturador até ser possível a
vasoativos e avaliação da função cardí- oxigenação da pessoa apenas com a
aca por ecocardiograma (contratilida- ventilação. Manter o fluxo de sangue.
de cardíaca) Opção 2: Suspender de imediato fluxo
• Se hemodinamicamente estável de gás do misturador, verificando se é

Início do desmame do suporte ventila- possível a oxigenação da pessoa,


tório (sweep gas) apenas com a ventilação, mantendo
• Se hemodinamicamente instável, fluxo de sangue.
retomar a taxa de fluxo de sangue Opção 3: Reduzir progressivamente o
anterior e otimizar ainda mais a hemo- fluxo de sangue (até mínimo de 1500
dinâmica da pessoa. RPM e com atenção à formação de
2. Redução transitória diária do fluxo coágulos no oxigenador), mantendo a
sanguíneo ECMO FiO2 do misturador a 100%.
- Reduzir o fluxo sanguíneo ECMO a 1
L/min durante 10-15 min e monitorizar Caso as pessoas apresentem critérios
a hemodepressão dinâmica e altera- para desmame do suporte circulatório
ções ecocardiográficas. e suporte pulmonar, a descanulação é
• Se os critérios clínicos e ecocardio- recomendada. Caso apresente critérios
gráficos estão estáveis - Início do para o desmame do suporte circulató-
desmame do suporte ventilatório rio, mas não para o suporte pulmonar,
(sweep gas) deve-se considerar a mudança para um
• Se os critérios são instáveis, reiniciar ECMO VV16,18. No Quadro 11, encontra-
a taxa de fluxo de sangue num fluxo -se um resumo do desmame em trial

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off do suporte ECMO VV16,18 e ECMO VA16,26.

Quadro 11: Orientações para o desmame em trial off do suporte ECMO VV e VA

Ações/Orientações Justificação

Avaliar condições fundamentais da pessoa para o


processo de desmame:
• Hemodinamicamente estável, com baixa dependência
de vasoativos e inotrópicos Prevenção de complicações
• RX tórax sem alterações significativas (Ver capítulo 7)
• Ecocardiograma sem alterações, com boa função
• Parâmetros metabólicos dentro dos valores normais
• SvO2 dentro dos parâmetros normais

Diminuir gradualmente o fluxo de sangue na bomba a uma


velocidade máxima de: Prevenção de complicações
• 10 – 20 ml/Kg (na modalidade VA) (Ver capítulo 7)
• 40 – 50 ml/Kg (na modalidade VV)

Prevenção de complicações (Ver


Diminuir o fluxo a cada 15/30/60 minutos (dependendo da
capítulo 7)
tolerância da pessoa à redução do fluxo)
Avaliação da resposta da pessoa
Avaliação da resposta fisiológica da
Monitorizar continuamente os sinais vitais
pessoa
Colher sangue arterial para gasometria após cada
Avaliação da resposta fisiológica da
diminuição do fluxo de sangue/fluxo de gás durante o
pessoa
desmame

Continuar a diminuir o fluxo de sangue à razão descrita


anteriormente até ao limite mínimo de:
• Circuito 1/4’’ (neonatal): 100 ml/min Prevenção de coagulação do sistema
• Circuito 3/8’’ (pediátrico / adulto): 200 ml/min
• Circuito 1/2’’ (adulto): 500 ml/min

Manter a perfusão de heparina de modo a manter os


Prevenção de coagulação do sistema
valores de ACT preconizados

Desconectar qualquer perfusão ou sistema ligado ao


sistema extracorporal e ligar diretamente à pessoa, como
Gestão de tempo
por exemplo, técnicas contínuas de substituição da
função renal.

Estabilização hemodinâmica do cliente


Administrar expansores de volume, se necessário Prevenção de complicações (Ver
capítulo 7)

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Ações/Orientações
Justificação

Estabilização hemodinâmica da pessoa


Aumentar ou iniciar vasoativos e/ou inotrópicos
Prevenção de complicações
consoante a necessidade da pessoa
(Ver capítulo 7)

Ajustar os parâmetros ventilatórios para valores que se


Promoção de trocas gasosas
considerem necessários após retirar o suporte
adequadas
extracorporal

Assegurar que o consumo de O2 não está aumentado (ex. Promoção de trocas gasosas
febre, dor, ansiedade) adequadas

Retirar fonte de O2 da membrana permutadora de gases

Nota: no caso da modalidade VV esta é a última ação Avaliação da função pulmonar nativa
antes de avançar para a descanulação. Após o seu do cliente
sucesso, é possível proceder à finalização do suporte e à
descanulação, conforme decisão da equipa Início do processo de trial-off
multidisciplinar
Na modalidade VA, após desmame com sucesso e
indicação médica, clampar as cânulas e parar a bomba Avaliação da função cardíaca nativa do
durante 2 minutos (120 segundos) cliente
Nota: O sistema pode permanecer parado durante
aproximadamente 2 minutos (120 segundos) sem Início do processo de trial-off
formação de coágulos (com ACT=200 segundos)
Seguir a seguinte ordem:
1. Clampar linha de retorno Prevenção de complicações
2. Clampar linha de acesso (Ver capítulo 7)
3. Desligar a bomba

Desclampar a cada 2 minutos e voltar a ligar a bomba de


Prevenção de formação de coágulos
sangue durante, pelo menos, 1 minuto

Avaliação da resposta fisiológica do


Realizar, durante este período, a avaliação constante dos cliente
parâmetros hemodinâmicos e SatO2 Prevenção de complicações (Ver
capítulo 7)

Retomar, com indicação médica, os parâmetros Promoção da adequação de suporte


anteriores em caso de insucesso no trial-off circulatório e respiratório

Avançar para o processo de descanulação em caso de


sucesso no trial-off

Efetuar registos

Fonte: Adaptado pelos autores

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6.5 Descanulação respirar espontaneamente, isto


porque, aquando da remoção da
É o processo de remoção das cânulas cânula venosa, o ar pode entrar na
dos vasos sanguíneos. Na maioria dos corrente sanguínea através dos
casos, após a interrupção de anticoa- orifícios laterais2,13,15.
gulação sistémica durante 30 a 60
minutos, as cânulas ECMO podem ser O uso do Doppler na descanulação
removidas sem intervenção cirúrgica, venoso é recomendado para detetar
mas simplesmente por uma pressão uma trombose venosa profunda no
local durante 30 min. Cânulas coloca- vaso da cânula2,18.
das por dissecação direta são removi-
dos por dissecação direta18. O ECLS pode ser interrompido se não
existir esperança de vida ou qualidade
Para o procedimento, a pessoa deve de vida [lesão cerebral grave, coração
apresentar valores de hemoglobina ou pulmão irrecuperável, ou nenhuma
aceitáveis (12-14 mg/dl) e deve de ser esperança para substituição do órgão
posicionado em decúbito dorsal na por Dispositivo de Assistência Ventri-
posição horizontal ou em Trende- cular (DAV) ou transplante]. A possibi-
lenburg e administrar um curarizante lidade de interromper o suporte ECMO
de curta duração (se necessário) ou por inutilidade deve ser explicado à
executar uma manobra de Valsalva família antes da ECLS ser iniciada2,15,18.
para reduzir o risco de embolia O quadro 12 resume a descanulação do
gasosa, no caso de a pessoa estar a suporte ECMO.

Quadro 12: Descanulação do suporte ECMO

Ações/Orientações Justificação

Diminuição da ansiedade
Informar e instruir a pessoa sobre o procedimento
Obtenção da colaboração do cliente
Conhecer o valor de hemoglobina da pessoa e assegurar Prevenção de complicações
a disponibilidade de hemoderivados, caso a pessoa
necessite. (Ver capítulo 7)

Avaliação do estado hemodinâmico


Vigiar e monitorizar continuamente os sinais vitais
Despiste de complicações (Ver capítulo 7)

Fonte: https://www.getinge.com3

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Ações/Orientações Justificação

Posicionar a pessoa em decúbito dorsal na posição Facilitação da realização do procedimento


horizontal ou em Trendelenburg Prevenção de embolia gasosa

Reunir os recursos humanos e materiais necessários


para a descanulação Gestão de tempo
(ver Anexo 4)

Retirar as cânulas 30 a 60 min após interrupção da


perfusão de heparina (alguns centros ECMO em
Portugal não interrompem a perfusão de heparina para
descanulação)

Nota: A remoção das cânulas é um ato médico. Ao retirar Prevenção de complicações


a cânula venosa existe o risco de entrada de ar pelos (Ver capítulo 7)
orifícios laterais desta, passível de ocorrer quando a
pessoa tem respiração espontânea. Esta situação pode
ser evitada utilizando a apneia / pausa expiratória (no
ventilador) e retirando a cânula num gesto rápido.

Para a descanulação venosa são efetuados pontos


cerclagem com fio de sutura.
No caso da descanulação arterial, a técnica mais
utilizada é aplicação de Perclose ProGlide®;

Prevenção de complicações
Em ambos os casos, ainda podemos recorrer à
(Ver capítulo 7)
compressão direta [manual ou com sistema de
contenção vascular com controlo de pressão
(compressor FemoStop®)]

Nota: Se a canulação foi feita por desbridamento pode


ser necessário a reconstrução cirúrgica do vaso

Prevenção de sinais de má perfusão


Realizar penso compressivo e manter compressão no vascular
máximo durante 4 horas, de acordo com a coagulação Prevenção de hemorragias
da pessoa e capacidade hemostática Prevenção de outras complicações
(Ver capítulo 7)

Prevenção de sinais de má perfusão


Avaliar perfusão distal dos membros e sinais vascular
contralaterais para comparação durante penso Prevenção de outras complicações
compressivo (Ver capítulo 7)

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Ações/Orientações Justificação

Efetuar tratamento nos ex-locais de inserção das


Prevenção de complicações (Ver capítulo
cânulas conforme protocolo de serviço ou centro de
7)
referência.
Aplicar penso com compressa e vigiar. Prevenção de IACS

Vigiar e monitorizar continuamente os sinais vitais,


gasometria arterial, perfusão distal dos membros e Prevenção de complicações (Ver capítulo
sinais contralaterais 7)

Efetuar registos

Fonte: Adaptado pelos autores

6.6 Transporte da pessoa em situa- dois critérios também é importante


ção crítica em suporte ECMO que as pessoas tenham uma avaliação
do seu estado hemodinâmico antes da
A Ordem dos Médicos e a Sociedade canulação, recorrendo à ecocardiogra-
Portuguesa de Cuidados Intensivos23 fia de forma a avaliar a função e o DC
defendem que o transporte de pessoas para a seleção da modalidade.
críticos deverá passar por três fases
fundamentais, “decisão, planeamento e Posteriormente, caso tenha indicação
efetivação”, sendo que o transporte da para ECMO segue-se a fase de planea-
pessoa em ECMO também obedece a mento, na qual é contactada e ativada
estas fases cruciais. A fase de decisão a equipa de ECMO.
passa pela seleção da pessoa, ou seja,
pela avaliação médica de dois clínicos Esta equipa de ECMO deve enviar ao
envolvidos (hospital recetor e hospital hospital de origem (onde se encontra a
onde se encontra a pessoa) que após pessoa) uma lista de material e equipa-
realização de todos os procedimentos mento de forma a estar disponível
possíveis para eventual reversão do aquando da chegada desta equipa.
quadro (prone position; recrutamento Esse material e equipamento é
alveolar, entre outros) e na presença composto por: batas esterilizadas,
dos seguintes critérios: avaliação da toucas, compressas, luvas esterilizadas
indicação e exclusão de contraindica- de vários tamanhos, cloroexidina,
ção, que determinam o início do supor- ecógrafo com sonda vascular, protetor
te ECMO. Para a ELSO6,22, além destes esterilizado de sonda de ecógrafo, gel

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esterilizado para ecógrafo, sedas de dade, encontra-se uniformizado por


vários tamanhos, soro fisiológico, documentos legais e/ou orientações
polieletrolítico simples, seringas (2, 5, das Ordens Profissionais bem como
10, 20 e 50 ml), agulhas, esponja de Sociedades Científicas.
gelatina hemostática, placas hidrocoló-
ides, penso de pelicula transparente, Este documento procura ser um
máquina de tricotomia e mesa cirúrgi- complemento, para a orientação do
ca, assim como, a realização de alguns transporte com a especificidade da
procedimentos técnicos, tais como, pessoa em suporte ECMO. Conforme o
tricotomia do joelho à zona umbilical guia da Sociedade Portuguesa de
bilateralmente, tricotomia da região Cuidados Intensivos, o transporte deve
temporal direita (pescoço e toda a ser constituído por 3 fases: decisão,
zona temporal). planeamento e efetivação.

Os restantes equipamentos/materiais A decisão de transferência de uma


necessários devem ser transportados e pessoa em situação crítica pressupõe
assegurados pela equipa ECMO do sempre uma avaliação dos benefícios e
hospital recetor que se encontram riscos inerentes ao transporte e este
descritos no final deste subcapítulo. deve ser considerado como uma exten-
são de cuidados do hospital23. Assim, a
O transporte seguro de uma pessoa em Decisão do transporte, será sempre da
suporte ECMO é fundamental e exige responsabilidade do Médico com
organização e apoio específico. A competência em ECMO, que tendo em
mobilização deste tipo de pessoas conta as necessidades da pessoa irá
apresenta risco, deve ser excecional e avaliar as condições de risco benefício.
realizada por uma equipa especializa-
da em ECMO, incluindo pelo menos um O Planeamento deverá ter em conta:
médico, um EEEMC e um profissional a) O contacto com os diferentes inter-
de ECMO (Médico/Enfermeiro/Perfu- venientes, no sentido de minimizar os
sionista). A antecipação, a conformida- tempos de transporte.
de com os procedimentos e a logística b) Selecionar o meio de transporte
adequada são as condições que mais adequado para a deslocação,
asseguram o máximo de segurança tendo em conta os dispositivos de
para a pessoa em ECMO21,22. ECMO a utilizar.
c) Realizar estimativa do tempo do
O transporte de pessoas entre institui- transporte, a fim de preparar suple-
ções de saúde, devido à sua especifici- mentação elétrica, de gases e terapêu-

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tica para a deslocação. porte intra-hospitalar é aquele realiza-


d) Fazer-se acompanhar de material do dentro do edifício onde a pessoa
para ação e correção de possíveis está internado. Será a deslocação entre
complicações/intercorrências, como: a unidade da pessoa e outro local para
via aérea; respiração; circulação; e a realização de intervenções e/ou
circuito extracorporal. exames complementares de diagnósti-
co imprescindíveis.
Por último, a Efetivação do transporte
inicia-se com a saída da equipa de Transporte inter-hospitalar: O trans-
ECMO da unidade hospitalar de porte inter-hospitalar é aquele realiza-
origem, no caso do transporte inter e do entre duas unidades de saúde.
extra-hospitalar. A responsabilidade Neste caso podemos estar perante
da pessoa é, até à chegada da equipa dois cenários. O primeiro, a deslocação
de ECMO, da unidade de origem. Após de equipa para colocação de início de
o início da canulação e até à chega à técnica na pessoa no hospital de
unidade recetora, a responsabilidade é origem e respetivo resgate para o
da equipa de ECMO. serviço/centro de suporte ECMO –
transporte primário; o segundo cená-
A ELSO publicou diretrizes para o rio, o transporte entre serviços/
transporte da pessoa em suporte centros de referência em ECMO –
ECMO. Estas recomendações devem transporte secundário.
ser um guia para a conceção e o
estabelecimento de um programa de Transporte extra-hospitalar: O trans-
transporte ECMO inter e intra-hospita- porte extra-hospitalar pressupõe o
lar. Pressupõem que qualquer pessoa resgate da pessoa da via pública e/ou
que é admitido para o transporte propriedade privada para a instituição
ECMO já foi avaliado separadamente hospitalar, com a implantação da técni-
para a necessidade de suporte extra- ca no local onde se encontra a pessoa.
corporal. Estas diretrizes abordam a
seleção e execução do transporte da (B) Fatores geográficos e questões
pessoa em ECMO22. relacionadas com as condições clima-
téricas
Alguns dos fatores para a Decisão do A distância entre o serviço/unidade
transporte da pessoa em suporte hospitalar e serviço/centro de suporte
ECMO passam por2,20,21,22,23: ECMO desempenha um papel funda-
(A) Tipo de transporte mental na seleção do tipo de transpor-
transporte intra-hospitalar: O trans- te. Em cada caso, as considerações

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 109
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

geográficas devem ser tidas em conta ECMO


no contexto de prioridades clínicas, • EEEMC, EEESIP e/ou ECECLS
tempo e recursos. Se a duração entre • Profissional de ECMO (Médico/Enfer-
serviços/unidades é superior a 3-4 meiro/Perfusionista)
horas por via terrestre, então o trans- • Equipa de logística, mediante o meio
porte pelo ar deve ser considerado. a utilizar.
As condições climatéricas têm um
grande impacto sobre o transporte (D) Material/equipamento a acompa-
aéreo, assim como, o gelo/neve ou nhar o transporte da pessoa em
outras condições das estradas perigo- ECMO:
sas podem afetar a viabilidade de Relativamente ao material/equipamen-
transporte terrestre. O impacto do to, deve ser selecionado e “acondicio-
clima sobre a adequação do transporte nado” de modo a que durante o trans-
para uma determinada missão deve porte estabilize de forma segura contra
sempre estar uma decisão do condu- as forças de vibração, aceleração e
tor/piloto sem a entrada da equipa desaceleração em todas as direções;
médica. evite potenciais impactos ou interfe-
rências com outros materiais/equipa-
(C) Equipa de transporte: mentos; permita a fixação e remoção
De acordo com a ELSO “a equipa de rápida (no caso de ser necessário) e
transporte deve ser totalmente autos- que o oxigenador esteja sempre a um
suficiente para a transferência de nível inferior da pessoa para evitar
hospital para hospital”3,22. embolia de ar no caso de uma paragem
O transporte de uma pessoa em ECMO, acidental da bomba com o oxigenador.
devido ao risco de instabilidade
iminente, deverá ser realizado por um O material necessário:
Médico (com a devida formação) e • Monitor/desfibrilhador de transporte
EEEMC, bem como os técnicos neces- com alarmes que tenha monitorização
sários para a operacionalidade dos contínua da FR; oximetria de pulso;
diferentes meios. A esta equipa deve ECG continuo; frequência cardíaca;
acrescentar-se o profissional de ECMO pressão arterial invasiva;
que deverá estar em contacto perma- • Material de intubação com tubos
nente com o Médico de ECMO. traqueais adequados á pessoa e
insuflador manual (com válvula de
Sistematizando, a equipa de transporte PEEP);
deve possuir: • Fonte de oxigénio com capacidade
• Médico com a devida formação em adequada;

110 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

• Aspirador elétrico (com baterias) e Durante o transporte são tomadas


sondas de aspiração; todas as precauções para prevenir
• Drenos torácicos, conjunto de intro- complicações/ intercorrências que
dução e acessórios; coloquem a pessoa em perigo de vida,
• Material para punção e manutenção para isso é efetuada uma vigilância
de perfusões endovenosas e respeti- contínua, através da monitorização de
vas seringas ou bombas volumétricas todos os parâmetros e registados.
com bateria (agulhas, cateteres veno-
sos, seringas, sistemas de soros...);
• Soros (cristaloides e coloides) com
mangas para administração sob
pressão;
• Fármacos, para suporte avançado de
vida, e outros que se julguem necessá-
rios ou específicos para terapêuticas
continuadas ou intermitentes pré-pro-
gramadas;
• Ventilador de transporte, com possi-
bilidade de monitorização do volume/
minuto, e da pressão da via aérea, com
capacidade de fornecer PEEP e FiO2,
reguláveis de forma fiável e com
alarmes de desconexão e pressão
máxima da via aérea;
• Máquina de circulação extracorporal
com visualização de rotações da
bomba e débito de bomba, ponderar
restante monitorização;
• Bomba de suporte do débito de
sangue, suplente;
• Clampes para tubuladuras (no
mínimo 4 e idealmente metálicos);
• Outro material: Tesoura e Conexões –
1/4 e 3/8;
• Equipamento de comunicações
(permitindo contactos entre os hospi-
tais de origem e destino).

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 111
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

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14 Faustino, Alexandra (2014) –
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em Unidade de Cuidados Intensivos. validity of the Richmond Agitation-Se-
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Hospital Prof. Doutor Fernando 2003;289(22):2983-2991 (doi:10.1001/-
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Support: The ELSO Red Book 5th Extracorporeal Elimination in Extracor-
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23 ORDEM DOS MÉDICOS & SOCIEDA-


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24 PARECER N.º 09 / 2017 - TRANS-


PORTE DA PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA. Parecer da Mesa do Colégio
da Especialidade em Enfermagem
Médico Cirúrgica. Relatores(as):
MCEEMC Aprovado em reunião
ordinária de 06.03.2017.

114 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

7. Complicações
A avaliação, o planeamento e a
intervenção de enfermagem á
pessoa submetida a ECMO são
orientados por três objetivos princi-
to pelo princípio ético da beneficên-
cia/não maleficência2.

7.1 Prevenção de complicações asso-


pais: “a promoção do conforto e repou- ciadas à pessoa em situação crítica
so, a prevenção de complicações e o com suporte ECMO (complicações
suporte enquanto ocorre o processo clínicas)
de cura”1. Na prática de enfermagem, a
antecipação de possíveis complicações As possíveis complicações clínicas da
e a prevenção do dano são dois dos pessoa em situação crítica com suporte
aspetos que coexistem em simultâneo ECMO4,11,18,21 encontram-se descritas no
para a segurança da pessoa, no respei- Quadro 13.

Quadro 13: Complicações Clínicas

Complicações Clínicas
Hemorragias/Embólicas
Neurológicas
Hematológicas
Cardiopulmonares
Renais
Infeção
Nutricionais
Imobilidade

Fonte: Adaptado pelos autores

Complicações emorrágicas/embóli- potencia exponencialmente o risco de


cas – Gestão da anticoagulação hemorragia. A anticoagulação sistémi-
A anticoagulação da pessoa é um ca constitui-se, pois, como um impor-
pré-requisito para a concretização das tante foco de atenção, dado o risco de
técnicas ECLS, o que, aliado ao consu- complicações hemorrágicas que acres-
mo de plaquetas e de outros fatores da centa, nomeadamente ao nível do local
coagulação pelo circuito extracorporal cirúrgico e zonas de canulação3,20. As

116 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
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complicações hemorrágicas “são a observação de comportamentos, em


principal causa de morbilidade e pessoas incapazes de comunicar, seda-
mortalidade” nestas pessoas6, estando dos e ventilados9,10.
a hemorragia intracraniana descrita
como a complicação major da ECMO1,7. Em relação à avaliação da qualidade e
profundidade da sedação, a utilização
Prevenção da escala RASS contribui para a gestão
Algumas das práticas clínicas a estas da analgosedação em conformidade
pessoas implicam, assim, reduzir a com os resultados da evidência cientí-
perfusão de heparina, administrar fica mais recente dirigida aos adultos
Plasma Fresco Congelado (PFC), na UCI12,13.
plaquetas, fibrinogénio, controlar o
local da hemorragia, revisão cirúrgica Complicações Hematológicas –
da hemóstase, interrupção esporádica Trombocitopenia e Hemólise
da heparina se persistência de hemor- O suporte de ECMO pode causar
ragia grave (maior vigilância de coágu- outras complicações graves e poten-
los) e interromper suporte extracorpo- cialmente fatais, além das referidas
ral, caso exista risco de vida5. anteriormente, como a hemólise intra-
vascular, a trombocitopenia ou a
Complicações neurológicas – Gestão coagulopatia de consumo11. A trombo-
da sedação citopenia é comum em pessoas com
As complicações com o Sistema Nervo- suporte ECMO e pode ser uma conse-
so são as mais documentadas como quência da doença ou causado pela
mais graves e estão relacionadas com o exposição do sangue ao circuito extra-
grau de hipóxia e acidose8. É recomen- corporal. Assim, as plaquetas aderem à
dado que se evite bloqueadores neuro- superfície do circuito e sofrem uma
musculares e se realizem exames reação de libertação que atraí outras
neurológicos regulares. plaquetas. Estes agregados de plaque-
tas circulam no sangue e são removi-
Prevenção das pelo fígado e baço. No caso de a
Os cuidados de enfermagem especiali- contagem de plaquetas ser inferior a
zados assumem um papel preponde- 20.000/mm3 de sangue pode ocorrer
rante na sua prevenção, nomeadamen- hemorragia espontânea. Para isso
te na aplicação da escala numérica deve-se transfundir plaquetas á
para avaliar a dor em pessoas capazes pessoa de forma a obter uma conta-
de comunicar de forma verbal ou gem de plaquetas superior a
motora e a Behavioral Pain Scale da 80.000/mm3 de sangue11.

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 117
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Numa pessoa em suporte ECMO, o realizar colheita de sangue para hemo-


fluxo gerado pelas rotações poderá grama e dependendo dos resultados,
lesar os glóbulos vermelhos e causar considerar a administração de PFC,
sangramento. Assim, a hemólise pode plaquetas, fibrinogénio, entre outros.
ocorrer devido às seguintes situações: Deve ser considerada a realização de
falha da membrana (formação de procedimentos invasivos a análise dos
fibrina e coágulos); bomba com alto resultados analíticos.
fluxo; coágulos nas cânulas e alta
pressão de sucção de sangue que pode Hemólise
ser devido a hipovolemia ou outra Para prevenir a hemólise na pessoa em
situação anómala4. suporte ECMO, deve-se vigiar e moni-
torizar a presença de hemoglobinúria e
Diariamente, devem ser observados realizar colheita de sangue para hemo-
sinais clínicos que poderão ser sugesti- grama para despistar sinais de Hb livre
vos de hemólise nomeadamente, a > 50 mg/dl4,11.
tonalidade semelhante à cor vermelha A formação de coágulos no circuito
na urina (Hemoglobinúria), ou no pode ser completamente evitada
conteúdo do saco de efluente em caso através das seguintes ações4:
de Técnicas de Substituição da Função - correta gestão da anticoagulação;
Renal (TSFR), e ainda vigiar a hemo- - vigiar e monitorizar as pressões pré
globina livre no plasma que deve ser (pressão negativa) e pós membrana do
menor do que 10 mg/dl. oxigenador (pressão positiva) que pelo
gradiente (diferença entre pressões)
No caso da hemoglobina no plasma ser pode ser indicativo de presença de
superior a 50 mg/dl, deve ser investi- coágulos no oxigenador. Coagulação
gada a causa, sendo que por vezes está no oxigenador é representado pelo
associada a baixa de plaquetas. Nestes aumento do gradiente;
casos poderá ocorrer hemorragia inter- - vigiar a formação de coágulos no
na e externa e, por tratamento inade- oxigenador e nos componentes do
quado, a pessoa desenvolver uma circuito com uma luz (foco);
Coagulação Intravascular Dissemina- - avaliar a temperatura central da
da4,11,19,20. pessoa.
O tratamento passa pela transfusão de
Prevenção CE, plaquetas, PFC e a substituição de
Trombocitopenia todo o circuito do suporte ECMO.
Para prevenir a trombocitopenia na
pessoa em suporte ECMO deve-se Complicações cardiopulmonares

118 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
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As complicações cardíacas incluem oligúria, necrose tubular aguda


alterações do miocárdio, como uma associada a permeabilidade capilar e
diminuição na percentagem de encur- depleção de volume intravascular
tamento do ventrículo esquerdo, por devido ao ECMO desencadear uma
mais de 25% com o início do ECMO que reação inflamatória aguda. A fase
retorna ao normal após 48 horas; a diurética, o que geralmente se inicia
hipertensão devido ao risco de hemor- entre as 48-72 horas, é muitas vezes
ragia e acidente vascular cerebral; e a um dos primeiros sinais de recupera-
arritmia devido à hipóxia e ao desequi- ção, mas por vezes, a oligúria persiste
líbrio eletrolítico4. após 72 horas assim como, a necrose
tubular aguda, os diuréticos deixam de
Relativamente às complicações ter qualquer efeito e as Técnicas de
pulmonares, o edema agudo do Substituição da Função Renal (TSFR)
pulmão juntamente com hemorragia serão a melhor solução para a lesão
pulmonar, embolia pulmonar e a hiper- renal aguda19.
tensão pulmonar são as complicações
mais frequentes. Para Patel19, existem dois métodos de
introdução das TSFR numa pessoa que
Prevenção necessite de ECLS. Um deles consiste
Durante o suporte ECMO, a perfusão na colocação de um acesso vascular
sistémica e o volume intravascular exclusivo para TSFR que pressupõe
devem ser mantidos. O status do uma decisão quando possível, antes da
volume pode ser analisado clinicamen- canulação do ECLS, devido ao risco de
te pelo débito urinário, por sinais hemorragia pela anticoagulação. Este
físicos de hipoperfusão e avaliando a método permite uma gestão da antico-
pressão venosa central e a PAM. O DC agulação das TSFR e ECLS de forma
pode ser reforçado com agentes independente. As desvantagens deste
inotrópicos. O ecocardiograma deve método é ser mais dispendioso e
ser realizado para excluir qualquer apresenta maior risco de infeção.
grande anomalia cardíaca congénita,
que pode exigir uma intervenção Outro método, envolve acoplar as
imediata que não o ECMO15. TSFR ao circuito ECLS, em que esta
conexão depende de vários fatores,
Complicações renais – Instituição e nomeadamente do tipo de bomba
gestão das TSFR ECLS e software das TSFR. De um
Durante as primeiras 24-48 horas da modo geral, numa bomba de rolamen-
pessoa em ECMO, é comum apresentar tos ECLS, o circuito das TSFR pode ser

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 119
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

integrado no circuito pré bomba ECLS. DGS, bem como as normas institucio-
Outro fator a considerar, são os softwa- nais, considerando ainda o Programa
res das TSFR, pois existem alguns que Nacional de Prevenção e Controlo de
não permitem o seu início devido à Infeções e de Resistência a Antimicro-
magnitude das pressões negativas na bianos. Em todo o modo, ao contrário
linha pré bomba ECLS. Num circuito dos restantes cateteres, as cânulas não
ECLS com uma bomba centrífuga, podem ser substituídas por suspeita
recomenda-se que o circuito das TSFR de colonização e a troca do circuito
seja conectado pós bomba ECLS. Este acarreta sempre riscos significativos.
método é simples, menos dispendioso
e deverá ser realizado por um profis- Complicações nutricionais – Gestão
sional em ECLS. As desvantagens do suporte/aporte nutricional
deste método poderá ser a recircula- As complicações do trato gastrointes-
ção no circuito das TSFR reduzindo a tinal incluem a hemorragia, que pode
sua eficiência, múltiplos desequilíbrios ocorrer como resultado de stress,
eletrolíticos sobretudo em crianças e isquemia ou tendências hemorrágicas.
descalibração das balanças dos moni- A Hiperbilirrubinemia direta e cálculos
tores de TSFR o que poderá levar a biliares podem ocorrer secundaria-
uma diferença entre o volume ultrafil- mente ao jejum prolongado, Nutrição
trado e o os fluídos de reposição forne- Parenteral Total (NPT), hemólise e
cidos11. diuréticos4.

Prevenção Prevenção
A monitorização do débito urinário e as Vários estudos têm demonstrado que,
TSFR serão os meios para melhorar a sob a supervisão clínica adequada, a
lesão renal. nutrição entérica deve ser iniciada o
mais precocemente possível, uma vez
Complicações infeciosas – Gestão que é bem tolerada pelos pessoas em
das medidas de controlo da infeção ECMO, independentemente da modali-
O risco de infeção aumenta com a dade17. “A nutrição entérica é conside-
manipulação e o número de dispositi- rada a via de eleição para o suporte
vos envolvidos. As cânulas colocadas nutricional nas pessoas críticas”16.
nos vasos femorais acarretam um
maior risco de infeção5.Os tratamentos Complicações associadas à imobili-
dos locais de inserção das cânulas dade – prevenção de úlceras por
devem ser realizados tendo em consi- pressão e autocuidados comprometi-
deração as normas orientadoras da dos

120 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

As complicações associadas à imobili- avaliar o nível de consciência, avaliar os


dade de uma pessoa submetida ao recursos humanos disponíveis, obser-
suporte da ECMO são semelhantes a var todo o circuito ECLS, verificar as
outra pessoa em situação crítica que fixações das cânulas, verificar a dispo-
esteja admitido numa UCI. nibilidade de tubuladura do circuito
extracorporal e reunir todos os mate-
O posicionamento destas pessoas nos riais necessários.
vários semi-dorsais (direito e esquer-
do), deve ser o mais precoce possível, Outras complicações
de forma a minimizar atelectasias e a Durante o suporte de ECMO, a pessoa
condensação pulmonar posterior, poderá apresentar algumas complica-
embora dependente da condição ções decorrentes das descritas
hemodinâmica5. anteriormente ou relacionadas com o
equipamento ECLS4. Essas complica-
Prevenção ções apresentam-se descritas no
Para reposicionar a pessoa devemos quadro 14.

Quadro 14: Complicações relacionadas com a pessoa em ECMO

Hipotensão Persistente

Hipertensão Persistente

SvO2 baixa (<60%)

SvO2 alta (>90%)

Saturação Arterial de O2 baixa (<80%)

PaCO2 Alta (> 45mmHg)

Isquemia do membro

Pressão de acesso  (> - 300mmHg)

Pressão de retorno  (> 400mmHg)

Hipoxia diferencial

Fonte: Adaptado pelos autores

Relativamente à modalidade ECMO está inserida a cânula (femoral ou


VA, o fluxo de sangue para o membro jugular), é baixo ou inexistente sendo
inferior ou superior, dependendo onde necessário a colocação de uma linha

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 121
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

de reperfusão (cateter/introdutor 6 - 8 partir da cânula arterial de forma a


Fr) em posição próximo-distal na prevenir o risco de isquemia do mem-
artéria femoral superficial ou axial bro4,11,18,21.
superficial, para perfusão retrógrada a
Figura 29: Hipoperfusão dos membros

Fonte: Adaptado pelos autores

Para antecipar complicações ou sinais - a perfusão de ambos os membros


de hipoperfusão, devemos vigiar e com Near InfraRed Spectroscopy
monitorizar: (NIRS).
- a temperatura e oximetria de ambos
os membros; Os elétrodos do NIRS deverão estar o
- o aspeto do membro onde está inseri- mais distal possível nos membros de
da a cânula, relativamente à rigidez e forma a antecipar complicações e
cor; sinais de hipoperfusão.

Figura 30: Monitorização dos membros com NIRS

Fonte: Adaptado pelos autores

122 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

7.2 Prevenção de complicações asso- Referências bibliográficas


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serão desenvolvidas as complicações New York: Springer Publishing Com-
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GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 125
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

8. Resolução de problemas
e atuação de emergência
C onsiderando que a condição de

de oxigenação está dependente do


Toda a tecnologia envolvida, o proces-
saúde da pessoa em situação
so de circulação e oxigenação sanguí-
crítica com apoio circulatório e
nea extracorporal, nomeadamente as
alterações na homeostasia do organis-
mo, a resposta inflamatória e o proces-
correto funcionamento deste suporte,
so de coagulação, acrescentam riscos
a resolução imediata de qualquer inter-
significativos à estabilidade da pessoa,
corrência com ele relacionado é crucial
já por si só, em condições críticas de
para a sobrevivência da pessoa. Nestas
saúde e de falência orgânica. Por isso,
situações, “respostas instantâneas são
“as vidas dos clientes dependem da
imperativas para tratar as complica-
ções e/ou prevenir uma cascata dedecisão do enfermeiro em tomar as
acontecimentos devastadores e/ou ações clínicas em pré-emergências e
irreversíveis”1. emergências em que o tempo é escas-
so e exige uma ação imediata”1. No
8.1 Relacionadas com a pessoa em quadro 15, está explanado a resolução
suporte ECMO de problemas relacionadas com a
pessoa em suporte ECMO.

Quadro 15: Resolução de problemas relacionadas com a pessoa em ECMO

Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

• Baixar perfusão de heparina


- Despistar sinais Gerais: (segundo protocolo)
Alterações da
o Hemoglobina baixa • Avaliar ACT de acordo com protocolo
Coagulação
o Hipotensão • Administrar PFC, plaquetas,
o Taquicardia fibrinogénio, entre outros
• Controlar a hemorragia
- Despistar sinais Específicos: • Vigiar pensos
• Vigiar locais de inserção de dispositivos
Perda sanguínea / o Convulsões invasivos
Hemorragias hemorragia o Midríase ou anisocoria
pupilar • Rever a intervenção cirúrgica da
o Sinais de hemóstase
tamponamento • Interromper temporariamente a
cardíaco/hemotórax heparina se persistir a hemorragia
Trombocitopenia
o Secreções hemáticas (maior probabilidade de formação de
(por ação da
o Distensão abdominal coágulos)
bomba ou
o Hematoquésias • Evitar procedimentos invasivos
induzida pela
o Drenagem hemática • Interromper suporte extracorporal, no
heparina)
(via digestiva) caso de risco de vida

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 127
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Hemorragia
intracraniana • Avaliar a dor em pessoas capazesde
comunicar de forma verbal ou motora
• Avaliar a qualidade e profundidade da
- Aplicar a escala numérica
Hipóxia sedação
Behavioral Pain Scale
(diminuição do • Monitorizar a atividade cerebral em
- Aplicar a escala RASS
fluxo por respostas a diversas combinações de
- Monitorizar por BIS
canulação da sedativos e anestésicos no cérebro
(índice bispetral)
carótida) • Avaliar o tamanho e a reatividade
- Monitorizar por NIRS
pupilar, do estado de consciência, dos
Neurológicas - Avaliar a Glasgow
Embolia reflexos, dos movimentos corporais e
Coma Scale
(migração de da presença de atividade convulsiva
- Avaliar os reflexos,
coágulo ou bolha • Realizar exames complementares de
dos movimentos
de ar – ECMO corporais e da diagnóstico para despiste de
VA) alterações neurológicas
presença de atividade
convulsiva • O ideal será a pessoa estar acordado o
suficiente para interagir com a família e
PIC elevada com os profissionais, de preferência
(canulação da com respiração espontânea
veia jugular
interna)

Maior
consumo
(coagulopatia
de consumo)

Diminuição da
produção (por
- Despistar sinais de • Administrar PFC, plaquetas,
Hematológicas hipoxia dos
trombocitopenia fibrinogénio, entre outros
(Trombocitopenia) órgãos
- Hemograma diário • Evitar procedimentos invasivos
produtores)
Sequestração
(esplenomegal
ia)
Diluição no
sangue

Coágulos no • A formação de coágulos no oxigenador e


oxigenador e circuito não pode ser completamente
circuito evitada.
Pressão no • Correta gestão da anticoagulação
circuito muito - Hemograma diário • Vigiar as pressões pré e pós Membrana
Hematológicas positiva ou - Despistar sinais de: (risco de coágulos)
(Hemólise) muito negativa o Hb livre (> 50 mg/dl) • Vigiar e monitorizar com uma luz (foco) a
o Hemoglobinúria formação de coágulos no oxigenador e
nos componentes do circuito
Aumento da
temperatura • Avaliar a temperatura central da pessoa
do sangue • Administrar CE, PFC, plaquetas,
entre outros

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Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Disfunção
Cardíaca

Hipertensão
Pulmonar
Cardio - Despistar sinais de
• Protocolos de atuação nas
pulmonares complicações
Edema Agudo do complicações cardiopulmonares
cardiopulmonares
Pulmão

Embolia
Pulmonar/
cardíaca

Pneumotórax
hipertensivo
- Despistar sinais de
• Protocolos de atuação nas
Intratorácicas Hemotórax maciço complicações
complicações intratorácicas
intratorácicas
Tamponamento
Cardíaco
Resposta
inflamatória com
fuga de líquido
Renais - Avaliar débito urinário • Tratamento diurético
para o espaço
Oligúria – primeiras
extravascular - Avaliar balanço hídrico • Administrar expansores de volume
24 –48 horas Diminuição do
fluxo sanguíneo
renal

Agudização de
doença anterior

Renais - Avaliar débito urinário • Tratamento diurético


(Lesão Renal
Baixo débito
Aguda) urinário - Avaliar balanço hídrico • Administrar expansores de volume TSFR

Débito não pulsátil


(ECMO VA)

Cateteres
vasculares
Circulação
sanguínea
extracorporal
Ventilação - Cumprimento das
mecânica • Atuar conforme as orientações
orientações da DGS,
Infeção descritas nas normas institucionais e
Feridas cirúrgicas PPCIRA e institucionais
do serviço
na prevenção da infeção
Imunodepressão

Ambiente

Outras…

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 129
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Hemorragia
• Iniciar protocolo de nutrição entérica sob
Stress supervisão clínica adequada, o mais
- Gerir a nutrição entérica precoce possível
Isquemia e a eliminação intestinal • Controlar valores de glicemia segundo
Nutricionais
- Iniciar precocemente a protocolo
Hiperbilirrubinema nutrição entérica
• Vigiar eliminação intestinal e iniciar
direta
protocolo de eliminação (obstipação ou
diarreia)
Cálculos biliares

- Prevenir: úlceras por • Posicionar de 2 em 2 horas ou


pressão, rigidez articular, sempre que necessário;
Imobilidade Imobilidade • Mobilizar o mais precoce possível
atrofia muscular
prolongada
- Prevenir problemas • Observar continuamente todo o
cardiopulmonares circuito e as fixações das cânulas

Hipovolemia (↓↓
• Administrar expansores de volume
preload)
- Vigiar tensão Arterial
Hipotensão Sistólica, Diastólica e
Persistente Má função (↓↓ Média
• Administrar inotrópicos
(PAM < contratilidade) - Monitorizar com monitor
65mmHg) hemodinâmico
↓↓ Resistências (PiCCO®)
vasculares • Administrar vasoativos
periféricas

Hipervolemia • Administrar diuréticos


- Vigiar tensão Arterial
Hipertensão Sistólica, Diastólica e • Diminuir inotrópicos
Inotropismo alto
Persistente Média
↑↑ Resistências - Vigiar débito urinário
vasculares - Monitorizar com PiCCO® • Administração de vasoativos
periféricas

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Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Fluxo da bomba
de sangue muito • Aumentar fluxo de bomba de sangue
baixo

Hemoglobina • Administrar CE
baixa

Consumo - Vigiar fluxo de bomba


metabólico - Hemograma diário e • Diminuir consumo metabólico
Saturação aumentado (administrar antipiréticos, analgesia,
sempre que necessário
Venosa Central (Sépsis, sedação, entre outros)
- Vigiar temperatura central
de O2 Baixa hipertermia, entre
da pessoa
(<60%) outros)
- Vigiar parâmetros
ventilatórios
Disfunção do
• Substituir membrana/acrescentar
oxigenador/
outra membrana
Superfície
insuficiente
Parâmetros
ventilatórios • Aumentar parâmetros ventilatórios
baixos (apenas na modalidade ECMO VA e
(programados no na ausência de falência pulmonar)
ventilador)

Recirculação (ECMO VV) por:

Posição das - Vigiar posição e local de • Reposicionar cânulas


cânulas
inserção das cânulas
Saturação
Venosa Central Velocidade de - Vigiar bomba de sangue
• Diminuir a velocidade da bomba de
de O2 Alta bomba de sangue - Vigiar tensão Arterial sangue (se possível)
(>90%) (muito alta) Sistólica, Diastólica e
Média
Hipovolemia - Vigiar débito urinário • Administrar expansores de volume
- Monitorizar com
Função cardíaca (PiCCO®) • Gerir inotrópicos
diminuída

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 131
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Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

• Aumentar FiO2 na misturadora ligada


FiO2 baixo à membrana

Fluxo de sangue • Aumentar velocidade da bomba de


baixo sangue do sistema extracorporal

Hemoglobina • Administrar concentrado eritrócitos


baixa
- Vigiar Sat. O2
Oxigénio - Vigiar bomba de sangue
- Hemograma diário ou • Reconetar Oxigénio
desconectado
sempre que necessário
- Vigiar tensão Arterial • Administração de expansores de
Hipovolemia Sistólica, Diastólica e Média volume
- Vigiar e monitorizar débito
Disfunção da urinário • Substituir membrana permutadora de
membrana - Monitorizar com PiCCO® gases ou adicionar membrana
permutadora de permutadora de gases (em caso de
gases/superfície superfície insuficiente)
Saturação insuficiente
Arterial de O2
Baixa (<80%) Recuperação da • Aumentar fluxo de sangue
função cardíaca • Converter em modalidade ECMO VV
nativa da pessoa (se tolerado)
(na modalidade • Converter em modalidade ECMO VA
ECMO VA) V (se necessário/adequado)
- Procurar razão de
recirculação15 e resolver:
o Fluxo de sangue
muito elevado
• Mobilizar as cânulas
o Cânulas muito
próximas • Mudar para uma cânula dupla lúmen
Recirculação (na o Volume auricular baixo (Avalon ®): mas ter cuidado uma vez
modalidade o Função cardíaca que estas cânulas podem
deprimida ser menores e não permitir que um fluxo
ECMO VV)15 de ECMO acima de 5 L/min
- Há sempre alguma
recirculação (+/- 30%) • Adicionar uma cânula na outra veia
- Valor estimado da fração femoral
de recirculação =
Sat. Pré Ox. – SvO2
Sat. Pós Ox. – SvO2

15
É um fenómeno específico para ECMO VV implantado em femorojugular e resulta numa execução ECMO ineficiente. O
sangue oxigenado entregue pelo ECMO na cânula jugular (eferente) é imediatamente aspirada pela cânula femoral (aferente),
sem passar através da circulação geral. Nesse caso, os órgãos não são eficientemente oxigenados2

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Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Fluxo de Oxigénio • Aumentar fluxo de Oxigénio na


baixo membrana (L/M)

Oxigénio
desconectado da
• Conectar oxigénio à membrana
membrana
- Vigiar Sat.O2
PaCO2 Alta - Vigiar bomba de sangue
(> 45mmHg) Disfunção da - Vigiar conexão do
membrana oxigénio • Substituir membrana

Superfície da
membrana
insuficiente • Colocar membrana adicional de forma
(pessoa com peso paralela (em Y)
corporal > 100 Kg)

Fluxo de sangue
para o membro é - Comparar a temperatura
baixa ou de ambos os membros
inexistente pode - Observar o aspeto do
ser no membro membro onde está inserida
inferior onde está a Cânula: Rigidez e Cor
Isquemia - Uso em ambos os
inserida a cânula • Inserir uma linha de reperfusão na
(ECMO VA) membros de Oximetria e
ou no membro artéria femoral ou axial superficial e
superior quando NIRS. ligá-lo à cânula para permitir perfusão
a cânula está do membro inferior
inserida na
jugular (menos
frequente)

Hipovolemia • Administrar expansores de volume

• Diminuir o fluxo de sangue e logo que


Cânula venosa de possível, substituir cânula por uma de
baixo calibre maior calibre
Pressão de - Despiste de
acesso complicações
Linha/cânula
elevada cardiopulmonares e
(Não deve exceder
venosa obstruída • Procurar fonte de obstrução e
(ex: clampada, intratorácicas
- 300 mmHg) resolver
coágulo,
posicionamento)

Tamponamento/ • Drenar tamponamento/


pneumotórax • pneumotórax hipertensivo
hipertensivo

Linha de retorno
obstruída (ex: • Procurar fonte de obstrução e
Pressão de clampada, resolver
retorno coágulo,
elevada posicionamento)
(Não exceder + 400
mmHg) • Diminuir o fluxo de sangue e logo que
Cânula arterial de possível, substituir cânula por uma de
baixo calibre maior calibre

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 133
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Disfunção
cardíaca extrema,
(o coração está a
bater e a válvula - Para detetar e / ou
aórtica não está a diagnosticar hipoxia
abrir). ECMO VA diferencial, o oxímetro
é proporcionar de pulso deverá ser
100% do fluxo de colocado sobre um
sangue da pessoa dedo da mão direita, e
Hipoxia e oxigenação. Se
Diferencial os gases sanguíneos
a função (gasometria) deve ser
(ECMO VA) pulmonar é realizada na artéria
Síndrome prejudicada, a • Inserir uma cânula jugular para
Harlequin ou radial direita, o que
taxa de fluxo fornecer oxigénio para o cérebro
síndrome de reflete o débito cardíaco
ECMO VA típico da pessoa.
duas circulações
ou Síndrome Norte/ (80% de - Observar a cabeça da
Sul rendimento pessoa que apresenta
cardíaco uma tonalidade azul,
completo) pode enquanto as
resultar em extremidades inferiores
sangue apresentam uma
dessaturado do coloração vermelha
ventrículo
esquerdo, do
cérebro e artérias
coronárias.

Fonte: Adaptado pelos autores

8.2 Relacionadas com o de conhecimentos e competências


equipamento ECMO assume uma faceta preponderante no
domínio de atuação do enfermeiro com
Conhecer os componentes ECLS e a competência em ECLS, dada a sua
sua interligação, dominando os seus extrema importância na gestão de
princípios de funcionamento e estando situações inesperadas ou emergentes.
apto para a resolução de problemas Interpretar de forma rápida e precisa o
com eles relacionados são fatores funcionamento destes equipamentos
determinantes para uma prestação de (…) requer conhecimento clínico,
cuidados de enfermagem segura, competências práticas e ainda respeito
sendo que um dos aspetos “para a pelo equipamento e pelos riscos
prevenção de reais e potenciais potenciais que ele representa1. No
perigos relacionados com os equipa- quadro 16, apresentamos a resolução
mentos tecnológicos é assegurar que de problemas relacionadas com o
estes funcionam de forma correta e equipamento de suporte ECMO.
precisa”1. Efetivamente, este manancial

134 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Quadro 16: Resolução de problemas relacionados com o equipamento ECMO

Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Problema
mecânico mais
comum

Fluxo de sangue
baixo

No acesso (venoso), membrana ou


bomba:
ACT baixo • Informar o médico
• Documentar
• Vigiar
Coágulos no
Sistema
No retorno (arterial):
Extrair porção da linha com coágulo:
• Clampar pós-bomba
A formação de coágulos no • Parar a bomba
Pequenos circuito não pode ser • Clampar pré e pós coágulo
coágulos completamente evitada. • Cortar pré e pós coágulo
normalmente não • Colocar conector
• Fazer flush
representam - Correta gestão da • Reconetar
perigo anticoagulação • Validar ausência de bolhas
significativo para • Ligar a bomba até 1000RPM
o cliente de
Coágulos - Vigiar as pressões pré e pós • Desclampar linhas
membrana • Repor parâmetros
Pequenos
grandes (Uso da técnica asséptica)
coágulos
dimensões - Vigiar os componentes do
normalmente circuito e respetiva
podem levar a:não Esta técnica está descrita
representam documentação esquematicamente no final deste
perigo Falha
➢ subcapítulo.
significativo para
do oxigenador
o cliente
Coágulos no ➢ Coagulo
Sistema
patia de
consumo
(contagem alta
de plaquetas)
➢ Embolia
pulmonar
(ECMO VV) ou
sistémica
(ECMO VA)

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 135
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

No acesso (venoso):
• Colocar uma pinça na linha
vermelha
• Certificar que a bomba está parada
• Apertar a cânula venosa atrás e à frente
do conector, tendo o cuidado para não
o danificar
• Remover a linha venosa da cânula
venosa, de modo a que o ar presente
no sistema de tubos seja expulso
• Deixar que o ar no sistema de tubos
- Manter PO2 pós membrana < seja expulso através da linha venosa
600 mmHg desconetada e conecte depois a linha
- Evitar oclusão das cânulas venosa, já sem ar, à cânula venosa ou
PaO2 muito alta (circuito dobrado, clampado, fazer circular a(s) bolha(s) de ar até à
(>600 mmHg). A vincado, posição da pessoa) membrana oxigenadora e aspirar
pressão do O2 - Vigiar permanentemente o • Fixar a cânula de acordo com as
Ar no Sistema excede a pressão circuito e prevenir fraturas indicações no manual de instruções
(presença de ar do sangue e do sistema
• Iniciar novamente a perfusão a abra
no circuito de bolhas - Utilizar dispositivo detetor de as pinças nas linhas, azul e vermelha
ECMO) de ar são ar autorregulador
transferidas para - Evitar manuseamento do
o lado onde circuito por equipa sem No retorno (arterial):
circula o sangue experiência Quando o ar ultrapassa a membrana e
- Preencher e canular o passa para a linha de retorno exige ação
sistema efetuado por equipa rápida:
experiente • Clampar circuito arterial próximo da
pessoa
• Parar a bomba
• Parâmetros ventilatórios de urgência
• Tentar remover o ar por aspiração
• Se não for possível, mudar o circuito
• Identificar a origem do ar e solucionar
(Cardiohelp®)
o “Intervenções”
o “Abrir alarme de bolhas ativo”
o “Repor” e “confirmar”
• Substituir o sistema, se necessário

• Clampar imediatamente a linha arterial


(retorno) e a linha venosa (acesso)
• Parar a bomba de sangue
• Priming de um novo circuito
extracorporal
• Parâmetros ventilatórios de
Ar no Sistema
urgência
(Entrada massiva Deslocação/
de ar) • Expansores de volume
Exteriorização da
SITUAÇÃO • Inotrópicos
cânula venosa
• Suporte Básico e Avançado de Vida
EMERGENTE
• Conexão de novo circuito
• Estabilização da pessoa

Esta técnica está descrita


esquematicamente no final deste
subcapítulo.

136 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Coagulação das
fibras (coágulos no
Falha na oxigenador)
Membrana • Substituir a membrana permutadora de
Permutadora de Rutura da gases (oxigenador)
Gases membrana
permutadora
(incapacidade de (oxigenador)
oxigenar o
sangue) Rutura no
permutador de
calor
• Ligar a bateria secundária (se
Falha de energia aplicável)
elétrica • Utilizar a bomba manual (rotações
Falha de energia ideais: 2250-4750 RPM) até ao
(bateria e fonte restabelecimento da energia
externa) • Parâmetros ventilatórios de urgência

Falha Mecânica
 Aumento
repentino de
ruido de - Manter a unidade de
bomba emergência sempre
 Hemoglobinúri disponível
Anomalia ou
a e aumento - Manter sempre a bateria
Falência da da ligada à fonte externa
Bomba hemoglobina - Proteger a bomba de
• Utilizar bomba manual (rotações ideais:
livre (hemólise impactos esternos
2250-4750 RPM) até à substituição da
por aumento
bomba de sangue
da temperatura
• Parâmetros ventilatórios de urgência
gerada por
ineficiente
funcionamento
da bomba)
 Falha mecânica
do motor
Impacto acidental
com queda de
bomba

Ambas com uma


Coloração tonalidade clara • Procurar causa de recirculação
idêntica das (vermelho vivo)
Linhas
Ambas com uma • Verificar se está conectado à fonte de O2
(venosa e arterial) tonalidade escura • Aumentar aporte de Oxigénio
(vermelho escuro)

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 137
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Problema Causa Prevenção Ação/Orientação

Fratura ou fissura
de um dos • Isolar imediatamente o local de rutura
componentes do (clampar antes e depois da zona de
sistema - Sistema sempre visível
rutura)
para evitar impactos ou
• Parar a bomba de sangue
Rutura do Sistema Corte ou punção punções inadvertidas
(falha/fissura em acidental do • Colocar parâmetros ventilatórios de
- Não usar soluções
qualquer parte do sistema urgência
sistema)
alcoólicas na limpeza do
• Substituir segmento danificado ou
SITUAÇÃO sistema
Limpeza do substituir circuito completo
EMERGENTE sistema com - Usar braçadeiras de plástico
soluções para reforço das
alcoólicas junções/ligações do sistema Esta técnica está descrita
esquematicamente no final deste
Pressão muito subcapítulo.
elevada

Descanulação –
remoção
acidental de uma
cânula:
 Relacionados
com a sua
inserção
 Dilaceração
da jugular
interna e/ou
veia cava - Colocar as cânulas com
superior controlo ecocardiográfico e
 Disseção da subsequentes controlos
• Clampar imediatamente o circuito
carótida - Fixar cuidadosamente as
próximo da cânula removida e parar a
comum cânulas
bomba
 Colocação da - Posicionar a pessoa • Colocar a pessoa em
cânula - Suportar o peso das
Associado às Trendelemburg
arterial na cânulas à cama (atenção
Cânulas • Comprimir o local de inserção da cânula
artéria Aorta durante o posicionamento)
(evitar perda sanguínea)
descendente - Registar o nível de
• Parâmetros ventilatórios de
 Colocação da inserção de cada cânula
urgência
cânula - Garantir que a pessoa não
• Administrar expansores de volume
arterial na exterioriza as cânulas
Válvula Aorta - Circuito sempre visível para
 Cânula evitar “trações” inadvertidas
arterial
encostada ao
endotélio do
Ventrículo
esquerdo

Obstrução
(dobra, presença
de coágulos,
posicionamento)

Fonte: Adaptado pelos autores

138 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Substituir segmento

Fonte: Adaptado pelos autores

Substituir circuito completo

Fonte: Adaptado pelos autores

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 139
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

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tions in Acute and Critical Care. A
Thinking-in-Action Approach (2ª ed.).
New York: Springer Publishing Com-
pany, LLC.

2 Mossadegh, C.; (2017). Chapter 5:


Monitoring the ECMO in Nursing Care
and ECMO. Spring International
Publishing Switzerland. ISBN 978-3-
-319-201009.

140 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

9. Outcomes do suporte
de vida extracorporal:
follow-up da pessoa
e família pós-ECMO
A
o longo dos anos temos assisti- dade de vida dos sobreviventes.
do a uma alteração no paradig-
ma da saúde, sendo crescente Até recentemente o foco de atenção
a preocupação em implementar medi- dos cuidados prestados á pessoa
das que avaliem, não só o impacto da dependente de suporte ECMO esteve
doença e o compromisso nas ativida- relacionado com a sua sobrevivência
des de vida diárias, mas sobretudo a ao próprio suporte extracorporal e com
qualidade de vida relacionada com a o sucesso do seu desmame/descanula-
saúde. Os tradicionais indicadores de ção. Efetivamente, a complexidade
mortalidade e morbilidade revelam-se envolvente e as características deste
insuficientes quando se pretende suporte como técnica de resgate e de
analisar a qualidade dos cuidados último recurso podem ter contribuído
centrados nas pessoas e no seu para uma maior preocupação com as
bem-estar a longo prazo. Neste senti- consequências imediatas da sua
do, têm surgido vários instrumentos de utilização em detrimento das implica-
avaliação da qualidade de vida relacio- ções a longo termo na vida das pesso-
nada com a saúde, embora sejam ainda as. Assim sendo, apesar da comprova-
escassos os resultados de evidência da eficácia na sobrevida das pessoas,
decorrentes da sua aplicação. pouco se sabe sobre o impacto do
suporte extracorporal na sua qualida-
A duração do suporte de ECMO pode de de vida após a alta hospitalar.
ser bastante variável, sendo propícia a
ocorrência de múltiplas complicações Estudos recentes1,2,3 de follow-up em
neste período. Os efeitos nefastos adultos submetidos a ECMO VV
destas intercorrências encontram-se referem taxas de sobrevida (6 a 12
bem caracterizados a curto prazo, mas meses após a alta) superiores a 60%,
pouco se conhece sobre a sua reper- sendo que, nos casos de ECMO VA,
cussão a médio-longo prazo na quali- outros estudos4 demonstram (num

142 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

período alargado de 1 a 10 anos após com resultados semelhantes em todas


alta) uma sobrevida compreendida as faixas etárias6. De uma forma geral,
entre 17% e 40%. No caso da idade os poucos dados de evidência existen-
neonatal e pediátrica, esta modalidade tes têm demonstrado melhores outco-
de suporte tem demonstrado5 largos mes, a longo prazo, nas situações de
benefícios, tanto a curto como a longo insuficiência respiratória em detrimen-
prazo, sem provocar sequelas incapaci- to das situações de insuficiência cardí-
tantes na maioria dos casos. No caso aca, em todas as faixas etárias. Estes
das pessoas neonatais a sua sobrevida resultados podem estar associados às
pós ECMO varia de acordo com a particularidades inerentes à utilização
doença de base, sendo que os casos de de cada uma das modalidades terapêu-
ECMO VV têm apresentado melhores ticas e às suas complicações imediatas,
resultados5 de sobrevida após a alta dada a maior complexidade na utiliza-
hospitalar (70%), em comparação com ção da ECMO VA em comparação com
os casos onde se procedeu à utilização a ECMO VV. Assim sendo, o acompa-
do suporte ECMO na modalidade VA nhamento destas pessoas ao longo dos
(45%). No caso das pessoas pediátricas anos pode contribuir para melhorar os
a sobrevida pós-ECMO é menor do que cuidados prestados durante o trata-
nos neonatais, embora alguns mento, prevenindo efeitos indesejados
estudos5 refiram existir um melhor a longo prazo. Na verdade, reconhe-
prognóstico tanto no grupo com insufi- cendo as necessidades particulares
ciência respiratória, como nas pessoas destas pessoas, a ELSO tem emitido
suportadas com ECMO por causas orientações específicas para a estrutu-
cardíacas. ração de programas de follow-up nos
centros de referência, de modo a
Num estudo de follow-up, com um melhorar os cuidados prestados a
tempo médio de seguimento de apro- estes clientes ao longo das várias
ximadamente 8 anos após a alta, faixas etárias.
realizado no Karolinska ECMO Center,
em Estocolmo, com pessoas submeti- Dados recentes têm sugerido que os
dos a ECMO VV, concluiu-se que o adultos sobreviventes à ECMO têm
maior risco de mortalidade se situava resultados de saúde adversos após a
nos meses imediatamente seguintes alta hospitalar, cursando com uma
ao suporte ECMO, sendo que, nas recuperação lenta e alto risco de
pessoas que sobreviveram mais de 3 problemas de saúde mental, tais como
meses após a alta hospitalar, 91% ansiedade, depressão e stress
encontravam-se vivos ao fim de 5 anos, pós-traumático. Já nos clientes neona-

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 143
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

tais e pediátricos as preocupações inferiores devido a complicações


mais prementes prendem-se com o durante o curso da ECMO (decorrentes
neurodesenvolvimento das crianças, essencialmente de problemas na canu-
uma vez que os compromissos neurop- lação e descanulação). De 50% dos
sicológicos em sobreviventes de ECMO participantes neste estudo, apresenta-
neonatais mostraram emergir na infân- vam ainda ao fim de 1 ano, dor ou
cia, persistindo até a adolescência7. De problemas neurológicos relacionados
acordo com a ELSO8, a preparação para com o local ou membro da canulação,
a alta dos clientes neonatais e pediátri- incluindo pé pendente. Estes resulta-
cos deve iniciar-se durante o próprio dos vão ao encontro de estudos
internamento e deve incluir a avaliação anteriores que relataram problemas
frequente do neurodesenvolvimento, a neurológicos causados por lesão do
avaliação audiológica, um exame oftal- nervo femoral em mais de 40% dos
mológico e a realização de Tomografia sobreviventes de ECMO VA, a presen-
Computorizada (TC), ou Ressonância ça de parestesias ou déficits neurológi-
Magnética Nuclear (RMN). Idealmente cos periféricos em 48% destas pesso-
esta preparação deve ser trabalhada as9, bem como dificuldades na deam-
pelo centro de ECMO com a comunida- bulação e “agachamento”, que embora
de onde a criança se insere (cuidados com prevalência superior na ECMO VA,
de saúde primários, pediatra, institui- também ocorrem em situações de
ções de educação), com ênfase na ECMO VV10. Por outro lado a imobilida-
educação e no suporte da própria de severa e a fraqueza muscular a que
família8. estas pessoas estão sujeitas, devido ao
internamento prolongado na UCI e aos
Tramm, Ilic e Sheldrake (2017)9 repor- fármacos utilizados, são também
tam, num estudo realizado com contribuidores para uma recuperação
adultos, um maior agravamento da lenta com necessidade de longos
saúde física do que da saúde mental períodos de reabilitação2,9,11. Deste
destas pessoas, embora ambas as modo, recomenda-se, ainda sob supor-
situações melhorem ao longo do te de ECMO, a mobilização precoce
tempo, tal como corroborado por destas pessoas pelos enfermeiros e o
Schmidt et al. (2013)1. De acordo com início de um programa de reabilitação
as conclusões obtidas neste estudo, direcionado a cada situação particular,
muitas pessoas recuperaram em todos com continuidade após a alta hospita-
os domínios da saúde, embora alguns lar.
tivessem graves deficiências neuroló-
gicas nas extremidades dos membros Alguns estudos direcionados para a

144 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

utilização de ECMO VV, em casos de prejuízo residual na qualidade de vida


insuficiência respiratória por ARDS, das pessoas por problemas respirató-
reportam também alterações no parên- rios tardios, após o tratamento conven-
quima pulmonar a longo prazo repre- cional nos casos de ARDS. No entanto,
sentativas de fibroses, na maioria das a avaliação dos sintomas pulmonares
pessoas. No entanto, Lindén et al. utilizando o St. George's Respiratory
(2009)3 refere que a extensão das Questionnaire (SGRQ) nas pessoas sob
anormalidades morfológicas encontra- ECMO, nos casos de ARDS grave,
das na TC foram limitadas e que a indicaram uma tendência geral para
predominância da patologia parenqui- scores mais baixos em comparação
matosa descrita anteriormente em com o relato de estudos anteriores face
pessoas com ARDS, tratados conven- ao tratamento convencional. Este
cionalmente, não foi observada no seu estudo refletiu também uma conside-
estudo (provavelmente pela utilização ração importante face à recuperação
de uma ventilação ultra protetora nas das pessoas idosas, constatando-se
pessoas submetidas a ECMO). Assim, pontuações significativamente mais
apesar de algumas pessoas relatarem altas no SGRQ, o que pode sugerir uma
"falta de ar", mesmo durante exercícios recuperação mais difícil de lesões
leves, na maioria dos estudos encon- graves nesta faixa etária.
trados não foi necessário recorrer a
Apesar dos sobreviventes de ECMO
oxigenoterapia domiciliária após a alta
poderem apresentar menor qualidade
hospitalar2,3. Schmidt et al. (2013)1
acrescenta ainda no seu estudo que de vida nos domínios físico e psicológi-
36% das pessoas relataram dispneia co na aplicação do Short-Form 36
(SF-3616) quando comparados com a
persistente à data do follow-up e que
30% estavam ainda sob utilização de população saudável10, estes compro-
medicamentos pulmonares (b2-agonis- missos são menores em pessoas com
tas de longa duração em 16 pessoas, ARDS tratados com ECMO, verifican-
do-se uma boa função física e social,
corticoides inalatórios em 7, oxigenote-
rapia domiciliar em 1 e ventilação com alta taxa de empregabilidade pós-
mecânica não invasiva noturna em 3).ECMO, segundo Lindén et al. (2009)3.
Contudo, no estudo de Hodgson et al.
De acordo com Lindén et al. (2009)3 (2012)2 os sobreviventes de ECMO a
todos os estudos mostram algum longo prazo apresentavam uma saúde

16
SF-36 instrumento de medição genérico que avalia 8 dimensões do estado de saúde: função física, desempenho físico e
emocional, dor física, saúde em geral, vitalidade, função social e saúde mental

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 145
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

física semelhante, embora com De acordo com o estudo do autor


diminuição da saúde mental, da saúde supracitado, apesar da força física e da
geral, da vitalidade e da função social condição geral das pessoas ter melho-
em comparação com outros sobrevi- rado sensivelmente cerca de seis
ventes de ARDS, obtendo um inespera- meses após a alta, as preocupações
do mau retorno ao trabalho, apenas com a perda de amigos e com a vida
com um quarto dos participantes a social limitada mantiveram-se em
regressarem à sua atividade prévia. Já alguns casos. Vários estudos têm
no estudo de Schmidt et al. (2013)1, à demonstrado que o apoio familiar tem
data do follow-up 72% das pessoas sido um elemento essencial na gestão
haviam regressado ao trabalho, sem de doenças crónicas, aumentando a
alterações das suas funções normais, moral da pessoa e, consequentemente,
sendo que Lindén et al. (2009)3 refere o seu autocuidado, tendo um impacto
uma taxa de 76% no retorno à sua muito positivo no processo de reabili-
atividade laboral. Os dados existentes tação dos mesmos10. Posto isto, a
mostram algumas contrariedades face necessidade de contato frequente das
a estas questões, sugerindo a necessi- pessoas com os serviços de saúde após
dade de realização de mais estudos e a alta, acresce um fator de stress contí-
por períodos mais alargados de follow- nuo, não só aos próprios, mas também
-up, no sentido da confirmação dos às suas famílias. É então prioritário que
mesmos. Hsieh et al. (2016)11 acrescen- os enfermeiros, durante o internamen-
ta, no entanto, que apesar da qualida- to destas pessoas, incentivem e
de de vida dos sobreviventes de ECMO eduquem os membros da família sobre
após alta ser menor que a da popula- a importância e participação no
ção média, esta pode ser melhor ou processo de reabilitação11.
semelhante à dos clientes com outras
doenças graves ou crónicas. Na perspetiva de Tramm et al. (2015)12,
as pessoas tratadas com ECMO estão
As alterações nas atividades sociais e a expostos a quase todos os fatores de
incapacidade de retornar aos níveis risco de stress pós-traumático conhe-
anteriores de trabalho, relacionadas cidos (idade precoce, história psiquiá-
com as complicações durante o trata- trica, ventilação mecânica, delirium e
mento, são fatores que acrescentam agitação, terapêutica medicamentosa).
stress físico e psicológico aos sobrevi- A esta situação acresce o facto de as
ventes de ECMO, segundo Chen et al., pessoas estarem cada vez mais cons-
201610. cientes na UCI durante o internamento,

146 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
.

G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

o que pode ter efeitos psicológicos Referências bibliográficas


positivos ou negativos, segundo este
autor. Tramm et al. (2015)12 sugere que, 1 Schmidt et al. (2013). The PRESERVE
a tentativa cada vez mais frequente de mortality risk score and analysis of
manter as pessoas em ECMO “acorda- long-term outcomes after extracorpo-
dos” (conscientes) durante o suporte real membrane oxygenation for severe
de vida, pode em si representar um acute respiratory distress syndrome.
fator de risco único nesta perspetiva, Intensive Care Medicine, 39(10), 1704-
tanto para as pessoas, como para os –1713. http://doi.org/10.1007/s00134-
seus familiares. -013-3037-2

Perante o exposto é notória a impor- 2 Hodgson, C. L., Hayes, K., Everard, T.,
tância do acompanhamento prolonga- Nichol, A., Davies, A. R., Bailey, M. J.,
do destas pessoas após a alta hospita- Pellegrino, V. (2012). Long-term quality
lar, em programas estruturados de of life in patients with acute respiratory
follow-up. A avaliação do estado de distress syndrome requiring extracor-
saúde e da qualidade de vida dos poreal membrane oxygenation for
sobreviventes de ECMO pode ajudar refractory hypoxaemia. Critical Care,
os enfermeiros a determinar interven- 16(5), R202.
ções para melhorar efetivamente a http://doi.org/10.1186/cc11811
qualidade de vida relacionada com a
saúde destas pessoas e dos seus 3 Lindén et al. (2009). ECMO in ARDS:
familiares11. De acordo com Chen et al. A long-term follow-up study regarding
(2016)10, Intervenções multidisciplina- pulmonary morphology and function
res baseadas em evidência devem ser and health-related quality of life. Acta
implementadas antes ou logo após a Anaesthesiologica Scandinavica, 53(4),
alta hospitalar no sentido de ajudar os 489–495. http://doi.org/10.1111/j.1399-
sobreviventes da ECMO nos problemas -6576.2008.01808.x
físicos, psicológicos e sociais que estes
experienciam. 4 Burrell, A. J. C., Pellegrino, V. A.,
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Kaye, D. M., & Pilcher, D. V. (2015).
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GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 147
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

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311–319.
5 Kattan, J., González, Á., Castillo, A., & http://doi.org/10.4037/ajcc2017707
Caneo, L. F. (2017). Oxigenação por
membrana extracorpórea neonatal e 10 Chen et al. (2016). Problems and
pediátrica em países emergentes da health needs of adult extracorporeal
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-behandling, (March). g.2015.12.005

7 Schiller, R. M., Madderom, M. J., 11 Hsieh, F.-T., Huang, G.-S., Ko, W.-J., &
Reuser, J. J. C. M., Steiner, K., Gischler, S. Lou, M.-F. (2016). Health status and
J., Tibboel, D., IJsselstijn, H. (2016). quality of life of survivors of extra
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e20161313–e20161313. Advanced Nursing, 72(7), 1626–1637.
http://doi.org/10.1542/peds.2016-1313 http://doi.org/10.1111/jan.12943

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https://www.elso.org/ centre study. Australian Critical Care,
Portals/0/IGD/Archive/FileMana- 28(1), 31–36.
ger/2440a82ecdcusersshyerdocu- http://doi.org/10.1016/-
mentselsorecommendationsforneonat j.aucc.2014.04.005
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9 Tramm, R., Ilic, D., & Sheldrake, J.


(2017). RECOVERY, RISKS, AND
ADVERSE HEALTH OUTCOMES IN
YEAR 1 AFTER EXTRACORPOREAL
MEMBRANE OXYGENATION. Ameri-

148 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

10. A dimensão ética


no suporte ECLS
A prestação de cuidados ás
pessoas sob suporte de vida
extracorporal prevê-se uma
situação transitória com o objetivo de
durante a sua utilização surgir condi-
ções irreversíveis que desafiam os
limites do conceito de futilidade
médica. De acordo com Williams e
recuperar as funções nativas do Dahnke (2016)3, esta situação pode
pulmão e/ou do coração, sendo cada levar os enfermeiros a experienciarem
vez mais frequente a sua utilização. sensações de frustração, de conflito
Contudo, o desenvolvimento tecno- ético e de stress moral perante o dever
científico das técnicas ECLS, tem de fornecer o tratamento solicitado e a
alterado de tal forma a prática clínica e possibilidade de favorecerem interven-
melhorado os outcomes das pessoas, ções não benéficas ou mesmo prejudi-
que as suas indicações clínicas se têm ciais ás pessoas (como aquelas que
expandido continuamente, tornando causam deterioração do corpo,
muito ténue a linha que separa a sua descompensação dos sistemas ou que
utilização como tratamento standard decorrem das complicações inerentes
do tratamento experimental1. Posto à técnica: hemorragia, tromboembolis-
isto, várias questões éticas têm emer- mo, infeção, disfunção neurológica,
gido no que diz respeito às indicações, entre outras descritas em capítulos
duração e remoção deste tipo de anteriores).
suporte. Questões estas que decorrem
muitas vezes da extrema emergência Por outro lado, com a crescente utiliza-
do início da técnica, da ambiguidade ção deste suporte em emergências,
do resultado, assim como da falta de como nos casos de paragem cardior-
clareza sobre a direção do tratamento respiratória (PCR), a urgência no início
pretendido (ponte para recuperação, da técnica pode conduzir a situações
ponte para transplante ou para apoio em que a ECMO se torna uma “ponte
mecânico ao longo da vida)2. para lugar nenhum”, mantendo a
pessoa viva ainda que sem aspiração a
No caso da ECMO, as pessoas estão uma recuperação ou a transplantação4.
sob risco de vida iminente e, apesar Tal desafio ético tem implicações
deste suporte ser life saving, não é óbvias tanto para a pessoa, como para
garantia de sobrevivência, podendo a sua família, para os profissionais de

150 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

saúde, para o hospital e para o próprio Makdisi, 2017, p. 65)2”.


sistema de saúde4.
Posto isto, a existência de guidelines
De acordo com a ELSO (2017, p.26) “a referentes à suspensão do suporte
5

ECLS deve ser descontinuada imedia- extracorporal2 e a consulta frequente


tamente se não houver esperança de de comités de ética durante a presta-
sobrevivência saudável (dano cerebral ção de cuidados a estas pessoas6 são
grave, ausência de recuperação do estratégias sugeridas na literatura
coração ou do pulmão e nenhuma recente que podem ajudar a mitigar
esperança de reposição de órgãos por estas questões e a minimizar o
DAV ou transplante),” sendo que a sofrimento moral dos profissionais
possibilidade de suspensão da técnica envolvidos na prestação de cuidados a
por futilidade deve ser explicada aos estas pessoas e às suas famílias.
familiares, preferencialmente antes do
início da mesma. Assim sendo, torna-se Encontramo-nos, cada vez mais, numa
primordial envolver a família em todo o era em que a evolução tecnológica se
processo, esclarecendo antecipada- insurge rapidamente, deixando-nos
mente as metas, a duração, as expecta- pouco tempo para refletir sobre as
tivas, os planos estratégicos de saída e implicações que as novas tecnologias
os resultados funcionais aceitáveis podem inferir no cuidado humano,
após a remoção do suporte ECLS2. É nomeadamente no que concerne às
também essencial que a própria equipa pessoas, aos seus familiares e aos
de saúde esteja preparada para próprios profissionais de saúde.
reconhecer a futilidade do suporte, Enquanto enfermeiros especialistas,
sendo que, quando confrontados com com competências específicas do
esta situação, podem surgir vários domínio da responsabilidade profissio-
problemas éticos, “incluindo questões nal, ética e legal7, compete-nos discutir
de autonomia e autoridade apropriada estas questões do cuidado á pessoa
para a tomada de decisão, a determina- sob técnicas ECLS junto das equipas
ção do dano versus bem proporciona- de saúde em que estamos inseridos.
do pelo tratamento, o conceito difícil e Impera assim nestas questões, que o
incerto de futilidade médica, questões enfermeiro tenha bem presente na sua
de justiça social relacionadas com o ação o código deontológico, no respei-
possível desperdício de recursos to pelos direitos das pessoas e do seu
humanos e materiais e o sofrimento dever perante a profissão.
moral por parte daqueles que prestam
assistência fútil percebida (Makdisi & É certo que os desafios éticos relativos

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 151
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

à utilização do suporte ECLS não são Referências bibliográficas


únicos. Cada novo dispositivo médico
ou tecnologia que surge gera debates 1 Kirsh, R., & Clark, J. (2017). The Ethics
relativos à sua aplicação, utilização of ECLS. Em T. Brogan, L. Lequier, R.
prolongada e eventual desenvolvimen- Lorusso, G. MacLaren, & G. Peek, Extra-
to de modalidades crónicas1. As técni- corporeal Life Suport: The ELSO Red
cas ECLS continuam em expansão Book (5ª Edição) (pp. 781-790). Ann
crescente e, consequentemente, a Arbor, Michigan: Extracorporeal Life
desafiar as nossas habilidades face a Support Organization.
questões quanto à obtenção do
consentimento informado, à determi- 2 Makdisi, T., & Makdisi, G. (2017).
nação dos melhores interesses da Extra corporeal membrane oxygena-
pessoa, à gestão da tomada de decisão tion support: ethical dilemmas. Annals
partilhada e à promoção de cuidados of Translational Medicine, 5(5), 112–112.
em fim de vida de elevada qualidade. http://doi.org/10.21037/atm.2017.01.38
Posto isto, recomenda-se a discussão
contínua destas situações no dia-a-dia 3 Williams, S. B., & Dahnke, M. D. (2016).
do cuidado ás pessoas e aos seus Clarification and Mitigation of Ethical
familiares. Problems Surrounding Withdrawal of
Extracorporeal Membrane Oxygena-
tion, 36(5), 56–66.

4 Abrams, D. C., Prager, K., Blinderman,


C. D., Burkart, K. M., & Brodie, D. (2014).
Ethical dilemmas encountered with the
use of extracorporeal membrane
oxygenation in adults. Chest, 145(4),
876–882.
http://doi.org/10.1378/chest.13-1138

5 Extracorporeal Life Support Organi-


zation. (1997). ESLO Recommenda-
tions for follow-up for ECMO patients.
Obtido de https://www.elso.org/
Portals/0/IGD/Archive/File
Manager/2440a82ecdcusersshyerdo-
cumentselsorecommendationsfor

152 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

neonatalpediatricecmopatientfollowu-
p.pdf

6 Courtwright, A. M., Robinson, E. M.,


Feins, K., Carr-Loveland, J., Donahue,
V., Roy, N., & McCannon, J. (2016).
Ethics committee consultation and
extracorporeal membrane oxygena-
tion. Annals of the American Thoracic
Society, 13(9), 1553–1558. http://doi.or-
g/10.1513/AnnalsATS.201511-757OC

7 Regulamento n.º 140/2019 - Regula-


mento das Competências Comuns do
Enfermeiro Especialista. Diário da
República, 2.ª série — N.º 26 — 6 de
fevereiro de 2019, pág. 4744-4750.
Obtido de https://www.ordemenfer-
meiros.pt/me-
dia/10778/0474404750.pdf

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 153
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS
CUIDADOS À PESSOA EM SITUAÇÃO
CRÍTICA DEPENDENTE DE SUPORTE
EXTRACORPORAL DE VIDA:
UM DESAFIO PARA
A PRÁTICA ESPECIALIZADA
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

11. Um modelo assistencial


da pessoa em situação de
ECMO/ECLS
C om o progresso verificado na
técnica e nas componentes mais
biocompatíveis com sistemas
miniaturizados, compactos e portáteis,
de cuidados a estas pessoas, iniciou-se
em Portugal, o processo de candidatu-
ra para obtenção de reconhecimento,
como centro de referência, pelo Minis-
a expansão da ECMO tornou-se óbvia e tério da Saúde, a 22 de dezembro de
a hipótese de referenciar e resgatar a 2016 emitido pelo aviso nº 15955-
pessoa de forma segura e em tempo -D/2016 divulgado no Decreto-Lei nº
útil para centros especializados 244/20162. As candidaturas tiveram de
tornou-se mandatória. Segundo obedecer a todos os critérios incluídos
Roncon (2017) por ser uma técnica de
1
na Portaria nº194/2014, alterado pelo
tratamento complexa, que envolve 3º artigo da Portaria nº195/2016 de 19
riscos e custos elevados é do consenso de julho e 52/2017, de 2 de fevereiro3.
da comunidade científica internacional De referir que, centro de referência “é
que os pacientes submetidos a ECMO qualquer serviço, departamento ou
devam ser tratados/transferidos para unidade de saúde reconhecido como o
Centros de referência/especializados, expoente mais elevado de competên-
que possuam uma equipa multidiscipli- cia na prestação de cuidados de saúde
nar diferenciada com uma casuística de elevada qualidade em situações
significativa de casos, de forma a que a clínicas que exigem uma concentração
segurança da pessoa seja preservada, de recursos técnicos e tecnológicos
existindo uma otimização dos recursos altamente diferenciados, de conheci-
inerentes à técnica em questão. mento e experiência, devido à baixa
prevalência da doença, à complexidade
11.1 Centros de suporte ECMO: Reali- no seu diagnóstico ou tratamento e/ou
dade portuguesa aos custos elevados da mesma, sendo
capaz de conduzir formação pós-gra-
Com a necessidade imperiosa de criar duada e investigação científica nas
centros de referênciana na área do respetivas áreas médicas”4. Foram
suporte ECMO, com o objetivo de oficialmente reconhecidos pelo Minis-
melhorar os outcomes e a excelência tério da Saúde, no Despacho

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 155
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

6669/2017 do Diário da República nº através do Despacho nº 9063/20176.


148/2017 de 2 de agosto5, o Centro No sentido de aumentar o número de
Hospitalar de São João, E. P.E, Centro órgãos disponíveis para transplanta-
Hospitalar Lisboa Central, E.P.E e o ção e, consequentemente, o número de
Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. transplantes em Portugal, foi alargado
No entanto, não foi necessário esperar este projeto ao Centro Hospitalar e
por este reconhecimento para que as Universitário de Coimbra, E. P. E. a
entidades competentes reconheces- partir do dia 2 de janeiro de 2019, pelo
sem esta técnica como vanguarda em Despacho n.º 9731/20187.
vários cenários, sendo uma área emer-
gente na medicina pré e intra-hospita- Perante o exposto, é necessário conti-
-lar. Em outubro de 2016 foi apresenta- nuar a investir em políticas de saúde
do um projeto-piloto destinado a que permitam uma maior expressão
melhorar a capacidade de resposta à nacional na utilização da ECMO, nos
paragem cardiorrespiratória (PCR) seus diversos propósitos, garantindo,
refratária e à ressuscitação avançada no entanto, uma assistência de exce-
assistida por ECMO, assim como à lência, tal como a praticada nos centros
otimização da doação de órgãos em de referência.
PCR não controlada, que resultou de
um protocolo assinado entre o Institu- 11.2 O processo de formação das
to Português do Sangue e Transplanta- equipas de ECLS
ção, o Centro Hospitalar São João e o
Instituto Nacional de Emergência Os procedimentos associados às ECLS
Médica. Este projeto visou a criação de são tecnicamente complexos, de alto
uma área de integração da emergência risco, dependentes de múltiplos recur-
pré-hospitalar com um centro de sos e imprevisíveis em termos de
ECMO, neste caso do Centro Hospitalar volume e de tempo. Assim sendo, para
São João, na assistência à PCR extra- garantir a excelência na prestação de
-hospitalar refratária. Um ano após a cuidados é necessária a existência de
sua implementação, os resultados estratégias institucionais efetivas que
superaram as previsões iniciais de uma garantam a qualidade, segurança e
forma bastante positiva e este tipo de eficácia destas técnicas, sendo para tal
colheita de órgãos passou a fazer fundamental a existência de um
parte, não só da atividade hospitalar programa de treino e formação bem
desta instituição, mas também do delineado para as equipas de ECLS8.
Centro Hospitalar Lisboa Central e do
Centro Hospitalar Lisboa Norte, A ELSO (2010)9 enquanto entidade de

156 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

referência mundial nesta área, tem o treino de procedimentos de emer-


emitido guidelines referentes os gência e resolução de complicações,
programas de treino e formação que os assim como os cuidados à cabeceira
centros de ECMO devem desenvolver das pessoas de modo a garantir a
para garantir a qualidade dos cuidados segurança e qualidade dos mesmos. As
prestados às pessoas e aos seus guidelines da ELSO recomendam que
familiares. Não obstante, é sugerido os especialistas em ECMO sejam anual-
por esta entidade que estas guidelines mente submetidos a um exame escrito
sejam adaptadas a cada uma das ou oral, onde seja avaliado não só o
realidades institucionais. Recentemen- conhecimento, mas também as compe-
te, em Portugal, o programa de candi- tências técnicas e comportamentais.
datura ao reconhecimento dos centros Devem também ser detentores de uma
de referência para a área de ECMO, certificação institucional.
pelo Ministério da Saúde, exigiu a
existência de um Programa de Forma- No seguimento destas recomendações,
ção sólido, com início numa certificação os planos de formação de cada centro
inicial, sujeita a um processo de recerti- devem garantir não só uma formação
ficação periódica da equipa de ECMO, inicial, mas também a formação contí-
para que os centros fossem reconheci- nua das suas equipas. A existência de
dos como tal. reuniões de equipa formais que inclu-
am: revisão de casos, atualizações
De acordo com a ELSO9, os programas sobre os tratamentos, garantia da
de formação devem contemplar cursos qualidade, revisão da política e dos
didáticos multiprofissionais (em sala procedimentos em curso, assim como
de aula, com a duração de 24 a 36h) discussão de questões administrativas,
seguidos de sessões de treino e/ou são também promotoras da formação
sessões de laboratório, sendo que as contínua dos profissionais. Segundo a
sessões de simulação constituem uma ELSO, a periodicidade destas reuniões
excelente ferramenta para ensino, deve estar de acordo com o tamanho
aquisição e manutenção das compe- das equipas e com o volume de pesso-
tências necessárias para gerir as técni- as tratados em cada centro.
cas ECLS8. De um modo geral, é
recomendado que os cursos de ECMO De acordo com a ELSO, os programas
incluam nos seus principais tópicos a formativos devem ter por base os
revisão dos equipamentos necessários, princípios inerentes à formação de

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 157
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

adultos e a pirâmide de Miller17 para a


ECMO. Em Portugal, segundo o Aviso
avaliação de competências clínicas, de
n.º 15955-D/20162, a equipa de ECMO
modo a diferenciar os vários níveis de
deverá ser multiprofissional, detendo
iniciado a perito na prestação de cuida-
na sua constituição médicos, enfermei-
dos as pessoas submetidas a técnicas
ros e perfusionistas com capacidade de
ECLS. ação 24h/7 dias, tal como o preconiza-
do também pela ELSO. Assim, no caso
11.3 A Função do enfermeiro na dos enfermeiros, considera-se premen-
equipa ECLS te a existência de:

Embora cada centro de suporte ECMO Enfermeiro de UCI: Deverá ser um


possa desenvolver um modelo assis- enfermeiro com competência no cuida-
tencial organizacional próprio, o enfer- do ao doente crítico, detentor de uma
meiro representa sempre um papel formação base específica em ECLS,
fundamental na prestação de cuidados com objetivo de prestar cuidados à
a estas pessoas e aos seus familiares. cabeceira da pessoa e família, estando
Os aspetos relacionados com a segu- apto a agir prontamente em caso de
rança da pessoa têm sido o foco princi- intercorrências/complicações relacio-
pal do desenvolvimento tecnológico nadas com a pessoa e/ou equipamento
associado á pessoa ECLS e, neste do suporte ECMO.
seguimento, os enfermeiros têm vindo
a ser incentivados a desenvolverem Enfermeiro Especialista com compe-
competências e responsabilidades não tência em ECLS: Deverá ser detentor
só no cuidado direto ao cliente e do Título de Enfermeiro Especialista
familiares, mas sobretudo na monitori- em Enfermagem Médico-Cirúrgica ou
zação dos equipamentos e na preven- Saúde Infantil e Pediátrica, com experi-
ção de complicações associadas aos ência na prestação de cuidados diários
mesmos. às pessoas em ECLS, por mais de 1 ano.
O seu percurso formativo deverá ser
Podemos então considerar que, de realizado em Centros de Referência
acordo com as competências adquiri- certificado pela DGS, num período
das, o enfermeiro pode desempenhar compreendido entre 3 a 6 meses. Além
diferentes papéis dentro da equipa de das competências gerais e específicas

17
A Pirâmide de Miller é um modelo conceitual que ilustra as bases cognitivas (“saber” e “saber como fazer”) da prática
profissional (“fazer”) e a necessidade da avaliação de habilidades e competências práticas (“mostrar como faz”), especialmente
interessante nas áreas clínicas. Ferramenta importante para o desenvolvimento de métodos de construção do conhecimento e
de avaliação, bem como, para a construção de objetivos de aprendizagem9.

158 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

do Enfermeiro Especialista, o enfermei- Referência bibligráficas


ro com competência em ECMO deverá:
gerir o circuito extracorporal, nomea- 1 Roncon, Roberto. (14 de Novembro de
damente no que concerne à vigilância 2017). Centro Hospitalar São João.
regular do circuito e à monitorização Obtido de http://portal-chsj.min-sau-
dos gases pré e pós-oxigenador; de.pt: http://portal-chsj.min-saude.pt/-
garantir condições de segurança junto frontoffice/pages/16?news_id=455
da pessoa durante o transporte inter e
intra hospitalar; atuar eficientemente 2 Aviso nº 15955-D/2016 de 22 de
em emergências decorrentes de altera- Dezembro de 2016. Diário da República
ções no circuito; participar nos proce- n.º 244/2016, 1º Suplemento, Série II.
dimentos de canulação, descanulação Número:15955-D/2016. Páginas: 37268-
e troca de circuitos; integrar a equipa -(8) a 37268-(9). DireçãoGeral da
de resgate, fazendo a ligação com o Saúde. Lisboa. [online] Disponível na
hospital de origem da pessoa; assumir Internet via https://dre.pt/application/
um papel de formador junto da equipa conteúdo/105600013. Arquivo captu-
de enfermagem da UCI; rado em 25 de Novembro de 2018.

Enfermeiro Coordenador: Enfermeiro 3 Portaria nº194/2014 de 30 de Setem-


Especialista na área Médico-Cirúrgica bro de 2014 alterado pelo 3º artigo da
ou Saúde e Pediátrica, com competên- Portaria nº195/2016 de 19 de julho e
cia em ECLS, que juntamente com o 52/2017 de 02 de Fevereiro. Diário da
Coordenador Médico, garantem a República n.º 24/2017, Série I. Núme-
operacionalização do programa de ro:52/2017. Páginas: 655-656. Ministé-
técnicas ECLS. Assume, corresponsabi- rio da Saúde. Lisboa. [online] Disponí-
lidade na elaboração do programa de vel na Internet via https://dre.pt/appli-
formação do centro de ECLS, garantin- cation/conteudo/106388652. Arquivo
do a formação contínua e avaliação da capturado em 25 de Novembro de
equipa de enfermagem com compe- 2018.
tência em ECLS, bem como junto dos
enfermeiros da UCI que prestam cuida- 4 Serviço Nacional de Saúde. (6 de
dos às pessoas e família sob suporte de Outubro de 2016). Serviço Nacional de
vida extracorporal. Deverá acrescentar Saúde. Obtido de https://www.sns.go-
às suas responsabilidades a promoção v.pt: https://www.dgs.pt/qualidade-e-
da investigação dos cuidados de enfer- -seguranca/reconhecimento - da-
magem às pessoas e família sob técni- -qualidade/centros-de-referencia.aspx
cas ECLS.

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 159
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

5 Despacho 6669/2017 de 02 de Michigan: Extracorporeal Life Support


Agosto de 2017. Diário da República n.º Organization.
148/2017, Série II. Número:6669/2017.
Páginas: 16069-16070. Ministério da 9 Extracorporeal Life Support Organi-
Saúde. Lisboa. [online] Disponível nazation. (2010). ELSO Guidelines for
Internet via https://dre.pt/application/-
Training and Continuing Education of
conteudo/107794486. Arquivo captu- ECMO Specialists version 1.5. Obtido
rado em 25 de Novembro de 2018. de www.elso.org: https://www.elso.or-
g/Portals/0/IGD/Archive/FileMana-
6 Despacho nº 9063/2017 de 13 de ger/97000963d6cusersshyerdocumen
outubro de 2017. Diário da República tselsoguidelinesfortrainingandcontinui
n.º 198/2017, Série II. Núme- ngeducationofecmospecialists.pdf
ro:9063/2017. Páginas: 23343–23344.
Gabinete do Secretário de Estado 10 Panúncio-Pinto MP; Troncon LEA.
Adjunto e da Saúde. Lisboa. [online] (2014). Avaliação do estudante – aspe-
Disponível na Internet via https://- tos gerais Student assessment – gene-
dre.pt/application/ conteu- ral aspects. Medicina (Ribeirão Preto)
do/108298260. Arquivo capturado em 2014;47(3): 314-23.[online] Disponível
25 de Novembro de 2018. na Internet via http://revista.fmrp.us-
p.br/2014/vol47n3/10_valiacao-does-
7 Despacho n.º 9731/2018 de 17 de tudante-aspectos-gerais.pdf. Arquivo
outubro de 2018. Diário da República capturado em 15 de Fevereiro de 2019.
n.º 200/2018, Série II. Número:
9731/2018. Páginas: 27896–27897.
Gabinete do Secretário de Estado
Adjunto e da Saúde. Lisboa. [online]
Disponível na Internet via https://-
dre.pt/application/ conteu-
do/116696237. Arquivo capturado em
25 de Novembro de 2018.

8 Ogino, M., Froehlich, C., & Moore, E.


(2017). Education and Training. Em T.
Brogan, L. Lequier, R. Lorusso, G.
MacLaren, & G. Peek, Extracorporeal
Life Support: The ELSO Red Book (5ª
Edição) (pp. 747-764). Ann Arbor,

160 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
CONCLUSÕES Guia Orientador
de Boas Práticas –
Cuidados à pessoa em
situação crítica
dependente de
suporte extracorporal
de vida: um desafio
para a prática
especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

A ECMO constitui assim uma


técnica de suporte de vida
extracorporal, internacional-
mente consagrada pela ELSO. Esta
possibilidade de colheita de órgãos
para transplantação em dadores em
PCC não controlada, tanto a nível intra-
-hospitalar como no extra-hospitalar,
técnica significa suporte cardiopulmo- levando à implementação de vários
nar temporário permitindo que o programas de transplantação em
coração e/ou o pulmão recuperem de dadores de PCC em vários países da
uma situação reversível perante o europa, nomeadamente em Portugal19.
insucesso dos tratamentos convencio-
nais e na perfusão de órgãos destina- Com o progresso verificado, tornou-se
dos a transplantação18. óbvia e mandatória a hipótese de
referenciar e resgatar a pessoa de
A necessidade de aumentar o número forma segura e em tempo útil para
de dadores levou à implementação de centros especializados/referência que
programas de transplantação com possuam uma equipa multidisciplinar
DPCC em vários países Europeus e em diferenciada com uma casuística signi-
Portugal também é uma realidade com ficativa de casos, de forma, a seguran-
a Operacionalização do Programa de ça da pessoa seja preservada, existin-
Colheita de Órgãos em Dadores em do uma otimização dos recursos
Paragem CardioCirculatória19. inerentes à técnica em questão.

A E-CPR assume um suporte importan- O EEEMC faz parte desta resposta e a


te como técnica de RCR avançada sua intervenção deve ser igualmente
quando as medidas de reanimação consistente e competente, baseada na
padronizadas não são bem-sucedidas evidência científica produzida. De
e não se consegue reverter os sinais de acordo com as competências adquiri-
vida da pessoa. Esta técnica substitui a das, o enfermeiro pode desempenhar
função cardíaca e pulmonar, total ou diferentes papéis dentro da equipa
parcialmente, na possibilidade de multidisciplinar de ECMO. Assim, no
proporcionar tempo para o tratamento caso dos enfermeiros, considera-se
da sua patologia primária que originou premente a existência de um EEEMC
a PCR18,19. com competência em ECLS, porque os
procedimentos associados à ECLS são
Nos últimos anos, têm crescido as tecnicamente complexos, de alto risco,
indicações para transplante, com a dependentes de múltiplos recursos e
consequente necessidade de mais imprevisíveis em termos de volume e
órgãos, assim este suporte, abre a de tempo. Assim sendo, para garantir a

162 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

excelência na prestação de cuidados á de conhecer continuamente a situação


pessoa e sua família é necessária a da pessoa alvo de cuidados, de prever
existência de estratégias institucionais e detetar precocemente as complica-
efetivas que garantam a qualidade, ções, de assegurar uma intervenção
segurança e eficácia destas técnicas, precisa, concreta, eficiente e em tempo
sendo para tal fundamental a existên- útil”.
cia de um programa de treino e forma-
ção bem delineado para os EEEMC, Assim, o propósito de elaborar este
EEESIP e ECECLS. guia, foi contribuir para o aprofunda-
mento de conhecimentos técnicos e
Segundo o Parecer MCEEMC 10 / 2017, científicos, no âmbito do Suporte
página 2, “os cuidados de enfermagem Extracorporal de Vida, habilitando os
à pessoa em situação crítica são cuida- EEEMC, EEESIP e ECECLS para uma
dos altamente qualificados, prestados prática de cuidados mais segura e
de forma contínua à pessoa com uma eficiente, significando isso, desenvol-
ou mais funções vitais em risco imedia- ver competências e responsabilidades
to, como resposta às necessidades nos cuidados mais adequados às
afetadas e permitindo manter as necessidades da pessoa em situação
funções básicas de vida, prevenindo crítica em suporte de ECLS e sua
complicações e limitando incapacida- família, mas também, desenvolver um
des, tendo em vista a sua recuperação modelo assistencial e organizacional
total. Estes cuidados de enfermagem próprio, na monitorização dos equipa-
exigem observação, colheita e procura mentos que envolve este suporte e na
contínua, de forma sistémica e siste- prevenção de complicações associadas
matizada de dados, com os objetivos aos mesmos e á pessoa.

18
ELSO (Extracorporeal Life Support Organization. (2010). Guidelines for Training and Continuing Education of ECMO
Specialists version 1.5. [online] Disponível na Internet via https://www. elso.org/Portals/0/IGD/Archive/FileMana-
ger/97000963d6cusersshyerdocumentelsoguidelinesf ortrainingandcontinuingeducationofecmospecialists.pdf. Arquivo
capturado em 25 de novembro de 2018.
19
Coimbra, N. & Amaral, T. (2016). Acompanhamento de Enfermeiro no Transporte Primário do Doente Critico. Revista Nursing,
Fevereiro, p.1OPCODPCC (2014) - Operacionalização do Programa de Colheita de Órgãos em Dadores em Paragem CardioCircu-
latória. Instituto Português do Sangue e da Transplantação, IP [online] Disponível na Internet via http://www.ipst.pt/files/-
TRANSPLANTACAO/Paragem_Cardiocirculatoria.pdf Arquivo capturado em 25 de Novembro de 2018.

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 163
ANEXOS Guia Orientador
de Boas Práticas –
Cuidados à pessoa em
situação crítica
dependente de
suporte extracorporal
de vida: um desafio
para a prática
especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Fórmulas de cálculo

Teor de O2 arterial

Teor de O2 venoso

Relação O2 art /ven (quantidade de O2 utilizado)

Distribuição de O2

Simplificando

Consumo de O2

Simplificando

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 165
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Recursos humanos e materiais Anestesia (conforme indicação do


necessários à canulação anestesista)
• Analgesia
Recursos Humanos • Sedação
• 2 médicos • Curarização
• 2 enfermeiros
• 1 profissional de ECMO (enfermeiro Heparina
ou perfusionista)
Equipamento do sistema extracor-
Recursos Materiais poral
Mesa cirúrgica: • Circuito
• Caixa de ferros para colocação de • Membrana permutadora de gases
cateter por desbridamento (se • Consola
aplicável) • Permutador de calor
• Cânula de acesso (venosa) e cânula • Bomba manual de emergência
de retorno (arterial) - conforme • 4 clampes metálicos
indicação médica • Equipamento de ACT (depende de
• Panos cirúrgicos cada centro/serviço ECMO)
• Campos com buraco
• Kit de pensos Material de execução de penso
• Compressas esterilizadas • Kit de pensos
• Clorohexidina 2% • Compressas esterilizadas
• 2 seringas de 50 ml • Soro fisiológico
• Seringas (2, 5, 10, 20 ml) • Clorohexidina
• Soro fisiológico • Penso de pelicula transparente
• Linhas de sutura (conforme indica- • Tesoura ou lâmina de bisturi esterili-
ção médica) zados

Equipamento de Proteção Individual


(EPI)
• Batas esterilizadas
• Luvas esterilizadas (vários tama-
nhos)
• Toucas cirúrgicas
• Máscaras cirúrgicas

166 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Confusion assessment method for


the ICU (CAM-ICU)

Fonte: Disponível:https://www.icudelirium.org/
medical-professionals/downloads/resources-by-category

GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada | 167
G U I A O R I E N TA D O R D E B O A S P R ÁT I C A S

Recursos humanos e materiais FemoStop® (se aplicável)


necessários na descanulação • Adesivo de compressão (se aplicá-
vel)
Recursos Humanos
• 2 médicos
• 2 enfermeiros
•1 profissional de Ecmo (enfermeiro ou
perfusionista)

Recursos Materiais

Mesa cirúrgica:
• Caixa de ferros para colocação de
cateter por desbridamento (se
aplicável)
• Kit de pensos
• Compressas esterilizadas
• Clorohexidina 2%
• Linhas de sutura (conforme indica-
ção médica)

Equipamento de Proteção Individual


(EPI)
• Batas esterilizadas
• Luvas esterilizadas (vários tama-
nhos)
• Toucas cirúrgicas
• Máscaras cirúrgicas

Material para execução de penso


• Kit de pensos
• Clorohexidina 2%
• Compressas esterilizadas
• Penso de pelicula transparente
• Perclose ProGlide®;
• Sistema de contenção vascular com
controlo de pressão-compressor

168 | GOBP – Cuidados à pessoa em situação crítica dependente de suporte extracorporal de vida: um desafio para a prática especializada
GUIA ORIENTADOR
DE BOAS PRÁTICAS

EM SITUAÇÃO
CRÍTICA
DEPENDENTE
DE SUPORTE
EXTRACORPORAL
DE VIDA:
Um desafio para
a prática
especializada

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