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Texto revisto e atualizado da Lição proferida no âmbito das Provas Públicas de avaliação da competência

pedagógica e técnico-científica para a categoria de Professor Coordenador na área disciplinar de Enfermagem de


Saúde Mental e Psiquiatria, ao abrigo do nº 5 do artigo 8º-A da Lei nº 7/2010, de 13 de Maio, dando cumprimento
ao indicado na alínea b) do ponto 1 do Artigo 7º do Regulamento de Provas Públicas previstas na Lei nº 7/2010 de
13 de Maio, aprovado pela Presidente da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, pelo seu Despacho nº 42 de
10/10/2014.

[Atraia a atenção do seu leitor colocando uma boa citação


no documento ou utilize este espaço para enfatizar um
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ÍNDICE

Introdução .................................................................................................................................................... 1
Cap. 1 - Enquadramento sociopolítico e legal .............................................................................................. 3
Cap. 2 – Conceitos relacionados com a reabilitação psicossocial ................................................................ 7
Doença Mental Grave (DMG) ................................................................................................................... 7
Modelo de vulnerabilidade-stress .......................................................................................................... 11
Recovery e Empowerment ..................................................................................................................... 13
Emprego e educação apoiados ............................................................................................................... 16
Habitação apoiada .................................................................................................................................. 19
Cap. 3 – O Terapeuta de Referência – objetivos, funções e competências ............................................... 21
Cap. 4 – O Enfermeiro como Terapeuta de Referência .............................................................................. 31
Considerações finais ................................................................................................................................... 43
Bibliografia.................................................................................................................................................. 45
INTRODUÇÃO

A figura do Terapeuta de Referência surgiu explicitamente preAAvista, pela primeira vez


em Portugal, no Plano Nacional de Saúde Mental (PNSM) 2007–2016. Indo ao encontro
desse modelo de prestação de cuidados, que há várias décadas se considera standard
care em diversos países, já em 2011 essa figura foi contemplada no Regulamento das
Competências do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental (D.R.,
2011). No ano seguinte, e no âmbito da Reatualização do PNSM, foi preconizada, ‘no
caso das doenças mentais graves, a generalização do modelo de Terapeuta de
Referência’ (DGS, 2012: 48). Mais recentemente, a Resolução da Assembleia da
República nº 213/2017 recomendou ao Governo o reforço das respostas do Serviço
Nacional de Saúde na área da saúde mental em Portugal incluindo, na alínea e) do seu
ponto 2, a criação ou o reforço de ‘equipas multidisciplinares e terapeutas de referência’,
enquanto na alínea f) de recomenda a criação ou reforço de ‘equipas comunitárias de
saúde mental de apoio aos utentes e cuidadores’.

Na prática, porém, constata-se ainda alguma indefinição acerca dos objetivos e das
funções deste modelo de organização dos cuidados, o que decerto tem contribuído para
o seu reduzido nível de implementação nos serviços de saúde mental em Portugal.

Por outro lado, e atendendo à natureza das dificuldades e do impacto da doença mental
grave no indivíduo, na família e na sociedade, é já há várias décadas reconhecido, a nível
internacional, que as capacidades e competências profissionais necessárias no trabalho
de gestão de caso, e como Terapeuta de Referência, se enquadram completamente no
objecto e nos focos de atenção do enfermeiro, e em particular no âmbito das
competências do enfermeiro especialista em Saúde Mental e Psiquiatria.

Assim, e como objetivos deste documento, foram definidos os seguintes:

- Sensibilizar e habilitar os enfermeiros especialistas para o desenvolvimento de


actividades numa perspectiva de continuidade de cuidados em contexto comunitário,
nomeadamente no que respeita à gestão de casos como terapeutas de referência no

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âmbito do Programa integrado para Doentes Mentais Graves, conforme o definido no
Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 (com extensão a 2020).

- Contribuir para a análise e planeamento estratégico de serviços e cuidados, com base


nos resultados da evidência científica, e tendo em vista a adequação dos cuidados às
necessidades específicas das pessoas com doença mental grave em contexto
comunitário.

Assim, será apresentado o enquadramento sociopolítico e legal da figura do Terapeuta


de Referência no âmbito do sistema de cuidados de saúde mental, seguindo-se a revisão
de alguns conceitos científicos atuais relacionados com o tratamento e recuperação de
pessoas com doença mental grave em contexto comunitário. Serão depois analisados e
discutidos diversos aspectos relacionados com os objetivos, funções, e competências
necessárias na gestão de casos por Terapeuta de Referência, com base em múltiplas
experiências, a nível internacional, ao longo das últimas décadas. Conclui-se com uma
reflexão acerca de como a figura do Terapeuta de Referência se relaciona com o papel
dos enfermeiros especialistas na promoção da autonomia e recuperação das pessoas
com doença mental grave em contexto comunitário e, especificamente, no âmbito das
Equipas de Saúde Mental Comunitária.

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CAP. 1 - ENQUADRAMENTO SOCIOPOLÍTICO E LEGAL

Na sequência da descoberta dos primeiros neurolépticos, na década de 50 do século XX,


verificou-se uma importante alteração na forma de organização dos cuidados de saúde
mental, que até então se centralizavam nas grandes instituições psiquiátricas. Devido às
novas possibilidades de tratamento das perturbações psicóticas na comunidade, logo na
década de 60, e na maioria dos países desenvolvidos, tiveram início os processos de
desinstitucionalização das pessoas com doença mental, com consequente mudança do
foco dos cuidados do hospital psiquiátrico para a comunidade. A Lei Kennedy, nos EUA,
e também a 1ª Lei da Saúde Mental portuguesa, ambas promulgadas em 1963,
baseavam-se já neste novo paradigma de cuidados, e desde então foi-se desenvolvendo,
em todo o mundo, a evidência científica acerca da efetividade dos serviços de saúde
mental em contexto comunitário (Lehman et al., 1982; Leff, 2000; OMS, 2002;
CRNRSSM, 2007; WHO, 2009; WHO, 2013).

Mais tarde, na 2ª Lei de Saúde Mental portuguesa (Lei nº 36/98), ainda em vigor, bem
como no Decreto-Lei nº 35/99, foram claramente expostos os princípios que deveriam
nortear a organização dos serviços de Saúde Mental, aliás também preconizados no
Relatório Mundial da Saúde 2001 – Saúde Mental: Nova Compreensão, Nova Esperança,
elaborado pela Organização Mundial da Saúde (OMS, 2002), tendo por base a
experiência de múltiplos países, com diversos níveis de desenvolvimento social e
económico. Dentre esses princípios destacam-se os seguintes: serem acessíveis a todas
as pessoas, serem responsáveis por um setor geodemográfico específico (com cada
Equipa de Saúde Mental Comunitária a prestar cuidados a uma população de 50.000 a
100.000 habitantes); integrarem um conjunto diversificado de unidades e programas,
incluindo o internamento em hospital geral, ambulatório e intervenção no domicílio;
envolverem a participação de utentes, familiares e entidades da comunidade; estarem
articulados com a rede dos Cuidados de Saúde Primários; colaborarem com o setor
social e com as Organizações Não Governamentais.

Estes são, ainda, os princípios que o atual Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016
(D.R. 2008, 2009) pretende que, finalmente, sejam implementados, visto que os estudos
existentes acerca dos cuidados prestados a pessoas com esquizofrenia em Portugal

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(Xavier et al., 2000 e Kovess et al., 2006, referidos no Relatório da CNRSSM, 2007; Caldas
de Almeida et al, 2015), apontam para a existência de uma cobertura clínica semelhante
à dos restantes países europeus, mas com um grau muito superior de necessidades não-
cobertas nas áreas de intervenção psicossocial, incluindo a reabilitação. Com efeito, e
conforme o referido pelo mesmo Relatório, a avaliação da qualidade da estrutura e
processo de funcionamento dos serviços de psiquiatria da rede pública indicou que o
nível dos dispositivos de ambulatório é inferior ao das unidades de internamento,
beneficiando estas últimas de 83% dos recursos, ao invés do que é preconizado pelos
organismos internacionais (OMS, 2002; WHO, 2013) no que respeita a uma prestação
de cuidados cada vez mais dirigida ao contexto comunitário. Considera-se que são
especialmente necessárias respostas não-hospitalares de apoio pós-crise, nos aspectos
físicos e psicológicos, mas também a nível familiar, profissional, educacional, económico
e cultural, que tenham em vista evitar o isolamento e melhorar a qualidade de vida das
pessoas com doença mental grave, favorecendo o máximo de autonomia e integração
social, e o seu efectivo exercício da cidadania (CNSM, 2005; López e Laviana, 2007).

Nesse sentido, o Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 preconiza a efectiva criação
das Equipas de Saúde Mental Comunitária (ESMC) como componente estruturante da
organização dos Serviços Locais de Saúde Mental, em correspondência direta com um
ou mais Centros de Saúde, e tendo como objetivo prestar cuidados a um setor
geodemográfico determinado, incluindo: programa integrado para Doentes Mentais
Graves, com manejo de casos por Terapeutas de Referência; programa de ligação com
a Saúde Familiar e apoio a perturbações mentais comuns; programa de apoio a doentes
idosos; programa de prevenção nas áreas da depressão e suicídio (D.R. 2008: 1400).

Para a implementação dos vários programas previstos, tanto o Plano Nacional de Saúde
Mental (D.R. 2008), como a Coordenação Nacional para a Saúde Mental (CNSM, 2009) e
também a legislação mais específica sobre a reorganização dos serviços (D.R., 2009),
indicam que as Equipas de Saúde Mental Comunitária deverão partilhar, com os
Cuidados de Saúde Primários e outras estruturas na comunidade, a responsabilidade
pelos cuidados às pessoas com doenças psiquiátricas mais comuns (perturbações de
ansiedade, depressão ligeira e moderada), baseando-se num regime de colaboração e

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consultadoria. Pelo contrário, cabe à Equipa de Saúde Mental Comunitária a
responsabilidade pela prestação direta de cuidados e apoio específico às pessoas com
doenças mentais graves e crónicas, com manejo de casos por Terapeutas de Referência,
ainda que com a colaboração dos profissionais dos Cuidados de Saúde Primários.

Quanto à composição das Equipas de Saúde Mental Comunitária, segundo o Plano


Nacional de Saúde Mental devem ser ‘multidisciplinares, com forte participação de
enfermeiros e outros técnicos não-médicos’, designadamente ‘psicólogos, assistentes
sociais, terapeutas ocupacionais e outras profissões relevantes para a saúde mental’
(D.R. 2008: 1400, 1407; CNSM, 2009).

No que respeita ao papel do enfermeiro nas Equipas de Saúde Mental Comunitária, e


em concordância com o previsto no Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016, o
Regulamento nº 129/2011, sobre as Competências do Enfermeiro Especialista em
Enfermagem de Saúde Mental, inclui diversas unidades de competência e critérios de
avaliação que se relacionam especificamente com a problemática dos ‘cuidados
comunitários assertivos e integrados para pessoas com Doença Mental Grave’, que se
estima que atinjam uma prevalência de 0.5 a 1.5% da população. Neste contexto,
destaca-se a indicação (F3.5.1) de que o Enfermeiro Especialista em Enfermagem de
Saúde Mental ‘desempenha funções de Terapeuta de Referência e pode coordenar
programas de gestão dos casos, no âmbito dos programas integrados de apoio
específico às pessoas com perturbação mental, doença mental grave ou de evolução
prolongada e suas famílias (D.R., 2011: 8671, 8672).

Apesar de tudo o que o que até agora foi legislado e regulamentado no que respeita à
reorganização dos cuidados de saúde mental portugueses, o relatório feito em 2012
pelo Regional Office for Europe da Organização Mundial de Saúde identifica diversas
fragilidades na implementação e forma de funcionamento dos serviços locais de saúde
mental em Portugal, salientando o risco de os indivíduos com problemas mais graves e
crónicos serem ignorados ou receberem cuidados abaixo das suas necessidades,
sobretudo no que respeita às intervenções que visam a sua reabilitação psicossocial.
Assim, a primeira das recomendações da OMS, tendo em vista a Reatualização do Plano
Nacional de Saúde Mental, aponta para a necessidade de melhorar a capacidade e

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competência para tratar e apoiar pessoas com problemas de doença mental grave na
comunidade, através do estabelecimento de objetivos claros para as equipas de saúde
mental comunitária. Aponta também para a necessidade de se investir mais no
desenvolvimento dos serviços comunitários para doentes mentais graves e,
especificamente, para ‘a generalização do modelo de Terapeuta de Referência’ (DGS,
2012: 36, 39, 48).

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CAP. 2 – CONCEITOS RELACIONADOS COM A REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL

No Plano Nacional de Saúde Mental 2007 – 2016, e no âmbito de intervenção das


Equipas de Saúde Mental Comunitária, a figura do Terapeuta de Referência surge
especificamente ligada ao ‘programa integrado para Doentes Mentais Graves’ (D.R.
2008: 1400). Considera-se assim necessário rever alguns conceitos relacionados com
este programa, que devem estar subjacentes a todo o processo de reabilitação
psicossocial, e por isso bem presentes em todas as fases do trabalho desenvolvido pelos
profissionais de saúde que desempenham funções de Terapeuta de Referência. Será,
em primeiro lugar, apresentado o próprio conceito de ‘doença mental grave’,
analisando-se alguns dos factores que contribuem para que se trate, de facto, de um
processo de doença específico, conforme a designação adotada pela Ordem dos
Enfermeiros (OE, 2009a). Passa-se depois à apresentação do modelo de vulnerabilidade-
stress, pelas suas implicações na forma de compreensão, abordagem e tratamento da
esquizofrenia, como paradigma da doença mental grave. Seguem-se algumas
considerações sobre os conceitos de recovery (recuperação) e empowerment, bem
como sobre os conceitos de emprego, educação e habitação apoiada, que se consideram
fundamentais para uma abordagem efectivamente integrada da problemática da pessoa
com doença mental grave em contexto comunitário.

DOENÇA MENTAL GRAVE (DMG)

Segundo Ruggeri et al. (2000), uma das primeiras definições de Doença Mental Grave
(SMI - Severe Mental Illness), e que foi amplamente aceite a nível internacional, foi a
proposta em 1987 pelo NIMH (National Institute of Mental Health). Nesta definição
consideravam-se três critérios básicos para inclusão dos indivíduos na categoria de
doença mental grave: o diagnóstico de psicose não-orgânica; a duração prolongada
(superior a 2 anos) da doença e do tratamento; a incapacidade funcional significativa
(moderada ou grave) a nível social, ocupacional ou escolar, conforme avaliada pela
escala GAF (Global Assessment of Functioning, APA, 1987).

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Em Espanha utiliza-se a expressão Transtorno Mental Severo (TMS) para designar um
quadro que, segundo López e Laviana (2007) e Granda Mariño et al. (2007), para além
dos critérios definidos pelo NIMH, inclui também a circunstância de a pessoa atingida
viver num contexto social próximo pouco tolerante ou ‘exausto’.

Segundo o Decreto-Lei nº 8/2010, os Cuidados Continuados de Saúde Mental em


Portugal são destinados às ‘pessoas com doença mental grave de que resulte
incapacidade psicossocial e que se encontrem em situação de dependência’. Por sua
vez, a Doença Mental Grave (DMG) é, no mesmo documento, definida como a ‘doença
psiquiátrica que, pelas características e evolução do seu quadro clínico, afeta de forma
prolongada ou contínua a funcionalidade da pessoa, comprometendo as suas
capacidades para realizar tarefas de subsistência, de se relacionar com o meio
envolvente e participar na vida social’ (D.R. 2010: 257, 258).

Apesar de o conceito de Doença Mental Grave não se restringir a um único diagnóstico


clínico, a vasta maioria das situações que se enquadram na definição e nos critérios
referidos corresponde a diagnósticos relacionados com a esquizofrenia, a que se juntam
algumas situações de perturbação bipolar com evolução complicada, bem como alguns
casos de perturbações dos impulsos e por utilização de substâncias, mesmo que sem um
diagnóstico de psicose (Ruggeri et al., 2000).

Em todo o caso, a generalidade dos estudos internacionais indica que, no conjunto das
doenças mentais graves, as esquizofrenias são as que causam mais incapacidade
psicossocial. Com efeito, os estudos epidemiológicos apontam para uma taxa de
prevalência média variável entre 0.5 e 1.5% da esquizofrenia na população em geral, e
os dados recentes indicam que a doença é 1.4 vezes mais frequente nos indivíduos do
sexo masculino, que também tendem a iniciar a doença mais cedo, entre os 15 e os 25
anos de idade, surgindo antes dos 19 anos em cerca de 40% dos casos, com
manifestações clínicas mais graves e uma evolução mais crónica. Nas mulheres a doença
tende a surgir mais tarde, sendo que em apenas cerca de 20% dos casos os seu início
terá sido mais precoce (Schultz et al., 2003; Torrey, 2006; McGrath & Susser, 2009; North
e Yutsy, 2010).

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E embora grande parte dos doentes responda bem ao tratamento inicial com fármacos
antipsicóticos, cerca de 80% recairá no prazo de 5 anos desde o primeiro episódio
tratado, em parte devido ao abandono da medicação, mas também pela ausência de
terapias psicossociais concomitantes com o tratamento farmacológico. Calcula-se assim
que cerca de 70% das pessoas afetadas pela doença têm numerosas reagudizações do
quadro, e apresentam um comprometimento moderado ou acentuado das suas
capacidades psicossociais (D’Amato e Rochet, 2001; OMS, 2002; Lieberman, 2003;
Marques-Teixeira, 2003; Barnes e Pant, 2005; Jobe e Harrow, 2005; López e Laviana,
2007; Afonso, 2010; North e Yutsy, 2010. Tais factos contribuem para que estas pessoas
sejam a parte principal do universo de população adulta que integra os potenciais
candidatos a utentes para os Cuidados Continuados Integrados de Saúde Mental (DGS,
2012).

A etiologia da esquizofrenia não é ainda bem conhecida, embora se tenda a adotar uma
perspectiva neurodesenvolvimentista, como síntese dos resultados de diversos tipos de
investigação (genética, epidemiológica e cognitiva), que apontam sobretudo para a
interação de factores perinatais e ambientais, como as infecções e os défices
nutricionais, bem como os ambientes sociais adversos e o consumo de Cannabis na
adolescência (Macedo e Azevedo, 1996; Dalery e d’Amato, 2001; Saoud e Dumas, 2001;
McGrath e Susser, 2009; Afonso, 2010; Santos et al., 2010; Brito, 2012).

Estudos recentes na área da neuropatologia, neuroimagiologia, neurobioquímica e


neuropsicologia, têm demonstrado de forma consistente a ocorrência de alterações no
cérebro das pessoas com esquizofrenia, com um substrato anatómico e/ou funcional,
essencialmente nas regiões pré-frontais, logo aquando do primeiro episódio da doença,
ocasionando perturbações no tratamento da informação (Marques-Teixeira, 2003;
Schulz et al, 2003; Pantelis et al., 2005; Afonso, 2010).

A doença caracteriza-se pela presença de vários tipos de sinais e sintomas, que são
classificados em dois grupos principais, com base nas funções mentais envolvidas: a) os
sintomas ‘positivos’, que resultam de um exagero das funções normais, que incluem as
alucinações, os delírios e a aceleração e desorganização do discurso e do
comportamento, e que na maioria dos casos são relativamente fáceis de eliminar

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através do tratamento farmacológico; b) os sintomas ‘negativos’, que resultam numa
perda das funções mentais normais, nomeadamente no que respeita à volição e às
funções executivas, com dificuldade em dirigir e manter a atenção e a concentração,
dificuldade em iniciar e terminar tarefas, incapacidade em sentir interesse e prazer nas
atividades habituais, dificuldade em modelar e expressar adequadamente as suas
emoções, e a tendência para o isolamento social. Em muitos casos estes sintomas
‘negativos’ são as primeiras manifestações da doença, evidenciando-se através de uma
diminuição do rendimento escolar ou do trabalho, bem como do funcionamento social
em geral, passando frequentemente despercebidos e sendo confundidos,
especialmente no jovem, com preguiça, ociosidade, má educação ou depressão
(Andreasen, 2003; Castro-Henriques et al., 2006; Afonso, 2010; Brito, 2012).

Além disso, e ao contrário do que sucede com os sintomas ‘positivos’, estes sintomas
‘negativos’, associados a uma disfunção cognitiva geral relacionada com alterações na
conectividade cerebral, continuam a mostrar-se muito resistentes ao tratamento
farmacológico, e muito persistentes, sendo por isso os principais responsáveis pelas
dificuldades que as pessoas com esquizofrenia muitas vezes sentem em regressar à
escola ou ao trabalho, em participar em atividades sociais e em estabelecer relações
pessoais significativas (Marques-Teixeira, 2003; Rector et al., 2005; Machado, 2006;
Afonso, 2010; Brito, 2012).

Com efeito, e sobretudo devido ao seu início precoce (durante a adolescência e idade
de jovem adulto), a doença compromete as funções essenciais que permitem à pessoa
a vivência da sua individualidade e do seu domínio de si própria, deteriorando a sua
capacidade de relação com o meio, o seu funcionamento social e a sua participação nas
diversas atividades. E, atendendo à natureza crítica da fase do desenvolvimento
psicossocial em que a doença ocorre, acaba por afetar seriamente a construção da
personalidade e o processo de formação profissional e familiar da pessoa, podendo
assim comprometer todo o seu futuro como indivíduo autónomo e socialmente
integrado e produtivo.

Assim se compreende o facto de muitas das pessoas com esquizofrenia precisarem de


apoio continuado em relação a diversas áreas da sua vida. Por tudo isto, trata-se

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efectivamente de uma doença grave e crónica com um grande peso social e económico,
não só pelos custos do tratamento (em Portugal, e com base no Censos de 2001, 36.2%
das camas de internamento em serviços de Psiquiatria estavam ocupadas por casos de
esquizofrenia), mas especialmente pelas perdas de produtividade e qualidade de vida
dos indivíduos atingidos e das suas famílias, sendo actualmente considerada a 3ª causa
de incapacidade (AVI – Anos Vividos com Incapacidade) no grupo etário dos 15 aos 44
anos (Andreasen, 2003; Castro et al., 2007; CNRSSM, 2007; Afonso, 2010; WHO, 2013).

MODELO DE VULNERABILIDADE-STRESS

Conforme o atrás exposto, a esquizofrenia é considerada o paradigma da doença mental


grave e crónica que, segundo o Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016, requer por
isso um ‘programa integrado’, com um ‘Terapeuta de Referência’ para gestão do
processo de tratamento e reabilitação das pessoas por ela atingidas, que deverão assim
ser o objecto específico de atenção e cuidados das Equipas de Saúde Mental
Comunitária.

Neste processo integrado de tratamento e cuidados das pessoas com esquizofrenia,


surge como fundamental a adoção do denominado ‘modelo de vulnerabilidade-stress’,
que se considera um marco importante na compreensão da doença em termos teóricos,
mas sobretudo pelas implicações práticas que tem no que respeita às formas de
tratamento implementadas (Herz e Lamberti, 1995; Magliano et al., 2000, 2005;
Gonçalves-Pereira, 2007).

Conforme o referido por Saoud e Dumas (2001), o primeiro modelo de vulnerabilidade-


stress foi proposto em 1977 por Zubin e Spring, que consideravam que certos fatores
endógenos e/ou exógenos provocam um estado de crise nos indivíduos, dependendo
da intensidade dos fatores de stress e do limiar de tolerância individual. A crise pode ser
contida por homeostase ou pode provocar um episódio de doença, dependendo, em
cada indivíduo e em cada momento, do equilíbrio entre os fatores bológicos,
socioculturais, educacionais e económicos do ‘nicho ecológico’ que ele ocupa.

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No caso da esquizofrenia, em particular, serão as perturbações atrás referidas no
processo neurodesenvolvimental, associadas a elementos de carácter biológico,
psicológico e social (alterações genéticas e/ou estruturais do cérebro, estilo de vida,
estratégias de coping, competências sociais, recursos psicossociais), que atuam como
recursos ou vulnerabilidades face aos intensos processos de reorganização neuronal que
ocorrem na adolescência, especialmente quando a estes se associam perturbações
graves no equilíbrio hormonal, abuso de substâncias (especialmente a Cannabis) ou
situações de stress excessivo (Schulz et al., 2003; McGrath e Susser, 2009; Afonso, 2010;
Santos et al. 2010).

Por outro lado, é também esta grande variedade de interacções possíveis entre os
diferentes modelos factoriais que explicará a heterogeneidade dos quadros de
esquizofrenia, salientando-se, por esta via, o aspeto dinâmico e evolutivo da doença.
Nesse sentido, a ocorrência de um episódio psicótico resultará da interação entre o grau
de vulnerabilidade individual da pessoa e o nível de stress biológico, psicológico e social
a que ela está exposta, em jogo com as variáveis moderadoras ou protetoras que
estejam, ou não, presentes. É neste contexto que, face a cada indivíduo com a doença,
devem ser identificados e definidos três tipos de marcadores: de vulnerabilidade,
através da identificação das características pré-mórbidas; de episódio, através do
reconhecimento de eventuais pródromos e sintomas próprios do episódio; e residuais,
com carácter persistente, resultantes da doença ou de factores extrínsecos, incluindo os
iatrogénicos (Yank et al., 1993; Pio-Abreu, 2000; Bressan e Pilowsky, 2003; Kumra et al.,
2003; Liberman, 2003; Marques-Teixeira, 2003; Park e Thakkar, 2010; McFarlane et al.,
2014).

Com efeito, sabe-se atualmente que a exposição a uma situação crónica de elevados
níveis de stress aumenta a actividade dopaminérgica em diversas regiões cerebrais, e
em especial no sistema límbico. Em conjunto com a concomitante activação do sistema
nervoso simpático e com a maior dificuldade em processar os estímulos sensoriais, as
situações de stress desempenham assim, e sobretudo nas fases iniciais da doença, um
papel fundamental no desencadear de episódios psicóticos (Chang et al., 2011). Neste
contexto, a terapêutica farmacológica é fundamental, pelo seu efeito de redução da
excitabilidade neuronal, mas é igualmente importante uma adequada gestão dos

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estímulos (externos e internos) tendo em vista a redução do stress, ou o controlo dos
seus efeitos, e o consequente controlo dos sintomas (Gonçalves-Pereira, 2007; Brito,
2012).

É também deste modelo que surge o conceito de indivídulos em ‘alto risco’ de


esquizofrenia, que se podem também classificar como ‘vulneráveis’, sendo aqui
considerado o risco genético, bem como o risco ‘psicométrico’ (perturbações de
atenção, outras perturbações cognitivas com deficiente desempenho em tarefas
associadas a disfunção frontal, perturbações electrofisiológicas, labilidade emocional,
ansiedade social, retraimento social e/ou comportamentos agressivos). Assim, a
identificação de sujeitos vulneráveis deveria conduzir ao tratamento terapêutico com
uma finalidade de prevenção primária, apesar de a eficácia e os meios deste tratamento
só agora começarem a estar identificados (Woodberry et al., 2010; McFarlane et al.,
2010, 2014).

Assim, o modelo de vulnerabilidade-stress surge como fundamental para a


compreensão dos processos, e para a conceção dos programas integrados, de
tratamento e reabilitação, rompendo com a conceção tradicional da esquizofrenia como
entidade mórbida crónica, através de uma abordagem psicossocial mais ‘ecológica’
(Saud & Dumas, 2001). E nesse sentido surgem então, com maior destaque, as medidas
terapêuticas que, no âmbito dos programas integrados de apoio, visam desenvolver, nos
doentes, estratégias de adaptação mais apropriadas, aqui se incluindo as psicoterapias
de apoio ao indivíduo doente e as intervenções familiares, ambas numa perspectiva
cognitivo-comportamental (McFarlane, 2002; Torrey, 2006; Garcia Cabeza, 2008;
Dougherty et al., 2013; McFarlane, 2010, 2014; Favrod e Maire, 2014).

RECOVERY E EMPOWERMENT

Mais de 30 anos após o início e desenvolvimento dos tratamentos farmacológicos, e


também da implementação de diversos tipos de intervenções psicossociais, diversos
estudos de caráter qualitativo e longitudinal feitos na Alemanha, na Suíça e nos EUA

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começaram a constatar que algum nível de recuperação é também possível na
esquizofrenia, considerando-se que entre metade e dois terços dos doentes estudados
terão conseguido atingir um bom nível de recuperação (Farkas, 2004, 2007; Torrey,
2006; CNRSSM, 2007; San et al., 2007; Ornelas, 2008; Portugal, 2008).

A partir dos anos 90 do século XX começou então a desenvolver-se uma nova visão da
reabilitação psicossocial, que passou a dar maior importância à experiência das próprias
pessoas com doença mental, às suas necessidades e aspirações, bem como ao seu
percurso e projecto pessoal para a recuperação ou recovery.

Assim, o processo de recovery é descrito como uma mudança de atitudes, valores,


significações e objectivos, empreendida pela própria pessoa, de forma a construir um
novo projecto de vida, e a ultrapassar os efeitos da doença mental. Consiste então num
processo pessoal de crescimento e reintegração social que resulta em que o indivíduo
doente adquira, ou readquira, os seus papéis sociais – estudante, trabalhador, membro
da família, participante na comunidade – aprendendo a reduzir/controlar os sintomas
da doença, aumentando o seu sentido de auto-eficácia e bem-estar, e aumentando o
seu nível de sucesso e satisfação com a sua vida (Silverstein e Bellack, 2008).

A recuperação (recovery) é também um dos valores preconizados no Relatório da


CNRSSM (2007), e incluído no Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016, na linha do
já anteriormente defendido por diversos autores, a nível nacional e internacional,
muitos deles referidos por Ornelas (2008). Preconiza-se então que ‘os serviços de saúde
mental devem criar condições que favoreçam a autodeterminação e a procura de um
caminho pessoal das pessoas com doença mental’ (D.R., 2008: 1399).

Especificamente relacionado com a autodeterminação da pessoa com doença mental


surgiu o conceito de empowerment. Segundo Kieffer (1984), referido por Ornelas (2008),
empowerment é um processo de desenvolvimento individual, continuado e de longo
prazo, que envolve uma dimensão relacionada com o aumento das competências
individuais, e uma outra com o desenvolvimento de competências de participação
social. Por outro lado, e também conforme referido por Ornelas (2008), o Empowerment
Group da Cornell University (1989) considera que empowerment é o processo
intencional e continuado que envolve o respeito mútuo, a reflexão crítica, o apoio e a

14
participação em grupos, através dos quais as pessoas mais isoladas e com menos acesso
aos recursos disponíveis podem aumentar a sua acessibilidade e controlo sobre esses
mesmos recursos. Segundo Mechanic (1991), referido pelo mesmo autor,
empowerment é um processo através do qual os indivíduos desenvolvem uma
compreensão acerca dos seus próprios objectivos e acerca das estratégias para os
alcançar.

Por último, Zimmerman (1995, 2000), também referido por Ornelas (2008), o conceito
de empowerment compreende três dimensões: controlo, por oposição ao conceito de
powerlessness, referente à percepção da pessoa sobre a sua capacidade para influenciar
o seu contexto (família, trabalho, comunidade); consciência, relacionada com a
capacidade de a pessoa identificar e perceber como funcionam as estruturas de poder,
assim como identificar e prever os factores que podem dificultar ou facilitar a sua
intervenção no contexto, bem como com a capacidade de planeamento estratégico e
mobilização dos recursos necessários; participação, relativa à capacidade de ação
concreta para atingir os objectivos estabelecidos.

Em qualquer perspetiva, considera-se que o processo de empowerment ocorre


simultaneamente a nível individual, organizacional e comunitário, pelo que uma pessoa
pode sentir-se empowered num contexto e não noutro, enquanto os contextos podem
(ou não) ser promotores e facilitadores do processo de empowerment, se facilitam o
acesso à informação e se efetivamente proporcionam oportunidades de participação e
liderança, tendo em vista a recuperação ou recovery da pessoa com doença mental
grave (Ornelas, 2008).

Nesse sentido, e segundo Kreyenbuhl et al. (2009) o empowerment desenvolve-se


através de um processo colaborativo de decisão partilhada, em que tanto o utente e o
profissional se reconhecem como peritos e parceiros, trabalhando em conjunto na
partilha de informações e clarificação de valores, a fim de atingirem um consenso sobre
as decisões relativas ao tratamento. O profissional deve informar o utente acercas das
possibilidades de tratamento e ajudá-lo a clarificar as suas preferências e valores, ao
mesmo tempo que o estimula a tomar um papel ativo no processo de decisão. Os
utentes contribuem com o conhecimento acerca da sua experiência vivida com a

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 15
doença, e partilhando informação sobre as suas necessidades e valores, e sobre o que
tem significado na sua vida. Esta perspectiva de empowerment tem sido
sistematicamente associada a melhor adesão aos regimes terapêuticos, uma auto-
gestão mais efectiva da doença, melhor controlo da doença e maior satisfação do
doente.

EMPREGO E EDUCAÇÃO APOIADOS

Para além da necessidade de ‘ocupar-se com vista a realizar-se’, conforme é designada


no modelo de Virginia Henderson, constitui para a maioria das pessoas em idade ativa
uma necessidade humana fundamental para a sua vivência como pessoa saudável e
membro ativo de uma comunidade. Com efeito, e para além dos benefícios económicos,
são também importantes os benefícios psicológicos decorrentes de uma actividade
laboral regular, por geralmente implicar contactos sociais, estimulação cognitiva,
psicomotora e afectiva e, em maior ou menor grau, o sentido de integração e realização
pessoal (Dias e Brissos, 2007). Pelo contrário, e conforme o referido por Ornelas (2008),
constata-se que a falta de um emprego ou de uma ocupação útil, e para além dos
constrangimentos financeiros, está frequentemente associada ao enfraquecimento das
redes sociais, com a criação de situações de isolamento e exclusão social e, em muitos
casos, com um significativo aumento da morbilidade psiquiátrica.

Os mesmos mecanismos acontecem, genericamente, no caso das pessoas com doença


mental grave, sendo que diversos estudos apontam para o emprego como fator
facilitador da sua integração social e comunitária e do recovery, pelo aumento dos
sentimentos de bem-estar, aumento do empowerment e fortalecimento das redes de
suporte social, por tudo isto ocasionando mesmo a redução da sintomatologia
psiquiátrica (López e Laviana, 2007; Ornelas, 2008).

Durante muito tempo, porém, partiu-se do pressuposto que a maioria das pessoas com
doença mental grave não estão, a priori, aptos a integrar um contexto laboral na
comunidade, requerendo por isso contextos experimentais de reabilitação e de
preparação para a situação de emprego. Foi nesse contexto que surgiram os centros de

16
actividades ocupacionais tradicionais, bem como os locais de emprego protegido e as
denominadas empresas sociais. No entanto, e segundo Ornelas (2008) a investigação
entretanto realizada sobre esta problemática indica que, ao contrário do inicialmente
pretendido, a permanência das pessoas com doença mental grave em contextos
protegidos diminui muito as suas possibilidades de acederem ao mercado competitivo
de trabalho, com taxas de sucesso muito baixas, que não ultrapassavam os 15.%.

Nos anos 80 do século XX, em paralelo com o movimento do recovery, e tendo o direito
ao emprego como referencial de Direitos Humanos, começaram a ser questionados os
pressupostos iniciais, considerando-se que os modelos de ocupação até então adotados
constituiriam, basicamente, novas formas de segregação das pessoas com doença
mental. Surgiu então o conceito de Emprego Apoiado, no pressuposto de que,
independentemente da gravidade da doença, as pessoas com doença mental podem ser
produtivas num contexto natural, se dispuserem dos apoios necessários.

Nesse contexto, considera-se que o programa individual de recuperação da pessoa com


doença mental deve ter como objectivo a sua colocação no mercado de trabalho, sendo
a necessária formação feita no posto de trabalho, ou seja, in vivo, e assegurando-se a
continuidade do acompanhamento, pelo Terapeuta de Referência, em função das
necessidades identificadas em cada momento (López e Laviana, 2007; Ornelas, 2008;
Wright-Berryman et al., 2011).

Esta forma de abordagem tem sido utilizada também em Portugal, com sucesso, através
das iniciativas e do trabalho desenvolvido já há quase duas décadas por algumas
entidades na área da reabilitação psicossocial, como a Associação para o Estudo e
Integração Psicossocial (AEIPS) e a Associação de Solidariedade Social de Lafões (ASSOL).
Mas o conceito de emprego apoiado encontra-se ainda muito longe de ter sido
incorporado nas abordagens adotadas pela maioria dos profissionais de saúde mental
do país face ao doente em contexto comunitário, tendendo-se ainda preferencialmente
para as opções relacionadas com a mera atribuição de subsídios de doença ou invalidez
(DGS, 2012).

Quanto ao conceito de educação apoiada, surgiu pelo facto de que a instalação da


esquizofrenia no jovem ocorre habitualmente no período de transição do ensino básico

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 17
para o secundário, ou já durante os estudos superiores, provocando muitas vezes a
interrupção e o abandono do percurso escolar e de formação profissional. Assim, e
mesmo após a recuperação clínica, torna-se muitas vezes difícil que a pessoa doente
retome os estudos após o período de afastamento do contexto escolar, por estigma
interiorizado e receio de tratamento discriminatório, mas também por falta de apoios
específicos nas respostas da pessoa doente e da sua família face à complexidade da
doença. Face a esta problemática, preconiza-se que, no que respeita à educação da
pessoa com mental grave, se adoptem princípios idênticos aos referidos para o emprego
apoiado, sendo que diversos estudos a nível internacional indicam que a maioria dos
estudantes que beneficia deste tipo de apoio conseguiu completar o curso com sucesso,
para além de ter reduzido os seus episódios de reagudização da doença e
reinternamento (Ornelas, 2008).

18
HABITAÇÃO APOIADA

No âmbito da reforma dos serviços de saúde mental ocorrida em Espanha, com início
em 1985, e considerando em particular a sua experiência de implementação na
Andaluzia, López e Laviana (2007) consideram que os programas residenciais são uma
área essencial nos cuidados comunitários a pessoas com Doença Mental Grave.
Chamam, no entanto, a atenção para a necessidade de distinguir entre os programas
destinados a doentes anteriormente institucionalizados, com menores possibilidades de
reintegração social, e os programas que têm por base as intervenções e os apoios sociais
que permitam a permanência da pessoa doente na comunidade, em respeito pelos seus
direitos básicos de cidadania.

Também Ornelas (2008) considera que os programas residenciais em contexto


comunitário têm sido encarados como meras alternativas aos cuidados tradicionais nos
hospitais psiquiátricos, ou como simples prolongamento dos cuidados de saúde dos
serviços de psiquiatria, sendo disso exemplo os diversos tipos de espaços habitacionais
coletivos supervisionados, ainda que com variáveis dimensões e graus de supervisão,
segundo um modelo de continuum residencial. Considera-se que uma tal concepção
resulta, afinal, numa perpetuação das tendências de segregação social das pessoas com
doença mental grave, ao invés do objectivo de atingir uma real integração comunitárias
destas pessoas. Neste sentido, o alojamento da pessoa com doença mental grave deverá
passa a ser considerado como um ‘local para viver’, com o maior nível de normalidade
e autonomia possível, através de um programa de apoio residencial.

Com efeito, ao longo dos últimos 50 anos, diversos modelos e experiências foram
implementados e analisados em países como os EUA, Canadá, Reino Unido, Itália,
Espanha, com um grande diversidade de programas, terminologias, tipologias,
mecanismos de gestão e dinâmicas de funcionamento. E apesar de nesta área ser difícil
a realização de estudos controlados aleatorizados para verificação e comparação de
resultados, os diversos estudos referidos por Ornelas (2008) indicam que os vários tipos
de estruturas residenciais de transição que surgiram nas décadas de 60 e 70 do século
XX, sob a forma de hospitalização alternativa mais prolongada ou de residência
protegida, na maioria dos casos mostraram-se pouco eficazes na promoção do

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 19
ajustamento e integração comunitária das pessoas. Entre outros motivos, tal
constatação relaciona-se com o facto, atualmente mais bem compreendido, de que as
competências aprendidas em tais contextos não são linear nem facilmente transferíveis
para a realidade comunitária.

Assim, também López e Laviana (2007) consideram que a preferência deve ser dada aos
programas integrados que incluem apoio domiciliário na casa da pessoa doente, ou da
sua família, ou mesmo numa pensão ou outra forma de habitação independente.
Segundo Ornelas (2008), este conceito de habitação apoiada surgiu na década de 90 do
século XX e, tal como o também previsto na Rede de Cuidados Continuados Integrados
de Saúde Mental (D.R., 2010), pressupõe a existência de serviços de apoio
individualizados e flexíveis, através de Equipas de Apoio Domiciliário em articulação com
os Cuidados de Saúde Primários e os serviços sociais. Para além do apoio direto à pessoa
doente, estas equipas visam assegurar e apoiar o envolvimento dos familiares e outros
cuidadores, sempre que necessário.

Comparando com os modelos mais tradicionais de apoio residencial, os estudos mais


recentes indicam que a habitação apoiada por equipas de apoio domiciliário é um
modelo mais eficiente em termos de custo-benefício, tendo-se verificado que 80 a 90%
das pessoas neste tipo de programa mantêm situação habitacional estável.

Além disso, e dado que a pessoa doente passa a viver numa habitação normal, por
escolha pessoal, com integração local e social e apoio continuado, num processo de
aprendizagem no mundo real e em contextos permanentes, vários estudos indicam que
este modelo de habitação apoiada favorece efectivamente o empowerment, a
integração social, a qualidade de vida e o recovery da pessoa com doença mental grave
(López e Laviana, 2007; Ornelas, 2008; Henwood et al., 2014; Stregiopoulos et al., 2014).

20
CAP. 3 – O TERAPEUTA DE REFERÊNCIA – OBJETIVOS, FUNÇÕES E
COMPETÊNCIAS

Conforme o exposto nos capítulos anteriores, considera-se atualmente que o objetivo


dos serviços de saúde mental deve ser a recuperação (recovery) da pessoa com doença
mental grave, através de um processo de reconstrução do seu percurso pessoal para um
projeto de vida, apesar da circunstância da doença, seus efeitos e respetivo tratamento.

Segundo López e Laviana (2007), a prossecução de um tal objetivo implica todo um


trabalho concertado tendo em vista evitar o agravamento da situação clinica da pessoa
doente, assim contribuindo para evitar a sua desinserção social e eventual
institucionalização, visando então a sua inclusão social e plena cidadania, e não apenas
o controlo dos sintomas ou a mera ocupação do seu ‘tempo livre’.

Porém, um dos principais problemas especificamente relacionados com o tratamento


das pessoas com Doença Mental Grave é o seu frequente afastamento dos serviços de
saúde, em resultado da própria natureza psicótica da doença, e também por esta
tipicamente afetar as pessoas durante o final da adolescência e início da idade adulta.
Com efeito, e como é descrito por McCay e Ryan (2003), os jovens têm,
compreensivelmente, muita dificuldade em integrar tudo o que envolve uma doença
crónica e altamente estigmatizada, como é o caso da esquizofrenia, no seu processo de
formação da identidade e organização do auto-conceito, pelo que muitas vezes
recusam-se a aceitar a doença e a consequente necessidade de tratamento continuado
(Kumra et al., 2003). Conforme o referido por Kreyenbuhl et al. (2009), esta situação
afeta cerca de 1/3 das pessoas com doença mental grave que tiveram algum contacto
com os serviços de saúde mental, e principalmente os mais jovens, de sexo masculino,
pertencentes a minorias étnicas, e com reduzido funcionamento social. Também os
indivíduos com co-morbilidades associadas ao abuso de substâncias, bem como os casos
em que a doença se instala mais precocemente, ou que se encontram em períodos de
maior risco (a seguir a uma ida às Urgências, nas fases iniciais do tratamento, ou após
um internamento), estão em maior risco de deixarem de utilizar os serviços de saúde. A
análise conjunta de diversos estudos indica que 24% dos indivíduos com psicose não
cumprem os esquemas de consultas, enquanto outros estudos apontam para que cerca

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 21
de 58% dos doentes faltam logo à primeira consulta após a alta de um internamento
hospitalar, o que indica que este é um dos períodos mais críticos no que respeita à
necessidade de estratégias de envolvimento no tratamento (Jónsdóttir, 2010; Balikci et
al., 2013).

Ainda segundo Kreyenbuhl et al. (2009), as intervenções recomendadas para melhorar


a adesão aos serviços de saúde mental variam entre intervenções de baixa intensidade,
como lembretes para as consultas, até intervenções de elevada intensidade, como é o
caso do tratamento assertivo comunitário. Considera-se que estas intervenções, com
especial destaque para os programas de gestão de caso, poderão reduzir o impacto da
doença e promover as tarefas de ajustamento, de integração comunitária e de
recuperação (recovery).

Reconhece-se, por tudo isto, a necessidade de que a pessoa com doença mental grave
seja devidamente apoiada desde o início do processo de doença, e depois acompanhada
de perto e de forma continuada, sendo-lhe proporcionados os apoios adequados a cada
caso. Estes deverão ser implementados através de programas integrados que, para além
do tratamento farmacológico, incluem intervenções psicossociais como o treino de
competências sociais, o treino de atividades de vida diária, as intervenções familiares
psicoeducativas, os programas de habitação apoiada e emprego apoiado conjugados
com o apoio domiciliário na área da saúde mental, e o apoio psicoterapêutico para os
sintomas residuais, todos devidamente articulados de forma a facilitarem a autonomia
e evitarem a desinserção social (Caldas de Almeida e Xavier, 1997; Falloon et al., 1998;
Lehman et al., 1998; OMS, 2002; Dogan et al., 2004; Farkas, 2007; CNRSSM, 2007;
Ornelas, 2008; Silverstein e Bellack, 2008; Favrod e Maire, 2014).

Neste sentido, tendo em atenção a natureza específica da doença, e à semelhança do


que já há muitos anos ocorre em diversos outros países, o Plano Nacional de Saúde
Mental 2007-2016 preconiza a criação de um programa integrado para Doentes Mentais
Graves, com manejo de casos por terapeutas de referência, no âmbito das atividades
das Equipas de Saúde Mental Comunitária (CNRSSM, 2007; D.R., 2008).

O conceito de gestão de caso (case-management) em saúde mental comunitária


remonta ao final dos anos 60 do século XX, nos EUA, tendo a figura do case manager

22
sido criada para apoio aos doentes psiquiátricos desinstitucionalizados. No Reino Unido
utiliza-se a expressão care management para designar a mesma atividade, que até aos
dias de hoje continua a ser realizada pelos denominados care co-ordinators, procurando
assim explicitar a intenção de ‘gestão do tratamento e do apoio’ e não propriamente de
‘gestão do indivíduo’. Em ambos os casos, a atividade destes profissionais pressupõe o
contacto continuado da pessoa doente com um ou mais profissionais de referência, com
o objectivo de promover a continuidade dos cuidados e o melhor acesso e articulação
dos serviços (Burns e Perkins, 2000; Ziguras e Stuart, 2000; DH, 2002; Burns et al., 2007).

É de referir que, conforme o descrito por Burns e Perkins (2000), durante a década de
70, nos EUA, os case managers eram, na sua maioria, pessoas sem formação de base na
área da saúde, que eram contratadas para fazerem a coordenação dos cuidados, mas
não para a prestação direta dos mesmos. Cabia-lhes então assegurar a continuidade,
acessibilidade e eficiência dos cuidados recebidos pela pessoa doente após a sua saída
do hospital psiquiátrico. Para isso, recebiam uma formação específica e breve que lhes
permitia, de alguma forma, avaliar as necessidades do ‘cliente’, desenvolver um plano
global de cuidados, providenciar para que os serviços necessários fossem prestados
(incluindo os cuidados médicos e psiquiátricos, os benefícios da segurança social e o
apoio para habitação), monitorizar e avaliar os serviços prestados, e acompanhar a
evolução da situação ao longo do tempo.

Rapidamente, porém, começaram a surgir críticas à eficácia do modelo inicial dos case
managers, constatando-se que a experiência e competências clínicas eram
efetivamente necessárias, dado que os seus ‘clientes’ eram pessoas com necessidades
múltiplas e complexas, e com muitas dificuldades em utilizar os serviços
proporcionados. Reconheceu-se, assim, que era fundamental o estabelecimento de uma
relação terapêutica entre o case manager e o seu cliente, até para possibilitar uma
adequada avaliação das necessidades e das capacidades da pessoa doente, e para que
o case manager pudesse apoiar e encorajar a pessoa doente a aceitar e utilizar os
serviços proporcionados. Assim, e conforme o descrito por Burns e Perkins (2000) e
Burns et al. (2007), os case managers iniciais foram sendo progressivamente
substituídos por profissionais de saúde, principalmente enfermeiros, psicólogos,
assistentes sociais e terapeutas ocupacionais. Evoluiu-se, desta forma, para o

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 23
denominado clinical case management, que inclui as funções básicas do case
management, e também a prestação direta de cuidados. Segundo Hargreaves et al.
(2007), este é ainda o modelo mais frequentemente utilizado no conjunto dos
programas não-residenciais de saúde mental nos EUA.

No Reino Unido, e conforme o referido por Gournay (2000), o Warlingham Park Hospital,
em Croydon, terá sido o primeiro hospital psiquiátrico a prestar cuidados de psiquiatria
em contexto comunitário, pois já em 1954 os enfermeiros do internamento eram
enviados para a comunidade para acompanhar doentes com esquizofrenia. Em 1970
começou a ser ministrada a formação específica das denominadas Community
Psychiatric Nurse (CPN) que, até meados da década de 1980, trabalhavam quase
exclusivamente com doentes com esquizofrenia, em articulação com os psiquiatras dos
hospitais psiquiátricos.

Devido às alterações que entretanto ocorreram na formação académica dos


enfermeiros de saúde mental no Reino Unido, surgiu a necessidade de reforçar a
formação específica, teórica e prática, aos enfermeiros que trabalham com famílias de
pessoas com esquizofrenia em contexto comunitário. Essa formação, no âmbito do
denominado The Thorn Programme, iniciou-se na década de 80, em Londres e
Manchester, e incluía três módulos: gestão de caso/tratamento assertivo comunitário;
intervenções psicológicas (numa abordagem cognitivo-comportamental); intervenções
familiares. A partir de 1995, outros profissionais, para além dos enfermeiros, passaram
a ser incluídos neste programa específico de formação, que entretanto alterou a sua
designação para COPE – Collaboration on Psychosocial Education – e que atualmente se
mantém ainda em funcionamento (Gournay, 2000; DH, 2002; NICE, 2002; Bradshaw et
al., 2007).

Também em Espanha, e sobretudo desde a reforma dos serviços de saúde mental


iniciada em 1985, foram constituídas diversas equipas, multidisciplinares e de
enfermagem, cujo objectivo é a assistência, na comunidade, a pessoas com doença
mental grave de evolução prolongada que apresentem dificuldades no apoio social, de
saúde e laboral, e com limitada adesão ao tratamento. Na maioria destas equipas, o
acompanhamento individualizado e continuado das pessoas doentes é feito com base

24
no modelo de Gestão de Casos, em alguns casos combinado com o modelo de
tratamento assertivo comunitário (Alonso e Pérez Fernandez, 2007; Fernandez
Gonzalez, 2007; Granda Mariño et al., 2007; Sanchez Bujaldón, 2007).

Apesar das diversas variações nas designações adotadas e no modo de implementação,


a figura do case manager, ou Terapeuta de Referência, conforme a designação adotada
no Plano Nacional de Saúde Mental (D.R., 2008), é considerada central, e standard care,
na prestação de cuidados de saúde mental comunitária em muitos outros países, como
Canadá, Nova Zelândia, Austrália, Brasil, Irlanda, Taiwan, Singapura e Irão, entre outros
(Ziguras e Stuart, 2000; Mueser et al., 2003; SSC, 2003; O’Brien et al.,2006; Machado et
al., 2007; Meyer e Morrissey, 2007; Shanley et al., 2007; ARNNL, 2008; Malakouti et al.,
2009; Njenga, 2009; Razali et al., 2000; Chang et al. 2011, 2013; Abdel-Baki et al., 2013;
Low et al, 2013).

Constata-se então que a figura do Terapeuta de Referência surgiu, nos vários países,
como resposta dos sistemas de saúde face ao problema específico de um grupo
significativo de utentes (tipicamente doentes psicóticos crónicos e adultos jovens) que,
ainda que tendo a oportunidade de aceder a redes de serviços médicos, sociais e
comunitários, continuam sem deles usufruir, por desconhecimento ou por incapacidade
para os utilizar, em resultado da sua patologia (Marques-Teixeira et al., 2005). Assim, e
no âmbito dos programas integrados de cuidados, é designado um coordenador de
cuidados para cada utente, o Terapeuta de Referência, com a função de o ajudar a
selecionar os cuidados mais adequados, garantindo que beneficia dos serviços
disponíveis, facilitando-lhe o acesso e coordenando a atuação dos profissionais dos
vários serviços, com o objectivo de garantir a continuidade e a coerência dos cuidados
prestados. A cada Terapeuta de Referência será atribuído um número de utentes (case-
load) variável em função das características dos utentes e dos objetivos específicos das
unidades prestadoras de cuidados. Neste sentido, considera-se que o modelo do
Terapeuta de Referência não é uma forma de ‘tratamento’, mas sim uma forma de
organização dos cuidados que visa ajudar a manter as pessoas com doença mental grave
em contacto com os serviços, assim contribuindo para reduzir a frequência e duração
dos internamentos, e para melhorar os resultados de saúde, especialmente no que se
refere ao funcionamento social e à qualidade de vida (Burns e Perkins, 2000; Alonso e

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 25
Pérez Fernandéz, 2007; CNSM, 2009; Kreyenbuhl et al., 2009; Wright-Berryman et al.,
2011; Chang et al., 2013).

Este modelo tem por base uma filosofia explicitamente centrada na pessoa,
contribuindo também para uma intervenção multiprofissional e integral,
proporcionando cuidados e serviços globais e integrados in vivo, ao invés dos
tradicionais serviços baseados nos gabinetes de consulta e hospitais, e com a
flexibilidade necessária para lidar com os aspetos imprevisíveis e únicos da vida de cada
pessoa. O Terapeuta de Referência contribui para facilitar a permanência da pessoa
doente na comunidade e promover a sua integração, estimulando ao máximo a sua
autonomia através de atitudes, metodologias e procedimentos que maximizam a sua
iniciativa e participação, potenciando capacidades e sucessos. Ao proporcionar um
adequado sistema de cuidados, mediante a elaboração, execução e avaliação de planos
individualizados de reabilitação, o Terapeuta de Referência assegura a continuidade dos
cuidados, facilitando a adesão ao tratamento, detetando sinais precoces de alerta e
facilitando a intervenção em crise, dessa forma prevenindo recaídas e reinternamentos,
e garantindo os direitos das pessoas com doença mental grave (Burns & Perkins, 2000;
Fernandez Gonzalez, 2007; Wright-Berryman et al., 2011).

Na prática, o principal contexto de cuidados do Terapeuta de Referência é a


comunidade, e as suas principais actividades são a visita domiciliária e o trabalho de
coordenação. As suas atividades centram-se no indivíduo doente (adesão ao
tratamento, psicoeducação, etc.), mas também no seu ambiente (manutenção e
desenvolvimento do apoio comunitário individualizado, coordenação dos vários serviços
de saúde, sociais e comunitários, apoio aos familiares, etc.), utilizando e mobilizando
uma grande variedade de recursos, incluindo a educação e apoio dos membros da
comunidade (Fernandez Gonzalez, 2007; Ornelas, 2008).

Mais especificamente no que respeita ao trabalho com as pessoas com doença mental
grave é de salientar que, em consequência da própria natureza da doença psicótica,
estas são habitualmente pessoas com alta vulnerabilidade ao stress, elevada
dependência, dificuldades no desenvolvimento de capacidades e nas relações
interpessoais, pensamento concreto, ansiedade perante situações novas e dificuldades

26
para generalizar as aprendizagens (Kenny e Friedman, 2003). Este perfil de utente
pressupõe necessidades frequentes de cuidados (mais de 4 contactos por mês) devido
à sua deterioração significativa nas áreas de autocuidados e do funcionamento social,
familiar e/ou laboral, pelo que se requer do Terapeuta de Referência uma atitude
assertiva, a fim de conseguir fazer face à falta de motivação da pessoa doente,
resultante dos efeitos da doença (Burns e Perkins, 2000; Alonso e Pérez Fernandéz,
2007; Granda Mariño et al. 2007; Corrigan et al., 2009).

Quanto à vertente do trabalho de organização, coordenação e suporte social, inclui


diversos tipos de intervenções, para acesso e coordenação de recursos gerais (cuidados
primários e diferenciados de saúde, educação e formação, lazer, apoio ao domicílio),
bem como para facilitar o acesso e a articulação com serviços específicos de saúde
mental, incluindo os serviços de internamento, hospital de dia, consulta, centros de
actividades ocupacionais, centros de dia, etc. (Alonso e Pérez Fernandéz, 2007;
Fernandéz Gonzalez, 2007; Granda Mariño et al., 2007).

Conforme o sintetizado pela Comissão Nacional para a Saúde Mental (CNSM, 2009), as
funções do Terapeuta de Referência são as seguintes:

• Servir de pessoa de ligação entre a equipa de Saúde Mental e a pessoa doente,


sua família e pessoas significativas
• Centralizar a informação acerca da pessoa doente (incluída no processo único)
• Delinear, em conjunto com a pessoa doente e, sempre que possível, com a
família, o Plano Individual de Cuidados (PIC)
• Monitorizar o percurso e a evolução da pessoa doente ao longo do tempo, e a
implementação do PIC
• Identificar, em cada momento, os problemas e necessidades da pessoa doente
• Referenciar, em reunião de equipa, a pessoa doente ao(s) técnico(s) cuja
competência específica (ou própria) mais se adeqúe a uma intervenção que
responda aos problemas ou necessidades identificadas.

No que se refere ao Plano Individual de Cuidados (PIC) considera-se que, de facto, é


fundamental um adequado planeamento e programação das intervenções para cada

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 27
utente. Estes Planos Individuais de Cuidados devem ser delineados pelo Terapeuta de
Referência, em conjunto com a pessoa doente e, sempre que possível, também
incluindo a família. Na elaboração dos Planos é necessário ter em conta a pessoa doente
e a sua idiossincrasia, com base numa cuidada e aprofundada identificação e avaliação
dos problemas e necessidades no que respeita a doenças somáticas, doenças e
problemas de saúde mental, adesão à medicação, autocuidados e atividades de vida
diária, questões relacionadas com a ocupação, formação, ou emprego, problemas de
consumo de álcool e drogas, rede de suporte social, questões financeiras e relacionadas
com benefícios sociais, e avaliação dos comportamentos de risco. Com base nesta
avaliação holística das necessidades da pessoa com doença mental grave no domicílio e
na comunidade, segue-se a definição dos objetivos terapêuticos e de reabilitação, bem
como a proposta de intervenções, estruturadas de forma sequencial e dinâmica, com
limites temporais definidos, e tendo em conta a variedade das competências da equipa
multidisciplinar. O Plano Individual de Cuidados precisa, naturalmente, de ser dinâmico
e flexível, ajustando-se às alterações e flutuações na evolução do processo de
recuperação da pessoa. São também necessários mecanismos e instrumentos de registo
e avaliação periódica dos planos, dos protocolos e das respetivas intervenções (Granda
Mariño et al., 2007; CNSM, 2009; Kuon e Choi, 2009).

A avaliação dos efeitos da metodologia do Terapeuta de Referência deve incidir nas


variáveis ‘clássicas’ de resultados, como a redução na sintomatologia, nas recaídas e nos
dias de internamento, mas também em resultados de saúde mais congruentes com o
modelo de recovery que lhe está subjacente, como a qualidade de vida e bem-estar, o
funcionamento social, a situação de emprego, a dimensão e qualidade das redes sociais
de apoio. Além disso, o nível de aceitação e satisfação da pessoa doente e dos seus
familiares em relação à implementação do modelo de intervenção é considerado um
indicador crucial para a adesão e o sucesso da sua implementação (Burns e Perkins,
2000).

Para a obtenção de bons resultados neste tipo de trabalho, é necessário que o Terapeuta
de Referência demonstre capacidade de estabelecer com o utente e família uma relação
de confiança e ajuda, que lhe permita uma adequada avaliação das necessidades e o
estabelecimento de uma aliança terapêutica, bem como a capacidade para transmitir

28
informação e apoio. Além disso, e sobretudo no que respeita às funções de
coordenação, o trabalho de Terapeuta de Referência implica reuniões com a equipa
multidisciplinar e com instituições da rede de serviços de saúde e de apoio social e
comunitário, para potenciação dos recursos comunitários, gestão dos recursos
normalizados de reabilitação e socialização, manutenção e alargamento da rede social,
bem como para apoio e assessoria à comunidade (Alonso e Pérez Fernandéz, 2007;
Fernandéz Gonzalez, 2007; Granda Mariño et al., 2007; Solomon e Alexander, 2010).

Tendo tudo isto em conta, considera-se que a priori qualquer um dos técnicos da Equipa
de Saúde Mental Comunitária pode desempenhar as funções de Terapeuta de
Referência, sendo para tal necessário que tenha formação profissional prévia e
competências elevadas na área das doenças mentais graves, mas sendo também
essencial a sua participação regular em acções de formação contínua, que lhe permita
uma maior confiança e segurança na realização de práticas baseadas na evidência
científica disponível e mais actual (CNSM, 2009; Chang et al., 2013)

Neste ponto, porém, é importante fazer notar que nem todos os profissionais de saúde
mental têm apetência, ou têm as competências necessárias, para efetivamente
trabalharem nas equipas de saúde mental comunitária e com funções de Terapeuta de
Referência. Conforme o referido por Singh (2000), é necessário um comprometimento
ideológico com o modelo de cuidados e o conhecimento dos pressupostos éticos e legais
(cuidado vs. controlo, liberdades civis vs. saúde) e dos pressupostos científicos (relação
entre fatores biológicos e psicossociais, relação entre medicação e psicoterapia, etc.),
bem como uma atitude de flexibilidade e disponibilidade face à mudança (Alonso e
Pérez Fernandéz, 2007; Vuckovich, 2010; Sullivan e Floyd, 2012).

Para além da disponibilidade pessoal e formação contínua do profissional para este tipo
de trabalho, é também necessário que o Terapeuta de Referência tenha um bom
conhecimento dos recursos, capacidade de estabelecer uma relação de trabalho,
capacidade para avaliar as necessidades do utente e família, e também avaliar os efeitos
das diversas intervenções (farmacológicas incluídas), bem como a capacidade para
transmitir a informação necessária às várias pessoas que participam nos cuidados ao
utente, nos vários serviços e estruturas da comunidade.

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 29
30
CAP. 4 – O ENFERMEIRO COMO TERAPEUTA DE REFERÊNCIA
Tendo por base o conceito de transição formulado por Meleis, entendido como uma
mudança significativa na pessoa, que pode gerar um novo comportamento ou uma
outra definição de si mesma no contexto social, considera-se que assistir as pessoas em
processos de transição constitui o papel mais relevante do exercício de Enfermagem,
por facilitar estes processos, e assim ajudar as pessoas a alcançarem o seu bem-estar,
num novo equilíbrio (Queirós et al., 2014).

Por outro lado, segundo Orem, também referida por Queirós et al. (2014), o conceito de
autocuidado assume centralidade disciplinar, pela sua capacidade de clarificar um
propósito para a Enfermagem, no sentido de promover ou restituir a capacidade de
autocuidados das pessoas, bem como pelo poder explicativo das acções do enfermeiro,
que contribui para a aquisição de competências por parte da pessoa cuidada, visando a
sua autonomia e autodeterminação.

Ora no caso das pessoas com Doença Mental Grave, e conforme o apresentado nos
capítulos anteriores, torna-se evidente que, especialmente nos quadros de
esquizofrenia, são muito comuns, extensas e persistentes as perturbações na
capacidade de autocuidados, devido à natureza psicótica da doença e também ao facto
de ela se manifestar no final da adolescência e início da idade adulta, assim
comprometendo seriamente todo um conjunto de aprendizagens que normalmente são
feitas durante esse período, e que visam a autonomização do indivíduo, através da sua
formação escolar e profissional, e também do estabelecimento de outros tipos de
interações sociais e novos relacionamentos para além da família de origem.

Além disso, as mudanças que ocorrem na vida da pessoa doente e da sua família são tão
dramáticas, a nível individual, familiar e social que, conforme é reconhecido na maioria
dos países desenvolvidos e nos organismos internacionais, o papel do enfermeiro é
realmente indispensável, a fim de facilitar o complexo processo de transição e promover
ou restituir a autonomia e o recovery (OMS, 2002; APA, 2004; ARRNL, 2008; DGS, 2012;
WHO, 2013).

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 31
Tal como o referido no preâmbulo do Regulamento nº 129/2011 sobre as Competências
do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental (ESSM), no que respeita à
sua ‘participação no tratamento das pessoas com doença mental, as intervenções do
EESM visam contribuir para a adequação das respostas da pessoa doente e família face
aos problemas específicos relacionados com a doença mental (adesão à terapêutica,
autocuidado, ocupação útil, stress do prestador de cuidados, etc.) tendo como objectivo
evitar o agravamento da situação e a desinserção social da pessoa doente, e promover
a recuperação e qualidade de vida de toda a família’ (D.R., 2011: 8669).

Neste sentido, e embora compreendendo, e tendo em atenção, a complexidade dos


mecanismos etiológicos das doenças mentais, o foco dos enfermeiros centra-se
especialmente nas respostas de cada indivíduo face à doença, acedidas através da
relação interpessoal do enfermeiro com o utente, conforme o proposto por Peplau,
referida por diversos autores (Barker et al., 1999; Wallace, 2005; Granda Mariño et al,
2007; Shanley e Jubb-Shanely, 2007; Delaney e Ferguson, 2014).

A relação terapêutica é, com efeito, a base do trabalho do enfermeiro, e pressupõe um


conhecimento científico aprofundado, bem como a capacidade de observar, analisar,
compreender e explicar as respostas mais frequentes das pessoas face às situações de
dificuldade, as suas implicações fisiológicas, psicológicas e sociais, bem como os
aspectos éticos e legais associados. Face às pessoas com doença mental grave, é esta
compreensão da problemática específica da pessoa doente e sua família que permite o
estabelecimento de uma relação empática e de confiança entre o profissional, a pessoa
doente e a família. Esta relação baseia-se, segundo o Modelo de Relações Interpessoais
de Peplau, em processos interpessoais terapêuticos e significativos para a pessoa, com
objetivos terapêuticos bem definidos que, para além da ressonância emocional, passam
também por ajudar a pessoa a tomar consciência das suas reacções e respostas, bem
como ajudá-la a construir o sentido de si face às mudanças e significados da vivência do
processo de doença ou transição (Delaney e Ferguson, 2014).

Em todo este processo, é evidentemente necessário que o profissional seja capaz de


utilizar técnicas de comunicação, verbal e não-verbal, para interagir nos vários contextos
e junto dos diversos intervenientes. Mas, especialmente nas situações de Doença

32
Mental Grave, o fator tempo e a continuidade dos contactos e da relação são
absolutamente fundamentais pois, sobretudo os indivíduos que negam a sua doença,
ou não têm acesso aos seus sentimentos sobre a situação, podem por isso não estar
preparados para rapidamente se envolverem num processo de verbalização da sua
experiência de doença. Nestes casos, o estabelecimento de uma relação terapêutica
constitui realmente um grande desafio, requerendo competências adicionais,
especializadas, da parte do profissional, para além de muita flexibilidade, paciência e
persistência. Só assim se tornará efectivamente possível que, utilizando a relação de
confiança e tendo por base os recursos e as capacidades da pessoa doente e da sua
família, o enfermeiro possa identificar as necessidades afetadas e implementar as
intervenções adequadas (apoio, informação, motivação). Neste sentido, as ações do
enfermeiro vão plenamente ao encontro dos princípios do recovery, já que visam ajudar
a pessoa doente e a sua família a encontrarem formas adequadas de resposta face às
inúmeras alterações ocasionadas pela doença, descobrindo os seus próprios recursos e,
assim, iniciando os necessários processos de ajustamento e mudança, ao seu ritmo, e
em função das possibilidades do seu ambiente próximo, incluindo a família, os amigos e
as estruturas de apoio (Sequeira, 2006; Granda Mariño et al., 2007; Delaney e Ferguson,
2014).

Neste ponto, e devido à extensão e complexidade das alterações que a Doença Mental
Grave provoca no dia a dia da pessoa doente e sua família, é de referir que, conforme o
salientado por Delaney e Ferguson (2014), a relação interpessoal com o profissional é
importante para o doente e para a família, mas a ajuda específica em questões práticas
identificadas pela pessoa (autocuidados, atividades de vida diária, alojamento, finanças)
também é necessária e muito valorizada.

Com efeito, essa ajuda prática incide em múltiplos aspetos (fisiológicos, psicológicos,
sociais e espirituais) da forma como cada indivíduo responde à situação de doença, ou
processo de transição, e como estas interferem na satisfação das suas necessidades
humanas fundamentais, sendo por isso um aspeto fundamental da contribuição
específica da disciplina de Enfermagem para o trabalho da equipa multidisciplinar. Neste
sentido, e conforme o apresentado por Sequeira (2006), as ações de Enfermagem
incluem atividades diversas como observar (para identificar, diagnosticar, vigiar e

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 33
avaliar), gerir (organizar, distribuir, coligir), executar (limpar, arranjar, alimentar,
manipular e estimular, entre outras), atender (assistir, tratar, prevenir, relacionar) e
informar (ensinar, orientar, descrever, entrevistar, explicar).

Concretamente em relação às pessoas com Doença Mental Grave e suas famílias, aplica-
se em boa medida o que foi indicado no Referencial do Enfermeiro para a generalidade
das doenças crónicas de evolução prolongada no âmbito da Rede Nacional de Cuidados
Continuados Integrados (OE, 2009a), sendo que os principais focos de atenção da prática
de Enfermagem incluem o autocuidado (comer e beber, higiene, sono e repouso,
aprendizagem e atitudes), o coping (aceitação do estado de saúde, ansiedade,
interacção social), o tratamento (não adesão à medicação, nas suas várias dimensões
física, mental e comportamental, socio-cultural, ambiental e espiritual) e o cuidador
informal (prestador de cuidados, conhecimento sobre a importância de cumprir o
regime terapêutico, ansiedade, stress do prestador de cuidados, autocuidado: sono e
repouso e aprendizagem), entre outros (Sequeira, 2006; Granda Mariño et al., 2007;
Simões e Simões, 2007).

Encontrando-se já feita, por Sequeira (2006), a descrição dos focos de atenção da prática
clínica em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, bem como a identificação dos
dados relevantes para o processo de diagnóstico e a definição das respetivas
intervenções, serão no presente contexto apenas destacados três dos focos que, na
problemática das pessoas com Doença Mental Grave, assumem contornos mais
específicos: a não adesão ao tratamento, o coping e o prestador de cuidados.

No que respeita à não adesão à terapêutica, diversos estudos indicam que na área da
psiquiatria esse fenómeno é duas vezes mais frequente do que nas restantes áreas,
sendo que nas pessoas com esquizofrenia a taxa de não adesão pode variar entre 50%
e 80% (Dodds, et al., 2000; Balikci et al., 2013). Estima-se que cerca de 74% dos doentes
descontinuam o tratamento no prazo de 18 meses, enquanto 50% dos doentes em
ambulatório e 20% os internados não aderem à medicação prescrita, considerando-se
este facto como principal responsável pelas altas taxas de recaída e reinternamento, e
por muitas das implicações clínicas, sociais, familiares e financeiras que daí advêm
(Stephen et al, 2007).

34
Assim, e dado que nas pessoas com Doença Mental Grave a adesão à terapêutica é uma
condição essencial para o tratamento em ambulatório, é fundamental a identificação e
compreensão dos fatores que funcionam como obstáculo para a adesão à terapêutica,
a fim de que, com a participação da pessoa doente e pessoas significativas, se possam
encontrar as estratégias adequadas para os ultrapassar e melhorar a auto-gestão da
doença e suas consequências (OE, 2009b).

Dentre os fatores mais frequentemente relacionados com as dificuldades na adesão ao


esquema farmacológico destacam-se os efeitos secundários da medicação, que em
muitos casos contribuem de forma importante para a não adesão ao tratamento. No
entanto, e para além do desconforto dos efeitos secundários, as falhas na adesão à
terapêutica relacionam-se também com aspetos característicos da própria patologia,
nomeadamente a recusa em admitir a doença ou o reduzido insight (pelo caráter
psicótico da doença), os conhecimentos insuficientes sobre os mecanismos
fundamentais da doença e da medicação, as crenças de saúde e a atitude negativa face
ao caráter crónico da doença e à necessidade de tratamento continuado, sobretudo
tendo em conta a jovem idade de muitos doentes (Zipursky e Schulz, 2003; Sequeira,
2006; Stephen et al, 2007; Afonso, 2010).

Outros fatores têm sido também identificados como obstáculos na adesão à


terapêutica, incluindo os relacionados com a acessibilidade aos serviços de saúde e as
dificuldades económicas, mas também no que respeita à qualidade da relação da pessoa
doente com a equipa de saúde. Segundo Kreyenbuhl et al. (2009), a descontinuação na
utilização dos cuidados poderá significar, do ponto de vista da pessoa doente, que o
tratamento não é necessário, que não corresponde às suas necessidades, ou que não
está a ser disponibilizado de uma forma colaborativa. Os diversos estudos sugerem, por
isso, que todos os esforços devem ser feitos para melhorar a comunicação centrada no
utente, incluindo uma forte relação de confiança entre o utente e o profissional, e
promovendo o seu envolvimento ativo nas decisões acerca do seu tratamento (OE,
2009b; Balikci et al., 2013).

Embora não haja dúvidas acerca da importância do tratamento farmacológico, tendo


como objetivo a compensação dos desequilíbrios neurobioquímicos relacionados com a

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 35
esquizofrenia, são também particularmente relevantes as dificuldades da pessoa
doente, e da sua família, no coping, incluindo a adaptação pessoal e social ao processo
de doença e ao tratamento.

De facto, o confronto de um jovem com o diagnóstico de esquizofrenia, ou


simplesmente com a ideia de ter uma doença que obrigará a um tratamento
prolongado, frequentemente resulta num menor sentido de auto-estima e auto-
eficácia, e em comportamentos de negação ou de retraimento social, em muitos casos
com significativo risco de suicídio (McCay e Ryan, 2003; Torrey, 2006; Corrigan et al.,
2009). Conforme o afirmado por Zipursky e Schulz (2003), espera-se demasiado das
pessoas doentes, e sobretudo dos jovens doentes, até pelo facto de que se encontram
num estado de maior dificuldade em compreender a realidade: espera-se que aceitem
um diagnóstico de doença mental, que entendam os sintomas, que aceitem as
medicações e que adiram às recomendações para o longo prazo, entre outras.

Neste processo de adaptação à doença, é portanto necessário ajudar a pessoa a


compreender e aceitar o seu estado de saúde, tornando-se capaz de identificar as
relações entre os seus sintomas e os comportamentos, aprendendo a gerir os seus
estados de stress e ansiedade, e melhorando as suas capacidades e oportunidades de
interacção social (Sequeira, 2006). Com efeito, diversos autores consideram que, a longo
prazo, o nível de funcionamento social da pessoa e a sua qualidade de vida dependerão,
sobretudo, do que for conseguido ao nível da sua adaptação psicológica e emocional à
doença (Falloon et al., 1987; Tarrier e Bobes, 2000; McCay e Ryan, 2003; Zipursky e
Schulz, 2003; Bellack et al., 2004; Garcia Cabeza, 2008).

Neste sentido, e tal como se encontra também previsto no Regulamento das


Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental,
considera-se que a utilização de técnicas psicoterapêuticas e socioterapêuticas são uma
componente fundamental no tratamento das pessoas com Doença Mental Grave,
incluindo o treino de competências sociais, os programas de gestão da ansiedade e as
técnicas de aconselhamento (DH, 2002; Turkington et al., 2004; Cather, 2005; D.R.,
2011; Tolleti, 2011).

36
Por último, e no que respeita ao papel do cuidador, é um foco de atenção da prática
especialmente relevante na problemática da pessoa com Doença Mental Grave porque,
concretamente no caso da esquizofrenia, a doença manifesta-se durante os anos críticos
para a formação pessoal e profissional do indivíduo, pelo que em muitos casos estas
pessoas têm menos possibilidade de completarem a formação necessária para um
desempenho profissional adequado, que lhes garanta o seu funcionamento social, a sua
subsistência e a sua autonomização, mantendo-se por isso em coabitação e a cargo das
famílias.

Além disso, a doença obriga muitas vezes a que atividades básicas como a higiene
pessoal e a alimentação da pessoa doente requeiram algum grau de supervisão,
controlo ou apoio direto. Neste contexto, a pessoa doente muitas vezes
desresponsabilizada das tarefas que assumia ou deveria assumir (incluindo as tarefas
domésticas), acabando-se por aceitar a sua incapacidade para as desenvolver como
alternativa ao conflito permanente, e recaindo essas tarefas nos restantes membros da
família.

O papel do cuidador é ainda dificultado porque as famílias se confrontam com o stress


diário provocado pelos comportamentos imprevisíveis e bizarros do doente, pela
constante preocupação e angústia devido à incerteza em relação ao futuro e à
subsistência do doente, para além dos stressores externos relacionados com o estigma,
o isolamento social e a frustração emocional, muitas vezes também relacionada com as
barreiras e deficiências do próprio sistema de saúde mental.

Todos estes factores contribuem para a exaustão emocional, física e económica dos
cuidadores familiares, habitualmente designada de sobrecarga familiar (objetiva e
subjetiva) que, frequentemente, contribui para que os familiares apresentem taxas de
patologia médica e psiquiátrica superior às da população em geral (Schene, 1990; Brito,
2002, 2006, 2012).

É evidente que as famílias não estão naturalmente preparadas para lidar, de forma
continuada, com sintomas e comportamentos tão complexos como os que ocorrem na
esquizofrenia, e por isso podem, de facto, mas sem saber, e sem querer, estar a
estimular os sintomas que na realidade gostariam de ver reduzidos. Por esse motivo

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 37
considera-se que, em conjunto com o tratamento farmacológico que visa a regulação
interna da excitabilidade cerebral, também uma mudança no clima emocional dentro
das famílias pode ter um efeito adicional na prevenção da recaída, através da redução
da intensidade dos estímulos externos a que a pessoa doente está sujeita no dia-a-dia.
Por esse motivo, os familiares constituem, como prestadores informais de cuidados, um
recurso extremamente importante nos cuidados comunitários às pessoas com
esquizofrenia, pelo que é importante apoiá-los e procurar manter também a sua saúde
física e mental, tendo igualmente em atenção as suas necessidades especiais de apoio,
a fim de que possam ativa e eficazmente participar no processo de tratamento e
recovery da pessoa com Doença Mental Grave. Para isso é fundamental que as famílias
sejam positivamente envolvidas no processo de tratamento, e dotadas dos
conhecimentos e capacidades instrumentais necessários para lidarem eficazmente com
a doença. Esse é, aliás, o principal objectivo das intervenções psicoeducativas familiares,
também previstas no Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016, e no âmbito das
Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental
(McFarlane, 2002; OMS, 2002; APA, 2004; Gonçalves-Pereira et al., 2007; CNRSSM,
2007; OE, 2009; D.R. 2008 e 2011; Brito, 2012).

Estas são apenas algumas das áreas em que é notório e reconhecido o contributo da
Enfermagem para a promoção da autonomia e para o processo de recovery da pessoa
com Doença Mental Grave, sendo por isso consideradas, sob o ponto de vista dos
resultados, como áreas muito sensíveis aos cuidados de Enfermagem. Neste sentido, e
tal como também foi proposto no Referencial do Enfermeiro para a Rede Nacional de
Cuidados Continuados Integrados, considera-se que as horas de cuidados de
enfermagem deverão estar relacionadas com o potencial de recuperação previsto,
sendo que ‘quanto maior for o potencial de recuperação de um utente, maior será o
investimento em horas de cuidados, para a sua recuperação máxima e capacitação da
autonomia’ (OE, 2009: 18, 27).

Face a toda a complexidade do processo de tratamento e recovery da pessoa com


Doença Mental Grave, e à semelhança do que já há várias décadas tem sido adotado na
maioria dos países desenvolvidos, o atual Plano Nacional de Saúde Mental (2007-2016)
preconiza a criação das Equipas de Saúde Mental Comunitária (ESMC), que devem

38
funcionar em correspondência direta com um ou mais Centros de Saúde, tendo como
objetivo prestar cuidados a um setor geodemográfico determinado, e incluindo
explicitamente o programa integrado para Doentes Mentais Graves, com manejo de
casos por Terapeutas de Referência (D.R. 2008: 1400).

É de notar que, tal como o referido por O’Brien et al. (2006), as áreas de intervenção das
Equipas de Saúde Mental Comunitária nas populações alvo dos cuidados englobam três
grandes grupos, muitas vezes sobreponíveis: cuidados a pessoas com doença mental
grave (gestão de situações de evolução prolongada), cuidados a pessoas com
perturbações ligeiras a moderadas, e promoção da saúde mental. Em todas estas áreas,
e tendo em conta as directivas internacionais, aposta-se numa perspectiva de cuidados
de proximidade, que permitam uma maior individualização e continuidade dos
cuidados, e oferecendo respostas mais adequadas à complexidade dos problemas e
necessidades da cada pessoa ou grupo (OMS, 2002; Gomes e Loureiro, 2013).

Porém, e conforme o até agora exposto, esta condição de complexidade das


necessidades de cuidados em saúde mental adquire uma mais forte expressão no caso
das pessoas com doenças mentais graves e crónicas, pelo que cabe à Equipa de Saúde
Mental Comunitária a responsabilidade pela prestação direta de cuidados e apoio
específico a estas pessoas, utilizando a metodologia da gestão de casos por Terapeutas
de Referência, ainda que com a colaboração dos profissionais dos Cuidados de Saúde
Primários (CNRSSM, 2007; D.R., 2008; CNSM, 2009).

Quanto à composição destas Equipas de Saúde Mental Comunitária, está claramente


definido no Plano Nacional de Saúde Mental que devem ser ‘multidisciplinares, com
forte participação de enfermeiros e outros técnicos não-médicos’, designadamente
‘psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e outras profissões relevantes
para a saúde mental’ (D.R. 2008: 1400, 1407; CNSM, 2009).

Também conforme o definido nos documentos entretanto elaborados pela


Coordenação Nacional para a Saúde Mental, qualquer um dos técnicos da Equipa poderá
exercer as funções de Terapeuta de Referência, desde que para isso tenha formação
prévia e competências elevadas na área das doenças mentais graves, regularmente
actualizadas através da indispensável formação contínua (CNSM, 2009).

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 39
Disto decorre que, para além da contribuição específica da disciplina de Enfermagem
para o skill mix da Equipa de Saúde Mental Comunitária, cabe aos enfermeiros, que em
princípio até serão a classe profissional mais numerosa na Equipa, desempenhar
efetivamente o papel de coordenadores dos cuidados da maioria das pessoas com
necessidades de cuidados continuados complexos que são acompanhadas pela Equipa,
assumindo-se assim como Terapeutas de Referência, tal como de resto se encontra
também contemplado no Regulamento das Competências do Enfermeiro Especialista
em Enfermagem de Saúde Mental (D.R., 2011:8671, 8672).

Conforme o anteriormente referido em relação ao Reino Unido e aos Estados Unidos,


está tem sido a prática, desde há várias décadas, em todos os países que reconheceram
as necessidades especiais de coordenação e articulação dos cuidados tendo em vista o
recovery das pessoas com Doença Mental Grave. No Canadá, por exemplo, já há mais
de 20 anos que se vem defendendo o alargamento dos papéis desenvolvidos pelos
enfermeiros de saúde mental na comunidade, considerando que até agora têm sido sub-
utilizados. Assim, e para além das funções globais do enfermeiro no que respeita ao
estabelecimento de relação terapêutica, avaliação das necessidades, realização e
avaliação dos vários tipos de intervenções, articulação no âmbito organizacional, o
enfermeiro é chamado a desempenhar papeis específicos dirigidos a grupos específicos
de utentes, que requerem competências também específicas, em função da área de
intervenção. E no que respeita ao apoio às pessoas com Doença Mental Grave, a gestão
de caso (clinical case management) é considerado uma modelo de efectividade
comprovada, em relação ao qual os objetivos, os focos de atenção e as competências
do enfermeiro de psiquiatria e saúde mental se adequam completamente: apoiar as
pessoas para funcionarem a um nível óptimo e tornarem-se auto-suficientes; coordenar,
negociar e gerir os cuidados de doentes complexos; facilitar a colaboração
interdisciplinar e interinstitucional; ensinar as pessoas doentes e suas famílias;
proporcionar intervenções terapêuticas à pessoa doente e sua família; proporcionar
aconselhamento de apoio, ensinar técnicas de resolução de problemas, gestão da
medicação e prevenção de recaída; ensinar reabilitação psicossocial; ligar os utentes
com outros serviços na comunidade; participar em equipas de tratamento assertivo

40
comunitário (Alonso e Fernández, 2007; Fernandez Gonzalez, 2007; Granda Mariño et
al., 2007; ARNNL, 2008).

Estas responsabilidades do enfermeiro têm sido alvo de múltiplas análises e reflexões


por todo o mundo (Leff et a., 2001; Simpson, 2005; Wallace, 2005; O’Brien et al., 2006;
Sánchez Bujaldón, 2007; Shanley e Jub-Shanley, 2007; O’Neill et al., 2008; Barker e
Buchanan-Barker, 2011; O’Connell e Stein, 2011; Sullivan & Floyd, 2012), incluindo um
outro aspeto a ter em conta, que é a questão fundamental da aceitação, por parte dos
outros profissionais, do Enfermeiro como coordenador de cuidados e Terapeuta de
Referência. Conforme o já há muito tempo analisado por diversos autores em relação à
realidade de vários países, esta aceitação pode estar dificultada pela falta de articulação
entre os vários serviços, mas também por dificuldades de aceitação da função de
Terapeuta de Referência por parte de profissionais que possam sentir que o papel de
Terapeuta de Referência subverte as linhas hierárquicas tradicionais, como acontece
com frequência por parte dos psiquiatras ou dos psicólogos, inicialmente resistentes
face à ideia de tal papel ser desempenhado por um enfermeiro ou por um técnico de
serviço social (Altschuler e Forward, 1978; Intaliata e Baker, 1983; Simpson, 2007;
Kanter, 2010; Mohamed, 2013).

Finalmente, e no que respeita a estratégias de organização e implementação da figura


do Terapeuta de Referência no âmbito de atuação das Equipas de Saúde Mental
Comunitária, reconhece-se que a natureza da relação profissional na gestão de caso
requer capacidades e competências profissionais complexas, tanto no domínio científico
como nas competências de comunicação. Além disso, este trabalho realiza-se no
domicílio e na comunidade, e precisa de ser adaptado de forma individual às
necessidades e ao ritmo de cada utente, e também à sua rede social de apoio, como a
família, os amigos, a escola, o trabalho e outras estruturas de comunidade. Por isso as
intervenções terapêuticas, muitas vezes sem horário pré-definido, podem ter lugar no
domicílio, na rua, no café, no local de trabalho, ou até mesmo pelo telefone ou utilizando
outros meios multimédia, o que acontece já em diversas situações de cuidados, e até já
foi alvo de um parecer positivo do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros
(Senn, 2000; Alonso e Pérez Fernandéz, 2007; Granda Mariño et al., 2007; OE, 2009c;

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 41
D’Espiney, 2010; Sullivan & Floyd, 2012; Delaney e Ferguson, 2014; Kasckow et al.,
2014).
Assim, o trabalho nas equipas de saúde mental comunitária difere muito do trabalho em
contexto hospitalar, ou mesmo das meras actividades de visitação domiciliária ou
consulta em ambulatório. Por esse motivo, torna-se essencial a experiência e a formação
específica nesta área dos cuidados em saúde mental, incluindo uma adequada definição
e compreensão dos papéis dos diversos profissionais (O’Brien et al., 2006; ARNNL, 2008;
CNSM, 2009; D’Espiney, 2010).

Em todos estes contextos cabe aos enfermeiros garantirem o ambiente terapêutico


adequado, que efetivamente contribua para facilitar o processo de transição,
autonomização e recovery das pessoas com Doença Mental Grave e suas famílias, e por
essa via fazendo efetivamente a diferença na vida e no bem-estar destas pessoas (Meleis
e Glickman, 2014).

42
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme o referido no Programa Nacional para a Saúde Mental 2017, constata-se que
em Portugal ‘uma percentagem importante de pessoas com doenças mentais graves
permanecem sem acesso a cuidados de saúde mental, e muitos dos que têm acesso a
cuidados de saúde mental continuam a não beneficiar dos modelos de intervenção
(programas de tratamento e de reabilitação psicossocial) hoje considerados essenciais’
(DGS, 2017: 13). Mais adiante no mesmo documento, e com base nas Linhas de Ação
Estratégica para a Saúde Mental e o Bem-Estar na Europa, refere-se a necessidade de
‘garantir a transição para um tratamento abrangente e para cuidados na comunidade
de elevada qualidade’, com ênfase na ‘coordenação dos cuidados de saúde e sociais para
pessoas com doenças mentais mais graves’ (DGS, 2017:13).

Apesar da bem documentada, a nível internacional, a efetividade e a redução de custos


- pessoais, sociais e financeiros- do tratamento das pessoas com Doença Mental Grave
em contexto comunitário, este encontra-se ainda pouco desenvolvido em Portugal, o
que continua a acarretar consequências nefastas para as pessoas doentes (pelas
frequentes situações de descompensação psicótica e deficiente autonomização pessoal
e profissional), para a família (pelos efeitos da situação continuada de sobrecarga), e
para a sociedade (pelos elevados custos dos reinternamentos e do apoio a pessoas não
socialmente produtivas).

Atendendo a que os meios de tratamento atuais (farmacológicos e psicossociais),


oferecem a possibilidade de recuperação pessoal e social de grande parte das pessoas
com Doença Mental Grave, e não apenas ‘cuidados paliativos’, considera-se atualmente
que o verdadeiro objetivo de todos os serviços de saúde mental deve mesmo ser a
recuperação (recovery) da pessoa com doença mental grave, visando então a sua
inclusão social e plena cidadania, e não apenas o controlo dos sintomas ou a mera
ocupação do seu ‘tempo livre’.

Torna-se para isso indispensável todo um trabalho multidisciplinar bem articulado, que
permita o apoio continuado e articulado à pessoa com doença mental grave e sua família
em contexto comunitário.

MARIA LUISA DA SILVA BRITO | O Enfermeiro como Terapeuta de Referência nas Equipas de Saúde Mental Comunitária 43
É com este objectivo que, no âmbito do Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016,
surge o programa integrado de apoio a pessoas com DMG com manejo de casos por
Terapeuta de Referência, através do qual os enfermeiros de Saúde Mental portugueses
são chamados a estarem onde estão os doentes – predominantemente na comunidade,
e a exercerem as funções de Terapeuta de Referência, para as quais têm as habilitações
e as competências básicas necessárias.

Em todo o mundo, os enfermeiros de saúde mental têm sido desafiados a redefinir o


seu leque de competências clínicas, e a desenvolver novos papéis em resposta às
diferentes percepções acerca das necessidades em saúde mental, bem como às
mudanças nos modelos de prestação de cuidados. Tal implicará também
transformações significativas ao nível da organização do trabalho, das relações e das
práticas profissionais.

Em todo o caso, e para que os enfermeiros estejam preparados para os novos desafios
dos cuidados de saúde, a sua formação deve espelhar as necessidades da sociedade e
ter em conta o efeitos das condições globais na saúde e na prática de enfermagem.
Nesse sentido, tanto a formação contínua como a formação pós-graduada e avançada
dos enfermeiros na área da saúde mental, são fundamentais para obter e manter os
conhecimentos e competências necessários para a implementação de novos papéis e a
realização de cuidados de qualidade em contexto comunitário e de forma colaborativa
com outras profissões, e tendo em vista a realização do seu potencial de contribuição
para os ganhos em saúde das populações.

Fica a questão colocada no título do artigo de Hurley e Linsley (2007) no Journal of


Psychiatric and Mental Health Nursing - Expanding roles within mental health legislation:
an opportunity for professional growth or a missed opportunity?

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