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Epicurismo; fatalismo:

Ricardo Reis propõe uma filosofia moral de acordo


com os princípios do epicurismo e uma filosofia
estóica:
 “Carpe diem” (aproveitai o dia), ou seja,
aproveitai a vida em cada dia, como caminho
de felicidade;
 Buscar a felicidade com tranquilidade
(ataraxia);
 Não ceder ao impulso dos instintos
(estoicismo);
 Procurar a calma ou, pelo menos, a sua ilusão;
 Seguir o ideal ético da apatia que permite a
ausência da paixão e a liberdade (sobre esta
apenas o Fado).
Não podemos nem devemos opor-nos ao destino,
antes aceitá-lo com naturalidade, como a água
segue o curso do rio, sem lhe resistir. “Segue o teu
destino”, proclama Ricardo Reis. Cada um deve
apenas buscar a calma e a tranquilidade, abstendo-
se de todo o esforço e atividade inútil.
O núcleo da sabedoria epicurista consiste neste
fatalismo, ou melhor, neste aceitar o destino
inelutável, desfrutando os prazeres e sofrendo a
inevitável dor, pois nada é duradouro. Apesar de
todo o sentido trágico do fatum (fado), cabe ao
homem viver a vida com a lucidez dos “grandes
indiferentes”.
Em Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação,
Fernando Pessoa afirma que a obra de Ricardo Reis
apresenta um epicurismo triste, pois na vida, apesar
do prazer e da felicidade que se deve buscar, nunca
se encontra a calma e a tranquilidade. Diz ele que
“devemos buscar dar-nos a ilusão da calma, da
liberdade e da felicidade, coisas inatingíveis,
porque, quanto à liberdade, os próprios deuses –
sobre quem pesa o Fado- a não têm; quanto à
calma, quem vive na angústia complexa de hoje,
quem vive sempre à espera da morte, dificilmente
pode fingir-se calmo. A obra de Ricardo Reis,
profundamente triste, é um esforço lúcido e
disciplinado para obter uma calma qualquer”.
O epicurismo consiste na filosofia moral de Epicuro
(341-270 a.c.), que defendia o prazer como caminho
da felicidade. Mas para que a satisfação dos desejos
seja estável, sem desprazer ou dor, é necessário um
estado de ataraxia, ou seja, de tranquilidade e sem
qualquer perturbação. O poeta romano Horácio
seguiu de perto este pensamento da defesa do
prazer do momento, ao considerar o carpe diem
(“aproveitai o dia”) como necessário à felicidade.
O estoicismo é uma corrente filosófica que
considera ser possível encontrar a felicidade desde
que se viva em conformidade com as leis do destino
que regem o mundo, permanecendo indiferente
aos males e às paixões, que são perturbações da
razão. O ideal ético é a apatia, que se define como
ausência de paixão e permite a liberdade, mesmo
sendo escravo.
Ricardo Reis é um poeta disciplinado, que procura o
prazer nos limites do ser humano face ao destino e
à brevidade da vida. Daí fazer a apologia da
indiferença solene diante do poder dos deuses e do
destino inelutável. Considera que a verdadeira
sabedoria de vida é viver de forma equilibrada e
serena, “sem desassossegos grandes”.

Indiferença cética e contemplativa:


Caeiro propunha-nos o saber ver; a obra de Reis sugere-
nos o saber contemplar, ou seja, ver intelectualmente a
realidade: “Sábio é o que se contenta com o espetáculo
do mundo”.
Para Reis é necessário saber apreciar, muito consciente e
tranquilamente, o prazer das coisas, sem qualquer
esforço ou preocupação. É preciso viver a sua vida em
conformidade com as leis do destino, indiferente à dor e
ao desprazer: “Segue o teu destino, / Rega as tuas
plantas, / Ama as tuas rosas. / O resto é a sombra / De
árvores alheias.”
A indiferença cética é um ato de lucidez de quem sabe
que tudo tem seu fim e de que tudo já está, fatalmente,
traçado. Reis, muitas vezes, considera a inconsciência ou
a distração como a melhor forma de gozar o pouco que
nos é dado. Aceita o Fatum, de olhos atentos e, com
calma lucidez, a relatividade e a fugacidade de todas as
coisas. Procura ignorar tudo conscientemente, pensando
apenas o momento, o gozo do instante. O sentimento do
tempo leva-o a considerar o instante como a duração
calculada da vivência, mas que flui continuamente.

Classicismo (intelectual e erudito):


A precisão verbal e o recurso à mitologia, associados aos
princípios da moral e da estética epicuristas e estoicas ou
à tranquilidade resignação ao destino, são marcas do
classicismo erudito de Reis. Faz dos Gregos o modelo da
sabedoria, pois souberam aceitar o destino e fruir o bem
da vida. Mas, apesar deste diálogo com a Antiguidade, há
uma angústia ou tristeza marcadamente modernas, que
se refletem no Pessoa ortónimo e em Campos.
Poeta Clássico, da serenidade, Ricardo Reis privilegia a
ode, o epigrama e a elegia. A sintaxe clássica latina,
frequentemente com a inversão da ordem lógica,
favorece o ritmo das suas ideias disciplinadas.

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